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AÇÃO

O 1º comportamento penalmente relevante é a ação.

Figueiredo Dias:
O conceito de ação ainda subsiste como base autónoma e unitária de construção do sistema
O conceito de ação é importante porque é o mínimo que tem de existir para qualificar um comportamento com
crime.

Maria Fernanda Palma:


O conceito de ação surge para responder à questão de saber a que realidade/objeto se referem as valorações do
conceito de crime.

O conceito de ação cumpre uma pluralidade de funções

1. Função de Classificação
Identifica um conceito geral comum tendo uma função classificatória - torna perceptível as características
comuns a todos os crimes
MFP - conceitos de ação da escola clássica e finalista são muito criticados pala função classificatória por não
conseguem especificar dentro de vários géneros

2. Função de Definição e Ligação - Sistemática


Capacidade de abranger todas as predicações posteriores, possuindo entre si o mínimo de substancia e
materialidade indispensáveis a suportar essas predições mas sem antecipar o significado material especifico
que numa cada uma delas

3. Função Processual Germanistica

4. Função de Delimitação:
Possibilidade de excluir comportamentos, ad initio, não podem nem deve, constituir ações relevantes para o
direito penal e para a construção dogmática de facto punível
Fronteira entre o relevante e irrelevante da ação

Para a Professora MFP a ação tem sido o conceito que exprime o pressuposto básico da responsabilidade por culpa,
condicionando o tipo de comportamento que em geral pode ser designado como crime.

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Até onde se deve aceitar a qualificação de um comportamento como ação?

- Perspetiva ontológica - análise do que caracteriza no seu ser e existência o comportamento como expressão da
ação humana e ação pessoal

A discussão sobre a extensão do conceito de ação é pertinente, desde logo, para análise dos casos de dúvida como
os movimentos reflexos e os automatismos.
O princípio do direito penal do facto faz com que possamos, deste logo, excluir determinadas realidades como por
exemplo aquilo que sejam meras intenções, ou pensamentos ou sonhos.
Estes acontecimentos até podem indicar a perigosidade do agente mas não constituem factos.
A doutrina do facto punível remete apenas para factos, nunca para peras intenções ou pensamentos.
Meras vivencias psíquicas do agente nuca poderão ser consideradas crimes - isto deve-se por razões ligadas ao
princípio da culpa, autonomia e dignidade da pessoa humana.

Casos de coação física insuperável:


Situações e coação física insuperável nunca poderão ser comportamentos penalmente relevantes porque não
conferem esse mínimo passível de censura
Agente é movida como um objecto - o corpo está a mover-se mas sem qualquer comando levado pela sua vontade
Ex: Coagido é obrigada por outra pessoa a por a mão no gatilho, tem emendo força que o agressor e acaba por ter
de o fazer.
Ex: Alguém é empurrado e cai em cima de alguém

Caso de Embriaguez:
Teremos sempre um comportamento penalmente relevante - foi o agente que se colocou naquele estado

Movimentos Reflexos:

Comportamentos compelidos por uma força física irresistível em que está fora de causa qualquer comportamento
voluntário.
- Comportamentos insuscetíveis de assimilação pela vontade
- Não intervém a vontade - é um comportamento provocado pelo Sistema nervoso
- Normalmente é inato - mas pode haver certas pré disposições congénitas que levem a atos reflexos
- Todas as pessoas fazem igual, sem exceção, pois é biológico de reação a estímulos

O agente não pratica uma verdadeira ação penalmente relevante, uma vez que não existe qualquer dirigibilidade
ou poder de controlo por parte do mesmo
É uma reação puramente biológica, pelo que, todas as pessoas, em principio, teriam a mesma reação.

Em termos de organização de conceitos, por vezes, a doutrina, divide-os em alguns subtipos como atos reflexos e
atos instintivos.

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Atos Reflexos:
- Situações em que intervém uma reação em que não é uma parte minimamente controlável do agente - o corpo
reage sozinho a isso - não é algo que possa evitar
- Ex: Exame que os médicos fazem ao bater na perna fazendo-a subir

Atos Instintivos:
- É possível controla-los
- Reação intuitiva no sentido inato
- Não reage porque pensou, vai fazê-lo automaticamente mas não será com a mesma intensidade que nos atos
reflexos
- Ex: Capacidade de resistir à dor de uma queimadura, nem toda a gente tem de reagir da mesma forma
- A sua vontade inconsciente ainda tem forma de intervir
- Mas é possível que se treine para não reagir daquele modo instintivo

Automatismos:

Resultam de um processo de aprendizagem - são produtos da experiência e da aprendizagem, controláveis


Parece que não são controlados e que o agente é controlado por eles - desenvolve de tal forma o automatismo que
não o consegue interromper
Não é como um ato reflexo, uma atuação sem vontade e biologicamente comandada - tem uma finalidade
Comportamento está dirigido para uma finalidade e são adquiridos/treinados e necessários para a atividade
final
- Podem ser impulsivos - reposta a uma situação que o agente não controlou
- Situações que o indivíduo começou e não consegue parar/interromper - pessoa não é suficientemente livre para
parar o comportamento automático

Divergência Doutrinária quanto aos Automatismos:

Stranwerth - existência de uma ação independentemente de se poder identificar qualquer estado de consciência
ou de afirmar a possibilidade de uma intervenção controladora da consciência
Doutrina que entende que, mesmo inconsciente, há um direção na vontade - a consciência não é necessária
para que haja uma ação final
Se a divisibilidade é inconsciente, ela poderia ser consciente, logo, estamos perante uma ação
Não secciona o comportamento e vê-lo como um todo dirigido a uma finalidade - foca-se no comportamento
global

Jakobs - seria decisiva, para de enquadrar como ação, a possibilidade de afirmar a concreta evitabilidade
individual do comportamento
Só há automatismo se a consciência não permitir parar/interromper
Relevância do automatismo como independente da globalidade da ação

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Maria Fernanda Palma:
A consciência do ato no sentido mais racionalizado não é critério de voluntariedade nos comportamentos
automáticos, embora seja sustentável a permanência de um nível baixo de consciência pois será sempre difícil
anular a presença de consciência em atos que se integram num processo a fins escolhidos pelo agente.

A professora tem uma posição intermédia face aos automatismos:


Automatismos não poderão ser considerados ações - passíveis de responsabilidade penal - onde não existir desde
logo uma reconhecibilidade dos atos como elementos do processo de um comportamento globalmente final e que
é assumido pela pessoa como sua expressão
A concreta impossibilidade do agente prever a situação que explica o ato, nas circunstâncias em que o agente
empreende a sua conduta, afasta a relevância como ação dos automatismos, porque não permite vislumbrar um
comportamento motiváveis
A imprevisibilidade de um desencadeamento da conduta automática é manifestação de que o automatismo não é
elemento integrante da conduta global final em que surge como uma intromissão inesperada
Pode haver ponto de apoio para qualificar o comportamento como uma ação se houve possibilidade do agente
dirigir o comportamento de forma consciente
Só não há ponto de apoio se não havia possibilidade sequer de consciecia para dirigir o comportamento

MFP não exclui que os automatismos podem ser ações mas exclui classificar como ação um automatismo em que
há tempo para a consciência intervir
Critérios não são incompatíveis

A fronteira entre o automatismo que é integrável numa conduta voluntária e aquele que corresponde apenas a um
domínio do corpo sobre a vontade há de depender do grau de previsibilidade da situação ou do estimulo que
suscita o ato.

A professora utiliza como critérios para resolver estas situações a previsibilidade e a evitabilidade da ação - haverá
ação penalmente relevante quando houver previsibilidade e evitabilidade da situação e dos estímulo que suscita o
facto

MFP entende que estes entendimentos contribuem para saber quando há uma ação.

O agente poderia ter representado aquele facto antes de atuar?


- Se Sim, há ação

Roxin - conceito abrangente de ação


- Inclui o automatismo - expressão da personalidade do agente
- Para este autor, os automatismos são sempre ações porque demonstra sempre personalidade

Jacobs - coloca o critério na evitabilidade individual do resultado = possibilidade da intervenção da consciência


- Haverá automatismo quando a consciência não intervém
- Havendo possibilidade da consciência intervir, temos ação

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Hipnose, Sonambulismo e alguns casos de efeitos de substâncias:

Hipnose:
Autores tendem a considerar que é penalmente relevante

Maria Fernanda Palma:


Nestes casos, o entendimento entre o corpo e a pessoa e a integração da ação corporal numa linha geral de ação
não existe. Os comportamentos praticados sob efeito de hipnose não constituem ações
Não estamos sequer perante comportamentos dominados pela vontade.

Roxin:
Considera que a prática de certos factos criminosos sob hipnose seria impossível para certas pessoas - sendo-o
somente para quem fosse capaz de cometer esses atos em estados conscientes.

Sonambulismo:
Autores tendem a dizer que não é penalmente relevante

Maria Fernanda Palma:


É importante que o Direito Penal, tendo os seus critérios e valorações, só as faça funcionar num diálogo e
comunicação com as pessoas em que se reflete.
O Direito Penal não pode impor os seus critérios com total indiferença pelo significado que os comportamentos
têm para os seus destinatários.
O que isto quer dizer é que o Direito Penal tem o seu principio da culpa - só podemos punir se pudermos censurar
- Saber se a pessoa poderia ter reagido de outra maneira ou não
Na linguagem social um comportamento só é minimamente voluntário para efeitos de poder ser depois
censurável se a pessoa poderia ter feito outra coisa
À partida, nos casos em que a pessoa não tem uma consciência reflexiva do que está a fazer, a sua capacidade de
controlo diminui.
Ainda assim, olhando para o contexto e quadro em que surgiu o estímulo e a reação ainda podemos
eventualmente identificar certos factores que permitem dizer que ainda há um mínimo de voluntariedade -
quando era previsível para a pessoa o aparecimento do estímulo que vai desencadear a ação/reação.
Se era previsível que ia aparecer, à luz dos critérios da sociedade, então esse comportamento teve um mínimo de
previsibilidade e é possível que venha a ser censurado.
Não quer dizer que seja mesmo censurado face aos restantes critérios depois vistos mais à frente.

Ex:Se a pessoa sabe que é sonâmbula, sabe que costuma ser agressiva e deita se com o bastão na mesa de
cabeceira - aqui há previsibilidade

Jacobs:
Critério da evitabilidade - tem a ver com o seu funcionalismo sistémico
O Direito Penal quer garantir a vigência das normas
Só faz sentido garantir essa vigência por referência aos comportamentos que as colocam em causa
Esses são aqueles que a pessoa poderia ter evitado

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Os que não podia ter evitado não colocam a norma em causa - Não se justifica a intervenção do direito penal - não
se justifica que seja penalmente relevante
O comportamento ao qual o Direito Penal dá relevância é só aquele que possa ter colocado a norma em causa e
esse é o que o agente poderia ter evitado
Para saber se é penalmente relevante - olhamos para o agente na situação em concreto e perceber se ele poderia,
querendo respeitar a norma, ter evitado aquele comportamento.

Roxin:
Não há uma manifestação de personalidade porque está a atuar num mundo que existe, na sua cabeça

Actiones liberae in causa:

Só podem ser ponto de apoio da resposta penal quando são deliberadas


Justifica a responsabilidade penal dos agentes que dolosamente se tivessem colocado num estado de falta de
consciência
A ação é anterior ao decidir colocar-se nessa situação
Vem admitir-se que a responsabilidade penal pode assentar em momentos anteriores, pois na realização dessas
condutas persiste ainda uma dimensão da vontade e nelas se espera o desenvolvimento corporal e automático,
característico da ação humana, de uma orientação final global da conduta.

Casos em que os agentes se submetem a hipnose para poder praticar certas condutas, ou sendo sonâmbulos,
criarem a possibilidade, com elevada probabilidade, de realizarem uma certa conduta, ou consumindo substancias
para realizar uma conduta.
- Art 20º/4 CP - não exclui explicitamente a capacidade de culpa, não deixando de existir, manifestamente, ação
- O agente tem de querer utilizar intencionalmente o estado em que se colocou

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OMISSÃO
A omissão é, ao lado da Ação, uma das formas especificas de realização típica
- FD - Mas são estruturalmente diversas
As omissões só serão punida quando houver dever jurídico de não atuar
- MFP - A relevância penal da omissão tem de ser construída a partir de uma analogia com o comportamento
ativo
Na linguagem normativa, as proibições podem integrar comandos de ações

O que nos permite distinguir ação de omissão?


Se se concluir que não há nenhuma distinção, os comportamentos típicos seriam indiferenciadamente ações e
omissões
Este ponto de vista não é o que o CP adota - não deve ser adotado até considerado na CRP

Delimitação entre ação e omissão:

Figueiredo Dias:
Na senda da doutrina germânica, naturalisticamente, existe ação quando há uma introdução positiva de energia,
por parte do agente, que casualmente determina a produção do resultado típico
Este critério tem de ser complementado com uma postura valorativa no sentido social do comportamento -
distinguindo se o ponto de conexão da censurabilidade jurídico-penal se encontra num comportamento ativo ou
omissivo
O critério determinante deverá ser o da criação de perigo
Deve entender-se que há ação sempre que o agente criou ou aumentou o perigo que vem a concretizar-se num
resultado
Deve entender-se que há omissão sempre que o agente não diminuiu o perigo já existente

Kaufman - propondo o principio da subsidariedade - só existe omissão relevante quando o comportamento não
pode ser perspectivado como uma ação.

O ponto de vista de diferenciação entre ações e omissões caba no art 10º CP

Eduardo Correia:
Entende que o tipo legal de crime já comporta comandos de ação e comandos de omissão
Quando a norma configura um certo comportamento ao mesmo tempo indica ao agente que este tem o dever de
evitar certo resultado.

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Jacobs:
Quando pensamos que A atropela o B podemos perguntar é uma ação ou omissão?
Jacobs questiona se faz sentido dar assim tanta importância a esta distinção
Nos casos de fronteira muito ténue não se deve justificar

Depende do modo como descrevemos a situação


Se é tão difícil de distinguir será que se justifica estabelecer uma diferença tão grande nos seus efeitos quando
não parece sequer relevante?
Importante é saber se o agente violou algum dever que tinha
Em geral as pessoas tem deveres com os demais - deve genérico em qualquer ordem social - não lesar os próximos

Lógica funcionalista de Jacobs:


As pessoas dispõem de liberdade e para isso tem vários meios - eles e que têm, em principio, competência para
organizar a sua liberdade como bem entenderem
Com o limite do dever negativo de todas as pessoas - desde que não o façam de tal modo que venha a repercutir-
se de modo lesivo ou perigoso na igual competência que os outros têm para organizar a sua própria liberdade

A atropela o B - usou o meio de que dispunha para usar a liberdade de tal modo que interferiu com a do outro
Isso é que é importante, não se o faz através da ação ou omissão

As sociedades não podem bastar-se com este dever mínimo tendo em conta a complexidade que têm hoje em dia
Acrescem deveres específicos numa lógica mais institucional e funcional
Em função da posição que ocupam face a potenciais vitimas elas tem deveres acrescidos
Determinadas pessoas têm deveres acrescidos para tutelar a confiança que as pessoas têm relativamente às
instituições

MFP:
Para a Professora, porém, a relevância penal da omissão surge essencialmente como problema a partir da
exigência de um requisito comportamental geral, comum a toda a responsabilidade penal.
Não se pode utilizar uma teoria não naturalista sobre a ação, em geral, e simultaneamente praticar uma distinção
entre ação e omissão naturalista, na interpretação do 10º/2
O art 10º surge como uma cláusula extensiva da tipicidade, permitindo que, preenchidos os seus requisitos, se
puna o agente por comportamento omissivo.

Faz uma distinção a 2 níveis distintos:


1. Sempre que o agente vai alem da sua competência e ultrapassa a sua esfera, ao interferir com a esfera de
outra pessoa, cria responsabilidade.
Tanto é responsável quem pratica uma ação proibida, como aquele que não pratica a ação a que está obrigado
- daí ser indiferente estarmos perante uma ação ou a uma omissão
2. O individuo que esta numa posição de assunção de um dever - domínio em que assume uma posição de
garante

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Clausula de extensão de tipicidade:
Implica a verificação de que a teoria tradicional das posições de garante é compatível com as exigências do
princípio da legalidade
Para que os comportamentos sejam naturalisticamente omissões, sejam puníveis, têm de obedecer ao art 10º/2

Pode acontecer que dada a configuração da norma em concreto, um comportamento ativo pode ser visto como
uma omissão

Omissão através da Ação:

Roxin:
É perfeitamente possível submeter uma ação a um tipo omissivo quando tal é imposto por razões normativas

FD:
Casos em que o agente não diminui o perigo que, independentemente dele, afetava um bem jurídico.

Crime de Omissão:

Violação de uma imposição legal de atuar


Só pode ser cometido por pessoa sobre a qual recaia um dever judicio de levar a cabo a ação imposta e esperada

Só numa maioria de casos é que a lei, de forma integral, descreve os pressupostos factícos, de onde resulta o dever
jurídico de atuar. Na maioria, basta a clausula geral do art 10º/2
- É com base nisto que surge a distinção entre crimes omissos puros e impuros

Crimes puros/próprios de omissão:

Roxin: não tem correspondência num delito de ação - o delito correspondente de ação não existe
Parte especial referência expressamente a omissão como forma de integração típica, descrevendo os pressupostos
fácticos de onde deriva o dever jurídico de atuar

Nunca se pode dizer que a violação do dever de auxilio - art 200º CP - é uma fonte de posição de garante
Essa violação apenas é uma tipicidade da violação do dever de socorro.
- A posição de garante vem de uma autovinculação implícita
- Dever geral de auxilio não é fonte de posição de garante

Resultam diretamente da parte especial do código, estando aí regulados como tal.


Os crimes puros de omissão são crimes de mera atividade, na medida em que não é necessário que haja um
resultado, batendo a execução de determinado comportamento

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Nas omissões próprias:
O próprio tipo já descreve o comportamento como sendo omissivo - Ex: omissão de auxilio - art 200º
Crimes que estão descritos como omissão
Aquilo que temos de fazer para punir a pessoa é aplicar o tipo ao caso - praticou o crime de omissão

O art 10º não se aplica a omissões puras

Crimes impuros/impróprios de omissão:

Crimes de comissão por ação


Não especificamente descritos na lei como tais, mas em que a tipicidade resulta de uma cláusula geral de
equiparação da omissão à ação - art 10º/1/2
O fundamento desta equiparação é que, para certo tipo de ilícito, o desvalor da omissão corresponde no essencial,
ao desvalor da ação.
Sobre o agente recai um dever de evitar ativa ou positivamente a realização e verificação do resultado típico
Tem o dever de garantia ou de garante

Uma das questões levantadas em torno dos crimes de omissão imprópria tinha a ver com as exigências de
determinação típica - envolvendo a problemática da constitucionalidade

Cavaleiro de Ferreira - não é norma incriminadora constitucionalmente válida aquela cujo teor se apaga numa
clausula geral que remeta o seu preenchimento pelo julgador
Essa inconstitucionalidade podia pôr-se pelo art 10º porque não se afirmava por lei certa a realização mediante a
não levitação do resultado
É certo que as normas penais têm de delimitar claramente as proibições e permissões mas os elementos da
factualidade típica fornecem ao interprete e ao aplicado do direito uma base de partida razoável, nomeadamente
no que diz respeito ao caracter jurídico do dever de garante - Figueiredo Dias

Como se determinam os deveres de garante, de forma a responder às exigências do principio legal


nullum crime sine lege?
Para responder a esta questão surgem 2 teorias:
1. Teoria formal da dever jurídico e das posições de garante:
O crime de omissão pressupõe um especial fundamento jurídico - lei ou contrato - daí se extraindo a base de
obrigatoriedade
Uma terceira fonte é acrescentada - a ingerência - situação de perigo anterior criada pelo omitente
2. Teoria material - teoria das funções:
Os deveres de garante fundam-se numa função de guarda de um bem jurídico concreto, ou numa função de
vigilância de uma fonte de perigo

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Fontes de Posição de Garante:

Exigência de um dever jurídico do art 10º/2 não corresponde a um dever legal


O dever legal não se confunde com o dever jurídico de evitar o resultado
Há um espaço lógico entre eles

Deveres de Garante:
Problema:
Principio da legalidade - nada na lei nos diz quais são os deveres de garante
FD - há 6 deveres de garante - mas o prof não é legislador
Os deveres de garante têm uma cláusula geral no art 10º/2 que deve ser interpretada de uma forma bastante
restritiva
Temos de ser exigentes, só podemos aceitar um dever de garante quando, em termos de valor e de censura,
comissão seja equivalente à ação

Supondo que há um comportamento penalmente relevante e entendemos que há uma omissão, temos em
seguida de ir ver se o agente tinha o dever de praticar alguma ação que omitiu - só assim é que a omissão poderá
ter relevância
Na procura desse dever de atuar vamos ver se é um dever de garante

É importante distinguir omissões próprias e impróprias

A maior parte dos casos, os crimes parecem pensados para ações - como? - quem matar - pratica uma ação
Parece mais difícil incluir, à partida, o deixar morrer
Olhando para o art 131º parece que só cabe lá a ação de matar

O art 10º vem dizer que quando o tipo prevê uma ação adequada a um resultado, não só a está a prever como
também compreende a omissão da ação adequada a evitar esse resultado
Mecanismo para fazer equiparação da omissão à ação - que só funciona quando haja esse dever de garante
Homicídio por omissão é um crime de omissão impura - clausula do 10º que nos deixa equiparar a omissão à ação
mas só no caso de ter uma posição de garante
Conjuga-se o tipo da parte especial mas com o art 10º
Isto nunca acontece nos crimes de omissão pura cuja omissão está especificada no tipo!!

Quando é que as pessoas têm dever de garante?


As omissões puras são subsidiárias às impuras - começamos sempre por ver se a pessoa tem uma posição de
garante
As omissões impuras prevalecem sobre as puras
Só sanciono pela omissão pura quando não consigo fazê-lo pela omissão impura

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A pessoa tem dever de garante quando está investida na posição de garante numa determinada situação em
concreto.

Fontes da Posição de Garante:


Temos de saber quais são as fontes de posição de garante
Tradicionalmente, na teoria mais formal, esses autores diziam que as fontes são a lei e o contrato
Mas por razões várias a teoria foi sendo superada e evoluiu-se para a teoria das funções/material
Hoje tende-se para uma conjugação entre as duas
O essencial seria a fonte material, sem prejuízo da lei e do contrato poderem ser pontos de apoio importantes

MFP - Tem de ser possível verificar, poder ler uma autovinculação da parte do agente - mesmo que seja
implicitamente - so assim se extrai a condição de juridicidade

FD - Relação de solidariedade como princípio genérico que explica as fontes de posição de garante
Proximidade existencial das pessoas
No meu viver da sociedade em relação com todos os outros se gere um dever de solidariedade que nao faz com
que haja sempre um dever jurídico em todas as situações.

1. Ingerência:
Na anterior intervenção geradora de perigos o sujeito é obrigado, como garante, a impedir a produção do
correspondente dano
Quem cria perigo tem o dever de impedir que este venha a converter-se em dano.
Casos em que alguém, com a sua conduta, pôs a vida de outrem em perigo.
Ainda assim, há quem tome posição contra, quem seja anti-ingerência.
A tendência é para lhe introduzir limitações - a ingerência lícita não é um molde para fundar um dever de
impedir um resultado.
Não bastará que o perigo seja adequado, é ainda necessário que ele tenha, ilícita ou inadmissivelmente
sido criado.
Não bastam perigos mínimos - o perigo de causar um prejuízo a outrem deve ser um perigo adequado

Há que distinguir 2 momentos :


- O perigo aparece, é criado ou aumentado pelo agente ou não é diminuído por este
- O perigo sai concretizado num resultado - agente não atua para evitar a concretização daquele perigo que
surgiu num primeiro momento

Caso da legitima defesa - No intervalo de tempo entre o 1º e o 2º momento fica a pessoa atacada com o
dever de evitar que essas lesões que se venham a repercutir no resultado morte?
Foi a pessoa que se defendeu que criou esse risco - será que faz dela um garante em termos de ingerência?
Pensa-se a ingerência para situações em que a pessoa perturba as esferas de liberdade - vai-se imiscuir na
esfera do outro - responsável para que essa interferência não se venha a repercutir em lesões na outra esfera

A doutrina tende a dizer que esta ingerência só se traduz num dever de garante quando a ingerência seja

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ilícita e naturalmente haja uma conexão entre o risco criado e o resultado
Nesses casos é muito claro - se criar um risco ilicitamente e não tenho nenhuma justificação para o ter feito - é
claro que fico com o dever de evitar que se produza o resultado
Excesso de legitima defesa - não há exclusão de ilicitude - então tinha o dever de garante
Outra parte da doutrina defende que mesmo em certos casos de ilicitude também se justifica a posição de
garante - Ex: direito de necessidade - direito permite atuar daquela maneira mas a pessoa que está a ser
sacrificada não fez nada - depois tem de se precaver para que o sacrificado não tenha mais prejuízos - Ganha
esse dever de garante - FD e TC
Nas situações de direito de necessidade uma vez que o sacrificado não é responsável de modo nenhum por
ter sido colocado naquela situação - há dever de garante
MFP - Não se gerará uma posição de garante quando não se possa estabelecer uma conexão normativa entre
o comportamento do agente e do resultado - quando não haja imputação objectiva - situações de
comportamento licito alternativo
Não se estabelece conexa entre o comportamento e o resultado por isso não há ingerência

Tudo vai depender da posição subjectiva do agente:


Há sempre 2 momentos
Pessoa que deita a outra ao lago
1. Empurra
2. Vitima está a afogar-se e depois morre
Podemos figurar várias hipóteses consoante a posição subjectiva do agente

- Fez as 2 coisas sem querer - não reparou em nada


So temos um crime - homicídio negligente por ação

- A pessoa empurra sem querer vê que empurrou e que a outra se está a afogar e vai-se embora aceitando que
ele pode morrer
Ação negligente de homicídio mas o 2º momento é diferente - omissão dolosa - dever de garante por causa da
ingerência e já prevalece o 2º momento porque o homicídio doloso por omissão é mais grave - art 123º +10º

- Empurra de propósito e vai embora


É um homicídio por ação doloso

Responsável por uma obra - tempestade - leva a que se deteriorem as condições da obra - não foi ele que fez
isso - mas ele é que é o responsável - se ele não faz nada e um dia cai alguma parte da obra e magoa alguém -
por omissão é responsável por aquele risco por ingerência, devido ao seu dever de garante

A ingerência reporta-se sempre ao 2º momento


Se a pessoa morre logo não há ingerência - violou o dever de cuidado e a posição de garante já podia existir
antes através da vigilância de fonte de perigo

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2. Dever de garante por vigilância de outrem:
Na responsabilidade por condutas ilícitas de terceiro, cabe começar por observar que cada um é responsável
pelos seus próprios atos e que a este princípio apenas fogem os educados quando aos menores, os
professores relativamente aos alunos no respetivo circulo escolar, os guardas prisionais para com os maus
tratos recebidos pelos reclusos de outros presos.
A responsabilidade termina, por exemplo, entre cônjuges - haverá um especial dever de protecção mas quem
não impede o seu cônjuge de cometer crimes não assume qualquer posição de garante - nenhum dos
cônjuges é guarda do outro

Relativamente aos polícias:


O fundamento essencial é a autovinculação implícita
Comunidade de Risco
Estão institucionalmente investidos numa posição de garante
Para garantir o respeito pelo principio da legalidade precisamos de pode dizer que o agente podia contar com
o facto de vir a ser responsabilizado/autovinculação tem aqui uma componente muito institucional e forte -
assunção de deveres de proteção embora aqui seja em função da posição que ocupa - a pessoa ter neste caso
a posição de garante

3. Laços Familiares
Laços familiares implicam deveres de garantia mas o âmbito em que isso ocorre não foi ainda estabelecido
com a necessária precisão
O núcleo fundamental assenta no vínculo natural dos pais com os filhos - relações de cuidado
Enquanto os filhos, por si só, são incapazes de sobreviver, têm os pais o dever de lhes prestar a colaboração
correspondente às suas necessidades

Nem todos aceitam que das relações conjugais derivam deveres de garante, mas do que não há duvida é
que qualquer dos cônjuges espera auxílio do outro e confia na sua proteção em situações de necessidade,
como coisa natural e justificada - os deveres conjugais determinam, pelo menos, o dever jurídico de ambos se
protegerem e ajudarem, de acordo com as suas forças, em caso de perigo de vida
Estes deveres conjugais relacionam-se com a estreita comunhão de vida e de perigos - relações com
características duradouras, por força da mutua confiança estabelecida
Já não se compreende tão bem um dever reciproco de proteção quando o casamento está desfeito e,
sobretudo, se os cônjuges fizerem vidas separadas.

O Professor Figueiredo Dias estabelece 2 critérios cumulativos para que as relações familiares constituam
deveres de garante:
- Existência de uma relação de proximidade afetiva - tal proximidade não precisa de ser física
- Existência de uma relação de dependência - o laço de consanguinidade não basta para existir o dever de
evitar resultados, um dever de garante - é necessário que haja dependência

Proximidade existencial das pessoas


Na medida em que o meu viver em sociedade em relação com todos os outros gere um dever de
solidariedade que não faz com que haja sempre um dever jurídico em todas as situações.

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O que é essencial não é o sangue mas sim a proximidade factícia numa relação de dependência - ex: pai
adotivo e filha adotiva
Se o pai deu o filho para adoção deixou de ter posição de garante
À media que o filho cresce a posição de garante também se vai atenuando
O que interessa é a facticidade material - varia e depende de caso para caso

4. Perigos para bens extremamente valiosos:


Ex: o guia de expedições - quem toma parte nelas é responsável pela vida das outras pessoas mas não pelos
seus bens
Figueiredo Dias - tende a aceitar com maior abrangência
Desde que haja relações estreitas com as pessoas mas na medida em que se traduzam, no caso concreto, num
pressuposto de confiança - Ex: estavam a fazer montanhismo em conjunto
De que em caso de necessidade dependem um do outro
No sentido de se traduzir na situação de confiança naquele momento e dependência
MFP - tenderá a dizer que não é por as pessoas fazerem um empreendimento arriscado em conjunto que se
estão a ajudar em caso de necessidade - temos de poder ler essa autovinculação
Não é assim tão diferente no resultado mas o modo como os professores o justificam é distinto

5. Deveres de custódia
Caso da babysitter - encarrega-se de substituir os pais, que estão vinculados ao portador do bem jurídico por
um vinculo natural, mas que assume, do mesmo passo, deveres de garante para com a criança.
Se o serviço se inicia, a eventual nulidade do contrato não pode deixar sem efeito a posição de garante
Se o contrato que está por base nesta relação não a vinculasse por alguma razão, ela tinha na mesma a
posição de garante

6. Vigilância de fontes de perigo:


Ex: camiões, animais perigosos, determinado tipo de instalações…
Quando a ordem jurídica aprova o domínio sobre essas coisas nasce o dever de as controlar e de evitar os
perigos que delas derivam
A pessoa torna-se responsável para que essa fonte de perigo não se venha a concretizar na esfera de outras
pessoas
A contrapartida por ter esta fonte de perigo é a de tomar as devidas precauções para que ela não se venha a
repercutir nas esferas de outras pessoas

7. Posições de Monopólio:
Divergência quanto à sua admissibilidade enquanto posições de garante
Taipa de Carvalho - inclui-as no dever geral de garantia, pois não deverá ser o facto de poderem ser vários ou
apenas um a salvar o bem jurídico que fará com que se deva afirmar apenas o dever de auxilio ou o dever de
garante.
Figueiredo Dias - Tal parece estar em contradição com a orientação doutrinária que apela à esfera de domínio
positivo do emitente

DIREITO PENAL - INÊS MORAIS FDL 15


Em situações de monopólio, o resultado desvalioso poderá ser imposto ao omitente recorrendo a estes
pressupostos explicativos e fundamentadores
Devemos estar perante uma situação de perigo agudo e iminente para bens jurídicos de valor cimeiro na
ordem axiológica constitucional, os quais não demandam mais do que um pequeno esforço do agente para
serem salvos.
A pessoa em causa não tem de ser a única a deter o domínio dos meios e das oportunidades de salvar o bem
jurídico

Só se pode aplicar subsidiariamente quando não estamos perante mais nenhuma posição de garante
possível
Pressupostos:
- Domínio fáctico absoluto - facilidade de intervir evitando a lesão do bem jurídico - não quer dizer que tenha
de lá estar sozinho, pode estar um grupo de pessoas desde que ele tenha toda a facilidade do mundo em
intervir - não quer dizer domínio exclusivo da situação
- Iminência do perigo - mesmo prestes a concretizar-se
- Desproporção entre o grau de esforço e o grau de perigo mínimo para o agente

Figueiredo Dias - Esta é uma posição de garante - lógica do solidariedade entre os membros da comunidade
Maria Fernanda Palma - Não deve ser vista como um tipo de fonte de posição de garante - Por muito
chocante que seja e que moralmente que exista esse dever, não há posição de garante pelo simples acaso da
pessoa ter passado por ali - não podemos exigir-lhe juridicamente que atue - podemos remeter estas
situações para a omissão do dever de auxilio enquanto omissão pura mas nunca para uma omissão impura,
por meio do art 10º.
Para a professora, não estamos perante uma posição de garante uma vez que a pessoa não se autovinculou de
nenhuma forma para tal
Pode gerar o dever geral de auxílio mas não uma posição de garante

O crime específico de recusa de médico:


Art 284º
Situação em que o agente é medico mas no caso concreto não tinha posição de garante
Ex: A vai a passar na rua e vê um acidente e não faz nada
A não tem posição de garante porque não estava de serviço mas mesmo assim é mais grave do que a do B que não
é medico
Daí a existência concreta do crime especifico de recusa de médico
Esse crime só é praticado quando a pessoa recusa o auxilio da sua profissão
Mas se era um cuidado médico que ele não pode prestar então ja não está a recusar auxilio medico - ele é como
outra pessoa qualquer

DIREITO PENAL - INÊS MORAIS FDL 16

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