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TEORIA GERAL DO CRIME

A Teoria Geral do Crime aparece, pela primeira vez, nos Tratados de direito penal do séc. XVI através de Tiraqueau. Este autor já definia crime através da
distinção dos seus elementos que encontraremos na chamada escola clássica:
Ele via o crime como um facto ilícito e punível, praticado com dolo ou negligência.

Na teoria geral do crime analisar-se-á os elementos constitutivos do crime. Vamos proceder a uma decomposição analítica destes elementos que fazem
parte do conceito material de crime, nos seus elementos constitutivos!

Nos dias de hoje é indiscutivelmente aceite na dogmática jurídico-penal e em matérias de construção do facto punível, o princípio de que todo o direito
penal, é direito penal do FACTO e não do AGENTE!
E isto por duas grandes razões:

- O direito penal liga a punibilidade a tipos de factos singulares e a sua respetiva natureza!

- Na aplicação de sanções! Elas constituem consequências jurídicas dos factos praticados, não são formas de reação contra uma certa individualidade.

Por isto mesmo, deverá se concluir desde logo que a construção dogmática do conceito de crime, é uma construção do conceito do FACTO PUNÍVEL!

A tentativa de apreensão deste conceito jurídico-penal do FACTO punível/criminoso, constituiu e constitui até os dias de hoje, uma das mais ingentes
tarefas a que já se dedicou a dogmática jurídico penal!

Essa mesma tentativa ocorreu quase sempre nos últimos dois séculos (numa luta entre três escolas do pensamento jurídico), socorrendo-se de um
procedimento metódico categorial-classificatório, através do qual se toma por base um conceito geral – no caso, o conceito de AÇÃO – suscetível, por
sua larga extensão e reduzida compreensão, de servir de pedra angular para todas a suas predicações ulteriores!
É um procedimento que não pretende mais do que alcançar uma compreensão unitária do conceito de crime, através da consideração sucessiva dos seus
elementos constitutivos, de uma compreensão lógico-sistemática, permitindo que uma realidade unitária seja contemplada a partir de pontos de vista
diversos!
Com isto, pretende-se dois objetivos:
OBJETIVO PEDAGÓGICO: Ao decompor-se analiticamente a ideia de crime nos seus vários elementos, estamos a simplificar a sua compreensão! A
compreender melhor o próprio crime, logramos de uma melhor compreensão da própria realidade criminal!
OBJETIVO METODOLÓGICO + Importante - A teoria geral do crime é uma proposta metodológica, que vai presidir à realização do dto penal! Perante
cada caso concreto, o juiz, o Ministério Público, o advogado etc, para saber se tem um crime ou não e qual a sua espécie, tem de percorrer um caminho,
verificando todos os elementos e verificar se estão preenchidos os seus requisitos constitutivos do conceito de crime.

NOTA: O conceito de crime, é um conceito instrumental à imputação da responsabilidade criminal!


- Para se resolver o problema da imputação, é conveniente que tenhamos um sistema organizado, que nos permita de modo uniforme decidir no caso
concreto!

 Este procedimento de apreensão do conceito de crime, já foi objeto de críticas, nos anos 30 do século XX, por parte do ordinalismo concreto
(Escola de Kiel)!
Esta dominou pela europa entre 1930 e 1945! Foi um pensamento muito utilizado pelos regimes políticos totalitáriosnuma tentativa de justificação das
atrocidades penais cometidas.
É também chamada escola do Irracionalismo Penal, na medida em que, a lógica fundamental desta Escola, é que, para estudar o crime não é preciso
recorrer aos 4 elementos, de forma individual. Esta escola propunha uma visão global dos respetivos elementos, desprezando assim, a visão analítica do
crime (analisar ponto por ponto).
Os defensores desta escola, consideravam que não podemos partir o crime, temos de ter uma visão global, uma compreensão global intuitiva do facto
punível, caso contrário, estaríamos a empobrecer esse conceito.
O ordinalismo concreto teve por trás do DP nazi. O ordinalismo concreto não tem nada a ver com o nazi, mas o facto de ter sido aproveitado por ele, deixa
transparecer como é frágil, pois a lei não vale por si, está tudo nas mãos dos juízes, quando a lei for contraria ao Volksgeist (espírito do povo), neste caso,
interpretado pelo Fuhrer, é posta de parte!
Atualmente, ninguém defende o ordinalismo concreto, está totalmente posto de parte! Nenhum regime político verdadeiramente democrático, adota esta
posição.
Por outro lado, segundo o procedimento metódico categorial-classificatório, chega-se a compreensão do Facto punível – e todo e qualquer – com um
conjunto de 5 elementos, traduzidos em predicações/qualificações de um comportamento humano:
Em primeiro lugar – AÇÃO (que depois é qualificada = conceção quadripartida – como típica, ilícita, culposa e punível*)

AÇÃO – TIPICIDADE – ILICITUDE – CULPA –- São os elementos constitutivos do conceito do facto punível e dos respetivos sistemas! Como quer que
eles devam mutuamente relacionar-se, delimitar-se, compreender-se a numa certa perspetiva, até fundir-se (=ilícito-típico defendido por Figueiredo dias)

Punibilidade (?)
Culpa (4)
Ilícita (3)
Típica (2)
AÇÃO (1)

(1) É preciso um comportamento humano, relevante para o direito penal (postivo/negativo). Tudo se passa no mundo interior (do pensamento) não há
crime. Ou mesmo a mãe natureza poderá matar, ou ferir, sem constituir crime! Um animal selvagem causa-me um ferimento, também não é crime.
Até há um velho ditado latino que diz que ninguém sofre uma pena por um pensamento.1

(2) Mas, nem todas as ações humanas são penalmente relevantes! Ações humanas típicas apenas! Existem muitos comportamentos atípicos! Assim, a
segunda categoria é a tipicidade (a título de exemplo: matar pode não ser crime, pois a pessoa pode matar-se, sendo que o suicídio é um acto atípico
em Portugal; na Alemanha quem se suicidar comete um acto típico, só que não é punido por razões óbvias. O furto é uma actuação típica. Passear
na rua não é nenhuma acção típica, porque não há nenhuma norma penal que proíba passear na rua)

(3) Podemos adotar comportamentos típicos e eles não serem ilícitos! (a título de exemplo: quando se mata em legítima defesa). Assim, não são ilícitos
os comportamentos praticados ao abrigo de uma causa de justificação. Assim, a terceira categoria é a ilicitude. Ilicitude é a qualidade de um
comportamento típico não justificado! Avalia-se o valor objetivo do facto (contrariedade a ordem jurídico-penal!); sendo as causas de justificação, a
título de exemplo, a legítima defesa, o direito de necessidade, o consentimento do ofendido, etc.

(4) Podemos ainda praticar um facto que seja típico e ilícito, e, no entanto, este não constituir crime, pois para que haja crime é necessário que o facto
seja culposo (Dolo ou Negligência). A culpa é um juízo de censura pessoal, subjetiva. Avalia-se o valor subjetivo do ato, o conteúdo de
censurabilidade desse ato, àquele concreto agente. Portanto, a quarta categoria é a culpa; sendo que, não haverá culpa nos seguintes casos:
- No caso de o agente ser inimputável;
- No caso de o agente ter agido sem dolo ou negligência;
- Quando estamos perante um caso de inexigibilidade

1
Mas então não é a pessoa que é punida? A pessoa será punida pelo que faz! Direito penal do Facto!
(5) Pode-se ainda suceder do comportamento adotado ser típico, ser ilícito, ser culposo mas não preencher requisitos de punibilidade! É mais um
elemento de fundamentação preventiva do direito penal, no sentido de que, não é punir, por punir! Deve-se punir apenas quando for necessário. Por isso,
poderão haver situações, não tão frequentes, em que temos uma ação típica, ilícita e culposa, e, todavia, não seja necessário punir. Ex.: despensa de pena –
concretiza a ideia de necessidade de punição à a tal conceção unilateral ou unívoca da culpa

Pode-se dizer, de uma forma geral, que os sistemas elaborados pela doutrina, a partir daquele procedimento, tem uma estrutura piramidal, indo do requisito
mais genérico para o cada vez mais específico, cada conceito estando numa relação de género a espécie, na medida em que se avança, indo a restringir a
situação jurídico-criminalmente relevante!
Ao decompor a ideia do crime, estamos a oferecer um caminho ao julgador/e aos juristas em geral/praticantes da lei, que propicia a justiça! – desde logo, ao
analisar cada uma das vertentes/ elementos vai permitir melhor ajustar ou chegar a uma melhor solução, mais ajustadas à avaliação criminal –, mas
prossegue, sobretudo, objetivos de segurança jurídica.
Para se chegar a um bom resultado, o julgador tem de sempre percorrer este caminho, criado pelo sistema. Mesmo para efeitos de recurso: O tribunal de
recurso, para avaliar da justeza ou falta dela, da decisão recorrida, terá de percorrer o mesmo percurso que a decisão percorreu.

São três grandes (sistemas da) construções gerais do conceito do facto punível:
- Sistema clássico, também designado de positivista ou naturalista;

- Sistema neoclássico ou normativista; inspirados nos pressupostos ôntico-epistemológicos do neokantismo de Baden.

-Sistema finalista.
De Hans Welzel.

Estes foram os 3 sistemas basilares que marcaram uma acesa luta de escolas, durante os primeiros 60 ou 70 anos do século XX, sendo que:
O sistema naturalista/ positivista, em 1º lugar, que não teve expressão entre nós;

O segundo sistema, normativista ou neoclássico, já nos influenciou mais! Beleza dos Santos que não estudou diretamente a dogmática alemã, mas que foi
discípulo de Eduardo Correia, que por sua vez, foi influenciado pela dogmática alemã.

Todas as escolas que se vai analisar, trabalham com os elementos, decompõe analiticamente a ideia de crime e os seus elementos constitutivos (ação;
tipicidade, ilicitude, e culpa). Cada uma das escolas apresentou sistemas, que procuraram ser melhores do que os anteriores, não somente os substituir. Não
devemos olhar para elas em termos de optarmos por uma ou por outra. Assim, devemos considerar cada uma delas ultrapassadas, mas cada uma delas
realizou progressos.
Escola Clássica
(BELING, VON LISTZ)

- de influência naturalista e jus positivista – monismo científico da segunda metade do séc. XIX
- o sistema do facto punível haveria de ser constituído por realidades mensuráveis e empiricamente comprováveis, pertencessem elas à facticidade (objectiva) do mundo
exterior ou antes a processos psíquicos internos (subjetivos)
- o elemento determinante na fundamentação dos critérios e soluções é a lei positiva

Acção Tipo Ilicitude Culpa

- naturalista – modificação objectiva do - objectivo e descritivo – descrição - meramente formal – basta a - conceção psicológica; descritivo/subj.
mundo exterior através de um movimento puramente externo-objectiva da contradição com a norma
- existência, entre o agente e o seu facto
corporal voluntário realização da acção, completamente
- juízo normativo e objectivo objectivo, de uma ligação psicológica
estranha a valores e sentidos
- basta a voluntariedade formal do suscetível de legitimar a imputação ao
- ilicitude adequada ao carácter
comportamento, independentemente de a - tarefa de enquadramento do facto agente a título de dolo ou de negligência
secundário e sancionatório do Direito
vontade se dirigir à espécie de acção concreto no facto legal que não
Penal inerente à teoria das normas de - dolo – conhecimento e vontade de
desenhada legalmente produz verdadeiros juízos de valor –
BINDING - trata-se de toda a ordem realização do facto
é neutro
- o conteúdo ou o objecto concreto da vontade jurídica1 é um juízo que implica na
- negligência – deficiente tensão de
é uma questão a ser valorada ulteriormente - a tipicidade é apenas a verificação avaliação do confronto do facto com
vontade impeditiva de prever
(dolo/neg.) e não impede a verificação da de um indício de crime, ao qual se todas as proibições e permissões que o
corretamente a realização do facto
condição de o facto ter a qualidade de acção segue um processo lógico de mesmo suscita
confirmação do indício de ilicitude
- a congruência imprescindível entre
o facto descrito legalmente e o facto
concreto é um momento do juízo
- basta-se com uma estrutura comportamental - a acção típica é lícita se não intervier
global Crítica: esquece que o inimputável
objectiva, independentemente da significação no caso uma causa de justificação
no mundo social pode agir com dolo ou negligência;
Crítica: esquece as unidades de - causa de justificação – situação que, a esquece que, ao menos na negligência
Acção como dado empírico observável sentido social que vivem nos tipos título excecional, torna a acção típica em inconsciente, não existe qualquer
elemento externo e objectivo de um (ex.: leva a igualar o acto do acção lícita, aceite ou permitida pelo relação psicológica comprovável entre o
comportamento voluntário cirurgião que salva a vida do paciente direito agente e o facto, antes ausência dela;
com o faquista que esventra a sua esquece que, independentemente da
Crítica: restringe de forma inadmissível a vítima) Crítica: reduz o juízo de ilicitude à verificação do dolo/negligência,
base de toda a construção (exs.: acção na ausência de uma causa de justificação do circunstâncias que devem excluir a
injúria é a emissão de ondas sonoras dirigidas facto típico, o que constitui uma culpa, nomeadamente a falta de
ao aparelho auditivo do receptor; na omissão compreensão paupérrima e inexata do consciência do ilícito ou
releva como acção a acção precedente) que vai implicado naquele juízo a
inexigibilidade de outro comportamento
Escola Neoclássica
(MEZGER, ENGISCH, EDUARDO CORREIA)

- filosofia dos valores de origem neokantiana (primeiras décadas do séc. XX, pela Escola do sudoeste alemão ou Escola de Baden): pretende situar o direito numa zona
intermediária entre o mundo do “ser” e o do puro “dever-ser”, no mundo das referências da realidade aos valores, do ser ao dever-ser e no mundo da axiologia e dos sentidos
- normativista; o elemento predominante na fundamentação dos critérios e soluções utilizadas na definição do crime: finalidades e valorações essenciais do sistema
- o método configura o objecto: realidade significativa (depende dos valores com que se observa)

Acção Tipo Ilicitude Culpa

- negação de valores - objectivo – não inclui momentos de violação do - danosidade social - tem uma componente psicológica
através de uma atuação da dever (dolo; negligência), excepto quando o próprio (dolo; negligência)
- normativismo penal
vontade no mundo tipo inclui momentos subjectivos (como a especial - e uma componente normativa
exterior – acção como intenção) - juízo de desvalor (censurabilidade ético-social do
comportamento - definição concreta entre permitido e proibido agente)
- constatação prática de que os tipos não são
significativo
descritivos, pois o juízo sobre o elemento ultrapassa - expressão de valorações específicas do legislador- elementos constitutivos:
- significado social de a natureza do elemento, é interpretativo e valorativo penal na incriminação das condutas e de uma - imputabilidade – capacidade do
contrariedade ao Direito – expressão de valorações específicas do legislador justificação autónoma das normas penais agente de avaliar a ilicitude do facto e
penal na incriminação de se determinar por essa avaliação
- relativização do - apresenta-se em diversas hipóteses como um - dolo/negligência – formas ou graus
conceito de acção (= - constatação teórica de que a tipicidade é a conglomerado de elementos objetivos e subjetivos de culpa
omissão) individualização da ilicitude (elementos especiais) - exigibilidade – comportamento

- fundamento do ilícito – tipo como ratio essendi da - o facto é ilícito por estar em contradição com a adequado ao direito
Crítica: ilicitude ou tipo de ilícito - tipicidade não apenas própria proibição penal que se deduz do tipo legal
(≠ clássicos) Crítica: apesar de se dizer concebida
(FDIAS) continua a partir como o indício, mas a fonte da antinormatividade (a como um juízo de censura, continua a
do conceito mecânico- tipicidade fundamenta por si a ilicitude do facto) - é o tipo legal que fundamenta, por si, toda a
constituir um conglomerado
causalista da acção, - a tipicidade é o princípio e o fim do juízo afirmação de valor possível sobre o facto
heterogéneo de objecto da valoração e
esquecendo não ser aí que valorativo - causas de justificação como elementos negativos de valoração do objecto, submetendo
reside a essência do actuar - unidade de sentido socialmente danoso, do tipo ao mesmo denominador características
humano comportamento lesivo de bens juridicamente que são elementos de um puro juízo
(MFP) despreza a questão protegidos Crítica: esquece ou minimiza a sua carga ético- (imp.; exig.) e as que são elementos do
de saber qual é a estrutura pessoal; resultados inaceitáveis como a inclusão substrato que deve ser valorado como
comportamental que no dolo da ausência de causas de justificação; censurável (dolo; neg.)
Crítica: não distingue valoração e objecto da impraticabilidade no processo penal
permite a analogia entre
valoração
acção e omissão
Escola Finalista
(WELZEL)
- crítica ao subjetivismo metodológico e ao relativismo axiológico do neokantismo (e às consequências que teve no DP nazi, ex.: caso do aborto das mulheres arianas);
pensamento ontológico – o DP refere-se a valores ínsitos na realidade, independentes de subjetividade - A norma penal deve estruturar-se a partir da realidade com
significado ético-social, que existe prejuridicamente (factividade humana como realidade prévia à configuração normativa) – o objecto condiciona o método
- o elemento predominante na fundamentação dos critérios e soluções são as estruturas ontológicas do comportamento humano

Acção Tipo Ilicitude Culpa


- tipo indiciador e descritivo - juízo normativo e - mero juízo normativo de
objectivo-subjetivo censurabilidade do agente (sem
- prévio à ilicitude: verificação de
elemento psicológico)
que o objecto da proibição se - constituído pelo
verifica no caso desvalor da acção e - puro juízo de desvalor, por o
- só da conjugação das vertentes desvalor do resultado agente haver agido de maneira
objectiva e subjetiva pode resultar (inclui o desvalor da contrária ao direito, quando lhe
o juízo de contrariedade da acção acção!!!, pois o era possível proceder em
à ordem jurídica (juízo de elemento subjetivo conformidade com a ordem
ilicitude) jurídica;
está incluído logo na
- C rític a à d o u trin a c a u s a l d a a c ç ã o : a v o n ta d e n ã o p o d e se r se p a ra d a d o
- elemento objectivo: elementos acção) - juízo negativo, de exclusão
se u c o n te ú d o re sp e ito p e la d ig n id ad e h u m a n a - re sp e ito p e lo h o m e m
descritivos do agente, da conduta daqueles que não são capazes de
c o m o p e s s o a , c a p a z d e a g ir co m o se r liv re e re sp o n s á v e l - v in cu la ç ã o d o - conceção pessoal-
e do seu circunstancialismo conduzir as suas ações de
D ire ito a o c o n c eito d e a c ç ã o fin al – a v o n ta d e é u m a e s p e c ific id a d e final do ilícito
- elemento subjetivo (substitui vontade com autodeterminação
d o co m p o rta m e n to h u m a n o , q u e c o rre sp o n d e à c o n d u ç ã o (o u
(consequente da acção final): dolo plena de sentido;
c o n d u tib ilid a d e ) p a ra fin s o u o b je tiv o s c o n c re to s p re v ia m e n te a
se le c io n a d o s (ju íz o o b je c tiv o - su b je tiv o ) ou negligência s conceções causais- - elementos:
objetivas anteriores) - imputabilidade
(dolo e negligência como objecto - consciência (ao menos
- acção como conceito pré-jurídico, ontologicamente determinado da valoração | culpa como mera potencial) do ilícito
valoração) - exigibilidade de outro
- Exige uma acção final (real ou potencial): sobredeterminação causal de
comportamento
meios pelo agente para obtenção de um certo objectivo – processo orientado
para a modificação do mundo exterior

- A finalidade não tem conteúdo espiritual, de significação – é uma


orientação implícita do comportamento exterior pela vontade

- Negligência: finalidade potencial – poderia ter existido no sentido de evitar


o resultado criminoso: exprime um momento de controlo sobre os actos; as
ações reais e ações possíveis são iguais na sua dignidade ontológica (acaba
por falar em acção cibernética, como acontecimento controlado e dirigido
pela vontade)

- Omissão: há intencionalidade – para atingir um fim não se empregam


factos causais
A. ESCOLA CLÁSSICA

A formulação que se denomina de clássica é a que a teoria do crime tem em Liszt, em finais do século XIX e inícios do século XX.

Esta chama-se de clássica porque foi a primeira formulação perfeita desenvolvida. Podemos dizer que todas as posteriores vêm desta primeira, assistindo-
se a uma espécie de evolução da teoria da escola clássica.

Importa aqui falar da evolução do pensamento filosófico que influencia decididamente as várias escolas, ou a sua base. Filosoficamente, Liszt era um
positivista, o que significa que acreditava que a realidade é dada pela experiência. Os positivistas negam a metafísica e acreditam que o saber não pode ir
para além da realidade.

Este é um dado importante, porque como filósofo positivista que era, Liszt entendeu que o crime é uma realidade no mundo da experiência e os elementos
que o constituem são parte dessa realidade, devendo fazer-se uma distinção material desses elementos.

Neste sentido, Liszt considerava haver quatro elementos do crime: ação, ilicitude, culpa e punibilidade.

Quanto à ação, Liszt adotava um conceito naturalístico, segundo o qual, a ação, se traduz num movimento corporal que leva a uma transformação no
mundo exterior estando este movimento e essa transformação ligados por um nexo de causalidade. Como iremos ver, ao desenvolver esse elemento,
chama-se a este conceito de ação de conceito causal de ação.

Contudo, não bastava provar a existência de uma ação, era necessário provar a ilicitude que, nesta altura, consistia na contrariedade a uma norma jurídica
e era constituída apenas pelos elementos objetivos do crime.

Já os chamados elementos subjetivos do crime como o dolo e a negligência, nesta formulação ainda faziam parte da culpa e, por isso, todos os processos
anímicos e espirituais que se desenrolavam no interior do autor ao praticar o crime pertenciam à culpa.
O dolo consistia na vontade de realizar o facto, enquanto que a negligência consistia na deficiente tenção da vontade, que não permitia ver a realização do
facto. Assim, o dolo e a negligência eram formas de culpa, pois a culpa era apenas a ligação psicológica entre o agente e a ação. Por último surge o
elemento punibilidade que correspondia ao conjunto de elementos adicionais, geralmente objetivos, que permitiam distinguir determinado crime de outros
atos ilícitos e culposos.

Como iremos perceber, as várias escolas também tiveram a sua evolução. Assim, dentro de cada escola, nomeadamente da clássica, há também uma grande
evolução. Isto é relevante porque em 1901 surge um autor muito importante, Beling. Este faz uma alteração profunda na teoria geral do crime porque
introduz um novo elemento, a tipicidade. Introduziu-o com a sua monografia “teoria da infração”.
Em termos gerais, vem dizer que para haver um crime é necessário que também haja uma correspondência ou conformidade do facto praticado com
a previsão da norma incriminadora. Assim, a tipicidade é a existência de correspondência entre o facto e um tipo legal. Já na altura este autor distinguiu
dois conceitos de tipo que continuam a ser essenciais: conceito de tipo indiciário ou provisório e o conceito de tipo essencial ou definitivo.

O conceito de tipo indiciário ou provisório abrange apenas as circunstâncias incluídas na norma incriminadora e por isso, sempre que o facto corresponde
às 4 circunstâncias descritas na previsão da norma, verifica-se a tipicidade desse facto. Por seu lado, o conceito de tipo essencial ou definitivo abrange o
conjunto de elementos constitutivos do crime, isto é, abarca todas, mas mesmo todas, as circunstâncias de que depende a consequência final e, por isso,
além das circunstâncias descritas pela norma incriminadora inclui também as circunstâncias que têm a ver com a ilicitude ou com a culpa, e chega mesmo a
incluir os elementos das normas processuais.

Beling faz isto na sua monografia e Liszt, principal autor da escola clássica, recebe e adere a este conceito. Quando Liszt acolheu como elemento do crime
a tipicidade, resolveu colocá-lo no fim da definição de crime: facto ilícito culposo punível e típico. Contudo, nas últimas edições do seu tratado, já coloca a
tipicidade logo a seguir à ação e crime passa a ser uma ação típica, ilícita, culposa e punível. Porque é que há esta hesitação de Liszt? Quando resolve por a
tipicidade no fim está a pensar no conceito de tipo essencial, mas quando o passa para segundo elemento já está a pensar no tipo indiciário. Ora, a partir
daqui o conceito de tipo passa a ser essencial na teoria do crime e por isso, importa referir alguns conceitos relacionados com o tipo que são fundamentais.

Atualmente o crime é definido, para a maior parte da doutrina, como uma ação típica, e o tipo surge como tipo indiciário criado por Beling, mas este
conceito que agora usamos como segundo elemento do crime, para além de abranger os elementos constitutivos do tipo legal, abarca também as
circunstâncias que vêm descritas nas chamadas normas extensivas na punibilidade e que estão na parte geral do código penal. Um exemplo destas normas é
a norma que prevê a tentativa. Esta é uma norma extensiva da punibilidade ou da tipicidade, visto que se ela não existisse a tentativa não poderia ser punida
de todo. Para além desta distinção entre tipo indiciário e tipo essencial, há que distinguir consoante o ponto de referência, o tipo em sentido abstrato do tipo
em sentido concreto. Se o ponto de referência é o facto concreto, se o ponto de análise é o caso concreto, as circunstâncias de que depende a consequência
jurídica fazem parte do chamado tipo em sentido concreto e depois pode ser indiciário ou essencial. Contrariamente, se o ponto de referência é a previsão
da norma incriminadora, estamos a falar do tipo em sentido abstrato, daí que o ponto de referência seja a própria norma. Isto é muito importante porque
para averiguar se determinadas circunstâncias previstas na lei estão ou não presentes num determinado caso concreto, temos o chamado método subsuntivo
que consiste numa operação lógica pela qual o facto concreto se determina como um caso de certa norma. Assim, o que faremos é saber se o facto concreto
se subsume em certa norma através desta operação lógica. Isto faz-se através da interpretação do caso e da interpretação dos conceitos da norma e esta
operação lógica é constante, estamos sempre a passar do caso para a norma e da norma para o caso, daí que se fale em técnica subsuntiva. Há quem critique
este método subsuntivo, considerando que implica uma dissociação analítico-objetiva de dois termos, o facto e a norma, e que, além disso, não existe um
facto objetivo, o que existe é, através da aplicação do direito ao caso, a 5 construção de um caso. Como é que se confronta esta crítica? Em primeiro lugar,
sempre que se critica uma doutrina, neste caso o método subsuntivo, não basta criticar, tem de se propor um método melhor ou alternativo. E esta doutrina
não propõe um método alternativo. Além disso, o método subsuntivo também vê o caso penal como um caso em construção, isto porque para conseguirmos
subsumir o caso estamos sempre a passar do caso para a norma e da norma para o caso. É claro que nem sempre basta fazer raciocínio subsuntivo, sendo
muitas vezes necessário fazer valorações. Mas, ter de fazer valorações por vezes, não é suficiente para se deixar de usar o termo subsunção. Isto porque este
termo introduzido por Kant, significa saber se algo cai ou não na norma legal. Ainda a propósito do conceito de tipo, importa termos em conta que existem
mais que não vamos estudar aqui na cadeira. Por exemplo o tipo de garantia, que será relevante do ponto de vista constitucional e que abrange todos os
elementos que fundamentam positivamente a punibilidade, com exceção dos elementos negativos. O conceito de tipo de ilícito vai abarcar todos os
elementos de que depende o juízo de ilicitude. Esse conceito de tipo de ilícito, por sua vez, pode ser indiciário ou essencial. O tipo indiciário abarca só os
elementos positivos, que fundamentam a ilicitude, o tipo ilícito essencial irá abarcar para além dos elementos positivos, também os elementos que excluem
a ilicitude. O mesmo se aplica ao conceito de tipo de culpa.
B. ESCOLA NEOCLÁSSICA (NORMATIVISTA)

O principal autor da escola neoclássica foi Mezger e o conceito que assumiu era dominante em 1930.
É neoclássico porque é uma continuação do sistema anterior, e não um sistema autónomo. Contudo, além de partir do sistema anterior, parte das críticas ao
sistema anterior e procura superá-las.
Este sistema funda-se essencialmente na filosofia dos valores de origem Neokantiana, tal como ela fora desenvolvida, nas primeiras décadas do século XX,
pela escola do sudoeste alemão ou escola de Baden (Windelband, Rickert, Lask)! Por isso pretende retirar o direito, do mundo naturalista do “ser”, para o
situar numa zona intermediária entre aquele mundo e o do puro dever-ser, mais rigorosamente, num campo referencial, e logo por aí, num mundo da
axiologia e dos sentidos!
direito passa a pertencer ao mundo dos valores/sentidos - Há que preencher as categorias/predicativos com estas referencias!
O mais interessante é que o próprio conceito de ação passa a ser um conceito valorativo, deixando de ser apenas uma realidade do mundo natural. Para
esta escola, o conceito de ação passa a ser o conceito social de ação, de acordo com o qual, ação é o comportamento humano voluntário socialmente
relevante. O próprio conceito social de ação teve uma evolução e esta noção que estamos a referir é considerada a mais perfeita.
Atualmente na doutrina, há autores que continuam a defender este conceito social de ação, daí a sua importância.
A ilicitude e a culpa já não são comparadas pela sua distinção material, mas são consideradas enquanto valores
A ilicitude passou a ser caracterizada como “danosidade social”. A culpa, por sua vez, era já “censurabilidade” do agente por ter agido como agiu, quando
poderia ter agido de forma diferente.
Quanto ao tipo, que passou a existir com Beling, deixa de se situar ao lado da ilicitude para se transformar no tipo de ilícito. Isto é, o tipo passa a ter a
mera missão formal de conter os elementos da ilicitude e surge por isso como uma fundamentação positiva da ilicitude.
Por sua vez, a ilicitude surge como um desvalor, para além de conter elementos objetivos, passa a conter por vezes, mas só por vezes, elementos subjetivos.
Nesta altura, começa a perceber-se que, para valorar um facto como furto, não bastaria a subtração, passando ser necessário provar a intenção de
apropriação.
Mezger distingue elementos positivos de elementos negativos do tipo da ilicitude. Os positivos fundamentavam o juízo de ilicitude e os negativos seriam
os que agora chamamos de causas de exclusão da ilicitude.
Outra distinção importante feita pela escola neoclássica, e que continua a ser feita, ainda que noutros moldes, é entre a ilicitude formal e a ilicitude
material. A ilicitude formal ocorre sempre que houver contrariedade à norma jurídica enquanto que a ilicitude material surge quando há danosidade social
ou ofensa material dos bens jurídicos. Assim, já não interessa apenas saber se o facto é ilícito ou não, e passa a ser importante a gravidade da lesão dos bens
jurídicos, a medida do desvalor.
Quanto à culpa, surge uma nova teoria, a chamada teoria normativa da culpa. Esta teoria foi desenvolvida por Frank, de acordo com o qual, o essencial da
culpa era um juízo de censura e esse juízo de censura só existiria se fosse exigível ao agente um comportamento contrário ao adotado e se, além disso,
houvesse uma motivação negativa do agente e, portanto, esta ideia de exigibilidade é meramente normativa. Contudo, apesar de Frank ter feito esta
evolução, ainda considerava como formas de culpa, o dolo e a negligência. Dolo existia quando a pessoa tinha condição para se motivar pelo direito e não o
fazia, enquanto que a negligência era quando houvesse falta de atenção no cumprimento do dever de cuidado.
Desta forma, passam a existir duas importantes valorações na escola neoclássica: a ilicitude e a culpa. A primeira é uma valoração objetiva em que se
analisa se o ato é contrário à ordem jurídica e se analisa a maior ou menor gravidade da ilicitude. A segunda é uma valoração subjetiva que se relaciona
com a culpa e tem a ver com a possibilidade ou não de o agente se motivar pelo direito.
C. ESCOLA FINALISTA (ÔNTICO-FENOMENOLÓGICA)

O principal representante da escola Finalista é Welzel. Surge a partir de 1930, após a tragédia da segunda grande guerra. Com isto, para a maioria dos
juristas da época, ficou bem claro que o normativismo proveniente das orientações jurídicas neokantianas não oferecia garantia bastante de justiça dos
conteúdos das normas validamente editadas.
Contrariamente aos neoclássicos, achava que na verdade o direito não podia impor as suas valorações Tinha de partir da própria realidade! O direito tinha
de ter em conta qual era a estrutura do comportamento humano (ontologia). Comportamento humano tinha de ter significado - ser passível de ser crime
O comportamento humano era a ação final, ou seja, a pessoa elege um objetivo que quer atingir, seleciona os meios que acha que são adequados para o
atingir, e depois determina um processo causal para atingir esse fim. Só este comportamento poderia ser crime - base estrutural da lógica do
comportamento humano - supradeterminação causal num processo finalmente orientado por uma vontade.
Como o conceito da ação é final, quer o dolo quer a negligência passam a ser averiguados logo ao nível da tipicidade.
Ao partir deste conceito final de ação, começa-se a perceber que para afirmar que uma ação é típica temos de ter em conta os elementos subjetivos: a
tipicidade passa a resultar da conjugação do tipo objetivo com o tipo subjetivo.
E, portanto, nos crimes dolosos o tipo só estaria preenchido se houvesse dolo e nos crimes negligentes, o tipo só estaria preenchido com a violação do
cuidado necessário.
Na escola finalista, a tipicidade surge como uma valoração autónoma da ilicitude. Isto é, apesar de ser uma valoração indiciária da ilicitude, não deixa
de ser autónoma face à categoria da ilicitude.
Além disso, como a ilicitude era uma valoração sobre o ato do Homem, quer na sua vertente objetiva como subjetiva, a ilicitude passa a
compreender dois desvalores: o desvalor da ação e o desvalor do resultado.
O primeiro tem a ver com a vontade ilícita, elementos subjetivos, enquanto que o segundo já tem a ver com o desvalor de lesão do bem jurídico. A
inda ao nível da ilicitude na escola finalista surge a chamada teoria dos tipos permissivos que estabelece que quando estes tipos se verificam se exclui a
punibilidade. Quanto à culpa, esta, no essencial, é um juízo de censura pelo facto de o agente não ter agido de outra maneira. A análise da culpa
coincide com as causas de exclusão da culpa em sentido amplo. Quer isto dizer que sempre que se verificasse uma causa de exclusão em sentido amplo,
excluía-se a culpa e acabava-se ali a análise. É a técnica negativa da exclusão.
D. PÓS FINALISTAS
A generalidade dos tratamentos sobre a doutrina geral do FACTO PUNÍVEL, pode ainda hoje, transmitir a ideia de que eles não se afastam da tentativa de
combinar, sob as mais variadas formas, aquisições do sistema neoclássico, que se consideram continuarem válidas, com inovações introduzidas pelo
sistema finalista, muitas das quais reputam-se fundadas e irrenunciáveis.
Podemos tomar por definitivo hoje em dia, na doutrina mais avançada, (livro é de 2019) que mal nos deparamos com conceitos que continuem a assentar
num conceito finalista ortodoxo de ação!
Atualmente, a maior parte da doutrina pode ser incluída nos pós-finalistas. Isto porque, a larga maioria da doutrina, tal como os finalistas, considera que o
dolo e a negligência são elementos do tipo, não sendo possível dizer que um facto preenche materialmente o tipo de crime se não houver dolo ou
negligência.
Consequentemente, a ilicitude, isto é, o tal juízo de contrariedade da ação face à norma jurídica, também só pode ser feito tendo em conta os elementos
subjetivos. Dolo e negligência, deixam de ser apenas formas de culpa, passam a fazer parte do tipo. Dentro dos pós-finalistas, encontramos nomes tão
importantes como Roxin e Jakobs. Contudo, dentro desta ideologia, encontramos várias correntes que devem ser distinguidas.

 Corrente teleológico-funcional ou racional-final


Dentro da escola pós-finalista, temos a chamada corrente teleológico-funcional ou racional-final do direito penal (figueiredo dias!).
Os defensores desta orientação vêm dizer que o sistema de construção do conceito de facto punível, só se pode guiar pelas finalidades do próprio direito
penal. O que quer isto dizer?
Quem defende esta conceção racional-final, vem explicar que só conseguimos chegar ao conceito de direito penal partindo das próprias finalidades do
direito penal, nomeadamente das chamadas teorias dos fins das penas, e das bases político-criminais da teoria do crime.
Roxin é que arranca com esta conceção em 1970 através de um estudo sobre as relações entre a política criminal e o sistema do facto punível (sistema do
crime). A sua expressão paradigmática vem nos seus tratados que estão sempre a ser atualizados. Roxin também aponta como defensor desta conceção
racional-final Jakobs. Este segundo tem uma grande diferença:
-Segundo Jakobs o direito penal só pode determinar-se em concordância com as teorias dos fins das penas.
O grande defeito é que ao só partir das teorias dos fins das penas, esquece-se que o direito penal é composto por outros princípios e valorações,
nomeadamente a culpabilidade e o princípio da culpa. E por isso, ao contrário de Jakobs, Roxin defende que a culpa não deve ser absorvida pelo conceito
de prevenção geral positiva, deve existir por si só, através do princípio da culpa e do princípio da dignidade humana. A culpa deve ser avaliada tendo em
conta as capacidades concretas do agente.
É por isso que há quem denomine o funcionalismo de Roxin como um funcionalismo teleológico e o funcionalismo de Jakobs como um funcionalismo
sociológico.
Ainda dentro desta visão funcional racional, há uma corrente onde a professora Ana Bárbara Sousa Brito se insere, que considera que um direito penal que
se proponha justificar cabalmente as suas propostas normativas como justas e eficazes não pode deixar de considerar os contributos das outras ciências
sobre o seu próprio objeto de valoração. Quer-se com isto dizer que o direito penal não pode ignorar os conhecimentos que as outras ciências têm acerca do
seu objeto de estudo que é o comportamento humano, sob pena de não ser realista, nomeadamente a psicologia ou a neurociência. O direito não surge
isolado, é e tem de ser uma ciência interdisciplinar. Apesar de a professora defender esta corrente, isto não significa substituir o direito pelas outras
ciências. Significa apenas que as afirmações de valor do direito têm que se basear em dados ontológicos firmes.
A professora Fernanda Palma defende algo diferente, dizendo que tem de haver uma imbricação, uma ligação, do direito com a realidade social. A
realidade social tem de ser um instrumento de interpretação do direito. A professora Ana Bárbara Sousa Brito não discorda, mas acrescenta que não se pode
deixar de ter em conta as ciências que estudam o comportamento humano e que nem sempre são conhecidas pela realidade social.
A. O 1º e fundamental elemento – A ação juridicamente relevante
Qualquer discussão acerca do conceito de facto punível, não poderá ainda se furtar por inteiro dos ecos da controvérsia à roda do conceito de ação! O
conceito de ação – sentido amplo - é importante, porque é o mínimo dos mínimos que tem de existir para qualificar um comportamento com crime!
Prof. Maria Fernanda Palma - O conceito de ação surge para responder à questão de saber a que tipo de realidade/objeto vão referir-se as
valorações/predicações/qualificações posteriores do conceito de crime. Ação é pedra angular do conceito de crime. Sem ela todas as valorações seguintes
caem. É um referente conceptual, ao qual se reportam as diferentes qualificações.
Nos últimos anos, raramente tem surgido tratamentos da doutrina do crime que arranquem de um conceito puro de ação!
*Como se sabe, dentro do sistema categorial-classificatório, toma-se, ab initio, um “conceito geral” de AÇÃO como base autónoma e unitária, capaz de
suportar todas as posteriores predicações, nomeadamente, da tipicidade, da ilicitude (ou antijuricidade) da culpa e da punibilidade.

Para isto, deveria ser então exigido deste tal “conceito genérico de ação”, o cumprir de uma pluralidade de funções (daí também a importância da sua
conceitualização) ! Na sistematização de Jescheck:

-Função de classificação
-Função de definição e ligação
-Função de delimitação
Para cumprir com a primeira, deveria ser um conceito que assumisse o caráter -significado lógico – de conceito superior, abrangendo todas as formas
possíveis de aparecimento do comportamento punível. (por ação, por omissão, dolosos, negligentes). Deveria ser um conceito bem alargado, para abranger
isto.

Para cumprir com a segunda, o conceito deveria possuir a capacidade, por um lado, de abranger todas as predicações posteriores, e por outro, de não as pré-
determinar, ou seja, de não antecipar o seu significado material específico. A ideia é que o conceito de ação é base do sistema, a expressão da valoração
fundamental que vai ordenar todo o conceito de crime.
De modo a cumprir com a terceira, o conceito precisaria permitir que, com a apelo ele, logo se conseguissem excluir todos os comportamentos que não
podem nem devem constituir ações relevantes para o direito penal! (acontecimentos naturais/comportamentos de animais/pensamentos/atos reflexos). Por
outras palavras, seria estabelecer as fronteiras do conceito de ação penalmente relevante, delimitando todos os comportamentos que são relevantes para o
direito penal, e excluindo ab initio aqueles que estariam fora do conceito de ação.

MFP: Critica a relevância atribuída por alguns autores à função delimitativa da ação, já que não tem sentido delimitar previamente a ação a certos
comportamentos quando o tipo legal, por si, já os exclui!
*Segundo Maria Fernanda Palma – Uma certa Função Garantística - A expressão como tutela das expetativas e da segurança dos cidadãos contra a
arbitrariedade do sistema judicial. Consolidando a ação como realidade objetivável, tendo em conta a dimensão processual e probatória, concebe-se um
conceito que previne a arbitrariedade (exemplo: punição de estados mentais, estados de espírito).
Este elemento é bem discutido. A doutrina diverge bastante neste ponto, buscando encontrar um conceito geral de ação que atendesse a todas estas funções!
Existem diversos conceitos, defendidos pelos mais variados juristas e estudiosos do direito!
O que se traduz? Defensores?

CONCEITO escola CLÁSSICA Noção de ação causal Escola Clássica (Belling, Von Lizst)

CONCEITO NEO-CLÁSSICO Noção de ação com relevância social. Escola Neoclássica


= SOCIAL

CONCEITO ESCOLA Noção de ação finalista. Escola Finalista (Welzel)


FINALISTA

Entende a ação, como expressão da personalidade. Vai


abarcar nela tudo aquilo que pode ser imputado a um Jakobs (evitabilidade)
CONCEITO PESSOAL homem como centro de ação anímico-espiritual. Herzberg (posição de garante de evitar o resultado)

A ação é controlo do eu - algo que ainda seja uma


manifestação do eu. Alega ser um conceito normativo
que preenche todas as funções necessárias ao conceito
de ação

O conceito de ação corresponde ao não evitar


evitável de um resultado!
Roxin
CONCEITO NEGATIVO O conceito de ação coloca-se no campo da
(em termos mais recentes!) evitabilidade, na medida em que seja suficiente para
pôr em causa a norma.
Para Jakobs, esta noção de evitabilidade deve ser
averiguada numa perspetiva individual, ou seja, não se
trata do que é evitável para o homem médio, mas do
que é evitável para o agente em concreto
(circunstância concretas).

Há autores como o prof. Doutor Figueiredo, e os nossos professores – Costa Andrade, que entendem que não vale a pena uma discussão em torno deste
conceito Genérico! E será esta a doutrina que vamos seguir para a prossecução do curso!
Doutor Figueiredo dias, considera que, ainda que observadas todas as teorias/e conceções acerca do conceito de ação, e que elas tenham cada uma seu
mérito, não valerá mesmo a pena insistir nesta querela!
Será preferível à doutrina do Facto punível, renunciar a caça a sua “Ultima thule 2” nos resultados de uma excessiva abstração generalizadora, que vai
implicada na aceitação de um qualquer conceito pré-jurídico generalísticos de ação.
Ainda com este autor: Seria um preconceito, de raiz idealista 3, pensar que os fenómenos deste mundo deveriam se reconduzir por força, a conceitos da
maior abstração, formando uma ordem pré-estabelecida que apenas importaria conhecer!

Destas posições, estes autores fazem duas ressalvas:


1) Com elas, não defendem que é preciso renunciar ao procedimento metódico categorial-classificatório na construção do conceito de facto punível!

2) Elas significam antes de mais, que naquele procedimento, deverá renunciar-se, a colocar como pedra angular, como elemento básico do sistema, um
tal “conceito genérico de ação”, com suas respetivas funções!

A construção do conceito de Facto Punível se deve antes ocupar da compreensão dos concretos comportamentos positivos e negativos (ações e omissões)
dolosos e negligentes, que se apresentam como jurídico-penalmente relevantes e, por conseguinte, tal como se revelam nos são dados no TIPO.

Noutros termos, a Doutrina da ação – na construção do conceito de facto punível – deve ceder espaço/primazia à doutrina das ações típicas, tipicamente
cunhadas, passando a caber assim ao conceito de ação a função:
Permitir que, com a apelo ele, logo se conseguissem excluir todos
-Jescheck: Passando a caber-lhe apenas uma certa (e restrita) função de delimitação! os comportamentos que não podem nem devem constituir ações
relevantes para o direito penal! Por outras palavras, seria
estabelecer as fronteiras do conceito de ação penalmente
Mesmo esta função, derivaria da categoria do TIPO – das formas admitidas relevante, delimitando todos os comportamentos que são
relevantes para o direito penal, e excluindo ab initio aqueles que
de realização típica! E nesta medida, seria uma função normativamente já conformada/pré-judicada estariam fora do conceito de ação.
Do exposto resulta que a própria função de delimitação, não deve ser desempenhada por um conceito genérico de ação, mas por vários conceitos de ação
tipicamente conformados!

2
É a localização norte mais distante mencionada na literatura e cartografia grega e romana antiga. Interpretações modernas incluíram Orkney, Shetland, norte da Escócia, a ilha de
Saaremaa (Ösel) na Estônia, e a ilha norueguesa de Smøla.

Na literatura clássica e medieval, última Thule (latim "mais longe thule") adquiriu um significado metafórico de qualquer lugar distante localizado além das "fronteiras do mundo
conhecido".

3
Conjunto de teorias filosóficas metafísicas complexas que entendem a realidade como uma complexidade existente em, pelo menos, dois planos: um plano material (da realidade
material, sensorial e percetível) e um plano ideal, de uma existência ideal, onde se estabelecem apenas conceitos, significados e formas perfeitamente estabelecidas.

Pode-se remontar o idealismo a Platão, e temos um desenvolvimento maior da corrente com os idealistas alemães do século XVIII!
-Com isto, o conceito de ação não vai perder a sua relevância! O que acontece é que perde autonomia! Não é mais um conceito genérico, pedra-angular do
sistema, agora são vários.

O conceito de ação não é, não pode, nem deverá vir a ser um dia – algo de previamente dado ao TIPO! Precisa ser sim, apenas um elemento, a par dos
outros, integrante do núcleo dos TIPOS.
A este respeito, FD sobre a função daquele novo conceito: Passaria a caber apenas a função de integrar, na teoria do TIPO, o meio mais adequado de
prospeção da espécie de atuação!

CONEITO DE AÇÃO - FIG. DIAS/COSTA DE ANDRADE


Primeiro elemento traduz-se num comportamento
Não um conceito genérico! Ações típicas! humano como quer que venha a se revelar! É um
comportamento! DP do facto!

1) DELIMITADORA 2) REALIZAÇÃO DO ILÍCITO-


(RESTRITO) TIPICO - Excluídos logo da tipicidade comportamentos não
humanos! Provocados por causas naturais, por animais
Ou função negativa! Tem o papel primário, sem hesitação! selvagens!
-Também excluídos estarão, a partida, pensamentos,
Possui um papel secundário! Possui uma função de construção teleológica intenções! Estes até podem indiciar a perigosidade do
do facto punível.
Excluir da tipicidade, comportamentos agente, mas não constituem factos.
jurídico-penalmente irrelevantes!

E até onde se deve aceitar a qualificação de um comportamento como jurídico-penalmente relevante? A discussão sobre a extensão do conceito de
comportamento é muito pertinente, desde logo, para análise dos casos que suscitam dúvidas (comportamentos em que não se vê, pelo menos de forma
expressa – a exteriorização da vida consciente do indivíduo!). Efetivamente, muitos são os casos que podem surgir, e que na doutrina são tratados pelos
mais variados autores, que pode-se suscitar dúvidas relativamente a sua relevância ou não! (Relevância grande tem aqui também, a presunção de inocência!
“In dubio pro reo” - significa literalmente na dúvidas (ex. falta de provas) , a favor do réu.

Outros Autores Maria Fernanda Palma


Stratenwerth: admite a existência de ação, independentemente de se poder identificar ´
qualquer estado de consciência, bastando que o processo global, em que o ato se Os automatismos não são ações, sempre
enquadre, seja determinado/explicável pela experiência, acessível a uma dirigibilidade que não seja possível reconhecer os atos
AUTOMATISMOS = consciente. Eu tinha acesso à consciência para ter feito as coisas de maneira diferente. como elementos de um processo de um
Resultam de um processo de
comportamento final.
aprendizagem - são produtos da Jakobs: admite a existência de ação sempre que se considere a concreta evitabilidade
experiência e da aprendizagem, em regra
controláveis!
individual do comportamento, ou seja, a possibilidade de um controlo do automatismo Critério: Capacidade de o agente prever
pela experiência. Tempo de reação. o motivo externo da sua ação
Parecem que não são controlados e que (compreender, previamente, o que
o agente é controlado por eles -
desenvolve de tal forma o automatismo Donald Davidson (Hume): na ação, defendem uma noção causal, ou seja, de relação explica a sua ação) e o grau dessa
que não o consegue interromper Não é entre um estado mental e a ação voluntária (a ação humana suporta-se na existência de capacidade de previsão.
como um ato reflexo, uma atuação sem
vontade e biologicamente comandada - momentos mentais/fisiológicos);
tem uma finalidade!
A imprevisibilidade da causa do
Comportamento está dirigido para uma
OLG Ham: percebe se o processo está dirigido pela vontade, ou seja, se é evitável comportamento, para o agente, torna o
finalidade e são adquiridos/treinados e naquela situação; seu comportamento não motivável.
necessários para a atividade final!
Processo global do comportamento:
Podem ser impulsivos – como reposta a Eser: a chave está na disponibilidade de reações; ou seja, quais as alternativas do sujeito, ainda se reconhece uma tomada de
uma situação que o agente não controlou
- Situações que o indivíduo começou e o que significa averiguar se se podem impor restrições antes que surja o impulso que decisão do agente, ainda se reconhece
não consegue parar/interromper - pessoa
não é suficientemente livre para parar o
desencadeia o automatismo; a relevância da ação é análise mediante a possibilidade, ex algum controlo
comportamento automático antes, ou seja, em função da situação no âmbito da qual se desencadeia o agir
automático.
Critério: Sempre que o agente procurou
HIPNOSE PROFUNDA Teoria da barreira de caráter (Roxin): a prática de certos factos, sob hipnose, seria utilizar da situação de hipnose para
(COMANDADO PELA impossível para certas pessoas, só sendo possível para pessoas capazes de cometerem praticar o crime. Ou, não querendo
VONTADE ALHEIA) esses crimes em estado consciente; utilizar, seria a situação previsível.
Problema: estes 2º fogem ao DP
português (artigo 20º/4 CPenal).
Teoria da barreira de caráter (Roxin): a prática de certos factos, sob hipnose, seria
SONANBOLISMO impossível para certas pessoas, só sendo possível para pessoas capazes de cometerem Critério: Sempre que o agente procurou
(COMANDADO PELO esses crimes em estado consciente; o agente nunca faz nada que nunca faria utilizar da situação de sonambulismo,
ESTADO conscientemente; manifestação da personalidade; criando essa possibilidade (com elevada
SONÂMBULO) probabilidade), para praticar o crime.
Críticas: julgar o agente pela personalidade; violação do princípio da igualdade (hipnose Dolo eventual: processo global; pode
profunda e consciência - não há condições de igualdade); haver ação sempre que exista dolo
eventual;
Jackobs: o agente não pratica atos consciente; se só a consciência pode determinar a
contramotivação normativa, não há ação.
Teoria das actio liberae in causa: é responsável, em termos penais, aquele que se tivesse
EMBRIAGUEZ colocado, dolosamente, numa situação de falta de consciência; - ainda que o ato pudesse
ter sido praticado num estado de inconsciência!

Os 1ºs, são respostas involuntárias, comandadas pelo SNP (sistema nervoso periférico), a
determinados estímulos recebidos pelo organismo. Forças irresistíveis!

Exame que os médicos fazem ao bater na perna fazendo-a subir!

Ricoeur: são atos insuscetíveis de assimilação pela vontade, não se revelando qualquer
ação voluntária, o que indicia que estes atos não são suscetíveis de coerção, pelo que não Concorda com a tese de Ricoeur. MFP:
ATOS podem reclamar a intervenção do sistema da responsabilidade penal. há situações que são consideradas como
REFLEXOS/Similar aos atos reflexos e que podem ser
ATOS INSTINTIVOS! Os 2ºs, são uma reação intuitiva no sentido inato - é possível controla-los - Não reagimos aprendidas (stress pós-traumático)
porque pensamos, vamos fazê-lo automaticamente, mas não será com a mesma
intensidade que nos atos reflexos.

- Ex: Capacidade de resistir à dor de uma queimadura, nem toda a gente tem de reagir da
mesma forma - A sua vontade inconsciente, ainda tem forma de intervir - Mas é possível
que se treine para não reagir daquele modo instintivo (afastar-se do fogo)

Helena Mourão: entende que nos estados de inconsciência, se não há historial de


SONAMBULISMO violência, ainda que o agente deixe intencionalmente de tomar a medicação e coloque a
POR FALTA DE arma na cabeceira - dificilmente se pode dizer que haja ação, uma vez que a ideia de
TOMA DE danosidade social dificilmente se poderia provar; dificilmente o princípio da culpa seria MFP: entende que existe ação e que o
MEDICAMENTOS/ observado numa situação destas de inconsciência do agente. Já não era assim, se agente deve ser punido!
DEIXA ARMA NA houvesse já historial de violência durante ataques de sonambulismo!
MESA DE
CABECEIRA: Roxin: se o facto é praticado num estado de inconsciência pura, não há consciência logo
não há intervenção da personalidade – e, nesse sentido, não pode haver ação.

Nunca poderão ser comportamentos penalmente relevantes porque não conferem o


SITUAÇÕES E mínimo necessário para se quer podermos falar em facto punível – AÇÃO.
COAÇÃO FÍSICA
INSUPERÁVEL O agente é instrumentalizado! Não há qualquer vontade!
 Formas Básicas, tipicamente cunhadas, do FACTO PUNÍVEL

Uma conceção como anteriormente defendida pelo Dr. Professor Figueiredo Dias, dá razão mais do que suficiente a que se renuncie a unidade tradicional
de construção do conceito de facto punível (=tradicionalmente, buscou-se o alcançar do conceito do facto punível enquanto unidade, o facto punível!) e se
substitua por uma construção que, em rigor deveria ser em quadripartida!
Ora, da análise do conjunto de Crimes tificamente previstos num ordenamento jurídico penal, chegamos aa conclusão de que existem, na realidade,
diferenças notáveis, teleológico-funcionais e estruturais, entre 4 formas de revelação (=conceção quadripartida!), que convidam uma consideração
dogmática autónoma!

-Aliás na querela relativamente aos conceitos de ação, nenhum deles conseguiu de facto, abranger estas 4 formas! (Cumprindo com aquela função de
classificação – que nos falou Jescheck!). Ou conseguiam abranger e não cumpriam com outras funções. Nunca houve um conceito perfeito, que cumprisse
com todas aquelas funções, inerentes ao conceito genérico de ação!
NEGLIGENTES (3)
AÇÃO (1)
DOLOSOS (Os mais importantes, pode-se dizer!)

FACTO PUNÍVEL

NEGLIGENTES (5)
OMISSÃO (2)
DOLOSOS (4)
Da análise dos tipos de crimes contidos na Parte especial da generalidade dos códigos penais, dá-se logo a entender que enquanto uns, que são a
generalidade, vão assentar numa forma que podemos dizer “normal” ou “vulgar” de comportamento – Ativo/por ação – outros, a minoria, são levados a
cabo por omissão/negativo!

NOTA: É todavia, certo que, diversos são os resultados típicos, que poderão ser realizados, tanto por comportamentos positivos como negativos!

(1) Comportamento ativo/Ação – Lesar ou por em perigo bens jurídicos protegidos constitui o mandamento primário contido nas disposições penais! É
muito mais grave lesar ativamente um bem jurídico, do que omitir os comportamentos indispensáveis para conservar um bem jurídico.
(2) Comportamento negativo – Mandato de atuar em favor dos bens jurídicos – sendo punida, assim, a omissão! Possui um papel
subordinado/secundário!
E deverá mesmo ser assim! Caso contrário, o direito penal poderia correr o risco de perder sua vertente liberal, adequada é claro aos princípios
democráticos e ao estado de direito, para se tornar num direito de intervenção sistemática na esfera jurídica das pessoas, do qual poderiam esperar-se
maiores danos para as liberdades individuais dos indivíduos do que aqueles a que o próprio direito penal visa evitar!

De forma semelhante, facilmente podemos entender que uma política-criminal minimamente consistente/coerente, conduza a proibição primária, dos
comportamentos DOLOSOS, no sentido de que estes tratam-se de comportamentos em que o agente previu e quis a realização do crime!

Comportamentos não previstos/não queridos pelo agente, nos quais, o conteúdo de ilicitude se reporta em primeiro lugar, a violação de um dever objetivo
de diligência/cuidado – Os chamados comportamentos NELGIGENTES – apenas devam ser punidos a título excecional! – Vejamos o Artº 13º do código
penal!
NOTA: A propósito, só há dois crimes em que a negligência é punida: O homicídio (artigo 137.º) e as ofensas corporais (artigo 148.º).

Tudo isto, devendo-se ter em atenção um aspeto: Não se perder a consciência de que, um direito penal verdadeiramente adequado a sociedade do
risco/imprevisibilidade, requer cada vez mais vivamente, uma punição mais extensa e intensificada das condutas omissivas e negligentes! Apesar da sua
menor importância, na vida prática, não podemos ignora-las!

Portanto, temos agora esta conceção quadripartida do Facto Punível! E é partindo desta mesma conceção, que vamos dar seguimento a sistematização:

-Começar com a análise rigorosa do Facto Punível doloso de ação (mais importantes e frequentes)
-Depois, seguindo para o tratamento dos Factos Puníveis negligentes de ação (intermédios)
-Concluindo com os Factos puníveis por Omissão, distinguindo-se os dolosos e negligentes logicamente (menos importantes!)
 Os outros elementos constitutivos do conceito de crime – As qualificações/valorações, categorias dogmáticas!

É preciso ainda uma breve introdução de cada uma das categorias em que, no entendimento dos defensores do sistema teleológico-funcional e racional,
deverá se decompor o conceito de crime.
-PUNIBILIDADE
-CULPA
-ILICITO-TÍPICO (Antijuricidade)

- AÇÃO – JÁ sabemos como deve ser entendido dentro do sistema este primeiro elemento, sem obstar sua
Essencialidade – já que sem um comportamento (ativo ou negativo) não podemos nem partir para as demais
Predicações! Tudo se passa no mundo interior (do pensamento) não há crime. Ou mesmo a mãe natureza. Ela
poderá matar, ou ferir, sem constituir crime! Um animal selvagem causa-me um ferimento, também não é crime.
Até há um velho ditado latino que diz que ninguém sofre uma pena por um pensamento.4

ILICITUDE +TIPO

Um dos maiores problemas ainda hoje, é determinar a conceção mais adequada de relacionamento entre as categorias do TIPO e da ILICITUDE
(ANTIJURICIDADE)

É absolutamente dominante, quer na escola clássica, neoclássica, finalista, como mesmo nos sistemas teleológico funcionais, de que o TIPO possui o
primado! Constitui o primeiro grau valorativo da doutrina do crime, e portanto, o primeiro e autónomo qualificativo da ação!
-Deste modo, teremos sempre que começar por fazer corresponder a ação concreta, a um TIPO! Somente depois poderemos negar ou não sua ilicitude, se
no caso intervier causas de justificação.
Agora entra a posição do Dr. Figueiredo dias: Discorda deste primado! Apesar de reconhecer que seguindo aquela ordem, tenhamos a nosso favor a
correspondência a um correto procedimento prático de resolução de casos penais, não parece ser a melhor numa perspetiva científico-dogmática!

4
Mas então não é a pessoa que é punida? A pessoa será punida pelo que faz! Direito penal do Facto!
FD: Num sistema verdadeiramente teleológico-funcional e racional, a prioridade não poderá de caber a categoria do ilícito, concebido como ilícito típico o
tipo de ilícito, a mesma coisa em sua conceção.

Conforme o pensamento de Fig. Dias:


A função que a categoria da ILICITUDE, cumpre no sistema do FACTO PUNÍVEL (e nesta aceção – também será a mesma função do TIPO) é, e dito de
forma sintética, definir – não em abstrato – mas em concreto, ou seja, relativamente a singulares comportamentos, o âmbito do penalmente proibido e
dá-lo a conhecer aos destinatários potenciais das suas normas, motivando, por esta forma estes, a comportamentos de acordo com o ordenamento
jurídico-penal!
NOTAR: Este juízo de ilicitude, tem de ser concretizado na lei, e da forma mais precisa possível, até para que cada um saiba o que é ilícito e o que não. A
categoria do tipo, corresponde a expressão formal do juízo de valor da ilicitude. O tipo por si só não vale como expressão do conteúdo material da
ilicitude! É apenas um meio de acesso ao espírito da lei (“mens legis), ao juízo da ilicitude.
Não se diga por isto, e como desenvolve Figuer. Dias, que a categoria do TIPO, individualmente/de forma independente da ilicitude, pertença logo a função
de motivar a omissão de ações proibidas ou a realização de ações impostas!
De modo a corroborar o primado desta categoria, refere este autor dois argumentos:
A. Função do direito penal – Tutela subsidiária de bens jurídicos
B. Justificação da intervenção penal – reafirmação das expetativas comunitárias na validade da norma violada
NOTA CONTEXTUAL: Fins das penas/Aqui presente o fim de prevenção geral positiva 5! = Pena como mecanismo que o estado se serve, para manter e
reforçar a confiança da comunidade na validade e força de vigência de suas normas, no ordenamento jurídico-penal Instrumento utilizado para demonstrar
a inquebrantabilidade da ordem jurídica, mesmo com todas as violações, e para reforçar os padrões de comportamento adequados as normas

Irmanam-se na determinação funcional da categoria da ilicitude! (=motivando os destinatários das normas a comportamentos…)

Com a categoria do ilícito, quer-se traduzir o específico sentido de desvalor jurídico-penal, que atinge um concreto comportamento humano numa concreta
situação, estando atentas todas as condições reais de que ele se reveste (se é ativo/omissivo/doloso/negligente) ou em que tem lugar!

Noutros termos, este autor refere:


A qualificação de uma conduta concreta como penalmente ilícita significa que ela é:
-Tanto duma perspetiva objetiva, como subjetiva, desconforme ao ordenamento jurídico-penal
-E que aquele último liga a conduta um juízo de valor negativo (=desvalor)
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A finalidade prioritária das penas, deve ser a prevenção geral positiva de integração! E isto porque?

Pois é exatamente esta, que mais nos fornece a garantia da tutela subsidiária dos bens jurídicos (Função do direito penal)

Mas não é qualquer tutela de bens jurídicos. Tutela num sentido prospetivo, isto é, necessidade de tutela da confiança e das expetativas da comunidade na inquebrantabilidade,
manutenção do ordenamento jurídico penal.
Somente a partir daí, é que a categoria do TIPO vai ganhar o seu verdadeiro significado, sendo a ILICITUDE o verdadeiro fundamento do TIPO! Se ilícito
não há TIPO, ou se desejarmos, todo o TIPO é um TIPO de ilícito!

Por outro lado, a categoria do TIPO, surge como a tipificação/sedimentação concreta de um ilícito na lei penal. Trata-se de um ilícito, cunhado tipicamente!
É o portador da valoração de um comportamento como ilícito, como refere o Dr. Professor Eduardo Correia.
Esta concretização permite ainda realizar a distinção entre dois diferentes instrumentos, ainda que funcionalmente complementares: Um deles são os
chamados TIPOS INCRIMINADORES e os outros, são os TIPOS JUSTIFICADORES.

A. TIPOS INCRIMINADORES
Correspondem ao conjunto de circunstâncias fácticas, que diretamente se ligam à concretização do conteúdo ilícito da conduta praticada! Assume
primeiro local nestes, a configuração do bem jurídico protegido, e as condições a ele ligadas, sob as quais o comportamento que tenha as preenchido, possa
ser, em primeira instância (pois poderão intervir causas de justificação!), considerado ilícito!

O TIPO INCRIMINADOR delimita o conteúdo de ilícito do comportamento, de forma concreta e pela positiva!
Para haver ilicitude, no lado dos tipos incriminadores, é necessário que o comportamento concreto preencha os requisitos descritos! (realize o ilícito-
típico, nestes termos)
NOTA: Porém, podem existir circunstâncias excecionais que excluam a ilicitude, aqui entrando os tipos justificadores ou causas de exclusão da ilicitude –
Neste sentido, assumindo um caráter de limitação – negativa – dos tipos incriminadores!
Tipo incriminador do furto; o tipo incriminador da burla, o tipo incriminador do homicídio…comportamentos concretamente considerados!).

B. TIPOS JUSTIFICADORES (=CAUSAS DE JUSTIFICAÇÃO)

Tal como os anteriores, estes servem à delimitação do conteúdo ilícito de uma conduta, o fazendo de forma genérica e pela negativa!
Os tipos justificadores valem e aplicam-se a várias espécies de comportamento (legitima defesa aplica-se a ofensas à integridade física, à tentativa de
homicídio, como até em sede de crimes patrimoniais, etc.
Para se ter um ilícito, percecionadas as coisas do lado do tipo justificador, é preciso que a situação concreta não preencha os requisitos do tipo justificador!
NOTA: Se pelo contrário o ilícito vier a preencher os requisitos das causas de exclusão da ilicitude, então a situação deixa de ser ilícita!

Estes, trabalham juntos! A NÍVEL FUNCIONAL, SÃO COMPLEMENTARES6 – em que sentido?


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Seja como for, a verificação em concreto de saber se uma situação é ou não ilícita, dependerá da ponderação cumulativa dos tipos incriminadores e dos tipos justificadores. Diz se a
este propósito que os tipos incriminadores e tipos justificadores estão numa relação de mútua complementaridade, com vista à definição do concreto ilícito típico das várias situações.
NOTA: Tanto os TIPOS INCRIMINADORES como os TIPOS JUSTIFICADORES, têm em comum a função de circunscrever, os condicionalismos sob
os quais a lesão de um bem jurídico, é em definitivo, considerada ilícita! Mas….
Enquanto que nos primeiros, a esta função, liga-se uma outra, de descrever ou indicar o bem jurídico de que se trata
Nos segundos esta outra função é, em regra, estranha!
Ambos constituem formas delimitadoras/concretizadoras do conteúdo de ilícito do comportamento (formas estas que possuem, elementos constitutivos,
pressupostos, e no caso dos Justificadores, também, até mesmo alguma certa descrição fáctica, tudo isto fazendo com que também os justificadores
possam ser alvo de alguma tipificação, tal como os primeiros! – por isto os segundos são também designados contra-tipos, funcionalmente complementares
aos primeiros.
Apesar desta complementaridade, A NÍVEL ESTRUTURAL, SÃO FIGURAS MUITO DIFERENTES – Em que sentido?
-Apenas os Tipos Incriminadores, são os portadores do bem jurídico protegido (indicam/descrevem o bem jurídico), até por isto, delimitando o ilícito por
forma concreta e positiva!
-Os tipos justificadores, são em princípio, estranhos a ordem legal dos bens jurídicos, e delimitam assim o ilícito por forma genérica e negativa!

Num sistema teleológico-funcional da doutrina do crime, não há lugar para construções que separem, em categorias autónomas, o TIPO e a ILICITUDE.
Categoria sistemática é a do ILÍCITO-TÍPICO. Os tipos incriminadores e justificadores são apenas instrumentos conceituais, que servem sem autonomia
recíproca e de forma dependente, a realização da intencionalidade próprias da categoria referida.

CULPA
A categoria da culpa vem adicionar um novo elemento (predicação) à construção do facto punível – que já estamos numa conduta ilícita-típica!
Sem este, jamais poderemos falar de “facto punível”, pelo menos com as penas criminais – que pressupõe culpa!
O facto punível não se esgota no ilícito-típico! É preciso também que a conduta seja culposa (como veremos – dolo/negligência), isto é, que o facto
possa ser pessoalmente censurado ao agente, por aquele revelar expressão de uma atitude interna juridicamente desaprovada pela ordem jurídico-penal, e
pela qual ele – o agente - terá por isto de responder.

A função desempenhada pela culpa, no sistema do Facto Punível, é por isto – e foi mérito de Roxin – uma função limitadora do intervencionismo estatal,
visando defender a pessoa do agente de excessos e arbitrariedades que pudessem ser desejados e praticados pelo poder do estado!

PUNIBILIDADE
Tendo o ILÍCITO-TÍPICO, e a CULPA, ainda não se esgota o conteúdo do sistema do facto punível! O dr. Figueiredo dias considera que é preciso
completa-lo ainda com outra categoria, a da PUNIBILIDADE!

Para termos um ilícito é necessário que a conduta preencha os requisitos dos tipos incriminadores e não preencha os requisitos do tipo justificador!
Qual a ideia-chave desta categoria? A da dignidade penal/ou merecimento da pena do facto concretamente cometido!
É uma categoria interessante, que vai permitir que hipóteses tão diversificadas, como a da impunibilidade da desistência de tentativa, os factos bagatelares,
o auxílio ao suicídio (sempre quando este não vem a consumar-se), sejam remetidos para o denominador da falta de dignidade penal!

Isto, pois, em qualquer destas hipóteses, o que estamos perante é que apesar da realização integral do ilícito-típico e da culpa, a imagem global do facto
praticado é uma tal que em função de exigências preventivas, o facto concreto acaba por ficar aquém do limiar mínimo de dignidade penal!

A verificação da punibilidade – isto é, estando presente esta categoria no caso concreto – não podemos dizer ainda que haverá necessariamente lugar a
aplicação de uma reação criminal! É melhor dizer a este respeito, que a verificação da PUNIBILIDADE – logo, dos seus pressupostos – vai perfeccionar o
FACTO, que por sua vez, fará entrar em cena alguma(s) das consequências/reações jurídico-penais, e sua doutrina autónoma!

NOTA: Por conseguinte, poderá suceder que mesmo todos os elementos do FACTO PUNÍVEL tendo sido devidamente preenchidos, e assim, a
punibilidade do facto não venha a ocorrer, por razões que pouco ou nada tem a ver com a doutrina do facto punível, mas autonomamente com a doutrina da
consequência jurídica!

A. FACTOS PUNÍVEIS DOLOSOS DE AÇÃO


Conforme a sistematização que seguimos: Ilícitos típicos de ação/de omissão/dolosos e negligentes.
Qualquer uma destas figuras consubstancia núcleos de antinormatividade própria, que têm um desvalor e estrutura diversos, o que que justifica a sua
subordinação a diferentes regimes.
A.1 O TIPO OBJETIVO DE ILÍCITO

Como fora analisado, se tanto os tipos incriminadores como os justificadores, concorrem na concretização/delimitação do sentido de ilicitude de uma
conduta concreta, não deixam de haver entre uns e outros, grandes diferenças de sentido e conteúdo! Portanto, existem claras vantagens a que uns se
distingam doutros, a começar pelos incriminadores.
A.1.1 TIPOS INCRIMINADORES

= Um tipo incriminador, corresponde ao conjunto de circunstâncias fácticas, que diretamente se ligam à concretização do conteúdo ilícito da conduta
praticada! Assume primeiro local nestes, a configuração do bem jurídico protegido, e as condições a ele ligadas, sob as quais o comportamento que tenha as
preenchido, possa ser, em primeira instância (pois poderão intervir causas de justificação!), considerado ilícito!
Estes tipos de ilícito, apresentam, no âmbito dos FACTOS PUNÍVEIS DOLOSOS POR AÇÃO, uma estrutura bastante complexa, sendo compostos por
elementos de natureza OBJETIVA e elementos de natureza SUBJETIVA, com os quais, é possível edificar um TIPO OBJETIVO e um TIPO
SUBJETIVO (ou melhor dizendo, um tipo objetivo-subjetivo! Verdadeiramente não temos autonomamente um tipo objetivo ou um tipo subjetivo 7).
Esquematicamente do agora em análise:
“ TIPO” OBJETIVO (elementos objetivos)
-Agente/conduta/bem jurídico
TIPOS INCRIMINADORES
FACTOS PUNÍVEIS DOLOSOS “ TIPO” SUBJETIVO (elementos subjetivos)
POR AÇÃO

O TIPO OBJETIVO - Ou seja, elementos de natureza objetiva que intervém na composição dos tipos incriminadores! Vai importar, por um lado, identificar
um certo número de problemas gerais, diretamente relacionados a fundamentação e sentido da tipicidade (A) ,e por outro, sublinhar algumas técnicas e
procedimentos usados pelo legislador, na construção e sistematização dos tipos incriminadores (B)

(A) QUESTÕES GENÉRICAS DE TIPICIDADE

I. Determinações conceituais: TIPO DE GARANTIA(t=tipo legal de crime)/TIPO DE ERRO/TIPO DE ILÍCITO/TIPO DE CULPA

Antes que estudemos a estrutura do tipo de ilícito objectivo importa clarificar a pluralidade de sentidos com que a dogmática penal se utiliza a categoria do
tipo, introduzida pela primeira vez na dogmática por Beling.
 O erro deste foi o de pensar que o mesmo conjunto de elementos, poderia cumprir simultaneamente as diversas funções que na tríplice
conceitualização a que procederemos vão implicadas.

Atualmente sabe-se que não é assim! De tal modo que a distinção dos vários sentidos do “tipo” representa um momento absolutamente essencial de uma
correta aplicação da lei penal.
O tipo apresenta-se, antes de tudo, como tipo de garantia – também por vezes chamado tipo legal de crime -, isto é, como o conjunto de elementos,
exigido pelo artigo 29.º da CRP e pelo artigo 1.º do Código Penal, que a lei tem de referir para que se cumpra o conteúdo essencial do princípio nullum
crimen, nulla poena sine lege.
Trata-se de um conjunto de elementos que se distribuem pelas categorias da ilicitude, da culpa e da punibilidade: em qualquer uma destas categorias se
depara com requisitos de que depende em último termo a punição do agente e relativamente aos quais por isso tem de cumprir-se a função da lei penal
como Magna Charta dos cidadãos. È este o conteúdo e é esta a função que ao tipo de garantia cabem dentro do sistema da justiça penal.

7
A doutrina autonomiza artificialmente ambos estes planos, apenas com fins de esclarecimento, didáticos! São uma unidade, sendo que
só assim interessa para efeitos penais.
Diferente é o conceito de tipo de erro. Trata-se aqui do conjunto de elementos que se torna necessário ao agente conhecer, para que possa afirmar-se o
dolo do tipo, dolo do facto ou “dolo natural”.
Este tipo não se confunde nem com o tipo de garantia, nem com o tipo de ilícito: dele fazem parte os pressupostos de uma causa de justificação ou mesmo
de exclusão da culpa; bem como até proibições cujo conhecimento seja razoavelmente indispensável para que o agente tome consciência da ilicitude do
facto (artigo 16.º n.º1 e 2), no sentido de que a sua não representação ou a sua representação incorreta pelo agente exclui o dolo.
E, todavia, estes elementos não têm necessariamente de pertencer nem ao tipo de ilícito, nem ao tipo de garantia!
O tipo de ilícito é a figura sistemática de que a doutrina penal se serve para exprimir um sentido/Juízo de ilicitude, individualizando uma espécie de delito
e cumprindo, deste modo, a função material de dar a conhecer ao destinatário que tal espécie do comportamento é proibida pelo ordenamento jurídico. Sem
prejuízo de, segundo a conceção atrás exposta, na questão do relacionamento entre a tipicidade e a ilicitude o primado caber à categoria da ilicitude,
constituindo a tipicidade apenas a mostração, concretização ou individualização de um sentido de ilicitude em uma espécie do delito.

II. Elementos típicos descritivos e normativos


De modo a concretizar a ilicitude que neles vive, os tipos incriminadores servem-se de elementos de natureza dupla: Descritivos e Normativos!

-Dizem-se elementos descritivos, todos aqueles que são apreensíveis através duma simples atividade sensorial! São elementos que vão se referir as
realidades materiais, que fazem parte do mundo exterior, e que por isto, podem ser conhecidas/captadas de forma quase que imediata pelos nossos sentidos,
sem necessidade de valorações!
Consideram-se ainda descritivos, os elementos que exigem já alguma atividade valorativa, mas em que, de todo modo, continua a preponderar a dimensão
naturalística!
Exemplos: “A pessoa”(Art. 131º) “A mulher grávida”(140º) “o corpo”(143º) “o automóvel” (208º) etc

-Os elementos normativos, por seu turno, correspondem a todos aqueles que não são sensoriamente captáveis/percetíveis! Apenas podem ser
espiritualmente compreensíveis ou avaliáveis!

Por exemplo: “caráter alheio da coisa”(Art. 204º) as intervenções ou tratamentos (Art. 156º

III. Desvalor de Ação e Desvalor de Resultado*

Após as investigações dogmáticas de Welzel e o advento da doutrina da ação final, tornou-se bastante corrente a distinção, em sede de ilícito-típico, entre o
desvalor de ação e o desvalor de resultado.
Por desvalor de acção compreende-se o conjunto de elementos subjectivos que conformam o ilícito-típico, e a culpa, nomeadamente a finalidade
delituosa, a atitude interna do agente que ao facto preside e a parte do comportamento que exprime facticamente este conjunto de elementos.
Por desvalor de resultado compreende-se a criação de um estado juridicamente desaprovado e, assim, o conjunto de elementos objetivos do ilícito-
típico (eventualmente também da culpa) que perfeccionam a figura de delito.
De forma plástica, mas substancialmente correta, se poderá dizer que o desvalor de acção se revela de forma exemplar na tentativa de crime, o desvalor de
resultado no crime consumado
A conclusão deve ser a seguinte: A constituição de um ilícito-típico exige, por regra, tanto um desvalor de acção, como um desvalor de resultado; sem
prejuízo de casos haver em que o desvalor de resultado de uma certa forma predomina sobre o desvalor de acção, ou em que inversamente o desvalor da
acção predomina sobre o desvalor de resultado

B. CONSTRUÇÃO DOS TIPOS INCRIMINADORES


Em todo e qualquer ilícito-típico objetivo, podemos encontrar os seguintes conjuntos de elementos estruturantes:
-Elementos referentes ao Autor
-Elementos referentes a conduta
-Elementos referentes ao bem jurídico

NOTA: Aqui o legislador joga com estes elementos, construindo tipos de ilicitude!

Com efeito, todos os tipos incriminadores deverão, em sua formulação objetiva, precisar exatamente (1) quem pode ser o autor do respetivo tipo de
crime, (2) qual a conduta em que este se consubstancia e, na medida do possível, (3) dar a indicação, explícita ou implícita (em todo caso clara) do
bem(s) jurídico(s) tutelado(s).

B.1 - 1º ELEMENTO - BEM JURÍDICO


Em relação ao bem jurídico, importa ter presente que ele se não confunde com um outro possível elemento do tipo de ilícito objetivo, como é o caso do
objecto da acção:
Se A furta um anel a B, o objecto da acção é o anel, bem jurídico a propriedade alheia; se C mata D, o corpo de D é o objecto da acção, a vida humana o
bem jurídico lesado.
O intérprete deve, neste âmbito, primeiramente perguntar qual é o bem jurídico protegido! Isto porque, não serão típicas nenhumas condutas que não
atinjam o bem jurídico da forma que a lei quer que o bem seja atingido!

Bens jurídicos – Definem-se como a “expressão de um interesse, da própria pessoa ou da comunidade, na manutenção ou integridade de um certo estado,
objeto ou bem em si mesmo, socialmente relevante e por isto, juridicamente reconhecido como valioso!
Podem estes ser:
- Individuais, sendo estes aqueles de que são portadores uma pessoa física concreta (a título de exemplo: eu sou portador do bem jurídico vida).
Relativamente a estes, ainda importa referir que temos:
BJ Pessoais, que tutelam as dimensões da personalidade;
BJ patrimoniais, tendo nestes a propriedade e a posse. Os bens jurídicos individuais patrimoniais são sempre disponíveis e os bens jurídicos individuais
pessoais são em regra disponíveis, mas há alguns que são indisponíveis.

- Supra-individuais ou comunitários, sendo estes aqueles de que é portadora a própria comunidade.


NOTA: Os bens jurídicos individuais, em princípio são disponíveis (vale o consentimento na lesão do portador concreto) e os bens jurídicos supra-
individuais são indisponíveis.
NOTA2: A nível do ilícito-típico objetivo, o elemento objeto de ação, surge como uma manifestação real desta noção abstrata de bem jurídico. É a
realidade projetada, a partir daquele conceito genérico, e que é ameaçada ou lesada com a prática da conduta ilícita-típica.
(A vida, patrimônio, honra, liberdade). É com base nos bens jurídicos que os crimes são elencados no Código Penal, inclusivamente: crimes contra a vida,
contra a honra, contra o patrimônio, etc.

B.1.1 – CRIMES DE DANO E CRIMES DE PERIGO

Atendendo ao critério da forma como o bem jurídico é posto em causa pela atuação do agente (o bem jurídico, dizemos, não o mero “objecto da
acção”) distingue-se entre: CRIMES DE DANO E CRIMES DE PERIGO.
Nos CRIMES DE DANO (a maioria dos tipos de crime), a realização do tipo incriminador pelo comportamento do agente, tem como consequência uma
lesão efetiva do bem jurídico (a título de exemplo: o homicídio – artigo 131.º, o dano – artigo 212.º, a violação sexual – artigo 164.º, e a injúria – artigo
181.º).
Nos crimes de perigo, a mesma realização não vai pressupor a lesão, mas antes se basta com a mera colocação em perigo do bem jurídico. Nestes,
distinguem-se entre:
-Crimes de perigo concreto
-Crimes de perigo abstrato/ou presumido

Nos crimes de perigo concreto, o perigo vai fazer parte do tipo = o tipo incriminador apenas será preenchido pelo comportamento, quando o bem jurídico
tenha sido, efetivamente posto em perigo, sendo necessária a prova, no caso concreto, desta exposição efetiva ao perigo (é o caso do artigo 138.º, exposição
e abandono, em que é elemento normativo do tipo o “colocar em perigo a vida de outra pessoa”: só haverá crime de exposição ou abandono, quando se
comprove no caso concreto, que o bem jurídico vida foi realmente posto em perigo pelo comportamento!).
* Sempre que não se conseguir provar o perigo efetivo para o bem jurídico, à luz do pp in dúbio pro reu, o agente será absolvido!

Nos crimes de perigo abstrato, o perigo não é elemento do tipo, é motivo da proibição! (por isto, ligado a ilicitude = permitido/proibido); quer dizer, neste
tipo de crimes, o legislador penal tipifica certos comportamentos8, em nome da sua perigosidade típica, para um determinado bem jurídico, mas…
Não é necessário que esta perigosidade seja provada no caso concreto (é dispensável, portanto, qualquer tentativa de provar que não houve o provocar em
perigo!): Nestes, há como uma presunção inelidível (iuris et de iure) de perigo e, por isso, a conduta do agente é punida independentemente de ter criado
ou não um perigo efetivo para o bem jurídico (a título de exemplo: a condução de veículo em estado de embriaguez – artigo 292.º, em que o condutor
embriagado, se assim for pego pro autoridades, é punido pelo facto de o estado em que se encontra constituir um perigo potencial para a segurança
rodoviária, abuso sexual de crianças -172, posse de arma proibida – 275º, contrafação de moeda 262º etc).
NOTA: O tipo de crime que melhor protege o bem jurídico, é o crime de perigo abstrato! É uma tutela muito avançada/rigorosa – Repara-se:
Agente nem tem chances de tentar provar o contrário!
Até por isto a questão da sua constitucionalidade já fora levantada! O Direito Penal protege bens jurídicos por um lado, mas também sacrifica bens
jurídicos por outro. Ora, como os crimes de perigo abstrato são uma tutela muito à frente, pode-se entender que há uma certa desproporcionalidade! Daí
que, há autores que dizem que os crimes de perigo abstrato são inconstitucionais.
No entanto, a doutrina maioritária e o Tribunal Constitucional já se pronunciaram, e ao entender de fig. Dias, com razão, pela não inconstitucionalidade
destes crimes quando visarem a proteção de bens jurídicos de muita importância, quando for possível identificar claramente o bem jurídico tutelado e a
conduta típica for descrita de uma forma tanto quanto possível precisa e minuciosa!

No intuito de abrandar este rigor, que a doutrina sugeriu uma categoria de crimes de perigo intermédio: Os crimes de perigo abstrato-concreto, que
seriam crimes de perigo abstrato (o crime tinha de se aferir ex ante), mas que excecionalmente admitiam a prova em contrário!
Ou seja, desde que o arguido provasse que, apesar de ter preenchido em abstrato o tipo legal do crime de perigo abstrato, na situação em concreto não
houve qualquer perigo para o bem jurídico, ele não seria punido!

As críticas a esta posição afirmavam que ela envolvia uma inversão do ónus da prova - em processo penal vigora a presunção de inocência, sendo que uma
das suas manifestações é a de que quem tem o ónus da prova, é quem acusa – em conformidade com o princípio in dúbio pro reo.
Assim, estes princípios seriam violados com a regra subjacente à consagração do crime de perigo abstrato-concreto, pois fazia-se entender sobre o arguido
a prova.
Desta forma, os autores repudiaram esta categoria e substituíram-na por uma outra categoria, denominada crimes de aptidão, que são crimes de perigo
abstrato, mas em que o perigo é medido sob uma perspetiva ex ante e, portanto, chamam-se de crimes de aptidão, porque são condutas que em abstrato são
aptas para conduzir à lesão do bem jurídico.
Todavia, em relação a estes crimes de aptidão admite-se a prova do perigo abstrato, medido ex ante e sempre que não se chegar à conclusão para além da
dúvida razoável de que ex ante a conduta deixava antever uma possível lesão do bem jurídico, o agente não será punido.

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Socorrendo-se para isso a dados estatísticos ou da experiência comum!
Estes crimes de aptidão tendem progressivamente a ocupar todo o espaço dos crimes de perigo abstrato, pois são na mesma crimes de perigo abstrato,
só que numa perspetiva correta, fazem depender a consumação desse crime abstrato da prova de um perigo ex ante e respeitando as regras do processo
penal (princípio in dúbio pro reo).
Contudo, ainda existem alguns crimes, que por razões de segurança e de ordem publica a doutrina continua a fazer corresponder ao velho modelo dos
crimes de perigo abstrato/presumido.

Por isso detetamos na nossa literatura quanto ao bem jurídico três categorias ao nível dos crimes de perigo:
Os crimes de perigo abstrato ou presumido entendidos nos moles tradicionais, que não admitem a prova em contrário nos processos de crime;
Os crimes de aptidão, que são crimes de perigo abstrato que admitem prova em contrário quanto à existência de uma perspetiva ex ante na consumação do
perigo (antes do facto não achei que havia perigo para o bem jurídico!)

B.1.2 CRIMES SIMPLES E CRIMES COMPLEXOS


Ainda em atenção ao bem jurídico é possível distinguir crimes simples e complexos, atento se o tipo de ilícito visar a tutela de um ou mais do que um
bem jurídico.
A maior parte dos crimes são simples! Está em causa a proteção de apenas um bem jurídico (a título de exemplo: a vida, artigo 131.º; a honra, artigo
180.º).
Nos ilícitos-típicos complexos pretende-se alcançar a proteção de vários bens jurídicos (a título de exemplo: no roubo – artigo 210.º - é tutelada não só a
propriedade, mas também a integridade física e a liberdade individual de decisão e acção).
O relevo normativo-prático desta distinção reside em que ela pode mostrar-se essencial para uma correta interpretação (e aplicação) do Tipo.
Por exemplo, no crime de denúncia caluniosa (artigo 365.º) é absolutamente decisivo para uma correta interpretação de muitos e importantes pontos do seu
regime ter em conta a duplicidade dos bens jurídicos protegidos pelo tipo, por um lado o interesse individual dos atingidos pela denúncia, por outro o
valor supra-individual da realização da justiça.
B.2 2º ELEMENTO -A CONDUTA (Remete para a querela da ação!)
Relativamente a conduta, vários problemas colocam-se!

Desde logo, será nesta sede que incumbe determinar quais são as ações jurídico-penalmente relevantes/e as irrelevantes, conforme a função de
delimitação/ou função negativa do conceito de ação!

“de excluir da tipicidade, todos os comportamentos jurídicos-penalmente irrelevantes!

Aqui, temos a exigência genérica de que se trate de um comportamento humano! Assim, desde logo já ficam excluídas da tipicidade, dada a falta de
capacidade de ação, comportamentos de animais, e as coisas inanimadas! (as pessoas coletivas não perderão capacidade de ação por conta disto!)

É exigido ainda que o comportamento tenha sido voluntário, ou seja, presidido por uma vontade, o que vai permitir excluir por exemplo, os puros atos
reflexos, os cometidos em estado de inconsciência ou sob o impulso de forças irresistíveis! (estarão fora, bem como, os sonhos ou pensamentos!)

No âmbito da conduta, vai importar distinguir-se entre ilícitos-típicos cuja consumação pressupõe a produção de um resultado ou evento, e ilícitos-
típicos em que para a consumação é suficiente a mera acção!

-Os primeiros, são os chamados CRIMES MATERIAIS9 OU DE RESULTADO! (a título de exemplo: O homicídio! O agente só consuma o crime, se o
resultado da ação = a “morte” tiver efetivamente sido produzido, o que não quer dizer, que se o resultado não se produzir como o agente pensou, o agente
não é punido, porque ele pode ser punido ainda por tentativa (crime de tentativa de homicídio)! Também a ofensa a integridade física (143º), a burla (217º).
Nestes tipos de crime, só se dá a consumação quando se verificar uma alteração externa, espácio-temporalmente distinta da conduta!
NOTA: A maioria dos crimes, são deste tipologia!
-Os segundos, são os chamados CRIMES FORMAIS10/DE MERA ATIVIDADE. Estes, para o crime se consumar, basta o simples comportamento, não
sendo dependente do resultado! (É o exemplo do crime de incitamento a guerra – 236º) violação de domicílio (190 nº1)– consiste numa conduta (alguém
entrar de forma não autorizada na casa de outrem), falsidade de depoimento declaração (359º), coações sexuais (163º e ss)
Estes crimes esgotam-se num puro facere ou non facere! – consumam-se com a própria conduta do agente! São bem poucos, mas existem alguns exemplos.

O relevo prático desta distinção é multímodo, mas revela-se sobretudo em que, apenas os segundos suscitam a questão da imputação objetiva do resultado a
conduta – ou seja, quais os requisitos necessários para que um certo resultado/evento possa ser considerado como produzido por uma determinada conduta.

9
A cuja Tipicidade interessa o resultado!
10
A cuja tipicidade é indiferente a realização do resultado!
Por outro lado, relativamente a conduta, também podemos distinguir entre os denominados CRIMES DE AÇÃO ou CRIMES DE OMISSÃO! Tem
grande interesse, dadas as diferenças notáveis de regime entre os crimes de comissão por ação e os de comissão por omissão!

NOTA2: Contrariamente ao que muitos autores diziam, os crimes contra a honra, nomeadamente a injuria e a difamação não são crimes formais!
Verdadeiramente o atentado à honra depende de um resultado, que é o facto de a declaração ser ouvida por outra pessoa.
Ex.: Se alguém escreve uma carta a difamar, mas, por confusão dos correios, não chegou ao destino e volta para trás  não temos uma injuria ou difamação
consumadas.

Ainda quanto a conduta, pode-se distinguir entre os CRIMES DE EXECUÇÃO VINCULADA e CRIMES DE EXECUÇÃO LIVRE

-Nos primeiros, sucede que o “iter criminis” e assim, o modo de execução do ato, vem descrito no TIPO!
Ex.: o homicídio pode ser cometido por facadas, pistolas, enforcamento, etc – É indiferente a forma como o resultado morte provoca-se! desde
que a conduta seja idónea e conduza ao resultado, preenche o tipo legal.
-Nos segundos, o mesmo não ocorre!
Há alguns casos em que o legislador exige um determinado “modus operandi”, i.e., não se basta com a simples produção do perigo ou lesão do bem
jurídico, exige que o processo de realização do crime cumpra certos requisitos.
Ex.: burla – não basta aqui a produção de um dano patrimonial (o lesar do bem jurídico!), é necessário para ser burla, o crime de facto, que este dano
patrimonial siga um modus operandi.

NOTA: Por norma, os crimes são de execução não vinculada(livre)!


Isto é importante, efetivamente, quer para efeitos de tentativa – quando é começa a tentativa da burla, quais os requisitos para a burla, e para efeitos de
comparticipação.
 Alguns conceitos a reter relativamente ao elemento da conduta:
Ação típica Enquadramento da ação. Apelo à função negativa/delimitativa da ação – exclusão, da tipicidade, de comportamento jurídico-penalmente
relevantes. Requisitos: (1) comportamento humano; (2) comportamento voluntário;
Objeto da Ação - Ente sobre o qual recai a ação produzindo um efeito concreto
Objeto Jurídico - Valor/interesse que, como síntese categorial, é o objeto jurídico da norma incriminadora.
Resultado - É o evento espácio-temporalmente destacado da ação e por ela determinado!

B.3 AUTOR
Elemento constitutivo de todo ilícito-típico objetivo, nos crimes dolosos de ação é, apesar de sua natureza subjetiva/ou intersubjetiva – o autor da ação!
O autor, que em princípio, será uma pessoa singular, também poderá ser, nos casos em que a lei expressamente o determinar, um ente coletivo (Art. 11º)

-Casos de responsabilidade criminal das pessoas coletivas aumentaram sensivelmente nos últimos anos! – LEI 59/2007, DE 4 DE SETEMBRO – Essencial
neste contexto!

-Esta não somente introduziu a responsabilidade criminal de entes coletivos no CP (para o catálogo de crimes previstos no nº 2 do Art. 11) como a ampliou
a outros regimes jurídicos (=existem vários diplomas, que não o próprio código penal, que prevem este tipo de responsabilidade:

-LEI DO COMBATE AO TERRORISMO – Art. 6º


-REGIME JURÍDICO DAS ARMAS E MUNIÇÕES – (Art. 95º)
-LEGISLAÇÃO DE COMBATE A DROGA – (Art. 33º -A) Todas anexas ao código!
-LEI DA PROCRIAÇÃO MEDICAMENTE ASSISTIDA – (Art. 43º - A)

E muitas outras mais! Deste modo fica mais que entendido que o legislador português tomou a clara posição, na querela já antiga da responsabilidade penal
dos entes coletivos, no sentido de admitir esta responsabilidade, ainda que não a título de regra e não nos mesmos modos que ocorre pra com uma pessoa
singular!

Portanto – AGENTES QUE PRATICAM O COMPORTAMENTO SUSCETÍVEL DE VIR A CONSTITUIR CRIME:


-EM REGRA, PESSOAS SINGULARES
-EXCESSIONALMENTE, PESSOAS COLETIVAS

B.3.1 PROBLEMA DA RESPONSABILIDADE PENAL DO ENTES COLETIVOS


– Durante muito tempo vigorou a regra «Societas delinquere non potest», implantou-se em meados do séc. XIX: a sociedade, os entes coletivos, não podem
delinquir. Os entes coletivos não podem delinquir, uma vez que o ente coletivo em si mesmo seria incapaz da ação.

Por outro lado, em relação ao ente coletivo não se justificaria nenhum dos fins das penas.
-Este foi um dogma do DP continental até há bem pouco tempo.

Por razões de ordem prática, admitindo-se até que seja de ordem pragmática, e sob a influência do dto anglo americano levou, todavia, a que entre nós se
admitisse a responsabilidade de pessoas coletivas.
O prof Almeida Costa considera que é um erro já que esta responsabilização envolve a questão da responsabilidade objetiva.
Ex.: Pense se no sócio de uma empresa, que está afastado da gestão. Que responsabilidade tem este homem pelos crimes que são praticados na ação social
pela empresa?
Não nos podemos esquecer que os crimes praticados pela empresa têm sanções muito graves, de acordo com o CP português, são, por regra, sanções
pecuniárias, sanções que atém podem levar à cessação do exercício da atividade da empresa ou até na própria cessação do exercício da empresa.
As sanções pecuniárias podem ir até 30 milhões de euros, que em muitas situações podem levar à falência da empresa. Irão pagar todos os sócios,
nomeadamente, este individuo, que não terá nenhuma responsabilidade.
Levantam-se questões relacionadas com o pragmatismo, é muito difícil determinar o responsável individual do crime ou quando todos são responsáveis,
ninguém é efetivamente responsável (o processo penal assenta no pp in dúbio pro reu – desde logo a dificuldade de provar). E, por outro lado o interesse
financeiro do Estado em cobrar sanções pecuniárias muito pesadas que nenhum património individual poderia suportar, levaram à implementação da
responsabilidade penal dos entes coletivos.
O Prof. Dr. Almeida Costa considera que era possível delimitar áreas de responsabilidade, determinar pessoas individuais responsáveis por essa área e
imputar os crimes praticados na base da atividade social da empresa a pessoas individuais em termos de crime de omissão.

Ou seja, aquele que estivesse responsável por determinada área deveria fiscalizar a atividade daquela área, bem como a atividade dos seus funcionários em
ordem em que não fossem cometidos crimes.
Considera que esta questão levanta graves problemas no âmbito do princípio da culpa, uma vez que leva implicada o estabelecimento de verdadeira
responsabilidade objetiva em matéria penal.
Isto, para além do aspeto de que há sempre um interesse do Estado de arrecadar valores pecuniários através do Dto Penal.
Trata-se de um problema, sendo que a solução será de ordem muito prática, porque ultrapassa as tais dificuldades de prova, mas levanta problemas ao nível
do princípio da culpa e da máxima de intransmissibilidade da responsabilidade criminal.

B.3.2 O AGENTE INDIVIDUAL


I. CRIMES COMUNS E CRIMES ESPECÍFICOS

O autor de um crime é em regra uma pessoa SINGULAR! E dentro destas pessoas singulares, pode-se afirmar com alguma propriedade que, podem ser
autores, em princípio, qualquer indivíduo – sem “preconceitos” – Ideia traduz o princípio constitucional da igualdade perante a lei! (Art. 13º CRP)
Nestes casos, estamos perante aos chamados CRIMES COMUNS! – São a maioria dos tipos de crime.
Há inúmeros exemplos: Temos o Homicídio, o Furto etc.
NOTA: Estes crimes começam por serem tipificados utilizando pronomes relativos! “quem matar outrem” ou “quem… subtrair coisa móvel alheia…) –
Neste sentido, se falando de elementos típicos do autor!

No entanto, outras vezes, acaba por suceder de a lei levar a cabo, nesta matéria, uma especialização – em que sentido?
-No sentido de que certos crimes apenas poderão ser cometidos por determinadas pessoas (= restrição da responsabilidade criminal!), às quais
pertence uma certa qualidade/um estatuto, ou sobre as quais recai um dever especial!
Regra geral estes crimes prendem-se com o facto de a relação de parentesco ou relação profissional, conferir ao ato um particular desvalor ou essa mesma
relação exigir especial cuidados de prevenção tendentes a agravar a sanção por referência aos crimes.

Nestes casos, então estaremos perante aos chamados crimes específicos, de que são exemplos os Arts. 227º (O devedor que…), 284º(O médico que…) ou o
375º também (“o funcionário que”…)

 Dentro dos crimes específicos, pode-se realizar a distinção ainda entre duas modalidades:
-Crimes específicos próprios/ou puros Nestes, temos que a qualidade/estatuto especial ou o dever especial que impende sobre o agente,
fundamentam a sua responsabilidade criminal!
Exemplo: Crime de pre-varicação (370º) – Se a conduta em causa não tiver sido adotada pelos agentes específicos, que desempenham estas funções, não
haverá crime – não há responsabilidade criminal! Por conseguinte um médico/psicólogo, não pode cometer crime de pre-varicação!

-Crimes específicos impróprios/impuros Nestes, a qualidade/estatuto do agente, ou os deveres especiais que sobre ele impendam, não
servem para fundamentar a responsabilidade criminal, unicamente para a agravar!
Exemplos: Artigo 378º - Combina uma pena mais gravosa para o crime de violação de domicílio, previsto no Art. 190º, quando este for cometido por
funcionário! Mais simples ainda, o homicídio qualificado! ART. 132º/2 als. a) e b) CP. Nas suas primeiras alíneas, estabelece uma agravação da pena do
homicídio quando entre o agente e a vítima exista uma particular relação!
Crime comum que pode ser cometido por qualquer pessoa (homicídio simples) e depois temos o homicídio qualificado a exigência de uma relação entre
vítima e agente!
4. DICOTOMIAS – CRIMES MERA ATIVIDADE/RESULTO vs CRIMES DE PERIGO/DE DANO
Nunca podemos sobrepor estas classificações! Elas não sobrepõe-se, combinam-se!
-Os primeiros, reportam-se em princípio, ao objeto da ação! Os segundos reportam-se ao bem jurídico!
Podem verificar-se quatro combinações:
-Crimes de mera atividade (formais) que sejam crimes de dano - exemplo – violação sexual(164º)/violação de domicílio (190º)
-Crimes de resultado (materiais) que são crimes de dano – Homicídio /ofensa a integridade física
Crimes de mera atividade (formais) que são crimes de perigo – condução em estado de embriaguez (292º) falsidade de depoimento ou declaração (359º)
-Crimes de resultado (materiais) que são crimes de perigo – A generalidade dos crimes de perigo comum (272º e ss) ou também o crime de exposição e
abandono (138º)

NOTA: Professor pergunta em orais para alterar um tipo de crime para outro!

AUTORES/AGENTES/SUJEITOS
Pessoas Singulares É a regra geral. A pessoa singular enquanto autor do crime

Pessoas Coletivas O autor pode ser, alternativamente, um ente coletivo (art. 11º)

Crimes Comuns Quem (pronomes relativos). Qualquer pessoa pode ser autora deste tipo de
crimes.
Crimes Específicos Crimes específicos impróprios: a
qualidade do autor ou o dever que
Especialização. Apenas certas e determinadas pessoas, sobre as quais Especialização. Apenas certas e sobre impende não servem para
recai uma qualidade ou dever especial, é que podem ser havidas como determinadas pessoas, sobre as quais fundamentar a responsabilidade, mas
autoras destes crimes recai uma qualidade ou dever unicamente para agravar.
especial, é que podem ser havidas
como autoras destes crimes Crimes específicos próprios: a
qualidade especial do autor ou o
dever que sobre ele impende
fundamentam a responsabilidade

Crimes de mão própria* Exclui-se nestes: os autores mediatos, a co-autoria (participantes que não
chegaram a executar pelas próprias mãos)
Tipos de ilícito em que se abrange como autores apenas aqueles que
levem a cabo a ação através da sua própria pessoa, não através de
outrem.
Crimes de Perigo Abstrato: o perigo não é elemento do tipo, mas
simplesmente motivo da proibição; há comportamentos proibidos em
função da perigosidade típica, mas esta não tem de ser comprovada no
caso concreto. O perigo é presumido

Crimes de perigo abstrato-concreto: o perigo abstrato é, não só critério


Antecipação da tutela do bem interpretativo e de aplicação, mas deve ser também o momento
CRIMES DE PERIGO jurídico, bastando-se com a referencial da culpa; admite-se, assim, que a perigosidade seja objeto de
criação de perigo! um juízo negativo/de censura.

Crimes de Perigo Concreto: o perigo faz parte do tipo, ou seja, o tipo só


é preenchido quando o bem jurídico tenha efetivamente sido posto em
perigo

Prolação da tutela do bem jurídico. O direito penal apenas intervém


CRIMES DE DANO quando se verifique, efetivamente, dano lesivo do bem jurídico

Crimes simples Visam a tutela de um bem jurídico

Crimes complexos
Visam a tutela de mais do que um bem jurídico roubo
(propriedade e integridade física)

5. FIGURAS TÍPICAS DE ESTRUTURA ESPECIAL


No sentido de melhor corresponder as exigências do princípio da legalidade, nomeadamente, de descrever de uma forma o mais precisa e estrita os
comportamentos típicos e as formas de lesão ou colocação em perigo dos bens jurídicos (dar a conhecer aos destinatários), o legislador faz uso de técnicas
que resultam na criação de grupos de tipos de crime, bem como de figuras típicas de estrutura especial. São os mais importantes desses grupos e figuras
que se vai agora referir.

5.1 CRIMES FUNDAMENTAIS, QUALIFICADOS E PRIVILEGIADOS

Os crimes fundamentais contêm o tipo objetivo ilícito, na sua forma mais simples! Constituem o mínimo denominador comum da forma delitiva!
Conformam o “tipo-base”, cujos elementos vão de pressupostos, nos tipos qualificados e privilegiados.
Frequentemente, na verdade, o legislador, partindo do crime fundamental, ou acrescenta-lhe elementos, respeitantes à ilicitude ou/e à culpa, que assim
vão agravar a responsabilidade (crimes qualificados) ou atenuam (crimes privilegiados) a pena prevista no crime fundamental. Claro exemplo destes grupos
de tipos de crime é o homicídio. No artigo 131.º está contido o ilícito-típico fundamental de homicídio, traduzido na acção de matar outra pessoa. A partir
daqui e como a morte foi produzida em circunstâncias, devidamente descritas ou referenciadas através de uma cláusula geral, que revelem uma culpa mais
grave ou uma culpa menos grave do que a pressuposta no tipo-base, deparamos comum homicídio qualificado (artigo 132.º9 ou um homicídio privilegiado
(artigo 133.º). Outro exemplo é dado pela generalidade dos crimes patrimoniais, como por exemplo o crime de furto: partindo do tipo-base (ou furto
simples: artigo 203.º) e acrescentando-lhe elementos, aqui relativos ao tipo de ilícito, que aumentam a gravidade do facto, deparamos com o furto
qualificado, artigo 204.º. Os crimes qualificados são crimes em que ocorrem circunstâncias tais em que o crime é particularmente perverso e censurável.
Assim, é um crime derivado no sentido da agravação. Por outro lado, os crimes privilegiados são crimes derivados no sentido da atenuação. Só estaremos
perante uma forma derivada se estiverem presentes todos os elementos dos crimes fundamentais. O legislador por vezes recorre à Técnica dos Exemplos-
Padrão. São casos em que há um enunciado normativo conjugado com algumas ilustrações típicas em termos tais que estas ilustrações não são esgotantes
nem sequer necessárias, a título de exemplo: artigo 132.º.

5.2 CRIMES INSTANTÂNEOS, DURADOUROS (OU PERMANENTES) E CRIMES HABITUAIS

-Quando a consumação de um crime se traduza na realização de um acto ou na produção de um evento, cuja duração seja instantânea, isto é, não se
prolongue no tempo, esgotando-se num único momento, diz-se que o crime é instantâneo. (por exemplo, o homicídio consuma-se no momento em que se
da a morte da vítima! O furto, no momento em que se dá a subtração da coisa!)

O crime não será instantâneo, mas antes duradouro, quando a consumação se prolongue no tempo, por vontade do autor. Assim: Se um estado
provocado por um crime, tiver uma certa duração, e esta se protrair no tempo, enquanto tal for a vontade do agente – que detém a faculdade de por fim a tal
situação -, o crime será duradouro!
NOTA: Nestes, a consumação ocorre logo que se cria uma situação ilícita/o resultado. Sucede apenas que a consumação vai se alongar, vai persistir até que
tal situação tenha cessado!
Exemplos aqui, são o sequestro (158º) e a violação de domicílio (190º nº1)
Por sua vez, os crimes habituais são aqueles em que a realização do tipo incriminador supõe que o agente pratique determinado comportamento de uma
forma reiterada, até ao ponto de ela poder dizer-se habitual (os casos de aborto agravado (141º n2 e de lenocínio 170º).

 De certa forma relacionada com estas classificações, surge um problema muito difícil: O PROBLEMA DA CHAMADA IMPUTAÇÃO
OBJETIVA DO RESULTADO A CONDUTA
A. O SENTIDO/ E INTRODUÇÃO DO PROBLEMA
Crimes de resultado – exigem para o seu consumar, a verificação de um resultado/evento espacio-temporalmente autónomo da primeira!

É necessário imputar este resultado produzido a conduta do agente, desde logo porque:
-Direito penal apenas vai intervir relativamente a comportamentos humanos (pessoas singulares/coletivas), direito penal do facto, não contra resultados!

É preciso ligar o
resultado a conduta, daí
o problema!

Da exigência destes tipos legais de crime, vai importar por exemplo, averiguar não apenas se este resultado, de facto chegou a produzir-se, mas também e,
sobretudo, se ele pode ser atribuído (imputado) a ação (concreta!)
- Assim, torna-se, por vezes, mesmo difícil determinar se aquele resultado é efetivamente o resultado que foi produzido por aquela conduta em específico!

De todo modo, a exigência mínima das mínimas que se tem de fazer, ao relacionamento do comportamento humano com o resultado – para que este possa
ser imputado a aquele – é a da causalidade (logicamente/e historicamente)
-Não é atoa que por muito tempo, o problema da imputação do resultado a conduta fora sintetizado sob os postulados da causalidade – A ação há de, pelo
menos, ter sido causa do resultado! E assim resolvia-se!

A.1 TEORIA DA “CONDITIO SINE QUA NON” (já se traz pressuposto – nexo causal - , aquilo que se pretenderia determinar – imputação do resultado a
conduta)
Um primeiro degrau, constitutivo da exigência mínima que se tem de fazer ao relacionamento do comportamento humano com o resultado – para que
este possa ser imputado a aquele – é a pois, o da pura causalidade! Vamos imputar o resultado a conduta, por pura causalidade, através da teoria da conditio
sine qua non!
Pelas mãos de Glaser e V. Buri, em meados do século XIX, surge a Teoria das condições equivalentes que teve o mérito de libertar o Direito Penal dos
resquícios medievais do estabelecimento da imputação objetiva através de práticas mágicas e supersticiosas e de juízos metafísicos.
A premissa mais básica desta teoria, refere que: A causa de um resultado, é toda a condição sem a qual ele não teria tido lugar! – Por isso mesmo, toda
e qualquer condição que tivesse, dalguma forma, contribuído para que o resultado se produzisse, são causais em relação a ele, devendo ser consideradas em
pé de igualdade11!
De modo a apurar quais as condições que deram causa a um certo resultado, deveria o juiz realizar uma operação mental de supressão! Isto é, deveria
observar as condições, e seguir o seguinte pensamento: Sem esta condição, o resultado ainda assim se produziria? Pode-se chegar a duas respostas:
-Positiva – sem a respetiva condição o resultado ainda se produz – não é conditio sine qua non – por isto não haveria imputação segundo este
comportamento
-NEGATIVA (A resposta ideal) – Sem a condição, o resultado concreto não se produziria – é conditio sine qua non! Imputa-se/esta condição seria
relevante para efeitos do estabelecer do nexo de causalidade

EXEMPLO – MORTE DO SR.A


-Segundo teoria da conditio sine qua non, serão causais desta morte, facto do sr. B ter uma arma e ter disparado dois tiros em A; facto de C de produzido a
arma; facto de D, taxista, ter levado B ao encontro de A! Sem quaisquer uma destas condições o resultado não teria sido possível, pelo menos nas concretas
condições de modo tempo e lugar que realmente ocorreu.

Ora, dito isto é fácil concluir que tal fórmula levava a uma espécie de regressum ad infinitum, abrangendo a mais longínqua das condições! (ex: se C não
tivesse feito a arma do crime, A não lha tinha comprado para matar B; a C seria imputado o resultado), sendo que ainda deveriam ser excluídas da
problemática qualquer consideração sobre a “interrupção do nexo causal” devido atuação do ofendido ou de terceiro (ou por circunstâncias
extraordinárias/imprevisíveis)
Ex: Se no 1º ex A não tivesse morrido com os tiros, mas com um incendio no hospital – ainda assim os tiros seriam conditio sine qua non!
Também há mais críticas, além desta principal!

O critério de supressão mental de uma condição – através do qual pretende-se saber se ela é ou não causa dum determinado resultado – é apenas eficaz em
certos casos, mas não em outros, nomeadamente:
11
Uma vez que o resultado, é indivisível – não há um resultado específico para cada uma das condições que contribuíram! O resultado não pode ser pensado sem a totalidade das
condições que o determinam!
-Casos de “causalidade virtual” (A dispara tiro a B que no exacto momento tem um enfarte do miocárdio mortal)
-Casos de “dupla causalidade” ou “causalidade alternativa” (A e B ministram dois venenos diferentes em C, qual deles o mata?)
-Ou ainda nos casos em que não se consiga determinar se determinada ação foi de facto uma conditio sine qua non de um certo resultado. por exemplo, de
atentados ao ambiente, de manipulação genética ou de responsabilidade pelo produto tão frequentes no seio da “sociedade de risco”.
*Dele também, irão surgir dificuldades acrescidas de comprovação, quando se trate de responsabilização de entes coletivo!

Pela insuficiência e inutilidade da “conditio sine qua non”, surge um outro critério (que já ganha alguns contornos normativos): “condição conforme às leis
naturais”, segundo a qual o estabelecimento da causalidade depende de saber se uma acção é acompanhada por modificações no mundo exterior que
normalmente se encontram vinculadas a essa acção de acordo com as leis da natureza e são constitutivas de um resultado típico (Jescheck). Apela-se,
portanto, às leis da experiencia, de base probabilística ou estatística.
Conclui-se que uma comprovação conforme as leis científicas, ainda que de base científica, é bastante como degrau ineliminável, em certos casos, da
imputação jurídico – penal.
Todavia, não se lhe dá o papel de máximo denominador comum de toda a categoria da imputação (desde logo pois o seu defeito principal liga-se à
exagerada extensão que confere ao objecto da valoração jurídica). Assim, se bem que se conclui ser a relação de causalidade um dado necessário, não é, de
todo, suficiente. Importa subir ao nível da valoração jurídica.

A este propósito, tomando como referência a doutrina moderna, desde início do século XX até agora, surgiu uma 1ª doutrina – de solução: A teoria da
equivalência das condições (sine qua non), que assentava nos postulados causalistas que, no fim de contas, transportava para o problema da imputação da
conduta a noção de causalidade naturalista.
Mais concretamente a noção de causalidade de Maxon Buri, que era um conselheiro do supremo tribunal alemão. O seu conceito de causalidade foi
avançado por John Stuart Mill.
Causa seria o conjunto de todas as condições sem as quais um determinado resultado não se verificaria Era a perspetiva causal.
Ex.: o que é deu origem a uma árvore – semente; no entanto, também tivemos em várias circunstâncias, que contribuíram para tal.
Esta noção de causa de John Stuart Mill, que Maxon Buri previu, sem nunca ter lido os ensinamentos de Mill, estava na base da teoria da equivalência das
condições.

É este conceito de causa que é transportado para o plano do DP. Portanto, atribuiríamos o resultado à conduta do agente, sempre que chegássemos à
conclusão que sem ela, sem a conduta, (havia aqui um método hipotético) não se tinha produzido o resultado não haveria causa.
Se a conduta era imprescindível, se ele retirasse a conduta não tinha havido resultado, então imputava-se o resultado à conduta

 era o método hipotético que apontava para o critério da condição sem a qual (sine qua non).
A conduta seria causa daquele resultando quando, nesse juízo hipotético, se o juiz procedesse à subtração mental daquela conduta e chegasse à conclusão
de que não se tinha verificado o resultado.
Várias críticas se dirigiam a esta perspetiva:
Ela leva a um alargamento do conceito de causa inadmissível à luz das valorações jurídico-penais.
Ex.: suponha-se que alguém dá uma pancada na cabeça de outra pessoa. A pessoa fica inanimada. Chega ao hospital e depara-se com um enfermeiro
negligente, que troca o frasco de remedio pelo frasco de veneno, provocando a sua morte.
De acordo, com a teoria da conditio sine qua non, teríamos que imputar o resultado morte à pancada, porque se o individuo não tivesse levado a pancada,
nunca teria ido ao hospital, nunca se teria encontrado com o enfermeiro negligente, que provocou a sua morte.
Podemos até multiplicar isto: se o pai daquele agente que lhe deu a pancada, não tivesse nascido, não tinha aquele filho.
Esta perspetiva puramente causal, descritiva não é adequada às valorações jurídico-criminais e levava às imputações de resultados que manifestamente não
são previsíveis.
O DP o que pretende é comandar o comportamento das pessoas para o futuro e só pode exigir que se abstenham de condutas, desde que o resultado dessas
condutas seja previsível  não faz sentido adotar esta perspetiva como nuclear de toda a imputação do resultado à conduta.

Junta-se uma segunda crítica: o critério conditio sine qua non // do método de supressão mental é uma ficção, porque verdadeiramente para o juiz fazer a
supressão mental, e chegar à conclusão de que com comportamento se tinha produzido o resultado ou não, é necessário que ele conheça as próprias regras
causais (ele já tem que saber o critério sine qua non) para chegar à conclusão de que aquela conduta foi indispensável à produção do resultado.

Quanto a este segundo aspeto é proposto um segundo critério: critério da condição conforme às leis naturais.
i.e., para se fazer esta imputação naturalista, tem de se atender às regras científicas e de conhecimento que são pacificas na ciência da doutrina da matéria
em causa.

A determinação da condição conforme às leis naturais apontaria que só se imputasse o resultado quando, de acordo com regras conhecidas, pacificamente
aceites, determina-se o nexo de imputação.
Ex.: crimes ambientais, erros médicos.
Porém, mesmo com esta correção permanece a crítica inicial.

Mesmo com este novo critério, a teoria da equivalência das condições conduz a um alargamento demasiado largo do âmbito da imputação. Está em causa,
não é estabelecer um puro nexo causal, mas é, antes de mais nada, determinar em que casos é, no momento da prática do facto, era ou não previsível o
resultado.
O DP pretende comandar o comportamento futuro das pessoas, procurando que as pessoas se abstenham de praticar atos que lesma os bens jurídicos – é
esta a perspetiva que deve presidir à imputação do resultado à conduta.
E foi, por isso, que como correção à teoria da equivalência das condições surgiu a chamada teoria da adequação.
Há duas vias da teoria da adequação.
Há uma que pretendeu introduzir o conceito de causalidade humana, substituindo radicalmente a teoria da equivalência das condições.
E, depois, há outra que é a maioritária, que introduz a teoria da adequação como um corretor à teoria da equivalência das condições.

Teoria da adequação
A teoria da adequação diz que de entre todos os processos causais só podem revelar para o DP, aqueles que no momento da prática do facto, atendendo à
normalidade do acontecer, às regras da experiência e aos conhecimentos gerais do agente na situação concreta, o resultado se apresente como uma
consequência possível, ou pelo menos não impossível da conduta.
A teoria da adequação aponta para o juízo de prognose póstuma, i.e., defende que não basta que haja um nexo causal naturalístico, entre a conduta e o
resultado, tal qual resulta da teoria da equivalência das condições.
É necessário que, de todos esses nexos causais, só valore aqueles que de acordo com a regra da experiência, atendendo aos conhecimentos gerais e
específicos do agente esse resultado se afigure como uma consequência previsível ou pelo menos não impossível da conduta.

Os autores preferem, hoje, falar de uma consequência não impossível.

A regra da experiência funciona na base dos conhecimentos do agente.


 Colocam-se aqui em causa os acontecimentos gerais, mas também os conhecimentos específicos do agente.
Ex.: suponha-se que alguém produz um ferimento numa pessoa. Para a maioria das pessoas isto não será mais do que um ferimento na cabeça.
Só que, naquele caso concreto, a vítima tinha uma especial fragilidade que fazia com que uma agressão, que para a maioria não tinha grandes
consequências, neste caso concreto veio a provocar a morte da vítima ou gravíssimas ofensas à saúde ou integridade física.
De acordo com a teoria da adequação, se não fosse visível o ferimento produzido, não era de esperar o resultado previsível  sendo que o agente seria
apenas acusado de ofensas à integridade física – não se imputaria a morte.
Suponhamos, agora, que o agente sabia dessa especial fragilidade física, aí já passa a ser previsível. Deste modo, já se imputaria aqui o homicídio.
As regras da experiência medem-se em função das circunstâncias conhecidas em geral pelas pessoas, sobre o caso concreto, e também dos conhecimentos
especiais do agente.
Com isto, não estamos a confundir o ilícito com a culpa – está-se a apenas a falar da adequação da conduta na sua objetividade, para produzir um resultado.
o A culpa tem que ver com a censura, e, como se sabe, o agente pode até ser inimputável ou esteja numa situação de não exigibilidade.

Para operacionalizar esta teoria fala-se no juízo de prognose póstuma – é uma prognose feita à posteriori.
O juiz tem que fazer uma espécie de “viagem no tempo”, colocar- se no momento e nas circunstâncias em que o agente atuou e, em face disso, fazer um
juízo se era previsível, pelo menos como consequência não impossível, a produção da consequência como não resultado.
Este conteúdo essencial da teoria da adequação como critério da imputação jurídica – diz-se que este já não é um problema de causalidade (causalidade
naturalística é o 1º pressuposto e é resolvido à luz da teoria da equivalência das condições).
Aqui, no âmbito da teoria da adequação, é um problema de valoração.

Está-se a circunscrever, de entre todos os processos causais naturalísticos possíveis, aqueles que relevam para o dto penal.
E, só relevam aqueles que deixem antever no juízo de prognose póstuma, a verificação do resultado como consequência da conduta ou pelo menos não
imprevisível.

Assim viveu a doutrina durante muito tempo. Até que, em finais do século XX, surgiu a Teoria da Conexão do Risco, que é a teoria maioritária hoje em
dia, mas que o Prof. Dr. Almeida Costa discorda.
É a teoria que a doutrina moderna veio introduzir e que conta com o apoio maioritário da doutrina, em particular Dr. Figueiredo Dias.
O grande autor que introduziu esta teoria foi Klaus Roxin.

Esta teoria vem dizer que existem ainda muitas situações em que, à luz, seja da teoria da equivalência das condições e, depois, do corretor da teoria da
adequação, o resultado se deve imputar e, todavia, essa imputação não corresponde ao sentido das valorações jurídicas, sendo necessário introduzir +
limites valorativos, que excluem imputação do resultado à conduta, em relação a casos que, da atuação conjugada da teoria da equivalência das condições e
da teoria da adequação resultaria a imputação.

A teoria da conexão do risco caracteriza-se por conservar as doutrinas anteriores, juntando-lhe um elemento novo trazido pela conexão do risco. Do ponto
de vista formal, há várias construções – Roxin, autonomiza 2 momentos; Figueiredo Dias, 3 momentos – seguir-se-á o esquema apresentado por Figueiredo
Dias  haverá que cumprir, cumulativamente, 3 momentos.
Primeiro momento  é constituído precisamente pela teoria da equivalência das condições, integrada pelo tal critério das condições conforme as leis
naturais: é problema de determinar se, no plano dos factos, aquele resultado foi ou não causado pela aquela conduta. É um requisito mínimo, que se percebe
no quadro do DP do facto.
Eu só posso imputar alguma coisa alguém quando no plano da causalidade foi efetivamente produzido pela conduta do agente- teoria da equivalência das
condições.

Segundo momento: já não estamos à procura do nexo causal naturalístico, esse já está resolvido. É o nexo de adequação – no fim de contas, é a teoria da
adequação. Neste segundo nível, Dr. Figueiredo Dias vai restringir a imputação aqueles casos em que, de acordo com as regras da experiência, da
normalidade do acontecer, atendendo aos conhecimentos gerais, mas também aos
acontecimentos específicos do agente, o resultado se apresente como consequência previsível, ou pelo menos não impossível.
No entanto, os autores diziam que há muitos casos em que o resultado se deve imputar tendo em conta essas duas teorias e, mesmo assim, afigura se injusto
responsabilizar o agente.
Deste modo entra-se no terceiro escalão.

Terceiro escalão: Teoria da conexão do risco: há casos em que na conduta há nexo causal, nexo de adequação e a imputação do resultado contrariaria as
regras jurídico criminais.
Enuncia 4 situações que funcionam, pela negativa, são 4 corretores que excluem a imputação em relação à conduta em relação às quais havia nexo de
causalidade e de adequação, limitando a teoria da adequação.
Corretor do risco permitido  nas sociedades modernas e complexas existem atividades que apesar de perigosas, apesar de deixarem antecipar a possível
lesão do bem jurídico, continuam a existir, por exemplo o caso do tráfego automóvel e da indústria química.
São situações de condutas que são lícitas e úteis às sociedades, mas que envolvem certos perigos e riscos para os bens jurídicos.
Deste modo, o legislador nestas áreas estabelece regras de cuidado, estabelece limites ao exercício de certas atividades pertencentes a esses setores de
atividade perigosos (por exemplo regras do código da estrada).
E, portanto, ao estabelecer estas regras o legislador diz que sempre que a atividade perigosa for exercida no respeito dessas normas de cuidados, a conduta
em si mesmo será lícita pelo que não será imputado o resultado.
Só quando agente ultrapassa as regras de cuidado é que será responsável pela sua conduta.

Corretor da diminuição do risco/Princípio do risco diminuído  dois amigos vão escalar uma montanha; e um vai à frente e outro atrás com

alguma distancia, o que vai atras vê uma pedra que se desprendeu e que vai atingir o amigo
magoando-o gravemente; e por qualquer meio o amigo de trás consegue desviar a pedra, magoando não a cabeça, mas a omoplata, destruindo-a.
De acordo com os critérios da teoria da adequação e da teoria da equivalência das condições, este é um efeito previsível e teríamos que imputar ao amigo a
ofensa à integridade física consistente da fratura da omoplata.
Todavia é consequência injusto e gritante – o que a teoria da diminuição do risco vem dizer é que não se imputa o resultado quando a produção desse
resultado foi meio para evitar um dano mais grave.

Estes autores dizem que quanto ao dano do ombro verifica-se o nexo causal, também há nexo de adequação pois ele previu e é adequado, era consequência
não impossível atingi-lo no ombro.
Seria absurdo responsabilizar o agente por uma lesão que foi indispensável e necessária para evitar a lesão mais grave do bem jurídico.
Não se imputa o resultado quando a produção do resultado ainda que consequência causal e adequado, seja um meio para evitar uma lesão mais grave de
um bem jurídico.

Comportamento lícito alternativo  casos em que


o agente atuou ilicitamente, prova-se, à posteriori, que mesmo que atuasse licitamente, o resultado teria sido o mesmo.
Caso do cirurgião que pratica certas diligências de má prática médica e o doente morre.
Vem-se a provar, à posteriori, que mesmo que o médico respeitasse as boas práticas jurídicas ele morreria à mesma.

Neste caso não se imputa o resultado, sendo que a conduta continuando a ser ilícita, o agente é punido apenas nos termos da tentativa.
A tentativa só é punível a título de dolo, o que significa que, quando o agente atuasse com dolo, seria punido apenas por tentativa.
A tentativa não é punível a título de negligencia, por isso o corretor do comportamento lícito alternativo implica a impunidade do agente.

Há o desvalor da ação pois desrespeitou a regra, mas não se verifica o desvalor do resultado pois ele acontecia de qualquer forma.

Princípio do âmbito de proteção ou fim da norma


 suponha-se que há, devido à proximidade um cruzamento perigoso e com o objetivo de evitar acidente, uma placa que limita a velocidade a 50km/h.
O fim da norma é impedir acidentes devido ao perigo rodoviário - o senhor A vai a 70km/h e rebenta um pneu e galga o passeio e atropela uma pessoa.
O sentido da norma não tinha que ver com o rebentamento de pneus, ele vai ser punido por ultrapassar o limite de velocidade, mas o resultado não lhe pode
ser imputado pois esse limite de velocidade estava lá apenas para evitar acidentes e não tinha que ver com o perigo do rebentamento do pneu.
Não lhe vai ser imputado o resultado atropelamento em virtude do rebentamento do pneu. Contudo, se em virtude dos 70km/h, não travou a tempo e teve
um acidente

no cruzamento, teve um resultado que a norma pretendia evitar e o resultado é lhe imputado.
O âmbito de proteção da norma respeita sim a evitar perigos de acidente, sendo que o agente apenas será punido por excesso de velocidade.

Teoria geral dos delitos de ação dolosos (continuação)


Teoria da conexão pelo risco: a imputação do resultado à conduta passa por três momentos sucessivos que têm de ser preenchidos cumulativamente.
Primeiro, há que verificar se se há um nexo causal naturalístico definido nos termos da teoria da equivalência das condições. Mas isto não chega.
Depois, temos de verificar se se preencheu o nexo de adequação, conforme aos pressupostos da teoria da adequação.
E, por fim, resta-nos analisar o nexo da conexão pelo risco.

Quatro corretores da conexão pelo risco:


Corretor do risco permitido;
Corretor da diminuição do risco;
Corretor do comportamento lícito alternativo;
Corretor do âmbito da proteção da norma.

O prof. Dr. Almeida Costa DISCORDA desta perspetiva:


Discorda, logo na base pela adoção da teoria do ilícito pessoal.
O que está aqui em causa na imputação objetiva é determinar a atuação juridicamente relevante.
A imputação objetiva não é um problema exclusivo dos crimes materiais.  Coloca-se também nos crimes formais.
Ex.: Pense-se na hipótese de autoria mediata em relação à invasão de domicílio. Muitas vezes, o crime é imputável não aquele que executa a conduta
criminosa, mas àquele que está por detrás dele, que o comanda.
- Supõe-se que alguém, usando coação, faz com que o autor imediato invada o domicílio.

Portanto, o problema da imputação objetiva põe-se em relação a todos os crimes e traduz-se em saber qual os

requisitos que deve revestir o nexo que liga o agente ao facto criminoso, para que ele lhe possa ser imputado, isto independentemente de o crime praticado
ser um crime formal ou um crime material.

A partir daqui, tem-se uma segunda crítica: se é este o critério, então o critério de imputação não pode estar na teoria da adequação (o 2º escalão da
conexão do risco).
Ex.: um farmacêutico vende uma substância abortiva para a prática de um aborto que não é permitido por lei. É previsível que o ato de venda tenha como
consequência a prática do aborto.
- Significa isto que podemos praticar a prática do aborto ao farmacêutico?
. Não. Este beneficia apenas do domínio da liberdade da venda da substância.
Os crimes dolosos caracterizam-se por uma simetria/ correspondência entre o lado ativo e passivo entre o lado objetivo e subjetivo.
Os crimes dolosos traduzem-se do lado subjetivo no conhecimento da realização do crime.
Só se pode falar de crime doloso, quando a realização objetiva do ato, i.e., a lesão ou colocação em perigo do bem jurídico é obra da vontade do agente – só
aí se pode dizer que a prática do crime dependeu da vontade do agente e, por isso, é a concretização do seu próprio dolo.
No nosso exemplo o farmacêutico só tem em mãos o domínio da venda do medicamento e não a prática do ato abortivo.

Resumindo e antecipando conceitos: O verdadeiro critério da imputação objetiva dos crimes dolosos é o DOMÍNIO DO FACTO, há um nexo de
dominabilidade – só podemos dizer que o facto é imputável a título de dolo, quando da vontade do agente dependeu o «se», o «quando» e «como» da
prática do crime.
Há uma diferença muito grande entre nexo de dominabilidade e o puro nexo de previsibilidade.
Por isso, e é esta a 2ª crítica a dirigir á teoria da conexão do risco, é que o critério base da imputação objetiva (que é a teoria da adequação

para a teoria da conexão do risco) não exprime o desvalor do crime doloso.


O critério da imputação objetiva do crime doloso tem de ser no domínio do facto, que tem importa também um juízo de prognose póstuma, mas que é
diferente.
Também aqui o juiz vai “viajar no tempo”, no entanto fará uma pergunta diferente: “não se era previsível que a esta conduta viesse a suceder-se a prática
do ato?”; perguntará ainda: “se atendendo às circunstâncias do caso aquela conduta dava ao agente o efetivo controlo o se, o quando e o como, dele
dependia ou não a prática do crime.”.

Existe ainda uma terceira critica: bem vistas as coisas, o critério da imputação objetiva, na teoria da conexão do risco, reduz-se à teoria da adequação, que
já se viu, é insuficiente.
Verdadeiramente os corretores não são critérios de imputação objetiva  têm que ver com a delimitação do tipo.
Ex.: Voltemos ao caso dos dois amigos que vão escalar e que A para tentar salvar B de uma pedra que lhe ia provocar a morte fatal, desvia uma pedra e
acerta-lhe na omoplata, destruindo-a.
- Os autores dizem que neste caso, nos termos da teoria da adequação, tem que se imputar a destruição do ombro. Só que vai se excluir essa imputação.
. O critério da diminuição do risco não tem a ver com a imputação do resultado. Para falar de conexão do risco é necessário que a fratura do ombro seja
imputável ao amigo, em termos de previsibilidade. Pode se imputar, mas exclui-se o ilícito.
Isto porque se diz que o tipo legal de ofensas à integridade física não pode abranger uma conduta que causa uma ofensa à integridade física, mas como
meio para evitar outra mais grave.
. o que está aqui em causa não é o nexo entre a conduta e o resultado  este nexo existe e, por isso, se levanta o problema, o que está em causa é o
elemento de valoração.

Por outras palavras, é dizer que esta conduta, quando praticada nestas circunstâncias, não é ilícita.
O mesmo se diga para o comportamento lícito alternativo.

Em alternativa à conexão do risco, o Prof. Dr. Almeida Costa considera que o problema deve ser colocado de outra forma e que a imputação passa, no
âmbito dos delitos dolosos, a depender de dois momentos diferentes:
Um primeiro momento, que é um verdadeiro nexo de imputação jurídica – domínio do facto – só posso imputar um crime (formal ou material) a partir do
momento em que a verificação/ preenchimento do tipo é obra da vontade do agente;
2º requisito  Causalidade naturalística: o prof. faz intervir este requisito só em último lugar, uma vez que não basta uma conduta que propicia o agente o
domínio do facto;
É necessário, no quadro de um DP do facto, que a conduta seja a causa efetiva da sua produção.
Aqui, o Prof. Dr. Almeida Costa aceita a teoria da equivalência das condições, integrada pelo critério da condição conforme às leis naturais.

O sentido do ilícito doloso – imputação no âmbito dos delitos dolosos


Problema não se restringe à imputação do resultado à conduta – não se restringe aos crimes materiais.
O problema de imputação objetiva respeita à determinação/ definição do nexo que tem de existir entre a conduta e a verificação do crime, para que o
possamos considerar obra do agente.
O dolo é conhecimento e vontade da realização do tipo, daí que necessariamente o ilícito doloso só possa compreender os factos que são realização da
vontade do agente.
Portanto, o critério basilar que exprime o desvalor da ação característico do ilícito doloso e, por isso, tem de ser o critério da imputação objetiva e aplicável
tanto aos crimes materiais como aos crimes formais é o domínio do facto.

Posto isto, o domínio do facto exige um juízo de prognose póstuma análoga da teoria da adequação.
Contudo, é diferente, uma vez que a teoria de adequação exprime um nexo de previsibilidade.
No entanto, há situações em que um determinado crime é previsível, sem, todavia, se poder dizer a

respeito dele que constitui a concretização de uma decisão da vontade do agente.

O juízo de prognose póstuma à realização do facto faz com que também o juiz tenha de “recuar ao tempo da prática do ato”, sendo que a pergunta que se
faz será a “será que é previsível o resultado como consequência desta conduta?” (teoria da adequação).
Ora, aqui será uma pergunta diferente: “naquela situação, atendendo às circunstâncias do caso, aquela conduta dá ao agente ou não o controlo sobre «se»,
«quando» e «como» - se dá o domínio do facto ou não?”
É este o critério de imputação objetiva.
Como segundo requisito, surge o nexo de causalidade definido nos termos da teoria da equivalência das condições.
Este critério vale tanto para os crimes materiais como para os crimes formais, i.e., quanto aos crimes materiais, o problema adicional da imputação do
resultado se subordina este mesmíssimo critério – é saber se o agente, com a sua conduta, tem ou não o domínio sobre a prática do ato e a subsequente
produção do resultado.
É uma perspetiva alternativa à teoria da conexão do risco e que comporta apenas 2 momentos:
Momento do domínio do facto – a determinação do nexo pessoal objetivo que tem de interceder entre a conduta do agente e verificação do crime;
Verificação do efetivo nexo causal entre essa mesma conduta e a produção do evento.

Quanto aos critérios da conexão do risco, qual o seu papel?


Estes critérios não têm a ver com a imputação objetiva, mas sim com a definição da conduta penalmente relevante, com a definição do âmbito do tipo.
Ex.: Voltando ao exemplo da montanha, se o que ia atras consegue desviar a pedra que colocaria, porventura a morte, e consegue desviá-la para o ombro,
causando com isso a fratura da omoplata, é evidente que lhe estamos a imputar este resultado. Só falamos de diminuição do risco, porque, de facto, este
resultado (partir a clavícula) é imputável, nos termos do domínio do facto, à conduta do agente.
O que se passa é que se entende que o sentido do tipo de incriminação do crime de ofensas à integridade física, não abrange estas situações.
O sentido do ato de ofensas à integridade física é o de lesar a integridade física, não é a de diminuir o risco, atenuar a lesão.

E, por isso, imputa-se ao agente o ato de diminuição do risco, mas diz-se que esta conduta, com este resultado não preenche o tipo.
o E, considerações análogas poderíamos fazer para o comportamento lícito alternativo.

São, no fim de cotas, estes tipos corretores do risco são, não critérios de imputação objetiva, mas causas de exclusão da ilicitude.
Quando se verificam, não há sequer o desvalor da conduta para ser subsumível a um tipo incriminador em causa  a sua verificação é, por isso, uma causa
de exclusão da tipicidade do facto.

Imputação objetiva: a interrupção do nexo causal, causalidade cumulativa e causalidade alternativa

Interrupção do nexo causal: são situações em que existem dois processos causais, que concorrem entre si para a produção de um resultado, mas um deles
antecipa-se a outro e produz o resultado.
Ex.: o senhor A e o senhor B, sem saberem um do outro, aplicam à vítima (C) veneno, porque a querem matar. Contudo, o veneno do senhor A, ele aplica-o
em 1º lugar, mas é um veneno mais lento. O veneno do senhor B, apesar de aplicado depois, ultrapassa o outro da produção do próprio resultado.
Nestas situações de interrupção do nexo causal e nesta situação em concreto, dado que o veneno que produziu efetivamente a morte foi o veneno do senhor
B, o resultado da morte só será imputável ao senhor B.
O senhor A será apenas punido por tentativa de homicídio.
Falta aqui o requisito do nexo de causalidade em relação à conduta do senhor A.
A conduta do senhor A era, nos termos da teoria da conexão do risco, adequada a produzir o crime.
Nos termos da conceção do prof. Almeida Costa, a conduta do senhor A era apta a dar o domínio do facto ao agente.
Todavia, só em relação à conduta do senhor A é que se manifesta o nexo causal, pelo que o resultado morte só será imputado à conduta do senhor A ou do
senhor B (daquele que produziu a morte), o outro só será punido por tentativa.

Causalidade cumulativa

Ex: o senhor A e o senhor B querem matar o senhor C e escolhem o veneno, e cada um aplica a sua dose. Só que cada uma das doses, isoladamente
considerada, não era apta para produzir a morte. Se tivesse só um aplicado, o senhor A não morreria. No entanto, as duas doses juntas vêm a produzir o
resultado.
Como resolver estes casos de causalidade cumulativa?
. DEPENDE, existem três sub-hipóteses:
Se o senhor A e o senhor B não sabem do projeto criminoso um do outro
 aqui no se pode imputar o resultado, porque as condutas serão adequadas ou aptas a dar o domínio do facto, mas não produzem efetivamente o resultado,
pelo que os dois serão punidos a título de tentativa (tentativa inidónea ou impossível, nos termos do ART.23º/3 CP).

O senhor A aplica o veneno sem saber que o senhor B fez o mesmo, mas
o senhor B viu o senhor A a aplicar a dose de veneno e sabe que a dose do senhor A é insuficiente e, então, aplica-lhe aquele bocadinho de veneno que lhe
falta, para que a conduta seja eficiente para produzir a morte.
É evidente que cada uma das doses continua aqui, por si só, a ser insuficiente, mas a situação muda, porque o senhor B aplicou uma dose que isoladamente
era insuficiente, mas ele sabia que a não a estava a aplicar isoladamente, mas estava a aplica-la apenas para acrescentar o que faltava para dar ao veneno o
carater letal que pretendia.
Aqui, a consequência será diferente:
O senhor A, que não sabia do senhor B, continua a ser punido por tentativa inidónea ou impossível.
Já o senhor B será punido a título de consumação, quer à luz da teoria da adequação, que está subjacente à teoria da conexão do risco, porque ela é
adequada a produzir o resultado em função das circunstâncias do caso.
O mesmo se diga no quadro da doutrina do prof. Almeida Costa, na doutrina do facto – o senhor B ao aplicar a parte de veneno que lhe faltava, ele passa a
ter domínio sobre a produção do resultado morte.
O caso de os dois atuarem concertadamente, mediante acordo  em COAUTORIA – dois agentes ou mais acordam, entre si, colaborar na realização de um
crime.
Nestes casos de coautoria, há uma imputação recíproca do comportamento de cada um dos agentes aos demais – é como se cada um isoladamente
considerado tivesse praticado o crime.

Ex: o senhor A e o senhor B são sobrinhos de um tio rico e, para herdar rapidamente e tornar o seu projeto menos visível, combinaram entre si ir
envenenando-o aos poucos.
- Neste caso, eles vão ser responsabilizados pelo crime na sua globalidade, como se o tivessem praticado isoladamente.

Causalidade alternativa: é uma situação difícil e que, no entendimento do prof., a doutrina tem defendido uma situação pouco correta.
Quais são os casos da causalidade alternativa?
São os casos em que duas pessoas de forma independente, sem saberem um do outro, praticam atos que por si só são adequados para produzir o resultado,
só que em Tribunal, não se consegue provar qual das duas condutas produziu efetivamente o resultado.
Ex (1): o senhor A aplica uma dose de veneno, que é apta a produzir a morte e o senhor B também aplica uma dose de veneno apta a produzir a morte.
Prova-se em tribunal que a morte foi causada por um dos venenos, mas não se sabe qual.
Ex (2): o senhor A e o senhor B têm um grande inimigo: o senhor C, que costuma ir todas as tardes ver uma propriedade na aldeola onde vivem e cada um
deles põe-se escondido, um do lado direito e outro do lado esquerdo do caminho que a vítima (C) costuma fazer para ir ver a tal propriedade.
E, pelas coincidências do acaso, disparam os dois ao mesmo tempo, nem deram um pelo outro, e um acerta no coração e outro acerta na cabeça.
Qualquer dos tiros era, por isso letal.  Só que não se consegue provar em tribunal qual dos dois tiros produziu o resultado.
E, qual é a solução da doutrina?
Na doutrina maioritária, e em Processo penal vigora o in dúbio pro reo, pelo que necessariamente, neste caso, se não se pode provar qual dos dois tiros ou
dos venenos, produziu a morte, não se pode imputar a morte a nenhum dos agentes, pelo que os dois serão apenas punidos por tentativa.

O prof. Almeida Costa discorda desta solução: Se o fundamento da atenuação da tentativa é a existência de um menor alarme social, que em geral, é um
argumento que é valido, neste caso não o é. O alarme social é, no fim de contas, a impressão na comunidade.
O que é facto, é que nesta situação verificou-se um resultado, em consequência de duas condutas que eram idóneas a produzir o resultado.
Portanto, significa que falta esse elemento de menor alarme social que justifique a atenuação da pena da tentativa por referência à consumação.
E, por isso, na base desta fundamentação, falta aqui o fundamento da aplicação da figura da tentativa, pelo que os agentes devem ser os dois punidos pelo
crime consumado.

Tipo subjetivo (do ilícito doloso):


refere os elementos de natureza subjetiva que interferem naquele ilícito.

O tipo subjetivo incriminador doloso é constituído, por definição, pelo próprio dolo.
E, o dolo é entendido como o conhecimento e vontade de realizar o tipo ilícito, por oposição à negligencia.

Na negligencia o agente não quer praticar o ilícito típico, mas por descuido ou leviandade, sem querer lesa ou põe em perigo o bem jurídico.

Quanto ao ilícito doloso, o elemento subjetivo por excelência é o próprio dolo, caracterizado por conhecimento e vontade de realização do tipo objetivo
O agente representa todos os elementos constitutivos do tipo objetivo na situação material e, depois, quer realizar/ há um ato de vontade para realizar o
ilícito típico.
Este é o elemento geral do tipo subjetivo incriminador do ilícito doloso.
Em casos especiais, o legislador consagra ainda elementos subjetivos especiais (certas intenções, p. ex., na burla é preciso também uma intenção de
enriquecimento e não somente o dolo, certos aspetos do carater, certas tendências).
Estes elementos especiais respeitam a casos particulares.

Por excelência, o elemento comum imprescindível para termos um ilícito doloso é o próprio dolo. O dolo comporta assim (aqui a doutrina é unanime):
Elemento intelectual: traduz-se no conhecimento.
O agente tem de saber que numa determinada circunstância estão preenchidos, em concreto, os elementos integradores do tipo objetivo em que estão.
Ex: o senhor A está à caça e vê um vulto atras de um arbusto e julga que é uma peça de caça, dispara e mata. Vem-se a ver e era uma pessoa. Ora bem,
temos de excluir aqui o dolo do homicídio porque ele não queria matar ninguém, ele julgava que estava a disparar contra uma peça de caça.

- A sua conduta será, porventura, censurável, mas não a título de dolo, talvez tenha havido negligencia, mas falta o elemento intelectual (o dolo).
Elemento volitivo: o agente quer praticar esse crime.
Elemento emocional (acrescentado pelo prof.): seria um elemento da culpa doloso e que se traduziria na tal expressão de uma atitude de contrariedade ou
de indiferença perante o “dever ser” jurídico-penal.

É evidente que esta posição é prisioneira do entendimento do dolo como um dolo natural, que vem do sistema clássico.
O dolo natural é o puro nexo psicológico que liga o agente ao facto.
Porém, no quadro de uma correta compreensão do ilícito pessoal, o entendimento do dolo não pode ser visto desta forma.
A diferença entre o plano do ilícito e da culpa não está no substrato do objeto de valoração.
Em ambos os casos nos tínhamos a mesma unidade o subjetivo- objetiva:
Tanto o juízo de culpa, como o juízo de ilicitude, incidem sobre o mesmo objeto: aquele facto doloso.

O que varia é o critério de valoração: no plano do ilícito valora-se aquela situação como ato humano em geral e atribui-se o sentido que teria se tivesse sido
praticado por qualquer pessoa (plano objetivo).
Ao passo que no plano da culpa estamos a entendê-lo como ato do concreto agente e a valorá-lo tomando em consideração as características do concreto
agente (plano subjetivo e pessoal).

Também no ilícito, ainda que medido à luz do critério do homem medio, a pratica consciente e voluntária do ilícito exprime uma atitude de contrariedade
ou de indiferença com o dever ser jurídico-penal (elemento emocional).
Este sentido emocional do ato a um nível do juízo de ilicitude dolosa é um elemento implícito, pois é o sentido de um ato como ato humano em geral.
Este elemento emocional, permitirá ultrapassar muitas das contradições que a tradicional doutrina do ilícito pessoal em matéria de erro.
Tendo em conta estes elementos, ir-se-á começar pela caracterização do elemento intelectual:
Elemento intelectual – Traduz-se no conhecimento da factualidade típica.

No caso do furto o agente tem de ter a noção que a coisa que ele se está a apropriar é alheia.
Se ele julga por equívoco que é sua ele não está a praticar um furto.
Falta o elemento subjetivo que, neste caso, é o dolo.

Este conhecimento abrange toda a factualidade típica, toda a descrição constante do tipo incriminador objetivo:
O objeto da sua conduta é uma pessoa humana;
Estar perante uma coisa móvel e alheia;
Tem de representar a aptidão causal para ofender ou colocar em perigo esse mesmo bem jurídico - tem de ter conhecimento dessa factualidade típica.
Na descrição da factualidade típica, o legislador utiliza na maior parte das vezes elementos descritivos, mas também elementos normativos.
O elemento descritivo limita-se a descrever o pedaço da realidade objetiva – é um conceito descrito apto à mera subsunção.
Contudo, muitas vezes o legislador utiliza também elementos normativos, que consistem num apelo a juízos de valor.
Para descrever a uma realidade fáctica, em vez de utilizar conceitos descritivos, utiliza conceitos normativos (que envolve ele próprio a referência a
determinada situação fáctica).

O problema que se coloca em relação aos elementos normativos é que grau de conhecimento deve exigir-se?
Se se trata do elemento normativo de índole ético social, o agente tem de representar o substrato fáctico associado a esse elemento normativo de índole
técnico social.
O problema é quando o agente lança mão de conceitos normativos de índole técnico jurídica, regra geral pertencentes a outros ramos de direito (boa-fé,
bons costumes, ato administrativo, etc).
Coloca se o problema se nestes casos de elementos normativos de índole técnico jurídico para afirmar o elemento normativo do dolo vamos exigir um
conhecimento específico técnico jurídico  assim não pode ser, porque a maioria das pessoas não são juristas, uma que se assim fosse, só juristas
especializados é que os poderiam cometer a título de dolo.

Posto isto, na doutrina se generalizou uma fórmula: em relação aos conceitos de índole normativos de índole técnica jurídica, devia exigir se tão só um
conhecimento à esfera do homem comum/ leigo, um sentido associado pelo não jurista esses mesmo conceitos.

Beleza dos Santos (prof. prefere esta perspetiva) dizia que em relação aos conceitos normativos de índole técnico jurídica se existia tão-só que o agente
tivesse consciência dos efeitos práticos que se ligam a esses conceitos.
O homem comum não conceptualiza - quando se fala de propriedade ligamos aos efeitos práticos de se ser proprietário de qualquer coisa.
Portanto, quanto a estes conceitos normativos de índole técnico jurídico de que o legislador lança mão, devemos apenas exigir para se afirmar o elemento
intelectual do dolo que o agente represente na situação, na formulação de Beleza dos Santos, que o agente atualize os efeitos práticos da conduta.

Nota: Quanto aos elementos de índole técnico jurídica está em causa a sua expressão fáctica, a factualidade e não sentido pelo próprio elemento normativo
 isso tem a ver com elementos normativos, com o erro sobre a ilicitude.

Importará perguntar que tipo de conhecimento é este? É o conhecimento ao nível da consciência refletiva ou será ao nível daquilo que se viria a designar de
co- consciência?
A atuação inconsciente leva implícito um conjunto de conhecimentos que estão ao nível da co-consciência, mas que rapidamente podem ser atualizados ao
nível da consciência refletiva.
Ex.: Quando conduzimos um automóvel e metemos uma mudança são aspetos da nossa vida consciente que estão implícitos a qualquer comportamento.
Estes são os conhecimentos ao nível da consciência refletiva.
Estes conhecimentos levam implícitos todo um conjunto de conhecimentos acompanhantes, que podemos dizer que fazem parte do elemento intelectual – a
todo momento podem ser atualizado e estão implicados em toda e qualquer decisão consciente do individuo.

Para efeito de afirmação do elemento intelectual do dolo, o conhecimento que se exige não é apenas um conhecimento atualizado, ao nível da tal
consciência refletiva, abrange também os factos incluídos na tal co-consciência.
Deste modo, temos de determinar se o agente, em ato, representa ou não os elementos da factualidade.
Se os representa, então está preenchido o elemento intelectual.

E quando falta o elemento intelectual?


Temos o chamado erro sob a factualidade típica, que na nossa lei vem designado como erro sob as circunstâncias de facto  ART. 16º/1 CP.
O nº1 é um preceito longo que abrange duas coisas – vamos ater- nos a um desenho do erro sobre a factualidade típica.
Diz que o erro sobre elementos de facto (elementos descritivos) ou de direito (elementos normativos de índole técnico jurídica, cujo conhecimento exigido
é o conhecimento à esfera do leigo) de um tipo de crime, ou sobre proibições cujo conhecimento for razoavelmente indispensável para que o agente possa
tomar consciência da ilicitude do facto, exclui o dolo.
Se falta o elemento intelectual, falta o dolo.

O que sucede é o seguinte:


Nestes casos em que ao agente atua em erro sobre as circunstâncias de facto, o regime jurídico encontra se no ART. 16º/3 CP  Isto quer dizer que o erro
sobre as circunstâncias de facto, na parte em que corresponde à ausência do elemento intelectual de dolo, exclui o dolo.
Contudo, isto não significa a impunidade.
Significa que o agente pode ser punido a título de negligência.

Esta punição a título de negligência fica dependente do preenchimento cumulativo de dois requisitos:
Requisito formal – por razões de necessidade de pena a punição da negligência é excecional – ART.13º.
Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência.
Isto porque se entende que a negligencia não exprime a contrariedade e indiferença perante o
«dever ser» penal.
O agente quer praticar um facto lícito, não é de forma voluntaria que viola bens jurídicos.
Só nos casos mais graves é que se torna necessário punir a negligencia.

Requisito material – é preciso que se verifique o pressuposto material da negligência, que é a chamada violação do dever objetivo de cuidado.
Pelo simples facto de viver em sociedade estamos obrigados, em todos e cada um dos momentos da nossa

vida, a manter o grau de atenção, o grau de tensão psicológica necessária para antecipar as consequências dos nossos atos e para nos abstermos das ações
que podem lesar bens jurídicos.
Aí radica o fundamento e a expressão do desvalor da ação característico do delito negligente, que o opõe e o distingue do crime doloso.
Na negligência há apenas um descuido, uma leviandade, censurável, mas menos censurável que o dolo (não exprime a tal contrariedade aos valores
jurídico- criminais) e só punível a título excecional.

Voltando à temática do erro sobre a factualidade típica, é excluído o dolo


não será punido a título de dolo  isso resulta da parte final do ART. 16º/1.
E só é punível a título de negligencia – ART. 16º/3.
Contudo, para isso, é necessário verificarem-se cumulativamente os 2 requisitos.

Nisto se traduz o regime geral o erro sobre as circunstâncias de facto/erro sobre a factualidade típica.
Como modalidades de erros intelectuais existem outras.
Esta, prevista no ART. 16º/1 primeira parte é a mais simples, mas existem outras modalidades de erro que não estão previstas na lei, mas cujo regime
resulta do funcionamento das regras gerais atendentes à natureza do dolo e natureza do ilícito.
Estas modalidades especiais de erro intelectual são várias:
Erro sobre o processo causal;
Erro na execução;
Erro sobre a pessoa e o objeto;
Dolo generalis.

Erro sobre o processo causal


O senhor A quer matar o Senhor B por afogamento. O senhor A sabe que
o senhor B passa por uma ponte e quer atira-lo da ponte abaixo, e assim
o faz.
O senhor B não morre por afogamento porque quando cai à água já se encontra morto. Provou-se em tribunal que ele morreu em virtude do embate nos
pilares da ponte que lhe causou morte imediata.
Temos um desvio do processo causal – ele quer matar por afogamento, mas mata com o embate.

A doutrina, neste tipo de situações, sugere duas grandes posições:

Ambas partem de uma ideia que as torna indefensáveis:


- Partem da assunção do dolo do tipo como um dolo natural, ou seja, um dolo que se esgota no conhecimento e vontade de realização daquela concreta
factualidade.

Solução da tentativa;
Solução da consumação.

Na base deste entendimento, a dita solução da tentativa dizia que nestes casos nunca se poderia punir o agente pelo crime consumado a título de dolo.
Só se poderia punir por um concurso de crimes.
Ex.: no exemplo dado anteriormente - a tentativa de crime de homicídio por afogamento, em concurso com o homicídio negligente pelo embate na ponte.
Esta solução aplicar se ia a outras hipóteses:
Suponhamos que A quer ofender B dando-lhe um soco na cara e que, na base de uma esquiva previsível, vem a atingir-lhe no tórax.
Fala-se novamente num concurso de crimes  ofensa à integridade física por tentativa em concurso com uma ofensa à integridade física negligente.

Trata se de uma distorção da realidade – não corresponde ao sentido das valorações jurídico- criminais.
É irrepreensível do angulo da coerência interna: Se o dolo é conhecimento e vontade daquela factualidade típica, não podemos imputar, a título de dolo,
uma factualidade típica diferente da que foi representada pelo agente.
Houveram várias doutrinas a criticarem, mas foi este absurdo nesta solução que tinha consequências práticas inaceitáveis.
Já estudamos que a negligência é punida a título excecional – só quando o legislador o declarar.

Deste modo, nestes casos, sempre que o crime não fosse punível a título de negligência, a regra de concurso já não poderia ser punida.
Apesar de te produzido a lesão do bem jurídico, o agente só seria punido por tentativa.

Por outro lado, a punição da tentativa também é excecional.


Só quanto ao crime consumado corresponder a pena superior a 3 anos de prisão ou o legislador expressamente o declarar  o que poderia levar à assunção
da impunidade.

Outro exemplo absurdo é o seguinte: O crime de dano quando se reporte a bens ou ao culto religioso é agravado.
Suponhamos que alguém queria destruir uma estatueta religiosa num templo, disparando sobre a estatueta, não acertando na estatueta, mas no seu suporte
correspondendo no mesmo resultado, acabando por partir a estatueta.
Segundo esta doutrina o agente não poderia ser punido por um crime de dano qualificado doloso consumado.
Teria de ser punido pela tentativa de dano consumado com um crime de dano negligente.
A tentativa de dano qualificado em concurso com o dano negligente.

Só que o dano não é punível a título negligente e ele vai ser punido a título de tentativa.

A solução é absurda porque distorce a realidade da vida e leva a soluções insustentáveis.

Isto levou a generalidade da doutrina a aderir à solução da consumação


 no seu resultado a solução da consumação chega a uma solução satisfatória, dizendo que quando houver um desvio do processo causal e o agente venha
a atingir o mesmo bem jurídico, produzindo o resultado que queria, só que por meios do através de um processo causal diferente, haverá que perguntar se o
processo causal efetivamente ocorrido era ou não uma consequência previsível da conduta – cabia ou não ainda no perigo típico da conduta.
Ex.: quem atira alguém de uma ponte, este ato pode ter várias consequências, e todas elas são previsíveis:

ele pode morrer por afogamento;


pode morrer por embate nos pilares;
pode morrer por um barco atropelado;
poder nem morrer.
Tudo isto são consequências previsíveis do crime típico, inerente à consumação.
A teoria da consumação dizia que, ainda que através de um processo causal diferente do que foi projetado pelo agente, o resultado se viesse a verificar,
ainda que de acordo com o processo causal que constituísse a concretização do perigo tipo da conduta, o erro não relevava  o agente seria
responsabilizado dentro dos quadros da unidade criminosa, i.e., pelo crime doloso em causa.
Ex.: No nosso exemplo o agente seria punido na mesma, a morte foi produzida por um agente causal que é concretização pelo perigo típico da conduta  O
agente seria condenado por homicídio doloso.
Só assim não sucederia, se não se tratasse de um perigo típico.
Ex.: Imaginemos que a vítima chega água vivo e tenta nadar para a margem, e aparece um tubarão que o comeu - o aparecimento de um tubarão, por
exemplo, nas águas quentes do Porto não cabe nas consequências previsíveis da conduta.
- Neste caso, ele seria apenas punido por tentativa, já que o resultado provém de uma causa que não era antecipável.
. O ataque do tubarão não é uma consequência adequada da conduta.  É uma consequência política- criminalmente aceitável.
Embora esta doutrina conduza a resultados aceitáveis, ela é insustentável no plano dogmático, já que estes autores partem da conceção do dolo do tipo
como um dolo natural.
O dolo é conhecimento e vontade daquele concreto resultado, com aquele processo causal concreto que foi pensado pelo agente.
Eles admitem que o processo causal não é conhecido pormenorizadamente.
Ex.: Aquele que envenena não sabe quais são os processos biológicos que se passam dentro da vítima.

Conhece os efeitos gerais do ato e o sentido global do ato.

Portanto, a solução da consumação parte desse entendimento do dolo.


Estes autores consideram, dentro dos efeitos gerais e do sentido global do ato, preenchido o perigo típico, não apenas quando se trate uma variação de uma
das possíveis consequências do processo causal que cabe no perigo típico da conduta, alargando-a a situações que constituem processos causais
independentes.
Embora conduza a soluções aproximadamente corretas esta solução da consumação é dogmaticamente imprestável por ser incongruente.
Essa incongruência parte do dolo do tipo.

Conceção do Prof. Almeida Costa - Está harmonizada com a conceção do ilícito pessoal.
No plano do ilícito nós estamos a valorar a situação da conduta como se tivesse sido praticada pelo homem médio, i.e., sentido do ato humano em geral.
Não estamos aqui a falar do dolo do concreto agente, mas sim do dolo do homem médio se tivesse nesta situação.
No plano do ilícito pessoal aquilo que temos de fazer é transplantar os elementos intelectuais evolutivos do concreto agente para a cabeça do homem
médio.
Se o homem médio quisesse realizar esta conduta nesta situação o que é que ele representaria como consequência da sua conduta?
Ex.: Voltemos ao exemplo da ponte: o homem médio sabe a altura que tem a ponte, sabe que quer atirar a ponte abaixo.
O homem médio antecipa uma série de consequências para o seu ato.  O seu ato pode ter uma multiplicidade de consequências e todas são consequências
típicas da sua ação.
. O homem médio sabe que a vítima pode vir a morrer de várias formas, e até pode nem morrer, sofrendo só ofensas à integridade física.
Como ato humano em geral, no plano do ilícito pessoal doloso, o ato de atirar outrem abaixo de uma ponte pode ter como consequência a morte, ou tão-só
ofensas à integridade física ou pode até não ter nada. E, quaisquer destes processos causais alternativos, cabem no dolo do homem médio.

A este propósito podemos falar do dolo alternativo do homem médio: quando alguém representa que a sua conduta pode preencher um crime ou outro
ainda.
Diz-se que, independente do crime que ele antecipou como consequência possível da conduta, este crime consumado é-lhe imputável.
É este dolo do homem médio que caracteriza o elemento subjetivo dos crimes dolosos.

Deste modo, sempre que o processo causal efetivamente ocorrido, ainda que não tenha sido aquele que tinha sido querido em 1º lugar pelo agente, mas
caiba na previsibilidade do homem médio, no âmbito do dolo do homem medio, ele será responsabilizado a título de dolo.
Ex.: Ele queria matar por afogamento, mas morre pelo embate nos pilares  será punido tão-só pelo crime doloso consumado.
O problema põe-se quando não há identidade típica:
Ex.: Ele queria matar, mas a vítima consegue nada até à margem, provocou-lhe apenas ofensas à integridade física. Como é que vamos resolver o caso?
Aqui convoca-se uma figura do concurso aparente legal ou por normas, preenche mais do que 1 tipo legal de crime  deve-se recorrer à solução de
consolução que se traduz em subsumir aquele tipo legal que melhor retratar o desvalor intrínseco do ato.
Ex.: Suponhamos que ele queria matar por afogamento, mas acaba por não matar por afogamento, sendo que a vítima acaba por sofrer apenas ofensas à
integridade física.
O agente será punido por ofensas à integridade física consumadas ou deverá ser punido por tentativa de homicídio?
. Tentativa de homicídio  é + gravemente punida que as ofensas à integridade física consumadas.
O ilícito doloso é uma unidade objetiva-subjetiva e, destas duas figuras, aquela que exprime melhor o desvalor do ato é sem dúvida a figura da tentativa de
homicídio onde esta presente o elemento subjetivo da vontade de matar.
o Entre as duas figuras, este dolus alternativo do homem médio, deverá ser punido pela tentativa de homicídio.

Dentro da solução pessoal objetiva deverá imputar-se o crime consumado, sempre que ele couber dentro da previsão do homem médio.
O sentido objetivo do ato é aquele.

Se há identidade típica ele é punido nos quadros da unidade criminosa – é, p. ex., homicídio doloso consumado.
Se é uma consequência diferente e que leva a que não haja identidade típica, aí funcionará a regra do concurso aparente legal ou por normas.
E se não era previsível?
Caso do tubarão: aí ele será punido pela tentativa do crime projetado.  Seria punido pela tentativa de homicídio.

A solução a que o prof. Almeida Costa chega para o erro sobre o processo causal vai ser a mesma para uma figura que está próxima, embora a generalidade
da doutrina não a trate como tal: o erro na execução.
No erro sob o processo causal o agente ofende o mesmo objeto, só que através de um processo causal diferente daquele que projetou.
No erro da execução o agente, devido a uma execução defeituosa, atinge um objeto diverso.
Ex.: A quer matar B, dispara sob B e acerta em C há um desvio sob o processo causal só que atinge um objeto diverso.

A doutrina maioritária inclina-se para solução do concurso:


Ele vai ser punido pelo crime projetado a título de tentativa e a título consumado a título de negligência.
Com todas as dificuldades associadas: desde logo,
o resultado pratico de a tentativa só ser excecionalmente punida, em relação a crimes que não forma consumada sejam punidos com pena superior a 3 anos;
e a negligência também só é punida excecionalmente, o que pode conduzir a situações insatisfatórias, nomeadamente, à impunidade do agente;

Posição do Prof. Almeida Costa: verdadeiramente estas situações de erro na execução não tem autonomia em relação às de erro no processo causal.
Ex.: A está a uma distância grande e quer matar B, sendo que este se encontra a conversar com C à janela. Suponha-se que A aponta na direção da cabeça,
mas acerta no coração.
Ele atinge o mesmo objeto, mas com um processo causal diferente que projetou.

Que diferença tem esta situação em relação àquela em que o erro de 40 cm faz com que a bala não atinja B, mas sim C.
O homem médio não representaria a possibilidade de atingir C?
 tinha de representar.
No quadro do dolo do homem médio ele tinha de representar várias hipóteses: acertar um órgão vital; não acertar um órgão vital; falhar o tiro; acertar na
pessoa ao lado, etc.
. O desvalor do ato é o mesmo. O sentido do ato é o mesmo.
Deste modo, a situação do erro na execução, em que o agente atinge um objeto diferente do inicialmente projetado, devam ter a mesma solução das
situações de erro sobre processo causal.
. A figura do erro do processo causal, do ponto de vista do regente da cadeira, abrange também as situações de erro na execução ou as situações que são
autonomizadas como de erro na execução.
. O facto de o agente atingir o mesmo objeto ou outro objeto não atinge o sentido da antinormatividade da conduta – também aqui o problema será o
recurso ao critério do dolo do homem medio (“que sentido é que o homem medio daria a esta conduta? Que consequências associaria a esta conduta?”  se
na base da situação fosse de prever, à luz do critério do homem medio, que o tiro tanto poderia ter a consequência de acertar no A de diferentes formas,
como no B, a solução deve ser a mesma que
Casos especiais de erro intelectual  não estão regulados expressamente na lei, mas cuja solução resulta dos pp gerais:
Erro sobre o processo causal
Erro sobre a execução;
Erro sobre a pessoa ou sobre o objeto.

Erro sobre a pessoa ou sobre o objeto


Ex (1).: O senhor A quer matar o senhor B e sabe que ele passa sempre na mesma Rua. Esconde-se e quando vê um vulto a aproximar-se, que parece ser o
vulto do sr. B, dispara e mata.
Todavia, vem a verificar- se que não era B, mas sim C. ele queria matar B, mas matou C.  errou sobre a pessoa que queria atingir.
Ex (2).: A quer furtar uma caixa de metal e julga que essa caixa é de latão, mas afinal é de ouro. Ele quer furtar uma caixa de latão de valor insignificante
que integraria um furto simples.
Todavia, vem a furtar uma caixa de ouro.  A graduação da responsabilidade pelo furto, entre outros critérios, depende do valor da

coisa furtada. Pelo que o fruto da caixa de ouro integra um furto qualificado.
Como resolver estes casos?
Há aqui que distinguir consoante o crime projetado e o crime consumado sejam subsumíveis ao mesmo tipo legal de crime ou, pelo contrário, não se
verifique identidade típica entre o crime projetado e o crime consumado.
Afirmamos identidade típica sempre que o crime projetado seja subsumível ao mesmo tipo legal do crime consumado, que era diferente daquele que o
agente desejava realizar.
Não há identidade típica quando o crime projetado e o crime consumado não cabem no mesmo tipo legal.
O que está aqui em causa é a questão de saber se o crime projetado e o crime consumado cabem no mesmo tipo incriminador.

No 1º exemplo havia identidade típica  ele queria matar B e matou C, ele queria praticar um homicídio simples e praticou um homicídio simples com a
única diferença de ter atuado esse homicídio numa pessoa diversa do que aquele que pretendia.
No 2º exemplo, não temos identidade típica.  Ele quer em ambos os casos furtar a caixa de latão. O crime projetado cabia no furto simples, que tem uma
pena menor do furto qualificado a que é subsumível o crime consumado.
Este é o primeiro ponto de partida para a solução sobre o erro da pessoa ou sobre o objeto.
Quanto aos casos em que há identidade típica a doutrina é unânime  o agente vai ser punido por um crime consumado a título de dolo, ou seja, dentro de
uma unidade criminosa.
O argumento tem que ver com o facto de que a norma do homicídio não prevê que se mate A, B ou C.
A norma do furto não proíbe que se atente contra a propriedade de A, de B ou de C.
As normas proíbem qualquer conduta que atende contra o bem jurídico vida ou propriedade independentemente da identidade do titular do bem em causa.

Sempre que há identidade típica podemos dizer que ele preenche o tipo incriminador do tipo doloso em causa.

Ex.: A queria matar B, mas matou C  isso não releva para o desvalor da própria conduta – ele matou uma pessoa.
- Quando há identidade típica entre os crimes projetados e crimes consumados, a doutrina é unânime em punir o agente.

O problema surge quando não há identidade típica entre o crime projetado e o crime consumado:
A quer furtar uma caixa de metal e julga que essa caixa é de latão, mas afinal é de ouro. Ele quer furtar uma caixa de latão de valor insignificante que
integraria um furto simples.
Todavia, vem a furtar uma caixa de ouro. A graduação do furto depende do valor da coisa furtada Pelo que o fruto da caixa de ouro integra um furto
qualificado.

Como punir nestes casos em que o agente realiza um crime que não cabe no mesmo tipo legal que ele projetou?
Existem várias posições:
Em primeiro lugar, a doutrina portuguesa começou a tratar estes casos no quadro da unidade criminosa.
O Dr. Cavaleiro Ferreira dizia que o agente deveria ser punido pelo crime consumado a título de dolo.
Uma solução que parece contrariar os pressupostos do DP da culpa.
Ex.: O agente quer furtar uma caixa de latão, quer realizar um furto simples e vem a realizar um furto qualificado.
- Vamos imputar-lhe a título de dolo algo que ele não quis realizar.
Estamos a responsabilizar a título de dolo o agente algo que não representou e não quis  e, por isso, estamos a violar os pressupostos da culpa.
Já o Dr. Eduardo Correia dizia que sempre que não houvesse identidade típica entre o crime projetado e o crime consumado  o agente devia ser punido
pelo agente projetado, como se tivesse sido consumado.
Esta posição viola o princípio do DP do facto, dado que estamos a imputar ao agente um facto que na verdade não se verificou.
Ex.: vamos supor que A quer furtar uma caixa de metal, achando que ela é de ouro, mas afinal ela não é – É de latão. O agente quer realizar o furto da caixa
de ouro, mas, todavia, consuma um furto simples.

- Para o Dr. Eduardo Correia ele iria ser punido pelo crime projetado, ou seja, pelo furto qualificado.
Estas duas posições foram abandonadas.
Atualmente, a doutrina, seguindo a doutrina maioritária na Alemanha, consagrou a chamada SOLUÇÃO CONCURSAL.
No seguimento de Dr. Figueiredo Dias, a doutrina maioritária portuguesa diz que nestes casos de erro sobre a pessoa e o objeto, em que não se verifique a
identidade típica entre o crime projetado e o crime consumado  o agente deve ser punido pelo concurso da tentativa do crime projetado – a título de dolo
– em concurso com o crime consumado – a título de negligência.
Verdadeiramente esta doutrina, ao partir o crime numa situação de concurso, desde logo perverte o sentido/ unidade da situação e o sentido do ilícito do
caso e leva a dificuldades práticas  vazios de punição.
A punição da tentativa é excecional e a punição da negligência também é excecional, o que significa que se o crime projetado não for punido a título de
tentativa e o crime consumado não for punido a título de negligência, haverá vazio de punição.

Leva ainda a consequências absurdas:


Ex.: A quer praticar um furto simples e vem a praticar um furto qualificado. A, dentro desta solução, que diz que ele tem que ser punido pelo concurso de
crimes, só poderá ser punido a título de tentativa de furto simples, já que o furto não pode ser punido a título de negligência.
- Esta solução, para além de não refletir a unidade de sentido que é a concreta de situação, conduz a absurdos.

Posição do prof. Almeida Costa  joga aqui o conceito de dolo do homem médio e a compreensão de que no conteúdo do dolo do tipo interferem o
elemento emocional, o elemento volitivo e o elemento intelectual.
Esta posição aponta, ao contrário da posição maioritária, para o tratamento dos casos concretos no quadro de uma unidade criminosa  para isso temos que
convocar o conceito de dolo do homem médio.
No plano do ilícito o que determinados é o sentido da conduta como se fosse praticado por qualquer pessoa.
Ex.: Caso da Caixa de latão  o agente queria furtar uma caixa de latão, mas afinal ela é de ouro. Aqui interessa o sentido do ato como ato
humano em geral. Não avaliamos ainda o desvalor do ato daquele concreto agente.
Avaliamos o sentido daquele ato como ato humano em geral  critério do sentido do ato como se ele tivesse sido praticado pelo homem médio.
Ele quer furtar uma caixa de latão, mas afinal ela é de outro. Perante esta situação, se fosse o homem médio a atuar será que ele também erraria? Ele
também veria uma caixa de latão ou uma caixa de ouro?
Se de facto o homem médio, perante aquela situação, representasse erroneamente que a caixa era de latão, então o sentido de antinormatividade aos olhos
de todas as pessoas seria um furto simples. Se as generalidades das pessoas caíssem aqui no erro temos aqui um crime de furto simples.
Na hipótese inversa se o homem médio visse que era uma caixa de ouro, então aí temos o ilícito típico do furto qualificado, não importando se o agente era
inimputável ou estava numa situação de não exigibilidade, uma vez que isso se mede ao nível da culpa.
Ex.: Imaginemos que ele não quer furtar uma caixa de latão, mas sim uma caixa de ouro, mas aquilo que ele julga que é ouro é latão.
Se o homem médio achasse que era latão, aí temos furto simples porque o sentido social é um furto simples  No plano do ilícito aquilo que temos é um
furto simples.
Se o homem médio também errasse, i.e., a generalidade das pessoas olhando para aquela caixa ficaria convencido que era de ouro.
. Não se verificando o resultado, porque de facto o agente apenas furtou erradamente uma caixa de latão, ele seria punido por uma tentativa de furto
qualificado.
. Havia o desvalor da ação, porque ele queria praticar um furto qualificado, mas não há desvalor do resultado, pelo que seria apenas punido por uma
tentativa de furto qualificado.
 Sintetizando: na conceção do Dr. Almeida Costa, perante as situações de erro sobre a pessoa ou objeto em que não há identidade típica aquilo que temos
que fazer é questionar qual o sentido do ato se praticado pelo homem médio e atribuímos ao ato o significado que teria na conceção do homem médio.
Com uma única exceção: se a representação do homem médio não tenha correspondência com o resultado (e aqui ele será punido pela tentativa do crime
projetado).
Se houver identidade típica entre o crime projetado e o crime consumado, aí o erro não releva, sendo ele punido pelo crime consumado pelo título de dolo.
Se não houver identidade típica devemos questionar se o homem médio com esta representação teria errado ou não

teria errado, em função do resultado qualificar o caso como se fosse praticado pelo homem médio.
Depois do erro sobre pessoa e objeto importará estudar outra figura, que é talvez a que suscita mais duvidas na dogmática  Dolus generalis.
Dolus generalis.
A generalidade da doutrina avança várias posições.  A doutrina em relação a nenhuma delas fica satisfeita.
O prof avança com uma posição que também não o satisfaz plenamente, apenas se julga que será um “mal menor” em relação às demais soluções
avançadas.

Antes disso: a que situações práticas o dolus generalis se reporta?


Ex.: A quer matar B com uma paulada. B fica caído inconsciente no chão e A acha, de facto, que matou B. Ele não está morto, encontra-se vivo, mas A, o
agressor acha que o matou e quer se ver livre do corpo. A pega em B e atira-o ao rio. B acaba por morrer em virtude do afogamento.
As situações de dolus generalis (= dolo geral) reportam-se a estes casos em que o agente produz o resultado pretendido, mas produ-lo, não em resultado da
conduta que ele projetou, mas em virtude de um ato posterior (via de regra, praticado como ato de encobrimento).
Tanto os atos de execução como os atos de encobrimento relevariam para o dolus generalis.
Vamos ver que as soluções avançadas na doutrina assentavam numa analogia com o erro sobre o processo causal.
A doutrina diz que estamos perante uma situação análoga, já que o agente produz o resultado pretendido, só que através de um processo causal diferente
daquele que causou.
A jurisprudência alemã maioritária diz que é previsível que depois da prática do crime haja atos de encobrimento.
Este erro sobre o processo causal é um erro irrelevante.

Outra doutrina vem dizer que nem sempre é previsível. O agente pode praticar ou não praticar. A morte resultante de ato de encobrimento pode ser ela
própria imprevisível.
Ex.: A quer matar B à paulada. B fica apenas inconsciente. B quer se desfazer do corpo e leva-o para uma lixeira. No caminho para a lixeira, A sofre um
acidente e B acaba por morrer não da paulada, mas sim do acidente.  será punido só por tentativa.

Outros autores vêm dizer que o encobrimento pode ser previsível ou não, tendo de fazer depender isto do facto do agente já ter projetado ou não o ato de
encobrimento.
Se já projetou, podemos considerar no seu todo o processo criminoso (atos de execução e o ato de encobrimento) e ver se na sua globalidade este processo
era adequado ou não a produzir o resultado.

Não faltam autores que avançam diretamente para solução concursal.


Todas estas soluções assentam no paralelismo do dolus generalis
com o erro sobre o processo causal.
- Prof. considera todas insuficientes.
Na perspetiva do Dr. Almeida Costa a analogia deve ser feita com o erro sobre a pessoa ou o objeto.
Ex.: O senhor A que dá uma paulada a B, convencendo-se que o deixou morto. Mas abandona-o.
Um amigo dele vê o sucedido e tendo de encobrir A pega no cadáver e atira-o ao rio.
Nesta situação quanto ao senhor A teríamos uma tentativa de homicídio.
Quando ao segundo momento, realizado por um terceiro  caso de erro sobre o processo causal em que não há identidade típica.
O esconder ou destruir o cadáver é o crime de profanação de cadáver do ART. 254º CP. O amigo apenas pretendia profanar o cadáver, mas sem saber acaba
por consumar o homicídio. Ele julga que está a atuar sob um homem morto, mas está a atuar sob um ser vivo. Assim temos um erro sob a pessoa e o objeto.
Isto quando aquele que pratica o ato de encobrimento é pessoa diversa do que aquele que que deu a paulada.
-- E quando é a mesma pessoa que deu a paulada a praticar o ato de encobrimento?  A situação é a mesma.
Temos uma tentativa de homicídio quanto à paulada dada. Porém, relativamente ao segundo acontecimento  o ato de encobrimento – aqui o agente erra
quanto à pessoa ou objeto. Por outras palavras, há um segundo momento em que o agente erra sob a pessoa ou objeto que deve ser resolvido consoante o
referido atrás:
. se aderimos à posição tradicional será a solução concursal, porque aqui não há identidade típica. Isto que era válido para o caso de o ato de encobrimento
ser realizado por terceiro continua a ser válido quando o ato de encobrimento é praticado pelo autor da agressão.

. Se seguirmos a posição do Prof. Almeida Costa a solução será dada pelo quadro da unidade criminosa. Devemos questionar se o homem médio também
erraria.
se o homem médio também veria naquele corpo um corpo morto
 Deste modo, o agente seria punido pela tentativa de homicídio em concurso com a profanação de cadáver.
Se, por outro lado, o homem médio não errasse, qualquer pessoa olharia para aquela pessoa e veria que ele estava vivo. Então qual seria o sentido do ato?
 Seria de um homicídio consumado.
Para determinar o elemento intelectual do dolo ou a falta dele, vamos analisar uma última modalidade de erro  ERRO SOBRE AS PROIBIÇÕES.
Verdadeiramente o erro sobre as proibições não é um erro sobre as circunstâncias de facto – o agente tem um incorreto conhecimento do circunstancialismo
fáctico em que atua.
Embora represente corretamente esse circunstancialismo fáctico, não toma consciência do caracter ilícito daquela conduta.
Este erro sobre as proibições está paredes meias com o erro sobre a ilicitude, que se traduz numa situação em que o agente tem o correto conhecimento do
circunstancialismo fáctico, só que não atualiza/ representa o caracter ilícito da conduta.
A diferença está na diferente natureza das proibições dos ilícitos de um caso e noutro.
Ilícitos como matar, furtar, etc, tratam-se de ilícitos que estão desenhados na lei há muito tempo e que, por isso, são dotados de uma grande constância
histórica e que, nessa medida, as pessoas logo os apreendem através dos processos de integração social normais – a criança vai apreendendo esses
conteúdos de ilícito.

Simplesmente, como vimos desde o início, o Direito Penal intervém em todos os setores de atividade social sempre que estejam em causa lesões graves de
bens jurídicos fundamentais que não possam ser acautelados através de sanções de outros ramos do Direito e, nessa medida, há o fenómeno das
NEOCRIMINALIZAÇÕES  condutas lícitas, ou pelo menos indiferentes para o Direito, que se vêm a revelar que afinal são socialmente danosas a ponto
de justificarem a intervenção do Direito Penal.
Este fenómeno pode observar-se, essencialmente, no âmbito do Direito Penal secundário.
E estas proibições, por um lado, pela sua novidade e, por outro lado, pelo facto de estarem ligadas a conhecimentos muito especializados de ordem técnica
e científica, escapam ao conhecimento do homem comum (o seu

conhecimento não é dado através dos processos de integração social normal).


Ex.: devido a investigações científicas demonstra-se que há uma nova partícula com uma influência terrível no buraco de ozono e em virtude disso o
legislador impõe a utilização de um novo filtro adicional nos escapes dos automóveis, punindo criminalmente quem não aplicar esse filtro adicional.
- Suponha-se que A, fiel ao Direito, não conhece essa proibição e entra no seu automóvel, que não tem esse filtro. É evidente que ele atuou com o
conhecimento correto da situação, o que ele ignora é o caráter proibido de andar com o automóvel sem o tal filtro adicional no escape.
Esta situação é muito diferente, embora tenha em comum o conhecimento da realidade fáctica e a ignorância da lei, do erro da ilicitude em que o agente
ignorava ilícitos há muito interiorizadas na consciência axiológica comunitária (dotados de grande constância histórica).
o Ora, é esta a situação do erro sobre as proibições.

E o que o nosso legislador, na esteira da doutrina portuguesa, nomeadamente na esteira do Dr. Figueiredo Dias, autonomiza estas situações no sentido de
dizer: se o facto doloso e o seu sentido é exprimir uma atitude de contrariedade ou de indiferença por oposição frontal ao dever jurídico-penal, é evidente
que nas situações em que estamos perante as tais proibições de caráter técnico ou especializado o agente não revela essa atitude de contrariedade.
Quanto muito o que lhe pode ser censurado é um descuido/ leviandade de não se ter informado devidamente.
O que aqui há não é um erro moral/emocional/ de valoração no sentido de que haja uma desconformidade entre a consciência axiológica individual daquele
concreto agente e a consciência axiológica comunitária, pelo que a conduta do agente não exprime uma atitude de contrariedade perante os valores jurídico-
criminais  o que exprime é a tal atitude, quando muito, de leviandade.

É por isso que a doutrina, embora as situações de erro sobre as proibições não sejam um erro sobre as circunstâncias de facto, diz que há aqui um erro
intelectual e, nessa medida, o regime do erro sobre as proibições deve ser o mesmo do erro sobre a factualidade típica.

Ao contrário do erro da ilicitude que se reporta às tais proibições dotadas de consciência comunitária e que exprimem uma atitude de contrariedade ou
indiferença punível a título de dolo, nos termos do ART. 17.º CP.
O erro sobre as proibições está regulado no ART. 16.º/ 1, segunda parte. Na primeira parte vimos que estava regulada a situação mais simples do erro sobre
as circunstâncias de facto, mas depois desta parte vem o erro sobre as proibições «O erro (…) sobre proibições cujo conhecimento for razoavelmente
indispensável para que o agente possa tomar consciência da ilicitude do facto, exclui o dolo.».
Exclui o dolo, porque o dolo envolve a expressão de uma atitude de contrariedade ou de indiferença perante um dever ser penal, repita-se.
Assim, neste caso, não existe essa atitude, apenas sendo censurável o descuido/ leviandade – numa palavra, ele apenas poderá ser punido a TÍTULO DE
NEGLIGÊNCIA. E isso mesmo diz o ART. 16º/3 CP.
Quer dizer que o erro sobre as proibições, embora seja diferente do erro sobre as circunstâncias de facto, tem isto em comum – é um erro intelectual que
não exprime um erro de valoração; e, nessa medida, subordinado ao mesmo regime do erro sobre as circunstâncias de facto: EXCLUI-SE o DOLO e o
AGENTE, a ser PUNIDO, é a título de NEGLIGÊNCIA.

Tem de estar aqui presente os requisitos formal e material em que assenta a punição a título de negligência:
Requisito formal – ART. 13.º CP  temos de estar perante um crime que, em abstrato admita a punição a título de negligência
Requisito material  resulta do ART. 15.º CP, onde o legislador carateriza a própria figura da negligência, que é esse erro se ficar a dever à violação do
‘dever objetivo de cuidado’.

Portanto, no erro sobre as proibições, tal como no erro sobre as circunstâncias de facto, o agente NUNCA será punido a título de dolo; e a punibilidade a
título de negligência só poderá ocorrer nos termos do ART. 16.º/ 3 CP quando verificados os pressupostos gerais da negligência.
Ainda a propósito do erro sobre as proibições importa reter um aspeto em que o professor Almeida Costa tem discordância em relação à doutrina
tradicional e que, mais uma vez, concretiza o tal entendimento do dolo do tipo (dolo do homem médio), que comporta tanto o elemento intelectual, como o
volitivo e o emocional – sendo este último que agora importa.

É que, para a doutrina tradicional, que assimilava o dolo do tipo ao dolo natural, nestas situações de erro sobre as proibições havia um dolo natural 
esgota-se no conhecimento e vontade da factualidade típica e o que é facto é que ele conhece os factos integradores do tipo objetivo da infração em causa.
Por isso, os autores diziam que nestas situações de erro sobre as proibições temos um ilícito doloso, só que depois, no plano da culpa, o agente só seria
punido por culpa negligente.
Esta posição foi seguida por vários autores, nomeadamente por Figueiredo Dias, que a divulgou em Portugal.

Ora, isto leva ao absurdo e a uma contradição entre o conteúdo do ilícito e o conteúdo da culpa.
No fim de contas, nestas situações, para a doutrina tradicional, nós tínhamos um ilícito doloso que depois ia ser punido a título de culpa negligente.

Deve dizer-se que esta posição ignorou que 24 anos depois o seu próprio fundador veio dar ‘o dito pelo não dito’. Todavia, ninguém ouviu isto e, seja como
for, esta é uma solução anacrónica.
No quadro do Direito Penal do facto, a culpa é sempre a culpa por um determinado facto ilícito, pelo que não faz sentido falar numa culpa negligente por
um ilícito doloso (posição que o fundador desta tese reivindicou os tais 24 anos mais tarde).

Ora, nenhuma destas dificuldades resulta no quadro da conceção do professor Almeida Costa.
Como se sabe, no plano do ilícito estamos a avaliar o sentido do ato como ato humano em geral, como se tivesse sido praticado por qualquer pessoa.
Nesse sentido, ao nível da avaliação da situação fáctica, vamos atender tanto aos elementos intelectuais, como aos volitivos e aos emocionais do agente  a
um sentido do ato.
E o que é facto é que, medido à luz do homem médio, ficcionando que o autor em causa tinha as características do homem médio, nestes casos de erro
sobre o processo causal logo no plano do ilícito temos de concluir que o homem médio, para conhecer da ilicitude, tinham de lhe mostrar a própria lei.
São as tais normas particularmente especializadas, cuja apreensão não resulta dos processos de integração social normal, pelo que só conhecendo a norma é
que o agente poderia ter consciência da ilicitude do facto.

Nesta medida, sempre que o homem médio não conhecesse a própria norma, verdadeiramente a sua ignorância nunca expressaria a tal atitude de
contrariedade ou de indiferença perante um dever ser penal.

Exprimiria, à luz do homem médio, a mesmíssima atitude de descuido ou leviandade.

Portanto, nas situações de erro sobre as proibições, logo no plano do ilícito, não temos nenhum dolo, uma vez que o sentido do ato como ato humano em
geral não é o do ato doloso (não exprime a desconformidade da consciência axiológica individual com a consciência axiológica comunitária).
Medido à luz do critério do homem médio, exprime o DESCUIDO ou LEVIANDADE, o que significa que nestes casos nós temos um ILÍCITO
NEGLIGENTE.
Desta forma garante-se uma congruência entre o sentido de culpa e o sentido de negligência exigidos no quadro do Direito Penal dos factos.

Desta forma garante-se uma congruência entre o sentido de culpa e o sentido de negligência exigidos no quadro do Direito Penal dos factos.
Elemento volitivo
Contudo, vimos desde o início que, para haver dolo, não basta o elemento intelectual que consiste no conhecimento e na atualização dos elementos
integradores do tipo objetivo; é necessário que o agente queira realizar o próprio ato.
E vamos ver que é neste elemento da voluntariedade da conduta que reside o elemento que, em última análise, vai permitir que nas zonas de franja se
distinga o ilícito doloso do ilícito negligente.
O dolo traduz-se, portanto, no conhecimento e vontade de realização do tipo  o crime é uma unidade subjetivo-objetiva que no âmbito dos crimes dolosos
se traduz numa congruência entre o lado objetivo e subjetivo do crime:
O agente projeta o crime e depois quer realizar o crime, sendo que este projeto e conhecimento e vontade de realização do crime traduzem-se na efetiva
realização desse projeto de crime.
Só que esta vontade pode traduzir-se de várias formas. E no âmbito deste elemento volitivo distinguem-se três modalidades de dolo:
Dolo direto (direto de 1º grau)
O dolo direto é quando o crime é a finalidade imediata e principal da conduta.
Quando falamos em dolo, em geral, estamos a pensar no dolo direto: A quer matar B, por isso dispara e mata.
A realização do crime é a finalidade primeira da atividade do agente.

Dolo necessário (direto de 2º grau)

Quando, em primeira linha, o agente não quer praticar um ato ilícito (quer realizar outra finalidade), simplesmente o crime surge como um efeito necessário
ou muito provável dessa mesma conduta.
Aqui fala-se de um dolo necessário, uma vez que o crime não é uma finalidade primeira, mas sim uma consequência dessa mesma conduta.
fala-se em consequência, quer dizer que é consequência da realização do fim primeiro, que até pode ser lícito ou indiferente para o Direito – NÃO É MEIO.
Ex.: alguém que mata o polícia que está à frente do banco para depois assaltar – dolo direto.
O dolo necessário é um efeito necessário/lateral do fim prosseguido pelo agente.

Dolo eventual
Aqui o crime surge, igualmente, como um efeito lateral ou secundário, mas que ao invés do dolo necessário, no dolo eventual há uma diferente
probabilidade.
Vimos que no dolo necessário temos um efeito inevitável/ necessário ou muito provável, ao passo que no dolo eventual é tão só um efeito possível dessa
mesma conduta.
Ex.: o senhor A detesta o senhor B, que tem uma casa de campo que visita às vezes nas férias. O senhor A decidiu incendiar a casa de B.
Sucede que o senhor B tem lá o vizinho a guardar o seu automóvel, e o senhor A sabe disso. Além do mais, o senhor B tem lá uma empregada de limpeza
que vai lá de vez em quando e em alturas que não são certas.
Neste contexto, A QUER DESTRUIR A CASA de B  fá-lo pelo fogo.
Temos aqui DOLO DIRETO em relação à casa;
Quanto ao automóvel do vizinho temos um DOLO NECESSÁRIO  ele não quer queimar o automóvel, contudo o ódio por B fá-lo prosseguir o incendio
na casa.
. Quer dizer, embora não seja a finalidade da sua conduta destruir o caso do vizinho, é uma consequência necessária (muito provável) da conduta de lançar
fogo à casa de B;

Mas além disso, se, por mero caso, estava lá a empregada, que falece em virtude do incendio  DOLO EVENTUAL, uma vez que temos uma
consequência tão só possível
Deve dizer-se que, de acordo com a doutrina mais recente, esta classificação das modalidades do dolo não tem que ver com qualquer elemento quantitativo,
no sentido de dizermos que um é mais grave que outro e que, por isso, deve ser punido mais gravemente que o menos grave.
De acordo com a doutrina pacífica, verdadeiramente esta distinção tem apenas que ver com a definição do âmbito do elemento volitivo do dolo, no sentido
de dizer que o elemento volitivo necessário para que possamos falar num dolo do tipo pode abranger tanto as situações de dolo direto, como dolo
necessário e dolo eventual  e tão-só isso.
Quanto à gravidade maior ou menor do dolo do agente, será algo a valorar-se em concreto.
São pensadas situações em que um dolo eventual pode ser mais grave que um dolo necessário e situações em que um dolo necessário é tão ou mais grave
que um dolo direto.
É, portanto, uma definição que contende com o âmbito de delimitação dos casos em que se admite falar do elemento volitivo do dolo, não importando, de
princípio, qualquer hierarquização valorativa entre estas modalidades de dolo.

PROBLEMA  distinção entre dolo eventual e negligência consciente.


Aqui suscitam-se alguns problemas, porque são figuras que estão ‘paredes meias’.
No dolo eventual o agente representa o resultado tão só como possível; e na negligência consciente também.
Aliás, o todas as modalidades de dolo estão reguladas no ART. 14.º CP, sendo que depois vemos que no ART. 14.º/3 CP está o dolo eventual, que pode ser
comparado com a negligência consciente, que está no ART. 15.º, alínea a) CP.
No ART. 14.º/ 1 temos o dolo direto;
No ART. 14.º/ 2 temos o dolo necessário;
No ART. 14.º/ 3 temos o dolo eventual  é neste elemento da conformação que está, nos termos da própria lei, a distinção entre dolo eventual e
negligência consciente.

Em ambos os casos o agente representa o crime como uma consequência tão-só possível da conduta; a diferença está num ELEMENTO SUBJETIVO:
«mas atuar sem se conformar com essa realização».
Nem sempre assim foi no passado – havia quem pretendesse estas situações de dolo eventual e situações de negligencia consciência com base num critério
objetivo – terroriza da verosimilhança (Dr. Figueiredo Dias chama teoria da probabilidade).  foi uma teoria que foi abandona por não dar um critério
preciso para a distinção.

Devemos ser muito cautelosos nesta situação de fronteira entre o dolo eventual e a negligência consciente, porque, como já vimos, o qualificarmos um caso
de dolo ou de negligência, para além de a negligência ser sempre menos punida que o dolo, significa que, por força do ART. 13.º CP, muitas vezes é a
fronteira entre a punição e a impunidade.  É que a punição da negligência é EXCECIONAL, sendo que, para todos os efeitos, a negligência consciente é
sempre modalidade de negligencia.
Assim, em muitas vezes, qualificarmos o caso de dolo eventual ou de negligência consciente estabelece, então, a fronteira entre a PUNIÇÃO e a
IMPUNIDADE.
Foi em virtude da insegurança do critério da verosimilhança (de distinção entre possibilidade e probabilidade), que no fim de contas deixava tudo nas mãos
de um juiz, que a doutrina optou por um critério subjetivo.

Houve várias formulações: anteriormente era a teoria da aceitação, depois veio a fórmula positiva de Frank, mais tarde houve a teoria da conformação,
sendo que todas elas apontam para o mesmo.
Assim, vamos ter em conta a teoria atual da TEORIA DA CONFORMAÇÃO.
A teoria da conformação diz que, perante o mesmíssimo elemento intelectual (em ambos os casos o agente apresenta a consequência como tão só possível)
nós vamos qualificar o ato como dolo eventual ou negligência inconsciente consoante o agente se conforme com o resultado.
Se estivermos perante a seguinte afirmação «aconteça o que acontecer, eu vou levar adiante a minha conduta» - neste caso o agente sobrepõe os seus
interesses ao dever ser jurídico-penal e, nessa medida, releva a tal atitude de contrariedade ou indiferença perante o dever ser jurídico- penal, que é
caraterística do dolo.
Portanto, o agente conforma-se com o resultado. Aqui estamos perante DOLO EVENTUAL.

Diferente é a negligência consciente. Aqui o agente representa o resultado da mesma forma como possível, todavia, ele atua porque está convencido de que,
naquela situação, e apesar de tudo, tudo irá correr bem.
i.e., o agente representa na mesma o crime como uma consequência possível da conduta, mas só atua porque está convencido de que naquele caso o
resultado não se vai consumar, isto é, não se conforma com a produção do resultado.
Nesta medida, a doutrina diz que o agente não revela a tal atitude de contrariedade ou de indiferença perante o dever ser penal; revela tão só uma atitude de
descuido ou leviandade, que é caraterística da NEGLIGÊNCIA.
Portanto, nesta diferença radicaria a linha de fronteira, de acordo com a teoria da conformação, entre dolo eventual e negligência consciente.

Contudo, isto leva-nos a levantar a questão: mas e se o agente não toma posição?
É que para a teoria da conformação as coisas são muito claras no sentido de que o agente toma uma posição expressa, mas muitas vezes nas situações da
vida as pessoas não chegam a tomar posição.
Então o que devemos fazer?
Houve na doutrina várias tentativas: houve quem o tentasse explicar através da fórmula de Frank, ainda que um pouco deturpada.
Segundo esta fórmula, nestes casos em que o agente não toma posição haveria que fazer uma ficção e perguntar o que é que o agente teria decidido se, em
vez de representar o resultado tão só como possível, o tivesse representado como uma consequência necessária e inevitável do seu comportamento.
Quer dizer que se vai ficcionar que naquele caso se estava perante uma situação de dolo necessário e não de dolo eventual.
E se, em face das características e da personalidade do agente, se chegasse à conclusão de que, se ele tivesse visto que era um efeito inevitável da conduta,
não teria avançado então estaríamos perante uma negligência consciente.
Se, pelo contrário, na mesma situação, atendendo às caraterísticas da personalidade do agente, concluíssemos que este teria na mesma avançado seria,
então, dolo eventual.

Esta posição é afastada, porque contraria o Direito Penal do facto, uma vez que estaríamos verdadeiramente a punir o agente, não por aquilo que ele fez,
mas por aquilo que ele é, isto é, em função de uma personalidade.

É por isso que, em relação a estes casos intermédios em que o agente não toma posição, é de seguir a fórmula da dupla negativa do Doutor Eduardo
Correia, que diz que quando o agente, representando o resultado como possível, só atua porque confia que o resultado não se vai verificar, estaria a atuar,
segundo uma negligência consciente, dado que este não se conforma com o resultado – ELE SÓ VAI ADIANTE COM A CONDUTA PORQUE
ACREDITA QUE O RESULTADO NÃO SE VAI VERIFICAR.
Ora, se isto é negligência então o dolo tem de ser o contrário e abranger tudo aquilo que não está compreendido na negligência.
Daí que o Doutor Eduardo Correia venha dizer que no dolo temos abrangidas tanto as situações em que ele toma posição e se conforma, como as situações
em que ele não toma posição.
Isto, porque o Direito Penal se contende com lesões de bens jurídico essenciais, ou seja, com lesões graves de bens jurídicos essenciais, pelo que o não
tomar posição é já expressar uma atitude de contrariedade ou de indiferença perante um dever ser penal, que é caraterística típica do dolo.

Portanto, tudo aquilo que não for negligência consciente, isto é, todas aquelas situações em que o agente não confie que o resultado não se vai verificar,
serão de dolo eventual.
E é esta a formulação em que Eduardo Correia diz que no dolo eventual cabem todas as situações em que o agente não confie que o resultado não se vai
verificar.
Crê-se que é esta fórmula do Doutor Eduardo Correia que deve continuar a ser mantida na interpretação do ART. 14.º/ 3 e do ART. 15.º/ 1, alínea a) [o
mesmo é dizer: interpretar a fórmula da conformação].

Vamos ver que desde logo esta distinção ab initio é uma distinção que tem que se por logo no âmbito do ilícito típico.
E essa era uma dificuldade que os autores do ilícito pessoal, que aderiam ao ilícito doloso, mas que reconduziam o dolo ao dolo natural NÃO PODIAM
ULTRAPASSAR.
Repare-se que o dolo natural é conhecimento e vontade de realização de um tipo, o elemento intelectual e o elemento

volitivo acabam por ser os mesmos no dolo eventual e na negligência consciente.


Em ambos os casos o agente conhece a conduta e conhece que possivelmente ela pode conduzir à realização de um crime, mas quer a conduta  o que
significaria que para a doutrina do ilícito pessoal que reconduz o dolo do tipo ao dolo natural não distinguia no plano do ilícito entre o dolo eventual e a
negligencia consciente (era uma distinção só no plano da culpa).
Encontramos, por isso, aqui a contradição que encontrávamos no caso do erro sobre as proibições: nos casos de negligência consciente estar-se-ia a punir a
título de culpa negligente a prática de um tipo doloso.

É obvio que esta contradição desaparece a partir do momento em que reconduzamos o dolo do tipo ao tal dolo do homem médio, que abrange tanto o
elemento intelectual, como o volitivo e o emocional.
Será atendendo a este ELEMENTO EMOCIONAL que dizemos que o homem médio, se tivesse praticado aquele ato conformando-se estava a revelar a tal
atitude de contrariedade, ao passo que se não se conformasse não estava a expressar o sentido de ilícito doloso (teríamos um ilícito negligente).

É claro que esta situação está prevista na lei, pelo que, nos termos do princípio da legalidade temos que obedecer a esta teoria, porém há fortes críticas,
porque quer queiramos quer não, na distinção entre dolo eventual e negligência consciente o que nós estamos a fazer é punir diferentes modos de ser.
Em ambos os casos o agente representa o crime como uma consequência possível e quer realizar essa conduta – a conformação ou não tem depois que ver
com o modo de ser, com o caráter da personalidade (‘é o otimista inveterado ou o pessimista doentio’).

Será isto suficiente no quadro do Direito Penal do facto para se admitir uma distinção?
E depois, no ponto de vista político-criminal questiona-se: o que é que é mais perigoso do ponto de vista social?
O sujeito que naquele caso atuou e se conformou com o resultado, dado que é o tal pessimista doentio
Ou aquele outro que é um otimista inveterado, para o qual nunca há problemas e ‘para a frente é que é o caminho’.

O Doutor Figueiredo Dias já põe isto em causa e o professor vai no mesmo caminho, no sentido de que importaria estabelecer aqui, quanto à hierarquização
do desvalor pessoal da conduta, não a classificação

bipartida que temos hoje (dolo e negligência), mas estabelecer uma HIERARQUIZAÇÃO TRIPARTIDA:
Dolo de resultado  que seria o dolo de resultado e que abrangeria o dolo direto e o dolo necessário
Negligência (tout court)  que se esgotaria na negligência inconsciente, isto é, nos casos em que o agente não representa sequer o perigo da conduta
Dolo de perigo  conglomeraria as situações que hoje autonomizamos sobre o dolo eventual e a negligência consciente, dado que em ambos os caos o
agente representa o perigo e quer a conduta.
Depois, o que concerne à distinção entre dolo eventual e negligência consciente é algo que tem que ver com os motivos da conduta, mas isso é algo para ser
apreciado ao nível da culpa e não ao nível do ilícito.
Em ambos os casos teríamos um dolo de perigo e acabava-se com esta distinção que levantou já muitos problemas na doutrina, chegando-se a uma solução
mais correta.
 Nota: isto não é mais do que uma proposta que tem duas vozes a favor, mas para já nós temos uma lei e o princípio da legalidade criminal tem de ser
respeitado, pelo que continuamos a ter de distinguir no âmbito do dolo as três modalidades (direto, necessário e eventual) e a ter de contrapor o dolo
eventual à negligência consciente na base da teoria da conformação.
Na interpretação da teoria da conformação deve ser mantida a fórmula da dupla conformação do Doutor Eduardo Correia para distinguir entre dolo
eventual e negligência consciente.
Quanto ao elemento volitivo é ainda necessário que se fale noutras figuras e noutras situações, desde logo na figura do dolus alternativus: uma conduta
pode levar a um crime ou a outro e o agente conforma-se com qualquer deles; a figura do dolus antecedens e a do dolus subsequens.

Para terminar o elemento volitivo do dolo haverá que falar de 3 categorias:


Dolus alternativus ou dolo alternativo;
Dolus antencedens ou dolo antecedente;
Dolus subsequens.

O dolo alternativo verifica-se quando o agente prevê como possível consequência da sua conduta ou o preenchimento de um crime ou outro.
A sua conduta em alternativa pode conduzir ou à verificação de um resultado ou à verificação de outro resultado e o agente conforma-se/ aceita, conforme
qualquer 1 destes resultados e leva por diante a sua conduta.

Como punir o agente neste caso?


Terá de ser punido a título de dolo, uma vez que para todos os efeitos o agente conhece e quer como consequência da sua conduta, ainda que em termos
alternativos, a produção de um resultado ou de outro.

Levanta-se a questão de COMO deverá ser punido:


A doutrina alemã divide-se fundamentalmente por 3 orientações, sendo que o Dr. Almeida Costa defende uma 4ª orientação.
A 1ª posição (posição dominante na doutrina alemã) é a de punir o agente nas situações de dolo alternativo pelo concurso ideal dos 2 crimes.
O concurso ideal é uma figura que está prevista no par. 52º do CP alemão e que não tem correspondência entre nós.
Esse par. diz que nestes casos o agente deve ser punido, de entre os 2 crimes alternativos, pelo crime + grave (pela moldura penal do crime + grave).
Todavia, a pena não pode descer abaixo do mínimo admitido da moldura penal do outro crime que não vai aplicado.

Não é aplicável esta posição entre nós, pelas razoes acima indicadas.
A 2ª posição traduz-se em punir o agente pelo crime consumado  é a posição defendida, entre nós, pelo Dr. Figueiredo Dias.
A 3ª posição manda aplicar sempre/ punir o agente com a pena do crime
+ grave.
O dr. Almeida costa opta por uma outra opção, convocando a figura do concurso aparente legal ou de normas, que já se falou a propósito do regime
proposto para o erro sobre o processo causal.
Esse concurso aparente legal ou de normas não é um concurso de crimes, uma vez que estamos apenas perante um crime.
O concurso de crimes aparece quando o agente pratica vários crimes e vai ser julgado por todos eles no âmbito do mesmo processo – ART. 30º - e a
respetiva punição nos ARTs. 77º e 78º CP.  é concurso efetivo de crimes;
Nas situações de concurso aparente legal ou de normas temos apenas 1 crime que é subsumível a vários tipos legais  temos um concurso de normas e que,
do ponto de vista do concurso de crimes será aparente, já que é uma situação de unidade de infração.

Relativamente às múltiplas situações de concurso aparente legal ou de normas, estabelecem-se relações entre essas mesmas normas e o agente será punido
apenas por 1 delas.

Deve ser punido por aquela que melhor exprimir e se ajustar ao desvalor jurídico-criminal da concreta situação (do ato em causa).

Isto leva a que o agente, voltando à situação de dolo alternativo, deva ser punido por aquela norma/ tipo legal aplicável ao caso que melhor exprima o
desvalor do ato e, portanto, melhor proteja os bens jurídicos em causa.
Ex.: suponha-se que o agente vai praticar um ato e vê 2 pessoas à distância a conversarem. O agente quer matar apenas delas, mas acaba por acertar na
outra  ele conta com essa possibilidade e conforma-se com esse resultado.
Agora suponha-se que 1 dessas pessoas é pai/ parente do agente, que é um dos fundamentos do homicídio qualificado  dentro desta ótica o agente será
punido nos termos do homicídio qualificado consumado.
Se acertou no que não era parente será punido pela tentativa de homicídio qualificado.

De acordo com a perspetiva do regente da cadeira, que acaba por levar a soluções paralelas à da última posição da doutrina alemã – punir o agente pelo
crime + grave e a consolução leva, por via de regra, a punir pelo tipo legal mais grave, uma vez que é o que melhor reflete o desvalor jurídico-penal da
situação.

Sintetizando, nas situações de dolo alternativo, em que o agente prevê como possível, em alternativa, um resultado ou outro, o agente vai ser punido nos
quadros de uma unidade criminosa por 1 só crime, mas será punido ao nível ou no quadro do tipo legal que melhor exprime o desvalor do ato, que melhor
reflete/ retrata o desvalor do ato  por regra, é o tipo legal que contempla a sanção mais grave.
Isto, quanto ao dolus alternativus, mas ainda no âmbito do elemento volitivo, deve-se falar em 2 figuras  dolus antecedens e dolus subsequens.
Para simplificar, ir-se-á utilizar o mesmo exemplo do Dr. Figueiredo Dias para caracterizar o dolus antecedens:
Suponha-se que o dono de uma casa vê o assaltante entrar e decide mata-lo oy atingi-lo, só depois de ele consumar a infração, i.e., só depois de se apoderar
de algum dos objetos que constituem o seu património.
Suponha-se agora que ao tirar o revolver, ainda não quer disparar, mas tira-o de forma descuidada e a arma dispara-se e atinge o assaltante, antes do
momento em que pretendia realiza-lo.

- neste último caso não podemos imputar o crime a título de dolo  o que verdadeiramente há aqui é um ato negligente, uma vez que o dolo é
conhecimento e vontade da realização do tipo legal.
. o projeto do agente era tão-só disparar e atingir o agente depois dele consumar o furto, depois da subtração do património. Ele acaba por realizar o ato em
momento anterior e de forma não intencional, não dolosa, pelo que, necessariamente, o dolus antecedens não releva, nestes casos.

A outra hipótese será o dolus subsequens – nestes casos o agente realiza negligentemente o crime.
Ex.: suponha-se que alguém está a praticar o tiro ao alvo e não repara que há pessoas na proximidade, atras de um arbusto e atinge a vítima. Depois, dirige-
se ao local e vê que a vítima era um seu inimigo, que até tencionava matar noutra altura.
- isto não releva  não nos esqueçamos que o crime doloso é unidade subjetiva- objetiva, pelo que se tem de verificar o conhecimento, vontade de realizar
a factualidade típica/tipo objetivo.
Nesta circunstância não cabem no dolo nem as meras intenções nem os meros desejos  o dolo tem de se traduzir no conhecimento e vontade de realização
do crime.
Em qualquer dos dolus (antecedens ou subsequens) falados, à conduta não preside a vontade de perpetrar o crime.
no caso de dolus antecedens a arma disparou-se, porventura por negligencia, no momento anterior ao que o agente pretendia faze-lo. Portanto, só será
punido, quanto muito, a título de negligencia.
no dolus subsequens, embora a situação seja diferente a solução é a mesma  ele não pretendia, no momento em que disparou a arma, atingir ninguém.
Apenas à posteriori se congratulou com o resultado, mas isto não constitui o dolo  falta o elemento volitivo do dolo, pelo que o agente só poderá ser
punido por negligência, se se verificarem os pressupostos.
Terminamos o elemento volitivo e, com isso, a caracterização do dolo do ilícito típico. Importará falar de elementos especiais do tipo subjetivo.
Elementos especiais do tipo subjetivo
Em regra, ao nível do ilícito típico doloso, o legislador basta-se com a verificação do dolo do agente (conhecimento e vontade de realização do tipo
objetivo).
Todavia, em certos casos especiais exige, para o preenchimento do tipo subjetivo, elementos adicionais:
Especiais intenções;
Especiais motivos;

Especiais impulsos afetivos;


Que o facto traduza certas características da atitude integradora.

Ex.: no furto não basta que o agente queira subtrair coisa movel alheia – é necessário que o faça com intenção de apropriação, com intenção de a fazer sua.
na burla não basta o dolo de produzir o dano no património da vítima  ele produz esse dano com intenção de enriquecer propriamente ou alheiamente.
nos crimes sexuais não basta a prática de ações pudicas  é necessário que lhes presida uma intenção libidinosa.
Qual é a diferença entre elementos subjetivos e o dolo?
O dolo encontra correspondência no tipo objetivo  nos crimes doloso, via de regra, há correspondência ou simetria entre tipo objetivo e o tipo
subjetivo.
Aquele que o agente projeta e quer é aquilo que realiza no plano exterior.
Portanto, o dolo é conhecimento e vontade de realização do tipo objetivo:

Estes elementos subjetivos especiais adicionais do tipo subjetivo dolos não tem correspondência no tipo objetivo.
Ex.: na burla exige-se que o agente atue com intenção de enriquecimento, mas não é necessário haver um enriquecimento para que haja um crime
consumado  basta o empobrecimento da própria conduta.
Estes elementos subjetivos so podem ser compreendidos através do estudo da Parte Especial.
Obviamente que a doutrina discute, é uma matéria polemica, por várias razoes:
Desde logo, a classificação constante da doutrina que classifica estes elementos especiais do tipo subjetivo em intenções, motivos, impulsos afetivos ou
características da atitude interior.
Há uma grade sobreposição entre elas, uma vez que são categorias extrapenais, que vem essencialmente da psicologia e da psiquiatria - e a que a doutrina
recorre apenas para caracterizar descritivamente estas situações de elementos subjetivos especiais.

Mas depois a doutrina discute sobretudo se estes elementos pertencem ao ilícito ou à culpa. Logo aí não faltam vozes que põem em causa que ao atender
aos

elementos da subjetividade, por serem conceitos imprecisos, põem em causa a certeza e segurança na aplicação do dto penal.
Por outro lado, no plano substancial poe em causa
o modelo do dto penal do facto, uma vez que parece que se está a punir um modo de ser, certas tendências, certos aspetos da interioridade do agente que
não deveriam ser considerados no quadro do dto penal do facto.
Assim, esses autores defendem a sua abolição.

Importará reter que, por via de regra, o tipo subjetivo dos crimes dolosos esgota-se no dolo do tipo e, portanto, no dolo tal qual como o caracterizamos e
cujo regime já foi analisado.
No entanto, excecionalmente, o legislador, a propósito de certos crimes, pode exigir elementos subjetivos especiais  especiais intenções, especiais
motivos (ex.: homicídio qualificado – matar por razões económicas ou por odio racial), e características da atitude interior (certo modo de ser, a crueldade,
brutalidade, total insensibilidade), que interferem na modelação do tipo subjetivo do ilícito doloso.
Sempre que o legislador exigir esses elementos subjetivos, sempre que faltar 1 deles, não temos um crime em causa.
A distinção entre tipo objetivo e subjetivo, no quadro de uma doutrina do ilícito pessoal, é uma distinção artificial, uma vez que assim como o ilícito
doloso é uma unidade subjetivo-objetivo,  também o tipo incriminador doloso, enquanto expressão desse ilícito objetivo, é também uma unidade
subjetivo-objetivo.

Só dividimos em tipo objetivo e subjetivo por razões de clareza de exposição e, por isso, sempre que falte um qualquer elemento do tipo subjetivo (ou o
dolo ou 1 dos elementos subjetivos especiais) ou do tipo objetivo, a conduta não preenche o tipo incriminador doloso em causa.

Os tipos justificadores – causas de exclusão da ilicitude/ilícito


A matéria dos tipos justificadores está relacionada com certas figuras que representam contratipos. Isto é, uma determinada conduta preencheu um tipo
incriminador, contudo, existem circunstâncias adicionais que retiram a circunstância criminal e a conduta deixa de ser considerada ilícita.
Ex: Furtar é proibido, mas alguém pode furtar em estado de necessidade. Matar é proibido, mas se for em legitima defesa é permitido, desde que
preenchidos os necessários pressupostos previstos na lei.
Neste seguimento iremos falar da Teoria Geral dos Tipos Justificadores, analisando os princípios comuns a todos os tipos incriminadores. Todavia, é
necessário recuar e fazer uma revisão do que demos anteriormente.

Revisão…
O conceito material de crime é reconduzível, de acordo com as duas funções do direito (função de conformação/ordenação e função de proteção/garantia),
às normas de determinação dirigidas a impor um comportamento futuro dos cidadãos. O núcleo do crime radica, portanto, no desvalor da ação, na
contrariedade da conduta à norma de determinação. Isto não significa que o desvalor do resultado não releva, mas assume um papel secundário.
Neste sentido, todo o crime tem de ser uma conduta humana violadora de uma norma de determinação, sendo que a doutrina autonomiza como expressões
do desvalor da ação 4 espécies de crimes: crimes dolosos e crimes negligentes e crimes por ação e crimes por omissão. Esta ideia de crime levou à
autonomização das dogmáticas dos crimes anteriormente citados. Desta forma, a construção geral do crime surge dividida em, pelo menos, três grandes
capítulos: teoria geral do crime doloso, a teoria geral do crime negligente e a teoria geral do crime por omissão.
Esta teoria geral do delito trata-se de uma decomposição analítica do conceito material de crime. Já falamos da teoria geral do crime doloso, mas não a
terminamos. De facto, começamos por decompor a ideia de ação dolosa, que se traduz num crime onde se verifica uma convergência entre o lado subjetivo
(dolo – aquilo que o agente projeta realizar) e o lado objetivo do crime. Esta unidade objetiva-subjetiva vai ser decomposta nos seus elementos
constitutivos. Neste contexto, vimos que a as várias categorias do sistema vão avançando do menos exigente para o mais exigente, sendo que em 1º lugar
temos de ter uma ação humana, isto é, tem de existir uma intencionalidade de uma manifestação do agente (neste sentido, os atos reflexos, os
sonambulismos não contam para a verificação de uma ação humana).
Contudo, verificamos que a ação humana não é suficiente para determinar o crime, é necessário que a ação seja ilícita típica. Neste sentido, o tipo mais não
é do que os juízos de valor subjacentes à lei. Já o ilícito típico corresponde ao ilícito típico pessoal, em que interfere a subjetividade do agente. O ilícito
pessoal distingue entre ilícito doloso e o ilícito negligente.
No ilícito estamos a determinar o ato humano em geral (objetivo). Na culpa estamos a avaliar o sentido pessoal-subjetivo enquanto ato daquela concreta
pessoa. Devido a

caraterísticas pessoais do agente, um certo comportamento ilícito pode não ser culposo. Ex: o Sr. A dispara sobre um órgão vital do Sr. B. Ora, trata-se de
um ato de homicídio doloso (ato humano em geral – sentido objetivo). Mas, suponhamos que aquele Sr. A era inimputável – temos um ilícito doloso, mas
não temos uma culpa dolosa, pois este ato integra uma das causas de exclusão da culpa. O que varia do juízo de ilicitude e culpa é o critério de valoração.
Voltando ao conceito de ilícito típico não separamos o ilícito do típico, tendo, neste sentido, sempre um ilícito típico (doloso).
Ora, nos tipos incriminadores, de que já falamos, o legislador descreve essa unidade objetiva-subjetiva em que consistem os vários ilícitos típicos dolosos.
Assim, o tipo é composto de elementos objetivos e subjetivos e, ao nível do tipo incriminador estudamos primeiro o tipo objetivo e depois o tipo subjetivo.
Mas, salvaguardamos que esta distinção é artificial, apenas se justificando em termos pedagógicos, porque na verdade o tipo é uno, na medida em que é
uma unidade objetivo- subjetivo.
Por fim, acabamos a matéria do 1º semestre analisando os casos especiais do tipo subjetivo.

Com isto terminamos a matéria do tipo incriminador. Agora estudaremos os tipos justificadores. O facto de uma conduta ser subsumível a um tipo
incriminador, não significa que essa conduta seja necessariamente ilícita. Por exemplo, matar é proibido, mas matar em legitima defesa é permitido, desde
que preenchidos os pressupostos exigidos na lei.
As causas de justificação ou os tipos justificadores representam uma espécie de contratipos, ou seja, o legislador descreve situações excecionais que
excluem o desvalor jurídico penal à conduta que é subsumível ao tipo incriminador. A determinação do carater lícito ou ilícito de uma situação concreta
não pode resultar apenas da sua subsunção ao tipo incriminador, pois é preciso que ela seja subsumível a um tipo incriminador, mas que não caiba em
nenhum tipo justificador. Trata-se, portanto, de uma relação complementar entre o tipo incriminador e o tipo justificador, uma vez que os tipos
incriminadores e os tipos justificadores concorrem para a determinação da ilicitude concreta.
Desta forma, os tipos incriminadores concorrem para a determinação dos ilícitos de forma concerta (o tipo incriminador define as características dos
crimes, que define o concreto ilícito que está em causa. Desenha e carateriza o específico conteúdo desta espécie de ilícito e que distingue dos demais
crimes) e positiva (para termos esse ilícito é preciso que a conduta preencha o tipo incriminador).
Já no que respeita aos tipos justificadores estes concorrem para a determinação dos ilícitos de forma geral, na medida em que se aplicam a uma
multiplicidade de espécies ilícitas, de crimes e, negativa, dado que a conduta não pode preencher os elementos constitutivos do tipo justificador em causa.
Por isso, o ilícito típico é compreendido nos termos da teoria do ilícito pessoal, concretizando-se nos tipos incriminadores e nos tipos justificadores.
A doutrina, embora entenda que os tipos incriminadores e justificadores concorrem para a definição da ilicitude, trata separadamente os dois tipos porque
as diferenças estruturais destes dois tipos concorrem para a definição da ilicitude. Assim, esta autonomização justificasse porque os dois tipos estão sujeitos
a regimes diversos no que respeita ao mecanismo da analogia. A analogia funciona de forma mais ampla para os tipos justificadores. De facto, as limitações
ao intérprete não funcionam na mesma medida para os tipos incriminadores, sendo mais ampla no caso dos tipos justificadores. Nos tipos incriminadores,
por razoes de certeza e segurança do direito, justifica-se a regra do art.3º e 29º do CPA, que proíbe o recurso à analogia em matéria de agravação da
ilicitude. Nos tipos justificadores, que excluem a ilicitude, admite-se o recurso à analogia (legis ou iuris
criação de tipos justificadores supralegais). O recurso à analogia em matéria de justificação, não pode restringe o âmbito de aplicação do tipo justificador.
Ou seja, toda a solução que envolva uma restrição do âmbito de aplicação do tipo justificador, fica sujeita ao mesmo regime de analogia dos tipos
incriminadores.
O recurso à analogia é amplamente permitido no âmbito dos tipos justificadores.
Em suma, os tipos incriminadores e os tipos justificadores não são categorias separadas, existindo entre os dois tipos uma relação de complementaridade,
mas por razoes pedagógicas iremos separá-los e autonomizá-los para melhor os compreender. Assim, ambos os tipos são a concretização do juízo de
ilicitude e concorrem de forma complementar para justificação ou negação da ilicitude ao nível dos casos concretos.
Passaremos agora à Teoria geral dos tipos justificadores, onde iremos analisar os princípios gerais e os aspetos comuns a todos os tipos justificadores:
Princípio da unidade da ordem jurídica (art.31º do CPA) – é a ideia da unidade da ordem jurídica. Um ato considerado ilícito num ramo do direito tem de
ser considerado ilícito em todos os demais. Ou seja, entende-se por unidade da ordem jurídica um ilícito unitário comum a todos os ramos do direito. Este
não pode ser o entendimento da ordem jurídica, pois esta doutrina contradiz a matriz do DP, pois a intervenção do DP é subsidiária. Existem muitas
condutas ilícitas noutros ramos do direito (ex: violação de um contrato) que não têm relevância penal. Assim, a doutrina maioritária nega essa ideia de
ilicitude unitária comum a todos os ramos do direito. Neste sentido, alguns autores entendem esta unidade da OJ em sentido negativo que parte da
autonomia do ilícito penal dizendo que o DP, devido ao carater subsidiário da sua intervenção, não pode considerar ilícitas condutas tidas como toleradas
pelos outros ramos do direito.

O prof. discorda desta posição porque no âmbito do DP podem existir condutas que são consideradas ilícitas, mas que não são consideradas ilícitas noutros
ramos do direito e vice-versa. De facto, este entendimento assenta em pressupostos errados: todas as situações consideradas ilícitas pelo DP também são
consideradas ilícitas pelos outros ramos do direito. Na verdade, existem diversas condutas que são consideradas ilícitas para o DP, mas que não são ilícitas
para outros ramos do direito (ex: crimes de perigo). Ainda que o âmbito da ilicitude penal seja inferior aos restantes ramos do direito, a verdade é que há
condutas ilícitas no DP, que não são ilícitas noutros ramos do direito. Este princípio da unidade da ordem jurídica

deve ser entendido não como uma unidade de sobreposição, mas como uma unidade de congruência entre o ilícito penal e o ilícito de outros ramos do
direito, tal como existe essa congruência nas funções do direito.

Se a unidade da OJ deve ser vista como unidade de congruência levanta-se o problema de saber qual é o fundamento material para a afirmação da ilicitude
ou para a sua exclusão, que é o que a doutrina denomina de “sistematização das clausulas de justificação”. Neste âmbito, costuma opor-se as teorias
monistas (o fundamento das causas de justificação seria um só. São a concretização em situação materialmente diversas de um único princípio material de
justificação, são concretizações da mesma ideia) às teorias pluralistas (as diferentes causas de justificação assentam em fundamentos materiais diversos).
A doutrina monista apontava para a doutrina que viria a ser a doutrina dominante
– princípio da prevalência de interesses/principio da ponderação de interesses – toda a conduta que apesar de preencher o tipo incriminador, lesa-se um
bem jurídico menos valioso para salvaguardar um BJ mais valioso seria licita. Depois, havia outra teoria dentro desta doutrina que se designava de teoria
do fim ou da maior vantagem do que o prejuízo em que, ainda que a conduta preenchesse um tipo incriminador deixava de ser ilícita sempre que
configurasse em concreto a configuração de um fim justo. Contudo, esta teoria apresenta falhas, na medida em que é imprecisa e apresenta uma fórmula
vaga que não é operatória num plano dogmático. Contudo, é através do princípio da ponderação dos bens e prevalência do BJ mais valioso perante o menos
valioso que assenta o fundamento para os monistas

A teoria dualista dizia que o princípio da ponderação de interesses funcionava para a maioria das causas de justificação, exceto para as situações de
consentimento do ofendido (consiste em que alguém, em relação a um bem de que é titular e que é disponível, consente a própria lesão). Neste caso deixa
de existir BJ, não havendo qualquer ponderação de interesses, mas sim uma ausência de um interesse jurídico penal relevante porque o seu titular consente
na lesão no bem. Assim, deve assentar no princípio da ponderação de interesse e prevalência do BJ mais valioso, prevalecendo o mais valioso e o princípio
da carência ou ausência de interesse, que é o fundamento material do consentimento do ofendido.
Esta doutrina vigorou muito tempo entre nós, sendo defendida nomeadamente por Eduardo Correria, mas a doutrina da ponderação dos interesses voltou a
afirmar- se com Figueiredo Dias, dizendo que mesmo no consentimento o princípio da ponderação dos interesses funciona. No consentimento do individuo
há um conflito de interesses entre o valor da liberdade de disposição de bens e o interesse da OJ na preservação de bens jurídicos, havendo também no
consentimento, um conflito de interesses que deveria ser resolvido pelo princípio da ponderação de interesses, mas ao nível da definição dos bens que eram
ou não eram disponíveis. Assim, nem todo o consentimento releva, na medida em que têm de estar em causa BJ disponíveis.
O legislador determina quais são aqueles bens jurídicos que estão ou não sujeitos à livre disponibilidade do titular (bens disponíveis VS bens
indisponíveis). Esta

doutrina e o Dr. Figueiredo Dias entende que também no consentimento do individuo, o princípio da ponderação dos interesses e prevalecia do mais
valioso se aplica. O prof discorda de todas as teorias anteriormente referidas porque elas assentam na teoria do ilícito objetivo (desvalor do resultado) e não
no ilícito pessoal (desvalor da ação) – apenas considera o desvalor do resultado.
O regime da legitima defesa confirma a discórdia do prof. porque ela traduz-se na situação em que a alguém que tem a sua esfera jurídica em perigo, e que
não tem acesso em tempo útil aos meios de proteção normais, recorrer às suas próprias forças protegendo o seu bem jurídico causando danos na esfera
jurídica do próprio agressor. A legitima defesa pode funcionar, desde que verificados certos pressupostos, podendo funcionar mesmo quando se traduz na
preservação de um BJ menos grave para proteger um BJ mais grave.
Esta situação não pode ser explicada no quadro do princípio da ponderação dos interesses, pelo que o prof. discorda de todas essas teorias.

Atualmente, avançou-se outra teoria: é a defesa da OJ no geral na pessoa do defendente, dizendo que a legítima defesa não se limita a defender o concreto
BJ ameaçado, estando também a prosseguir objetivos de prevenção geral e especial, pois ao atuar sobre o agressor evita-se que muitas agressões ilícitas
fossem praticadas. Ora, o prof discorda, pois, o agressor quando decide ou não agredir, na prática, não vai fazer esta ponderação. O único bem jurídico
protegido é o BJ ameaçado, não cabendo na concretização do princípio da ponderação de interesses. Assim, encontramos a comprovação da critica do prof.
na medida em que o princípio da ponderação de interesses como princípio geral não cabe no âmbito do ilícito pessoal, isto é, no desvalor da ação.
A ideia do prof é outra – a justificação é a negação da ilicitude, pelo que o fundamento material tem de ser o mesmo fundamento material subjacente à
ilicitude. No quadro do ilícito pessoal pauta-se pelas exigências mínimas para a convivência comunitária, pelo que só viola esta norma de determinação
quando estamos perante uma situação em que era exigível ao homem medio não violar essa norma. Desta forma, a justificação baseia-se nas exigências
mínimas da convivência comunitária. A inexigibilidade objetiva é por isso o fundamento material.
Na base do princípio geral como fundamento material de toda a justificação está a inexigibilidade objetiva (a própria conduta deixa de consubstanciar um
desvalor da ação da própria conduta), pelo que o prof admite a ponderação de princípios intermédios como a ponderação de interesses. A justificação é a
negação da ilicitude, pelo que só temos uma conduta ilícita quando existe uma violação de uma norma de determinação que era exigível ao homem medio
que não a violasse. Este é o ponto de vista do prof. quanto ao fundamento material da justificação (princípio da não exigibilidade objetiva como
justificação).

Intervém aqui elementos subjetivos das causas de justificação ou não? - SIM


Ex: Um Sr. que ao partir o vidro salva o vizinho de uma fuga de gás, sem ter essa intenção, pois na verdade apenas queria aborrecê-lo partindo a janela. No
entanto, sem saber estava a salvá-lo de morrer intoxicado.

Nestas situações, a doutrina dizia que estava admitida a justificação do ilícito, pelo que o agente sairia impune. Contudo, esta solução é absurda porque o
sentido da conduta era o da produção de um dano, pelo que o agente devia ser punido. Se o núcleo do ilícito esta no desvalor da ação (ilícito), para
sabermos se a conduta estava ou não justificada, temos de atender aos elementos subjetivos do agente, isto é, à culpa. Ora, a generalidade dos tratados
modernos reconhece que a todas as causas de justificação tem de existir um fundamento comum: o agente saber e quer realizar aquela conduta justificativa,
isto é, o conhecimento do agente de que está a atuar a coberto de uma causa de justificação, que desempenha ao nível do tipo justificado a mesma função
que o dolo representa no tipo incriminador.
Devemos distinguir nas causas de justificação entre tipo objetivo (elemento comum a todos eles) e o tipo subjetivo (definição da realidade subjetiva de cada
tipo justificador). Por exemplo, desde que o agente conheça a situação e estiverem preenchidos os seus pressupostos, a legitima defesa está preenchida.
Assim, é de restringir o elemento objetivo de todas as causas de justificação ao facto de o agente saber que está a agir em legitima defesa. O princípio da
justificação não pode ser apenas atinente ao desvalor do resultado
princípio da inexigibilidade objetiva. Neste sentido, se faltar o elemento subjetivo (conhecimento do elemento de justificação), não existe justificação do
ilícito.
Existe depois a ideia de que também os tipos justificadores comportam um elemento objetivo (descrição da situação fáctica de cada tipo justificador) e um
elemento subjetivo (o conhecimento da situação de justificação. Quanto ao tratamento dos casos em que falte o elemento subjetivo não há unanimidade.
Assim, no art.38º/nº4 do CP, que se reporta apenas ao consentimento do ofendido, a doutrina maioritária diz que este nº4 é um princípio geral que se aplica
a todos os tipos justificadores, pois, se ele não sabe que está a atuar ao abrigo de um tipo justificador vai ser punido por uma situação análoga à tentativa.
Ora, o agente não conhece que está a atuar a coberto de um tipo justificador pelo que não há tentativa, mas há uma situação análoga à tentativa, na medida
em que há um desvalor da ação, mas a que não se segue o desvalor do resultado, pois no plano objetivo aquele dano foi um dano necessário para preservar
um BJ mais valioso.
O que sucede quando há o desconhecimento da justificação? A conduta é ilícita porque não temos tipo justificador. Mas, o agente vai ser punido e, em que
termos? Como vimos, a doutrina maioritária diz que esta situação é análoga à tentativa, pelo que o agente deve ser punido a título de tentativa. Embora não
se trate de uma situação de tentativa, é análoga à tentativa porque houve um desvalor da ação, mas não um desvalor do resultado. O FD diz que de facto é
análoga à tentativa, pelo que é de aplicar o regime da tentativa, ou seja, quando se trata de um crime que não e punível a título d tentativa, o agente deve
sair ileso.
Sempre que faltar o elemento comum de todos os tipos justificadores, o agente será punido a título de tentativa. Todavia, o prof discorda porque entende
que sempre que faltar o elemento subjetivo o agente deve ser punido a título de consumação.
Ex: O Sr. A tem um inimigo (sr. B) e sabe que ele vai todos os dias a um café e faz-lhe uma espera para o matar. Efetivamente mata-o, mas vem a provar-
se à posteriori que o sr. B também estaria preparado para o matar, mas que ele foi mais lento a disparar. De acordo com a doutrina tradicional, esta situação
levaria a que o agente, sem saber, estaria

a atuar sobre legitima defesa, pelo que o agente seria punido apenas por tentativa. Mas, esta solução é absurda porque há um desvalor de intenção, há um
desvalor de ação e há um desvalor do resultado. Assim, no quadro do ilícito pessoal estamos a avaliar o desvalor da ação naquela concreta situação. O que
valoramos é o sentido do ato e, neste caso temos desvalor do crime doloso consumado, pelo que ele deve ser punido a título de consumação (opinião do
prof.). E, o que vem previsto na letra da lei no art.38º/nº4 do CP, não vale? E o princípio da legalidade?
Ex: Um senhor muito abastado e solteirão, que apenas tinha como descendentes os seus sobrinhos, possuía moedas valiosas e, pediu ao seu mordomo que
as entregasse a um dos seus sobrinhos favoritos. Contudo, esse sobrinho, numa situação de aperto económico e sem saber da intensão do seu tio de lhe doar
as moedas, assalta a casa e rouba as moedas, sendo apanhado. O ato do tio dizer ao mordomo que aquilo é para o sobrinho já implica a renuncia ao seu
património sobre as moedas. Trata-se de consentimento, pelo que aqui não há desvalor do resultado, dado que o tio já repudiou esse património. Ora, o que
temos é um desvalor da ação a que não se segue um desvalor do resultado, pelo que a solução do art.38º/nº4 do CP apenas se justifica no consentimento do
ofendido, mas já não se justifica na legitima defesa, por exemplo. No consentimento não há desvalor do resultado, mas nas outras situações de causa de
justificação existe desvalor de resultado. Assim, exceto nestas situações de consentimento que devem ser punidas a título de tentativa, as restantes situações
devem ser punidas a titulo de consumação dolosa (opinião do prof.).
Neste sentido, no âmbito da teoria da culpa limitada, devemos distinguir, nos tipos justificadores, duas situações: o erro sobre as circunstâncias de facto
(art.16º/nº2 e nº3 do CP) e o erro sobre a ilicitude (art.17º do CP)
O erro sobre os pressupostos de uma causa de justificação trata-se da situação inversa à falta do elemento objetivo. No erro sobre os pressupostos de uma
causa de justificação, o agente julga que está a atuar numa situação de justificação, mas não está.
Ex: no Carnaval há uma pessoa que tem o hábito de passear depois do jantar e um seu amigo quer lhe fazer uma partida. O amigo disfarça-se de bandido
com uma pistola falsa, mas o homem dispara convencido de que estava a ser agredido e de que estaria a agir sobre legitima defesa. Ora, trata-se de um erro
sobre os pressupostos de justificação. E, nestes casos, a maioria da doutrina distingue entre erro intelectual e erro de valoração/sobre a ilicitude/moral, ou
seja, distingue entre erro sobre as circunstancias de facto previsto no art.16º/nº2 do CP ( “erro sobre um estado de coisas” - esse estado de coisas são os
pressupostos fácticos de uma causa de justificação) em que o agente apenas pode ser punido por negligencia, nos termos do art.16º/nº3 do CP, desde que se
verifiquem os requisitos formal (art.13º do CP - o crime admitir a negligencia) e o requisito material ( art.15º do CP - o erro dever-se a ausência do dever
objetivo de cuidado).
Depois temos o erro sobre a ilicitude previsto no art.17º. Nestes casos trata-se de um erro sobre os contornos da ilicitude, sobre os limites da causa de
justificação.
Ex: O Sr. A é imigrante e veio para Portugal de férias para construir uma casa no seu país de origem (Portugal). O Sr. A contrata o mestre de obras, que lhe
diz que precisa de um adiantamento para as despesas de construção e o sr. A paga e volta para o pais onde é imigrante. Quando no ano seguinte volta a
Portugal, deparasse com a ausência das obras.

Na pretensão de resolver o seu problema, o Sr. A vai a casa do mestre de obras e este não está, mas ele vê um quadro valioso que se encontra na sua casa e
leva-o, convencido que estaria a agir em legitima defesa do seu património, e convencido que a legitima defesa recobre esta situação. Mas, a legitima
defesa não cobre estas situações, dado que os direitos de crédito não se podem exercer por legitima defesa. O Sr. A erra sobre a ilicitude, e não sobre as
circunstancias de facto, pelo que o ato se for censurável é punível a titulo de dolo. Aqui o agente tem um concreto conhecimento dos factos, mas erra sobre
os contornos da ilicitude.

Concretos tipos justificadores previstos no Cód. Penal


Legítima defesa: art. 32º+ 33º do CP: alguém está a ser alvo de uma agressão, e na impossibilidade de recorrer à força publica (em pp vigora o monopólio
estadual) para preservar o BJ em causa, o agente pode recorrer às suas próprias forças. A LD traduz se numa espécie de contra-ataque sobre o agressor. A
LD não é o dto de recorrer à vingança nem sequer fazer justiça pelas suas proporias mãos. A finalidade é suster a agressão, e dessa forma preservar o BJ em
causa. O recurso a meios de autotutela é excecional. A doutrina agrupa os requisitos da LD em dois grupos:
Requisitos da agressão:
Tem de se traduzir num comportamento humano agressivo, afastando se os fenómenos naturais e comportamentos de animais.
Mesmo quanto ao comportamento humano tem de ser uma atuação juridicamente relevante (exclui se os atos reflexo; os atos praticados de forma
inconsciente e sob coação física.) A agressão tem de ser consciente e livre. A agressão poderá ser imputável a uma pessoa individual ou pessoa coletiva. A
ação em DP pode traduzir se num comportamento positivo ou omissão (Ex.: Mãe que não alimenta o filho e o está a deixar morrer).
Tem de ser uma ação que ponha em causa interesses juridicamente protegidos do próprio ou de terceiro (privados ou interesses públicos). Há uma corrente
doutrinal que pretende restringir a LD a bens jurídicos individuais. O prof discorda. O Dr. Figueiredo Dias bem como o prof, entende que não há limitação
ao exercício de LD para defesa de BJ individuais ou públicos.
A agressão tem de ser ilícita. A ilicitude da agressão como requisito da legitima defesa não tem de ser especificamente penal.
A agressão tem de ser atual (iminente e em execução). Não pode estar consumada. Quanto à iminência não tem de se esperar pelo início da tentativa. Para a
LD não é necessário esperar pelo início da tentativa. Se for evidente que outrem vai agredir logo nesse momento o defendente pode desencadear os
mecanismos da legítima defesa. Dois problemas quanto ao início da execução:
Meios antecipados de defesa (por exemplo redes eletrificadas; placa de aviso “Cuidado com o cão”) - têm de estar montados e devidamente assinalados de
modo a só atuar perante a agressão. Ex.: Só quando alguém

entra em casa é que o cão intervém. A atualidade existe porque é perante uma agressão.
Hipóteses de legitima defesa preventiva: Ex.: Imaginemos uma estância de ski. Num restaurante, duas pessoas combinam um assalto às casas na estância.
O dono do restaurante apercebe se e para evitar a lesão do BJ (não há possibilidade de recorrer à força publica porque há um forte nevão que impossibilita a
circulação de carros) mete um comprimido na bebida dos assaltantes e estes adormecem só acordando no dia seguinte. Há possibilidade da legitima defesa.
O Dr. FD coloca algumas restrições, na medida em que as hipóteses de legítima defesa em DP são excecionais. O prof não concorda. Considera que neste
caso não é colocado em causa o requisito da atualidade. Se o dono do restaurante não consegue em tempo útil recorrer à força publica e evitar a lesão do BJ
em causa, o prof admite a possibilidade da legítima defesa preventiva (com base numa interpretação restritiva).
Nota: Quanto ao termo da agressão entende se alguns problemas ao nível patrimonial: quanto ao furto- o furto consuma se com a subtração da coisa e ter
como objetivo fazer sua a coisa. Quando o assaltante coloca as joias na mochila ele já consumou o furto? O dono não pode atuar? Pode sim atuar em
legítima defesa. Para efeito de LD a infração só esta consumado quando o agente já esta a retirar da coisa furtada as utilidades normais que o proprietário
retiraria. Assim mesmo que ele tenha já as joias na mochila o dono da ourivesaria pode intervir. Mesmo que ele tenha corrido até sua casa, o dono da
ourivesaria pode intervir com base na legítima defesa.

Requisitos da defesa:
Requisito subjetivo geral (comum a todos as causa de exclusão) o agente tem de saber que esta a atuar coberto pela legitima defesa. Se o agente não sabe
falta o requisito subjetivo. O ato é ilícito. Não há legítima defesa. Aplicação analogicamente do art. 38º/4 do CP: o agente será punido tão só pela tentativa:
há um desvalor da ação a que não se segue o desvalor do resultado. assim só há desvalor da ação juridicamente relevante. O prof discorda. Defende que há
desvalor da ação, desvalor do resultado e desvalor da intenção.
Requisito da necessidade do meio: diz se que de entre todos os meios disponíveis ao agente ele deve recorrer ao estritamente necessário; aquele que for
menos gravoso. A LD não é o dto à vingança, mas sim um dto vinculado a uma finalidade específica: evitar a lesão do BJ. Este requisito deve ser valorado
perante as situações concretas. O legislador e a doutrina dizem que necessária à defesa será o meio que naquela concreta situação atendendo a todas as
circunstâncias se mostre adequado, de acordo com o padrão do homem médio. A doutrina sublinha que entre os meios de defesa a ponderar pelo
defendente não deve intervir a possibilidade de fuga. Que ideia está aqui em causa? Fundamento material de LD: a inexigibilidade objetiva: não é exigível
a uma pessoa que está no gozo dos seus dtos que tenha de ceder a uma agressão ilícita. Reconhece se o dto de perante

aquela agressão possa responder e não tenha de recuar. Dentro da LD há que procurar de acordo com este requisito da necessidade do meio a forma menos
gravosa para proteger o BJ da agressão, sendo que não se deve contar com a possibilidade de fuga. Quando falta a necessidade do meio (ou seja, se o
agente vai para além do necessário), não há LD e o comportamento é ilícito- “excesso intensivo de LD”.
Na terminologia mais antiga distinguia se:
excesso extensivo (erro sobre os pressupostos de facto do tipo justificador- art. 16º/2 do CP- o agente só poderá ser punido a título de negligência (com os
requisitos preenchidos devidamente);
excesso intensivo – verifica se sempre que o agente vai para além do estritamente necessário para a defesa- aqui há que distinguir entre duas hipóteses de
excesso intensivo:
Excesso intensivo de natureza asténica: tem que ver com estados asténicos: medo, pavor, susto. Assim o defendente perde a noção das medidas das coisas
indo para além do necessário à defesa;
Excesso intensivo de natureza esténica (estados de afeto esténicos- raiva, furor, vingança- vão para além do necessário com o intuito de fazer justiça pelas
próprias mãos.
Esta classificação logrou consagração no CP- art. 33º - está regulado o excesso intensivo. No art. 33º/2 o legislador reporta se ao excesso intensivo
asténico. Mas a todo o excesso asténico? Parece que não. O medo e o susto são censuráveis? Podem sim. Pensemos no caso das pessoas que receberam
preparação especial para lidar com situações de crise (caso do nadador-salvador; bombeiro…). Há pessoas que tiveram preparações especiais em que lhes é
exigível mais do que é exigido ao homem comum. É esta possibilidade de censura a que se reporta no nº2 do art. 33º. Aqui teremos de medir a
censurabilidade em função das características da posição sociocultural do agente. O nº2 fala apenas então do excesso intensivo asténico não censurável. E
se for censurável? Onde está regulado? Está no nº1 do art. 33º- regime geral do excesso intensivo seja ele esténico, ou asténico (remete para os arts. 73º e
74º do CP). Sempre que estivermos perante o excesso intensivo de natureza esténico ou asténico censurável aplicamos o nr. 1 do art. 33º. No nr. 2 do art.
33º está apenas o excesso intensivo asténico não censurável. A própria lei diz que o agente fica impune. A doutrina diz que está em causa uma ideia de
inexigibilidade: a doutrina enuncia como causa de exclusão da culpa. A exclusão da culpa fica a dever se ao circunstancialismo exterior. A exclusão da
culpa pode ficar a dever se a fatores endógenos internos ou fatores endógenos externos (que leva à exclusão total da culpa ou então para atenuação da
culpa). A doutrina tradicional que diz isto cai numa contradição. Quando é censurável e não censurável? Quando cai no critério do homem médio. Aquilo
que a doutrina diz que exclui a culpa não exclui a culpa- exclui sim a própria ilicitude- apela para a inexigibilidade objetiva que é causa de exclusão da
ilicitude. Assim este art. 33º na parte que se considera que intervém critérios do homem médio (homem fiel, leal ao Direito) temos uma causa supralegal de
exclusão da ilicitude. A nossa lei fala de exclusão da culpa, ou seja, esta a falar de inexigibilidade subjetiva, só que antes desse juízo, temos de verificar se
aquela situação à luz do homem medio é censurável ou não. Se

chegamos à conclusão de que a luz do homem médio o medo era aceitável então exclui se a ilicitude.
Esta posição da legitima defesa conduzia a soluções insuportáveis à luz do senso comum, logo a doutrina estabeleceu limitações.
Exemplo: um velho tem um pomar de macieiras perto de uma escola e as crianças furtam uma maçã, e ele ralha. Certo dia decide disparar sobre uma
criança quando lhe rouba uma maçã - estão aqui preenchidos os requisitos da legitima defesa? Contraria o sentimento de justiça e para evitar isto a doutrina
introduziu como limite, a teoria do abuso do direito. Os direitos são atribuídos com um sentido, como realização de justiça, logo a legitima defesa não
podia cobrir uma situação injusta como a do exemplo. A legitima defesa passou a ter a clausula de segurança que é o abuso de direito. É uma clausula geral
que não se adequa à certeza e segurança do direito penal. A doutrina evolui para a teoria dos limites éticos sociais à LD. Tanto a teoria dos limites ético
sociais como a teoria do abuso de direito eram limites exteriores. Foi isso que mudou da teoria dos limites éticos- sociais para a teoria atual. A teoria atual
importou a teoria dos limites éticos sociais para dentro, considerando-a limites intrínsecos. Acrescentou-se um terceiro requisito à legitima defesa que é a
necessidade de defesa/justiça da defesa.
Requisito da admissibilidade normativa ou justiça da própria defesa: o conteúdo deste terceiro requisito concretiza se nas mesmas situações tipo no quadro
da teoria dos limites éticos sociais. Este terceiro requisito é designado pelos alemães e por Figueiredo Dias de necessidade da defesa.
Situações que já estavam enunciadas na teoria dos limites éticos sociais: quando a agressão é não culposa: pensemos na agressão de um inimputável- pensa
se que deve haver da generalidade das pessoas uma maior tolerância. Embora não se negue o recurso à LD estabelecem-se limites, ou seja, quando o
defensor não poder furtar-se ao confronto. Por exemplo quando o inimputável se dirige a agredir verbalmente alguém- neste caso deve se restringir e negar
se a possibilidade de recorrer à LD sempre que o agente poderá furtar se ao confronto. Podemos ainda ir mais longe e falar- se dos casos da negligência. A
punição da negligência é excecional. Nas situações da negligência ele não tem consciência que está a praticar um caso ilícito. O agente só poderá recorrer à
LD se a pessoa não puder furtar se ao confronto;
Posições especiais: entre o agressor e defendente existe uma relação própria: nestes casos deve haver restrições. Não se nega o recurso à LD. Deve haver
uma limitação. A mesma que enunciamos para aqueles casos em que a agressão não é culposa. Assim só admitimos ao recurso à LD quando o agente não
possa furtar-se ao confronto.
Agressões provocadas: alguém provoca outrem e em função da agressão o outro agride-o.
A doutrina nestes casos distingue duas hipóteses: provocação pré- ordenada: tem como objetivo gerar uma agressão e depois agir a coberto da LD. Aqui a
doutrina é unânime e nega a possibilidade de LD. A defesa do agente não será então no quadro da LD, mas sim no quadro do estado de necessidade
defensivos (estudaremos mais adiante- reter que esta figura

tem requisitos mais apertados); provocações que não foram pré- ordenadas: por exemplo, chamar nomes ao Presidente do clube rival- aqui há uma
provocação simples. O agente não pretende desencadear uma situação de LD. Esta situação afeta a LD? A doutrina aqui é unânime e entende que para se
legitimar o recurso à LD é necessário o preenchimento de dois requisitos: a conduta tem que caber num tipo incriminador (injurias, difamações, calúnias) -
ou seja a provocação tem que revestir um comportamento penalmente relevante; a resposta do provocado tem que ser próxima com a provocação para se
poder dizer que é uma resposta próxima da provocação- só ai a provocação exclui a LD. Mais uma vez o agente só poderá defende se no quadro do estado
de necessidade defensivo.
Quando se verifica uma crassa desproporção entre o valor do BJ ameaçado e aquele que é sacrificado para salvaguardá-lo: a LD não assenta no pp da
ponderação de interesses, mas há limites. Quando essa desproporção é abissal, é evidente- não cabe na cabeça de ninguém admitir o sacrifício da vida
humana para salvaguardar um BJ de diminuta importância (caso do idoso e do seu pomar). Os dtos do proprietário serão acautelados, mas isso será
problema do DC. Da perspetiva penal nega se a LD.
Suscitado pelo art. 2º/2 da convenção europeia dos dtos do homem: parece que veio pôr em causa a possibilidade de se lesar BJ mais valiosos para se
proteger BJ menos valiosos. Este art.2º/2 apenas funciona em casos de LD em auxílio de terceiro exercido por força da ordem. Em relação a estes não pode
haver sacrifício do valor da vida para salvaguardar interesses patrimoniais

Artigo 32.º Legítima defesa


Constitui legítima defesa o facto praticado como meio necessário para repelir a agressão actual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou
de terceiro.
Confirma todos os elementos a propósito da legítima defesa: prevê a LD exercida para defesa de interesses próprios ou de terceiro; requisito da agressão-
comportamento humano atual e ilícito e quanto à defesa a mesma tem que ser um meio necessário
Estado de necessidade
Traduz-se na situação de alguém se deparar com uma situação de bem jurídico em perigo, próprio ou de 3º, p afastar esse perigo, na impossibilidade de
recorrer a outro meio (nomeadamente, à força pública) a reage/ salvaguarda o bem jurídico à custa da esfera jurídica de terceiro (que nada teve a ver/
contribuiu com a situação de perigo). Este 3º está na livre fruição dos seus dtos.
Com isto estamos a circunscrever a parte inicial da configuração do Prof. à configuração tradicional do estado de necessidade. É o chamado, hoje, estado
de necessidade ofensivo.

Este estado de necessidade ofensivo, que era o desenho tradicional do Estado de Necessidade – tradicionalmente, o estado de necessidade era definido nos
manuais de autores como Cavaleiro Ferreira e Eduardo Correia, restringido a esta situação de estado de necessidade ofensivo. Ofensivo porque, como foi
referido, se traduzia precisamente na salvaguarda de um bem jurídico próprio ou alheio que está em perigo à custa/ através da ofensa da esfera jurídica de
3º que nada tem a ver com a situação.
No entanto, p/ a doutrina moderna o estado de necessidade hoje não se restringe ao estado de necessidade ofensivo – fala-se no estado de necessidade
defensivo, que foi uma figura introduzida na Alemanha e, depois, acolhida entre nós p/ resolver um problema de uma lacuna resultante, não do regime do
estado de necessidade, mas do regime da própria legitima defesa.
Estado de necessidade ofensivo
Aquele que até há algumas décadas esgotava a figura do estado de necessidade.
Verdadeiramente é uma causa de exclusão da ilicitude/ tipo justificador ou tão-só uma causa de exclusão da culpa? De início (séc. XIX – Feuerbach)
compreendiam o estado de necessidade tão-só como uma causa de exclusão da culpa. Referia-se a este propósito, um exemplo de escola, a Tábua de
Carnéades.
Ex.: tínhamos 2 náufragos e um deles estava agarrado a uma tabua de madeira que apenas suportava o peso de uma pessoa.
O outro naufrago, p/ se salvar tirava a tabua de esse outro colega, sendo que com isto estava a salvar a sua via, e no mesmo passo a lesar a vida de outrem,
que morreria afogado.
A doutrina entendia este caso como um caso que envolvia ilicitude: o ato do agente ia implicar a morte, a lesão do bem jurídico vida do outro.
Todavia, excluía-se a culpa com base numa ideia de coação psicológica, i.e., ele estaria numa situação em que, devido ao circunstancialismo exógeno não
era exigível outro comportamento, da parte do DP, ao concreto agente.
Por isso estas situações de estado de necessidade, entendia-se, que excluíam apenas a culpa. É a chamada Teoria Subjetiva do Estado de Necessidade.
Pelos meios do séc. a escola penalista Egliana, inspirada pela filosofia de Eagle, vem, todavia, pôr em causa esta ideia dizendo que ao menos em algumas
situações, quando estivesse em causa a salvaguarda da vida ou da integridade física, portanto, de bens jurídicos pessoas à custa de bens jurídicos
patrimoniais, o estado de necessidade retirava o valor objetivo do ato, excluindo a própria ilicitude do ato (Teoria Objetiva do Estado de necessidade)
Nesta luta de escolas (Teoria objetiva vs. Teoria Subjetiva) viria a resultar, nos finais do séc. XIX, aquela que ainda hoje é a doutrina maioritária – Teoria
Diferenciada do Estado de Necessidade.

Esta teoria vem dizer que o estado de necessidade, nem é só uma causa de exclusão da culpa, nem só causa de exclusão da ilicitude, pode ser uma coisa ou
outra, consoante as circunstâncias do caso.
Para distinguir estas duas situações recorre ao pp da ponderação de interesses.
Diz que: numa situação de conflito de bens de estado de necessidade, o agente salvaguardar o bem jurídico mais valioso à custa do menos valioso, o estado
de necessidade EXCLUI a ilicitude e, nesse caso, estar-se-á perante o estado de necessidade objetivo, justificante (causa de exclusão da ilicitude).
É também designado na nossa lei, no ART. 34º CP, de Dto de Necessidade, i.e., porque as causas de justificação dao um verdadeiro dto a agir.
Ao invés, sempre que na situação de estado de necessidade o agente salvaguardar um bem jurídico menos valioso ou tão valioso quanto aquele que
sacrificava, o estado de necessidade só poderia excluir a culpa e, nesse caso, estar-se-ia perante um estado de necessidade subjetivo ou desculpante (ART.
35º CP).

Nota: Percebe-se a logica: o DP tem por objetivo a tutela de bens jurídicos, portanto, sempre que:
O bem jurídico protegido for mais valioso, traduz-se numa situação conforme às valorações criminais, querida pelo legislador penal.
O bem jurídico protegido, que pode ser um bem jurídico 3º, tão valioso ou menos valioso que o que se está a sacrificar, a situação será sempre ilícita,
quando muito poderá excluir-se a culpa se não for exigível outro comportamento ao agente. Diz-se neste sentido que o estado de necessidade subjetivo é
uma concretização da ideia de não exigibilidade como causa de exclusão da culpa.
Para nós, nesta matéria, só nos interessa o estado de necessidade objetivo/ justificante ou dto de necessidade, por só esse constituir um tipo justificador.
Quanto à fundamentação deste estado de necessidade objetivo justificador concorrem 2 ideias:
O pp da ponderação de interesses ou de bens e da prevalência do interesse mais valioso sobre o menos valioso.
Por outro lado, está associado a esta ideia uma ideia de solidariedade humana e social.
No fim de contas, o que traduz no estado de necessidade é que alguém (o tal 3º) está na paz jurídica a gozar dos seus dtos vai ter de suportar a lesão de um
interesse seu, em favor de um interesse de 3º. (Isto numa situação em que ele em nada contribuiu p/ a lesão do bem jurídico).
É também atendendo a esta ideia de solidariedade humana que irão funcionar algumas limitações ao estado de necessidade, uma vez que esta solidariedade
tem limites.

Isto por estarmos no campo de DP onde se estabelecem as exigências mínimas à convivência em comunidade e, portanto, só é exigível ao 3º que o suporte
ate determinado limite.
Uma outra ideia a sublinhar é que o facto de se afirmar que o pp que de forma imediata subjaz ao estado de necessidade objetivo justificante é o pp da
ponderação de interesses ou de bens e da prevalência do interesse mais valioso sobre o menos valioso. É o pp da inexigibilidade objetiva
À luz dos critérios de justiça social e, sobretudo, do critério de justiça e das opções jurídico-criminais subjacentes ao sistema, o legislador entendeu que não
é exigível a ninguém que, perante uma situação de perigo p/ um bem jurídico mais valioso se deixe de o salvaguardar à custa de um menos valioso (ainda
que esse bem jurídico seja de 3º).
O que significa que, neste caso, o 3º vai ter que suportar essa lesão do seu bem jurídico, embora depois possa (e deva) ser indemnizado pelos danos
sofridos.
Estado de necessidade ofensivo no CP – ART. 34º:
Desde logo, tem de haver uma situação de perigo p/ interesses juridicamente protegidos do agente ou de 3º. Terá que se considerar o valor do concreto bem
jurídico, naquela concreta situação, atendendo não apenas à dignidade do bem jurídico em abstrato, mas sobretudo à gravidade da lesão p/ o concreto bem
jurídico.
Nota: interesses juridicamente protegidos podem não consistir com interesses juridicamente tutelados – podem estar em causa interesses que não tenham
tutela penal e que apenas sejam protegidos por outro ramo de dto  também a sua tutela está recoberta pelo estado de necessidade.
Esse interesse jurídico tem, então, que estar em perigo – é um perigo atual. Só quando não for possível o recurso à força publica. Essa atualidade é aqui
entendida num sentido mais lato que a atualidade na legitima defesa. Admitem-se, aqui, os chamados perigos duradouros. Ex.: pense-se num prédio que a
ameaçar ruir – existe um perigo de vir a cair. Estes perigos duradouros são designados na doutrina como perigos relevantes p/ efeitos de estado de
necessidade.
A conduta tem de ser adequada a evitar o perigo – é obvio que só será legitima pelo estado de necessidade, uma conduta que se mostre, na situação,
atendendo às circunstâncias da situação se revele adequada/ idónea a suster esse mesmo perigo.
O agente pode atuar: na prossecução da defesa de um interesse próprio ou de um interesse de 3º
Requisito subjetivo geral de todas as causas de justificação: o agente tem de atualizar/ representar, naquele momento, que estão preenchidos na situação,
todos os requisitos do estado de necessidade. Se faltar este requisito subjetivo, falta o estado de necessidade e, consequentemente, a justificação e a conduta
é ilícita. A dúvida surge, tão-só, quanto ao modo como se deve punir o agente. A doutrina maioritária entre nos aplica, analogicamente, o ART. 38º/4, que é
um artigo relativo apenas ao consentimento do ofendido, a todas as causas de justificação. partir daí entende que nas situações em que o agente atua
acoberto de uma causa de justificação sem o saber (é o caso) será punido apenas com a pena

correspondente à tentativa, por haver um desvalor de ação a que não sucede, por motivo estranho ao agente, um desvalor de resultado.
Dr. AC discorda da doutrina afirmando que este artigo apenas se aplica ao consentimento, pelo que, concordando com a velha ideia de Welzel, em relação
a todas as outras causas de justificação, quando falte o elemento subjetivo (o conhecimento por parte do agente da situação de justificação), o agente deverá
ser punido pelo crime consumado.
Como a própria lei o diz o artigo vem enunciar requisitos adicionais:
Al. a)  «criar voluntariamente» - o que é isto? A doutrina e a jurisprudência, unanimemente, interpretam restritivamente a palavra voluntariamente,
reconduzindo-a à ideia de PREORDENAÇÃO. Dizem que esta alínea apenas exclui do estado de necessidade os casos em que a situação de perigo foi
preordenadamente criada pelo agente. Pelo contrário, já entendem que o perigo pode ter sido criado voluntariamente, desde que não haja preordenação,
esse perigo não exclui o estado necessidade
Ex.: o sr. que vive junto a um troço de estrada com muitas curvas e gosta de fazer competições consigo próprio de provar que consegue fazer o trajeto em
pouco tempo.
A doutrina entende que se deve admitir, neste caso estado de necessidade, tanto mais porque aqui está em causa a tutela de bens jurídicos essenciais e de
bens jurídicos mais valioso do que os que tem que destruir.
Na parte final desta alínea estabelece-se uma restrição, admitindo-se, mesmo nas situações de preordenação o recurso ao estado de necessidade. Quais são
esses casos? Pode suceder que o agente preordenamente crie uma situação de perigo, não em relação a um bem jurídico próprio, mas em relação a um bem
jurídico de 3º.
Ex.: suponha-se que alguém lança fogo a um jardim de uma casa que não lhe pertence, para depois poder ir à casa do vizinho, a pretexto da situação de
perigo, rebentar-lhe a porta/ causar-lhe danos p/ ir buscar uma mangueira.
Houve preordenação, mas nestes casos, entendeu o legislador, na esteira alias do que já entendia a doutrina portuguesa, de que nestes casos se deve
continuar a reconhecer o recurso ao estado de necessidade.
O agente será julgado pela colocação em perigo de bem jurídico e afins, mas reconhece-se, de facto, o dto de necessidade de ir buscar os meios necessários
p/ preservar o bem jurídico de 3º em causa.
Al. b) – é a consagração em letra de forma da própria teoria diferenciada do estado de necessidade e do seu critério basilar que é o da ponderação de
interesses. Para se reconhecer o estado de necessidade como causa de justificação é necessário que o bem protegido seja «sensivelmente/ manifestamente
mais valioso». Deverá, aqui, atender-se às valorações gerais de todo o ordenamento – à dignidade/ importância dos bens jurídicos em confronto, atendendo
aos critérios de justiça subjacentes ao DP, mas também a toda a ordem jurídica e, nomeadamente, ao Dto Constitucional.
A doutrina defende ainda que deve atender-se à importância em abstrato dos bens jurídicos em conflito, devendo-se atender à gravidade da lesão que
resultará em concreto p/ e outro bem jurídico, sendo certo que o que interessa é uma
ponderação em concreto que resultam da situação. Por isso, pode suceder que, em concreto, um bem jurídico que abstrato será incomparavelmente mais
valioso, possa ser sacrificado p/ proteger outro menos valioso.
Ex.: suponha-se que num museu há uma importantíssima uns mosaicos romanos com um valor cultural insubstituível – têm valor patrimonial enormíssimo,
mas também um valor cultural irrecuperável.
Suponha-se que certo dia rebentou um cano e o conservador do museu p/ evitar que agua fosse p/ esse setor onde estão os mosaicos romanos, teve de
fechar de modo estanque uma ala do museu durante 2h p/ que os técnicos reparassem a tal fuga de água. Só que ao fechar a ala, privou a liberdade de uma
excursão de turistas que estava a visitar o museu – no fim de contas, realiza o ilícito de sequestro. Ninguém duvida que o valor da liberdade, como bem
jurídico pessoal essencial, é superior ao valor patrimonial em abstrato. Todavia, em concreto, temos que atender à concreta lesão: o que estamos a dizer não
é que vamos privar a liberdade em detrimento de bens patrimoniais. Vamos privar a liberdade somente durante 2h p/ evitar uma perda irreparável no plano
cultural e uma perda astronómica no plano patrimonial. Teríamos de afirmar que o conservador atuou acoberto do estado de necessidade. É possível lesar
bens jurídicos pessoais, p/ salvaguardar bens jurídicos patrimoniais, ao contrário do que resulta do dto civil.
Al. c) - “c) Ser razoável impor ao lesado o sacrifício do seu interesse em atenção à natureza ou ao valor do interesse ameaçado”. As ideias subjacentes ao
regime do estado necessidade são, então: a ponderação de interesses e a ideia da solidariedade humana. Esta solidariedade humana tem limites. Pode
suceder que estejam preenchidos todos os requisitos expostos até agora e, todavia, não é justo exigir ao terceiro, que nada tem que ver com a situação, que
suporte essa mesma lesão - admissibilidade normativa ou justiça na defesa.
Ex: há um paciente que precisa urgentemente de um transplante de um rim, mas o paciente pertence a um grupo imunológico muito restrito e, ainda não foi
possível encontrar um dador compatível.
Contudo, o medico que o está a tratar sabe que o diretor do Hospital possui um sistema imunológico compatível com o paciente.
Esquecendo a ilicitude desta situação, imaginemos que o medico pede ao diretor o rim e ele nega.
Porém, o medico não fica por aí e, aproveitando um momento em que encontra o direito sozinho, anestesia-o e procede à retirada do órgão. A ninguém
parece admissível a solução, uma vez que o comportamento do medico consubstancia uma intromissão/ invasão inadmissível à integridade da pessoa,
violando o valor da autonomia pessoal.

Onde é que vamos encontrar aqui o critério? Até onde?


A posição tradicional era de negar a admissibilidade da ação em estado de necessidade sempre que houvesse uma intromissão/ invasão grave e irreversível
da integridade física

«my body is my castle». Na base desta ideia, proibia-se, inclusivamente, a colheita de sangue.
Esta situação (recolha de sangue/ medula óssea) é diferente, dado que o sangue é renovável e, se o sangue foi colheito com todas as condições de higiene e
medicamente exigidas, trata-se de uma invasão insignificante.
Neste sentido, o critério é de que deverá atender-se ao carater insignificante, à ausência de sequelas para o terceiro (vítima da agressão), e, nesses casos
admite-se o Estado de Necessidade e como sacrifício exigível à concreta vítima.
A agressão do terceiro tem de ser insignificante e, têm de ser respeitadas todas as condições exigíveis (no caso do sangue – higiene, recolha feita por um
profissional, etc.).

Estado de Necessidade defensivo - que foi uma 2ª modalidade que a doutrina introduziu, que visou colmatar uma lacuna resultante do regime da legitima
defesa.
Para que fiquemos com noção global desta matéria e da teoria diferenciada consagrada no CP, devemos ler o ART. 35º/1 CP:
«Age sem culpa quem praticar um facto ilícito adequado a afastar um perigo atual, e não removível de outro modo, que ameace a vida, a integridade física,
a honra ou a liberdade do agente ou de terceiro, quando não for razoável exigir-lhe, segundo as circunstâncias do caso, comportamento diferente.»
O nº1 restringe o estado de necessidade subjetivo ou desculpante, restringe o efeito de exclusão da culpa (no nº2 ver-se-á que é diferente) a bens jurídicos
de caracter pessoal, quando se verifique uma situação de perigo p/ um determinado bem jurídico.
Retirando as especificidades quanto ao bem jurídico, a situação do estado de necessidade subjetivo ou desculpante é a mesmíssima, são os mesmos
requisitos do ART. 34º CP.
A diferença está no bem jurídico, ou melhor, na relação/ na ponderação dos bens jurídicos, dos interesses em confronto.
No ART. 34º é «sensivelmente superior»; ao passo que no 35º tem que se verificar 1 de 3 hipóteses:
Ou o bem jurídico protegido é menos valioso;
O interesse protegido é tão valioso quanto o sacrificado;
Ou, mesmo que o bem jurídico protegido seja mais valioso não é sensivelmente mais valioso do que o sacrificado.
Por isso, não se verifica o pressuposto da al. b) do ART. 34º, que é a tal consagração em letra de forma da teoria diferenciada do estado de necessidade.
Nota: o primeiro problema que se deve tratar na hipótese concreta é saber se o bem jurídico (e não é o bem jurídico em abstrato), é a concreta lesão do bem
jurídico protegida é, ou não, sensivelmente mais valiosa.
Pode bem dar-se o caso em que o bem jurídico protegido tem uma destas naturezas do
35º/1 e sendo uma lesão mais valiosa não se poderá utilizar o 35º  terá que se usar o

34º que se aplica independentemente da natureza dos bens jurídicos em confronto (pode ser o sacrifício de um bem jurídico matrimonial para a salvaguarda
de um pessoal; pode ser a inversa, etc).
O 34º, ao contrário do artigo que regula o estado de necessidade no CC, não estabelece limitações quanto á natureza do bem jurídico, o funcionamento do
estado de necessidade como tipo justificador assenta tão-só num critério quantitativo, que é a exigência de que o bem jurídico protegido seja sensivelmente
mais valioso do que os sacrificado.
Isto compreende-se porque o 34º exclui a ilicitude e o 35º exclui a culpa. Só colocamos os problemas de a culpa na eventualidade do comportamento ser
ilícito.
Se houver exclusão da ilicitude ou se puder faze-lo, o problema do 35º nem sequer se põe.
O ART. 35º suscita outra questão: costuma ser enunciado como causa de exclusão da culpa e, como a próprio texto diz «quando não for exigível outro
comportamento».
Os autores veem no 35º uma concretização da ideia da inexigibilidade subjetiva, que tradicionalmente é apontada como causa de exclusão da culpa.
A exclusão da culpa pode ficar-se a dever essencialmente a 2 ordens de fatores:
A fatores de ordem endógena/ interna: prendem-se com as qualidades do próprio agente (é a inimputabilidade)
A circunstancialismos situacionais/exteriores: que retiram ao DP a possibilidade de censurar a conduta, porque à luz dos critérios do DP, esse
circunstancialismo exterior de crise torna não exigível aquele concreto agente que atue de forma conforme ao dto.

É nesta aceção, como concretização desta ideia da não exigibilidade subjetiva que a doutrina fala do estado de necessidade do ART. 35º como uma causa
de exclusão da culpa.
Todavia, contrariamente a este ponto de partida, se analisarmos a generalidade da doutrina quando escreve sobre este último artigo, a doutrina pretende
enunciar um critério preciso p/ se avaliar se é exigível ou não, responde quase sempre que:
Considera-se exigível aquilo que se considera ao exigível ao homem honesto e fiel ao dto, que é o homem medio.
Isto é uma contradição por referência à qualificação da inexigibilidade da causa da exclusão da culpa, uma vez que o que está em causa na culpa é saber se
é exigível aquele concreto agente, em função das suas concretas características, qualidades e capacidades.

Significa que a doutrina tradicional está a confundir 2 coisas:


Está a confundir o juízo de culpa com o juízo de ilicitude pessoal. Viu-se que o ilícito pessoal procura o desvalor pessoal objetivo do ato, valorando o ato
com o sentido que teria se tivesse sido praticado pelo homem medio. Significa que a doutrina quando está a pretender enunciar o critério da inexigibilidade
subjetiva está é a enunciar o critério do

ilícito pessoal. É na base desta ideia, e à semelhança do já falado excesso intensivo de legitima defesa do 33º CP, que o regente diz que aqui se deve falar
de um estado de necessidade justificante supralegal. Estado de necessidade justificante supralegal, que embora moldado sobre o desenho fáctico do 35º,
respeita a situações em que ao homem medio, nesse caso concreto, não fosse exigível comportamento diverso, i.e., assente no critério da inexigibilidade
objetiva.

Com isto, o regente da cadeira vem dizer que no nosso dto existem 3 estados de necessidade:
Estado de necessidade objetivo justificante, consagrado no ART. 34º;
Depois existe um estado de necessidade objetivo justificante, moldado sob o desenho fáctico do ART. 35º, mas aferido à luz da inexigibilidade objetiva;
o Depois existe o estado de necessidade desculpante, expressamente previsto no
ART. 35º.
Para percebermos esta figura devemos voltar à LD: a LD é um contra-ataque contra o agressor. O titular do bem jurídico ou quando estejam em causa bens
jurídicos de terceiro, aquele que está a atuar em auxílio de terceiro. Vendo o bem em perigo, iminente ou em execução, p/ o preservar, na impossibilidade
de recorrer à força publica, reage contra o próprio agressor, contra a própria fonte de perigo.
A agressão pressuposta na LD, diz a lei e a doutrina, tem que ser uma agressão ilícita. Como é que se vai caracterizar esta ilicitude?
Antigamente caracterizava-se esta ilicitude da agressão, como pressupostos da LD, nos quadros do ilícito objetivo: era o dano ou o perigo do dano e não
interessava se esse perigo resultava do comportamento humano ou de comportamentos de animais.
Mais tarde restringiu-se que só pode ser uma agressão derivada de um comportamento humano e tem de ser uma ação humana p/ efeitos jurídico-criminais
(atos reflexos, descargas nervosas, etc, não relevam p/ estes efeitos).
Perante isto esta restrição do âmbito da LD, resultante de uma alteração do conceito de ilicitude como requisito da LD, trouxe vazios de punição, melhor
trouxe insuficiências do regime de LD p/ os casos concretos.
Ex.: suponhamos que alguém está para ser atropelado e a única forma de evitar o atropelamento é disparar para uma das rodas. Com isto, altera a trajetória
do automóvel, evita ser atropelado, mas o carro vai contra uma arvore e o condutor sofre lesões à sua integridade física.
Se o condutor ia de facto para atropelar temos então uma agressão ilícita pelo que não haveria problema de aplicar a LD.
Suponhamos agora que o automóvel vai contra o agente, não por o querer atropelar, mas porque apanhou uma mancha de óleo na estrada. i.e., o tal
atropelamento não resultava de uma atuação voluntaria do condutor, mas resultava da situação de óleo na estrada.

Neste caso o condutor estava dentro do risco permitido e esta conduta seria licita. Logo, a agressão em causa era uma agressão licita. Assim o ato do peão
disparar contra as rodas já não poderia ser justificado com base na legítima defesa.
Todavia, todos compreenderão que não havia justificação p/ as duas hipóteses:
 Perante a situação concreta, o peão não tem como distinguir se o agressor age intencionalmente ou não. Vê-se perante a iminência de ser atropelado e
então dispara (tem a mesmíssima reação nos dois casos). Qual a razão para considerarmos a conduta justificada numa situação e noutra não?
 Foi esta insuficiência que levou os autores a introduzirem a figura do estado de necessidade defensivo. Portanto, o estado de necessidade defensivo
recobriria todas aquelas situações em que o agente protege o bem jurídico, não à custa de terceiro (como era o caso de estado de necessidade ofensivo), mas
protege o bem jurídico, próprio ou de terceiro, à custa da esfera jurídica do agressor.
A única diferença entre as situações de estado de necessidade defensivo e as situações de LD está na natureza da agressão:
Num caso a agressão é ilícita em termos de LD;
Noutros casos a agressão é licita e temos estado de necessidade defensivo.
O que significa que hoje em dia, perante um caso concreto, para saber se se trata de uma situação de Estado de necessidade ou LD temos que nos
questionar:
À custa de quem é que o agente protege o bem jurídico?
Se for à custa de um terceiro que nada teve que ver com a situação, trata se de EN ofensivo;
Se o agente defende o bem jurídico à custa da esfera jurídica do agressor temos que nos questionar se a conduta é licita ou ilícita.
Se for ilícita estamos perante uma situação coberta pela LD;
Se for lícita estamos perante uma situação coberta pelo EN defensivo.
Quanto à compreensão do estado de necessidade defensivo existem, todavia, 2 entendimentos:
Na Alemanha o EN defensivo foi introduzido por uma causa de justificação supralegal, com requisitos próprios, construído pela jurisprudência e doutrina.
Entre nós houve autores que pretenderam/ pretendem consagrar no ordenamento jurídico português o EN defensivo nessa veste de causa de justificação
supralegal, apontando-lhe requisitos próprios (nomeadamente quanto à ponderação de bens), i.e., procuram uma posição intermedia entre o EN do 34º CP e
LD. Viu-se na al. b) do 34º o EN exige que o bem jurídico protegido seja sensivelmente superior (o oposto da LD).
O regente entende que, a admitir-se a figura do EN defensivo, deveremos seguir a posição do Dr. Figueiredo Dias, dizendo que deve ficar sujeito ao regime
do EN ofensivo.
Em relação ao EN defensivo deve continuar a valer a teoria diferenciada, nos mesmíssimos moldes estabelecidos no 34º e 35º; i.e., também o estado de
necessidade defensivo pode funcionar ou como tipo justificador (causa de exclusão da ilicitude) ou

como causa de exclusão da culpa, sendo que a diferença reside na exigência da al. b) do 34º.
Também p/ excluir a ilicitude no EN defensivo o bem jurídico protegido tem de ser sensivelmente/ manifestamente mais valioso.
Esse admitir-se ou não esta figura depende menos do regime do próprio estado de necessidade do que do regime da LD.
O regente considera que a introdução desta figura surgiu p/ colmatar a deficiência de regime, resultante de uma deficiente interpretação do requisito da
ilicitude da agressão da LD. O regente, partidário do ilícito pessoal, crê que a ilicitude deve ser entendida de outro modo: p/ medir o desvalor do
comportamento do agente e não p/ medir o desvalor da agressão, do pressuposto do comportamento do agente. Crê que uma adequada conformação do
regime da LD torna desnecessário a existência desta figura do EN defensivo.

Nota: do angulo do desvalor de ação daquele que vê o automóvel a aproximar-se (no exemplo supramencionado) é o mesmíssimo, por não ter a
possibilidade de verificar se a agressão é intencional ou não. O se avalia na LD não é a agressão (esse é um plano de saber se o agressor é punível ou não) –
o que estávamos a averiguar é o desvalor da conduta do defendente.
Este desvalor da conduta do defendente é o mesmo, quer a agressão seja intencional por parte do condutor ou não intencional.
Por isso, o regente entende que o requisito da ilicitude da agressão deve ser definido como o puro dano ou o perigo do dano p/ o defendente ou de um
terceiro.
No próprio regime da LD já há limitações no caso da agressão não ser culposa a que muitos autores alargam p/ situações em que o agente atua de forma
negligente não dolosa, quando de todo em todo o agente não puder furtar-se ao confronto. Limitações desta índole já não serão suficientes, quando sejam
aplicáveis ao caso, p/ garantir a justiça da solução nas hipóteses em que a agressão é também licita, no sentido do ilícito pessoal não foi intencional? O
Prof. pensa que sim e que, portanto, não há qualquer lacuna, não havendo necessidade de se chamar à colação o EN defensivo.
Nota: a admitir-se estas figuras, tem sempre que se verificar o elemento subjetivo em que a sua falta tem as mesmas consequências que têm a propósito de
toda e qualquer causa de justificação.

Conflito de deveres
O agente está vinculado a dois deveres, mas só pode cumprir um deles. O que significa que se cumpre um, viola o outro, ou se cumpre o outro, viola o 1º.
Durante muito tempo pensou se que esta situação se reconduzia à situação de estado de necessidade. Ex.: o medico tem dois doentes, mas só tem remedio
para um deles.

Os deveres não valem por si. Devemos questionar-nos quais dos BJ subjacentes aos deveres em confronto é o mais valioso e o menos valiosos. Assim
quando o BJ subjacente ao dever que o médico prosseguiu fosse sensivelmente mais valioso, excluía se a ilicitude. Na base deste raciocino dizia se que o
conflito de deveres não tinha autonomia já que era reconduzível ao Estado de necessidade e mais concretamente à teoria diferenciada do EN.
Esta logica que em parte é verdadeira falha num ponto: esta situação é diferente do EN e isso reflete se no estabelecimento de uma diferente teoria
diferenciada. No EN o agente é livre de atuar ou não atuar. Ele não é obrigado a atuar. A OJ só lhe dá o dto de atuar quando o BJ protegido é sensivelmente
mais valioso. No conflito de deveres ele não é livre de atuar ou não atuar. Ele tem o dever de intervir e se não intervier é punido. No EN se ele não
intervier, simplesmente sofre o dano
Ex.: Suponhamos que dois acidentados precisam da intervenção do medico para sobreviver. Já que o agente não é livre de atuar, a equação da teoria
diferenciada é outra e por isso deve se excluir a ilicitude sempre que o bem protegido é mais valioso que o bem sacrificado ou se os valores em causa têm o
mesmo valor. Isto mesmo nos diz o art 36º/1 (Não é ilícito o facto de quem, em caso de conflito no cumprimento de deveres jurídicos ou de ordens
legítimas da autoridade, satisfizer dever ou ordem de valor igual ou superior ao do dever ou ordem que sacrificar). Assim é um tipo justificador. Exclui a
ilicitude quando o dever prosseguido é mais valioso mas também quando tem igual valor ao dever não cumprido/sacrificado

Quanto à determinação do conflito de deveres, e de quando estamos perante uma situação de conflito de deveres importa reter que só releva para este efeito
deveres jurídicos (não revelam deveres morais); quanto à ponderação de deveres, o prof entende que temos de olhar para as consequências em concreto do
incumprimento de um dever e de outro dever- pode suceder que a lesão de um dever leva ao sacrifício de um BJ que até é em abstrato mais valioso, mas em
concreto seja menos valioso.
Ex.: Suponhamos que um médico tem dois acidentados- os dois precisam da sua intervenção para sobreviver. O incumprimento de um dever e de outro tem
o mesmo resultado. Só que infelizmente o medico repara que um dos acidentados é um filho. Para o Dr. Eduardo Correia e o Dr. Figueiredo Dias, ao dever
geral do medico de tratar os doentes acresce o dever especial de cuidar do filho- assim o dever de salvar o filho é um dever mais especial do que o outro. O
prof discorda já que no plano do DP só está em causa a preservação de bens jurídicos relevantes. Assim deverá atender se apenas ao cumprimento ou
incumprimento dos deveres em causa. A partir do momento que se chegue à conclusão que são deveres idênticos porque a consequência era a mesma,
nestes casos há que deixar a decisão à liberdade dos médicos. Esqueçamos a relação entre pai e filho- ele tem de escolher um deles. Nesta opção de
consciência deixemos o homem livre. Quanto à ponderação dos deveres em conflito deve atender se as consequências resultantes do incumprimento de um
dever e de outro
O Conflito de deveres para funcionar como tipo justificador tem que ser um conflito de deveres jurídicos, não se trata de deveres morais. Alguma doutrina
(alemã) diz que têm que ser dois deveres de ação, porque quando os deveres tiverem sinal diverso (isto é, um dever de ação e um de omissão), isso já não é
situação de conflito de deveres, mas de

estado de necessidade pois o que há é o dever concreto de atuar e o dever de respeito geral.
Ex.: O caso do museu em que os canos vão contaminar as obras - o diretor do museu tem o dever de atuar para salvar o museu (fechar a ala), mas também
tem o dever de não sequestrar as pessoas. Aqui tem de atuar, é obrigado a fazê-lo. Seguindo a doutrina tradicional, o professor não aceita a restrição do
conflito de deveres aos casos em que os conflitos de deveres têm um idêntico sinal. Esta posição pode levar a situações difíceis - exemplo de um hospital
que só tem 1 ventilador a que um doente já está ligado e há um outro doente que chegou e que também precisa. Ambos doentes precisam do ventilador para
sobreviver. O medico pode desligar o ventilador do doente para o ligar ao outro doente? Perante o dever de salvar o bem jurídico e o dever de não lesar o
bem jurídico, este de não lesar sobrepõe-se sempre.

Consentimento do ofendido
O consentimento do ofendido consiste no facto de o titular do BJ admitir/consentir na lesão do BJ. Quando se trate de BJ disponíveis, o titular do BJ pode
consentir na lesão desse mesmo BJ. Tradicionalmente, a doutrina encara esta situação como uma causa de exclusão da ilicitude.
A doutrina entende que, tratando-se de BJ disponíveis, quando o titular consente na sua lesão, necessariamente deixa de haver um BJ penalmente relevante.
Esta ideia fortificou- se e fala-se hoje que o consentimento é uma concretização da liberdade de disposição sobre bens que se se sobrepõem ao interesse da
OJ global na preservação de BJ, sendo esta a ideia que subjaz na doutrina maioritária, que tem por base a teoria monista – pp. da ponderação de BJ ou de
interesses (seleção de entre todos os BJ penalmente tutelados dos que são disponíveis, havendo uma ponderação de interesses: por um lado, o interesse do
Estado na preservação de BJ e por outro lado, a liberdade do particular dispor os seus BJ).
Quanto à natureza atribuída ao consentimento existem várias posições:
O consentimento seria uma causa de justificação (Eduardo Correia)
Paradigma dualista (Costa Andrade e Figueiredo Dias) – o consentimento pode, nuns casos, intervir como causa de justificação, sendo que nestas situações
esta doutrina as denomina de “consentimento”, mas noutros casos intervém como uma causa de exclusão da tipicidade do facto ao qual a doutrina se
denomina de “acordo”.
Qual o critério para distinguir o consentimento do acordo? O consentimento é feito pelo titular do bem e, é congruente com o próprio sentido da lei e da
tutela do BJ. Ex: Alguém pede a outrem que lhe parta o relógio.
No acordo o agente realiza o próprio BJ. Ex (1): No caso em que alguém convida outra para entrar em casa – o BJ em causa é a privacidade. Ora, a sua
privacidade faz-se na relação com o outro e, o consentimento de alguém que convida outro a entrar está a realizar o próprio BJ. Ex (2): uma cirurgia – os
tratamentos médico-cirúrgicos melhoram a saúde da pessoa, pelo que se trataria de um acordo.
Esta doutrina distingue, dentro do consentimento, dois tipos: consentimento propriamente dito e o consentimento que intervém como uma exclusão do tipo
incriminador (o ato consentido é congruente com o BJ).
Almeida Costa + Roxin – o consentimento, em qualquer circunstância, é sempre uma causa de exclusão da própria tipicidade (exclusão da tipicidade do
facto). Estes autores têm por base a conceção personalista dos BJ disponíveis, que são aqueles que estão à liberdade de disposição pelo seu titular– os BJ
disponíveis valem pelo conteúdo ou titularidade que propicia à pessoa. A partir do momento em que o legítimo titular prescinde desse BJ, verdadeiramente
deixa de existir o BJ penalmente relevante porque o BJ vale como expressão dessa liberdade de disponibilidade
O consentimento abrange apenas a conduta ou o resultado? Esta questão coloca-se no âmbito dos crimes materiais, que são aqueles que apenas se
consideram perfeitos quando se verifica o resultado da conduta. Ora, Almeida Costa e a doutrina maioritária diz que necessariamente o consentimento
abrange todas as consequências que lhe sejam imputadas, ou seja, abrangendo também o resultado.
Requisitos do consentimento:
Tem de se tratar de BJ disponíveis (art.38º/nº1 do CP), que estejam compreendidos na liberdade de disposição da pessoa e em relação aos quais a OJ deu
prevalência da disposição do seu titular em detrimento da sua preservação da OJ global desses BJ. Exclui-se do consentimento, os BJ do Estado e os BJ
supra- individuais (Ex: atentado ao sistema monetário, segurança do Estado, etc.). Quais os BJ disponíveis? o valor vida (a vida é indisponível em relação a
terceiros
– Ex: o suicídio não é punido) e os direitos de personalidade elementares (Ex: redução à escravatura).
Quanto aos BJ de natureza patrimonial e em relação à integridade física (art.149º/nº1 do CP) é admitido em geral, o consentimento.
Clausula dos bons costumes (art.38º/nº1 do CP) – exclui a relevância do consentimento, mesmo quando se trate de BJ disponíveis, quando o ato consentido
se traduza numa lesão grave e irreversível de BJ de carater pessoal, desde que essa lesão não tenha por objeto salvaguardar interesses de igual ou superior
valor (art.149º/nº2 do CP): pode estar-se perante um ato que contenda apenas com BJ disponíveis e mesmo assim a nossa legislação excluir a relevância do
consentimento, quando contrariar os bons costumes. No passado os bons costumes estavam relacionados com a moral comum. Hoje, defende-se que os
bons costumes estão restringidos: mesmo estando em causa BJ disponíveis o consentimento não releva quando a lesão consistir numa lesão grave e
irreversível de um BJ (Ex: tirar o fígado para ficar mais leve).
O consentimento é uma concretização da liberdade de disposição de bens, que tem de assentar numa manifestação livre, seria e esclarecida (art.38º/nº2 do
CP). Teoria da direção de vontade – se o consentimento é um ato de liberdade de disposição do seu titular o que releva é a direção de vontade do próprio
titular. O consentimento tem de ser anterior ao ato consentido. Para alem disso, tem de ser um ato de vontade sério, livre e esclarecida (tem de ter
capacidade para consentir, mas que capacidade é esta? A doutrina penal entende que o consentimento precisa

da capacidade natural – entender o sentido do ato consentido, apenas com o limite formal dos 16 anos estabelecido na lei – art.38º/nº3 do CP). A vontade
não pode ser coagida (diz-se que só releva a coação jurídico-penalmente relevante – que caiba no tipo legal de coação ou de ameaça, as restantes não
relevam) ou assentar em erro. Existem duas situações de erro:
erro que foi provocado pelo beneficiário do consentimento – sempre que o beneficiário estiver induzido em erro, o consentimento não releva. Mas, este
erro provocado pelo beneficiário só releva se incidir sobre o concreto BJ;
erro que não foi produzido pelo beneficiário do consentimento – neste caso o erro em pp. não exclui a relevância do consentimento. Nós só entendemos o
consentimento através da sua expressão, por exemplo, a partir de uma declaração expressa. Todavia, se o titular do bem emitir uma declaração de vontade,
mas o agente saber que ele está em erro, pelo que o consentimento não relevaria e deveria negar-se o consentimento, apesar de a declaração de vontade
apontar nesse sentido – mas a eficácia pratica desta teoria será pouco relevante porque será difícil prová-lo devido ao pp. in dubio pro reo.
Requisitos de forma (ausência) – art.38º/nº2 do CP: o consentimento pode ser prestado por qualquer forma e por qualquer meio que seja adequado a
exprimir a vontade seria, esclarecida e livre– palavras, ações, etc. Não existem requisitos de forma. Mas, o consentimento pode também resultar de atos
concludentes – consentimento tácito. Pode ser expresso, quando há um ato de vontade, por palavras orais ou escritas ou por gestos; ou consentimento tácito
– expresso através de atos concludentes.
Requisito comum (requisito subjetivo) – art-38º/nº4 do CP: é necessário que o agente saiba que esta a atuar numa situação de consentimento. no art.38º/nº4
do CP – o ato é ilícito, mas será punido a título de tentativa. Esta regra justifica-se na base da conceção personalista do BJ. De facto, os BJ disponíveis
valem não por si, mas como instrumentos para a realização da pessoa, deixando de haver desvalor do resultado e somente desvalor da ação. Na doutrina há
uma diferença. FD e AC entendem que esta remissão é em geral para todo o regime da tentativa porque a situação é análoga a título de tentativa, ou seja,
quando o agente não conhecer a situação de consentimento é lhe aplicável o regime da tentativa e quando a lei o preveja. Costa Andrade diz que é sempre
punido a título de tentativa. O prof. entende que este art.38º/nº4 do CP apenas se aplica para o consentimento. A doutrina maioritária entende que este
artigo se aplica para todos os tipos justificadores.
A par do consentimento efetivo ou real/ tout court de que estivemos a falar, em que o agente seja de que forma for manifesta efetivamente a sua vontade,
permitindo o ato que lesa o BJ. Mas, há situações em que a doutrina identifica o consentimento presumido – art.39º do CP, para as situações em que o
titular do BJ não está em condições para prestar o seu consentimento, mas o agente, no sentido de o favorecer, presume o seu consentimento. O agente atua
em “Estado de necessidade de decisão”, pois não pode obter em tempo útil uma declaração expressa do seu consentimento. Assim, diz-se que o
consentimento presumido produz os mesmos efeitos do consentimento real.

Qual o critério que o agente deve atender para o consentimento presumido? Critério daquele homem concreto ou o critério do Homem médio? O
consentimento é a expressão da liberdade do agente, é a liberdade de disposição sobre os bens, pelo que o critério tem de ser o do Homem concreto.
Impõe-se ao agente que ele refaça/ficcione a vontade do legitimo titular se conhecesse a situação e pudesse exprimir o seu consentimento. Mas, a nossa lei
diz que o consentimento só produz efeitos quando for razoável supor que o titular teria consentido (art.39º/nº2 do CP). Ou seja, não se pode exigir ao
agente o impossível, ele tem de respeitar aquela que seria a vontade do agente, mas dentro do que seria razoável, caso não a saiba de forma expressa ou
tácita.
Os requisitos do consentimento presumido são os mesmos do consentimento real/propriamente ditos, acima citados (art.39º/nº1 do CP).
O art.150º, art.156º e art.157º do CP – consentimento e tratamento médico cirúrgicos
O art.150º do CP afirma que as intervenções no corpo, desde que sejam as indicadas de acordo com as legis artis e de acordo com os códigos
deontológicos, desde que tenham uma função terapêutica e desde que realizadas por médicos não se consideram ofensas à integridade física. O art.156º/nº1
do CP tem subjacente a proteção de que BJ? é a liberdade, porque ninguém pode ser curado à força. Neste caso, quando há consentimento exclui-se a
própria tipicidade, que para o FD é um “acordo”. Este consentimento tem de preencher os mesmos requisitos do consentimento em geral. O art.156º/nº2 do
CP – o medico pode atuar, no próprio interesse do doente, desde que seja presumível que o doente consentiria nessa intervenção diferente da que estava
planeada.
Ex: uma pessoa tenta o suicídio e vai parar ao hospital, poderia presumir-se que ele quereria morrer – está provado que na esmagadora maioria dos casos de
suicídio, à última da hora o agente arrepende-se e quer ser salvo. E aqueles que não se arrependeriam? Na dúvida, como o medico não pode saber qual a
posição do suicida, o médico pode sempre salvar, pois a maioria queria tratamentos. Se ele o deixa morrer, não há retorno.
Falaremos agora de outras figuras que são apontadas pela doutrina como causa de exclusão da ilicitude, mas que para o prof. são causas de exclusão da
tipicidade do facto.
Obediência hierárquica – caso do superior hierárquico dentro da AP que dá ordem a um inferior hierárquico e que essa ordem origina a prática de um
crime. Havia duas teorias
Teoria da hierarquia – valores de ordem, disciplina da AP. Defende que o funcionário era obrigado a obedecer e, nestes casos a obediência hierárquica era
uma causa de exclusão da ilicitude
Teoria da legalidade – o Homem não é autómato, pelo que sempre que seja ilegal deve recusar a ordem.
Estas posições antagónicas deram lugar a uma tese maioritária (art.271º/nº2 e nº3 da CRP
+ 36º/nº2 do CP), que distingue entre os casos em que a ordem conduz à prática de uma ilicitude não penal, que dá origem ao direito de respeitosa
representação. Diferentemente quando a ordem conduzir à prática de um crime/ilícito penal, o agente tem o dever de desobedecer, de não cumprir a ordem,
pois se o fizer será corresponsabilizado juntamente

com o superior hierárquico (art.36º/nº2 do CP). Mas, a responsabilidade doo inferior hierárquico, mesmo nestas situações, pode ser excluída: art.37º do CP
– as pessoas têm formações diferentes e pode acontecer que o inferior hierárquico não saiba que aquela conduta consubstancia um ilícito penal, para além
de que supõe que o superior hierárquico não o iria mandar cometer um crime. este artigo contempla um caso especial de erro sobre a ilicitude, cujo regime
geral se encontra no art.17º do CP. Assim, exclui-se a culpa e a pena do concreto funcionário. A outra situação especial: o pp. geral deve ser o de
obediência hierárquica, mas apesar de tudo isso, o futuro do funcionário e a manutenção do cargo e a consequente subsistência da sua família está em larga
medida nas mãos do superior hierárquico, não sendo exigível ao funcionário à luz do Homem médio que desobedeça – inexigibilidade objetiva. Mas, trata-
se de situações excecionalíssimas e apenas se aplicam a crimes de diminuta gravidade.

Atuações oficiais
No cumprimento dos seus deveres funcionais os funcionários públicos (policias, investigadores, etc.) às vezes são obrigados a praticar atos típicos, que
seriam ilícitos se fossem adotados por particulares. Ex: invasão domiciliaria, intromissão nas comunicações, etc.
O prof. discorda que seja uma causa de exclusão da ilicitude, mas sim exclusão da tipicidade. Se a conduta não for realizada, a conduta típica seria na
mesma ilícita porque se o oficial não fizer uma busca domiciliária estará a incorrer num crime de corrupção,
p.e. Ou seja, estas atuações nem sequer são subsumíveis a um tipo incriminador, pois essas condutas são realizadas no cumprimento de um dever funcional.
Autorizações oficiais
São casos que contendem com matérias de risco permitido. São setores de atividades que comportam utilidade social e comportam também riscos, pelo que
a lei estabelece alguns limites e controlo dessas atividades especialmente perigosas, mas essenciais para a sociedade.
Estas autorizações oficiais traduzem-se em situações quem a autoridade administrativa estabelece o risco permitido (Ex: licença de condução).
Nem sequer está a cometer uma conduta ilícita, pelo que não são causas de exclusão da ilicitude, mas sim de exclusão da tipicidade do facto como o prof.
Almeida Costa defende).
O direito de correção dos pais
O direito de correção respeita ao facto de que a preparação do menor para uma vida adulta responsável possa passar por restrições de direitos, que seriam
subsumíveis a um tipo legal de crime, mas desde que se trate de restrições moderadas e desde que exercidas em vantagem do menor, diz-se que se exclui a
ilicitude da conduta.
Ou seja, os castigos moderados exercidos com o objetivo de preparar o menor para uma vida adulta responsável– exerce-se no âmbito da adequação social.

Ex: um pai diz que, de castigo, o filho não sai à noite durante uma semana. É sequestro? NÃO, porque nem sequer preenche o tipo incriminador. Para o
prof. trata-se de uma exclusão da tipicidade do facto e não de exclusão da ilicitude, pois nem constitui um crime.

Culpa
Quanto à culpa, o sistema que nós temos hoje, é em longa medida contributo dos vários sistemas que tivemos.
o Um dos contributos do sistema clássico é sem dúvida o conceito normativo de culpa- conceito psicológico de culpa- nexo psicológico que liga o agente
ao seu bem. Não permitia a distinção entre imputáveis e inimputáveis, nem os atos praticados em estado de inexigibilidade e exigibilidade, nem sequer
abrangia a negligência inconsciente.
o O sistema normativista/neoclássico ultrapassou esta situação. Introduzindo o conceito normativo de culpa. A culpa era um juízo de censura dirigido ao
agente que praticou o ilícito típico quando podia não ter praticado. Assim dolo e negligência mais do que diferentes estruturas psicológicas eram
verdadeiros graus de censura. Este conceito normativo de culpa salvo opiniões minoritárias integra ainda hoje a conceção dominante quanto ao conceito de
culpa.

Houve alterações já que a ciência jurídica vai evoluindo, mas a matriz essencial é esta: compreensão de culpa como juízo de censura dirigido àquele
concreto agente.
Problema essencial: só podemos censurar algo a alguém quando essa pessoa é responsável por aquilo que realizou. Questão da liberdade humana: voltemos
a uma questão do sec. XIX em opunha se
teoria da vontade- entendia que o homem era livre. Na resposta ao acontecimento exterior o homem teria liberdade de escolha. A escolha dos motivos dos
atos. Na escolha reside o espaço de liberdade de cada pessoa. É verdade que esta liberdade esta condicionada. No entanto reconhecia que o homem tinha
um espaço de liberdade em que se decidia sobre si mesmo. Neste espaço de liberdade afirmaria se a liberdade. O órgão da liberdade seria a vontade;
teoria da representação defendia se o determinismo da conduta humana-as regras causais que explicavam os fenómenos da natureza entendia em estes
autores que regiam o comportamento humano.
Há autores que negam a liberdade humana. O problema de liberdade humana é um problema de verdade de adesão. O prof. Almeida Costa entende que a
experiência de todos os dias nos traz a experiência da própria liberdade.

O prof. parte da ideia de liberdade como verdade de adesão. A culpa é uma estrutura essencial para a dogmática penal. O prof adere a um conceito
normativo de culpa. Este conceito normativo de culpa tinha uma dificuldade que perpassou todo o sistema neoclássico. Sem dúvida que a culpa era
censurabilidade, mas qual era o substrato desse juízo de culpa? A culpa não se resumia ao nexo psicológico volitivo. Era um juízo de valorização sobre
determinadas situações em que se verificava o nexo psicológico. Este conceito não permita distinguir a negligência consciente e o dolo eventual.
Mais grave do que não explicar esta diferença é que este conceito normativo de culpa, não explicava a negligencia inconsciente porque aqui não há nenhum
nexo psicológico. Muitos autores do conceito normativo de culpa vieram defender uma de duas coisas: muitos deles diziam que a negligência inconsciente
não é uma forma de culpa e há outros autores que procuraram um qualquer elemento do dolo na negligencia. Este conceito normativo de culpa permitiu um
salto: salto esse que corresponde à configuração que ainda se mantém do conceito normativo de culpa- o que se censura é a atitude que o agente tem, ou
melhor que o agente revelou com a prática do facto perante o dever ser jurídico penal. De todo o modo com esta viragem, deixou de ser pressuposto de
culpa a verificação do nexo psicológico. Esta viragem deu-se nos inícios do séc. XX- falava se da culpa pelo sentimento e depois impos se a culpa pela
atitude e a culpa da personalidade. É evidente que também existem autores que adotam postura positivista/naturalística/determinística.

No fim de contas todos nós nos pequenos e grandes momentos da vida perante a situação concreta temos a possibilidade/liberdade/capacidade de decidir a
nossa conduta em concreto. Todos nós somos responsáveis também por aquilo que nos vamos tornando. Assim nesta ideia radica maioritariamente o
conceito normativo de culpa. É evidente que este conceito normativo de culpa assenta nesta ideia da liberdade, não um livre-arbítrio, mas tão só uma
liberdade condicionada/um determinismo relativo.
Aludindo à teoria de FD que ente a culpa enquanto culpa da pessoa – mas, para o prof., esta teoria de FD recobre uma posição determinista. FD afirma que
em concreto todos nós agimos daquela maneira e não poderíamos agir doutra forma, porque é da nossa natureza. Ou seja, no momento da prática do facto o
agente não é livre, mas ele é responsável pelo seu próprio modo de ser, pois o Homem decide-se a si mesmo por aquilo que vai ser. Roxin critica FD
dizendo que há momentos que nos transformam, mas não são esses momentos que nos definem. Ou seja, ninguém decide ser de determinada forma. A
teoria de FD acaba por ser uma teoria determinista porque o autor nega a teoria da vontade, dizendo que não é demonstrável cientificamente. Para o prof.
trata-se de uma engenharia doutrinal jurídica.

Dois pontos essenciais:


o facto de falarmos na culpa em nada contradiz a conceção unilateral/unívoca da culpa. A culpa é pressuposto e limite da punição mas não é fundamento.
Este conceito normativo de culpa deve ser entendido na conceção unilateral/unívoco da culpa- não há pena sem culpa nem a pena pode ultrapassar a
medida da culpa. Mas pode haver culpa sem pena. Ou a pena ficar abaixo da culpa. Porquê? Porque

se pretende proteger os BJ essenciais. A culpa é tão só um limite devido a uma ideia de humanidade das próprias penas.
reforçar de novo os termos que se contrapõe o ilícito e a culpa no quadro de uma teoria do ilícito pessoal. Enquanto no ilícito doloso procuramos o
conteúdo pessoal implícito ao ato, na culpa procuramos o desvalor pessoal subjetivo do ato. Assim o juízo de ilicitude pessoal corresponde a um juízo de
culpa do homem médio. Na culpa estamos a fazer um juízo pessoal subjetivo que atende as especiais características do agente. O prof. considera que o
juízo de culpa funciona pela negativa. As características da culpa funcionam pela negativa. O juízo de exclusão da culpa é um juízo de negação do ilícito.
No ilícito pessoal determinamos o sentido pessoal objetivo da situação, ao passo que a culpa procura avaliar o sentido da conduta enquanto ato daquele
concreto agente, o que pode levar a que a afirmação do ilícito não se siga da afirmação da culpa.

A culpa avalia se pela negativa, dai a dogmática da culpa avaliar se pela negativa. Destaque para três paradigmas:
falamos de um paradigma biopsicológico- conceção dos positivistas/determinista- para esta conceção o homem não é livre. A reposta de cada um de nós
aos estímulos da realidade exterior é uma resposta condicionada causalmente. A distinção do inimputável seria apenas uma anormalidade, uma reação
diferente. Assim nega se a liberdade e a vontade. A inimputabilidade traduz se numa doença psíquica que se entedia que tinha substrato biológico, o ADN
do inimputável não seria livre provocando sim uma reação diferente. A inimputabilidade representava uma doença psíquica com substrato psicológico. Se
não há liberdade de vontade, então a anomalia teria que conter apenas com aspetos intelectuais. Era uma doença psíquica que afetava as capacidades de
compreensão e/ou de avaliação.
orientação maioritária: paradigma normativo- parte se da ideia de liberdade dentro do indeterminismo relativo- a inimputabilidade pode refletir se tanto ao
nível das capacidades de representação como capacidades volitivas. Teria que ver com uma anomalia psíquica que afetasse ou a capacidade de avaliação do
ilícito ou a capacidade de se determinar de acordo com essa avaliação. Para se falar da inimputabilidade teria se que se verificar uma qualquer afetação que
afetasse as capacidades intelectuais ou volitivas do agente (anomalia psíquica e essa anomalia teria que ter consequências no plano normativo. Este
elemento normativo traduz se no facto da sequência da anomalia psíquica o agente fosse incapaz de distinguir o lícito ou o ilícito ou então que não fosse
capaz de se determinar de acordo com essa avaliação. Esta orientação é a que melhor se adequa ao texto da lei portuguesa e é esta a perspetiva do curso. A
estes dois paradigmas surgiu o paradigma compreensivo
Paradigma compreensivo- decorrência direta da compreensão da culpa do Dr. FD: este paradigma nega que o homem em concreto seja livre. Ele é
responsável sim pela sua natureza, pelo homem como é. Mas se assim é neste plano, não há diferença entre imputáveis ou inimputáveis. O Dr. FD diz que a
inimputabilidade

não tem que ver com a existência de liberdade. Dado esse diferente funcionamento, essa diferente forma do inimputável reagir- a sua conduta não é
compreensível como ato humano em geral. O comportamento do inimputável não seria compreensível como ato humano. Assim o problema da
inimputabilidade é um obstáculo à culpa, já que o inimputável seria apenas uma espécie de caixa negra impenetrável pelo juiz. Assim, esta é a natureza da
inimputabilidade que faria com que o juiz mais do que excluir o juízo de culpa não tinha meio de penetrar na logica do inimputável.
Esta perspetiva é uma decorrência da conceção da culpa do Dr. FD. Mesmo na prática é pouco verossímil. Um ato de um menor de 16 anos não é
compreensível? Claro que é compreensível. No fim de contas estamos perante um exercício de engenharia jurídica. Por tudo isto e na base da negação da
culpa do FD vamos aderir ao paradigma normativo e que esta em consonância com o conceito normativo de culpa de que partimos.
Fundamentalmente são três as causa de exclusão da culpa: Inimputabilidade:
inimputabilidade em razão de anomalia psíquica (art 20º do CP)
Art. 20º/1: É inimputável quem, por força de uma anomalia psíquica, for incapaz, no momento da prática do facto, de avaliar a ilicitude deste ou de se
determinar de acordo com essa avaliação. Dois elementos do paradigma normativo: tem que haver anomalia psíquica e esta por si não basta. Só releva a
anomalia psíquica que tenha reflexos no comportamento do agente. Assim para ser inimputável é necessário a anomalia psíquica e que esta tenha
repercussões no comportamento do agente, na sua relação com o ordenamento jurídico penal. O juízo de inimputabilidade é duplamente concreto.
O Dto Penal é o Dto Penal do facto- ou seja avalia o facto praticado. A par de uma inimputabilidade permanente há inimputabilidades transitórias. O que o
juiz tem de determinar é se no momento da prática do facto o agente estava ou não em estado de inimputabilidade. É também um juízo concreto atendendo
ao tipo de crime em causa. O agente é inimputável em relação àquele concreto ilícito típico. A inimputabilidade respeita a uma particular espécie de crimes
(há agentes que são inimputáveis em matéria de crimes sexuais e já não o são quanto a crimes patrimoniais).
Art 20º/2: Pode ser declarado inimputável quem, por força de uma anomalia psíquica grave, não acidental e cujos efeitos não domina, sem que por isso
possa ser censurado, tiver, no momento da prática do facto, a capacidade para avaliar a ilicitude deste ou para se determinar de acordo com essa avaliação
sensivelmente diminuída. Existem situações em que o agente sofre de anomalia psíquica que afeta a sua capacidade de avaliação e/ou volitiva, mas não a
retira totalmente. Não lhe retira a capacidade de atuar conforme a sua avaliação, mas esta diminuída. São zonas em que o agente ainda é imputável, mas
essa capacidade esta diminuída (Inimputabilidade diminuída). A nossa lei dá a possibilidade ao juiz mediante as circunstâncias do caso concreto na base do
que for melhor para o delinquente, o juiz pode optar por o considerar imputável ou pelo contrário aplicar lhe medidas de segurança considerando
inimputável.
O Art 20º/3 e 4 levanta problemas de interpretação.

Art. 20º/3 - A comprovada incapacidade do agente para ser influenciado pelas penas pode constituir índice da situação prevista no número anterior. Refere-
se aqui a capacidade para ser influenciado ou não influenciado pelas penas como critério de distinção entre imputável e não imputável. Não há contradição
nenhuma se lermos com atenção. O facto de o agente ser influenciado ou não pelas penas é um mero elemento de prova a par de outros elementos de prova
possíveis. Não basta este critério para fundamentar a qualificação de alguém como inimputável. O facto de ele ser influenciado ou não influenciável é
apenas um indício. Em segundo lugar, mesmo nesta qualidade de indício a capacidade para ser influenciado pelas penas é apenas um indício a para
inimputabilidade diminuída. Assim além de ser tão só um indício. é um indício que só funciona para a inimputabilidade diminuída.
Art. 20º/4 - A imputabilidade não é excluída quando a anomalia psíquica tiver sido provocada pelo agente com intenção de praticar o facto. Diz respeito à
figura da ação que não foi livre no momento em que foi executada, mas livre na causa. É o caso de alguém que se coloca premeditadamente em situação de
inimputabilidade para praticar um crime e por isso invocar a exclusão da culpa.
Nota: A medida de segurança pode ser renovada. Findo o tempo determinada na sentença se o agente continuar a revelar perigosidade a medida pode ser
prorrogado. O que significa que haverá possibilidade de prolongamento indeterminado dessa mesma medida de segurança. Sempre que é possível os
advogados procuram puxar os seus clientes para o domínio da inimputabilidade. Pode suceder que o agente tenha sido perigoso no momento da prática do
facto e no momento do julgamento já não e perigosos, assim não haverá aplicação da medida de segurança, à luz do pp da necessidade da medida de
segurança. Esta situação da actio libera in causa: o agente no momento da prática do facto não era livre (porque por exemplo bebeu bebidas alcoólicas,
porque consumiu drogas) mas a verdade é que ele era imputável no momento em que elaborou todo o projeto criminosos. Assim a ação foi livre na causa.
Assim ele será tratado como plenamente imputável.
Esta situação difere de uma situação do art 295º/1 do CP: Quem, pelo menos por negligência, se colocar em estado de inimputabilidade derivado da
ingestão ou consumo de bebida alcoólica ou de substância tóxica e, nesse estado, praticar um facto ilícito típico é punido com pena de prisão até 5 anos ou
com pena de multa até 600 dias.
Aqui a situação é próxima da que descrevemos, mas a sanção é diferente. Aqui a pena é mais branda. A diferença reside no momento da pré ordenação. No
art 20º/4 ele coloca se nessa situação como forma de usufruir da exclusão da culpa. No caso do art 295º agente tem o dolo em relação ao colocar se na
situação de inimputabilidade- p.e o meu clube ganhou o campeonato por isso vou embriagar-me- dolo/negligência da sua própria situação de
inimputabilidade. Neste caso não houve no entanto preordenação. Este art consagra um crime de perigo abstrato- que só é punido quando se verifica o
dano. O legislador pune a embriaguez para evitar que se pratique o crime, mas só pune quando se verifica o dano. O dano é condição objetiva de
punibilidade. Há quem diga que esta condição é uma comprovação a posteriori da situação de perigo. Ou seja, daquela inimputabilidade perigosa

Os autores dizem que há aqui um desvio ao juízo de culpa que deve reportar-se ao momento da prática do facto e nesse momento é inimputável. Para
resolver esta situação surgiram 2 doutrinas para explicar: a teoria da exceção e a doutrina do delito.

Actio libera em causa - no momento da prática do facto não era livre, era inimputável, mas foi livre na causa, comandou com toda a liberdade o processo
que conduziu à sua colocação numa situação de inimputabilidade e a coberto desta, à prática de um crime. A ação livre na causa já causou dificuldades na
doutrina: o juízo da culpa deve ser feito em concreto e reportando-se ao momento da prática do facto, e, portanto, a culpa do agente deve ser averiguada no
momento da prática do facto. Nos casos do 20º/4, no momento da prática do facto ele não é livre. Assim haveria uma situação de exceção- teoria da
exceção. Aqui há exceção pois faz-se retroagir o momento da censurabilidade ao momento em que o agente ainda é livre, ainda é imputável. Quanto à
teoria do tipo esta alargava o tipo até ao primeiro ato em que o agente começou a embriagar-se ou a tomar o estupefaciente.
O prof considera que não há problema nenhum. A solução a que a o prof chega é análoga à da teoria da exceção, considerando que temos de autonomizar
dois problemas: a demarcação do facto penalmente relevante (não é quando está a beber que está a praticar o crime de homicídio que planeou praticar),
imputação a um concreto agente deste início de execução da tentativa em que o intercriminis adquire relevância penal (alguém realiza um crime por
intermédio de outrem. Nas situações de autoria mediata, o autor mediato dá a ordem ou controla o comportamento do outro num momento anterior à
própria execução e não há aqui nenhum problema que exija uma especial construção como a teoria do tipo ou da exceção. Nem podemos dizer que é uma
exceção porque a autoria mediata não são exceções, são situações contempladas no nosso direito. A demarcação do facto penalmente relevante surge no
âmbito da tentativa que só é punida quando há o começo da execução, ou seja, quando o agente inicia uma conduta que de forma direta vai conduzir à
consumação do próprio crime. O ato de execução só começa quando o agente avança imediatamente para a prática do crime - exemplo de movimento que,
sem quebras, vai conduzir ao crime. Nas situações de actio libera em causa, com este argumento afastamos a teoria do tipo.

Inimputabilidade em razão da idade: art 19º do CP (16 anos)


Art. 19º: Os menores de 16 anos são inimputáveis.
Porquê 16 anos? A fixação dos 16 anos é correta: sem dúvida que o menor antes dos 16 anos já tem a perceção das coisas. Há que reconhecer que há uma
menor responsabilidade, por outro lado por razões de humanidade é permeável às más influências e às boas influências. Assim por razões de prevenção e
humanidade, é favorável retirar o menor do projeto degradante que é o processo penal. Independentemente dos 16 anos ser um limite bom ou mau há um
elemento na legislação que cria alguma contradição. Estes limites formais são exigidos pelas próprias exigências de segurança do DP. Quanto à
incongruência que é tratar uma pessoa com 16 anos + 1 dias e outro com 16 anos – 1 dia a nossa lei estabeleceu regimes de passagem a montante e na
jusante.
A montante, temos a lei tutelar educativa (lei 147/1999) estabeleceu um regime para os menores delinquentes. Esta lei tem dois tipos de medidas: medidas
assistenciais (que respeitam aos menores em risco) e medidas tutelares educativas (para os menores entre os 12 e 16 anos que pratiquem ilícitos penais).
Estas medidas são menos severas do que as penas, privilegiando a vertente da reintegração social do menor. Todavia apesar de serem menos severas
contemplam um quantum de sofrimento no sentido da sua responsabilização. Estas medidas tem um carater responsabilização. Estes menores continuam a
ser tratados como inimputáveis.
A jusante: O DL 401/82 contempla o regime aplicável aos chamados jovens adultos, entre os 16- 21 anos- este DL estabelece um regime menos pesado –
um regime que privilegia tanto em nome do valor da humanidade e também à luz da prevenção especial positiva deixam antever uma mais fácil
reintegração social são medidas sobretudo viradas para a reintegração social para o jovem delinquente. Claro que isto não invalida que não se considerem
questões de defesa social
Inexigibilidade
Contende com fatores exógenos. A inexigibilidade reporta a situações que devido às caraterísticas do circunstancialismo exógeno não era exigível àquele
concreto agente atuar de acordo conforme ao direito- trata se de inexigibilidade subjetiva- tem de reportar se às características pessoais do concreto agente.
Enquanto a inimputabilidade é uma causa de exclusão da culpa que contende com as características internas do agente, a inexigibilidade contende com as
características exógenas do agente. De acordo com a ideia do mínimo de intervenção do DP entende-se que em certas situações limite o legislador não pode
exigir outro comportamento ao agente (Ex: náufragos). A inexigibilidade foi introduzida do conceito normativo de culpa, e entende-se enquanto causa de
exclusão da culpa. A inexigibilidade foi sujeita críticas, mas esta figura permaneceu no DP, sendo admitida pela generalidade da doutrina.
A doutrina alemã contemporânea, embora reconheça a inexigibilidade não a reconhece como causa de exclusão da culpa. Na Alemanha existem três
vertentes:
Uns entendem que a inexigibilidade deve pautar-se segundo a ideia do Homem médio, sendo uma causa de exclusão da ilicitude, pelo que sempre que à luz
do Homem medio não fosse exigível outro comportamento, deixaríamos de ter um facto jurídico-penalmente relevante.
A posição maioritária na Alemanha continua a colocar a inexigibilidade em sede de culpa, mas apenas enquanto causa de desculpa (atenuação da culpa) e
não uma causa de exclusão da culpa – na verdade o agente poderia agir de forma diferente, não há uma total exclusão da culpa, existindo ainda algo
censurável no agente, mas o facto nestes casos, tem um facto penalmente diminuto, pelo que há uma desculpa ao agente pela OJ – para alem da exclusão da
diminuição da culpa resultante da coação psicológica decorrente de uma situação de culpa, o comportamento praticado em EN sacrifica um bem para
sacrificar outro bem, pelo que o sacrifício do bem surge como meio para preservar outro bem – retira-se gravidade ao próprio ilícito, e consequentemente à
culpa. Estamos perante uma atenuação da ilicitude e atenuação da culpa - desvalor diminuto, pelo que estamos perante uma causa da desculpa, justificando-
se que o legislador se desculpa o ato.

Daqui resulta uma consequência: há uma renúncia excecional da OJ à punição do crime. Assim, a doutrina vem dizer que a inexigibilidade só funcionaria
nos casos expressamente permitidos na lei (lei portuguesa: excesso intensivo, asténico, não censurável da LD, EN objetivo/desculpa, conflito de deveres
subjetivo ou desculpa, obediência hierárquica desculpante – art.37º do CP – em circunstancias excecionalíssimas a situação de vida em que se encontra o
funcionário ele obedeça a uma ordem, apesar de ela constituir um crime, p.e, precisa de medicamentos para a mulher, não podendo de todo perder o seu
emprego). Sendo a inexigibilidade uma causa de desculpa deve atender às características do concreto agente. Contudo, os alemães não fazem assim:
adotam uma perspetiva geral- objetiva – a inexigibilidade é auferida de acordo com a culpa do Homem médio (se esquecemos as características do concreto
agente e os – estamos a atribuir à situação um desvalor que teria se praticada pelo homem médio, havendo uma contradição na doutrina alemã. Este
entendimento acaba por se reconduzir à primeira perspetiva – ao adotar o critério do Homem médio estão a assumir a inexigibilidade objetiva
Roxin contesta a posição anterior – deve analisar-se a culpa em geral, e depois a
necessidade de pena (o DP visa tão só prevenir a prática de crimes - pode acontecer que havendo culpa não há um facto penal relevante). Não se trata de
uma causa de exclusão da culpa, mas sim de uma causa de exclusão da responsabilidade.
Na doutrina portuguesa a inexigibilidade continua a ser entendida como uma causa geral de exclusão da culpa. Contudo, a doutrina portuguesa ao defender
a inexigibilidade como causa de exclusão da culpa cai numa dupla contradição:
Esta doutrina diz que não há uma causa geral da inexigibilidade e que a inexigibilidade só funciona nos casos expressamente previstos na lei – se a
inexigibilidade só pode funcionar nos casos previstos por lei, não há uma verdadeira causa de exclusão da culpa (o pp. da culpa entende-se que está
plasmado na própria CRP – sempre que o juiz perante o caso concreto entende que o agente atuou sem culpa deve excluir a punição ao agente. Assim, seria
inconstitucional que, ainda que em concreto, o juiz entendesse que o agente não tinha culpa, teria de o punir).
Para além disso, a doutrina portuguesa fala de uma inexigibilidade média, devendo atender-se a um critério pessoal objetivo, isto é, às capacidades e
características do Homem médio. Todavia, a culpa contende com um plano emocional-psicológico do concerto agente. Aqui parece haver uma confusão
entre os momentos do ilícito e da culpa o que conduz a que os autores, a propósito do art.33º do CP e do art.35º do CP, na medida em que interpretam estes
artigos na base do Homem medio, estão a admitir, sem se aperceberem, dois tipos justificadores supralegais: o conteúdo de antinormatividade (crime) deve
aferir-se em função o Homem médio (inexigibilidade objetiva).
Temos de distinguir entre dois tipos de inexigibilidade. A inexigibilidade deve ser entendida como uma causa geral de exclusão da culpa – há exemplos
padrão expressos no CP que não esgotam os casos em que a inexigibilidade subjetiva pode atuar como causa de exclusão da culpa. O que está em causa no
conceito normativo de culpa é o juízo de censura, mas o determinante no juízo de culpa não é a possibilidade de ter feito de

outra forma, mas sim a amplitude do juízo de censura em que a culpa se traduz num quadro de um conceito normativo de culpa, pois atendendo aos
critérios de justiça, o legislador entendeu que naquela situação não se justifica e não é legitimo, devido ao princípio do mínimo de intervenção do DP,
dirigir um juízo de culpa ao concerto agente:
Inexigibilidade objetiva: o conteúdo da antinormatividade deve aferir-se em função do Homem médio. Medida na base das capacidades, características e
qualidades do Homem médio
Inexigibilidade subjetiva: no âmbito da culpa, só esta é admitida, porque a culpa é uma concretização das características e capacidades do concreto agente
(plano psicológico-emocional do concreto agente). Só esta pode ser considerada como causa de exclusão da culpa. Medida na base das capacidades,
características e qualidades do concreto agente.

Concretizações da inexigibilidade na lei:


Estado de necessidade subjetivo/desculpante - Art.35º do CP
O EN subjetivo ou desculpante é uma causa de exclusão da culpa, pois o facto é ilícito, mas não será imputada a culpa ao agente pela conduta.
Art.35º/nº1 do CP - a situação subjacente a este EN é uma situação análoga à do EN objetivo. No corpo do art.34º do CP: tem de haver um perigo e, esse
perigo tem de ser atual, a ação tem de ser idónea para afastar o perigo. Se houver a possibilidade de recorrer à força publica ou a outros meios para impedir
a lesão do BJ, a situação não estará justificada.
A doutrina faz valer aqui o requisito da alínea a) do art.34º do CP, considerando que deve- se considerar as condutas voluntarias/preordenadas no âmbito do
EN subjetivo. Se a situação de perigo foi criada sem preordenação, a doutrina entende que pode verificar-se a inexigibilidade – continua, portanto, a valer
aqui também o requisito da alínea a) do art.34º do EN objetivo. Já no que respeita às alienas b) e c) do art.34º do CP não se aplica no âmbito do EN
subjetivo do art.35º do CP.
É ainda exigido o requisito subjetivo comum – é exigível que o agente saiba que está a agir a coberto de uma situação de EN, isto é, no âmbito de uma
causa de exclusão da culpa.
Também aqui parece que uma pessoa pode atuar em EN subjetivo em auxílio de terceiro, mas a lei deixa ao juiz a faculdade de averiguar, em concreto, se
essa situação é suscetível ou não de desencadear uma coação psicológica idêntica à que se verificaria se o BJ fosse do próprio.
E se faltar o conhecimento do requisito subjetivo ou se errar sobre o mesmo? Estaríamos perante um erro sobre as circunstâncias de facto (art.16º/nº2 do
CP). A doutrina fala, a este propósito, na tese da inexigibilidade, segundo a qual se o agente erra sobre a representação, haveria que perguntar se a situação
representada do agente, que é falsa, caso fosse verdadeira fundamentava ou não a inexigibilidade – caso a representação do agente, embora falsa, não fosse
fundamentada pela inexigibilidade, o agente era punido a título de dolo, caso contrário, o agente não seria punido. Outra parte da doutrina (Roxin)

fala que estes erros que condicionam a representação do agente, embora a situação representada não corresponda à realidade, se houver lugar à censura do
agente, o mesmo seria punido, contudo, a título de negligencia, tendo de se verificar os dois requisitos formal e material da negligencia.
Destas duas doutrinas surgiu outra (a atualmente adotada): que questiona se a representação do agente, se fosse verdadeira, era inexigível ou não? se a
representação não fundamentava a inexigibilidade, o agente era censurado – nestes casos apenas por negligencia, sendo necessária a verificação dos
respetivos requisitos formal e material. Se, por outro lado, a representação do agente, embora não verdadeira, fundamentaria a inexigibilidade, o agente age
de facto convencido que estava a atuar no âmbito de uma causa de exclusão da culpa, pelo que não há dolo. Contudo, ele pode ser responsável pelo erro na
representação da inexigibilidade. É nestes termos que devemos interpretar o art.16º/nº2 do CP, pois este inclui não só as causa de justificação como as
causas de exclusão da culpa– “ou a culpa do agente”.
O art.35º do CP restringe o âmbito do EN subjetivo ou desculpante aos casos em que o BJ em perigo fosse a vida, integridade física, etc, isto é, a BJ
estritamente pessoais. Mas, o art.35º/nº2 do CP expande o âmbito dos BJ em causa, estendendo também a BJ não pessoais.
“Desde que se verifiquem os requisitos do nº anterior” – tem de se verificar os requisitos até agora mencionados (art.35º/nº1 + corpo do art.34º +
art.34º/a)).
Há também lugar, em regra, a uma “atenuação especial da pena” (art.72º e 73º do CP).
Mas, excecionalmente o agente pode ser “dispensado da pena”. A redação originaria de 1982 não era igual à que hoje encontramos no CP (dizia que o
agente podia ser isento de pena). Nesta matéria a doutrina diverge:

Eduardo Correia dizia que a inexigibilidade pode atuar como causa de exclusão da culpa ou como causa de atenuação da culpa. Nos BJ pessoais do nº1 do
art.35º do CP, a coação psicológica produz sobre o agente uma causa de inexigibilidade capaz de afastar a culpa. Já nos BJ não pessoais, em regra, nestas
situações a inexigibilidade atua como causa de atenuação da culpa. Mas, EC dizia que excecionalmente, atendendo às circunstâncias do caso, mesmo não
sendo BJ de carater pessoal, a situação em concreto poderia constituir uma causa de exclusão da culpa.
Figueiredo Dias dizia que a inexigibilidade nunca pode, fora dos casos em que estão em causa BJ pessoais, excluir a culpa, mas apenas atenuar a culpa,
pelo que quando estão em causa BJ de natureza não pessoal, a inexigibilidade só atenua a culpa, pelo que esta impunidade (“o agente ser dispensado de
pena”) do agente não se fundamenta. Contudo, Figueiredo Dias entende também que, em determinadas circunstâncias, quando em causa estejam BJ não
pessoais pode haver lugar a dispensa de pena, por razoes de necessidade da pena.
Almeida Costa concorda com ambas as perspetivas. No âmbito da perspetiva de EC dizendo que excecionalmente, atendendo as circunstâncias do caso,
pode a situação da inexigibilidade constituir uma causa de exclusão da culpa, mas no âmbito dos BJ pessoais

a que se refere o nº1 do art.35º do CP. Por outro lado, também concorda com a perspetiva de FD, pois está de acordo com o facto de a pena poder ser
excluída por questões de necessidade de pena – dispensa de pena.
A inexigibilidade que está prevista no art.35º/nº1 (“age sem culpa”), é uma inexigibilidade subjetiva, apesar de a doutrina falar (como acima referimos) da
culpa objetiva do Homem médio – pelo que a doutrina está a criar causas de exclusão da culpa supralegais. Verdadeiramente temos três EN: EN
objetivo/justificante (art.34º) – O BJ é sensivelmente mais valioso, EN subjetivo/desculpante (art.35º do CP) – O BJ protegido é ou menos valioso, ou tão
valioso, ou mais valioso, mas não sensivelmente mais valioso do que o sacrificado, EN justificante (inexigibilidade subjetiva) – funciona como
concretização da inexigibilidade subjetiva (não cabe no art.34º nem 35º do CP)
NOTA: Quando o BJ sacrificado é um BJ pessoal não significa que estamos obrigatoriamente no âmbito do art.35º do CP, pois esta situação do art.35º do
CP só funciona no âmbito de situações ilícitas.
O conflito de deveres subjetivo/desculpante
Pode funcionar tanto como causa de exclusão da culpa como causa da exclusão da ilicitude (como anteriormente verificamos).
No conflito de deveres o agente não é livre de agir, pois está perante dois deveres conflituantes que o vinculam. O conflito de deveres funciona como causa
de exclusão da culpa e, no âmbito da inexigibilidade subjetiva quando o dever protegido for superior ao sacrificado. O art.36º/nº1 do CP apenas fala do
conflito de deveres objetivo/justificante e não o subjetivo/desculpante (que é o que aqui estamos a falar).
Ora, o conflito de deveres subjetivo/desculpante é aplicado por analogia ao regime do art.35º do CP – é aqui que podemos contemplar as situações
excecionalíssimas de obediência hierárquica. A obediência hierárquica não exclui a ilicitude (art.36º/nº do CP), mas existem situações excecionais em que
o funcionário se pode encontrar numa situação de inexigibilidade. É de referir que nestas situações a ilicitude tem de ser de diminuta gravidade. O agente
sabe que esta a praticar um ilícito, mas a situação em que se encontra exclui a culpa do agente.
O excesso de LD intensivo/excesso nos meios– art.33º do CP
A LD exige a necessidade do meio – na impossibilidade de recorrer à força publica, o agente pode recorrer às suas próprias forças, mas deve ater-se ao
estritamente necessário para evitar a lesão do seu bem.
Art.33º/nº1 do CP – este artigo fala do excesso intensivo de LD que torna o ato ilícito, mas pode haver uma “atenuação especial da pena” (art.72º e 73º do
CP) que se fundamenta numa ideia de inexigibilidade enquanto atenuação da culpa. Isto porque em qualquer circunstância, o ato resultou de uma ação
ilícita, estando o agente a agir contra o próprio agressor – há uma atenuação da culpa baseada no pensamento da inexigibilidade.
Art.33º/nº2 do CP – devemos distinguir, desde logo, entre excesso intensivo de natureza asténica (pessoas tímidas, não agressivas, mas perante o medo ou
susto da agressão

perdem noção – medo, susto) e excesso intensivo de natureza esténica (raiva, furor, cólera, vingança – o excesso deve-se a estados agressivos).
Este nº2 do art.33º do CP diz que quando se trate de um estado intensivo asténico não censurável (p.e. pessoas que receberam uma preparação especial para
agir perante uma situação de crise, a situação de medo ou susto é censurável – situações de exigibilidade intensificada), o agente pode ficar impune
(consagração da ideia da inexigibilidade enquanto exclusão da culpa).
No nº1 do art.33º do CP está o regime geral do excesso intensivo (seja asténico ou esténico). No nº2 do art.33º do CP prevê-se a exceção dos casos de
exercício asténico não censurável (o censurável está no nº1).
Mas, quando é censurável? A doutrina aponta para a ideia do Homem médio. O prof. diz que isto não pode ser porque se não estaríamos perante uma causa
supralegal de exclusão da culpa, dado que a culpa se afere em relação ao concreto agente (deve-se ponderar o caso concreto).

Erro sobre a ilicitude não censurável


A terceira causa de exclusão da culpa dolosa, no âmbito da teoria geral do sistema dos crimes de ação dolosos, é o erro sobre a ilicitude não censurável
previsto no artigo 17.º CP.
Importará, antes de mais, enunciar o que é que aqui está em causa, fazendo um contraponto com o erro sobre a ilicitude/ sobre a factualidade típica– o erro
sobre as circunstâncias de facto que já estudamos a propósito do tipo subjetivo incriminador doloso.
Nesse sentido, já aludimos à questão. O erro sobre as circunstâncias de facto verifica-se com uma defeituosa representação do agente do circunstancialismo
fáctico em que atua. Nessa medida, regulado no artigo 16º CP, exclui-se o dolo e o agente apenas poderá ser punido a título de negligencia desde que
verificados os pressupostos formal e material, i.e., que o crime em abstrato admita a punção a título de negligencia, que sabemos que de acordo com artigo
13º CP, é excecional  só é admissível quando expressamente prevista pelo legislador; depois o requisito material, que o erro se fique a dever a descuido
ou leviandade penalmente relevante  i.e., à violação do dever objetivo de cuidado, que é o fundamento da negligencia penalmente relevante.

Ora, no erro sobre a ilicitude o agente tem um correto conhecimento sobre o circunstancialismo em que atua (não está em erro sobre o circunstancialismo
do facto), só que não se apercebe da natureza ilícita do ato – julga que está a praticar um comportamento permitido quando este não o é.
Deparamo-nos com um problema análogo ao do erro sobre as proibições (artigo 16º/2, 2ª parte) – também aqui (no erro sobre as proibições) o agente tem
um correto conhecimento sobre o circunstancialismo de facto em que atua, só que não representa a ilicitude do ato.

Só que aqui o que está em causa são proibições cujo conhecimento é indispensável para que o agente se aperceba da ilicitude do ato – são proibições
predominantemente do DP secundário, que contendem com conhecimentos especializados que escapam ao homem comum.
Como se disse, não é preciso estudar para saber que matar é proibido, por exemplo – trata- se de ilícitos que já estão consolidados na história e a sua
apreensão por parte dos indivíduos resulta dos processos de integração sociais normais (estão consolidados na consciência axiológica comunitária).
O mesmo não sucede em relação a condutas predominantemente do DP secundário (mas não só), em que estão em causa condutas que violam bens
jurídicos essenciais, mas trata- se de ilícitos que contendem com conhecimentos especializados (que não são dados pelos processos de integração social
normal) e daí que o agente só possa aperceber-se da sua ilicitude, perante o conhecimento explicito da norma  ou porque viu no DR ou porque alguém o
informou (ex.: norma que obriga à utilização de novos escapes automóveis; impõe regras novas para o tratamento de resíduos industriais).
É evidente que o homem conformista/ o homem respeitador dos valores jurídico- criminais, apesar da sua atitude ser uma atitude de respeito pelo DP e
pelos seus valores, ele so se pode aperceber do caracter ilícito da conduta mediante o conhecimento explicito da norma.
É por isso que, sendo embora um erro diferente, porque o agente tem um conhecimento correto da factualidade típica, o nosso legislador equiparou o
regime do erro sobre as proibições, ao erro sobre a factualidade típica ou erro sobre as circunstâncias de facto.
É um erro intelectual – este erro não exprime nenhuma atitude de indiferença ou contrariedade ao dever ser penal, quando muito exprime uma atitude de
descuido ou leviandade perante o dever ser penal.
Numa palavra, exprime a atitude de descuido ou leviandade caraterística da negligencia.

Por isso, logo no plano do ilícito excluímos o dolo, pelo que as situações correspondentes ao erro sobre as proibições correspondem a um ilícito negligente.
Ao homem medio, no plano do ilícito estamos a valorar a conduta como ato humano em geral. Como se tivesse sido praticado pelo homem medio e em
relação ao homem medio não é de esperar estes conhecimentos, ele poderá tomar conhecimento deles através do conhecimento da própria norma.

Por isso, logo se exclui no plano pessoal objetivo do desvalor do ato o dolo e por isso o agente só pode ser punido a título de negligencia
É no fim de contas esta razão material que levou o legislador na 2ª parte do artigo 16º/1 CP a equiparar o regime do erro sobre as proibições ao regime do
erro sobre a factualidade típica ou circunstâncias de facto.

Assim, o agente só poderá ser punido, como se diz no nº3 do artigo 16º, a título de negligencia, só quando verificados os requisitos gerais da punição da
negligencia (requisito formal + requisito material).

O que de diferente se verifica no erro sobre a ilicitude, que estamos a estudar agora como causa de excussão da culpa, por referência ao erro sobre as
proibições?
A diferença está na própria natureza das proibições – na natureza dos ilícitos em causa.
No âmbito do erro sobre as proibições estamos perante ilícitos sem ressonância ético social (cujo conhecimento não é dado pelo processo de integração
social normal), ao passo que no erro sobre a ilicitude estamos perante os tais ilícitos já interiorizados ao nível da consciência axiológico-comunitária.
Precisamente por isso nas situações de erro sobre a ilicitude, no plano do ilícito, temos um ilícito doloso  situações em que o homem medio tinha as
capacidades para se aperceber do carater ilícito – daí que se necessariamente se não apercebe, revela uma atitude de oposição frontal aos valores jurídicos
criminais, que é a atitude caraterística do dolo.
Por isso, logo no plano do ilícito, temos um ilícito doloso, ao contrário do que verificamos no âmbito do erro sobre as proibições de que se trata de um
ilícito negligente.
 Portanto, valorada a conduta subjacente ao erro sobre a ilicitude ao nível do critério do homem médio, nos temos um ilícito doloso.
 Contudo, para termos um crime não é suficiente termos uma conduta ilícita, e neste caso ilícito doloso, é necessário que seja também culposa.
Pode bem suceder que aquela conduta praticada em erro sobre a ilicitude (aquele ilícito objetivo) não seja censurável ao agente devido às suas particulares
qualidades/ características. i.e., não era exigível àquele concreto agente que, naquela concreta situação, se apercebesse da ilicitude do ato  temos uma
situação de ilícito objetivo a que não corresponde uma culpa subjetiva.
É esta a situação de erro sobre a ilicitude, que leva à consideração do erro sobre a ilicitude quando não censurável ao concreto agente como uma causa de
exclusão da culpa – artigo 17.º, n.º 1 CP.
Estamos no âmbito do DP da culpa, sem culpa não há crime. Logo, não há culpa e não haverá punição. Nisto consiste a consagração do erro sobre a
ilicitude não censurável como causa de exclusão da culpa.
E se for censurável? Se for censurável o erro – essa situação do erro sobre a ilicitude censurável está regulada no artigo 17.º, n.º 2 CP.
Convém, contudo, atender às duas grandes construções nesta matéria:
Teoria do dolo – defendida pelos autores do sistema neoclássico ou normativista (Eduardo Correia e Mezger): a teoria do dolo dizia que o erro sobre a
ilicitude, se não for

censurável, não é punível; mas se for censurável só pode ser punido a título de negligencia.
Isto pela razão de que o sistema neoclássico partia de uma conceção do ilícito objetivo, onde, em regra, não havia a consideração da subjetividade do
agente – tudo o que tivesse a ver com a subjetividade do agente remetia pela culpa, pelo que o dolo e a negligencia eram, exclusivamente, espécies e graus
de culpa.
O dolo, nesta conceção, abrangia, portanto, não apenas o elemento intelectual e volitivo, mas também emocional. O que significava que sempre que
faltasse a consciência da ilicitude, i.e., o agente atuasse em erro sobre a ilicitude, excluía-se o dolo – faltava o elemento emocional, pelo que só poderia ser
punido a título de negligencia.

Em suma, para a teoria (estrita/ extrema) do dolo, o erro sobre a ilicitude excluía o dolo, o que significava que o regime do erro sobre a ilicitude seria
idêntico ao regime do erro sobre a factualidade típica.

Contra esta teoria se levantaram problemas e dificuldades de índole político-criminal – é que a negligencia é apenas punível a título excecional (de acordo
com o artigo 13º CP), o que poderia levar a absolvições em massa.
O erro sobre as circunstâncias de facto é um erro intelectual, contendendo com o aspeto mais mecânico da atividade mental, daí que a sua prova no
processo seja mais fácil (o agente viu-se confrontado com a realidade e não se apercebeu/ conhecimento daquela circunstância); diferentemente se passa no
erro sobre a ilicitude, que contende com aspetos emocionais e valorativos (não podemos entrar na cabeça do agente para saber se ele se apercebeu ou não
da ilicitude, apesar de ter representado corretamente o circunstancialismo fáctico em que estava a atuar).
Por isso, num processo inspirado pelo princípio do in dubio pro reo, levar a insolvências em massa e com isso conduzir a situações político-criminalmente
insuportáveis.
Depois, existe a razão de fundo/ critica de fundo desta doutrina: de facto a negligencia tem o seu fundamento num dever objetivo de cuidado, num
descuido/ leviandade e foi esta a segunda grande critica: o não saber que matar é proibido, que furtar/ roubar é proibido, etc. é um descuido?
Não, fica-se a dever a uma atitude interior do agente que está em conflito com os valorar jurídico-criminais. Não revela uma atitude de descuido ou
leviandade, mas sim uma atitude de indiferença aos valores jurídico-criminais.
Circunstância que afasta a negligencia e a punição por responder à negligencia não exprimam o real desvalor jurídico-criminal destas situações.
Foram estas as duas críticas fundamentais dirigidas à teoria do dolo estrito ou extrema, tal qual surgiu na doutrina.

Como os próprios adeptos se aperceberam da justeza destas críticas, introduziram algumas limitações ao seu ponto de partida, e com isso nasceu a chamada
teoria do dolo limitada ou mitigada. Em que é que consistiu?
 Mezger dizia que, em princípio, o erro sobre a ilicitude (erro sobre a proibição [no singular]) exclui o dolo e, portanto, apenas se permitira a punição a
título de negligencia.
Contudo, existem, casos graves referentes àqueles bens jurídicos mais importantes do DP (dentro dos bens jurídicos essencial que o DP protege, há uns
mais importantes do que outros) e, nesses casos, se o agente não se apercebe da ilicitude está a revelar, mais do que uma «cegueira», uma verdadeira
inimizade pelo Direito.
Nessas situações, embora se exclua o dolo, ele deve ser punido a título de dolo – com isto, ultrapassava-se a critica quanto aos sentidos jurídico-criminais
do caracter excecional da punição da negligencia e da negligencia não ser suficiente para responder ao desvalor jurídico criminal da concreta situação.

 Eduardo Correia chegava ao mesmo resultado, mas procurava não sair tanto dos quadros da teoria do dolo, o que dizia era o seguinte: sem dúvida que o
erro sobre a ilicitude exclui o dolo, e o agente só podia ser punido a título de negligência.
Todavia em relação a esses casos mais graves de inimizade pelo direito o agente revelava não era apenas uma culpa negligente pelo facto, ma suma
verdadeira culpa negligente como modalidade da culpa na formação da personalidade.
Quer dizer, o erro sobre a ilicitude revelava que o agente ao longo da sua vida não se tinha preparado para respeitar aquelas exigências mínimas à
convivência comunitária, que são as exigências que contendem com os valores mínimos indispensáveis à convivência comunitária.
Nesse sentido, a negligencia que se punia com a que se punia o erro sobre a ilicitude seria, não a negligência como modalidade do facto, mas sim a
negligencia geral para com o dto, como modalidade de culpa na formação da personalidade. A partir daqui, EC dizia que esta negligencia geral pelo dto
não está subordinada ao limite do artigo 13º do CP, é punível a propósito de todos os crimes.
Punível como?
Punível com a moldura penal abstrata do crime doloso, ainda que especialmente atenuada.
Com isto, EC, sem sair dos quadros da negligencia, ultrapassava a tal dificuldade politico- criminal, pelo que a negligência geral pelo dto, seria punida a
respeito de todos os crimes, sem estar subordinada ao artigo 13º e a pena correspondente seria mais grave (uma vez que seria uma pena determinada dentro
da moldura penal abstrata do crime doloso).
Estas duas orientações enfermam empenos inultrapassáveis:

Na verdade, Mezger pretende punir situações que diz que são de negligência, com a pena dolosa. Logo aqui a grande dificuldade de encontra no pp da
legalidade. Se Mezger diz que o erro sobre a ilicitude exclui o dolo e só admite a punição a título de negligencia, na lei alemã existe um artigo semelhante
ao artigo 13º, que restringe a negligência aos casos expressamente previstos na lei. Como é que Mezger poderia alargar e continuar a dizer que estava a
respeitar a lei alemã? Qual a base legal para a solução?
Desde logo, esta doutrina parecia inadmissível à luz do princípio da legalidade.

O mesmo se dirá na teoria de EC que o que se está a punir no erro sobre a ilicitude não é o erro, não é a negligência como modalidade de culpa do facto, é
uma negligencia geral do dto como modalidade de culpa na formação da personalidade e que esta não está subordinada ao limite do artigo 13º e que vai ser
punida dentro da moldura dolosa. Onde é que isto está previsto na lei? Como vamos punir a negligencia a título de dolo?
Estas doutrinas, embora procurassem colmatar o erro da formulação inicial da teoria do dolo extrema ou estrita, sofriam deste empeno, desde logo, a sua
inadmissibilidade à luz do princípio da legalidade (não havia base legal para as mesmas, contrariavam a regulamentação expressa tanto da lei alemã como
da lei pt) e acresce a isto tudo a critica fundamental: é que estes autores continuam a incluir estas situações no âmbito da negligencia quando a negligencia
não reproduz o desvalor do facto (atitude de total divorcio face ao dever ser jurídico criminal).
Foi na base destas críticas que quer a doutrina do dolo estrita, como as doutrinas do dolo limitadas foram abandonadas pela generalidade da doutrina. Em
sua substituição nasceu a chamada teoria da culpa.
A teoria da culpa surgiu ligada ao sistema finalista, e mais propriamente, a Hans Welzel.
A doutrina finalista, ao contrário da doutrina normativista partia do ilícito pessoal, pelo que logo ao nível do ilícito típico distinguia o dolo da negligencia –
sucedia que o dolo do ilícito típico, para os finalistas e assim continua a ser para muita doutrina atual, se resumia ao dolo natural (i.e., conhecimento e
vontade de realização do tipo incriminador [não havia qualquer elemento emocional]).
Portanto, aquele que atuasse com conhecimento e vontade de realizar o tipo incriminador atuava a título de dolo, mesmo que atuasse numa situação de
legitima defesa ou acoberto de qualquer outra causa de exclusão da ilicitude. A conduta dele era dolosa, por ter preenchido conscientemente e
voluntariamente o tipo incriminador, só que depois poderia vir a causa de justificação eliminar o desvalor do facto e torná-lo lícito. Ex.: alguém mata
alguém julgando que está a ser vítima de agressão quando não está – legitima defesa putativa) O que Welzel dizia e o que a teoria do dolo estrita dizia é
que neste caso, ele praticou uma ação dolosa, e o erro sobre as circunstâncias de facto das duas uma: ou é censurável ou não, sendo que se o for o agente
será punido a título de dolo (mas esta censurabilidade só se poe em sede de culpa).
Em sede de ilícito, o dolo era o dolo natural, afirmamos o dolo desde que o agente tivesse conhecimento da factualidade típica e vontade de realizar essa
mesma factualidade típica.
O problema da falta de consciência da ilicitude não se punha aqui, somente depois em sede de culpa, o que fazia com que a teoria do dolo extrema ou
estrita conduzisse a um regime demasiado severo e de resto desajustado, em função do desvalor do caso, porque em função do que foi dito, esta teoria
remetia para o erro sobre a ilicitude.
Portanto, para uma punição a título de dolo, todos os casos em que ou o agente não se apercebesse do ilícito da conduta e, portanto, do sentido subjacente
ao tipo incriminador, como todo o erro sobre o tipo justificador, quer fosse um erro sobre os pressupostos fácticos, quer fosse um erro sobre a ilicitude/
sentido e alcance do tipo justificador.
Esta solução, nomeadamente quando ao erro sobre os pressupostos fácticos, pareceu excessivamente severa aos olhos da doutrina. Repare-se na situação de
erro sobre a legitima defesa (legitima defesa putativa): o agente que atua acoberto da legitima defesa julga, erroneamente, que está a atuar de modo
conforme ao Direito, pelo que a sua atitude não é de contrariedade ou indiferença face aos valores jurídico-criminais (ele quer e julga estar a praticar um
comportamento lícito, apenas avaliou mal a situação), pelo que a única censura que se lhe poderá dirigir terá que ver com a eventual atitude de descuido ou
leviandade tomada na apreciação do facto (negligência).
Foi isto que veio dizer a teoria da culpa limitada que, por referência à teoria da culpa estrita/ extrema, que no âmbito do tipo incriminador e do tipo
justificador há que distinguir as várias espécies de erro, assim temos: erro sobre a factualidade típica, que exclui o dolo e apenas admite a punição a título
da negligencia quando censurável e o erro sobre a ilicitude.
Por outro lado, a mesma distinção se tem que fazer no âmbito do tipo justificador: também no tipo justificador o agente pode errar sobre os pressupostos
fácticos e, nesses casos, exclui-se o dolo e o agente só será punido se esse erro lhe for censurável a título de negligencia. Como?
Inversamente, pode verificar-se um erro sobre o sentido da ilicitude e aí estaremos perante o erro sobre a ilicitude que, se não for censurável, não há culpa e
não será punido; se for censurável, só poderá ser punido a título de culpa dolosa.
Ex.: um emigrante pagar 50.000 euros de adiantamento a um mestre de obras para que este inicie um projeto de uma casa em Portugal.
O senhor quando chega a Portugal vê que o terreno está exatamente igual e ouve ainda dizer que o mestre de obras tem dividas e, pega num quadro valioso
do mestre de obras, convencido de estar a atuar em legitima defesa do seu património (a LD não recobre as situações de defesa de dtos de crédito) – não há
um erro sobre as circunstancias de facto, há um erro sobre o sentido e alcance da causa de justificação da legitima defesa, ou seja, há um erro sobre a
ilicitude da sua própria conduta, pelo que é um erro relativo ao tipo justificador.
Por isso, verdadeiramente este é o alcance da teoria da culpa limitada. É por isso que, quando tratamos do erro sobre o tipo justificador, dissemos que a
nossa lei consagrava no fundo a teoria da culpa limitada ou mitigada e que resulta da leitura conjugada dos artigos 16º/2 e 17º CP.

O artigo 16.º, n.º 2 CP (importa-nos a 1ª parte) – o erro sobre as circunstâncias de facto do tipo justificador exclui o dolo e só pode ser punido a título de
negligência, nos termos do nº3 do mesmo artigo 16º – A NOSSA LEI AFASTA A TEORIA DO DOLO ESTRITA.
Depois, o nº2 do artigo 17º confirma a consagração na nossa lei da teoria da culpa limitada ou mitigada  se o erro sobre a ilicitude lhe for censurável, o
agente exprime a tal atitude de contrariedade ou indiferença perante o dever ser jurídico- penal, é punido com a pena aplicável a qual pode ser
especialmente atenuada: se o erro sobre a ilicitude for censurável o agente exprime a atitude característica da culpa dolosa.
Sintetizando:
Ao contrário da teoria do dolo dos normativistas (defendida por Mezger e por EC) para a qual nas situações de erro sobre a ilicitude das duas, uma:
Ou não é censurável – se não há censura, não há culpa, logo fica impune;
Ou é censurável – neste caso seria punido tão-só a título de negligencia, com todas as dificuldades que isso significava e que aludimos.
Diferentemente, na teoria da culpa limitada ou mitigada, das duas, uma:
O erro sobre a ilicitude não é censurável? – se assim for, não culpa, não será punido.
É censurável? – a ser censurável, será punido a título de dolo, uma vez que a ignorância da ilicitude exprime a atitude de contrariedade ou de indiferença
perante o dever ser jurídico-penal característica da culpa dolosa.
O sentido da teoria da culpa limitada no confronto com a teoria da culpa originaria (a teoria da culpa extrema ou estrita) consiste em afirmar que, tanto no
âmbito do tipo incriminador, como justificador, há que distinguir as várias espécies de erro:
Por um lado, um erro intelectual/ um erro de conhecimento que contende com o conhecimento do circunstancialismo fáctico em que o agente atua
– o agente tem um defeituoso conhecimento e que está regulado no artigo 16º, exclui o dolo e o agente a ser punido só o poderá ser a título de negligencia,
desde que verificados os pressupostos gerais.
Por outro lado, um erro sobre a ilicitude, que é um erro de valoração/ moral, em que o agente evidencia uma desconformidade entre a sua consciência
axiológico individual e a consciência axiológico-comunitária (ele não interiorizou os valores da comunidade, o mínimo indispensável que o DP exige e
nessa medida traduz a diferença ou contrariedade pelo dever ser jurídico-penal). E este erro sobre a ilicitude ou não é censurável, e aí não há culpa; ou a ser
censurável terá de ser punido a título de negligencia.
Esta teoria da culpa limitada está consagrada expressamente na própria lei portuguesa como resulta da leitura conjugada do artigo 16º/2, 2ª parte, e 17º/2
CP.

Importará agora fazer uma referência para tornar as coisas mais claras:

Em primeiro lugar, o erro sobre a ilicitude não tem que ver com o conhecimento da norma em geral/ em abstrato (ex.: saber que matar é proibido, furtar é
proibido), mas sim com o erro sobre o sentido de ilícito concreto – é atendendo aquela concreta situação com aquelas concretas características que
afirmamos o erro sobre a ilicitude quando o agente não se aperceber em concreta da natureza do ilícito em causa– ERRO SOBRE O ILICITO.
Ele erra sobre o concreto sentido de ilícito daquele caso concreto – até pode saber que em abstrato há uma norma que diz que a conduta é proibida, mas não
atualiza na situação concreta esse conteúdo da norma.
Portanto, erra sobre o concreto sentido de ilícito daquela concreta situação.
Em segundo lugar, o erro contende com o sentido de ilícito penal – afirmamos que estamos perante uma situação de erro sobre a ilicitude se o agente em
concreto não representar que aquela situação é um ilícito penal.
Pode pensar que é um ilícito contraordenacional, administrativo, etc, desde que ele não represente o específico sentido de ilicitude penal daquele caso
concreto, estamos perante o erro sobre a ilicitude a submeter ao regime do artigo 17º CP.

Fotografia global das situações de erro:


Erro sobre as circunstâncias de facto: que pode respeitar às circunstâncias de facto do tipo justificador e do tipo incriminador; Erro intelectual, exclui o dolo
e o agente a ser punido será a título de negligencia.
Erro sobre as proibições: respeita a proibições sem ressonância ético social, de que o homem comum só se pode aperceber através de um conhecimento
explicito das mesmas. Por isso o nosso legislador entendeu (e bem) que se trata também de um erro intelectual, que não se confundindo sobre o erro sobre a
factualidade típica, deve por essa circunstância ser submetido ao mesmo regime (2ª parte, do artigo 16º). Exclui o dolo e o agente só será punido a título de
negligencia nos termos gerais, de acordo com o nº3 do mesmo artigo 16º.
Erro sobre a ilicitude – não tem que ver com o conhecimento do circunstancialismo fáctico (aqui o agente tem um correto conhecimento do
circunstancialismo fáctico em que atua), mas ao contrário do erro sobre as proibições, contende com ilícitos com ressonância ético-social – atitude de
característica da culpa dolosa. Neste caso, como manda o artigo 17º, o agente será punido a título de dolo: quer esteja em causa o sentido de ilícito
subjacente ao tipo incriminador; quer esteja em causa o sentido de ilícito da concreta causa de justificação, como o caso da LD dos dtos de crédito do
exemplo dado anteriormente. Neste caso o erro sobre a ilicitude, se for censurável, será punido a título de dolo.
Com a adesão a esta teoria da culpa limitada, estão ultrapassadas as dificuldades que se punham tanto à teoria da culpa estrita ou extrema (pela demasiada
severidade a que conduzia), quer às críticas à velha teoria do dolo e ao espaço de impunidade que abria às soluções político-criminalmente insuportáveis a
que conduzia.

Punibilidade
Vamos terminar a teoria geral dos delitos de ação dolosos, falando da última categoria: a punibilidade.
Há muito que muitos autores que assinalam como último estrato da construção geral do delito a punibilidade. Simplesmente, a punibilidade, tal como a
vemos enunciada em Belling era uma categoria que envolvia elementos muito heterogéneos: elementos esses que a doutrina tinha alguma dificuldade em
enquadrar, seja no plano do ilícito típico, seja no plano da culpa.
São elementos heterogéneos que muitas vezes nada tinham que ver com a matéria penal e, por isso, a doutrina remetia certos elementos que eram
pressupostos da punição, mas que havia dificuldade em incluir no plano do ilícito e da culpa.
A situação alterou-se, todavia, quanto à compreensão desta categoria da punibilidade. Ora, alterou-se sobretudo no contexto do sistema teleológico-
racional.
A estrutura básica do sistema teleológico-racional aproveitou em larga medida aquele sistema que resultou da luta de escolas e quase que se implantou na
década de 60 /70 como uma espécie de communis opinio, mas introduzindo um elemento novo.
Sobretudo por influência de Roxin, entendeu-se que se o conceito material de crime resultava da ponderação cumulativa de considerações de dignidade
penal de ordem axiológico-jurídica, e, por outro lado, de necessidade de pena atinentes aos objetivos politico-criminais da prevenção geral e/ou especial,
então tanto a vertente da dignidade penal como da necessidade de pena tinham de se projetar na construção geral do delito.
Portanto, se a construção geral do delito pretende enunciar os elementos constitutivos desse conceito material de crime que está pressuposto e se na
definição desse conceito material de crime intervêm tanto considerações de dignidade penal como de necessidade de pena, afigurava-se evidente que ao
longo do sistema deveria haver concretizações/ projeções dessas mesmas ideias.
Na modelação de qualquer das categorias não intervinham considerações de necessidade de pena e é isso que pretende fazer o sistema teleológico racional
que surge sobretudo por influência de Klaus Roxin.
Neste sentido, o sistema teleológico-racional, como disse um discípulo de Roxin, verdadeiramente traduz-se numa nova metodologia/ num novo modo de
construção conceptual que pretende introjetar no sistema, para alem das considerações de dignidade penal, as considerações de necessidade de pena.
São estas considerações de necessidade de pena que influem hoje sobretudo na categoria da punibilidade como último estrato da construção geral do delito.
É esta a categoria geral do sistema teleológico-racional: introjetar considerações de necessidade de pena. Só que o acordo dos autores começa e acaba aqui:
quanto ao modo como essas considerações de necessidade de pena deviam intervir na construção do sistema há grandes divergências doutrinais.

Começando pela opinião de Roxin, este faz intervir essas considerações substituindo a categoria da culpa pela categoria da responsabilidade. Roxin
mantinha o sistema intacto até ao plano do ilícito típico: ação, tipo incriminador, tipo justificador. Chegava à culpa e substituía-a pela da responsabilidade.
A averiguação da categoria da responsabilidade passaria por 2 momentos:
Um primeiro momento era a averiguação da culpa nos moldes tradicionais;
Então, depois de averiguada a culpa e se chegasse à conclusão de que o agente tinha atuado com culpa, haveria que passar a um 2º momento: momento da
necessidade de pena. Dizia Roxin que ao DP não interessa a culpa tout court, apenas interessa uma culpa relativamente à qual haja necessidade de punição
e pode bem suceder que haja culpa e não haja necessidade de pena. Nesse sentido, a categoria da responsabilidade seria como que concretização dentro do
sistema da conceção unilateral ou unívoca do pp da culpa.

Neste 2º momento da categoria da necessidade que aspetos atinentes à necessidade de pena poderiam excluir a punição (se considerada)? Podemos falar de
vários exemplos:
participação em rixa do artigo 151º. Para que a participação em rixa seja punida, é necessário que dessa rixa resulte ou a morte de alguém ou uma ofensa à
integridade física grave. Contudo, para que participação em rixa (crime de perigo) seja punida é necessário, então, que ela atinja um certo perigo. Como
prova desse perigo atende-se ao resultado. i.e., a exigência de que em concreto se tenha verificado a morte ou ofensa à integridade física grave de alguém
funciona como meio de prova e, portanto, como critério de necessidade de pena em relação à concreta rixa.
Outro exemplo é a incitação ao suicídio: para que seja punida é necessário que haja a tentativa de suicídio ou a sua consumação.

Depois, e seria a segunda consideração de necessidade de pena, referiam-se à criminalidade bagatelar: o DP só deve intervir quando estão em causa ofensas
graves de bens jurídicos essenciais. Isto porque em relação às pouco graves entende-se que não haja necessidade de pena. Muitas vezes o legislador
restringe a punição à exigência de que a lesão ou o perigo para o bem jurídico sejam graves (seria uma 2ª concretização da ideia da necessidade de pena).

Finalmente, surgia a desistência da tentativa: a tentativa traduz-se em alguém praticar atos que são idóneos a produzir a consumação do crime, só que esta
não se verifica por motivo estranho ao agente. Ex.: sr. A dispara sobre o sr. B, mas é azelha e falha.
A generalidade das legislações estabelece que a desistência voluntaria da tentativa exclui a punição, na base de razoes de prevenção.

Esta construção de Roxin, todavia, não teve grandes adeptos e a esmagadora maioria dos adeptos do sistema teleológico-racional autonomizaram estas
considerações de necessidade de pena para uma categoria autónoma: punibilidade.
FD, em concordância com a opinião maioritária entre os autores adeptos do sistema teleológico-racional, mantem o sistema intocado até ao momento do
ilícito: ação, ilícito típico, tipo incriminador, tipo justificador, culpa. Depois junta a categoria da punibilidade onde interviriam exclusivamente as tais
considerações de necessidade de pena atinentes a pontos de vista de prevenção geral e/ou especial.
Foi para autonomizar as considerações de culpa das considerações de necessidade e, com isso, manter a função de garantia da culpa em DP, que a
generalidade da doutrina adepta do sistema teleológico-racional, autonomizou as considerações de pena da culpa e com isso introduziram o tal 5º escalão
da construção geral do delito:
Ação;
Ilícito típico;
Tipo incriminador e Tipo justificador;
Culpa;
Punibilidade.

Dr. Almeida Costa discorda deste ponto de vista. Adere a um modelo que tem como defensor Walter Zaachs.
Se o sistema é a decomposição analítica de uma ideia de crime previa (conceito material de crime) e, na modelação desse conceito material de crime
intervêm tanto considerações de dignidade penal (atinentes ao desvalor do ato, à gravidade do ato tanto no plano objetivo como no plano subjetivo da
censura ao agente) e, por outro lado, intervêm considerações de necessidade de pena (sejam elas de prevenção geral e especial), então quer a dignidade
penal como a necessidade de pena não podem estar acantonadas apenas numa categoria/ num estrato do sistema.
Tem que se projetar ao longo de todo o sistema, intervindo na conformação de todas e cada uma das categorias.
A ideia da necessidade de pena não deve intervir apenas no estrato dogmático nas condições vistas, mas se que se projeta ao longo de todo o sistema na
modelação de todas e cada uma das categorias, não havendo razão para introduzir uma categoria autónoma.
AC reconhece, e aqui encontra-se de acordo com Roxin, a existência de uma categoria de punibilidade para abranger algumas situações, a maior parte das
vezes, provindas de natureza extrapenal que são limitações à punição, que fazem com que deixemos de estar perante um crime e, por isso, não cabem num
juízo de ilícito e de culpa. Ex.: intervenções parlamentares no sentido de que algumas condutas na vida corrente corresponderiam a ofensas à honra, sejam
consideradas adequadas.

Teoria geral do delito de ação negligente


Esta autonomização dos delitos de ação dolosos ou negligentes resultou da introdução da conceção do ilícito pessoal - antes não havia a autonomização, era
uma construção unitária do delito. No quadro de um sistema clássico e neoclássico verdadeiramente a contraposição do dolo e da negligencia só se
verificava na culpa.
Com a introdução do ilícito pessoal, a contraposição do ilícito à culpa alterou-se: o ilícito pessoal pretende já exprimir o desvalor pessoal objetivo do ato,
i.e., o desvalor do ato como ato humano em geral e isso permite, logo no plano do ilícito, autonomizar o ilícito doloso do ilícito negligente.
Dito isto, começar-se-á a estudar a teoria geral dos crimes de ação negligentes.
Qual é o fundamento da punição da negligencia? – traduz-se na violação do chamado dever objetivo de cuidado.
Pelo simples facto de viver em sociedade e de obter todas as vantagens que resultam da vida em sociedade, o dever objetivo de cuidado manda que todos e
cada um de nos em todos os momentos da nossa vida mantenhamos a tensão psicológica/ o grau de atenção necessário para prever/ antecipar as
consequências dos nossos atos e desta forma evitarmos os atos que possam vir a lesar ou a colocar em perigo bens jurídicos.
O dever objetivo de cuidado que é definido de acordo com o padrão do homem medio.
O DP rege-se por um pp de subsidiariedade que é o corolário do próprio pp da proporcionalidade em sentido amplo do artigo 18º/2 CRP. Portanto, o DP
exige o mínimo indispensável à convivência comunitária – é o exigível ao homem medio.
Por outro lado, na base desta violação do dever objetivo de cuidado estamos já a assinalar o ponto essencial que permite a contraposição do ilícito
negligente ao ilícito doloso.
No facto doloso o agente tem conhecimento e vontade de praticar o crime, exprimindo uma atitude de contrariedade ou de indiferença perante o dever ser
penal.
Ao passo que na negligencia, em princípio, o agente não quer praticar o crime, só que por descuido ou leviandade acaba, de forma não voluntaria/ não
dolosa, por lesar ou colocar em perigo um bem jurídico. É também censurável, mas é menos censurável porque o que ele revela não é uma atitude de
contrariedade ou de indiferença perante o dever ser penal característica do dolo, mas tão-só uma atitude de leviandade ou descuido.
Isto explica o facto de quando a negligencia é punida, será sensivelmente menos gravemente do que o dolo. Por outro lado, explica o caracter excecional da
punição da negligência que, de acordo com o artigo 13º CP, só é punível quando o legislador expressamente o declarar.
Temos ainda a ideia da necessidade de pena, uma vez que se diz que a negligencia na medida em que não revela a tal atitude de contrariedade ou de
indiferença, mas tão-só uma atitude de descuido ou leviandade perante o dever ser penal muitas vezes a ideia da preservação dos bens jurídicos não requer
uma sanção penal, a simples sanção civil é bastante para acautelar os interesses em causa. É esta a razão que está subjacente ao

caracter excecional da negligencia, mas também subjacente à ideia de que a tentativa não é punida a título de negligência, como resulta dos artigos 22º e
23º CP.
Duas distinções quanto à negligencia:
Uma primeira de ordem qualitativa, que distingue entre negligencia consciente e inconsciente.
Na negligência inconsciente, devido a descuido/ leviandade o agente não representa sequer o caracter perigoso do ato (artigo 15º al. b));
Depois, a negligencia consciente (artigo 15º al. a)) com o seu problema com a contraposição ao dolo eventual. Aqui elemento intelectual é igual ao do dolo
eventual: o agente representa o resultado criminoso como tão-só possível, só que atua confiante que o resultado não se vai produzir. Ao invés do dolo
eventual em que o agente representa o resultando como possível, mas atua não confiando de que o resultado não se produzirá.
Para a doutrina maioritária qualquer das 2 modalidades da negligência seria concretização da violação do dever objetivo de cuidado: o descuido ou
leviandade levaria num caso a que o agente nem sequer representasse o caracter criminoso da conduta. Noutro caso levaria a que o agente, embora
representando a possibilidade, ponderou mal as coisas e confiou, quando não devia, de que o resultado não se ia produzir.
Depois temos uma segunda distinção de ordem quantitativa entre negligência tout court
e a chamada negligencia grosseira ou negligencia qualificada.
Esta distinção prende-se com a maior ou menor gravidade da violação do dever objetivo de cuidado, que é um critério normativo que admite graduações.
Nos casos em que o descuido seja particularmente grave ou censurável fala-se em negligencia grosseira ou qualificada.
Isto tem importância ou para a medida da sanção, porque o legislador muitas vezes autonomiza a negligencia grosseira para agravar a sanção por referência
à sanção prevista para a negligencia tout court. Outras vezes, de acordo com o caracter excecional da negligência que resulta do artigo 13º do CP, restringe
a punição da negligencia ao requisito de que seja grosseira.

O crime negligente é violação de uma norma de determinação: o dever objetivo de cuidado é uma norma de determinação.
Se o objetivo é a proteção de bens jurídicos o legislador penal só pode fazer 2 coisas cumulativamente:
o Por um lado, e esta será a norma de determinação subjacente ao delito doloso, impor que ninguém pratique condutas atentatórias/ que lesem ou coloquem
em perigo bens jurídicos. Abster da prática de condutas que levem à colocação em perigo ou à lesão de bens jurídicos: este é o conteúdo da norma de
determinação subjacente ao crime doloso.
Por outro lado, temos o dever objetivo de cuidado, que será uma norma cujo objetivo podemos enunciar da seguinte forma: ao longo da tua vida mantem o

cuidado necessário para antecipar o resultado das condutas e abstém-te daquelas que possam lesar ou colocar em perigo bens jurídicos.
É esta ideia de crime negligente como conduta humana violadora de uma norma de determinação, é este conceito material de negligencia que vai ter que
estar subjacente à construção geral do delito negligente.
Também aqui a construção geral do delito tem a mesmíssima função que a construção geral do delito desempenhou no âmbito dos crimes dolosos:
Por um lado, permite aprofundar os vários elementos e aspetos da problemática do crime negligente e tem a virtualidade pedagógica;
Mas o mais importante continua a ser o significado metodológico: caminho que permite ao juiz averiguar se a situação cabe ou não neste âmbito, mas
também um caminho que potencia os valores de certeza e a segurança na aplicação do direito (até em sede de recurso).
Decomposição analítica do crime de ação negligente
Ação
Aqui não há nada a acrescentar em relação ao dito anteriormente a propósito do conceito de ação no âmbito da teoria geral dos delitos dolosos – conceito
pessoal ou personalista de ação.
Partimos então do conceito pessoal ou personalista de ação do primeiro Welzel, antes da ação final: toda a exteriorização de uma intencionalidade de
sentido. Ou, na formulação de Belling: toda a exteriorização da vida consciente do individuo.
Na realidade a ação é isso mesmo: a expressão de um sentido. O eu é provocado por acontecimentos exteriores e é a reação que comporta elementos
cognitivos, mas também elementos emocionais valorativos que constitui a ação.
Ex.: várias pessoas numa esplanada e alguém a passar cai – várias reações são possíveis: indiferença, riso, ajuda, etc. Tudo isto são exteriorizações de uma
intencionalidade de sentido.
No plano dogmático cumpre as mesmas funções que cumpria nos crimes dolosos de afastar logo numa primeira aproximação todas as situações, porque não
são ações humanas não podem integrar a violação de uma norma de determinação.
Nota: a norma de determinação tem como destinatários comportamentos humanos, pessoas, e, portanto, não é ação: fenómenos naturais, comportamentos
de animais, mas também comportamentos humanos que não são ações para efeitos de DP – atos praticados em estado de inconsciência (sonambulismo,
hipnose, atos reflexos, etc) e atos sob coação física.
Não basta a ação para termos crime, ela terá que ser:
Ilícito típico
Aqui continuamos a partir da conceção do ilícito pessoal que pretende exprimir o sentido da conduta como ato humano em geral, com o sentido pessoal
objetivo, ao invés de

relacionar com a culpa que se falará adiante, em que se analisa o ato do concreto agente e, portanto, no seu sentido pessoal subjetivo (num desvalor que tem
como ato daquele concreto agente, com aquelas concretas capacidades, qualidades ou características).
Também aqui o ilícito típico é uma unidade subjetiva-objetiva que se vai traduzir no tipo, que mais não é a expressão formal do específico conteúdo de
ilicitude de cada delito negligente.
Tipo objetivo
Também aqui o legislador, na modelação do tipo objetivo, joga/ combina 3 elementos:
 O agente;
 A conduta;
 Bem jurídico.
Quanto a cada um destes elementos podem fazer as distinções já feitas quanto às espécies de tipicidade:
 Quanto ao agente:
Crimes comuns (que podem ser praticados por qualquer pessoa, o legislador não estabelece qualquer exigência quanto às características do agente);
Crimes específicos ou especiais (em que o legislador restringe o âmbito dos destinatários daquele tipo a certas pessoas, que tem certas qualidades
profissionais ou institucionais ou têm uma especial relação com a vítima).
crimes específicos puros ou próprios, quando a qualidade pessoal do agente é elemento constitutivo da infração;
crimes específicos impuros ou impróprios, quando a qualidade especial é tão-só um elemento modificativo, i.e., agravante ou atenuante do ilícito.

 Quanto ao elemento da conduta: desde logo, regra geral, a maioria dos crimes são de execução livre ou não vinculada – o legislador basta-se com a
prática de um qualquer ato que se mostre idóneo de conduzir à lesão ou colocação em perigo do bem jurídico; mas, embora de forma mais rara na
negligência, é também pensável que o legislador vincule o preenchimento do tipo a um determinado modo de execução (a um modus operandi) – são os
crimes de execução vinculada ou não livre.
Por outro lado, ainda no elemento da conduta, podemos distinguir entre: crimes formais ou de mera atividade, que se esgotam na prática de uma simples
conduta e crimes materiais ou de resultado, cuja consumação depende da verificação, para alem da conduta, de um resultado material naturalístico que,
sendo embora consequência da conduta, é espácio-temporalmente autónomo em relação a ele.
 Quanto ao bem jurídico: também aqui há que distinguir crimes de perigo e crimes de dano e, dentro dos crimes de perigo, os crimes de perigo abstrato,
abstrato- concreto // crimes de aptidão e concreto.

As diferenças surgem a propósito do tipo objetivo que é a imputação objetiva do resultado à conduta. A doutrina hoje maioritária adere à chamada teoria da
conexão do risco e, a propósito dessa teoria da conexão do risco:
1º nível – teoria da equivalência das condições integrada pelo critério conforme ás leis naturais (problema da determinação do nexo causal);
Depois, de entre todos os casos em que se verifique este nexo causal, é preciso verificar-se o nexo de adequação, diferido nos próprios termos da
adequação. Só se imputa o resultado quando, de acordo com as regras da experiência, da normalidade do acontecer, a consideração dos conhecimentos
gerais, mas também dos conhecimentos específicos acerca da situação o resultado se apresente como uma consequência provável, ou melhor dizendo, não
impossível.
Finalmente, surge um 3º escalão que é um elemento novo que são o chamados critérios da conexão do risco, no âmbito dos quais, apesar de estarem
verificados os requisitos anteriores (o nexo de causalidade e o nexo de adequação), entende- se que à luz da valoração criminal não pode haver a imputação
do resultado à conduta. Nesse sentido, por razoes de simplificação adotou-se o enunciado dos 4 corretores da conexão do risco: Falou-se do critério do
risco permitido; do critério da diminuição do risco; do critério do comportamento lícito alternativo e, finalmente, do critério do fim ou âmbito de proteção
da norma.

O professor discorda desta conceção.


O professor considera que a teoria da conexão pelo risco verdadeiramente, não se aplica, perverte o sentido do ilícito negligente. Perverte-o desde logo no
2º escalão (nexo de adequação da teoria da adequação). Embora, discorde, é admissível a adoção do critério da teoria da adequação no âmbito dos crimes
dolosos, mas já não o é no âmbito dos crimes negligentes.
De acordo com a teoria da adequação, como se viu, imputa-se o resultado quando de acordo com as regras da experiência, atendendo aos conhecimentos
gerais e específicos do agente, o resultado se apresentar como consequência não impossível da conduta.
Ora, este critério é inadmissível nos delitos negligentes. O âmbito do dever objetivo de cuidado é o âmbito mínimo à convivência comunitária.
Pode bem suceder que existam situações que, sendo de verificação não impossível justifiquem uma justificação a título de dolo, mas já não a título de
negligencia.
Ex.: Pense-se no exemplo de um prédio com 4 ou 5 andares e no último andar tem uma varanda com uma grande grade de 10 m de extensão. Na base desse
prédio existe uma esplanada e alguém por não gostar da esplanada decidiu agredi-los, mas procurou um meio que dissimulasse a sua intenção de o fazer.
Esse gradeamento tem, numa das extremidades, um suporte virado para o exterior que contem vasos. Então, em ordem a levar por diante o seu projeto, o
agente finge reparar uma barra desse gradeamento da extremidade oposta para produzir vibrações que levem a que um dos vasos caia. Se isto
se provar, ninguém duvidará que imputar os danos à integridade física (o resultado) das pessoas que estão na esplanada causados por aquela conduta a
título de dolo.
Todavia, é bem pensável uma outra situação em que esse resultado já não seja imputável a título de negligencia.
Temos a mesma situação anterior, mas o agente não tem objetivo nenhum de lesar as pessoas da esplanada, apenas está a travar uma acesa discussão ao
telemóvel e descarregou a sua fúria dando um pontapé no gradeamento e, com isso, produz as tais vibrações no gradeamento que levam também á queda do
vaso.
Neste caso é pensável que este resultado, a quem não tenha intenção de o provocar, não consubstancie a violação de um dever objetivo de cuidado.

O âmbito da imputação negligente é definido pelo próprio objetivo de cuidado, o critério basilar da imputação objetiva negligente é o próprio dever de
cuidado. O dever de cuidado pode impor e funciona como previsão relativamente a situações que deixam antever, aos olhos do homem medio, o perigo de
lesar ou colocar em perigo bens jurídicos. Só deverão imputar-se ao agente nos casos em que, atendendo ao circunstancialismo fáctico em que o agente
atua, logo se tornaria consciente e evidente aos olhos do homem medio.

Contudo, as insuficiências da conexão do risco não se circunscrevem ao 2º escalão, também o nível do 3º nível não se mostra adequado. Vamos ver que
esses corretores são inúteis, uma vez que já se encontram compreendidos no dever objetivo de cuidado e outros são, pela própria natureza das coisas,
inaplicáveis à negligencia.
 Quanto ao corretor do risco permitido sabe-se que respeita aos setores de atividade lícitos, por trazerem vantagens à vida social, mas que são perigosos e
que, em relação a eles o legislador faz uma relação de custo benefício, de onde surge a consagração de normas de cuidado.
No entanto, essas normas de cuidado são precisamente o conteúdo do dever objetivo de cuidado, que é definido na base dos critérios de previsibilidade do
homem medio, mas em alguns casos é definido por normas legais e por normas constantes de códigos deontológicos ou as legis artis ou, finalmente, certas
normas de natureza técnico-científica ligadas à profissão.
 O mesmo se diga do fim/ âmbito da proteção da norma, que é o fim/ âmbito do dever objetivo de cuidado. Portanto, também o corretor já está
compreendido no dever objetivo de cuidado.
 No entanto, temos um que, pela própria natureza das coisas que não tem aplicação no âmbito dos crimes negligentes que é o princípio da diminuição do
risco. Ex.: relembrar o exemplo dos amigos da montanha que desvia a trajetória da pedra para causar uma ofensa menor à integridade física. A sua conduta
foi causal e adequada a produzir a fratura da omoplata, mas este pp diz que este resultado não

se imputa por ser meio para evitar um dano mais grave. Isto não é aplicável na negligencia.
 Quanto ao corretor do comportamento lícito alternativo, que diz que se o agente pratica um resultado, mas se vem a provar que mesmo que ele tivesse
atuado licitamente o resultado se teria produzido da mesma forma. No caso do dolo diz- se não se imputar o resultado, sendo só punido a título de tentativa.
No caso de negligencia, diz-se que a tentativa não é punida a título de negligencia, logo não é punido. Isto, nada tem que ver com a imputação objetiva,
mas sim com a delimitação geral do âmbito de relevância da negligencia (razões de necessidade de pena).
É por isto que a teoria da conexão do risco não tem aplicação no âmbito da negligencia.
Assim, a imputação objetiva no âmbito da negligencia depende, em suma, de 2 coisas:
 Desde logo e em primeiro lugar da violação do dever objetivo de cuidado: é o critério basilar da imputação objetiva.
 Depois, do nexo causal naturalístico, uma vez que estamos no âmbito do DP do facto e, portanto, só se pode imputar quando: Para alem da conduta
encarnar o desvalor característico da violação do dever objetivo de cuidado, tiver sido no plano dos factos a causa efetiva do resultado.

Ora, estamos aqui no plano do ilícito, tem que ver com a determinação do desvalor pessoal objetivo do ato que se pauta pelo critério do homem médio. O
cuidado que seria exigível naquela concreta situação ao homem médio. Que homem medio é este?
Durante muito tempo vigorou o critério do homem medio da posição socio- existencial do agente. i.e., na sociedade existem estratos muito diferentes, com
graus de cultura, de experiência, formação muito diferentes e em relação aos quais as exigências do DP têm também que ter critérios diferentes. Por isso,
dizia-se que o homem medio como critério de determinação do âmbito do dever objetivo de cuidado devia respeitar essas diferenças e, portanto, é diferente
o grau de exigência que prende ao sábio por contraposição ao analfabeto (ex.:o medico medio, o polícia medio, o juiz medio, o advogado medio.
Todavia, alguns autores adotam o critério do homem concreto. Este critério do homem concreto, verdadeiramente não aponta para o homem concreto na
sua globalidade, sim o homem medio das capacidades instrumentais operatórias do concreto agente. O que está subjacente a esta ideia é uma ideia de
justiça. No fim de contas, exigir daquele que pode dar mais, mais do que à pessoa comum. Todavia, esta ideia tem apenas um inconveniente que justificou
a introdução de uma correção por Roxin, com a qual concorda FD:
 Em toda a sua pureza, o critério do momento concreto importaria que se considerassem as capacidades acima da média, mas também as capacidades
abaixo da média. Por isso Roxin introduziu a correção de se

considerarem as capacidades acima da média do homem concreto apenas, não já as que estão abaixo da média.
Este critério recorre ao chamado critério misto do homem medio: há o critério residual, em que se recupera o velho critério do homem médio da posição
socio-existencial do agente. Por referência a este critério que é o homem médio socio existencial, só se considerarão as capacidades acima da média do
homem concreto acima da média. Será através deste critério misto que devemos definir o homem medio e definir as situações concretas para a
determinação do âmbito do dever objetivo de cuidado.
Isto em geral, mas temos que ver em concreto.
A doutrina juntou mais 2 elementos que intervêm na determinação no dever objetivo de cuidado e que são 2 situações típicas que se reconduzem:
Por um lado, à figura da chamada negligencia na aceitação ou na assunção;
Em segundo lugar, ao chamado pp da confiança.

Negligencia na aceitação ou na assunção:


O que se verifica é o seguinte e começar-se-á por um exemplo: suponha-se que alguém com idade vai a conduzir o seu automóvel e, devido a essa falta de
reflexos e de visão, atropela alguém numa situação em que o condutor normal não teria atropelado, foi devido às suas insuficientes capacidades para a
condução. No momento em que ele atropela, age de acordo com as capacidades que tem e, portanto, parece que não lhe seria censurável a conduta.
Todavia, ele é censurável, não no momento em que atropelou o peão em causa, mas no momento em que iniciou uma atividade para a qual não tem as
devidas capacidades.
Nestes casos da negligencia da aceitação ou assunção o momento da censura retroage ao momento em que ele iniciou uma atividade para a qual não estava
capacitado ou não tinha as informações devidas.
A importância dos bens jurídico-criminais impõe que alguém só inicie uma atividade quando tem as condições para a desenvolver adequadamente e sem
perigos para bens jurídicos.
Temos aqui algo de paralelo ao que se verifica no âmbito da actio liberum in causa, aquando do estudo da inimputabilidade e mais concretamente o nº4 do
artigo 20º do CP. Na actio da liberum in causa no momento do ato ele é inimputável, não é censurável, mas a censura retroage ao momento em que ele, em
estado de plena imputabilidade projetou o crime e pôs em marcha o processo.
Não sendo a mesma coisa, há aqui algo de paralelo, uma vez que a imputação do resultado e a responsabilização do agente atende não ao momento em que
se verificou a lesão do bem jurídico, mas ao momento prévio em que ele iniciou a atividade para a qual não estava preparado e em relação à qual, devido a
essa falta de preparação era previsível que pudesse vir a colocar em perigo ou lesar bens jurídico-criminais.

Pp da confiança
O pp da confiança vem dizer que o dever de cuidado manda que façamos a previsão dos perigos que resultam da nossa conduta e apenas dela.
Em pp, o dever de cuidado não abrange o dever de prever perigos resultantes de condutas de outras pessoas sejam elas dolosas ou negligentes, salvo
quando na situação concreta for evidente que a outra pessoa está a atuar ilicitamente (seja dolosa, seja negligentemente).
Ex.: pense-se na condução automóvel. Alguém vai a conduzir no respeito pelas normas do código da estrada, entra num cruzamento com prioridade, só que
vem um carro da esquerda e embate. Será que ele tinha a obrigação de prever esta conduta do condutor da esquerda? Depende!
Vamos supor que era um cruzamento sem visibilidade – não poderia antecipar a vinda do carro do lado esquerdo. Neste caso diz o pp da confiança que não
se pode imputar o resultado ao condutor, uma vez que se diz que nessa previsão se deve partir do pressuposto de que todos os membros da comunidade se
comportam conforme ao direito e, portanto, não vão praticar nem condutas dolosas nem negligentes. O agente deve confiar que os demais intervenientes na
vida social também se comportam conforme ao direito.
No entanto, temos a clausula de salvaguarda («salvo se for evidente») – suponha-se que o cruzamento tinha plena visibilidade e que o homem viu que, do
lado esquerdo, sem prioridade, se aproxima o automóvel a uma velocidade tal que era impossível parar e assim evitar o acidente. Neste caso, verifica-se
esta hipótese da clausula de salvaguarda em que era manifesto que o outro condutor estava a conduzir negligentemente/ contra o direito, pelo que estando
na mão do nosso homem evitar o acidente e este não o fizesse, então já lhe seria imputado o resultado  seria responsabilizado a título de negligência pelas
eventuais ofensas a bens jurídicos decorrentes do acidente.
Uma última nota que se costuma suscitar a propósito do pp da confiança:
Caso da pessoa que vai a conduzir no pleno respeito pelas regras do código da estrada, só que vai com uma taxa de alcoolémia superior a 1,2 g/l. E
suponhamos até que esta taxa de alcoolemia foi provocada negligentemente, uma vez que o agente se distraiu. Houve já quem pretendesse dizer que, na
medida em que ele está a praticar um crime negligente (condução sob efeito de álcool), então não pode beneficiar do pp da confiança, uma vez que já está a
praticar um crime negligente.
Isto é errado. O crime de condução sob efeito do álcool é um crime de perigo abstrato. Ora, no nosso exemplo o que se verificou foi que o perigo em causa
foi o perigo daquele acidente em concreto.
No âmbito desse crime concreto, o nosso homem apesar de ir com uma taxa de alcoolemia superior em nada influiu na produção do acidente. Por isso
entende FD, nestes casos, na medida em que o estado de alcoolemia não tinha tido nenhum reflexo no estado do agente naquele concreto acidente, deve
continuar a beneficiar (se for caso disso) do pp da confiança.

O agente apenas será punido pela condução sob efeito de álcool, mas não lhe será imputado o resultado do acidente na base da violação do dever objetivo
de cuidado.

Tipo subjetivo
Houve já quem pretende-se que na negligencia não há tipo subjetivo. É uma conceção que assenta ainda na ideia da recondução do tipo subjetivo a um
qualquer substrato psicológico/ existência de um qualquer quid psicológico e, nessa medida, é ainda uma revivescia do velho conceito psicológico.
O que esta doutrina diz é que nos crimes dolosos temos um nexo psicológico-volitivo – o agente conhece e quer – há este facto psicológico subjacente à
prática de qualquer delito doloso.
Na negligencia consciente, diziam eles, que ainda se viria uma vez que o elemento intelectual é o mesmo do dolo. Mas na negligencia inconsciente não
existe. Portanto, faltaria aqui um quid psicológico de uma qualquer representação da situação de perigo para o bem jurídico. Isto é errado, uma vez que não
se está aqui a tomar em consideração a verdadeira função do tipo. O que o tipo subjetivo pretende é descrever a situação psicológica do crime do agente
que se pode traduzir precisamente na ausência de vontade e de conhecimento.
É o tipo subjetivo da negligência inconsciente que caracteriza a situação psicológica do agente no crime negligente inconsciente (ausência de representação
e ausência de vontade) e que o distingue dos casos da negligencia consciente (representação do resultado como possível e ausência de vontade).
Portanto, faz todo o sentido falar do tipo subjetivo dos crimes negligentes, tanto no âmbito da negligência consciente como na inconsciente.
Aqui também temos posições intermedias como a de Roxin e, entre nos, o Professor Taipa de Carvalho que diz que: não há tipo subjetivo na negligencia
inconsciente, mas haverá na consciente, que é representação do resultado como possível e ausência da vontade de realização.

Tipos justificadores
Os tipos justificadores comportam o desenho de certas situações que retiram o ilícito de uma conduta do agente apesar desta conduta ser subsumível ao tipo
incriminador
O problema que se põe é saber se também no âmbito dos delitos negligentes há lugar à autonomização deste tipo da justificação. NÃO HÁ.
Há uma diferente estrutura do tipo incriminador doloso e negligente. O tipo doloso descreve um processo exterior de produção de uma situação de perigo
ou lesão de bem jurídico. O que está em causa no âmbito do tipo objetivo incriminador doloso é a lesão ou colocação em perigo de um BJ. O tipo
incriminador negligente também descreve uma

situação exterior de lesão ou colocação em perigo de BJ. No entanto é necessário que a conduta viole o dever objetivo de cuidado. No âmbito do tipo
incriminador intervém o dever objetivo de cuidado- critério delimitador do tipo incriminador negligente.
Este dever objetivo de cuidado tem o limite da inexigibilidade objetiva. É evidente que o dever objetivo de cuidado manda prever as consequências dos
nossos atos mas só podemos prever até ao limite que nos impõe o dever objetivo de cuidado. Sucede que sempre que não fosse exigível prever a
consequência do ato não há violação do dever objetivo de cuidado pelo que não há preenchimento do tipo incriminador.
Nós vimos que a posição do prof. AC ao contrário da doutrina maioritária reconduz o fundamento dos tipos incriminadores ao pp da inexigibilidade
objetiva. De acordo com o que foi dito no âmbito da negligência este princípio da inexigibilidade objetiva vai intervir logo na delimitação do tipo
incriminador.
Assim todas as situações que dão lugar a aplicação dos tipos justificadores, aqui quando transferidas para o âmbito da negligência levam à própria exclusão
da tipicidade. Esta é a posição do prof AC.
E a posição da maioria da doutrina? Esta é exposta de forma paradigmática por Roxin (FD aproxima-se desta posição).
Esta doutrina maioritária aceita que na negligência há menos espaço para o funcionamento dos tipos justificadores.
Todavia em certas situações limites seria necessário recorrer à figura da justificação para evitar consequências dogmáticas que seriam contrárias à
valoração jurídico criminal.
Esta posição assenta num equivoco. Todos os exemplos que dão a titulo excecional para recorrer à justificação na negligencia são casos de dolo e não de
negligencia. Os casos que eles chamam para legitimar o recurso à negligencia são casos de dolo
Exemplos:
Quanto à legítima defesa: briga entre duas pessoas em que o defendente para se defender do agressor da lhe um murro num braço. Com esse muro em vez
de acertar no braço acerta no queixo provocando uma locomoção cerebral. Diz Roxin que o agente deveria ser responsabilizado por ofensas à integridade
física negligente. ERRADO. Esta é uma situação de erro sobre o processo causal. Ou seja, temos uma conduta dolosa. Invocar este caso para dizer que a
legítima defesa aplica se à negligência é errado. Este é um perigo típico da conduta pelo que este resultado é imputável a titulo de dolo.
Quanto ao Estado de Necessidade: Alguém por negligencia bebeu demais e está com uma taxa de alcoolémia superior a 1,2 gramas de álcool por litro de
sangue. Este homem tem um acidente porque é obrigado a levar o amigo urgentemente ao hospital. Dizem os autores que neste caso deveria se fazer
funcionar o EN para justificar esta conduta negligente. ERRADO. O agente atuou com dolo, representando o perigo de ter o acidente devido à taxa de
alcoolémia e pondera esse perigo relacionado com o perigo do amigo que precisava de ir ao hospital.
Quanto ao Consentimento do ofendido: Um médico vai na rua e vê alguém que tem uma síncope e tem que fazer uma intervenção cirúrgica sob pena da
pessoa
morrer. De acordo com a legis artis o medico não reúne as condições necessárias. No entanto, o medico intervém e salvou o paciente. Mas devido às
condições precárias, embora o paciente tenha sobrevivido ficou com sequelas para o resto da vida. Os autores dizem que estamos perante uma situação de
ofensas à integridade física recorrendo ao consentimento presumido. E dizem que estamos perante um caso que teremos que recorrer ao consentimento para
evitar punir o médico por integridade física negligente. ERRADO. O medico esta a atuar com dolo e atuando com dolo justifica se invocar o consentimento
presumido. Não faz sentido invocar este exemplo para falar da aplicabilidade dos tipos justificadores à negligência
Suponha se que A é caçador e vê um vulto atrasa do arbusto. Julga que é uma peça de caça e dispara só que mata uma pessoa porque o vulto era um
homem. De acordo com o erro sobre a factualidade típica exclui se o dolo. Só que este homem atro do arbusto estava lá para matar o caçador. Com isto, se
o agente atuasse com dolo estaríamos perante uma situação de LD. Ele não atuou com LD porque não sabia estar a atuar perante uma situação de LD.
Dizem os autores que deste modo, a única forma de evitar a punição do caçador é aplicar a LD a uma situação de negligência. Assim desde já deve se
admitir que o agente deve ser punido a título de negligência. Mesmo seguindo a logica dos autores que pretendem excluir a ilicitude esta exclusão deverá
ter a ver com uma razão de necessidade de pena idêntica à que subjaz ao art 13º quanto à punição da negligência a título excecional e quanto aos arts. 22º e
23º. Seria uma regra que diria qualquer coisa como isto: “a negligência é uma situação menos grave, pelo que a negligencia não deve ser punida sempre
que a situação análoga de dolo também não seja”. Na base desta regra poderíamos excluir a punição. No entanto o prof não aceita esta posição. O agente
deve ser punido a título de negligência. A circunstância de os autores (Roxin e FD) pretenderem funcionar a justificação não faz o mínimo de sentido. ainda
que se admitisse excluir a punição, resultaria ainda da tal consideração global de desnecessidade de pena que restringe a punição da negligencia em
comparação com os crimes dolosos.
Assim, na ótica do prof, não há lugar para a figura da justificação no âmbito da dogmática dos crimes dolosos.

Culpa
Há também diferenças entre a dogmática dos crimes dolosos e negligentes. Partimos da perspetiva do ilícito pessoal. No ilícito procuramos o sentido do ato
enquanto ato humano em geral (desvalor pessoal objetivo). Ao invés do que se passa na culpa: atendemos às particulares qualidades, capacidades do
concreto agente e valorá-lo como ato daquele concreto gabinete e saber se é censurável àquele concreto agente (desvalor pessoal subjetivo).
Também aqui no plano dogmático a culpa funciona pela negativa. Em pp, o ato ilícito é também culposo já que a generalidade das pessoas preenche as
características do

“Homem médio”. Em certos casos especiais verificam-se no agente desvios emocionais quanto ao “Homem médio”. O “Homem médio” não é inimputável.
São as causas de exclusão da culpa. Vamos estudar a culpa negligente.
Na culpa nós vamos aferir as características pessoais subjetivas do “concerto agente”.
Vamos passar para a análise dogmática do conceito de culpa negligente e vamos estudá- la no âmbito da exclusão da culpa negligente – situações que
marcam uma exceção do concreto agente com referência ao “Homem médio”, na medida em que o agente fica aquém do “Homem médio”.
As causas de exclusão da culpa negligente são duas:
A inimputabilidade (rever a matéria anteriormente lecionada) – contende com fatores endógenos. Tem dois elementos (elemento biopsicológico – anomalia
psíquica; elemento normativo - impossibilidade de o agente avaliar a ilicitude da situação ou de se determinar de acordo com essa avaliação).
Inimputabilidade por anomalia psíquica - O art.20º/nº4 do CP – está prevista a actio liberum in causa – o agente coloca-se na situação de inimputabilidade
para depois criar uma situação para poder cometer um crime com base nessa imputabilidade. A diferença esta no elemento da pré-ordenação – aqui não há
preordenação ao contrário do que acontece no art.20º/nº4 do CP. Parece que a actio liberum in causa não pode funcionar na negligencia. na negligencia
inconsciente (não representa sequer o perigo da sua conduta) não se compreende como alguém se pode pré-ordenadamente se colocar numa situação de
inimputabilidade para depois cometer um crime. considerações análogas podem tecer-se para a negligencia consciente (confia que o resultado não se vai
produzir) então como se pode confiar que se está a pôr numa situação de inimputabilidade para depois praticar um crime. Aplica-se sim o art.295º do CC
Inimputabilidade em razão da idade: vigoram por inteiro as considerações que tecemos em relação ao dolo.
Não exigibilidade – como causa de exclusão da culpa, a inexigibilidade é uma inexigibilidade subjetiva – saber se naquela concreta situação, em relação ao
concerto agente, aquela conduta valora ou não, sabendo se se exclui a culpa ou não, ou até atenuar a culpa.
De acordo com FD e com AC e de acordo com a Teoria da culpa limitada, o problema do erro sobre a ilicitude não tem a ver com a negligencia - aquele
que viola o dever jurídico penal revela uma verdadeira inimizade e indiferença pelo Dto, pelo que está a agir de forma dolosa. A problemática do erro sobre
a ilicitude nada tem a ver com a matéria da negligencia.
Punibilidade
Esta categoria tal qual se coloca hoje surge no contexto do sistema teleológico-racional. Resulta porque para a corrente maioritária dentro dos adeptos do
sistema teleológico- racional, sabemos que Roxin segue uma outra via em vez da culpa fala de uma categoria da responsabilidade onde concentra tanto as
considerações de avaliação de culpa como as considerações de necessidade de pena. O professor defende uma posição contrária, as considerações de
dignidade penal e de necessidade de pena projetam-se ao logo de todo o sistema e, portanto ao longo da conformação de todas as categorias. Não há razão
para

concentra todas as considerações de necessidade de pena numa categoria autónoma no fim do sistema, mas a opinião maioritária entre os adeptos consagra
a punibilidade como a tal categoria onde interviriam as tais considerações de necessidade de pena. É essa a orientação maioritária entre nós. Aqui devemos
seguir a posição que acharmos mais adequada, mas talvez seja mais fácil adotar a posição maioritária. A posição de Figueiredo Dias é de que as categorias
do ilícito e da culpa se reportam ao desvalor intrínseco do ato e, portanto, concretizam prioritariamente considerações de dignidade penal, razões
axiológicas, valorativas atinentes seja ao desvalor objetivo do ato (plano do ilícito típico), quer seja ao desvalor subjetivo do ato (plano do juízo de culpa).
Ao invés interviriam as considerações de necessidade de pena interviriam apenas neste escalão da punibilidade. Quais seriam essas considerações? Aqui
vale com as necessárias adaptações tudo o que dissemos a propósito dos crimes dolosos. Eram considerações que tinham que ver com as considerações
objetivas de punibilidade (o crime é um crime de perigo só que esse perigo só é punido quando se verifica o dano, só que o dano não faz parte do crime
porque ele é de perigo, o dano está ali apenas para comprovar a gravidade do perigo, para comprovar o conteúdo de ilícito do ato), para os adeptos desta
doutrina, esta condição objetiva de punibilidade seria a concretização de considerações de necessidade de pena. Falamos da participação em rixa que pode
ser um crime praticado a título de dolo ou a titulo de negligencia, em relação ao qual depois se coloca o problema da condição objetiva de punibilidade, ou
seja, o agente só será punido desde que dessa rixa resulte ou uma lesão da vida, ou uma lesão grave da integridade física de outra pessoa. Também
podemos falar aqui da embriaguez e intoxicação do artigo 295º, é um crime de perigo que se associa ao facto de a pessoa estar em caso de
inimputabilidade. Todavia, este perigo só é punido quando em estado de inimputabilidade o agente praticar um outro ilícito típico. Esta figura das
condições objetivas de punibilidade pode funcionar quer nos crimes dolosos quer nos crimes negligentes. A outra ordem de considerações seria resultante
do chamado princípio da insignificância que aponta para que, à luz do critério de necessidade de pena, não se punam certos crimes quando a lesão do bem
jurídico em causa for de diminuto valor, isto está de acordo com o caráter subsidiário de ultima ratio de intervenção jurídico penal. Se isto é válido para os
crimes dolosos, por maioria da razão, este pensamento funciona ao nível da negligência, desde logo quanto a questões do artigo 13º que não nega que nos
casos que não estão previstos na lei continue a haver lesões de bens jurídicos imputáveis a título de negligência. Só que o legislador diz que a negligência é
pouco grave, que se exige o mínimo de intervenção, portanto não as vamos punir. Essas ações negligentes que continuam a ser negligentes não relevam
para o direito penal. É uma concretização da ideia, desde princípio da insignificância. O mesmo para a tentativa, é pensável a construção de uma figura
paralela à da tentativa na negligência, a quase tentativa. É pensável, mas o legislador diz não, a negligência é pouco grave de maneira que aqui só punimos
a negligencia sob forma do crime consumado, não da tentativa. Esta ordem de modelação concreta dos crimes negligentes já na parte especial leva a que o
legislador prescinda da punição quando o dano no bem jurídico for diminuto ou o grau de perigo para o bem jurídico for diminuto. Será também aqui uma
concretização do princípio da insignificância como concretização de uma ideia de necessidade de pena. No âmbito da punibilidade dos crimes negligentes
não há lugar para falar da figura da desistência da tentativa, isto porque a tentativa não tem lugar no crime negligente, não releva a tentativa no âmbito dos
crimes negligentes e se não releva a tentativa também não releva como consequência a figura da desistência da tentativa. Tirando esta figura do que os
autores

falam no âmbito da punibilidade relativamente aos crimes dolosos, tudo o resto que dissemos a propósito da punibilidade no âmbito dos crimes dolosos é
também aplicável aos crimes negligentes. Com isto terminamos a dogmática dos crimes de ação negligentes.
Crime agravado pelo evento
Esta figura contempla uma parte de dolo e uma parte de negligencia. Hoje em dia, esta figura foi introduzida por influência alemã, no art.18º do CP. Esta
figura veio substituir a figura do preter intencional, que é muito menos abrangente do que agora possuímos no art.18º do CP. Este é o caso em que temos
um crime, isto é, o agente pratica esse crime e consuma esse crime, só que em consequência vem a produzir-se um resultado adicional, sendo que a lei
atribui à produção desse resultado adicional um efeito agravante ao nível da sanção aplicável.
Antes da vigência do CP de 1982, esta temática era considerada no âmbito da figura do crime preter intencional (um crime que ia além do que era
intencional).
O que era o crime preter intencional? Quando alguém cometia um crime doloso, mas dessa conduta resultava uma conduta mais grave da que se pretendia.
Ex: ofensas corporais que daí advinha a posterior morte do agente (esta última não desejada). Ex: abandono de menores – a mãe, em regra, para esconder
filhos fora do casamento, deixava o recém-nascido, pe., à porta do padre. Ora, ela só queria abandonar a criança, sendo esse crime o de abandono. Só que
durante a noite, o frio ou um animal mata a criança. Portanto, a morte da criança estava para além da intenção, era um resultado que não tinha sido querido
pelo agente.
De acordo com as regras gerais, esta seria uma situação de concurso de crime: por um lado, o crime doloso (ofensas corporais e abandono) + crime
negligente (resultado mais grave não querido pelo agente – morte).
FD dizia que este crime e tinha fundamentalmente 4 elementos:
A prática de um crime fundamental doloso (só podia ser doloso), ou seja, tinha de haver um primeiro crime praticado a título de dolo;
A verificação de um evento mais grave, não recoberto pelo dolo do agente (evento negligente)
Este crime preter intencional era punido de forma mais grave do que a situação de concurso e o fundamento dessa agravação estava ligada à particular
gravidade da negligencia, na medida em que se tratava de uma negligência grosseira/qualificada (de acordo com as práticas da experiência deixava antever
como muito provável se não como necessário o resultado).
Requisito da legalidade – o crime preter intencional só funcionava nos casos expressamente previsto na lei. O crime agravado pelo evento tinha que estar
expressamente previsto na lei.
Assim, no crime preter intencional, o resultado agravante era imputável tão só à negligencia, e tinha de ser grosseira.
O novo CP introduziu a figura do crime agravado pelo evento, que substitui a figura do crime preter intencional.
Art.18º do CP (é uma norma sobre normas) – da leitura deste artigo resulta que esta figura do crime agravado pelo evento abrange todas as situações de
crime preter intencional e adiciona outras. Quais os requisitos do art.18º do CP?
Tem que ser um facto, que pode ser doloso- não diz somente doloso. A doutrina inclui aqui também a possibilidade de se incluir a prática de um facto
negligente consciente. Exclui-se a negligencia inconsciente porque não faz sentido. Ex: se alguém, em termos de negligencia inconsciente, dá um
encontrarão a alguém, causando-lhe com isso uma ofensa à integridade física e dessa ofensa à integridade física vem a resultar na morte do ofendido, o
agente não vai ser punido por ofensa à integridade física negligente agravada pelo resultado morte. Ou seja, temos de averiguar se a conduta não era
adequada a conduzir ao resultado morte
Haver lugar a um resultado agravante
O evento agravante do crime preter intencional era sempre imputável a título de negligencia. Aqui admite-se que esse resultado agravante possa ser
imputado pelo menos a título de negligencia, o que se pressupõe que também pode ser imputável a título de dolo. Mas, isto parece absurdo (então, ele quer
bater, mas depois quer matar. Ele vai ser punido pelo crime de ofensas à integridade física, depois agravado por um resultado de dolo? NÃO). A doutrina
tende a restringir estes casos de imputação a título de dolo a duas situações excecionais, em que pode ser imputável a título de dolo:
֎ O evento pode não ter dignidade penal em si mesmo, isto é, isoladamente considerado, não constitui um crime – Ex (art.177º do CP): alguém viola com
intenção de engravidar a mulher e acaba por engravidar. É punido a título de dolo. O evento em si não é em si mesmo não é um crime (gravidez). Ou seja, a
gravidez, em si mesma, não é crime, mas quando resultado de uma violação já é. Ou seja, nestes casos o resultado adicional (gravidez) que, em si mesmo,
não é crime, admitindo-se então que o resultado agravante seja imputado a título de dolo.
֎ O legislador, muitas vezes, devido ao carater subsidiário da intervenção do DP não pune todas as formas de dolo, só pune o dolo direito e o dolo
necessário e, já não o dolo eventual. Ou seja, falamos aqui dos casos em que esse evento agravante é crime, mas individualmente considerada, nos casos de
dolo eventual, não seria o agente punido. O que a doutrina diz é que se o evento agravante corresponder a um desses crimes em que o legislador
normalmente só pune o dolo direito e necessário, aqui no contexto do crime agravado pelo evento, passa a imputar-se mesmo nos casos de dolo eventual.
Pp. da legalidade – as hipóteses de crime agravado pelo evento têm de estar expressamente previstas na lei (Ex: art.147º, 177º, 285º do CP)
Assim, verificamos a inutilidade da manutenção da figura do crime preter intencional, pois esta nova figura recobre todas essas situações e adiciona outras.
É de referir que só podemos aplicar este art.18º do CP desde que preenchidos os seus requisitos – o art.18º do CP corresponde a uma norma sobre normas e
contem os pp´s de interpretação dos concertos crimes preter intencionais.

A TEORIA GERAL DOS CRIMES DE OMISSÃO


A lesão dos BJ pode ocorrer ou através de um comportamento positivo que atenta contra um BJ que o lesa ou coloca em risco (ação) ou num
comportamento negativo (omissão), isto é, perante uma situação em que o BJ está em perigo, o agente não intervém, nada faz para preservar esse BJ.
A omissão traduz-se em alguém que viola o dever de intervenção, traduz-se num non facere, na medida em que o agente não intervém quando o poderia
fazer para preservar um BJ alheio.
O reconhecimento do crime de omissão passou por dificuldades:
Mundividência individualista liberal –no âmbito do Estado de Direito Liberal defendia- se que o Dto devia proibir condutas que atentem contra a esfera
jurídica de outrem. Contudo, o Dto já não tem legitimidade para exigir um esforço pró-ativo, uma atuação em sentido altruístico no sentido de preservar
interesses jurídicos, BJ de outra pessoa. Isso ficaria no âmbito da moral e não do Dto. Mas, dizer que alguém aja para defender interesses alheios seria coisa
da moral e não do Dto. Esta ideia esta hoje ultrapassada pelo Estado de Direito social que assenta numa vertente solidarista – o DP intervém para defender
BJ essenciais e, em certas situações, ainda que não se confundindo com a esfera da moral, há lugar a incriminação em certos casos da omissão de acordo
com uma ideia de solidariedade. Todavia, é necessário que haja uma delimitação precisa do âmbito da omissão jurídico-penalmente relevante por
exigências da ideia de legalidade, certeza e segurança jurídica e também do próprio agente (quando é que o agente está ou não obrigado a intervir), mas
também no interesse das outras pessoas (do ponto de vista da tutela da intimidade da vida privada).
É preciso ainda distinguir entre:
Omissões puras/ próprias – correspondem àquelas que estão expressamente previstas na lei, sendo as que menos problemas levanta. O legislador, ao
descrever um determinado crime, descreve-o como uma omissão. É a própria conduta omissiva que está descrita na lei. Ex: recusa de medico, omissão de
auxílio (art.200º do CP), desobediência.
Ou seja, a própria descrição do tipo legal na parte especial ou em legislação extravagante, é a descrição de uma omissão, de um comportamento omissivo.
Omissões impuras/impróprias: refere-se a todos os delitos que estão descritos na parte especial ou em legislação extravagante como comportamentos
positivos. Ex: A generalidade dos crimes como o homicídio, as ofensas à integridade física, o furto, a burla, etc. Ou seja, o elemento gramatical da norma
reporta-se a comportamentos positivos (a crimes de ação). Todavia, entende-se que em certas e determinadas circunstâncias, este desvalor da ação é
equiparável ao desvalor da omissão. Reporta-se a crimes que estão descritos na lei como comportamentos positivos, equiparando o desvalor da omissão à
da ação e, portanto, abrindo a possibilidade desses mesmos crimes poderem ser imputados a título de omissão.

Casos ambivalentes/dupla relevância


Situações que suscitam a dúvida de se o crime foi praticado por omissão ou se foi praticado por ação.
Exemplos:
Alguém atropela outra pessoa, ele vai ser responsabilizado por ação, por ter conduzido o carro contra a pessoa; ou vai ser por omissão, por não ter travado a
tempo
O médico que desliga a máquina a que está ligado o doente, vai ser responsabilizado por ação de ter desligado a máquina ou por omissão de não ter
continuado o tratamento.
São estes os casos de dupla relevância em que se suscita o problema de encontrar um critério para saber se nestes casos devemos responsabilizar o agente
ou por ação ou por omissão. A questão é importante porque quando o artigo 10º estabelece alguns requisitos, restringe a equiparação do valor da omissão à
ação.
O âmbito da punição da omissão é menor do que o âmbito da punição da ação. O facto de qualificarmos a conduta como omissão ou como ação pode
significar a diferença entre a punição e a impunidade.
Foram vários os critérios avançados na doutrina:
O 1º de Roxin, é um critério causalista que não serve. O problema do direito penal é um problema de valoração, o que está em causa é saber o sentido da
conduta, se tem o sentido de uma ofensa por ação ao bem jurídico ou por omissão. É um critério que não é seguido pela generalidade da doutrina;
Outra doutrina diz que devemos adotar o ponto de conexão relevante para a responsabilidade. É uma formulação um bocado rebuscada. Estes autores
querem dizer que devemos atender ao sentido global da conduta e verificar se esse sentido global da conduta à luz da valoração criminal tem um sentido de
omissão ou tem um sentido de ação. Esta doutrina ponta no sentido correto, mas a critica que se lhe dirige é que é vaga, é imprecisa e não dá um critério
dogmático operatório para a solução dos casos concretos;
Em terceiro lugar surgiu uma nova doutrina que perante esta dificuldade de encontrar um critério material se resignou a encontrar um critério prático. Diz
que a responsabilização a título de omissão será a título subsidiário porque a regra é a responsabilidade por ação e só quando a ação não for recondutível de
todo em todo a um crime de ação é que vamos admitir a omissão. Verdadeiramente esta doutrina significa prescindir de um critério material para distinguir
a ação da omissão;
O critério seguido é aquele que reconduz a decisão destes casos de dupla relevância, de ambiguidade da conduta ao critério basilar da distinção entre ação e
omissão. Diz-se que sempre que o agente criou um perigo por ação ou agravou o perigo, ele será sempre responsabilizado por ação, a omissão fica para os
casos em que o agente não teve qualquer interferência seja na criação, seja na agravação, seja nas condições do perigo em causa, por isso só se lhe possa ser
censurada uma não intervenção para realizar a conduta.

Ainda dentro destas considerações introdutórias coloca-se o problema levantado por Roxin: um crime de omissão pode ser praticado por ação?
Em larga medida este problema é suscitado pelo critério de Roxin nos casos ambivalentes. Para quem siga a perspetiva acima indicada este problema não
existe.
Ex.: caso de alguém que se embriaga pelo momento do ato não praticar o ato. Seria uma espécie de omissio libera in causa. Roxin diria que há um ato
positivo de ingerir bebida alcoólica para depois não intervir. Neste caso temos um perigo de omissão. O guarda da cancela dos caminhos de ferro que se
embriaga para no momento oportuno não fechar a cancela está a praticar um crime de omissão.
Assim com base no critério da vontade nos casos ambivalentes não faz sentido a figura do crime de omissão praticado por ação.

Teoria geral dos crimes de omissão dolosos ou negligentes


Estamos a decompor o conceito material de crime (violação de norma de determinação). Aqui a norma de determinação é o dever de atuar. Sendo que a
violação do dever de atuar encontra o seu núcleo no desvalor da ação. Deste modo vamos decompor analiticamente e construir a teoria geral dos delitos de
omissão.
Vamos tratar unitariamente a omissão dolosa e a omissão negligente
Vamos encontra as categorias essenciais com que trabalhamos nos delitos de ação
Ação:
Mais uma vez temos o conceito de Ação pessoal/personalista: manifestação exterior da vida consciente do indivíduo. Afastamos desde logo todas as
situações que não sejam a exteriorização de uma intencionalidade de sentido. A ação abrange também a omissão ao contrário do que vimos na ação causal
do sistema clássico e no sistema finalista.
Para termos um crime não basta uma ação. É necessário que ela seja ilícita típica
Ilícito típico
A ilicitude é o juízo e valor subjacente a cada tipo. O elemento gramatical não vale por si, vale apenas como meio de aceder ao espírito da lei.
Perspetivamos este ilícito típico no quadro do ilícito pessoal. Procuramos saber o desvalor que teria esta situação se praticado pelo homem medio.
Também aqui o ilícito típico temos uma unidade objetiva- subjetiva. Tratamos os elementos subjetivos e objetivos da omissão de forma separada
Tipo objetivo
São os mesmos elementos estruturantes

Quanto ao agente: crimes comuns e crimes especiais- o agente pode delimitar a omissão juridicamente relevante a uma certa categoria de pessoas ou impô-
la à generalidade das pessoas. Mais uma vez temos os crimes específicos puros/próprios ou impuros/impróprios;
Quanto à conduta, embora seja mais raro, mas é pensável podemos distinguir entres crime de execução livre ou não vinculada. Regra geral os crimes são
tipos de crimes de execução não vinculada. Na omissão por via de regra apenas se exige que o agente intervenha de qualquer forma para satisfazer o dever
de ação em causa. Mas em certos deveres por exemplo de instalações técnicas perigosas não se exclui que o legislador exija que a ação respeite certo
modus operandi. A situação é rara, mas pensável. Ainda quanto à conduta podemos distinguir entres crimes formas ou materiais. Para a consumação exige
se para alem da consumação a subsequente lesão ou colocação em perigo do BJ- resultado material. Ex.: invasão de domicílio (art. 190º do CP);
Quanto ao BJ continua a afirmar-se as mesmas distinções: a omissão pode ser de perigo (abstrato ou concreto. Também há lugar para falar como espaço
intermedio de delito de aptidão) ou de dano.
Chamar a atenção para não confundir entre crimes formais e materiais com a distinção entre crimes de perigo e crimes de dano.
Ex.: invasão de domicílio- pode ser praticada por omissão nos casos em que ao agente já esta em casa de outra pessoa. A dá ordem a B para sair e ele não
sai- temos aqui um crime formal

Imputação objetiva do resultado à conduta


Devemos aqui distinguir o critério da imputação objetiva dolosa e negligente. Começando por reportar à teoria da conexão pelo risco devemos salientar que
na omissão a teoria da conexão pelo risco reporta se apenas a dois elementos.
Aqui não tem lugar o elemento da causalidade- não há qualquer contributo causal do agente para a situação de perigo do BJ. O agente limita se a não
intervir.
Por isso os adeptos da teoria da conexão pelo risco uma tendência que existe na Alemanha de ver na omissão o elemento da causalidade.
Mesmo na perspetiva da teoria da conexão pelo risco não há no âmbito da omissão que falar no nexo causal naturalístico
Quanto aos outros elementos há apenas uma inversão logica:
O agente estava na posição de adotar uma conduta adequada a evitar o resultado? Ex.: A estava obrigado a salvar aquela pessoa. Mas ele não sabe nadar.
Não esta na sua mão levar a conduta adequada a evitar o resultado. Neste 1º critério temos o mesmo critério da adequação só que perguntamos se ele estava
em posição de adotar uma conduta adequada à produção do resultado;
Quanto ao terceiro escalão: com as necessárias adaptações aplicam se por inteiro à omissão dolosa
Contraditoriamente estes autores aplicam se os mesmos critérios aos crimes dolosos e negligentes
O prof parte de outra conceção.
Aplicar a teoria da conexão do risco aos delitos de omissão negligentes não parece correto ao professor porque não se ajusta ao sentido da negligência.
A teoria da adequação não exprime o desvalor intrínseco da negligência e o critério de imputação é o próprio dever objetivo de cuidado. A imputação
aponta que este resultado não impossível, mas pode suceder que no âmbito da negligência, o agente usando do cuidado médio exigido ao homem médio
não se aperceba da concreta situação.
Por isso aqui o critério tem que ser diferente do da teoria da adequação, é o próprio dever objetivo de cuidado.
Quanto aos corretores: não é aplicável o da diminuição do risco, se não sabe que está a produzir um resultado como é que sabe que quer produzir esse
resultado para evitar um resultado mais grave? Quanto aos outros corretores são inúteis porque já estão compreendidos no dever objetivo de cuidado.
A propósito da imputação objetiva quando ao crime negligente, repetem-se aqui as mesmas críticas aos que pretendem usar a imputação do risco objetiva
nos crimes de ação negligentes. A posição do professor é a de que repudia a teoria da conexão do risco quer nos crimes dolosos quer nos crimes
negligentes. Nos crimes dolosos o critério é o domínio do facto e mais concretamente o domínio da não impossibilidade do facto. Ao passo que nos crimes
negligentes o critério é o próprio dever objetivo de cuidado.

É agora a este nível que se distingue aquelas duas modalidades de omissão que já referimos. A omissão pura ou própria é aquela que está descrita no tipo
legal de crime previsto na lei (artigo 284º, 200º, 348º - exemplos), ao descrever o crime, o legislador está a descrever um crime omissivo. Na omissão
imprópria ou impura em que nós na lei não temos uma descrição do crime em causa como uma omissão, muito pelo contrário, o sentido imediato do
elemento gramatical aponta para o legislador estar a falar de crime de ação, só que existe uma cláusula geral de equiparação da omissão à ação, prevista no
artigo 10º.
As principais dificuldades colocam-se a propósito da omissão impura ou impróprias- crimes previstos na lei sobre a forma de crimes de ação. A questão
que se coloca é se esses crimes podem ser praticados por omissão. São crimes cuja redação na lei apontam para a punição por ação. Será que estes crimes
podem ser praticados por omissão. No CP no art. 10º estabelece-se uma clausula de equiparação da omissão a ação, e onde se define o limite da omissão
impura jurídico penalmente relevante
Nos termos do art. 10º/1 quando um tipo legal de crime compreender um certo resultado, o facto abrange não só a ação adequada a produzi-lo como a
omissão da ação adequada a evitá-lo, salvo se outra for a intenção da lei.
Logo aqui temos o pp geral da equiparação da omissão à ação. Mas desde logo estabelecem-se limites.

Em 1º lugar terá que ser um crime de resultado: Temos aqui várias posições:
1º posição- está-se a limitar esta equiparação aos crimes materiais- o resultado será o resultado naturalístico da ação- a limitação da omissão impura aos
crimes materiais;
2º posição: Deveria se entender o resultado no sentido material, da lesão do BJ- aqui resulta da limitação da equiparação da omissão à ação aos crimes de
dano;
3º posição: o aprofundamento das ideias da solidariedade levou a que alguns autores alargassem o âmbito da equiparação: alargando aos crimes de perigo
concreto – assim por ao este conceito de resultado estão todas as situações que afetem a tranquilidade do BJ. Assim estão abrangidas tanto os crimes de
dano, que lesam o BJ, como os perigos de perigo concreto cuja consumação depende da verificação do crime efetivo em relação ao BJ. A perspetiva do
prof encaminha se no sentido da terceira orientação. Esta referência ao resultado está a circunscrever a equiparação da omissão à ação aos crimes de dano e
aos crimes de perigo em concreto
O agente tem que estar na situação em concreto na posição de adotar essa conduta de salvaguarda do BJ em perigo (possibilidade fáctica de intervir). É
ainda necessário que ele tenha na mão uma conduta que seja adequada a suster o perigo.
“Salvo se outra for a intenção da lei”: neste caso a doutrina e o prof. AC autonomizam duas questões:
a impossibilidade normativa: o próprio legislador deixa claro que não quer equiparar a omissão à ação. Pode suceder que o legislador entenda que não deve
exigir ao cidadão o comportamento ativo no sentido de salvaguardar interesses alheios;
Atendendo à própria estrutura do crime pode não ser admissível fazer essa equiparação. Ex.: crime de bigamia – pela própria natureza das coisas o crime
não admite a sua prática por omissão

De todo o modo estes requisitos enunciados no nº1 limitam se a balizar em abstrato o âmbito da equiparação à ação. O nº1 define em abstrato quando é
admissível a sua equiparação. Quanto a saber se em concreto se deve fazer essa equiparação ou não rege o nº2 do art. 10º
Ao abrigo do Art. 10º/2 a comissão de um resultado por omissão só é punível quando sobre o omitente recair um dever jurídico que pessoalmente o obrigue
a evitar esse resultado.
Chamamos aqui o dever de garante ou numa forma mais extensa o dever de garante pela não produção do resultado- temos aqui o fundamento da
equiparação da ação.
Não parece que sejam respeitadas as garantias de certeza e determinabilidade exigida pelo pp da legalidade. Que dever jurídico é este? É de natureza penal,
civil ou extrapenal? O pp da legalidade exige uma lei prévia, estrita, certa. E quanto a este requisito do “certa” coloca se a questão da determinabilidade. É
da existência do dever de garante relevante no plano da omissão que resulta a punibilidade ou não. Está em causa a fronteira entre saber o que é crime e o
que não é crime.

Neste sentido para concretizar o dever de garante há duas orientações:


Teoria clássica/formal que enunciava três fundamentos do dever de garante: lei, contrato, ingerência.
lei: Ex.: a relação de tutela e do curador;
contrato: Ex.: contrato do advogado e do cliente que o leva a acautelar os interesses do cliente;
ingerência: prende se com as situações em que alguém cria um perigo para BJ alheios – estará obrigado a remover esse mesmo perigo
Cedo a doutrina indicou que esta doutrina era estreita demais, que deixava de fora o dever de solidariedade. Quanto à lei por exemplo fala se do dever de
assistência dos cônjuges, mas também existe dever de assistência em união de facto por exemplo. Também aqui se geram relações de solidariedade que
devem fundamentar um dever de garante, sendo que sempre que algum deles esteja em perigo isso implica um dever de auxilio.
No contrato também se considera estreito demais. Ex.: caso da baby-sitter e do bebé. Imaginemos que a baby-sitter vê que o contrato e nulo e abandona a
criança. Esta situação não é admissível. Deste modo a doutrina diz nos que não deve ser o contrato mas as relações fácticas de confiança. O contrato ser
nulo releva apenas para questões de dto privado
Quanto à ingerência: a doutrina diz nos que há situações em que o agente apesar de não ser ele a criar o perigo tem o domínio sobre determinados setores.
Ex.: o gerente da empresa que sabe que uma máquina está a dar choques e não avisa o trabalhador
Esta teoria formal não remete para o verdadeiro fundamento material da omissão impura ou imprópria. Assim segue se uma outra via
Teoria das fundações: esta teoria tem muitas variantes. Esta teoria material procura arrumar as situações em que se verifica o dever de garante em dois
grande grupos:
para proteger BJ, e neste caso aquele que esta investido do dever de garante tem de proteger BJ carecidos de tutela;
proteger não já aquele BJ, mas fontes de perigo- ou seja proteger que determinada situação confiada à guarda do agente venha a lesar interesses de terceiros
Em relação a estes dois grupos surgem 4 situações:
Em relação ao 1º grupo:
Relações de comunidade de vida: situações de pessoas que vivem com base de relações de solidariedade (por exemplo relações entre pais e filhos; pessoas
que vivem debaixo do mesmo teto, que partilham apartamento);
Comunidade de perigos ou riscos: estamos na época dos desportos radicais- sempre que as pessoas se juntam para realizar uma empresa de perigo gera se
entre eles um dever de garante, um dever de solidariedade;

Solução de guarda e vigilância: são as tais relações fácticas de confiança Ex.: bebe e baby-sitter- alguém que assume funções de guarda e vigilância. Deste
modo esta obrigado a preservar esse bem e impedir que seja lesado;
Situação de monopólio: alguém que não tem relação com o BJ. Ex.: A decide ir para casa por um caminho que passa pelo meio de um jardim. A vê um
bebé num lago e está se a afogar. A não tem relação com a criança. Todavia ele não tem nenhuma relação mas basta um pequeno ato para salvar a vida da
criança. A maior parte da doutrina não aceita as situações de monopólio como fundamento do dever de garante. O Dr. André Leite admite. FD não admite.
O prof. AC admite já que atendendo ao fundamento material da omissão e ao diminuto incomodo que é salvaguardar um BJ de grande importante deve se
admitir a situação de monopólio atendendo à humanização do DP. Chamar a atenção para um ponto: só devemos recorrer esta situação quando as hipótese
concreta não couber nas restantes hipóteses. Temos uma hierarquia de pp´s. Os três primeiros têm a mesma força pelo que só poderemos ir para esta ultima
situação desde que a situação não caiba nas anteriores.

Quanto ao 2º grupo:
Velha ingerência que se mantêm: alguém que cria uma situação de perigo deve impedir que se lesem BJ jurídicos criminais;
Situações de senhorio ou domínio: alguém é o dominus de determinado setor e está obrigado a garantir que o funcionamento desse meio, desse mecanismos
não venha a lesar BJ alheios. Ex.: eu tenho um automóvel e sou obrigada a leva lo às revisões de modo que não haja danos que possam prejudicar outras
pessoas;
Situação limite do domínio de controlar condutas de terceiros: De acordo com o pp da confiança ninguém pode prever condutas dolosas ou negligentes de
outras pessoas. Há casos excecionais em que há esse dever. O exemplo mais claro é quando estão em causa inimputáveis.
Ex 1. O pai leva o filho a visitar o museu. O pai deve ter cuidado para que a criança não estrague as obras de arte.
Ex. 2: Temos um hospital psiquiátrico em que havia um dos doentes que apresentava comportamentos agressivos e o medico porque foi leviano passou lhe
mais uma licença para saída precária e ele saiu e matou 8 pessoas. Neste processo provou se que havia todos os indícios que ele podia praticar este crime
Situação de monopólio: O Dr. André Lamas Leite não admite. FD admite neste caso. Taipa de carvalho não aceita. O prof. AC aceita. Ex.: A costuma dar
um passeio à noite e existe uma oficina de pirotecnia. A vê na janela faíscas às 11 da noite. Será de exigir que ele avise ou não avise? Podemos imputar
estas lesões pessoais a título de omissão impura ou imprópria? A doutrina diverge como foi dito. O prof. AC crê que sim. Dado que em DP estão em causa
lesões graves de BJ essenciais, neste caso apenas se exige ao agente o incómodo mínimo: ou atundo ele próprio ou chamando auxilio- bastar-lhe-ia chamar
a policia ou os bombeiros. Assim o prof crê dada a abissal desproporção entre os danos em causa

e o diminuto incomodo, deve se reconhecer a situação de monopólio. Só devermos mais uma vez recorrer a esta hipótese em último caso

Por fim, ao abrigo do Art. 10º/3 a pena pode ser especialmente atenuada. Quanto à atenuação especial da pena: remissão para os arts. 72º e 73.
O fundamento material é só um: à luz das convicções comunitárias o facto de alguém atentar positivamente para lesar um BJ é mais grave do que uma
omissão dirigida a salvar. Assim no caso concreto o juiz em funções das circunstâncias do caso pode atenuar a pena por comparação com a pena que cabia
à ação.

Tipo subjetivo
Vamos começar pelo tipo subjetivo da omissão dolosa: o tipo subjetivo comum a todas as ações dolosas é o dolo do tipo. O conhecimento e vontade de
realização do ato, neste caso, conhecimento e vontade de realização da omissão.
Este dolo comporta
Um elemento intelectual;
um elemento volitivo;
um elemento emocional (ao contrário do que diz a doutrina, porque a omissão aqui não é um puro dolo natural, não é uma estrutura psicológica, não se
esgota no nexo psicológico-volitivo entre o agente e o facto, neste caso entre o agente e a omissão).
O juízo de ilicitude é um juízo de culpa sobre o homem médio que vem a determinar o sentido do ato/omissão, como se tivesse sido praticado pelo homem
médio. A prática intencional, o conhecer e vontade de realizar, expressam, do âmbito e no plano do homem médio, uma atitude de contrariedade ou de
indiferença perante o dever-ser jurídico-penal. Isto tem reflexos muitos importantes no âmbito do erro, sendo que aqui a propósito do erro se aplica no
essencial tudo o que dissemos para o erro dos crimes dolosos de ação. Assim sendo, temos que distinguir quanto ao elemento subjetivo comum a todas as
omissões dolosas, um elemento intelectual que tem que se traduzir num conhecimento da situação objetiva de perigo para o bem jurídico. Quanto a este
conhecimento, é o conhecimento da realidade típica.
O agente tem que atualizar na situação, toda a factualidade típica, todos os elementos integradores do tipo omissivo em causa.
Aplica-se aqui tudo o que se disse a propósito do elemento intelectual do dolo aplicável aos crimes de ação. Quando falta o elemento intelectual estamos
perante uma situação de erro sobre as circunstâncias de facto e aqui aplica-se o artigo 16º/2 - se o agente não representa a situação de perigo em relação a
um bem jurídico.

Ex.: pai que vai com o filho à praia e o filho leva uns calções de banho vermelho mas as crianças sujam-se e na mochila leva um calção de banho amarelo,
sem que o pai reparasse a criança trocou o calção vermelho pelo amarelo. O pai de repente vê uma criança em apuros na água, mas vê que a criança tem um
calção amarelo e o calção do filho era vermelho. Vê que é uma criança, mas não representa que está investido de um dever de garante, é a tal situação de
comunidade devida, é um dos fundamentos do dever de garante na sua primeira modalidade, o dever de proteger um bem jurídico face a perigos exteriores.
Ele não representa que é o filho e, portanto, não representa que está obrigado a ir salvar o filho. É um erro sobre a factualidade típica, ou sobre as
circunstâncias de facto. Exclui o dolo e o agente é punido a titulo de negligência se se verificam os requisitos da negligência:
formal (tratar-se de um crime que admita a punição a titulo de negligência);
material (o erro ficar-se a dever à violação do dever objetivo de cuidado que é o fundamento material da negligência).

Também aqui há lugar para falar dos casos especiais de erro intelectual, de erro sobre as circunstâncias de facto. Podíamos relembrar situações sobre o erro
sobre a pessoa ou objeto, ou de erro na execução, ou de erro sobre o processo causal. São situações cuja autonomização não tem grande relevo prático, já
que as soluções virão a ser as mesmas e assim tudo o que dissemos no âmbito dos crimes dolosos de ação é aplicável a estas situações especiais de erro
intelectual de que aqui podemos falar.
Também aqui podemos suscitar o erro sobre as proibições. Vale para ambos os casos de omissão, contudo coloca-se mais para as omissões puras ou
próprias, aqueles casos previstos na lei e onde porventura se trate de situações que pela sua especificidade escapem ao conhecimento do homem comum,
cuja apreensão não cabe dentro dos processos de integração social normal e que em relação aos quais o homem comum só pode tomar conhecimento se
dela lhe derem conhecimento explícito.
Por ser um erro intelectual a nossa lei equipara o regime ao erro sobre as circunstâncias de facto que está previsto na 16º/1 2ª parte, cujo regime se aplica de
idêntico modo aos crimes de omissão.
Por outro lado, temos depois o elemento volitivo. Logo aqui temos que distinguir as situações:
dolo direto em que a omissão, o crime é o objetivo central da conduta do agente;
o dolo necessário em que o crime não é o objetivo central, é uma consequência lateral, mas é inevitável, é necessária ou pelo menos muito provável;
o dolo eventual em que o agente representa o resultado tão só como possível mas atua conformando-se com esse resultado.

Relativamente ao dolo eventual aqui continua a vigorar a teoria da conformação e também o critério é o mesmo para a distinção entre dolo eventual (14º/3)
e a negligência consciente (15º/a).

Na negligência o agente só atua porque confia que o resultado não se vai produzir.
No dolo eventual ele não confia que o resultado não se vai produzir.
É a fórmula da dupla negativa e que o professor adere. A regra é de que as omissões dolosas, sejam puras ou impuras, ao nível do tipo subjetivo apenas
exigem o dolo.
Sempre que o legislador num elemento, na descrição do ilícito típico da omissão, no tipo subjetivo, para além do dolo exigir especiais intenções, é evidente
que a sua verificação é necessária para que possamos falar do ilícito típico em causa. Se faltar essa intenção o agente não preenche o tipo e por isso a
conduta não é ilícita típica.
Importará agora falar do tipo subjetivo das omissões negligentes. aqui colocam-se os mesmos problemas: distinção entre negligência consciente e
inconsciente.
Negligência consciente: agente representa o perigo como resultado tão só possível, mas atua confiando que o resultado não se vai verificar;
Negligência inconsciente ele não representa sequer a situação de perigo e portanto não representa a necessidade de intervir para salvar o concreto bem
jurídico;

Com base na nossa lei temos o artigo 14º/3 e o artigo 15º/a) CP, que distingue o dolo eventual da negligência consciente, o que significa que temos apenas
uma hierarquização bipartida do desvalor pessoal das condutas: dolo (necessário, direto, eventual) e negligência (consciente e inconsciente).
Tipo justificador
Distinguimos omissões dolosas de omissões negligentes:
Omissões dolosas: Alguma doutrina diz que não se levantam problemas do tipo justificador porque, sobretudo na omissão impura ou imprópria que assenta
no dever de garante, grande parte das situações contempladas nos crimes dolosos de ação no âmbito dos tipos justificadores estariam já contempladas na
definição do próprio dever de garante. O prof discorda. Sem dúvida que situações de justificação na omissão dolosa são menos comuns, mas são
igualmente pensáveis. Ex: alguém que tem um dever de garante em relação a outra pessoa, mas essa pessoa decide matá-lo. Numa briga em casa, a pessoa
que o quer matar cai à água mas não sabe nadar, é uma pessoa com força física. Há um perigo efetivo em relação ao que está investido no dever de garante
de que o outro o mate, logo ele não o salva, deixa-o morrer afogado. É uma situação de legítima defesa. Ainda que as hipóteses da vida enquadráveis na
justificação sejam raras na prática, nas situações de omissão dolosa, são pensáveis e podem verificar-se.
Aqui, para os tipos justificadores funcionarão, com necessárias adaptações, os requisitos que falamos para os crimes de ação dolosos:
Requisito subjetivo comum a todos os crimes dolosos: o agente tem de conhecer a situação de justificação.
Tem de se verificar a propósito de cada situação com adaptações, os requisitos da legítima defesa, estado de necessidade, conflito de deveres…

Quanto aos crimes negligentes:


Na ótica do prof continua a aplicar-se tudo o que dissemos a propósito dos crimes negligentes de ação, ou seja, que o pensamento da justificação não faz
sentido. Isto porque a função que é desempenhada pelos tipos justificadores nos crimes dolosos é desempenhada já dentro do tipo negligente, seja de ação
ou omissão.
No crime de omissão temos a descrição de um procedimento exterior em que há uma não intervenção do agente que vai resultar na lesão ou colocação em
perigo do bem jurídico.
Sempre que apesar de se verificar essa situação exterior, a conduta na sua objetividade à luz do critério do homem médio, não representar a violação
daquele cuidado exigido à generalidade das pessoas, essa situação não viola o dever objetivo de cuidado e não preenche o tipo incriminador. Teremos então
causas de exclusão da própria tipicidade do facto. Como vimos nos crimes de ação dolosos, os tipos justificadores são concretizações de uma
ideia/princípio geral: a não Inexigibilidade objetiva. São concretizações de um juízo de valor assente no homem médio: naquela situação não era exigível
ao comum das pessoas atuar diversamente, não era exigível o respeito pela norma. Se o preenchimento do tipo incriminador negligente, seja ele de ação ou
omissão, depende da conduta descrita ou omissão referida no tipo, comportar a violação do dever objetivo de cuidado, sempre que a situação for de não
inexigibilidade, não há violação do dever objetivo de cuidado. A situação descrita não envolve o dever objetivo de cuidado e, portanto, exclui-se o próprio
tipo incriminador.

Formas especiais do crime: tentativa; concurso de crimes e comparticipação (não vamos tratar de todos estes temas)
Até agora estudamos depois dos princípios materiais, os fundamentos do DP, estudamos a dogmática penal (a teoria geral do crime de ação doloso; de ação
negligente e a teoria geral do crime de omissão).

O que são as formas especiais do crime? Nelas costumam-se tratar 3 problemas: a tentativa por contraposição à consumação, o concurso de crimes por
contraposição à unidade criminosa, e a comparticipação que é uma situação em que várias pessoas colaboram para um evento criminalmente relevante.
Até agora detivemo-nos num crime perfeito em que o agente analisa os elementos de ilícito típico e atua de forma culposa para o realizar de uma forma
completa e consumada, e vimos ainda a unidade do agente em que só um agente pratica outro. Mas nós sabemos que o agente por vezes enceta a conduta
criminosa e por motivo estranho à vontade dele não consuma- tentativa; outras vezes comete mais do que um crime e no mesmo processo vai ser julgado
por essa pluralidade de infrações- concurso de crimes; e também na prática de crimes pode haver “trabalho de equipa” - comparticipação.
Estas matérias eram tratadas à parte no domínio do sistema clássico ou positivista, e do neoclássico/normativista, porque pelo facto de partirem do ilícito
objetivo, estes autores

não conseguiam inserir nas categorias tradicionais, nomeadamente na contraposição do ilícito à culpa estas figuras.
No caso da tentativa por exemplo, esta pode ser uma ofensa à integridade física simples ou uma tentativa de homicídio, e para determinarmos o verdadeiro
sentido de ilícito da conduta, tínhamos que atender à subjetividade do agente, o que era inadmissível no quadro destes sistemas. No caso dos concursos de
crimes, por exemplo 7 facadas- 7 crimes ou um crime só? A resposta era: “depende da resolução do agente- se ele tomou a resolução de agredir temos um
só crime, mas se ele tomou uma resolução de dar X facadas, depois para e volta a ter agredir- dois crimes”- a demarcação do ilícito depende da
subjetividade do agente e na comparticipação suscita-se o mesmo problema.
Isto significava que estes autores faziam depender o ilícito da subjetividade do agente que para eles só podia ser considerada no plano da culpa, o que
equivalia dentro dos quadros do sistema clássico e neoclássico a fazer da culpa um pressuposto de ilícito, pulverizando- se o sistema geral da construção do
delito-estávamos perante formas especiais do crime porque a propósito delas a dogmática era verdadeiramente diferente, misturando-se os elementos
objetivos e subjetivos, e fazia-se não do ilícito um pressuposto da culpa, mas sim da culpa um pressuposto do ilícito. Isto quer dizer que tratar-se-iam de
figuras a propósito das quais a própria construção dogmática divergia da teoria geral do delito era válida para a generalidade. Não é assim no quadro da
doutrina do ilícito pessoal, pois dentro dele estamos à procura do sentido pessoal-objetivo, do sentido de antinormatividade da conduta se praticada por
uma pessoa em geral, e logo aí nos deparamos que a conduta é uma unidade objetiva-subjetiva, e distinguimos logo aí entre ações dolosas VS negligentes.
A diferença entre este ilícito e a culpa, não tem a ver com o substrato ou objeto de valoração, varia apenas o critério da valoração- vamos avaliar essa
unidade à luz do padrão do homem médio, ao passo que na culpa vamos determinar o sentido pessoal subjetivo daquele ato à luz do concreto agente. Assim
sendo, a consideração da subjetividade do agente no âmbito da tentativa ou concurso de crimes não levanta qualquer problema, não implica abandonar os
quadros tradicionais ao nível da teoria geral do delito. Verdadeiramente, a questão da tentativa, do concurso ou da coparticipação são questões atendentes
ao ilícito típico, e apenas mantemos o seu tratamento separado no final do programa da disciplina pela complexidade que estas matérias têm. É por isso que
a expressão “formas especiais do crime”, no contexto de uma doutrina que parta da conceção do ilícito pessoal, adquire um significado diverso do que tinha
no passado. Não está em causa a perversão das categorias gerais do delito, os planos são os mesmos, apenas se autonomiza esta categoria pela sua
complexidade.

TENTATIVA

A tentativa opõe se ao crime consumado, ou seja, quando o agente preenche a totalidade dos elementos do ilícito típico. Na tentativa temos uma realização
incompleta do tipo.

Ex.: A quer burlar B. Mas B é advertido e não transmite para a esfera de titularidade a fáctica do está a ser burlado
A tentativa é uma extensão da punição. Existem casos em que o legislador alarga a punibilidade à tentativa. Coloca se o problema do fundamento do
alargamento. Colocam se aqui duas teorias:
Teoria subjetiva: pretende ver na prática do crime uma vontade criminosa- a manifestação de perigosidade do próprio agente; O fundamento da tentativa é
reagir contra a perigosidade do agente. Esta fundamentação não é admissível já que aponta para o DP do agente. Assim de acordo com a teoria objetiva o
fundamento da tentativa decorre do perigo do BJ. Ao iniciar o comportamento perigoso, há a colocação em perigo do BJ. Nesta situação de perigo reside
então o fundamento da sua punibilidade.
Tratam se de razões de prevenção que servem de fundamento à extensão da punição da tentativa. A punição é a título excecional. Apenas quando o
legislador a admitir. A tentativa só é punida a título de dolo. A nossa lei diz “decidiu cometer”. Ou seja, não é punida a tentativa negligente. Embora no
passado fosse pensável: falava se da “quase tentativa” - alguém que “sem querer” violando o dever objetivo de cuidado pratica atos perigosos a que não se
segue a consumação.
Mesmo na tentativa dolosa a tentativa só é punida em relação aos crimes a que corresponde na forma consumada uma pena de prisão superior a 3 anos- art.
23º- regra geral- há exceções declaradas na lei. Ex.: art. 202º e sgs- o legislador diz expressamente que a tentativa é punida.
A tentativa só releva na forma dolosa
A sua punição é excecional já que só é punida quando o crime em causa na forma consumada tiver uma pena superior a 3 anos ou quando fora destes casos
o legislador puna.

Importa referir que na sua globalidade nós podemos isolar no iter criminis 4 fases:
fase da chamada nuda cogitagiu/projeto criminoso: o agente no plano interno projeta/pensa que se vai ou não cometer o crime. Estamos na fase dos atos
internos, dos pensamentos- do puro pensamento;
fase da prática de atos exteriores: o agente está a praticar o crime- por exemplo compra os utensílios para o crime- atos preparatórios que já se traduz num
comportamento exterior, mas que em regra nos termos do art. 21º a regra é que são impunes: primeiro porque na maioria dos casos os atos preparatórios
são idênticos a atos lícitos. Ex.: A pode comprar uma espingarda para ir à caça. Torna se difícil provar que esse ato preparatório visa a prática de um crime;
em segundo lugar: de acordo com o caráter subsidiário da tutela penal o DP só deve intervir quando há lesão de BJ ou perigo próximo quanto a esse BJ. Em
relação ao perigo remoto em pp não releva para o DP. Ainda existe uma distância temporal e especial para a realização do crime propriamente dito. Assim
nos termos do art. 21º os atos preparatórios não são punidos. Há exceções, mas essas serão consagradas na lei. Acrescente se que mesmo quando
excecionalmente o

legislador pune os atos preparatórios pode faze lo considerando como crime autónomo da lei. Ex.: contrafação de moeda; o legislador pune o ato
preparatório ainda como ato preparatório. Ex.: Art. 277º: Aqui o legislador declara estes atos puníveis como atos preparatórios. A diferença é que se o
legislador declara o ato preparatório como ato preparatório ele para ser punido tem que ser consumado. Diferentemente se o legislador estabelece a punição
do ato preparatório como crime autónomo e pode ser punido na forma consumada ou forma de tentativa
fase da execução: o agente começa a praticar o ato de execução;
fase da consumação

A distinção entre os atos preparatório e os atos de execução marca a limitação entre a impunidade e punição.
Resulta que a tentativa que se traduz na prática de atos de execução que por motivo estranho ao agente não chega à consumação. A tentativa diz respeito
aos crimes dolosos.
Um crime doloso que pode ser de ação ou omissão já que a propósito dos crimes omissivos podemos distinguir entre ação e omissão.
Comecemos pela tentativa nos crimes de ação dolosos:
Nesta base a tentativa é um crime doloso. Em relação ao crime doloso de ação tem que se verificar quase todos os pressupostos para o crime de ação em
geral. A propósito da tentativa teremos que repetir quase tudo que foi dito para a teoria geral do crime doloso de ação. Aqui temos que falar do conceito de
ação. Por outro lado, a ação continua a cumprir a função dogmática que lhe apontamos (afasta os fenómenos naturais e comportamentos de animais ou
comportamentos humanos que não são ação humana relevantes para o DP).
Quanto ao ilícito típico não basta termos uma ação para termos um crime. Assim temos um ilícito doloso- uma unidade objetiva subjetiva. Separamos aqui
para mera clareza da exposição o tipo objetivo e tipo subjetivo.
A falta do elemento subjetivo tem a mesma consequência da falta do elemento objetivo- deixamos de ter um ilícito típico penalmente relevante.
Tipo subjetivo: exatamente igual ao tipo subjetivo do crime doloso consumado- temos que ter dolo : que tem os mesmos elementos (elemento intelectual,
volitivo, emocional). Quando falta o elemento intelectual temos também o erro sobre as circunstâncias de facto. Podemos também falar das situações
especiais de erros sobre as circunstâncias de facto.
Quanto ao elemento volitivo a doutrina maioritária considera que releva para a tentativa as hipóteses de dolo direito, necessário e dolo eventual. A tentativa
abrange todas as modalidades de dolo admitidas para o crime consumado. Há autores que poe em causa a punibilidade da tentativa de dolo eventual. Para
todos os efeitos com base na letra da lei e de acordo com a doutrina maioritária estende-se à tentativa todas as formas de dolo admitidas para a consumação.

Por norma o tipo subjetivo restringe se à exigência de dolo, mas pode existir casos em que se exige especiais intenções, caraterísticas pessoas da
personalidade etc.
O tipo subjetivo da tentativa é idêntico com o tipo subjetivo do crime consumado correspondente.
As distinções põem se quanto ao tipo objetivo
Em 1º lugar refira se que temos que falar dos elementos estruturantes do tipo objetivo: agente, BJ e conduta. Põe se as mesmas distinções
A diferença está no facto de a tentativa significar uma realização incompleta do tipo- o agente pratica atos de execução a que não se segue a consumação
por motivos estranhos à vontade do agente
Quanto à estruturação do tipo objetivo é tudo igual bem como as mesmas especificações que se colocam a propósito de cada estrutura.
Na tentativa há um preenchimento incompleto do tipo.
Há que distinguir entre a tentativa acabada e inacabada.
O agente pode ter uma execução incompleta porque não executou todos os atos. Ex.: assaltante do banco que é detido pela polícia. Ainda não chegou ao
cofre. Temos a tentativa inacabada
Poder dar se o caso de o agente realizar todos os atos de execução, mas não realizar o crime. Ex.: A quer matar B, dispara, mas falha.
No dto anterior distinguia se entre a tentativa e frustração. A tentativa era aquilo a que chamamos de tentativa inacabada. A frustração seria a tentativa
acabada.
O velho CP estabelecia uma diferença. Estas situações eram diferentemente puníveis.
A nossa lei hoje não estabelece diferença ao nível da pena abstrata entre a tentativa acabada e a tentativa inacabada. Em concreto o juiz pode atender a par
de outros elementos ao facto da tentativa ser acabada ou inacabada.
Em suma, conclui se que o tipo subjetivo da tentativa é idêntico ao crime doloso consumado. Quanto ao tipo subjetivo os elementos estruturantes e as
classificações de tipicidade são os mesmos. A diferença está no facto de na tentativa o agente não preencher a totalidade do crime. Há apenas um perigo. A
nossa OJ deste modo estabelece uma pena abstrata única para a punição da tentativa. <

Como sabemos o iter criminis pode dividir-se em 4 fases essenciais, acima referidas. Aqui vemos a importância de encontrar um critério seguro para
distinguir os atos preparatórios dos atos de execução, que consubstanciam a fronteira entre a impunidade e a punição. E para distinguir entre atos
preparatórios e atos de execução surgiram duas teorias:
Teoria subjetiva– ato de execução é todo aquele que expressasse uma vontade séria, firme de praticar o delito, não importando a configuração exterior do
ato ou se ele é mais próximo ou afastado da consumação

Teoria objetiva – caraterização objetiva do comportamento.


Teoria formal objetiva – o ato de execução é aquele que esta descrito textualmente. Esta teoria só funciona para os crimes de execução não livre
Teoria material objetiva – construída na base da teoria da adequação. São atos de execução aqueles que são idóneos para produzir o resultado. contudo, não
basta ser idóneo, mas não se pode verificar nenhum corretor da conexão do risco. Esta alteração foi introduzida pela teoria da conexão do risco. O prof não
concorda com esta perspetiva.
O que fez a nossa lei para distinguir entre atos preparatórios e de execução? Adotou um critério misto.
Art.22º do CP:
 Art.22º/nº1 do CP: o agente tem de praticar atos de execução e não atos preparatórios. Mas, de um crime que “decidiu” cometer – prática consciente e
voluntaria de um crime, afastando a negligencia (Elemento volitivo do dolo). Afasta a punibilidade da tentativa a título de negligencia.
 Art.22º/nº2 do CP: o que são atos de execução? Vejamos as alíneas
Critério formal objetivo – aqueles que estão descritos no tipo de crime, mas isto só vale para os crimes de execução vinculada. No final de contas nesta
alínea está o ato de consumação
Critério material objetivo para todos os restantes casos. Aqui também está descrito, na verdade, o ato de consumação.
Critério material objetivo – esta alínea vem precisar alguns aspetos, nomeadamente a perspetiva ex ante que explica o ato de execução. Na Alemanha e
historicamente por atos de execução entendiam-se os atos de consumação. Mas, o início da tentativa não pode restringir-se aos atos de execução. Foi por
isso que a doutrina e o legislador sentiram a necessidade de alargar o conceito de execução e da tentativa. Não se restringe aos atos de consumação, mas
quando o agente avançava imediatamente para a execução e que sem quebras iria terminar no ato de consumação. Ex: Não é quando prime o gatilho, mas
quando pega na arma que, sem quebras, levaria à consumação do ato. “É o avançar imediatamente” (Welzel).
O legislador afasta a teoria subjetiva e adota um critério objetivo, mas na alínea c) especifica de forma mais precisa certas situações.
Assim, o legislador delimita a fronteira entre atos de execução e de consumação, que na maior parte das vezes determina a impunidade ou a punição.
Tentativa inidónea ou impossível:
A tentativa inidónea ou impossível reporta-se a situações que, na prática, aquele ato nunca podia levar à sua consumação.
Ex: alguém dispara, mas a vítima tem um colete anti bala.
Ex: Alguém procura envenenar usando um veneno em relação ao qual a vítima é imune. Aquele dispara sobre a morte.

Mas, a tentativa idónea ou impossível é punível ou não? É que, na verdade o BJ nunca esteve efetivamente em perigo.
A doutrina portuguesa admite, assim, duas modalidades de tentativa inidónea ou impossível:
 Por inexistência do objeto – Ex: alguém está zangado com o vizinho e dispara quando ele está na piscina, convencido de que estaria a apanhar sol, mas o
vizinho já estava morte por virtude de um ataque cardíaco. De acordo com a teoria da aparência este comportamento era punível? SIM, porque aos olhos de
todos estaríamos perante um ser humano vivo.
 Por inaptidão do meio – é quando o meio, atendendo à realidade objetiva jamais pode atingir a consumação.
Ora, o fundamento da tentativa é o perigo. Ex: O sr. A tem à escolha três venenos e escolher um deles aleatoriamente, mas a vítima é imune a essa
substância.
 Mas, numa perspetiva ex ante não há aqui um perigo? SIM, pois se ele tivesse escolhido outro veneno poderia ter matado a vítima. Temos de aferir o
perigo de uma perspetiva ex ante. Esta situação, no final de contas, e de um ponto de vista de aferição ex ante do perigo, não é diferente da tentativa idónea.
Aplicar a alguém uma substância venenosa é uma atitude perigosa. É por isso é que a generalidade da doutrina declara em certos casos a punibilidade da
tentativa inidónea ou impossível. Entre nós esta doutrina traduz-se na teoria da aparência. Há quem fale na teoria da impressão, mas essa não se justifica no
quadro do DP português que adota uma teoria objetiva da tentativa, ao contrário do DP alemão que adota uma teoria subjetiva da tentativa. Na teoria da
aparência, EC dizia que a tentativa inidónea ou impossível é punível como tentativa sempre que haja idoneidade/aptidão do meio ou quando o objeto da
ação exista. É isto que nos diz os art.23º/nº3 do CP - quando for aparente essa idoneidade, a tentativa é punível. Assim, os atos que caracterizam a tentativa
são atos de execução. Desta forma, quanto ao art.22º/nº2 do CP devemos avaliar os atos de execução numa perspetiva ex ante.
Art.23º/nº1 do CP – a tentativa só é punível quando o crime consumado correspondente
for punível com pena superior a três anos
Art.23º/nº2 do CP – a atenuação especial remete para o art.72º e 73º do CP
A tentativa é um crime doloso, estando subordinado à teoria geral dos delitos dolosos.
Tipo justificador: funcionam todas as causas de justificação e nos mesmos termos que foram afirmadas para o crime doloso de ação consumada. A tentativa
pode ser recoberta pela LD, EN, conflito de deveres, etc. Os requisitos são os mesmos: se a LD torna lícito o crime consumado, também justifica os atos de
execução que consubstanciam a tentativa.
Culpa: o juízo de ilicitude no âmbito da ação e no âmbito da tentativa têm o mesmo objeto, a mesma valoração. Na culpa estamos à procura do desvalor
subjetivo do ato. Como a tentativa é um crime doloso, valem por inteiro as considerações que tecemos sobre a culpa no âmbito do crime doloso
consumado: na inimputabilidade continua a aplicar-se o disposto no art.295º do CP. Quanto à

inexigibilidade e ao erro sobre a ilicitude vale o mesmo que tecemos anteriormente.


PUNIBILIDADE/Condições objetivas de punibilidade: Aqui vamos confrontar-nos com um problema – a doutrina maioritária, quanto à punibilidade no
âmbito dos crimes dolosos e no âmbito da tentativa fala em três situações:
Bagatelas penais
Desistência da tentativa - que seria uma concretização da ideia da desnecessidade de pena. A desistência da tentativa é um instituto que exclui a punição do
agente que tendo iniciado a execução, todavia, a OJ dispensa a punição quando o agente interromper de forma voluntária a execução e, com isso, evitar a
prática do crime. A desistência está subjacente à politica-criminal do incentivo para que o agente não consuma o ato criminoso. Com este instituto, que
garante aquele que praticou atos de execução, a impunidade dá-se um incentivo para que desista. Assim, a desistência da tentativa, consoante se trate da
tentativa acabada ou inacabada pode assumir contornos diferentes:
Tentativa acabada – o agente comete todos os atos de execução, só que por razão estranha à sua vontade, o crime não se consume. A desistência da
tentativa, no âmbito da tentativa acabada, exige assim um comportamento ativo, que o agente desfaça o mal que fez, em ordem a evitar a consumação.
Ex: alguém mete uma bomba num monumento nacional. Se ele quiser desistir tem de ir lá desligar ou pedir as autoridades competentes que o faça, ligando-
lhes a informar da existência da mesma e do local onde se encontra.
A doutrina fala aqui de um “arrependimento ativo” – o agente atua positivamente para desfazer o mal que fez. O prof. AC considera esta expressão
equivoca porque a relevância da tentativa não tem a ver com o arrependimento moral.
É de referir ainda que a desistência da tentativa tem de preencher dois requisitos:
Requisito objetivo: o crime não se tenha consumado. Falamos da consumação material e não da formal (veja-se adiante a justificação).
requisito subjetivo – a voluntariedade da desistência. Se alguém está a assaltar uma casa e vê a polícia e por isso desiste, não há voluntariedade. Falamos de
voluntariedade no sentido de espontaneidade, o abandono não pode ser coagido por razoes exteriores, mas também não tem de ser um abandono por razões
nobres. A desistência tem de ser o abandono espontâneo daquele concreto projeto criminoso.
Tentativa inacabada – o agente pratica apenas parcialmente os atos de execução. A desistência traduz-se na pura e simples omissão dos atos de execução
que falta praticar.
A concretização disto está consagrada nos arts.24º e 25º do CP

Art.24º do CP
Art.24º/nº1 do CP – “A tentativa deixa de ser punível quando o agente voluntariamente (significa isto espontaneamente) desistir de prosseguir na execução
do crime (estamos perante a desistência tout court, isto é, da tentativa inacabada), ou impedir a consumação (falamos aqui da tentativa acabada), ou, não
obstante a consumação, impedir a verificação do resultado não compreendido no tipo de crime” (falamos aqui dos crimes de perigo, em que o agente
consuma o crime de perigo, mas não o crime de dano, impedindo a lesão efetiva do BJ, que é o resultado que não está contido no tipo. Os crimes de perigo
são quase sempre crimes de tentativa. Tratando-se de um crime de perigo, apesar de este ter sido consumado, e se depois o agente evitar que se
consubstancie num crime de dano, ele irá beneficiar do regime da desistência da tentativa. Aqui está em causa a consumação material, isto é, a lesão efetiva
do BJ).”
Art.24º/nº2 do CP – “Quando a consumação ou a verificação do resultado forem impedidas por facto independente da conduta do desistente, a tentativa não
é punível se este se esforçar seriamente por evitar uma ou outra.”.
Ex: é o caso de alguém que dispara sobre outra pessoa para matar, mas depois arrepende-se e vai chamar uma ambulância. Contudo, quando volta um ao
local, um medico já o tinha visto e levado para um hospital– a consumação foi impedida por um terceiro, mas provou-se que ele se esforçou seriamente
para o evitar, pelo que o agente beneficia do instituto da desistência da tentativa.
Art.25º do CP – “Se vários agentes comparticiparem no facto, não é punível a tentativa daquele que voluntariamente impedir a consumação ou a
verificação do resultado, nem a daquele que se esforçar seriamente por impedir uma ou outra, ainda que os outros comparticipantes prossigam na execução
do crime ou o consumem.”
Art.25º/1ª parte do CP – “Se vários agentes comparticiparem no facto, não é punível a tentativa daquele que voluntariamente impedir a consumação ou a
verificação do resultado (…)”. Pode haver lugar também à hipótese estarmos perante um crime cometido em grupo e de só um dos elementos desistir. Ora,
se este elemento que desistiu impedir que os outros consumem o ato, este agente vai beneficiar da desistência da tentativa e os outros vão ser condenados a
título consumado ou de tentativa.
Art.25º/2ª parte – “nem a daquele que se esforçar seriamente por impedir uma ou outra, ainda que os outros comparticipantes prossigam na execução do
crime ou o consumem.”
É o caso daquele que desistiu, quer pôr termo à prática do crime, mas os outros comparsas levam por diante o crime. Mas, se se provar que ele se esforçou
seriamente para impedir a lesão do BJ, embora os restantes prossigam na execução do crime ou o consumem, ele beneficia da desistência da tentativa, e os
outros serão punidos por tentativa ou consumação.
Este instituto da desistência da tentativa surge por razoes politico-criminais, para evitar a lesão de BJ. É uma concretização de uma ideia de necessidade de
pena, intervindo neste nível da punibilidade.

Crimes de tentativa dolosos omissivos: também a omissão é crime e tanto a omissão pura ou impura são suscetíveis que em relação a elas se faça a
distinção entre tentativa e consumação.
Pode uma pessoa não atuar e em virtude dessa sua não atuação não se verificar o resultado. Mas, torna-se difícil determinar, pela natureza da omissão,
quando inicia a tentativa da omissão.
Welzel dizia que não se podia aqui distinguir entre tentativa acabada e inacabada, existindo apenas a tentativa inacabada (tentativa inacabada - quando o
agente deixou esgotar a última possibilidade de intervenção).
Mas, a doutrina afastou este ponto de vista, pois na verdade não se censura apenas o resultado, mas censura-se o desvalor da ação, admitindo a existência
da tentativa acabada (quando o agente deixou passar a última possibilidade de salvar o BJ) e a tentativa inacabada (quando se verificasse uma alteração da
situação de perigo para o BJ. Ex. o filho está doente e os pais não chamam o médico. Ora, enquanto a doença estivesse estável não havia início da tentativa,
mas sim quando houvesse uma agravação aguda da situação de saúde da criança. Se perante uma alteração substancial agravada do perigo para o BJ o
agente não intervém estaríamos perante uma tentativa inacabada).
O prof. AC discorda porque considera esta doutrina insegura (o pai não é medico, não sabe quando há um salto equitativo para chamar o medico ou não. O
critério do início da tentativa deverá ser outro. Para o prof. AC há início de tentativa de omissão quando, perante uma situação de perigo grave para o BJ,
pela atitude do agente na situação se revelar evidente que ele não intervirá.
E quanto à tentativa acabada, faz sentido falar na sua existência? O que é isso da última oportunidade? Parece uma ficção. Para o prof. AC também não faz
sentido falar numa tentativa acabada.
Na omissão, o prof. AC entende que, atendendo as características do crime omissivo, não faz sentido distinguir entre tentativa acabada ou inacabada. Para
AC existe apenas a tentativa tout court por omissão acima referida pelo AC, ou seja, quando perante uma situação de perigo grave para o BJ, pela atitude
do agente na situação, se revelar evidente que este não intervirá.
Quanto à desistência da tentativa na omissão – o agente acaba por intervir, impedindo o resultado, aplicando-se os requisitos gerais da desistência da
tentativa, mas com as necessárias adaptações.

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