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NOÇÕES DE DIREITO

TRIBUTÁRIO E CÓDIGO DE
PROCESSO TRIBUTÁRIO
AULA 3

Prof.ª Fernanda Adams


CONVERSA INICIAL

A todos os entes políticos é assegurado a competência para instituir


tributos. Contudo, tal competência não é irrestrita. Ao contrário, há no
ordenamento jurídico brasileiro a previsão de uma sistemática que molda o
exercício da competência tributária.
Assim, para compreendermos como é exercido o poder tributar, é
necessário compreender quais são suas limitações e quais valores atuam,
direcionando a atuação do fisco.
Para tanto, nesta abordagem analisaremos hipóteses em que não ocorre
a tributação, seja por determinação constitucional, no caso das imunidades, ou
ainda, por mera faculdade do ente tributante, como é o caso das isenções.
Analisaremos os princípios tributários, que consistem nesses valores que
irão determinar e direcionar toda a relação jurídica tributária, para ao final,
compreendermos o que é a segurança jurídica tributária, elemento essencial
para manutenção de moralidade e legitimidade da tributação.

TEMA 1 – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA

Como vimos anteriormente, a competência tributária é uma autorização,


dada pela Constituição Federal, para as pessoas políticas criarem tributos.
Nesse contexto, as imunidades tributárias contribuem para a definição desta
competência, traçando o seu perfil.
De acordo com Roque Antonio Carrazza (2006, p. 485), imunidade
tributária consiste em:

“normas constitucionais que, direta ou indiretamente, tratam do


assunto fixam, por assim dizer, a incompetência das entidades
tributantes para onerar, com exações, certas pessoas, seja em função
de sua natureza jurídica, seja porque coligadas a determinados fatos,
bens ou situações”

As imunidades decorrem de normas constitucionais, e surgem não só


para delinear a competência tributária, mas, também para preservar preceitos
constitucionais.
No texto constitucional encontramos duas formas de imunidade, as
genéricas (alcançam todos ou inúmeros impostos) e as específicas (dizem
respeito apenas a um único imposto).

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As imunidades genéricas são encontradas no art. 150, VI, da Constituição
Federal: são a imunidade recíproca, a imunidade dos templos de qualquer culto,
a imunidade dos partidos políticos e das instituições educacionais ou
assistenciais e a imunidade dos livros, periódicos e do papel destinado à sua
impressão.
A imunidade recíproca, prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal,
decorre diretamente do princípio da isonomia e do princípio federativo, e veda
aos entes políticos exercitarem suas competências sobre o patrimônio, a renda
e os serviços uns dos outros, sendo aplicado extensivamente às autarquias.
Já a imunidade dos templos de qualquer culto é uma reafirmação do
princípio da liberdade de crença e da prática religiosa, estabelecidos no art. 5º,
VI e VIII, da Constituição Federal, e, surge para que nenhum obstáculo seja
criado para impedir ou dificultar os direitos de todos os cidadãos, inclusive a
incidência de impostos.
Estabelecida no art. 150, VI, c, da Constituição Federal, está a imunidade
que veda ao poder público atingir por meio de imposto o patrimônio, a renda e
os serviços dos partidos políticos e instituições educacionais ou assistenciais,
desde que observados os requisitos da lei. Isto ocorre porque os partidos
políticos e as entidades educacionais e assistências são de extrema importância
para sociedade, desenvolvendo inclusive, atividades que seriam, a princípio,
obrigação do Estado desempenhar.
E por fim, há a imunidade dos livros, periódicos e do papel destinado à
sua impressão, estabelecida no art. 150, VI, d, da Constituição Federal, que visa
garantir a liberdade de comunicação e de pensamento, ao mesmo tempo em que
propaga a cultura e educação para toda a sociedade.
Além dessas hipóteses de imunidade, o texto constitucional estabelece
outros casos em que o legislador ordinário é incompetente para atribuir impostos
a pessoas, coisas ou estados de coisas; são as chamadas imunidades
genéricas.

TEMA 2 – ISENÇÕES TRIBUTÁRIAS

Muitos traçam paralelos entre imunidades e isenções, justificando tal


paralelismo ao fato de ambos serem hipóteses em que inexiste o dever
prestacional tributário.

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Contudo, não se pode confundir tais conceitos, pois as imunidades, como
já demonstrado, são normas constitucionais que colaboram para o desenho da
competência tributária, atuando em um momento anterior à incidência da norma
tributária. Já as isenções decorrem de legislação infraconstitucional e atuam no
momento de incidência da norma tributária, reduzindo o campo de abrangência
dos critérios da hipótese de incidência ou do consequente tributário, da regra-
matriz de incidência do tributo.
Tratam-se, portanto, de institutos distintos.
De acordo com Harada (2017, p. 568):

“isenção é causa excludente do crédito tributário. A obrigação tributária


que surge com a ocorrência do fato gerador se estanca atingida em
seus efeitos. No dizer de Ruy Barbosa Nogueira “isenção é a dispensa
do tributo devido, feita por expressa disposição de lei”. É o
posicionamento adotado pelo STF [Supremo Tribunal Federal].
Entretanto, a doutrina moderna considera a isenção como uma
hipótese de não incidência legalmente qualificada, pelo que ocorre a
exclusão do fato gerador”.

De forma sintética, a isenção é a não ocorrência da tributação. De acordo


com o art. 175, inciso I, do Código Tributário Nacional, a isenção consiste em
uma forma de exclusão do crédito tributário, juntamente com o instituto da
anistia.
Para que a concessão da isenção ocorra, é necessário que o poder
tributante observa os requisitos previstos no artigo 150, parágrafo 6º da
Constituição Federal, bem como o artigo 176, do Código Tributário Nacional, que
assim estabelecem:

Art. 150 (...) § 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de


cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos
a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante
lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule
exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente
tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII,
g. (Brasil, 1988)

Art. 176. A isenção, ainda quando prevista em contrato, é sempre


decorrente de lei que especifique as condições e requisitos exigidos
para a sua concessão, os tributos a que se aplica e, sendo caso, o
prazo de sua duração (Brasil, 1966)

Como se pode observar, a concessão de isenção demanda atuação pelo


ente competente e ela pode ser de caráter geral ou em individual (nos termos do
artigo 176 e 179, do Código Tributário Nacional).

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TEMA 3 - CONCEITO DE PRINCÍPIO

Como se pode observar, o legislador constituinte não só atribuiu


competência tributária aos entes políticos, mas também cuidou de delimitá-la,
traçando os seus contornos a partir das imunidades.
No entanto, as imunidades não são os únicos aspectos que o legislador
infraconstitucional tem que se ater para instituir um tributo.
A Constituição Federal, como Lei Máxima, é o fundamento último de
existência e validade das demais normas do ordenamento jurídico,
condicionando o agir não só do poder público, mas de toda a sociedade.
Compondo o texto constitucional, há normas que veiculam apenas regras
de conduta, enquanto, outras veiculam diretrizes para todo o ordenamento
jurídico. Estas são denominadas princípios, e são encontradas no transcorrer de
todo o texto constitucional, explicita e implicitamente.
Celso Antônio Bandeira de Mello (1994, p. 183) assim define princípios:

Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele,


disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas
compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata
compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a
racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe
dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a
intelecção das diferentes partes componentes de todo unitário que há
pó nome sistema jurídico positivo.

Do exposto, pode se concluir que princípios são orientações a atuação


das demais normas, de modo que tanto as leis quanto atos normativos devem
se submeter a estes preceitos constitucionais.

TEMA 4 – PRINCÍPIOS DO DIREITO TRIBUTÁRIO

Na Constituição Federal, são contemplados inúmeros princípios gerais,


válidos e aplicados em todo o ordenamento jurídico. No entanto, iremos apenas
tratar dos princípios que refletem no direito tributário, são eles princípio da
legalidade, da irretroatividade, anterioridade, igualdade, capacidade contributiva,
seletividade e não cumulatividade, que passamos a analisar
pormenorizadamente.

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4.1 Princípio da legalidade

O princípio da legalidade, expresso no art. 5º, II, da Constituição Federal,


possui um papel de extrema importância no nosso ordenamento jurídico,
projetando-se por todos os ramos do direito. A partir dele, ninguém será obrigado
a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude da lei.
Tal princípio varia conforme o seu destinatário - particulares ou
administração pública. No caso dos particulares, estes somente serão obrigados
a fazer o que estiver previsto em lei, não lhes sendo vedada a prática de atos
não previstos. Já a administração pública só pode realizar o que está previsto
em lei, sendo vetado fazer tudo o que não está.
No âmbito tributário, o princípio da legalidade é encontrado no art. 150, I,
da Constituição Federal, e é denominado princípio da legalidade tributária, ou
ainda, princípio da reserva legal.
Tal princípio assegura que o patrimônio dos contribuintes só pode ser
atingido nos casos e modos previstos em lei.
Com efeito, o tributo só pode ser criado por lei, que deve conter todos os
elementos da regra-matriz de incidência (hipótese de incidência e consequente
tributário). Além disso, só a lei pode criar deveres instrumentais tributários,
regular a forma e época de pagamento dos tributos, bem como, definir as formas
de lançamento e os órgãos e repartições competentes para fazê-lo, cobrá-lo e
fiscalizar o seu pagamento.
O princípio da legalidade abrange todos os tributos, não só impostos, mas
também taxas e contribuições de melhoria.
No sistema tributário brasileiro, a lei é de extrema importância. Só ela
pode disciplinar as questões referentes à criação e extinção de tributo, assim
como o aumento e a diminuição de sua alíquota, alcançando inclusive os atos
administrativos.
Dessa forma, todos os elementos essenciais do tributo, que influenciem
no momento e no quantum da obrigação tributária, devem constar em lei, para
que se considere aplicado o princípio da legalidade.
Não obstante, a rigidez da Constituição Federal e da aplicação do
princípio da legalidade, está prevista no texto constitucional, para algumas
situações excepcionais, a atenuação deste princípio em virtude da urgência e
relevância que estas exceções demandam. As exceções consistem no

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empréstimo compulsório, instituído em caso de guerra e calamidade pública, e,
na faculdade que tem o poder executivo de alterar, dentro de determinados
limites, as alíquotas dos impostos de importação e exportação, IPI e IOF.

4.2 Princípio da irretroatividade

Já quando se fala na vigência de qualquer dispositivo legal, o art. 5º,


XXXVI, da Constituição Federal estabelece que as leis não podem retroagir,
alcançando o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada,
consagrando, assim, o princípio da irretroatividade.
O princípio da irretroatividade estabelece que uma norma, quando
instituída, deve regular fatos futuros, garantindo assim a segurança jurídica.
Qualquer lesão a este princípio, segundo Paulo de Barros Carvalho,
“representará, ao mesmo tempo, uma investida à estabilidade dos súditos e um
ataque direto ao bem da certeza do direito” (2009, p. 168).
Apesar de desnecessário, haja vista que o preceito do art. 5º é estendido
a todo o ordenamento jurídico, o legislador constituinte, quando tratou da matéria
tributária, institui no art. 150, III, da Constituição Federal, o princípio da
irretroatividade tributária. Tal princípio estabelece a irretroatividade da norma
tributária, proibindo que a lei nova alcance fatos geradores passados.
Isto ocorre para que o contribuinte não seja surpreendido com o aumento
ou a instituição de carga tributária. Um tributo criado ou majorado precisa
respeitar as regras do princípio da anterioridade, que veremos a seguir.
O princípio da irretroatividade, como toda regra, comporta exceções
estabelecidas no texto constitucional, são elas: os impostos extraordinários de
guerra, os empréstimos compulsórios por motivo de guerra ou em razão de
calamidade pública, em decorrência da urgência da situação e da exigência de
recursos imediatos, e, a concessão para alterar alíquotas, respeitando os limites
impostos pela lei, do imposto de importação e exportação, imposto sobre
produtos industrializados, imposto sobre operações de crédito, câmbio, seguros,
títulos e valores mobiliários, pelo poder executivo.
Ademais, não é vedado a retroatividade de normas que beneficiem os
seus destinatários, ou seja, que reduzam ou dispensem a exigibilidade do tributo.

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4.3 Princípio da anterioridade

Além da irretroatividade, também está previsto no texto constitucional o


princípio da anterioridade, que se divide em geral e nonagesimal.
Objetivando implementar o princípio da segurança jurídica, de modo que
o contribuinte não seja surpreendido com a exigência inesperada de um tributo,
a Constituição Federal, em seu art. 150, III, b, estabelece a anterioridade geral.
Segundo o princípio da anterioridade, a vigência da lei, que estabelece o
aumento de um tributo ou revogação de isenções, fica protraída para o ano
seguinte ao de sua publicação, ano este que, segundo Paulo de Barros Carvalho,
é “o momento em que o ato se insere no contexto comunicacional do direito”.
(2009, p. 175).
Excetuam-se dessa regra os casos descritos no art. 150, parágrafo 1º, da
Constituição Federal e os empréstimos compulsórios. Além disso, as
contribuições destinadas ao financiamento da seguridade social também não se
sujeitam ao princípio da anterioridade geral.
No entanto, muitas vezes o princípio da anterioridade geral não é
suficiente para garantir o direito dos contribuintes e a segurança jurídica. Em
decorrência disso, foi instituído, por intermédio da Emenda Constitucional nº 42,
de 19 de dezembro de 2003, a anterioridade nonagesimal, estabelecida na
alínea c, do art. 150, III, da Constituição1.
A anterioridade nonagesimal veda a cobrança de tributos antes de
decorridos noventa dias da data em que foi publicada a lei que os instituiu ou
aumentou, observado o disposto na alínea b.
Diante do exposto, conclui-se que, um tributo recém-instituído ou
aumentado é exigível apenas no exercício financeiro seguinte e depois de
decorridos noventa dias de seu aumento ou instituição. Ficam excepcionados da
regra de anterioridade nonagesimal os impostos previstos no art. 153, I, II, III e
V, da Constituição Federal, os impostos extraordinários, os empréstimos
compulsórios nos casos previstos no art. 148, I, da Carta Magna, assim como, a
fixação de bases de cálculo dos impostos incidentes sobre a propriedade de
veículos automotores e sobre a propriedade predial e territorial urbana.

1“Art.
150: Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios [...] III - cobrar tributos [...] c) antes de decorridos
noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado
o disposto na alínea b.” (Brasil, 1988)
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4.4 Princípio da igualdade

O princípio da igualdade está consagrado no art. 5º, caput, da


Constituição Federal (Brasil, 1988), que estabelece: “todos são iguais perante a
lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade”.
O destinatário deste princípio é o legislador infraconstitucional, os órgãos
da atividade legislativa e todos aqueles que expedirem normas dotadas de
juridicidade.
Tal princípio se desdobra no campo da tributação, no princípio da
isonomia tributária, disposto no art. 150, II, da Constituição Federal, que assim
estabelece:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao


contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios: [...] II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que
se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em
razão de ocupação profissional ou função por eles exercida,
independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos
ou direitos.” (Brasil, 1988)

Sob uma perspectiva material, concreta, tal artigo é, até certo ponto vago,
pois, nenhum indivíduo está na mesma situação que outro, cada um tem a sua
peculiaridade, levando a uma análise muitas vezes equivocada do princípio da
isonomia tributária.
Para que a norma seja considerada isonômica, ela não pode singularizar
o destinatário da norma, ou seja, diferenciar o regime para um determinado
indivíduo ou grupo. A norma precisa ser genérica, e todo aquele que se
enquadrar em seus requisitos genéricos será destinatário, além disso, precisa
identificar o fator discriminador (responsáveis pela ruptura da ordem isonômica),
fator este que deve atender aos valores constitucionais e guardar pertinência
lógica entre o critério de diferenciação e a disparidade do regime tributário.
Em decorrência disso, admite-se o tratamento desigual de contribuintes,
desde que, a norma prescreva e o justifique. O contribuinte que está em situação
diferente pode pedir a subsunção em um regime tributário diferenciado,
respeitando principalmente a sua capacidade contributiva.

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4.5 Princípio da capacidade contributiva

Em decorrência do tratamento diferenciado dos contribuintes, o princípio


da isonomia desdobra-se em princípio da capacidade contributiva, previsto no
art. 145, parágrafo 1º, da Constituição Federal, que assim estabelece:

“Art. 145: [...] § 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter


pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do
contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para
conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os
direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e
as atividades econômicas do contribuinte”. (Brasil, 1988)

Dentro do ordenamento jurídico tal princípio é uma sistemática de


tributação, que garante ao indivíduo, destinatário da norma tributária, não sofrer
uma retirada exacerbada de parcela de seu patrimônio, sua riqueza. A tributação
não pode ser tão onerosa a ponto de acabar com a riqueza que iniciou a
obrigação tributária.
O princípio da capacidade contributiva surge como uma determinação de
um nível ideal de tributação, que possibilita ao Estado desenvolver a sua
atividade, sem exaurir dos contribuintes recursos além dos devidos.
Nesse contexto, cabe diferenciar capacidade econômica e capacidade
contributiva. Esta é toda aquela riqueza que excede o mínimo vital (fundamental
para a existência digna), já capacidade econômica é qualquer espécie de
exteriorização de riqueza.
Sem dúvida este preceito constitucional é uma aplicação direta do
princípio da igualdade, e de todos os demais princípios que se relacionam com
ele. Ele surge no ordenamento jurídico para garantir e respeitar o direito de todos
os contribuintes, atendendo as peculiaridades de cada um, impedindo que os
tributos sejam utilizados de modo confiscatório e criando um modelo de sistema
tributário mais justo.

4.6 Princípio da seletividade e princípio da não cumulatividade

Destarte, a capacidade contributiva, além de ser um princípio por si só,


vem sendo complementada por outros princípios contemplados no texto
constitucional, como é o caso do princípio da seletividade e o princípio da não-
cumulatividade.

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O princípio da seletividade consiste no estabelecimento de alíquotas na
razão inversa a necessidade dos produtos. Além do ICMS, o IPI, por força do
disposto no art. 153, parágrafo 3º, IV, também será seletivo.
Note que há uma preocupação do legislador em preservar a capacidade
contributiva ao onerar produtos tidos como essenciais de uma forma diversa
daqueles tido como dispensáveis.
José Roberto Vieira, tomando como exemplo o IPI, assim ilustra tal
situação:

Quando mais imprescindíveis os produtos para satisfazer as


necessidades básicas da população, e, portanto, quanto mais
essenciais, tanto menores deverão ser suas alíquotas do IPI,
assegurando-lhes um tratamento brando e suave; e quanto menos
indispensáveis os produtos, raiando pela esfera da superfluidade, e,
portanto, quanto menos essenciais tanto maiores deverão ser suas
alíquotas do IPI. (Vieira, 1993, p. 127)

Portanto, as operações relacionadas aos produtos, em que se aplicam


alíquotas diferenciadas, sofrerão uma incidência de diferentes graus de
intensidade tributária. Tal situação além de influenciar diretamente na conduta
dos contribuintes cumprirá um desígnio constitucional, preservando a
capacidade contributiva.
O princípio da não-cumulatividade está consagrado no art. 155, parágrafo
2º, I, da Constituição Federal, que determina que o ICMS “será não-cumulativo,
compensando o que for devido em cada operação relativa à circulação de
mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores
pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”. (Brasil, 1988)
A partir de tal dispositivo podemos facilmente concluir que há uma
cumulatividade no ICMS vedada pelo texto constitucional, que é obstada pela
previsão de um sistema de compensação.
Tal comando confere ao sujeito passivo do ICMS o direito de deduzir em
cada operação os valores apurados nas operações passadas. Isto significa dizer
que surge, no momento de incidência do ICMS, um direito de crédito para os
contribuintes contra os Estados e o Distrito Federal.
Cabe ressaltar que, por intermédio do princípio da não-cumulatividade,
não só os contribuintes de direito do ICMS, como também os de fato, se
beneficiaram, uma vez que o consumir final passou a ter acesso a preços mais
reduzidos ou menos onerados pela carga de tributos.

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Portanto, nota-se que tal princípio tutela de uma forma mais ampla todo o
interesse econômico nacional, o que só destaca a sua relevância para todo o
ordenamento jurídico.

TEMA 5 – SEGURANÇA JURÍDICA E TRIBUTAÇÃO

Verifica-se, do exposto, que o sistema tributário nacional é composto de


uma série de vertentes axiológicas que irão direcionar e pautar a atuação do
Fisco, sempre preservando o contribuinte e a finalidade da tributação.
No Estado Democrático de Direito que vivenciamos, o tributo só existe
porque é interesse da sociedade manter a sua existência. E a sociedade que
legitima a atuação.
Nesse contexto, todos esses valores expressos na sistemática da
tributação são de suma importância para garantir os direitos fundamentais de
todos os contribuintes.
Não é novidade que muitas vezes os entes políticos, visando aumentar a
arrecadação, acabam por deturpar diversos institutos previstos no direito
tributário. Nesses momentos, precisamos recorrer aos valores constitucionais
para garantir a correta e legitima tributação.
Sob esse prisma, a segurança jurídica é um dos pilares indispensáveis
para disciplinar a relação fisco e contribuinte, promovendo a estabilidade nas
relações tributárias.
A segurança jurídica irá permitir que o contribuinte se sinta seguro, dando
previsibilidade à tributação e a ação do fisco, de modo que, não seja
surpreendido com cobranças inesperadas.
De acordo com Humberto Ávila, tamanha é a importância da segurança
jurídica que ela consiste em:

[...] um instrumento de realização de outros fins: de um lado, dos


direitos fundamentais de liberdade e propriedade, porque sem
estabilidade e sem calculabilidade da atuação estatal, o indivíduo não
tem como exercer o direito de autodeterminação livre da sua vida
digna; de outro lado, das finalidades estatais, tendo em vista que o
exercício da ação e do planejamento estatal, a médio e longo prazos
(arts. 70 e ss.), pressupõe uma permanência das regras válidas. Essa
permanência, porém, não é em benefício do Estado, mas em benefício
do particular, que pode, de um lado, controlar a atividade estatal e, de
outro, planejar as suas atividades. Esse caráter instrumental é ainda
mais visível no âmbito do Direito Tributário, porquanto, no Sistema
Tributário Nacional, ancorado na CF/88, os princípios e as regras
relacionadas à segurança jurídica, instituídos como “garantias” e como

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“limitações ao poder de tributar”, assumem feição protetiva em favor do
contribuinte e não em favor do Estado. (Ávila, 2012, p. 271-272)

Na realidade, a segurança jurídica acaba por se configurar em um


princípio, trazendo valores para todo o ordenamento jurídico, inclusive para o
sistema tributário, trazendo confiança e previsibilidade às relações jurídicas.
Em matéria tributária, a segurança jurídica irá pautar a atuação dos entes
políticos desde a criação das normas, passando pela arrecadação até as
decisões administrativas e atos de fiscalização, focando principalmente na
defesa do contribuinte.
Por conta de tal fato, Heleno Taveira Torres (2005, p. 182) defende que

“definir o que seja “segurança jurídica em matéria tributária” exige,


como visto, um percurso constante em previsibilidade e garantias de
justiça por todo o percurso de positivação do direito, desde o exercício
legislativo até o último ato de aplicação por parte das autoridades
administrativas ou judiciais, na exigibilidade dos tributos.”

É dever de todos contribuirmos para o financiamento do Estado, contudo,


é garantido a todos os contribuintes uma tributação que não comprometa o seu
patrimônio. Assim, a segurança jurídica irá se consumar quando o texto
constitucional e todos os princípios são assegurados e respeitados, de modo a
serem interpretados em prol da sociedade e não de interesses particulares e
meramente políticos.

NA PRÁTICA

Não são raras as vezes que nos deparamos, na prática, com a


necessidade de conter os abusos do fisco. Nesses momentos, a utilização dos
princípios e principalmente, a preservação da segurança jurídica são essenciais.
Para demonstrar, na prática, trazemos a lume um julgado do Supremo
Tribunal Federal, no qual questionou-se a violação ao princípio da anterioridade
geral. Vejamos:

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA. LEI 4.454/2017 DO ESTADO DO


AMAZONAS. INSTITUIÇÃO DE ADICIONAL NAS ALÍQUOTAS DO
ICMS, DESTINADO À CRIAÇÃO DE FUNDO ESTADUAL DE
COMBATE À POBREZA (ART. 82 DO ADCT). PERDA PARCIAL DO
OBJETO. COBRANÇA DO TRIBUTO DENTRO DO MESMO
EXERCÍCIO FINANCEIRO NO QUAL FOI PUBLICADA A LEI QUE O
INSTITUIU. CARACTERIZAÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA
ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA (ART. 150, III, B, DA CF). 1. A
revogação expressa de alguns dos dispositivos da norma impugnada
enseja a perda parcial do objeto da ação. 2. O Princípio da
Anterioridade (art. 150, III, b, da CF), por configurar uma das maiores
garantias tributárias do cidadão em face do Estado/Fisco, é
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consagrado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL como cláusula
pétrea, nos termos do art. 60, § 4º, IV, da CF (ADI 939, Rel. Min.
SYDNEY SANCHES, DJ de 18/03/1994). Além de constituir garantia
individual, assegura a possibilidade de o contribuinte programar-se
contra a ingerência estatal em sua propriedade, preservando-se, pois,
a segurança jurídica. 3. A instituição do adicional de alíquota de ICMS,
facultada pelo art. 82, § 1º, do ADCT, não configura hipótese de
relativização do referido princípio. 4. Ação Direta julgada procedente,
na parte em que conhecida, para declarar a inconstitucionalidade
parcial, sem redução de texto, do artigo 5º da Lei 4.454/2017 do Estado
do Amazonas, restringindo-se a censura aos fatos geradores ocorridos
entre a data de vigência da norma (1º de julho de 2017) e 31 de
dezembro de 2017. (STF - ADI: 5733 AM, Relator: ALEXANDRE DE
MORAES, Data de Julgamento: 20/09/2019, Tribunal Pleno, Data de
Publicação: 03/10/2019)

Como visto, o Supremo Tribunal Federal aplicou o princípio da


anterioridade geral como uma garantia fundamental do contribuinte, que não
pode ser relativizada, sob pena de violar a segurança jurídica.
Nota-se, claramente, que o referido Tribunal aplicou uma interpretação do
princípio em prol do contribuinte, utilizando como pressuposto máximo, a
prevalência da segurança jurídica como instrumento contra ações irregulares do
poder tributante.

FINALIZANDO

Não obstante os entes tributantes possuírem o poder de instituir tributos,


esse poder não pode ser utilizado de forma irrestrita. Há no ordenamento jurídico
brasileiro a previsão de diversos institutos de buscam estabelecer hipóteses de
não incidência de tributos, como é o caso das imunidades, bem como situações
em que o ente político pode optar por não exercer seu poder de tributação – as
isenções.
Além disso, há todo um arcabouço de valores que constituem os princípios
tributários que direcionam a atuação do fisco, preservando garantias e direitos
individuais dos contribuintes.
Dentre tais diretrizes de valores, desponta como primordial a segurança
jurídica. Será ela que irá pautar a interpretação de todos os princípios tributários,
garantia estabilidade e confiança na relação fisco-contribuinte.

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REFERÊNCIAS

ÁVILA, H. Segurança jurídica: entre permanência, mudança e realização no


direito tributário. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2012.

MELLO, C. A. B. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1994.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília:


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<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm >. Acesso
em 28 fev. 2022.

______. Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966. Disponível em:


<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172Compilado.htm> Acesso em
28 fev. 2022.

______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º


5.177. Brasília: 2019.

CARRAZZA, R. A. Curso de Direito Constitucional Tributário. 22. ed. São


Paulo: Malheiros, 2006

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