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DIREITO PENAL II
Professora Doutor Maria Fernanda Palma
II – O CONCEITO DE ACÇÃO
1 – A acção enquanto comportamento activo
Pode avançar-se, desde já, que a acção representa um comportamento voluntário,
dominado ou dominável pela vontade. No entanto, torna-se pertinente, para este e
para todos os demais pressupostos da responsabilidade penal, a análise da posição das
Escolas:
o Escola Clássica – adopta um conceito naturalista de acção, exigindo uma
modificação objectiva do mundo exterior, através de um movimento corporal
voluntário. Não é relevante o conteúdo ou objecto da vontade (não se analisa
aqui a dicotomia dolo/negligência), tal como não é relevante saber se a acção
era destinada à acção produzida. A acção é, no fundo, um dado empírico
observável.
o Escola Neoclássica – a acção representa um comportamento significativo,
exigindo-se uma negação de valores através de uma actuação da vontade no
mundo exterior;
o Escola Finalista – a acção corresponde a um comportamento ou processo
orientado, pelo agente, para a modificação do mundo exterior. A acção tem em
vista um certo objectivo ou resultado, sendo um conceito pré-jurídico,
ontologicamente determinado.
Diz-nos o Professor Figueiredo Dias que o conceito de acção ainda subsiste como a base
autónoma e unitária de construção do sistema de responsabilidade penal, sendo, no
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fundo, o seu substrato mínimo. A Professora Fernanda Palma segue, neste contexto, a
mesma linha de pensamento – a acção tem sido o conceito que exprime o pressuposto
básico da responsabilidade por culpa, condicionando o tipo de comportamento que em
geral pode ser designado como crime.
Para Jakobs, só haverá acção quando o agente causa um resultado que era
individualmente evitável. Note-se que esse resultado – um efeito objectivamente
autonomizável da acção – pode ser de perigo (o perigo que se exige que exista para um
bem jurídico é, em si mesmo, um resultado – p.e. condução perigosa) ou de dano (exige-
se a lesão de um bem jurídico – p.e. homicídio). Quanto ao facto de este ser
“individualmente evitável”, tem de estar em causa um resultado que o agente, tendo
em conta a sua capacidade em concreto, pudesse ter evitado, no sentido de permitir
que se mantivessem as expectativas da sociedade quanto à vigência da norma.
Já segundo a linha de Roxin, que adopta um conceito pessoal de acção, esta é vista
como expressão da personalidade, ou seja, tudo aquilo que pode ser imputado a um
homem como centro de ação anímicoespiritual. A ação é controlo do eu – algo que
ainda seja uma manifestação do agente.
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Assim, e em suma, a Professora Maria Fernanda Palma nega a classificação dos actos
reflexos como acções penalmente relevantes e, quanto aos automatismos, diz tudo
depender da previsibilidade e evitabilidade da situação que provoca o estímulo.
Entende que pode haver um ponto de apoio para qualificar o comportamento como
acção se houve possibilidade de o agente dirigir o comportamento de forma
consciente. Já Stratenwerth entende que, nos automatismos, haverá acção
independentemente de se poder identificar qualquer estado de consciência ou de ser
possível uma intervenção controladora da consciência, desde que seja identificável
que o processo global esteja determinado ou seja explicável pela experiência.
Diferentemente, Jakobs vem dizer-nos que é decisiva a possibilidade de afirmar a
concreta evitabilidade individual do comportamento, ou seja, a possibilidade de
controlo, reconhecível pelo agente, do automatismo pela consciência. Está em causa o
critério da existência (ou inexistência) de tempo para a intervenção da consciência,
critério esse que é afastado pela Professora Regente.
Outro conjunto de casos que levanta algumas dúvidas é o de casos de hipnose. Para a
Professora Maria Fernanda Palma, mantendo a coerência relativamente às anteriores
posições, os comportamentos praticados sob efeito de hipnose não constituem
acções. Não estamos, sequer, perante comportamentos domináveis pela vontade.
Diferente é a posição de Roxin, que entende que a prática de certos factos criminosos
sob hipnose é impossível para certas pessoas, pois que só seria possível para agentes
capazes de cometerem esses actos em estado consciente – teoria da barreira do
carácter. O Professor adopta o mesmo critério para os casos de sonambulismo,
entendo que também nesses está ainda em causa uma manifestação da personalidade
do agente. A teoria é bastante criticada, desde logo considerando-se que viola o
princípio da igualdade, ao equiparar estados de consciência a estados de
hipnose/sonambulismo.
Diferente será, contudo, a solução para um caso em que o próprio agente se quer
colocar no estado de hipnose, para que seja capaz de praticar um certo crime. Estes são
os casos das chamadas acções livres na causa (accio liberae in causa) – casos em que o
agente se coloca num estado de inimputabilidade (como hipnose ou embriaguez), com
o propósito de conseguir praticar o facto. Nesses casos, como faz sentido, não há
exclusão da imputabilidade (art 20º, nº 4 CP), pelo que haverá acção penalmente
relevante. São considerados comportamentos penalmente relevantes porque há
expressão da vontade e porque há intencionalidade anterior. O juízo, como relembra o
Professor Figueiredo Dias, é antecipado para o momento anterior à criação da situação
de inimputabilidade, fugindo ao que normalmente acontece (análise é feita segundo
juízo que se reporta ao momento da prática do facto).
Também nos casos em que o estado de sonambulismo (por exemplo) é resultado,
imagine-se, da falta de toma de medicamentos (caso do agente que não toma os
medicamentos e deixa uma arma na mesa de cabeceira, acabando por ter uma crise e
matar alguém durante a noite), a Professora Maria Fernanda Palma entende que a
solução terá de ser diversa – haverá espaço para punibilidade, se verificados os demais
pressupostos. Diz-nos, nestes casos, Helena Mourão, que se não há historial de
violência, ainda que o agente deixe intencionalmente de tomar a medicação e coloque
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a arma na cabeceira, dificilmente se pode dizer que haja ação, uma vez que a ideia de
danosidade social dificilmente se poderia provar; dificilmente o princípio da culpa seria
observado numa situação destas de inconsciência do agente – já não era assim,
naturalmente, se houvesse já historial de violência durante ataques de sonambulismo.
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assim, se encontre por força de um tal dever constituído na posição de garante da não
verificação do resultado típico.
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III – A TIPICIDADE
1 – Noção e evolução do conceito – pensamento das Escolas
O tipo de ilícito penal contempla duas dimensões: o tipo de ilícito objetivo e o tipo de
ilícito subjetivo.
o Tipo objetivo: engloba todos os aspetos que se têm de verificar
independentemente da vontade do sujeito, ou seja, o sujeito, o objeto da ação,
das modalidades de execução do facto, o processo causal e o resultado.
o Tipo subjetivo: corresponde aos aspetos da direção da vontade do sujeito que
revelem as espécies de dolo ou as especiais intencionalidades exigidas pelo tipo
legal de crime.
Cumpre, antes de mais, analisar a evolução do pressuposto, por via da análise do
pensamento das Escolas quanto a esta matéria:
o Escola Clássica – o tipo é objectivo e descritivo. A tarefa de enquadramento do
facto concreto no facto legal é neutra, não sendo aqui feito qualquer tipo de
juízo de valor. A tipicidade traduz apenas a verificação de um indício de crime;
o Escola Neoclássica – o tipo é objectivo, pelo que não inclui ainda o momento de
avaliação do dolo ou da negligência (a menos que haja uma situação de especial
intenção). A tipicidade é o fundamento da ilicitude, não sendo apenas um mero
indício. Esta é, no fundo, a fonte da antinormatividade.
o Escola Finalista – o tipo é indiciador e descritivo. É um juízo prévio à ilicitude,
sendo que só da conjugação das vertentes objectiva e subjectiva pode resultar o
juízo de contrariedade da acção à ordem jurídica. O elemento objectivo
corresponde a elementos descritivos do agente; o elemento subjectivo traduz-
se na avaliação de dolo ou negligência.
2 – Imputação objectiva
O Direito Penal só intervém perante comportamentos humanos (de pessoas singulares
ou colectivas). Assim sendo, a responsabilidade criminal exige a imputação do
resultado à conduta do agente. Trata-se, no fundo, de identificar a ligação do
comportamento humano ao resultado. A grande questão que se coloca é a de saber até
onde vai essa imputação. A esse propósito, surgem as teorias das condições
equivalentes, da causalidade adequada e do risco.
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princípio in dubio pro reu (art 32º, nº 2 CP) e do próprio princípio da legalidade. Note-
se, contudo que, para ambos os Autores, se deve ter sempre uma certeza razoável
(“probabilidade próxima da certeza”).Exige-se aqui, então:
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3 – Imputação subjectiva
É no momento da imputação subjectiva que se olha para o tipo subjectivo de ilícito,
avaliando-se a intenção do agente que praticou o facto e concluindo pela presença de
dolo ou negligência. Este dolo é, no entanto, o dolo do tipo (dolo do facto, dolo natural
ou dolo do ilícito), que difere do dolo da culpa.
O Código Penal não define o dolo do tipo, limitando-se o art 14º CP a tratar de cada
uma das suas formas. Ainda assim pode dizer-se que a Doutrina entende o dolo como
sendo o conhecimento e a vontade de realização do tipo subjectivo de ilícito. Mais,
pode avançar-se que o dolo comporta dois elementos:
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SITUAÇÕES DE ERRO
O erro pode, desde logo, ser um erro-suposição ou um erro-ignorância. O erro-
suposição é aquele em que há motivação para a prática do crime, mas o agente está
em erro sobre um elemento do tipo que o impede materialmente de praticar o crime.
É no erro-suposição que se integra a tentativa impossível (art 22º, nº 3 CP). Nestes casos,
há desvalor da acção, mas não há desvalor do resultado, pois que não se verifica o
resultado típico. Já o erro-ignorância é aquele em que o agente não representa um
elemento essencial à prática do tipo objectivo. Nestes casos, não pode o agente querer
praticar o crime, pois que ele não representa sequer um ou mais elementos do facto
típico.
o Erro sobre o processo causal – ocorre uma divergência entre o risco
conscientemente criado e aquele do qual deriva efectivamente o resultado.
Para alguns Autores, a solução passa pela aplicação do regime da tentativa; para
outros, passa pela punição pelo crime consumado. O Professor Figueiredo Dias
entende que, quando o erro sobre o processo causal for um erro sobre a
factualidade típica, deve-se punir pela tentativa, pois que não se exclui o dolo.
o Dolus generalis – o agente pratica mais que um acto e erra quanto ao que
efectivamente produziu o resultado. O agente pensa, num primeiro momento,
ter produzido um determinado resultado (erroneamente); num segundo
momento, fruto de nova actuação do agente, o resultado vem efectivamente a
concretizar-se. Estes são os casos em que, na sua maioria, o agente tenta
encobrir o facto praticado em primeira linha. Por exemplo, A envenena B,
achando que o matou, mas deixando-o meramente inconsciente. Num segundo
momento, para tentar encobrir esse facto, A enterra B, que morre então
asfixiado por ter sido enterrado vivo. O Professor Figueiredo Dias entende que
estamos ainda perante o mesmo tipo de casos nas situações em que haja uma
inversão temporal dos acontecimentos (por exemplo, A anestesia B para num
segundo momento o matar, mas B morre logo com a anestesia), sendo estes
casos em que a maioria da Doutrina tende a aceitar a punição por crime
consumado – no momento em que se produz o resultado há prática de actos de
execução. A Professora Maria Fernanda Palma, entende, nos casos de dolus
generalis, que estamos perante um crime consumado, se se conseguir
identificar uma unidade da acção (agente já projetava, de antemão, o
encobrimento – há um dolo geral, que engloba toda a conduta do agente). Se há
uma decisão de encobrimento posterior à acção, a Professora entende que o
agente não representa a segunda acção como consumação do crime, pelo que
há erro sobre a percepção do objecto da acção – exclui-se o dolo.
o Aberratio ictus vel impetus – é um erro na execução, que leva a que seja
atingido um objecto diferente daquele que estava no propósito do agente. Por
exemplo, A pretende matar B, mas ao disparar, por falta de destreza, acerta
antes em C, que estava ao lado de B. Aqui, a acção falha o seu alvo. Para o
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Tentativa + (se existir) crime negligente, uma vez que o agente apenas tem dolo relativamente a um dos
objetos da ação e não relativamente ao outro.
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resultado, mas não se conformou com ela; na negligência inconsciente, o agente não
tem sequer essa percepção.
o Dolo directo – representa a situação em que a realização do tipo objectivo de
ilícito surge como verdadeiro fim da conduta. Mais, serão também os casos em
que a realização típica não constitui o fim último da actuação do agente, mas
surge como pressuposto intermédio necessário do seu conseguimento (casos de
dolo directo intencional);
o Dolo necessário – são cassos em que a realização do facto surge como
consequência necessária/inevitável relativamente ao fim da conduta (por
exemplo, A coloca uma bomba no avião para matar B, seu inimigo. A morte de B
ser-lhe-á imputada com dolo directo intencional; a morte de todos os outros
passageiros é imputada com dolo necessário.
o Dolo eventual – a realização do tipo de ilícito (objectivo) é representado pelo
agente apenas como “consequência possível da conduta”.
o Negligência consciência – a realização do tipo objetivo de ilícito é representada
pelo agente como consequência possível da sua conduta;
o Negligência inconsciente – a realização do tipo objetivo de ilícito não é nem
representada pelo agente.
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aceita ganhar, quer o risco se efetive, quer o risco se não efetive. Assim, no dolo
eventual, o agente apenas aceita a inevitabilidade dos riscos.
A pergunta que deve ser feita: podia ou não podia não ter considerado a
inevitabilidade dos riscos que decorriam da sua conduta? Cumpre, para responder a
isso, observar a vontade do agente numa perspetiva de linguagem social: como se
percepciona socialmente a vontade do agente. Para facilitar essa análise, a Professora
adopta o critério do homem de negócios vs. jogador inexperiente.
A EXCLUSÃO DO DOLO DO TIPO (ART 16º, Nº 1 CP) EXIGE INDAGAÇÃO SOBRE SE O
CRIME PODE SER IMPUTADO A TÍTULO DE NEGLIGÊNCIA (ART 16º, Nº 3 CP)
IV – A ILICITUDE
1 – Noção. Escolas
No pressuposto da ilicitude, em termos práticos, cumpre avaliar se a acção praticada
pelo agente foi ou não ilícita.
o Escola Clássica – a ilicitude é meramente formal, bastando a mera contradição
da norma. Faz-se um juízo objectivo e normativo, estando em causa toda a
ordem jurídica (o juízo feito implica uma avaliação do confronto do facto com
todas as proibições e permissões que o mesmo suscita). As causas de justificação
da ilicitude são situações em que, a título excepcional, a acção passa de típica a
lícita, sendo assim aceite ou permitida pelo Direito.
o Escola Neoclássica – trata-se da danosidade social, sendo feito um juízo de
desvalor. A ilicitude é a expressão da valoração específica do legislador na
incriminação das condutas. O facto é ilícito por estar em contradição com a
própria proibição penal que se deduz do tipo legal. As causas de justificação são
elementos negativos do tipo.
o Escola Finalista – a ilicitude é um juízo normativo e objectivo-subjectivo,
constituído pelo desvalor da acção e pelo desvalor do resultado.
Regra geral, verificados que estejam os requisitos da tipicidade (imputação objectiva e
subjectiva), há um indício de ilicitude. A ilicitude penal tem sempre uma dicotomia:
desvalor da ação + desvalor do resultado, pois que os comportamentos ilícitos, para
serem ilícitos, têm que comportar ambos:
o Desvalor da acção – ideia de que as condutas praticadas têm que se desvaliosas.
Temos que ter ou uma ação proibida ou uma omissão da ação imposta ou devida.
o Desvalor do resultado – é desvaliosa tanto a ação de matar como a morte em si
mesma
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de um outro bem ou interesse que suscita uma razão específica para não proibir uma
conduta típica.
A maioria da Doutrina entende que há uma unidade da ilicitude, ou seja, que se
determinada conduta é ilícita num ramo do Direito, seria ilícita em todos os outros. A
Doutrina aceita pacificamente a ideia segundo a qual se considera necessário o
elemento subjectivo para apreciação da causa de justificação. Releva assim o tipo
subjectivo, a par do tipo objectivo. A densidade do elemento subjectivo, diz a
Professora Maria Fernanda Palma, releva de forma distinta para cada causa de
justificação, exigindo-se um olhar caso a caso.
A. LEGÍTIMA DEFESA
O fundamento da legítima defesa reside na necessidade de protecção, e consequente
preservação, do bem jurídico ilicitamente agredido. A sua relevância decorre, desde
logo, de dois aspectos:
o Necessidade de defesa da ordem jurídica, através da qual se justifica que se
sacrifiquem bens jurídicos de valor superior aos postos em causa pela agressão;
o Necessidade de protecção dos bens jurídicos ameaçados pela agressão, do qual
resulta a possibilidade concedida à vítima de se defender.
Diz a Professora Maria Fernanda Palma que a legítima defesa é um problema de colisão
de direitos, partindo da premissa de uma ordem de bens jurídicos de valor
diferenciado, o que significa que o defendente só pode atuar sobre os bens jurídicos
do agressor, já que só o agressor está a atacar o defendente – o agente só pode bulir
com os bens jurídicos do próprio agressor. A actuação ao abrigo da causa de justificação
abarca condutas por ação ou por omissão, dolosas ou negligentes e não tem
necessariamente que existir ilicitude penal do agressor, basta que a sua conduta
considerar globalmente seja ilícita (contrária à ordem jurídica e não necessariamente
contrária ao direito penal, como decorre do princípio da unidade da ilicitude, acima
referido).
→ Pressupostos
Para que se fale em legítima defesa, exige o art 32º CP que estejamos perante uma
agressão actual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou de
terceiro. A falta de um pressuposto leva a que a conduta seja ilícita, havendo desvalor
do resultado.
o Comportamento agressivo – o conceito de agressão corresponderá sempre a
uma ameaça derivada de um comportamento humano a um bem
juridicamente protegido. Sendo que só os seres humanos podem violar o
direito, ficam excluídas do âmbito da legítima defesa as actuações de animais.
Note-se, ainda assim, que a legítima defesa não deverá ser negada quando o
humano utiliza ou se faz valer do animal como instrumento de agressão, já que
nesses casos estamos efectivamente perante uma agressão humana. Exige-se
também que a conduta seja voluntária, ficando dessa forma excluídos os casos
de agressão por parte de um agente em estado de inconsciência ou com
vontade completamente ausente. Um comportamento omissivo também pode
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ser considerado uma agressão, para efeitos da legítima defesa. A questão que
se coloca é a de saber se, neste contexto, se consideram agressões as omissões
puras, as omissões impuras ou ambas:
• Omissões puras – nas omissões puras não há a colocação em perigo de
bens jurídicos individuais, segundo o que refere parte da Doutrina, pelo
que, para esses, não será aceitável falar em legítima defesa. Já outros,
como o Professor Figueiredo Dias, entendem que há ainda base para
que se aja em legítima defesa nestas circunstâncias. É exemplo o caso
do agente que força o taxista a transportar a vítima de um acidente para
o hospital (omissão pura – art 200º CP). Diz o Professor que, nestes casos,
há um perigo para bens jurídicos, individuais e supra-individuais, pelo
que faz sentido admitir-se a possibilidade de legítima defesa.
• Omissões impuras – a Doutrina tende a aceitar pacificamente que estas
devem ser fundamento da legítima defesa. É exemplo o caso das
ameaças ou agressões feitas sobre a mãe que se recusa alimentar o filho
recém-nascido (omissão impura – arts 10º + 131º ou 144º CP).
o Actualidade da agressão – a agressão será actual, nos termos utilizados pelo
Professor Figueiredo Dias, quando for iminente, já se tiver iniciado ou ainda
persistir. A agressão é iminente quando o bem jurídico se encontrar
imediatamente ameaçado, no entendimento do Professor Figueiredo Dias. Para
a Professora Maria Fernanda Palma, contudo, o critério a adoptar é o de se já
foram, ou não, praticados actos de execução: se sim, a agressão será actual.
Outro momento de definição relevante é o momento a partir do qual a agressão
deixa de persistir. O Professor Figueiredo Dias entende que o momento
definitivo não é o momento da consumação – há crimes nos quais, ainda após
a consumação, deve ser aceite a legítima defesa. É o exemplo do crime de
sequestro, que se dá como consumado assim que A encerra B num certo local
contra a sua vontade, mas ainda haverá legítima defesa se este se tentar
defender durante o cativeiro. Assim sendo, o que releva para este efeito é o
momento até ao qual a defesa é susceptível de pôr fim à agressão. Note-se que
os factos praticados depois desse momento já não serão justificados ao nível
da legítima defesa, mas podê-lo-ão ser ao nível da acção directa (art 336º CC).
o Ilicitude da agressão – exige-se que a agressão seja ilícita, ilicitude essa que se
afere perante toda a ordem jurídica e não especificamente perante a ordem
penal. Isto significa, no fundo, que não estaremos perante legítima defesa se a
agressão ilícita for justificada (por exemplo, não é legítima defesa a agressão do
ladrão sobre aquele que, pela força, tenta impedi-lo de fugir com as suas coisas).
Note-se que a legítima defesa pressupõe a ilicitude da agressão, mas não a
culpa do agressor.
→ Requisitos
Para que haja legítima defesa, o facto praticado tem de ser o meio necessário para fazer
face à agressão.
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O excesso pode ter por fundamento sentimentos diversos, permitindo esse facto
distinguir entre excesso esténico ou asténico:
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→ Pressupostos
o Perigo atual – o bem jurídico tem que estar objectivamente em perigo, porque
só aí se justificará um dever de suportar a acção típica a recair sobre o atingido
pela intervenção. Este, mais, tem que ser actual, actualidade essa que não exige
iminência (ainda que não se possa daqui partir para a aceitação de um estado de
necessidade preventivo). No fundo, a actualidade da agressão no direito de
necessidade acaba por se reportar ao que se identifica na legítima defesa, com
o alargamento para lá da iminência: o perigo será actual quando o
protelamento do facto salvador representar uma potenciação do perigo, ou no
caso de perigos duradouros (p.e. prédio em perigo de desmoronamento).
o Que ameace interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro – o
legislador evitou a utilização da expressão “bem jurídico”, seja para evitar
lacunas ou para evitar o entendimento de que só se poderia actuar em estado
de necessidade quando em causa estivessem bens jurídico-penais. Estão
abrangidas situações em que o bem jurídico salvaguardado é o que também
pode vir a ser sacrificado (caso do cirurgião que realiza uma operação de risco
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sobre o paciente, colocando a sua vida em risco, mas sendo esse o único meio
de a salvaguardar).
→ Requisitos
o Adequação do meio – tem de estar em causa um “meio adequado para afastar
o perigo”. Para o Professor Figueiredo Dias, há que daqui retirar que não estará
coberto por direito de necessidade o caso em que o agente utiliza um meio que,
segundo a experiência comum, é inidóneo para salvaguardar o interesse
ameaçado.
o Não provocação do perigo – al a) – a justificação será afastada se a situação for
intencionalmente provocada pelo agente, ou seja, se ele premeditadamente
criou a situação para poder livrar-se dela à custa da lesão de bens jurídicos
alheios. Essa situação já não é exigida se estiver em causa a protecção de
terceiros, pois que não seria admissível que da provocação do agente pudesse
resultar uma lesão não justificada para bens jurídicos de terceiro posto em
perigo, se depois o provocador os salvar à custa de um outro terceiro não
implicado. EXEMPLO: A cria intencionalmente um perigo de incêndio na casa de
B; arrependendo-se mais tarde, entra sem autorização na casa de C para chamar
os bombeiros. Está excluída a ilicitude da violação de domicílio, pois ele agiu em
estado de necessidade.
o Princípio do interesse preponderante – al b) – a lei exige que se pondere o valor
dos interesses conflituantes, nomeadamente dos bens jurídicos em colisão e o
grau do perigo que os ameaça. Esta requisito gera a dúvida sobre o conceito de
interesse, problema ao qual a Professora Maria Fernanda Palma dá resposta:
interesse é uma posição de vontade sobre uma coisa de que se carece e não
pode abranger todo e qualquer valor defensável na situação de conflito, mas
não atribuível a uma vontade. A sensível superioridade dos interesses não
implica uma comparação em abstrato, nem que esta esteja fixada através de
critérios padrão (não se trata de uma verificação/comparação quantitativa). A
Professora entende que a ponderação é feita caso a caso. Podemos estar
perante dois bens jurídicos iguais e um ser superior no caso concreto. Ainda
assim, há certos indícios de hierarquia:
• Molduras penais – atende-se à medida legal da pena, partindo do
pressuposto de que se o dano ao bem A é suscetível de pena superior ao
dano do bem B, então o bem A é superior ao bem B. O critério mostra-
se, por si só, insuficiente.
• Intensidade da lesão do bem jurídico – há que verificar se está em causa
o aniquilamento completo do interesse ou só a sua lesão parcial ou
passageira. Pode acontecer, por exemplo, que a lesão de bens como a
liberdade pessoal ou a integridade física (em princípio, superiores aos
bens puramente patrimoniais) seja mínima, quando comparada com a
lesão desses bens patrimoniais.
• Grau do perigo – quando a violação do perigo não surge como
absolutamente segura, mas sim como mais ou menos provável. Nestes
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casos, Roxin entende que quem, para evitar um dano que seguramente
se produzirá se não actuar, leva a cabo uma acção salvadora que só em
pequena medida põe em causa outro bem jurídico, estará a prosseguir o
interesse substancialmente preponderante. Já a criação de um perigo
concreto, com base num perigo meramente abstrato deverá ser
balanceada consoante o grau de probabilidade (não se justifica, por
exemplo, que uma ambulância circule de forma perigosa para transportar
um doente que apenas tem o pé partido).
• Autonomia pessoal do lesado – o bem jurídico ofendido terá que ser de
carácter eminentemente pessoal. Tem que ser “razoável impor ao lesado
o sacrifício do seu interesse em atenção à natureza ou ao valor do
interesse ameaçado”, pelo que tem de influenciar o resultado final o
facto de o facto necessitado ofender, para além do bem jurídico do
lesado, o seu direito de autodeterminação e de auto-realização.
• A imponderabilidade da vida de pessoa já nascida – sendo a vida um
bem jurídico de valor incomparável e insubstituível, não são legítimas
diferenciações qualitativas entre o valor das vidas (a vida de uma criança
vale tanto como a vida de um idoso), ou sequer quantitativas (não é
legítimo assumir que uma vida vale menos que mil vidas). Em caso de
conflito de vida(s) contra vida(s), deve assentar-se o princípio da
imponderabilidade da vida para efeito de estado de necessidade
justificante. Não é, portanto, de adoptar uma concepção utilitarista.
Alguma Doutrina constrói um conjunto de casos (“comunidade de
perigo”2) nos quais entende ser possível que o interesse na preservação
de uma ou mais vidas seja preponderante face ao sacrifício de outra ou
outras. O Professor Figueiredo Dias, contudo, afirma que a comunidade
de perigo não pode, por si mesma, justificar essa escolha.
o Em termos subjectivos, exige-se que o agente conheça a situação de conflito e
actue com a consciência de salvaguardar o interesse preponderante, ainda que
não seja exigido animus salvandi (não se exige que o agente tenha vontade de
defender o interesse preponderante).
C. CONFLITO DE DEVERES
O conflito de deveres é hoje considerado uma causa de justificação autónoma, pois que
assume certas especificidades que devem ser tidas em consideração. Desde logo, para
que haja conflito de deveres efectivo é necessário que em causa estejam deveres de
acção distintos, que colidem de tal forma que apenas um deles pode ser cumprido (por
exemplo, o caso dos irmãos A e B que estão prestes a morrer afogados, tendo C, pai de
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Havendo várias pessoas todas elas colocadas numa situação comum de perigo para a vida, sacrifica-se
uma ou algumas delas como única e adequada forma de impedir que outra(s) pereça(m). EXEMPLO: caso
dos náufragos, em que só há espaço para um
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ambos, um dever de garante de salvar ambos os filhos, sob pena de responder por
omissão3).
Assim, não caem no art 36º os casos de conflito entre acção e omissão, sendo esses
casos de colisão de interesses e remetidos assim para o art 34º CP – são casos de
conflito de deveres meramente aparente. A Professora Maria Fernanda Palma defende
que, em caso de conflito acção/omissão, deverá sobrepor-se a omissão: entre deixar ir
o comboio e matar 50 pessoas ou desviar e matar 1, atendendo ao princípio da
imponderabilidade da vida humana, deve cumprir-se o dever de não matar (e não o
dever de matar) – deixando o comboio ir, ele tem comportamento justificado porque
não foi ele que matou; ao virar o comboio, cumpre o dever de salvar, mas incumpre o
dever de não matar, pelo que será responsabilizado.
Dentro de certos limites, é dada possibilidade ao agente de escolher um dos deveres,
caso estes sejam iguais. Ainda assim, deve fazer-se uma ponderação concreta dos
interesses em conflito no quadro da situação global, pelo que não basta atender-se
tão somente ao bem jurídico em causa. Mais, deve ser dada primazia às situações em
que exista um dever especial de garante, que deverá prevalecer sobre o outro (caso
do médico que tem dois pacientes em igual estado de gravidade, mas que há muitos
anos que é médico de um deles e nunca viu o outro na vida).
Então:
→ Pressupostos
o Conflito entre deveres de acção distintos, que colidem de tal forma que apenas
um deles pode ser cumprido (conflitos de acção/omissão resolvem-se pelo art
34º, consubstanciando conflitos de interesses e não verdadeiros conflitos de
deveres – são conflitos de deveres meramente aparentes)
→ Requisitos
o O valor do dever cumprido deve ser pelo menos igual ao valor do dever
sacrificado;
o O agente tem de ter cumprido um dos deveres;
o O agente deve ter ponderado corretamente qual o interesse mais relevante.
• Ponderação em caso de gravidade: exemplo, prevalece o dever
relativamente à pessoa que está em maior perigo de vida.
• Ponderação, igualmente, dos deveres de garante: prevalece o dever que
implica o cumprimento de um dever de garante (caso de socorrer o filho
e socorrer alguém desconhecido).
3
ESTÁ ABRANGIDO PELO CONFLITO DE DEVERES O CASO EM QUE O PAI ESCOLHE UM DOS FILHOS, MAS
ELE TEM QUE SALVAR UM DELES – NÃO PODE SER JUSTIFICADA A ACÇÃO DE NÃO SALVAR NENHUM – a
Professora Maria Fernanda Palma ressalva, ainda assim, que pode este tipo de casos ter solução no
pressuposto da culpa, uma vez que estamos perante situações em que há uma “imobilização sentimental
que obsta à realização de ambos os deveres”. Podemos, então, estar aqui perante uma cláusula de
desculpa atípica.
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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva
→ Pressupostos
o Carácter pessoal e disponibilidade do bem jurídico lesado – ficam de fora os
bens jurídicos comunitários, que como tais se encontram protegidos. A grande
dúvida coloca-se quando à vida e à integridade física, que são os que mais valor
apresentam no nosso sistema. A Doutrina aponta para uma absoluta
indisponibilidade da vida humana. Já quanto à integridade física, esta é
considerada um bem disponível pelo seu titular, mesmo face a ataques de
terceiro.
o Não contrariedade aos bons costumes – passa pela gravidade e, sobretudo, pela
irreversibilidade da ofensa. Um consentimento que não respeita os bons
costumes é ineficaz.
→ Requisitos
o Capacidade em consentir (capacidade de exercício) – esta capacidade reporta-
se à necessidade de garantir que quem consente é capaz de avaliar o significado
do consentimento e o sentido da acção típica, supondo maturidade, certa idade
e discernimento. Em caso de incapacidade penal, admite-se a via da
representação legal. A vontade tem de ser séria, livre e esclarecida, pelo que não
pode sobre ela recair qualquer vício (seja de erro, engano ou ameaça).
o Expresso por qualquer meio
o Conhecimento do consentimento – tem de ser conhecido do agente.
Diferentes são as situações de consentimento hipotético – em que o consentimento
teria sido dado se o devido esclarecimento (art 157º CP) tivesse tido lugar – e de
consentimento presumido – casos e que o titular do bem jurídico não consentiu na
ofensa, mas nela teria presumivelmente consentido se lhe tivesse sido possível decidir
sobre a questão. O consentimento presumido só é chamado à colação quando não for
possível obter a manifestação expressa da vontade ou houve perigo sério na demora
(por exemplo, caso de emergência hospitalar, em que se presume o consentimento da
vítima para realização da cirurgia).
Discute-se se o fundamento do consentimento presumido será a vontade da pessoa
ou, antes, o seu superior interesse. A dúvida resulta, desde logo, do facto de poderem
estar em causa considerações distintas, consoante o fundamente. Para que possa falar-
se de um caso de consentimento presumido, é necessário que estejam verificados todos
os pressupostos relativos a art 38º CP – NÃO HÁ CONSENTIMENTO PRESUMIDO
RELATIVAMENTE A QUEM NÃO TEM CAPACIDADE PARA CONSENTIR (caso das
crianças).
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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva
3 – Justificações supra-legais
Representam causas de justificação não explícitas (não previstas na lei),
correspondendo no fundo a situações de figuras indiscutivelmente díspares das causas
de justificação legais, mas que com elas têm uma proximidade tal que, aparentemente,
realizam a mesma função.
V – A CULPA
1 – Noção e fundamento
A culpa representa, no fundo, o juízo de censurabilidade social que o Direito faz ao
agente que praticou o facto típico. Para ter culpa é necessário:
o Não ser inimputável em razão da idade ou de anomalia psíquica
o Ter capacidade de motivação pela norma – se o agente é coagido a fazer algo,
essa capacidade não existe verdadeiramente;
o Ter consciência da ilicitude
25
3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva
2 – Inimputabilidade
A inimputabilidade representa uma forma de negação da culpa – em causa estão
situações que afectam o agente e que fazem com que este não seja capaz de culpa,
por lhe faltar a capacidade de entender o carácter ilícito do comportamento.
A. ANOMALIA PSÍQUICA
Desde logo, a inimputabilidade pode resultar de anomalia psíquica. Estas representam
transtornos, devidos a causa orgânico-corporais, que geram deficiências patológicas
no agente. Existem vários casos que, para este efeito, se consideram anomalia psíquica,
e que são definidos também com recurso às ciências naturais: psicoses, neuroses,
anomalias sexuais, oligofrenia, psicopatias, etc.
Para além disso, o art 20º CP exige que, por força dessa anomalia psíquica, o agente,
no momento da prática do facto, seja incapaz de avaliar a ilicitude deste ou de se
determinar de acordo com essa avaliação. Está em causa a comparação entre o agir
modificado do psiquicamente anómalo e o que poderia esperar-se do homem-médio.
Assim, exige-se que o juiz proceda a uma racionalização retrospectiva de um processo
4
A culpa só pode ser censurabilidade da acção por o culpado ter actuado contra o dever quando podia,
antes, ter actuado de acordo com ele. Assim sendo, o poder de agir de outra maneira é elemento essencial
do conceito de culpa – temos de estar perante uma decisão livre e consciente da vontade a favor do ilícito.
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3º ano, Turma A
Patrícia Carneiro da Silva
B. IDADE
Outro dos factores que determina a inimputabilidade do agente é a idade – a
imputabilidade deve ser excluída relativamente a qualquer agente que ainda não
atingiu a sua maturidade psíquica e espiritual, com fundamento na necessidade de um
mínimo de maturidade como condição para apreciação da personalidade e atitude que
dela se exprimem. Só quando o estádio de desenvolvimento em que o agente se
encontra é suficiente para que o agente, ao praticar uma acção, tenha consciência da
natureza própria do que através dessa manifesta é que podemos falar em
imputabilidade. Nos termos do art 19º CP, os menores de 16 anos são inimputáveis.
No entanto, os ilícitos cometidos por estes agentes podem ser objecto de tutela
estadual, pois que também quanto a eles o Estado deve cumprir o dever de protecção
dos bens jurídicos.
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3º ano, Turma A
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3 – Inexibilidade
A inexibilidade trata-se de uma causa de exclusão da culpa, assim sendo considerada
pelo ordenamento português (apesar de ser muito discutido, a nível mundial, se esta
deve levar a uma total exclusão da culpa ou apenas a uma atenuação da mesma5).
Se ao agente for “roubada” a possibilidade de agir de outra forma, por força de
situação exterior, deverá manter-se a censurabilidade? A resposta é que não – se o
agente não tem poder de agir para actuar de forma diferente, exclui-se a culpa: não
lhe é exigível, nesse caso, que actue conforme o Direito. O Direito não impõe à pessoa
ser um herói moral, mas apenas um homem dotado de resistência espiritual normal,
honesto, normalmente fiel à normatividade e que teria agido de forma correcta se não
fosse aquele desvio causado por causa exterior a ele.
A Professora Maria Fernanda Palma entende que a inexibilidade deve ser entendida
como o fundamento geral da exclusão da culpa, partindo para isso do princípio da
desculpa.
→ Requisitos
o Perigo actual e não removível de outro modo – é em tudo idêntico ao requisito
exigido no estado de necessidade justificante, ainda que aqui a actualidade
deva ser mais ampla, abrangendo os perigos duradouros. Quanto ao facto de
não poder ser possível que o perigo seja eliminado de outra forma, essa
exigência deve ser entendida de forma estrita: por exemplo, não pode
reivindicar o estado de necessidade desculpante o soldado que, sujeito a sevícias
físicas ou morais do seu superior, se pode queixar ao comandante e, em vez de
o fazer, deserta. Exige-se, também que seja escolhido o meio adequado e menos
oneroso para os direitos de terceiro não implicado.
o Bens susceptíveis de serem lesados – trata-se de ser ou não exigível do agente,
naquela situação, um comportamento adequado ao direito – por esta razão,
compreende-se que a exclusão da culpa só possa ocorrer quando se trata de
5
Roxin entende que a inexibilidade deve ser vista como uma causa de exclusão da responsabilidade,
afirmando que, em vez de imputar a questão da inexibilidade a uma categoria anterior à culpa, deve
atribuir-se-lhe uma nova categoria – a da responsabilidade. Assim, o que está em causa é a punição, que
não se deve efectivar por ser desnecessária, pois que não existem exigências de prevenção.
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O art 16º, nº 2 não identifica uma estatuição – todo ele é previsão, caracterizando o
erro. Verificado esse erro, exclui-se o dolo pelo art 16º, nº 1 CP (porque se estou em
erro, não tenho condições informativas de motivar pela norma – “para aceder à
consciência da ilicitude”). O dolo diz-me quais são as informações que tenho que ter
para conseguir aceder à consciência do ilício – o dolo é instrumental face à consciência
da ilicitude. EXEMPLO: no caso de homicídio – preciso de saber se estou a matar uma
pessoa se achar que estou a matar coelho, por definição, nunca vou assumir que estou
a praticar um ilícito. Assim sendo, o dolo dir-me-á que eu tenho que ter conhecimento
dos elementos constitutivos do tipo, pois que isso é o que se exige para que consiga
aceder à consciência da ilicitude.
Passadas as dificuldades do art 16º, nº 1, é-nos possível seguir para o art 16º nº 2: casos
em que eu não tenho a informação toda (ou a informação correcta) que me permite
aceder à consciência da ilicitude. Por exemplo, se a minha representação do mundo é
a de que a pessoa que vem na minha direcção me vai matar, então por definição, eu
nunca vou achar que a minha defesa é ilícita. O agente não tem condições de
informação para colocar correctamente o problema da ilicitude6.
6
O PROBLEMA NÃO SE COLOCA SE HOUVER EXCESSO, POIS QUE, MESMO QUE FOSSE VERDADE QUE A
PESSOA ME VINHA BATER, EU NUNCA LHE PODERIA – LICITAMENTE – DAR UM TIRO. Nesses casos, há
concurso aparente entre o art 16º, nº 2 e o art 33º, pois que se tenho 33º não posso ter 16º, nº 2 – a
aplicação de um exclui a aplicação de outro.
EXCEPÇÃO – SITUAÇÃO EM QUE O EXCESSO É PROVOCADO PELO ERRO (por exemplo, penso
que só tenho disponível para me defender uma pistola, quando, na verdade, de baixo do balcão
tenho também um bastão. Aqui, eu uso a arma quando podia utilizar um meio menos gravoso).
7
Nesses casos, facilmente se compreende que há censurabilidade da falta de consciência do ilícito
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V – A TENTATIVA
1 – Noção e fundamento da punibilidade
A questão fulcral é a de saber a que estádios de realização do crime doloso a
responsabilidade penal pode aferir-se, e de que forma. Facilmente percebemos, para
começar, que a mera decisão de realização do ilícito não é punível. O que está em causa
é a necessidade de protecção subsidiária de bens jurídicos, não de puros valores
morais.
Outra questão pertinente é a de saber se já há lugar a punição pela mera prática de
actos preparatórios. Tende a responder-se que não: não sou punido por comprar uma
caçadeira para a prática de um homicídio. Há, ainda assim, excepções: por exemplo o
caso do art 262º CP, que pune a contrafação de moeda, que por sua vez constitui um
acto preparatório, apenas se consumando o crime no momento da entrada em
circulação daquela moeda.
A tentativa não é punida relativamente a todo e qualquer crime – e, quando o é, não
lhe cabe a pena do crime consumado. O fundamento da punibilidade da tentativa é
tema do qual resultou o desenvolvimento de várias teorias:
o Teorias objectivas – a tentativa é vista como uma acção externa dirigida
intencionalmente à realização do crime, devendo ser objectivamente perigosa.
O Professor Figueiredo Dias entende que esta teoria deve ser recusada, desde
logo porque o art 22º, nº 1 CP exige como elemento da tentativa a decisão da
prática do crime.
o Teorias subjectivas – a tentativa é punida por causa da vontade delituosa do
agente. No entanto, não pode ser aceite uma concepção extremada ou
exclusivamente subjectivista, que exclua por completo o fundamento na
perigosidade objectiva da conduta.
o Teorias da impressão – tendo em conta as críticas feitas a ambas as teorias
analisadas supra, desenvolve-se a teoria da impressão. De acordo com esta, a
punibilidade da tentativa funda-se na dignidade penal do facto tentado. O ponto
de partida é a vontade exteriormente manifestada em contrário da norma de
comportamento. No entanto, a punibilidade do acto dirigido à realização do tipo
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b), o meio idóneo seria apenas o de premir o gatilho. No entanto, assumir tal
premissa iria sempre contra a fórmula de Frank.
o Art 22º, nº 2, c) – são ainda actos de execução aqueles que, segundo a
experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, forem de natureza a
fazer esperar que se lhes sigam actos das espécies indicadas nas alíneas
anteriores, ou seja, ou seja, atos que integrem um elemento típico ou sejam
idóneos a produzir o resultado típico.
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material do ilícito – que o agente impeça a consumação material. O regime a que ficam
submetidos este tipo de casos é em tudo idêntico ao que cabe na desistência da
tentativa acabada (art 24º, nº 2 CP).
VII – COMPARTICIPAÇÃO
Em sede de comparticipação, cumpre estudar a responsabilidade pela realização de
factos típicos e ilícitos nos quais se identificam uma pluralidade de agentes, sendo
estes autores ou não. A comparticipação apenas existe ex ante facto, ou, quando
muito, no momento da sua prática. Significa isto que não é um caso de comparticipação
aquele em que uma pessoa se junta para encobrir o crime já praticado por outra
(situação que se passa ex post facto) – o encobrimento é um crime autónomo.
Existem três figuras de comparticipação: autoria, instigação e cumplicidade. Os
autores são as figuras centrais do acontecimento criminoso, sendo por isso o “centro
pessoal do ilícito típico”. Já o cúmplice representa uma figura lateral, secundária ou de
segunda linha, na integral realização do ilícito típico. Este não realiza o tipo de ilícito,
mas participa na realização levada a cabo por outrem. Existe também o instigador,
sendo esse aquele que determina dolosamente outrem à prática do facto. Por fim, há
que referir o papel do co-autor, o agente que pratica o facto em conjunto com outro(s),
tendo para isso havido uma decisão conjunta e participação na execução.
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1 – Autoria
O autor pode desde logo ser autor imediato ou autor mediato:
o Autor imediato – é punível como autor quem executa o facto, por si mesmo. O
autor imediato preenche, na sua pessoa, todos os elementos do ilícito típico.
EXEMPLO: A atira B contra C. A é autor imediato, pois que B não pratica qualquer
acção.
o Autor mediato – também é punível como autor aquele que executa o facto por
intermédio de outrem. Identificam-se as figuras do homem de trás (autor
mediato) e do homem da frente (executor, intermediário ou instrumento).
Roxin fala, aqui, de uma situação de domínio da vontade, que pode desde logo
ocorrer por três vias.
• Domínio da vontade por coação – homem de trás coage o homem da
frente à prática da acção (por exemplo, A aponta uma arma à cabeça de
B, dizendo-lhe que o matará se este não matar C).
• Domínio da vontade por erro – homem de trás engana o homem da
frente, levando a que este se torne executor involuntário do seu plano
delituoso (por exemplo, A entrega a B uma caixa de explosivos, dizendo
que a caixa contém compotas e que este tem de entregar a caixa a C. C
morre ao abrir a caixa).
• Domínio da vontade nos quadros de aparelhos organizados de poder –
em se de uma organização rígida e disciplinada, alguns autores entendem
que, por vezes, os agentes que recebem ordens acabam por se tornar
meros instrumentos (por exemplo, organização policial apodera-se do
aparelho do Estado).
o Co-autoria – é co-autor aquele que tome parte directa na execução do facto
(execução conjunta), por acordo (decisão conjunta). Há um domínio colectivo
do facto, em que a actuação de cada um dos co-autores se apresenta como
momento essencial da execução do plano comum. O co-autor é punido
segundo a moldura penal prevista para o crime, como se agisse sozinho.
• Decisão conjunta – o agente apenas pratica uma parte, mas decide pela
realização da execução típica. Por exemplo, num caso de roubo de um
banco, A paralisa os clientes e empregados com uma arma (ameaça),
enquanto B retira o dinheiro dos cofres (subtracção). Para considerarmos
haver uma decisão conjunta, tem de se verificar um acordo expresso, ou
pelo menos um conjunto de acções concludentes. Mais que isso, só
existe co-autoria perante o que foi determinado em conjunto, pelo que
não responderão ambos pelo excesso de um deles (por exemplo, A e B
decidem conjuntamente matar C, mas depois B “rouba”8 a vítima. O
homicídio é levado a cabo em regime de co-autoria; o “roubo” é
imputado a B, mesmo que A, depois da apropriação, também concorde
8
EXEMPLO RETIRADO DO MANUAL DO PROF. FIGUEIREDO DIAS. NO ENTANTO: considerar que há roubo
em vez de furto, parece-me a mim, representa violação do princípio ne bis in idem: toda a violência que
faria do roubo um crime de roubo é já contemplada no crime de homicídio, pelo que parece haver aqui
uma dupla valoração da violência.
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com ela). Este acordo que se exige tem de se verificar antes ou durante
a prática do facto, e nunca depois da sua consumação, sob pena de
estarmos perante co-autoria sucessiva. Para o Professor Figueiredo Dias,
o co-autor sucessivo só pode ser responsabilizado pelo ilícito cometido
após a sua adesão ao acordo (diverge da doutrina alemã, que entende
que este seria punido por todo o ilícito praticado, desde que o acordo
aconteceu).
• Execução conjunta do facto – o art 26º, nº 3 CP exige que o co-autor
tome parte directa na execução. A execução parte de um critério do
domínio do facto, que aqui se combina com uma exigência de divisão de
tarefas. O que se exige é que cada um dos agentes contribua com
actuações que, em conjunto, preencham o tipo legal de crime. Esta
repartição tem de se manter no estádio de execução, pelo que, entende
Figueiredo Dias, deve ser recusada a classificação de co-autor para o
agente que apenas participa na fase preparatória. Nesse caso, apenas
poderemos ter instigação ou cumplicidade.
Pode ser elaborada uma lista de casos em que tipicamente se considera haver autoria
mediata:
I. O INSTRUMENTO (HOMEM DA FRENTE) ACTUA ATIPICAMENTE
o Por intervir quanto a ele uma causa de exclusão da tipicidade – o instrumento
pratica uma acção que, se cometida pelo homem de trás, constituiria um ilícito
típico, mas cometida por aquele, surge como atípica.
o Por ser a própria vítima – a atipicidade provém do facto de o instrumento ser a
própria vítima, não sendo a acção típica quando praticada por ela. EXEMPLO: A
convence B de que a eletricidade está desligada e de que este pode fazer
reparações. Quanto B começa, sofre um choque elétrico e morre.
o Por actuar sem dolo do tipo – o instrumento pratica uma acção que preenche o
tipo objectivo de ilícito, mas não o tipo subjectivo, por lhe faltar o dolo (há erro
sobre a factualidade típica). EXEMPLO: A prepara uma chávena de chá
envenenado e ordena B que se encarregue de a servir a C. B desconhece o plano.
O Professor Figueiredo Dias entende que a situação de negligência consciente
do homem da frente deve ser resolvida de igual maneira. EXEMPLO: caso
Lacman modificado – A e B fazem uma aposta para saber se A consegue acertar
na maçã que C segura na mão. A actua com negligência consciente (não se
conformando com a possibilidade de acertar em C), mas B quer que A acerte em
C, o que acaba por acontecer.
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2 – Instigação
Será instigador aquele que, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto.
É esse o sentido do art 26º CP. Para que se seja considerado instigador, então, exige-se
ao agente que crie no executor a decisão de atentar contra o bem jurídico. A Escola de
Coimbra entende que a instigação é uma forma de autoria, dada a intensidade do
domínio da decisão que tem o instigador. O mesmo tende a entender o Professor
Figueiredo Dias. Já a Professora Maria Fernanda Palma, por contrário, defende que a
instigação é uma forma de participação, exigindo, desta feira, a acessoriedade.
Nos casos de instigação, acaba por ser exigida a verificação de uma situação de duplo
dolo – dolo do instigador deve referir-se à determinação do instigado (dolo na
determinação) e ao facto cometido por este (dolo do instigado). Pode também haver
situações de instigação em cadeia – casos em que a determinação é o resultado da
atuação em cadeia de vários instigadores. Apenas serão instigadores os que tiverem
domínio na decisão, sendo cúmplices todos os restantes.
Se o instigado for além do dolo do instigador, teremos um caso de excessus mandati,
respondendo o instigador apenas pelo seu dolo. Se, por contrário, a actuação do
instigado ficar aquém do dolo do instigador, então o instigador responderá pelo facto
efectivamente cometido – a tentativa falhada de instigação não é punida.
3 – Cumplicidade
Encontra-se regulada no art 27º CP, tratando de situações em que há uma
acessoriedade de participação – há uma colaboração do autor no facto, pelo que a sua
punibilidade supõe a existência de um facto principal cometido pelo autor. O cúmplice
não pratica a acção típica, pelo que o seu comportamento não é abrangido pela parte
especial do Código Penal – o art 27º CP representa uma extensão da punibilidade a
formas de comportamento que, sem ele, não seriam puníveis.
A cumplicidade pode dar-se por auxílio material – bastando que o cúmplice favoreça o
autor – ou por auxílio moral – por exemplo, auxílio psíquico. O que acontece se a
prestação material com que o cúmplice favorece o autor não for utilizada? Poderá
considerar-se que há uma mera tentativa de cumplicidade, que não é punível. No
entanto, também poderá ainda estar em causa um verdadeiro caso de cumplicidade,
pois que o contributo do cúmplice não precisa de ser causal para o resultado, bastando
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que o acto em causa aumente as hipóteses de realização típica por parte do autor.
Mais que isso, mesmo que não se considere já haver auxílio material, ainda há espaço
para que haja auxílio moral – bastará, para isso, que a prestação concedida pelo
cúmplice traga ao autor uma sensação de maior segurança no sucesso da prática do
facto.
A punição da cumplicidade funda-se na actuação do participante sobre a pessoa do
autor e na colaboração do participante no facto do autor (arts 72º e 73º CP).
4 – A acessoriedade na participação
Estabelecido que esteja que a actuação do agente é acessória e dependente
relativamente ao facto principal, cumpre fazer à acessoriedade exigências adicionais:
o Acessoriedade qualitativa ou interna – corresponde a uma medida mínima de
elementos constitutivos do facto do autor.
• Acessoriedade mínima – bastaria a verificação do facto típico – hoje
rejeitadas.
• Acessoriedade extrema – seria necessária a verificação de um facto
típico, ilícito, culposo e punível (hoje rejeitada).
• Discussão atual: entre a acessoriedade rigorosa (exige um facto típico,
ilícito e culposo) e a acessoriedade limitada (facto típico, ilícito).
Crítica à acessoriedade rigorosa: deixou de ter sentido com a
análise do tipo subjetivo que já implica a verificação do dolo;
ainda, não se coaduna com a referência, no art. 29º, a
independentemente de culpa.
ACESSORIEDADE LIMITADA: é hoje a tese dominantemente
aceite – cumplicidade como participação no ilícito típico do autor.
O Professor Figueiredo Dias propõe a teoria da acessoriedade
limitada modificada: a punibilidade, em princípio, não é critério,
no entanto, há situações em que têm necessariamente de ser
consideradas as condições objetivas de punibilidade ou casas
materiais e exclusão da pena (art. 227º/1 p.e.).
o Acessoriedade quantitativa ou externa: corresponde a uma exigência de que o
facto principal alcance um certo estádio de realização. Tem de existir execução
ou começo de execução: só há participação no facto de outrem se esse facto
começar a ser praticado (ideia de perigo dos bens jurídicos – art. 22º, tentativa).
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→ Caso Rolling Stones: A e B atiram à vez uma pedra para a base de uma colina. Uma
das pedras atinge uma pessoa e esta vem a morrer.
Helena Morão: co-autoria negligente.
Maria Fernanda Palma: como há combinação entre os dois, estamos perante um
cenário de imputação objetiva. É um caso de autoria paralela negligente.
Se não houver combinação: causas paralelas.
9
Excepto no caso da consunção, o que fundamenta a crítica feita a esta teoria pelo Professor Figueiredo
Dias
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o Consunção – casos em que são convocadas duas normas, mas, tendo em conta
as particularidades, percebe-se que uma delas consome todo o desvalor. Por
exemplo, A dá um tiro a B, que lhe acerta no peito: há crime de homicídio, mas
há também o dano de ter destruído a camisola. Nestes casos, entende.se que o
crime de homicídio consome todo o desvalor, pelo que o agente apenas é punido
por via desse.
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