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FATORES DE REINCIDÊNCIA DE URÓLITOS EM CANINO DA RAÇA

DACHSHUND: RELATO DE CASO

Gabriele Casagrande¹*, Katiane Carvalho Colombo², Diane Alves de Lima³; Liziane Bertotti
Crippa4, Leticia da Silva5,
1. Faculdade da Serra Gaúcha, gabriele_casagrande@yahoo.com.br; 2. Faculdade da Serra
Gaúcha, katianecarvalhocolombo@outlook.com; 3. Faculdade da Serra Gaúcha,
diane.lima@fsg.edu.br; 4. Faculdade da Serra Gaúcha, liziane.crippa@fsg.edu.br; 5.
Faculdade da Serra Gaúcha, leticia.dasilva@fsg.edu.br.

Palavras-chave: Clínica geral, urolitíase, estruvita, infecção do trato urinário.

1. Introdução

O sistema urinário coletor dos animais domésticos está sujeito a fatores


fisiopatológicos e congênitos. Dentre as afecções que acometem o trato urinário, a urolitíase
ocorre com relativa frequência em cães, sendo uma doença decorrente de desordens
subjacentes (ZACHARY, 2018).
Fatores de risco para formação destes cálculos incluem idade, raça, esterilidade do
animal e ainda a administração de glicocorticóides, relacionado ao hiperadrenocorticismo
(KOPECNY, 2021; LEIGH, 2013). Além disso, a presença de infecções no trato urinário (ITU)
pode ser um fator predisponente para a formação de cálculos urinários.
Os urólitos, formados pela superconcentração de substâncias cristalogênicas na urina,
causam precipitações no sistema excretor do animal (JERICÓ, 2019). Em caninos, os quatro
minerais urolíticos mais comuns encontrados são o oxalato de cálcio, fosfato amoníaco
magnesiano e urato de amônio cistina, seguindo em ordem decrescente, respectivamente
(KOPENCY, 2021). A estruvita composta de fosfato amoníaco magnesiano, relaciona-se
diretamente com infecções do trato urinário (ITU), predominantemente em cadelas
(SANTOS, 2017; KOPENCY, 2021).
A infecção bacteriana do trato urinário inferior é um fator de predisposição na
formação de urólitos do tipo estruvita e/ou urato de amônio. Entre os principais
microrganismos associados a formação de urease, e representantes do nicho patogênico
dentro dos cálculos, está o gênero Staphylococcus. Esta predisposição de formação de massa
calcária bacteriana se deve a quebra da uréia em amônia e dióxido de carbono, devido a
enzima urease (Mestrinho, 2019). A vesícula urinária desempenha um papel essencial no
armazenamento e excreção da urina pela uretra. A excreção dos produtos não aproveitados no
nosso metabolismo é também desempenhada pela bexiga, que quando não está em sua total
funcionalidade podem desestabilizar a sistematização corporal (Mestrinho, 2019).
Compreender o processo de geração dos urólitos e os fatores de risco atrelados a sua
formação é importante para diminuir a recidiva deste problema. O presente trabalho tem
como objetivo relatar um caso de reincidência de urólitos no período de seis meses, em
cadela da raça dachshund, de treze anos, que havia passado por cistotomia para retirada dos
cálculos.

2. Relato do caso

Foi recebido para atendimento em centro clínico particular, em setembro de 2020 no


município de Bento Gonçalves - RS, fêmea, fértil, da raça dachshund, doze anos de idade,
com queixa de hematúria acompanhada de disúria a três semanas, e polaquiúria a dois meses,
com nenhum histórico de doenças anteriores. Em anamnese constatou-se que o cão
apresentava desconforto abdominal, hematúria e polaquiúria, além de, na palpação da bexiga
foi possível sentir variados elementos sólidos, sugerindo uma possível patologia do trato
urinário inferior (Roca, 2020). Ademais vale salientar que o animal apresenta alopecia
endócrina simétrica, bilateral, em parte superior pélvica.
Foi instruído ao tutor a realização de exame abdominal de ultrassonografia, ao qual
diagnosticou, em vesícula urinária, múltiplas estruturas ecogênicas, lançando sombra
acústica, com medidas de aproximadamente 0,36 cm a 1,4 cm. Não foi observado nada digno
de relato em demais órgãos. Para a confirmação do diagnóstico, foram solicitados exames
bioquímicos e hemograma completo (CBC). Não foi realizado exame qualitativo de urina. As
paredes urinárias, em cistotomia, encontravam-se espessadas.
O hemograma apresentou contagem plaquetária anormal (806 mil/mm³ - Ref.: até
500.000 m³). Já nos bioquímicos renais e hepáticos, houve alteração em uréia (97,0 mg/dl -
Ref.: até 60 mg/dL), ALT - Alanina aminotransferase (180,0 UI/L - Ref.: < 102 UI/L) e
fosfatase alcalina (319,0 UI/L - Ref.: 156 UI/L). Os valores de referência seguem os
parâmetros de JAIN, 1993 e KANEKO, 1997.
A terapia instituída no diagnóstico primário, em setembro de 2020, incluiu a remoção
cirúrgica dos urólitos, por cistotomia, resultando em novecentos e oitenta e quatro (984)
unidades. Ademais foi realizado a ovariohisterectomia e a prevenção de uma segunda
recidiva, por meio do aumento da ingestão hídrica. O tutor optou por não realizar a análise
qualitativa dos cálculos, a fim de determinar a causa primária da formação.
Em março de 2021, seis meses após a primeira consulta, o animal retornou à clínica
com queixa de disúria e polaquiúria a duas semanas, sem melhora do quadro clínico. Após
anamnese sem alterações significativas, foi solicitado exame de ultrassom abdominal total,
exame qualitativo de urina (EQU) e hemograma, ao qual constatou nova formação urolítica.
Em ecografia encontrou-se uma bexiga com conteúdo anecogênico, apresentando
depositada inúmeras estruturas hiperecogênicas, compatíveis com cálculos, medindo em
torno de 0,65 cm a 1 cm (figura 2). Em rins as dimensões era mantidas, contornos lisos, com
leve indefinição corticomedular, compativel com processo senil e/ou nefropatia. Glândula
adrenal direita com formato, parênquima e dimensões mantidas: 1,94cm x 0,68cm x 0,62cm
(comprimento x espessura polo cranial x caudal). Já a esquerda, medindo 1,97 cm x 0,74 cm
x 0,72 cm (espessada), apresentava tênue mancha hiperecogênica homogênea em polo cranial
de 0,71cm x 0,65cm, compatível com hiperplasia nodular/ processo neoplásico (figura 3). Foi
observada uma hepatomegalia discreta.

As alterações patológicas seguiram-se no exame qualitativo de urina (EQU), através


de uma amostra de 9 ml de urina, normocorada, de aspecto turvo e densidade 1.026, ph 8,0
( Ref.: 5,5 a 7,5), foi constatada bacteriúria positiva (+++), fosfato amorfo presente (+++) e
leucócitos positivos, além de uma hematúria considerável (2 - 10 p/ campo - Ref.: até 5
campos) e piúria (10-20 p/ campo Ref.: até 5 campos). Foi observado a presença de proteína
(+ - Ref.: ausente), caudatas (0-2/ campo - Ref.: ausente) e granulosos (0-1 p/ campo - Ref.:
ausente). Sugeriu-se a cultura e o antibiograma da amostra. Em cultura e antibiograma de
urina, por cistocentese, foi isolado Staphylococcus sp., coagulase positiva, sensível a todos os
antibióticos testados.
Os exames bioquímicos realizados em setembro de 2021 encontravam-se no limite de
referência, plaquetas (430.000 m³ - Ref.: até 500.000 m³), hematócrito (56,5% - Ref.: até
55%), creatinina (0,9 mg/ dL - Ref.: até 1,5 mg/dL). Alterações significativas foram
observadas em fosfatase alcalina (234 UI/L - Ref.: até 156 UI/L) e uréia (72 mg/ dL - Ref.: 60
mg/dL). Os exames foram realizados em laboratório particular ao qual seguem os valores de
referência de JAIN, 1993 e KANEKO, 1997.
Posterior à identificação da nova deposição de urólitos em bexiga, foi executada uma
segunda cistotomia em setembro de 2021, realizada em centro veterinário particular. O
processo cirúrgico resultou na extração de cento e trinta e dois (132) cálculos urinários, que
posteriormente foram enviados para análise do constituinte mineral. As paredes da vesícula
urinária encontravam-se espessadas, sugestivas de infecção recorrente. (colocar ref.)
A análise física dos cálculos urinários resultou em variados elementos, com peso total
de 30 g, forma piramidal, coloração branca, superfície lisa e consistência arenosa. Em exame
químico dos urólitos observou-se positividade para carbonato, magnésio, amônio, fosfato,
concluindo se tratar de um cálculo composto por fosfato triplo amoníaco magnesiano
(estruvita) (++).

3. Discussão

O sistema urinário coletor dos caninos tem o atributo sobre a formação de urina
concentrada, sendo esta umas das funções para a eliminação dos resíduos corporais
subjacentes. A formação exacerbada de compostos sedimentados em urina é a principal causa
de urólitos em animais domésticos. Atrelado a este fator, doenças concomitantes como
infecções do trato urinário, insuficiência renal crônica e hiperadrenocorticismo são o estopim
de uma série de patologias, incluindo-se a recorrência de compostos minerais em cadelas.
colocar ref.
A formação de urólitos em animais domésticos é comum, assim como sua recidiva já
foi relatada por SOUZA, 2019. Apesar da relativa presença de precipitados minerais, dentro
das clínicas caninas, a identificação de fatores de risco é essencial para controlar e prevenir,
de forma eficaz, uma formação primária, ou sua reincidência.
A idade do animal (13), não foi um fator significativo de predisposição de estruvitas.
De acordo com KOPENCY, 2021, menos da metade dos animais (35,3%), do estudo
epidemiológico realizado, que possuíam estruvitas, tinham mais de sete anos, não sendo este
a causa principal de reincidência urolítica do presente relato. Ademais a urolitíase acomete
principalmnete o sexo masculino, sendo mais frequentemente encontrada na bexiga, com
96,9% dos casos em estudo epidemiológico realizado por Kopecny, 2021 (ZACHARY, 2018).
Desta forma, a formação de urólitos em bexiga é principalmente desenvolvida por
acometimentos afetando o órgão, como infecções, seja diretamente ou decorrente de
desordens fisiopatológicas sistêmicas. colocar ref.
São variados os fatores de precipitação de solutos no trato urinário. O potencial
Hidrogeniônico (pH) urinário é um grande co-fator da formação urolítica, já que quando
alcalinizado, facilita a presença de estruvitas (SANTOS, 2017). Desta forma, a alcalinização
do potencial Hidrogeniônico da urina, relatada no EQU, é compatível com o material
encontrado na extração por cistostomia. A permanência de um ambiente alcalinizado no trato
urinário inferior propicia o crescimento de bactérias em trato urinário. colocar ref Estas
colônias, em sua patogenicidade, juntam-se com epitélio da parede da bexiga e os leucócitos,
estes presentes em EQU (leucócitos 10-20 p/ campo, granulosos 0-1 p/campo, caudatas 0-2/
campo), e podem servir de núcleo, ao qual ocorre precipitação dos constituintes minerais dos
cálculos. colocar ref
Em um estudo realizado por Kopecny e colaboradores em 2021, 41,8% dos urólitos
submetidos para crescimento bacteriano, pela técnica de cultura aeróbica de urolíticos, foram
positivos, deste sendo o mais comum o gênero Staphylococcus spp (74,9%), devido a sua
capacidade de produção de urease, material utilizado na produção de alguns dos cálculos
mais comuns da clínica de pequenos animais. Assim, o cultivo da amostra submetida no
EQU e cultura e/ou antibiograma, ter apresentado bacteriúria e cultivo de Staphylococcus
spp., respectivamente, são grandes indícios na propiciação da formação dos cálculos (colocar
ref.). São necessários maiores análises do crescimento bacteriano aeróbio das amostras, assim
como descrito por —-----------.
Vale ressaltar que os fatores atrelados à reincidência dos urólitos no pequeno espaço
de tempo podem estar relacionados à síndrome de chushing, com alta produção de fosfatase
alcalina, associado a infecção do trato urinário inferior (TÁSSIA, 2016). Entre as raças com
maior predisposição desta patologia, encontra-se o dachshund, principalmente na forma
dependente da hipófise (HPD) (NELSON, 2001). Conforme acompanhado o caso, as
patologias apresentadas em adrenal esquerda, hiperplasia nodular, em conjunto com alopecia
endócrina de lombar, exames alterados em creatinina, uréia, hemoglobina, fosfatase alcalina
aumentada em bioquímicos, presentes em urina e componente das estruvitas extraídas, além
da idade, raça e quadro clínico são sugestivos de hiperadrenocorticismo ACTH-dependente,
tendo como co-fator, para formação de estruvitas, a infecção do trato urinário. Foi indicado
ao tutor exames complementares para diagnóstico.

4. Conclusão
Por intermédio de análise física do animal e relato do tutor, com a presença de
polaquiúria e disúria durante anamnese pode-se suspeitar de doença do trato urinário inferior.
O exame de ultrassonografia abdominal foi determinante para o diagnóstico. Acompanhado
dos bioquímicos, hemograma completo e exame qualitativo de urina, pode-se fechar
diagnóstico de recidiva de urólitos em bexiga, tendo como co-fator a infecção do trato
urinário do animal.
A reincidência desta patologia é comum na rotina clínica, sendo necessário a
investigação da causa primária de tal formação. No presente relato o animal não tinha
predisposição racial e alimentar.

Estruvita ou hexaidrato de fosfato de amônio e magnésio, representado pela fórmula


[(MgNH4PO4)6H2O], é um dos minerais mais encontrados em urólitos caninos. A supersaturação da
urina com íons fosfato de amônio e magnésio é um requisito, mas vários outros fatores – incluindo ITU,
urina alcalina, alimentação e predisposição genética – podem influenciar sua formação. Nos cães, a
maioria dos urólitos de estruvita está associada a uma infecção urinária bacteriana com bactérias
produtoras de urease, como Staphylococcus spp. (na maioria das vezes, S. intermedius) ou, menos
comumente, Proteus spp. A urease é uma enzima que hidrolisa a ureia, levando ao aumento de amônio, de
fosfato e de carbonato, que resulta na alcalinização da urina. Muitos urólitos de estruvita também contêm
uma pequena quantidade de outros minerais, como o fosfato de cálcio e, menos comumente, o urato de
amônio. O urólito de estruvita estéril é raro em cães; sua etiopatogenia pode incluir fatores alimentares,
metabólicos ou familial, mas não envolve a urease bacteriana.2

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