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Campus Contagem
DIREITO CIVIL V
1º Semestre
2021
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PUC MINAS – Campus Contagem
DIREITO CIVIL V – 7º Período
Profª. Simone Reissinger
Ementa
Propriedade. Posse. Direitos reais sobre coisas alheias.
Objetivos
Objetivo geral:
Possibilitar ao aluno a compreensão crítica, análise e interpretação das teorias
e dos institutos de Direitos Reais e sua aplicação às diversas áreas do Direito,
com o desenvolvimento de competências e habilidades destacadas nas Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCN) e no Projeto Pedagógico do Curso de Direito.
Objetivos específicos:
- Identificar os conceitos necessários a cada instituto dos direitos reais;
- Classificar os institutos dos direitos reais;
- Distinguir posse e propriedade;
- Distinguir os modos de aquisição da propriedade móvel e da propriedade imóvel;
- Analisar criticamente os institutos dos direitos reais sob a ótica da função
social da propriedade na sociedade contemporânea;
- Reconhecer e distinguir os procedimentos processuais para a posse e para
a propriedade;
- Incentivar o debate sobre temas atuais relacionados ao conteúdo programático,
fomentando e motivando o aluno para soluções criativas.
Métodos Didáticos
Unidades de Ensino
Processo de Avaliação
Adota-se como métrica do processo avaliativo uma pontuação total de cem (100)
pontos, assim distribuída:
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas (v.
5). 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. (livro eletrônico)
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito das coisas (v. 4). 12ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2020. (livro eletrônico)
FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direitos
reais (v. 5). 11ª ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2015.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:
direitos reais (v. 5). 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020. (livro eletrônico)
LÔBO, Paulo. Direito Civil: coisas (v. 4). 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. (livro
eletrônico)
SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Direito Imobiliário: teoria e prática. 16ª ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2020. (livro eletrônico)
TEPEDINO, Gustavo. Fundamentos de direito civil: direitos reais (v. 5). Rio de
Janeiro: Forense, 2020. (livro eletrônico)
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SUMÁRIO
I INTRODUÇÃO AO TEMA
1 Direito das Coisas ou Direitos Reais?
2 Distinção entre direitos reais e obrigacionais
3 Classificação dos direitos reais
III. PROPRIEDADE
1 Introdução
2 Histórico do direito de propriedade
3 A mudança de paradigma: a visão liberal e individualista do direito de
propriedade e a nova visão
3.1 Função social
3.2 Desenvolvimento histórico da propriedade no Brasil
3.3 Reforma agrária no Brasil
4 Fundamento jurídico da propriedade
5 Características do direito de propriedade
6 Faculdades inerentes à propriedade
7 Principais atributos da propriedade
8 Objeto do direito de propriedade
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IV DIREITOS DE VIZINHANÇA
1 Árvores limítrofes
2 Passagem forçada
3 Passagem de cabos e tubulações
4 Das Águas
5 Limites entre prédios e ação demarcatória
6 Direito de tapagem
7 Direito de construir
V CONDOMÍNIO
1 Noções gerais
2 Condomínio geral (ordinário)
3 Condomínio edilício
4 Multipropriedade imobiliária
5 Condomínio de lotes
6 Loteamento de acesso controlado
7 Condomínio urbano simples
2.3 Uso
2.4 Habitação
2.5 Superfície
2.6 Concessão de uso especial para fins de moradia
2.7 Concessão de direito real de uso
2.8 Direito real de laje
2.9 Enfiteuse, aforamento ou emprazamento (CC/1916)
REFERÊNCIAS
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I INTRODUÇÃO AO TEMA
Verifica-se que algumas obras jurídicas se denominam “Direito das Coisas”, tal
como o título do livro III do Código Civil, e outras denominam-se “Direitos Reais”.
De acordo com Flávio Tartuce (2017), “a expressão Direito das Coisas sempre gerou
dúvidas do ponto de vista teórico e metodológico, principalmente quando confrontada com o
termo Direitos Reais.”
Assim, em sentido didático, afirma Tartuce (2017) “que o Direito das Coisas é o ramo do
Direito Civil que tem como conteúdo relações jurídicas estabelecidas entre pessoas e coisas
determinadas, ou mesmo determináveis. Como coisas pode-se entender tudo aquilo que não é
humano (...).”
Deste modo, “coisas” significa bens corpóreos ou tangíveis, ou seja, móveis e imóveis.
Portanto, Direitos das coisas, para Clóvis Beviláqua, “é o complexo das normas
reguladoras das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo
homem. Tais coisas são, ordinariamente, do mundo físico, porque sobre elas é que é
possível exercer o poder de domínio. Todavia, há coisas espirituais que também entram
na esfera do direito patrimonial, como é o direito dos autores sobre as suas produções
literárias, artísticas ou científicas”. (BEVILÁQUA apud RIZZARDO, 2014).
Já os Direitos Reais, na explicação de Tartuce (2017), conceitua-se “como sendo as
relações jurídicas estabelecidas entre pessoas e coisas determinadas ou determináveis, tendo como
fundamento principal o conceito de propriedade, seja ela plena ou restrita.”
Neste sentido, “a diferença substancial em relação ao Direito das Coisas é que este constitui
um ramo do Direito Civil, um campo metodológico. Já os Direitos Reais constituem as relações
jurídicas em si, em cunho subjetivo.” (TARTUCE, 2017)
Na doutrina brasileira, segundo Tartuce (2017), utilizam o termo Direitos Reais: Caio
Mário da Silva Pereira, Orlando Gomes, Sílvio de Salvo Venosa, Marco Aurélio S. Viana,
Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald. Direito das Coisas é usado por Lafayette
Rodrigues Pereira (o famoso Conselheiro Lafayette), Clóvis Beviláqua, Silvio Rodrigues,
Washington de Barros Monteiro, Maria Helena Diniz, Arnaldo Rizzardo, Carlos Roberto
Gonçalves, Marco Aurélio Bezerra de Melo, Paulo Lôbo, Luciano de Camargo Penteado e Álvaro
Villaça Azevedo, e o próprio Flávio Tartuce.
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O livro III do Código Civil – Direitos das Coisas – abrange os direitos reais
propriamente ditos (art. 1.225, CC), a posse e os direitos de vizinhança1.
Assim, o objeto dos direitos reais (ou do direito das coisas), no Código Civil, são
bens corpóreos (haja vista a forma de aquisição – registro e tradição) passíveis de
apropriação e que tenham função de utilidade para o sujeito (valor econômico).
Se faltar o requisito corporeidade, a lei deve prever, expressamente, os modos de
transferência específicos ou qual o direito real que pode se exercer sobre determinados
bens imateriais, como, por exemplo, usufruto sobre universalidades e direitos reais de
garantia sobre direitos ou títulos de crédito. Além disso, no caso dos direitos autorais,
considerados como propriedade imaterial, existe legislação específicas, reconhecendo,
também, o seu aspecto moral, decorrente da personalidade do autor.
Estão excluídos dos direitos reais aqueles bens/coisas que a utilização é inesgotável,
como as destinadas ao uso comum da humanidade: o ar, a luz solar, o oceano e os bens
públicos. Esses não interessam ao Direito das Coisas.
O direito real significa o poder da pessoa sobre a coisa, numa relação que se
estabelece diretamente e sem intermediário, que se exerce erga omnes. De outro lado, o
direito de crédito (ou pessoal) requer sempre a interposição de um sujeito passivo,
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“Os direitos reais, no sistema brasileiro, são uma classe de direitos subjetivos dotada de certas e
determinadas características bastante particulares. São os direitos elencados no CC 1.225 (...). A posse, no
Brasil, como se verá no seu momento oportuno não é regulada como direito real. (...) Sendo assim, como
esta disciplina estuda a posse e os direitos reais, melhor se denomina como direito das coisas,
compreendendo assim um ramo do direito objetivo que regula os processos apropriatórios, tanto do ponto
de vista dos fatos, quanto do ponto de vista dos direitos”. (PENTEADO, 2008, p. 71-72).
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Entretanto, segundo Farias e Rosenvald (2015), no atual estágio da ciência do Direito não cabe mais
enaltecer essa dicotomia entre os dois grandes direitos subjetivos patrimoniais, pois, da mesma forma que
houve uma relativização da sacralidade da propriedade, também houve uma flexibilização do princípio da
relatividade das obrigações. Por outro lado, todos os manuais de direitos reais (direito das coisas) ainda
mantêm a explicação sobre suas principais diferenças.
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devedor da prestação (dar, fazer ou não fazer), ou seja, opõe-se unicamente a determinada
pessoa.
Neste sentido, no direito real (jus in re – direito à coisa) o direito tem por objeto,
imediata e diretamente, a própria coisa. Quem tem direito real, o tem independentemente
da participação de outra pessoa.
No direito pessoal (jus ad rem – direito a uma coisa) o direito só é satisfeito por
intermédio da pessoa do devedor. O devedor, cumprindo a obrigação, presta colaboração
para a realização do direito.
No direito real, a participação de outra pessoa, que não seja o titular do direito, terá
caráter de oposição, porque, sendo o direito real um poder jurídico direto e imediato sobre
a coisa, somente interfere outra pessoa no quadro próprio dele para embaraçar-lhe o
exercício. No direito pessoal (de crédito, obrigacional), a pessoa que não seja o titular do
direito aparece como colaborador; no direito real, aparece como opositor. (RIZZARDO,
2014).
De acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2015, p. 29) “a doutrina denominada
dualista ou clássica mostra-se, com efeito, mais adequada à realidade, tendo sido por isso
acolhida no direito positivo brasileiro, que ‘consagra e sanciona a clássica distinção entre
direitos reais e pessoais, isto é, direito sobre as coisas e direitos contra as pessoas’”.
Por outro lado, segundo Luciano Penteado (2008), a teoria realista de defesa e
proteção da liberdade individual que se projeta sobre as coisas (relação entre sujeito de
direito e coisa) se encontra superada.
Esta teoria não aceita uma relação jurídica diretamente entre a pessoa do sujeito e a
própria coisa. A relação jurídica se desenvolve sempre entre duas pessoas (premissa
kantiana), ou entre dois sujeitos: o ativo e o passivo.
No direito de crédito há dois sujeitos em confronto: o sujeito ativo e o sujeito
passivo, que se vincula ao primeiro e lhe deve a prestação. A relação jurídica se forma
entre pessoas determinadas.
No direito real existe um sujeito ativo, o titular do direito real, e há uma relação
jurídica, que não se estabelece com a coisa, pois esta é objeto do direito, mas tem a
faculdade de opô-la erga omnes. Assim, estabelece-se a relação jurídica entre o sujeito
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ativo (titular do direito real) e o sujeito passivo (a generalidade anônima dos indivíduos
ou sujeito passivo universal). O sujeito passivo universal tem que se abster à prática de
qualquer ato tendente a lesar o proprietário. Está obrigado a respeitar o direito do titular.
A distinção também pode ser percebida pela análise da pretensão decorrente da
violação do direito subjetivo. “Nos direitos reais a pretensão decorre da ofensa a direitos
absolutos, enquanto nos direitos obrigacionais, materializa-se a pretensão quando aquele
que deveria cumprir a prestação (direito relativo) viola o direito subjetivo ao crédito.”
(FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 23).
Segundo Arnaldo Rizzardo (2014) esta teoria não se mostra prática:
Flávio Tartuce (2020), assim como Farias e Rosenvald (2015), coloca em dúvida
essa tradicional dicotomia apresentada no quadro acima, salientando que existem
conceitos híbridos, que estão em um ponto intermediário entre os direitos pessoais e os
direitos reais. Como veremos na Unidade II, a própria Posse é objeto de intenso debate
sobre sua natureza jurídica.
Outro exemplo são as obrigações reais ou propter rem, que segundo Tartuce (2020)
também são denominadas de obrigações híbridas ou ambulatórias. Essas obrigações
pessoais recaem sobre uma pessoa (devedor) por força de determinado direito real e
aderem/acompanham à coisa. Pode-se citar como exemplo a obrigação imposta aos
proprietários e inquilinos de um prédio de não prejudicarem a segurança, o sossego e a
saúde dos vizinhos (art. 1.277, CC); obrigação dos donos de imóveis confinantes, de
concorrerem para as despesas de construção e conservação de tapumes divisórios (art.
1.297, § 1º, CC).
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3.1 Direito real sobre coisa própria: propriedade (jus in re propria) - direito real pleno.
3.2 Direitos reais sobre coisa alheia ou direitos limitados (jus in re aliena)
a) direitos reais de gozo e fruição: servidão, usufruto, uso, habitação, direito de
superfície, concessão de uso especial para fins de moradia, concessão de direito real de
uso3, laje4. (Enfiteuse e renda constituída sobre imóvel – CC/1916).
b) direitos reais de garantia: hipoteca, anticrese, penhor, propriedade fiduciária
(alienação fiduciária em garantia).
c) direito real à aquisição: promessa irrevogável de compra e venda; o devedor
fiduciante, seu cessionário ou sucessor também passaram a ter direito real de aquisição
nos termos do art. 1.368-A, que foi incluído no Código Civil pela Lei n. 13.043/14.
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Essas duas formas de concessões foram inseridas como direitos reais, pela Lei n. 11.481/07, no art. 1.225
do Código Civil. São medidas voltadas à regularização fundiária de interesse social em imóveis da União,
buscando novas soluções para a moradia no País. Farias e Rosenvald (2009, p. 11) esclarecem que esses
dois modelos jurídicos já faziam parte da legislação especial. A Lei n. 11.481/07 cuidou apenas de
sistematizá-los no rol taxativo do Código Civil. Ao contrário dos demais direitos reais, não foram dedicados
títulos específicos a estas duas figuras, que, portanto, permanecem submetidas às legislações que lhe deram
origem. A inserção da concessão especial para fins de moradia atende a uma evolução legislativa que
iniciou no art. 183, § 1º da Constituição Federal, passando pela MP n. 2220/2001, artigo 56 do Estatuto da
Cidade e art. 167 da Lei de Registros Públicos. Já a concessão de direito real de uso remete ao contrato
administrativo de direito real do art. 7º do Decreto-lei n. 271/67.
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O direito real de laje foi inserido no Código Civil (art. 1.225, XIII e art. 1.510-A) através da Medida
Provisória n. 759, de 22/12/2016, convertida na Lei n. 13.465, de 11/07/2017, que dispõe, entre outras
medidas, da regularização fundiária rural e urbana.
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Duas teorias são os grandes marcos sobre o conceito de posse e seus elementos:
b) Teoria objetiva, formulada por Rudolf Von Ihering (1818-1892). Ihering foi
aluno de Savigny na Faculdade de Direito de Berlim. Na teoria objetiva “a posse não é
reconhecida como modelo jurídico autônomo, pois o possuidor seria aquele que concede
destinação econômica à propriedade, isto é, visibilidade ao domínio. A posse é a porta
que conduziria à propriedade, um meio que conduz a um fim” (FARIAS; ROSENVALD,
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2015, p. 37). Para Ihering a proteção da posse tem como único fundamento a defesa
imediata da propriedade, pois, na maioria dos casos, coincidem no mesmo titular.
Ihering caracteriza a posse da seguinte forma:
Corpus: relação exterior (imagem) que normalmente há entre o proprietário e sua
coisa, não sendo exigido o poder físico imediato, mas o uso econômico da mesma em
relação às necessidades do possuidor de acordo com sua utilidade econômica.
Prevalece a conduta de dono, ou seja, a maneira como o proprietário age em face da
coisa, o que pode ser analisado de forma objetiva, sem a necessidade de saber a intenção
do agente. “A posse, então, é a exteriorização da propriedade, a visibilidade do
domínio, o uso econômico da coisa. Ela é protegida, em resumo, porque representa a
forma como o domínio se manifesta” (GONÇALVES, 2015, p. 51).
Animus domini: está inserido no elemento corpus, na medida em que o possuidor
direciona sua vontade para o procedimento externo, não necessariamente de ser
proprietário. A posse é reconhecida exteriormente. Desta forma, admite-se a posse por
outrem, já que não se exige a intenção de dono para que alguém seja possuidor.
De acordo com essa teoria, se alguém subtrai a coisa, por exemplo um ladrão,
obtém posse injusta, mas, se o proprietário livremente transfere o poder de fato, o
possuidor obtém posse justa. Assim, independentemente da condição de proprietário,
possuidor é quem concede destinação econômica à coisa, isto é, visibilidade ao domínio.
A fórmula de Jhering é P = C, indicando que a posse é reconhecível externamente
por sua destinação econômica, independentemente de qualquer manifestação volitiva do
possuidor, sendo suficiente que ele proceda em relação à coisa como se comportaria o
proprietário em relação ao que é seu, mesmo reconhecendo o domínio alheio.
Pela teoria objetiva amplia-se o rol dos possuidores, estendendo-se a proteção
possessória àqueles que se conduzem como presumíveis proprietários, podendo esses
agirem por conta própria.
Já a detenção, na teoria objetiva, é uma posse degradada, desqualificada em virtude
de lei. As hipóteses no CC/2002 são: fâmulo/servidor da posse (art. 1.198); atos de
violência e clandestinidade (art. 1.208); permissão e tolerância (art. 1.208).
Aqueles considerados meros detentores na teoria clássica, são considerados
possuidores pela teoria objetiva. Outrossim, por dispensar a intenção de dono, a teoria
objetiva consagra a admissibilidade da coexistência das posses direta e indireta.
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O Código Civil, em seu art. 1.196, adota a teoria objetiva da posse. Assim,
necessário é que se manifeste como estado de fato visível a toda sociedade (corpus), de
acordo com o hábito normal dos proprietários, o qual é decorrência de atividades
dirigidas a esse propósito (animus) pelo possuidor. “Pela letra do legislador, o possuidor é
quem, em seu próprio nome, exterioriza alguma das faculdades da propriedade, seja ele
proprietário ou não.” (FARIAS e ROSENVALD, 2009, p. 40).
Assim, quem usar, fruir, dispor ou reivindicar uma coisa (faculdades do proprietário
– art. 1.228, CC) é considerado possuidor. “Basta a presença de um dos atributos da
propriedade para que surja a posse. Em outras palavras, pela atual codificação, todo
proprietário é possuidor, mas nem todo possuidor é proprietário.” (TARTUCE, 2017)
Há exceção quanto à teoria objetiva no Código Civil apenas em relação à
usucapião (art. 1.238, 1.242, CC), com uma nítida concessão à teoria subjetiva, que
requer o animus domini de Savigny.
Neste sentido, a distinção entre posse e detenção não depende exclusivamente do
arbítrio do sujeito. Há que se examinar em cada caso se o ordenamento protege a relação
com a coisa. Quando não houver proteção, existe mera detenção, como nos casos do art.
1.198 (fâmulo/servidor da posse) e do art. 1.208, ambos do Código Civil, situações em
que o próprio legislador excluiu a posse.
Assim, o conceito amplo de posse, descrito no art. 1.196 do CC, deve ser
examinado em consonância com o art. 1.198 e, também, com a ressalva do art. 1.208.
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(...) que, nos dias atuais, as teorias de Savigny e Ihering não são mais capazes
de explicar o fenômeno possessório à luz de uma teoria material dos direitos
fundamentais. Surgiram ambas em momento histórico no qual o fundamental
era a apropriação de bens sob a lógica do ter em detrimento do ser. Ambas as
teorias se conciliavam com a lógica do positivismo jurídico, na qual a posse se
confina no direito privado como uma construção científica, exteriorizada em
um conjunto de regras herméticas. (FARIAS, ROSENVALD, 2015, p. 40)
os direitos reais imobiliários apenas nascem com o registro. A posse pode resultar de uma
relação obrigacional, como um contrato de locação, comodato ou arrendamento. Nestes
casos, não há dúvida que a posse direta não pode ser conceituada como direito real.
Uma corrente minoritária, representada por Caio Mário da Silva Pereira e
Orlando Gomes, afirma que a posse é direito real, com todas as suas características:
oponibilidade erga omnes, indeterminação do sujeito passivo, incidência em objeto (não
em uma prestação) obrigatoriamente determinado, sujeição direta e imediata do objeto ao
titular (o possuidor atua imediatamente sobre a coisa, sem necessidade da colaboração de
terceiros), etc.
Para as teorias sociológicas da posse, tutela-se a posse como direito pessoal especial
– inserido entre os direitos de personalidade – em atenção à superior previsão
constitucional do direito primário à moradia (art. 6º, CF) e o acesso aos bens vitais
mínimos hábeis a conceder dignidade à pessoa humana (art. 1º, III, CF). “A oponibilidade
erga omnes da posse não deriva da condição de direito real patrimonial, mas do atributo
absoluto e extrapatrimonial da proteção da moradia como local de resguardo da
privacidade e desenvolvimento da personalidade do ser humano e da entidade familiar.”
(FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 48)
As modernas teorias sociológicas da posse procuram demonstrar que a posse não é
um apêndice da propriedade, ou a sua mera aparência. Trata-se de um fenômeno de
relevante densidade social, com autonomia em relação à propriedade e aos direitos reais.
Assim, a posse deve ser protegida por ser um fim em si mesma, não a projeção de
um outro direito pretensamente superior (propriedade). A posse é protegida por sua
função social determinante e não pelos seus eventuais efeitos (acesso aos interditos
possessórios e usucapião). Também este o entendimento que foi proferido na V Jornada
de Direito Civil (08 a 10/11/2011), através do Enunciado n. 492:
4 Objeto da posse
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O grande defensor desta ideia no direito brasileiro foi o advogado Ruy Barbosa. “No Brasil, por influência
de RUY BARBOSA, os interditos possessórios chegaram a ser utilizados para a defesa de direitos pessoais,
incorpóreos, como o direito a determinado cargo. O Governo da República suspendera por três meses, com
privação dos vencimentos, dezesseis professores catedráticos da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, por
se haverem rebelado contra uma decisão do diretor desse estabelecimento de ensino, criando embaraços ao
seu regular funcionamento. Esses professores, tendo RUY BARBOSA como seu advogado, requereram e
obtiveram um mandado de manutenção de posse para que fossem mantidos no exercício dos seus cargos. O
governo insurgiu-se contra esse ato judicial e declarou que não reconhecia a legitimidade desse mandado.
(...) Defendeu ele [Ruy Barbosa] a tese de que cabia ação possessória porque havia direito de posse ligado à
coisa, uma vez que o professor não poderia exercer seu direito senão em determinado lugar, ou seja, numa
escola.” (GONÇALVES, 2017, p. 68)
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(software), que confere outros meios processuais ao titular. Assim, pode-se afirmar que a
existência do direito de propriedade não importa a afirmação da posse sobre direitos
autorais (FARIAS; ROSENVALD, 2015).
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5 Desdobramento da Posse
Os possuidores também defendem sua posse um contra o outro, mesmo que o art.
1.197 do CC enuncie apenas que pode “o possuidor direto defender a sua posse contra o
indireto”, pois, por exemplo, se o possuidor direto oferece resistência à devolução da
coisa no termo final para restituição, o possuidor indireto pode adotar ação possessória
contra aquele.
O desdobramento da posse pode comportar uma verticalização em vários graus,
concebendo-se, assim, uma tripartição da posse. Todavia, a posse direta será sempre uma,
isto é, caberá àquele que mantiver atuação material sobre a coisa. A posse indireta pode
ser fracionada. Ex.: Locador/Locatário (possuidores indiretos) – Sublocatário (possuidor
direto).
6 Classificação da Posse
A POSSE JUSTA é aquela cuja aquisição não repugna ao direito, isenta de vícios
de origem, posto não ter sido obtida pelas formas enunciadas no art. 1.200 do CC.
A POSSE INJUSTA OU ILEGITÍMA é a que se instala por modo proibido e
vicioso8. É adquirida pelo esbulhador. Subdivide-se em três categorias:
a) posse violenta: adquire-se pelo uso da força (vis absoluta) ou pela ameaça (vis
compulsiva). É a posse daquele que expulsa o legítimo possuidor da coisa. Importa a
agressão física ou intimidação contra quem esteja protegendo a posse (ver também art.
161, II, CP (esbulho possessório).
Se o possuidor agredido reagir prontamente ao ato de violência, ainda não haverá
posse violenta (injusta). Esta só se concretizará no instante em que cessar a reação de
defesa, isto é, quando o possuidor esbulhado não mais resistir à ocupação (art. 1.208; art.
1.210, §1º CC).
b) posse clandestina: é a posse que se constitui às escondidas. É a posse do invasor
que se apossa da coisa sem o consentimento do dono. É necessário demonstrar que o
arrebatador deseja camuflar o ato de subtração daquele que é esbulhado, praticando
8
A posse injusta do art. 1.200, CC é caracterizada em sentido estrito, cabendo para defesa da posse as ações
possessórias. A posse injusta do art. 1.228, CC é caracterizada em sentido amplo e, neste caso, a ação para
defesa da posse será a ação reivindicatória.
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Pode-se fazer um paralelo com o Direito Penal: posse violenta (art. 157, CP –
roubo); posse clandestina (art. 155, CP – furto) e posse precária (art. 168, CP –
apropriação indébita).
(...) daquele que adquire a posse de um terreno por meio de prática de vício de
consentimento, logrando êxito em obter a aquisição da propriedade mediante
um título aquisitivo. Terá posse justa, eis que não se prevaleceu de violência,
clandestinidade ou precariedade para iniciar a posse. Todavia, patente a má-fé
na conduta eivada de dolo, fraude ou coação. (FARIAS; ROSENVALD, 2009,
p. 116)
Aplicação prática da distinção entre a boa-fé e a má-fé na posse: arts. 1.214, 1.219 e
1.242, CC.
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Código Civil, Art. 1.233. Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo
possuidor.
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Justo título é o título hábil, apto a conferir ou transferir o domínio e a posse, e que
realmente a transferiria se não possuísse um vício qualquer, quanto à forma ou aos
requisitos legais exigidos à sua validade. Leva-se em consideração a faculdade abstrata de
transferir. Por exemplo, um testamento pelo qual alguém recebe um imóvel, ignorando
que o ato é nulo. Não obstante o vício, é hábil para transmitir-lhe a crença de que o
adquiriu legitimamente. Uma escritura de compra e venda, devidamente registrada é um
título hábil para a transmissão do imóvel. No entanto, se o vendedor não era o verdadeiro
dono (aquisição a non domino) a aquisição não se aperfeiçoa e pode ser anulada.
Entretanto, a posse do adquirente presume-se ser de boa-fé, porque calcada em justo
título (art. 1.201, parágrafo único).
Segundo Cláudia Cimardi (2008), “é justo o título que poderia ser causa de
transferência do domínio, mas que, em razão de um defeito ou da ausência de algum
requisito, não pode produzir o efeito jurídico da transmissão.” (p. 50). Pode ser tanto
aquele existente, mas defeituoso, como aquele inexistente que o possuidor reputa como
tal.
O justo título configura estado de aparência que permite concluir estar o sujeito
usufruindo de boa posse, ou seja, o induz a erro. Essa é a justificativa para considerar o
possuidor com justo título, presumivelmente (presunção relativa) possuidor de boa-fé (art.
1.201, par. único, CC).
Sobre a matéria é importante ressaltar os Enunciados da IV Jornada de Direito Civil
(2006), abaixo transcritos:
302 – Art.1.200 e 1.214. Pode ser considerado justo título para a posse de boa-
fé o ato jurídico capaz de transmitir a posse ad usucapionem, observado o
disposto no art. 113 do Código Civil.
Posse nova é aquela adquirida há menos de ano e dia. Posse velha é aquela
adquirida há de ano e dia ou mais. O decurso do prazo tem o fim de consolidar a situação
de fato, permitindo que a posse seja considerada isenta dos defeitos da violência e da
clandestinidade, embora tal isenção possa ocorrer antes.
A fixação deste prazo pode estar relacionada ao tempo de plantio e colheitas:
Posse ad interdicta é aquela que pode ser defendida pelos interditos possessórios,
quando molestada, mas não conduz à usucapião. Exemplo: o locatário vítima de ameaça
ou de efetiva turbação ou esbulho.
Posse ad usucapionem é a que se prolonga por determinado lapso de tempo
estabelecido na lei, possibilitando ao seu titular a aquisição da propriedade. Deve-se
ressaltar que a aquisição da propriedade por usucapião exige outros requisitos: o exercício
de maneira mansa e pacífica, o animus domini e, na usucapião ordinária, a boa-fé e o
justo título.
6.7 Composse
7 Detenção
Para Savigny, detenção é a ausência de animus domini por parte daquele que detém
o poder físico sobre a coisa. Já a teoria de Jhering diferencia detentor e possuidor pela
regulamentação do direito objetivo.
Pode-se conceituar detenção, de acordo com o direito civil brasileiro, como a posse
degradada, vez que juridicamente desqualificada pelo ordenamento vigente. Em algumas
situações, alguém que possui poder fático sobre a coisa (o detentor) não tem a proteção
jurídica, porque assim entendeu o legislador. “Somente a posse gera efeitos jurídicos,
conferindo direitos e pretensões possessórias em nome próprio: esta a grande distinção”.
(GONÇALVES, 2015, p. 63).
São hipóteses de detenção previstas no Código Civil:
a) servidores ou fâmulos da posse: art. 1.198. Exercitam atos de posse em nome
alheio como mero instrumento da vontade de outrem. Não é necessária a existência de
contrato formal de trabalho ou remuneração como contraprestação aos serviços
praticados. Basta visualizar um vínculo social de subordinação pelo qual alguém atua
materialmente sobre a coisa, porém sem autonomia.
Pode ocorrer de o fâmulo da posse ser demandado em ação possessória, porque o
autor o considerava como possuidor, sem saber sua verdadeira relação de detenção com a
coisa. Neste caso, o fâmulo da posse deverá apresentar a contestação e alegar sua
ilegitimidade (art. 337, XI, CPC/15), indicando o sujeito passivo da relação jurídica
discutida, sempre que tiver conhecimento (art. 339, CPC/15). O juiz facultará ao autor a
alteração da petição inicial, com a substituição do réu, no prazo de 15 dias (art. 338,
CPC/15).
prová-la é aquele que deseja demonstrar que o usuário agiu como detentor e não como
possuidor. Exemplo: uso da vaga de garagem do vizinho.
pública, alienáveis, podendo ser objeto de posse autônoma e de contratos regidos pelo
Código Civil (locação, arrendamento). A única restrição é a usucapião10.
10
Independentemente da espécie, nenhum bem público pode ser objeto de usucapião de acordo com o art.
102 do Código Civil.
35
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11
Neste caso, a função social da propriedade passa a ser exercida pelo precarista ao conceder destinação
econômica ao bem em nome próprio. Prevalece o direito fundamental social de moradia.
12
Enunciado 301 – Art.1.198. c/c art.1.204. É possível a conversão da detenção em posse, desde que
rompida a subordinação, na hipótese de exercício em nome próprio dos atos possessórios. (IV Jornada de
Direito Civil – 2006).
36
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Conforme a teoria objetiva adotada pelo Código Civil, possuidor é aquele que tem
de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade13. Assim,
qualquer um que esteja nessa situação terá adquirido a posse (art. 1.204, CC).
O art. 1.205, CC estabelece os sujeitos de aquisição da posse, que são mais comuns
na aquisição da posse civil: I) a própria pessoa que a pretende ou seu representante; II)
por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.
A posse pode ser adquirida em virtude de sucessão inter vivos (accessio
possessionis) e mortis causa (successio possessionis)14.
Assim, quando o possuidor falece, seus herdeiros passam imediatamente à posição
de possuidor, independentemente da manifestação de vontade do interessado (princípio
da saisine, art. 1.784, CC). Assim, o herdeiro passa a exercer a posse com as mesmas
características que o possuidor falecido (art. 1.206, CC). “De modo que, se a posse
daquele era viciada ou de má-fé, a posse do sucessor é viciada e de má-fé.”
(GONÇALVES, 2017, p. 115).
O art. 1.207 trata da união de posses nos casos de aquisição por sucessão:
13
De acordo com o art. 1.228, CC: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o
direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”
14
A sucessão mortis causa pode ser universal e a título singular. No primeiro caso o herdeiro é chamado a
suceder na totalidade da herança, fração ou porcentagem dela. Pode ocorrer tanto na sucessão legítima (art.
1.829, CC) como na testamentária. A título singular o testador deixa ao beneficiário um bem certo e
determinado, denominado legado.
37
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A perda da posse se dá no momento em que cessa o poder de agir sobre o bem (art.
1.223, CC). Pode ser através de um ato contrário à vontade do possuidor (esbulho) ou por
sua livre consciência (venda de coisa móvel e sua entrega).
38
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10 Efeitos da posse
15
Quando o proprietário ou possuidor faz obras ou despesas no seu próprio bem não há repercussão para o
direito possessório, por inexistir consequências jurídicas nessa atuação. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p.
145). Esse entendimento é oposto à previsão do art. 97, CC.
16
Não se deve confundir benfeitorias e acessões industriais (construções e plantações). As benfeitorias são
melhoramentos realizados em coisa já existente. As acessões são obras que criam coisas novas, como a
construção de uma casa. As consequências/efeitos são diversas para ambas.
39
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É um dos efeitos mais importantes da posse. Entretanto, será visto como modo de
aquisição da propriedade.
possessória no próprio instituto da posse ou fora dele, como no caso de aceitá-la como
corolário da defesa da propriedade.
Atualmente entende-se que a defesa da posse encontra amparo na constatação de
sua preexistência e na agressão/ofensa ao possuidor, o que corresponde a uma ofensa à
posse.
As ações possessórias stricto sensu ou ações possessórias propriamente ditas
(também chamados interditos possessórios) são aquelas que têm como exclusivo
fundamento a posse e, como pedido principal, a defesa da posse. O que distingue uma
ação da outra é o grau de agressão à posse (art. 1.210, CC):
- interdito proibitório: quando deriva de ameaça;
- ação de manutenção de posse: turbação, a ameaça é intensificada;
- ação de reintegração de posse: esbulho, quando o possuidor é excluído da coisa.
Restitui a posse àquele que a tenha perdido em razão de um esbulho, sendo privado
do poder físico sobre a coisa. “Esbulho é a perda injusta da posse.” (PENTEADO, 2008,
p. 477). Segundo Rizzardo (2014), “pratica esbulho quem priva outrem da posse, de
modo violento ou clandestino, ou com abuso de confiança.”. O esbulho pode ser total ou
parcial, bastando que o possuidor tenha sido mitigado de qualquer parcela de seu poder
de fato sobre a coisa. Além do aspecto civil, o esbulho possessório também está tipificado
na área penal - art. 161, § 1º., II, CP.
Essa ação pode ser intentada pelo possuidor ou seus herdeiros (legitimidade ativa).
41
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20
Enunciado 80. Art. 1.212: É inadmissível o direcionamento de demanda possessória ou ressarcitória
contra terceiro possuidor de boa-fé, por ser parte passiva ilegítima diante do disposto no art. 1.212 do novo
Código Civil. Contra o terceiro de boa-fé, cabe tão somente a propositura de demanda de natureza real. (I
Jornada de Direito Civil/2002).
21
“Assim, considerando que o Sr. Nelson não teve qualquer participação no esbulho sofrido pela apelante,
restou evidenciada, pois, a boa-fé daquele na condição de terceiro adquirente. Por conseguinte, ante a
inviabilidade de se manejar reintegração de posse em face de terceiro que recebeu o bem esbulhado sem ter
ciência de tal fato, outra não era a solução senão a improcedência do pedido contido na exordial, conforme
se depreende de interpretação em sentido contrário extraída do art. 1.212 do Código Civil, bem como
enunciado 80 da I Jornada de Direito Civil.” (Trecho extraído do acórdão referente à AC n. 0004983-
42.2012.8.26.0642 – TJSP).
42
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22
“Ocorre que, em 10/09/2014, os requerentes tiveram invadida a sua área, de tal sorte que, por meio de
esforço imediato, retomaram a posse da mesma, reerguendo os muros que haviam sido destruídos (fls.
34/35). Segundo narram, foi noticiada pela mídia uma invasão à área vizinha à sua propriedade, iniciada em
15 de agosto daquele ano, na Rua Vemag, nas proximidades do Shopping Central Plaza e do Linhão de São
Caetano do Sul, em imóvel de propriedade das empresas Savoi Construtora e Saven, sendo certo que o
imóvel dos autores foi esbulhado em continuação à citada ocupação, tendo havido a necessidade de sua
retomada imediata, conforme consta do Boletim de Ocorrência supramencionado (fls. 36/42).” (Extraído do
acórdão referente à AC n. 1005985- 96.2014.8.26.0565 – TJSP).
23
“Aduz a agravada na petição inicial da ação de interdito proibitório que o ora agravante ameaçou sua
posse, com o uso de facão, retirando seus pertences do imóvel mencionado na inicial. O próprio agravante,
agora em sua minuta recursal, confessou que “... cansado de pedir a retirada dos guarda-sóis, cadeiras e
holofotes, subiu com um facão no coqueiro para tirar os holofotes ele mesmo, bem como os demais
pertentes da requerente” (fls. 06). Patente, pois, a ameaça ao direito possessório discutido na ação principal,
sendo mesmo o caso de ser concedida a tutela de urgência pretendida, para manter a agravada na posse do
imóvel e determinar que o agravado retire seus pertentes do local.” (Extraído do acórdão referente ao AI n.
2037386-40.2017.8.26.0000 – TJSP).
45
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Legítima defesa da posse e desforço imediato: são medidas que o possuidor está
autorizado a adotar de imediato para recuperar ou manter a posse agredida (art. 1.210, §
1º, CC). Trata-se de exceção à quebra do monopólio do Judiciário em virtude de reação
urgente a um atentado em face de uma situação subjetiva consolidada.
A legítima defesa é a reação a uma turbação, pois nessa situação a agressão apenas
incomoda a posse, não tendo o possuidor, ainda, perdido a posse. O desforço imediato
dirige-se ao esbulho consumado, implicando reação imediata à injusta perda da posse do
autor.
Ambos devem ser praticados logo em seguida à agressão24, observando-se o
princípio da proporcionalidade e razoabilidade da repulsa, ou seja, como defesa privada
excepcional, deve ser moderada, pois, caso contrário, poderá a conduta do possuidor se
converter em ato ilícito (art. 345, CP – exercício arbitrário das próprias razões). Exemplo:
Proprietários rurais e MST.
De acordo com entendimento na V Jornada de Direito Civil (08 a 10/11/2011), o
detentor também pode exercer a autodefesa, no interesse do possuidor, conforme
enunciado abaixo:
Assim, por exemplo, o caseiro que venha a exercer a autodefesa para garantir a
posse do sítio que está sob seus cuidados, visando o interesse do possuidor daquele bem.
24
V Jornada de Direito Civil (2011) – Enunciado 494: No desforço possessório, a expressão “contanto que
o faça logo” deve ser entendida restritivamente, apenas como a reação imediata ao fato do esbulho ou da
turbação, cabendo ao possuidor recorrer à via jurisdicional nas demais hipóteses.
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25
O CPC/15 trouxe as tutelas provisórias (art. 294 e seguintes), que se dividem em tutela de urgência e
tutela de evidência. A tutela de urgência pode ser de natureza antecipada (art. 300, § 3º, CPC) ou de
natureza cautelar (art. 301, CPC).
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Assim, será feita a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local,
mais a citação por edital dos demais, conforme os §§ 1º e 2º do art. 554 do CPC/15. Esta
citação pessoal será realizada de forma genérica, pois é impossível ao oficial de justiça
realizá-la quando houver uma coletividade. O § 1º do art. 554 do CPC ainda prevê a
necessidade de intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de
hipossuficiência econômica, como na maioria desses casos, será intimada a Defensoria
Pública.
O § 3º do art. 554 do CPC trata de meios complementares de divulgação da ação
possessória, a fim de viabilizar as informações aos ocupantes.
Além disso, o art. 565, CPC/15, regula o litígio coletivo pela posse de imóvel, com
a designação de audiência de mediação antes de deferir a liminar, em ações possessórias
de força velha, bem como a intimação do Ministério Público. A Defensoria Pública
também será intimada quando houver parte beneficiada pela justiça gratuita.
Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana dos entes estatais
onde se situe a área objeto do litígio também poderão ser intimados para a audiência, a
fim de manifestar interesse no processo e sobre a existência de possibilidade de solução
para o conflito possessório.
O mero detentor não é legitimado passivo para a causa, cabendo-lhe alegar a
ilegitimidade passiva em contestação (art. 337, XI, CPC/15) e, se tiver conhecimento do
sujeito passivo da relação, indicá-lo (art. 339, CPC/15).
Quanto à legitimidade, também é importante à menção ao art. 73, CPC/15, sobre o
litisconsórcio passivo necessário dos cônjuges nas ações que versem sobre direitos reais
imobiliários. As ações possessórias, para a maioria da doutrina e jurisprudência, não são
ações reais (natureza jurídica da posse). Desta forma, não se aplica às ações possessórias
o caput e o § 1º do art. 73, CPC/15, mas apenas o seu § 2º.
g) Natureza dúplice das ações possessórias (art. 556, CPC/15). Dúplices são as
ações em que não se vislumbra predeterminação de legitimação ativa e passiva, isto é, o
autor da demanda pode ser réu e vice-versa. O inverso das ações dúplices são as ações
simples, nas quais “há nítida diferença de atitudes de cada parte: só o autor pede; e o réu
apenas resiste ao pedido do autor. Somente por meio de reconvenção é que se torna
possível ao réu a formulação de pedido contra o autor. Mas aí o que se tem não é mais
50
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defesa, e sim a propositura de nova ação, dentro dos autos já existentes.” (THEODORO
JÚNIOR, 1998, p. 157)
Assim, o réu da ação possessória pode usar a própria contestação para alegar que a
sua posse é que foi ofendida, e demandar, contra o autor, a proteção possessória.
Há uma ampliação do objeto litigioso, pois o réu formulará um pedido na
contestação. A posse do réu, caso vitorioso terá caráter de coisa julgada, pois a sentença
será formalmente una e materialmente dúplice.
Quanto à possibilidade do réu requerer medida liminar no seu pedido contraposto,
há entendimentos divergentes. Para aqueles que entendem não ser possível, as razões são:
1) por ser desnecessária quando o autor não a obteve liminarmente ou na audiência
de justificação; ou
2) pela preclusão, pois na contestação não cabe pedido de liminar possessória (art.
562, CPC). Neste caso, cabe defender para o réu o pedido de tutela de urgência de
natureza antecipada (art. 300, CPC/15), pois, neste momento (contestação), o
procedimento já passou a ser comum (arts. 564 e 566, CPC) e não há via específica
satisfativa em prol do réu.
É uma ação executiva lato sensu, uma vez que a sentença de procedência não exige
posterior cumprimento, conforme procedimento específico, sendo cumprida mediante a
expedição de mandado de imissão de posse, independentemente de citação do réu para
cumprimento da decisão judicial.
26
Há entendimento em sentido contrário, preconizando o aproveitamento da ação como demolitório, já que,
concluída a obra não há o que embargar. Após a conclusão da obra o vizinho tem prazo decadencial de ano
e dia, após a conclusão da obra, para pedir sua demolição (art. 1.302, CC).
57
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d) Embargos de terceiro
É ação de procedimento especial, prevista nos arts. 674 ao 681, CPC/15, destinada
àquele que, não sendo parte num processo de conhecimento, em cumprimento de
sentença ou de execução, sofre turbação ou esbulho da posse de seus bens, em
decorrência de determinação judicial.
É admitida a oposição de Embargos de terceiro pelo promitente comprador do
imóvel, ainda que o contrato não esteja registrado, nos termos da Súmula 84 do STJ.
O seu objetivo é a desconstituição da constrição judicial desfavorável ao terceiro.
É ação possessória (mas não em sentido estrito), pois é o meio normal para o
terceiro defender sua posse. Seu fundamento pode ser, inclusive, a posse em si mesma
considerada, ou seja, o ius possessinis. Por outro lado, os embargos de terceiro também
podem ter como fundamento o domínio e, até mesmo, direitos de natureza creditória.
Desta forma, os embargos de terceiro podem comportar lides envolvendo o ius
possessionis ou o ius possidendi.
Sendo os embargos julgados procedentes, o juiz mandará expedir o mandado de
manutenção ou reintegração de posse.
III PROPRIEDADE
1 Introdução
Por muito tempo o Direito das Coisas manteve-se fiel à tradição romana e aos
princípios individualistas. O direito de propriedade é reconhecido como o mais
importante e mais sólido de todos os direitos subjetivos outorgados ao indivíduo.
Entretanto, esse direito vem sofrendo profundas alterações. O primeiro fator para
isso é a preponderância do interesse público sobre o privado. Assim, antes a propriedade
era entendida, simplesmente, como a relação privada e individual, de caráter sagrado e
absoluto. Não havia qualquer restrição ao livre exercício desse direito pelo proprietário
(usar, gozar e dispor da coisa). As legislações proclamavam a intangibilidade do domínio
(direito absoluto).
Atualmente, verifica-se que, gradativamente, a concepção individualista foi se
modificando, reconhecendo o interesse público sobre o privado. O interesse público, de
conteúdo social, veiculado através do direito constitucional e do direito administrativo,
aos poucos foi destruindo os direitos absolutos do proprietário.
Neste desenvolvimento histórico do direito de propriedade, também contribuíram
os progressos do socialismo. Assim, a CR/88 (art. 5º, XXIII e 170, III) prevê a função
social da propriedade e o CC/2002 condena o abuso de direito (art. 187), especificamente
do direito de propriedade (art. 1.228, § 2º). Desta forma, o proprietário pode usar a coisa,
mas sem ferir os direitos dos outros cidadãos. Ex.: plantar árvores, sem aparente utilidade
para o proprietário, apenas para tolher a vista panorâmica do vizinho (ato emulativo - Art.
1.228, §§ 1 e 2, CC).
Assim, a propriedade, hoje, com o atributo da função social, tem de ser geradora
de novas riquezas, de mais trabalho e emprego, tornando-se apta a concorrer para o bem
geral do povo.
certos móveis, como redes, armas e utensílios de uso próprio. O solo pertencia a toda a
tribo.
Assim, a propriedade coletiva foi dando lugar à propriedade privada.
Na Idade Média o principal centro da propriedade eram os feudos, ou seja, a
propriedade era dos senhores feudais e os vassalos tinham o usufruto condicional. Com o
passar do tempo, a propriedade sobre os feudos tornou-se perpétua e transmissível pela
linha masculina. No Brasil, pode-se identificar os feudos nas capitanias hereditárias.
No final do século XVIII vem o fim do feudalismo e a Revolução Francesa
(1789), com o início do Estado Liberal. Neste, a propriedade privada passou a ter o
caráter absoluto, sem a intervenção do Estado nas relações privadas.
Atualmente, pode-se dizer que a configuração da propriedade depende do regime
político adotado pelo país. Entretanto, o que se percebe cada vez mais fortemente, é que a
propriedade individual vem sofrendo restrições, perdendo seu caráter absoluto. Há
limitações oriundas da própria natureza do direito de propriedade ou imposição legal,
como por exemplo: preservação do meio ambiente (art. 225, CF), do patrimônio histórico
(tombamento; art. 216, CF); proteção de áreas indígenas (art. 232, CF); restrições
relativas ao direito de vizinhança, etc.
A finalidade dessas restrições é coibir abusos ou impedir que o direito de
propriedade acarrete prejuízo ao bem-estar social, permitindo, assim, o exercício da
função social da propriedade.
27
Baseado no capítulo 5 – A função social da propriedade – do livro de Gilberto Bercovici, Constituição
econômica e desenvolvimento: uma leitura a partir da Constituição de 1988.
62
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Após essa fase, surgiram as sesmarias, importadas de Portugal. Naquele país elas
se originaram para solucionar uma crise de abastecimento, no século XIV (1375).
“Aquele que não cultivasse ou arrendasse suas terras as perderia, devendo estas ser
distribuídas a outros, tendo em vista o interesse coletivo do Reino. Visavam impedir o
esvaziamento do campo e o desabastecimento das cidades” (BERCOVICCI, 2005). Eram
gratuitas e condicionadas (exigia-se o aproveitamento), sujeitas apenas ao dízimo para
propagação da fé (incidia sobre a produção).
O sistema sesmarial foi transposto, no início do século XVIII, sem adaptação à
realidade brasileira, o que gerou consequências opostas. A necessidade de ocupação e as
possibilidades comerciais do açúcar fizeram a Metrópole desconsiderar o cumprimento
das exigências legais. As concessões não possuíam limites, sendo concedidas áreas
imensas; o mesmo colono, às vezes, era contemplado mais de uma vez. Teve início um
mercado ilegal de compra e venda de sesmarias.
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28
Meia légua quadrada equivale a 2.178 hectares. 1 hectare equivale a 10.000 metros.
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29
Terras devolutas são terras públicas sem destinação pelo Poder Público e que em nenhum momento
integraram o patrimônio de um particular, ainda que estejam irregularmente sob sua posse. O termo
"devoluta" relaciona-se ao conceito de terra devolvida. (CÂMARA DOS DEPUTADOS).
No período colonial, quando o cessionário não preenchia as condições da concessão por sesmaria, as terras
voltavam para a Coroa, isto é, eram devolvidas (devolutas). A partir da Lei de Terras (1850) passou-se a
compreender terra devoluta como a terra vaga, inculta.
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ATIVIDADE COMPLEMENTAR:
2. Assistir ao episódio 1 “The racial wealth gap” (A diferença de riqueza entre brancos e
negros) da série de documentários Explained (Explicando) – 1ª Temporada, disponível
na Netflix ou no Youtube (https://www.youtube.com/watch?v=Mqrhn8khGLM). 16
minutos.
3. Com base nas atividades 1 e 2 acima, elabore uma análise crítica, em no máximo duas
folhas, sobre a desigualdade racial pautada pelo acesso desigual de terra e moradia nos
municípios de Contagem e Belo Horizonte. Utilize, inclusive, dados estatísticos para os
municípios indicados, tendo como referência a pesquisa citada no texto acima (disponível
em: <https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-humanas/negros-e-brancos-de-alta-renda-
moram-em-locais-distantes-e-distintos/>).
30
“Tem sido objeto de larga controvérsia entre juristas, filósofos e sociólogos o fundamento jurídico da
propriedade. Em todos os tempos, muito se discutiu sobre a origem e a legitimidade desse direito”.
(GONÇALVES, 2015, p. 242)
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Pio XI, na Encíclica Quadragésimo Ano, afirma que “o direito de possuir bens
individualmente não provém da lei dos homens, mas da natureza; a autoridade
pública não pode aboli-lo, porém, somente regular o seu uso e acomodá-lo ao
bem do homem”. (GONÇALVES, 2015, p. 244)
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31
O direito obrigacional também é um direito subjetivo patrimonial.
32
Sílvio de Salvo Venosa, por exemplo, entende ser a expressão propriedade voltada apenas para os bens
corpóreos (NCC) e domínio para os bens incorpóreos (direitos autorais – ex.: “cair no domínio público”; ou
“domínio de página da internet”). Outros autores, no entanto, não farão distinção, assim como no antigo
Código Civil.
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Alguns autores entendem que aquelas três primeiras faculdades consistem nos
elementos internos ou econômicos do direito de propriedade, pois por intermédio do seu
exercício é que o proprietário obterá as vantagens pecuniárias decorrentes de sua
titularidade. O direito de reivindicar é denominado elemento externo ou jurídico da
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7.1 Exclusividade
33
O atributo da perpetuidade vem sendo flexibilizado, sendo contestado pelo princípio da função social da
propriedade.
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A Constituição de 1988 garante o direito à propriedade (artigo 5º, XXII), com sua
perpetuidade e exclusividade, desde que esteja cumprindo sua função social (art. 5º,
XXIII). Não subsistirá a propriedade antissocial. No art. 170, CF/88, o legislador
observou a conciliação da propriedade empresarial com a sua função social.
No Código Civil a função social é reconhecida como cláusula geral, isto é, trata de
uma norma imprecisa e vaga, com grande abertura semântica. A vantagem desse tipo de
34
Abuso de direito ou ato emulativo é aquele que não traz qualquer proveito para o agente, mas causa dano
a terceiro. Sobre a teoria do abuso de direito, “Louis Josserand imortalizou na história do direito dois
precedentes franceses da virada do século XIX: o caso da falsa chaminé, julgado pela Corte de Colmar, em
2 de maio de 1855; e o caso Clément-Bayard, apreciado pela Corte de Cassação, em 03.08.1915. Na sua
visão, a edificação de uma falsa chaminé destinada a prejudicar o vizinho constituiu um exemplo célebre
da constatação do abuso de direito, tal qual a instalação de espigões de ferro, com altura de 16 metros, com
o escopo de constranger a empresa de dirigíveis a adquirir o terreno lindeiro. Em ambas as hipóteses, os
Tribunais não poderiam concordar com a atuação dos proprietários, embora as obras tivessem sido
realizadas no próprio terreno e em conformidade com as licenças, uma vez que o seu agir era animado por
uma perspectiva anti-social.” (USTÁRROZ, Daniel. A atualidade da teoria do abuso de direito.
Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2019/01/14/a-atualidade-da-teoria-do-abuso-do-
direito/#_ftnref6>. Acesso em: 01 ago. 2019.
O Código Civil brasileiro adota a teoria do abuso de direito nos arts. 187 e 1.228, § 2º.
77
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redação é a abertura ao influxo contínuo dos valores sociais, sendo sempre atualizada pela
sociedade.
O art. 1.228, § 4.º, CC traz um novo instituto jurídico de aquisição da propriedade
imobiliária, denominado (equivocadamente) como “desapropriação judicial indireta”.
Trata-se da posse qualificada pela função social. Entretanto, o maior problema
encontrado nesse dispositivo são os conceitos jurídicos indeterminados: “extensa área”;
“considerável número de pessoas”; “obras e serviços de interesse social e econômico
relevante”.
Conforme o art. 186, CF, a propriedade rural cumpre sua função social quando
observados três elementos: econômico, social e ecológico.
A propriedade rural tem a terra como bem de produção de riquezas e criação de
empregos. Assim, o ônus social do proprietário de imóvel rural é maior do que o do
proprietário de imóvel urbano.
O art. 184, CF prevê os requisitos que devem ser cumpridos, simultaneamente, pelo
proprietário rural, sob pena de desapropriação por interesse social para fins de reforma
agrária. O art. 185, CF estabelece que a propriedade produtiva também pode vir a ser
desapropriada, se não observados os requisitos do art. 184 da CF.
O Código Civil, no § 1º do art. 1.228, CC prevê a harmonização da propriedade
privada com os princípios sociais pertinentes aos interesses difusos35.
35
Enunciado 506 – Na aplicação do princípio da função social da propriedade imobiliária rural, deve ser
observada a cláusula aberta do § 1º do art. 1.228 do Código Civil, que, em consonância com o disposto no
art. 5º, inciso XXIII, da Constituição de 1988, permite melhor objetivar a funcionalização mediante
critérios de valoração centrados na primazia do trabalho. (V Jornada de Direito Civil/2011)
79
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A CR/88, no art. 170, III, estabeleceu a função social da propriedade, nesta incluída
a empresa. Assim, o CADE - Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Lei n.
8.884/94) deve prevenir os abusos do poder econômico ao suspender processos de
concentração nocivos à sociedade, pelo risco da criação de monopólios capazes de lesar a
concorrência e os consumidores, colocando em risco a livre iniciativa.
10.1 Registro
a) matrícula: tem por finalidade individualizar o imóvel. Pode-se dizer que é a sua
“certidão de nascimento”. Só se modifica com o desmembramento e fusão do imóvel.
36
Título: negócios jurídicos emanados da autonomia privada (contrato de compra e venda, doação, etc.),
bem como sentença de adjudicação, carta de arrematação.
81
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Matrícula
n. 929
Registros
01 e 02 da
matrícula 929
Averbação 03
da matrícula
929
37
Enunciado 624 – Art. 1.247: A anulação do registro, prevista no art. 1.247 do Código Civil, não
autoriza a exclusão dos dados invalidados do teor da matrícula. (VIII Jornada de Direito Civil/2018).
38
STJ, REsp. n. 122.853 – SP – 3.ª Turma – Rel. Min. Ari Pargendler – DJU 07/08/2000.
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Assim, a regra geral é que o registro imobiliário tem presunção relativa. Todavia,
existe uma forma de registro com presunção absoluta. É o chamado registro pelo sistema
Torrens (art. 277 e ss. da Lei n. 6.015/73)39. O título levado a assento no Registro
Torrens tem valor absoluto, ficando resguardado de quaisquer protestos, reclamações,
reivindicações e evicções, como se estivesse revestido com o manto da intangibilidade.
Restringe-se ao registro de imóveis rurais.
Trata-se de um procedimento demorado, difícil e complexo, em que cada registro
requer ação judicial (art. 281, LRP), que pode assumir o caráter de contenciosa,
reivindicatória do imóvel que se pretende registrar, além do elevado custo com
publicação de editais, custas e outras despesas. Talvez por isso, o Torrens não foi bem
acolhido no Brasil. Só o proprietário possui legitimação para requerer esse registro,
mediante comprovação de seu domínio (art. 278, I, LRP).
O registro imobiliário tem como atributos ou efeitos:
Prioridade ou preferência: é a proteção concedida àquele que prenota o
título constitutivo em primeiro lugar no Livro de Protocolo do Registro Imobiliário.
Deve-se verificar a ordem cronológica de apresentação dos títulos. Assim, se uma pessoa
vender o mesmo imóvel duas vezes, a pessoas distintas, considerar-se-á proprietário
aquele que primeiro proceder ao registro imobiliário. Restará ao outro adquirente apenas
ação indenizatória contra o alienante, em face do inadimplemento da obrigação de dar. A
conduta do alienante pode ser considerada crime de estelionato, conforme art. 171, § 2º,
II, CP.
Em certas situações, a prioridade serve para estabelecer a ordem de preferência
quando do resgate de créditos de diversos credores. É o caso da hipoteca, posto que a
vantagem do primeiro credor hipotecário sobre os demais será a faculdade de obter
preferencialmente o pagamento do débito após a venda do bem em leilão. Remanescendo
crédito, porém, os credores que o seguirem na ordem de graduação serão contemplados
(arts. 1.477, 1.478, 1.493 e parágrafo único, do CC).
Força probante: funda-se na fé pública do registro, pois se presume (juris
tantum) pertencer o direito real à pessoa em cujo nome se faz o assento. O registro não
possui eficácia saneadora, como no sistema germânico, e a qualquer tempo toda a cadeia
sucessória poderá ser afastada em face do defeito inicial.
39
Enunciado 502 – É relativa a presunção de propriedade decorrente do registro imobiliário, ressalvado o
sistema Torrens. (V Jornada de Direito Civil/2011)
84
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10.2 Acessão
40
Se o rio for navegável, a acessão se verifica em proveito da pessoa jurídica de direito público, por se
tratar de águas públicas. Ver arts. 20, IV e 26, II e III, da CR/88.
41
Álveo: é a superfície que as águas cobrem sem transbordar para o solo natural e ordinariamente enxuto.
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Se um braço do rio abrir a terra, a ilha que resultar desse desdobramento continua a
pertencer aos proprietários à custa de cujos terrenos se constituiu.
42
APELAÇÃO CÍVEL - REINTEGRAÇÃO DE POSSE - ALUVIÃO - AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO QUE A AUTORA FOI DESAPOSSADA DA COISA INJUSTAMENTE -
IMPOSSIBILDIADE - AÇÃO ORDINÁRIA - ILEGITIMIDADE DA FIADORA - CONSIGNAÇÃO EM
PAGAMENTO - VALORES DEVIDOS A RÉ DA REINTEGRAÇÃO DE POSSE. -Com cuidado para não
ferir a regra de que no juízo possessório é incabível a discussão do domínio, é preciso antes de mais nada,
entender que estamos diante de um típico caso de acessão, especificamente, da espécie aluvião. - Os
acréscimos formados por depósitos e aterros naturais, ou pelo desvio das águas dos rios, ainda que estes
sejam navegáveis, pertencem aos donos dos terrenos marginais. Permanece assim, a conhecida regra de que
o acessório segue o principal. - Para a concessão da proteção de reintegração de posse, deve o requerente
comprovar, no processo, não apenas a posse anterior, o esbulho praticado pelo requerido, com a perda da
posse e a data da prática de tal ato. É necessário também que o requerente, comprove que foi desapossado
da coisa, injustamente, com o fim de reavê-la e restaurar a posse perdida. - Sendo fiadora, a apelante é parte
ilegítima para propor a presente ação. É princípio basilar do direito que ninguém poderá pleitear, em nome
próprio, direito alheio. E sendo assim, somente os titulares dos interesses em conflito têm direito à
prestação jurisdicional. - É compreensível os apelados não saber a quem pagar os aluguéis, tendo em vista a
avença travada na reintegração de posse. Entretanto, uma vez julgada improcedente, não restam dúvidas de
que os aluguéis são devidos à apelante. (MINAS GERAIS, TJ, 16ª Câmara Cível, AC n. 1.0015.06.034272-
0/001, Rel. Des. Batista de Abreu. Julgado em 20/05/2009. Publicado em 03/07/2009).
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Há um total e permanente abandono do antigo leito, por um rio que seca ou que se
desvia em virtude de fenômeno natural, ficando o leito inteiramente descoberto e
passando a pertencer aos proprietários ribeirinhos das duas margens, seja o rio público ou
particular. Deve originar-se de forças naturais. Os donos dos terrenos por onde o rio
inaugure novo curso não têm direito à indenização, por se tratar de força maior que não
pode ser evitada.
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A divisão se fará tendo por base a linha mediana do álveo abandonado, pertencendo
a cada um na extensão de sua testada, por uma linha perpendicular da margem, nos
pontos extremos, à linha mediana do álveo.
Se o álveo abandonado se der por forças humanas, o prejudicado fará jus à
indenização correspondente ao valor das terras submergidas. Havendo irregularidade da
parte contrária, poderá, ainda, o prejudicado reclamar o desfazimento da obra e o retorno
das águas ao curso original.
Se a mudança da corrente se der por utilidade pública, o terreno ocupado pelo novo
álveo deve ser indenizado e o álveo abandonado passa a pertencer ao expropriante para
que se compense da despesa feita43. Nesse caso, o abandono do álveo foi artificial, por
isso não se fala em acessão.
43
ABERTURA MATRÍCULA IMOBILIÁRIA. ÁLVEO ABANDONADO ORIUNDO DE OBRA
PÚBLICA. PROPRIEDADE ESTATAL. De acordo com o disposto no art. 26 do Código de Águas e no
art. 1.252 do Código Civil, o álveo abandonado de corrente pertence aos proprietários ribeirinhos das duas
margens. Todavia, se a mudança da corrente se fez por obra pública o álveo abandonado passa a pertencer
ao expropriante para que se compense da despesa feita, no caso, a municipalidade. (MINAS GERAIS, TJ,
5ª Câmara Cível, AC n. 1.0433.08.269497-0/001, Rel. Des. Maria Elza. Julgado em 02/07/2009. Publicado
em 21/07/2009).
90
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O parágrafo único do art. 1.255, CC traz outra hipótese, que é a “acessão inversa”
ou “desapropriação privada”. Neste caso, o solo deixa de ser o bem principal. Trata-se,
mais uma vez, da aplicação do princípio da função social da propriedade: o dono do solo
invadido deveria, durante a construção, ter tomado as medidas necessárias para impedi-la.
3ª - Proprietário do terreno e possuidor-construtor/plantador agem de má-fé: art.
1.256 e seu parágrafo único, CC. Pode-se exemplificar esse caso com situação bastante
comum encontrada entre pessoas economicamente hipossuficientes: o casal constituído
por A e B resolvem construir sua casa nos fundos do terreno do pai de A. Tempos depois
o casal resolve se separar. Caberá a B pleitear indenização calculada sobre 50% do valor
da acessão (construção), uma vez que, neste caso, o proprietário possui má-fé ao permitir
as obras em seu terreno. B não terá qualquer direito sobre o terreno.
44
Enunciado 318 – Art.1.258. O direito à aquisição da propriedade do solo em favor do construtor de má-fé
(art. 1.258, parágrafo único) somente é viável quando, além dos requisitos explícitos previstos em lei,
houver necessidade de proteger terceiros de boa-fé. (IV Jornada de Direito Civil/2006)
92
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10.3 Usucapião
usu + capio/capere
Pelo uso tomar/adquirir => adquirir (a coisa) pelo uso
Enunciado 317 – Art. 1.243. A accessio possessionis, de que trata o art. 1.243,
primeira parte, do Código Civil, não encontra aplicabilidade relativamente aos
arts. 1.239 e 1.240 do mesmo diploma legal, em face da normatividade do
usucapião constitucional urbano e rural, arts. 183 e 191, respectivamente. (IV
Jornada de Direito Civil/2006).
45
O art. 197, I, CC estabelece o impedimento do prazo prescricional entre os cônjuges, na constância do
casamento. Desta forma, o referido impedimento cessa com a separação judicial, divórcio ou a morte de um
dos cônjuges. No entanto, o STJ, por meio do REsp n. 1.693.732, julgado em 05/05/2020 pela 3ª Turma,
entendeu que o impedimento cessa, para fins de usucapião, com a separação de fato do casal.
46
Ainda que vigente por poucos meses, a Lei n.14.010/2020, denominada Regime Jurídico Emergencial e
Transitório de Direito Privado, previu a suspensão e impedimento do prazo prescricional entre o período de
12/06/2020 a 30/10/2020 (art. 3º), o que também afeta os prazos para usucapião.
94
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por intermédio de seus funcionários ou das pessoas a quem outorgou posse direta em
virtude de relação jurídica. A posse será descontínua quando o possuidor abandonar o
poder físico sobre a coisa por prazo relevante. A questão sobre o tempo aproximado desse
lapso de ausência é mais uma questão probatória e fática do que jurídica. Deve-se
lembrar, ainda, que é possível realizar a união de posses, conforme arts. 1.243 e 1.207,
CC.
A posse pública é aquela com visibilidade, ou seja, os vizinhos reconhecem o
possuidor em relação ao imóvel a ser usucapido.
A posse com animus domini consiste no propósito de o usucapiente possuir a
coisa como se esta lhe pertencesse (requisito psíquico). Excluem-se da usucapião aqueles
que exercem temporariamente a posse direta, por força de obrigação ou direito (art.
1.197, CC), pois a posse indireta não é afastada, continua a existir concomitantemente
com aquela.
O justo título (art. 1.201, parágrafo único; art. 1.242, CC) é o documento que
seria capaz de transferir o domínio; formalizado e devidamente transcrito e hábil ou
idôneo à aquisição da propriedade. Ex.: contrato de compra e venda, de doação, formal de
partilha. Assim, aquele título que, em tese, seria capaz de transferir o domínio, mas tem
algum vício/irregularidade não obsta o direito de usucapir, pois pode ser eivado pelo
tempo, exceto a nulidade absoluta. É requisito apenas na usucapião ordinária.
A posse de boa-fé (art. 1.201 e 1.202, CC) é aquela em que o possuidor está
convencido de que não ofende direito alheio; ignora vício/obstáculo que impede a
aquisição da propriedade; crença de que a coisa realmente lhe pertence. A menor dúvida
exclui a boa-fé e resta ao possuidor a usucapião na forma extraordinária. É requisito
apenas na usucapião ordinária. Lembrando que o possuidor com justo título presume ser
possuidor de boa-fé.
Também é importante analisar o próprio imóvel que se pretende adquirir por
usucapião, pois alguns não suscetíveis desta forma de aquisição. Assim, somente os
direitos reais que recaem em coisas prescritíveis podem ser adquiridos por usucapião –
propriedade, servidões, enfiteuse, usufruto, uso e habitação.
Certos bens são imprescritíveis, como os que estão fora do comércio (ar, luz solar,
etc) e os bens públicos (arts. 183, § 3º e 191, parágrafo único da CF; art. 102, CC; Súmula
340/STF), como se verifica, apenas a título de exemplo, na decisão judicial abaixo:
95
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Essa previsão também está na Lei n. 6.015/73, art. 214, § 5º (com alteração pela Lei
n. 10.931/04). A usucapião tabular visa convalidar o registro expurgando os vícios
congênitos que maculavam a estrutura do título47.
c) Usucapião especial rural ou pro labore: art. 191, CR/88 e art. 1.239, CC.
Esta espécie de usucapião surgiu com a Constituição Federal de 1934. Foi
regulamentada pela Lei n. 6.969/81.
47
Enunciado 569 – No caso do art. 1.242, parágrafo único, a usucapião, como matéria de defesa, prescinde
do ajuizamento da ação de usucapião, visto que, nessa hipótese, o usucapiente já é o titular do imóvel no
registro. (VI Jornada de Direito Civil/2013)
98
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d) Usucapião especial urbana: art. 183, CR/88; art. 1.240, CC e art. 9º EC.
O possuidor deve utilizar o imóvel para sua moradia ou de sua família. Desta
forma, não se aplica a terrenos urbanos sem construção. Não exige justo título nem boa-
fé.
Há limitação sobre a extensão do imóvel usucapiendo, não podendo ultrapassar
250m², pois o constituinte entendeu que este é o tamanho máximo suficiente à moradia do
possuidor ou de sua família. Sobre este requisito houve discussão quanto ao limite
imposto pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Cidade (lei federal) em relação ao
módulo mínimo de lote estabelecido pelos municípios. No entanto, o STF pacificou
entendimento no julgamento do Recurso Extraordinário n. 422.349/RS49, com o
reconhecimento da existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada,
julgado em 29/04/2015:
48
Enunciado 317 – Art. 1.243. A accessio possessionis, de que trata o art. 1.243, primeira parte, do Código
Civil, não encontra aplicabilidade relativamente aos arts. 1.239 e 1.240 do mesmo diploma legal, em face
da normatividade do usucapião constitucional urbano e rural, arts. 183 e 191, respectivamente. (IV Jornada
de Direito Civil/2006).
49
Os autores ajuizaram ação de usucapião especial urbano referente a uma área de 225m², em Caxias do
Sul/RS. Entretanto, o pedido deles foi julgado improcedente, em primeira e segunda instâncias, pois o
módulo mínimo para parcelamento do solo urbano naquele município é 360m².
99
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1. Módulo mínimo do lote urbano municipal fixado como área de 360 m2.
Pretensão da parte autora de usucapir porção de 225 m2, destacada de um todo
maior, dividida em composse.
2. Não é o caso de declaração de inconstitucionalidade de norma municipal.
3. Tese aprovada: preenchidos os requisitos do art. 183 da Constituição
Federal, o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana não
pode ser obstado por legislação infraconstitucional que estabeleça módulos
urbanos na respectiva área em que situado o imóvel (dimensão do lote).
4. Recurso extraordinário provido.
(BRASÍLIA, STF, Plenário, RE n. 422349/RS. Rel. Min. Dias Toffoli,
Julgamento em 29/04/201. Publicado em 05/08/2015).
O tema também foi objeto da VII Jornada de Direito Civil (2015), referindo-se à
área rural:
O CPC/1973 previa procedimento especial para a usucapião, nos artigos 941 a 945.
A ação de usucapião não está prevista no CPC/15. Assim, a pretensão do usucapiente
seguirá o procedimento comum do CPC/15.
Todavia, é importante observar as exigências de documentos da legislação anterior,
tal como a juntada de planta e memorial descritivo do imóvel (art. 942, CPC/1973), bem
como a intimação dos representantes das Fazendas Públicas (art. 943, CPC/1973), a fim
de evitar eventuais nulidades processuais.
Quanto à citação, o CPC/15, art. 246 mantém a citação por edital no art. 259, I
(correspondente ao art. 942, CPC/1973), bem como a citação pessoal dos confinantes50,
exceto quando for objeto da usucapião a unidade autônoma de prédio em condomínio,
caso em que a citação é dispensada (art. 246, § 3º, CPC/15).
A sentença na ação de usucapião é declaratória, conforme o art. 1.241 e parágrafo
único do CC e art. 10, § 2º, EC. Assim, o possuidor adquire a propriedade quando
completa todos os requisitos exigidos na legislação, dependendo da forma de usucapião.
O processo judicial é apenas para regularizar a situação do imóvel no registro imobiliário,
dando segurança jurídica ao possuidor/proprietário e publicidade da sua propriedade.
A sentença constitui título hábil para assento no Registro Imobiliário. O registro,
embora seja considerado modo de aquisição da propriedade, no caso da usucapião possui
valor meramente probante (art. 167, I, n. 28, Lei n. 6.015/73), uma vez que a usucapião é
modo originário de aquisição da propriedade.
A Súmula 237/STF (13/12/63) firmou o entendimento de que a usucapião pode ser
arguida em defesa nas ações reais. Assim, no caso do possuidor com prazo de prescrição
aquisitiva já completado não ter ajuizado a ação de usucapião, não ficará impedido de
demonstrar os requisitos cumulativos em defesa (contestação), obstando, assim, o êxito
da pretensão contra si dirigida. A usucapião como defesa também está prevista no art. 13
do Estatuto da Cidade.
50
Súmula 391/STF: O confinante certo deve ser citado, pessoalmente, para a ação de usucapião.
103
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A propriedade móvel também pode ser adquirida pelo modo originário (ocupação e
usucapião) ou derivado (especificação, confusão, comistão, adjunção, tradição e sucessão
hereditária51).
51
A sucessão hereditária como forma de aquisição da propriedade é estudada no Direito das Sucessões.
52
A ocupação, conforme o CC, tem por objeto seres vivos e coisas inanimadas. Assim, recairá em animais,
sob a forma de caça e pesca, bem como sobre substâncias minerais, vegetais ou animais lançados à praia
pelo mar.
105
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Atualmente não são frequentes as coisas sem dono, portanto, a ocupação como
modalidade aquisitiva ficou muito reduzida.
De acordo com o art. 1.264, CC, tesouro é o depósito antigo de coisas preciosas
ocultas, cujo dono seja desconhecido, como, por exemplo: objeto encontrado em
escavação de terreno ou demolição de prédio.
Assim, somente poderá se falar em tesouro quando a sua propriedade não puder ser
justificada, ou seja, não se possa identificar o seu dono. Também é requisito que a coisa
esteja oculta por atuação humana, intencional. Não se tem achado quando a ocultação se
dá por fenômeno natural.
Os bens encontrados (tesouro) serão adquiridos conforme as regras a seguir:
106
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1. se for achado pelo proprietário do terreno, ou em pesquisa que ordenou por meio
de prepostos, pertence ao proprietário, seguindo a regra de que o acessório segue o
principal (art. 1.265, CC).
2. se for encontrado por pessoa que não é proprietária, isto é, pelo descobridor, terá
ele direito à metade do tesouro quando o encontre casualmente (art. 1.264, CC).
Exemplo: comodatário, locatário.
3. se o descobridor penetrar no prédio alheio com o propósito de encontrar o
tesouro, não terá direito a nada, pois não se permite a obtenção de vantagem no caso de
esbulho (art. 1.265, CC).
O art. 1.266 não tem muita aplicação nos dias atuais, tendo em vista a extinção da
enfiteuse no atual CC (art. 2.038). Só se aplica às constituições de enfiteuse anteriores ao
CC.
No caso de terreno objeto de usufruto ou locação, não cabe ao usufrutuário ou ao
locatário qualquer direito sobre o tesouro casualmente encontrado por terceiro. O direito à
metade desse tesouro compete ao nu-proprietário (usufruto) ou ao locador (locação).
Conforme o art. 1.262, CC deve ser aplicado à usucapião de bem móvel o disposto
nos arts. 1.243 e 1.244, CC. Portanto, é possível unir posses (art. 1.207) e observar as
causas que obstam, suspendem ou interrompem o prazo prescricional.
b) negócio jurídico válido (art. 1.268, § 2.º, CC). A tradição requer vontade, que se
manifesta no contrato, e ato, que se dá na efetiva entrega da coisa. Se não houver
vontade, não há tradição hábil para transferir propriedade (ver art. 227, CC – necessidade
de forma escrita).
12 Perda da Propriedade
12.1 Alienação
12.2 Renúncia
mesma classe, formalizando-se o ato abdicativo por escritura pública ou termos nos autos,
levando ao registro imobiliário quando da transcrição do formal de partilha.
12.3 Abandono
É o ato material pelo qual o proprietário se desfaz da coisa porque não quer mais
ser seu dono. Como não se trata de ato expresso, resulta de atos exteriores que atestem a
manifesta intenção de abandonar, sendo insuficiente o mero desuso (desprezo físico pela
coisa) se não acompanhado de sinais evidentes do ânimo de abdicar da propriedade (art.
1.275, III, CC). Também chamado de derelição ou derrelição.
Nosso ordenamento não admite o imóvel sem dono, por isso, o art. 1.276, § 1.º, CC,
estabelece que o imóvel urbano abandonado será arrecadado como bem vago pelo
Município ou Distrito Federal, passando ao seu domínio após três (3) anos. No caso de
imóvel rural a arrecadação e o domínio se darão pela União. Esses imóveis serão
destinados à reforma agrária e política habitacional urbana.
Durante o prazo de três anos é permitido ao proprietário voltar atrás e reaver o
imóvel que intencionava abandonar, pois o Poder Público só adquire a propriedade após o
término do prazo de arrecadação, isto é, três anos.
Há presunção absoluta (juris et de jure) da referida intenção se, cessados os atos de
posse, o proprietário deixar de satisfazer os encargos fiscais (art. 1.276, § 2.º, CC). Em
decorrência do princípio da função social da propriedade, percebe-se no atual CC uma
relativização do atributo da perpetuidade da propriedade.
De acordo com o caput do art. 1.276 há um fato impeditivo para a arrecadação pelo
Poder Público do imóvel abandonado pelo seu real proprietário: o imóvel encontrar-se na
posse de outrem. A posse de terceiros sobre o bem é suficiente para conceder função
social à propriedade53 e determinar a exclusão da pretensão à titularidade pelo Poder
Público.
O procedimento para arrecadação dos imóveis urbanos abandonados foi previsto
nos arts. 64 e 65 da Lei n. 13.465/2017.
Em relação ao abandono como perda da propriedade, na VI Jornada de Direito Civil
(2013) foi aprovado o Enunciado 565: Não ocorre a perda da propriedade por abandono
53
Enunciado 597 – A posse impeditiva da arrecadação, prevista no art. 1.276 do Código Civil, é efetiva e
qualificada por sua função social. (VII Jornada de Direito Civil, 2015).
113
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de resíduos sólidos, que são considerados bens socioambientais, nos termos da Lei n.
12.305/2012. Artigo: 1.275, III, do Código Civil.
Para entender a finalidade deste enunciado é necessário analisar a Lei n. 12.305/12,
que conceitua resíduos sólidos.
12.4 Perecimento
12.5 Desapropriação
Está prevista no art. 1.228, §§ 4.º e 5.º, CC. Trata-se de uma “desapropriação”
judicial pela posse qualificada, pois o proprietário será privado do imóvel mediante justa
indenização. Alguns entendem que seria uma espécie de usucapião “onerosa”, tendo em
vista os requisitos da posse ininterrupta e de boa-fé por mais de cinco anos.
Percebe-se, mais uma vez, no atual Código Civil, a intenção do legislador em
privilegiar a função social da propriedade.
115
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No processo que for alegada a desapropriação judicial (ou indireta) nos termos do
art. 1.228, §§ 4º e 5º, o Ministério Público deverá intervir, bem como o juiz poderá
determinar a intervenção de órgãos públicos para fins de licenciamento ambiental e
urbanístico da área objeto do processo.
54
Enunciado 84 - Art. 1.228: A defesa fundada no direito de aquisição com base no interesse social (art.
1.228, §§ 4º e 5º, do novo Código Civil) deve ser arguida pelos réus da ação reivindicatória, eles próprios
responsáveis pelo pagamento da indenização.
55
Enunciado 495 - O conteúdo do art. 1.228, §§ 4º e 5º, pode ser objeto de ação autônoma, não se
restringindo à defesa em pretensões reivindicatórias.
56
Enunciado 306 – Art.1.228. A situação descrita no § 4º do art. 1.228 do Código Civil enseja a
improcedência do pedido reivindicatório. (IV Jornada de Direito Civil/2006).
57
Enunciado 308 - Art.1.228. A justa indenização devida ao proprietário em caso de desapropriação
judicial (art. 1.228, §5°) somente deverá ser suportada pela Administração Pública no contexto das políticas
públicas de reforma urbana ou agrária, em se tratando de possuidores de baixa renda e desde que tenha
havido intervenção daquela nos termos da lei processual. Não sendo os possuidores de baixa renda, aplica-
se a orientação do Enunciado 84 da I Jornada de Direito Civil.
58
Enunciado 83 - Art. 1.228: Nas ações reivindicatórias propostas pelo Poder Público, não são aplicáveis
as disposições constantes dos §§ 4º e 5º do art. 1.228 do novo Código Civil. (I Jornada de Direito
Civil/2002)
116
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Quanto à indenização prevista no § 5º do art. 1.228, se a mesma não for paga pelos
possuidores, nem exigida pelo proprietário no prazo prescricional, ainda assim o
mandado para registro de propriedade em favor dos possuidores poderá ser expedido:
Enunciado 311 - Art.1.228. Caso não seja pago o preço fixado para a
desapropriação judicial, e ultrapassado o prazo prescricional para se exigir o
crédito correspondente, estará autorizada a expedição de mandado para registro
da propriedade em favor dos possuidores. (IV Jornada de Direito Civil/2006)
117
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13 Propriedade Resolúvel
A distinção oriunda da classificação acima está nos efeitos operados pela extinção.
Dessa forma, a resolução por condição ou termo opera efeitos ex tunc. Já a resolução por
causa superveniente opera efeitos ex nunc, conforme Enunciado n. 508 da V Jornada de
Direito Civil (2011):
59
A propriedade fiduciária será mais bem analisada no capítulo sobre direitos reais de garantia.
119
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14 Ações de domínio
60
Não é ação de natureza dúplice como as possessórias.
120
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É ação que visa afirmar a existência de direito real, obrigando a respeitar o seu
conteúdo normativo. É bastante importante na tutela das servidões, principalmente
aquelas que se tornaram ocultas ou de difícil identificação.
em que se direciona ao sujeito concreto que violou o dever geral de abstenção. É uma
ação predominantemente condenatória.
O objetivo do pedido nesta ação é acabar com a ofensa praticada (turbação) por
quem se acha titular de direito real e, também, obter-se uma decisão que obrigue o
demandado a abster-se de novos atos de turbação.
O pedido do verdadeiro titular do direito real será para negar a titularidade de
direito real do infrator, pedindo também que cesse seu ato de turbação indevida
(condenatória). “Consoante leciona SILVIO VENOSA; ‘O objetivo dessa ação é provar
que a propriedade está livre de qualquer servidão. A finalidade é impedir que o vizinho
exerça atos inerentes a uma servidão que se reputa inexistente’ (Código Civil
Interpretado. São Paulo: Atlas, 2010, p. 1.252).” (SÃO PAULO, TJ, 11ª Câmara de
Direito Privado, AC n. 0243107-95.2009.8.26.0002, Rel. Des. Gilberto dos Santos.
Julgado em 31/05/2012).
É a ação do sujeito que está em situação para-dominial, para tutelar o seu direito,
em face de qualquer sujeito, especialmente de possuidor ou quem alega titularidade
dominial.
O seu fundamento está na possibilidade de se conceber, em determinados casos, um
direito real relativo (quase domínio), sem com isso se ofender o sistema jurídico como
um todo.
61
(...) A presente ação publiciana foi proposta pelo fato de ter transcorrido o lapso temporal para a
aquisição pela usucapião, não ter sido ajuizada ação de usucapião e não terem os autores a posse atual, que
lhes foi retirada por ato injusto de terceiro (fls. 06 e 07). (...) A ação publiciana, conforme já esclarecido,
exige três requisitos: que tenha decorrido prazo suficiente para ensejar a usucapião, que não haja ação de
usucapião pendente e que haja perda do exercício da posse direta pelo autor da ação em decorrência do
esbulho. Referida ação se fundamenta nos artigos 1228 e 1238 do Código Civil de 2002, e muito embora
não conste expressamente na letra da lei, é permitida. (SÃO PAULO, TJ, 1ª Câmara de Direito Privado, AC
n. 0023826-03.2010.8.26.0003, Rel. Des. Rui Cascaldi. Julgado em 20/08/2013).
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IV DIREITOS DE VIZINHANÇA
62
O vocábulo “prédio” não se refere apenas à edificação de uma casa ou apartamentos em condomínio, pois
mesmo o terreno sem edificação é considerado imóvel lato sensu.
63
O terno “vizinho” não se aplica apenas aos prédios confinantes, mas a todos que podem sofrer
repercussão de atos advindos de prédios próximos.
124
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64
Enunciado 319 – Art.1.277. A condução e a solução das causas envolvendo conflitos de vizinhança
devem guardar estreita sintonia com os princípios constitucionais da intimidade, da inviolabilidade da vida
privada e da proteção ao meio ambiente. (IV Jornada de de Direito Civil/2006)
125
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65
“(...) Da detida análise dos autos vê-se que a parte autora/agravada ajuizou a presente ação aduzindo em
síntese que a parte ré/agravante faz mal uso de terreno lindeiro à sua propriedade como depósito de
materiais de construção, perturbando-lhe o sossego e a saúde, física e mental, além de causar danos ao muro
limítrofe à sua residência. A narrativa inicial revela ainda ser freqüente o trânsito de veículos de carga no
local, causando todo tipo de ruído e poeira, razão pela qual necessita de manter as janelas fechadas.
Menciona a presença de operários e palavreado de baixo calão, implicando sofrimento psicológico e
prejuízo para o desempenho das suas atividades normais.
A parte ré/agravante arvora-se defensivamente nos princípios da ordem econômica, livre iniciativa e
impacto social, afirmando, ainda, não estarem presentes as razões psíquicas alegadas pela autora para o
deferimento da liminar, tampouco a perturbação de sossego noturno. (...)” (Trecho extraído do voto do Des.
Otávio de Abreu Portes).
66
“Abusivos são os atos que, embora o causador do incômodo se mantenha nos limites de sua propriedade,
mesmo assim vem a prejudicar o vizinho, muitas vezes sob a forma de barulho excessivo. Consideram-se
abusivos não só os atos praticados com o propósito deliberado de prejudicar o vizinho, senão também
aqueles em que o titular exerce o seu direito de modo irregular, em desacordo com a sua finalidade social”.
(GONÇALVES, 2015, p. 350).
126
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a) Ação cominatória: com base no art. 497, CPC/15, para fazer cessar o uso
nocivo. É possível o pedido de tutela de urgência de natureza antecipada (art. 300,
CPC/15), a fim de viabilizar a medida nas obrigações de fazer e não fazer. O autor pode
cumular ao pedido inibitório o de danos materiais e morais verificados até a efetivação da
medida coercitiva.
b) Ação indenizatória: com base no art. 186 do CC, que objetiva a formação de
título executivo judicial. É utilizada pelo morador se os incômodos já cessaram,
pretendendo ele o restabelecimento do status quo ante ao ilícito.
c) Ação de dano infecto: proposta quando há justo receio de vir a ser prejudicado
pela ruína do prédio vizinho (art. 1.280, CC). Tem caráter preventivo e pressupõe um
127
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1 Árvores limítrofes
Por outro lado, é certo que os autores, poderiam cortar os ramos de árvore que
invadissem a sua propriedade, até o plano vertical divisório, sem prévia
reclamação ou aviso (artigo 1.283 do Código Civil). Entretanto, trata-se de
simples faculdade, que não afasta a obrigação dos réus, como proprietários, de
podar a árvore, a fim de evitar prejuízos aos vizinhos, arcando com as
respectivas despesas e ressarcimento dos danos provocados por sua desídia,
como no caso.
Fixadas essas premissas, daí decorre necessariamente a conclusão de que houve
uso anormal da propriedade pelos réus, que importou em lesão aos autores,
justificando a adoção das providências determinadas pela sentença, além do
ressarcimento dos danos materiais, a serem apurados em liquidação. (SÃO
PAULO, TJ, 31ª Câmara de Direito Privado, AC n. 0009599-
11.2010.8.26.0099/Bragança Paulista. Rel. Des. Antonio Rigolin. Julgado em
09/12/2014).
2 Passagem forçada
67
A passagem forçada assemelha-se à servidão de passagem ou de trânsito. Todavia, a primeira é obrigação
propter rem decorrente do direito de vizinhança; a segunda é direito real previsto no art. 1.378, CC.
68
Enunciado 88 – O direito de passagem forçada, previsto no art. 1.285 do CC, também é garantido nos
casos em que o acesso à via pública for insuficiente ou inadequado, consideradas inclusive as necessidades
de exploração econômica (I Jornada de Direito Civil, 2002).
130
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4 Das Águas
b) Águas supérfluas das correntes comuns e das nascentes. O art. 1.290, CC (art.
90, CA) trata do direito às sobras das águas nascentes não captadas e das águas pluviais
(servidão de águas supérfluas).
As águas pluviais (das chuvas) e nascentes pertencerão ao dono do prédio onde
diretamente caírem ou surgirem, o qual poderá delas dispor como bem queira. Contudo,
não lhe será lícito desperdiçá-las em detrimento de outros prédios, sob pena de
indenização aos seus proprietários pela perda do remanescente.
69
Enunciado 598 – Na redação do art. 1.293, “agricultura e indústria” não são apenas qualificadores do
prejuízo que pode ser causado pelo aqueduto, mas também finalidades que podem justificar sua construção.
(VII Jornada de Direito Civil, 2015).
70
“Da análise do arcabouço probatório erigido na presente Ação, verifico que houve a comprovação de
que, apesar de não haver formalização, existe, sim, servidão relativamente ao imóvel da parte ré em prol do
imóvel da parte autora em razão da captação de água da nascente ora em discussão.
Restou evidenciado, na inspeção judicial realizada à fl. 34, que a nascente de água fica na parte de cima dos
referidos imóveis (fl. 34-item 1) e que o fluxo normal da água, sem o represamento, é no sentido da casa da
132
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c) Fluxo das águas pelo prédio inferior ou do escoamento natural das águas. O
dono do prédio inferior é obrigado a receber e escoar as águas pluviais ou correntes que
naturalmente escorram do superior (servidão de escoamento) sem qualquer tipo de
indenização. Caso o proprietário do prédio superior realize drenos, sulcos ou obras que
facilitem o escoamento das águas, deverá proceder de modo a não agravar a primitiva
condição do prédio inferior (art. 1.288, CC e 69, CA). “Excluem-se da obrigação do art.
1.288, CC todas as águas obtidas pelo proprietário do prédio superior por meio de
máquinas e bombas, por via de cisternas e poços. Em tais casos, o habitante do prédio
inferior não terá que recebê-las, eis que não atingiram o seu terreno de forma natural”.
(FARIAS e ROSENVALD, 2015, p. 561).
O curso artificial das águas pode ser efetuado por aqueduto ou por encanamento
(art. 1.289, CC)71, mas neste caso o imóvel inferior não está obrigado a suportar as
autora (fl. 34 - item 2). Que a água corre em terra nua, sem encanamento (fl. 34 - item 3).” (Extraído do
voto do Des. Álvares Cabral da Silva).
71
Aqueduto: é qualquer obra realizada para derivar o curso de águas de um lugar para o outro.
Encanamento: é o aproveitamento do curso d’água por meio de canais, para qualquer fim.
133
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Conforme o art. 1.297, CC, todo proprietário pode constranger o seu confinante a
proceder com ele à demarcação entre dois prédios, a aviventar rumos apagados e a
renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os
interessados as despesas.
Ação demarcatória é a medida judicial utilizada para a fixação ou aviventação dos
rumos apagados ou destruídos de dois imóveis (art. 574, CPC/15). A obrigação para
proceder à demarcação geográfica surge quando: a linha divisória ainda não foi
delimitada; ou há confusão sobre os limites de cada imóvel.
Além da demarcação dos marcos divisórios, que é a pretensão do autor nesta ação,
outro efeito da sentença que julgar procedente o pedido é a restituição da área invadida,
se houve esbulho, declarando o domínio ou a posse do prejudicado, ou ambos (parágrafo
único do art. 581, CPC/15).
Conforme o art. 1.297, CC, o proprietário tem o direito de cercar, murar, valar ou
tapar de qualquer modo o seu prédio, sendo seu confinante obrigado a concorrer, em
partes iguais, para as despesas de construção e conservação. Desta forma, presumem-se
pertencentes a ambos os proprietários confinantes, até a realização de prova em sentido
contrário: os intervalos, os muros, as valas, as cercas, os tapumes divisórios, tais como:
sebes vivas72, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas (degraus), e qualquer
outra obra divisória entre os imóveis (art. 1.297, § 1º., CC). A presunção juris tantum de
comunhão cessa se um dos vizinhos demonstrar que executou a obra às suas expensas,
sem ter sido indenizado pelos gastos decorrentes. O tapume deve ser feito em
conformidade com as posturas municipais e costumes de cada lugar, não se podendo
exigir do confinante que arque com obra dispendiosa e muito cara.
A conservação dos marcos divisórios é obrigação propter rem. As despesas são,
então, proporcionalmente arcadas pelos proprietários dos imóveis contíguos e
transmitem-se aos novos adquirentes.
72
Sebes vivas são cercas de arbustos, ramos, estacas ou ripas entrelaçadas para vedar terrenos.
135
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6 Direito de tapagem
7 Direito de construir
Na zona rural a limitação é de no mínimo três metros do terreno vizinho (art. 1.303,
CC).
73
Lembrar que esta ação não possui correspondente no NCPC como procedimento especial, conforme
havia no CPC/1973 (art. 934 a 940).
137
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d) Outra limitação ao direito de construir está no art. 1.311, CC, que trata da
segurança dos vizinhos, proibindo a execução de obras que provoquem desmoronamento
ou deslocação de terras, sem que antes sejam impreterivelmente realizadas obras
acautelatórias. Aqui também pode-se utilizar da ação de nunciação de obra nova.
Entretanto, mesmo tendo o construtor tomado as devidas medidas acautelatórias e
ocorrendo prejuízos para o vizinho, este deverá ser indenizado. Trata-se de
responsabilidade objetiva pela teoria do risco (art. 1.311, parágrafo único, CC).
V CONDOMÍNIO
1 Noções gerais
74
Foi incluído o art. 1.358-A no Código Civil, pela Lei n. 13.465/17, que trata do condomínio de lotes.
75
O capítulo VII-A (a partir do art. 1.358-B) foi incluído no Código Civil pela Lei n. 13.777/18, a fim de
disciplinar o condomínio em multipropriedade.
140
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No condomínio ordinário mais de uma pessoa tem a propriedade sobre determinado bem,
seja ele móvel ou imóvel.
São importantes algumas classificações indicadas pela doutrina, iniciando-se pela
sua origem:
a) voluntário ou convencional: deriva de negócio jurídico, como na aquisição,
doação ou destinação em comum de bem para que duas ou mais pessoas possam usá-lo e
usufrui-lo. Ex.: casamento pelo regime de comunhão universal de bens (art. 1.667, CC);
ou alguns amigos que compram um imóvel para investimentos em comum.
b) incidente ou eventual ou fortuita: se origina de motivos estranhos à vontade dos
condôminos, como aquele que se estabelece entre os herdeiros no momento da abertura
da sucessão, com encerramento ao final da partilha.
c) necessário ou forçado: resulta da lei como consequência inevitável do estado de
indivisão de certos bens, como nas hipóteses de paredes, muros, cercas e valas (art. 1.327,
CC).
Quanto à duração, o condomínio pode ser transitório ou perene. No primeiro, o
condomínio pode ser sempre extinto, a todo tempo, pela vontade de qualquer um dos
consortes. Em contrapartida, o condomínio perene ou permanente é oriundo do
condomínio forçado. Assim, não sendo este passível de divisão, existirá enquanto
subsistir a causa que provocou a sua necessidade. Exemplo: cercas e muros.
Quanto à forma ou divisão, o condomínio é pro diviso ou pro indiviso.
a) pro indiviso: é aquele que perdura de fato e de direito, permanecendo a coisa em
estado de indivisão perante os condôminos, porquanto estes ainda não se localizaram,
cada qual, na coisa. Ex.: entre herdeiros, no momento da sucessão hereditária. Nessa
espécie de condomínio a alienação da quota-parte deve seguir os ditames do art. 504, do
CC (hipótese de preempção ou preferência legal. Prazo decadencial (180 dias) deve ser
contado do registro imobiliário - efeito erga omnes).
b) pro diviso: só existe de direito, não de fato, pois cada condômino já se localiza
numa parte certa e determinada da coisa. Exercem sobre sua fração concreta todos os atos
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de proprietário singular, tal como se o imóvel já fosse partilhado, com aprovação tácita
recíproca. Ex.: um terreno com vários proprietários, em que, por acordo, cada qual
estabeleceu uma área de atuação individualizada. (Ex.: condomínio formado pela
usucapião urbana coletiva, prevista no art. 10 do Estatuto da Cidade). No condomínio pro
diviso cada condômino pode opor meios possessórios contra os demais. Também é
permitida a usucapião entre condôminos.
2.1 Condomínio voluntário: direitos e deveres do condômino (art. 1.314 a 1.319, CC)
em concorrência com terceiro para adquirir a fração ideal oferecida à alienação. Além
disso, o Código Civil estabelece os parâmetros de preferência76.
3 Condomínio edilício
76
Enunciado 623 – Art. 504: Ainda que sejam muitos os condôminos, não há direito de preferência na
venda da fração de um bem entre dois coproprietários, pois a regra prevista no art. 504, parágrafo único,
do Código Civil, visa somente a resolver eventual concorrência entre condôminos na alienação da
fração a estranhos ao condomínio. (VIII Jornada de Direito Civil/2018).
77
Para ser classificado como propriedade horizontal ou vertical, deve-se analisar o elemento que separa as
unidades.
78
O código civil de 1916 não previa regras sobre o condomínio edilício, pois no início do século XX não se
cogitava, no Brasil, de edificações como os prédios de apartamento ou comerciais.
144
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art. 1.334 traz diversas cláusulas que devem estar presentes nas convenções
condominiais.
Os direitos dos condôminos estão previstos no art. 1.335, CC. Os deveres estão no
art. 1.336, CC.
Destaca-se o direito do condômino de usar, fruir e livremente dispor das suas
unidades (art. 1.335, I). Todavia, deve respeitar a segurança, o sossego e a saúde dos
demais condôminos. Entre os inúmeros casos concretos no mercado imobiliário sobre o
tema, destaca-se a permanência de animais domésticos em condomínio, observando-se,
primeiramente, o que prevê a convenção. Entretanto, ainda que a convenção proíba
animais no condomínio, os tribunais vêm entendendo que é permitida sua permanência,
desde que não seja perturbador do sossego, saúde e segurança dos demais condôminos.
Este também o entendimento na VI Jornada de Direito Civil (2013):
1.336, I)79. Trata-se de obrigação pecuniária, cujo inadimplemento acarreta multa de até
2% ao mês80 mais os juros moratórios, conforme previsão no § 1º do art. 1.336.
Deve-se ressaltar que o CPC/15 considerou a dívida condominial, documentalmente
comprovada, como título executivo extrajudicial (art. 784, VIII), o que permite a sua
imediata execução judicial. Neste sentido, é importante observar que o imóvel, ainda que
se configure como bem de família, poderá ser penhorado, considerando a exceção trazida
no art. 3º, IV, da Lei n. 8.009/90. Além disso, por se tratar de obrigação propter rem, o
adquirente responde pelos débitos do alienante (art. 1.345, CC).
Entretanto, na prática, percebe-se grande dificuldade de recebimento dos débitos,
principalmente nos condomínios residenciais. Desta forma, discutem-se outras medidas
coercitivas para constranger o devedor à quitação do débito.
79
Observar decisão proferida em 02/06/2020, pelo STJ no REsp n. 1.778.522: RECURSO ESPECIAL.
CONDOMÍNIO. CONVENÇÃO. DESPESAS ORDINÁRIAS. APARTAMENTOS EM COBERTURA.
RATEIO. FRAÇÃO IDEAL. ART. 1.336, I, DO CC/2002. REGRA. LEGALIDADE.
80
Enunciado 505 – É nula a estipulação que, dissimulando ou embutindo multa acima de 2%, confere
suposto desconto de pontualidade no pagamento da taxa condominial, pois configura fraude à lei (Código
Civil, art. 1336, § 1º), e não redução por merecimento. (V Jornada de Direito Civil/2011)
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O § 2º, do art. 1.336, CC, ainda estabelece multa de até cinco (5) vezes o valor da
quota condominial para o condômino que descumprir os deveres especificados no art.
1.336, incisos II a IV. Esta multa pode estar prevista no ato constitutivo ou na convenção,
mas não havendo disposição expressa, os condôminos deverão deliberar em assembleia
geral a sua cobrança, exigindo-se um quórum qualificado de no mínimo 2/3 dos
condôminos restantes.
O art. 1.337, caput, CC, também prevê que o condômino ou possuidor que não
cumprir reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por
deliberação de 3/4 dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa de até cinco
(5) vezes o valor da quota condominial, conforme a gravidade das faltas e a reiteração,
além das perdas e danos que se apurarem.
Trata-se do chamado “condômino nocivo ou antissocial”, ou seja, aquele
proprietário ou possuidor que descumpre reiteradamente os seus deveres perante o
condomínio será penalizado com o pagamento de multa pelo comportamento
antissocial81. Assim, o parágrafo único do art. 1.337, prevê a multa máxima, que pode
81
Enunciado 507 – Verificando-se que a sanção pecuniária mostrou-se ineficaz, a garantia fundamental da
função social da propriedade (arts. 5º, XXIII, da CRFB e 1.228, § 1º, do CC) e a vedação ao abuso do
148
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Destaca-se, portanto, que os tribunais vêm entendendo pela aplicação desta multa
diante do condômino que se caracteriza como devedor reiterado e contumaz:
É importante, no entanto, que as multas previstas no art. 1.337, CC, podem ser
instituídas apenas após a prévia comunicação ao condômino infrator, concedendo-lhe
direito (arts. 187 e 1.228, § 2º, do CC) justificam a exclusão do condômino antissocial, desde que a ulterior
assembleia prevista na parte final do parágrafo único do art. 1.337 do Código Civil delibere a propositura
de ação judicial com esse fim, asseguradas todas as garantias inerentes ao devido processo legal. (V Jornada
de Direito Civil/2011)
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Algumas matérias deliberadas exigem quorum especial de dois terços (art. 1.351,
CC) e, outras, aprovação unânime.
A assembleia geral ordinária é obrigatória e deve ocorrer ao menos uma vez por
ano (art. 1.350, CC). A assembleia geral extraordinária irá deliberar sobre todas as
matérias de interesse do condomínio que não estão abrangidas pelo art. 1.350, CC (art.
1.355, CC).
Nos dois casos a assembleia extraordinária, com quorum de metade mais um das
frações ideais do terreno, deliberará sobre a reconstrução do imóvel (com a quantia do
seguro obrigatório – art. 1.346) ou a venda do terreno e materiais. O produto dessa venda
será rateado proporcionalmente à fração ideal de cada condômino (art. 1357, § 2º, CC).
Os condôminos, em virtude de interesses econômicos, por unanimidade podem
decidir a extinção do condomínio pela demolição do prédio.
A confusão também é uma forma de extinção do condomínio. Ocorre quando uma
pessoa, condômino ou terceiro, adquire todas as unidades autônomas e não mantém a
divisão para eventual alienação futura.
Conforme o art. 1.358, CC, a desapropriação do prédio para fins de utilidade
pública ou interesse social provocará a extinção do condomínio. Na ação de
desapropriação todos os condôminos devem ser citados e não apenas o síndico (art. 16 do
Dec-lei n. 3.365/41).
De acordo com o art. 1.358-F, CC, a multipropriedade pode ser instituída por ato
entre vivos ou testamento, que será registrado no cartório de registro de imóveis.
No cartório haverá uma matrícula principal referente à instituição do condomínio
multiproprietário, com a criação de novas matrículas independentes para cada unidade
periódica (art. 176, § 10, da Lei n. 6.015/73). Assemelha-se ao condomínio edilício, em
que há a matrícula do imóvel (terreno), a qual recebe o registro da instituição do
condomínio edilício, com a consequente criação de matrículas autônomas para cada
unidade (apartamento, sala, etc).
Assim, cada unidade periódica, com matrícula própria, pode ser objeto de hipoteca
ou de alienação fiduciária (art. 1.358-I, III, CC), pois representa um direito real de
propriedade, ou seja, um direito real sobre coisa própria.
Diante disso, a unidade periódica também pode ser objeto de penhora por dívidas
do multiproprietário. Os móveis que guarnecem o imóvel não poderão ser penhorados,
pois “o devedor não é titular do mobiliário isoladamente, mas sim de um direito real de
154
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propriedade periódico, que, de forma indivisível (art. 1.358-D, I, CC), alcança o imóvel e
os respectivos mobiliários na respectiva fração de tempo.” (OLIVEIRA, 2018).
5 Condomínio de lotes
A violência nos centros urbanos e a busca por uma melhor qualidade de vida, levou
os moradores da cidade a buscar residências nos chamados “condomínios fechados ou
loteamentos fechados”. Entretanto, por não estarem regulamentados na legislação
brasileira havia muita insegurança jurídica sobre este tipo de propriedade, que acaba
sendo considerada como ilegal.
Nesta situação ocorre a venda de lotes (unidades autônomas), não edificadas, com
matrícula própria. Por ser tratado como um loteamento comum, as áreas destinadas ao
sistema viário e os equipamentos comunitários são transferidos para o Poder público
municipal (art. 22, da Lei 6.766/79). Mas em ato posterior, o município autorizava o
fechamento das vias de comunicação – daí a expressão loteamento fechado – concedendo
o uso de todas as áreas públicas exclusivamente aos moradores do loteamento.
Os adquirentes dos lotes costumavam constituir uma associação que se
encarregava de murar toda a área e instalar uma portaria para controle de acesso de
pessoas e de veículos.
156
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82
Ver RExtr. n. 432.106/RJ e REsp. n. 1.280.871/SP e 1.439.163/SP.
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1 Noções iniciais
O direito real consiste no poder jurídico, direto e imediato, do titular sobre a coisa,
com exclusividade e contra todos; tem, como elementos essenciais, o sujeito ativo, a coisa
e a relação ou poder do sujeito ativo sobre a coisa.
A propriedade é o direito real mais completo e confere ao seu titular os poderes de
usar, gozar e dispor de seus bens, assim como de reavê-los do poder de quem
injustamente os possua ou detenha (art. 1.228, CC). Quando todas essas prerrogativas se
acham reunidas em uma só pessoa, diz-se que é titular da propriedade plena.
Entretanto, quando algum ou alguns dos poderes inerentes ao domínio se
destacarem e se incorporarem ao patrimônio de outra pessoa (atributo da elasticidade e
consolidação), teremos a propriedade limitada, como por exemplo no usufruto, pois o
direito de usar e gozar fica com o usufrutuário, permanecendo com o nu-proprietário
somente o de dispor e reivindicar a coisa. Em razão desse desmembramento, o
usufrutuário passa a ter um direito real sobre coisa alheia, sendo oponível "erga omnes".
O direito real sobre coisa alheia é o de receber, por meio de norma jurídica,
permissão do seu proprietário para usá-la ou tê-la como se fosse sua, em determinadas
circunstâncias, ou sob condição de acordo com a lei e com o que foi estabelecido em
contrato válido (Godofredo Telles Júnior).
Os direitos reais sobre coisa alheia podem ser divididos em:
Direitos reais de uso/gozo e fruição: servidões prediais, usufruto, uso,
habitação, superfície, concessão de uso especial para fins de moradia, concessão de
direito real de uso, direito real de laje, rendas constituídas sobre imóveis e enfiteuse
(essas duas previstas apenas no CC/1916);
Direitos reais de garantia: penhor, anticrese, hipoteca e propriedade fiduciária
(alienação fiduciária em garantia);
Direito real de aquisição: compromisso ou promessa irrevogável de venda; o
devedor fiduciante, seu cessionário ou sucessor também passaram a ter direito real de
aquisição nos termos do art. 1.368-A, que foi incluído no Código Civil pela Lei n.
13.043/14.
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Como já se sabe, no direito brasileiro o contrato, por si só, não transfere o domínio;
ele é apenas instrumento que cria obrigações e direitos. O direito real sobre bens imóveis
deve ser registrado no Cartório Imobiliário.
Os direitos reais sobre coisa alheia têm duração temporária83, pois a lei não permite
o fracionamento da propriedade por períodos indefinidos (atributos da elasticidade e da
consolidação). Ex.: vitaliciedade do usufruto (art. 1.410, I, CC); hipoteca – 30 anos (art.
1.485, CC).
De acordo com Farias e Rosenvald (2015), “cuida-se de direito real sobre coisa
imóvel, que impõe restrições em um prédio em proveito de outro, pertencentes a
diferentes proprietários. O prédio que suporta a servidão é o serviente. O outro, em
favor do qual se proporciona utilidade e funcionalização da propriedade, é o dominante.”
(p. 670, grifos nossos).
A finalidade da servidão predial, portanto, é proporcionar uma valorização do
prédio dominante, tornando-o mais útil, agradável ou cômodo, implicando, por outro
lado, uma desvalorização econômica do prédio serviente.
A servidão se liga ao direito de propriedade do prédio dominante e não à pessoa
que seja sua titular. O desdobramento do domínio se dá em favor e contra os prédios
dominante e serviente, respectivamente. Desta forma, se um dos prédios for alienado, isso
não extingue a servidão predial, pois o ônus real adere à coisa, acompanhando-a
permanentemente e opondo-se erga omnes.
O direito real de servidão é acessório ao direito de propriedade, aplicando-se,
aqui, portanto, a regra de que o acessório segue o principal. Disso decorre sua
inalienabilidade, pois não pode ser objeto de existência autônoma. Luciano Penteado
(2008) e Arnaldo Rizzardo (2014) acrescentam, ainda, que devido à característica da
acessoriedade, a servidão não pode ser penhorada nem hipotecada.
83
“As contrações dominiais são transitórias, pois mais cedo ou mais tarde, os poderes novamente se
unificarão com o proprietário, e a propriedade será plena.” (FARIAS e ROSENVALD, 2015, p. 658).
161
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Esta classificação não é encontrada em todos os autores. Luciano Penteado (2008) e Farias e Rosenvald
(2009) não a mencionam.
163
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b) Modos de constituição
De acordo com Farias e Rosenvald (2015), a servidão pode ser constituída por
negócios unilaterais (testamento), contrato, sentença e usucapião (art. 1.378, 1.379,
parágrafo único do CC), mas os autores ainda explicam a servidão administrativa.
O contrato é o modo mais comum de constituição das servidões prediais. Em
regra, é negócio jurídico oneroso, prevendo indenização ao titular do prédio serviente
pela restrição gerada, mas nada impede que seja gratuito. O contrato gera efeitos
obrigacionais e serve como título aquisitivo do direito real imobiliário, pois só se
constitui com o registro (art. 1.378, CC). Somente os proprietários (quem tem poder de
disposição) podem convencionar servidão, a qual pode ser contínua ou descontínua,
aparente ou não aparente.
A servidão pode ser instituída por sentença, em ação divisória, na forma do art.
art. 596, II, CPC/15. “Essa situação viabiliza a utilização dos vários lotes que surgem pela
repartição de um só́ imóvel e não raramente ocorre quando um dos terrenos criados com a
divisão demanda o acesso para a via pública em razão de encravamento.” (FARIAS;
ROSENVALD, 2015, p. 679-680).
164
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85
Enunciado 251 – Art. 1.379: O prazo máximo para o usucapião extraordinário de servidões deve ser de
15 anos, em conformidade com o sistema geral de usucapião previsto no Código Civil. (III Jornada de
Direito Civil).
165
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a) Características
O usufruto é temporário (art. 1.410, II), uma vez que não se prolonga além da
vida do usufrutuário. Pode ser constituído por tempo determinado ou condição resolutiva.
É personalíssimo, pois sua única finalidade é beneficiar pessoas determinadas (art.
1.411).
b) Modos constitutivos
e) Extinção
O chamado usufruto impróprio ou quase usufruto tem por objeto bem consumível.
Assim, ao fim da relação jurídica não existe possibilidade de o restituir, o que se fará
através de valor, salvo o caso de usufruto de títulos de crédito (art. 1.395), que se
destinam à percepção do seu valor específico.
O conceito de “necessidades” como critério para fruição da coisa foi trazido pelo
próprio legislador: avaliado conforme a condição social do titular do direito, bem como a
situação econômica da comunidade em que está inserida, considerando, ainda, o número
de pessoas que se albergam na entidade familiar (art. 1.412, §§ 1º e 2º do CC).
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De acordo com o art. 1.414, CC, constitui o direito real temporário de usar
gratuitamente casa alheia, para morada do titular e de sua família. Desta forma, seu objeto
é unicamente imóvel residencial.
Conforme Rizzardo (2014), a destinação é exclusiva para residência, sem
possibilidade para o comércio ou a indústria, ainda que do habitador, ou morador-usuário.
Entretanto, ressalta o autor que este requisito deve ser visto com certa tolerância,
permitindo-se atividades, mesmo que profissionais, de cunho artesanal, desde que não
descaracterizem a principal função, que é a habitação.
O direito real de habitação não pode ser transferido. Desta forma, proíbe-se a
locação e o comodato do imóvel pelo titular do direito.
É temporário, isto é, prolonga-se até a superveniência do termo ou condição
pactuada. Se o instrumento de constituição for omisso, considera-se vitalício, mas não se
transmite aos sucessores do titular.
É indivisível, pois grava o imóvel na sua integralidade, todavia pode ser
concedido a mais de uma pessoa, na forma do art. 1.415, CC.
Constitui-se, normalmente, pela vontade do proprietário, mediante escritura
pública registrada no CRI. Também é possível através de testamento.
É possível situação em que a habitação tenha causa legal, como no art. 1.831, CC
e art. 7º, parágrafo único da Lei n. 9.278/96.
O habitador possui os seguintes direitos e deveres:
morar na casa com sua família, devendo guardar e conservar o prédio;
não alugar, nem emprestar o imóvel;
defender sua posse por meio de interditos possessórios, seja contra o
proprietário ou terceiros;
pagar tributos e despesas que recaírem sobre o imóvel;
fazer o seguro, se o título lhe impuser tal realização, devendo o valor segurado
ser empregado na reedificação do prédio se este sofrer destruição por caso fortuito ou
força maior;
prestar caução se o reclamar o proprietário;
receber indenização pelas benfeitorias necessárias;
172
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a) Características
86
Ver, ainda, a exceção ao princípio da acessão no parágrafo único do art. 1.255, CC (acessão inversa).
87
Enunciado 568 – O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo
relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato, admitindo-se o direito de sobrelevação, atendida a
legislação urbanística. Referência legislativa: Código Civil, art. 1.369, e Estatuto da Cidade, art. 21. (VI
Jornada de Direito Civil/2013).
173
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88
Desde que inexistam recursos minerais no subsolo (art. 20, IX, CF).
89
Previsto expressamente no art. 21, § 1º. do EC.
90
“No mérito, os agravantes alegam, em apertada síntese, que são os proprietários do imóvel descrito na
inicial, cujo direito de superfície foi concedido onerosamente aos agravados; que ajuizaram ação de
cobrança em face do agravado Leonardo Lino Silva, na qualidade de devedor solidário da parcelas em
atraso do "cânon superficiário", sendo proferida sentença com trânsito em julgado a favor dos ora
agravantes; que os dois primeiros agravados foram notificados extrajudicialmente da extinção da concessão
de superfície em face do inadimplemento; que a liminar de reintegração de posse foi deferida neste
processo, mas os agravados, agindo de má-fé, apresentaram Exceção de Incompetência nos próprios autos
da reintegratória, argüindo suposta conexão de ações; que a única pretensão dos agravados na outra ação,
em trâmite na 1ª Vara Cível, é uma indenização amparada em contrato de compra e venda que eles
celebraram com terceiros estranhos à lide; que, dessa forma, não existe igualdade dos objetos das ações,
não havendo que se falar em conexão”. (Extraído do voto do Des. Sebastião Pereira de Souza)
91
Enunciado 509 – Ao superficiário que não foi previamente notificado pelo proprietário para exercer o
direito de preferência previsto no art. 1.373 do CC é assegurado o direito de, no prazo de seis meses,
contado do registro da alienação, adjudicar para si o bem mediante depósito do preço.
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2.6 Concessão de uso especial para fins de moradia (art. 183, § 1º, CR/88)
92
Enunciado 321 – Art. 1.369. Os direitos e obrigações vinculados ao terreno e, bem assim, aqueles
vinculados à construção ou à plantação formam patrimônios distintos e autônomos, respondendo cada um
dos seus titulares exclusivamente por suas próprias dívidas e obrigações, ressalvadas as fiscais decorrentes
do imóvel. (IV Jornada de Direito Civil/2006)
93
Enunciado 322 – Art. 1.376. O momento da desapropriação e as condições da concessão superficiária
serão considerados para fins da divisão do montante indenizatório (art. 1.376), constituindo-se
litisconsórcio passivo necessário simples entre proprietário e superficiário. (IV Jornada de Direito
Civil/2006)
175
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propriedade ou a concessão de outro imóvel. Esse modo de concessão não será reconhecido
ao mesmo concessionário mais de uma vez e o título da concessão será concedido pela via
administrativa ou judicial.
A concessão de uso especial para fins de moradia também pode ser coletiva quando a
área for maior que 250m², ocupada por população de baixa renda, com as mesmas
caracterísicas da usucapião urbana coletiva (art. 10 do EC).
Trata-se de um direito real inserido no rol do art. 1.225, CC (inciso XI) pela Lei n.
11.481/2007. Por ser direito real, exige, para sua constituição, registro Cartório de
Imóveis. A Lei n. 11.481/2007 também inseriu a concessão de uso especial para fins de
moradia como objeto de hipoteca (art. 1.473, VIII, CC), o que facilita ao concessionário a
obtenção de crédito junto ao SFH para construção da casa própria.
Dispõe o art. 6º da MP nº 2.220/201 que o título de concessão de uso especial para
fins de moradia será obtido pela via administrativa perante o órgão competente da
Administração Pública ou, em caso de recusa ou omissão deste, pela via judicial.
A concessão de direito real de uso de bens públicos ou particulares foi criada pelo
Decreto-Lei n.º 271, de 28 de fevereiro de 1967. Esse Decreto-Lei foi alterado pela Medida
Provisória n.º 292/2006 e, posteriormente, pela Lei n.º 11.481/2007, que procurou adequar o
instituto à nova realidade urbanística brasileira.
De acordo com o art. 7º do Decreto-Lei nº 271/1967 é “instituída a concessão de uso
de terrenos públicos ou particulares remunerada ou gratuita, por tempo certo ou
indeterminado, como direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de
interesse social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento
sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de
subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas.”
A concessão de direito real de uso é transmissível por ato inter vivos ou mortis causa,
salvo disposição contratual em contrário (art. 7º, § 4º, do Decreto-Lei nº 271/1967). Pode ser
formalizada por instrumento público ou particular, bem como por termo administrativo (art.
7º, § 1º, do Decreto-Lei nº 271/1967).
Trata-se de direito real resolúvel (art. 1.225, inc. XII, do Código Civil, com a redação
dada pela Lei n.º 11.481/2007, c/c art. 7º, caput, do Decreto-Lei nº 271/1967), portanto,
176
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exige-se o registro no Cartório de Imóveis competente. Por ser direito real resolúvel fica
subordinada a uma ou mais condições resolutivas.
O concessionário fruirá plenamente do imóvel para as finalidades estabelecidas no
contrato e responderá por todos os encargos civis, administrativos e tributários que venham a
incidir sobre a coisa e suas rendas (art. 7º, § 2º, do Decreto-Lei nº 271/1967).
A Lei nº 11.481/2007 incluiu a concessão de direito real de uso no rol de direitos reais
do Código Civil (art. 1.225, XII), possibilitando, ainda, sua inserção como objeto de hipoteca
(art. 1.473, IX, do Código Civil).
A extinção pode se ocorrer pelo término do prazo e pelo descumprimento, por parte
do concessionário, de cláusula resolutória do contrato. Assim, se o concessionário der ao
imóvel destinação diversa, ou descumprir a cláusula resolutória ajustada, a concessão
resolver-se-á antes de seu termo e o concessionário perderá todas as benfeitorias de qualquer
natureza (art. 7º, § 3º, do Decreto-Lei nº 271/1967).
Foi incluído como direito real no Código Civil (art. 1.225, XIII) por meio da MP n.
759, de 22/12/2016, convertida na Lei n. 13.465, de 11 de julho de 2017.
No Brasil é muito comum os chamados “puxadinhos”, isto é, construções realizadas
sobre uma construção anterior, como quando o filho, ao se casar e sem condições financeiras
para adquirir imóvel próprio, é autorizado pelo pai ou sogro a construir sobre a laje do imóvel
daqueles. Para as famílias existem dois imóveis, duas casas, separadas e individualizadas.
Entretanto, esses casos correspondem à aquisição de propriedade imóvel por acessão
de construção. Assim, o dono do imóvel principal (pai/sogro) adquire a construção realizada
pelo filho/genro (art. 1.256, CC).
Desta forma, a fim de solucionar este problema, a MP 759/16 instituiu o direito real
de laje, que tem por escopo o “reforço ao propósito de adequação do Direito à realidade
brasileira, marcada pela profusão de edificações sobrepostas" (Exposição de Motivos).
Portanto, nos imóveis em que haja coexistência de unidades edificadas, com
titularidades distintas, acessos independentes e isolamento funcional, será possível a
abertura de matrícula registral para cada unidade, bem como o estabelecimento de
encargos tributários individualmente suportados pelos seus titulares.
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Oliveira (2017a, p. 6) sustenta que não se trata de um direito real sobre coisa
alheia: “Ao contrário do que insinua uma primeira impressão, o Direito Real de Laje
não é um direito real sobre coisa alheia. É, sim, um novo Direito Real sobre coisa
própria, ao lado do direito real de propriedade.” O consultor legislativo ainda justifica:
Ante o exposto, atento ao que mais dos autos consta e aos princípios de Direito
aplicáveis à espécie, além de estar em conformidade com o art. 1.242 do
Código Civil, julgo procedente o pedido formulado na Ação de Usucapião
nº 0027691- 84.2013.8.17.0001, para declarar a ocorrência da prescrição
aquisitiva e, em decorrência, constituir o domínio da parte autora sobre o
imóvel indicado na inicial, devendo esta sentença, juntamente com a sua
certidão de trânsito em julgado, servir de título para a averbação ou registro
(art. 172 da Lei de Registros Públicos) oportunamente, no Cartório de Registro
de Imóveis competente, pagos os emolumentos e respeitadas as formalidades
legais.
Por outro lado, julgo improcedente o pedido de usucapião de formulado na
Ação de Usucapião nº 0071376- 44.2013.8.17.0001, ao tempo em que
reconheço o Direito de Laje da casa 743-A à autora, nos termos do art.
1.510-A do Código Civil, devendo o imóvel referido ser registrado com
matrícula própria, pagos os impostos e emolumentos e respeitadas as
formalidades legais. (Dispositivo da sentença. Disponível em:
<http://www.irib.org.br/app/webroot/files/downloads/files/Senten%C3%A7a-
Usucapi%C3%A3o-Extraordin%C3%A1rio-Procedente-Direito-de-
laje(2).pdf>. Acesso em 29 jan. 2018).
94
Enunciado 627 – Art. 1.510: O direito real de laje é passível de usucapião. (VIII Jornada de Direito
Civil/2018).
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Trata-se de instituto jurídico novo, com grande repercussão social, mas precisamos
verificar se realmente será incorporado pela sociedade para regularizar as situações
fáticas.
Esse direito real foi suprimido do atual Código Civil. Sua previsão está apenas no
art. 2.038, CC, que trata do princípio da irretroatividade da lei, resguardando os direitos
adquiridos. Justifica-se a supressão por tratar-se de direito real incompatível com o
modelo da função social da propriedade, uma vez que prejudica a livre circulação de
riquezas.
É o direito real sobre coisa alheia por meio do qual o proprietário transmite o
domínio útil de bem imóvel ao enfiteuta ou foreiro, para sua exploração econômica
perpétua (art. 678, CC/1916). Ao proprietário resta o domínio direto, desprovido de
qualquer gozo ou fruição (nua propriedade).
As partes são o senhorio direto (proprietário). Ele praticamente conserva apenas o
nome de dono e alguns poucos direitos, que se manifestam em ocasiões restritas. O
enfiteuta ou foreiro é o titular do direito real sobre coisa alheia, possuindo a posse direta.
Ele tem um poder muito amplo sobre a coisa, podendo usá-la e desfrutá-la do modo mais
completo, bem como aliená-la e transmiti-la por herança, por isso se diz que a enfiteuse é
o mais amplo dos direitos reais sobre coisas alheias.
O enfiteuta deve pagar uma pensão anual (foro), certa e invariável ao senhorio. A
inadimplência referente ao foro, por três anos consecutivos, leva à perda do direito real
por sentença (pena de comisso). Além do foro, também incidia sobre o direito real de
enfiteuse o laudêmio95, pago pelo enfiteuta ao senhorio, que se constituía no pagamento
de 25% sobre o valor da alienação/cessão onerosa do domínio útil a terceiros. O laudêmio
não vigora mais nas enfiteuses ainda existentes, conforme art. 2.038, CC.
95
“A "Taxa do Príncipe" foi instituída em Petrópolis, no ano de 1847, quando dom Pedro 2º teve a ideia de
distribuir lotes de terra a imigrantes alemães. Seu objetivo era colonizar as terras da então Fazenda do
180
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No Direito Romano (Lei das XII Tábuas) o devedor respondia por suas dívidas
com o próprio corpo, sobre o qual incidia o poder do credor. A partir da Lex Poetelia
Papiria transferiu-se a garantia do adimplemento da obrigação para o patrimônio
material.
Entretanto, essa garantia genérica (patrimônio como um todo) foi insuficiente,
dando origem a duas espécies de garantia: a pessoal e a real. Desta forma, existem três
espécies de garantias: ordinária (patrimônio do devedor); por vínculo pessoal (um terceiro
assume a responsabilidade pelo pagamento da dívida, tal como a fiança e o aval); real
(um bem determinado fica sob o poder de excussão do credor em caso de inadimplemento
de uma obrigação de trato sucessivo – art. 1.419, CC).
Atualmente são garantias reais: o penhor, a anticrese, a hipoteca e a
propriedade fiduciária (alienação fiduciária em garantia).
O direito real de garantia é o que vincula diretamente ao poder do credor
determinada coisa do devedor (direito de sequela), assegurando a satisfação de seu
crédito se o devedor se tornar inadimplente, conforme art. 1.419, CC.
São características dos direitos reais de garantia:
Córrego Seco, comprada em 1830 por seu pai dom Pedro 1º. Ficou decidido que os colonos alemães seriam
obrigados a pagar ao Imperador uma taxa caso vendessem a outra pessoa o lote recebido, o laudêmio.
Embora o Brasil seja uma República desde 15 de novembro de 1889, os moradores do primeiro distrito de
Petrópolis ainda são obrigados a pagar a "Taxa do Príncipe" no território da antiga fazenda, que atualmente
engloba o centro e os bairros mais valorizados.” (JULIANO, Anderson. Com “taxa do príncipe”, Petrópolis
privilegia regime extinto há tempos. Uol Notícias Opinião, 18/08/2015. Disponível em:
<https://noticias.uol.com.br/opiniao/coluna/2015/08/18/com-taxa-do-principe-petropolis-privilegia-regime-
extinto-ha-tempos.htm>. Acesso em 19 jul. 2018).
96
Bens públicos dominiais da União, constituídos pela faixa de terra que vai até certa distância, a partir da
preamar máxima. Sujeita a regras especiais de Direito Administrativo.
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Enunciado 626 – Art. 1.428: Não afronta o art. 1.428 do Código Civil, em relações paritárias, o pacto
marciano, cláusula contratual que autoriza que o credor se torne proprietário da coisa objeto da garantia
mediante aferição de seu justo valor e restituição do supérfluo (valor do bem em garantia que excede o
da dívida). (VIII Jornada de Direito Civil/2018).
=> A diferença entre o pacto comissório e o pacto marciano está na fixação do valor do bem para
apropriação do credor em caso de inadimplemento da dívida pelo devedor. No pacto comissório a
transferência ou a consolidação da propriedade da coisa dada em garantia é transferida ao credor sem a
fixação do justo valor do bem, uma vez que não se obriga uma avaliação por terceiro. Desta forma, o
credor, que já calcula unilateralmente o valor da dívida, poderia fixar valor menor do bem para pagamento
da dívida. No pacto marciano exige-se a avaliação do justo preço, com a devolução de eventual excedente
ao devedor.
Destaque-se que o enunciado se refere à possibilidade do pacto marciano apenas em relações paritárias,
isso exclui as relações consumeristas.
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a) Características
recai sobre coisa móvel e exige alienabilidade do objeto;
o bem empenhado deve ser da propriedade do devedor (salvo o disposto nos
arts. 1.420, § 1º. e 1.427);
não admite pacto comissório (art. 1.428, CC);
é direito real uno e indivisível (a amortização não libera parcialmente o bem);
é temporário e acessório,
depende de tradição, exceto nos seguintes casos: artigo 1.431, parágrafo único,
CC; artigo 1° da Lei n° 2.666/55 - penhor rural, industrial, mercantil e de veículos; art. 28
do Dec.-lei n° 413/69 – cédula de crédito industrial.
O penhor pode ser extinto dos seguintes modos: extinção da dívida; nulidade,
prescrição da obrigação principal; remissão da dívida; perecimento do objeto empenhado;
renúncia do credor; adjudicação judicial, remição ou venda amigável da coisa
empenhada; confusão; resolução da propriedade; escoamento do prazo; reivindicação do
bem gravado.
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É o direito real de garantia que grava coisa imóvel alienável ou bem a que a lei
entende por hipotecável (art. 1.473, art. 80), pertencente ao devedor ou a terceiro, sem
transmissão de posse ao credor, conferindo a este o direito de promover a sua venda
judicial (penhora), pagando-se preferencialmente, se inadimplente o devedor.
a) Características e requisitos
98
Vinculam-se a portos. Possuem registro na Capitania dos Portos.
99
São individualizadas e têm registro aeronáutico brasileiro. Ver arts. 79 e 82, CC.
100
Ressalte-se, inclusive, o art. 698, CPC, que prevê a nulidade da praça, pleiteada em embargos de terceiro
ou ação autônoma, oposta pelo credor hipotecário, quando ele não for regularmente intimado da sua
realização.
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b) Espécies de hipoteca
Hipoteca legal: a lei confere a certos credores (art. 1.489, CC; 1.205 a 1.210,
CPC, não há correspondente no NCPC), que por se encontrarem em determinada situação
e pelo fato de que seus bens são confiados à administração alheia devem ter uma proteção
especial. Perdura indefinidamente, enquanto se prolongar a situação jurídica que visa
garantir. Requer sentença de especialização e inscrição.
Hipoteca judicial: é aquela que a lei empresta a todo julgamento que condena um
devedor a executar sua obrigação. Não é considerada direito real, por isso não está no CC.
O seu objetivo é evitar a fraude à execução. Requisitos: sentença condenatória proferida
pelo Poder Judiciário; liquidez dessa sentença; trânsito em julgado; especialização;
inscrição no registro imobiliário (art. 466, CPC, correspondente ao art. 495, NCPC).
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O devedor pode alienar o bem gravado, bem como constituir sub-hipoteca (art.
1.476); defender sua posse; antecipar o pagamento da sua dívida; e tem direito à liberação
do bem gravado, mediante o cumprimento da obrigação.
O credor sub-hipotecário pode remir a primeira hipoteca. A remição hipotecária
consiste no direito concedido a certas pessoas de liberar o imóvel onerado, mediante
pagamento da quantia devida independentemente do consentimento do credor (art. 1.482,
CC). Esse direito pode ser exercido pelo credor sub-hipotecário (art. 1.478), o adquirente
do imóvel hipotecado (art. 1.481 e 346, II, CC), o devedor da hipoteca ou membros de
sua família e pela massa falida.
O devedor hipotecário não pode praticar atos que desvalorizem, deteriorem ou
destruam o objeto, nem alterar a substância do bem onerado.
É o direito real sobre imóvel alheio, em virtude do qual o credor obtém a posse
direta da coisa a fim de perceber-lhe os frutos e imputá-los no pagamento da dívida, juros
e capital, sendo, porém, permitido estipular que os frutos sejam, na sua totalidade,
percebidos à conta de juros (art. 1506).
a) Características
requer capacidade das partes;
não confere preferência ao anticresista no pagamento do crédito com a
importância obtida na excussão do bem onerado, pois só lhe é conferido o direito de
retenção (§ 1º do art. 1.509 e 1.423, CC);
o credor anticrético só poderá aplicar as rendas que auferir com a retenção do
bem de raiz (coisa imóvel alienável), no pagamento da obrigação garantida;
requer para sua constituição: escritura pública e inscrição no registro
imobiliário.
necessita da efetiva entrega do imóvel (tradição) ao credor anticrético.
O credor pode reter o imóvel do devedor, para dele usar e gozar, administrando-o
até liquidar o débito, mediante a percepção da renda do imóvel; reivindicar seus direitos
contra o adquirente do imóvel e credores quirografários e hipotecários posteriores à
inscrição da anticrese; possui direito de retenção (art. 1.509, §§ 1º e 2º) e defesa da posse;
O credor deve guardar e conservar o imóvel como se fosse seu, respondendo pelas
deteriorações que, por culpa sua, o imóvel vier a sofrer, bem como pelos seus frutos que
deixar de perceber por negligência, desde que ultrapassem, no valor, o momento do seu
crédito (art. 1.508); prestar contas de sua administração; restituir o imóvel, findo o prazo
contratado ou quando o débito for liquidado.
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d) Extinção
a) Características e requisitos
101
O devedor fiduciante, seu cessionário ou sucessor passaram a ter direito real de aquisição nos termos
do art. 1.368-A, que foi incluído no Código Civil pela Lei n. 13.043/14.
102
De acordo com Farias e Rosenvald (2009, p. 380), o Decreto-lei 911/69 foi parcialmente esvaziado
devido ao tratamento de direito material e processual da propriedade fiduciária ter sido inserido no Código
Civil. Entretanto, o mencionado dispositivo legal não foi totalmente revogado, devendo-se atentar ao
procedimento de busca e apreensão de bem nele previsto, com alteração pela Lei n. 10.931/04.
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Exige, para sua constituição, no caso de bens móveis, instrumento escrito (público
ou particular), devidamente arquivado no Registro de Títulos e Documentos (art. 1.361, §
1º; 1.362, CC). Para imóveis requer escritura pública e registro no Cartório Imobiliário.
Recai sobre bem móvel "in comercium" e infungível; coisa imóvel; direitos reais;
direito sobre coisas imateriais.
Devido à proibição do pacto comissório (art. 1.365, CC), se o débito não for pago
no vencimento, o credor deverá vender o bem alienado a terceiros, não estando sujeito à
excussão judicial (art. 1.364, CC). O credor fiduciário poderá proceder à execução contra
o devedor fiduciante, seus avalistas ou credores, hipótese em que o credor poderá fazer
com que a penhora recaia sobre qualquer bem do devedor.
O devedor pode ficar com a posse direta (art. 1.361, § 2º, CC) da coisa alienada
em garantia fiduciária, mantendo-a e conservando-a, defendendo-a com os interditos
possessórios; haver a restituição simbólica do bem dado em garantia, assim que pagar seu
débito ou reivindicar a coisa, se recusa houver por parte do fiduciário de entregar o bem,
uma vez paga a dívida; entregar o bem, no caso de inadimplemento da obrigação e
receber do fiduciário o saldo da venda da coisa alienada efetivada por força do
inadimplemento de sua obrigação (art. 1.363,II, CC); intentar ação de consignação em
pagamento, se o credor recusar-se a receber o pagamento da dívida ou a dar quitação.
O devedor deve permitir que o credor ou fiduciário fiscalize o estado da coisa
gravada; não pode dispor da coisa alienada fiduciariamente; continuar obrigado
pessoalmente pelo remanescente da dívida, se o produto alcançado pela venda do bem,
realizada pelo credor, não for suficiente para saldar a sua dívida e as despesas efetuadas
com a cobrança (art. 1.366, CC).
O credor fiduciário pode considerar vencida a dívida, se o devedor não pagar uma
das prestações; reivindicar o bem alienado fiduciariamente; vender a terceiros a coisa que
adquiriu fiduciariamente, empregando o produto da venda da coisa alienada, se
inadimplente o devedor, no pagamento do seu crédito, juros e despesas de cobrança (art.
1.364, CC), requerer a devolução da coisa alienada fiduciariamente, a busca e apreensão,
bem como propor ação possessória quando necessário e oferecer embargos de terceiro se
o bem for penhorado por qualquer credor do devedor.
O credor fiduciário deve proporcionar ao devedor o financiamento, empréstimo
ou entrega de mercadoria a que se obrigou e respeitar o uso da coisa alienada pelo
fiduciante; e restituir o domínio do bem gravado assim que o devedor quitar seu crédito.
a) Requisitos
Para ser considerada direito real de aquisição, a promessa de compra e venda deve
conter os seguintes requisitos:
irretratabilidade do contrato (art. 1.417 e 473, CC);
recair sobre bem imóvel loteado ou não, rural ou urbano, edificado ou não,
desde que não seja inalienável;
exige que o preço seja pago à vista ou em prestações periódicas;
capacidade das partes e inscrição no registro imobiliário (art. 1.417, CC).
b) Efeitos jurídicos
Mediante o preenchimento dos requisitos acima, a promessa de compra e venda
passa a ser direito real e promove os seguintes efeitos:
oponibilidade "erga omnes";
transmissibilidade aos herdeiros por morte do compromissário-comprador ou
compromitente-vendedor;
direito de sequela;
imissão na posse;
cessibilidade da promessa;
purgação da mora;
adjudicação compulsória;
não há resolução do contrato por sentença declaratória da falência de quaisquer
das partes.
É importante esclarecer que o direito real nasce com o registro da promessa, mas a
pretensão de impedir a eficácia de alienações e onerações posteriores à celebração do
contrato só pode ser exercida após o pagamento integral.
c) Extinção
O direito real de aquisição pode se extinguir pela execução voluntária do contrato,
execução compulsória (adjudicação), distrato, resolução (inadimplemento contratual),
impossibilidade superveniente de aquisição, vício redibitório e evicção.
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