Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
DEFESA ADMINISTRATIVA
Página 1 de 12
1. DA TEMPESTIVIDADE
A Autuada foi cientificada da lavratura do auto de infração ambiental em
epígrafe, no dia 20 de fevereiro de 2020, através do envio de carta com aviso de recebimento, de
modo que, nos termos do art. 71, I, da Lei Federal 9.605/1998 e art. 113 do Decreto 6.514/2008, o
prazo para apresentar defesa prévia é de 20 dias contados da ciência da autuação, e, portanto,
indiscutível a tempestividade da presente defesa.
2. DA COMPETÊNCIA
A Lei Complementar 639, de 30 de outubro de 2019, deu nova redação ao art.
96 da LC 38, para incluir o Corpo de Bombeiros como autoridades competentes para lavrar auto
de infração ambiental e instaurar processo administrativo, como se vê:
Art. 96 São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar
processo administrativo: (Nova redação dada pelo pela LC 639/19)
[...]
III - o Corpo de Bombeiros Militar, em circunstâncias que envolvam queimadas ilegais,
incêndios florestais e transporte de produtos perigosos, tóxicos ou nocivos à saúde
humana.
Art. 99 Os autos de infração ambiental serão processados junto à SEMA, incluindo
aqueles lavrados pelos agentes do Batalhão de Polícia Militar de Proteção Ambiental e
do Corpo de Bombeiros Militar. (Nova redação dada pelo pela LC 639/19)
O auto de infração ambiental foi lavrado em face da Autuada por suposta prática
de desmatar 4.200 ha (quatro mil e duzentos hectares) de vegetação nativa, objeto de especial,
sendo consumada mediante uso de fogo, sem autorização do órgão competente.
Página 2 de 12
Segundo a equipe técnica do Corpo de Bombeiros, teria sido constatado no
local, resíduo vegetal queimado e formato de leiras, que de acordo com informações obtidas
através do sistema da SEMA, a propriedade teria autorização para queima controlada, mas
realizou fora do período permitido, causando assim crime ambiental por uso de fogo em período
proibitivo.
Página 3 de 12
Já no Relatório Técnico, a equipe técnica do Corpo de Bombeiros que o
elaborou reconhece a existência das mencionadas autorizações, mas deduz que:
A propriedade teria autorização para queima controlada, mas que deixou passar o
período permitido causando assim crime ambiental por uso de fogo em período
proibitivo.
Evidentemente, não há como inferir que o fogo foi causado pela Autuada em
sua propriedade a partir de duas meras imagens fotográficas tiradas um dia depois após o início
do fogo, desprezando o fato de que a propriedade fica às margens da rodovia.
4. PRELIMINARMENTE
Página 4 de 12
I - ressalvados os casos previstos nos arts. 46 e 58, a infração for consumada
mediante uso de fogo ou provocação de incêndio; e
II - a vegetação destruída, danificada, utilizada ou explorada contiver espécies
ameaçadas de extinção, constantes de lista oficial.
Ora, se o legislador previu uma infração administrativa por uso de fogo sem
autorização, por óbvio, o próprio uso de fogo irregular não pode ser causa de aumento da sanção,
ao contrário, estar-se-ia diante de antinomia e violação ao princípio do non bis in idem.
Portanto, a majorante prevista no art. 60, incisos I e II, deve ser afastada,
porquanto inaplicável por expressa previsão legal e por atipicidade da conduta.
5. DO MÉRITO
Página 5 de 12
Partindo dessa premissa, sabe-se que a imposição de multa administrativa
possui caráter penalizador, e, afigurando-se como medida rigorosa e privativa de uma liberdade
pública constitucionalmente assegurada, exige-se a demonstração cabal da autoria e
materialidade, que são pressupostos autorizadores da imposição de sanção.
Isso porque, o ius puniendi do Estado é único, de modo que, a aplicação dos
princípios penais e processuais penais garantistas e limitadores devem ser estendidos também,
ao Direito Administrativo Sancionador, porque as infrações administrativas se diferenciam das
penais tão somente em relação à autoridade que às aplica.
Página 6 de 12
É bem verdade que o § 3º do art. 225, da Constituição Federal, prevê a tríplice
responsabilidade ambiental, pela qual o causador de danos ambientais está sujeito à
responsabilização administrativa, cível e penal, de modo independente e simultâneo:
Art. 14. Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e
municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção
dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental
sujeitará os transgressores: [...].
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor
obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos
causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério
Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de
responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
Por outro lado, a reparação ambiental, de cunho civil, pode atingir todos os
poluidores, a quem a própria legislação define como “a pessoa física ou jurídica, de direito público
ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação
ambiental” (art. 3º, IV, da Lei nº 6.938/81).
Página 7 de 12
No caso analisado foi imposta multa por dano ambiental sob o fundamento da
responsabilidade objetiva decorrente da propriedade da carga transportada por outrem,
que efetivamente teve participação direta no acidente que causou a degradação
ambiental. Ocorre que a jurisprudência desta Corte, em casos análogos, assentou que
a responsabilidade administrativa ambiental é de natureza subjetiva. A aplicação de
penalidades administrativas não obedece à lógica da responsabilidade objetiva da
esfera cível (para reparação dos danos causados), mas deve obedecer à sistemática
da teoria da culpabilidade, ou seja, a conduta deve ser cometida pelo alegado
transgressor, com demonstração de seu elemento subjetivo, e com demonstração do
nexo causal entre a conduta e o dano. A diferença entre os dois âmbitos (cível e
administrativo) de punição e suas consequências fica bem estampada da leitura do art.
14, caput e § 1º, da Lei n. 6.938/1981. Em resumo: a aplicação e a execução das
penas limitam-se aos transgressores; a reparação ambiental, de cunho civil, a seu
turno, pode abranger todos os poluidores, a quem a própria legislação define como "a
pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou
indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental" (art. 3º, inc. V, do
mesmo diploma normativo). Assim, o uso do vocábulo "transgressores" no caput do art.
14, comparado à utilização da palavra "poluidor" no § 1º do mesmo dispositivo, deixa a
entender aquilo que já se podia inferir da vigência do princípio da intranscendência das
penas: a responsabilidade civil por dano ambiental é subjetivamente mais abrangente
do que as responsabilidades administrativa e penal, não admitindo estas últimas que
terceiros respondam a título objetivo por ofensas ambientais praticadas por outrem. 1
Não há, nos autos do processo administrativo, qualquer prova que demonstre ou
indique que o fogo foi ateado propositadamente pela Autuada, nem que tenha sido parte do
processo de supressão de vegetação, a qual se repise, foi autorizada pela SEMA. Nesses termos,
não se pode afirmar que a Autuada concorreu para a prática da infração ambiental ou que dela
tenha se beneficiado, ao contrário, conclui-se que foi prejudicada pela queima de pastagem,
enorme quantidade de materiais de construção e benfeitorias, além de cercas e área de reserva
legal.
1
Informativo de Jurisprudência n. 650: EREsp 1.318.051-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por
unanimidade, julgado em 08/05/2019, DJe 12/06/2019.
Página 8 de 12
a ausência de dolo ou culpa e da demonstração do nexo causal entre a conduta e o dano, de
modo que o auto de infração hostilizado merece ser declarado nulo.
Art. 38. É proibido o uso de fogo na vegetação, exceto nas seguintes situações:
§ 3º Na apuração da responsabilidade pelo uso irregular do fogo em terras públicas ou
particulares, a autoridade competente para fiscalização e autuação deverá comprovar
o nexo de causalidade entre a ação do proprietário ou qualquer preposto e o dano
efetivamente causado.
§ 4º É necessário o estabelecimento de nexo causal na verificação das
responsabilidades por infração pelo uso irregular do fogo em terras públicas ou
particulares.
Página 9 de 12
Ademais, a própria linguagem utilizada pela equipe técnica do Corpo de
Bombeiros na motivação da infração ─ a propriedade teria autorização para queima controlada
mas a realizou fora do período permitido, causando assim crime ambiental por uso de fogo em
período proibitivo ─ revela o desconhecimento dos agentes quanto à causa que deu origem ao
fogo.
Com efeito, a mera lavratura de auto de infração ambiental por fogo ocorrido na
propriedade da Autuada, não demonstra o dolo ou culpa, nem o nexo causal entre a conduta e o
dano, porque os fatos narrados na autuação, no auto de inspeção e relatório técnico foram apenas
deduzidos, e não comprovados, como exige a teoria da responsabilidade subjetiva.
Como mencionado linhas atrás, a disposição do art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981
de que a indenização ou reparação dos danos ambientais não afasta a aplicação de sanções
administrativas, significa apenas, que a indenização ou reparação do dano prescindem da culpa, e
não que as sanções administrativas dispensam tal elemento subjetivo. Bem por isso, não há
confundir o direito administrativo sancionador com a responsabilidade civil ambiental, de modo
que necessária a comprovação do dano e do nexo causal, além da demonstração de dolo ou
culpa, o que não aconteceu no caso em tela.
Página 10 de 12
ilação –, a autuação não se sustenta por falta de comprovação da ocorrência de referido nexo e
do citado dano.
Ora, a Autuada não possuía qualquer interesse em fazer uso de fogo de forma
irregular, ante as autorizações válidas, de modo que não há como afastar a conclusão de que se
tratou de fogo de autoria e origem desconhecidas, que se iniciou sem a concorrência de qualquer
conduta da Autuada.
2
SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 26ª Edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005, p. 324.
Página 11 de 12
6. DOS REQUERIMENTOS
Ante o exposto, requer:
b) No mérito, seja o auto de infração ambiental declarado nulo por ausência de nexo causal entre
a alegada conduta e o suposto dano, bem como, a ausência de demonstração de dolo ou culpa
da Autuada;
c) requer a intimação pessoal ou por via postal com aviso de recebimento, para a audiência de
instrução e oitiva de testemunhas, bem como, para apresentar alegações finais, nos termos do
parágrafo único do art. 122 do Decreto 6.514/08, e, no caso de ser mantido o auto de infração
hostilizado, requer a notificação da decisão para interposição de recurso administrativo por via
pessoal ou postal com aviso de recebimento, consoante art. 126 do Decreto 6.514/08, sempre
observado o endereço mencionado no preâmbulo, sob pena de nulidade. Em caso de a
intimação/notificação pessoal ou por carta com aviso de recebimento restar inexitosa, requer o
esgotamento dos meios hábeis para localização do endereço da Autuada, vez que a
intimação/notificação por edital é medida excepcional que somente pode ser realizada após
exauridas todas as tentativas de localizar o autuado, sob pena de nulidade;
d) por fim, requer, nos termos do art. 115 do Decreto 6.514/08, a produção de todos os meios de
prova em direito admitidos, especificamente, estudos e laudo técnico elaboradores por
profissional habilitado a serem realizados na fase de saneamento, a fim de comprovar que a
Autuada não deu causa ao fogo, muito menos provocou danos em 4.200 ha, bem como, a
oitiva das testemunhas abaixo arroladas para serem ouvidas na fase de instrução, as quais
comprovarão que a Autuada não provocou o fogo, nem se beneficiou com ele, que teve
prejuízos e envidou esforções para tentar apaga-lo.
Local e data.
ADVOGADO
OAB/SC
Página 12 de 12