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02/08/2023, 16:31 O rastro de mortes de indígenas durante o governo Bolsonaro | Nexo Jornal

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02/08/2023, 16:31 O rastro de mortes de indígenas durante o governo Bolsonaro | Nexo Jornal

EXTERNO (/EXTERNO/)

O rastro de mortes de indígenas durante o governo


Bolsonaro
Bruna Bronoski 26 de jul de 2023 (atualizado 26/07/2023 às 18h25)

Foram 795 assassinados entre 2019 e 2022, segundo relatório do Conselho Indigenista Missionário. Omissão na
saúde matou mais de três mil crianças, de acordo com a organização

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FOTO: INDÍGENAS YANOMA


YANOMAMI, EM RORAIMA. FOTO: ADRIANO MACHADO/REUTERS - 1º.JUL.2020

 INDÍGENAS YANOMAMI,
YANOMA EM RORAIMA

Ao sair para buscar lenha numa fazenda vizinha à reserva de Taquaperi, no


Mato Grosso do Sul, um jovem indígena Guarani-Kaiowá de 18 anos foi morto
por cinco disparos de arma de fogo. No Amazonas, a cacique do povo Kulina
denunciou o assassinato de ao menos sete indígenas das aldeias da região, entre
eles o de um adolescente de 15 anos, decapitado. Em Roraima, a tentativa de
assassinato de um grupo de cinco indígenas Xirixana por garimpeiros resultou
na morte de uma liderança. Para fugir dos disparos, as vítimas se jogaram no
rio Uraricoera. Todos os crimes ocorreram em 2022. Ao todo, quase 800
indígenas foram assassinados entre 2019 e 2022.

Os três estados citados acima — Mato Grosso do Sul, Amazonas e Roraima —


são os mais letais para indígenas no Brasil, conforme o relatório anual do
Conselho Indigenista Missionário (CIMI), divulgado nesta quarta-feira (26) ao
qual a Agência Pública teve acesso. Os dados do período de 2019 a 2022, sob o
governo de Jair Bolsonaro (PL), são da Secretaria Especial de Saúde Indígena
(Sesai), do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e das secretarias
estaduais de saúde.

Nos estados de Roraima e Amazonas, onde está a Terra Indígena Yanomami


(TIY), houve 208 e 163 assassinatos de indígenas no período, respectivamente.
Em terceiro lugar no ranking de mortes violentas contra indígenas aparece o
Mato Grosso do Sul, com 146 casos. Juntas, as três unidades federativas foram
responsáveis por 65% dos assassinatos no período. Em todo o país, foram
registrados 795 homicídios nos quatro anos.

As mortes por assassinato não são a única causa de extermínio indígena.


Invasão de terras, negligência ou negativa de assistência médica, redução de
verba pública para órgãos de proteção, racismo, ameaças e violência física e
sexual são causas apontadas para o extermínio de indígenas. Outro ponto
levantado pelo relatório é a falta de políticas públicas contra o suicídio.

O documento também pontua a necessidade de criação de uma Comissão


Nacional Indígena da Verdade (CNIV), a exemplo da comissão instalada para
investigar crimes da ditadura civil-militar brasileira.
FOTO: NACHO DOCE/REUTERS - 09.SET.2019

 INDÍGENA ARARA CAMINHA NA RODOVIA TRANSAMAZÔNICA AO LADO DA


ALDEIA DE ARADO, PERTO DE ALTAMIRA, NO PARÁ

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Governo negligencia fome, doenças e mortes


evitáveis

O governo Bolsonaro não demarcou nenhum centímetro de Terra Indígena no


Brasil, como prometido antes da posse. Sua política indigenista é considerada
“genocida” e promotora da “naturalização da morte indígena”. O governo
Bolsonaro foi o primeiro desde a redemocratização a não homologar nenhuma
TI, o que, para o CIMI, contribuiu para a desassistência à saúde e à morte
indígena.

O relatório indica que, sem a demarcação de suas áreas, há grupos que não
possuem terras ou águas suficientes para produzir os próprios alimentos. Eles
ficam assim dependentes de políticas de assistência social.

O cerco, segundo o relatório, ocorreu dos dois lados sob o governo Bolsonaro.
De um lado, não houve andamento dos estudos de Grupos Técnicos (GTs) da
Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), nem daqueles criados por
determinação judicial, para que qualquer território indígena reivindicado fosse
reconhecido no Brasil. De outro, o governo federal interrompeu o fornecimento
de cestas básicas entre agosto e dezembro de 2022, antes e depois do período
eleitoral, entre outras desassistências.

Segundo o documento, ao menos 800 indígenas das etnias Avá-Guarani, do


oeste do Paraná, e Mbya Guarani, do Rio Grande Sul, vivenciaram situações de
fome, principalmente entre crianças. Segundo o CIMI, os “espaços diminutos”
em que vivem impedem qualquer forma de sobrevivência pela terra.

Em Dourados (MS), houve registros de indígenas se alimentando de lixo para


comer. O relatório traz o depoimento da liderança indígena Erileide Domingos,
da aldeia Guyraroka, que denunciou o caso à Organização das Nações Unidas
em agosto de 2022. “A fome é resultado da desorientação do Estado brasileiro.
É muita falta de piedade com o outro, de olhar os pobres, sem condições, sem
emprego, sem possibilidade de plantar, não conseguimos produzir nada, não
conseguimos ser ninguém”, relata Erileide no documento.

Omissão na saúde matou mais de três mil crianças


indígenas, diz relatório

A omissão na área da saúde é outro ponto que levou à morte centenas de


indígenas em todo o país.

Mais de 3.550 crianças de até 4 anos de idade morreram entre 2019 e 2022 em
territórios indígenas. Os estados de Roraima e Amazonas carregam a maior
quantidade de casos, desta vez seguidos pelo Mato Grosso.

Uma em cada três mortes infantis registradas pela Sesai eram evitáveis,
conforme análise de dados do CIMI a partir da Nota Técnica do Ministério da
Saúde. Falta de acompanhamento da gestação, casos de gripe e pneumonia,
desnutrição, diarreias e doenças infecciosas tratáveis estão entre os motivos que
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evitaram que 1.504 crianças pudessem chegar à fase adulta.

Para o CIMI, a desassistência médica é fator diretamente ligado à política


indigenista empregada pelo governo federal nos últimos quatro anos. O caso de
maior repercussão foi a falta de acesso às políticas públicas de saúde por parte
dos indígenas Yanomami, denunciado pela Pública em diversas reportagens. O
Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami e Ye’kwana (Dsei-YY) registrou,
só em 2022, 134 mortes de crianças entre 0 a 4 anos.

Na TI Yanomami, a invasão do garimpo estrangula serviços públicos


indigenistas, entre eles os de saúde, denuncia a Hutukara Associação
Yanomami (HAY) no relatório. “A captura da estrutura de saúde por
garimpeiros gerou uma situação de desassistência generalizada no território”,
afirma o documento sobre os postos de saúde que fecharam no território pela
sensação de insegurança com a presença da atividade ilegal e armada.

Governo atrasou vacina e não reforçou políticas para


prevenir o suicídio

Entre os adultos, a maior quantidade de mortes foi no Mato Grosso, com 136
casos. Entre as causas estão o atraso da chegada da vacina aos territórios,
estadias em más condições quando grupos de indígenas se dirigem aos centros
urbanos em busca de serviços, infecções gastrointestinais causadas por poluição
da água, consumo de agrotóxicos pela água, entre outros.

Se crianças e adultos indígenas morrem por desassistência médica, a omissão


estatal entre os jovens indígenas ocorre pela falta de outra política pública: a de
prevenção ao suicídio. Novamente, estados já citados em outras estatísticas
negativas lideram a causa da morte por suicídio entre indígenas. A cada cinco
registros no quadriênio 2019-2022, dois ocorreram no estado do Amazonas e
um no Mato Grosso do Sul. Ao todo, 535 indígenas tiraram a própria vida no
período. Destes, 35% eram jovens menores de 19 anos.

Destruição de bens indígenas

O Conselho das Aldeias Wajãpi-Apina denunciou, em fevereiro de 2022, a


poluição dos rios pela invasão garimpeira na Terra Indígena (TI) Waiãpi, no
Amapá: “Fotos e vídeos de várias aldeias mostram as águas com muita lama e
como dependemos dos rios para beber água e tomar banho, isto gerou muita
preocupação para os nossos chefes e famílias.”

O registro afirma que os garimpeiros provocam danos aos bens naturais


essenciais que afetam o modo de vida indígena no entorno e dentro da TI.

Mais ao oeste, outro caso de invasão ao maior patrimônio indígena, a floresta. A


autorização para abrir um ramal dentro da TI Jaminawá/Iguarapé Preto,
ligando dois municípios, partiu do Instituto de Meio Ambiente do Acre. Por se
tratar de Terra Indígena, o licenciamento ambiental da obra deveria passar pelo
órgão federal competente, o Ibama, e não pelos órgãos estaduais.

A li t d d t itó i d d ã é d C t ã d
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A lista de danos aos territórios, demarcados ou não, é grande. Construção de
Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), criação de gado, arrendamento de
terras, uso de agrotóxicos, construção de presídios estaduais e federais,
desmatamento de área sagrada, contaminação das águas e animais por
mercúrio, loteamento e outras formas de invasão e destruição ao patrimônio
indígena ocupam algumas páginas do relatório.

As maiores estatísticas ocorreram com casos de desmatamento, registrados em


74 TIs, segundo dados do Prodes. Em seguida, aparece a extração ilegal de
madeira, areia, castanha e outros recursos naturais, com 65 ocorrências. Já as
atividades ilegais de garimpo e mineração, assim como a de caça e pesca ilegais,
atingiram, cada uma, ao menos 45 TIs, segundo o relatório. Uma TI pode
constar em um, dois ou mais tipos de ocorrência.

De acordo com o CIMI, os danos ao patrimônio indígena têm como


consequência o aumento de conflitos por direitos territoriais. O assassinato do
jovem Guarani-Kaiowá com cinco disparos de arma de fogo que abre esta
reportagem foi seguido de conflitos por território.

O documento relembra que o crime incitou ações de retomada indígena, como


são chamadas as manifestações e acampamentos para reivindicar uma área
ancestral. Conforme documenta o CIMI, as manifestações no município de
Coronel Sapucaia (MS) foram “reprimidas com violentas e ilegais operações
policiais e emboscadas contra lideranças, que deixaram mortos e feridos”.

Sinal “verde” para violar direitos

Nomeado em julho de 2019 para presidir a Funai e exonerado só no penúltimo


dia do governo Bolsonaro, em 29 de dezembro de 2022, o delegado da Polícia
EM ALTA Federal Marcelo Xavier defendeu um ex-coordenador regional da fundação em
Mato Grosso do Sul, preso por operação da PF pelo envolvimento no esquema
de arrendamento de Terras Indígenas e cobrança de propina para aluguel de
pastos. O ex-presidente da Funai disse, em ligação interceptada pela PF, que
estava tentando intervir nas investigações que incriminavam o ex-servidor.

“As ações e discursos do governo federal e da Funai, sob a presidência de


Marcelo Xavier, serviram como sinalizações que criaram nos invasores a
expectativa de que suas posses ilegais dentro de terras indígenas seriam (/interativo/2016/01/11
(/explicado/2023/07/30/O-
legalizadas em breve”, destaca o CIMI sobre as tentativas de Xavier, via
protagonismo-e-as-urgências-da- salário-diante-da-realid
(/estante/favoritos/2023/07/29/5-livros-
normativas da infância-no-século-21) (/explicado/2021/09/05/Direitos-
Funai, de legalizar o garimpo e a extração de madeira em TIs. brasileira)
para-mapear-a-poesia-contemporânea- EXPLICADO reprodutivos-uma-história-de-avanços-e- INTERATIVO
brasileira) O governo agiu(/EXPLICADO/) obstáculos)
em diversas frentes contra os direitos indígenas, aponta o CIMI. (/INTERATIVO/)
FAVORITOS EXPLICADO (/EXPLICADO/)
Na pasta da Justiça sob Bolsonaro,
O protagonismo e as o então ministro Sérgio Moro definiu, com O seu salário diant
(/ESTANTE/FAVORITOS/) Direitos reprodutivos: uma realidade brasileir
base da tese dourgências da infância
marco temporal, no de áreas
uma relação indígenas que poderiam
5 livros para mapear a poesia século 21 história de avanços e obstáculos (/interativo/2016/0
ser demarcadas. Proposta pela bancada ruralista, a tese retiraria amplamente
(/explicado/2021/09/05/Direitos- seu-salário-diante-
contemporânea brasileira (/explicado/2023/07/30/O-
os direitos
(/estante/favoritos/2023/07/29/5- indígenas, afirmam
protagonismo-e-as-os povos originários e especialistas.
reprodutivos-uma-história-de- realidade-brasileir
livros-para-mapear-a-poesia- urgências-da-infância-no- avanços-e-obstáculos) Gabriel Zanlorenssi
contemporânea-brasileira) século-21) Mariana Vick
Isadora Rupp

A seção `Externo` traz uma seleção de artigos e ensaios cedidos por veículos
nacionais e internacionais. Textos publicados originalmente em outros idiomas
têm tradução do Nexo.

(https://thetrustproject.org/) SAIBA MAIS

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