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DIREITO PENAL – ANA PAULA VIEIRA DE CARVALHO


AULA 07 – 30.06.2021

SISTEMA FINALISTA

Já foram abordados os sistemas clássico e neoclássico. A seguir, será visto


o sistema finalista, que sucedeu o sistema neoclássico. Foi desenvolvido
pelo penalista alemão HANS WELZEL e floresceu na Alemanha na segunda
metade do sec. XX..

Como se viu, o sistema clássico tinha ojeriza aos juízos de valor, pois se
utilizava de um método que pretendia uma reprodução do método das
ciências naturais. Já o sistema neoclássico buscava uma reaproximação
entre o direito e os juízos de valor. O sistema finalista, por sua vez, foi
marcado pela desconfiança em relação aos juízos de valor, em razão das
deficiencias constatadas no sistema neoclássico.
O sistema finalista acredita que existem, na natureza, estruturas da
realidade (as chamadas estruturas lógico-reais) que devem ser reconhecidas
pelos juristas e trazidas para dentro do Direito Penal, a fim de que, a partir
delas, possam ser encontradas soluções para os problemas jurídicos.
Diferentemente do que ocorria no sistema neoclássico, no sistema finalista o
operador do direito não tinha uma ampla liberdade de valoração. Para os
finalistas, as valorações estão limitadas por estruturas lógico-reais,
presentes na natureza. Em suma, as estruturas lógico-reais materializam
limites às valorações.

EXEMPLO: Uma das estruturas lógico-reais (da natureza) reconhecidas pelo


finalismo é o conceito de ação (para eles, um movimento do corpo dirigido a
uma finalidade). Para os finalistas, o direito não pode criar o conceito de
ação que bem entender, devendo respeitar e aproveitar o conceito de ação
existente na natureza, ou seja, uma atividade dirigida a uma finalidade. Esta
visão impede, por exemplo, que se reconheça capacidade de ação nas pessoas
jurídicas, porque não há como adaptar o conceito naturalístico de ação a
elas. Isso torna a responsabilidade penal da pessoa jurídica incompatível com
uma visão finalista de teoria do delito.
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Para o finalismo, existem algumas estruturas da natureza, como a ação


finalista, que serão obrigatoriamente respeitadas pelo Direito. A partir delas
será moldado o direito penal e serão encontradas soluções para problemas
jurídico-penais.

Haveria diversas estruturas lógico-reais na natureza, vinculantes para os


juristas, sendo a ação apenas um desses conceitos, embora seja a base
fundamental do sistema finalista. Outro exemplo seria a causalidade física
entre ação e resultado, também existente na natureza.

O livre arbítrio é mais uma estrutura lógico-real finalista. Segundo essa


ideia, todos os homens mentalmente sãos podem realizar suas escolhas
livremente, e tal possibilidade deve ser tomada em conta pelo jurista para
moldar a teoria do delito.

Cabe ao jurista encontrar as soluções para os problemas jurídicos a partir


do conhecimento dessas estruturas da natureza. Esse é o ponto nuclear do
finalismo, a sua metodologia.

Afirma-se que o finalismo tem base realista. Com isso quer-se afirmar que
a construção de ideias não é absolutamente autônoma, estando limitada
pelos dados da realidade.

No sistema finalista, portanto, os dados ontológicos adquirem uma


importância muito maior do que nos sistemas anteriores. Por dados
ontológicos entende-se aqueles que remetem aos seres, à realidade. A palavra
ontológico nos remete ao prefixo onto, que significa ser.

O jurista é obrigado a respeitar a "lógica da coisa", as estruturas lógico-reais,


sendo que as duas mais importantes a serem respeitadas são:

I) O agir humano de natureza finalista ( Hans Welzel desenvolve um


novo conceito de ação, a ser estudado oportunamente).

II) O livre arbítrio (poder agir de outro modo), enquanto conteúdo material
do juízo de censura da culpabilidade. O finalismo mantém a ideia
neoclassica de que a culpabilidade é um juizo de censura, porém, acrescenta
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que o conteúdo material desse juízo de censura deve ser o livre arbítrio. Uma
pessoa somente pode ser censurada se agiu com liberdade de escolha.

Os sistemas clássico e neoclássico se utilizavam do conceito causalista de ação


(a ser aprofundado no capítulo 12). Para os causalistas, ação era o movimento
do corpo que produzia um resultado no mundo exterior. Apenas interessava
o aspecto externo da conduta. As intenções do sujeito não faziam parte do
conceito de ação, sendo examinadas na culpabilidade, mais especificamente
dentro do estudo do dolo.

Welzel, baseado na ideia de que os juristas devem respeitar certas


estruturas presentes na natureza, observando a realidade e trazendo-a para
dentro do Direito Penal, constatou que as ações humanas são sempre
impelidas por uma vontade. Assim, o conceito de ação humana possui um
aspecto externo (movimento corpóreo), mas também um aspecto interno, que
são as intenções. A partir daí, passa a trabalhar com um novo conceito de
ação, o conceito finalista.

Para o finalismo, ação é toda atividade (movimento corporal) dirigida a uma


finalidade. Por conseguinte, Welzel inseriu no conceito de ação a ideia de
fim ou finalidade.
O conceito de ação apresentado por Welzel tem natureza pré-jurídica, ou
seja, pretende explicar tanto as ações ilícitas, penalmente relevantes, como
as lícitas, penalmente irrelevantes. Esse novo conceito de ação revolucionou
a teoria do delito. Vejamos por quê.

Ao partir da premissa de que todas as ações humanas são finais, também as


ações descritas nos tipos penais devem ser ações finais ( ex. no art. 121 do CP,
“matar alguém”). Ora, se os tipos descrevem ações, e se as finalidades fazem
parte das ações, então parece lógico afirmar que as finalidades das ações
criminosas se encontram contidas nos tipos penais. A partir do finalismo,
portanto, como uma consequência lógica do seu conceito de ação, o dolo é
transferido da culpabilidade para o tipo, tornando-se seu elemento.

A culpabilidade , por sua vez, no sistema neoclássico, era composta por: (a)
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imputabilidade; (b) dolo + consciência da ilicitude; (c) culpa e (d) exigibilidade


de conduta diversa. Era a culpabilidade psicológico-normativa, porque
detinha um elemento psicológico (dolo) e elementos normativos, que
representavam juízo de valor. Com o finalismo, o dolo é retirado da
culpabilidade, passando a ser elemento do tipo.

Além do dolo, também a culpa foi retirada da culpabilidade e se tornou um


elemento do tipo penal. E isto ocorreu não porque a culpa seja uma
intenção, como o dolo. Como já vimos, a culpa é um elemento objetivo (um
juízo de valor, extraído da comparação da conduta do sujeito com os deveres
de cuidado devidos). O que gerou a necessidade de deslocar a culpa da
culpabilidade para o tipo, a partir do finalismo, foi a opção metodológica de
concentrar no injusto todos os elementos que digam respeito ao fato
(desvalor da ação e desvalor do resultado), deixando na culpabilidade
apenas os elementos relacionados ao estudo do agente . Ora, se a culpa é uma
forma de realização da conduta, está relacionada ao desvalor da ação,
devendo ser estudada no injusto.

Em resumo, a culpa foi transferida da culpabilidade para o tipo porque está


relacionada à forma de realização da conduta ( conduta praticada com
violação a regras de cuidado). Em razão disso, a culpa é um tema ligado aos
tipos penais, que cuidam da descrição de ações criminosas.

Embora o dolo tenha sido deslocado da culpabilidade para o tipo, no


sistema finalista a consciência da ilicitude permanece na culpabilidade, tendo
sua nomenclatura alterada para potencial consciência da ilicitude.

Para o finalismo, os três elementos da culpabilidade são: (a) imputabilidade;


(b) potencial consciência da ilicitude e (c) exigibilidade de conduta diversa, todos
de natureza normativa (juízos de valor). Por isso, a concepção de culpabilidade
desse sistema recebe o nome de concepção normativa pura da
culpabilidade, que vigora até os dias atuais.

O injusto também sofreu mudanças, vez que o tipo agregou o dolo e a culpa
como seus elementos, o que foi fundamental e mais coerente. EXEMPLO:
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Imagine-se uma tentativa de homicídio. Se "A" atira em "B" e não o mata.


Foram produzidas em "B" lesões corporais. Se objetivamente apenas
houve lesões corporais, por que na tipicidade será identificada uma
tentativa de homicídio? Por causa da intenção do agente "A", que tinha
vontade de matar. Assim, a finalidade ou intenção é fundamental para se
descobrir qual é o tipo aplicável.

Uma última observação parece importante. Não se deve confundir


finalidade, como elemento de todas as ações humanas, com dolo. O conceito
finalista de ação descreve ações lícitas e ilícitas. Todas são ações finais. Beber
água, escrever um e-mail, fazer ginastica, são todas ações finais. Quando,
porém, a finalidade do agente se encontra proibida em algum tipo penal (
vontade de matar, no homicídio, por exemplo), tem-se o dolo. A finalidade,
portanto, é o gênero, que tem no dolo uma de suas espécies. Dolo é a
finalidade penalmente proibida, a finalidade tipificada. Em razão disso,
seria um erro crasso dizer que dolo é elemento do conceito de ação finalista.
O elemento do conceito de ação é a finalidade.

E na ilicitude, o que mudou a partir do sistema finalista?


A grande inovação finalista na ilicitude foi a inclusão de elementos subjetivos
nas causas de exclusão de ilicitude.

Até o finalismo, as causas de exclusão de ilicitude, como a legítima defesa


e o estado de necessidade, não tinham elemento subjetivo, ou seja, o sujeito
não precisava saber que estava em legítima defesa para se beneficiar da
excludente. A partir do finalismo, as causas de exclusão de ilicitude passaram
a exigir elementos subjetivos, de modo que exigem que o agente conheça a
situação de fato e que aja por causa dela.

EXEMPLO: "A" atira em "B", matando-o, mas só depois descobre que "B" estava
prestes a matar "C". Havia, portanto, uma legítima defesa de terceiro, mas “A”
não sabia. Antes do finalismo, o autor seria beneficiado pela excludente de
ilicitude. A partir do finalismo, porém, não.
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TEORIA DO CRIME: SISTEMA FINALISTA


INJUSTO ( AÇÃO TÍPICA E ILÍCITA) CULPABILIDADE

1. IMPUTABILIDADE
TIPO: DESCRIÇÃO DE AÇÕES CRIMINOSAS 2. POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA
DOLO E CULPA COMO ELEMENTOS DO ILICITUDE
TIPO 3. EXIGIBILIDADE DE CONDUTA
INSERÇÃO DE ELEMENTOS SUBJETIVOS DIVERSA
NAS CAUSAS DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE

DESVALOR DA AÇÃO + DESVALOR DO JUÍZO DE CENSURA, CENTRADO NAS


RESULTADO CARACTERISTICAS DO AGENTE ( LIVRE
ARBÍTRIO)
CRÍTICAS AO FINALISMO

O finalismo encontra-se ultrapassado na doutrina, embora ainda tenha


influência no Brasil. A principal crítica a ele endereçada seria de natureza
metodológica: a chamada falácia naturalista.

A falácia naturalista consiste na crença de que é possível encontrar no mundo


do ser (no que existe, na realidade) respostas para o mundo do dever-ser (o que
se espera que exista ou que deveria existir). Tal não é possível, porém. Não há
uma relação necessária entre o que é e o que deve ser.
Diferentemente do que advogam os defensores de um direito natural, os
direitos não existem na natureza, mas sim são construídos culturalmente pelo
homem. Da mesma forma, as soluções jurídico-penais são construídas a
partir de juízos de valor, não sendo encontradas prontas na natureza.

Apesar de sua decadência, muitas conquistas do finalismo são


imorredouras, sendo até hoje aceitas. Cite-se, como exemplo, o fato de o dolo
e a culpa serem elementos do tipo e a culpabilidade continuar tendo como
elementos a imputabilidade, a potencial consciência da ilicitude e a
exigibilidade de conduta diversa (embora com um conteúdo material muito
diferente no funcionalismo)

SISTEMA FUNCIONALISTA
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No funcionalismo, a mudança primordial não está relacionada a um novo


conceito de ação, como ocorreu com o finalismo. O funcionalismo, na verdade,
significa um novo método para trabalhar o direito penal, que volta a
aproximá-lo dos juízos de valor. Abandonam-se as ideias de estruturas lógico-
reais do finalismo e propõe-se um resgate da importância dos juízos de valor
na teoria do delito.

O novo método proposto pelo funcionalismo rechaça a premissa finalista de


que existiriam estruturas da natureza que impõem soluções jurídico-penais
para o direito penal. Por outro lado, parte da ideia de que o direito penal
deve dar soluções a seus problemas a partir de juízos de valor que
considerem as suas finalidades próprias.

Não há uma volta ao sistema neoclássico, pois o sistema funcionalista quer


oferecer diretrizes valorativas para que possam ser realizados os juízos de valor.
Acredita que a construção do sistema penal deve vincular-se aos fins do
direito penal.

Mas quais são os fins do direito penal?


Como vimos no capítulo 1, a resposta não é unívoca. Autores importantes
divergem quanto ao tema.

De forma geral, é possível dizer que o funcionalismo parte das funções a


serem cumpridas pelo direito penal, para determinar a configuração dos
elementos que compõem a teoria do delito. Se temos em mente que o direito
penal tem como função única a proteção de bens jurídicos, a partir da
função preventiva da pena, como quer Roxin, todos os institutos a serem
desenvolvidos na teoria do delito devem ser voltados para essa ideia. Essa é
uma ideia macro, a ser desenvolvida em cada etapa da teoria do delito (ação,
tipicidade, ilicitude e culpabilidade), a partir das finalidades específicas de cada
uma destas categorias.
Tendo em mira que o funcionalismo se caracteriza pela proposta de
nova metodologia, que desenvolva os institutos jurídico-penais a partir dos
fins do direito penal, parece claro que uma divergência entre os penalistas
sobre qual seja o fim do direito penal levará a sistemas funcionalistas muito
diversos.
Por isso, é comum ouvirmos que não existe um único funcionalismo,
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mas sim funcionalismos.


As várias propostas funcionalistas têm em comum o rechaço do
método finalista e das estruturas lógico-reais, bem como a crença na
reaproximação com os juízos de valor. Todos os funcionalismos também
acreditam que esses juízos de valor devem ser feitos com base nos fins do direito
penal. Assim, o critério orientador desse juízo de valor é o fim último do direito
penal.

A divergência entre os autores funcionalistas, porém, se dá quanto aos fins


do direito penal. O funcionalismo de Roxin, predominante na doutrina,
sustenta que a função do direito é a proteção de bens jurídicos. Constrói
toda a teoria do delito tendo em mira essa ideia. Assim, conduta criminosa é
apenas aquela lesiva ou perigosa para o bem jurídico; se não houver lesão ou
perigo de lesão a bem jurídico, o direito penal não irá interferir. Já Jakobs
acredita que função do direito penal é a prevenção geral positiva. Essa visão
influenciará a construção dos institutos no sistema desse autor,
notadamente a culpabilidade.

Todavia, os funcionalismos de Roxin e de Jakobs partilham da mesma ideia


fundamental, qual seja, a da necessidade de um novo método para desenvolver
o direito penal, que o reaproxime dos juízos de valor, guiados pelas finalidades
do direito penal

O FUNCIONALISMO DE ROXIN (FUNCIONALISMO TELEOLÓGICO)

O funcionalismo de Roxin toma em conta a missão constitucional do direito


penal, de proteção de bens jurídicos, através da prevenção geral e especial.

Qual seria o parâmetro dos valores no funcionalismo de Roxin? Como


se viu, o grande problema do sistema neoclássico foi o de, ao reaproximar- se
dos juízos de valor, não oferecer parâmetros valorativos que gerassem
segurança jurídica. O funcionalismo não incorre ou pretende não incorrer
nesse erro. No caso do Roxin, a principal diretriz será a consideração de que o
direito penal só é legítimo quando está em jogo um risco ou uma lesão a bem
jurídico, tendo em mira a função preventiva da pena.

Já aprendemos que o funcionalismo rechaça as estruturas lógico-reais


do finalismo. Sendo assim, não acredita que um conceito extraído da
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natureza possa solucionar um problema jurídico-penal. Mas isso não


significa que o funcionalismo de Roxin não atribua nenhuma importância à
esfera ontológica.
Segundo Roxin, as soluções para problemas jurídico-penais não estão na
natureza; o homem as constrói, realizando juízos de valor. No entanto, os
dados da realidade servem como uma limitação a esta construção, que não
pode ser abandonada.

EXEMPLO: para apurar a responsabilidade jurídico-penal por um resultado (


se o agente responde por homicídio tentado ou consumado, por exemplo), são
importantes inumeras considerações de natureza jurídica, mas não se pode
abandonar a relação de causalidade física entre a conduta e o resultado.

Contudo, para Roxin, diferentemente de Welzel, a solução jurídica não se


encontra pronta na natureza. A natureza funciona como mero limite
negativo. No exemplo dado, a constatação de responsabilidade jurídico-
penal por um homicídio consumado exige, primeiro, a relação de causalidade
física (dado ontológico). Mas isso não é suficiente. É necessário que, num
segundo momento, continuemos a perquirir, mas agora com base em princípios
jurídicos (raciocínios valorativos de natureza jurídica).
No sistema de Roxin, o ontológico, ou seja, o mundo do ser, exerce um
papel importante na teoria do delito, qual seja, o de limitação ou negativo. O
direito penal pode construir suas próprias soluçoes, mas sem confrontar os
limites impostos pelos dados da realidade. No sistema de Jakobs, ao contrário,
há uma renuncia, por completo, aos dados ontológicos.
Um outro aspecto fundamental do funcionalismo de Roxin, também
chamado teleológico, é o de que ele procura aproximar o direito penal da
política criminal. O que é a política criminal? É o estudo das diretrizes que
devem ser seguidas pelas autoridades para lidar com o fenomeno da
criminalidade.
Em Roxin, as diretrizes político-criminais (o direito penal como deve ser)
serão utilizadas para conferir conteúdo material aos institutos jurídico-
penais e auxiliar o aplicador na tarefa de interpretação da lei.

FUNCIONALISMO DE JAKOBS (FUNCIONALISMO SISTÊMICO)


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Para Jakobs, a missão do direito penal é a chamada prevenção geral positiva,


ou seja, reforçar a confiança que as pessoas possuem no funcionamento do
sistema jurídico, aí incluido o sistema penal.
O objetivo central do direito penal é a busca pela estabilização da norma,
que ocorre quando o infrator é sancionado. O objetivo da sanção penal é o
de reforçar a confiança da população na vigência da norma que foi
desafiada.
Por que o funcionalismo de JAKOBS se chamada “funcionalismo
sistêmico”? O funcionalismo sistêmico parte da teoria dos sistemas, de
Niklas Luhmann. Segundo esta concepção, o direito é uma estrutura
através da qual se facilita a orientação social, e a norma é uma
generalização de expectativas. A configuração fundamental da sociedade se
produz através do direito, e a missão do direito penal é garantir essa
configuração. As expectativas se estabilizam através de sanções.
Como vimos, no funcionalismo teleológico (de Roxin) acredita-se que as
estruturas do mundo do ser, os dados ontológicos, possuem um papel
negativo, impõem limitações. Contudo, o funcionalismo de Jakobs
renuncia por completo ao conteúdo pre- jurídico dos conceitos de ação,
causalidade etc. A ideia é a de que as valorações (o Direito) podem construir
conceitos com total liberdade, sem estarem presos à limitações da
realidade. Como exemplo, seria possível construir um conceito de ação sem
nenhuma conexão com a realidade, sem nenhum dado naturalístico. Essa
visão hoje é evidente quando se estuda a responsabilidade penal da pessoa
jurídica.
Uma crítica importante ao funcionalismo de Jakobs é a de que, ao afastar
a proteção do bem jurídico como função do direito penal, seu sistema não
permite um questionamento da legitimidade do conteúdo das normas
penais. O que interessa ao direito penal é apenas estabilizar a norma,
conquistar a confiança das pessoas na obediência à norma. Não interessa
que conteúdo possua essa norma
Dessa forma, qualquer que seja seu conteúdo, a missão do direito penal
será reforçar a confiança das pessoas na obediência à norma. Esta
concepção não leva em conta o conteúdo da norma a ser estabilizada, e por
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isso impede a crítica do sistema quando a aplicação da norma apresentar


distorções. A norma, e não mais o homem, passa a ser o sujeito em torno
do qual se organiza o sistema jurídico-penal.

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