Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
A revolução americana
O primeiro novo Estado a ser fundado tendo como base os
princípios do Iluminismo ficava na América do Norte. A
revolução que levou à criação da república americana surgiu dos
conflitos entre ingleses e franceses durante os séculos 17 e 18.
Conforme foi mencionado no capítulo anterior, essas guerras
foram travadas não apenas na Europa mas também no mundo
colonial, resultando na vitória britânica na América do Norte e na
Índia. Porém, como dinheiro e soldados britânicos tinham sido
usados para vencer a guerra e expulsar os franceses da América do
Norte garantindo que faria parte de um império em expansão,
Londres achou que a colônia deveria contribuir mais para os
custos de defesa. O esforço atabalhoado por parte do governo
britânico de coletar impostos para esse fim, alienou os colonos e
levou à Guerra da Independência.
A religião também contribuiu para a crise. Durante o Grande
Despertamento, muitos colonos passaram a esperar que estivessem
diretamente relacionados com os planos de Deus para o fim dos
tempos e que o reino milenar de Cristo estivesse prestes a
começar. Quando o fogo do reavivamento foi esfriando, muitos
clérigos misturaram as expectativas de que todas as nações seriam
convertidas a Cristo com um compromisso em relação à América
como terra da liberdade. Em primeiro lugar, viam a França e
depois a Inglaterra como arqui-inimigas dos direitos civis e da
liberdade religiosa. Esse “milenialismo civil” considerava que a
liberdade era a causa defendida por Deus, sendo a opressão civil
— e não uma religião formal — o Anticristo. A nação em si era
vista como agente da atuação de Deus na História.
O Despertamento ajudou a lançar as bases para um
reavivamento nacional. Tendo em vista que o Despertamento
havia funcionado de modo intercolonial e nutrido relações entre as
igrejas de várias regiões geográficas, foi o primeiro acontecimento
verdadeiramente “nacional” nas colônias. Também valorizou o uso
de palavras como “liberdade”, “virtude” e “tirania” no discurso
público e criou um modelo de liderança que exigia uma resposta
direta das pessoas. Clérigos de várias denominações — batistas,
congregacionalistas, presbiterianos, luteranos, reformados
holandeses e até anglicanos — viam-se sob a orientação de Deus
para despertar e guiar a nação para o cumprimento iminente do
milênio.
Com o aprofundamento da crise, esses pastores apoiaram a
resistência à Grã-Bretanha. A tentativa anglicana de criar uma
diocese na colônia também assustava muitos dos ministros de lá e,
numa série de reuniões conjuntas, congregacionalistas e
presbiterianos declararam firmemente que consideravam o
episcopado a ferramenta eclesiástica do governo absolutista.
Lançando mão do ideal puritano da aliança, insistiram que o
governo era baseado num acordo ou contrato entre o governante e
os cidadãos. Muitos anglicanos, especialmente aqueles das
colônias do sul, juntaram-se aos que rejeitavam a imposição de um
bispo da Inglaterra sobre a América e, de fato, dois terços daqueles
que assinaram a Declaração de Independência eram membros da
Igreja da Inglaterra.
1792 1792-98
Reune-se a Seita de Clapham Hannah More publica os Panfletos Baratos de Repositório
1773
O papa dissolve os jesuítas
1725 1755 1790 1791 1801 1813
O Grande Conversão de Constituição Civil Ratificada Concordata Abertura da
Despertamento John Newton dos Clérigos a Lei dos entre Napoleão Índia para
Direitos e o papa missões
1700 1750 1800 1850
1774 1775 1789 1806 1815
Lei de Início da Revolução Dissolução do Santo Derrota final
Quebec Revolução Francesa Império Romano de Napoleão
Americana
1763 1763 1787 1804 1807
Tratado de Febronianismo Convenção Napoleão O Parlamento aprova a
Paris proclamado Constitucional se torna Lei de Wilberforce
imperador abolindo o tráfico de
escravos
1781
Édito de Tolerância de
Joseph II
Mas outros cristãos sinceros opunham-se à idéia de uma
guerra pela independência. Entre eles estavam os anglicanos na
Nova Inglaterra e colônias centrais bem como os metodistas. O
próprio John Wesley escreveu sobre a Revolução num tom crítico
e muitos membros de seu grupo seguiram seu exemplo. Wesley
estava convencido de que o reavivamento que havia se espalhado
pelas colônias estava sendo abafado pelo materialismo e era isso
que, na realidade, estava por trás da revolução. Além disso, ele
concordava com o ensinamento de que um cristão não deve resistir
ativamente à autoridades devidamente instituídas. Outros que se
opunham ao conflito eram as igrejas da paz — os quakers, Igreja
dos Irmãos, morávios e menonitas. Durante as lutas, esses cristãos
pacifistas por princípio, eram mal compreendidos e perseguidos
por ambos os lados.
Dentre as ações britânicas mais provocadoras, estavam as
medidas que pareciam favorecer outras partes do império (como
impostos sobre melado e chá) e a imposição de novos impostos
como a Lei do Selo de 1765. Tendo em vista que a maioria dos
líderes coloniais haviam passado a aceitar os ensinamentos do
Iluminismo sobre o livre comércio, as novas medidas pareciam
anacrônicas e ameaçavam sua posição. O imposto do selo — que
deveria ser cobrado de todos os papéis impressos e documentos
legais — foi instituído numa época de queda na economia e fez
muitos se perguntarem se o Parlamento tinha o direito de cobrar
impostos das colônias. Como não havia nenhum representante
americano dentro do Parlamento, os líderes coloniais
argumentavam que essa era uma “taxação sem representação”.
Boicotes da colônia e problemas no recolhimento dos impostos
levaram à anulação dessas e outras leis de rendimento em 1770,
mas o imposto sobre o chá que favorecia a Companhia Britânica
das Índias Orientais continuou vigorando como sinal da autoridade
central. Quando colonos irados jogaram no mar todo o
carregamento de chá de um navio em 1773 (“Boston Tea Party”),
enfurecido o rei George III fechou o porto e revogou a
constituição de Massachusetts.
Os pastores americanos já estavam indignados com aquilo
que consideravam uma atitude injusta por parte dos britânicos,
mas tiveram um choque ainda maior com a Lei de Quebec de
1774. Essa medida, criada para facilitar a integração da Nova
França com o Império Britânico, dava amplos poderes à Igreja
Católica naquela região. Ela reconhecia oficialmente a Igreja e
permitia que esta coletasse os valores habituais. Como a lei
também estendia as fronteiras de Quebec de modo a incluir a área
de Ohio, colonos de Nova York, Pensilvânia e Virgínia acharam
que estavam sendo impedidos de ir para o interior.
Em setembro de 1774 ocorreu a primeira reunião do
Congresso Continental na Filadélfia na qual foi questionado o
direito do Parlamento de controlar as colônias. No dia 19 de abril
de 1775, logo depois de uma segunda reunião do Congresso,
começaram as hostilidades entre tropas britânicas e a milícia
colonial nos campos de Lexington e na ponte Corcor, não muito
longe de Boston. Os colonos acreditavam estar defendendo seus
direitos como pessoas livres e em seu desafio ao Parlamento e ao
rei da Inglaterra, tomaram os primeiros passos rumo tanto ao
republicanismo como à igualdade humana. As idéias iluministas
que haviam sido semeadas sobre o Novo Mundo começavam a
germinar.
Como a violência continuava, o Congresso Continental
formou um exército sob o comando de George Washington,
começou a procurar aliados europeus e adotou a Declaração de
Independência formal no dia 4 de julho de 1776. Escrita por
Thomas Jefferson (ver capítulo 15), sua invocação de Deus refletia
o deísmo iluminista e, no fundo, colocava Deus a serviço da tarefa
secular que os americanos tinham diante deles. Apesar de no
começo não terem se saído bem na guerra, uma importante vitória
em Saratoga no ano seguinte encorajou os franceses a apoiar os
americanos como um meio de restabelecer seu prestígio na
Europa. Enquanto isso, representantes das antigas treze colônias
(agora chamadas de “estados”) assinaram os Artigos de
Confederação que criavam os Estados Unidos da América. Em
1778, a França formou uma aliança com a nova nação e sua ajuda
levou à derrota dos britânicos que se entregaram em Yorktown em
1781. No Tratado de Paris, dois anos mais tarde, a Grã-Bretanha
reconheceu a independência das colônias.
O país viu-se imediatamente diante de uma crise econômica
tendo em vista que os navios americanos foram excluídos do
comércio com as Índias Ocidentais Britânicas. Além disso, a
instabilidade social devido à falta de autoridade dos Artigos
provisórios da Confederação preocupava especialmente as classes
mais ricas, que viam a necessidade de um governo central mais
forte. Sua preocupação os levou a convocar uma convenção na
Filadélfia em 1787 para revisar os Artigos. Um documento
completamente diferente resultou dessa reunião, a Constituição
que tornou-se vigente em 1789. Ela criava uma república federal,
com certos poderes reservados aos estados e outros dados ao
governo central. Nesse sistema, estava claro que os estados eram
mais do que unidades administrativas de uma burocracia central. A
Constituição também incorporou o conceito de Montesquieu de
separação dos poderes em legislativo, executivo e judiciário.
Havia dispositivos e recursos embutidos no mecanismo
governamental para impedir que uma das unidades se tornasse
poderosa demais, oprimindo as outras ou o próprio povo. O
judiciário tinha um caráter singular pois possuía poder de
interpretar a constitucionalidade das ações dos estados e do
Congresso. George Washington, um líder respeitado cujos padrões
morais eram impecáveis, tornou-se o primeiro presidente da
república.
O impacto do Iluminismo ficou evidente especialmente na
forma como a Constituição tratava da religião. Não havia nenhum
traço de instituição religiosa no documento e uma cláusula no
Artigo VI declarava especificamente que não seria exigida
nenhuma avaliação religiosa de quem estivesse ocupando cargos
públicos. (Esta foi, obviamente, uma reação a Lei inglesa do Teste
de 1673.) Além disso, por haver incerteza em certos meios se as
liberdades individuais estavam sendo suficientemente protegidas,
um conjunto de dez emendas conhecido como Carta de Direitos
foi aprovado em 1789 e ratificado dois anos depois. A principal
das Emendas era a Primeira:
O declínio do Catolicismo
Depois de 1648, a Igreja Católica como instituição universal
entrou em declínio. O papa, que havia sido ignorado na Paz da
Westphalia, raramente era consultado sobre problemas
internacionais e não estava representado em nenhuma das grandes
conferências de paz. As diversas igrejas nacionais passaram cada
vez mais a ser governadas por sínodos ou bispos e o papado tinha
grande dificuldade em exercer sua autoridade. Uma série de papas
fracos deixou a instituição impotente diante dos crescentes
ataques.
A afirmação mais importante da idéia de Igreja nacional no
século 17 foi o Galicanismo. Numa assembléia em Paris em 1862,
os bispos franceses adotaram uma declaração (os Quatro Artigos
Galicanos) que afirmava que o rei Luís XIV não estava sujeito em
coisas temporais (seculares) a qualquer poder eclesiástico e
nenhuma ação do papa liberava seus súditos da obediência ao rei.
Também declarava que concílios gerais tinham autoridade sobre o
papa e que a coroa e os bispos podiam controlar a interferência do
papa na França. Apesar do papa ter autoridade espiritual universal,
os galicanos insistiam que o Estado controlasse, de fato, o
funcionamento da Igreja em questões como a seleção de bispos,
liturgia, lei eclesiástica e educação.
Um outro desafio ao poder papal foi uma doutrina conhecida
como Febronianismo. Esta foi apresentada num livro publicado
em 1763 por Johann Nikolaus von Hontheim (1701-90), bispo
auxiliar de Trier, sob o pseudônimo de Justus Febronius e com o
título Sobre o Estado da Igreja e o Poder Legítimo do Pontífice
Romano. Apesar de aceitar a primazia do papa como uma figura
digna de honra e administrador executivo em Roma, o pontífice
era, na verdade, um “primeiro entre iguais”. As chaves do reino
em Mateus 16.19 foram entregues a toda Igreja e não só ao
papado. A autoridade legislativa máxima da Igreja era um concílio
geral composto de todos os bispos, que haviam recebido o cargo
de Deus e não do papa e podia-se apelar para o concílio sobre uma
decisão papal. Além disso, no que dizia respeito a questões
humanas, não à lei divina, os príncipes seculares tinha o direito de
recusar-se a obedecer o papado. O autor acreditava que a
centralização excessiva do poder eclesiástico havia sido a causa da
Reforma; assim a descentralização poderia facilitar o retorno de
protestantes à Igreja Católica.
O papa condenou a obra de Hontheim no ano seguinte ao
colocá-la no Índice de Livros Proibidos, mas quatro príncipes-
arcebipos alemães afirmaram os princípios febronianos numa
conferência em 1786. Aceitando apenas uma primazia limitada do
papa, pediram o consentimento episcopal para decretos e bulas
papais, o fim dos apelos a Roma e a autoridade local sobre ordens
religiosas. Na verdade, sua intenção era formar uma Igreja
Católica nacional na Alemanha, mas os bispos inferiores, temendo
o poder dos superiores preferiram o governo distante em Roma à
autoridade mais imediata dos príncipes alemães. A revolta entrou
em colapso em 1789 quando os arcebispos retiraram suas
declarações, mas as implicações foram abrangentes.
A idéia de se limitar a autoridade do papa encontrou
ambiente propício em Viena, onde o futuro “déspota esclarecido”,
o jovem Joseph II, falou sobre a necessidade de liberdade religiosa
no reino do qual era herdeiro. Ele considerava a riqueza poderosa
da Igreja Austríaca um obstáculo para o desenvolvimento
econômico e o controle eclesiástico da educação uma barreira para
o amadurecimento da mentalidade no país. Ao tornar-se imperador
em 1780, Joseph pôs-se a colocar em prática um programa de
reforma completo que iria racionalizar a organização da sociedade
através da centralização estatal e autoridade superior.
Na esfera religiosa, ele foi bastante além do Galicanismo
francês. Em 1781, lançou o famoso Édito de Tolerância, que
garantiu aos protestantes e gregos ortodoxos o direito de ter seus
próprios templos e escolas, de possuir propriedades e assumir
cargos políticos e militares. Joseph justificou a liberdade de culto
dizendo que qualquer Igreja podia ser levada a obedecer o Estado.
Ações posteriores permitiram algumas liberdades um pouco mais
limitadas para os judeus.
As leis de censura foram relaxadas e obras literárias de
críticos da Igreja puderam, então, ser publicadas. Outros decretos
fecharam mosteiros e conventos ou reduziram seu tamanho,
explicando que eram inúteis e causavam desperdícios. Só aqueles
que mantinham escolas, hospitais ou outras obras de caridade
sobreviveram. Assim, setecentas casas religiosas foram fechadas e
trinta e oito mil monges colocados para fora. As propriedades
foram confiscadas e os lucros das mesmas foram revertidos para
financiar uma reorganização das paróquias e instituições de
caridade sob o controle do Estado e para as pensões e suplementos
salariais para os clérigos. Também foi implantado o ensino
universal e obrigatório.
O imperador Joseph na realidade colocou a Igreja sob o
controle do Estado. Exigia-se que os bispos fizessem um voto de
lealdade às autoridades. Os decretos papais precisavam ter
permissão do governo a fim de serem válidos na Áustria. A
educação clerical foi colocadas sob supervisão do Estado e os
seminários passaram a oferecer ensino de Ciências e conhecimento
secular juntamente com a Teologia. Foram dadas ordens tratando
dos mínimos detalhes das práticas religiosas como peregrinações,
observância dos dias santos e mobília e apetrechos das igrejas. Em
1782 o papa Pio VI chegou a fazer uma viagem às pressas para
Viena, onde pediu a Joseph para rescindir suas medidas mas não
teve sucesso. As reformas religiosas permaneceram intactas
mesmo depois de sua morte em 1790 e para os católicos romanos
o termo “josephismo” desde então adquiriu o sentido da Igreja
sendo controlada pelo Estado secular.
Denominações de destaque nas treze colônias americanas
Colônia Estabele Denominações principais Igreja
cimento estabelecida
Virgínia 1607 Anglicanos, presbiterianos e batistas Anglicana
Massachusets 1620 Congregacionais (puritanos), separatistas e batistas Congregacional
New Hampshire 1623 Congregacionais Congregacional
Nova York 1626 Reformados holandeses, anglicanos e presbiterianos Anglicana
(1693)
Maryland 1634 Católicos, anglicanos e presbiterianos Anglicana
(1691)
Connecticut 1634 Congregacionais Congregacional
Rhode Island 1636 Congregacionais, batistas e quakers Nenhuma
New Jersey 1638 Reformados holandeses, presbiterianos e quakers Nenhuma
Delaware 1638 Luteranos e anglicanos Nenhuma
Carolina do Norte 1653 Anglicanos, presbiterianos e morávios Anglicana
Carolina do Sul 1670 Anglicanos, huguenotes e presbiterianos Anglicana
Pensilvânia 1681 Quakers, luteranos, menonitas, irmãos, reformados Nenhuma
alemães, schwenckefelder, presbiterianos e morávios
Geórgia 1733 Anglicanos e morávios Anglicana
(1758)
Nova Scotia 1710, Anglicanos, mas havia tolerância para quase todas as Anglicana
(Acadia) 1749 crenças (1758)
A Revolução Francesa
A contínua incapacidade do governo francês de lidar com os
problemas que afligiam o país tornou a revolução quase inevitável.
Apesar da França, de um modo geral, ser próspera, o sistema
social antiquado vigente no “antigo regime” deixava as finanças
públicas numa situação desesperadora. As terras que eram
propriedade do clero e da nobreza, os chamados “primeiro” e
“segundo” estados ou ordens da sociedade, eram isentas de
impostos, mesmo constituindo 35 por cento da área do país. Isso
significava que o fardo tributário recaía sobre o “terceiro” estado,
os vinte milhões de camponeses e quatro milhões de artesão e a
classe média (burguesia) que constituíam 98 por cento da
população do país. Tendo em vista que a maior parte dos impostos
era paga pelos camponeses, eles tinham boas razões para estar
descontentes. Os fatores econômicos não foram tão importantes na
alienação da classe média, pois sua situação estava melhorando,
mas ressentiam às vantagens sociais da nobreza e suas exclusão
dos cargos melhores no exército, serviço público e Igreja.
Desde a ascensão de Luís XVI ao poder em 1774, vários
ministros das finanças tentaram em vão efetuar reformas
tributárias e a dívida do governo continuou crescendo em ritmo
constante. Então, as guerras na América pesaram ainda mais sobre
o tesouro. Em 1787 o rei convocou uma reunião dos membros do
alto clero e dos nobres (os “Notáveis”) para que fosse aprovado
um programa de reforma que iria cobrar impostos sobre todas as
terras e envolver a colaboração dos contribuintes em assembléias a
serem eleitas sem distinção de classe social. Essa tentativa
fracassou e depois de meses de altercações, em maio de 1789
decidiu-se convocar o Estatamento Geral da França, um grupo que
não se reunia desde 1615. Os nobres insistiam que uma mudança
tributária de tal magnitude só poderia ser feita com o
consentimento de toda a nação através de uma assembléia de seus
representantes. Eles cometeram um erro grave ao pensar que
poderiam controlar o Estatamento Geral e o que resultou foi uma
tempestade revolucionária que destruiu as instituições dominantes
da França.
Essa assembléia não representava o “povo”, mas sim as
“ordens” da sociedade francesa. Porém o terceiro estado, com o
apoio de alguns clérigos e uns poucos nobres, assumiu a liderança
e a transformou numa Assembléia Nacional que escreveu uma
Constituição e fez do Estado um governo baseado nos princípios
do Iluminismo. Mas eles precisavam competir com as grandes
massas de Paris que exigiam comida e um sistema econômico mais
justo e que foram responsáveis pelo grande ato simbólico de
revolução, a invasão à Bastilha, o antigo forte usado como prisão,
em 14 de julho de 1789. Em seguida a violência espalhou-se para
o campo quando camponeses inflamados pelo incidente na
Bastilha começaram a tomar terras, destruir cercas e queimar
mansões senhoriais.
A Assembléia Nacional reagiu à situação desmanchando o
que restava do sistema senhorial, abolindo as diferenças legais
entre classes e adotando a Declaração dos Direitos do Homem e
Cidadão, um documento abrangente sobre direitos humanos.
Durante os dois anos seguintes, a assembléia transformou a nação
em monarquia constitucional e atacou o problema financeiro
através do confisco e venda de terras da Igreja e propriedades dos
nobres. Enquanto isso, o rei havia perdido todo seu poder.
Muitos dos nobres que fugiram para o campo, os chamados
émigrés, voltaram-se para potências internacionais em busca de
ajuda a fim de reconquistar os privilégios e propriedades que
haviam perdido. Ao mesmo tempo, um grupo dentro da assembléia
queria exportar a revolução para outros países. O resultado foi a
explosão de uma guerra com a Áustria e a Prússia em abril de
1792. Isso deu aos radicais (os jacobinos) o impulso necessário
para derrubar a monarquia constitucional e em setembro foi
proclamada uma república. Uma Convenção Nacional foi eleita
para escrever uma nova constituição e sua ala extremista garantiu
a execução de Luís XVI em janeiro de 1793.
Enquanto isso, os exércitos franceses haviam aderido à
ofensiva e a convenção tinha declarado que iria ajudar o povo de
toda parte a “recuperar sua liberdade”. Inglaterra, Espanha e
Holanda juntaram-se então à coalizão contra a França, mas um
exército conscrito, inspirado pelo amor à pátria e liderado por
jovens e competentes comandantes conseguiu enfrentar o desafio
estrangeiro. Além de suprimentos para o exército, os líderes da
república precisavam lidar com problemas internos — uma revolta
entre os devotos católicos e camponeses monarquistas no oeste,
inflação e falta de comida.
Para dirigir o governo foi criado um grupo chamado Comitê
de Segurança Pública, cujo membro dominante era um jovem
advogado, Maximilien Robespierre (1758-94). Discípulo de
Rosseau, era o defensor “incorruptível” da democracia e um
idealista fanático. Sob seu governo o comitê levou o povo a atos
heróicos, conduziu a política externa, impôs racionamento e
controle de preços e, de onde quer que viesse oposição, era
esmagada sem piedade. Assim, foi lançado o “Terror”, um
mecanismo que iria proteger a “República da Virtude” de seus
inimigos. Porém, a grande maioria das quarenta mil pessoas que
morreram no Terror não eram do primeiro e segundo estados, mas
sim camponeses, trabalhadores e pequenos artesãos. Só 15 por
cento das vítimas eram nobres ou clérigos. Madame Roland, uma
republicana convicta que desentendeu-se com Robespierre fez
uma das mais pungentes acusações ao idealismo revolucionário
enquanto era colocada na guilhotina: “Ó Liberdade, quantos
crimes são cometidos em teu nome!”
Em seu ímpeto cruel de salvar a revolução conforme ele a
havia imaginado, Robespierre foi alienando cada vez mais
pessoas. Uma vez que os exércitos tinham saído vitoriosos, não
havia mais necessidade do Terror, mas Robespierre executou até
mesmo seus próprios simpatizantes. Ninguém parecia livre de
suspeitas e quando o governante denunciou aqueles delegados da
Convenção Nacional que haviam se oposto a ele, os delegados
temeram que seriam os próximos e ordenaram a prisão e execução
de Robespierre.
As tensões diminuíram rapidamente e as pessoas reagiram
com entusiasmo diante do fim da República da Virtude. O ardor
revolucionário se arrefeceu e os líderes da fase mais extremista
perderam a credibilidade e muitos foram punidos, milhares de
prisioneiros foram libertos, émigrés voltaram para casa e as igrejas
reabriram suas portas. Porém, os burgueses asseguraram-se de que
manteriam o controle sobre a França através de uma nova
constituição adotada em 1795. Mas crescentes problemas
econômicos, a guerra contínua e os inimigos tanto da direita
quanto da esquerda ameaçaram o regime de tal forma que este
tornou-se dependente dos militares, especialmente do jovem
general Napoleão Bonaparte (1769-1821). Finalmente, em
novembro de 1799 ele derrubou o governo e estabeleceu uma
ditadura. Em 1804, proclamou-se imperador. O programa que
implantou em seu país durante esse período mostrou-se bem mais
duradouro que suas iniciativas imperiais e suas reformas legais,
financeiras, educacionais e religiosas lançaram as bases para um
Estado moderno.
Napoleão foi o herói militar supremo da história francesa e
suas brilhantes campanhas da Itália em 1796 à Áustria em 1809
maravilharam o mundo. Ele reorganizou a Itália em repúblicas-
satélite e reinos e mais tarde anexou a maior parte ao seu império.
Quando os dois papas da época lançaram objeções, foram levados
para a França praticamente como prisioneiros (1799 e 1812). Na
Alemanha, a anexação da margem esquerda do Reno em 1797
significou a extinção dos antigos Estados eclesiásticos — os
arcebispados de Colônia, Mainz e Trier — e desencadeou a
dissolução do Sacro Império Romano, que chegou formalmente ao
fim em agosto de 1806. Em 1810 Napoleão já havia reorganizado
a Europa numa vasta estrutura de territórios dependentes da
França ou aliados a ela. Mas então foi longe demais em sua
tentativa fracassada de derrotar a Grã-Bretanha através de uma
guerra econômica (o Sistema Continental), num conflito de
guerrilha sem vencedores na Espanha e na desastrosa campanha
contra a Rússia em 1812. Seu império entrou em colapso absoluto
em 1813-14 e depois de uma rápida virada ele foi exilado numa
ilha solitária no Atlântico Sul.
A revolução e a Igreja
Em 1789, entre os membros do baixo clero e até mesmo por
parte de alguns do alto clero, havia um forte apoio à reforma. A
maioria concordava que os mosteiros eram instituições inúteis e
que as finanças da Igreja precisavam ser repensadas. Assim,
muitos representantes clericais votaram junto com o terceiro
estado durante os primeiros meses da Assembléia Nacional. Não
houve grande oposição quando em agosto a assembléia aboliu o
dízimo (o principal imposto da Igreja) e os direitos senhoriais
sobre as propriedades da Igreja e quando em novembro confiscou
e vendeu terras da Igreja.
A fim de ter bases legais para essas medidas e garantir a
subordinação da Igreja ao Estado, em 12 de julho de 1790 a
assembléia adotou a Constituição Civil do Clero. Esta oferecia a
“racionalização” da estrutura da Igreja e de seu pessoal. Estipulava
que os clérigos receberiam salário de funcionários públicos e
eqüitativos, tendo em vista que o pagamento dos bispos foi
reduzido drasticamente enquanto o dos sacerdotes paroquiais
recebeu um considerável aumento. Também dispensou um grande
número de funcionários da Igreja que, aparentemente, não
exerciam nenhuma função útil a menos que estes concordassem
em ser empregados em tarefas “úteis” como professores ou
sacerdotes de paróquias. O resultado foi a eliminação de
aproximadamente 60 por cento do quadro da Igreja em 1789. A
Constituição Civil também reduziu o número de dioceses e as fez
contíguas aos novos distritos administrativos da França, os
departamentos. O clero deveria ser escolhido através da eleição
por leigos: bispos pelos eleitores do departamento e sacerdotes
pelos eleitores do distrito, os mesmos que votavam para deputados
no poder legislativo. O papa ainda era reconhecido como sendo
teoricamente o cabeça da Igreja mas não poderia mais receber
dinheiro de impostos do clero francês ou confirmar a nomeação de
bispos. A Assembléia também exigiu que todo o clero fizesse um
juramento de lealdade à Constituição civil.
Em 1791, o papa Pio VI denunciou a Constituição
declarando-a separatista e herética e suspendeu todos os
sacerdotes e prelados que haviam feito o juramento de lealdade. A
grande quantidade de clérigos “refratários” ou “obstinados”, isto
é, daqueles que se recusavam a fazer o juramento, levou a uma
clara divisão da Igreja e ao aparecimento do “anticlericalismo”
pela primeira vez. Este pode ser definido como a oposição a
qualquer forma dogmática ou institucional de Cristianismo pois a
ordem estabelecida nos assuntos da Igreja é vista como reacionária
e uma defesa da tirania política. O movimento viria a ser uma
importante força na Europa do século 19.
À medida em que aumentava o anticlericalismo na
Assembléia, também fortalecia-se a oposição ao clero que
recusava-se a jurar para a Igreja “constitucional”. Logo, eles foram
vistos como contra-revolucionários, especialmente depois do
início da guerra com a Áustria e a Prússia. Muitos achavam que
Pio VI era o incentivador por trás da coalizão do clero e os que
não juravam eram então suspeitos de traição. Entre trinta e
quarenta mil sacerdotes que não juraram imigraram ou foram
exilados, enquanto muitos outros foram presos e entre dois e cinco
mil foram mortos. Um método de execução era a
“descristianização por imersão” no qual os clérigos eram
amarrados juntos em pares e lançados no rio Loire.
A campanha de descristianização chegou a proporções
absurdas com a formação de seitas pagãs para homenagear
mártires revolucionários como Jean Paul Marat. Outro exemplo foi
a comemoração da nova Constituição na Bastilha em agosto de
1793. Um membro do Comitê de Segurança Pública colocou-se
em pé o lado de uma estátua da “Natureza” e declarou:
Tenho para mim... que fora dos preceitos e doutrinas do Evangelho não há
sociedade que possa desabrochar e nem qualquer verdadeira civilização. O que
leva um homem pobre a não se admirar de que dez chaminés soltam fumaça em
meu castelo enquanto ele morre de frio — que tenho dez conjuntos de trajes em
meu armário enquanto ele está nu — que à minha mesa, em cada refeição há o
suficiente para alimentar uma família por uma semana? É a religião que diz a ele
que numa outra vida serei igual a ele e que, de fato, ele tem mais chance do que
eu de ser feliz lá.3
1831
Formad a Sociedade Evangélica de Genebra
1813 1815 1833
J.A. Neander Fundada a escola da Começa o Tractarianism
designado professor Missão Basel
1799 1814 1825 1835 1850
Segundo Grande Restabeleci F.A. Charles G. J.C. Blumhardt abre
Despertamento nos mento dos Tholuck Finney um centro de
Estados Unidos Jesuítas começa a evangelismo
ensinar em
Halle
1750 1800 1850 1900
1755 1810 1813 1828 1853-1856 1861-1865
Frederick Georg H.F. Guerras de Recusa da Guerra da Guerra Civil
Schiller Hegel Libertação Lei do Teste Criméia Americana
1755 1814-15 1830 1848 1871
Johann Congresso Revoluções Revolução Unificação
Wolfgang de Viena de 1830 de 1848 da
von Goethe Alemanha
Romantismo e Nacionalismo
Enquanto esses acontecimentos políticos e militares
cativavam a atenção do público, mudanças intelectuais
significativas também estavam ocorrendo. Uma delas foi o
Romantismo, um movimento na Arte, Literatura, Filosofia e
Religião. Surgido na década de 1790 como uma reação ao
Iluminismo, suas raízes encontravam-se no pensamento de
escritores mais antigos como Rousseau e a escola de Tempestade e
Tensão cujos principais representantes — Wolfgang von Goethe
(1749-1832) e Friedrich von Schiller (1759-1805) — enfatizavam
a turbulência do espírito humano. As obras de Goethe Götz von
Berlichingen (1773) e Tristezas do Jovem Werther (1774) foram
importantes trabalhos pré-românticos, enquanto Fausto, um poema
dramático de duas partes escrito em seus anos de mais maturidade
foi a grande obra de arte da literatura alemã. Na Grã-Bretanha
entre as principais figuras do Romantismo estavam William
Woodsworth, Samuel Coleridge e Sir Walter Scott.
Os românticos rejeitavam o Classicismo e o Racionalismo
mas enfatizavam o emocionalismo, a sensualidade, fantasia e
imaginação. A realidade não era encontrada no pensamento
racional, mas sim através dos sentimentos, dos sentidos, da
iluminação espiritual e do ouvir a voz interior. Consideravam
todas as experiências como sendo subjetivas e enfatizavam a
consciência própria, espontaneidade e originalidade. Um senso de
mistério surgia do desejo interior daquilo que era desconhecido e
ainda não havia sido experimentado. Devia-se permitir que cada
personalidade se desdobrasse de acordo com seu próprio gênio e
características individuais. Beleza, cor, aventura, o exótico e a
vida no campo distinguiam as obras românticas artísticas e
literárias e formas tradicionais ou pré-determinadas sofriam
rejeição daqueles que eram diferentes, não-convencionais e novos.
Havia também um profundo interesse pelo passado, especialmente
a Idade Média e também pela mitologia e folclore nórdicos. Por
fim, sua arte era visionária e até mesmo mística, pois como disse
um poeta alemão, na visão romântica da vida “o mundo torna-se
sonho e o sonho torna-se mundo”.
O Romantismo contribuiu muito para o Nacionalismo
moderno. Enquanto os philosophes do Iluminismo eram
cosmopolitas em sua visão de mundo, os românticos voltaram-se
interiormente para suas próprias origens e tradições nacionais. Nos
quatro volumes de Idéias sobre a Filosofia da História da
Humanidade (1784-91) o pastor protestante Johann Gottfried
Herder (1744-1803) afirmava que as classes instruídas da
Alemanha, que dependiam demais do pensamento e costumes
franceses, deveriam ao invés disso desenvolver sua cultura nativa.
Argumentou que cada Volk (povo), isto é, um conjunto de pessoas
que compartilham de uma língua comum, possuía um Geist
(espírito ou gênio) singular e o Volkgeist (caráter nacional) deveria
ser permitido surgir a seu próprio modo. A fim de ser autêntica, a
cultura nacional tinha que surgir da vida do Volk — as pessoas
comuns — e tirar delas suas inspiração. Os Völker eram uma
característica natural da raça humana e sua diversidade havia sido
criada pelo Todo-Poderoso. A teoria nacionalista de Herder era de
natureza puramente racional — não havia interesse político — e o
conceito de desenvolvimento nacional aplicava-se de modo
semelhante a outros povos além dos alemães. Seguindo seus
passos, vários escritores alemães exploraram sua lei, folclore e
religião, mas depois de 1800 outros começaram a falar da
superioridade cultural alemã. Numa série de palestras entre 1807 e
1808, o filósofo J. G. Fichte, pedia a regeneração moral do povo
através da educação. As pessoas deveriam adquirir consciência de
seu caráter nacional singular e aprender a amar sua terra natal. Um
indivíduo só podia alcançar a “liberdade” ao identificar-se com a
personalidade de sua nação como um todo e os alemães tinham
uma genialidade que não estava presente em outros povos.
O mais importante filósofo da época, Georg W. F. Hegel
(1770-1831), levou esse pensamento um passo adiante e enfatizou
o Estado. Sua idéias estavam contidas num sistema vasto e
complexo que é de difícil compreensão mas exerceram enorme
influência. Em reação a Kant, cuja filosofia crítica despedaçou o
mundo do pensamento, Hegel via o universo como um grande
todo. Para ele a realidade era a “Mente Absoluta” ou “Espírito do
Mundo” que revelava-se na Natureza e na História. A mente de
cada pessoa é um aspecto do Espírito do Mundo e a atividade
intelectual é um fase do próprio Absoluto.
Para explicar como isso ocorria, Hegel lançou mão de uma
metodologia de raciocínio conhecida como dialética. Nessa
abordagem, uma determinada idéia, tema ou “tese” dá origem ou é
contrária ao seu oposto ou contradição — a “antítese”. Desse
conflito surge uma idéia ou “síntese” que é ao mesmo tempo nova
e superior em relação à sua antecessora. Esse desenvolvimento, o
qual ele chamou de “realização própria da Idéia Absoluta”, ocorria
na Natureza, Ciência e no processo histórico. A História muda
através do conflito de forças no reino das idéias puras e o Estado
era uma dessas idéias. As três principais fases da história do
Estado foram a asiática, caracterizada pela monarquia absolutista;
a clássica, marcada pela liberdade individual e por último a
germânica que era uma síntese de liberdade no contexto do Estado
todo-poderoso. Nesse ponto de “consciência plena” todos os
povos teriam liberdade e não apenas os monarcas ou uns poucos
escolhidos.1
A idéia de Hegel sobre o Estado não era tão autoritária como
pode-se pensar. Pelo contrário, ele o via como o mais alto
desenvolvimento de comunidade, o lugar onde a sociedade
perfeita encontraria sua existência. Era como a vontade geral de
Rousseau, a manifestação do espírito racional da comunidade
toda. Hegel rejeitava o individualismo das revoluções americana e
francesa, crendo ser este contrário à natureza da humanidade e à
realidade. Em seu sistema, o indivíduo só tinha valor e significado
como uma parte do todo maior e unificado. Assim, sua
preocupação com o aspecto político era atraente para os alemães
da época que desejavam a unidade nacional. Apesar de não terem
unidade naquele tempo, podiam sentir que ela acabaria vindo
através do movimento da História.
Durante a Era Romântica, escritores de outros países
aceitaram o desafio de Herder de concentrar-se na herança cultural
— sua história, linguagem, literatura e arte. Entre os resultados
estavam a renovação grega que levou à sua revolta contra o
governo turco, o ressurgimento dos magiares na Hungria pedindo
mais autonomia dentro do Império Austríaco e o movimento
nacionalista italiano contra os príncipes em 1815. Além disso,
apesar dos jacobinos da França revolucionária terem utilizado o
Nacionalismo para reunir o apoio público durante a era
napoleônica, ele serviu de catalisador para a resistência ao
conquistador. Foi um fator importante na revolta espanhola, na
iniciativa russa de 1812 e na renovação alemã que culminou com a
Guerra da Libertação em 1813.
Em resumo, o Nacionalismo é uma idéia ou sentimento
presente em um povo que veio a crer que é diferente dos outros —
ou seja, uma nação — e seu desejo de afirmar essa singularidade.
A existência da nacionalidade não é uma realidade que pode ser
determinada logicamente mas é, sim, algo irracional, emocional e
místico. O objetivo maior de um nacionalista é criar um Estado-
nação, uma ordem política na qual seus semelhantes exercem o
poder.
Na primeira metade do século 19, o Nacionalismo foi
marcado pela humanidade, diversidade e a simpatia por outros.
Seguindo os passos de Herder, a maioria dos primeiros
nacionalistas acreditava que a realização de suas aspirações
nacionais era essencial para o bem-estar geral da humanidade.
Cada um tinha sua contribuição a fazer para a civilização mundial
e a sociedade seria mais rica se várias nacionalidades tivessem
liberdade de expressão. Só depois da metade do século é que o
movimento começou a desandar e a mudança para uma tendência
ao exclusivismo e superioridade nacional tornou-se visível.
Ainda assim, mesmo nos seus primeiros momentos, o
Nacionalismo mostrou-se como rival da fé cristã. Timothy Dwight
(1752-1817), presidente do Yale College e um marco do
Cristianismo americano, opôs-se com veemência a essa
“infidelidade” que para ele era produto do Iluminismo. Ele pediu
aos americanos que resistissem à propagação das idéias francesas,
tendo em vista que sua nação tinha um papel especial no plano
divino. Deus os havia preservado durante as lutas revolucionárias
e, desde então, eles haviam crescido espiritual e fisicamente.
Naquele instante, muitos sinais apontavam para o advento de uma
nova era e o reino de Deus estava prestes a chegar na Terra. Isso
traria como resultado o reavivamento entre os cristãos e a
propagação do sistema americano de liberdade religiosa e política
por todo o mundo, pois sua nação era um instrumento de Deus
para converter a humanidade. Ao posicionar-se contra a ameaça
francesa, Dwight havia dado a sua própria nação importância
espiritual e identificado a América com o propósito de Deus.
Romantismo e Religião
Os românticos glorificavam o seu próprio poder de auto-
expressão e criatividade. Não seriam leais a qualquer força
espiritual superior à sua própria genialidade ou aos objetos de sua
devoção como a natureza, liberdade, beleza e amor. Porém alguns
aceitaram o Cristianismo. Em 1798, o escritor alemão Friedrich
von Schlegel ao que parece, teve uma experiência de conversão
(ao Catolicismo Romano) e a partir de então, todo o seu trabalho
passou a ter temas religiosos. Na obra Cristandade ou Europa
(1799), o poeta Novalis retratou o Cristianismo como símbolo de
uma fé universal, o exemplo mais puro de religião como fenômeno
histórico e a mais completa revelação. Esses dois homens
influenciaram o jovem pregador Friedrich Schleiermacher (1768-
1834), que foi o principal teólogo do século 19 e pai da teologia
protestante liberal.
Educado em escolas morávias e em Halle, Schleiermacher
foi moldado de acordo com o Pietismo místico. Nomeado capelão
de um importante hospital de Berlim em 1794, entrou em contato
com o círculo de escritores românticos da cidade. Na verdade, foi
Schlegel que incentivou Schleiermacher a escrever Sobre a
Religião: Discursos aos Ilustrados que a Desdenham (1799), uma
defesa da fé para os intelectuais da época. Ele argumentava que o
Racionalismo havia ignorado a verdadeira essência da religião,
que é o sentimento. Isso permite que a pessoa tenha uma
experiência direta com Deus. A devoção surge desse experimentar
a Deus (o Infinito) através da experiência do mundo (o finito), e
não por algum tipo de processo de reflexão racional. Como os
românticos, ele acreditava que as pessoas compreendiam o mundo
no qual viviam mais através da imaginação e sentimento do que ao
estudá-lo através de uma análise racional. Deus não é
transcendente, mas sim, está presente no mundo e o crente faz
contato direto com Ele. Ao invés de ser algo que surge das
expressões doutrinárias ou da vida na Igreja, a religião é a
experiência imediata da existência humana.
Schleiermacher deixou a capital da Prússia em 1804 para
lecionar em Halle mas voltou três anos depois para pastorear a
Igreja da Trindade e trabalhar como professor na Universidade de
Berlim. Ele ocupou ambos os cargos até sua morte, vinte e cinco
anos mais tarde. Schleiermacher publicou várias obras
expressando sua visão romântica da teologia, sendo a mais
importante delas A Fé Cristã (1821). Nela, ele apresentou a idéia
da “dependência” ou “Percepção de Deus” absoluta de cada
indivíduo. O pecado é deixar de depender, mas Cristo é o homem
que foi completamente dependente de Deus em todos os seus
pensamentos, palavras e gestos. Isso significa que Deus existia
dentro dele e, portanto, ele era divino. Assim, as doutrinas cristãs
são as expressões da visão religiosa da pessoa. A Bíblia molda e
informa a consciência de Deus no cristão, mas ao mesmo tempo é
produto dessa dependência. A consciência religiosa fundamental
levou ao desenvolvimento de comunidades cristãs, onde a
percepção de Deus demonstrada por Jesus e sua obra redentora
deu aos crentes o pleno conhecimento de Deus. Para ele a
regeneração ocorre através da participação na vida em comunidade
ao invés de depender simplesmente de acreditar na morte e
ressurreição de Cristo. Eles passam a experimentar, então, a
mesma percepção de Deus que Jesus.
Nessa época, vários românticos voltaram-se para a Igreja
Católica Romana, onde encontraram um lugar de descanso onde se
refugiar. Um desses digno de menção foi o escritor popular
François René Vicomte de Chateaubriand (1768-1848) que
converteu-se à fé viva. Em sua famosa obra O Gênio do
Cristianismo (1802) René elevou a defesa da fé do plano racional
para o dos sentimentos e argumentou que a História revelava o
Catolicismo como uma grande força cultural e moral.
Os conservadores
A era da “restauração” que seguiu-se à queda de Napoleão
caracterizou-se tanto pelo retraimento ao conservadorismo quanto
pelo avanço do Liberalismo. No Congresso de Viena, a antiga
ordem política não foi completamente restaurada: o Sacro Império
Romano, por exemplo, não foi reconstituído, mas a monarquia foi
afirmada como única forma de governo que poderia garantir a
estabilidade. O melhor exemplo disso foi a Sagrada Aliança, uma
proposta do czar Alexandre I, que na época estava sob a influência
do misticismo e do messianismo. Muitos afirmam que a inspiração
para a Sagrada Aliança veio da baronesa Julie von Krüdener, uma
escritora que havia passado por uma conversão ao Pietismo e que
fazia parte do séqüito do czar na época; mas a maior parte dos
estudiosos de hoje acha que a idéia veio do próprio czar. A
Aliança foi assinada por todos os monarcas europeus — exceto
pelo regente da Inglaterra, o papa e o sultão turco — e declarava
que as relações internacionais daquele ponto em diante seriam
baseadas nas “sublimes verdades ensinadas pela Santa Religião”.
Os governantes concordaram em seguir o princípio de que eram
irmãos, de “ajudar uns aos outros” sempre que necessário e
reconhecer a soberania de nenhum outro a não ser “Deus, nosso
Divino Salvador, Jesus Cristo”. Apesar da Sagrada Aliança não
ter, na realidade, nenhum poder, ela serviu para manter a
estabilidade da Europa oriental até a Guerra da Criméia.
A tendência conservadora ficou mais evidente na Igreja
Católica. Assim que foi liberto do cativeiro na França em 1814, o
papa Pio VII restabeleceu a ordem dos jesuítas. Então, através de
seu secretário de Estado que o representou em Viena, Pio VII
recebeu de volta os territórios papais na Itália. Também fez
tratados favoráveis com diversos países e condenou os carbonari,
uma movimento nacionalista italiano. Sob sua liderança e a de
seus sucessores, a posição “Ultramontana” prevaleceu, isto é, a
completa centralização da autoridade da Igreja na cúria papal em
Roma e não a independência das Igrejas Nacionais ou dioceses. O
papa também lutou contra o liberalismo social na França e em
1834 excomungou o conhecido escritor Félicité de Lamennais
(que originalmente era um tradicionalista).
O “tradicionalismo” católico reacionário foi melhor
representado nas obras de Joseph de Maistre (1753-1821) e Louis
de Bonald (1754-1840). Émigrés durante a Revolução Francesa,
eles enfatizavam o desenvolvimento histórico e a providência
divina e oposição à autonomia humana e pediam a restauração da
monarquia Bourbon.
Seguindo os passos de Edmund Burke, eles denunciaram a
ênfase dada pelo Iluminismo à Razão e aos direitos naturais. Mas
foram ainda mais longe e atacaram toda a ênfase liberal na teoria
do contrato social e nas liberdades individuais. Os conservadores
também condenaram a falta de respeito pela autoridade
eclesiástica e, especialmente de Maestri, afirmou que o
Cristianismo católico era a base da ordem social.
Na obra Sobre o Papa (1819) de Maistre declarou que toda a
soberania é derivada de Deus e investida sobre o monarca. Pelo
fato da autoridade do rei ser de origem divina, seu poder não deve,
de forma alguma, ser limitado por seus súditos. A religião oferece
ao povo um motivo para obedecer o governante e reconciliá-lo
com as desigualdades naturais da sociedade. A Igreja e o Estado
devem trabalhar em conjunto para promover a moralidade humana
e preservar a ordem e caso surja um conflito entre as duas, a
autoridade da Igreja automaticamente tem primazia. Ele encerrou
retratando o papa como a autoridade política e religiosa suprema
naquela que era a teocracia universal.
Os conservadores alemães incorporaram um importante
conceito romântico em seu pensamento — a idéia do organicismo
— e um dos seus principais expoentes foi Schleiermacher. O
Estado não era o produto de um contrato social mas sim um
desenvolvimento autônomo numa forma superior de vida. Ele
crescia de acordo com suas próprias leis e o indivíduo alcançava a
plenitude e verdadeira liberdade dentro do contexto do Estado. Até
mesmo a própria nacionalidade era uma desenvolvimento
orgânico. Um grupo de pessoas falando a mesma língua e com
experiências históricas em comum tinha a tendência de se
organizar politicamente. Assim, o Estado era um organismo no
qual a nação havia se desenvolvido ao longo da História e ambos
eram criações divinas.
De acordo com os organicistas, não havia espaço para a
revolução pois ela causaria distorções no crescimento natural do
organismo político. O governo tinha suas raízes no passado e o
governante, o povo e a Igreja eram todos parte de um único
organismo espiritual. Estado e Igreja, trono e altar pertenciam
juntos e deviam ser organizados da mesma forma, ou seja, o
Estado monárquico e a Igreja episcopal.2 Um resultado dessa visão
foi a atitude do rei Frederico Guilherme III em 1817, o
tricentenário das Noventa e Cinco Teses, ao unir as igrejas
Reformada e Luterana em “uma única Igreja evangélica” — a
chamada união prussiana. Sua intenção era organizar uma frente
comum contra o Racionalismo, que ele encarava como um inimigo
da fé, mas isso provocou reações de todos os lados.
Os conservadores luteranos (“confessionalistas”)
organizaram um vigoroso contra-ataque. Um pastor — Klaus
Harms (1778-1855), publicou suas próprias noventa e cinco teses
condenando o Racionalismo e afirmando os ensinamentos básicos
luteranos sobre o perdão dos pecados e os sacramentos. Com a
crescente pressão para que se adaptassem, muitos luteranos da
Prússia imigraram para a América ou Austrália, levando com eles
o seu confessionalismo. Entre os mais conhecidos estavam C. F.
W. Walther (1811-87), o fundador da Igreja luterana — Sínodo de
Missouri e Wilhelm Löhe (1808-72) de Neuendetteslau na
Bavária, um brilhante pregador que ficou na Alemanha mas
enviou missionários confessionalistas para a América. O estudioso
de maior destaque no confessionalismo foi E. W. Hengstenberg
(1802-69), professor em Berlim. Através de seus comentários
bíblicos e do jornal que fundou em 1827, o Jornal da Igreja
Evangélica, Hengstenberg combateu o Racionalismo e o
Liberalismo teológico.
Os liberais
Ao contrário dos românticos, os liberais bebiam em grande
parte da fonte do Iluminismo. Enfatizavam a liberdade individual
— liberdade de discurso, imprensa e reunião e da prisão e
encarceramento arbitrários. Eles consideravam que a forma
constitucional de governo era a melhor a fim de garantir essas
liberdades. Nos países avançados os liberais exigiram direitos
civis e governos mais representativos, enquanto aqueles que se
encontravam em outras partes da Europa buscaram escrever
constituições que limitassem o poder do governante o fizessem
trabalhar em conjunto com as aspirações nacionalistas. Poucos
liberais, porém, aceitariam a soberania popular pois desejavam que
o direito de voto fosse restrito às classes com propriedades.
Consideravam a democracia em massa tão perigosa quanto a
tirania do rei. A maior parte concordava com o teorista utilitariano
inglês Jeremy Bentham que afirmou que “o maior bem para o
maior número de pessoas” seria o resultado se cada indivíduo
pudesse lutar pelos seus próprios interesses com um mínimo de
interferência externa.
Em outras palavras, estavam dispostos a aceitar a igualdade
perante a lei, mas não viam nada de errado na enorme
desigualdade da distribuição de propriedades e riqueza.
Acreditavam que um indivíduo com iniciativa, ambição e
capacidade empreendedora poderia ganhar uma fortuna se o
governo não interferisse na propriedade privada e sua aquisição.
No âmbito econômico, isso significava uma abordagem de laissez-
faire e os colocava em oposição aos dois grupos que buscavam a
reforma do sistema industrial no século 19 — os humanitários
cristãos e os socialistas (ver capítulo 19).
No âmbito teológico o Liberalismo refletiu-se primeiro na
atitude de Schleiermacher ao rejeitar a crença doutrinária racional
e enfatizar o sentimento subjetivo que fazia da fé uma questão de
experiência individual. Os seguidores de Hegel, inspirados por sua
ênfase na imanência divina (Deus está dentro do mundo e não
acima ou fora dele) e no desenvolvimento histórico sujeitaram o
Cristianismo à análise histórica. Os teólogos da “Escola de
Tübingen”, liderados por F. C. Baur (1792-1860) que foi nomeado
para a universidade em 1826, chamaram a atenção para aquilo que
acreditavam ser linhas e teologias diferentes dentro do Novo
Testamento e passaram a ensinar uma visão puramente histórica da
Bíblia. O próprio Baur rejeitou o sobrenatural e usou uma
abordagem dialética para o Novo Testamento. Concluiu que ele
refletia a tensão básica dentro da Igreja entre um antigo partido
ligado a Pedro ou “Judeu” e um partido mais novo, ligado a Paulo
ou “Helenista”. Também afirmou que a maior parte das cartas de
Paulo não era “autêntica” pois faltavam-lhes as “tendências” anti-
judaizantes. Ele identificou um terceiro grupo de livros católicos
ou conciliatórios, alguns deles como Atos que provavelmente foi
escrito no século 2º. Baur determinou um precedente para o
criticismo bíblico revisionista que mais tarde se tornaria a marca
registrada da teologia liberal. Os estudiosos discordam sobre se
Baur era, de fato, hegliano ou não, mas ele usava a análise
histórica e via a história da Igreja em termos dialéticos.3
O rompimento decisivo entre a antiga escola conservadora de
interpretação bíblica e o novo radicalismo anti-sobrenaturalista
ocorreu quando um aluno de Baur — David Friedrich Strauss
(1808-74) — publicou sua obra aclamada A Vida de Jesus
Examinada Criticamente em 1835. Ele concluiu que apesar de um
Jesus “histórico” estar escondido por trás da vida registrada nos
evangelhos, sua vida havia sido re-escrita e adornada pelos
escritores cristãos a fim de fazer com que se cumprissem as lendas
e previsões do Antigo Testamento. Essas reflexões devotas dos
seguidores de Jesus eram “mitos”, ou seja, verdades sobre ele que,
mesmo sendo historicamente imprecisas, estavam em harmonia
com suas idéias e sentimentos religiosos. Não eram falsidades em
si, mas sim verdades declaradas de modo indireto. Num senso
hegeliano, elas expressavam a consciência dos autores de que
Jesus havia descoberto que Deus e o homem são um e que o
verdadeiro Deus-homem não é um indivíduo, mas sim a
humanidade como um todo. Jesus deve ser compreendido de
maneira simbólica como a realização do Espírito Absoluto na raça
humana. A humanidade é a união do finito com o infinito, do
espírito com a natureza. A humanidade é destinada à perfeição em
sua marcha para dentro e para o alto, simbolizada no Novo
Testamento em termos de morte, ressurreição e ascensão.
O historiador de religião francês Joseph Ernest Renan (1823-
92) levou a discussão ainda mais adiante em sua obra Vida de
Jesus (1863). Ao fazer uso da ciência do criticismo textual que
encontrava-se em rápido desenvolvimento, ele substituiu a teoria
de mito de Strauss sobre Jesus por uma apresentação racional dele
como um homem moderno, um professor de ética itinerante que
certamente não era o Filho de Deus. Era um tranqüilo galileu que
pregava uma moralidade simples e sonhava em fundar uma
comunidade utópica do povo de Deus aqui na Terra. Ele assumiu o
papel de Messias, lutou contra o mal enquanto trabalhava para
formar o Reino de Deus e morreu por seu idealismo perfeito numa
luta contra o Judaísmo ortodoxo e estéril. Quanto à ressurreição,
esta era produto do amor idealizado de Maria Madalena.
Esses estudiosos que retratavam a essência da religião como
sendo a pureza de coração em comunhão com um Deus de amor
que está presente em toda a parte, trouxeram uma nova e
revolucionária era de estudos bíblicos e teológicos. A pesquisa
sobre “a vida de Jesus” enfatizava observar o que havia por trás do
“Jesus da fé”, e do “Cristo dos credos” para encontrar o “Jesus da
História”, enquanto o criticismo literário novo e “superior” tomava
liberdades extremas com as Escrituras e rejeitava sua origem
sobrenatural. Por fim, junto com a introdução do darwinismo (ver
capítulo 20) no liberalismo teológico, a alta crítica apresentou um
desafio imenso para a ortodoxia, tanto protestante quanto católica.
A Igreja na Grã-Bretanha
O reavivamento da religião inglesa no século 19
correspondeu de muitas maneiras ao crescimento das classes
médias. Freqüentar os cultos de uma Igreja anglicana ou capela
não-conformista era uma parte importante de ser respeitável.
Porém, as igrejas faziam mais do que simplesmente reforçar a
busca por riquezas. Elas ensinavam valores como o “dever” que
era contrário ao interesse próprio e uma seriedade no propósito de
tornar a fé religiosa algo relevante às questões do quotidiano que
encontrava-se presente em grande parte do Protestantismo inglês.
As classes trabalhadoras freqüentavam bem menos as igrejas,
mas muitos desse grupo participavam de congregações metodistas
e evangélicas anglicanas. Havia, porém, barreiras reais que
impediam os pobres de freqüentar as igrejas, tendo em vista que
estes não podiam se vestir adequadamente e nem pagar o aluguel
dos bancos que era cobrado em muitos lugares. A ênfase sobre a
disciplina dentro da Igreja parecia ser mais pesada em relação aos
pobres, especialmente sobre o seu consumo de bebidas alcoólicas.
Além disso, a crescente organização de atividades de lazer
concorria com a capacidade de atração da Igreja.
A única Igreja que claramente possuía a maior riqueza e
poder era a anglicana. Possuía os recursos financeiros para
reformar suas edificações antigas e construir novos templos, a
profissão de clérigo estava entre as de maior prestígio na
Inglaterra e a coroa mantinha um relacionamento próximo com
essa Igreja. Teoricamente, aqueles que não tomavam a Ceia na
Igreja da Inglaterra (não-conformistas e católicos romanos) eram
excluídos da vida pública, mas havia-se feito várias exceções. As
restrições foram finalmente eliminadas quando o Parlamento
anulou a Lei do Teste e a Lei da Corporação em 1828 e aprovou a
Lei da Emancipação Católica em 1829.
Aqueles que se preocupavam com a revitalização da Igreja
anglicana podiam ser divididos em três categorias. O “baixo
Clero” dava maior importância à inspiração e autoridade das
Escrituras do que ao culto litúrgico e reservava uma forte
desconfiança para as práticas e crenças católicas. Os evangélicos
mais conservadores eram os “Recordistas” cujo nome veio de The
Record [O Registro], um jornal da Igreja fundado em 1828 que
apresentava seu ponto de vista. Os evangélicos moderados
continuaram dentro da tradição de Charles Simeon e da Seita de
Clapham e seu jornal, The Christian Observer, afirmava lealdade à
Igreja. Essas várias facções trabalhavam em conjunto e sua
harmonia refletia-se nos “Encontros de Maio”, festivais de
exultação evangélica que ocorriam no Exeter Hall em Londres. O
“Alto Clero” enfatizava a continuidade do Catolicismo,
especialmente a sucessão apostólica e a autoridade episcopal, o
culto extremamente litúrgico e o poder salvífico dos sacramentos.
O partido da facção liberal da Igreja anglicana tentou encontrar
um meio termo e interpretava as doutrinas e o culto anglicanos de
maneira liberal. Os membros mais extremistas do Alto Clero eram
os “Anglo-Católicos” que enfatizavam as ligações históricas da
Igreja do presente com a Igreja medieval.
Foi do meio deles que surgiu o “tratarianismo” que teve
início em 1833 com a publicação de Panfletos para os Tempos. Os
autores defendiam a Igreja da Inglaterra como sendo uma
instituição divina, proclamavam a doutrina de sucessão apostólica
e defendiam o Livro Comum de Orações como regra de fé. Muitos
dos tratados eram reimpressões de obras escritas por pessoas do
Alto Clero no século 17. O grupo também era conhecido como
Movimento de Oxford pois seus líderes — John Keble (1792-
1866), E. B. Pusey (1800-82) e John Henry Newman (1801-90) —
foram colegas no Oriel College na década de 1820.
Muitos desse grupo pendiam mais para Roma, especialmente
Newman que era vigário da Igreja na universidade de Oxford.
Numa viagem para a Itália, ele escreveu um poema que
epitomizava sua luta espiritual e que recebeu uma música no hino
Lead, Kindly Light. Dos vinte e quatro tratados de sua autoria o
mais famoso (e último) foi o Panfleto No. 90 de 1841, que tentava
reconciliar os Trinta e Nove Artigos da Igreja anglicana com a
doutrina católica. O texto foi tão condenado que ele deixou o
pastorado e entrou para a Igreja Católica em 1845, acabando assim
com o Movimento de Oxford. Em 1879 ele foi nomeado cardeal.
Através de seus muitos escritos como a Idea of a University [Idéia
de uma Universidade] (1852), que apresentava sua concepção de
educação cristã e o esboço autobiográfico, Apologia Pro Vita Sua
(1864), Newman tinha uma influência enorme tanto nos meios
anglicanos como católicos.
Os evangélicos deram nova vida ao protestantismo inglês.
Sua preocupação em ganhar almas refletiu-se na criação de
agências para propagar a fé cristã. Entre elas, havia diversas
sociedades missionárias (discutidas no capítulo 20), a Sociedade
Bíblica Britânica e Estrangeira (1804), Sociedades de Panfletos
Religiosos (1799), Sociedade de Londres para a Promoção do
Cristianismo entre Judeus (1809), União da Escola Dominical
(1803) e a Sociedade Nacional para a Educação dos Pobres
(1811). Os evangélicos sentiam-se particularmente atraídos pelas
sociedades bíblicas e muitas delas surgiram nas Ilhas Britânicas,
bem como no império e nos Estados Unidos. A BFBS enviou
membros para o continente e estes fundaram sociedades bíblicas
em vários países e durante um breve período a iniciativa gozou até
mesmo do apoio católico na Alemanha.
Porém, no decorrer do século, cada vez mais evangélicos
radicais começaram a questionar o valor das sociedades bíblicas,
missionárias e de panfletos. Eles consideravam seus métodos
“laboriosos” como sendo inadequados e ao invés disso
argumentavam em favor do auxílio sobrenatural através da obra do
Espírito Santo. Insistiam que os obreiros cristãos deferiam
depender somente de Deus para ajudá-los a realizar suas tarefas e
não em organizações burocráticas.
A linha radical do evangelicalismo foi afetada por muitos
fatores. Um deles foi o interesse renovado no Calvinismo e outro
foi o romantismo literário que enfatizava o “sobrenaturalismo
natural” (a possibilidade de discernir significado espiritual no
mundo quotidiano) juntamente com a emoção, experiência e
imaginação. Além disso, houve um ressurgimento do pré-
milenismo, a idéia de que não se devia considerar o triunfo da
Igreja como resultado da concretização do reino de Cristo pois a
sua volta à Terra era iminente. Uma quarta ênfase era uma alta
consideração pela inspiração bíblica e a interpretação literal das
Escrituras.
Edward Irving (1792-1839) era um conhecido evangélico
radical, ministro da Igreja na Escócia e que pastoreava uma igreja
em Londres. Sua eloqüência ao atacar os males morais da época
atraiu um grande número de seguidores, que incluía muitas figuras
proeminentes. Mas não tardou para que surgisse uma controvérsia
quando ele pregou sobre a volta iminente de Cristo em glória e
incentivou o falar em línguas durante cultos públicos. Ao mesmo
tempo, tinha grande consideração pelas idéias do Alto Clero
quanto aos sacramentos e liturgia.
Finalmente, em 1833 Irving foi dispensado, mas a essa altura
ele e um amigo — Henry Drummond, que era um homem de
negócios e membro do Parlamento — haviam formado a Igreja
Católica Apostólica. Crentes de que a Segunda Vinda estava
próxima, eles montaram uma estrutura de doze apóstolos dos
últimos dias que iriam assentar-se com os primeiros doze
apóstolos nos vinte e quatro tronos mencionados em Apocalipse 4.
Então, através de um “sacramento” distintivo, os membros da
Igreja eram “selados” e tornavam-se parte dos 144.000 de
Apocalipse 7. O grupo fazia uso de rituais em seus cultos e dava
pouco atenção a questões sociais. Apesar do movimento ter
desaparecido na Grã-Bretanha, espalhou-se para o continente,
onde seus frutos na Alemanha — A Nova Igreja Apostólica —
continuam sendo uma comunidade ativa até os dias de hoje.
Outro grupo dissidente evangélico importante foi o dos
“Irmãos de Plymouth” ou “Irmãos Evangélicos”. Originou-se em
Dublin no final da década de 1820 e recebeu esse nome por causa
da grande congregação formada em Plymouth em 1831. Buscando
uma volta à simplicidade da Igreja primitiva, os Irmãos
encontravam-se em casas para observar a Ceia do Senhor,
rejeitavam o clero ordenado e o culto litúrgico e escolhiam
presbíteros para liderar a comunidade. Suas reuniões eram
marcadas por profunda devoção a Cristo, zelo evangélico e um
forte interesse nas questões proféticas. Seu excepcional mestre,
John Nelson Darby (1800-82) foi tanto um estudioso da profecia
bíblica quanto um fervoroso crente no literalismo da Bíblia. Ele
formulou os princípios básicos do Dispensacionalismo, incluindo
o “arrebatamento” da Igreja antes da Segunda Vinda. Apesar de
ser uma idéia aceita pela minoria na época, no século 20 viria a
dominar o pensamento pré-milenista.
No final da década de 1840, quando surgiram disputas sobre
quanto controle centralizado deveria ser exercido sobre as
assembléias, houve uma divisão. Aqueles que eram a favor dos
princípios originais do movimento tornaram-se os Irmãos Abertos
e misturavam-se livremente com outros crentes. Sua figura mais
conhecida foi George Mueller (1805-98), um imigrante alemão
que pastoreava uma capela e administrava o famoso orfanato de
Ashley Down em Bristol. Este seguia o modelo da Fundação
Francke em Halle com a qual Mueller estava familiarizado.
Mueller foi pioneiro no conceito de manter um empreendimento
totalmente pela fé, sem fazer apelos para levantar fundos ou pedir
sustento à Igreja. Darby e seus seguidores formaram os Irmãos
Exclusivos cuja marca registrada era o estilo de vida austero e a
separação dos outros cristãos.
O maior líder evangélico do século 19 na Escócia foi
Thomas Chalremos (1780-1847). Ordenado em 1803, ele passou
por uma experiência de conversão em 1811, sendo que esta
transformou completamente sua visão e ênfase ministeriais.
Quatro anos depois ele aceitou uma cargo em Glasgow onde
desenvolveu um sistema de paróquias que poderia tratar dos
problemas de uma cidade industrial. O sistema envolvia a
nomeação de presbíteros para supervisionar as questões espirituais
e diáconos para ministrar às necessidades sociais e educacionais
da população.
Em 1823 Chalmers aceitou lecionar em St. Andrews e, em
1828, na Universidade de Edinburgo, onde foi o líder e símbolo do
partido evangélico. Além disso, ocupou também o cargo de diretor
do programa de extensão da Igreja e em seis anos supervisionou a
criação de mais de duzentas novas igrejas. Então surgiu um
problema quanto à interferência do Estado em assuntos da Igreja,
sendo que a questão evoluiu, tornando-se uma crise na assembléia
geral em 1843. Quando a assembléia se recusou a ir contra as
autoridades, duzentos ministros e presbíteros liderados por
Chambers deixaram a reunião num ato conhecido como
Rompimento. Eles logo formaram um novo grupo, a Igreja Livre
da Escócia, que o elegeu como moderador. Cerca de um terço dos
clérigos juntou-se ao novo movimento e pôs-se a duplicar as
igrejas e escolas da Igreja da Escócia. O cisma não seria
completamente superado até 1929.
A propagação do reavivamento
Os reavivamentos que varreram a Grã-Bretanha tiveram seus
equivalentes na Europa e na América. A Alemanha estava
especialmente preparada para uma renovação espiritual, tendo em
vista que a influência do Pietismo já havia diminuído sob a
pressão do Racionalismo. Mais uma vez, houve uma interatividade
do evangelicalismo inglês com o alemão, semelhante à relação
anterior entre Pietismo e Metodismo.
Reavivamento na Alemanha
A liderança do Erweckung [reavivamento] ficou por conta da
Sociedade do Cristianismo Alemão, fundada em 1780 pelo pastor
Johann Urlsperger de Augsburg. Seu plano era reunir todos os
cristãos fiéis numa iniciativa para levar adiante a “verdadeira
doutrina e verdadeira bênção”. Dentro dos modelos da Society of
the Propagation of Christian Knowledge - SPCK [Sociedade para
Propagação do Conhecimento Cristão (SPCC)] da Inglaterra, ela
realizava seu trabalho através de uma revista, contatos pessoais e
correspondência. Dentro de poucos anos ela havia tornado viável a
formação de sociedades missionárias, bíblicas e de panfletos por
toda a Europa.
Uma figura-chave foi seu secretário em Londres e pastor da
Igreja de língua alemã de Savoy, Karl F. A. Steinkopf (1773-
1859). Natural de Württemberg, ele espalhou a notícia sobre a
Sociedade Missionária de Londres pela Alemanha e foi co-
fundador da BFBS - British and Foreign Bible Society [Sociedade
Bíblica Britânica e Estrangeira]. Ele ajudou a começar filiais da
BFBS na Alemanha e incentivou seus compatriotas a fazer
doações em dinheiro para as missões britânicas. Também teve um
papel importante na fundação das sociedades missionárias alemãs.
Pastores do reavivamento cruzavam o país em todas as
direções e algumas regiões como Württemberg no sul da
Alemanha e Wuppertal e Siegerland no oeste, tornaram-se centro
de devoção protestante, fato que ainda é realidade nos dias de
hoje. A Igreja Católica também foi contagiada por parte desse
entusiasmo, sendo Johann Evangelista Gossner (1773-1858) o
sacerdote mais conhecido. Ele pregava sermões evangelísticos na
igreja em sua paróquia, realizava estudos bíblicos e reuniões de
oração em sua casa e chegou a organizar reuniões bíblicas
especiais na Basiléia para a Sociedade do Cristianismo. O
reavivamento católico acabou sendo silenciado pela hierarquia e
em 1826 Gossner passou para a Igreja luterana. Como protestante
ele pôs-se a fazer contribuições importantes nas áreas da atuação
social cristã e de missões.
A influência de alguns pregadores do reavivamento
continuou muito além de seu tempo. Um deles foi Ludwig
Hofacker (1798-1828), que na verdade foi o equivalente alemão
de David Brainerd. Um homem profundamente espiritual e
afligido por problemas de saúde, suas pregações resultaram em
milhares de pessoas que se voltaram para Cristo. Apesar de seu
ministério ativo ter durado pouco mais de quatro anos, sua obra
póstuma, Sermões para Todos os Domingos, Festivais e Dias
Santos, teve inúmeras edições e traduções e ainda é uma das obras
de maior distribuição na literatura popular cristã da Alemanha.
Outro foi Johann Christoph Blumhardt (1805-80), que
tornou-se pastor de Möttlingen em Württemberg em 1838 e
rapidamente ganhou distinção como pregador e através de curas
pela fé. Depois da cura miraculosa de uma mulher supostamente
endemoniada, milhares de pessoas dirigiram-se para sua paróquia.
Por fim, em 1852 ele deixou o pastorado e abriu um centro para
evangelismo e obras missionárias internacionais. Blumhardt
desejava profundamente a vida de Cristo e acreditava que um
novo Pentecoste, com a volta dos dons espirituais, iria preparar o
caminho para o Segundo Advento. Por esse motivo ele é
considerado um precursor do Pentecostalismo.
Um resultado do Erweckung foi a fundação de escolas
especializadas para missionários e evangelistas em Berlim (1800).
Basiléia (1815) e St. Chrischona (1840). Esta última foi a criação
de Christian Friedrich Spittler (1782-1867), secretário da
Sociedade do Cristianismo na Basiléia. Seu plano era treinar
artesãos competentes para serem evangelistas e então enviá-los
como obreiros cristãos auto-sustentáveis. Spittler comprou uma
igreja vazia em St. Chrischona, próximo à Basiléia e a transformou
na sede das chamadas “Missões Peregrinas”. Os alunos
encontravam sua própria área de trabalho e serviam em qualquer
igreja, sociedade missionária ou sínodo que os aceitasse.
As iniciativas da Igreja livre também são dignas de menção e
resultaram de relações exteriores. Imigrantes alemães que tinham
ido para a Grã-Bretanha e América fundaram congregações
metodistas em sua terra natal durante as décadas de 1830 e 1840.
O primeiro trabalho batista foi iniciado por Johann Gerhard Onken
(1800-84) que tinha vivido em Londres e havia se convertido
numa capela metodista. Trabalhou para vários grupos
evangelísticos no norte da Alemanha e então, em 1834 decidiu
receber o batismo do crente. Através do evangelismo itinerante
Oncken e outros fundaram várias igrejas e, mais tarde, os batistas
alemães foram ativos na propagação do evangelho em outros
países da Europa.
A própria capital da Prússia tornou-se um centro de
Erweckung e foi da Universidade de Berlim que saíram duas das
figuras acadêmicas mais importantes do movimento, Johann
August Neander (1789-1850) e Friedrich August Tholuck (1799-
1877). Neander era um convertido do Judaísmo e através de um
dedicado estudo da Bíblia desenvolveu uma fé profunda baseada
em suas experiências. Foi aluno de Schleiermacher e em 1831
tornou-se professor de história da Igreja em Berlim onde se
especializou em Cristianismo primitivo e também publicou uma
história geral da Igreja com seis volumes. Um inimigo fervoroso
do Racionalismo de Baur e Strauss, Neander comunicou uma fé
calorosa e viva para várias gerações de estudantes de Teologia.
Um jovem precoce, Tholuck estudou línguas orientais.
Através do testemunho de várias pessoas, ele encontrou a Cristo
como Salvador e então passou a estudar Teologia. Depois de um
breve período lecionando em Berlim, em 1826 mudou-se para a
Universidade de Halle onde trabalhou durante cinqüenta anos. Um
estudioso da Bíblia e teólogo distinto e conservador, era inimigo
declarado do Racionalismo. Mas também teve um amplo
ministério entre os estudantes e procurou desenvolvê-los para que
se tornassem cristãos fervorosos e diligentes. Ele os convidava
para estudos bíblicos e discussões sobre várias obras cristãs em
sua casa, visitava-os e orava com eles nos dormitórios e os levava
junto em suas viagens.
A preocupação social era uma das marcas registradas do
Erweckung, tendo em vista que naquela época muitos alemães
estavam sofrendo com a crise econômica. Um líder do movimento
em Berlim, o barão Ernst von Kottwitz, fundou com seus próprios
meios em 1807 uma residência para desempregados que chegou a
abrigar até seiscentas famílias, oferecendo-lhes oportunidades de
trabalho bem como abrigo. Um escritor cristão em Weimar,
Johannes Falk, viu o grande número de órfãos que restaram depois
das Guerras Napoleônicas e levou muitos deles para sua casa.
Abriu, então, um centro onde crianças pobres recebiam abrigo e
educação e tornavam-se aprendizes de um ofício. Também é digno
de menção o trabalho de Amalie Sievking, membro de uma família
proeminente de Hamburgo que tinha uma fé pietista e laços com
os evangélicos da Inglaterra. Quando uma epidemia de cólera
varreu a cidade em 1831, ela trabalhou em hospitais para ajudar as
vítimas da doença. No ano seguinte, formou a Sociedade Feminina
de Auxílio aos Pobres e Enfermos, um grupo de mulheres cristãs
que distribuía alimentos e visitava os necessitados.
O reavivamento na Escandinávia
O Ewerckung espalhou-se para o norte, chegando à
Escandinávia. Nikolai Grundtvig (1783-1872), um respeitado
estudioso de Literatura Medieval Nórdica bem como pastor de
uma Igreja luterana dinamarquesa, passou por uma experiência de
questionamentos e dúvidas. Ele encontrou a Deus de maneira
parecida com Lutero. Suas tentativas de iniciar um reavivamento
na Igreja Dinamarquesa foram mal recebidas e ele viu-se forçado a
ficar fora do ministério durante sete anos, tempo que gastou
escrevendo poesia e hinos. Ao voltar à paróquia em 1821, ele
combateu o Racionalismo e defendeu o Credo dos Apóstolos
como padrão para a Igreja. Depois de várias visitas à Inglaterra,
promoveu mais liberdade congregacional dentro da Igreja do
Estado. Outro centro de evangelicalismo desenvolveu-se na ilha de
Bornholm no final da década de 1860. A partir de lá, pregadores
leigos espalharam-se pela Dinamarca proclamando a justificação
pela graça, a reconciliação através da expiação de Cristo e o
sacerdócio de todos os crentes.
Na vizinha Suécia, havia muitos pregadores do reavivamento
em atividade, sendo o mais notável Karl Olof Rosenius (1816-68).
Apesar de ter sido fortemente influenciado pelo Metodismo inglês,
ele continuou dentro da Igreja luterana e proclamou a mensagem
da graça de Deus em Cristo e do perdão dos pecados sem mérito
humano. Várias igrejas livres surgiram depois de suas iniciativas,
sendo que a maioria juntou-se na Aliança de Missões da Suécia
em 1878.
Hans Nielsen Haugue (1771-1824) foi um excepcional
evangelista leigo na Noruega. Convertido aos 25 anos de idade,
começou imediatamente a pregar a mensagem da salvação e da
santidade pessoal. Viajou por todo o país e deu início a um
movimento religioso popular dentro da Igreja do Estado que
caracterizou-se por seus pregadores leigos auto-sustentáveis que
trabalhavam ligados a toda uma rede. Essa ênfase sobre a
atividade voluntária pelos leigos teve um efeito poderoso sobre a
Igreja, apesar do clero racionalista ressentir-se amargamente de
Hauge. As iniciativas missionárias e evangelísticas da Noruega no
final do século 19 se inspiraram nele.
O reavivamento na América
Apesar de um reavivamento ter varrido as colônias
americanas durante a década de 1740, depois da Revolução a
membresia das igrejas tornou-se mais baixa do que nunca — cerca
de 5 a 10 por cento da população adulta. Porém, uma
reavivamento surgiu na fronteira no final da década de 1790 e
espalhou-se rapidamente também para as cidades do Leste.
Conhecido como o Segundo Grande Despertamento, esse
movimento espiritual resultou no triunfo evangélico na cultura
religiosa da América — o “Século Protestante”, como
historiadores tem chamado essa era.
Ao contrário do “primeiro” despertar, no qual as
denominações mais antigas assumiram a liderança, neste caso
foram os novos grupos — metodistas, batistas e discípulos de
Cristo — que dominaram e tornaram-se as maiores denominações
protestantes. Esse movimento também foi mais duradouro tendo
em vista que fez com que o país tivesse um caráter mais ou menos
evangélico até o final do século 19. Além disso, as sociedades
voluntárias que sustentavam as missões estrangeiras, a
evangelização e uma série de causas sociais, proliferaram. Nesse
caso, um papel-chave foi desempenhado pelo pregador
congregacionalista Lyman Beecher (1792-1863) que orquestrou
muitas das iniciativas que formaram a “frente evangélica unida”.
Outra característica foi a ênfase arminiana sobre o fato de
que Deus deu a todos a capacidade de chegar-se a Cristo se a
pessoa assim o desejasse. Essa teologia de ação refletia-se tanto
nas organizações voluntárias como nos evangelistas itinerantes
como Francis Asbury (1745-1816) e Charles G. Finney (1792-
1875). Wesley havia enviado Asbury para as colônias em 1771 e
depois da Revolução ele reorganizou a obra metodista lá. Usou
uma ampla rede de “viajantes” para alcançar pessoas na fronteira
com o evangelho e seus próprios esforços foram prodigiosos.
(Diz-se que ele viajou 450 mil quilômetros, a maior parte à
cavalo.) Em 1771 ele era um entre cinco obreiros; quarenta e cinco
anos mais tarde, já haviam dois mil ministros e mais de duzentos
mil metodistas na América.
Finney foi o mais conhecido evangelista das massas na
América. Coordenou reuniões cuidadosamente controladas nas
maiores cidades do país, bem como na fronteira. Também ligou a
religião evangélica à reforma social, especialmente a abolição e a
educação para mulheres, enquanto que, ao mesmo tempo,
formalizou os laços entre a teologia conservadora e a riqueza
industrial que mais tarde viria a caracterizar tão profundamente o
protestantismo americano; Finney foi presidente do Oberlin
College em Ohio de 1851 a 1866. Oberlin foi uma das primeiras
faculdades a aceitar mulheres e negros. Através dos escritos de
Finney sobre o governo moral de Deus e a vontade humana ele
também tornou-se um importante teólogo.
Igrejas trazidas da Europa ofereciam um santuário espiritual
para os imigrantes enquanto os afro-americanos organizavam suas
próprias igrejas, que ministravam ao povo que sofria a degradação
do racismo e da escravidão. A população católica romana estava
crescendo e algumas ordens missionárias usaram técnicas do
reavivamento para propagar sua igreja. Alexis de Tocqueville, que
visitou os Estados Unidos em 1831 e viu essas grandes
demonstrações de fervor religioso comentou que “não há nenhum
país no mundo onde a religião cristã tenha maior influência sobre
a alma dos homens do que a América”.4
A Revolução Industrial
Apesar dos estudiosos discutirem assuntos como a
cronologia e a duração da Revolução Industrial, todos eles
concordam que a substituição de ferramentas manuais por
máquinas motorizadas na produção do trabalho no mundo foi uma
das transformações mais fundamentais da história humana.
A industrialização britânica
Quem tomou a frente nesse processo foi a Inglaterra, lugar
onde algum tempo antes havia ocorrido uma revolução agrícola.
Lá, as classes que possuíam terras controlaram o Parlamento e
obtiveram uma legislação que anexava as terras comuns e campos
abertos, colocando dessa forma a maior parte das propriedades
agrícolas nas mãos desses abastados senhores de terras. Com
extensões maiores, ele podiam usar técnicas de cultivo mais
eficientes para melhorar a produtividade da terra e portanto
aumentar também o suprimento de comida para o país. Ao mesmo
tempo, isso forçou um grande número de pequenos fazendeiros
(camponeses) a encontrar outras fontes de trabalho, o que
significava que toda a força de trabalho móvel passou a receber
em forma de salários. O capital gerado pelo setor agrícola também
podia ser canalizado para outros empreendimentos, especialmente
a manufatura.
A Inglaterra também possuía uma infra-estrutura política e
econômica que tornou possível a industrialização. O governo
estável permitiu que a economia funcionasse com liberdade. Como
não havia guerras em solo inglês desde a década de 1640, nem
lutas civis e nem exércitos invasores constituíam uma ameaça à
paz e prosperidade. O país tinha uma classe empreendedora
moderna e experiente e as vantagens de um banco central e de
instituições de crédito bem desenvolvidas. A Inglaterra possuía o
maior mercado interno da Europa e a maior parte dos lugares era
de fácil acesso pela água, quer fosse por rios, navegação costeira
ou canais. Através do desenvolvimento de sua marinha mercante e
do império colonial, a Inglaterra encontrava-se numa posição
favorável para colocar no mercado seu principal produto
manufaturado, o tecido de lã, e com o desenvolvimento do
maquinário, ele podia concorrer também com os tecidos de
algodão da Ásia.
Os avanços tecnológicos que criaram a Revolução Industrial
ocorreram em primeiro lugar na indústria têxtil do algodão. Uma
série de invenções entre 1765 e 1800 permitiu um aumento na
produção do algodão e na fiação e tecelagem. O uso de turbinas de
água e motores a vapor para operar essas máquinas exigia que
houvesse fábricas, portanto os trabalhadores têxteis passaram a
trabalhar nesses lugares e não mais em casa e em suas lojas. Essas
mudanças estimularam as indústrias de carvão e ferro e, logo,
estradas de ferro e navios a vapor foram construídos para
transportar a matéria prima para as fábricas e o produto pronto
para os mercados. Em 1850 a Inglaterra havia se tornado a oficina
do mundo, responsável por dois terços das produção mundial de
carvão e metade de seu ferro e tecido de algodão. Londres era o
centro financeiro do globo e, de lá, o capital era exportado para
outras partes a fim de criar novos empreendimentos.
A industrialização espalhou-se então para a Bélgica e França
nas décadas de 1820 e 1830 e para os Estados Unidos e Alemanha
logo em seguida. Depois de 1860 o crescimento espetacular desses
dois últimos países começou a ultrapassar a Inglaterra, e no final
do século 19, novos centros industriais estavam se desenvolvendo
na Itália, Áustria, Suécia, Rússia e até mesmo no Japão. Os
capitalistas de outras partes do mundo tomavam emprestados os
métodos desenvolvidos pela Inglaterra e usavam seu dinheiro e
capital, mas voltavam-se para seu próprio Estado em busca de
ajuda para promover o crescimento industrial.
1865 1891
Fundação do Exército da Salvação Leão XIII, Rerum Novarum
1780 1813 1848 1883 1911
Robert Haikes começa Elizabeth Fry Missão Fundada a Liga da Igreja
o movimento da inicia as visitas às interior na Sociedade Socialista
Escola Dominical prisões Alemanha Fabiana
1700 1800 1900 1950
1750 1833-34 1853
Início da Revolução Abolição da Escravidão Florence Nightingale funda a
Industial na Inglaterra no Império Britânico enfermagem científica
1833 1848
Lei da Fábrica Publicação do Manifesto Comunista
O impacto da industrialização
As conseqüências sociais desses acontecimentos foram o
maior desafio enfrentado pelas igrejas do século 19. O rápido
crescimento populacional que acompanhou a industrialização (a
Grã-Bretanha cresceu de dez para trinta milhões de pessoas entre
1750 e 1850) acabaram com o sistema de paróquias e incentivaram
o desenvolvimento de ministérios itinerantes como os dos
metodistas. As paróquias rurais foram empobrecidas pelas divisões
de terras enquanto as igrejas das cidades não tinham como lidar
com o fluxo de cada vez mais pessoas. Nas novas cidades
industriais, ao que parece, as igrejas dissidentes exerciam um
ministério mais eficaz junto às novas massas do que a Igreja
oficial.
Relacionado ao aumento da população, houve um
crescimento das favelas. Cidades inteiras pareciam surgir do nada
e o crescimento descontrolado colocava um peso excessivo sobre
os serviços urbanos — esgotos, coleta de lixo, abastecimento de
água, saúde pública, segurança e moradia. Aparentemente, não
havia regulamentos para construir. As edificações eram colocados
nos menores espaços possíveis e ficavam lotadas de gente. Muitas
vezes, famílias inteiras moravam em um só cômodo e em alguns
lugares a vida familiar desintegrou-se ao mesmo tempo que
inúmeras crianças começaram a encher as ruas. A fumaça pesada e
a fuligem do início da era do carvão escureciam o céu e causavam
doenças respiratórias. O fedor da sujeira e excrementos no chão
era inacreditável. Tendo em vista que normalmente não havia
transporte público disponível, as pessoas tinham que ir à pé para
as fábricas e lojas.
As condições dos trabalhadores nas fábricas era, na melhor
das hipóteses, incerta, e os primeiros anos da Revolução Industrial
foram os piores, como nos mostram os estudiosos da atualidade.
Até 1820, os preços dos alimentos subiram mais rapidamente do
que os salários, mas em 1840 os salários também começaram a
subir consideravelmente. Além disso, muitas famílias trabalhavam
juntas nas fábricas e minas de carvão, o que ajudava a manter a
coesão. Por outro lado, as horas semanais de trabalho eram
excessivas e a disciplina das fábricas constituia uma experiência
nova para quem estava acostumado a trabalhar em casa ou em
pequenas oficinas. Como muitas crianças eram empregadas,
tinham pouco acesso à educação. Muitas vezes, seu crescimento
era afetado pelo trabalho pesado em máquinas e várias sofriam
acidentes debilitantes.
Quanto aos donos das fábricas, estes engordavam cada vez
mais a classe média. Alguns já eram de famílias de comerciantes
bem estabelecidos mas, no início, muitos vinham de origens mais
humildes, apesar dessa situação ter mudado na metade do século
19. Havia boas possibilidades para artesãos competentes e que
tivessem iniciativa. Além disso, pessoas de grupos religiosos ou
étnicos que antes haviam sofrido discriminação em ocupações
controladas pela aristocracia, passaram a ter novas oportunidades.
Quakers e escoceses tiveram papéis importantes no
desenvolvimento industrial britânico, enquanto que os protestantes
e judeus dominaram o setor bancário na França.
Os novos industriais, de um modo geral, tinham um estilo de
vida modesto e investiam grande parte de sua renda de volta no
próprio negócio a fim de manter-se à frente da concorrência. Eles
consideravam os “pobres” como sendo preguiçosos e pensavam
estar lhes fazendo um favor quando lhes davam emprego e
exigiam que trabalhassem diligente e produtivamente. Os
empresários não queriam inspetores do governo vigiando seu
trabalho para ver se estavam tratando corretamente os empregados.
Eles insistiam que se fossem deixados em paz para dirigir seus
empreendimentos como bem entendessem, então o país iria
prosperar.
O impacto da Revolução Industrial sobre a família foi muito
importante. Para a classe média, a instituição do lar e a família
imediata substituíram a família que incluía parentes mais distantes
como da sociedade pré-industrial. A antiga indiferença para com
as crianças foi substituída por amor e preocupação em relação a
elas. Enquanto o marido trabalhava, a mulher ficava em casa para
administrar o lar e cuidar dos filhos. As famílias de classes
trabalhadoras passaram a sofrer muito mais tensão por causa das
longas horas de expediente, baixos salários, condições de trabalho
insalubres, moradia inadequada e falta de segurança social caso o
provedor da família ficasse desempregado, se acidentasse ou
morresse.
Juntamente com isso, desenvolveu-se uma divisão no
trabalho de acordo com o sexo, tendo em vista que só as mulheres
que não eram casadas ou as que eram casadas mas de família
pobre é que trabalhavam fora do lar. Boas oportunidades de
trabalho eram praticamente inexistentes e elas viam-se relegadas a
serviços domésticos, tarefas que não exigiam aptidão específica,
ou prostituição. A esposa não possuía identidade legal, não podia
ter propriedades em seu nome e sempre saía perdendo em acordos
de divórcio. Até mesmos seu salário podia pertencer ao marido.
Socialismo
Uma reação completamente diferente aos problemas da era
industrial foi a do Socialismo. Os simpatizantes desse movimento
iam além da simples reforma e defendiam a criação de uma ordem
social totalmente nova. Apesar de haver muitas variedades de
Socialismo, um denominador comum era o pedido por alguma
forma de propriedade coletiva dos bens produtivos ou “meios de
produção” — terras, máquinas, fábricas, sistemas de transporte e
bancos. Além disso, ao contrário dos liberais, os socialistas
rejeitavam o Capitalismo de laissez-faire e a competição de
mercado livre, considerando-os causadores de desperdício. Em seu
lugar, preferiam algum tipo de arranjo comunitário ou cooperativo
em que as pessoas teriam propriedades em comum e
compartilhariam dos lucros da produção. Enfatizavam uma
distribuição mais justa de renda entre os membros funcionais da
sociedade, ao invés do simples aumento da produção.
Os primeiros socialistas eram chamados de “utópicos” pois
suas idéias baseavam-se em conceitos extremamente idealistas da
natureza humana. Por exemplo, aqueles que seguiam Robert Owen
achavam que o governo próprio de uma comunidade daria um fim
às desigualdades da vida. Os discípulos do Conde Saint Simon
argumentavam que o Estado deveria possuir os meios de produção
mas sob uma hierarquia de elites talentosas que recompensariam a
todos de acordo com o trabalho realizado. Charles Fourir
visualizava uma sociedade formada por unidades cooperativas de
mil e seiscentas pessoas nas quais todos fariam o trabalho que
estava mais de acordo com suas aptidões e todos compartilhariam
dos rendimentos dessa comunidade. Louis Blanc defendia a
formação de “oficinas sociais” financiadas pelo governo e que
teriam melhor desempenho do que os empreendimentos privados
pois os trabalhadores participariam de sua administração e dos
lucros.
Para Karl Marx (1818-83), o mais importante de todos os
pensadores socialistas, esses eram planos de sonhadores nada
pragmáticos. Marx e seu colega Friedrich Engels (1820-95)
insistiam que ao invés de criar sociedades ideais, deveria buscar-se
a destruição do sistema capitalista. Das suas cinzas surgiria uma
nova ordem baseada no tratamento justo dos trabalhadores.
Filho de pais judeus que haviam se convertido ao
Luteranismo, o jovem Marx rejeitava todas as religiões. Depois de
estudar filosofia em Berlim, foi para o jornalismo porque suas
idéias radicais impediam que ele conseguisse um cargo de
professor universitário. Porém, as autoridades prussianas fecharam
seu jornal e o forçaram ao exílio. Em 1844 ele começou um
relacionamento vitalício com Engels, um conterrâneo alemão que
havia se mudado para a Inglaterra a fim de administrar uma fábrica
têxtil que seu pai possuía lá e publicou um relato chocante do
tratamento recebido pelos trabalhadores do início da Revolução
Industrial. No começou de 1848, os dois homens escreveram um
plano de ação político chamado O Manifesto Comunista, para um
grupo radical quase desconhecido, a Liga Comunista.
Quando a revolução eclodiu na Alemanha, dois meses
depois, eles voltaram para casa, começaram um jornal e tentaram
sem sucesso direcionar os acontecimentos para um rumo social.
Quando a revolta entrou em colapso em 1849 os dois voltaram
para a Inglaterra. Engels continuou sua carreira de negócios e
ajudou a sustentar Marx, que passou os trinta anos seguintes
enterrado na biblioteca do Museu Britânico desenvolvendo os
detalhes de sua teoria. O primeiro volume de Das Kapital [O
Capital] saiu em 1867 e, depois da morte de Marx, seus discípulos
compilaram mais dois volumes usando suas anotações. Ele
também escreveu vários livros menores e muitas cartas a outros
socialistas numa tentativa de criar um movimento internacional
das classes trabalhadoras.
Para desenvolver seu próprio sistema, que explicava por que
os trabalhadores viviam na pobreza e por que ocorriam as
revoluções e depressões, Marx lançou mão extensivamente de
pensadores mais antigos. Rejeitando o idealismo de socialistas
anteriores e considerando-os “utópicos”, ele declarou que suas
idéias eram “científicas”, ou seja, baseadas nas “leis” que
governavam a sociedade e garantiu que os trabalhadores ainda
triunfariam. Dentre essas leis, a mais básica era a “visão
materialista da História” ou “materialismo histórico”. Para isso ele
fez uso de dois pensadores, Feuerbach e Hegel. O filósofo Ludwig
Feuerbach (1804-72) escreveu na obra A Essência do Cristianismo
(1841) que a matéria ou natureza (o material) era a fonte de todas
as idéias, o inverso daquilo que Hegel havia ensinado. Além disso,
Deus era uma projeção do homem, o desejo exaltado do coração
das pessoas, a amplificação de idéias sobre nós mesmos. Assim, a
Teologia era Antropologia, o conhecimento a humanidade. Marx
foi ainda mais longe argumentando que a realidade final não se
encontrava na natureza em si, mas nas estruturas da vida
econômica. Aqueles que controlam os meios de produção (a
“classe dominante”) constróem a sociedade de modo que eles
próprios sejam beneficiados. Determinam seus relacionamentos
sociais, órgãos políticos, leis, valores morais e crenças religiosas.
Isso inevitavelmente levava à exploração de outros.
Porém, um sistema econômico se expande naturalmente e
sofre mudanças nas técnicas de produção. Isso leva à ascensão de
uma nova classe que está profundamente envolvida na produção e
mais cedo ou mais tarde desafia a antiga classe dominante. Assim,
o fato básico da História é a “luta de classes”. Para explicar esse
fato, Max lançou mão da dialética de Hegel. A antiga classe
dominante é a tese e a emergente é a antítese. De sua colisão (luta)
surge um novo sistema que contém as melhores características de
ambas as classes. Esse processo de evolução histórica continuará
até que todas as classes tenham se “libertado” e o resultado final
será o “comunismo” ou “sociedade sem classes”. Na sua época, a
luta era entre a “burguesia”, a classe dominante do Capitalismo e o
“proletariado”, os trabalhadores assalariados que não possuíam
nenhum bem a não ser suas mãos e suas costas.
A maior parte do esforço literário de Marx tinha como
objetivo mostrar os males da sociedade burguesa e preparar o
caminho para a revolução do proletariado. Ele argumentava que o
poder capitalista baseia-se no lucro (“valor excedente”), as rendas
que deveriam ter ido para os trabalhadores que haviam feito os
bens e, portanto, o Capitalismo é um “roubo organizado”. Além
disso, o número de capitalistas irá diminuir pois o poder
econômico está se concentrando nas mãos de cada vez menos
pessoas e as classes trabalhadores estão aumentando. O acúmulo
de tensões e contradições dentro do Capitalismo juntamente com a
crescente miséria dos trabalhadoras finalmente levará a um
colapso de todo o sistema. Então, os trabalhadores irão tomar o
poder e instalar uma “ditadura revolucionária do proletariado”
para realizar as transições rumo à sociedade sem classes. Nesse
ponto, o próprio Marx tornou-se utópico, tendo em vista que ele
acreditava que no Comunismo a propriedade particular deixaria de
existir, o Estado (o “comitê executivo da classe dominante”)
acabaria tornando-se desnecessário e todos viveriam num estado
de liberdade autêntica, onde cada pessoa contribuiria de acordo
com sua habilidade e seria recompensada de acordo com sua
necessidade.
Apesar de Marx ter ajudado na formação da (Primeira)
Associação Internacional de Trabalhadores em 1864 e tê-la usado
como forma de espalhar suas idéias, a maior parte da organização
socialista foi feita por outros. O primeiro partido marxista alemão
foi formado em 1869 e depois de juntar-se com um outro grupo
socialista em 1875, o Partido Social Democrata da Alemanha
cresceu rapidamente. No começo do século 20, estava recebendo
mais votos que qualquer facção nas eleições parlamentares.
Partidos marxistas também se formaram em outros países
industrializados, sendo os maiores na Bélgica e França. Muitos
dos recém-criados sindicatos profissionais também eram
orientados pelo pensamento marxista. À medida em que os
partidos e sindicatos foram ganhando força, desenvolveram-se
diferentes estratégias. Os “ortodoxos” argumentavam que os
socialistas devem trabalhar no sentido de uma deposição
revolucionária dos regimes “burgueses”, enquanto os
“revisionistas” afirmavam que, tendo em vista que os
trabalhadores possuíam sindicatos e partido político, podia
conseguir uma transferência de poder através de meios pacíficos.
Uma importante influência na produção dessa segunda
abordagem foi o “gradualismo” defendido por um grupo de
críticos do Capitalismo pertencentes à classe média na Grã-
Bretanha e conhecidos como Sociedade Fabiana. Formada em
1883, seus membros (incluindo H.G. Wells e George Bernard
Shaw) viam o Socialismo como o equivalente social e econômico
da democracia, bem como seus resultados. O conflito de classes
não era inevitável e medidas graduais e conciliatórias acabariam
trazendo uma ordem socialista. Os marxistas desprezavam esse
pensamento taxando-o de “oportunismo”. Os marxistas mais
extremistas voltaram-se para o sindicalismo, um movimento de
anarquia que pedia a deposição violenta dos governos para que em
seu lugar fossem colocados sindicatos de trabalhadores com
autoridade suprema.
As relações entre as igrejas e os movimentos socialistas
eram, no mínimo, tensas. Marx era um “humanista pós-cristão” no
sentido de que proclamava a independência humana de Deus e da
religião. Para ele a religião era “o ópio do povo”, uma ferramenta
que a classe dominante usava para manter sua supremacia. Os
partidos socialistas eram indiferentes em relação às igrejas e a
freqüência da classe trabalhadora nos cultos caiu acentuadamente.
A alienação das massas trabalhadoras das igrejas oficiais da
Europa já estava a pleno vapor no final do século. Ao mesmo
tempo, a hostilidade das igrejas que em sua maioria eram
burguesas tornava ainda mais difícil uma reconciliação com as
classes trabalhadoras.
Socialismo cristão
Os humanitários evangélicos procuravam ajudar as vítimas
da ordem industrial enquanto os socialistas seculares encaravam o
sistema em si como sendo a principal fonte dos problemas sociais.
Porém, os “socialistas cristãos” tentavam reconciliar as
abordagens divergentes. Eles defendiam uma adaptação ou
remodelagem do sistema em si a fim de haver uma medida maior
de justiça social. A maioria deles propunha uma alternativa cristã
para a ordem econômica existente e alguns até trabalhavam com
partidos socialistas ou de trabalhadores na tentativa de realizar
mudanças.
Apesar de divergirem em questões de doutrina e ação, os
socialistas cristãos concordavam que a abordagem liberal clássica
à vida econômica era gravemente deficiente. É certo que suas
idéias eram tiradas de correntes reformistas contemporâneas
enquanto os socialistas mantinham-se céticos em relação à sua
ênfase sobre os fatores espirituais e o trabalho voluntário ao invés
da solução coletivista para os males da sociedade. Os socialistas
cristãos acreditavam que o reino de Cristo abrangia toda a raça
humana e, portanto, a humanidade poderia ser melhorada e
libertada das condições precárias de vida (como, por exemplo, as
práticas econômicas competitivas) produzidas pelo pecado. Essa
não era a intenção de Deus para suas criaturas.
Desde que as primeiras variedades de Socialismo ainda
estavam surgindo na França, assim também apareram as primeiras
expressões de Socialismo cristão. O sacerdote e escritor católico
Félicité de Lamennais (1782-54) identificava a pobreza como
sendo conseqüência do pecado humano. Ele pedia uma nova
ordem baseada na abolição dos privilégios do monopólio,
tornando o crédito disponível para todos e dando aos trabalhadores
o direito de formar cooperativas de produção (“associações”) mas
não era a favor da abolição da propriedade privada por si só. Em
seu jornal de curta duração L’Avenir [O Futuro], Lamennais
chegou a defender a separação entre Igreja e Estado e a
regeneração da Igreja Católica. Mas em 1832 o papa condenou
suas idéias e ele pediu demissão da Igreja e acabou até mesmo
abandonando sua fé.
Phillippe Buchez (1796-1865) era um escritor que rejeitava
veementemente o Catolicismo e ainda assim aceitava o
Cristianismo e pode até ter experimentado uma conversão. Era o
principal defensor das cooperativas independentes e voluntárias.
Via o “direito de trabalhar” que seria possibilitado pela
associação, como o cumprimento das implicações políticas e
sociais dos ensinamentos de Cristo. Algumas outras figuras
francesas defenderam formas vagas de Socialismo cristão, mas a
liderança eclesiástica reacionária também resistiu a elas.
Na Inglaterra, porém, a idéia atraiu grande número de
seguidores. Fundador de um movimento socialista cristão de estilo
próprio, John M. F. Ludlow (1821-1911) era um advogado que
havia sido educado na França e aprendido lá sobre o Socialismo.
Durante inquietações Chartistas de 1848 (um movimento
moderado que, através de abaixo-assinados e manifestações em
massa pedia uma reforma democrática do Parlamento) ele
persuadiu o teólogo anglicano liberal Frederick D. Maurice (1805-
72) e o escritor Charles Kingsley (1819-75) de que os cristãos
deviam estar preocupados com o sofrimento e as injustiças em
relação aos trabalhadores. Como disse Ludlow, “o novo
Socialismo deve ser cristianizado”. Durante os seis anos seguintes
eles publicaram panfletos, abriram uma “Faculdade para
Trabalhadores” em Londres e formaram oficinas cooperativas para
artesãos. Em 1855 o movimento havia se apagado devido à falta
de interesse tanto da Igreja como dos líderes da classe
trabalhadora e a distração causada pela Guerra da Criméia. Porém,
sua influência a longo prazo pode ser vista no movimento dos
sindicatos, na legislação para cooperativas e nas iniciativas de
educação da classe trabalhadora.
O Socialismo cristão foi reavivado com a fundação da
Guilda de São Mateus na Igreja oficial em 1877 pelo Reverendo
Stewart D. Headlam (1847-1924), que também era membro da
Sociedade Fabiana. A associação era fortemente favorável ao
trabalhador e desprezava as cooperativas, argumentando que, ao
invés delas, eram as leis que deveriam proteger os operários.
Headlam declarou que Jesus era o “Emancipador social e político,
o maior de todos os trabalhadores seculares, o fundador da grande
sociedade socialista para a promoção da retidão, o provedor de
uma revolução”.2 Porém seus principais rivais, o Sindicato Social
Cristão (1889) e a Liga Socialista da Igreja (1906) atraíam mais
membros e ofereciam soluções mais radicais para os males da
sociedade. Eles estudavam as condições de trabalho em fábricas e
expunham as firmas que apresentavam resultados negativos.
A Primeira Guerra Mundial e a Revolução Russa foram um
golpe severo para esses grupos e os de “guildas socialistas”,
alguns dos quais eram associados à Igreja anglicana. (O
Socialismo de guilda era uma forma de reviver o antigo sistema
medieval de produção tendo como base as guildas de artesanato
em pequena escala.) Por causa de seu caráter de classe média, as
sociedades nunca alcançaram as massas urbanas que estavam cada
vez mais alienadas das igrejas. Ainda assim, o Protestantismo
pendia favoravelmente para o Socialismo. Um bom exemplo foi o
trabalhado do Arcebispo William Temple, cujo livro Christianity
and Social Order [Cristianismo e Ordem Social] (1942) ainda é
altamente respeitado.
Uma ilustração exemplar do envolvimento no Socialismo
“partidário” é o caso de J. Keir Hardie (1856-1915). Influenciado
pelos valores espirituais e éticos da tradição do Presbiterianismo
da Aliança proveniente de sua região de origem na Escócia, ele
possuía um comprometimento profundo com a justiça social. Isso
foi fortalecido por sua conversão numa reunião de Moody-Sankey
e por sua afiliação ao Sindicato Evangélico, um grupo
congregacionalista escocês. Mais tarde, ele disse que seu
Socialismo vinha do Sermão da Montanha, afirmando que “a única
forma que você pode servir a Deus é servindo a humanidade”. Ele
começou como mineiro de carvão, tornou-se um agente do
sindicato e então entrou para a política. Eleito para o Parlamento
em 1892, no ano seguinte ele ajudou a formar o Partido
Trabalhista Independente. Apesar de não usar o nome “socialista”,
sua proposta continha uma declaração que apoiava a propriedade
coletiva dos meios de produção. O nome foi logo mudado para
Partido Trabalhista e, em 1906 ganhou trinta cadeiras, sendo que
nessa ocasião Hardie trabalhou durante dois anos como presidente
do partido.
Na Alemanha, as igrejas viam a ordem industrial como um
enorme desafio. Em função disso, promoveram a observância do
Dia do Senhor, formaram comissões municipais para ministrar aos
trabalhadores e os recém-chegados do campo além de manterem
missões para os viajantes nas estações ferroviárias. Dedicaram-se
a muitas outras iniciativas através da Missão Interior, a principal
reação protestante à industrialização. Viam, porém, o Partido
Social Democrata como uma ameaça ainda maior. Durante a
década de 1880, o governo alemão tentou combater o Marxismo
com uma tentativa fútil de proibir o partido e oferecer assistência
médica, seguro de invalidez e aposentadoria para os trabalhadores.
Assim, os socialistas passaram a considerar a Igreja e o Estado
como seus inimigos.
A princípio, a posição dos Sociais Democratas em relação ao
Cristianismo era hostil. Alguns argumentavam em favor do
ateísmo ou chamavam o Socialismo de nova religião das massas,
enquanto outros insistiam que a religião era uma questão
puramente “particular”. Não tardou para que o partido moderasse
essas atitude como forma de ganhar mais seguidores. Apesar da
resposta de muitos líderes eclesiásticos ser puramente negativa,
um clérigo luterano, Adolf Stoecker (1835-1909) concebeu uma
forma de Socialismo cristão como alternativa ao Marxismo.
Através do pastorado em uma nova cidade industrial,
envolvimento com a Missão da Cidade de Berlim e serviço como
pregador da corte da Prússia, Stoecker esteve em contato próximo
com os problemas da era industrial. Ele concluiu que o reino de
Deus podia criar uma ponte sobre o abismo entre a antiga
sociedade conservadora e nova sociedade radical. A ênfase da
Igreja na liberdade, irmandade e igualdade perante Deus podia
reconciliar as diferenças de classe na terra e permitir que ricos e
pobres vivessem em paz uns com os outros.
Em 1878 Stoecker fundou o Partido dos Trabalhadores
Cristãos Socialistas para concorrer com os Sociais Democratas. O
partido pedia uma série de reformas para a classe trabalhadora e
incentivava sua lealdade a Igreja, monarquia e pátria. Como não
conseguiu repercussão entre os eleitores da classe trabalhadora,
voltou-se para a classe média baixa. Nesse meio ele descobriu o
poderoso apêlo político do anti-semitismo. Através desse artifício
Stoecker tornou-se uma figura nacional , chegando a ganhar a
eleição para o parlamento, mas isso o desacreditou como socialista
e acabou levando à sua dispensa do cargo de pregador da corte em
1890. Apesar de ter se dedicado a outras formas de ação social
mais para o final de sua vida, a maioria só se lembra dele como
precursor do nazismo por causa de suas atividades e discursos
anti-semitas.
Christoph Bulmhardt (1842-1919) um evangélico sério, filho
de J.C. Blumhardt (ver capítulo 18), era muito diferente. Ele
entrou para o ministério junto com seu pai em 1869 e endossou a
idéia dele de que Jesus é vitorioso e seu reino de luz irá conquistar
o reino de trevas do mundo. Porém, argumentava que a Igreja
institucional não estava servindo de testemunho do reino de Deus
tendo em vista que interessava-se apenas em detalhes da doutrina
e, portanto, os proletários e socialistas eram os aqueles que, na
verdade, tinham uma esperança escatológica. Blumhardt tornou-se
o primeiro pastor luterano a entrar para o Partido Social
Democrata e em 1899 uma assembléia local o expulsou de seu
cargo ao púlpito por apoiar publicamente os movimentos de
protesto dos trabalhadores. Em 1900 ele foi eleito para o
legislativo estadual de Württemberg como Social Democrata,
cargo que manteve até 1906. Então, desiludido com o Partido
Social Democrata, ele deixou a política ao perceber que o partido
estava menos preocupado com a luta pela justiça do que com a
possibilidade de um acordo confortável que pudesse fazer com o
mundo injusto. Ainda assim, a ênfase na soberania e revelação de
Deus continuaram presentes em suas pregações que influenciaram
muitos teólogos do século 20, incluindo Karl Barth, Emil Brunner
e Dietrich Bonhoeffer.
Sua influência também ficou evidente no trabalho dos
“Socialistas Religiosos”, uma sociedade fundada em 1906 por
Hermann Kutter (1863-1931) e Leonhard Ragaz (1868-1945) na
Suíça. O grupo identificava o Socialismo com a mão do Deus vivo
e insistia que a questão social seria resolvida no cerne do
Cristianismo. Ragaz chegou até a juntar-se ao Partido Social
Democrata Suíço, como também o fez Karl Barth. Uma forte
ênfase do movimento era o pacifismo, que seria um elemento
chave para o Socialismo cristão alemão desde então. Porém, em
1919 Barth sugeriu que o Socialismo religioso era um forma de
idolatria política quando afirmava que o serviço do homem,
quando realizado a partir do mais puro amor, tornava-se o serviço
de Deus e, por isso, Barth deixou o movimento. Graças a Paul
Tillich e outros, o Socialismo religioso cresceu na Europa de
língua alemã, apesar de nunca ter ficado muito claro qual era o
significado do termo para aqueles que faziam uso dele. Mostrou-se
um fenômeno duradouro e a Associação de Socialistas Religiosos,
formada em 1926, existe até hoje.
Nos Estados Unidos, a hostilidade ao Socialismo prevaleceu
tanto nos meios protestantes quanto católicos, mas várias pessoas
influentes chegaram a pertencer à Fraternidade Socialista Cristã
(1906) ou à Liga Socialista da Igreja (1911). Estes eram muito
diferentes dos grupos britânicos, tendo em vista que seus membros
se identificavam com o Partido Socialista da América, estavam
familiarizados com a teoria socialista e buscavam trazer mais
cristãos para sua iniciativa política. Essas pessoas, muitas das
quais (mas de forma alguma todas elas) era liberais, identificaram
a vinda do reino de Deus com o Estado socialista. Seu sucesso em
alcançar a Igreja de um modo geral foi mínimo e o movimento
entrou rapidamente em declínio durante a Primeira Guerra
Mundial. Porém, um resultado duradouro foi que um ministro
presbiteriano, Norman Thomas (1884-1968) acabaria liderando o
Partido Socialista. Além disso, o trabalho desses socialistas
cristãos contribuiu para a propagação de uma reação mais
singularmente americana à industrialização — o Evangelho Social.
O Evangelho Social
O movimento nacional desenvolveu-se dentro do
Protestantismo americano surgindo na década de 1880, tendo seu
ponto alto por volta de 1910-15 e entrando em declínio nos anos
20. Seus simpatizantes, que incluíam pastores, educadores,
jornalistas e líderes de agências de serviço social, lutavam com a
crise do industrialismo e urbanização e buscavam nas Escrituras e
na teologia cristã as soluções para esses problemas. Por causa do
uso impreciso do termo “evangelho social” tanto por aqueles que
apoiavam como por aqueles que criticavam o movimento, ele foi
usado de várias maneiras significando desde um envolvimento
significativo dos cristãos até a moralidade das boas obras que
esvaziava a mensagem do evangelho de todo o seu conteúdo
espiritual. O liberal Shailer Mathews chamava o movimento de
“aplicação dos ensinamentos de Jesus e da mensagem da salvação
cristã como um todo à vida econômica, instituições sociais ... bem
como aos indivíduos”.3 Por outro lado, o oponente W. B. Riley
afirmava que os pregadores do Evangelho Social “repudiavam o
sangue derramado enquanto imploravam para que o homem
servisse o homem, para um refinamento da educação, menos casas
alugadas e flores no jardim”.4
O Evangelho Social era, antes de mais nada, um fenômeno
urbano e de classe média e refletia a crença dos protestantes na
bondade essencial da América e os esforços de se cristianizar a
nação. Seu enfoque era dirigido às cidades pobres e dava-se pouca
atenção à situação dos fazendeiros ou dos afro-americanos.
Devido à ênfase em pregações contra os bares e vícios
semelhantes na reforma da imigração, alguns estudiosos afirmam
que o movimento na verdade tinha suas raízes nos valores das
cidades pequenas. Além disso, o Evangelho Social se apoiava
fortemente nos meios públicos e políticos para promover o bem-
estar da sociedade e, em certos aspectos, era o braço espiritual do
movimento Progressivo pró-reforma na política americana. Por
fim, o avanço das preocupação sociais até o ponto de ocuparam o
centro do palco no Protestantismo americano foi a conseqüência
direta do ativismo evangélico.
Conforme foi mencionado anteriormente, os evangélicos
com seus fortes impulsos morais que complementavam seu zelo
pelas almas, estavam na vanguarda da ação social urbana. Por
exemplo, logo depois do reavivamento de Dwight L. Moody em
Boston em 1877, o batista A. J. Gordon abriu um Lar Industrial
Temporário para oferecer comida, alojamento e empregos àqueles
para quem ele pregava. A. B. Simpson formou a Aliança Cristã e
Missionária na década de 1880 a fim de levar o evangelho aos
pobres dos centros urbanos. Sob a liderança do empresário Louis
Klopsch, a Revista Christian Herald [Arauto Cristão] era, na
virada do século, a principal patrocinadora em todo o país das
iniciativas sociais urbanas. O trabalho do Exército da Salvação nas
favelas americanas cresceu rapidamente. Porém, os evangélicos
seguiram um rumo diferente do Evangelho Social no que diz
respeito à ênfase na ação pragmática. Para os evangélicos, as
crenças teológicas e a afirmação da fé eram absolutamente
essenciais e a indiferença de muitos dos ativistas do Evangelho
Social parecia enfraquecer a relevância da mensagem da salvação
eterna.
O principal pregador do Evangelho Social foi o ministro
congregacionalista Washington Gladden (1836-1916). Em seu
famoso discurso “É Paz ou É Guerra?” (1886) ele defendeu o
direito dos trabalhadores de se organizar. Em várias palestras e
escritos ele pediu medidas de reforma práticas como a
regulamentação nas fábricas, impostos sobre heranças e quebra
dos monopólios. Um conhecido divulgador do Evangelho Social
foi o clérigo Charles M. Sheldon (1857-1946) que escreveu In His
Steps, or What Would Jesus Do? [Em seus passos, o que faria
Jesus? (1896). Ele retratava a regeneração social de uma
comunidade cujos líderes haviam seguido em suas vidas o modelo
de Cristo e, diz-se que a obra vendeu vinte e três milhões de
cópias. Josiah Strong (1847-1916), cuja obra Our Country [Nosso
país] (1885) talvez tenha sido o chamado mais poderoso à reforma
urbana, declarou que a conquista do oeste já havia sido alcançada
e que a nova fronteira era, então, a cidade. Ele passou seus últimos
trinta anos em Nova York trabalhando a fim de colocar em prática
os princípios do Cristianismo social nos problemas urbanos.
O principal teólogo do Evangelho Social foi Walter
Rauschenbusch (1861-1918), um batista teuto-americano que em
1887 tornou-se pastor de uma congregação de imigrantes numa
favela de Nova York e onze anos mais tarde, professor do
Seminário de Rochester. Ao adquirir conhecimento de primeira
mão sobre a exploração e sofrimento e a indiferença daqueles nas
posições de poder em relação à situação, tornou-se um crítico da
ordem estabelecida. Procurou nas Escrituras uma alternativa que
pudesse harmonizar seu profundo comprometimento à regeneração
pessoal com uma percepção igualmente firme da necessidade de
ação social. Em obras como Christianity and the Social Gospel
[Cristianismo e o Evangelho Social] (1907) e A Theology of the
Social Gospel [Uma Teologia do Evangelho Social] (1917), ele
enfatizou a centralidade do pecado na produção de crises sociais e
a construção do reino de Deus como resposta a elas.
A reação católica
Os católicos ficaram para trás em sua reação ao
industrialismo por causa do conservadorismo do papa, mas na
Alemanha houve esforços para confrontar o problema. No final da
década de 1840, Adolf Kolping (1813-65), um sacerdote em
Colônia, formou associações de artífices para incentivar os valores
religiosos e morais e imunizar os trabalhadores especializados
contra os apêlos sócio-revolucionários. (A organização, que
recebeu o seu nome, ainda existe e possui programas educaconais
clubes e albergues.) Vinte anos mais tarde, clérigos de Rhineland
lançaram um movimento “Social Cristão” para contratacar a
agitação Social Democrata. O principal expoente foi Wilhelm von
Kettler, arcebispo de Mainz (1811-77), que tinha um diálogo com
líderes socialistas e ligou o movimento ao Partido Central Alemão
Católico.
Uma mudança importante no rumo da política papal de
oposição absoluta às questões da classe trabalhadora ocorreu em
1891 com a encíclica Rerum Novarum de Leão XIII. Em sua
essência, era um documento conservador que condenava a idéia
marxista de sociedade sem classes e afirmava a propriedade
privada e o contrato salarial entre empregados e patrões mas
criticava o Capitalismo por sua ganância desmedida de competição
e a concentração de poder políticos nas mãos de uns poucos
poderosos. O papa também pedia aos patrões que pagassem
salários justos e que permitissem uma intervenção moderada do
Estado em favor dos fracos e pobres. Sugeria que os católicos
formassem seus próprios sindicatos, apesar de que estes deveriam
existir com o propósito de buscar a perfeição moral e religiosa e
não o exercício da política. Leão XIII certamente não foi o “papa
vermelho” como diziam alguns críticos do Rerum Novarum, e o
pensamento social católico continuou a ser mais conservador do
que o dos protestantes. Porém, incentivou alguns, especialmente
na América, a buscar relações mais estreitas com organizações
trabalhistas e a reforma social.
1
Pronuncia-se bur e significa "fazendeiro", designação pejorativa que os ingleses adotaram na
África do Sul para os descendentes dos holandeses.
parte para Burma nomeado bispo sa Movimento Voluntário funda a Comunhão
África Ocidental Estudantil Dohnavur
1786 1793 1806 1844 1865 1891 1910
Thomas Coke Willia Reuniã Fundaç Hudson Taylor Mary Slessor Conferência
dirige a primeira m o de ão da funda a Missão nomeada vice- Missionária
missão Carey oração ACM do Interior da chanceler em Mundial em
metodista nas navega Haysta China Calabar Edinburgo
Índias para a ck
Ocidentais Índia
1750 1800 1850 1900 1950
1788 1834 1869 1898 1904-05
Tem início a Emancipação dos Termina o Guerra Hispano- Guerra Russo-
colonização britânica escravos no canal de Suez americana japonesa
na Austrália Império Britânico
1899-1902 1914
Guerra Boer na África do Irrompe a 1ª Guerra
Sul Mundial
O Cristianismo e o Imperialismo
Neste ponto, é necessário fazer menção a algumas questões
interpretativas. A declaração marxista de que o Imperialismo era (e
ainda é) um produto do Capitalismo ainda é aceita sem
questionamento em muitos lugares nos dias de hoje, especialmente
nos países em desenvolvimento. Essa “ortodoxia popular” afirma
que todos os tipos de expansão imperialista ocidental era resultado
da busca do Capitalismo pelos lucros no além-mar. Isso incluía
tanto o “capital de exportação” como a dependência nos governos
locais no sentido de proteger seus investimentos dos capitalistas
de países rivais e da resistência das vítimas nativas às suas
políticas econômicas.
Assim, o Imperialismo serve de slogan apelativo para os
líderes de movimentos de libertação, mesmo que, na realidade, a
base histórica para essa idéia seja, no mínimo, fraca. Estudos sobre
o Imperialismo realizados mais recentemente mostram que os
banqueiros ocidentais em busca de lucros dedicavam pouca
atenção às áreas não-ocidentais. Ao invés disso, grande parte de
seus investimentos era colocada em regiões já desenvolvidas e não
em dependências coloniais recém-adquiridas. Fica claro que esse
foi o caso com a Grã-Bretanha, Estados Unidos, França e
Alemanha. Alguns países, entre eles Rússia, Itália, Japão e
Portugal, que possuíam ou estavam procurando colônias, tinham
pouco capital. Além disso, o capital que era investido em novos
territórios coloniais não tinha um retorno muito mais alto do que
os investimentos domésticos. Assim, seria mais produtivo procurar
a origem do Imperialismo em outros fatores — como a busca pelo
prestígio nacional — do que em conspirações tramadas em virtude
de interesses capitalistas.
Essa questão é muito importante para os historiadores do
Cristianismo, tendo em vista que uma explicação materialista do
Imperialismo como essa descarta qualquer sentimento de
filantropia ou motivação missionária. Significa que quando os
missionários cristãos cooperaram com o Imperialismo, quer isso
fosse prudente ou não, estavam automaticamente promovendo os
planos de exploração do Capitalismo ocidental. Na melhor das
hipóteses, os missionários era ingênuos e, no pior dos casos,
estavam em conluio com os agentes do Imperialismo capitalista.
Além disso, essa interpretação impede qualquer avaliação dos
benefícios que podem ter resultado desse relacionamento
imperialista e, do ponto de vista teológico, não deixa espaço para a
obra da providência divina.
Porém, um problema de maior seriedade para os cristãos é a
relação entre Imperialismo e o conceito de superioridade cultural
do Ocidente. Idéias sociais darwinistas (ver capítulo 21) sobre a
“adequação” dos povos brancos para dominar as raças mais
“fracas” e trazer civilização e existência esclarecida para aqueles
que vivem nas trevas — “as línguas selvagens que não têm por
vós temor” e “raças inferiores sem a lei”, como colocou Rudiard
Kipling em seu hino poético “Recessional” (1987) — entraram em
colisão com a crença cristã da pecaminosidade universal da
humanidade e da igualdade de todos os povos diante de Deus.
Quanto à versão racista do darwinismo social — as nações mais
fortes sempre conquistaram as mais fracas e as raças brancas
dominantes tomaram posse de colônias para provar que eram mais
fortes e viris — esta não é apenas repugnante para o Cristianismo
mas também foi um dos elementos que prepararam o caminho para
a manifestação mais terrível de racismo: o nazismo alemão.
Porém, a fé na civilização moderna era muito mais sedutora
e, na verdade, para muitos havia tornado-se uma espécie de
substituto para a religião, tendo o Imperialismo como credo. Os
franceses falavam de sua “missão sagrada civilizadora”, os
alemães, de espalhar a Kultur, os americanos, das “bênçãos da
proteção anglo-saxônica” e os britânicos do “fardo do homem
branco”. Esta última expressão foi tirada do poema de Kipling de
1899, que urgia os europeus a dedicarem-se ao serviço altruísta em
terras distantes para levar adiante a obra da humanidade. O
problema estava no interesse próprio que era óbvio e na enorme
condescendência que acompanhava essa nobre visão.
Conforme a observação do historiador britânico Brian
Stanley, a maioria dos missionários protestantes do século 19,
especialmente aqueles que vinham da Grã-Bretanha, acreditava
que as missões transformariam o barbarismo incrédulo em
civilização cristã. Essa idéia baseava-se em quatro pressuposições.
A primeira era de que as culturas com as quais estavam entrando
em contato não eram neutras em relação à religião, mas sim
estavam sob o controle de Satanás em todos os seus aspectos,
incluindo a política, economia, moralidade pública e artes. Em
segundo lugar, eles viam sua própria nação como um modelo de
cultura e sociedade cristã; A Bíblia e a Reforma haviam
engrandecido seu país. Em terceiro lugar ficava implícita a fé no
progresso moral humano que havia sido uma contribuição do
Iluminismo ao pensamento cristão. Séculos de influência cristã em
seus países havia contido a pecaminosidade que reinava
livremente em países incrédulos. E, finalmente, o esforço bem-
sucedido de “civilizar” os incrédulos, como foi o caso em Serra
Leoa e algumas ilhas do Pacífico, parecia confirmar a
argumentação de que isso era possível. Foi só no século 20 que as
pessoas começaram a reconhecer que a civilização moldada de
acordo com a sociedade vitoriana pós-Iluminismo não era
necessariamente cristã.1
O princípio nativo
Uma questão importante na teoria de missões foi o
desenvolvimento de uma igreja independente “nativa” ou
indígena. Apesar dessa ter sido claramente uma preocupação no
início do século, a discussão principal ocorreu entre 1840 e 1870 e
os princípios foram enunciados por Henry Venn (1796-1873),
secretário da CMS (1841-72) e Rufus Anderson (1796-1880),
secretário exterior da ABCFM (1832-66). O slogan "auto-
governante, auto-sustentável e auto-propagadora”, resumia seu
posicionamento. Isso significava descentralização do trabalho
missionário e incentivo à iniciativa local. Os fundos para o
ministério deveriam vir de fontes locais e não da Europa. Pastores
nacionais deveriam ser ordenados e receber a responsabilidade de
dirigir suas igrejas, que por sua vez iriam crescer por conta própria
e ganhar pessoas da comunidade. Isso liberaria os missionário das
funções pastorais e administrativas para que pudessem realizar o
trabalho de evangelização.
Uma boa ilustração do potencial e limitações dessa doutrina
foi Samuel Ajayi Crowther, o cristão africano mais conhecido do
século 19. Um Yoruba originário da atual Nigéria, quando era
adolescente foi capturado e vendido como escravo para
comerciantes portugueses em 1822. Porém, uma esquadra naval
britânica parou o navio em que se encontrava, deixando-o em
Serra Leoa. Lá ele encontrou a Cristo, foi batizado por um
missionário da CMS, adotou o novo nome de Samuel Crowther e
recebeu uma educação. Foi professor e evangelista, dedicou-se aos
estudos lingüísticos e acabou fazendo uma excelente tradução
Yoruba da Bíblia. Também foi enviado para Londres a fim de
aprofundar seus estudos e foi ordenado em 1843. Ao voltar,
trabalhou em estreita relação com uma missão da CMS em terras
Yoruba.
Ainda na linha da teoria de Venn, outros africanos foram
ordenados e, por fim, em 1864 Crowther foi consagrado bispo
dessa região. Para Venn, o papel do missionário era temporário e
uma vez que a igreja indígena estivesse estabelecida, os europeus
deviam seguir em frente. Porém, a resistência dos missionários em
países estrangeiros — que viam essa teoria como um idéia pouco
prática de um administrador que não havia saído do país — era
forte demais. Na década de 1880 a visão missionária havia se
espalhado entre as classes mais cultas e a CMS tinha um grande
número de jovens e perspicazes obreiros europeus que desejavam
sair para o campo missionário, ganhar o maior número possível de
convertidos e organizar a igreja a seu modo. Tendo em vista que
não havia interesse numa igreja africana com autonomia de
governo, eles ignoraram Crowther. Em 1891, bastante abatido, ele
faleceu e em seu lugar foi colocado um bispo europeu.
Mas a idéia de igreja nativa não estava morta. Ela foi
retomada pelo missionário presbiteriano americano na China, John
L. Neviu (1829-93), que escreveu a influente obra Planting and
Development of Missionary Churches [Implantação e
Desenvolvimento de Igrejas Missionárias] (1886). Depois de ser
convidado por missionários na Coréia para fazer uma avaliação de
seu campo em 1890, eles adotaram sua abordagem e houve um
crescimento fenomenal em sua igreja presbiteriana. O “método
Nevius” tinha quatro pontos: (1) cada cristão deve ser auto-
sustentável através de seu próprio trabalho e testemunhar de Cristo
através de palavras e atos; (2) os métodos de organização da igreja
devem ser desenvolvidos somente até o ponto a partir do qual os
cristãos nativos possam assumir a responsabilidade; (3) a Igreja
deve escolher para o trabalho de tempo integral aqueles que forem
mais bem-qualificados e capazes de se sustentar e (4) as igrejas
devem ser construídas no estilo nativo e pelos cristãos com seus
próprios recursos.
Essa abordagem triplamente autônoma (auto-governante,
auto-sustentável e auto-propagadora) foi reiterada pelo
missionário anglicano na China, Roland Allen (1868-1947). Essas
estratégia mostrou-se decisiva no crescimento da Igreja e foi a
base de uma enorme expansão eclesiástica em países do mundo
não-ocidental que ocorreu no século 20.
2
Plural de boer, fazendeiro, na língua africâner dos descendentes dos holandeses na África do Sul.
autoridades britânicas a dar direitos civis a todas as pessoas de cor.
Transformou as estações de sua sociedade em “cidades de refúgio”
para negros, onde estariam à salvo da intimidação de residentes
brancos por causa de discussões de contrato trabalhista. Philip
também tentou arranjar para que comerciantes brancos e
fazendeiros fossem tirados das áreas fronteiriças e obteve uma
legislação que abolia o trabalho forçado e afirmava a igualdade
legal de ambas as raças. Ele foi severamente condenado pelos
brancos da colônia por causa desses seus esforços.
Um história inspiradora é a do missionário batista inglês
William Knibb (1803-45). Ele foi para a Jamaica em 1825 e logo
deparou-se com a terrível situação dos escravos das plantações.
Ao ver que a evangelização e a libertação eram inseparáveis, suas
pregações contra o sistema vigente de plantações foi ficando cada
vez mais militante. Seu costume de tratar os negros como seres
humanos também desagradava os fazendeiros. Quando uma
insurreição escrava eclodiu em 1831-32, Knibb foi acusado de ser
seu instigador e um bando violento de brancos pôs fogo em sua
capela. Tendo em vista que sua vida estava então em perigo, ele
foi para casa e dedicou-se completamente à campanha pela
abolição da escravatura no Império Britânico. Publicou
documentos e deu palestras sobre as condições na ilha e
testemunhou perante uma comissão parlamentar sobre a servidão
nas colônias do Caribe. Ele voltou para a Jamaica depois de
aprovada a lei de abolição da escravatura e pôs-se imediatamente a
lutar contra o “sistema de aprendizes”, um meio termo entre a
escravidão e a liberdade. Para Knibb, a questão fundamental era a
justiça para seus “irmãos e irmãs”, como ele chamava os
jamaicanos.
As mulheres e as missões
A área da Igreja mais aberta para as mulheres era a de
missões estrangeiras. Nelas, as mulheres podiam pregar,
evangelizar, implantar igrejas, educar líderes nacionais e realizar
trabalho humanitário. Apesar de não serem ordenadas, elas
trabalhavam com autonomia, longe dos críticos em seus países de
origem. Além disso, como a maioria delas dedicava-se a
“trabalhos femininos” no campo missionário ou só pregava para
ouvintes masculinos “nativos”, as igrejas que eram dirigidas por
homens simplesmente faziam vistas grossas. As missões não
apenas constituíam uma profissão importante para milhares de
mulheres, como também milhões de outras acabavam se
envolvendo com as iniciativas de uma forma ou outra uma vez que
quase toda a denominação tinha uma sociedade missionária
feminina ou um grupo de apoio constituído por mulheres. A
historiadora Patrícia Hill comenta que as iniciativas missionárias
eram “substancialmente maiores do que qualquer outro movimento
feminino de grande escala durante o século 19” e de proporções
ainda maiores do que tanto o conhecido Movimento Voluntário
Estudantil como o Movimento de Leigos Missionários.4
As esposas dos missionários eram um elemento nesse
fenômeno. Apesar de algumas serem ignoradas por seus maridos
(Mary Moffat Livingstone foi um bom exemplo disso), muitas
delas eram tão competentes em seus ministérios quanto seus
maridos. Era o caso de Ann Hasseltine Judson, primeira esposa de
Adoniram que ficou famosa por seus escritos inspirativos e a
assistência ao marido quando ele encontrava-se numa prisão na
Birmânia. A primeira esposa de J. Hudson Taylor, Maria, o ajudou
a fundar a Missão do Interior da China e sua segunda esposa,
Jennie, foi uma parceira em pé de igualdade no ministério.
O número de obreiras cresceu assustadoramente. A maioria
das sociedades também considerava as esposas como missionárias
e várias mulheres solteiras foram para os campos a serviço de
juntas denominacionais ou através de uma das muitas agências
para mulheres como a Sociedade Feminina de Educação (Grã-
Bretanha), a Sociedade Missionária Zenana da Igreja da Inglaterra,
Sociedade Missionária da União de Mulheres (Estados Unidos) ou
a Ordem das Diaconisas na Alemanha. O fato é que na década de
1890 havia tantas mulheres voluntariando-se para o trabalho que
os homens começaram a vê-las como uma ameaça.
Muitas vezes ignoradas pelos historiadores, algumas dessas
mulheres foram indivíduos extraordinários. Uma delas foi
Charlotte (“Lottie”) Diggs Moon (1840-1912), um professora da
Virgínia, membro da Igreja Batista do Sul que foi para a China em
1873 e começou um ministério excepcional de ensino e pregação.
Cheia de energia, dizia-se que fazia o trabalho de três
missionários. Ela fundou uma estação remota de evangelização no
norte da China, onde outros já haviam feito tentativas e
fracassado. Lottie Moon também mantinha uma correspondência
persistente com a sede da missão, pedindo sempre mais
missionários e apoio financeiro. Em 1888 isso resultou no
lançamento de uma oferta anual de Natal para as missões
estrangeiras levantada nas igrejas batistas do Sul (oferta que
depois da morte de Lottie, recebeu o seu nome) que, ao longo do
tempo, já arrecadou mais de um bilhão de dólares.
Uma personalidade marcante na área das missões médicas foi
a Dra. Ida Sophia Scudder (1870-1960). Nascida na Índia, numa
família tradicional de missionários americanos, ela havia, a
princípio, decidido seguir os passos de seu pai e seu avô. Uma
experiência crítica em 1893 a fez mudar de idéia e ela estudou
Medicina, voltando para a Índia como médica. Abriu um hospital
para mulheres em Velore em 1900 e mais tarde anexou a ele uma
escola de enfermagem e em 1918 uma Faculdade de Medicina
para mulheres. Através de sua grande habilidade para levantar
fundos, ela construiu um complexo de treinamento médico que
envolveu a cooperação de cinqüenta missões de dez países. O
lugar ficou conhecido como o melhor centro médico na Índia.
Outra figura excepcional que trabalhou na Índia foi Amy
Carmichael (1867-1951). Nascida na Irlanda do Norte, ela foi
profundamente influenciada pelo Movimento Keswick (ver
capítulo 21). Depois de um breve período no Japão ela foi para o
sul da Índia em 1895 e nunca mais voltou para casa. Trabalhou em
Dohnavur com a Sociedade Missionária Zenana da Igreja da
Inglaterra que tentava alcançar as mulheres da casta mais elevada
que viviam isoladas da sociedade em geral. (Zenana era a parte de
uma casa grande onde viviam as meninas e mulheres.) Um
momento decisivo de sua vida foi em 1901 quando ela abrigou em
sua casa uma menina que havia fugido pois estava destinada a ser
uma prostituta do templo. Logo outras crianças abandonadas e
fugitivas do templo passaram a procurá-la e ela começou um
programa ativo para resgatar jovens vítimas de abusos. Ela
chamou seu empreendimento de Irmandade Dohnavur e em 1912
já havia cento e trinta crianças sob seus cuidados. A organização
funcionava como uma sociedade comunitária em que todos os
obreiros vestiam roupas indianas, cuidavam das crianças,
ensinavam-nas e lutavam para desenvolver nelas um caráter
cristão. Ela formou então uma ordem religiosa para mulheres
solteiras chamada Irmãs da Vida Comum. Apesar de inválida
desde 1931, ela ficou famosa por seus livros devocionais que eram
marcados por uma espiritualidade intensa.
A mulher mais admirável de todas foi Mary Slessor (1848-
1915). De uma família operária pobre da Escócia, ela foi criada
nas favelas de Dundee. Apesar de ter recebido sua educação
limitada e trabalhado numa indústria têxtil para ajudar a sustentar
sua mãe e outros membros da família, a morte de David
Livingstone inspirou-a para oferecer seus serviços como
voluntária na missão presbiteriana em Calabar, oeste da África
(atual Nigéria). Ela chegou lá em 1876, lecionou numa escola e
aprendeu a língua rapidamente. Em 1880 assumiu a liderança da
missão na Cidade Velha, onde morava numa cabana de barro,
comia os alimentos locais, supervisionava escolas, distribuía
medicamentos, resolvia disputas, lutava contra a bruxaria e
bebedeira e cuidava de órfãos, sendo que muitos desses eram
gêmeos que haviam sido abandonados. Slessor começou, então,
um trabalho pioneiro em meio à tribo dos Okoyong e era tão
competente trabalhando com pessoas em questões judiciais que as
autoridades inglesas a nomearam vice-consulesa em 1891, a
primeira mulher do império a receber esse título. Uma década
depois ela foi ainda mais para o interior para trabalhar entre os
Ibos. Sua identificação com os africanos era tanta que, no final de
sua vida, ela ficou conhecida como “Mãe de Todos os Povos”.
Os avanços católico-romanos
Em suas terras não-européias — na América Latina — a
Igreja Católica passou por tempos difíceis. Com o fim do
patrocínio espanhol, os regimes liberais revolucionários depois de
1815 exerceram suas próprias formas de controle sobre a Igreja e o
Catolicismo perdeu grande parte de seu poder e influência legal.
Aqueles governos que estavam lutando contra a Igreja muitas
vezes encontravam aliados entre os protestantes e isso levou a
pequenos avanços destes últimos, especialmente mais para o final
do século. Apesar de, durante algum tempo, as relações com o
papado terem sido razoavelmente boas, a religião a nível popular
estava em rápido declínio e depois de 1850 os liberais passaram a
exigir cada vez mais (e em muitos países conseguiram) a
separação entre Igreja e Estado. O rompimento mais radical
aconteceu no México, onde até mesmo as terras da Igreja foram
confiscadas e as ordens religiosas fechadas.
No final do século, um renascimento missionário teve início
na América Latina. Várias ordens religiosas trabalharam no meio
do povo a fim de ganhá-lo (ou recuperá-lo) para o Catolicismo e
os bispos começaram a desenvolver estratégias para preservar a fé
levando em consideração os movimentos anti-cristãos e a
crescente competição protestante, incluindo metodistas, batistas do
sul e missões interdenominacionais que eram especialmente ativas.
Em outras partes do mundo, muitas ordens católicas mais
antigas deram continuidade ao trabalho missionário, mas suas
iniciativas não foram tão espetaculares como aquelas dos
protestantes. Além disso, quase cem novas ordens e comunidades
religiosas foram fundadas e dedicaram-se a algum tipo de missão.
Elas não tinham tanta liberdade de ação como as sociedades
protestantes, uma vez que a Propaganda em Roma exercia uma
certa supervisão. Mas as missões a seguir podem servir de
exemplo.
Em 1868 uma ordem francesa chamada Padres Brancos foi
fundada pelo Cardeal Charles M. Lavigerie (1825-92), arcebispo
de Algiers e líder da Igreja Católica no norte da África. Eles eram
sacerdotes seculares que usavam uma roupa branca distintiva e
que faziam votos de servir as missões da África para o resto da
vida. A princípio trabalharam entre os muçulmanos, mas depois,
em 1877, foram enviados a Uganda, onde criou-se uma rivalidade
feroz entre eles, obreiros da CMS e muçulmanos que buscavam o
controle do reino de Buganda. A luta contra o comércio de
escravos também era uma grande preocupação para ordem que
tinha estações por toda a África central e oriental.
A Sociedade da Divina Palavra foi formada em 1875, por
católicos alemães, em grande parte como reação às crescentes
iniciativas protestantes. Seu primeiro campo missionário foi em na
região Shantung, na China e o governo alemão usou o assassinato
de dois sacerdotes da sociedades por terroristas chineses em 1897
como pretexto para tomar uma cidade portuária na região e
transformá-la em base militar. O grupo também fundou trabalhos
na América Latina, África e no Sul do Pacífico. Uma outra
sociedade importante foi uma congregação americana de
sacerdotes diocesanos conhecidos como os Missionários de
Maryknoll. Formada em 1911, seus principais campos
localizavam-se no leste da Ásia, porém mais tarde abriram missões
na América Latina e na África.
As missões e o Ecumenismo
O movimento ecumênico do século 20 originou-se nos
avanços missionários e foi um cumprimento destes. Nos campos
estrangeiros cristãos de muitas denominações e países dedicavam-
se ao esforço comum de pregar o evangelho e nos meios não-
cristãos eles descobriram que as diferenças entre eles não eram
assim tão importantes quando comparadas à tarefa que tinham
diante de si. Os recursos limitados e a magnitude da necessidade
espiritual forçaram as agências missionárias a aprender como
cooperar umas com as outras e as lições que aprenderam lá foram
levadas de volta para as sedes na Europa e América do Norte.
Um elemento da nova visão ecumênica era o estudo da
missiologia. Alexander Duff em Calcutá, que era um forte
defensor do ensino como meio de propagar o evangelho,
promoveu o estudo científico de missões. Em 1867 ele foi
nomeado para a primeira cátedra universitária de missões no Free
Church of Scotland‟s New College em Edinburgo. Outro pioneiro
no estudo das missões foi Gustav Warneck (1834-1910), que
recebeu uma cátedra honorária de missões na Universidade de
Halle, editou o primeiro jornal acadêmico dedicado ao estudo de
missões e publicou importantes obras teóricas sobre a História,
Filosofia e Teologia das Missões. Julius Richter (1862-1940) foi
autor de trinta livros e duzentos artigos sobre missões e foi
nomeado para a nova cátedra de missiologia na Universidade de
Berlim em 1913. Esses três homens eram fortes defensores do
ecumenismo. The Muslim World [O Mundo Muçulmano], fundado
em 1911, ainda é o principal jornal sobre as relações entre
muçulmanos e cristãos. Uma revista mais popular que noticiava
sobre missões de um ponto de vista global era a Missionary
Review of the World [Resenha Missionária do Mundo], editada
pelo proeminente evangélico americano A. T. Pierson (1837-
1911).
Iniciativas conjuntas tiveram início nos campos missionários
sob a forma de reuniões regionais e conferências gerais. Também
foram importantes as conferências da Aliança Evangélica, uma
organização internacional formada em 1846 para prover a unidade
entre as igrejas e que enfatizava a autoridade plena das Escrituras,
a encarnação e expiação dos pecados em Cristo, a salvação pela fé
e a obra do Espírito Santo. Numa Convenção Missionária da
União em Nova York e numa reunião da Aliança Evangélica em
Londres, ambas em 1854, Duff realizou apresentações
empolgantes sobre missões. Várias conferências foram realizadas
na Alemanha e Grã-Bretanha durante as três décadas seguintes
culminando com grandes encontros Londres (1888) e Nova York
(1900) que pediam maior unidade. Além disso, formaram-se
organizações cooperativas entre os países que mais enviavam
missionários como o Comitê Permanente de Missões Protestantes
Alemãs (1885), a Conferência das Missões Estrangeiras da
América do Norte (1911) e a Conferência das Sociedades
Missionárias da Grã-Bretanha e Irlanda (1913).
Os movimentos estudantis foram um fator ainda mais crucial.
A Associação Cristã de Moços, fundada na Inglaterra em 1844 por
George Williams (1821-1905), um homem de negócios e
evangelista leigo, chegou aos Estados Unidos em 1851. Logo a
ACM começou trabalhos nas universidades (em 1884 havia 181),
enfatizando o estudo da Bíblia, adoração e evangelismo pessoal.
Outros grupos estudantis atuavam em seminários e universidades
britânicas, inclusive um em Cambridge onde, em 1882, sete
importantes atletas assumiram o compromisso de tornar-se
missionários. Os “Sete de Cambridge” tiveram um poderoso
impacto sobre o recrutamento missionário. Numa reunião de
estudantes na casa de D. L. Moody em Mount Hermon,
Massachusetts, em 1886, aconteceu um reavivamento e cem
jovens assumiram o compromisso de tornar-se missionários.
Um deles foi um jovem estudante da Universidade de
Cornell, John R. Mott (1865-1955), que entrou para o trabalho
universitário da ACM. Em 1888 ele fundou o SVM - Student
Voluntary Movement [Movimento Voluntário Estudantil para
Missões Estrangeiras], cujo lema era “A Evangelização do Mundo
Nesta Geração”. Mott continuou sendo obreiro cristão leigo
durante toda sua vida e, como seu mentor Moody, nunca recebeu
educação teológica formal e nem foi ordenado. Era um escritor e
orador talentoso, um organizador cheio de energia e criatividade e
um viajante contínuo que deu a volta ao mundo promovendo o
trabalho entre estudantes e a cooperação cristã. Além de liderar o
SVM, a ACM de estudantes e a Federação Mundial de Estudantes
Cristãos, que ele formou em 1895, foi o principal motivador por
trás da Conferência Missionária Mundial, em Edinburgo no ano de
1910.
Esse foi o primeiro encontro verdadeiramente ecumênico.
Foi organizado por um comitê internacional e 1.200 delegados
representaram 159 sociedades e juntas missionárias. Dezessete
eram líderes asiáticos. O principal assunto das discussões plenárias
e das reuniões das comissões era o trabalho missionário. Um
Comitê de Continuidade foi nomeado para dar seqüência aos
tópicos investigados e preparar o caminho para um concílio
missionário internacional permanente. Mott era o presidente dessa
organização juntamente com Eugene Stock da CMS e Julius
Richter de Berlim o vice. O secretário era J. H. Oldham (1874-
1969), um rapaz dinâmico que se tornaria um dos líderes do
movimento ecumênico. Também foi o editor de International
Review of Mission [Resenha Internacional de Missões], fundada
em 1912 e que era o órgão do novo ecumenismo. Porém, as
esperanças de unidade protestante baseada na cooperação
missionária foram cruelmente destruídas pelo começo da guerra
em 1914.
Conservadorismo católico-romano
Com a ascensão de Pio IX (1792-1878) ao trono papal em
1846, parecia, a princípio, que haveria uma certa liberalização,
mas a Revolução de 1848 o deixou apreensivo e o fez voltar à
costumeira posição reacionária do papado (ver capítulo 18). Ele
havia fugido de Roma quando os radicais tinham formado uma
república lá e havia retornado em 1850 sob a proteção das forças
armadas francesas. O objetivo de Pio era fortalecer sua autoridade
espiritual de todas as formas possíveis, o que começou a fazer em
1854 ao proclamar o dogma da concepção imaculada da Virgem
Maria. Então, em 1864 lançou uma encíclica (carta papal aos
bispos) fazendo uma lista de oitenta proposições ou “erros” que
deveriam ser rejeitados pelos católicos. A maioria desses pontos já
havia sido condenada antes, mas colocá-los todo em num pacote
foi visto como uma rejeição formal ao mundo moderno. Na Lista
dos Erros estavam incluídos o panteísmo, naturalismo,
Racionalismo, indiferentismo, Socialismo, Comunismo,
maçonaria, sociedades bíblicas, ensino público, liberdade de
discurso, qualquer limitação ao poder civil do papa e muitos
outros pontos. A seção mais ofensiva era a de número 80, que
condenava a afirmação de que “o pontífice romano deve adequar-
se e alinhar-se com o progresso, o Liberalismo e a civilização
moderna”. Essa encíclica enfureceu os protestantes e católicos
liberais, mas não havia nada que pudessem fazer.
Em 1869-70, Pio IX convocou um concílio (Vaticano I) para
tratar de várias questões da Igreja e usou a ocasião para afirmar
ainda mais a primazia papal. Os ultramontanos, defensores
radicais do papa, eram em número muito maior do que os liberais
no concílio e garantiram a aprovação de um decreto que afirmava
a infalibilidade do papa. Declarava que o papa era infalível “em
seu falar ex cathedra”, isto é, no papel de pastor e mestre e “pela
virtude de sua autoridade apostólica suprema define a doutrina
acerca da fé ou moral que deve ser aceita pela Igreja Universal”.
Superficialmente, essa era uma afirmação chocante, mas na
realidade era bastante limitada e a prerrogativa foi usada em raras
ocasiões. Porém, o papado havia ganho uma posição de poder
dentro do Cristianismo romano como não havia tido nem no
século 13 e a maioria dos cristãos católicos pareciam dispostos a
conceder essa autoridade à Santa Sé. Na era da democracia, Roma
havia construído para si uma fortaleza contra a modernidade. A
aceitação incondicional da jurisdição papal havia prevalecido
sobre as tendências nacionais e liberais.
A declaração foi aceita por todos, com exceção de um
punhado de dissidentes na Alemanha e Áustria. Um distinto
historiador da Igreja, Johann von Dölinger de Munique, liderou a
oposição ao decreto e foi excomungado, mas não juntou-se ao
grupo que se separou em 1871. Esse grupo afirmava que os
decretos do Vaticano e outros pronunciamentos recentes haviam
criado uma nova Igreja, mas eles desejavam perpetuar o
“verdadeiro” Catolicismo. Eles se autodenominavam os “Antigos
Católicos”, adotando uma forma episcopal de governo e
reconhecendo como corretas a maioria das doutrinas declaradas
antes de 1054. Os Antigos Católicos, que nunca passaram de uma
minoria, em 1932 acabaram entrando em comunhão com a Igreja
da Inglaterra e, com efeito, tornaram-se os Episcopais Alemães.
Enquanto o Concílio do Vaticano estava em andamento,
eclodiu a guerra entre França e Prússia e a guarnição francesa foi
retirada de Roma. Esse era o momento tão aguardado pelo jovem
estado italiano. Mais que depressa, suas forças entraram no
Vaticano e anexaram a cidade, finalizando assim o poder temporal
do papado. A longo prazo, essa ação foi um benefício enorme para
a Igreja. Uma vez que o papa não era mais um príncipe secular,
aumentou seu poder espiritual sobre os católicos de todo o mundo.
Porém, Pio IX ficou indignado que os italianos haviam
tomado suas terras e retirou-se para o Palácio do Vaticano. De lá,
assumiu o papel de “prisioneiro do Vaticano” e a “questão
romana” encheu de amargura as relações entre o papado e a Itália
pelos próximos cinqüenta anos. O Estado fez uma oferta generosa
na Lei das Garantias (1871) que, apesar de privar o papa de seu
poder soberano, ainda concedia-lhe todas as honras e direitos de
um soberano e o tornava isento da lei italiana. Recebeu permissão
de ficar com o Vaticano e duas outras propriedades, a Santa Sé
continuaria a ter corporações diplomáticas e suas tradicionais
unidades policiais, os eclesiásticos podiam ir e vir quando bem
entendessem e tratar dos assuntos da Igreja sem impedimentos.
Além disso o Estado deu-lhe um fundo anual equivalente ao que
teria recebido através de suas antigas propriedades.
Pio e seus sucessores rejeitaram essa proposta pois ela não
reconhecia o direito do papa de ser um príncipe territorial
independente. Foi impossível entrar num acordo, tendo em vista
que os italianos não estavam dispostos a devolver qualquer parte
dos Estados Papais. A situação foi agravada quando os
monarquistas de direita da França apoiaram a posição do papa,
gesto que a Itália tomou como uma interferência em suas questões.
Quando Leão XIII ordenou em 1898 que os católicos se
abstivessem da vida política enquanto ele estivesse naquela
“posição intolerável”, o gesto só fez surgir ainda mais
anticlericalismo. Essa questão só foi resolvida depois da Primeira
Guerra Mundial.
Na Alemanha, um severo conflito entre Igreja e Estado
ocorreu durante a década de 1870. Conhecido como Kulturkampf
[luta cultural], foi equivocadamente retratado por alguns liberais
como um conflito entra a civilização moderna e a religião antiga e
obsoleta. Na verdade, as bases do conflito eram políticas. Por
várias razões, o chanceler alemão Bismarck temia que na
Alemanha, que era dominada por protestantes, a minoria católica
fosse uma ameaça à sua segurança. Eles possuíam um partido
político forte, o Centro, que era hostil ao seu regime. A declaração
de infalibilidade papal parecia ser uma afirmação de superioridade
em relação ao Estado. As intensas exigências de alguns católicos
por uma intervenção que restaurasse o poder temporal do papa
perturbaram a relação amigável com a Itália. Havia, ainda, o
perigo dos católicos alemães unirem-se aos seus companheiros na
França e Áustria e entrarem numa guerra que desintegraria a
unificação alemã.
O programa de repressão de Bismarck incluiu a expulsão dos
jesuítas (instrumento tradicional de autoridade papal), a abolição
do departamento católico no Ministério de Culto Público, a
instituição do casamento civil e a transferência da educação sob o
controle completo do Estado. Além disso, nomeou um liberal —
Adalbert Falk — como Ministro do Culto Público na Prússia e
ordenou que ele defendesse os direitos do Estado contra a Igreja.
Falk foi responsável pela adoção das famosas “Leis de Maio”
(1873) que declaravam a supremacia absoluta do Estado.
Limitavam ainda o poder dos bispos em questões disciplinares,
criavam uma suprema corte eclesiástica escolhida pelo imperador,
colocavam o treinamento dos sacerdotes sob rígida supervisão
estatal e davam ao regime o poder de veto sobre as nomeações
clericais. Quando Pio IX condenou as medidas, Bismarck rompeu
relações diplomáticas com o Vaticano, cortou todo o apoio
financeiro à Igreja alemã e obrigou ordens religiosas a deixarem o
país.
A resistência católica às ações do Estado foi obstinada e
muitos bispos e sacerdotes foram presos ou expulsos de seus
cargos. No parlamento o Partido de Centro criticou
veementemente essas decisões. Até alguns protestantes
simpatizaram com a resistência uma vez que consideravam que as
medidas tinham ido longe demais e temiam ser as próximas
vítimas da ação arbitrária do Estado. Bismarck, que não esperava
que suas medidas fossem atrair uma reação tão hostil, viu-se
politicamente constrangido e começou a procurar uma saída.
Finalmente, com a ascensão do diplomático Leão XIII ao trono
papal, uma mudança no clima político da Europa (os republicanos
haviam vencido na França e a Áustria tinha se aliado com a
Alemanha) e com o início da campanha anti-socialista, a política
foi revertida e as leis discretamente retiradas dos livros oficiais. A
tentativa de Bismarck de intimidar a Igreja Católica e seu partido
político havia fracassado completamente. Desde então, o termo
Kulturkampf tornou-se parte do vocabulário político moderno e é
usado com freqüência para designar um conflito entre a Igreja e o
Estado.
Na França, a maioria dos principais católicos romanos
opunha-se à Terceira República que havia sido fundada em 1870 e
defendia a restauração da monarquia. O governo reagiu com leis
anti-clericais para manter a Igreja sob controle. Entre estas estava
o registro de associações religiosas, a eliminação da capelania do
exército, a legislação do divórcio e a educação primária
obrigatória que incluía uma proibição do ensino religioso nas
escolas públicas. Porém, em 1890 Leão XIII decidiu por uma
conciliação com o regime ao ordenar que os católicos franceses
deixassem seu apoio à restauração da monarquia.
A partir de então as relações entre Estado e Igreja
melhoraram, mas não tardaram a sofrer danos irreparáveis com a
questão Dreyfuss. Esta envolvia a corte marcial e condenação de
um oficial judeu do exército acusado de vender segredos para os
alemães. Quando foi mostrado em 1896 que as acusações eram
falsas, o país dividiu-se entre os defensores e os críticos do
exército. Os militares recusavam-se a admitir o erro ou tratar do
anti-semitismo que era o cerne da questão. Enquanto os
republicanos apoiavam o capitão Dreyfuss e exigiam justiça, os
monarquistas e o clero católico apoiavam a atitude inicial.
O capitão acabou sendo exonerado, mas nesse meio tempo,
os republicanos voltaram-se contra os monarquistas e seus aliados
clericais e em 1905 aprovaram uma lei que separava a Igreja do
Estado. Esta garantia a completa liberdade de consciência,
estipulava que o Estado não teria nenhuma relação com a
nomeação de clérigos ou com o pagamento de seus salários (o
mesmo se aplicava também aos protestantes e judeus) e
determinava a formação de corporações privadas que tomariam
posse das propriedades da Igreja.
A importância dessa ação dificilmente pode ser exagerada.
Ela não apenas cancelou o acordo napoleônico entre Estado e
Igreja (ver capítulo 17) como, mais importante ainda, significou o
fim do um relacionamento especial entre papas e governantes
franceses que havia começado em 756 quando Pepino o Breve
tinha autorizado Estevão II a assumir o controle de terras na Itália,
lançando assim as bases para o poder temporal do papado.
Chegava ao fim uma era que havia durado doze séculos. Além
disso, os acontecimentos da época ajudam a explicar o motivo da
França, apesar de sua forte herança católica, ser hoje um dos
países mais seculares da Europa.
O ressurgimento da ortodoxia
Com o rápido declínio do Império Otomano, a autoridade do
Patriarca Ecumênico de Constantinopla foi ficando cada vez
menor. No decorrer do século, as igrejas sérvias, gregas, romenas
e búlgaras tornaram-se todas autônomas. Enquanto isso, a Igreja
Ortodoxa da Rússia continuava intimimante ligada ao Estado (ver
capítulo 13) e durante o reinado do czar Nicolau I (1825-52), foi
desenvolvida a doutrina da “nacionalidade oficial”. Proclamada
pelo seu ministro da educação em 1833, ela continha três
princípios — ortodoxia, autocracia e nacionalidade. A autocracia
significava a manutenção do poder absoluto do soberano, o que
era um fundamento indispensável ao Estado. A ortodoxia indicava
que o papel oficial da Igreja era de ser a fonte maior da ética e dos
ideais que davam significado à vida e à sociedade na Rússia. A
nacionalidade referia-se à natureza singular do povo russo, o que
fazia deles um poderoso e dedicado defensor da dinastia e do
governo. Para possibilitar que a Igreja realizasse um trabalho mais
eficaz em inculcar o povo com a lealdade ao czar foram fundados
mais seminários e o Estado pagava o salário do clero.
Para Nicolau I, a ortodoxia também estava relacionada à
política externa. Ele afirmou o direito de “proteger” a ortodoxia
cristã presente no império otomano, o que levou a uma crise
diplomática no início da década de 1850. Uma disputa eclodiu
entre monges ortodoxos e católicos romanos sobre a custódia dos
lugares santos na Palestina e o ambicioso Napoleão III afirmou
que a França era a protetora dos católicos lá. Nicolau enviou um
ultimato ao sultão turco insistindo para que ele resolvesse a
controvérsia da Terra Santa em favor dos ortodoxos e
reconhecesse o protetorado russo sobre as igrejas ortodoxas no
império. A França e a Grã-Bretanha urgiram o sultão a resistir às
exigências, o que ajudou a desencadear a Guerra da Criméia em
1854.
Nas décadas de 1830 e 1840 surgiu um grupo de intelectuais
românticos conhecidos como Eslavófilos. Eles tiveram um
importante impacto sobre o pensamento religioso russo.
Rejeitaram o Ocidente e enfatizaram a natureza superior e missão
histórica da Rússia e de sua Igreja ortodoxa. Argumentaram que os
eslavos eram divinamente chamados para preservar a fé cristã em
sua pureza e que sua Igreja e Estado eram guardiões do verdadeiro
Cristianismo e da sociedade ideal. De acordo com os Eslavófilos,
o caráter do camponês eslavo, especialmente do russo, era
marcado pelo amor, liberdade e cooperação, enquanto o Ocidente
era decadente. No Ocidente, o Cristianismo havia sido corrompido
pelo Racionalismo, pela tirania papal e pelo individualismo
protestante. Alguns diziam que a Rússia deveria libertar todos os
eslavos do governo estrangeiro e trazer todos os cristãos para
debaixo das asas da ortodoxia. Era uma reafirmação da Santa
Rússia como Terceira Roma.
Os principais filósofos religiosos eslavófilos foram os leigos
Alexis S. Khomiakov (1804-60) e Vladimir S. Soloviev (1853-
1900). Khomiakov argumentava que a Igreja Ortodoxa era um
todo orgânico, tendo Cristo como o cabeça e o Espírito Santo
como alma e sua essência era a unidade e a liberdade. A
autoridade religiosa estava sobre toda a Igreja e não na Bíblia ou
no papado. Soloviev apresentou um conceito de “bondade
humana” sendo que com isso ele se referia à união da humanidade
com a divindade através da identificação do homem com Cristo, a
Palavra encarnada. Defendeu a reunião das igrejas do Oriente e
Ocidente e o estabelecimento de uma teocracia universal.1
Uma importante figura russa do final do século 19 foi
Constantino Pobiedonostev, um advogado que trabalhou como
procurador do Santo Sínodo de 1880 a 1905 e foi o arquiteto da
política reacionária czarista. Enfatizava a fraqueza e maldade da
humanidade e a falibilidade da Razão humana, detestava a
Revolução Industrial e o crescimento das cidades e via o propósito
do Estado como sendo de manter a lei, ordem, estabilidade e
unidade. Na Rússia, a melhor forma de alcançar esse propósito era
através da autocracia e da Igreja Ortodoxa. Constantino não
confiava no Ocidente e queria evitar ao máximo que a Rússia
fosse contaminada pelas idéias que vinham de lá. Opunha-se aos
parlamentos, julgamentos diante de um júri, jornais e escolas
seculares e censurava rigidamente a imprensa. A fim de assimilar
os vários povos do império para dentro da cultura russa
(russificação), ele incentivava as missões ortodoxas entre esses
povos.
Um dos principais alvos de Pobiedonostev foi a grande
população de judeus no oeste da Rússia e Polônia. Declarou que
um terço deles se converteria à ortodoxia, um terço emigraria e um
terço seria exterminado. Muitos pogroms (palavra russa para a
violência organizada contra os judeus) ocorreram durante esses
anos, levando a uma migração em massa de judeus russos para a
Europa ocidental e América. Seu anti-semitismo era um assustador
prenúncio do que aconteceria na Alemanha nazista. Em resumo,
ele colocou a ortodoxia firmemente do lado da reação e contribuiu
para desacreditá-la aos olhos do povo mais questionador.2
A Igreja Ortodoxa não tinha mais consideração pelos grupos
evangélicos do que pelos Molocanos e Doucobores (O fato é que
estes últimos emigraram em massa para o Canadá em 1898 para
escapar da perseguição). Os primeiros protestantes na Rússia eram
imigrantes, mas a fé evangélica acabou criando raízes entre os
russos nativos. Catarina a Grande havia convidado colonos
menonitas e huteritas da Alemanha para assentarem-se na Ucrânia,
enquanto outros alemães de origem pietista foram para o sul da
Rússia no começo do século 19. Alguns deles dedicaram-se à
evangelização, mas sob o governo de Nicolau I tais atividades
foram dificultadas. Até mesmo a Sociedade Bíblica Russa foi
fechada, mas a distribuição clandestina das Escrituras continuou.
Na década de 1840, batistas da Alemanha começaram a trabalhar
na área do Báltico e, depois da morte de Nicolau, espalharam-se
pela Rússia.
O grupo dos Estudistas — cujo nome veio de sua prática de
estudar a Bíblia em determinados horários — estava intimamente
relacionado aos batistas. O movimento surgiu na década de 1860.
A princípio, operavam dentro da Igreja Ortodoxa, mas acabaram
sendo forçados a sair. F. W. Baedeker (1823-1906), um
evangelista alemão de uma alta posição social e laços estreitos
com círculos dos Irmãos na Inglaterra, começou a trabalhar na
Rússia em 1875 e teve um certo sucesso em alcançar pessoas da
classe alta. Um desses convertidos, um coronel do exército,
organizou a primeira reunião da União Batista Russa em sua casa
em 1884. Por causa de suas ligações, Baedeker podia fazer
viagens missionárias freqüentes e até mesmo visitar presídios onde
distribuía bíblias. Mais tarde, batistas e estudistas se juntaram,
formando o núcleo dos “Cristãos Batistas Evangélicos” na Rússia.
Avanços evangélicos
Enquanto as igrejas oficiais da Europa protestante estavam
perdendo impulso no final do século 19, as denominações
americanas — que eram unidades bem organizadas e socialmente
homogêneas — alcançaram uma porção muito maior da
população. Na América, não só o denominacionalismo se
desenvolveu, mas também a inovação religiosa. O Adventismo,
com sua ênfase na vinda apocalíptica do reino de Deus,
desenvolveu-se na década de 1840 e foi institucionalizado
formando a Igreja Adventista do Sétimo Dia, que cresceu e
transformou-se numa denominação mundial através de sua ênfase
na dedicação leiga à área da saúde. Um adventismo bem mais
radical era pregado pelas Testemunhas de Jeová, movimento
fundado por Charles T. Russel na década de 1870. Mas aquela que
viria a ser a maior de todas as novas fés era a Igreja de Jesus
Cristo dos Santos dos Últimos dias (os mórmons). Ela surgiu na
década de 1830 e depois do assassinato de seu fundador, Joseph
Smith em 1844, dividiu-se em duas igrejas separadas. A ala maior
com sede em Utah tornou-se uma denominação internacional,
graças à integridade de sua iniciativa missionária. Um outro grupo,
pequeno mas de alto nível, constituiu a Ciência Cristã, fundada na
década de 1870. O historiador Sydney E. Ahlstrom comenta
apropriadamente que esses quatro grupos, mais o Pentecostalismo,
são os cinco movimentos que podem ser chamados de “norte-
americanos”.3
Porém, mais importante do que qualquer uma dessas
inovações, foi a formação americana do protestantismo
evangélico. Isso o preparou para sobreviver aos ataques
ideológicos e a funcionar como uma verdadeira fé global no final
do século 20. Um produto do meio americano foi a evangelização
em massa. Essa abordagem popularizou-se nas primeiras décadas
do século com o trabalho de Charles Finney e tornou-se um dos
pilares do Protestantismo nos Estados Unidos depois da Guerra
Civil.
Suas figura de destaque foi Dwight. L. Moody (1837-99).
Convertido quando adolescente em seu estado de origem, o
Massachusetts, ele foi para Chicago em 1856 a fim de trabalhar
como vendedor de sapatos. Ao mesmo tempo, tornou-se
profundamente envolvido com as atividades da ACM, pregou,
começou escolas dominicais e distribuiu literatura cristã. Depois
de cinco anos, havia se tornado um homem de negócios bem-
sucedido, mas deixou a carreira para dedicar-se ao ministério em
tempo integral. Apesar de ser apenas um leigo sem treinamento
teológico, sua fama de pregador cresceu rapidamente. Então,
encontrou o dirigente da área de música Ira Sankey (1840-1908) e
entre 1873 e 1875 foram juntos para uma longa missão de
pregação na Grã-Bretanha. O sucesso das reuniões foi tanto que
Moody recebeu convites de todos os Estados Unidos. Durante os
anos seguintes, ele e Ira realizaram cultos evangelísticos em quase
todas as grandes cidades do país e voltaram mais duas vezes à
Grã-Bretanha.
A organização foi um elemento crítico para o sucesso de
Moody. Ele se recusava a visitar uma cidade até que todos os
pastores das igrejas evangélicas o convidassem. Criava-se então
um comitê local para cuidar da preparação como a reserva de um
espaço para o evento, a divulgação e a arrecadação de fundos.
Organizava-se um coral de voluntários e este ensaiava músicas do
hinário de Sankey. Escolhiam-se pessoas para fazer a recepção do
povo e pastores e leigos para conversar com aqueles que fossem à
frente durante o apelo a fim de receber a Cristo. Durante a
campanha, Moody também realizava cursos práticos para obreiros
cristãos, sendo que estes teriam um papel importante no
“acompanhamento” dos recém-convertidos.
Seus modos como pregador eram um modelo de decoro.
Vestia-se como um homem de negócios comum, as reuniões eram
cuidadosamente planejadas e seguiam uma agenda e ele falava de
modo calmo e claro. Suas mensagens eram simples e diretas e ele
concentrava-se em Deus, no pecado e na necessidade de um
Salvador. Moody não falava sobre teologia, não tratava de
questões doutrinárias e nem promovia a ação social, mas
simplesmente chamava homens e mulheres para Cristo. Ele se via,
antes de mais nada, como alguém que ganhava almas e seus
sermões poderosos eram preparados para atingir esse objetivo.
Quanto aos convertidos, seu conselho era que se tornassem
membros de uma igreja local imediatamente e começassem a
trabalhar para Deus.
A agenda de Moody era tão exaustiva, cheia de viagens,
reuniões de oração, palestras, cursos com obreiros e entrevistas
que, quando ele estava com 62 anos de idade, seu coração não
resistiu. Mas seu legado continuou em sua escola de treinamento
para leigos em Chicago (o atual Moody Bible Institute), escolas
secundárias no Massachusetts e pessoas tocadas por seu ministério
como John R. Mott. Todos os outros grandes pregadores entre
1870 e 1920 (os “anos dourados” do evangelismo itinerante das
massas) — Samuel O. “Sam” Jones, J. Wilbur Chapman, R. A.
Torrey, Rodney “Cigano” Smith, William A. “Billy” Sunday e
inúmeras outras figuras menos conhecidas dos Estados Unidos,
Grã-Bretanha e Alemanha — seguiram a trilha metodológica
desbravada por Finney e transformada em uma auto-estrada
espiritual por Moody.
Uma outra contribuição americana foi a ênfase na
“santidade”. Teve suas origens nos ensinamentos de John Wesley
sobre o perfeccionismo e em textos sobre santificação de autores
anteriores à Guerra Civil como Charles Finney, Asa Mahan e
Phoebe Palmer. A santidade surgiu com força total nos
“acampamentos” que começaram no final da década de 1860 e
vários grupos e publicações a promoveram nos meios metodistas.
Porém, seus defensores dentro da linha geral das igrejas
metodistas (tanto do norte como do sul) sentiram-se cada vez mais
alienados pela indiferença às suas preocupações e, finalmente, se
separaram e formaram suas próprias denominações de santidade.
Dentre estas, as maiores foram a Igreja de Deus, fundada por
Daniel S. Warner em 1881 e a Igreja do Nazareno, iniciada por
Phineas F. Breeze em 1895.
A marca registrada do ensinamento americano de santidade
era a “santificação completa”, um estágio do desenvolvimento
espiritual que ia além da conversão. Essa “segunda bênção” do
Espírito Santo conferia à pessoa a capacidade de resistir às
tentações de cometer pecado e de viver uma existência totalmente
dedicada a Deus.
A idéia da santidade foi levada para a Grã-Bretanha por
William E. Boardman (1810-86), autor do livro The Higher
Christian Life [A Vida Cristã Mais Elevada], R. Pearsall Smith
(1827-99) e sua esposa Hannah Whithall Smith (1832-1911). Ela
escreveu o conhecido livro The Christian’s Secret of a Happy Life
[O Segredo do Cristão para uma Vida Feliz]. O casal propagou as
doutrinas da santidade na Inglaterra enquanto ele lá esteve a
negócios e durante a campanha de Moody, em 1873, juntaram-se
com Boardman a fim de transmitir a mensagem aos ministros
britânicos. Seguiu-se então uma série de conferências em Oxford
em 1874 só sobre a santidade e um convite de um ministro
anglicano em 1875 para realizar reuniões ao ar livre em sua cidade
de Lake Country, Keswik. Estas tornaram-se um evento anual e
outras convenções começaram a acontecer ao redor do mundo. O
nome “Keswik” ficou ligado ao ensinamento, mas na Europa ele
também é conhecido como “Movimento de Oxford”.
Na busca pela santidade pessoal os defensores de Keswik
rejeitavam o aspecto perfeccionista da santificação e, ao invés
disso, enfatizavam o que chamavam de “plenitude do Espírito”.
Era preciso buscar essa experiência, que consistia em um ato de fé
em Cristo diferente da regeneração necessária para se conseguir a
vitória sobre o pecado. O poder recebido do Espírito Santo
também capacitava a pessoa para ser um servo eficiente de Cristo.
Alguns termos associados a Keswik eram “viver elevado”, “vida
de vitória”, “habitar em Cristo”, “descansar no Senhor”, “entrega
total”, “consagração” e “vida cheia do Espírito”.
Keswik teve um profundo impacto no evangelicalismo
moderno. Moody trouxe as idéias de volta para as conferências de
verão que realizou em sua terra natal no Massachusetts e elas
espalharam-se rapidamente pelas escolas bíblicas evangélicas e
sociedades missionárias. Os termos de Keswik acabaram sendo
usados até em corinhos evangélicos populares. Os principais
evangelistas de massas seguiram o exemplo de Moody e falaram
sobre a plenitude do Espírito Santo, enquanto professores da
Bíblia como F. B. Meyer, Andrew Murray, W. H. Griffith-Thomas
e W. Graham Scroggie tornaram-se nomes conhecidos tanto para
evangélicos britânicos como americanos. Keswik teve um impacto
crítico no espetacular reavivamento de Gales em 1905 e sua
influência também ficou evidente no Movimento de Comunhão,
um reavivamento de santificação que varreu a Alemanha entre
1880 e 1910. Os pregadores desse reavivamento eram
relativamente desconhecidos fora da Alemanha, mas a Associação
Gnadau, que se formou em torno de uma conferência bíblica
dentro do estilo de Keswik, preserva até hoje a forma
organizacional do Movimento de Comunhão.
Um fruto da ênfase na santidade foi o Pentecostalismo. Este
ia além da segundo benção, enfatizando o “batismo no Espírito
Santo” que era acompanhado dos “dons do Espírito” ou
“charismata”. Esse não era um acontecimento isolado, mas sim
algo que deveria continuar a manifestar-se na vida do crente e na
Igreja daquele dia em diante. Entre os dons, estavam a glossolália
(falar em línguas), interpretação das línguas, profecia, curas
divinas e uma experiência semelhante a um transe de ser “morto
no Espírito”.
Os primórdios do movimento encontram-se em 1901 quando
uma mulher falou em línguas numa escola bíblica dirigida por um
pregador metodista, Charles F. Parham (1873-1929), em Topeka,
Kansas. Mais tarde, ele formulou a doutrina das “línguas” como
primeiro sinal necessário de que alguém experimentou a bênção
pentecostal. Então, William J. Seymour (1870-1922), um afro-
americano que pregava a santidade, adotou o ensinamento
pentecostal depois de ter contato com Parham. Em 1906, tornou-se
líder de uma missão de santidade na rua Azuza, em Los Angeles e
um dia começou a falar em línguas. Grandes multidões reuniram-
se no velho prédio para compartilhar essa experiência e essas
reuniões, que foram realizadas durante três anos, deram início, de
fato, ao pentecostalismo americano. A partir dessas modestas
origens surgiu um movimento mundial completo, com divisões
denominacionais e debates teológicos sobre questões delicadas da
doutrina.
Um Pentecostalismo europeu desenvolveu-se
independentemente através de Thomas B. Barrat (1862-1940), um
metodista da Noruega que recebeu o batismo do Espírito Santo em
1906. Espalhou-se rapidamente para a Alemanha, mas o
Movimento de Comunhão dividiu-se por causa dessa questão. Em
Berlim, uma declaração de líderes da santidade em 1909 condenou
o “movimento de línguas” e os pentecostais alemães seguiram um
outro caminho. O considerável intercâmbio que ocorreu entre
pentecostais americanos e europeus ajudou a incentivar o
crescimento do movimento.
Uma quarta contribuição americana ao evangelicalismo foi a
campanha contra as bebidas alcoólicas. O movimento de
temperança antes da Guerra Civil foi a iniciativa de reforma com
maior repercussão na época e foi trazido de volta depois da Guerra
Civil através dos esforços de evangelistas como Frances Willard
(1839-98) e sua União Feminina Cristã da Temperança e
organizações políticas poderosas como a Liga Anti-Bares. É certo
que os grupos de temperança existiam na Grã-Bretanha e Europa,
mas eram pequenos e procuravam principalmente refrear a
embriaguez. Os americanos, porém, foram mais longe, proibindo o
uso de álcool em seus próprios meios e pressionando o governo a
impedir completamente a produção e distribuição de todas as
bebidas alcoólicas. Em 1914 as leis para isso já estavam vigorando
na maior parte dos estados e em 1920 foi estabelecida uma
Proibição Nacional. A grande maioria dos evangélicos apoiou essa
medida, mas cristãos de igrejas imigrantes, especialmente
luteranos e católicos demonstraram muito menos entusiasmo.
Alguns até opunham-se fortemente à medida. Uma crescente
divergência pública sobre a Proibição Nacional finalmente
resultou em sua suspensão em 1933, mas a maioria dos americanos
evangélicos ainda pratica a abstinência total.
Um dos pregadores evangélicos mais influentes da época foi
Charles Haddon Spurgeon (1834-92). Convertido numa capela
metodista, tornou-se batista e começou a pregar aos 17 anos de
idade. Três anos depois foi chamado para uma congregação em
Londres, onde trabalharia até o fim da vida, trinta e oito anos mais
tarde. A igreja cresceu tão rapidamente durante seus primeiros
cinco anos que ele teve que construir um novo templo em 1859
chamado Tabernáculo Metropolitano, a fim de abrigar uma
congregação que, naquela época, contava com seis mil membros.
Também fundou uma faculdade para treinar pastores, um orfanato
e várias outras agências de assistência social. Um calvinista
evangélico, ele era muito conhecido por seus sermões que foram
muldialmente distribuídos e ainda são lidos nos dias de hoje.
A principal iniciativa ecumênica foi a Aliança Evangélica.
Depois de uma considerável discussão entre líderes protestantes de
ambos os lados do Atlântico, foi convocada uma reunião em
Londres, em 1846, a fim de criar uma frente unida para defender o
Cristianismo bíblico. A intenção era formar um grupo que
promovesse a comunicação e comunhão entre evangélicos de todo
o mundo e auxiliasse na propagação do evangelho, mas a
delegação americana decidiu não se envolver quando alguns
levantaram a questão da escravidão. Os participantes da
conferência finalmente decidiram que ao invés de ter uma
organização abrangente, cada país iria formar sua própria Aliança
nacional. Ainda assim, sendo mais forte, a organização britânica
manteve abertos os contatos com os outros e foram realizadas
algumas convenções nas principais cidades para reunir o povo. As
várias Alianças concentravam-se na defesa da liberdade religiosa
dos protestantes evangélicos tanto em países católicos como não-
católicos, apoiando as iniciativas evangelísticas (como por
exemplo, Moody e Sankey na Grã-Bretanha, uma escola bíblica
em Berlim e as viagens de Baedeker à Rússia), incentivando o
trabalho missionário e patrocinando a Semana Mundial da Oração.
Os grupos da Grã-Bretanha e Alemanha foram os que
tiveram maior sucesso em cumprir os objetivos da organização.
Nos dias de hoje a Aliança Alemã trabalha como uma organização
cooperativa para as igrejas livres, enquanto a Aliança Britânica
dedica-se a várias obras evangelísticas, missionárias e de
assistência. A criação da União Evangélica Mundial em 1951
ajudou a dar novas forças para esse conceito. Enquanto isso, os
Estados Unidos formaram uma Aliança em 1867 e entre seus
líderes estava o historiador da Igreja Philip Schaff e a
personalidade do Evangelho Social, Josiah Strong. Seu sucesso na
promoção da cooperação ecumênica não foi muito espetacular e
em 1900 já estava em profundo declínio. Foi suplantada pelo
Concílio Federal de Igreja de Cristo, formado em 1908.
A influência dos protestantes evangélicos era excepcional.
Abastados homens de negócio sustentavam evangelistas e
políticos muitas vezes testemunhavam sua fé. O primeiro ministro
britânico William E. Gladstone era considerado um cristão
admirável, enquanto um dos presidentes americanos, James A.
Garfield, tinha sido pregador leigo em sua juventude e confessava
abertamente ser “nascido de novo”. Outro presidente, William A.
McKinley, era um dedicado leigo metodista e Woodrow Wilson,
um presbiteriano participativo, freqüentemente manifestava seus
valores cristãos em suas ações presidenciais. William Jennings
Bryan, três vezes candidato à presidência e secretário de Estado de
Wilson, era um evangélico muito respeitado. Na Holanda,
Abraham Kuyper (1837-1920), um ministro Reformado e teólogo
lutou contra o Liberalismo de sua época ao desenvolver a “visão
de mundo e de vida” neo-calvinista. Esta consistia em formar
instituições políticas, econômicas e sociais separadas para que,
através delas, a Igreja Reformada pudesse ir ao de encontro de
todos os aspectos da sociedade e cultura com uma perspectiva
distintivamente cristã. No âmbito político ele tornou-se líder do
Partido Anti-Revolucionário e foi primeiro ministro de seu país de
1901 a 1905.
Anti-semitismo e sionismo
O crescimento do racismo europeu é um assunto complexo,
mas fica claro que a criação de estereótipos como o “nobre ariano”
e a sistematização dos tipos raciais à partir de características
físicas eram voltadas para um grupo — os judeus. Muito disso
tinha suas raízes nos conceitos românticos de Volk e de sangue e
nas idéias do Socialismo darwiniano de evolução das raças. Havia
também uma lenda medieval bastante popular nesse período sobre
um “judeu errante”, um homem chamado Assuero que apressou
Jesus a caminho da crucificação, recusando-se a confortá-lo e dar-
lhe abrigo e que por isso foi amaldiçoado, condenado a uma
infindável existência errante. Essa lenda reforçava a idéia do judeu
como o eterno estrangeiro, um nômade incapaz e sem raízes que
dedicava-se ao comércio — diferente do bom fazendeiro ariano
que tinha raízes. Um outro mito era o da sinistra conspiração
mundial judia, um tema da ficção do século 19 que foi
incorporado no maior livro anti-semítico de todos os tempos, The
Protocols of the Learned Elders of Zion [Os Protocolos dos Sábios
Anciãos de Sião]. Produzido na Rússia por volta de 1905, chegou
traduzido no Ocidente em 1918 e é considerado desde então a
“bíblia” dos anti-semitas.
Em contraste com esse pensamento, havia a idéia iluminista
de assimilação dos judeus. Esta afirmava que os judeus poderiam
tornar-se parte da civilização em geral e que deveriam ter os
mesmos direitos que todas as outras pessoas. A emancipação —
concessão de direitos civis aos judeus — foi alcançada em muitos
países durante o século 19. Mas em décadas posteriores, o
sentimento anti-judeu mostrou sua cara assustadora outra vez,
especialmente na Rússia mas também na Áustria-Hungria e na
Alemanha. Theodor Herzl (1860-1904), um jornalista austríaco
que acompanhou o julgamento de Dreyfuss e viu o anti-semitismo
agressivo naquele que era o mais liberal de todos os países — a
França — concluiu que a assimilação não era a solução. Publicou
um livro no qual argumentava que os judeus deveriam ter sua
própria terra — um Estado judaico.
Herzl foi o fundador do sionismo moderno, o movimento em
favor de um país para os judeus. Para ele essa era uma resposta
racional para o anti-semitismo e não alguma coisa baseada num
profundo sentimento de identidade nacional dos judeus. Ele não
foi capaz de negociar um acordo com o sultão para separar um
território na Palestina otomana, mas um número cada vez maior se
dirigia para lá de qualquer forma, um gesto que causou espanto
nos árabes nativos da região. Com o crescimento do nacionalismo
árabe por todo o Oriente Médio em 1914, já existia um potencial
para conflitos. Porém, pelo fato da Turquia ter tomado partido dos
Poderes Centrais, o sentimento de sionismo cresceu no Ocidente.
Chaim Weizman (1874-1952), um fervoroso defensor do
movimento na Grã-Bretanha e que tinha contatos em cargos
elevados, persuadiu o Secretário de Assuntos Estrangeiros Arthur
Balfour a apoiar o sionismo como uma medida de guerra.
Na famosa Declaração de Balfour em 2 de novembro de
1917, ele afirmou que o governo britânico “vê favoravelmente a
fundação na Palestina de um lar nacional para o povo judeu”. A
intenção dessa declaração era firmar o apoio de judeus americanos
e russos para as iniciativas de guerra e buscar um possível endosso
alemão para o sionismo e, de fato, no mês seguinte as tropas
britânicas entraram em Jerusalém. No tratado de paz a Grã-
Bretanha recebeu um mandato da Liga das Nações sobre aquela
área, enquanto a França assumiu o mandato do Líbano e da Síria.
Imigrantes judeus começaram a dirigir-se em massa para a
Palestina mandatária, compraram terras, construíram cidades,
fundaram escolas e hospitais e, em 1929, criaram um órgão de
governo próprio, a Agência Judia da Palestina. Durante os anos
que se seguiram, a violência entre grupos de guerrilha judeus e
árabes intensificou-se e os britânicos ficaram presos entre os dois.
Depois que Hitler subiu ao poder na Alemanha, a imigração
cresceu ainda mais e com ela também o ressentimento árabe. O
número de judeus na região havia subido de 58 mil em 1919 para
450 mil em 1939. Para a Grã-Bretanha o problema na Palestina
parecia não ter solução.
O movimento ecumênico
Mesmo antes da Primeira Guerra Mundial os protestantes da
Europa e América do Norte já pensavam na cooperação cristã em
âmbito internacional e nacional e as primeiras tentativas de união
aconteceram depois da Segunda Guerra com o “movimento
ecumênico”, termo que se refere à ampla gama de iniciativas no
sentido de reintegrar o Cristianismo. Entre os primeiros exemplos
de empreendimentos cooperativos podemos citar as sociedades
bíblicas, a ACM, grupos cristãos estudantis e o Esforço Cristão.
Depois de 1900 os concílios nacionais e regionais das igrejas
começaram a se organizar. Os primeiros foram os da Federação
Protestante da França, formado em 1905 e o Concílio Federal das
Igrejas de Cristo na América, fundado em 1908 e reestruturado
como Concílio Nacional de Igrejas em 1950. Concílios Nacionais
Cristãos foram criados na Índia, China e Japão em 1922 e na
Coréia em 1924. A Igreja Evangélica na Alemanha (1922) e o
Concílio Britânico de Igrejas (1942) foram organizações nacionais
importantes para a Europa. Em 1948, havia trinta concílios
nacionais em todo o mundo e em 1990 o número já havia
alcançado a casa dos noventa.
Depois da Segunda Guerra, formaram-se vários concílios
regionais. O primeiro deles, a Conferência de Igrejas do Leste da
Ásia (que mais tarde mudou de nome para Conferência Cristã da
Ásia) foi formado em 1959, sendo D. T. Niles (1908-70) do Sri
Lanka seu primeiro secretário geral. Um evangelista da Igreja
Metodista, ele era um brilhante organizador e trabalhador
incansável em prol das causas ecumênicas. Outros grupos
regionais incluiram a Conferência de Igrejas Européias (1959), a
Conferência de Igrejas de Toda a África (1961), a Conferência
Pacífica de Igrejas (1966), a Conferência Caribenha de Igrejas
(1973), o Concílio de Igrejas do Oriente Médio (1974) e o
Concílio Latino-Americano de Igrejas (1982). Todos eles
almejavam ajudar as igrejas divididas a entenderem-se e a
trabalhar juntas, mas não esperavam que os membros aceitassem
uma posição doutrinária comum ou abrissem mão de qualquer
autonomia.
Uma outra forma de cooperação ecumênica ocorreu dentro
de grupos denominacionais específicos. A primeira foi a das
Conferências de Lambeth, reuniões consultivas de bispos da
família anglicana de igrejas que tiveram início em 1867 e tem sido
realizadas a cada dez anos desde então. A Aliança Mundial de
Igrejas Reformadas (1970) foi resultado da união de uma agência
criada pelas igrejas presbiterianas britânicas e norte-americanas
em 1875 com o Concílio Congregacional Internacional. A Aliança
Mundial Batista foi formada em 1905 e concentrava-se na
comunhão e em programas nos quais os batistas podiam oferecer
apoio mútuo. A Federação Mundial Luterana foi fundada em 1947
tendo como base uma organização anterior conhecida
especialmente por suas iniciativas assistenciais. O Conselho
Mundial Metodista foi criado em 1951 como sucessor de uma
conferência ecumênica que vinha se encontrado a cada década
desde 1881. A maioria deles entrou num relacionamento
consultivo através do WCC - World Church Council [Concílio
Mundial de Igrejas] e são conhecidas como “Sociedades Cristãs
Mundiais”.
O CRISTIANISMO COMO FÉ GLOBAL (Dados de 1993)
População mundial (total) 5.575.954.000
------------------------------------------------------------------------------------- -------------------------------------
População mundial por religião
Cristãos (de todos os grupos)
Não-cristãos 1.899.751.000
Muçulmanos
Sem religião 1.014.372.000
Hindus 912.874.000
Budistas 751.360.000
Ateístas 334.002.000
Novas religiões 241.852.000
Religiões tribais 123.765.000
Sikhs 19.853.000
Judeus 18.153.000
Religiões menores ou não classificadas 190.234.000
Total 3.706.202.000
Total percentual de cristãos na população mundial 34%
------------------------------------------------------------------------------------- -------------------------------------
Membros por bloco eclesiástico
Anglicanos (Episcopais) 55.974.000
Católicos Romanos (incluindo Uniatas) 1.020.804.000
Protestantes 342.696.000
Protestantes periféricos 20.020.000
Ortodoxos (todos os grupos) 185.568.000
Cristãos nativos não-brancos 161.873.000
Crentes secretos ou não classificados 112.816.000
------------------------------------------------------------------------------------- -------------------------------------
Porcentagem de cristãos por área geográfica
África 16.6%
Ásia Oriental 6.2%
Europa 24.1%
Norte da Ásia (antiga União Soviética) 6.7%
América Latina 25.3%
América do Norte 11.6%
Sul e Sudoeste da Ásia 8.4%
Oceania 1.1%
Fonte: David B. Barret, "Annual Statistics Table on Global Mission - 1993", International Bulletin of
Missionary Research 17 (January 1993), 23.
O ressurgimento evangélico
Entre os fundamentalistas americanos, cresceu o sentimento
de que deveriam cooperar uns com os outro, mas viam o Concílio
Federal com uma organização totalmente modernista. O primeiro
passo foi dado por Carl McIntire, que nasceu em 1906, estudou
com J. Gresham Machen e seguiu seu mentor e outros quando
estes deixaram o Seminário de Princeton. Quando desafiaram a
Igreja Presbiteriana dos EUA ao formar uma junta de missões
independente, foram expulsos do ministério. Então, McIntire
rompeu com seus colegas por causa de questões de pré-milenismo
e estilo de vida e criou uma nova denominação e seminário. Em
1941, organizou o ACCC - American Council of Christian
Churches [Concílio Americano de Igrejas Cristãs], cujas bases
teológicas eram o fundamentalismo e o exclusivismo separatista.
Nenhuma denominação ou igreja individual podia juntar-se ao
ACCC a não ser que renunciasse formalmente o modernismo e
cortasse todos os laços com o Concílio Federal.
Uma outra abordagem à cooperação evangélica
transdenominacional foi a de J. Elwin Wright (1896-1966). Em
1929 ele formou a Sociedade da Nova Inglaterra, cujo programa
cooperativo incluía um ministério no rádio, educação cristã,
livrarias e conferências bíblicas. Ele urgiu os representantes de
quase quarenta denominações reunidos em St. Louis em 1942 a
formar a NAE - National Association of Evangelicals [Associação
Nacional de Evangélicos]. Eles adotaram uma declaração de fé
conservadora mas rejeitaram o pedido de McIntire para que se
juntassem ao seu concílio separatista (o ACCC). Ao invés disso,
optaram por uma sociedade para ações unificadas em campos
como a evangelização, a transmissão por rádio, missões
estrangeiras e relações entre Igreja e Estado. A NAE assumiu uma
postura separatista no sentido de que as denominações que eram
parte do Concílio Federal (depois chamado de Nacional) não
podiam candidatar-se à afiliação, sendo que esse requisito não se
aplicava a indivíduos ou congregações. Além disso, organizações
pentecostais e da santidade também podiam se afiliar.
As diferenças entre os dois grupos eram claras e os encontros
de McIntire e do ACCC atacaram mordazmente a NAE por sua
posição “transigente” e “inclusiva”. Devido ao seu próprio
negativismo e anti-liberalismo a NAE não conseguiu atrair muitos
que poderiam ser definidos como evangélicos, como as igrejas
mais conhecidas e das denominações negras. Na verdade, as
grandes denominações conservadoras — a Convenção dos
Batistas do Sul, Igreja Luterana-Sínodo de Missouri e Igrejas de
Cristo — não se afiliaram. Porém, grupos secundários como A
Associação Evangélica de Missões Estrangeiras,
Radiotransmissores Nacionais Religiosos, Comissão de
Assistência Mundial e Associação de Imprensa Evangélica
ajudaram a realizar a visão cooperativa.
Mais importante ainda foi o surgimento de uma nova geração
de intelectuais fundamentalistas. Muitos deles, tendo se formado
em importantes universidades, começaram a ser ouvidos nos meios
teológicos e acadêmicos. O Fuller Theological Seminary, fundado
em 1947, era o centro desses novos estudiosos e o crescimento
acelerado das faculdades e seminários refletiu uma sede de ensino
entre os evangélicos. Novas sociedades acadêmicas foram
formadas para representar essa visão de mundo, incluindo a
Afiliação Científica Americana em 1941 e a Sociedade Evangélica
Teológica em 1949.
Em 1947 o jornalista e teólogo de 34 anos, Carl F. H. Henry,
publicou The Uneasy Conscience of Modern Fundamentalism [A
Consciência Inquieta do Fundamentalismo Moderno], que
desafiava as igrejas conservadoras a irem ao encontro dos
problemas que confrontavam a mente e a sociedade modernas.
Henry e outros argumentavam que o Fundamentalismo, apesar de
afirmar a integridade do Cristianismo ortodoxo diante dos desafios
modernos, havia perdido seu caráter profético e passado a ser uma
ameaça para a fé histórica. Eles o culpavam de simplificar em
demasia questões teológicas complexas, separar a fé do indivíduo
de sua vida diária, ser anti-intelectualista e ter um caráter belicoso
e negativo. Afirmavam que, na mente popular, o Fundamentalismo
havia se tornado repleto de conotações ruins e as contribuições
positivas porventura realizadas num período crítico da Igreja
haviam sido esquecidas.
O “novo evangelicalismo”, um termo criado por um de seus
fundadores, Harold J. Ockenga (1905-85), representava uma força
vital do Protestantismo americano. Em uma década havia
alcançado uma posição de liderança. Um símbolo dessa escalada
foi a fundação da revista Christianity Today em 1956, tendo
Henry como seu editor. Essa visão de unidade que os novos
evangélicos expressavam era uma iniciativa de cooperação
realizada por pessoas de pensamento semelhante em áreas como
evangelização, educação e ação social e não uma fusão de
denominações ou um ecumenismo abrangente. Sua estratégia era
de “infiltração”, não separação e iria ministrar a todas as igrejas e
influenciá-las através da aplicação da verdade cristã a todas as
fases da vida.
A personalidade mais relevante que comunicou a idéia de um
evangelicalismo mais amplo foi William F. “Billy” Graham.
Nascido em 1918, converteu-se numa reunião evangelística e
estudou em Wheaton College. Em 1943 começou o ministério
trabalhando para a MPC - Mocidade Para Cristo, uma das maiores
organizações do novo evangelicalismo e identificou-se com a
NAE e sua posição intermediária entre o negativismo
fundamentalista e a heresia modernista. Seu chamado era
claramente para a evangelização de massas, tornando-se uma
figura nacional depois de uma cruzada em Los Angeles em 1949 e
ganhando renome internacional com sua campanha em Londres
em 1954. Na metade da década de 50 já não havia a quem
compará-lo nesse campo. Em seus primeiros anos ele demonstrou
características de Fundamentalismo americano — uma teologia
conservadora ligada a uma filosofia política e social que
enfatizava a ética de trabalho, o patriotismo, o papel central da
religião na vida pública, papéis tradicionais dentro do lar e nos
relacionamentos familiares, uma defesa nacional forte e a rejeição
da ideologia estrangeira comunista.
Porém, Graham possuía uma flexibilidade excepcional e foi
capaz de mudar à medida em que os tempos mudavam. Apesar de,
no fundo, ser um humilde rapaz do interior, era capaz de
relacionar-se com os mais altos membros do governo e do mundo
dos negócios. Seus contatos com eles e inúmeras viagens
ampliaram sua visão de mundo. Sua ênfase no “evangelização
cooperativa”, isto é, no apoio ecumênico local para suas várias
cruzadas enquanto mantinha o funcionamento com firmeza nas
mãos de sua organização e de outros evangélicos, tudo isso
contribuiu imensamente para seu sucesso. Mas também lhe
conferiu uma persistente inimizade com os fundamentalistas
separatistas. Além disso, ele amadureceu em sua visão das
questões sociais, abandonando em primeiro lugar a segregação
racial que havia aprendido como tantos outros do sul do país e,
mais tarde, moderando seu anti-comunismo depois de visitas à
Europa oriental. Também passou a perceber a necessidade do
desarmamento nuclear e de abrir mão de seu antigo
superpatriotismo. O mais extraordinário, porém, foi sua
capacidade de criar uma ponte sobre o abismo que separava os
evangélicos das outros expressões de fé cristã, chegando até a
comparecer a eventos do Concílio Mundial e estabelecer uma
relação cordial com o papa João Paulo II.
Graham também promoveu o Ecumenismo entre os
evangélicos. Ele não apenas os reuniu em suas cruzadas locais
como também foi o principal motivador do lançamento da revista
Chrisitianity Today. Sua organização patrocinou congressos sobre
evangelização, começando com uma reunião em Berlim em 1966,
sendo que todos esses eventos incluíam uma vasta gama de
participantes. Foi facilitador do Congresso de Lausanne sobre
Evangelização Mundial em 1974 e sua reunião de
acompanhamento em Manila no ano de 1989. Também realizou
conferências de treinamento para evangelistas itinerantes em
Amsterdã em 1983 e 1986. Essas reuniões, enfatizando a
importância do esforço cooperativo em escala global para alcançar
homens e mulheres para Cristo, incluíam em sua visão não apenas
os ensinamentos bíblicos mas também a preocupação social.
O evangelicalismo americano deu origem a inúmeras
instituições evangelísticas, missionárias, educacionais e de
assistência social que funcionam a nível interdenominacional e
muitas vezes internacional. A organização World Vision [Visão
Mundial], por exemplo, foi fundada em 1950 por Robert “Bob”
Pierce (1914-78) para ajudar órfãos coreanos e hoje está entre as
maiores organizações humanitárias do mundo. O InterVarsity
Christian Fellowship [Aliança universitária cristã], que teve
origem na Inglaterra e depois passou para o Canadá em 1928 e
Estados Unidos em 1940, tem sido uma das grandes forças no
incentivo à evangelização e interesse em missões estrangeiras
junto a estudantes. Uma organização associada, a International
Fellowship of Evangelical Students [Aliança internacional de
estudantes evangélicos], formada em 1947, auxilia e encoraja o
trabalho com estudantes nativos em 130 países. Um ministério
com estudantes de igual importância é a Campus Crusade for
Christ International [Cruzada Estudantil], fundada em 1951 e que
também trabalha em âmbito global. O Comitê de Lausane para
Evangelização busca, através de conferências, publicações e
contatos, ser um catalisador e facilitador da evangelização
mundial.
O crescimento evangélico não foi apenas um fenômeno
americano. Na Grã-Bretanha, durante os anos entre as duas
grandes guerras, a divisão entre conservadores e liberais não era
tão hostil como na América. Os conservadores estavam envolvidos
na estrutura institucional das igrejas, onde sua voz era ouvida.
Alguns conservadores moderados como o batista W. Graham
Scroggie (1877-1958) e o congregacionalista G. Campbell Morgan
(1863-1945), haviam visitado a América e voltado lamentando-se
do estrago que o Fundamentalismo havia feito ao evangelho.
Tendo em vista que a separação entre liberais e conservadores
britânicos não foi absoluta e os evangélicos estavam ampliando
sua própria visão das questões teológicas, o evangelicalismo
britânico era de caráter bastante diferente.
Assim como seus colegas na América do Norte, o
InterVarsity Fellowship (hoje chamado de Universities and
Colleges Christian Fellowship), formado em 1920, estimulou o
avanço do evangelicalismo conservador depois da Segunda
Guerra. Entre seus empreendimentos estava a criação de
associações de profissionais cristãos, a fundação da Tyndale
House em Cambridge em 1945, como um centro para estudos
bíblicos, a fundação do London Bible College em 1954 a fim de
treinar pessoas para o trabalho cristão e a publicação de literatura
cristã acadêmica.
Dentro da própria Igreja da Inglaterra, o líder do movimento
que trouxe o Cristianismo evangélico de volta para a linha
principal em termos de vida e pensamento foi John R. W. Stott.
Nascido em 1921 e educado em Cambridge, ele trabalhou na All
Soul‟s Church em Londres, onde teve um ministério notável entre
1945 e 1975. Através de suas palestras e escritos tornou-se
conhecido em todo o mundo como um grande evangelista
apologista e professor da Bíblia. Foi o organizador do Primeiro
Congresso Nacional Evangélico Anglicano em Keel em 1967, um
acontecimento que teve impacto decisivo sobre a renovação do
evangelicalismo dentro da Igreja.
Entre outras figuras conhecidas do evangelicalismo britânico
estão o eminente líder anglicano e estudioso de Lei Islâmica, Sir
Norman Anderson; o estudioso do Novo Testamento, F. F. Bruce;
o estudioso do Antigo Testamento, D. J. Wiseman; e o pregador
D. Martyn Loyd-Jones. Além disso, o TEAR - The Evangelical
Alliance Relief Fund [Fundo para a Assistência da Aliança
Evangélica], criado em 1968, tem se tornado uma importante
agência de assistência social, enquanto o Projeto Shaftesbury
incentivou o pensamento e a ação no meio social.
Na Alemanha, o número de evangélicos era pequeno se
comparado com os Estados Unidos e Grã-Bretanha, mas as igrejas
livres e a Aliança Evangélica promoveram a obra evangelística e
nos anos pós-guerra cresceram os esforços realizados por estes e
muitos outros grupos. Billy Graham foi à Alemanha em várias
ocasiões e suas reuniões atraíam enormes multidões. O pregador
itinerante Anton Schulte, Ulrich Parzany da ACM alemã, o Bispo
Rolf Scheffbuch da Igreja protestante de Württemberg e o Dr.
Theo Lehmann, o principal evangelista de jovens na antiga
Alemanha Oriental, tornaram-se figuras respeitadas do
evangelicalismo alemão. A Rádio TransMundial começou a operar
na Alemanha em 1961 e tornou-se uma importante organização
cristã. Além disso, evangélicos alemães patrocinaram uma
convenção nacional bienal criada para ser um contrapeso da
Kirchentag (Assembléia da Igreja) das igrejas tradicionais.
O desafio da secularização
O desafio mais imediato da Igreja é algo com que ela já vem
lutando há muito tempo — o processo de secularização. O termo
secular vem da palavra latina saecullum ("era" - o mundo
considerado de acordo com os aspectos do tempo) e foi usada para
traduzir o termo grego aion, que possuía o mesmo sentido. No
Novo Testamento aion refere-se a “era” que foi criada por Deus
(Hb 1.2) na qual vivemos e fazemos o bem ao nosso próximo
(1Tm 6.17) sendo que não devemos nos conformar com seus
valores e padrões (Rm 12.2) e um tempo que terminará com o
julgamento de Deus (Mt 24) e que será seguido da era futura na
qual os fiéis gozarão a vida eterna (Lc 18.30). Foi o tempo
histórico no qual as pessoas viveram a expectativa do Redentor
que estava por vir. Porém, a palavra assumiu um significado
diferente na Idade Média, quando o “secular” passou a ser
identificado com o “temporal”, a era presente em contraste com o
“eterno”, a esfera do espiritual, sagrado e divino.
Nos tempos modernos, a secularização veio a significar mais
do que apenas um processo de viver e agir no mundo presente. É,
agora, uma visão de mundo que pode ser chamada de
“Secularismo”. Essa é uma filosofia que enfatiza o material sobre
o espiritual, o respeito por toda verdade, independente de sua
origem, desde que leve ao aprimoramento humano, uma
preocupação exclusivamente com coisas desse mundo e não de um
outro mundo que possa vir e uma moralidade racional
independente de qualquer referência a Deus ou à realidade
espiritual. Do ponto de vista secularista, a região convencional
fica à margem do funcionamento da ordem social e a sociedade é
governada por sistemas impessoais de controle, tais como a
Burocracia, Ciência, Tecnologia e Pragmatismo (qualquer coisa
que funcione). Grupos que valorizam o sobrenatural não têm mais
permissão de exercer um papel no processo de tomar decisões.
Apesar do Secularismo aparentar ser a visão de mundo
predominante dos tempos modernos, seu vazio foi demonstrado
pela condição deplorável das cidades da Revolução Industrial,
pela tirania de Hitler, Stalin e Mao Tse-tung, bem como a criação
de armas de destruição em massa que poderiam eliminar toda a
vida na Terra. Até mesmo no Ocidente “esclarecido” onde a
Ciência produziu os mais altos padrões de vida na História e a
separação entre Igreja e Estado permitiu a ambos funcionar de
maneira mais autêntica, o Secularismo fracassou na tarefa de
oferecer respostas significativas para os problemas básicos do ser
humano. A corrupção política, o número crescente de ameaças ao
meio ambiente e o perigo de novas doenças mortais como a AIDS
ajudaram a destruir a ilusão de otimismo que havia tomado conta
do Ocidente no início do século 20.
Até mesmo para muitos cristãos o ritmo de vida na era
secular deixa muito a desejar. Isso fica evidente no aumento do
uso de medicamentos para dormir bem como de outras drogas e
pelas estatísticas sobre saúde mental, doenças relacionadas ao
estresse e suicídios. Eles não são imunes aos males que assolam os
outros no mundo.
Um outro tipo de Secularismo consiste na devoção quase
religiosa a coisas ou processos que aparentemente não tem ligação
nenhuma com aquilo que é considerado religião. Entre os novos
deuses seculares desta era estão a obsessão com a sexualidade, a
confiança no Estado-nação, a crença nos processos tecnológicos, a
fixação por entretenimento e esportes e o desejo de bens materiais.
Apesar de não haver nada intrinsecamente errado nessas coisas,
ainda assim qualquer uma delas pode exigir um nível de
comprometimento que deve ser reservado exclusivamente para
Deus.
O ressurgimento de religiões tradicionais em todas as partes
do mundo é uma prova de quão vazio é o Secularismo e isso
reforça para os cristãos o fato de que não devem ignorar o
problema existente e deixar a encargo de outros a tarefa de
desafiar o sistema do mundo. Eles não devem se conformar com o
espírito destes tempos ou permitir que a Igreja seja manipulada por
líderes políticos ou outros que estejam em busca de benefícios
temporais.
A reação dos crentes ao Secularismo deve ser de tornar a fé
relevante a todas as questões da atualidade. Não existe nenhuma
esfera da vida que seja isenta do escrutínio de Deus. Por outro
lado, não devem procura voltar a imaginários tempos áureos da
cultura cristã ou se retrair em algum tipo de gueto cristão. É
preciso que os crentes confrontem o secularismo vivendo no
mundo e demonstrando como é possível ter uma vida integrada
cujas diferentes partes são unidas pelo conceito de um Deus
criador que se preocupa com seu universo e que possibilitou a
redenção através da morte de Cristo.
Riqueza e pobreza
Um segundo desafio que confronta a Igreja é a extrema
divergência entre os ricos e os pobres do mundo de hoje, um
contraste que muitas vezes é descrito em termos de divisão entre
Norte e Sul. Especialistas em dados demográficos estimam que em
2000 a população do mundo será de 6,3 bilhões de pessoas e em
2025 pode chegar aos 8,5 bilhões. Além disso, 95 por cento do
crescimento populacional durante esse período será nos países em
desenvolvimento da América Latina, África e Ásia. Em 2025 o
México terá tomado o lugar do Japão entre os dez países mais
populosos do mundo e a população da Nigéria será maior que a
dos Estados Unidos.
Apesar do verdadeiro progresso realizado no crescimento
econômico, saúde pública e alfabetização no Terceiro Mundo,
pelo menos 800 milhões vivem em condições de “pobreza
absoluta”. O termo significa uma condição de vida na qual a
desnutrição, o analfabetismo, doenças, habitação inadequada, alta
taxa de mortalidade infantil e baixa expectativa de vida estão
abaixo de qualquer definição de decência humana. A dura
realidade é que o Norte (incluindo a Europa Oriental e excluindo a
China), tem um quarto da população mundial e 80 por cento de
sua renda, enquanto no Sul (incluindo a China), três quartos da
população do mundo vivem com um quinto de sua renda. Além
disso, aproximadamente 90 por centro da indústria mundial de
manufatura encontra-se no Norte. Enquanto a qualidade de vida no
Norte sobe num ritmo regular, no Sul a cada dois segundos uma
criança morre de fome ou doença.
Ainda assim, o contraste entre a riqueza e a pobreza não
corresponde exatamente à divisão Norte-Sul. Muitos dos países da
OPEP são ricos enquanto a pobreza pode ser encontrada na
América do Norte e Europa. Nos Estados Unidos, 14 por cento das
pessoas e um quinto de todas as crianças estão abaixo da definição
legal de pobreza e na Grã-Bretanha mais de 10 a 15 por cento
estão próximos desse ponto. A realidade é que a grande
disparidade entre riqueza e pobreza não existe somente entre as
nações mas também dentro delas.
Por outro lado, um quinto da população do mundo vive em
relativa afluência e consome aproximadamente quatro quintos da
produção mundial. Além disso, de acordo com um relatório do
Banco Mundial, no ano de 1988 a “contribuição total” das nações
ricas para o Terceiro Mundo foi de $92 bilhões, um número
equivalente a menos de 10 por cento dos gastos mundiais com
armamentos, mas isso foi mais do que compensado pelo “serviço
total de débito” de $142 bilhões. O resultado foi uma transferência
negativa de aproximadamente $50 bilhões do Terceiro Mundo
para os países desenvolvidos. Essa disparidade entre riqueza e
pobreza é uma injustiça social tão grave que os cristãos não podem
ousar ignorá-la.
Não se deve culpar a Deus pela situação na qual existe o
pobre. Ele deu recursos suficientes através do solo e dos mares da
terra para atender as necessidades de todos. Também não é culpa
dos próprios pobres, tendo em vista que a maioria deles nasceu na
pobreza, mas alguns dos líderes de seu governo podem ser
culpados de corrupção e incompetência. Além disso, não é
necessariamente culpa daqueles que estão no Ocidente. Porém, os
cristãos tornam-se pessoalmente culpados quando não fazem nada
sobre essa situação.
Na história do Homem Rico e Lázaro (Lc 16.19-31) não há
nenhuma indicação de que a pessoa rica fosse responsável pela
triste situação do pobre. A culpa estava em sua ignorância cega
quando ao mendigo em seu portão. Ele não usou sua afluência
para suprir as necessidades do homem e permitiu que uma situação
de pobreza extrema privasse Lázaro de sua humanidade. O
Homem Rico foi enviado para o inferno não porque explorou o
mendigo, mas porque o ignorou. Os cristãos de hoje são tentados a
usar a complexidade da economia como desculpa para não fazer
nada. O povo de Deus precisa dedicar-se não apenas à
evangelização, mas também a atender as necessidades humanas,
tanto em seu próprio país como nos confins da terra.
Isso explica porque os cristãos no Terceiro Mundo colocam
as questões de pobreza e desenvolvimento no topo de suas
prioridades teológicas. Alguns cristãos no Norte têm dificuldade
de entender que a “libertação” é tão central no pensamento de seus
irmãos na América Latina, África e Ásia, mas eles nunca
enfrentaram a realidade dura e desumana da pobreza completa.
Não deve ser surpreendente que os evangélicos do Sul, com seu
forte compromisso com a integridade e autoridade das Escrituras,
estejam na vanguarda da iniciativa de se garantir mais justiça para
seus vizinhos. Eles simplesmente acreditam naquilo que a Bíblia
diz.
Essa dedicação à ação nunca foi mais eloqüentemente
afirmada do que no Manifesto de Manila, adotado no II Congresso
Internacional de Evangelização Mundial em Lausanne no mês de
julho de 1989. Com três mil representantes de cento e setenta
países, essa reunião nas Filipinas foi a organização mais
representativa de evangélicos a se reunir em um único lugar. As
palavras a seguir estão na seção que tem como título “o Evangelho
e a Responsabilidade Social”:
Racismo e etnicidade
O racismo e a etnicidade estão intimamente ligados aos
problemas de guerra. Uma definição amplamente aceita dentro da
comunidade cristã afirma que racismo é
Por causa da unidade da raça humana, exigimos direitos iguais e respeito igual
para as minorias raciais. Por causa da diversidade de grupos étnicos, renunciamos
o imperialismo e buscamos preservar toda a riqueza da cultura inter-racial que for
compatível com o senhorio de Cristo.
Por causa do caráter decisivo de Cristo, afirmamos que a liberdade religiosa
inclui o direito de propagar o evangelho. Por causa da glória da Igreja, devemos
procurar nos desfazer de qualquer traço de racismo e transformá-la num modelo
de harmonia entre as raças, no qual o sonho multirracial tornou-se realidade.3
O desafio ambiental
Talvez o desafio mais sério para a Igreja do século 21 seja o
de preservar a Terra. A extensão da destruição ambiental é
assustadora, como indicam desastres recentes como o vazamento
de gás venenoso de uma indústria química em Bhopal na Índia em
1984, que matou mais de duas mil pessoas e deixou seqüelas em
mais de duzentas mil; o acidente na usina nuclear de Chernobyl na
Ucrânia em 1986, cujos efeitos letais só serão conhecidos ao longo
de décadas; o derramamento de petróleo da Exxon Valdez no
Alasca em 1989 e o derramamento ainda maior de petróleo nas
Ilhas Shetland. Acontecimentos alarmantes como a destruição da
floresta amazônica, a eliminação sistemática das florestas no norte
da Índia, o deserto do Saara avançando para o sul, as crises de
chuva ácida na Europa e América do Norte, os buracos na camada
de ozônio, a eliminação de inúmeras espécies de animais e plantas
chamaram a atenção do público para a necessidade de
responsabilidade ambiental.
Infelizmente, ecologistas seculares acusam a Igreja de ser a
principal origem desse problema por causa da afirmação em
Gênesis 1.26,28 de que a humanidade deve “subjugar” e ter
“domínio” sobre a terra e toda a vida que nela há. Alguns chegam
a afirmar que os cristãos tem uma boa dose de culpa na exploração
desordenada do meio-ambiente e pedem uma religião panteísta
que junte os seres humanos e a natureza.
Os cristãos devem responder a essas acusações mostrando
que Gênesis 1 e 2 tem um equilíbrio mútuo. Deus delegou o
domínio aos seres humanos mas estes seriam responsáveis perante
ele e deveriam cooperar com as forças da natureza. O princípio de
que Deus possui a terra e supervisiona o que acontece com ela
aparece repetidamente nas Escrituras “A terra é do Senhor” (Sl
24.1), “cada animal na floresta é meu bem como o gado em
milhares de colinas” (Sl 50.10) e ele alimenta os pássaros, faz
crescer os lírios e veste a erva dos campos (Mt 6.26,28,30). Isso
exige a conservação dos recursos da terra, incluindo sabedoria
para usar e reciclar produtos manufaturados. Se deseja manter sua
credibilidade no mundo de hoje, a Igreja deve promover a
consciência da responsabilidade ambiental.
Mulheres no ministério?
Nas últimas décadas do século 20, poucos assuntos foram tão
controversos nos meios protestantes e católicos como a questão da
mulher ser aceita e ordenada como clériga. De um lado, estão
aqueles que acreditam que a missão da Igreja de Deus é
prejudicada quando é negada a metade dos membros a
oportunidade de exercer os dons que receberam de Deus. Do outro
lado estão os que acreditam com igual convicção que o ministério
masculino foi instituído pelo próprio Jesus quando chamou doze
homens para serem seus apóstolos. Tanto os tradicionalistas
quanto os igualitários lançam mão das Escrituras Sagradas e do
desenvolvimento histórico da Igreja para apoiar seu
posicionamento quanto ao papel da mulher no ministério. Cada um
acusa o outro de projetar na Bíblia sua própria visão
preconceituosa escolhendo passagens que reforçam sua posição
sobre o assunto.
No século 19, vários grupos protestantes permitiam a
participação de mulheres no ministério público. Entre os exemplos
mais conhecidos estavam a metodista americana Phoebe Palmer,
Catherine Booth do Exército da Salvação e Hannah Whitall Smith,
que ajudou a começar o movimento Keswick. Nos Estados Unidos
a maior parte das organizações pentecostais e movimentos da
santidade tiveram mulheres como pastoras e evangelistas no
início, mas foi só na metade do século 20 que as denominações
mais tradicionais começaram, de fato, a ordenar mulheres. Porém,
a nível de igreja local, havia uma considerável resistência até
pouco tempo atrás. Nos dias de hoje, quase um terço dos alunos de
seminários são mulheres.
Os luteranos da Suécia começaram a ordenar mulheres em
1958 e os alemães seguiram o exemplo alguns anos mais tarde. A
primeira mulher alemã à exercer o bispado foi nomeada em 1992.
A Igreja Reformada e a Igreja da Escócia começaram a aceitar
mulheres no ministério nos anos 60 e os batistas e metodistas na
Grã-Bretanha e Alemanha, só mais recentemente. Os evangélicos
de um modo geral são resistentes a essa tendência, mas alguns
deles têm argumentado em favor da ordenação feminina.
As tensões mais sérias podem ser vistas nas igrejas
Anglicana e Católica Romana. Nos anos 70 tanto a Igreja
Anglicana do Canadá como a Episcopal da América começaram a
ordenar mulheres e em 1991 a Nova Zelândia nomeou uma mulher
para o cargo bispal. Mas as igrejas anglicanas na Grã-Bretanha e
Austrália foram divididas por profundas dissensões. Em 1992, a
decisão de permitir mulheres no ministério ameaçou dividir a
Igreja nos dois países e colocou em sério risco a iniciativa de
ecumenistas anglicanos no sentido de estreitar os laços com Roma.
O papa João Paulo II adotou um posicionamento intransigente na
questão da ordenação feminina, apesar das pressões contrárias de
um forte movimento feminista dentro da Igreja Católica. As
igrejas ortodoxas orientais nunca estiveram mais firmes do que
agora em sua rejeição da ordenação feminina.
Pelo visto essa questão ainda continuará a perturbar várias
comunidades cristãs pelo mundo afora por anos ou talvez mesmo
décadas futuras. Muitos cristãos devotos, entre eles multidões de
mulheres, apegam-se fervorosamente aos antigos costumes quando
tudo o que lhes é sagrado parece estar desmoronando. É por isso
que igrejas conservadoras que opõem-se rigorosamente à
ordenação de mulheres continuam a crescer. A fim de ter sucesso a
longo prazo, o novo feminismo cristão terá que demonstrar que a
igualdade entre os gêneros contribui para a força moral e espiritual
da Igreja.
Rumo ao futuro
A lista de problemas apresentada acima não é, de forma
alguma, completa. Entre outras questões que poderiam ser
mencionadas estão a era da informática, o totalitarismo de alguns
chefes de Estado, o impacto das tecnologias de comunicação,
alienação do mundo moderno, questões familiares (como divórcio,
violência contra cônjuges e filhos, homossexualidade e eutanásia),
uso de drogas e álcool, analfabetismo e ignorância, direitos
humanos, emprego e trabalho e relações industriais. Só de pensar
nos múltiplos desafios que se apresentam à Igreja poderia levar ao
desespero. Porém os cristãos não devem jamais fraquejar em sua
crença de que o poder soberano de Deus está agindo sobre o
mundo.
Caso os acontecimentos continuem no rumo que estão
tomando no momento, é bastante provável que em algum
momento do futuro a Igreja seja obrigada a voltar a uma existência
parecida com a que era predominante antes do tempo do
imperador Constantino. Ao invés de fingir seu uma extensão do
mundo, ela terá que operar como a Igreja de uma minoria e aceitar
a posição de antagonismo consciente do mundo. Independente do
que reserve o futuro, as palavras de despedida de Jesus aos seus
discípulos são tranquilizadoras:
Estas coisas vos tenho dito para que tenhais paz em mim. No
mundo passais por aflições; mas tende bom ânimo, eu venci o
mundo (Jo 3.16).
Notas
Capítulo 2
1. Tático, Anais 15.44.
2. Eusébio, História Eclesiástica 8.2.4-5.
3. Orígenes, Homilias sobre Levíticos 9.1.3.
4. Hipólito, Refutação de Toda Heresia 9.12.21-22.
5. Minúcio Félix, Otávio 8.4
6. Ibid., 9.4.
7. Ibid., 31.7-8.
8. Tertuliano, Apologia 37.4.
9. Lactâncio, Sobre a Morte dos Perseguidores 44.5.
Capítulo 3
1. Clemente, Stromateis 6.8.
2. Tertuliano, Sobre o Corpo de Cristo 5.4.
Capítulo 4
1. Para lendas cristãs sobre Juliano, ver Robert
Browning, The Emperor Julian (Berkley, Calif.: Univ. of
Califórnia, 1976), 225-58.
2. Hipólito, A Tradição Apostólica 2.20.7-21.1.
Capítulo 5
1. Bede, Uma História da Igreja Inglesa 2.13.
2. Citado de uma fonte contemporânea por J. Brondsted.
The Vikings (Londres: Penguin, 1965), 58.
Capítulo 6
1. Alcuin, carta à Meginfried (796).
2. Einhard, Life of Chalemagne 28.
3. Capitulário (820) de Luís o Pio de Capitularia
Requim Francorum 1, 298.
4. Inocêncio III, carta a Acerbus (1198).
Capítulo 8
1. Teodoro o Estudita, First Refutation of the
Iconoclasts 2.
2. John J. Norwich, Byzantium: the Apogee (Nova York:
Knopf, 1992), 321.
3. T. Fitzgerald, “Toward the Reestablishment of Full
Communion: The Orthodox-Orthodox Oriental Dialogue”. Greek
Orthodox Theological Review 36 (1991), 169-82; cf. e também
“Joint Comission of the Theological Dialogue between the
Orthodox Church and the Oriental Orthodox Churches”, idem.,
183-88.
Capítulo 9
1. A. G. Dickens, The English Reformation (University
Park, Pa.: Pennsylvania State Univ., 1991), 46-60.
2. Matthew Spinka, Advocates of Reform from Wyclif to
Erasmus. Library of Christian Classics (Filadélfia: Westminster,
1953), 15:337.
Capítulo 10
1. Roland H. Bainton, Here I Stand: A Life of Martin
Luther (Nashville: Abingdon-Cokesbury, 1950), 65.
2. Ibid., 185.
3. Ibid.
Capítulo 11
1. Clyde, L. Manschreck, A History of Christianity in
the World (Englewood Cliffs, N.J.: Prentice-Hall, 1985), 206.
Capítulo 12
1. Lewis, Hanke, org., Tears of the Indians by
Bartholomé de Las Casas (Williamstown, Mass.: John Liburne,
1970), xiii.
2. Charles R. Boxer, The Portuguese Seaborne Empire,
1415-1825 (Nova York: Knopf, 1975), 228.
Capítulo 13
1. Paul Althaus, The Theology of Martin Luther
(Filadélfia: Fortress, 1966), 274-86.
2. Paul Hazaard, The European Mind: The Critical
Years (1680-1715) (New Haven, Com.: Yale Univ., 1953), 198-
216.
Capítulo 14
1. Robert J. Nelson. Pascal: Adversary and Avocate
(Cambridge, Mass.: Harvard Univ., 1981, 115-209. Ver também
Alexander Sedgwick, Jansenism in Seventeenth-Century France
(Charlottesvile, Va.: Univ. of Virginia, 1977).
2. Blaise Pascal, Pensées, Fragmentos 432-380;
3. F. Ernest Stoeffler. The Rise of Evangelical Pietism
(Leiden, Holanda: Brill, 1971), 228-48.
Capítulo 15
1. John Dillenberger, Protestant Thought and Natural
Science (Londres: Collins, 1961), 54:359.
2. R. R. Palmer, A History of the Modern World, 7a ed.
(Nova York: McGraw-Hill, 1992), 54: 359.
3. The Complete Works of Benjamin Franklin, ed. John
Bigelow (Nova York: Putnam‟s, 1888), 10:194-95.
Capítulo 17
1. Alexis de Tocquevile, The Old Regime and the
French Revolution (Garden City, N.Y.: Doubleday, 1955), 6.
2. Paul Johnson, A History of Christianity (Nova York:
Atheneum, 1970), 360.
3. Alec R. Vidler, The Church in an Age of Revolution
(Nova York: Penguin, 1961), 19.
4. R. I. Wilberforce e Samuel Wilberforce, The Life of
William Wilberforce (1838), 1:149, citado em John Pollock,
Wilberforce (Nova York: St. Martin‟s, 1977), 69.
5. David W. Bebbington, Evangelicalism in Modern
Britain (Londres, Unwin Hyman, 1989), 52.
Capítulo 18
1. T. A. Burkill, The Evolution of Christian Thought
(Othaca, N.Y.: Cornell Univ., 1971), 382-98.
2. Fritz Fischer, “Der deutche Protestantismus und die
Politik im 19 Jharhundert”, Historische Zeitschrift 171 (1951)m
480-83.
3. “Tübingen School”, in Evangelical Dictionary of
Theology, org. Walter A. Elwell (Grand Rapids: Baker, 1984),
1114-15.
4. Alexis de Tocqueville, Democracy in America (Nova
York: Schocken, 1961), 1:359-60.
Capítulo 19
1. Edwin Hodder, The Life and Works of the Seventh
Earl of Schaftesbury (Londres: Cassell ,1887), 1:146.
2. John C. Cort, Christian Socialism (Maryknoll, N.Y.:
Orbis, 1988), 156.
3. Shailer Matthews, “The Social Gospel” in A
Dictionary of Religion and Ethics (Nova York: Macmillan, 1921),
416-17.
4. W. B. Riley, The Menace of Modernism (Nova York:
Christian Alliance, 1917), 337.
Capítulo 20
1. Brian Stanley. The Bible and the Flag: Protestant
Missions and British Imperialism in the Nineteenth and Twentieth
Centuries (Leicester, Inglaterra: Apollos, 1990), 160-62.
2. Lamin Sanneh, Translating the Message: The
Missionary Impact on Culture (Nova York: Orbis, 1989), 3.
3. Stephen Neill, A History of Christian Missions (Nova
York: Penguin, 1964), 278.
4. Patricia R. Hill, The World Their Household: The
American Woman’s Foreign Mission Movement and Cultural
Transformation,1870-1920 (Ann Arbor, Mich.: Univ. of
Michigan, 1985), 3.
Capítulo 21
1. Dmitrij Tschizewskij, Russian Intelectual History
(Ann Arbor, Mich.: Univ. of Michigan, 1978), 194-97.
2. Ibid., 221-26.
3. Sydney E. Ahlstrom, A Religious History of the
American People (New Haven, Conn.: Yale Univ., 1972), 1021.
4. “Julius Wellhausen”, in The Oxford Dictionary of
Theology, org. F. L. Cros (Nova York: Oxford Univ., 1958), 144.
5. “Theological Liberalism” in Evangelical Dictionary
of Theology, org. Walter A. Elwell (Grand Rapids: Baker, 1984),
631-32: William R. Hutchinson, The Modernist Impulse in
American Protestantism (Nova York: Oxford Univ., 1976) 2-6.
Capítulo 22
1. Ver a discussão em Richard V. Pierard e Robert D.
Linder, Civil Religion and the Presidency (Grand Rapids:
Zondervan, 1988), 153-58.
2. Hitler’s Secret Conversations 1941-1944 (Nova
York: New American Library, 1961), 34, 330.
Capítulo 23
1. Joel A. Carpenter e Wilbert R. Shenk, org., Eaarthern
Vessels: American Evangelicals and Foreign Missions, 1880-1980
(Grand Rapids: Eerdmans, 1990), 335-42.
Epílogo
1. J. D. Douglas, org., Proclaim Christ Until He Comes
(Minneapolis: World Wide, 1989), 20-21.
2. Adotado em 1968 na assembléia do Concílio Mundial
de Igrejas. Ver Dictionary of the Ecumenical Movement. Org.
Geoffrey Wainwright, et al. (Grand Rapids: Eerdmans, 1991), 841.
3. John Stott, Decisive Issues Facing Christians Today
(Tarrytown, N.Y.: Revell, 1990), 225-26.