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1
Graduando em direito na Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail:
erildopedrini@hotmail.com
2
Possui graduação em Direito pela Universidade de Vila Velha (1990), graduação em
Economia pela Universidade Federal do Espírito Santo (1991), mestrado em Direito pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1996) e doutorado em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (2002). Atualmente é professora adjunta da Universidade
Federal do Espírito Santo e advogada. Sócia do Escritório Bastos, Mendonça & Tovar
Advogados Associados. Procuradora do Município de Vitória. Foi Procuradora Geral do Estado
do Espírito Santo no período compreendido entre abril de 2004 e abril de 2007. Foi Presidente
do Conselho de Ética Pública Estadual de abril de 2007 a março de 2008. Foi Secretária da
Fazenda do Estado do Espírito Santo de abril de 2008 a fevereiro de 2009.
an attempt will be made to answer whether Precedent 656 of the Brazilian
Supreme Court is currently surpassed or not.
1. INTRODUÇÃO
Essa súmula foi aprovada pelo STF em sessão plenária realizada no dia
24/09/2003, publicada no diário oficial no dia 13/10/2003, e baseou-se em
precedentes firmados em julgamento de recursos extraordinários3, nos quais se
decidiu que a Constituição não prevê o sistema de alíquotas progressivas ao
Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e, por ser um imposto real, a
personalização da alíquota seria ilegítima.
3
A súmula 656 do STF foi embasada nos Recursos Extraordinários n. 234105, 252368,
252044, 227033 e 153771.
Além disso, este trabalho fará um paralelo entre a súmula 656 do STF e o
decidido no julgamento do RE 562045/RS, em que a Corte Suprema decidiu
pela constitucionalidade da progressão de alíquotas no Imposto de
Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), apesar de este também ser um
imposto real.
Já quanto ao critério espacial e temporal, Maria Helena Costa destaca que são
respectivamente “o território municipal ou distrital onde se situa o imóvel” e “o
momento da transmissão do bem imóvel ou direito a ele relativo, consumada
no devido registro em cartório4”.
4
PONTALTI, Mateus. Direito Tributário: Dizer o Direito. Salvador: Ed. JusPodivm. 2020, p.
424.
5
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária, 5ª edição. São Paulo: Editora
Malheiros. 1997, p. 125.
jurídicas influem, para estabelecer diferenciações de tratamento
legislativo, inclusive no aspecto material da hipótese normativa 6”.
6
Idem.
7
COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva, 2ª edição. São Paulo:
Editora Malheiro. 1996, p. 15.
8
VICENTINO, Cláudio. História Geral. 11ª edição. São Paulo: Editora Scipione. 2012, p. 268.
dos Direitos do Homem e do cidadão9, que, além de estabelecer igualdade de
todos perante a lei, o direito à propriedade e de resistência à opressão,
prescrevia:
Art 202 - Os tributos terão caráter pessoal, sempre que isso for
possível, e serão graduados conforme a capacidade econômica
do contribuinte.
9
Idem, p. 271.
10
COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva, 2ª edição. São Paulo:
Editora Malheiro. 1996, p. 18.
Atualmente, de forma similar à Constituição de 1946, a Constituição Cidadã de
1988 também prevê a capacidade contributiva em seu art. 145, §1º ao dispor
que:
Regina Helena Costa indica que, para Carlos Palao Taboada, “a capacidade
contributiva não seria mais do que um elemento imediatamente deduzível da
idéia de justiça”, eis que:
De fato, como expõe Paulo de Barros, existe uma ligação intrínseca entre a
capacidade contributiva e o Princípio da Igualdade, tanto é que “mesmo em
tempos em que aquele imperativo não constava na constituição, o princípio da
capacidade contributiva persiste no direito brasileiro, não como formulação
expressa, porém implícito nas dobras do primado da igualdade”.
11
COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva, 2ª edição. São Paulo:
Editora Malheiro. 1996, p. 38
Ainda assim, parte considerável da doutrina atribui à Capacidade Contributiva o
título de Princípio estampado na Constituição de 1988.
Regina Helena Costa, por exemplo, afirma que “não resta dúvida que a norma
que impõe a observância da capacidade contributiva traduz-se num verdadeiro
princípio”, eis que:
Como ensina Paulo de Barros, “um único texto pode originar significações
diferentes, consoante às diversas noções que o sujeito cognoscente tenha dos
termos empregados pelo legislador. Ao enunciar os juízos, expedindo as
respectivas proposições, ficarão registradas as discrepâncias de entendimento
dos sujeitos, a propósito dos termos utilizados13”.
Por essa razão, assim como leciona Humberto Ávila “a interpretação não se
caracteriza como um ato de descrição de um significado previamente dado,
mas como um ato de decisão que constitui a significação e os sentidos de um
texto14”.
12
Idem, p. 32.
13
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 30ª edição. São Paulo: Saraiva.
2019, p. 49.
14
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. 7ª edição. São Paulo: Malheiros. 2007, p. 33.
Por conta desse problema semântico e da ambiguidade do termo capacidade
contributiva, a doutrina divide esse instituto em absoluta/objetiva e
relativa/subjetiva.
Como explica Nélida Cristina dos Santos, “um sujeito pode ser
economicamente capaz, no sentido de possuir renda e patrimônio, mas não ter
15
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 30ª edição. São Paulo: Saraiva.
2019, p. 422
16
Idem, 421
17
Idem, 422
18
COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva, 2ª edição. São Paulo:
Editora Malheiro. 1996, p. 26.
capacidade contributiva se esta renda ou patrimônio permitir somente um
mínimo vital, não passível de tributação19”.
Por fim, de forma preliminar, vale aqui fazer um breve panorama sobre a
eficácia e aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva, que será
abordada mais profundamente em tópico posterior.
19
DOS SANTOS, Nélida Cristina. A Capacidade Contributiva e os Símbolos de Riqueza.
São Paulo: Lex Editora. 2007, p. 67.
20
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 6. ed. São Paulo: Noeses,
2013, p. 45.
determina relevantes consequências exegéticas, relativamente a
todo o sistema normativo21”.
O recurso, que foi julgado em sede de repercussão geral, foi interposto pelo
Estado do Rio Grande do Sul em face de acórdão do TJRS que declarou
inconstitucional o art. 18 da Lei Estadual do Rio Grande do Sul 8.821/198923
21
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 11ª edição. São
Paulo: Malheiros. 1998, p. 69.
22
STF, Recurso Extraordinário n. 562.045/RS, Min. Rel. Ricardo Lewandowswi, data de
julgamento 06/02/2013, publicação no DJe em 26/11/2013.
23
Art. 18. No Imposto sobre a Transmissão 'Causa Mortis ' a alíquota é definida com base no
resultado da soma do valor venal da totalidade dos bens imóveis, móveis, títulos e créditos,
bem como dos direitos a eles relativos, do patrimônio inventariado, estabelecendo-se: I -
isenção, se os valores supra referidos não excedem 2.000 Unidades de Padrão Fiscal; II - em
um por cento, se os valores referidos no 'caput' deste artigo estiverem entre 2001 e 4000
Unidades de Padrão Fiscal; III - em dois por cento, se os valores referidos no 'caput' deste
artigo estiverem entre 4001 e 6000 Unidades de Padrão Fiscal; IV - em três por cento, se os
valores referidos no 'caput' deste artigo estiverem entre 6001 e 9000 Unidades de Padrão
Fiscal; V - em quatro por cento, se os valores referidos no 'caput' deste artigo estiverem entre
9001 e 12000 Unidades de Padrão Fiscal; VI - em cinco por cento, se os valores referidos no
'caput' deste artigo estiverem entre 12001 e 20000 Unidades de Padrão Fiscal; VII - em seis
por cento, se os valores referidos no 'caput' deste artigo estiverem entre 20001 e 30000
Unidades de Padrão Fiscal; VIII - em sete por cento, se os valores referidos no 'caput' deste
artigo estiverem entre 30001 e 50000 Unidades de Padrão Fiscal; IX - em oito por cento, se os
valores referidos no 'caput' deste artigo estiverem acima de 50001 Unidades de Padrão Fiscal.
que previa a progressividade da alíquota entre 1 e 8% de acordo com o valor
do acervo patrimonial deixado pelo de cujus.
O voto divergente foi seguido pelo Min. Menezes Direito, que argumentou que
a Constituição permite a progressividade das alíquotas, sempre que possível,
como manifestação do Princípio da Capacidade Contributiva:
“Será inconstitucional uma lei estadual que dispõe sobre a sua
carga tributária e entende possível essa progressividade,
agasalhada essa progressividade na disciplina da Constituição,
que comanda explicitamente, sim, que sempre que possível os
impostos sejam de natureza progressiva? A minha resposta é que
não, que não há nenhum óbice constitucional a que lei estadual
assim disponha, porque não existe incompossibilidade entre a
disciplina constitucional que comanda a possibilidade e, portanto,
recomenda essa possibilidade de o imposto ser progressivo e a
natureza deste imposto que é objeto do recurso sob julgamento.”
Interessante, ainda, foi o voto da Min. Ellen Gracie que entendeu que a
classificação dos impostos em reais e pessoais é apenas genérica, não
impedindo que os impostos reais sejam pessoalizados e os impostos pessoais
realizados, utilizando-se de um exemplo:
Isso se justifica porque o trecho “sempre que possível”, assim como leciona
Regina Helena Costa “quer significar sempre que a estrutura material da
hipótese de incidência tributária o comporte25”.
24
STF, Agravo em Recurso Extraordinário n. 22866/SC, Min. Rel. Sepúlveda Pertence,
julgamento em 24/08/1999, DATA DE PUBLICAÇÃO DJ 24/09/99 - ATA Nº 28/1999.
Não se trata, portanto, de mera “discrição do legislador infraconstitucional a
observância ou não do princípio26”, mas, sim, de uma verdadeira
obrigatoriedade, assim como ensina a mesma professora:
Roque Antônio Carrazza, por sua vez, afirma que todos os impostos devem ser
progressivos, exceto o Imposto sobre Circulação de Bens e Serviços (ICMS) e
o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), uma vez que são indiretos 29 e,
portanto, sua estrutura material não permite:
25
COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva, 2ª edição. São Paulo:
Editora Malheiro. 1996, p. 88.
26
Idem, 93.
27
Idem, 94.
28
Idem, 53.
29
“Um imposto direto é aquele cobrado exatamente das pessoas que se tenciona ou se deseja
que o paguem. Impostos indiretos são aqueles que são cobrados de uma pessoa, na
expectativa ou com a intenção de que esta se indenize à custa de outra, tal como o imposto de
consumo ou as taxas alfandegárias” (MILL, John Stuart. Princípios de Economia Política.
Com Algumas de suas Aplicações à Filosofia Social. Tradução de Luiz João Baraúna. São
Paulo: Nova Cultural, 1996, v. 2, p. 395.)
ser progressivos, para que possam ter caráter pessoal e ser
graduados segundo a capacidade econômica dos contribuintes30.”
Isso porque ambos os impostos são muito similares, já que são reais, diretos,
possuem base de cálculo parecida (patrimônio) e o mesmo fato gerador
(transmissão). A diferença é que o ITCDM incide em transmissão a título
gratuito e causa mortis, enquanto que o ITBI incide sobre transmissões
onerosas de patrimônio.
30
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 11ª edição. São
Paulo: Malheiros. 1998, p. 65.
31
Idem, p. 67.
“É essencial que seja mencionado o fato de que atualmente não é
considerada uma vedação implícita a possibilidade de as
alíquotas serem progressivas não constar expressamente no texto
constitucional. A progressividade do IPTU, por exemplo, também
não encontrava previsão na CRFB e foi introduzida pela Emenda
Constitucional nº 29/200012, ao passo que as alíquotas
progressivas do ICTMD não são estabelecidas pela CRFB, mas
são aceitas pelo STF.
32
ROSENBLATT, Paulo; PEREIRA, Juliana Studart. Alíquotas progressivas no imposto sobre a
transmissão de bens imóveis: proposta de superação da súmula 656 do Supremo Tribunal
Federal. Revista de Informação Legislativa: RIL, v. 54, n. 215, p. 195-212, jul./set. 2017.
Disponível em: <http://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/54/215/ril_v54_n215_p195
33
Idem.
“Não se pode querer inferir que a capacidade contributiva de
alguém que adquire um imóvel pelo valor de dois milhões de
reais, por exemplo, seja a mesma de alguém que adquire um
imóvel de cinquenta mil reais. Ao aplicar a mesma alíquota sobre
operações que demonstram capacidades contributivas tão
discrepantes, o princípio da igualdade é ofendido e, ainda, pode-
se onerar exageradamente o de menor capacidade contributiva,
configurando-se numa hipótese de regressividade direta.
Independentemente de se tratar de impostos reais ou pessoais,
diretos ou indiretos, a progressividade fiscal é um importante
instrumento para a concretização deste princípio34.”
Sendo assim, pelo que se pode ver, a Súmula 656 do STF está muito
provavelmente superada, ante a jurisprudência recente quanto à
progressividade de alíquotas em impostos reais, o que atende ao Princípio da
Capacidade Contributiva. Contudo, ainda não é possível se ter certeza quanto
ao afastamento da súmula, uma vez que o STF ainda não se pronunciou sobre
o assunto, tampouco a cancelou.
6. CONCLUSÃO
34
CAMPOS, Hélio Sílvio Ourém; VAN DRUNEN, Albert August Walter. Concretização do
Princípio da Capacidade Contributiva no ITBI. Revista Jurídica da Presidência. V.17, n. 113,
jun/2016. Disponível em : < https://doi.org/10.20499/2236-3645.RJP2016v17e113-1171
A partir dessa ideia, O Supremo Tribunal Federal, após decidir reiteradas vezes
no mesmo sentido editou a Súmula 656, que prescreve que “é inconstitucional
a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão iter
vivos de bens imóveis”.
Os fundamentos que alicerçaram a sumula foi de que (a) os impostos reais não
levam em consideração os aspectos pessoais dos contribuintes e, portanto,
não comportam a progressividade de alíquotas e; (b) apenas é possível
estabelecer a progressividade de alíquotas, nos impostos reais, quando houver
previsão expressa da Constituição Federal.
Isso porque ambos os impostos são muito similares, já que são reais, diretos,
possuem base de cálculo parecida (patrimônio) e o mesmo fato gerador
(transmissão). A diferença é que o ITCDM incide em transmissão a título
gratuito e causa mortis, enquanto que o ITBI incide sobre transmissões
onerosas de patrimônio.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 6. ed. São Paulo:
Noeses, 2013, p. 45.
VICENTINO, Cláudio. História Geral. 11ª edição. São Paulo: Editora Scipione.
2012.