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Considerações gerais
No ordenamento jurídico brasileiro é adotada a classificação tripartite
das funções estatais proposta por Montesquieu, em que o poder do Estado é
exercido pelo Legislativo, pelo Executivo e pelo Judiciário, de forma
independente e harmônica, a fim de que seja afastado o arbítrio que
decorreria de sua concentração. Trata-se do chamado sistema de freios e
contrapesos , consoante posicionamento adotado pelos norte-americanos
para ressaltar a necessidade de harmonia e equilíbrio entre os poderes.
O princípio da separação de poderes é previsto expressamente no art.
2º da Constituição Federal de 1988, que estabelece: “São Poderes da União,
independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário”. De acordo com o modelo adotado, o Poder Judiciário é o
responsável pela solução dos conflitos de interesses.
Poder Judiciário e princípio da inafastabilidade da jurisdição
A importância do Poder Judiciário é ressaltada principalmente pela
adoção no ordenamento jurídico pátrio do princípio da inafastabilidade da
jurisdição, de acordo com o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito” (art. 5º, XXXV, da CF). O princípio
não significa apenas que temos o direito de ingressar no Poder Judiciário
solicitando que aprecie uma suposta lesão ou ameaça a um direito, mas,
sobretudo, que tome providências que afastem a ofensa ou ameaça ao
direito que alegamos possuir caso a pretensão formulada seja acolhida.
Do princípio da inafastabilidade da jurisdição são extraídos quatro
entendimentos importantíssimos:
1º A jurisdição é monopólio do Estado .
A jurisdição é uma das funções que expressam a soberania do Estado.
É por isso que seu exercício é um monopólio do Estado. Todavia,
“Anteriormente ao período moderno havia jurisdição que não
dependia do Estado. Os senhores feudais tinham jurisdição dentro de
seu feudo: encontravam-se jurisdições feudais [senhores feudais] e
jurisdições baronais [barões]. Lembre-se que os donatários das
Capitanias Hereditárias no Brasil colonial dispunham da jurisdição
civil e criminal nos territórios de seu domínio. No período
monárquico brasileiro, tínhamos a jurisdição eclesiástica ,
especialmente em matéria de direito de família, a qual desapareceu
com a separação entre Igreja e Estado. Agora só existe jurisdição
estatal, confiada a certos funcionários, rodeados de certas garantias:
os magistrados” [659] .
Embora a jurisdição seja um monopólio do Estado, é possível a
utilização de outros mecanismos para a solução dos conflitos, como a
arbitragem e a mediação, que são meios alternativos de pacificação social.
2º A jurisdição está vinculada ao Poder Judiciário
O princípio da exclusividade da atividade jurisdicional foi acolhido
no Estado brasileiro. Este princípio está relacionado à Revolução Francesa,
através da qual foi atribuída ao povo a soberania, que é exercida pelo
Estado, a quem incumbe, através do Poder Judiciário, monopolizar a
administração da justiça [660] .
3º Há o direito de acionar o Estado para que exerça a jurisdição
A ação é um direito conferido às pessoas de movimentar o Estado
para que preste a tutela jurisdicional através do processo, afastando as
situações que envolvam lesão ou ameaça a direito.
4º O Estado está obrigado a prestar a tutela jurisdicional
A partir do momento em que o texto constitucional dispõe que
nenhuma alegação de existência de lesão ou de ameaça a um direito será
afastada da apreciação do Poder Judiciário, obriga-o a prestar a tutela
jurisdicional todas as vezes que for acionado.
Outro aspecto importante é que o princípio da inafastabilidade da
jurisdição também abrange em seu contexto formas adequadas de tutela
jurisdicional – ex.: medidas cautelares e antecipação de tutela, que se
enquadram como tutelas provisórias -, a fim de que a atuação estatal seja
efetiva e ocorra no menor tempo possível, uma vez que o princípio da
inafastabilidade não consagra o mero acesso ao Poder Judiciário, mas o uso
de meios adequados, eficazes e rápidos para a prestação da tutela
jurisdicional.
Atuação do Poder Judiciário
No exercício da função jurisdicional, o Poder Judiciário aplica de
forma independente as normas jurídicas, mesmo que o litígio envolva a
administração pública e seus diferentes órgãos, já que a República
Federativa do Brasil é um Estado Democrático de Direito (art. 1º da CF), o
que determina que acima dos interesses dos poderes e de seus exercentes
coloca-se o império do Direito.
Em particular, costuma-se ressaltar a defesa da liberdade e a proteção
dos direitos humanos como as mais importantes funções do Poder
Judiciário [661] . No entanto, são extremamente importantes também as
funções de defesa da ordem jurídica e a solução dos conflitos através da
imposição das normas jurídicas às demandas que lhe são submetidas.
A unidade do Poder Judiciário
Ao indicar quais são os órgãos do Poder Judiciário, ou órgãos da
jurisdição, a Constituição Federal inclui também os Tribunais e juízes dos
Estados, trabalhando, assim, com a ideia de unidade do Poder Judiciário.
Dessa forma, embora tenhamos a justiça federal e a estadual, há um único
Poder Judiciário brasileiro, visto que a jurisdição se liga à soberania, que,
sendo única, faz com que o mesmo ocorra com a atividade jurisdicional.
De acordo com o art. 22, I, da Constituição Federal, compete
privativamente à União legislar sobre direito processual, o que faz com que
tenhamos uma única lei processual, ao lado de uma única jurisdição (una
lex, una jurisdictio ). Dito de outra forma, em primeiro lugar há a unidade
funcional do Poder Judiciário, pois embora existam vários órgãos judiciais,
todos integram um mesmo Poder Judiciário. Além disso, será necessária a
unificação da interpretação conferida às normas jurídicas, tarefa que ficará a
cargo dos tribunais superiores, uma vez que o direito processual aplicado
em todo o território nacional é o mesmo.
Por fim, o Poder Judiciário, por estar ligado à soberania do Estado,
fica vinculado ao princípio da aderência ao território , no que se refere ao
espaço físico de exercício da jurisdição, o que faz com que aprecie, a
princípio, somente os conflitos que ocorrem no território nacional.
Funções do Poder Judiciário e função jurisdicional
O Poder Judiciário tem como função principal a solução dos conflitos
de interesse (atividade cognitiva) e a satisfação dos direitos (atividade
executiva). Pode ainda desempenhar uma atividade protetiva ou cautelar.
Todavia, ao lado dessas funções, tidas como principais, específicas ou
típicas, existem as atípicas, pois não é absoluta a separação de poderes. É
por isso que o Poder Judiciário também exerce funções próprias do Poder
Executivo – ex.: organização dos seus serviços – e do Poder Legislativo –
ex.: elaboração dos regimentos internos dos tribunais. Esta situação ocorre
para evitar que um poder interfira em outro, afastando sua independência.
No Brasil existem tribunais administrativos que não afastam o
controle posterior por parte do Poder Judiciário. Como exemplo do exposto,
há no Estado de São Paulo o Tribunal de Impostos e Taxas (TIT), que julga
os recursos interpostos contra as exações tributárias, permitindo ao
contribuinte contestá-las, administrativamente, mediante a exposição do seu
inconformismo. Ex.: a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo afirma
que determinado posto de gasolina não está emitindo nota fiscal. Sendo
assim, verifica o montante do imposto que não foi recolhido e efetua o
lançamento do imposto devido, assim como das multas aplicáveis ao caso
concreto (art. 202 do CTN). Caso queira contestar a imposição fiscal, a
empresa poderá recorrer na esfera administrativa. Entretanto, se não
conseguir sucesso administrativamente a empresa poderá ainda se socorrer
do Poder Judiciário.
Órgãos judiciais
Nos termos do art. 92 da Constituição Federal de 1988, são os
seguintes os órgãos que integram o Poder Judiciário:
“I – o Supremo Tribunal Federal; I-A – o Conselho Nacional de
Justiça; II – O Superior Tribunal de Justiça; III – os Tribunais
Regionais Federais e Juízes Federais; IV – os Tribunais e Juízes do
Trabalho; V – os Tribunais e Juízes Eleitorais; VI – os Tribunais e
Juízes Militares; VII – os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito
Federal e Territórios”.
O artigo transcrito consagra o princípio da legalidade dos órgãos
jurisdicionais, de acordo com o qual somente integram o Poder Judiciário
os órgãos arrolados pela Constituição Federal. “Assim, se qualquer outro
órgão com atribuições judicantes não estiver enquadrado em nenhum dos
incisos mencionados, tenha a nomenclatura que tiver, não será integrante do
Poder Judiciário” [662] .
A independência do Poder Judiciário e suas garantias
Ao Judiciário devem ser asseguradas garantias para que seja
resguardada a sua independência e a imparcialidade de seus membros, pois,
caso contrário, não conseguiria exercer de maneira adequada as atribuições
que lhe foram conferidas. Para tanto, o sistema constitucional brasileiro
prevê duas ordens de garantias: a) as primeiras servem para proteger o
Poder Judiciário dos demais poderes e mesmo dos particulares; b) as
segundas ligam-se aos exercentes das funções jurisdicionais, especialmente
aos magistrados, que não podem sofrer pressões dos órgãos do próprio
Poder Judiciário.
As garantias oferecidas ao Poder Judiciário e a seus membros, assim
como à sociedade,
“correspondem à denominada independência política do Poder e de
seus órgãos, a qual se manifesta no autogoverno da Magistratura, nas
garantias da vitaliciedade, da inamovibilidade e irredutibilidade de
subsídios e na vedação do exercício de determinadas atividades, que
garantem às partes a imparcialidade do juiz” [663] .
Há ainda a independência jurídica dos juízes, que lhes confere
liberdade para julgar, pois estão limitados apenas ao ordenamento jurídico,
embora o sistema processual, por exigência constitucional, estabeleça que
devam indicar na decisão os fatores que serviram como base para a
formação do seu convencimento.
“STAMMLER traçou os seguintes corolários [consequências] do princípio da
independência jurídica do magistrado: a) o juiz deve submeter-se apenas à sua própria
convicção; b) nas dúvidas e incertezas sobre a interpretação de uma lei, o juiz não se
submete ao critério de outros, mas ao seu próprio, estando, pois, abolido o jus respondendi
[solicitar a outro juiz que responda suas dúvidas a respeito de determinado conflito]; c)
nenhum juiz está obrigado a aceitar as decisões de outros juízes e tribunais, como norma de
[664]
decidir, quando contrárias à sua convicção” .
É significativo notar, no entanto, que a Emenda Constitucional nº 3,
de 17 de março de 1993, que instituiu a Ação Declaratória de
Constitucionalidade, acrescentou um § 2º ao art. 102 da Constituição
Federal, estabelecendo que:
"as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal
Federal, nas ações declaratórias de constitucionalidade de lei ou ato
normativo federal, produzirão eficácia contra todos e efeito
vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e ao
Poder Executivo".
Posteriormente, em 8 de dezembro de 2004, por meio da Emenda
Constitucional nº 45, o art. 102, § 2º, da Constituição Federal foi alterado
para constar que:
“As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal
Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações
declaratórias de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou
estadual, produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante,
relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à
administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e
municipal”.
Da mesma forma, o art. 10, § 3º, da Lei nº 9.882, de 03 de dezembro
de 1999, que trata do processo e julgamento da arguição de
descumprimento de preceito fundamental, estabeleceu em seu texto que a
decisão que for proferida terá eficácia erga omnes e efeito vinculante em
relação aos demais órgãos do Poder Público.
Outra importante limitação à independência jurídica dos juízes
relaciona-se à existência das súmulas vinculantes. Realmente, nas hipóteses
em que as súmulas – entendimento uniforme firmado pelos tribunais a
respeito de determinadas matérias – são vinculantes, incumbe aos
integrantes do Poder Judiciário unicamente segui-las.
A propósito, prevê o art. 103-A da Constituição Federal que:
“O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação,
mediante decisão de dois terços de seus membros, após reiteradas
decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de
sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação
aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública
direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como
proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em
lei”.
É por força do exposto que foi previsto no art. 103-A, § 3º, que da
decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que, indevidamente a
aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a
procedente, cassará a decisão judicial reclamada e determinará que outra
seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso.
As súmulas vinculantes foram disciplinadas pela Lei nº 11.417, de 19 de dezembro de
2006, que, regulamentando o art. 103-A da Constituição Federal, trata da edição, revisão e
cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal.
Na verdade, cada vez mais o legislador cria mecanismos de
vinculação para os juízes, sendo exemplo do exposto o art. 927 do Código
de Processo Civil, que dispõe que:
“Os juízes e tribunais observarão: I - as decisões do Supremo Tribunal
Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II - os
enunciados de súmula vinculante; III - os acórdãos em incidente de
assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e
em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV -
os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria
constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria
infraconstitucional; V - a orientação do plenário ou do órgão especial
aos quais estiverem vinculados”.
O dispositivo transcrito versa sobre a vinculação dos órgãos judiciais:
a) às decisões proferidas no controle concentrado de
constitucionalidade - ação declaratória de constitucionalidade, ação
declaratória de inconstitucionalidade e arguição de descumprimento de
preceito fundamental;
O controle concentrado de constitucionalidade recebe essa denominação por ser exercido
diretamente pelo Supremo Tribunal Federal, o guardião do texto constitucional. Em todas
as situações descritas, é exercido o direito de ação, por um dos legitimados, que pede que
seja afastada uma possível ofensa ao texto constitucional, que pode decorrer de ação ou
omissão.
b) aos enunciados das súmulas vinculantes (do Supremo Tribunal
Federal) e aos enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em
matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria
infraconstitucional ;
Como o Supremo Tribunal Federal dá a última palavra a respeito do sentido e do alcance
do texto constitucional e o Superior Tribunal de Justiça sobre as normas
infraconstitucionais de caráter federal que não estejam submetidas a uma justiça
especializada – justiça eleitoral, militar ou trabalhista -, o legislador entendeu por bem
considerar que todas as súmulas desses dois tribunais devem ser obrigatoriamente
observadas, e não apenas as rotuladas como vinculantes, uma vez que refletem o
entendimento do órgão a respeito de uma determinada matéria e, consequentemente, devem
ser seguidas por todos os juízos e tribunais que estão a eles vinculados no aspecto
hierárquico.
c) aos precedentes (teses ou entendimentos) firmados em incidente de
assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas, em
julgamento de recursos extraordinário e especial que sejam repetitivos ou
pelo plenário ou órgão especial do tribunal a que estiverem vinculados .
Em determinadas hipóteses, o legislador considera que uma manifestação anterior de um
órgão judicial a respeito de uma matéria possui caráter vinculante. Sendo assim, faz com
que o que foi decidido anteriormente (precedente) tenha que ser observado no futuro
(posteriormente). Esta vinculação somente pode ocorrer quando foi firmada uma tese
(entendimento, posicionamento) sobre alguma questão jurídica, por se considerar que os
fatos são sempre diferentes, e o legislador a considerar de observância obrigatória, como
ocorre nas situações anteriormente listadas.
De qualquer modo, mesmo que a decisão de um tribunal não seja
vinculante, sendo meramente persuasiva, por tentar induzir outros órgãos a
aceitá-la, seu posicionamento prevalece, pois pode modificar as decisões
que lhe são contrárias quando estiverem relacionadas a órgãos que lhe estão
subordinados sob o aspecto hierárquico. Sendo assim, o que acaba
efetivamente valendo em caso de recurso é a decisão do responsável pela
revisão da decisão, como ressalta o art. 1.008 do Código de Processo Civil,
que apresenta a seguinte redação: “O julgamento proferido pelo tribunal
substituirá a sentença ou a decisão recorrida no que tiver sido objeto de
recurso”.
Encerrando, é preciso observar que no plano administrativo há
hierarquia entre os diferentes órgãos do Poder Judiciário. O oposto não
poderia ocorrer, por ser necessária a existência da competência hierárquica
ou de mando, já que do contrário não teríamos a unidade do Poder
Judiciário.
As garantias do Poder Judiciário como um todo
Além das garantias conferidas aos juízes (independência sob a ótica
individual), a Constituição Federal assegurou ao Poder Judiciário a
prerrogativa do autogoverno (independência da instituição), garantida
através do exercício de atividades normativas e administrativas, voltadas
para a auto-organização e autorregulamentação de suas atividades,
“tendentes a garantir a plena independência do Poder Judiciário entre os
órgãos do Estado” [665] .
As garantias conferidas ao Poder Judiciário procuram evitar que possa
existir qualquer forma de interferência no conteúdo das decisões judiciais,
sobretudo pelos demais poderes do Estado.
Dentre as hipóteses de auto-organização e autorregulamentação
figuram as seguintes:
a) autonomia administrativa
A autonomia administrativa exterioriza-se, em especial, nas seguintes
situações: eleição dos órgãos de direção dos tribunais; elaboração dos
regimentos internos pelos tribunais; organização das secretarias, dos
serviços auxiliares e dos juízos vinculados; propor a criação de novas varas;
preencher os cargos necessários à administração da justiça; conceder
licenças, férias e afastamentos a seus membros (art. 96, I, da CF) e, ainda,
propor: a alteração do número de membros dos tribunais inferiores; a
criação e a extinção de cargos e a remuneração dos seus serviços auxiliares
e dos juízos que lhe forem vinculados, bem como a fixação do subsídio de
seus membros e dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores, onde houver;
a criação ou extinção dos tribunais inferiores; a alteração da organização e
da divisão judiciárias (art. 96, II, da CF);
b) autonomia financeira
A autonomia financeira está relacionada, em especial, à elaboração de
sua proposta orçamentária e à administração dos seus recursos financeiros.
Contudo, os gastos do Poder Judiciário estão limitados a 6% da receita
líquida da União ou do Estado a que esteja vinculado o órgão jurisdicional
(arts. 19 e 20 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 - Lei de
Responsabilidade Fiscal ) e a proposta orçamentária dos tribunais deverá
ser elaborada dentro dos limites estabelecidos conjuntamente com os
demais Poderes na lei de diretrizes orçamentárias (art. 99, § 1º, da CF).
c) iniciativa legislativa
Prevê o art. 96, II, da Constituição Federal, que o Supremo Tribunal
Federal, os demais tribunais superiores (Tribunal Superior do Trabalho,
Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior Eleitoral, Tribunal Superior
Militar) e os Tribunais de Justiça são dotados de iniciativa legislativa
quanto à: a) alteração do número de membros dos tribunais inferiores; b)
criação e extinção de cargos e fixação de vencimentos de seus membros,
juízes e servidores auxiliares; c) criação ou extinção de tribunais inferiores;
d) alteração da organização e divisão judiciária.
Todas as garantias conferidas ao Poder Judiciário procuram assegurar
que mantenha uma convivência harmônica e independente em relação aos
demais poderes e, assim, possa exercer a contento suas atribuições.
As garantias dos magistrados
Além das garantias políticas conferidas ao Poder Judiciário, a
Constituição concedeu garantias aos magistrados, que se dividem:
“Em duas espécies: as garantias dos magistrados, propriamente ditas ,
que se destinam a tutelar sua independência, inclusive perante outros
órgãos judiciários, e determinados impedimentos que visam a dar-lhes
condições de imparcialidade, protegendo-os contra si mesmos e
garantindo consequentemente às partes seu desempenho imparcial”
[666]
.
As garantias propriamente ditas conferidas aos magistrados
correspondem à vitaliciedade, à inamovibilidade e à irredutibilidade de
subsídios (art. 95, caput , da CF). Os impedimentos, por sua vez, conforme
o art. 95, parágrafo único, da Constituição Federal, dizem respeito à
proibição do exercício de outro cargo ou função, salvo o magistério, ao
recebimento de custas ou participação em processo, ao desempenho de
atividade político-partidária, ao recebimento, a qualquer título ou pretexto,
de auxílios ou contribuições de pessoas físicas, e de entidades públicas ou
privadas, ressalvas as exceções previstas em lei e ao exercício da advocacia
no juízo ou tribunal do qual se aposentou ou exonerou antes de decorridos
três anos do afastamento.
Garantias de independência da magistratura
Por meio das garantias de independência procura-se evitar que o juiz
se submeta às determinações ou orientações provenientes de outros poderes
(independência externa), de outros órgãos do Poder Judiciário
(independência interna) [667] , da população (independência externa), da
sociedade civil (independência externa) e dos meios de imprensa
(independência externa). Com esta finalidade, no texto constitucional são
arroladas as seguintes garantias para os magistrados: a) vitaliciedade; b)
inamovibilidade; c) irredutibilidade de subsídios.
a) vitaliciedade
A vitaliciedade corresponde à garantia de que o juiz só perderá o
cargo em razão de sentença judicial transitada em julgado. Para obter a
garantia e mantê-la basta que o magistrado esteja atuando em consonância
com o ordenamento jurídico.
A garantia da vitaliciedade é conferida, em regra, aos magistrados
somente após ultrapassarem o estágio probatório, que é de dois anos. Para
tanto, terão que participar de curso oficial ou reconhecido por escola
nacional de formação e aperfeiçoamento de magistrados (art. 93, IV, da
CF). Durante o período do estágio probatório, os magistrados poderão ser
afastados por decisão do tribunal a que estiverem vinculados.
Alguns membros da magistratura adquirem a vitaliciedade após entrarem em exercício. É o
que ocorre, por exemplo, com os Ministros do Supremo Tribunal Federal, pois não teria
sentido que um integrante do aludido tribunal tivesse que passar por um estágio probatório,
já que o escolhido deve gozar de notório saber jurídico e reputação ilibada.
A vitaliciedade é uma importante condição para o exercício imparcial
da função judicante, pois esta requer garantias especiais de permanência e
definitividade no cargo. Deste modo, busca preservar a instituição judiciária
e não simplesmente a pessoa do juiz. Por isso, uma vez vitalício, o juiz só
poderá ser afastado de suas funções judicantes por vontade própria e apenas
perderá o cargo em razão de sentença judiciária, aposentadoria compulsória
ou se for posto em disponibilidade [668] - ex.: é extinto o órgão judicial em
que o juiz exercia as suas funções. Quanto à colocação em disponibilidade,
requer decisão por voto favorável da maioria absoluta dos membros do
respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça, assegurada ampla
defesa (art. 93, VIII, da CF).
b) inamovibilidade
A inamovibilidade impede que o juiz seja removido de um lugar para
outro, salvo se houver o seu consentimento. A garantia, porém, somente se
aplica aos juízes titulares, uma vez que os substitutos podem ser removidos
a qualquer momento do local em que se encontrem, tendo em vista que
substituem os titulares quando se afastam por motivo de férias, licenças etc.
No contexto da inamovibilidade estão compreendidos:
“O grau [1º e 2º grau], a sede [ex.: juiz que exerce sua jurisdição na
área central de São Paulo não pode ser removido], a comarca ou a
seção judiciária [ex.: comarca de São Paulo], o cargo [ex.: juiz das
execuções penais], o tribunal e a câmara [fracionamento interno dos
tribunais. Ex.: Câmara de Direito Público]. A inamovibilidade não
pode sofrer exceção sequer em caso de promoção, sem consentimento
do magistrado” [669] .
A inamovibilidade não permite sequer a remoção de um juiz para
outra vara, mesmo que localizada no mesmo foro, salvo para atender ao
interesse público. Sendo assim, um juiz de São Paulo, por exemplo, não
pode ser removido de sua vara (1ª) para atuar em outra (3ª). Por fim, a
inamovibilidade impede, inclusive, que determinados processos sejam
retirados de um juiz e encaminhados a outro, salvo se houver determinação
legal nesse sentido (ex.: impedimento, suspeição, incompetência).
Não obstante a existência da garantia da inamovibilidade, o art. 93,
VIII, da Constituição Federal permite que o magistrado seja removido,
independentemente de sua concordância, se houver interesse público,
baseado em decisão por voto favorável da maioria absoluta dos integrantes
do tribunal a que estiver vinculado o juiz ou do Conselho Nacional de
Justiça.
c) irredutibilidade de subsídios
A irredutibilidade de subsídios tem como finalidade impedir que
ocorram descontos no valor recebido pelo magistrado, prejudicando sua
imparcialidade, ao atingir seu subsídio (denominação atribuída aos valores
por ele percebidos em decorrência do exercício da função), que garante sua
independência financeira.
A palavra subsídio é utilizada no texto constitucional para representar o valor recebido por
determinados servidores públicos (juízes, promotores etc.) e pelos agentes políticos
(prefeitos, vereadores, deputados etc.). A Constituição Federal prevê que deve
corresponder a uma parcela única para evitar que sejam acrescidas diferentes vantagens
patrimoniais aos rendimentos mensais daqueles que o recebam, o que se costuma chamar
de penduricalhos, levando a ganhos abusivos.
Todavia, não há impedimento para a incidência dos tributos
genéricos, que são os que incidem, a princípio, sobre todas as pessoas,
como é o caso do imposto sobre a renda.
Impedimentos e imparcialidade
Conforme o parágrafo único do art. 95 da Constituição Federal, é
vedado aos juízes: I - exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou
função, salvo uma de magistério; II - receber, a qualquer título ou pretexto,
custas ou participação em processo; III - dedicar-se à atividade político-
partidária; IV – receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou
contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas
as exceções previstas em lei; V – exercer a advocacia no juízo ou tribunal
do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo
por aposentadoria ou exoneração.
Os impedimentos impostos aos juízes são aplicados com a finalidade
de assegurar a sua independência e imparcialidade, servindo, desse modo,
como importante garantia para os litigantes e para a própria sociedade.
MINISTÉRIO PÚBLICO