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Cap.

13 – O tipo subjectivo de ilícito

I – A construção do tipo subjectivo de ilícito

Dos elementos subjectivos do tipo objectivo ao tipo subjectivo


 Dolo natural, dolo de facto ou dolo do tipo

Os especiais elementos subjectivos do tipo


 Não se referem a elementos do tipo objectivo de ilícito
 Ex.: intenções, motivos, pulsões afectivas, elementos da atitude interna
a) Intenções
 Concorre com o dolo do tipo ou a ele se adiciona e
dele se autonomiza
 Crimes de intenção ou de resultado cortado, ex.:
262º/1 e 2, 217º, 256º, 203º
b) Outros
 São utilizados para caracterizar a censurabilidade da
actuação do agente – imputados ao tipo de culpa
 É difícil distingui-los

II – O dolo do tipo

A estrutura do dolo do tipo


 Definição: conhecimento e vontade de realização do tipo objectivo de
ilícito
 Do art. 13º resulta que: a criminalidade dolosa é a mais grave; diferença
de culpa
 O elemento intelectual do dolo do tipo não pode, por si mesmo,
considerar-se decisivo da distinção dos tipos de ilícito dolosos e
negligentes, uma vez que também estes últimos podem conter a
representação pelo agente de um facto que preenche um tipo de ilícito
(negligência consciente). É pois o elemento volitivo, quando ligado ao
elemento intelectual requerido, que serve para indiciar uma posição de
atitude do agente contrária ou indiferente à norma de comportamento
(culpa dolosa).

O momento intelectual do dolo


 Necessidade que o agente conheça, saiba, represente correctamente ou
tenha consciência das circunstâncias do facto que preenche um tipo de
ilícito objectivo
 Razão: função do elemento – o agente conheça tudo quanto é
necessário a uma correcta orientação da sua consciência ética para o
desvalor jurídico que concretamente se liga à acção intentada

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O conhecimento das circunstâncias de facto
 Conhecimento da totalidade dos elementos constitutivos do respectivo
tipo de ilícito objectivo – factualidade típica.

a) O conhecimento dos elementos normativos


 É necessário o conhecimento pelo agente dos elementos normativos na
direcção de uma apreensão do sentido ou significado correspondente,
no essencial, segundo o nível próprio das representações do agente, ao
resultado da valoração respectiva
 No entanto, há casos em que deve requerer-se o grau máximo de
conhecimento, impondo-se que o agente conheça os critérios
determinantes da qualificação. Ex.: “obtenção indevida”, “matéria
colectável”, “notação técnica”.
 Com um grau de menor exigência se deparará nos elementos
normativos cujo conhecimento pelo agente, necessário ao dolo do tipo,
deva limitar-se ao dos seus pressupostos materiais. É o caso de certos
elementos que exprimem imediatamente uma valoração moral, social,
cultural ou mesmo jurídica decisiva para a ilicitude do facto como um
todo. Ex.: “bons costumes”, “censurável”, “ilegitimidade”, “dever de
garante”.

b) A actualidade da consciência intencional da acção


 Consciência actual não é o mesmo que consciência reflectida,
ponderada, clara ou demorada.
 Será actual as circunstâncias do facto são assumidas pelo agente sob a
forma de representação mas também quando elas são co-
consciencializadas, ou seja, assumidas por uma consciência que não é
considerada explicitamente, mas que é atendida com outros conteúdos
conscientemente considerados e tem assim também de ser
implicitamente tomada em conta de forma necessária.
 Ex.: medico e o medicamento do colapso cardíaco; cópula com menor
de 15 anos; guarda prisional que pratica acto sexual de relevo com
pessoa ali internada; crime de funcionário público; furto de um crucifixo.
Em todos estes casos estende-se normalmente sobre o agente um
“permanente saber acompanhante” que basta para a afirmação do dolo
do tipo. Em caso de dúvida não deve um tal conhecimento ser
presumido

c) O erro sobre a factualidade típica


 Se faltar ao agente o conhecimento da totalidade das circunstâncias, de
facto ou de direito, descritivas ou normativas, do facto, o dolo do tipo não
pode afirmar-se – cfr. art. 16º/1, 1ª parte.
 Nota: o termo “erro” não está aqui tomado apenas no sentido de uma
representação positiva errada, mas também no sentido de uma falta de
representação; a expressão “exclui o dolo” não significa que um dolo já
existente foi eliminado, mas sim, que o dolo do tipo não chega a
constituir-se quando faltam os seus pressupostos.

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 Vale não só para as circunstâncias que fundamentam o ilícito, mas
também para todas aquelas que o agravam e para a aceitação errónea
de circunstâncias que o atenuam.
 Com a negação do dolo do tipo falta o tipo subjectivo apenas do crime
doloso de acção correspondente. Não só pode o agente ter realizado
dolosamente outros tipos de ilícito, como pode ainda estar preenchido
um tipo de ilícito negligente.
 Art. 16º/3 ao ressalvar “a punibilidade da negligência nos termos gerais”
quer dizer: se o respectivo comportamento for expressamente previsto
pela lei como crime negligente e se a negligência se tiver efectivamente
verificado no caso.

A previsão do decurso do acontecimento


 Saber se é necessário, e em que termos, o conhecimento pelo agente
da conexão entre acção e resultado

a) O erro sobre o processo causal


 Saber se qualquer divergência entre o risco pelo agente
conscientemente criado e aquele do qual deriva efectivamente o
resultado deve conduzir a que o evento não mais possa ser imputado ao
agente e este só deva responder por tentativa ou se este erro é
irrelevante.
 F.D. – problema da doutrina da imputação objectiva. Quando, todavia, a
imputação for naquela sede afirmada, então tem de se conferir relevo ao
erro sobre o processo causal. Mas uma de duas: ou o tipo de ilícito é de
execução vinculada e então o decantado “erro sobre o processo causal”
se traduz em um puro erro sobre a factualidade típica e é claramente
relevante; ou é de “execução livre” e o erro é relevante no sentido da
não afirmação do dolo e o agente só poderá ser punido a título de
tentativa
 Ex.: A dispara um tiro sobre outra pessoa representando a sua morte
imediata quando, afinal, o ferido ainda chega ao hospital mas vem a
morrer do tiro recebido.

b) O chamado dolus generalis


 Casos em que o agente erra sobre qual de diversos actos de uma
conexão da acção produzirá o resultado almejado
 Ex.: vítima aparentemente já assassinada ter sido lançada à água para o
corpo desaparecer, tendo acabado por morrer afogada.
 A acção suportada pelo dolo do facto não determina imediatamente o
resultado, enquanto a acção que causa o resultado não mais é
suportada pelo dolo do facto. Parte da doutrina vê aqui só uma tentativa
em concurso eventual com o cometimento negligente do facto, enquanto
que a doutrina dominante se pronuncia pela aceitação de um crime de
facto consumado.
 F.D.: saber se o risco que se concretiza no resultado pode ainda
reconduzir-se ao quadro dos riscos criados pela primeira acção.

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 Solução análoga para o caso de inversão temporal dos acontecimentos,
p. ex., alguém atira sobre outrem com uma pistola especial que deve
começar por anestesiá-lo e o mata logo.

c) A aberratio ictus vel impetus


 Do latim: desvio da trajectória ou do golpe
 Casos em que, por erro na execução, vem a ser atingido objecto
diferente daquele que estava no propósito do agente. Ex.: A pretende
matar B com um tiro, mas este vir a atingir não B, mas C.
 O resultado ao qual se referia a vontade de realização do facto não se
verifica, mas sim um outro, da mesma espécie ou de espécie diferente.
 A punição deve ter lugar só por tentativa ou por concurso desta com um
crime negligente

d) O error in persona vel objecto


 O decurso real do acontecimento corresponde inteiramente ao
intentado; só que o agente se encontra em erro quanto à identidade do
objecto ou da pessoa a atingir – erro na formação da vontade.
 Sempre que o objecto concretamente atingido seja tipicamente idêntico
ao projectado, o erro sobre o objecto é irrelevante. Ex.: A, pensando
que o passante é o seu inimigo B, dispara contra ele um tiro mortal,
verificando-se depois que A confundiu B com C e foi este, um estranho,
que matou.
 Se o agente erra também sobre as qualidades tipicamente relevantes
do objecto por ele atingido, então há que ficar ou só na
responsabilidade por tentativa, ou eventualmente na combinação de
tentativa com uma responsabilidade por negligência. Ex.: D subtrai de
um museu uma imitação de um quadro célebre pensando que se trata
do original; enquanto caça E dispara contra um vulto com dolo de dano
na pressuposição de que se trata de um animal, quando na verdade se
trata de uma criança que vem a falecer.

O conhecimento da proibição legal


 Excepcionalmente, porém, à afirmação do dolo do tipo torna-se
indispensável que o agente tenha actuado com conhecimento da
proibição legal. Isto sucede sempre que o tipo de ilícito objectivo
abarca condutas cuja relevância axiológica é pouco significativa que
faz com que o facto não suscite imediatamente um problema de
desvalor ligado ao dever-ser jurídico.
 Ex.: crimes de perigo abstracto; incriminações de direito penal
secundário (nomeadamente no direito penal económico) e do direito
penal de justiça (crimes em que a conduta é ilícita em função da
protecção de um bem jurídico-penal, mas em que este não se encontra
ainda nitidamente aceite como tal pela comunidade e pela sua
consciência de valores).

O momento volitivo do dolo


 O dolo do tipo não pode bastar-se com o conhecimento, mas exige
ainda a verificação no facto de uma vontade dirigida à sua realização.

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O dolo directo
 Casos em que a realização do tipo objectivo de ilícito surge como o
verdadeiro fim da conduta – art. 14º/1 – dolo directo intencional ou de
primeiro grau.
 Ex.: A, admirador incondicional de um quadro de Picasso, mas sem
dinheiro para o comprar, assalta o estabelecimento de leilões onde o
quadro será vendido e o subtrai para ficar com ele.
 Casos em que a realização típica não constitui o fim último, o móbil da
actuação do agente, mas surge como pressuposto ou estádio intermédio
necessário do seu conseguimento.
 Ex.: A mata o vigilante B como única forma de poder assaltar um banco
 Relevante é apenas a necessidade de conexão entre o facto prévio e o
fim último da conduta.

Dolo necessário
 A realização do facto surge como consequência necessária/inevitável,
se bem que “lateral” relativamente ao fim da conduta – art. 14º/2 – dolo
directo necessário ou de segundo grau.
 Ex.: agente que coloca a uma bomba num avião como forma de matar
um seu inimigo que nele viaja (em relação aos passageiros)

Dolo eventual
 A realização do tipo objectivo de ilícito é representada pelo agente
apenas como consequência possível da conduta – art. 14º/3.

Distinção entre dolo eventual e negligência consciente

a) Teorias da probabilidade
 Exigência de que para o dolo eventual se requeira uma qualquer
representação qualificada – não basta a exigência da mera possibilidade
de realização, mas requer-se que a representação assuma a forma da
probabilidade, ou mesmo de uma probabilidade relativamente alta.
 Conclusão: o agente contará tanto mais com a realização típica, quanto
mais esta surgir aos seus olhos como provável
 Criticas: determinar a probabilidade; apesar da improbabilidade o agente
pode querer firmemente alcancá-la.

b) Teorias da aceitação
 Perguntar se o agente, apesar da representação da realização típica
como possível, aceitou intimamente a sua verificação, ou pelo menos
revelou a sua indiferença perante ela (dolo eventual); ou se, pelo
contrário, a repudiou intimamente, esperando que ela se não verificasse
(negligência consciente).
 Caso Lacmann – aceitação em sentido jurídico: sempre que o agente se
resigna com a possibilidade de que a sua acção venha a ter o efeito
indesejado.

c) Teorias da conformação
 Art. 14º/3

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 Que o agente tome a sério o risco de (possível) lesão do bem jurídico,
que entre com ele em contas e que, não obstante, se decida pela
realização do facto.
 O propósito que move a sua actuação vale bem, a seus olhos, o “preço”
da realização do tipo, ficando deste modo indiciado que o agente está
intimamente disposto a arcar com o seu desvalor.
 Conformação com a realização típica
 Caso da correia de couro – dolo eventual
 Não deve dizer-se que o agente tomou a sério a possibilidade de
realização se esta é manifestamente remota ou insignificante. Ex.:
transmissão do vírus da sida através de contactos sexuais não
protegidos.

Conclusão:
 Dúvida: nos casos de indiferença o agente conforma-se com a
realização do tipo objectivo
 Distinção que mal é capaz de justificar diferenças significativas das
molduras penais aplicáveis a um e outro caso.
 Não há razão para que se estabeleça qualquer distinção a nível de
consequência jurídica.

A conexão entre o dolo do tipo e a sua realização


 Dolo alternativo: casos em que o agente se propõe ou se conforma com
a realização de um ou de outro tipo objectivo de ilícito – o dolo deve ser
afirmado relativamente ao tipo objectivo de ilícito realmente preenchido
pela conduta.
 Conexão de índole temporal: devem decorrer simultaneamente. Um dolo
prévio relativamente à realização típica não é pois ainda um dolo do tipo.
Tão pouco a conformação com um resultado típico que já aconteceu
constitui dolo do tipo.

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Cap. 12 – A imputação objectiva do resultado à conduta

I – Sentido do problema

 Princípio de que o direito penal só intervém relativamente a


comportamentos humanos
 A causalidade naturalisticamente comprovável constitui só o limite
máximo
 Saber se deve ser levada até aí, ou antes ficar aquém, através de uma
limitação jurídica da causalidade natural.

II – Primeiro degrau: a categoria da causalidade

 Exigência mínima: o comportamento há-de, ao menos, ter sido causa do


resultado, aferida através da teoria das condições equivalentes.
 Premissa básica: causa de um resultado é toda a condição sem a qual o
evento não teria tido lugar (conditio sine qua non). Todas as condições
devem ser consideradas em pé de igualdade já que o resultado é
indivisível.
 Para apurar quais as condições que deram causa a um certo resultado
deveria assim o juiz suprimir mentalmente cada uma delas: caso
pudesse afirmar que o resultado não se teria produzido sem essa
condição, tal significaria que esta seria penalmente relevante para
efeitos do estabelecimento do nexo de causalidade.
 Acaba por abranger a mais longínqua condição, implicando um regresso
ad infinitum, e deveria excluir da problemática qualquer consideração
sobre a interrupção do nexo causal – obriga os seus defensores a
aceitar correcções.
 Outra crítica: O critério da supressão mental não se revela prestável nos
casos de causalidade virtual e nos casos de dupla causalidade ou
causalidade alternativa. Também apresenta dificuldades quando não se
consiga determinar de determinado facto foi realmente conditio sine qua
non de um certo evento (frequente no seio da “sociedade de risco”) e
quando se trate da responsabilização de entes colectivos.
 Reconstrução: abandono do critério da “supressão mental” e sua
substituição pelo critério da condição conforme às leis naturais. Segundo
este critério o estabelecimento da causalidade está dependente de
“saber se uma acção é acompanhada por modificações no mundo
exterior que se encontram vinculadas a essa acção de acordo com as
leis da natureza e são constitutivas de um resultado típico”.
 Criticas: em muitas hipóteses os dados científicos disponíveis sobre a
conformidade às leis naturais ou não dizem nada, ou não são
suficientes, ou não são fiáveis, pelo que restaria o apelo às leis da
experiência (causalidade geral, generalizadora ou global); problemas a
nível processual penal.

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III – Segundo degrau: a causalidade jurídica sob a forma da teoria da
adequação

 Teoria da adequação ou “causalidade adequada” – distingue entre


condições juridicamente relevantes e irrelevantes.
 A imputação penal não pode nunca ir além da capacidade geral do
homem de dirigir e dominar os processos causais.
 Para a valoração jurídica da ilicitude serão relevantes não todas as
condições, mas só aquelas que, segundo as máximas da experiência e
a normalidade do acontecer – e portanto segundo o que é em geral
previsível –, são idóneas para produzir o resultado. Consequências
imprevisíveis, anómalas ou de verificação rara serão pois juridicamente
irrelevantes. Cfr. art. 10º/1
 Dificuldades: o critério de adequação deve ser geral e objectivo, o que
conduz à conclusão de que o nexo de adequação se tem de aferir
segundo um juízo ex ante – um juízo de prognose póstuma. Tal significa
que o juiz se deve deslocar mentalmente para o passado e ponderar se
dadas as regras gerais da experiência e o normal acontecer dos factos,
a acção praticada teria como consequência a produção do evento.
 Ao juízo de prognose póstuma devem ser tidos em conta os especiais
conhecimentos do agente (aqueles que o agente efectivamente detinha,
apesar da generalidade das pessoas deles não dispor).
 Necessidade da adequação se referir a todo o processo causal e não só
ao resultado – aqui se suscitam os problemas de “intervenção de
terceiros” e da “interrupção do nexo causal”. A actuação de terceiro que
se integre no processo causal desencadeado pelo agente excluirá a
imputação, salvo se ela aparecer como previsível e provável.
 Solução insatisfatória desta teoria em actividades que, comportando em
si mesmas riscos consideráveis para bens jurídicos, são todavia
legalmente permitidas. Ex.: circulação rodoviária, intervenções médicas
arriscadas, destruição dos ecossistemas – nestes casos a acção revela-
se adequada à produção do resultado típico mas não é possível proibir
tais condutas sem conduzir a vida social ao retrocesso. Por isso o
degrau de adequação tem de ser completado com a “relação de risco”.

IV – Terceiro degrau: a conexão de risco

O resultado só deve ser imputável à conduta quando esta tenha criado (ou
aumentado, ou incrementado) um risco proibido para o bem jurídico protegido
pelo tipo de ilícito e esse risco se tenha materializado no resultado típico.

Criação de um risco não permitido


Determinar os riscos a cuja produção pode ser referido o tipo objectivo:
 Estão excluídas as hipóteses em que, com a sua acção, o agente
diminui ou atenua um perigo que recai sobre o ofendido (melhoria da
situação do bem jurídico em perigo).
 A imputação deverá ter-se igualmente por excluída quando o evento
tenha sido produzido por uma conduta que não ultrapassou o limite do

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risco juridicamente permitido (relacionado com os riscos e perigos
tolerados pela sociedade). Ex.: medicina: leges artis; competição
desportiva: a obediência às regras do jogo afastará, em principio o tipo.
Já a inversa não é verdadeira – a violação das regras do jogo não tem
necessariamente de realizar o risco proibido capaz de suportar a
imputação do resultado típico. Tal só sucederá nas constelações em que
a violação das regras, pela sua violência e desproporcionalidade e pela
gravidade das lesões produzidas, perde a conexão de sentido com o
jogo.
 Dentro do risco permitido mantém-se o chamado risco geral de vida,
desde que ele se contenha, no caso, dentro de uma medida normal (são
socialmente adequados). Ex.: médico e antibiótico
 Nos casos em que o resultado se verifica em consequência de uma co-
actuação da vítima ou de terceiro, em princípio, o resultado não é
imputável em virtude da interposição da auto-responsabilidade da vítima
ou do terceiro; ou em virtude do princípio da confiança, segundo o qual
as pessoas poderão em princípio confiar em que os outros não
cometerão factos ilícitos. Ex.: Sida; porção de droga. Estas acções
mantêm-se dentro d risco permitido, só assim não sucedendo em casos
excepcionais, se particulares circunstâncias tornarem altamente
provável, em concreto, a conduta posterior da vítima ou de terceiro.

A potenciação do risco
 Muitas vezes, já está criado, antes da actuação do agente, um risco
que ameaça o bem jurídico protegido. Não obstante, o resultado será
ainda imputável ao agente se este, com a sua conduta aumentou ou
potenciou o risco já existente, piorando, em consequência, a situação
do bem jurídico protegido. Ex.: condutor de uma ambulância que, em
virtude de uma manobra errada, causa a morte do paciente que
transportava.
 O mesmo sucederá em situações de intervenção num processo causal
de salvamento, quando o comportamento do agente afasta, impede ou
faz em todo o caso diminuir as hipóteses de salvamento do bem
jurídico já em perigo. Ex.: conduzir o bote defeituosamente ou com
demasiada lentidão.

A concretização do risco não permitido no resultado típico


 Saber que perigo acabou por determinar o resultado é questão que só
pode ser respondida ex post, isto é, com conhecimento de todas as
circunstâncias relevantes para a verificação efectiva do resultado –
problema dos comportamentos lícitos alternativos. Ex.: pincéis de
barbear com pêlos de cabra chinesa; automobilista que atropela ciclista
embriagado.
 Demonstrando-se que o resultado teria tido seguramente lugar –
sensivelmente no mesmo tempo, do mesmo modo e nas mesmas
condições – ainda que a acção lícita não tivesse sido levada a cabo,
parece que a imputação objectiva deve ser negada, seja porque não se
torna possível comprovar aqui verdadeiramente uma potenciação do
risco, seja porque se não pode dizer sequer que o comportamento do
agente criou um risco não permitido: verificando-se que tanto a conduta

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indevida, como a conduta lícita “alternativa” produziriam o resultado
típico, a imputação deste àquela traduzir-se-ia na punição da violação de
um dever cujo cumprimento teria sido inútil, o que violaria o princípio da
igualdade.
 Diferentes são os casos em que se não demonstra que também com o
comportamento alternativo lícito o resultado típico teria seguramente tido
lugar, mas apenas que era provável ou simplesmente possível que tal
acontecesse. Aqui o que importa é provar a potenciação do risco e a sua
materialização no resultado típico. Se o juiz ficar em dúvida deve valorá-
la a favor do arguido, excluindo a imputação. Uma vez demonstrada o
comportamento lícito alternativo deve ser considerado irrelevante.

A produção de resultados não cobertos pelo fim de protecção da norma


 É necessário que o perigo que se concretizou no resultado seja um
daqueles em vista dos quais a acção foi proibida, quer dizer, seja um
daqueles que corresponde ao fim de protecção da norma. Se tal não
suceder deve ter-se por excluída a imputação objectiva.
Ex.: acidente resultante de uma ultrapassagem em excesso de
velocidade, cujo limite se devia a um sinal de aproximação de
travessia de peões
 Na sistematização de Roxin devem incluir-se neste contexto casos
como os da chamada autocolocação em perigo dolosa; da
heterocolocação em perigo livremente aceite e da imputação a um
âmbito de responsabilidade alheio.

V – A questão da “causalidade virtual”

 Não se confunde com os comportamentos lícitos alternativos porque


o que está em questão é o agente ter produzido o resultado numa
hipótese em que, se não tivesse actuado, o resultado surgiria em
tempo e sob condições tipicamente semelhantes por força de uma
acção de terceiro ou de um comportamento natural
 Também não se confunde com a causalidade dupla ou concurso de
riscos porque a causa virtual não chega na realidade a actuar.
 Saber se deve conferir-se relevo à causa hipotética virtual – doutrina:
não!!
 Continua a ter sentido não abandonar o bem jurídico à agressão do
agente só porque aquele já não pode, em definitivo, ser salvo.

VI – Problemas especiais

Relativos aos crimes de perigo


 Os crimes de perigo concreto são crimes de “resultado” só que o
resultado em causa é um resultado de perigo, não um resultado de
dano. Nesta medida suscitam um problema de imputação objectiva
análogo ao dos crimes de dano.
 Quanto aos crimes de perigo abstracto não há razão para qualquer
especialidade dos critérios e termos da imputação objectiva

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Relativos à criminalidade de massa própria da “sociedade do risco”
 Ex.: criminalidade ambiental e a responsabilidade pelo produto
 Saber se é possível imputar resultados lesivos do bem jurídico
protegido a condutas extremamente distanciadas no tempo e no espaço
e que, quantas vezes, consideradas na sua singularidade, parece
deverem reputar-se jurídico-penalmente irrelevantes. Só se tornando
relevantes atenta a frequência devastadora e a quantidade inumerável
com que condutas destas são levadas a cabo; pelo que, a serem
proibidas, não o serão em si mesmas mas em função de condutas de
outras pessoas, previsíveis e muito prováveis – Tipos aditivos ou
acumulativos

Relativos a crimes de organização ou de entes colectivos


 Saber sob que pressupostos pode atribuir-se ao ente colectivo como tal
capacidade de acção.

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