A questão do conhecimento na fenomenologia e psicoterapia
fenomenológica
A fenomenologia inicialmente surge através de Husserl como uma visão
filosófica, sem a pretensão de se tornar somente mais uma teoria psicológica buscando seu espaço no disputado campo da Psicologia. A fenomenologia é antes de tudo, um método, isto é, um caminho do entendimento humano, para atingir as coisas do mundo e o nosso existir, simplesmente como eles se mostram. Essa concepção se diferencia do que até então era proposto na ciência do início do século XX que buscava explicar as coisas a partir de relações causais ou processos evolutivos (pensamento darwinista). Outro traço desses modos de compreensão do que é “conhecer” e “conhecimento”, era a separação daquele que conhece(sujeito) do que é conhecido(objeto). A partir de tal dicotomia assume-se que o ser humano é dotado de faculdades que o permitem conhecer os objetos — sejam eles objetos do mundo ou até mesmo o ser humano enquanto um objeto a ser desvendado. Este pensamento é proveniente de uma compreensão de mundo cartesiana e bastante comum às ciências naturais, é influente na psicologia da época e dá origem ao que chamamos de psiquismo, que acabou se desdobrando, a princípio, nas primeiras teorias psicológicas, como a Psicanálise. No entanto, este modo de pensar acarreta em alguns problemas tratados por Husserl. Um dos questionamentos, diz que: “Como podemos ter certeza de que o conhecimento está em consonância com as coisas que existem em si? De fato estamos conhecendo o que se apresenta a nós?”. Outro questionamento segue como um desenvolvimento do anterior: “O conhecimento se constrói como um ‘empreendimento’ humano? Sendo assim, o conhecedor se livraria de sua humanidade (o que é próprio do humano) e sensibilidade ao acessar um objeto? De modo diferente, Husserl vai propor que o conhecer, inclusive o do método científico, está abarcado no modo de ser do humano. Assim, não existe a possibilidade de produzir um conhecimento que não seja relativo ao humano e, portanto, esta separação entre sujeito — objeto não se justifica. Essa pureza não existe. Enquanto Husserl introduz seu pensamento a partir do conceito de consciência intencional, seu discípulo Heidegger vai mais longe ao adentrar um campo que antecede a noção de consciência: o modo de ser do humano. Ora, se existe uma consciência, existe um modo de ser que possibilita sua manifestação. A este modo de ser do humano, Heidegger chama de Dasein. O Dasein tem como característica, a compreensão do seu próprio ser e, também, o fato de ter uma relação com o seu próprio ser e o ser dos demais entes(os que não são Dasein). Para Heidegger, o ser humano é um Ser-no-mundo, portanto, qualquer separação entre sujeito — objeto ignora esta realidade ontológica do homem, uma vez que os demais entes já estão junto ao homem e constituem seu Mundo. Os demais entes manifestam o seu modo de ser nas relações que estabelecem com o Dasein. Neste sentido o Dasein é uma abertura. É por estes fundamentos ontológico que a prática psicoterápica deve se guiar, de tal modo que uma psicoterapia fenomenológica só pode assim se denominar, se tiver esta base. A Dasein Analytik se constitui com base nestas formulações da teoria Heideggeriana, sendo fenomenológica, ela se livra de uma pré-concepção de homem como uma psique/mente/cognição, tão comuns na psicologia. Nesta perspectiva, um psicoterapeuta fenomenológico trabalha de maneira hermenêutica, isto é, busca entender uma história de vida. Não busca explicar uma história de vida e suas particularidades conforme ensinamentos de qualquer escola de psicoterapia ou através de determinadas categorias conceituais. O horizonte de sentido, presente no discurso do paciente é que deve alcançar o terapeuta, não o inverso.