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DIREITOS HUMANOS E A

HUMANIZAÇÃO DAS
PENAS E DAS PRISÕES
Conteudista associado: Karol Oliveira De Amorim Silva

CURSO DE FORMAÇÃO TÉCNICO-PROFISSIONAL


POLÍCIA PENAL – MG

MINAS GERAIS
2023
SUMÁRIO

EMENTA................................................................................................................................... 4

UNIDADE 1 – DIREITOS HUMANOS: ORIGEM, CONCEITO, FUNDAMENTOS E


TRAJETÓRIA DE UMA CONQUISTA SOCIAL ............................................................... 5

CONCEITO E ORIGEM: DEFINIÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ....................................................... 5


UM “GIRO” PELA HISTÓRIA DOS DIREITOS HUMANOS .............................................................. 6
A DIFUSÃO DOS DIREITOS HUMANOS ....................................................................................... 7
Magna Carta (1215) .......................................................................................................... 8
Petição de Direito (1628) .................................................................................................. 9
Declaração de Independência dos Estados Unidos (1776), Constituição dos Estados
Unidos (1787) e a Declaração de Direitos (1791) .......................................................... 10
Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) .............................. 11
A Primeira Convenção de Genebra (1864)..................................................................... 12
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS: CONTEXTO HISTÓRICO E LEGAL .......... 13
A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (1945) ..................................................................... 13
A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS (1948) .............................................. 14
DIREITOS HUMANOS E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL ................................................................ 17

UNIDADE 2: O PRINCÍPIO DA HUMANIDADE DA PENA .......................................... 20

HUMANIZAÇÃO DO SISTEMA PENITENCIÁRIO: ASPECTOS GERAIS DO BRASIL E DE MINAS GERAIS


............................................................................................................................................... 21
LEI Nº 7.210/1984 (LEI DE EXECUÇÃO PENAL) E LEI N° 11.404/1994 (LEI ESTADUAL NORMAS
DE EXECUÇÃO PENAL): UMA REFLEXÃO SOBRE ASPECTOS HISTÓRICOS E HUMANIZADORES .. 22

REGRAS MÍNIMAS PARA TRATAMENTO DE RECLUSOS – REGRAS DE MANDELA ...................... 25


PRINCÍPIOS E BOAS PRÁTICAS PARA A PROTEÇÃO DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE NAS
AMÉRICAS (RESOLUÇÃO CIDH 01/08) .................................................................................. 28
REGRAS INTERNACIONAIS PARA ENFRENTAMENTO DA TORTURA E MAUS-TRATOS ................. 30
Prevenção e combate à tortura ........................................................................................ 35
LEI Nº 9.455/1997 – DEFINE E TIPIFICA O CRIME DE TORTURA ................................................ 36
Crime de tortura cometido por agentes públicos e pessoas comuns e a aplicabilidade da
lei .................................................................................................................................... 37
O Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - (Lei n° 12.847/) ................... 38
O Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT) ................................ 38
O Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) ........................ 39
Denúncias sobre tortura: elementos essenciais ............................................................... 40

UNIDADE 3: SOCIEDADE BRASILEIRA E PRISÕES ................................................... 42

O PROBLEMA DO ENCARCERAMENTO MASSIVO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO ....................... 42


ROTINAS E PRÁTICAS DE ATENÇÃO ÀS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE ............................. 46
INTEGRAÇÃO ENTRE AS PRINCIPAIS POLÍTICAS PÚBLICAS E PROGRAMAS DE HUMANIZAÇÃO DAS
PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE ......................................................................................... 48

DIREITOS HUMANOS E GRUPOS VULNERÁVEIS ....................................................................... 49


Políticas para as mulheres .............................................................................................. 52
Populações indígenas ...................................................................................................... 54
Populações estrangeiras presas e egressas do sistema prisional ..................................... 55
Pessoas com deficiência física ou mobilidade reduzida ................................................. 56
Público LGBTQIA+ ....................................................................................................... 57
Pessoas em privação de liberdade com problemas e transtornos mentais ...................... 60
ASSISTÊNCIA SOCIAL AO EGRESSO DO SISTEMA PRISIONAL .................................................... 62
Referências internacionais .............................................................................................. 63
Referências nacionais ..................................................................................................... 63
Estigmatização social do egresso e suas dificuldades de reinserção .............................. 65
Marcadores da condição da pessoa egressa .................................................................... 67
O PAPEL DA SOCIEDADE CIVIL NA EXECUÇÃO DA PENA .......................................................... 69
ÓRGÃOS: OUVIDORIAS, CONSELHOS PENITENCIÁRIOS, CONSELHOS DA COMUNIDADE,

DEFENSORIA PÚBLICA ............................................................................................................ 71


Ouvidorias ...................................................................................................................... 71
Conselhos penitenciários ................................................................................................ 72
Conselhos da comunidade .............................................................................................. 72
Defensoria Pública .......................................................................................................... 73

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 75
EMENTA: O processo de constituição dos Direitos Humanos. História social e conceitual dos
Direitos Humanos. Documentos fundadores como resultados socio-históricos. Os Direitos
Humanos como projeto de sociedade. O Estado e a proteção dos Direitos Humanos. O conceito
de humanização da pena como integrante do projeto dos Direitos Humanos. Documentos,
tratados e legislações nacionais e internacionais que regem a política penal no escopo da
garantia dos Direitos Humanos. A sociedade brasileira, prisões e Direitos Humanos.
Reconhecimento do ser humano como titular de direitos, reflexão sobre o servir e proteger em
se tratando de Segurança Pública e orientação da prática de Polícia Penal enquanto uma
responsabilidade social.

CONTEUDISTA ASSOCIADA: Karol Oliveira de Amorim-Silva


UNIDADE 1 – DIREITOS HUMANOS: Origem, conceito, fundamentos e trajetória de
uma conquista social

TÓPICOS DA AULA:
• Conceito e Origem.
• Declaração Universal dos Direitos Humanos: Contexto histórico e legal.
• Direitos Humanos e a Constituição Federal.

PARA PENSAR!

“Mas, e em relação aos Direitos Humanos? Insisto que dificilmente um tema já venha
carregado de tanta ambiguidade, por um lado, e deturpação voluntária, de outro.
Provavelmente vocês já ouviram muitas vezes referência aos Direitos Humanos no
sentido pejorativo ou excludente, no sentido de identificá-los com direitos dos
bandidos. Quantas vezes vocês já ouviram - principalmente depois do noticiário sobre
crimes de extrema violência: Ah! E os defensores dos Direitos Humanos, onde é que
estão?” (Maria Victoria Benevides)1

Para você, o que são Direitos Humanos?


Para ajudar em sua reflexão, pesquise no dicionário o significado da palavra humano,
depois da palavra direitos e, então, construa sua definição a partir da junção dos dois
significados. Talvez você tenha chegado a uma conclusão próxima de que Direitos Humanos
são os direitos que as pessoas têm simplesmente por serem humanas.

Conceito e origem: definição de Direitos Humanos


A partir da premissa de que cada sujeito, enquanto ser moral e racional, merece ser
tratado com dignidade, os Direitos Humanos se fundamentam no princípio de respeito ao
indivíduo. São denominados Direitos Humanos porque são universais, ou seja, não são restritos
aos direitos de grupos específicos, aplicando-se somente a eles, mas são direitos merecidos por
todos os humanos, não importando quem sejam, onde morem, o que tenham feito: possuem
direitos porque estão vivos!

1
BENEVIDES, Maria Victoria. Cidadania e Direitos Humanos. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados da
Universidade de São Paulo. Disponível em:
http://www.iea.usp.br/publicacoes/textos/benevidescidadaniaedireitoshumanos.pdf/view Acesso em: 27 nov.
2022.
5
Se for feita uma pesquisa, muitas pessoas não saberão responder sobre seus Direitos
Humanos, talvez citarão um ou outro que seja significativo para elas. Mas eles são amplos,
justamente por abranger todas as demandas de um sujeito humano. Trata-se de opção e
oportunidade. Significam liberdade: de ir e vir, de se obter um emprego, de se seguir uma
carreira, de escolher um parceiro e criar os filhos. Incluem o direito de trabalho remunerado,
sem abuso, assédio ou ameaça de demissão de modo arbitrário. Abrangem também o direito de
viajar livremente e de ter acesso ao lazer.
Em épocas passadas, não havia o entendimento de Direitos Humanos. Com o tempo,
emergiu a ideia de que as pessoas deveriam ter determinadas liberdades e certas garantias que
lhes dessem dignidade de manutenção de suas vidas. Essa ideia, discutida ao longo de muitos
anos, em diferentes contextos e momentos históricos, ao fim da Segunda Guerra Mundial,
finalmente deu origem ao documento denominado Declaração Universal dos Direitos Humanos
(DUDH), constituído pelos trinta direitos que possuem todos os seres humanos.
Mas, você deve estar se perguntando: “Qual, exatamente, a origem da ideia de Direitos
Humanos?”

Um “giro” pela história dos Direitos Humanos


O princípio da busca por Direitos Humanos de que se tem conhecimento remete a mais
de 2.500 anos atrás, momento em que esse conceito ainda não estava em construção e nem
havia se constituído.
Em 539 a.C., o exército de Ciro, o Grande, rei da Pérsia, conquistou a cidade da
Babilônia e o rei teve uma atitude inesperada: libertou os escravos, declarou que todas as
pessoas tinham o direito de escolher sua própria religião e estabeleceu a igualdade racial. Esses
e outros decretos foram escritos em uma tábula de barro, denominada Cilindro de Ciro. É
considerado o documento precursor dos Direitos Humanos. Está traduzido nas seis línguas
oficiais das Nações Unidas e é semelhante aos quatro primeiros artigos da Declaração Universal
dos Direitos Humanos.

6
Figura 1 - Ciro, o Grande – 1º rei da Pérsia

Fonte: Página da internet, 20222.

SAIBA MAIS!
O Cilindro de Ciro data do século IV a.C., foi descoberto nas ruínas da Mesopotâmia
(atual Iraque) em 1879 e se encontra, atualmente, no Museu Britânico, em Londres. Ele narra a
trajetória política de Ciro (somente seus bons feitos).

Figura 2 - Cilindro de Ciro

Fonte: Página da internet, 2022.3

A difusão dos Direitos Humanos


A ideia dos Direitos Humanos se difundiu da Babilônia por diversas regiões da Ásia
Menor e Europa, chegando à civilização grega e romana. Com os gregos e os romanos, surgiu
o conceito de “lei natural”, com o objetivo de resguardar o direito que as pessoas tinham de

2
Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/dicionario/verbetes/c/ciro_02_grande.htm Acesso em: 27
nov. 2022.
3
Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/marcos/cilindro/index.htm Acesso em: 27 nov. 2022.
7
seguir certas leis não escritas no curso de suas vidas. Pode-se afirmar que esse conceito é a base
para o direito racional que rege a vida em sociedade.
A partir de então, surgem documentos nas mais diversas civilizações e sociedades que
defendem os direitos individuais, tais como:

Magna Carta (1215)

Figura 3 - Magna Carta ou “Grande Carta”

Fonte: Página internet, 2022.4

Assinada pelo rei da Inglaterra em 1215, a Magna Carta foi um ponto decisivo para os
Direitos Humanos, uma vez que foi a influência mais significativa no vasto processo histórico
que direcionou ao que se entende por direito de defesa atualmente. Teve como principal
objetivo limitar o poder do rei pela lei e proteger os privilégios dos nobres. Algumas de suas
definições:
• Todas as pessoas tinham o direito de acesso à justiça;
• Nenhum homem livre poderia ser aprisionado ou punido sem antes passar por
um julgamento.
É reconhecida como um dos documentos mais importantes no desenvolvimento da
democracia moderna, firmando-se como um ponto crucial na busca pelo estabelecimento da
liberdade humana.

4
Disponível em: https://www.canallondres.tv/carta-magna-importancia-e-o-que-significa/ Acesso em: 27 nov.
2022.
8
Petição de Direito (1628)
Figura 4 - Petição de Direito

Fonte: Página da internet, 20225.

Em 1628, o Parlamento Inglês enviou a declaração de liberdades civis ao rei Charles I,


o que significou mais um marco no desenvolvimento dos direitos humanos. Em função do
desacordo entre Parlamento e Monarquia, devido à recusa do primeiro em financiar a política
externa impopular do rei, o governo passou a exigir empréstimos compulsórios e assentamento
das tropas reais nas casas dos súditos como medida econômica, além de detenção arbitrária e
aprisionamento.
O Parlamento então reagiu, impondo a assinatura, pelo rei, da Petição de Direito, que se
baseava em estatutos e cartas anteriores e estabelecia algumas proibições, como, convocar o
exército, propor novos impostos sem a aprovação do Parlamento, ordenar prisões arbitrárias.
Além disso, a Petição solicitava a observância dos direitos e das liberdades dos súditos já
reconhecidos na Magna Carta, mas que não eram respeitados pelo rei.

5
Disponível em: https://www.jurisway.org.br/v2/cursoonline.asp?id_curso=1224&id_titulo=14930&pagina=12
Acesso em: 27 nov. 2022.

9
Declaração de Independência dos Estados Unidos (1776), Constituição dos Estados Unidos
(1787) e a Declaração de Direitos (1791)

Figura 5 - Declaração de Direitos da


Constituição dos EUA Figura 6 - Thomas Jefferson

Fonte: Página da internet, 20226 Fonte: Página da internet, 20227

Em 4 de julho de 1776, o Segundo Congresso Continental, que ocorreu na Filadélfia,


aprovou a Declaração de Independência dos Estados Unidos, tendo como principal autor
Thomas Jefferson. Esse documento enfatizava dois temas: os direitos individuais e o direito de
revolução. Foi o primeiro registro que fez referência à definição de Direitos Humanos como é
conhecida atualmente. Além de assegurar direitos universais à população, a Declaração de
Independência incluiu as obrigações legais e morais do Estado, inovando ao afirmar que os
cidadãos do país eram possuidores de ‘direitos inalienáveis’ e que a autoridade do governo
derivava do consentimento dos governados. Tais ideias foram fortemente apoiadas pelos
estadunidenses e se expandiram internacionalmente, influenciando, em particular, a Revolução
Francesa.
A Constituição dos Estados Unidos é a lei fundamental do sistema de governo federal
desse país e é referência para o mundo ocidental. É a mais antiga constituição nacional em uso
e definiu os principais órgãos de governo e os direitos básicos dos cidadãos, considerados como
Direitos Humanos (os direitos inalienáveis à vida, à liberdade e à busca da felicidade),
observando-os para que não fossem violados.
A Declaração de Direitos protege a liberdade de expressão, religiosa, de reunião e o

6
Disponível em: https://editorials.voa.gov/a/democracias-liberais-protegem-melhor-os-direitos-humanos-
/5612232.html Acesso em: 27 nov. 2022.
7
Disponível em: https://www.history.com/topics/us-presidents/thomas-jefferson Acesso em: 27 nov. 2022.
10
direito de petição. Proíbe busca e apreensão injustificada, punição cruel e abusiva e
autoincriminação forçada, bem como proíbe o governo federal de privar qualquer pessoa de sua
própria vida, liberdade ou propriedade sem o devido processo legal. Apresenta garantias no
campo dos processos penais federais, exigindo acusação por um grande júri para qualquer crime
capital ou crime de infâmia, um julgamento público rápido com um júri imparcial, no distrito
onde o crime tenha acontecido, e proíbe a dupla penalização.

Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789)

Figura 7 - Déclaration desdroits de I’Homme et du citoyen

Fonte: Página da internet, 20228

Com a Revolução Francesa, que tinha como lema ‘liberdade, igualdade, fraternidade’,
em 1789 o povo francês promoveu a abolição da monarquia absoluta, abrindo caminho para a
instituição da primeira República Francesa.
Após semanas da Tomada da Bastilha e da abolição do feudalismo, esse documento foi
adotado pela Assembleia Nacional Constituinte como o marco inicial para a criação de uma
Constituição para a República da França. Os franceses conseguiram, em um único documento:
aglutinar as proteções legais dos direitos individuais; declarar os direitos individuais e civis (do
ser humano) e os direitos de participação política (do cidadão).
A Constituição ampliou o campo de aplicação de direitos, garantindo liberdade e
igualdade de nascença, direitos de propriedade, segurança e resistência à opressão, liberdade de

8
Disponível em: https://www.upf.br/noticia/declaracao-dos-direitos-do-homem-e-do-cidadao-completa-231-
anos Acesso em: 27 nov. 2022.
11
pensamento, de expressão e culto, proteção contra acusações, prisões e punições arbitrárias,
além de estabelecer limites à liberdade individual em respeito à liberdade do próximo.

A Primeira Convenção de Genebra (1864)

Figura 8 - Documento original da primeira Convenção de Genebra

Fonte: Página da internet, 20229

No intuito de estabelecer o cuidado de soldados feridos, em 1864 foi realizada, em


Genebra, uma conferência diplomática (participação de 16 países europeus e vários estados
americanos). O objetivo central era a adoção de um pacto para tratamento de soldados feridos
em combate. Foram definidos princípios mantidos pelas convenções posteriores, tais como:
ampliação da assistência, sem discriminação, para a equipe militar ferida e doente; atenção e
respeito à identificação com o sinal específico da cruz vermelha sobre um fundo branco no
transporte de equipamentos e equipe médica.

ATENÇÃO!
Você percebeu que toda a concepção de Direitos Humanos, luta e defesa, nasce a partir
de violações à dignidade da vida dos seres humanos? E os maiores violadores de direitos
encontram-se na gestão de uma nação, estado, comunidade, sociedade? A partir disso reflita,
em sua posição enquanto cidadão e servidor público, sobre o seu papel de detentor e garantidor
de direitos.

9
Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Conven%C3%A7%C3%B5es_de_Genebra Acesso em: 27 nov.
2022.
12
Declaração Universal dos Direitos Humanos: Contexto histórico e legal

PARA PENSAR!
Agora que você já sabe os antecedentes da atual concepção de Direitos Humanos,
consegue perceber que ela foi sendo moldada ao longo de variados e determinados períodos
históricos, com base em diversas ideias e pensamentos de diferentes povos, construída por
distintas civilizações, mas que possui em comum, basicamente, duas necessidades:
- Proteção frente a abuso de poder de instituições governantes (Estado).
- Garantia da guarda e respeito à dignidade humana.

A Organização das Nações Unidas (1945)

Figura 9 - Símbolo da Organização das Nações Figura 10 - Convenção das Nações Unidas em
Unidas 1945

Fonte: Página da internet, 2022.10 Fonte: Página da internet, 2022.11

Os terríveis desdobramentos da Segunda Guerra Mundial, no período de 1939 a 1945,


se constituíram como o marco inicial e fundamental para a afirmação e a consolidação dos
Direitos Humanos na ordem internacional. Cinquenta nações se reuniram em 1945 em São
Francisco (EUA), assinaram a Carta das Nações Unidas e formaram a Organização das Nações
Unidas (ONU). Ressalta-se que o Brasil foi um dos primeiros signatários do documento.
O principal intuito era a promoção da paz e o impedimento de novas guerras. No
preâmbulo da Carta12, está descrito o ideal: “Nós, os povos das Nações Unidas, estamos

10
Disponível em: https://www.colab.re/conteudo/papel-da-onu Acesso em: 27 nov. 2022.
11
Disponível em: https://ladiscussione.com/61182/societa/a-72-anni-dalla-dichiarazione-universale-dei-diritti-
umani-la-necessita-di-trovarne-il-perche/ Acesso em: 27 nov. 2022.
12
OAS. Carta das Nações Unidas. São Francisco, 1945. Disponível em:
https://www.oas.org/dil/port/1945%20Carta%20das%20Na%C3%A7%C3%B5es%20Unidas.pdf. Acesso em:
13
determinados a salvar as gerações futuras do flagelo da guerra, que por duas vezes em nossas
vidas trouxe dor indescritível para a humanidade.” (ONU, 1945). Esse documento passou a
vigorar em 24 de outubro de 1945, ficando estipulada como data para comemoração do Dia das
Nações Unidas.

SAIBA MAIS!
Assista ao vídeo Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto em que o
Secretário-Geral da ONU, António Guterres, declara que “O Holocausto definiu as Nações
Unidas”. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Ll_ZxkXHDug

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)

Figura 10 - Declaração Universal dos Direitos Humanos

Fonte: Página da internet, 2022.13

A partir da compreensão de que é necessária a promoção de determinados ‘direitos’


considerados ‘inalienáveis’, ou seja, que não podem ser renunciados, foi que, em 10 de
dezembro de 1948, a Assembleia Geral das Nações Unidas promulgou a Declaração Universal
dos Direitos Humanos como uma norma comum a ser alcançada por todos os povos e nações.
É estabelecida, pela primeira vez, a proteção universal dos Direitos Humanos.

27/11/2022.
13
Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/91601-declaracao-universal-dos-direitos-humanos Acesso em: 27
nov. 2022.

14
A Carta contém 30 artigos de Direitos Humanos que, pela primeira vez na história, estão
reunidos e agrupados em um mesmo documento e formam a base para uma sociedade
democrática. A referida Carta subsidiou a construção das constituições de muitas nações
democráticas, principalmente a partir das características dos Direitos Humanos descritas a
seguir:
Quadro 1 – Características dos Direitos Humanos
Características Definições
A validade dos direitos é universal, independentemente de qualquer tempo,
Universalidade
espaço e cultura.
Objetividade A definição de direitos depende de critérios objetivos e não subjetivos.
Os direitos não podem ser renunciados e vendidos pelo sujeito que os
Inalienabilidade
possui.
Inviolabilidade Os direitos não podem ser violados por terceiros.
Imprescritibilidade Os direitos não possuem prazo de validade.
Complementaridade Os direitos são complementares uns aos outros.
Fonte: Enap - EV.G, 2022. 14

VOCÊ SABIA?
De acordo com o livro dos Recordes, o Guinness, a Declaração dos Direitos Humanos
é o documento mais traduzido no mundo. Considerando a relevância desse documento, indica-
se a leitura da Declaração Universal dos Direitos Humanos, especialmente os
artigos 5°, 8°, 9° e 10 que tratam dos direitos das pessoas sujeitas à justiça criminal e
penitenciária. O material pode ser acessado pelo link: https://www.humanrights.com/what-are-
human-rights/universal-declaration-of-human-rights/preamble.html

PARA EXAMINAR!
Leia a reportagem Brasil já registra mais de mil violações de Direitos Humanos em
2022, disponível em https://observatorio3setor.org.br/noticias/brasil-ja-registra-mais-de-870-
mil-violacoes-de-direitos-humanos-em-2022/, e responda: você conhece ou já conheceu

14
ENAP – EV.G. Características dos Direitos Humanos. Disponível em:
https://cdn.evg.gov.br/cursos/607_EVG/modulo01_scorm01/scormcontent/index.html#/lessons/033fGBnys8x
AhmcfBMJm2-cyK5sFoZPK. Acesso em: 31 jan. 2023.
15
alguém que passou por uma situação de violação de direitos na sua região? Você saberia falar
sobre a situação ocorrida?

Lei Internacional dos Direitos Humanos


A Declaração Universal dos Direitos Humanos, mesmo sendo um documento amparado
por nações do mundo inteiro, não possui força de lei. O esforço então, de 1948 a 1966, foi criar
um instrumento de lei de Direitos Humanos internacional que se respaldasse na Declaração para
estabelecer mecanismos indispensáveis para seu cumprimento, desde a implementação até o
uso.
Daí nasceram dois documentos que, juntos com a DUDH, constituem o projeto de Lei
Internacional dos Direitos Humanos:
• Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP): aborda assuntos
relacionados ao direito à vida, à liberdade de expressão, à religião e à votação.
• Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC):
aborda assuntos relacionados ao direito à alimentação, à educação, à saúde e ao refúgio.
Para fazer valer tais legislações, há o Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas,
composto por peritos em Direitos Humanos, responsável por certificar que cada país signatário
desses documentos cumpra com seus termos. Tal fiscalização é realizada através da análise de
relatórios, pelo referido Comitê, enviados pelos países. Depois de análise, são emitidas
conclusões sobre se tais signatários estão cumprindo os tratados, bem como sobre o seu
funcionamento em questões da garantia dos Direitos Humanos.
Conforme acordado, esse Comitê pode investigar alegações de indivíduos e
organizações que percebam que seus direitos tenham sido violados pelo Estado. Contudo,
eles devem esgotar, antes, todo o processo de recurso legal de seu país. Após a investigação, o
Comitê emite as conclusões que possuem grande força. Se há entendimento favorável às
alegações, o Estado deve tomar providências a fim de tratar e rever o caso de abuso.
Existem mais de vinte tratados, a partir desses documentos, que focam a prevenção e a
proibição de abusos a grupos específicos:
• Refugiados: (Convenção que se Relaciona com o Estado dos Refugiados, 1951);
• Mulheres: (Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra
Mulheres, 1979);

16
• Crianças (Convenção sobre os Direitos da Criança, 1989).
Além de outros em relação à discriminação racial, à prevenção ao genocídio, aos direitos
políticos de mulheres, à proibição de escravidão e tortura.
A partir da Carta Internacional de Direitos Humanos e suas legislações, algumas regiões,
com maior representatividade de países signatários, buscaram criar seu comitê/tribunal com
fins legislativos e fiscalizatórios também. Há, portanto, instrumentos regulatórios de Direitos
Humanos na Europa, Ásia, África e América. Esse último, que interessa neste estudo, é regido
pela Convenção Americana de Direitos Humanos em vigor desde 1978. A Convenção é regida
pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados
Americanos (OEA) que, juntamente com a Corte Interamericana de Direitos Humanos
(CorteIDH), forma a instituição do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos
(SIDH).

VOCÊ SABIA?
É por meio desses instrumentos que são tornadas públicas informações sobre a
condenação do Brasil pelos órgãos internacionais de Direitos Humanos por violações de
Direitos Humanos.
• Saiba mais em: Organização dos Estados Americanos, acessando
https://www.oas.org/pt/CIDH/jsForm/?File=/pt/cidh/mandato/que.asp
• Acesse o texto integral da Convenção Americana de Direitos Humanos em:
https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm

Direitos Humanos e a Constituição Federal

TÍTULO I – Dos Princípios Fundamentais


Art. 4o A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos
seguintes princípios:
II – prevalência dos Direitos Humanos; (BRASIL, 1988).

O Brasil, enquanto signatário dos tratados nas convenções de Direitos Humanos da


ONU, a partir de 1985, passou pelo processo de redemocratização. Sua constituição foi
amparada na observação dos artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. A
Constituição Federal (CF) de 1988 caracteriza-se como o marco mais evidente desses direitos

17
no país. Nela o homem se sobrepõe ao Estado. Logo nos primeiros artigos aparecem as garantias
e os direitos fundamentais do cidadão. O princípio da cidadania, da dignidade da pessoa humana
e os valores sociais do trabalho estão inseridos já no primeiro artigo. Têm-se ainda os direitos
civis, políticos, econômicos, sociais e culturais de todos os cidadãos.
Garantias fundamentais e Direitos Humanos, que compõem a CF, possuem mesma
essência e finalidade: asseguram direitos aos cidadãos e compõem um conjunto de leis inerentes
à dignidade da pessoa humana. Assim, proporcionam aos cidadãos o direito à vida, ao trabalho,
à educação e à liberdade de opinião e expressão. Os Direitos Humanos são considerados
universais, ou seja, válidos para todos os povos e são o resultados de reivindicações produzidas
no âmbito de violações e situações de injustiça, que, de alguma forma, restringiram os direitos
básicos aos seres humanos garantidos em tratados internacionais. Os direitos fundamentais são
os firmados na Constituição Federal. Ambos possuem a mesma relevância, hierarquia e vigor
normativo. Tais direitos sustentam a democracia no país a partir das ideias de igualdade,
liberdade, reconhecimento e justiça.
O período de governo militar colocou em xeque a democracia brasileira e representou
um contexto conturbado de muita violação de direitos. A não observância e o desrespeito a
esses direitos foram elementos que também contribuíram para a inclusão das garantias
individuais e sociais presentes na Constituição Federal de 1988. Os direitos fundamentais,
amparados na Constituição, fazem com que o Brasil esteja no rol dos países com o mais
completo ordenamento jurídico em relação aos Direitos Humanos. Assim, são orientados como
política pública no país, firmados como um compromisso do Governo Federal. Entretanto,
ainda existem inúmeros desafios para realmente efetivá-los.
O relatório Estado de Direitos Humanos no Mundo 2021/202215, organizado pela
Anistia Internacional, aponta que, entre as principais falhas do Brasil em Direitos Humanos,
aparecem problemas como16:
• Alta taxa de homicídios no país, sobretudo de jovens negros;

15
SITE ANISTIA INTERNACIONAL. Informe anual 2021/2022: o estado dos Direitos Humanos no
mundo. Disponível em: https://anistia.org.br/informe-anual/informe-anual-2021-22-o-estado-dos-direitos-
humanos-no-mundo/. Acesso em: 31 jan. 2023.
16
SITE POLITIZE. Direitos Humanos no Brasil. Disponível em: https://www.politize.com.br/direitos-
humanos-no-
brasil/#:~:text=OS%20DIREITOS%20HUMANOS%20S%C3%83O%20GARANTIDOS%20PELA%20NOS
SA%20CONSTITUI%C3%87%C3%83O&text=J%C3%A1%20no%20artigo%205%C2%BA%20%C3%A9,se
jam%20eles%20individuais%20ou%20coletivos Acesso em: 31 jan. 2023.
18
• Abusos policiais e as execuções extrajudiciais, cometidas por policiais em operações
formais ou paralelas, em grupos de extermínio ou milícias;
• Crítica situação do sistema prisional;
• Vulnerabilidade dos defensores de Direitos Humanos, principalmente em questões
ambientais;
• Violência sofrida pela população indígena, sobretudo pelas falhas em políticas de
demarcação de terras;
• Várias formas de violência contra as mulheres;
• Insegurança alimentar; e
• Falta de proteção e assistência social ao público LGBTQIA+.
Desse modo, a Constituição se consagra como um documento de altíssimo nível na
busca pela garantia aos Direitos Humanos. Seu artigo 5º enfatiza os direitos, as liberdades e as
garantias individuais e o 7º dá ênfase aos direitos sociais. Falta, portanto, realmente colocá-los
em prática de forma a atender a todos e todas.
Até mesmo porque, ao se considerar um Estado Democrático de Direito, o Brasil deve
ter como mola propulsora a realização do bem-estar do ser humano e o respeito por sua
dignidade. A avaliação da evolução de uma sociedade perpassa justamente no quanto
efetivamente consegue-se proteger e promover a dignidade humana de seu povo.

SAIBA MAIS!
• Leia mais em Direitos Humanos na Constituição Brasileira de 1988, disponível em:
http://www.dhnet.org.br/direitos/anthistbr/redemocratizacao1988/dh_constituicao_88.
htm
• Acesse https://www.justica.pr.gov.br/Pagina/Declaracao-Universal-e-Constituicao-de-
1988 e conheça os correspondentes de cada artigo da Declaração Universal dos Direitos
Humanos na Constituição de 1988.

PARA EXAMINAR!
Acesse o link https://g1.globo.com/jornal-nacional/brasil-em-
constituicao/playlist/brasil-em-constituicao-veja-todos-os-videos-da-serie-especial-do-jornal-
nacional.ghtml, assista à série ‘Brasil em Constituição’ e analise os casos em que cidadãos
tiveram seus direitos, garantidos pela Constituição, violados.

19
UNIDADE 2: O PRINCÍPIO DA HUMANIDADE DA PENA

TÓPICOS DA AULA:

• Humanização do Sistema Penitenciário: Aspectos gerais do Brasil e de Minas Gerais;


• Lei nº 7.210/1984 – Lei de Execução Penal e Lei Estadual Normas de Execução Penal
(11.404/94): Uma reflexão sobre aspectos humanizadores;
• Regras mínimas para tratamento de reclusos;
• Regras de Mandela;
• Princípios e boas práticas para a proteção das pessoas privadas de liberdade nas
Américas (Resolução CIDH 01/08);
• Regras Internacionais para enfrentamento da tortura e maus tratos;
• Prevenção e combate à tortura.

PARA PENSAR!
O que você entende sobre o princípio da humanidade da pena se todos e todas que se
encontram em privação de liberdade são seres humanos? Já não seria uma coisa óbvia?

O princípio da humanidade da pena surge a partir de reflexões e discussões acerca das


penas aplicadas desde a Antiguidade até os fins da Idade Média, quando passou a prevalecer a
racionalidade no modo de pensar o ser humano. Sabe-se que a punição era aplicada unicamente
como um ato de vingança e não era observada a dignidade da pessoa humana. As penas, cruéis
e degradantes, que acometiam o corpo dos condenados, sujeitos às mais variadas formas de
tortura, passaram a causar repulsa.
Cesare Beccaria, em 1764, através do livro ‘Dos delitos e das penas’ (BECCARIA,
2011) expôs que a pena não poderia ultrapassar o corpo do indivíduo, ou seja, sua dignidade
existencial, sendo esse o limite a ser respeitado.
Portanto, tal princípio encontra respaldo na Declaração Universal dos Direitos Humanos
ao não aceitar a aplicação de penas cruéis às pessoas condenadas, garantindo-lhes que o direito
cerceado, devido à responsabilização pelos seus atos praticados, considerados crimes, seja
somente aquele restringido pela pena que, no caso brasileiro, é a privação de liberdade.
A pessoa em cumprimento de pena, por ser um humano, permanece com garantias de
20
acesso a todos os outros Direitos Humanos declarados nos tratados nacionais e internacionais,
os quais devem ser observados.

Humanização do sistema penitenciário: Aspectos gerais do Brasil e de Minas Gerais


Pensar na humanização do sistema penitenciário, entendendo que esse sistema tem uma
função social e enxergando o sujeito em privação de liberdade como ser humano que está sob
os cuidados do Estado e que, portanto, deve ter acesso aos meios de garantia de sua vida, eleva
a sociedade como um todo a um alto padrão civilizatório. Nessa perspectiva, toda a lógica de
funcionamento do sistema prisional deve estar inserida no contexto dos Direitos Humanos e,
assim, ser orientada sempre para a promoção de formas humanizadas de cumprimento da pena.
Tal condição possibilita colocar as prisões em um contexto ético que respeita a
humanidade de todas as pessoas inseridas em uma unidade prisional: sujeitos em situação de
privação de liberdade, servidores penitenciários, visitantes, prestadores de serviços diversos etc.
Tal contexto ético precisa ser universal em sua aplicabilidade, ou seja, abarcar o compromisso
de toda a comunidade envolvida com a questão penitenciária. Para tanto, tem-se os instrumento
internacionais e nacionais de Direitos Humanos que proporcionam essa universalidade e
subsidiam as legislações que regem a execução da pena.
Conforme Foucault (2008), nas mãos do Estado se concentra a aplicação da punição,
tornando o direito de punir, através da pena privativa de liberdade, seu fundamento jurídico.
Pelas vias democráticas, cada cidadão concede ao Estado parte de sua autonomia de vingança,
de modo que ele delibere a punição mais cabível para o bem social. E esse direito de punir,
centralizado no Estado, é amparado nas normas constantes em leis que regem o sistema de
justiça criminal e penitenciário.

Com a promulgação da Constituição de 1988 e a sua similar em Minas Gerais de 1989,


o sistema penitenciário passa a ser pressionado por um lado pela perspectiva de
humanização do sistema a partir dos parâmetros democráticos emanados do contexto,
com a defesa dos direitos humanos e reformas institucionais na área da justiça e
segurança pública. (CRUZ et al., 2021, p. 09).

Portanto, enquanto signatário dos tratados de garantias de Direitos Humanos, o Brasil


busca efetivá-los no interior do cárcere a partir de leis que prezam a observação desses direitos.
A própria CF trata de estabelecer direitos e garantias individuais e fixa limites à pretensão
punitiva do Estado. Assim também o Estado de Minas Gerais, mesmo autônomo na gestão,
21
segue os principais regulamentos que orientam as políticas públicas de execução penal. Mesmo
que, por muitas vezes, ainda não é possível vislumbrar a efetivação desses direitos para além
do que está no papel.

ATENÇÃO!
Ao se pensar no trabalho penitenciário, tendo como orientação sua humanização e a
prática na perspectiva da ética e garantia dos Direitos Humanos, a primeira pergunta que sempre
se deve fazer é: ‘O que estou fazendo é correto?’

Lei nº 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) e Lei n° 11.404/1994 (Lei Estadual Normas de
Execução Penal): Uma reflexão sobre aspectos históricos e humanizadores
Considerada como uma das legislações penais mais avançadas em relação à observância
da condução da pena nos princípios da humanidade da pessoa reclusa, a Lei de Execução Penal
(LEP) brasileira trata dos direitos e deveres da pessoa presa (condenado e internado), de modo
a gerenciar o seu período de reclusão e prepará-lo para a ‘harmônica integração social’. É
regulada pelos princípios da legalidade, da igualdade, da jurisdicionalidade, do contraditório,
da humanização da pena, da proporcionalidade, da publicidade e da individualização da pena.
Essa lei reconhece a pessoa em privação de liberdade, bem como o egresso, como sujeito
de direitos e se encarrega dos princípios e das regras referentes à execução das penas e das
medidas de segurança no Brasil, conforme se observa já em seu 1º artigo ao estabelecer seu
objetivo: “efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições
para a harmônica integração social do condenado e do internado”. (BRASIL, 1984).
Ao propor essa dimensão de se preocupar com o retorno do recluso ao meio social
externo, a partir da compreensão de sua humanidade, a LEP estabelece uma série de assistências
que devem ser garantidas a fim de se propiciar a manutenção da vida desse sujeito, bem como
assegurar que sua dignidade humana seja resguardada. São elas: material, à saúde, jurídica,
educacional, social e religiosa.
O artigo 41 trata do que são direitos do preso:

I - alimentação suficiente e vestuário;


II - atribuição de trabalho e sua remuneração;
III - Previdência Social;
IV - constituição de pecúlio;

22
V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a
recreação;
VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas
anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;
VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;
VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;
XI - chamamento nominal;
XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena;
XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento;
XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;
XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e
de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes;
XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade
da autoridade judiciária competente. (BRASIL, 1984).

Conforme Amaral (2016), a LEP significa incontestável avanço em questões


democráticas, humanas e direitos, antes mesmo da promulgação da Constituição Federal de
1988 e justamente no momento em que o país passava pelo processo de redemocratização, ainda
sem conclusão. Para o autor, tal lei

[...] efetivamente judicializou execução penal: reconhecendo ao condenado a


condição de sujeito de direitos; afirmando a necessidade de título executivo penal
(sentença penal condenatória definitiva ou absolutória imprópria definitiva) para o
processo executivo, reconhecendo o direito às assistências em favor dos presos;
estabelecendo infrações disciplinares, inclusive em graus; disciplinando competências
para o juiz da execução e atribuições aos demais órgãos que interagem no processo de
execução; regrando o sistema progressivo de cumprimento de penas privativas de
liberdade, o livramento condicional, as saídas temporárias e o sursis, dispondo sobre
os tipos de estabelecimentos penais; prevendo formas de diminuição do tempo de
encarceramento (por exemplo, através da remição pelo trabalho); e disciplinando o
cumprimento de medidas de segurança. (AMARAL, 2016, p.31-132)

Entram em vigor garantias legais que subsidiam uma execução penal definitivamente
humanizada, impelindo o Estado, portanto, a cumprir com a obrigação de ofertar condições
mínimas de existência aos que cumprem suas penas bem como garantir suas vidas.
A conjuntura democrática alimentada pela CF ratificou o discurso dos Direitos
Humanos para as pessoas em privação e restrição de liberdade. Nesse sentido, os legisladores
mineiros foram compelidos a tecer, no texto constitucional do Estado, princípios mínimos de
tratamento do recluso em consonância com a LEP. Tal feito se mostrou nas preocupações
iniciais em suprir o preso com assistências de educação e saúde no interior das unidades
prisionais.
Tal contexto desembocou, no âmbito estadual mineiro, na Lei Estadual Normas de
23
Execução Penal (11.404/94) que apresenta de forma clara seus objetivos em conformidade com
os direitos da pessoa em privação e restrição de liberdade. Os artigos a seguir demonstram essa
orientação:

Art. 2º A execução penal destina-se à reeducação do sentenciado e à sua reintegração


na sociedade.
Parágrafo único - A execução penal visa, ainda, a prevenir a reincidência, para
proteção e defesa da sociedade.
Art. 3º Ao sentenciado é garantido o exercício de seus direitos civis, políticos, sociais
e econômicos, exceto os que forem incompatíveis com a detenção ou com a
condenação.
Art. 4º No regime e no tratamento penitenciário serão observados o respeito e a
proteção aos direitos do homem. (MINAS GERAIS, 1994).

Importante destacar o movimento do estado mineiro em efetivar a garantia dos direitos


previstos na Lei de Execução Penal estadual e nacional. Assim, Cruz et al. (2021) relatam que
é implantado, no início dos anos 2000, o Plano de Humanização dos Estabelecimentos
Penitenciários de Minas Gerais, com 12 projetos focados na recuperação social, educacional e
profissional dos indivíduos privados de liberdade, bem como na formação e na capacitação dos
agentes penitenciários/policiais penais. É colocado em ação o Projeto Perspectiva, com o intuito
de ampliar o acesso dos presos à administração penitenciária. Esse projeto se constituiu em um
período de ampliação do sistema prisional, com muito investimento e ações focadas na garantia
de direitos do preso, objetivando sua reintegração social.

PARA PENSAR!
Conforme Amaral (2016, p.184):

Uma sociedade e um Estado que ainda não percebem o preso como tal, isto é, que não
o enxergam como ser humano, correm o risco de retroceder a uma época em que a
humanização do direito penitenciário pertencia à categoria de
costumes ou praxes administrativas. A valorização dos direitos dos reclusos é de
algum modo reflexo do movimento geral de defesa dos direitos fundamentais.

ATENÇÃO!
Todo o movimento de humanização do sistema prisional nasce com o reconhecimento
da pessoa privada de liberdade como um sujeito de direitos. Nesse sentido, um documento
propulsor dessa guinada de entendimento é o intitulado Regras Mínimas para tratamento de
reclusos, de 1955, atualizadas no ano de 2015 com o nome Regras de Mandela. Recomendamos
24
que você leia esse documento, pois ele é um importante fundamento que embasa as práticas
prisionais. Acesse-o em https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/2019/09/a9426e51735a4d0d8501f06a4ba8b4de.pdf

Regras mínimas para tratamento de reclusos – Regras de Mandela

Figura 11 - Nelson Mandela (1918-2013)

Fonte: Página do CNJ no Facebook, 202217

O primeiro documento adotado pelas Nações Unidas, no que se refere ao tratamento


destinado às pessoas em situação de restrição e privação de liberdade, data de 1955 quando da
realização do 1º Congresso das Nações Unidas sobre Prevenção do Crime e Tratamento de
Delinquentes, realizado em Genebra. Intitulado Regras Mínimas para Tratamento de
Prisioneiros, foi aprovado pelo Conselho Econômico e Social da ONU através da sua resolução
663 C I (XXIV), de 31 de julho de 1957. Quase 30 anos após a aprovação das regras, o Conselho
Econômico e Social da ONU, através da resolução 1984/47 de 25 de maio de 1984, aprovou
treze procedimentos para a aplicação efetiva das Regras Mínimas.18
Após 55 anos de uso do referido documento como um aporte orientador e estruturador
da justiça criminal e penal dos Estados-Membros da ONU, percebeu-se a necessidade de revisão

17
Disponível em: https://www.facebook.com/cnj.oficial/posts/4183278961744832/ Acesso em: 31 jan. 2023.
18
SITE DHNET. Regras Mínimas para Tratamento de Prisioneiros. Disponível em:
http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/fpena/lex52.htm Acesso em: 07 fev. 2023.
25
e atualização das regras, tendo em vista o atual contexto da sociedade mundial como um todo
e suas novas demandas no campo carcerário, bem como adequações de terminologias e
conceitos condizentes com o avanço dos estudos nessa temática. Nesse sentido, em 2015 foi
aprovado o documento intitulado Regras de Mandela - Regras Mínimas para Tratamento de
Reclusos.19
O nome Regras de Mandela foi escolhido a fim de que as regras sejam conhecidas para
“honrar o legado do ex-presidente da África do Sul, Nelson Rolihlahla Mandela, que passou 27
anos na prisão durante sua luta pelos Direitos Humanos globais, pela igualdade, pela
democracia e pela promoção da cultura de paz.” (BRASIL, 2016a, p.18).

O que são e qual é o foco das Regras de Mandela?


Trata-se de um conjunto de diretrizes mínimas a serem consideradas pelo Estado no que
tange à justiça criminal e à gestão de políticas penais. O foco está na garantia de direitos e na
busca por assegurar tratamento digno às pessoas em situação de privação de liberdade.

Qual o objetivo principal das Regras de Mandela?


Sem a pretensão de se firmar como um modelo de sistema prisional, as regras “buscam
somente, com base no consenso geral do pensamento contemporâneo e nos elementos
essenciais dos mais adequados sistemas de hoje, estabelecer os bons princípios e práticas no
tratamento de presos e na gestão prisional.” (BRASIL, 2016a, p.20)
É consenso que, para constituir um sistema prisional seguro e que possibilite a
permanente socialização das pessoas reclusas, objetivando seu retorno ao convívio social
aberto, é necessário que a equipe de gestão e funcional das unidades prisionais também tenham
condições de trabalho. Nesse sentido, importante enfatizar as Regras 74 a 82, as quais dizem
respeito aos Funcionários da unidade prisional e trazem uma série de aspectos a serem
observados, tais como: processo seletivo criterioso quanto ao perfil desejado para a função;
meios de informação eficazes que possibilitem a conscientização do corpo funcional e opinião
pública acerca da relevância social do trabalho penitenciário; funcionários da segurança no
regime de dedicação exclusiva, incluídos na categoria de servidores públicos e estáveis, com
bons salários, condições e meios para exercerem as funções de forma profissional; formação

19
CNJ. Regras de Mandela. Brasília, 2016. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/2019/09/a9426e51735a4d0d8501f06a4ba8b4de.pdf Acesso em: 07/02/2023.
26
inicial e continuada com indicação dos principais conteúdos que devem constar nas matrizes
curriculares dos cursos; treinamento para trabalho com grupos específicos de reclusos;
orientação para o comportamento e a execução de atividades de forma que exerçam boa
influência sobre os presos, sendo exemplos e que mereçam seu respeito; especificidades para
cargos de direção; uso de armas e uso correto necessário da força. (BRASIL, 2016a).

PARA EXAMINAR!
Como visto, as Regras de Mandela foram uma atualização das regras publicadas em
1955 com o objetivo de torná-las mais condizentes com o que o momento contemporâneo
requer e as demandas de adequação quanto aos conceitos e às terminologias atuais usados no
campo da justiça criminal e política penal.
Leia os dois documentos ‘Regras Mínimas para Tratamento de Prisioneiros’ e ‘Regras de
Mandela’, comparando-os, e busque pelas principais adequações realizadas, conceitos
atualizados e os objetivos dessas mudanças ou acréscimos. Procure relacioná-los com seus
conhecimentos prévios sobre o sistema prisional do Brasil e indique aquilo que você considera
que ainda não é observado pelo Estado brasileiro.

VOCÊ SABIA?
O dia 18 de julho é designado como o Dia Internacional Nelson Mandela e, com a
publicação das Regras de Mandela, foi ampliado seu escopo para também ser reconhecido como
o Dia Mandela de Direitos dos Presos,

com o objetivo de promover condições humanitárias de encarceramento, de


conscientizar para o fato de que os presos são membros permanentes da sociedade e
de valorizar o trabalho dos funcionários de serviços penais como um serviço social de
particular importância [...] (BRASIL, 2016a, p.18, grifo nosso)

Nesse sentido, o documento conclama os Estados-Membros e as organizações das Nações


Unidas, de uma forma geral, a celebrarem a ocasião desse dia de forma condizente com sua
relevância.

27
Princípios e boas práticas para a proteção das pessoas privadas de liberdade nas Américas
(Resolução CIDH 01/08)
No intuito de primar pelos regramentos de atenção às pessoas reclusas com observância
das especificidades no âmbito das Américas, em 13 de março de 2008, por meio da resolução
1/08, foram aprovados os Princípios e Boas Práticas sobre a Proteção das Pessoas Privadas
de Liberdade nas Américas20 pela Relatoria Especial sobre os Direitos das Pessoas Privadas de
Liberdade, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
O documento enfatiza que os Princípios têm como finalidade proteger pessoas (adultas
e menores de idade) contra formas de violência, das mais diversas, por quaisquer que sejam os
motivos. Apresenta princícios gerais e relativos às condições de privação de liberdade, bem
como aqueles relativos aos sistemas de reclusão, destacando, dentre outras, as temáticas:
igualdade e não discriminação, práticas humanizadas, liberdade pessoal, imparcialidade,
legalidade e devido processo legal.
Ao se respaldar em documentos e tratados internacionais e na legislação interamericana
sobre Direitos Humanos, esse documento apresenta um conjunto de direitos e garantias
fundamentais já reconhecidos. Além disso, traz sugestões de boas práticas, ações preventivas e
de proteção às pessoas em situaçao de restrição e privação de liberdade aplicáveis em diversas
conjunturas.
Trata-se de um instrumento mais amplo no entendimento do que seja privação de
liberdade:

Qualquer forma de detenção, encarceramento, institucionalização ou custódia de uma


pessoa, por razões de assistência humanitária, tratamento, tutela ou proteção, ou por
delitos e infrações à lei, ordenada por uma autoridade judicial ou administrativa ou
qualquer outra autoridade, ou sob seu controle de facto, numa instituição pública ou
privada em que não tenha liberdade de locomoção. Incluem‐ se nessa categoria não
somente as pessoas privadas de liberdade por delitos ou infrações e descumprimento
da lei, independentemente de terem sido processadas ou condenadas, mas também
aquelas que estejam sob a custódia e a responsabilidade de certas instituições, tais
como hospitais psiquiátricos e outros estabelecimentos para pessoas com deficiência
física, mental ou sensorial; instituições para crianças e idosos; centros para migrantes,
refugiados, solicitantes de asilo ou refúgio, apátridas e indocumentados; e qualquer
outra instituição similar destinada a pessoas privadas de liberdade. (CIDH, 2008, p.1)

Portanto, o documento inclui pessoas em privação de liberdade por questões

20
OAS. Princípios e boas práticas para a proteção das pessoas privadas de liberdade nas américas. 2009.
Disponível em: https://www.cidh.oas.org/pdf%20files/PRINCIPIOS%20PORT.pdf Acesso em: 07 fev. 2023.
28
relacionadas a conflitos com a lei ou por motivos humanitários e de proteção.
Apesar de ser um documento importante em sua integralidade, para o nosso estudo é
relevante enfatizar o caso da excepcionalidade da pena privativa de liberdade, ou seja, a prisão
não deve ser a regra, mas sim exceção. E, para isso, deve-se adotar, em dispositivos legais, uma
série de medidas alternativas ou substitutivas da privação de liberdade, respaldadas em normas
internacionais sobre Direitos Humanos. Esse princípio invoca aos Estados-Membros a
promoção da participação da sociedade e da família na aplicação das medidas.

ATENÇÃO!
Uma ação que exemplifica a aplicação dos príncipios e boas práticas para a proteção de
pessoas privadas de liberdade, conforme o documento acima citado, são as Audiências de
Custódia implementadas em 2015, oficialmente, pelo Judiciário brasileiro, através de termos
de cooperação técnica entre o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e os tribunais do país.
Constituem-se na apresentação da pessoa presa, em audiência, a um juiz no prazo de até 24h,
com a presença do Ministério Público, Defensoria Pública ou advogado do preso.
Nas audiências, há análise do juiz acerca do aspecto legal e regular da prisão em
flagrante, bem como de sua necessidade e adequação; se caberá aplicação de alguma medida
cautelar e qual seria a mais apropriada; eventual concessão de liberdade, que pode ser
acompanhada de outras medidas cautelares, dentre outros. Além de se avaliar eventuais
episódios de tortura ou maus-tratos, dentre outras irregularidades.
Desde o ano de 2019, as ações acerca das audiências de custódia estão inseridas no
programa Fazendo Justiça, fruto da parceria entre o Conselho Nacional de Justiça e o Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento, com o apoio do Ministério da Justiça e Segurança
Pública e executadas em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime.21

As audiências de custódia constituem uma das mais importantes políticas públicas


implantadas no Brasil para enfrentar graves violações de direitos humanos, como a
prisão arbitrária e a tortura. Com sua implantação, o Poder Judiciário vem dar
cumprimento a uma obrigação imposta pelo direito internacional dos Direitos
Humanos e pôr fim a uma mora que se estendia por mais de 25 anos. (BRASIL, 2020,
p.4).

21
SITE CNJ. Audiências de Custódia. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario/audiencia-de-
custodia/ Acesso em: 07 fev. 2023.
29
SAIBA MAIS!
Para saber mais sobre essa ação e seus avanços desde a implementação, acesse e leia os
documentos disponíveis em:
• LEI Nº 13.964, DE 24 DE DEZEMBRO DE 2019_Aperfeiçoa a legislação penal e
processual penal_Audiência de Custódia
• Relatório_Audiência de Custódia 6 anos
• Manual de prevenção e combate à tortura e maus-tratos para Audiência de Custódia
• Manual de princípios básicos e práticas promissoras sobre alternativas à prisão
Assista também ao vídeo disponível em Em 06 anos audiência de custódia consegue
reduzir o número de presos provisórios em 10%
Ainda no âmbito de princípios e boas práticas, há que se enfatizar a ideia da Justiça
Restaurativa, que representa uma guinada no entendimento do crime enquanto fenônemo social.
Assim, ofensor, vítima e comunidade se envolvem na resolução de conflitos e responsabilização
do infrator. Leia o Manual sobre Programas de Justiça Restaurativa, acessando o link
https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2021/09/manual-sobre-programas-de-justica-
restaurativa.pdf e para entender como essa abordagem é promissora no que tange à promoção
da cultura de paz no sistema de justiça criminal.

Regras internacionais para enfrentamento da tortura e maus-tratos

PARA EXAMINAR!
Figura 12 – Campanha da Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Fonte: Página do Twitter da CIDH, 201822.

22
Disponível em: https://twitter.com/cidh_pt Acesso em 07 fev. 2023.
30
Com esse post em sua página do Twitter (datado de 27/06/2018), a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) chamou a atenção para o fato de que, passados
70 anos da Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH) e seus avanços no combate e
penalização da tortura e maus-tratos, bem como a implantação de sistemas de prevenção, a
tortura ainda existe, salientando que a impunidade é uma realidade nessa questão.
O post compartilha link para uma matéria23 da página da Organização dos Estados
Americanos (OEA) que, dentre outros pontos, aborda a importância da Convenção das Nações
Unidas contra a tortura de 1984 que, até o ano de 2018, possuía a ratificação de 163 países, ou
seja, esses países se tornaram signatários e implementaram legislações para o devido
cumprimento. Destaca-se, ainda, a importância de se conceber a tortura como crime.

Os documentos internacionais que se constituem como regras para o enfrentamento da


tortura e maus-tratos são, portanto, fruto de um esforço desde a DUDH que, em seu artigo 5º,
estabelece que “ninguém será submetido a tortura, nem a penas ou tratamento cruéis,
desumanos ou degradantes.” Salienta-se que, como país signatário, a Constituição Brasileira
também proíbe tal ato, discriminado no artigo 5º da CF/88:

III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;


(...)
XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a
prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os
definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores
e os que, podendo evitá-los, se omitirem. (BRASIL, 1988).

Quais seriam, então, esses instrumentos e como definem a tortura?


Tanto a Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos
ou degradantes da ONU quanto a Convenção interamericana para prevenir e punir a tortura
da Organização dos Estados Americanos (OEA) trazem a concepção e definição de tortura.
• Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou
degradantes – adotada pela Resolução 39/46, da Assembleia Geral das Nações Unidas,

23
Leia a matéria completa em: https://www.oas.org/pt/cidh/prensa/notas/2018/136.asp

31
em 10 de dezembro de 1984.24 (Ratificada, em legislação brasileira, pelo Decreto nº 40,
de 15/02/1991).

Art. 1º. Para os fins desta Convenção, o termo "tortura" designa qualquer ato pelo qual
uma violenta dor ou sofrimento, físico ou mental, é infligido intencionalmente a uma
pessoa, com o fim de se obter dela ou de uma terceira pessoa informações ou
confissão; de puni-la por um ato que ela ou uma terceira pessoa tenha cometido ou
seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir ela ou uma terceira pessoa; ou
por qualquer razão baseada em discriminação de qualquer espécie, quando tal dor ou
sofrimento é imposto por um funcionário público ou por outra pessoa atuando no
exercício de funções públicas, ou ainda por instigação dele ou com o seu
consentimento ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou
sofrimentos que sejam consequência, inerentes ou decorrentes de sanções legítimas.
(ONU, 1984).

Esse regramento, composto por 33 artigos, estabelece compromissos que devem ser
observados pelos Estados-Membros, principalmente, em se estabelecer a prática de tortura
como crime em suas legislações penais. Possui como premissa garantir que atos de tortura e/ou
maus-tratos não sejam mais utilizados como mecanismos de política de Estado. Principalmente
em se tratando de ditaduras e regimes autoritários estabelecidos após a 2ª Guerra Mundial. Não
se esquivando dos regimes democráticos em que, muitas vezes, os discursos acerca da
segurança descaracterizam a dignidade da pessoa humana enquanto princípio.
Aqui, podem-se destacar três aspectos centrais que caracterizam a tortura:
(1) é qualquer ato que inflige violenta dor ou sofrimento físico ou mental.
(2) há uma intencionalidade na prática do ato, que pode ter por motivação:
- Obtenção de informação ou confissão pela vítima.
- Castigo à vítima que supostamente cometeu algo.
- Intimidação e coerção da vítima.
(3) Discriminação de qualquer tipo:
- é praticado por agente público, ou pessoa em exercício de funções públicas, ou por sua
instigação com seu consentimento.
• Convenção interamericana para prevenir e punir a tortura – adotada pelo XV Período
Ordinário de Sessões da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos 25.

24
SITE DHNET. Convenção contra a tortura e outro tratamentos ou penas cruéis, desumanos
ou degradantes. 1984. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/tortura/lex221.htm Acesso em:
31 jan. 2023.
25
OEA. Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura. Colômbia, 1985. Disponível em:
https://www.oas.org/pt/cidh/mandato/basicos/tortura.pdf Acesso em: 31 nov. 2022.
32
(Ratificada, em legislação brasileira, pelo Decreto nº 98.386, de 09/12/1989).
Art. 2º. Para os efeitos desta Convenção, entender-se-á por tortura todo ato pelo qual
são infligidos intencionalmente a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais,
com fins de investigação criminal, como meio de intimidação, como castigo pessoal,
como medida preventiva, como pena ou com qualquer outro fim. Entender-se-á
também como tortura a aplicação, sobre uma pessoa, de métodos tendentes a anular a
personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não
causem dor física ou angústia psíquica. (OEA, 1985).

Tal documento, composto de 24 artigos, prevê uma série de medidas a serem tomadas
pelos Estados-Membros, visando a prevenção e o combate à tortura. Nota-se, através do excerto
citado, que há uma ampliação do conceito, em relação ao conceito da Convenção da ONU, ao
se estabelecer como consequência da tortura “penas ou sofrimentos físicos ou mentais”. Há
também a preocupação em garantir as alegações das vítimas sem que seja necessária a
submissão à análise clínica para confirmação.
Indica a finalidade da prática da tortura ao sublinhar o uso pelo aparato de Segurança
Pública e do Sistema de Justiça “com fins de investigação criminal, como meio de intimidação,
como castigo pessoal, como medida preventiva, como pena ou com qualquer outro fim.” Nesse
bojo, considera também a coparticição de cúmplices não servidores públicos, sendo esses que,
conforme a Convenção, praticam mais atos de ação e omissão. Em seu artigo 3º, diz: “Os
empregados ou funcionários públicos que, atuando nesse caráter, ordenem sua comissão
[tortura] ou instiguem ou induzam a ela, cometam-no diretamente ou, podendo impedi-lo, não
o façam.”
• Protocolo facultativo à Convenção da ONU contra a tortura (OPCAT)26 – adotado pela
Assembleia Geral em dezembro de 2002, passou a vigorar em junho de 2006.
(Ratificado, em legislação brasileira, pelo Decreto nº 6.085, de 19/04/2007).
A partir de sua adoção, dois novos atores surgiram no campo da prevenção à tortura: o
Subcomitê de Prevenção da Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou
Degradantes (SPT), órgão previsto no tratado estabelecido pelo OPCAT, e os Mecanismos
Preventivos Nacionais (MPN). Para além de definir o conceito de tortura, o Protocolo,
organizado em 37 artigos, estabelece medidas adicionais às que constam da Convenção da
ONU, com foco na prevenção. Define em seu artigo 1º, o objetivo de

26
CIDH. Protocolo Facultativo à Convenção da ONU contra a Tortura - Manual de Implementação. 2010.
Disponível em: https://www.corteidh.or.cr/tablas/27987.pdf Acesso em: 06 fev. 2023.
33
Estabelecer um sistema de visitas regulares efetuadas por órgãos nacionais e
internacionais independentes a lugares onde pessoas são privadas de sua liberdade,
com a intenção de prevenir a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos
ou degradantes. (CIDH, 2010, p. 44).

Tais documentos, ratificados pelo Brasil, levaram à aprovação da Lei nº 12.847, de


02/08/2013, a qual instituiu o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.
Ressalta-se que os países signatários da Convenção da ONU têm a obrigação de adotar
medidas eficazes de prevenção à prática da tortura em todas as esferas (legislativo,
administrativo e judicial). Devem tipificar a tortura como crime, além de fornecer o devido
amparo às vítimas que a sofreram, por meio de ações como: proteção à vítima e testemunhas,
direito de apresentação de queixa, rapidez e imparcialidade das autoridades frente à denúncia,
exclusão de provas e/ou declarações obtidas através da tortura, indenização das vítimas e seus
dependentes.

PARA PENSAR!
Como você acha que é a situação do Brasil frente a esses mecanismos internacionais,
principalmente os de fiscalização? Alguns casos poderão ajudar você a refletir sobre esse
assunto:
1. Sob o título ONU: impunidade por tortura nas prisões é regra no Brasil, a matéria27
da Revista Exame, realizada em 2017, apresenta uma entrevista com o Representante do Alto
Comissariado da ONU para os Direitos Humanos que, após visitar, juntamente com outros
especialistas da ONU, as unidades prisionais do Brasil concluiu que a falta de investigações
induz o aumento da violência e violações de direitos. A comitiva constatou um cenário
generalizado de tortura, desde o momento da detenção, durante interrogatórios e no
cumprimento da pena privativa de liberdade. Leia a matéria e faça uma relação dos aspectos
que levaram a Comitiva a considerar atos de tortura, quais foram as práticas, as consequências
dessas práticas e se houve a responsabilização das pessoas que cometeram ou não. Caso não
tenha tido a responsabilização, descreva o motivo que você considera para existência da
impunidade.
2. Uma matéria28 no site das Nações Unidas na América do Sul, sob o título Prevenção

27
REVISTA EXAME. ONU: impunidade por tortura nas prisões é regra no Brasil.Disponível em:
https://exame.com/brasil/onu-impunidade-por-tortura-nas-prisoes-e-regra-no-brasil/ Acesso em 31/11/2022.
28
SITE ACNUDH. Prevenção da tortura: especialistas em Direitos Humanos da ONU pedem ao Brasil que
34
da tortura: especialistas em Direitos Humanos da ONU pedem ao Brasil que cumpra as suas
obrigações legais internacionais, relata que tais especialistas estão profundamente preocupados
com o veto, pelo Governador de São Paulo, da lei N ° 1257, que estabelece um mecanismo
antitortura no Estado. Enfatizam que o Brasil, enquanto signatário dos tratados acerca do
combate e da prevenção da tortura, tem a obrigação de cumprir o acordo e que esperam que o
governo de São Paulo reveja tal decisão. Leia a matéria e, em seguida, o que diz a lei citada e
procure saber se houve reversão do veto ou não. Além disso, analise se as observações dos
especialistas da ONU foram ou não pertinentes.

Prevenção e combate à tortura


A tortura é proibida, no Brasil, através da Constituição Federal, tipificada como um
crime insuscetível a anistias ou a fiança, definida pela Lei nº 9.455/1997. Contudo, há relatos e
indícios da prática da tortura na sociedade brasileira. Certos grupos são vulneráveis à tais
práticas, como negros, população LGBTQIA+, mulheres, pessoas privadas de liberdade,
crianças e adolescentes, pessoas com transtornos mentais e idosas.

SAIBA MAIS!
A reportagem Em três anos, denúncias de tortura e maus-tratos no sistema prisional do
DF cresceram 3.600%, diz levantamento, disponível em https://g1.globo.com/df/distrito-
federal/noticia/2022/02/03/em-tres-anos-denuncias-de-tortura-e-maus-tratos-no-sistema-
prisional-do-df-cresceram-3600percent-diz-levantamento.ghtml, apresenta um exemplo de
casos de tortura no sistema prisional.

São importantes os canais de denúncias, a sistematização de informação e dados sobre


a conceituação do que seja a tortura para se estabelecer plano e ações para seu enfrentamento.
Com recorte no sistema prisional, serão abordados os mecanismos de prevenção e combate à
tortura no Brasil, a começar pela lei que a torna crime.

cumpra as suas obrigações legais internacionais. Genebra, 2019. Disponível em: https://acnudh.org/pt-
br/prevencao-da-tortura-especialistas-em-direitos-humanos-da-onu-pedem-ao-brasil-que-cumpra-as-suas-
obrigacoes-legais-internacionais/ Acesso em: 06 dez. 2022.
35
Lei nº 9.455/1997 – define e tipifica o crime de tortura
A partir da CF e demais regramentos internacionais que tratam da tortura enquanto
crime, anteriormente abordados, houve a necessidade de criação da lei específica para essa
questão. Então foi tipificado o crime de tortura na Lei nº 9.455, de 07/04/1997 que apresenta:

Art. 1º Constitui crime de tortura:


I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe
sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira
pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência
ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo
pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena - reclusão, de dois a oito anos.
§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de
segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto
em lei ou não resultante de medida legal.
§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evita-las
ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos.
§ 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão
de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.
§ 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço:
I - se o crime é cometido por agente público;
II – se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência,
adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos;
III - se o crime é cometido mediante sequestro.
§ 5º A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a
interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.
§ 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.
§ 7º O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o
cumprimento da pena em regime fechado. (BRASIL, 1997).

ATENÇÃO!
Observe que o estabelecido como tortura nas convenções da ONU e OEA difere da
tipificação do crime de tortura no Brasil, que não reservou a exclusividade da prática a agentes
públicos, ou em função pública. Ou seja, a lei estabelece que a prática de tortura pode ser
cometida por qualquer pessoa. Portanto, no Brasil, a tortura não é realizada somente por agentes
públicos, no entanto à estes é atribuído agravante da pena e perda do cargo, função ou emprego
público e a interdição para seu exercício.

36
Crime de tortura cometido por agentes públicos e pessoas comuns e a aplicabilidade da
lei
O que difere a aplicabilidade da pena em crimes de tortura cometidos por agentes
públicos e pessoas comuns? A diferença está que o agente público terá um agravante, recebendo
um aumento da pena de um sexto até um terço do total estipulado. A lei do crime de tortura
reforça o já constante na CF de que tal crime é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.
Importante também diferenciar maus-tratos de tortura. Maus-tratos, de acordo com o
Código Penal artigo 136, é definido como:

Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância,
para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a da alimentação
ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado,
quer abusando de meios de correção ou disciplina:
Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa.
§ 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
§ 2º Se resulta a morte:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
§ 3º Aumenta-se a pena de um terço, se o crime é praticado contra pessoa menor de
14 (catorze) anos. (BRASIL, 1940).

PARA FIXAR!
Leia o artigo 1º, inciso II, da Lei nº 9.455/1997 e o artigo 136 do Código Penal. Em
seguida, observe o tipo penal de maus-tratos. Ele se assemelha ao que consta para a tortura.
Complete o quadro a seguir com o que se pede a fim de se estabelecer a comparação:

Norma Elementos Pena


Lei n. 9.455/1997

Art. 136 do Código Penal

37
PARA EXAMINAR!
Acesse o link https://www.conectas.org/publicacao/julgando-tortura/ e conheça um
estudo que mostra que há uma tendência do Sistema de Justiça em condenar menos casos em
que agentes públicos estão envolvidos em comparação a casos em que agentes privados estão
envolvidos. Reflita sobre essa questão: há uma baixa responsabilização de agentes públicos.
Consequentemente, impunidade e perpetuação da prática de tortura como regra.

O Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - (Lei n° 12.847/)


O Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (SNPCT), integrante do
Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, foi instituído pela lei n° 12.847 de 2 de agosto
de 2013, que também criou o Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT) e
o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT).
Sua implementação reforça o Estado Brasileiro enquanto Estado-Membro das
Convenções da ONU sobre essa temática e consolida a formalização de uma rede de atores em
nível nacional e regional para fortalecer a articulação de ações. A ideia desse trabalho em rede
é que haja um melhor intercâmbio de boas práticas, organização e implementação de
recomendações feitas pelo Mecanismo Nacional, negociação de soluções ativas a questões de
privação de liberdade encaminhadas para organismos internacionais, dentre outras ações.

SAIBA MAIS!
Para aprofundar seus conhecimentos, leia a lei n° 12.847 na íntegra, acessando o link
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12847.htm. Essa lei, como já
dito, institui o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura; cria o Comitê Nacional de
Prevenção e Combate à Tortura e o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura; e
dá outras providências.

O Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT)


Trata-se de um colegiado composto por 23 membros, sendo 11 representantes de órgãos
federais e 12 da sociedade civil, que tem como objetivo contribuir para o enfrentamento de
violação aos Direitos Humanos, especificamente a prática da tortura, em instituições de
privação de liberdade, como delegacias, penitenciárias, locais de permanência para idosos e
hospitais psiquiátricos. Seus membros atuam
38
no acompanhamento, proposição de ações e programas para a erradicação da tortura
no Brasil. Também compete ao Comitê acompanhar os trâmites de apuração
administrativa e judicial, bem como de proposições legislativas, dando
encaminhamento às recomendações advindas de inspeções nos locais de privação de
liberdade. Todas atribuições do CNPCT estão listadas no art. 6º, da Lei nº
12.847/2013.29

É responsável pela escolha dos 11 peritos que compõem o Mecanismo Nacional de


Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT).

O Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT)


Trata-se de um órgão que é integrado por 11 especialistas independentes, denominados
peritos, que terão a prerrogativa de acesso às instalações de privação de liberdade de qualquer
natureza, hospital psiquiátrico, abrigo de pessoa idosa, instituição socioeducativa ou centro
militar de detenção disciplinar para fiscalização quanto a atos de tortura e maus-tratos.
Constatadas violações, os peritos elaboram relatórios com recomendações às demais
autoridades competentes, podendo usá-los na adoção das providências cabíveis.
Sua implementação tem a finalidade de “atender o compromisso internacional assumido
pelo Estado brasileiro em 2007 com a ratificação do Protocolo Facultativo à Convenção Contra
Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes da Organização das
Nações Unidas – ONU.”30

SAIBA MAIS!
• Amplie seus conhecimentos, acessando o link: https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-
informacao/participacao-social/sistema-nacional-de-prevencao-e-combate-a-tortura-
snpct/mecanismo/PORTARIAN20.pdf o qual dispõe sobre o Regimento Interno do
Mecanismo.
• Acesse também o link https://mnpctbrasil.wordpress.com/relatorios/ e conheça os
relatórios produzidos pelo Mecanismo.

29
SITE GOV.BR. Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - O Conselho. Disponível em:
https://www.gov.br/participamaisbrasil/o-conselho1 Acesso em: 03 fev. 2023.
30
SITE GOV.BR. Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura – MNPCT. Disponível em:
https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/orgaos-colegiados/mnpct/mecanismo-
nacional-de-prevencao-e-combate-a-tortura-mnpct Acesso em: 03 fev. 2023.
39
• Leia a matéria que fala sobre casos de tortura em unidades prisionais mineiras,
acessando o link https://globoplay.globo.com/v/10876644/
• Assista ao vídeo Comissão discute situação prisional no país, disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=ycqTxRgZ4As, e reflita sobre como as autoridades
brasileiras estão pensando esse assunto.

Denúncias sobre tortura: elementos essenciais


Primeiramente, para que a notícia-crime de tortura seja realmente efetivada, é necessário
que juízes e promotores assumam seu protagonismo perante a vítima a fim de garantir a
proteção dela, a responsabilização dos autores, bem como a identificação das devidas
atribuições da polícia investigativa e dos demais órgãos de controle interno das instituições.
Posteriormente, há a necessidade de apresentar o preenchimento, cumulativamente, de três
dados para se caracterizar penalmente a tortura:
• A forma em que foi cometida (autoria, modo, circunstâncias).
• A motivação ou objetivo (informação, castigo, ação ou omissão, descriminação).
• A consequência da ação (efeitos na vítima).
Caso esses três elementos não sejam apresentados, a tipificação fica comprometida,
podendo o ato ser denunciado e julgado como outras tipificações criminais, como maus-tratos,
lesão corporal, etc. O que não exclui como um instrumento de combate também, uma vez que
os tratados e as leis também enfatizam a importância de ações contra essas práticas.
Uma vez que a tortura geralmente não é vista, ou seja, é um ato invisível, é necessário
que as denúncias constem o maior detalhamento possível de informações, para que subsidie a
elucidação dos fatos e a consistência da investigação, com consequente responsabilização dos
ofensores.

SAIBA MAIS!
A ONU editou o Manual para investigação e documentação eficazes da tortura e outras
penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, conhecido como Protocolo de
Istambul. O documento pretende funcionar como uma referência internacional para a avaliação
da situação das pessoas alegadamente vítimas de tortura e maus-tratos, para a investigação dos
presumíveis casos de tortura e para a comunicação dos fatos apurados ao poder judicial ou

40
outros órgãos com competência no domínio da investigação. A íntegra do protocolo está
disponível em https://www.gov.br/mdh/pt-br/prevencao-e-combate-a-
tortura/1999ProtocoloIstambul.pdf

ATIVIDADE
Considerando o que se estudou até aqui, acesse o link
https://portacurtas.org.br/filme/?name=o_dia_em_que_dorival_encarou_a_guarda e assista ao
documentário O dia que Dorival encarou a guarda. Em seguida, responda: o documentário
apresenta violações aos Direitos Humanos e não cumprimento das legislações CF/88, LEP/84
e Lei Estadual Normas de Execução Penal/94 nos princípios da humanização da pena? Se sim,
quais foram as violações, por que elas ocorreram e quais seriam as atitudes necessárias para que
elas não acontecessem? Se não, como você justifica sua compreensão?

41
UNIDADE 3: SOCIEDADE BRASILEIRA E PRISÕES

TÓPICOS DA AULA
• O problema do encarceramento massivo no Brasil contemporâneo;
• Rotinas e práticas de atenção às pessoas privadas de liberdade;
• Integração entre as principais políticas públicas e programas de humanização das penas
e pessoas privadas de liberdade;
• Direitos Humanos e grupos vulneráveis;
• O papel da sociedade civil na execução da pena;
• Órgãos: ouvidorias, conselhos penitenciários, conselhos da comunidade, defensoria
pública;
• Assistência social ao egresso do sistema prisional;
• Estigmatização social do egresso e suas dificuldades de reinserção;

O problema do encarceramento massivo no Brasil contemporâneo

PARA EXAMINAR!
Em um artigo, disponível no link https://jornal.usp.br/revistausp/revista-usp-119-
dossie-3-sobre-a-pratica-da-tortura-no-brasil/, Paulo Endo apresenta um comparativo entre as
recomendações da ONU, constantes no Relatório sobre a Tortura no Brasil produzido pelo
relator especial sobre a tortura da Comissão de Direitos Humanos da ONU em 2001, com a
situação em 2016 através do Relatório Anual do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate
à Tortura (MNPCT) de 2015-2016.
A seguir, a recomendação acerca da situação de superpopulação carcerária em 2001 e a situação
em 2016:
Recomendação em 2001 (ONU)
Trata-se da constatação do fenômeno de superlotação carcerária no país e a
recomendação da ONU para adoção de medidas que caminhassem para a solução desse
problema.
Recomendação 23
A assustadora situação de superpopulação em alguns estabelecimentos de prisão
provisória e instituições prisionais precisa acabar imediatamente; se necessário,
mediante ação do Executivo, exercendo clemência, por exemplo, com relação a certas
42
categorias de presos, tais como transgressores primários não violentos ou suspeitos de
transgressão. A lei que exige a separação entre categorias de presos deveria ser
implementada. (ENDO, 2018, p. 55).

Situação em 2016 (MNPCT)


O Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, 15 anos após, encontra o
mesmo cenário caótico da superlotação, tendo em vista também o fenômeno do aumento
vertiginoso do crescimento da população carcerária após o ano de 2006.
Parágrafo 121
Em conformidade com esse cenário, com exceção do Cope São Pedro de Alcântara,
da Penitenciária Feminina de Manaus e do Presídio Romão Gomes, todas as outras
unidades visitadas pelo MNPCT em seu primeiro ano de atuação se encontravam
superlotadas. Como exemplos, a taxa de superlotação chegava a 256% no Centro de
Detenção Provisória (CDP) de Sorocaba (São Paulo), 254% no Complexo
Penitenciário Anísio Jobim (Amazonas) e 241% no Presídio Central de Porto Alegre
(Rio Grande do Sul). (ENDO, 2018, p. 55).

Parágrafo 122
Não foi raro observar celas com muito mais pessoas do que a sua capacidade. No CDP
de Sorocaba (São Paulo), por exemplo, havia celas com capacidade para nove presos,
mas que abrigavam mais de 50. Na Central de Custódia de Presos de Justiça do
Complexo de Pedrinhas, por exemplo, viviam 12 presos em uma cela destinada a
apenas quatro. Em muitas unidades, os privados de liberdade relataram se revezar para
dormir, sentar ou comer. Essas situações afrontam os artigos 85 e 88 da Lei de
Execução Penal (LEP) cujos conteúdos estabelecem, respectivamente, que a lotação
da unidade deve ser compatível com sua capacidade e os parâmetros mínimos para
uma cela. Adicionalmente, está em desacordo com os artigos 8° e 9° da Resolução
14/94 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), com o
Artigo 10 (1) do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e com as Regras
de Mandela. (ENDO, 2018, p. 55).

Parágrafo 123
O quadro de superlotação nas unidades aumentava o clima de tensão, além de
inviabilizar a garantia de direitos e assistências fundamentais à execução e à
individualização da pena. Isto é, garantir a saúde, a educação, o acesso ao trabalho, à
assistência social, etc. se tornava praticamente impossível nesse contexto. Para além
desse aspecto, formava-se um cenário de forte tensão e de grande restrição de direitos,
altamente propício à prática de tortura e maus-tratos. (ENDO, 2018, p. 55).

Parágrafo 124
Ainda, os efeitos da superlotação podiam ser tão diversos que, no Presídio Central de
Porto Alegre, a direção mencionou a dificuldade em realizar manutenções
infraestruturais na unidade. A superlotação do local impossibilitaria a transferência de
presos de determinada galeria a outra. Portanto, apenas eram realizadas reformas
quando os presos estavam no pátio da unidade, de forma que tais medidas eram
superficiais e insuficientes frente ao quadro de grave degradação da estrutura física
daquela unidade. (ENDO, 2018, p. 55-56).
43
Agora reflita: após 6 anos dessa análise, como você percebe o sistema prisional
brasileiro atualmente no que tange à superlotação? Quais seriam as possíveis ações para
solucionar esse problema?

A população carcerária brasileira vem mantendo um crescimento constante e, mesmo


que tenha tido uma pequena queda nos anos de 2020, 2021 e 2022 (o que, também, pode-se
justificar pelas prisões domiciliares em decorrência da COVID19), o número ainda permanece
alto: são 470.116 vagas para 661.915 em situação de privação de liberdade, conforme dados do
SISDEPEN (jan. a jun. 2022). E a taxa de aprisionamento é de 310,29 para 100 mil habitantes.

Gráfico 1 - População prisional por ano

Fonte: SISDEPEN, 202231

Ao se observar o Gráfico 1, conclui-se que, em 22 anos, houve um crescimento de quase

31
DEPEN. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – janeiro a junho 2022. Disponível em:
https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiNWQ0ODM1OTQtMmQ2Ny00M2IyLTk4YmUtMTdhYzI4N2ExM
WM3IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9 Acesso em: 30
nov. 2022.

44
3 vezes em relação aos dados no ano de 2000, 232.755 presos, que saltaram para 661.915 presos
em 2022, o que corresponde a um aumento de 184%. Tal fato coloca o país no 3º lugar no
ranking de países com a maior população carcerária do mundo, ficando atrás de EUA e China.
Tais dados mostram que a pena privativa de liberdade é legitimada pela população brasileira e
interfere nas decisões legislativas, judiciais e governamentais, ou seja, a prisão sendo aplicada
cada vez mais em detrimento de alternativas penais, o que se denomina novo punitivismo
(PRATT et al., 2005 apud AMORIM-SILVA, 2021).

O novo punitivismo é baseado unicamente no encarceramento, ou seja, a prisão é


reconhecida como punição civilizada, e passa a ser empregada para qualquer tipo de
desvio. Além disso torna-se uma experiência normal para determinadas classes,
agindo num fluxo contínuo: prende para soltar e solta para prender. (AMORIM-
SILVA, 2021, p.58)

Há também o que se denomina hiperencarceramento (WACQUANT, 2009) em que há


um alvo preferencial na dinâmica punitiva.

O encarceramento em massa não é aquele compreendido como sendo apenas o grande


número de pessoas em prisão, mas os efeitos da prisão numa concentração social, ou
seja, quando deixa de ser o encarceramento de infratores individuais e se torna o
sistema prisional de grupos inteiros da população. (AMORIM-SILVA, 2021, p.57).

Wacquant (2009, p.3) então explica por que o termo hiperencarceramento é mais
apropriado:

Encarceramento em massa sugere as preocupações com o confinamento de grandes


áreas da cidadania (como acontece com os meios de comunicação de massa, cultura
de massa, o desemprego em massa, etc.), implicando que a rede penal foi arremessada
para bem longe através do espaço físico e social. Mas a expansão e intensificação das
atividades da polícia, dos tribunais e das prisões ao longo do último quarto de século
têm sido algo amplas e indiscriminadas. Elas têm sido finalmente direcionadas, em
primeiro lugar, atendendo à classe, em segundo à denominada raça, através da
disfarçada marca de etnicidade, e, em terceiro, ao espaço físico. Este acumulado de
alvos levou ao hiper-encarceramento de uma categoria particular – os homens negros
de classe baixa a viver em guetos em ruínas – deixando os restantes membros da
sociedade – incluindo, de modo mais saliente, os negros de classe média -
praticamente intocados. Além disso, essa tripla seletividade é uma propriedade
constitutiva do fenómeno: se o Estado penal se desenrolasse de uma forma
indiscriminada por meio de políticas, resultando na captura de um vasto número de
cidadãos brancos e de classe média, o seu crescimento teria sido rapidamente
interrompido por uma ação política. O encarceramento em massa é socialmente
tolerável e, portanto, viável como política pública, apenas enquanto não atingir as
massas: é uma figura de estilo, que esconde os vários filtros que funcionam para
demarcar o alvo penal.

45
Nesse sentido, importante ressaltar o perfil da população carcerária a qual é composta
por maioria de negros (68,42%), de 18 a 29 anos (42,46%) e homens (95,62%).

ATENÇÃO!
Ficou demonstrado que a população carcerária tem cor, classe social, idade, gênero. É
importante refletir sobre esse aspecto, pois é um dos fatores que contribui na construção da
prática enquanto servidores (as) prisionais. Saber o público com o qual se lida é fundamental
para entender toda a dinâmica das unidades prisionais, suas lacunas e demandas. Para ajudar
você no processo reflexivo e de tomada de decisão, leia o texto jornalístico Encarceramento
em massa no Brasil: sintoma de uma sociedade excludente disponível em
https://laboratoriodejo2021.medium.com/encarceramento-em-massa-no-brasil-sintoma-de-
uma-sociedade-excludente-b82f76174ddb

Rotinas e práticas de atenção às pessoas privadas de liberdade


A atenção às pessoas privadas de liberdade se dá por meio da efetivação da garantia às
assistências previstas na LEP mencionadas anteriormente. Minas Gerais vem, desde os anos
2000, investindo na reestruturação do sistema prisional, quando iniciou o movimento de
retirada, da Policia Civil, da responsabilidade da custódia dos presos e instituiu o sistema
prisional, com quadro de funcionários próprios da pasta.

Neste processo de consolidação, a Subsecretaria de Administração Prisional (SUAPI)


investiu tanto na construção, manutenção e reforma de unidades prisionais, bem como
em sua gestão operacional cotidiana. Como descrito anteriormente, o modelo
referencial de gestão prisional, consolidou um conjunto de procedimentos
operacionais padrão que visam regular e oferecer previsibilidade ao funcionamento
cotidiano de uma unidade, especialmente no que se refere ao relacionamento entre os
agentes prisionais e os internos, no sentido de evitar ou coibir abusos ou desvios. Estes
procedimentos reduziram substantivamente os casos de denúncias de violência, seja
aquela praticada por agentes junto aos custodiados, seja entre estes. (CRUZ et al.,
2021, p.12)

O princípio humanizador da pena, ratificado nas legislações nacionais e internacionais,


impõe a entrada de certos direitos e benefícios nos cárceres brasileiros. Para tanto, invoca-se a
presença desses direitos e benefícios nas políticas direcionadas para o sistema prisional, no que
tange a suas rotinas e práticas, as quais carregam tal ideal como pano de fundo.
Tais práticas de atenção à pessoa presa passam, primordialmente, por sua movimentação
46
dentro da unidade prisional, exigindo uma rotina de segurança aliada à área de atendimento.
Nesse sentido, pode-se citar a oferta de educação básica, em que o recluso deve ser direcionado
para a sala de aula. A assistência à saúde que, da mesma forma, implica a movimentação para
os setores de enfermagem. Tem ainda os atendimentos psicossociais, os quais, além de dar
atenção à saúde mental do sujeito em privação de liberdade, buscam manter os vínculos
familiares, o resgate de documentos e demais demandas da área de assistência social.
Os diversos programas, projetos e resoluções que buscam implementar políticas de
atenção à pessoa privada de liberdade acabam por estabelecer parâmetros para condução das
rotinas e práticas, que convergem para essa garantia, dentro das unidades prisionais.

PARA EXAMINAR!
Um exemplo de prática de atenção à pessoa reclusa é o Projeto da Fiocruz que busca
reduzir tuberculose nas prisões. Estratégia apresentada na Semana Uma Só Saúde é voltada para
toda a comunidade carcerária, que tem maior risco de adoecimento pela doença devido às
condições de vida e saúde a que está exposta. Para entender sobre essa ação, acesse o link
https://www.fiocruzbrasilia.fiocruz.br/projeto-da-fiocruz-busca-reduzir-tuberculose-nas-
prisoes/

SAIBA MAIS!
Assista ao vídeo Nascer nas prisões: gestar, nascer e cuidar, acessando o link:
https://www.youtube.com/watch?v=vmi6r-M-K0U. O documentário é vinculado à pesquisa
Saúde Materno Infantil nas Prisões do Brasil (2016) e aborda a dura realidade da rotina, os
conflitos e os problemas enfrentados pelas mulheres privadas de liberdade em ter um pré-natal
de qualidade, com doenças evitáveis não adequadamente tratadas, discriminação na hora do
parto e dificuldades com o cuidado do recém-nascido, além do impacto social.

Muitas dessas ações fazem parte de políticas públicas voltadas para o sistema prisional,
bem como para a integração com as políticas de assistências e grupos específicos de maneira
geral. É o assunto do próximo tópico.

47
Integração entre as principais políticas públicas e programas de humanização das pessoas
privadas de liberdade
O indivíduo privado de liberdade, como já vimos, mantém seus direitos fundamentais
resguardados, devendo ter acesso a todas as políticas públicas e programas que tenham
extramuros. Dessa forma, citaremos algumas que dizem respeito às assistências.
A Assistência à saúde, executada por meio da Política Nacional de Atenção Integral à
Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP), instituída pela
Portaria Interministerial nº 1, de 2 de janeiro de 2014, teve como objetivo ampliar as ações de
saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) para a população privada de liberdade, fazendo com
que cada unidade básica de saúde prisional passasse a ser visualizada como ponto de atenção
da Rede de Atenção à Saúde.
Anteriormente havia o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário (PNSSP),
instituído pela Portaria Interministerial nº 1777, de 09 de setembro de 2003. Após avaliação
desse plano, no período de 10 anos, contatou-se seu esgotamento ao serem percebidas lacunas,
principalmente por ele não contemplar, em suas ações, o percurso total do sistema prisional que
começa desde a prisão e reclusão em delegacias até o efetivo cumprimento da pena privativa
de liberdade (após sentença transitado em julgado) em penitenciárias. Além disso, o PNSSP
não incluía as federais.
A PNAISP nasce então, com foco no pensamento de atendimento integral da pessoa
reclusa, desde o primeiro momento de sua prisão. Portanto, há uma ampliação dessa assistência
realmente a todos e a todas. Essa principal mudança, além de outras, é indicada como um avanço
na garantia e na defesa dos Direitos Humanos em relação à saúde no sistema prisional, primando
pela conformidade constitucional e universal de atenção à saúde sob responsabilidade do Estado
que, como visto, deve também abranger pessoas em situação de restrição e privação de
liberdade.

SAIBA MAIS!
Amplie seus conhecimentos sobre esse assunto, acessando o link:
https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/saps/pnaisp#:~:text=Info-
,Pol%C3%ADtica%20Nacional%20de%20Aten%C3%A7%C3%A3o%20Integral%20%C3%
A0%20Sa%C3%BAde%20das%20Pessoas,Liberdade%20no%20Sistema%20Prisional%20(P
NAISP)
48
A Assistência educacional foi instituída pelas resoluções:
• Resolução 03/2009 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária -
dispõe sobre as Diretrizes Nacionais para a Oferta de Educação nos estabelecimentos
penais.
• Resolução 02/2010 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de
Educação - dispõe sobre as Diretrizes Nacionais para a oferta de educação para jovens
e adultos em situação de privação de liberdade nos estabelecimentos penais.
Ambas as resoluções estabelecem que as ações de educação no contexto prisional devem
estar calcadas na legislação educacional vigente no país, na Lei de Execução Penal e nos
tratados internacionais firmados pelo Brasil no âmbito das políticas de Direitos Humanos e
privação de liberdade, devendo atender às especificidades dos diferentes níveis e modalidades
de educação e ensino e são extensivas aos presos provisórios, condenados, egressos do sistema
prisional e àqueles que cumprem medidas de segurança.
Além dessas resoluções, há o Decreto 7.626/2011, que institui o Plano Estratégico de
Educação no âmbito do Sistema Prisional (PEESP). No seu art. 2o, enfatiza que o Plano
contemplará a educação básica na modalidade de educação de jovens e adultos, a educação
profissional e tecnológica e a educação superior. Já o artigo art. 3o o tem como uma de suas
diretrizes: II - integração dos órgãos responsáveis pelo ensino público com os órgãos
responsáveis pela execução penal.

Direitos Humanos e grupos vulneráveis


Para um bom desempenho da ações nas unidade prisionais, faz-se necessário conhecer
melhor cada grupo populacional e quais são as suas características, bem como os regulamentos
legais nacionais e internacionais que subsidiem uma intervenção profissional adequada, além
da formulação de políticas e serviços penitenciários articulados com demais áreas da
administração pública e da sociedade na perspectiva da humanização do cárcere e garantia dos
Direitos Humanos.
Para iniciar essa temática, é importante ter o devido entendimento dos conceitos de
universalidade, igualdade e equidade:
O princípio da universalidade indica que a ação de serviço público, principalmente no
que tange os direitos, deverá ser ofertada a todos os cidadãos, independente de quem seja,

49
mediante um caráter genérico e universal. (SCHIER, 2017).
A igualdade pressupõe que todos devem ser regidos pelas mesmas regras e devem ter
os mesmos direitos e deveres.
A noção de equidade é implantada por meio de políticas e serviços focalizados nas
necessidades de cada indivíduo, mostrando o esforço de corrigir desigualdades sociais e
históricas. É a ideia de tratar desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades.
A incorporação da noção de equidade ajuda no entendimento de que é necessária a
adoção de medidas focalizadas nas necessidades e singularidades de cada grupo social, pois há
uma tendência em nossa sociedade de excluir notoriamente em razão das diferenças e que, por
preconceito e descriminação, produzem-se desigualdades e obstáculos para acesso a serviços e
políticas públicas.

PARA EXAMINAR!
Declaração sobre os direitos das pessoas pertencentes a minorias nacionais ou étnicas,
religiosas e linguísticas – aprovada pela Resolução nº 47/135 da Assembleia Geral da ONU, de
18 de dezembro de 1992.

A partir do entendimento desses conceitos, torna-se compreensível a necessidade de


voltar os olhos para grupos específicos que estejam em cumprimento de pena privativa de
liberdade. Vários instrumentos dos Direitos Humanos, como tratados, declarações e acordos,
abrangem temas relacionados às mulheres, ao público LGBTQIA+, aos indígenas e aos
estrangeiros, os quais buscam criar mecanismos de assegurar a promoção da diversidade.

SAIBA MAIS!
Você sabia que o termo minoria não é um conceito definitivo? Deve-se fazer uma
primeira ressalva sobre o seu uso, a saber: a noção de minoria não quer dizer necessariamente
um grupo social numericamente menor. Em regra, uma minoria está, sim, em menor quantidade,
mas isso nem sempre é verdade. É importante compreender, também, como esses grupos
específicos se colocam e se comportam dentro da sociedade, podendo constituir uma maioria
numérica, mas, ao mesmo tempo, ser politicamente uma minoria em razão da impossibilidade
de participar das instâncias decisórias.

50
É importante reforçar que a defesa dos Direitos Humanos, que fazem parte do direito
internacional do qual o Brasil é signatário e, portanto, também criou instrumentos que observem
a diversidade, pressupõe a sua plena aceitação e a repulsa a qualquer forma de preconceito ou
discriminação.

PARA PENSAR!
Para aprofundar nesse assunto, assista ao vídeo Direitos Humanos, a Exceção e a Regra,
que se encontra disponível no link
https://portacurtas.org.br/filme/?name=direitos_humanos_a_excecao_e_a_regra
Para se atender de forma adequada às pessoas em privação de liberdade de grupos
específicos, assegurando cumprimento dos dispositivos legais nacionais e os pactos
internacionais, é preciso identificar quais são as situações discriminatórias vivenciadas e quais
são as demandas dessas pessoas.
Em 2011, no Brasil, instituiu-se o Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária,
que estabeleceu em sua Medida nº 05 a necessidade de ações objetivando o reconhecimento e
o respeito à diversidade no âmbito do sistema penitenciário brasileiro. O documento indica a
emergência de se promover iniciativas para assegurar direitos de mulheres, público
LGBTQIA+, indígenas e estrangeiros, além de outros. Trata também do direito à livre
manifestação religiosa.
Assim, o documento apresenta recomendações e objetivos a serem alcançados em todas
as unidades prisionais. A seguir, são apresentados alguns pontos a serem alcançados pela
administração dos serviços penitenciários:

a) Assegurar as visitas íntimas para a população carcerária LGBTQIA+.


b) Garantir a assistência pré-natal e a existência de espaços e serviços específicos para
gestantes durante a gestação e também no período de permanência dos filhos das
mulheres presas no ambiente carcerário.
c) Elaborar políticas de respeito às mulheres transexuais e travestis nos presídios
estaduais.
d) Estudar a possibilidade de unidades específicas para população LGBTQIA+.
e) Garantir a acessibilidade nas unidades prisionais, conforme a orientação da NBR
9050.
f) Garantir as condições de manifestação e de profecia de todas as religiões e credos.
g) Criar sistema de acompanhamento de estrangeiros presos no Brasil e implantar.
h) Aplicar a separação de pessoas presas por facção criminosa para aquelas que
realmente estejam ligadas a grupos organizados do crime e que precisem de controle
ou proteção, eliminando as separações por origem, isto é, por locais de moradia, que
supostamente são comandados por determinados grupos, evitando assim a criação de
51
unidades específicas por facções criminosas.
i) Elaborar e implantar metodologia específica para cada público (BRASIL, 2011, p.5-
6).

SAIBA MAIS!
Acesse o Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária na íntegra no link
http://www.tjrj.jus.br/documents/10136/3231852/plano-politica-criminal-penitenciaria-
2011.pdf

Políticas para as mulheres


O retrato da população prisional brasileira tem mostrado o aumento do encarceramento
feminino. Relatório disponibilizado pelo SISDEPEN, com dados referentes ao período de
janeiro a junho de 2022, indica que o país possui uma população carcerária de mulheres de
28.699, correspondendo a 4,38% do total de pessoas presas.
Nesse sentido, justamente por ser minoria, é necessário atentar-se para esse público a
fim de atender a suas particularidades. Em âmbito internacional, tem-se as Regras de Bangkok32
– Regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de
liberdade para mulheres infratoras – as quais propõem um olhar diferenciado para as
especificidades de gênero no encarceramento feminino, tanto no campo da execução penal,
como também na priorização de medidas não privativas de liberdade, ou seja, que evitem a
entrada de mulheres no sistema carcerário.
Em âmbito nacional, há a Portaria Interministerial nº 210 de 16/01/2014 / SPM -
Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (D.O.U.17/01/2014) - Política Nacional de
Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional
(PNAMPE)33, a qual instituiu a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de
Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional, com o objetivo de reformular as práticas
do sistema prisional brasileiro, contribuindo para a garantia dos direitos das mulheres, nacionais
e estrangeiras.

32
CNJ: Regras de Bangkok: regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e medidas não
privativas de liberdade para mulheres infratoras. Brasília, 2016. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/2019/09/cd8bc11ffdcbc397c32eecdc40afbb74.pdf Acesso em: 31 jan. 2023.
33
SITE DIÀRIO DAS LEIS. Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade
e Egressas do Sistema Prisional. Brasília, 2014. Disponível em:
https://www.diariodasleis.com.br/legislacao/federal/226123-politica-nacional-de-atencao-as-mulheres-em-
situacao-de-privacao-de-liberdade-e-egressas-do-sistema-prisional Acesso em: 31 jan. 2023.
52
Voltada também para os funcionários que atuam nos estabelecimentos penitenciários, a
Política também prevê alterações e orientações para as rotinas carcerárias, com atenção às
diversidades e às especificações das mulheres, no que diz respeito à idade, à escolaridade, à
etnia, à maternidade e a outros aspectos, além de condições adequadas de cumprimento de pena,
garantindo o direito à saúde, à educação, à proteção à maternidade e à infância, ao atendimento
psicossocial e aos demais Direitos Humanos.
A Lei de Execução Penal (LEP), desde 1984, garantiu determinados direitos à
presidiária, a saber: que seja recolhida, separadamente, em estabelecimento próprio adequado
a essa condição e que sejam disponibilizadas exclusivamente funcionárias mulheres.
Igualmente, ficou garantido o acompanhamento médico à mulher, especialmente no pré-natal e
no pós-parto, extensivo ao recém-nascido.

SAIBA MAIS!
Veja a seguir alguns documentos da ONU que abordam o tema, consagrando a necessidade
e a urgência para promoção de tratamento digno às mulheres em conflito com a lei:
• Regras de Tóquio: contempla as especificidades de gênero das mulheres que entraram
em contato com o sistema de justiça criminal, recomendando a necessidade de se
aplicarem prioritariamente medidas não privativas de liberdade.
• Resolução 61/143, de 19 de dezembro de 2006: reconhece a urgência dos Estados
assumirem medidas para enfrentar causas estruturais de violência contra mulheres, bem
como práticas e normas sociais discriminatórias, incluindo aquelas voltadas às mulheres
que necessitem de atenção especial, tais como mulheres reclusas em instituições ou
encarceradas.
• Resolução 63/241, de 24 de dezembro de 2008: chama a atenção sobre o impacto da
detenção e o encarceramento de crianças e sugere adoção de boas práticas em relação
às necessidades e ao desenvolvimento físico, emocional, social e psicológico de bebês
e crianças afetadas pela detenção ou encarceramento de pais.
• Declaração de Viena sobre Crime e Justiça: os Estados-membros reconhecem a
importância de implantação de ações políticas baseadas nas necessidades especiais da
mulher, na condição de presa.

Há especial atenção quanto ao estabelecimento prisional que deve, também, ser um


53
ambiente preparado para abrigar a mulher presa, nas suas peculiaridades, como o caso da
maternidade, com berçários e espaços para amamentação de seus filhos. Como forma de
proteção aos filhos das mulheres presas, a condenada ao regime aberto que esteja grávida ou
amamentando poderá permanecer em residência particular. Chama atenção, nesse sentido, a
Resolução CNPCP nº 3, de 15 de julho de 2009, que versa sobre a estada, permanência e
posterior encaminhamento das(os) filhas(os) das mulheres encarceradas. A publicação
estabelece que deve ser garantida a permanência de crianças no mínimo até um ano e seis meses,
para as(os) filhas(os) de mulheres encarceradas, junto às suas mães. Após esse período, há
necessidade de se construir processo gradual de separação a partir da fixação de etapas
conforme quadro psicossocial da família, que podem durar até 6 (seis) meses. A normativa
possibilita que crianças até 7 (sete) anos possam permanecer junto às suas mães nas unidades
prisionais, mas desde que o estabelecimento reúna as condições para atender melhor ao
interesse do menor nessa fase de desenvolvimento.

PARA PENSAR!
Assista à reportagem Vidas no Cárcere - a realidade da mulher presa no DF produzida
pela equipe de TV da Universidade de Brasília (UnBTV), disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=o-2r9awpQyc

Populações indígenas
A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada na
107ª Sessão Plenária 13 de setembo de 2007, traz no artigo 2º que “os povos e pessoas indígenas
são livres e iguais a todos os demais povos e indivíduos e têm o direito de não serem submetidos
a nenhuma forma de discriminação no exercício de seus direitos, que esteja fundada, em
particular, em sua origem ou identidade indígena”.(ONU, 2008, p. 6-7).
A Constituição Federal, por sua vez, assevera que a realização de direitos dos povos
indígenas passa pela garantia de sua autodeterminação, o respeito à sua cultura, práticas sociais
e políticas. Os povos indígenas detêm o direito originário e o usufruto exclusivo sobre as terras
que tradicionalmente ocupam.
Além dessas, tem-se uma Resolução específica do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

54
- Resolução nº 287, de 25 de junho de 201934. Esse documento estabelece procedimentos ao
tratamento das pessoas indígenas acusadas, rés, condenadas ou privadas de liberdade, e dá
diretrizes para assegurar os direitos dessa população no âmbito criminal do Poder Judiciário.

Populações estrangeiras presas e egressas do sistema prisional


A Constituição Federal primou pela isonomia entre brasileiros e estrangeiros no que
toca aos direitos e garantias fundamentais, sobretudo aqueles elencados no artigo 5º. Dessa
forma, é necessário ter em mente que, uma vez preso, o estrangeiro deve ser tratado sem
qualquer forma de preconceito ou distinção em relação aos brasileiros.
Todos os benefícios que estão elencados na LEP aplicam-se, igualmente, ao estrangeiro,
inclusive assistência judiciária gratuita pela Defensoria Pública, caso não possua advogado
particular ou fornecido pela missão diplomática. Nos termos da Convenção de Viena sobre
Relações Consulares35, de 1963, as pessoas de outros países reclusas no Brasil devem receber
apoio do poder público em nível local, caso não possam se comunicar em português. Esse
auxílio pode, ainda, ser prestado pelo corpo consular do país de origem.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para instrumentalizar a citada Convenção de
Viena, editou a Resolução nº 162, de 2012, regulamentando a necessidade de notificação da
prisão de estrangeiro à missão diplomática do país de origem do preso, ou, na sua falta, ao
Ministério das Relações Exteriores e ao Ministério da Justiça, respectivamente, no prazo de
cinco dias. Além disso, a autoridade judiciária deverá comunicar, no mesmo prazo, sempre que
houver progressão ou regressão de regime, concessão de livramento condicional e extinção da
punibilidade.
Conforme o país do condenado tenha tratado assinado com o Brasil, o mesmo pode
requerer a sua transferência para cumprimento do restante da pena em seu país de origem. As
situações são consideradas individualmente e a transferência não é automática, só sendo
efetuada se os Estados a aprovarem. Está, assim, resguardado o direito soberano do Estado de
aprovar ou não a transferência. Em caso de negativa, deverá o Estado fundamentar a decisão.

34
CNJ. Resolução nº 287, de 25 de junho de 2019. Disponível em:
https://atos.cnj.jus.br/files/resolucao_287_25062019_08072019182402.pdf Acesso em: 31 jan. 2023.
35
SCALÉRCIO, M. Convenção de Viena sobre relações consulares. Disponível em:
https://vlex.com.br/vid/convencao-viena-relacoes-consulares-670884477 Acesso em: 31 jan. 2023.
55
SAIBA MAIS!
No intuito de buscar esclarecimentos e estruturar os serviços de assistências para a
população presa e egressa do sistema prisional, discussões e alguns eventos têm sido realizados.
Tem-se, como exemplo, alguns encaminhamentos sugeridos no debate promovido pelo
Conselho Nacional de Justiça, nos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo, em 2012:
• Necessidade de criação de um cadastro de tradutores/intérpretes para viabilizar a
comunicação dos presos estrangeiros, bem como a tradução das principais peças processuais.
Deve ser assegurado ao preso estrangeiro o direito constitucional de contatar sua família, além
de seu advogado ou defensor.
• Criação de política pública para moradia ou casas de passagem para presos estrangeiros.

Pessoas com deficiência física ou mobilidade reduzida


A lei federal nº 7.853/89 trata de direitos básicos das pessoas com deficiência, dos
direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e
à maternidade e a outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar
pessoal, social e econômico (Art. 2º).
Para tanto, deve-se considerar “os valores básicos da igualdade de tratamento e
oportunidade, da justiça social, do respeito à dignidade da pessoa humana, do bem-estar, e
outros, indicados na Constituição ou justificados pelos princípios gerais de direito” (BRASIL,
1989, Art. 1º, §1º). Cabe lembrar que a pessoa com dificiência mental não cumpre pena em
estabelecimento prisional, mas está sujeito a estabelecimento próprio, onde se submete a
medidas de segurança.
A LEP garante às pessoas com deficiência o trabalho adequado às suas condições,
lembrando que o trabalho é elemento fundamental para garantir a reintegração social do preso
e sua dignidade. Além disso, o artigo 117 da LEP admite o regime aberto em residência
particular na hipótese da presa possuir filho com deficiência física ou mental, como forma de
proteção a ele.
As diretrizes básicas para arquitetura prisional36 foram um avanço ao observar a

36
BRASIL. Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Diretrizes básicas para arquitetura
prisional. Revisão técnica (ortográfica e metodológica): Gisela Maria Bester/Suzann Flávia Cordeiro de Lima.
- Brasília: CNPCP, 2011. Disponível em: https://www.gov.br/depen/pt-
br/composicao/cnpcp/resolucoes/2011/diretrizes-basicas-para-arquitetura-penal.pdf Acesso em: 31 jan. 2023.
56
adequação dos meios de mobilidade nos presídios, através da eliminação de barreiras e da
adaptação arquitetônica para que o deficiente possa ter sua autonomia preservada. É preciso
que se ofereçam aos deficientes, conforme a deficiência, condições para que, sendo possível,
possam, sozinhos e autonomamente, tomar banho, se deslocar, se exercitar, enfim praticar as
ações que todos os demais praticam.
O 3º Plano Nacional de Direitos Humanos37, instituído pelo Decreto nº 7.037, de 21 de
dezembro de 2009, dentre as suas recomendações, propõe:

• vincular os repasses de recursos federais para construção de estabelecimentos


prisionais por Estados e o Distrito federal se observadas as diretrizes arquitetônicas
que preveem alas específicas para gestantes e aspectos sobre acessibilidade;
• garantir acessibilidade aos presos com deficiência ou às pessoas em cumprimento
de pena alternativa. (BRASIL, 2009).

Público LGBTQIA+

PARA PENSAR!

“A sexualidade abrange a dignidade e integra a própria condição humana, sendo um


direito fundamental que acompanha o cidadão desde o seu nascimento, pois decorre
de sua própria natureza. Como direito do indivíduo, é um direito natural, inalienável
e imprescritível. Ninguém pode realizar-se como ser humano se não tiver assegurado
respeito ao exercício da sexualidade, conceito que alberga a liberdade à livre
orientação sexual e identidade de gênero. O direito de tratamento igualitário exige
respeito ao livre exercício da sexualidade, pois sem liberdade sexual o indivíduo não
se realiza..” (Maria Berenice Dias)38

A partir dos Princípios de Yogyakarta39 - Princípios sobre a aplicação da legislação


internacional de Direitos Humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero
-, a orientação sexual está relacionada à atração emocional ou afetiva que as pessoas sentem
por indivíduos de outro gênero, do seu gênero ou de ambos, incluindo a manutenção de relações
íntimas ou sexuais com esses, diferenciando assim da ideia de opção sexual, que não leva em
consideração a complexidade da produção e vivência do desejo sexual. A identidade de gênero,

37
BRASIL. Secretaria Especial dos Direitos Humanos da República. Programa Nacional de Direitos Humanos
(PNDH – 3). Brasília, 2009. Disponível em: https://direito.mppr.mp.br/arquivos/File/PNDH3.pdf Acesso em: 31
jan. 2023.
38
SITE MARIA BERENICE DIAS. A garantia constitucional dos direitos à população LGBTI. Disponível em:
https://berenicedias.com.br/a-garantia-constitucional-dos-direitos-a-populacao-lgbti/. Acesso em: 31 jan. 2023.
39
SITE DHNET. Princípios de Yogyakarta. 2007. Disponível em:
http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/gays/principios_de_yogyakarta.pdf Acesso em: 31 jan. 2023.
57
por sua vez, diz respeito à experiência interna e pessoal do gênero de cada pessoa, que pode ou
não estar associada ao sexo atribuído no nascimento, em sua aparência, comportamentos e
vestimentas, por exemplo.
As recomendações feitas em diferentes oportunidades buscam:
• assegurar as visitas social e íntima homoafetivas;
• incluir esse segmento populacional em atividades educativas e culturais e de
trabalho;
• aplicar a Política Nacional de Saúde Integral de lésbicas, gays, bissexuais,
travestis e transexuais 40, instituída pela Portaria nº 2.836, de 1° de dezembro de
2011, e pactuada pela Comissão Intergestores Tripartite (CIT), conforme
Resolução n° 2 do dia 6 de dezembro de 2011, que orienta o Plano Operativo de
Saúde Integral LGBTQIA+.
• respeitar a identidade de gênero de travestis e transexuais.
Vale lembrar que os ministros do Supremo Tribunal Federal, em julgamento histórico
em 2011, reconheceram a união estável para casais do mesmo sexo. Essa medida ofereceu
embasamento para harmonização dos procedimentos que autorizam as visitas íntimas
homoafetivas nas unidades prisionais, que apenas vinham sendo liberadas para alguns casais
após decisão judicial.

ATENÇÃO!
A Resolução nº 348 de 13/10/202041, estabelece diretrizes e procedimentos a serem
observados pelo Poder Judiciário, no âmbito criminal, com relação ao tratamento da população
lésbica, gay, bissexual, transexual, travesti ou intersexo que seja custodiada, acusada, ré,
condenada, privada deliberdade, em cumprimento de alternativas penais ou monitorada
eletronicamente. Assim, explicita que

40
Brasil. Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais /
Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Departamento de Apoio à Gestão
Participativa. Brasília: 1. ed., 1. reimp. Ministério da Saúde, 2013. Disponível em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_lesbicas_gays.pdf Acesso em: 31 jan.
2023.
41
SITE CNJ. Resolução Nº 348 de 13/10/2020. Disponível em:
https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3519#:~:text=%C2%A7%203%C2%BA%20A%20aloca%C3%A7%C3%A3
o%20da,pessoas%20custodiadas%20no%20mesmo%20estabelecimento%2C Acesso em 31 jan. 2023.

58
A alocação da pessoa autodeclarada parte da população LGBTI em estabelecimento
prisional, determinada pela autoridade judicial após escuta à pessoa interessada, não
poderá resultar na perda de quaisquer direitos relacionados à execução penal em
relação às demais pessoas custodiadas no mesmo estabelecimento, especialmente
quanto ao acesso a trabalho, estudo, atenção à saúde, alimentação, assistência
material, assistência social, assistência religiosa, condições da cela, banho de sol,
visitação e outras rotinas existentes na unidade. (BRASIL, 2020b).

Importante chamar a atenção no aspecto ‘visitação’, que além da social, também lhe é
garantida a íntima. Nessa mesma resolução Art. 11, inc. V- C, diz que o juiz da execução deve
fiscalizar e fazer garantir o

exercício do direito à visita íntima em igualdade de condições,nos termos da Portaria


nº 1.190/2008, do Ministério da Justiça, e da Resolução nº 4/2011, do Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária, inclusive em relação aos cônjuges ou companheiros que
estejam custodiados no mesmo estabelecimento prisional. (BRASIL, 2020b).

Para tanto, faz-se necessário que a direção dos estabelecimentos prisionais criem condições
favoráveis para a visitação, e juntamente com o corpo funcional implemente campanhas
institucionais sobre direitos reprodutivos e prevenção à HIV/AIDS e Doenças Sexualmente
Transmissíveis (DST).
Além disso, há também a outra vertente de atuação que se insere no respeito à identidade
de gênero das travestis e transexuais. Não pode haver, por exemplo, a imposição de corte de
cabelos ou a proibição de roupas intimas que correspondam à identidade de gênero declarada,
mediante a condição de reclusão e/ou cumprimento de pena.
Conforme previsto nessa resolução e em outros regulamentos jurídicos, em seu Art. 6 é
estabelecido que “pessoas autodeclaradas parte da população LGBTI submetidas à persecução
penal têm o direito de ser tratadas pelo nome social, de acordo com sua identidade de gênero,
mesmo que distinto do nome que conste de seu registro civil, como previsto na Resolução CNJ
nº 270/2018.” (BRASIL, 2020b). Assim, alguns Estados, por meio de decretos, obrigam o
tratamento nominal de travestis e transexuais pelo nome social, exigindo a adequação dos
bancos de dados para cadastramento dessas pessoas e emissão de documentos para uso nos
atendimentos. Além de estipular unidades ou alas específicas para esse público.

PARA EXAMINAR!!!
Você sabia que em Minas Gerais há uma unidade prisional específica para atender ao

59
público LGBTQIA+? Faça uma pesquisa sobre esse estabelecimento e em quais estados da
federação também existem unidades prisionais destinadas esclusivamente ao público
LGBTQIA+ e quais são os principais desafios enfrentados na implementação das políticas
públicas e garantias de direitos.

Importante entender a definição de cada um dos segmentos, buscando dar visibilidade


de forma a coibir estigmas e preconceitos, uma vez que as políticas e os serviços precisam
atender às demandas populacionais de forma adequada:

• Lésbicas: denominação específica para mulheres que se relacionam afetiva e


sexualmente com outras mulheres.
• Gays: denominação específica para homens que se relacionam afetiva e
sexualmente com outros homens.
• Bissexuais: pessoas que se relacionam afetiva e sexualmente com ambos os
sexos.
• T (transgênero): diferentemente das letras anteriores, o T não se refere a uma
orientação sexual, mas a identidades de gênero. Também chamadas de “pessoas
trans”, elas podem ser transgênero (homem ou mulher), travesti (identidade feminina)
ou pessoa não-binária, que se compreende além da divisão “homem e mulher”;
• Q (queer): pessoas ‘queer’ são aquelas que transitam entre as noções de gênero,
como é o caso das drag queens. A teoria queer defende que a orientação sexual e
identidade de gênero não são resultados da funcionalidade biológica, mas de uma
construção social;
• I (intersexo): a pessoa intersexo está entre o feminino e o masculino. As suas
combinações biológicas e desenvolvimento corporal – cromossomos, genitais,
hormônios, etc – não se enquadram na norma binária (masculino ou feminino);
• A (assexual): assexuais não sentem atração sexual por outras pessoas,
independentemente do gênero. Existem diferentes níveis de assexualidade e é comum
essas pessoas não verem as relações sexuais humanas como prioridade;
• +: o símbolo de “mais” no final da sigla aparece para incluir outras identidades
de gênero e orientações sexuais que não se encaixam no padrão cis-heteronormativo,
mas que não aparecem em destaque antes do símbolo.(CNN, 28/06/2022)42

Pessoas em privação de liberdade com problemas e transtornos mentais


A Organização dos Estados Americanos (OEA), no que se refere às diretrizes para
atendimento às pessoas presas, enfatiza a necessidade de adequado atendimento às pessoas com
problemas e transtornos mentais internadas, buscando prepará-las para o convívio social,

42
SITE CNN. Saiba o que significa a sigla LGBTQIA+ e a importância do termo na inclusão social. São
Paulo. 2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/saiba-o-que-significa-a-sigla-lgbtqia-e-a-
importancia-do-termo-na-inclusao-
social/#:~:text=Com%20isso%2C%20LGBTQIA%2B%20se%20tornou,usadas%20pelos%20membros%20des
sa%20comunidade. Acesso em: 24 nov. 2022.
60
articulando os serviços de saúde mental de forma integrada, contínua e preventiva.
A saúde no sistema prisional é um dos temas mais sensíveis. Ainda é corrente uma visão
fortemente centrada nos aspectos relativos à segurança para os quais se destinam grande parte
dos recursos públicos. Uma medida importante foi a criação do Plano Nacional de Saúde do
Sistema Prisional, instituída pela Portaria Interministerial MS/MJ nº 1.777, de 09 de setembro
de 2003, que define prioridades, metas e caracterização das equipes mínimas de promoção e
atendimento em saúde. Em 2014, foi publicada a Portaria Interministerial nº 1/ MS/MJ, que
institui a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Pessoa Privada de Liberdade
no Sistema Prisional –PNAISP.
Inicialmente vale olhar para a situação dos pacientes dos Hospitais de Custódia e
Tratamento Psiquiátrico que, em razão de sua inimputabilidade, cumprem medida de segurança
nesses locais. Um dos maiores desafios observados é promover a aproximação e o
fortalecimento dos vínculos familiares na perspectiva da desinternação como pressuposto da
política de saúde mental a partir da reforma psiquiátrica realizada no Brasil. Esse paradigma é
fundamental para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária retirar, dentre os
itens financiáveis a construção de Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico.
Vê-se, assim, a necessidade de boa articulação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)
, vinculada ao Sistema Único de Saúde para acolher a demandas crescentes, e os órgãos que
integram o sistema penal. Nesse aspecto, duas iniciativas revelam-se exitosas: em Minas Gerais,
o Programa de Atenção Integral ao Paciente Judiciário portador de Sofrimento Mental (PAI-
PJ), regulamentado pela Resolução nº 633/2010 do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, e, em
Goiás, o Programa de Atenção Integral ao Louco Infrator (PAI/PJ), que buscam oferecer
assistência humanizada ao louco infrator, incidindo notadamente no preconceito sofrido por
esses indivíduos quando em liberdade.

SAIBA MAIS!
As referências a seguir ajudam a compreender melhor os aspectos relacionados ao tema
em discussão nesta seção:
• Programa de Atenção Integral ao Paciente Judiciário Portador de Sofrimento Mental –
PAI-PJ.
Disponível em : https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/hotsites/relatorio-de-gestao-2018-

61
a-2020/programa-pai-pj.htm#.Y47qW3bMLIU
• Programa de Atenção Integral ao Louco Infrator – PAI-LI.
Disponível em: https://www.saude.go.gov.br/biblioteca/7639-programa-de-
aten%C3%A7%C3%A3o-integral-ao-louco-infrator-paili
• O filme A casa dos mortos.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=noZXWFxdtNI

Assistência social ao egresso do sistema prisional


O mais recente instrumento orientador para a assistência social ao egresso é o
documento Política Nacional de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional43,
publicado em 2020 pelo Departamento Penitenciário Nacional, que contém postulados,
princípios e diretrizes para a estruturação de serviços de acolhimento, orientação e
encaminhamento das ações voltadas a atender à pessoa egressa do sistema prisional, com foco
na articulação com o conjunto mais amplo das políticas públicas. Possui também propostas de
metodologia e de estrutura gerencial e operacional dos serviços, além de planos de formação
voltados à qualificação de servidores das políticas públicas.

Trata-se de iniciativa inédita no país, uma vez que, embora prevista na Lei de
Execuções Penais, desde 1984, jamais logrou-se construir uma política de alcance
nacional para o público egresso das prisões. Esta publicação se soma à Resolução CNJ
n. 307, de 2019, compondo o arcabouço conceitual e normativo que permitirá
construir uma política pública nacional. (BRASIL, 2020c, p.4)

Historicamente, o documento divisor de águas em questões de mirar a condição de


egresso do sistema prisional foi o denominado Regras Mínimas para Tratamento de Presos,
instituídas em 1955 e editadas pela Organização das Nações Unidas (ONU). Esse primeiro
conjunto de regras mencionava, no item 54, a necessidade de se observar a assistência posterior
ao livramento, que ela deveria começar ainda durante o período da prisão e que deveria “ser
organizada na base em um estudo exato das condições de vida do preso e de seus parentes.”
(ONU, 1955).
Já a regra 55 mencionava ser “conveniente favorecer, quando possível, a criação, junto

43
Brasil. DEPEN. CNJ. Política Nacional de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional. Brasília, 2020.
Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/09/Pol%C3%ADtica-Nacional-de-
Aten%C3%A7%C3%A3o-%C3%A0s-Pessoas-Egressas-do-Sistema-Prisional_eletronico.pdf Acesso em: 31
jan. 2023.
62
a cada estabelecimento, de patronatos que se ocupem da assistência aos liberados, visitando-os
e ajudando-os a reentrar no convívio social e a tornar a encontrar um lugar entre os cidadãos
honestos”. (ONU, 1955).

Referências internacionais

• Regras Mínimas para Tratamento de Presos foram editadas no Primeiro Congresso das
Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em
Genebra em 1955, e aprovadas pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas em 1957.
Recentemente foram modificadas, com nova redação aprovada em novembro de 2015 pelo
Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, e passaram a denominar-se “Regras de
Mandela44”
É na regra nº 90 que a atenção volta-se para os egressos de forma específica, pois se afirma
que o compromisso da sociedade não se esgota com a liberação do preso. Enfatiza-se que
agências públicas ou privadas devem possibilitar às pessoas que saem da prisão um atendimento
capaz de diminuir os prejuízos do encarceramento e buscar sua reabilitação social (ONU, 2015).

Referências nacionais

• O artigo 26 da LEP define egressos como “I - o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um)
ano a contar da saída do estabelecimento; II - o liberado condicional, durante o período
de prova.” (BRASL, 1984).
Conforme o artigo 25 dessa lei, a assistência a eles prevista consiste “na orientação e
apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade” e na “concessão, se necessário, de alojamento e
alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses”.
No artigo 27, tal período poderá ser prorrogado com a comprovação de seu interesse na
obtenção de emprego, o que deve ocorrer com a colaboração do serviço de assistência social.
Já no artigo 78, são definidos os patronatos públicos ou particulares, como órgãos

44
SITE UNODOC. Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos (Regras de Nelson
Mandela). Disponível em: https://www.unodc.org/documents/justice-and-prison-
reform/Nelson_Mandela_Rules-P-ebook.pdf Acesso em: 31 jan. 2023.

63
destinados a prestar assistência tanto a albergados como a egressos do sistema prisional, que
possuem as seguintes atribuições, constantes no artigo 79:

I. orientar os condenados à pena restritiva de direitos;


II. fiscalizar o cumprimento das penas de prestação de serviço à comunidade e de
limitação de fim de semana;
III. colaborar na fiscalização do cumprimento das condições da suspensão e do
livramento condicional. (BRASIL, 1984)

Essas ações ficam sob supervisão dos Conselhos Penitenciários, que possuem entre suas
atribuições, conforme o inciso IV do artigo 70, “supervisionar os patronatos, bem como a
assistência aos egressos.” (BRASIL, 1984).

• O III Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), constituído pelo Decreto nº


7.037/2009 e atualizado pelo Decreto nº 7.177/201045, possui, em sua diretriz nº 16, os aspectos
que tratam da “modernização da política de execução penal, priorizando a aplicação de penas e
medidas alternativas à privação de liberdade e melhoria do sistema penitenciário”. (BRASIL,
2010).
Um dos objetivos estratégicos dessa diretriz é a “reestruturação do sistema
penitenciário”, estando, entre as ações programáticas (alíneas J e K), a ampliação de campanhas
de sensibilização para a inclusão social do egresso do sistema prisional e o estabelecimento de
“diretrizes na política penitenciária nacional que fortaleçam o processo de reintegração social
dos presos, internados e egressos, com sua efetiva inclusão nas políticas sociais”. (BRASIL,
2010).
Recomenda, também, aos estados e ao Distrito Federal, a criação de programas de
reinserção social dos egressos do sistema prisional e a aplicação das políticas sociais já
existentes para este fim.

• O Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária de 201546 fixa as diretrizes para


essa política e aborda a questão da pessoa egressa na 2ª parte, na medida 10 (Egressos e política
de reintegração social), enfatizando a necessidade do fortalecimento da política de reintegração

45
BRASIL. Decreto nº 7.177, de 12 de maio de 2010. Brasília, 2010. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/Decreto/D7177.htm Acesso em: 27 nov. 2022.
46
BRASIL. CNPCP. Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Brasília, 2015. Disponível em:
https://www.conjur.com.br/dl/plano-nacional-politica-criminal.pdf Acesso em: 27 nov. 2022.
64
social para garantir apoio ao egresso do sistema prisional em seu retorno à sociedade, apontando
que:

O retorno da pessoa que esteve privada de liberdade ao convívio social é dificultado


pelo estigma que existe sobre o egresso do sistema prisional. Há dificuldade de
inserção no mercado de trabalho, de retomar o cotidiano fora das grades em amplos
sentidos. A política de reintegração social deve ser fortalecida para propiciar apoio do
estado ao egresso a fim de orientá-lo em seu retorno à sociedade. (BRASIL, 2015, p.
33)

Define, a partir de então, as seguintes demandas:

a) Desenvolvimento de uma Política Nacional de reintegração que envolva


Ministérios correlatos (Trabalho, Assistência Social, Educação, Saúde) e a Sociedade
Civil; Política Nacional de Atenção às Pessoas Egressas do Sistema Prisional;
b) Estimular a criação de patronatos ou órgãos similares nas unidades da federação
que não possuem equipamentos destinados a executar a política de reintegração social;
c) Criar canais que facilitem ao preso ou egresso obter documentos aptos ao exercício
da plena cidadania e certidões de antecedentes que respeitem o disposto no art. 202
da LEP, principalmente com o fim de auxiliá-lo na obtenção de emprego;
d) Instituir medidas que favoreçam a inserção dos egressos no mercado de trabalho.
(BRASIL, 2015, p.33)

Dessa forma, pode-se concluir que a normativa internacional e as normativas nacionais


subsidiam legalmente a política de atenção à pessoa egressa do sistema prisional e constituem-
se parâmetros para compreensão da realidade e das dificuldades vivenciadas antes, durante e
após a saída da prisão, para a efetivação de diferentes direitos, não podendo ficar somente no
campo das ideias e projeções.

Estigmatização social do egresso e suas dificuldades de reinserção


Percebemos ao longo deste estudo que a prisão está estruturalmente amparada em uma
lógica seletiva e repressora que, para Goffman (1974), leva à despersonalização e anulação de
qualquer subjetividade dos indivíduos a ela subjugados. Nesse sentido, a prisão ultrapassa a
perda da liberdade e atinge a dignidade dos sujeitos, ocasionando consequências objetivas e
subjetivas a quem passou pela experiência do cárcere.
Todo o aparato burocrático-legal, que vai desde o ingresso na prisão, o processo de
cumprimento de pena e a saída, se insere na lógica do controle e da vigilância, estabelecendo
uma rotina em relações de dominação, que envolvem todos os atores no cárcere inseridos:
indivíduos privados de liberdade, seus familiares, operadores da justiça e funcionários
65
prisionais.
Tudo o que se impõe intramuros (barreiras institucionais, administrativas, morais e
sociais) repercutirá não só durante o cumprimento da pena, mas também e, sobretudo, no que
virá depois dela. Assim, o encarceramento retira toda a autonomia do sujeito, o que vai muito
além privação de liberdade: ele é afetado pela perda de noções básicas de se organizar e
controlar a própria vida, o que não o prepara para o retorno social aberto.

São predefinidos os horários de alimentação e sono, as roupas a serem utilizadas, o


corte de cabelo, o posicionamento das mãos, os comportamentos permitidos e os que
são exigidos e acarretam punição caso sejam descumpridos. A rígida organização de
rotinas institucionais no que tange ao acesso aos serviços – atendimento jurídico e
psicossocial, visita de familiares, trabalho, frequência à escola, etc. – é contraposta à
administração autônoma das facções no interior das galerias e alojamentos. Desta
forma, não há alternativas a não ser a adaptação e a submissão, seja à administração
prisional, seja aos demais poderes estabelecidos. (BRASIL, 2020c, p.38)

Trata-se, portanto, de adaptação ao meio interno e desadaptação de modos de vivência


em meio aberto. A adaptação nesse contexto torna-se meio de sobrevivência. Para tanto, se faz
necessária a adoção de modos comportamentais e o estabelecimento de padrões estereotipados
de linguagem e expressão. O que, na maioria dos casos, gera maneiras agressivas de se
apresentar, ansiedade constante, baixas perspectivas pós cárcere, bem como aimplicação na
responsabilização de seus atos.
Há também alterações na afetividade, que provocam dificuldades de relacionamentos e
perda dos vínculos afetivos. No caso de mulheres em situação de privação de liberdade, se se
considerar a realidade brasileira em que há um alto número de famílias monoparentais chefiadas
por mulheres, sendo ainda muito forte o papel de gênero desempenhado no cuidado dos filhos
e da família, o prejuízo é ainda mais grave. Portanto, com a prisão, podem ser acentuados os
problemas vivenciados no quesito relações e vínculos familiares.
Difícil pensar no papel reabilitador do sistema prisional tendo em vista tais
circunstâncias vivenciadas no cárcere, pois ele se impõe pelo reforço da exclusão. A cultura
que transpassa o sistema carcerário produz marcas e implicações na vida em liberdade e as
implicações do aprisionamento se sobreporão às demais situações vividas pelas pessoas
egressas desde antes de sua prisão. Isso poderá ser verificado nos marcadores descritos a seguir.

66
Marcadores da condição da pessoa egressa
Já se sabe o perfil das pessoas que são encarceradas no Brasil, perpassadas por diversas
expressões da questão social. Tais condições serão ampliadas pelas consequências sociais e
pessoais que a prisão acarreta nos sujeitos, somando-se, assim, dois processos de exclusão: o
anterior ao cárcere e o agora estigmatizado pelo cárcere.
Conforme depoimentos colhidos pelo DEPEN (BRASIL, 2020c, p.40-42), foi possível
relacionar alguns indicadores da condição da pessoa egressa, que foram comumente
mencionados por seu impacto na saída da prisão e na construção de novos projetos de vida. O
Departamento enfatiza que não se trata de um elenco exaustivo; são aspectos que não se
excluem, mas se somam e se reforçam mutuamente, articulando novas determinações.

Mobilidade: A dificuldade de locomoção aponta para a lacuna de políticas de


assistência aos egressos prisionais, desde o instante de saída dos presídios, visto que
muitas vezes a pessoa que foi liberada não dispõe de passagens nem para deslocar-se
até sua residência, muitos menos para cumprir algumas determinações de comparecer
ao Fórum ou ao Conselho Penitenciário. Muitas vezes encontram-se cumprindo pena
em outras cidades e distantes de sua residência.
Documentação É comum a dificuldade de possuir ou de portar sua documentação
pessoal, certidão de nascimento, carteira de identidade, certificado de reservista e
carteira de trabalho. Ainda que a documentação exista ou que tenha sido encaminhada
e confeccionada durante a prisão, não há garantia que o/a preso/a possa acessá-la
quando de sua saída. Nem sempre a documentação acompanha as diversas
transferências de local de cumprimento de pena e nem sempre a documentação é
preservada. Há ainda os entraves da Justiça Eleitoral (título eleitoral) e do Exército
(certificado de reservista), já que o não cumprimento das obrigações estabelecidas –
embora a impossibilidade dada pela prisão – impede a confecção dos demais
documentos civis.
Fragilidade nos vínculos familiares e comunitários: O período de prisão estabelece,
naturalmente, um distanciamento espacial do convívio com a família. Soma-se a isto,
as dificuldades enfrentadas para a realização das visitas, que vão desde o custo do
deslocamento, a disponibilidade de tempo exigido, a perda de dias de trabalho, a
exposição à revista vexatória, a submissão às regras das ‘chefias’ da facção, entre
outros. Esses aspectos se verificam nesta fragilização dos vínculos, em que o não
compartilhamento do cotidiano familiar deixa distante o estabelecimento de relações
e experiências de cuidado material e afetivo mútuo. Da mesma forma, o
distanciamento da comunidade – seja de amigos ou de relações de trabalho – traz o
sentimento de não pertencimento ou de sua prescindibilidade no contexto da família
ou da comunidade. Destaca-se que esta não é questão vivenciada apenas pelas pessoas
privadas de liberdade e egressas, já que a sociedade contemporânea está permeada
pela fragilização da solidariedade social e pela potencialização da individualização.
No entanto, o que se coloca é o fato de que a prisão potencializa esta condição e é por
ela agravada, com especial consequência para a pessoa egressa.
Trabalho: O trabalho na sociedade industrial capitalista se constitui quase que um
fim em si mesmo, pois é elemento de reconhecimento e identidade social. Para além
da luta pela sobrevivência material, ele está diretamente relacionado à possibilidade
de pertencimento ao mundo legal, dos bons e produtivos. Porém, nas condições do
mundo do trabalho contemporâneo, a ausência de qualificação e formação
profissional, a precária formação educacional e de domínio das novas tecnologias,
67
associados às sequelas, já impregnadas, do período de prisão dificultam e/ou impedem
este acesso ao reconhecido ‘mundo do trabalho’. Isto porque, se as possibilidades já
são muito exíguas para todos os trabalhadores, serão muito mais para quem está saindo
da prisão e que possui todas as marcas daí decorrentes.
Moradia: ‘Ter para onde ir’ não significa apenas a possibilidade de ter condições de
abrigo e alojamento. Traz o sentido de pertencimento e possibilidade de reconhecer-
se em um lugar social, bem como a possibilidade de ser referenciado/a nos serviços
de atendimento social. Da mesma forma, não poder indicar um endereço em uma
seleção de trabalho, ou não poder receber correspondências, constitui mais um aspecto
de exclusão na disputa do mercado de trabalho. Este é um aspecto tão significativo
que ser ex- presidiário/a passou a ser uma característica de parte da população de rua
atendida pelos equipamentos da política de Assistência Social. A demanda por
equipamentos e recursos temporários para este fim, já significativa na população em
geral, passa a ter para este público um acentuado sentido de urgência.
Antecedentes Penais e preconceito: Uma consequência do período de
encarceramento é sem dúvida a discriminação sentida pelos egressos. Se as condições
pessoais, baixa escolaridade, precária formação profissional, dificuldades de
documentação e de endereço fixo já determinam uma não cidadania, a condição de
ex-presidiário/a será a condição por excelência das resistências e dificuldades a serem
enfrentadas não só para inserção no mercado de trabalho, mas em diversos setores da
vida social. O registro dos antecedentes criminais demarca ainda mais a linha divisória
entre os bons e capazes de produzir e os indesejáveis e incapazes de ser socialmente
úteis. Destaca-se que esta restrição dada pelo registro de antecedentes, em muitos
casos, é extensiva aos familiares, que também passam a ficar marcados como ‘familiar
de preso’.
Dificuldades cognitivas e defasagem informacional: O nível de escolaridade das
pessoas que cumprem pena de privação de liberdade no Brasil é paradigmático das
desigualdades sociais, da seletividade penal e das exíguas possibilidades existentes
quando da saída da prisão. Cerca de 80% da população carcerária possui no máximo
ensino fundamental completo (BRASIL, 2014). Da mesma forma, o reduzido número
de presos que frequentam ensino formal na prisão – 10,7% como se viu – em nada
contribui para reversão deste quadro. São limitações que serão potencializadas pela
dificuldade de acesso à cultura, à informação e à formação profissional e, ainda, pela
restrição de contato e de troca com o ‘mundo lá fora’. Neste contexto está ainda o
restrito trânsito pelas tecnologias de informação, que são rotina e exigência na vida
contemporânea, com consequências importantes para o acesso ao mercado e trabalho
e a todos os demais serviços sociais.
Acesso à justiça: Independentemente de qual seja a condição da pessoa egressa, se
em final de pena ou em cumprimento de livramento condicional ou ainda em regime
aberto, há constantemente a necessidade de informação sobre o andamento dos
processos e sobre direitos e deveres no âmbito da justiça penal. Correntemente são
necessários encaminhamentos ou providências burocráticas e jurídicas que se tornarão
decisivas para a continuidade e para a organização da vida em liberdade. Há
problemas de mobilidade e o desconhecimento sobre a possibilidade, ou a forma, de
acessar a Defensoria Pública ou outras instituições do sistema de justiça e de defesa
de direitos que exigem persistência por quem deles necessita.
Problemas de saúde: São inúmeras as consequências da prisão para a saúde do/a
preso/a, conforme mencionado anteriormente. Doenças infectocontagiosas e uma
série de outros problemas de saúde deverão ser enfrentadas e irão somar-se às demais
dificuldades apontadas, repercutindo também na inserção no mercado de trabalho.
Destaca-se ainda o uso abusivo de drogas, muitas vezes já presente no processo de
criminalização e no contexto prisional, cujo enfrentamento irá demandar diferentes
esforços por parte da pessoa egressa e de sua família.
Vinculação e dependência ao ‘mundo do crime’: A história de vida, a prática do
delito e a vivência da prisão estabelecem, em muitos casos, uma relação de
pertencimento com o ‘mundo do crime’ a qual não necessariamente termina com a
saída da prisão. A dependência estabelecida pela troca de favores de diferentes ordens
68
no contexto prisional pode ter continuidade e ser adicionada às dificuldades
encontradas para o ingresso no mercado legal de trabalho. Pois, ainda que este
ingresso ocorra, será em sua forma mais precarizada, e com baixa remuneração. Desta
forma, as demandas de sustento pessoal e da família ficam associadas à facilidade de
remuneração com trabalhos ilegais, como o comércio de drogas que, em determinadas
circunstâncias, é visto como moralmente justificável (PIMENTA, 2014 apud
BRASIL, 2020c, p. 42).

A pessoa egressa se constitui pelos processos de aumento da vulnerabilidade, acentuado


pela experiência de prisionização. Portanto, para que se possa pensar na construção de uma
política nacional à pessoa egressa do sistema prisional, é necessário entendê-la como uma
pessoa que necessita de algum atendimento no âmbito das políticas públicas, dos serviços
sociais ou jurídicos, exatamente pela fragilidade que o período de permanência no sistema
prisional acarretou em sua vida.

Nesse horizonte, os processos que visam ao enfrentamento da realidade vivenciada


pelas pessoas egressas devem considerar a complexidade e a relevância das inúmeras
violações de direitos que esses sujeitos sofrem no decorrer de suas vidas – violações
estas que não começam com o encarceramento, mas nele resultaram. (BRASIL, 2016,
p. 38)

SAIBA MAIS!
• Leia um compêndio de artigos que trata do Programa de Inclusão Social de Egressos do
Sistema Prisional – PrEsp – em funcionamento no Estado de Minas Gerais, acessando
o link
http://institutoelo.org.br/site/files/publications/6249f589266779f9bd30d6a403db544f.
pdf
• Acesse mais informações governamentais de Minas Gerais sobre o PrEsp em
https://www.mg.gov.br/servico/participar-do-programa-de-inclusao-social-de-
egressos-do-sistema-prisional-presp
• Assista ao documentário Pelo direito de recomeçar, acessando-o pelo link
https://www.youtube.com/watch?v=YLrwdquiL4Y&t=17s

O papel da sociedade civil na execução da pena


As organizações da sociedade civil são entidades privadas sem fins lucrativos, que
desenvolvem ações de interesse público e não têm o lucro como objetivo. Essas organizações
atuam em diversas áreas, tais como: Direitos Humanos, saúde, educação, cultura, assistência
69
social, moradia, tornando-se imprescindíveis na promoção e na defesa de direitos.
É de extrema importância a pactuação de parcerias entre as organizações da sociedade
civil e o Estado na garantia e efetivação de direitos, uma vez que essa parceria estimula o
desenvolvimento de gestão pública democrática e participativa, possibilitando aos cidadãos as
políticas públicas a que têm direito.
Em termo legais, o termo Organização da Sociedade Civil (OSC) abrange:

a) entidades privadas sem fins lucrativos que não distribuam aos seus sócios ou
associados, conselheiros, diretores, empregados, doadores ou terceiros eventuais
resultados, sobras, excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, isenções
de qualquer natureza.
b) sociedades cooperativas previstas na Lei Nacional n° 9.867/99: as integradas por
pessoas em situação de risco ou vulnerabilidade pessoal ou social; as alcançadas por
programas e ações de combate à pobreza e de geração de trabalho e renda; as voltadas
para fomento, educação e capacitação de trabalhadores rurais ou capacitação de
agentes de assistência técnica e extensão rural; e as capacitadas para execução de
atividades ou de projetos de interesse público e de cunho social;
c) organizações religiosas que se dediquem a projetos de interesse público e de cunho
social distintos das atividades destinadas a fins exclusivamente religiosos.
(DISTRITO FEDERAL, 2018, p.10-11) 47:

No caso da gestão prisional, a participação da sociedade civil significa: o fortalecimento


da política de integração social; a ampliação da transparência, da participação social e do
controle da execução penal; a definição de parâmetros para trabalhadores e metodologia
prisional nacional; o respeito à diversidade; a melhoria das condições do cárcere; a garantia de
tratamento digno do preso; e a instituição de modelo de gestão prisional e combate aos fatores
geradores de ineficiência.

PARA EXAMINAR!
O Conselho Nacional de Justiça, para executar o Programa Fazendo Justiça cujos
objetivos são: (a) aperfeiçoar os procedimentos de porta de entrada, (b) garantir a regularidade
no cumprimento da decisão judicial nas medidas penais e socioeducativas e (c) qualificar a
inclusão social na porta de saída conta com a parceria de várias organizações da sociedade civil
na execução das ações propostas no referido programa. Acesse o link
https://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario/fazendo-justica/parceiros-e-apoio/ e saiba mais sobre

47
DISTRITO FEDERAL. Manual de Gestão de parcerias do marco regulatório das Organizações da Sociedade
Civil. Brasília, 2018. Disponível em: https://www.casacivil.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2018/11/Manual-
MROSC-DF-FINAL.pdf Acesso em: 31 jan. 2023.
70
a importância da sociedade civil na política de execução penal.

Órgãos: Ouvidorias, Conselhos penitenciários, Conselhos da comunidade, Defensoria


Pública

Ouvidorias
A Ouvidoria do Sistema Prisional foi criada a partir da reestruturação do Departamento
Penitenciário Nacional, do Ministério da Justiça, conforme Decreto n.º 4.991, de 18 de fevereiro
de 2004. Tem por missão zelar pelo cumprimento das normas da execução penal e pelo respeito
à dignidade do indivíduo sob a tutela do Estado brasileiro. Visa estimular e apoiar a criação e o
funcionamento de Ouvidorias do sistema penitenciário dos demais entes da federação. Essa
medida favorece o intercâmbio de informações e maior celeridade na resposta ao cidadão.

A Ouvidoria Nacional dos Serviços Penais - ONSP é um órgão vinculado ao


Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça e Segurança Pública
que tem como objetivos primordiais a defesa dos direitos das pessoas privadas de
liberdade e seus familiares, o acolhimento e processamento de manifestações e
denúncias de servidores, o fortalecimento do controle e participação social nos
serviços penais e, ainda, o monitoramento dos estabelecimentos penais do país, a
partir de inspeções prisionais.48

Existem, também, as Ouvidorias Estaduais, que no caso de Minas Gerais, denomina-se


Ouvidoria do Sistema Penitenciário e Socioeducativo, cuja finalidade é receber, registrar e
enviar resposta a reclamações, denúncias, elogios, solicitações e sugestões relativas às questões
penitenciárias e socioeducativas, referentes tanto ao preso quanto ao próprio servidor. Além
disso:

Realiza visitas técnicas em unidades prisionais, penitenciárias e do socioeducativo.


Elabora relatórios técnicos e de diagnósticos que têm por finalidade contribuir para a
qualificação da gestão, além de servirem de termômetro para evidenciar os problemas
presentes na execução da atividade.
Realiza encontros com a sociedade civil organizada, com o Ministério Público, com
a Defensoria Pública e com o Judiciário, além dos próprios sistemas de segurança
prisional e socioeducativo, visando subsidiar as discussões, o que resulta em propostas
construídas coletivamente.
Percorre os municípios mineiros, por meio do projeto da Ouvidoria Móvel da OGE,
levando atendimento presencial à população, aproximando os usuários dos serviços

48
SITE GOV.BR. Ouvidoria Nacional de Serviços Penais. Disponível em: https://www.gov.br/depen/pt-
br/canais_atendimento/ouvidoria Acesso em: 31 jan. 2023.
71
das áreas de atuação desta Ouvidoria49.

Conselhos penitenciários
O Conselho Penitenciário do Estado de Minas Gerais (COPEN/MG) integra a área de
competência da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública como órgão consultivo e
fiscalizador da execução da pena.
São de competência do Governador do Estado as designações dos membros efetivos e
suplentes, com mandato de 4 (quatro) anos, sendo permitida a recondução. Os membros do
Conselho Penitenciário são compostos por representantes do Ministério Público Federal,
Ministério Público Estadual, Defensoria Pública da União, Defensoria Pública do Estado,
Ordem dos Advogados, bem como professores das ciências penais e correlatas de instituições
de ensino superior.
Para a consecução de seus objetivos, compete ao Conselho Penitenciário do Estado de
Minas Gerais:

- Emitir parecer sobre a concessão de comutação de pena e indulto;


- Emitir parecer de livramento condicional, quando provocado pelo Juiz de Execução;
- Determinar diligências indispensáveis à perfeita instrução dos processos submetidos
a seu exame;
- Visitar estabelecimentos penais e sugerir às autoridades competentes as providências
julgadas necessárias à execução do regime penitenciário;
- Adotar medidas complementares e instrutivas, tanto de ordem técnica quanto
jurídica, necessárias ao funcionamento do Conselho;
- Articular-se com Tribunais, Juízes, Administração Pública e com terceiros, visando
a efetivação das decisões proferidas pelo Conselho;
- Apresentar, no primeiro trimestre de cada ano, ao Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária, o relatório das atividades desenvolvidas no exercício
anterior;
- Elaborar, discutir e aprovar o seu regimento interno;
- Discutir e decidir sobre outros assuntos que lhe sejam atribuídos pela legislação
federal50.

Conselhos da comunidade
No artigo 4º da Lei de Execução Penal é disposto que o Estado deverá recorrer à
cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida de segurança. Um

49
SITE OUVIDORIA GERAL MG. Ouvidoria do Sistema Penitenciário e Socioeducativo. Disponível em:
https://www.ouvidoriageral.mg.gov.br/ouvidorias-tematicas/ouvidoria-do-sistema-penitenciario Acesso em: 31
jan. 2023.
50
SITE SEJUSP MG. Conselho Penitenciário Estadual (COPEN). Disponível em:
http://www.seguranca.mg.gov.br/sobre/conselhos/conselho-penitenciario-estadual-copen Acesso em: 31 jan.
2023.
72
dos principais suportes oferecidos ao cumpridor de pena ou medida de segurança, senão o
principal, é o Conselho da Comunidade, pois, sendo ele bem constituído e atuante, tornará essa
tarefa árdua um pouco mais branda.
No artigo 80 da mesma lei afirma-se que haverá, em cada Comarca, um Conselho da
Comunidade, composto, no mínimo, por um representante de associação comercial ou
industrial, um advogado indicado pela seção da Ordem dos Advogados do Brasil e um assistente
social escolhido pela Delegacia Seccional do Conselho Nacional de Assistentes Sociais. Na
falta da representação prevista nesse artigo, ficará a critério do juiz da execução a escolha dos
integrantes do Conselho. Em seu artigo 81, a Lei de Execução Penal apresenta as atribuições
do conselho da comunidade, a saber:

Art. 81. Incumbe ao Conselho da Comunidade:


I - visitar, pelo menos mensalmente, os estabelecimentos penais existentes na
Comarca;
II - entrevistar presos;
III - apresentar relatórios mensais ao juiz da execução e ao Conselho Penitenciário;
VI - diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência
ao preso ou internado, em harmonia com a direção do estabelecimento.(BRASIL,
1984).

SAIBA MAIS!
Amplie seus conhecimentos sobre a relevância dos Conselhos da Comunidade na
reintegração social, acessando https://www.youtube.com/watch?v=A0H6suNRzMA

Defensoria Pública
Órgão atuante na Execução Penal, que presta assistência jurídica às pessoas condenadas
criminalmente e em cumprimento de pena. Seguem alguns exemplos de atuação:
Velar pela regular execução das penas e das medidas de segurança, em todos os graus
e instâncias, de forma individual e coletiva;
Requerer a unificação de penas, a detração, a remição da pena, saída temporária,
autorização para trabalho externo, progressão de regime, livramento condicional,
pedidos de salvo conduto, levantamento de pecúlio, indulto, comutação, transferência
de presos;
Solucionar questões relativas ao monitoramento eletrônico;
Encaminhamento pessoas drogaditas em cumprimento de pena para internação;
Inspecionar e visitar periodicamente os estabelecimentos penais;
Requerer interdição de estabelecimento penal.51

51
SITE DPMG. Serviço / Criminal - Saiba o que a Defensoria Pública de Minas Gerais pode fazer por você.
Disponível em: https://defensoria.mg.def.br/?servicos=criminal Acesso em: 31 jan. 2023.
73
ATENÇÃO!
Todos esses órgãos atuam na execução penal a fim de garantir que os Direitos Humanos
das pessoas privadas de liberdade sejam respeitados. Eles produzem relatórios de inspeção
prisional, os quais são de extrema importância para se construir um retrato correto da realidade
dos estabelecimentos prisionais no país.

FICAMOS POR AQUI!!!


Agora que você já possui uma compreensão do que seja os Direitos Humanos e o que
ele significa no contexto do sistema prisional, local onde você irá atuar profissionalmente,
elabore um plano de trabalho de um dia em que você terá de atuar assegurando as garantias
de direitos das pessoas privadas de liberdade sob sua custódia. Procure refletir no quão o seu
trabalho, na perspectiva da garantia de direitos é um dos fatores que contribuem para a redução
da reincidência criminal.

74
REFERÊNCIAS

AMORIM-SILVA. O trabalho nas prisões na perspectiva da socioeducação: uma análise


do trabalho docente e do agente de segurança penitenciário/polícia penal. Tese (Doutorado).
Universidade Federal de Minas Gerais – Faculdade de Educação. Belo Horizonte, 2021.

AMARAL, CLÁUDIO PRADO. A história da pena e da prisão. Jundiaí, Paco Editorial:


2016.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução de Paulo M. Oliveira. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2011.

BENEVIDES, Maria Victoria. Cidadania e Direitos Humanos. São Paulo: Instituto de Estudos
Avançados da Universidade de São Paulo. Disponível em:
http://www.iea.usp.br/publicacoes/textos/benevidescidadaniaedireitoshumanos.pdf/view
Acesso em: 27 nov. 2022.

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em:


https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm. Acesso em: 27 nov. 2022.

BRASIL. Lei de Execução Penal (LEP 7210/1984). Disponível em:


https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm. Acesso em: 18 nov. 2022.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em:


https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em:
31/11/2022.

BRASIL. Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997. Define os crimes de tortura e dá outras


providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9455.htm. Acesso
em: 27 nov. 2022.

BRASIL. Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. Programa


Naciona de Direitos Humanos (PNDH-3). Brasília- SEDH/PR, 2009. Disponível em:
https://direito.mppr.mp.br/arquivos/File/PNDH3.pdf Acesso em: 31 jan. 2023

BRASIL. Decreto 7.177 de 12 de maio de 2010. Disponível em:


https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7177.htm. Acesso em:
31 jan. 2023.

BRASIL. Decreto nº 7.177, de 12 de maio de 2010. Brasília, 2010. Disponível em:


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Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Brasília, 2011. Disponível em:
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2011.pdf. Acesso em: 27 nov. 2022.
75
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arquitetura prisional. Brasília, 2011. Disponível em: https://www.gov.br/depen/pt-
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medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras. Brasília, 2016. Disponível em:
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https://atos.cnj.jus.br/files/resolucao_287_25062019_08072019182402.pdf Acesso em: 31
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significa-a-sigla-lgbtqia-e-a-importancia-do-termo-na-inclusao-
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conteudo/uploads/2018/11/Manual-MROSC-DF-FINAL.pdf Acesso em: 31 jan. 2023.

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and-prison-reform/Nelson_Mandela_Rules-P-ebook.pdf . Acesso em: 27 nov. 2022.

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Brasil.Disponível em: https://exame.com/brasil/onu-impunidade-por-tortura-nas-prisoes-e-
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