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Teresa Ramos Ascensão

IMPUTAÇÃO SUBJECTIVA (juízo positivo da culpa)

1. Ver se o resultado é imputável à vontade do agente. Facto típico atribuível à sua


vontade.
2. Quanto à imputação subjectiva, a situação enunciada suscita a questão da vinculação
psicológica do agente ao resultado, traduzida pelo dolo. Objecto do dolo são os
elementos do tipo objectivo, que deverão ser considerados pelo agente do ponto de
vista do elemento cognitivo e do elemento volitivo (princípio da congruência).
3. Dolo e negligência – 14º e 15º.
 Dolo directo – agente representou e quis/desejou produzir o resultado,
orientando a sua acção nesse sentido. Conforma-se com resultado. Dolo
intencional – orienta conduta para realizar facto típico.
 Dolo necessário – agente representou o resultado como consequência
necessário da sua conduta e agiu à mesma, apesar de não orientar a sua conduta
a produzir o facto. não quer resultado, mas sabe que é inevitável. Necessidade
como consequência da conduta, não como meio para atingir conduta – aí, é
directo.
 Dolo eventual – agente representou o resultado como possível e conformou-se
com/aceitou essa possibilidade. Representa e conforma-se com o perigo
 Negligência consciente – agente representou possibilidade de realização do tipo
objectivo (há elemento intelectual) mas não se conformou com a mesma.
 Negligência inconsciente – agente nem verificou a realização do tipo objectivo.
4. Ver se tem dolo, pois, à partida, não é punido se não houver dolo – 13º. Porquê? Porque,
também de acordo com o princípio da culpa, o agente doloso é mais perigoso que o
negligente – era-lhe mais fácil evitar a lesão do bem, pois tinha vontade dirigida à
violação do mesmo. Agente está em conflito com norma e decide ir contra ela – a uma
maior liberdade de actuação corresponde uma maior responsabilidade.
5. Elementos do dolo:
5.1. Elemento intelectual – conhecimento/representação correcta da realização do
facto típico como pelo menos possível. Consciência da factualidade típica
(circunstâncias de facto) actual (no momento em que realiza facto). Actual não é
sinónimo de reflectida/ponderada/clara. Representação do perigo concreto – sabe
que comportamento é perigoso e danos são possíveis. Tem o conhecimento
necessário para ter uma correcta orientação da consciência. MFP: não é apenas
relação entre sujeito e objecto reconhecido, mas relação do sujeito consigo mesmo
– reconhecimento de si próprio, da sua racionalidade e experiência anterior.
Também nesta linha, WELZEL afirma que uma finalidade inconsciente demonstra já
que comportamentos automáticos não deixam de ser intencionais, quando
correspondem à adaptação a uma situação em que a actuação do agente é solicitada
de acordo com a sua experiência anterior. Implica ter conhecimento de todos os
elementos constitutivos do tipo objectivo. Não conhecendo, 16º/1 exclui o dolo. Ex.
desconhecer que está uma pessoa atrás do arbusto para onde disparo. Elemento
cognitivo é instrumental da consciência da ilicitude. Através das regras da
experiência comum, interpretamos se agente tinha conhecimento ou não. Que
conhecimento dos elementos de direito é que se pode exigir? Critério do significado
social – sé se exige que agente conheça o significado social de, por exemplo, “coisa
alheia” – esfera paralela do leigo.

Tipos de erro que podem excluir o dolo por excluirem o elemento intelectual:

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 Erro sobre a factualidade típica – 16º/1 – exclui dolo do tipo (não representa elemento
essencial do tipo do crime). FD: erro de tipo intelectual – a conduta é axiologicamente
neutra – agente não atinge a própria percepção dos factos existentes. Erro pode ser
quanto aos factos (vejo x, mas está lá y), quanto ao direito, ou quanto às proibições.

Este último pode-se confundir com o 17º, que exclui a culpa (erro sobre a ilicitude) –
fronteira nas situações em que o agente não sabe que é crime. Para FD, a diferença é
que no 16º/1 o erro é de tipo intelectual – as condutas são axiologicamente neutras (é
indispensável conhecer a proibição para ter consciência da ilicitude), e no 17º o erro é
de tipo moral – há um indício de desvalor porque as condutas são axiologicamente
relevantes (é possível ter consciência da ilicitude sem que se conheça a proibição).

Aplica-se o 16º/1 (proibições) quando o agente, apesar de ver a sua conduta como ela
é, não sabe que a sua conduta é crime porque não há razão axiológica para saber – é
crime por questão técnica, não é óbvio que há um bem jurídico, só é crime porque a lei
o diz. Aplica-se o 17º quando o agente sabe que aquele comportamento é crime, mas
acha que a sua conduta concreta não corresponde ao comportamento que é crime, dá-
lhe outro significado, valora a situação de forma diferente – aqui há sempre ponderação,
pois é claro que há bem jurídico.
16º/1 – mala prohibita – crimes cuja ilicitude não se presume conhecida de todos os
cidadãos (normas técnicas ou NPB) e não lhes é exigível tal conhecimento – erro sobre
a proibição. 17º - mala in se – crimes cuja ilicitude se presume conhecida de todos,
sendo-lhes exigível esse conhecimento – erro sobre a ilicitude. Se não for censurável
que não conheça, exclui-se a culpa.

16º/2 – erro-suposição – agente supõe existência de um estado de coisas que, a existir,


excluiria a ilicitude do facto ou a culpa do agente – exclui-se dolo da culpa.

Partir do critério de FD – conduta é axiologicamente neutra ou relevante? Se neutra, em


princípio exclui-se dolo do tipo. Mas, se for caso em que, mesmo que neutra, era exigível
ao agente ter conhecimento da sua proibição (agente especialmente responsável
atendendo à função que desempenha, ou agente que decide tomar parte de relação
especialmente regulada), então não se exclui dolo do tipo – aplicar 17º (MFP). Critério
de inevitabilidade da representação da gravidade da conduta, segundo factos concretos
como o nível de inserção do agente, evidência das regras, previsibilidade da
perigosidade da conduta. Representação evitável – 16º/1. Inevitável – 17º. Se era
relevante, não se exclui dolo do tipo. No entanto, se não for censurável ao agente não
ter consciência da ilicitude, exclui-se a culpa. Excluindo o dolo do tipo, 16º/3 remete
para indagação da punibilidade por negligência – 13º + 15º + norma do crime. Dolo não
é consciência da ilicitude, mas conhecer facto típico, mesmo que não se saiba se é
proibido ou não. Se agente sabe que está a matar pessoa, tem dolo (se conduta
axiologicamente relevante). Se acha que não é ilícito matá-la, será um problema de
consciência de ilicitude, que poderá ou não ser censurável (17º). Claro que, à partida, se
tem dolo tem consciência da ilicitude.

Se axiologicamente relevante – 17º. Se neutra – agente vê conduta como ela é, mas não
sabe que a mesma é crime – 16º/1, agente sabe que conduta x é crime, mas não vê a

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sua conduta como correspondente à que está na norma (acha que é y) – 17º. Com
correcção: se devia saber que é crime – 17º (MFP).

 Há quem distinga elementos descritivos de normativos. Descritivos – elementos


constitutivos do facto típico relativamente aos quais seria necessária uma percepção
sensorial. Normativos – basta representação do significado social – valoração paralela
na esfera dos leigos. Descritivos – não há dolo se falta de apreensão exacta pelos
sentidos. Normativos – não há dolo se falta de possibilidade de compreensão do
significado, numa perspectiva social. Para MFP, a questão central é saber se a deficiência
do conhecimento se refere à relação da norma com factos concretos ou à própria
compreensão da intencionalidade da norma.

 Error in persona vel objecto. Erro de representação da pessoa ou objecto do crime. Erro
na formação da vontade, pois está em erro quanto à identidade do objecto/pessoa a
atingir – erro de percepção. Exclui dolo do tipo? Depende: se elemento essencial da
factualidade típica não depende de um objecto concreto, erro é irrelevante e há dolo
(ex. tipo do crime de homicídio exige que se queira matar pessoa, não que se queria
matar pessoa x) – erro irrelevante sobre a identidade, pois a identidade não é elemento
constitutivo do tipo. Mas se erro for sobre qualidade tipicamente relevante/essencial
do objecto atingido, então exclui-se o dolo, sendo o erro-ignorância relevante (ex.
homicídio qualificado exige que agente queira matar pessoa concreta, como por
exemplo, o seu pai – se agente acha que está a matar pessoa qualquer, não tem dolo de
homicídio qualificado, mas simples).

 Erro na execução/aberratio ictus vel impetus. Agente tem representação clara, mas há
uma deficiência na execução ou um motivo exterior que o faz perder o controlo da acção
final, há falta de domínio sobre a acção concreta que se vem a realizar. Não provoca
risco que previu, e desencadeia processo que conduz a lesão diferente da que queria
causar – erro na execução que produz resultado distinto do projectado. Alteração da
produção causal/desenvolvimento causal (dentro daquilo que supostamente
dependeria do agente – diferente de uma falha no plano) + alteração do próprio
resultado (tem de haver alteração de ambos!). Exclui dolo do tipo?

FD: teoria da concretização – exclui-se o dolo – só pode ser punido por tentativa ou por
concurso da tentativa com crime negligente. HELENA MORÃO: só se pune pela tentativa.
TERESA BELEZA: se objecto atingido é igual (mesmo bem), é indiferente a
individualidade – assemelha-se a erros de identidade – pune-se pelo crime consumado.
Mas, nos casos de erro sobre o objecto, como há erro desde o início, só um bem esteve
em perigo. Aqui não, dois bens estiveram em perigo, mas só um se realizou. MFP: exclui-
se dolo e pune-se por tentativa – agente pratica acção controlada pela vontade, mas
não a consegue consumar e consuma outra não controlada finalisticamente. Há
pluralidade de acções – autonomia da decisão de agir inicial relativamente à acção
concretizada – uma acção dolosa e outra negligente, com objectos diferentes.

- Se erro implica facto típico da mesma espécie (identidade típica de objectos) – TERESA
BELEZA: teoria da equivalência – assemelha-se a erro sobre a identidade, sendo
irrelevante a individualidade – pune-se pelo consumado doloso; MFP: 16º/1 exclui o
dolo – pune-se por tentativa de crime projectado + consumado negligente (mesmo que

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inconsciente), se punível – concurso – teoria da concretização; porque agente pratica


dois actos – um controlado e falhado, outro sem controlo e consumado – criação de dois
perigos autónomos merecedores de punição. Único problema: pode haver casos em que
não será punido porque não se prevê punição por negligência nem por crime tentado.
- Se erro implica facto típico de espécie distinta – tentativa + negligência.

 Dolo alternativo/dolus alternativus. Há dolo em relação a dois resultados diferentes


(geralmente, directo quanto a um e eventual quanto a outro), mas só um se vai consumir
(é-lhe indiferente qual). Ex. Agente quer matar A, mas conforma-se com possibilidade
de acertar em B em vez de A. Como se pune?

MFP: concurso efectivo de crime tentado e crime doloso consumado – acção é bivalente
– encerrava em si, em alternativa, a possibilidade de atingir qualquer um e era
sustentada na decisão de atingir qualquer uma delas – ambas as vítimas foram objecto
da acção e os seus concretos bens jurídicos (vida de cada uma) foram ambos postos em
perigo – acção prejudica duas esferas (só no caso de haver perigo concreto para o que
não foi atingido). Solução criticada, porque na verdade trata-se de um só dolo com um
objecto alternativo – não se conforma com possibilidade de acertar nos dois, mas de
acertar num deles. Punir por dois crimes é ficcionar duas acções dolosas quando só
houve uma, violando o princípio non bis in idem (não valorar o mesmo conteúdo de
ilícito mais do que uma vez). FD: punir pelo crime doloso consumado – uma só acção,
uma só decisão (quer matar ou um ou outro) – conforma-se com a alternatividade (há
desvalor da acção e do resultado – não necessário inventar crime). HELENA MORÃO e
AUGUSTO SILVA DIAS: pune-se pelo mais grave – punir pelo desvalor da acção que
agente revela (o mais grave) – se o consumado é o crime pior, pune-se por esse; se for
o tentado, pune-se pela tentativa (dolo do mais grave > desvalor do resultado do menos
grave).
Ex. Se B quer matar A e aceita possibilidade de acertar no seu cavalo – se não atingir em
nenhum, FD pune por tentativa de homicídio, se acertar no cavalo é punido por crime
de dano; HM e ASD puniriam, caso acertasse no cavalo por tentativa de homicídio à
mesma – não se deve punir menos gravemente no caso de ter conseguido consumir um
dos crimes. Diferente do erro na execução, porque agente no dolo alternativo ainda se
conforma, mesmo que a nível mínimo, com possibilidade de atingir outro objecto.

 Erro sobre o processo causal. Processo causal representado pelo agente é diferente do
processo causal concreto, mas resultado é o mesmo (o representado). Resultado não
deixa de ser por consequência da actuação do agente, mas diferente da prevista. Atinge
o resultado almejado (diferença da aberratio ictus). É necessário conhecimento da
conexão entre acção e resultado para haver dolo? Exclui dolo do tipo? Ou há extensão
do dolo, abarcando este o concreto processo causal?

JAKOBS: resultado concretiza-se por risco não previsto, pelo que tipo objectivo e tipo
subjectivo doloso não estão em congruência – exclui dolo.
Doutrina tradicional – se desvio previsível/não essencial, dolo não se exclui; se essencial,
exclui-se dolo. Apesar da intuitiva razoabilidade desta construção, importa lembrar que
o dolo não se reconduz a previsibilidade, mas sim a previsão efectiva. Para haver dolo,
o agente tem de, pelo menos, prever como possível a verificação do resultado. Impõe-
se, aqui, uma previsão efectiva, uma acção “dirigida” à produção desse resultado. Por

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esse motivo, refere PUPPE que quando o processo causal se desenvolve de forma
completamente imprevisível, não haverá, desde logo, imputação objectiva, pelo que o
erro sobre o processo causal seria um problema de tipicidade objectiva e não de
imputação subjectiva.
MFP e EDUARDO CORREIA: erro é irrelevante, excepto nos crimes de execução vinculada
– aí, processo causal é elemento do tipo objectivo de ilícito.
Maioria da doutrina exclui dolo quando o tipo de ilícito é de execução livre, pois
alteração do modo concreto de produção do resultado não controlado pelo agente e
que não corresponde à sua decisão traduz-se num resultado já não correspondente à
acção do agente.
MFP, HELENA MORÃO: se erro/processo causal concreto/desvio era
imprevisível/acidental, nem há imputação objectiva porque não há conexão de risco –
deve-se punir por tentativa. Se era previsível, mas desvio é essencial, não há dolo.
Desvio irrelevante – alteração do processo não prevista, mas consequência imediata e
normal da acção, processo que cabe na área de risco da acção – ex. A atira B da ponte
achando que vai morrer do embate na águas, mas B morre logo ao bater em pilar. Se
processo era previsível e decorre em sequência do processo posto em movimento pelo
agente, há dolo. Ex. A dá facada a B, mas B morre de septicémia. MFP: se processo com
risco intenso e consequências incontroláveis, não há erro – agente representa
simultaneamente a verificação de múltiplos riscos, sendo esses perigos concretização
do risco inicialmente criado. FD: nos casos de risco intenso e imprevisível, a actuação do
agente absorve o risco do desvio – não se exclui o dolo, porque dolo abrange o processo
causal.
ROXIN: dolo abarca o plano do agente, havendo dolo quando o resultado ainda se
impute a esse plano. Daqui tende a concluir que o dolo não tem que abarcar o processo
causal, bastando que o agente represente os elementos da imputação objectiva –
criação do risco proibido e resultado como concretização desse risco – para que o crime
seja imputável a título doloso.

 Dolus generalis. Problema de actualidade do dolo. Tipo objectivo preenchido em


momento diferente do tipo subjectivo, o que parece contrariar o 14º/3. Executa facto
típico de modo diverso do projectado/representado. Normalmente, casos de
encobrimento do crime. 1º momento – pensa erroneamente que realizou facto típico.
2º momento – nova actuação em que produz facto típico sem saber. 2 acções, ao
contrário do erro sobre o processo causal. Analisar as duas acções separadamente.
Exclui dolo do tipo? Como deve ser punido?

CURADO NEVES: tentativa em concurso eventual com cometimento negligente do facto.


FD: doutrina da imputação objectiva – se risco que se concretiza no resultado ainda é
reconduzível ao quadro dos riscos criados pela primeira acção, pune-se pelo crime
consumado. Se não, pune-se pela tentativa (eventualmente em concurso com
consumado). Não é ambos serem risco para mesmo bem, mas aquele concreto risco
para o bem concretizar-se no resultado, forma como cria perigo tem relação com a
forma como se concretiza; relação entre os dois quadros de risco.
MFP, WELZEL, STRATENWERTH: homicídio encoberto – atribui-se dolo – é um dolo geral
– unidade na sequência das acções – tratar como um único facto típico com desvio não
essencial sobre o processo causal, pois há apenas uma decisão, dolo abarca todo o
processo desencadeado – quando acto subsequente de encobrimento tiver sido

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inicialmente previsto. Mas se encobrimento não foi projectado anteriormente, a


decisão de encobrimento não foi projectada sequencialmente, decisão posterior à acção
– tratar como duas acções. Unidade da acção/decisão na sequência das duas acções –
conexão de exclusividade entre conduta representada e concreto processo causal – erro
não essencial não excludente do dolo – ficção de dolo relativamente à 2ª acção, dolo
único e geral que se estender. Pluralidade de acções – concurso de tentativa dolosa e
crime negligente – não há dolus generalis. Mas, se sabia ou não podia deixar de saber
que a vítima estava viva e encobrimento posterior – homicídio consumado doloso se
podia representar a morte por esse encobrimento.
ROXIN: só se pune pelo consumado se dolo directo.
Maioria da doutrina: dolo abarca todo o processo desencadeado pelo agente – punição
pelo consumado. Alguma doutrina: desconsideração desta figura – será sempre uma
ficção de dolo relativa ao segundo momento – havendo duas acções, dolo muito
dificilmente será único e geral.

Inversão temporal dos acontecimentos/dolus generalis invertido – agente realiza facto


típico durantes os actos de preparação. Primeiro, sem dolo, produz resultado. Há dolo
apenas depois do momento do resultado, agindo em erro (suposição), achando que
pratica facto típico. FD defende a mesma solução – se agente ainda executa o acto
posterior destinado a realizar o facto típico (apesar de já estar realizado) que projectou.
Maioria da doutrina pune por crime consumado, pois quando se produz o resultado já
há actos de execução, justificando-se a extensão do dolo – momentos estão articulados
– se é acto de preparação/execução, agente já tinha dolo ab initio.

 Dolus antecedens. Conformação com um resultado típico que já aconteceu não é um


dolo do tipo. Se há crime negligente e quando se apercebe do crime aceita/conforma-
se, não se deixa de punir por crime meramente negligente. Dolo prévio à realização
típica não é ainda dolo do tipo – A vê que B invade a sua casa e decide matá-lo quando
ele de facto conseguir entrar; mas ao tirar a pistola do bolso dispara acidentalmente e
B morre – não há dolo de homicídio.

 Erro-suposição. Agente tem motivação para praticar o crime, mas está em erro sobre
um elemento do tipo que o impede materialmente de praticar o crime. Supõe qualidade
essencial. Há desvalor da acção, mas não do resultado, pois este não se verifica. Supõe
que praticou o facto típico, mas só não praticou porque estava em erro. Não há
imputação objectiva. Aplica-se tentativa impossível – 23º/3 (ex. por inexistência do
objecto – objecto típico não está lá). 1º - ver se há dolo (se não houver, não punido –
não há tentativas negligentes). 2º - havendo dolo, era uma tentativa possível ou
impossível (objecto inexistente ou meio inapto/inidóneo). Se era possível, punição por
tentativa. 3º - se impossível, ver se é punível – se crime consumado tiver pena > 3 anos
ou previsão expressa; se impossibilidade não for manifesta (não manifesta a inaptidão
dos meios ou a carência do objecto). Pune-se a aparência de perigo. Suposição do que
não existe – supõe que existe elemento do tipo que não existe. Não se aplica nem 16º
nem 17º, mas 23º/3.

Diferente se supõe que existe elemento negativo do tipo, mas que não existe – aí, erro
relevante que exclui dolo.

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 Erro-ignorância. Não representa elemento essencial à prática do tipo objectivo, quer


elemento seja descritivo ou normativo. Não pode querer praticar o crime, pois não
representa todos os elementos fácticos do tipo. Ex. Não conhecer o carácter alheio de
uma coisa que se leva. 16º/1 exclui o dolo do tipo. Desconhecimento do que existe. Se
erro for culposo, pune-se por negligência.

Concepção extrovertida da vontade (MFP) – intencionalidade é modo de comportamento


identificável pelas suas características objectivas e externas. Racionalidade comum – o que toda
a gente sabe. Dissociação entre representação do agente e representação da racionalidade
comum – ainda se pode afirmar dolo eventual – o que poderia ter representado com o
conhecimento acessível a todos (depois pode não ser censurável que não tenha partilhado dessa
racionalidade comum – exclusão da culpa pelo 17º). Vs introvertida – é fenómeno mental,
privado e íntimo, estados mentais.

5.2. Elemento volitivo – vontade de realizar o tipo objectivo de ilícito. Mesmo que não
deseje o resultado, quer (dolo eventual) – racionalidade do comportamento em
termos da decisão com aceitação de riscos.
A vontade é relevante em 3 momentos: dolo do tipo – agente representou e quis
resultado; dolo da culpa – desvalor da atitude associada à representação; culpa –
facto de agente ter querido é censurável? Na IS – falta de representação – quis e
representou?. Na culpabilidade – porque é que ele acha que é assim – ter querido e
representado aquela conduta é censurável? Se agente não representou/não quis,
não há dolo do tipo. Se representou/quis, mas tinha razão legítima para representar
e querer – não há dolo da culpa. Se não tinha razão para querer e representar, mas
não lhe é censurável que tenha querido – não há culpa.
Distinção de dolo eventual da negligência consciente – ambos têm o elemento
intelectual, mas à última falta o elemento volitivo.
 MFP: aspecto nuclear da diferença é a racionalidade da evitabilidade.
Não é tanto uma questão de saber se há um elementos ou os dois, mas
sim como os dois elementos se articulam – no dolo, há uma decisão em
que risco foi considerado e acautelado, ou não poderia deixar de ser –
inclusão do risco na base da decisão. Inevitabilidade da possibilidade do
resultado. Se por ser prudente equaciona riscos mínimos normalmente
desprezados (dolo escrupuloso ou supersticioso) – não tem dolo à
mesma – inevitabilidade implica uma intensidade média do risco.

Convergência entre racionalidade de cada pessoa (sua perspectiva de


intencionalidade/decisão) e a racionalidade comum – mesmo que
agente deseje realidade alternativa, não deixa de partilhar da comum e
incluí-la na sua decisão – não é alheio às relações causais normais que
todo o ser humano experimenta. Linguagem social que permite
distinguir comportamento doloso é uma linguagem que o agente dispõe
para representar e compreender o significado dos seus actos e através
do qual se orienta no mundo e que também para si é inultrapassável.
Basta concepção extrovertida da vontade – no sentido comunicacional
da interacção social, que constitui a racionalidade inultrapassável do
sujeito da acção – há poder de direcção e controlo da acção originadora
do facto típico. Se agente sobrevalorizou o seu interesse em fazer o

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quer relativamente à protecção do bem jurídico quando ponderou os


dois, tem dolo, porque achou mais importante fazer o que queria do
que não lesar o bem. Sobrevalorização dos interesses do agente em
detrimento da protecção do bem jurídico – conferiu primazia ao seu
intuito lesivo, ainda que tal implicasse a colocação em risco do bem
jurídico. Aceita verificação do risco da verificação do resultado. Tem de
haver conformação efectiva, não basta a indiferença (vs EDUARDO
CORREIA que diz que basta a indiferença).

Há certos contextos em que a pessoa fica pouco consciente dos riscos,


o que o impede de se conformar (está tão confiante) – contextos
lúdicos. A não ser que a principal motivação do agente seja o prazer do
risco, e não ganhar o jogo.
Quando há interesse empresarial, lógica de negócio ou grande ganho –
aí há dolo – sobrevaloriza-se o interesse empresarial, justificando fazer
aquilo. Indiferença em relação ao risco – lucro empresarial – não
impede uma posição ponderada perante o risco. Critério ligado à
existência de poderes de controlo e direcção do acto – homem de
negócios tem esses poderes.

 FD: há dolo se agente toma a sério o risco da possível lesão e decide agir
à mesma – critério da seriedade do risco – irrelevância da confiança.
Para que tome a sério, tem de ser provável. Conforma-se não com o
resultado, mas com o seu risco. PUPPE é próximo: critério é saber se
risco representado deve ser levado a sério. ROXIN: se confia
normativamente com fundamento razoável na não produção, há
negligência – decide-se pela lesão do bem ou confiança? Atenção que
confiança não é o mesmo que esperança.

 Fórmulas de FRANK – hipotética: se tivesse representado o resultado


típico como necessário, teria agido à mesma?; positiva: aceitação íntima
do resultado – aja o que houver, ele actua?, dolo se aceitação do
resultado e negligência se confiança na sua não produção. MFP e FD
criticam a fórmula hipotética: aprecia a personalidade do agente, factos
exteriores ao facto em vez de se trabalhar com a matéria de facto. DP
do facto, não da atitude. Para além disto, a maior parte das vezes, o
agente, se soubesse que resultado iria produzir-se, não actuaria – quase
nunca haveria dolo eventual. Contudo, a positiva também não diz
grande coisa – difícil prova.

 Indícios: probabilidade de produção do resultado (quase impossível que


não se tenha conformado; ou havia razões objectivas para confiar que
resultado não se iria produzir), actuação do agente na redução do risco
(tenta evitar produção do resultado – não basta medidas posteriores de
precaução, mas contribuem), contexto motivacional.

Método:
1. Fórmulas de FRANK.

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2. FD e ROXIN – conformação com o risco.


3. MFP – racionalidade comum, inclusão do risco na decisão,
ponderação da protecção e do seu interesse em agir.
4. Indícios – probabilidade, redução do risco/medidas preventivas,
contexto motivacional.

6. Especiais elementos subjectivos do tipo. Estes elementos não se referem a elementos


do tipo objectivo de ilícito, mas individualizam uma espécie de delito – se faltarem, o
tipo de ilícito não se verifica. Situação em que não basta mero dolo do facto, mas exige-
se uma intenção específica ou certa atitude interna (ex. 132º/2, a), c), f), 367º, 369º).
Ex. casos em que a conduta típica se define em função da realização do fim a que ela é
instrumental, consumando-se antes da verificação desse fim – 262º, 263º, 266º.
o Intenção específica essencial à delimitação típica do comportamento – 203º,
217º, e crimes de aproveitamento. Intenção essencial para identificar o
significado social do tipo de crime.
o Manifesta antecipação da tutela penal – crimes com estrutura de actos
preparatórios ou de tentativas ou o próprio crime tentado – elemento
subjectivo refere-se a crime consumado ulterior que pode nem verificar-se. Ex.
falsificação de moeda.
o Atitude mental, motivação, impulso ou tendência que dá especial conotação
negativa (partindo de uma censura moral). Servem para fundamentar
agravação da ilicitude – não caracterizam o delito em si mas a censurabilidade
da actuação.
o Pelo princípio da necessidade da pena, abrange-se apenas certas espécies de
dolo – crimes de negação da justiça e prevaricação – 369º.

7. Preterintencionalidade – crimes dolosos e crimes agravados pelo resultado. Ex. crime


de OIF mas resultado é morte – 147º. Perigosidade da conduta dolosa menos grave
atinge resultado mais grave não pretendido dolosamente. Na mesma acção, há dolo de
um tipo específico e negligência quanto a outro. Ausência de conexão objectiva e
subjectiva – risco proibido inicialmente criado era risco menor do que o que se
concretizou. Seria, em tese, concurso efectivo entre dois crimes, se análise separada de
cada evento, mas 18º constitui uma excepção ao regime do concurso. A figura da
agravação pelo resultado parte do versare in re ilícita que, por seu turno, se traduz na
convicção de que quem actua ilicitamente assume todas as consequências do acto que
pratica. Impõe-se, contudo, uma limitação em nome do princípio da culpa, exigindo-se
não só uma clara relação de imputação objectiva, como também de imputação
subjectiva. Equivale isto a afirmar, por um lado, que o resultado morte só poderá ser
imputado ao agente se houver uma certa conexão de risco entre as duas situações,
sendo previsível o segundo resultado na sequência da primeira actuação. No fundo,
exige-se que no conjunto de riscos inicialmente criados pelo agente ainda se encontre
alguma conexão com o risco mais grave ulteriormente verificado.

Relevância na imputação objectiva: autonomização de 3 momentos – 1. conduta, 2.


crime menos grave (1º resultado), 3. crime mais grave (2º resultado). Há um duplo nexo
de causalidade – entre conduta e 1º resultado e entre 1º resultado e 2º (ex. morte é
concretização do risco de infecção).

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Relevância na imputação subjectiva: dolo quanto ao resultado menos grave e


negligência quanto ao mais grave. Solução não pode ser uma presunção de dolo –
princípio da culpa – seria responsabilidade objectiva, se não se provar pelo menos a
violação de deveres de cuidado quanto ao resultado mais grave. Assim, 18º tem uma
medida da pena que não excede um concurso efectivo entre o crime doloso menos
grave e o negligente correspondente ao resultado.

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