Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
PODER JUDICIÁRIO
VARA ESPECIALIZADA DO MEIO AMBIENTE
DECISÃO
PROCESSO N. 0000000-46.2020.8.11.0053
IMPETRANTE:SIDNEY
IMPETRADOS:SUPERINTENDENTE DE GESTÃO DE PROCESSOS ADMINISTRATIVOS E
AUTOS DE INFAÇÃO DA SECRETARIA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE -
SEMA-MT
Vistos.
Cuida-se de Mandado de Segurança impetrado por SIDNEY , devidamente qualificado, em face de ato
atribuído ao SUPERINTENDENTE DE GESTÃO DE PROCESSOS ADMINISTRATIVOS E AUTOS
DE INFAÇÃO DA SECRETARIA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE - SEMA-MT, com
pedido de liminar consistente em determinação para a restituição da embarcação Marca/
Modelo Karranca Garoupa 600, número de série 3838/19, equipada com motor Yamanha 90 HP F90 BETL,
número de série 6EJL1003017, denominada “Liberdade”, inscrita junto a Capitania dos Portos de Cuiabá
(MT) sob o nº 483M2019003611 ou que lhe seja conferido o depósito da referida embarcação, na condição
de fiel depositário. No mérito, pugna pela confirmação da pretensão liminar, bem assim pela anulação de
partes dos dispositivos das decisões administrativas proferidas nos Processos Administrativos
números 404.734/2019 e 408.221/2019, mais precisamente quanto à homologação da apreensão e do perdimento
da citada embarcação, restituindo-a em definitivo.
A parte impetrante afirma que é legítima proprietária da embarcação
Marca/Modelo Karranca Garoupa 600, número de série 3838/19, equipada com motor Yamanha 90 HP F90
BETL, número de série 6EJL1003017, denominada “Liberdade”, inscrita junto a Capitania dos Portos de Cuiabá
(MT) sob o nº 483M2019003611, adquirida em XX.XX.2019, a qual é utilizada para “recreação”.
Informa que a referida embarcação, sob a posse de Marcos Zanchi de Oliveira e outros, foi
apreendida por agentes de fiscalização em 03.8.2019, no local denominado “Porto Canga”, comunidade das
Conchas, localizada no Município de Barão de Melgaço (MT), uma vez que estaria sendo utilizada para pesca em
“local interditado por órgão competente”, sendo lavrado o Auto de Infração n. 167.081 (autuado
Marcos Zanchi de Oliveira), o Termo de Apreensão n. 163.487 e o Termo de Depósito n. 104.364 (depositário
fiel Tarso Ricardo Lopes).
Sustenta que em 12.8.2019 formalizou pedido de restituição da embarcação apreendida
(Protocolo n. 385.141), do qual jamais foi notificado e/ou intimado formalmente a respeito de qualquer decisão
da autoridade administrativa competente.
Aduz que no âmbito da Processo Administrativo n. 404.734/2019, houve a apuração da
responsabilidade pela conduta descrita no Auto de Infração n. 167.081 de 03.8.2019, culminando com a
aplicação da penalidade de multa no valor de R$6.000,00 (seis mil reais) em face de Marcos Zanchi de Oliveira,
bem assim declarado o perdimento da sua embarcação.
Objetivando desconstituir o ato administrativo que ora impugna, alega: (01) cerceamento
de defesa; e (02) ausência de motivação e de fundamentação.
A inicial vem instruída com os documentos constantes no Id. 40682999,
40683000,40683001,40683002, 40683003, 40683004, 40683005, 40683007, 40683008, 40683009, 40683010,
40683011, 40683012, 40683013, 40683014, 40683015, 40683016 e 40683017.
Inicialmente distribuída para a Vara Única da Comarca de Santo Antônio do Leverger
(MT), os autos aportaram nesta vara especializada em matéria ambiental após o declínio de competência daquele
d. Juízo (Id. 40724602).
A apreciação do pleito liminar foi postergada para após a manifestação da autoridade
coatora (Id. 45128857).
O ESTADO DE MATO GROSSO ingressou no feito apresentando defesa processual no
Id. 48610511. Preliminarmente sustentou a decadência do direito a impetração da ação mandamental. No mérito,
argumenta a ausência de ilegalidade ou abuso de poder a amparar a pretensão da parte impetrante, na medida em
que tanto a apreensão da embarcação reclamada quanto a decisão que concluiu pelo seu perdimento se encontram
amparadas na legislação de proteção ambiental. Ao final, pugna pelo indeferimento do pedido liminar, bem
assim pela denegação da ordem pretendida. Juntou documentos nos Ids. 48610518 e 48610519.
Instada a respeito da decadência alegada pelo ESTADO DE MATO GROSSO
(Id. 50377239), a parte impetrante manifestou pela sua inocorrência, na medida em que até o momento não foi
cientificada a respeito dos atos administrativos impugnados (Id. 51975333).
É o relatório. DECIDO.
1. FUNDAMENTO.
O ESTADO DE MATO GROSSO sustenta a decadência do direito a impetração do
mandado de segurança, sustentando que a parte impetrante tem ciência dos atos administrativos impugnados
– Termo de Apreensão n. 163.487 e as Decisões Administrativas números 2859/SGPA/SEMA/2019
e 2860/SGPA/SEMA/2019 – ao menos desde 12.8.2019, data em que formulou pretensão de restituição.
Por outro lado, a parte impetrante sustenta que até então não foi cientificada a respeito das
decisões administrativas que culminaram com a declaração de perdimento de sua embarcação, razão pela qual
não há que se falar em decadência do direito a ação mandamental.
A tese levantada se trata de matéria de ordem pública, podendo ser apreciada em qualquer
fase processual, quer por provocação da parte quer de ofício. Neste sentido, eis a lição dos ilustres mestres
Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery:
“Decadência. Conhecimento de ofício. A decadência é matéria de
ordem pública e deve ser examinada ex officio pelo juiz, independentemente de
provocação da parte ou interessado (...)” (Código de Processo Civil Comentado, 13.ª ed.,
Ed. RT, pág. 566).
Pois bem.
Dispõe o art. 23 da Lei n. 12.016/2009: “Art. 23. O direito de requerer mandado de
segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato
impugnado.”
Assim, resta configurada a decadência se da ciência do ato impugnado, ultrapassado o
prazo de 120 (cento e vinte) dias da impetração do mandado de segurança.
No caso, a pretensão da parte impetrante está sustentada em atos administrativos
praticados pela autoridade coatora em 29.10.2019 e 14.11.2019, consubstanciados nas Decisões
Administrativas números 2859/SGPA/SEMA/2019 (Id. 40683014, pág. 41/43; Id. 48610519, pág. 05/10)
e 2860/SGPA/SEMA/2019 (Id. 40683015, pág. 81/86), proferidas nos Processos Administrativos
números 404.734/2019 (instaurado em face de Marcos Zanchi de Oliveira) e 408.221/2019 (instaurado em face
de Diego Haneiko), nas quais houve a análise e o indeferimento da pretensão de restituição formulada pela parte
impetrante (Protocolo n. 385.141 de 12.8.2019), bem assim a declaração de perdimento da embarcação
reclamada.
Da análise dos documentos que compõem os processos administrativos acima referidos,
verifica-se que a parte impetrante não foi cientificada/notificada/intimada a respeito das decisões
administrativas supracitadas, sendo que as publicações viabilizadas no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso
em 21.01.2020 (D.O. n. 27.674; Id. 40683014, pág. 45) e 18.9.2019 (D.O. n. 27.592; Id. 40683015, pág.
69) cingiram-se às partes autuadas (Marcos Zanchi de Oliveira e Diego Haneiko, respectivamente).
Nesses termos, conclui-se que não ocorreu a decadência sustentada pelo ESTADO DE
MATO GROSSO, razão pela qual passo a analisar a pretensão liminar.
Para a concessão da medida liminar em mandado de segurança devem concorrer dois
requisitos legais, quais sejam: (01) relevância dos motivos ou fundamentos em que se assenta o pedido inicial;
e (02) a possibilidade da ocorrência de lesão irreversível ao direito da parte impetrante, ou dano de difícil
reparação, seja de ordem patrimonial, funcional ou moral, se for mantido o ato coator até a sentença final, ou se o
provimento jurisdicional instado só lhe for reconhecido na sentença final de mérito, nos precisos termos do artigo
7º, inciso III, da Lei n. 12.016/2009.
No caso, os documentos atrelados na petição inicial demonstram a boa aparência do
direito da parte impetrante e a razoabilidade de sua pretensão a uma medida de urgência, destinada ao
imediato atendimento de seu pedido liminar.
Pois bem.
Sobre a apreensão de bens, a Lei Federal n. 6.514/2008 dispõe que:
“Art. 101. Constatada a infração ambiental, o agente autuante, no uso
do seu poder de polícia, poderá adotar as seguintes medidas administrativas:
I - apreensão;
[...].
Art. 102. Os animais, produtos, subprodutos, instrumentos,
petrechos, veículos de qualquer natureza referidos no inciso IV do art. 72 da Lei no 9.605, de
1998, serão objeto da apreensão de que trata o inciso I do art. 101, salvo impossibilidade
justificada.
Parágrafo único. A apreensão de produtos, subprodutos, instrumentos,
petrechos e veículos de qualquer natureza de que trata o caput independe de sua fabricação
ou utilização exclusiva para a prática de atividades ilícitas.
[...].
Art. 105. Os bens apreendidos deverão ficar sob a guarda do órgão ou
entidade responsável pela fiscalização, podendo, excepcionalmente, ser confiados a fiel
depositário, até o julgamento do processo administrativo.
Parágrafo único. Nos casos de anulação, cancelamento ou revogação
da apreensão, o órgão ou a entidade ambiental responsável pela apreensão restituirá o bem
no estado em que se encontra ou, na impossibilidade de fazê-lo, indenizará o proprietário pelo
valor de avaliação consignado no termo de apreensão.
Art. 106. A critério da administração, o depósito de que trata o art.
105 poderá ser confiado:
I - a órgãos e entidades de caráter ambiental, beneficente, científico,
cultural, educacional, hospitalar, penal e militar; ou
II - ao próprio autuado, desde que a posse dos bens ou animais não
traga risco de utilização em novas infrações.
§1º Os órgãos e entidades públicas que se encontrarem sob a condição
de depositário serão preferencialmente contemplados no caso da destinação final do bem ser
a doação.
§2º Os bens confiados em depósito não poderão ser utilizados pelos
depositários, salvo o uso lícito de veículos e embarcações pelo próprio autuado.
§3º A entidade fiscalizadora poderá celebrar convênios ou acordos com
os órgãos e entidades públicas para garantir, após a destinação final, o repasse de verbas de
ressarcimento relativas aos custos do depósito”. [sem destaque no original]
2. FUNDAMENTO.
Pelo exposto, com fundamento no art. 7º, inciso III, da Lei n. 12.016/2009:
2.1. DEFIRO a liminar almejada, por conseguinte, CONFIRO a parte
impetrante SIDNEY a condição de fiel depositária da
embarcação Marca/Modelo Karranca Garoupa 600, número de série 3838/19, equipada com motor Yamanha 90
HP F90 BETL, número de série 6EJL1003017, denominada “Liberdade”, inscrita junto a Capitania dos Portos
de Cuiabá (MT) sob o nº 483M2019003611, até decisão final da presente demanda ou contraordem judicial,
mediante termo de fiel depositário, a ser lavrado pela autoridade administrativa, devendo o cumprimento desta
decisão ser comprovado nos presentes autos no prazo de 10 (dez) dias.
2.2. Após, abra-se vista ao Ministério Público para os fins do art. 12, da Lei n. 12.016/2009
e, a seguir, conclusos.
2.3. Intimem-se. Notifique-se. Cumpra-se.
Cuiabá (MT), data registrada no sistema.
(assinado digitalmente)
Rodrigo R. C.
Juiz de Direito
JG