Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
43
produzi-lo a se abster e cessar a sua conduta. Age, pois, com dolo eventual, o agente que ofende
a integridade física de mulher grávida, ciente do seu adiantado estado gravídico, causando-lhe
o aborto. Note-se que o agente não quer o resultado, pois se desejasse, agiria com dolo direto,
mas prevê como possível o aborto e mesmo assim segue em diante com a sua conduta,
assumindo o risco de interromper a gravidez com a morte do feto.
44
causando-lhe a morte. A finalidade do agente, sem dúvida, era lícita (chegar no local da prova).
Contudo, os meios utilizados para alcançar essa finalidade foram inadequados, uma vez que,
para chegar ao local da prova, imprimindo alta velocidade na condução de veículo automotor,
não observou o dever de cuidado objetivo, atropelando e causando a morte de uma pessoa.
Note-se que a conduta voluntária do agente foi desenvolvida para alcançar uma finalidade
lícita, gerando, no entanto, um resultado involuntário.
c) Resultado involuntário
Ao desvalor da ação voluntária, acrescenta-se o desvalor do resultado involuntário, mas
produzido em decorrência da inobservância do dever de cuidado objetivo.
Como nos crimes culposos a conduta voluntária é dotada de finalidade lícita, afigura-se
imprescindível a produção de um resultado naturalístico. Isso porque, se é voltada a uma
finalidade lícita, a conduta do agente constitui um indiferente penal, razão pela qual se mostra
necessário a produção de um resultado involuntário para caracterizar o crime culposo.
d) Nexo de causalidade
O crime culposo depende de um resultado naturalístico, já que se trata de crime material.
E, em se tratando de crime material, exige-se, para a adequada tipificação, o nexo causal entre
a conduta voluntária descuidada e o resultado involuntário.
e) Previsibilidade objetiva
É a possibilidade de uma pessoa comum, com diligência e prudência inerente à média da
população, prever a incidência de determinado resultado. Trata-se da previsibilidade daquilo que
se convencionou chamar de homem médio, considerando-se o grau de atenção e cuidado
exigido das pessoas de mediana inteligência.
45
A previsibilidade do resultado é aferida a partir de um juízo de valor, comparando a
conduta desenvolvida pelo agente com a de um homem médio.
Assim, se realizar uma conduta sem prever o resultado, mas uma pessoa comum, com
prudência e inteligência mediana, inerente à generalidade dos indivíduos, teria a possibilidade
de prever, o agente terá agido, se presentes os demais elementos, com culpa, uma vez que, nas
circunstâncias, desenvolveu uma conduta sem prever o resultado que era previsível.
Esse juízo de valor deve ser realizado considerando as circunstâncias do caso concreto,
considerando a postura de um homem médio nas mesmas condições em que o agente se
encontrava. Ou seja, a análise não deve levar em conta qualquer homem médio, mas a
possibilidade de antever o resultado nas mesmas circunstâncias e condições em que o agente
estava inserido.
Assim, se o contexto fático envolve acidente de trânsito, deve-se realizar um juízo de valor
acerca da conduta do agente levando-se em conta a generalidade dos motoristas de veículo
automotor. Se a situação fática envolve uma intervenção cirúrgica, o juízo de valor e a
possibilidade de antever o resultado deve ser realizado considerando um cirurgião com diligência
e perspicácia normais à generalidade dos cirurgiões.
f) Ausência de previsão
Para caracterizar o fato típico culposo, é necessário, ainda, que o agente não tenha
previsto o resultado, embora previsível. Se o previu, não há culpa, mas, via de regra, dolo.
Se o agente, dentro da concepção do homem médio, não tinha condições de prever o
resultado, embora previsível, afastada estará a culpa. Se há previsão do resultado, mas ainda
assim o agente desenvolve a conduta, sendo indiferente quanto à produção do evento, há dolo,
e não culpa.
Não se vislumbra, pois, previsibilidade do agente que, conduzindo o veículo dentro das
normas de trânsito, atropela uma pessoa, que, de forma inesperada e repentina, se joga em
frente ao veículo com desejo suicida.
Todavia, de forma excepcional, pode haver previsão do resultado na culpa, quando se
tratar de culpa consciente.
g) Tipicidade
A tipicidade também constitui elemento do fato típico culposo.
46
Para caracterizar o crime culposo, o fato praticado pelo agente deve encontrar
correspondência num tipo penal que prevê a modalidade culposa da conduta.
E, nos crimes culposos, há a peculiaridade de somente incidirem se expressamente
previstos em lei. É o que se extrai do artigo 18, parágrafo único, do Código Penal, segundo o
qual “salvo os casos expressos em lei, ninguém poderá ser punido por fato previsto como crime,
senão quando o pratica dolosamente”.
De fato, quando o tipo penal descreve um modelo legal de conduta proibida, silenciando
a respeito da modalidade culposa, significa que o crime existe somente na forma dolosa.
Tomemos como exemplo o crime de furto (CP, art. 155). O tipo penal descreve a conduta
proibida (Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel), silenciando quanto à modalidade
culposa dessa conduta. Logo, forçoso concluir que não existe furto culposo, incidindo, pois,
somente na modalidade dolosa.
Da mesma forma, se Adriano, acidentalmente, quebra a tela do celular de Vinicius, seu
colega de trabalho, o fato não constituirá crime, uma vez que não há previsão na lei do crime de
dano culposo.
Assim, para se aferir a tipicidade, deve-se verificar se o fato praticado pelo agente
encontra correspondência numa norma penal incriminadora que prevê a modalidade culposa.
Imaginemos que um motorista, imprimindo velocidade excessiva no seu veículo, dirigindo, pois,
de forma imprudente, perde o controle da direção e atropela uma pessoa, causando-lhe a morte.
Essa conduta imprudente encontra correspondência no tipo penal que define o crime de
homicídio culposo na condução de veículo automotor (Lei 9.503/97, art. 302), havendo, pois,
tipicidade.
• Modalidades de culpa:
A inobservância do dever objetivo de cuidado, que é a quebra do dever de cuidado imposto
a todos, é manifestada por meio de três modalidades de culpa, todas previstas no artigo 18, II,
do Código Penal: imprudência, negligência e imperícia.
a) Imprudência
A conduta imprudente se caracteriza por agir um positivo, sem a observância do dever de
cuidado objetivo. Ocorre quando o agente pratica fato perigoso, de forma intempestiva e
precipitada.
É a culpa decorrente de um comportamento positivo descuidado. Trata-se de modalidade
de culpa que incide paralelamente à ação do agente. É, pois, a face ativa ou positiva da culpa,
47
que se exterioriza de forma concomitante à ação desenvolvida pelo agente. Trata-se, enfim, da
culpa in agendo.
A imprudência é, portanto, um fazer algo perigoso, sem observar o dever de cuidado
objetivo.
Age com imprudência o condutor de veículo automotor, que, imprimindo excessiva
velocidade, perde o controle do veículo, invade a calçada e atropela um pedestre, matando-o.
Da mesma forma, age com imprudência o agente que limpa arma de fogo carregada
próximo a pessoas e, de forma descuidada, aciona o gatilho, matando alguém que estava ao seu
lado.
b) Negligência
Trata-se de modalidade negativa de culpa, em que a inobservância do dever de cuidado
do agente é retratada pela ausência de cautela e precaução. É a face omissiva ou negativa da
culpa. Trata-se da culpa in omitendo.
A negligência é, portanto, um não fazer algo, deixando, por isso, de observar o dever de
cuidado objetivo.
Ao contrário da imprudência, que ocorre concomitante à ação, a negligência se revela
sempre antes do início da conduta. Antes de agir, o negligente deixa de tomar as cautelas que
uma pessoa prudente adotaria.
Tomemos como exemplo o condutor de veículo que, antes de sair de viagem, deixa de
reparar os pneus e verificar os freios. Da mesma forma, age com negligência o pai que deixa
arma de fogo ao alcance de uma criança. Agem, ainda, com negligência os pais, por culpa in
vigilando, que deixam a criança de tenra idade, sem noção do perigo, caminhar vários metros à
sua frente, em acostamento de rodovia de intenso tráfego, culminando o episódio com o trágico
desfecho de um atropelamento, a atravessar o infante, repentina e abruptamente, a pista
asfáltica.
c) Imperícia
A imperícia se caracteriza pela falta de capacidade, preparo ou de conhecimentos técnicos
suficientes de agente autorizado a desempenhar determinada arte, profissão ou ofício.
É a chamada culpa profissional, pois decorrente da falta de aptidão para o exercício de
arte, ofício ou profissão. Ocorre quando o agente não tem o adequado conhecimento acerca das
técnicas e regras que todos que se dedicam à determinada profissão, arte ou ofício deveriam
dominar.
48
Assim, se um médico cirurgião, que não domina determinada técnica inerente à
determinada intervenção cirúrgica, causar a morte do paciente, responderá por homicídio
culposo (CP, art. 121, § 3º), já que agiu com imperícia no exercício da sua profissão.
49
Em síntese, incide a culpa consciente quando o agente prevê o resultado, mas espera,
sinceramente, que não ocorrerá; configura- se o dolo eventual quando a vontade do agente não
está dirigida para a obtenção do resultado, mas, prevendo que o evento possa ocorrer, assume
assim mesmo a possibilidade de sua produção, conformando-se com a sua ocorrência.
50
4.3 Questões sobre Teoria do dolo e culpa
51
pena de detenção no patamar mínimo previsto no dispositivo legal. Considerando apenas os
fatos narrados no enunciado, responda aos itens a seguir.
A) Qual o recurso cabível da decisão do magistrado, indicando seu prazo e fundamento legal?
(Valor: 0,60)
B) Qual a principal tese jurídica de direito material a ser alegada nas razões recursais? (Valor: 0,65)
Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere
pontuação.
52