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Questões de embasamento
Primeiro, a fenomenologia enquanto perspectiva filosófica e terapêutica (com
psiquiatras pioneiros desse relacionamento, como Binswanger e Boss), é
questionadora dos fundamentos da psicanálise. Ela pode ser entendida, em
certo sentido, como uma contribuição que busca retirar a psicanálise da sua
aspiração a ciência natural e oferecer-lhe um embasamento ontológico.
Considerando a importância de Husserl no campo da fenomenologia, a filosofia
busca contribuir, em certo sentido, para o fundamento racional do
conhecimento, com a formulação de verdades universais, isto é, independentes
de qualquer particularidades e contingências. Para tanto, ele recorre à minúcia
de uma investigação das estruturas da consciência, possivelmente acessíveis
desde certa metodologia.
Da parte de Freud, o fundamento de seu saber e de sua técnica não é
epistemológico, pois parte do interesse clínico. Assim, não pretende formar
uma perspectiva universal e fechada para, depois, desdobrar sua produção –
no entanto, isso também é consequência dele considerar que seu
embasamento já estava dado: as ciências naturais. Por outro lado, se a
consciência fenomenológica buscava fundamentar uma evidência, Freud
procura um inconsciente que tem por definição o traço da opacidade.
Paradoxalmente, da perspectiva do método, psicanálise e fenomenologia
parecem poder se aproximar, já que revelam certo sentido latente dos
fenômenos que estuda, sendo levada ela mesma para fora do campo natural.
Com Heidegger, a fenomenologia é retirada do campo metodológico e
epistemológico e inserida em uma ontologia da analítica existencial, isto é, sai
da consciência e vai para uma análise do Dasein (ser no aí**) como o modo de
ser do homem (Barbosa, et. Al, 2020). Pensar no Dasein (para alguns, ser-no-
aí) leva ao plano de um “ente” que questiona o “ser” com perguntas do tipo:
como pode existir a pergunta pelo sentido do ser? A existência do Dasein é
pensada como “ek-sistente”, sem fundamento a priori e sem limitação em si
mesmo, só podendo ser apreendido na medida em que entra em jogo sua
inserção no mundo. Sua determinação pelo campo no qual se insere coloca
para ele suas diretrizes fundamentais, que são propriamente humanas e não
podem referirem-se em outros campos. Assim, Heidegger pode perguntar: na
psicanálise, o homem está mesmo aí?
Partindo do fundamento Heideggeriano do ser, Biswanger é um psiquiatra
digno de nota, pioneiro para a daseinsanálise, deflagrador das primeiras
conexões entre psiquiatria, fenomenologia e psicanálise – inserindo-se no
esforço de retirar o campo “psi” da posição naturalista. Para ele, a construção
da noção freudiana de homem seria a de um homem ideal, concebível apenas
a partir de uma “destruição” da experiência antropológica, ou seja,
propriamente humana.
Binswanger concorda com Heidegger sobre Freud não inserir de fato o homem
quando o toma como objeto, porém, entende que a natureza freudiana não é
exatamente a mesma que a das ciências naturais, já que a pulsão traz uma
dimensão “mítica” de intangibilidade, exigindo uma “ontologia”.
Da parte de Boss, a daseinsanalise é uma práxis psicanalítica “purificada dos
erros teóricos de Freud”. Ele diz, ainda, que o método de tratamento da
psicanálise difere muito de sua própria teoria psicológica. Assim, a
daseinsanálise rejeita a criação de pressupostos especulativos, como faz
Freud, mas aceita a prática clínica de lidar com os “sentidos” dos atos
psíquicos – fazendo até uma volta a Freud para aprofundar as descobertas
dele.
Quando freud fala em psique, a daseinsanálise fala em Dasein. Esta última
parece deter-se mais naquilo que é considerado “experiência imeditada”,
desgarrando-se da necessidade de especulações causais. Podemos
questionar que esta suposta necessidade freudiana de “explicar tudo” pode ser
questionada, tendo em vista que já no sonho sobre a injeção de irmã ele
reconhece uma espécie de “umbigo” ininterpretável.
“incompatibilidade que há em assumir um modelo energético para explicar o
funcionamento do psiquismo e, ao mesmo tempo, utilizar-se de um método que
busca traduzir os sentidos dos fenômenos apresentados no contexto clínico”
(p.136)
- morte: heid e freud colocam a morte como força central em suas respectivas
concepções da vida, sendo a finitude uma presença fundamental para ambos;
no entanto, o saber sobre a morte muda, pois, para o primeiro, a morte não
encontra representação, e, para o segundo, mesmo inserido no esquecimento
causado pelo cotidiano, a morte é sempre sabida e aparece na angústia;