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ISSN: 2595-6825
DOI:10.34119/bjhrv5n4-035
RESUMO
Introdução: A Síndrome de Burnout, caracterizada por exaustão emocional, despersonalização
e baixa realização pessoal, é decorrente do estresse crônico causado por atividades laborais.
Durante a pandemia da COVID-19, a piora das condições de trabalho e as longas jornadas
tornaram-se fatores de risco para o desenvolvimento dessa síndrome, principalmente entre a
classe médica. Diante disso, este trabalho tem por objetivo revisar a literatura sobre Síndrome
de Burnout, sua prevalência entre médicos e sua interface com a pandemia de COVID-19.
Método: Revisão da literatura disponível dos últimos 5 anos sobre o tema. A busca por
publicações foi realizada no período de agosto a dezembro de 2021 nas bases de dados PubMed,
LILACS, SciELO e BIREME com os descritores “Burnout”, “Médicos”, “COVID-19” e
“Esgotamento Profissional”. Resultados: De 22 artigos encontrados, 7 preencheram os critérios
de inclusão para o objetivo principal desta revisão. Todas as pesquisas foram conduzidas no
ano de 2020 em diferentes países, com médicos de diversas especialidades. A maioria dos
estudos utilizou o Maslach Burnout Inventory (MBI) como instrumento diagnóstico. A
prevalência de SB durante a pandemia de COVID-19 variou de 49,2% a 100%. Enquanto no
ABSTRACT
Introduction: Burnout Syndrome, defined as emotional exhaustion, personal derealization and
low personal fulfillment, is due to the stress caused by work activities. During the COVID-19
pandemic, worsening working conditions and long hours became risk factors for the
development of this syndrome, especially among the medical profession. Therefore, this work
aims to review the literature on Burnout Syndrome, its prevalence among physicians and its
interface with the COVID-19 pandemic. Method: Review of available literature from the last 5
years on the subject. The search for publications was carried out from August to December of
2021 in the PubMed, LILACS, SciELO and BIREME databases with the descriptors “Burnout”,
“Doctors”, “COVID-19” and “Professional Burnout”. Results: Of the 22 articles found, 7 were
presented as an inclusion review for its main objective. All surveys were conducted in 2020 in
different countries, with physicians of different specialties. Most studies used the Maslach
Burnout Inventory (MBI) as a diagnostic instrument. The prevalence of SB during the COVID-
19 pandemic ranges from 49.2% to 100%. While in the period before the pandemic, percentages
of a maximum of 81.5% were found, research in the context of the COVID-19 pandemic
revealed numbers of up to 100%. Conclusion: There were higher numbers in the prevalence of
SB in most samples from the pandemic context. More studies are needed to obtain more reliable
results and neutralize biases.
1 INTRODUÇÃO
A Síndrome de Burnout (SB), por muito tempo, não vem sendo identificada como
doença pela comunidade médica no cenário global, referindo-se a um fenômeno do contexto
ocupacional. Entretanto, no Brasil, existem normativas considerando-a doença relacionada ao
trabalho desde 1999 (DIAS et al., 2001).
Após uma mudança ocorrida em janeiro de 2022, foi incluída na 11ª Revisão da
Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-
11) na categoria “fatores que influenciam o estado de saúde ou o contato com os serviços de
saúde”, reforçando seu lugar como fenômeno ocupacional e não doença, sob o código QD85,
no capítulo “problemas associados ao emprego ou desemprego”. Aparece na CID-11 como uma
síndrome resultante do estresse crônico no local de trabalho que não foi administrado com
sucesso e caracterizada por três dimensões: sensação de esgotamento ou exaustão;
distanciamento mental ou sentimentos de negativismo ou cinismo em relação ao trabalho; e
uma sensação de ineficácia e baixa realização pessoal (CID-11, 2022).
Os médicos são profissionais altamente vulneráveis à SB, pois lidam com fatores de
estresse ao longo de sua vida profissional (MOREIRA; SOUZA; YAMAGUCHI, 2018).
Especificamente na área da medicina, a presença desta síndrome é crítica: em nível mundial
está presente em 1 a cada 2 médicos; um terço destes é afetado de maneira considerável; e um
décimo, de forma grave com aspectos irremediáveis (TUCUNDUVA; GARCIA; PRUDENTE;
et al., 2006). De acordo com o Conselho Federal de Medicina, no Brasil, 23,1% dos médicos
apresentam a SB em alto grau em uma amostra de 7,7 mil profissionais de todos os estados
(BARBOSA, 2007).
A pandemia da COVID-19 acarretou diversos fatores agravantes para o
desenvolvimento da síndrome entre a classe médica, como crescimento das jornadas de
trabalho, aumento do estresse no ambiente de trabalho, sobrecarga dos profissionais, risco de
contaminação e sentimento de impotência diante do desconhecimento sobre a doença. Segundo
Sung C-W, no ano de 2020, 40,3% dos profissionais de saúde das enfermarias de COVID-19,
principalmente médicos (31%), apresentaram SB.
A SB apresenta uma diversidade de sintomas psicológicos como humor depressivo,
alterações de memória e concentração, ideações suicidas e irritabilidade. Além disso, pode
manifestar sintomas físicos. Foi diretamente associada com a experiência de pelo menos um
sintoma somático como mudanças nos hábitos alimentares, dificuldade em dormir e tensão
muscular (BARELLO; PALAMENGHI; GRAFFIGNA, 2020).
Os efeitos da síndrome não se limitam apenas aos médicos que a experenciam, podendo
impactar todo o sistema de saúde, devido a importância do papel da classe médica dentro desse
sistema (DEWA; LOONG; BONATO; et al., 2017). Está relacionada à falta de
comprometimento com o trabalho, diminuição da produtividade e demissões. À medida que a
exaustão dos médicos aumenta, esses profissionais diminuem a carga de energia emocional
investida no trabalho, levando à despersonalização (SALYERS; LUTHER; FIRMIN; et al.,
2016), o que pode afetar a integridade da relação médico-paciente e comprometer a efetividade
do atendimento. Além disso, contribui mais fortemente com a possibilidade de erros médicos
(TAWFIK, D. S.; PROFIT, J.; MORGENTHALER, T. I.; et. al., 2018).
Tendo em vista o contexto global de sobrecarga da classe médica proporcionado pelo
surgimento da COVID-19, este trabalho tem por objetivo revisar a Síndrome de Burnout, sua
prevalência entre médicos e sua interface com a pandemia.
2 METODOLOGIA
A presente pesquisa é uma revisão integrativa de literatura. Como objetivo principal,
foram incluídos estudos que avaliaram a prevalência de SB na classe médica durante a
pandemia de COVID-19. Adicionalmente, trabalhos sobre o conceito da SB e a prevalência
desta na classe médica no período pré-pandêmico também foram incorporados nesta revisão
para enriquecer o material, esboçar o conhecimento mais atual disponível na literatura sobre o
que se entende por SB e o panorama geral desta no período pré-pandemia.
O limite para o período de publicação foi entre os anos de 2016-2021 e os idiomas
analisados foram português e inglês. Foram excluídos desta revisão estudos que não avaliaram
a prevalência de SB na classe médica antes e durante a pandemia de COVID-19, além daqueles
nos quais não foi possível ter acesso ao conteúdo completo.
A busca pelos artigos foi realizada no período de agosto a dezembro de 2021 nas bases
de dados PubMed (Público/Editora MEDLINE), LILACS (Literatura Latino-Americana e do
Caribe em Ciências da Saúde), BIREME (Centro Latino-Americano e do Caribe de informação
em Ciências) e Scielo (Scientific Electronic Library Online).
Os descritores utilizados estão cadastrados no Portal de Descritores das Ciências da
Saúde (DeCS): COVID-19; Burnout; Médicos; Esgotamento Profissional, e seus
correspondentes em inglês (Burnout; Physicians; COVID-19; Professional Burnout).
Foram identificados 47 artigos. Para a triagem dos estudos, foi realizada a leitura
minuciosa dos resumos e selecionados os que atendiam aos objetivos e critérios de inclusão.
Posteriormente, foi realizada a leitura do texto completo para avaliação da elegibilidade. Para
a revisão de literatura, foram utilizados 22 artigos. Destes, 7 atenderam ao objetivo principal e
o restante aos objetivos secundários. O processo de seleção dos artigos está sintetizado na figura
1.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 O CONCEITO DE SÍNDROME DE BURNOUT
O termo “burnout” foi inicialmente utilizado por um teórico americano chamado
Herbert Freudenberger para designar uma relação insatisfatória entre um indivíduo e seu
trabalho, na qual ocorre uma progressão dos níveis de estresse (FREUDENBERGER, 1974).
Essa denominação origina-se da língua inglesa: to burn é traduzido como arder ou queimar e
out significa até o fim. Segundo Mendanha, Bernardes e Shiozawa, 2018:
Tabela 1. Dados sobre a prevalência de Síndrome de Burnout entre médicos durante a pandemia de COVID-19
encontrados nos sete estudos utilizados nesta revisão.
Prevalência Instrumento
Tamanho da
Autores Ano / País Especialidades encontrada diagnóstico
amostra (n)
% utilizado
AZOULAY;
2020 / Maslach Burnout
WAELE; Medicina intensiva 1001 51%
Vários Inventory (MBI)
FERRER; et al.
Maslach Burnout
KHAN, N.; Inventory -
2020 /
PALEPU, A.; Medicina interna 302 68% Human Services
Canadá
DODEK, P.; et al. Survey (MBI-
HSS)
DIMITRIU;
PANTEA-
2020 / Médicos residentes de Maslach Burnout
STOIAN; 100 76%
Romênia diversas áreas Inventory (MBI)
SMARANDA; et.
al
Maslach Burnout
Inventory -
FARIA; COELHO; 2020 /
Não especificadas 126 85.5% Human Services
SILVA; et al. Brasil
Survey (MBI-
HSS)
CHALHUB;
2020 / Maslach Burnout
MENEZES; Não especificadas 223 100%
Brasil Inventory (MBI)
AGUIAR; et al.
Oldenburg
MENDONÇA; 2020 /
Várias 1392 49.2% Burnout
STEILII; GOIS. Brasil
Inventory (OLBI)
ALRAWASHDEH;
10-item Burnout
AL-TAMMEMI; 2020 /
Várias 973 57.7% Measure-Short
ALZAWAHREH; Jordânia
version (BMS)
et al.
82 estavam na linha de frente e 44 não. Entre os profissionais cujo resultados foram compatíveis
com SB, 85,5% trabalhavam na linha de frente e 14,5% trabalhavam fora (FARIA; COELHO;
SILVA; et al., 2021).
Estudos internacionais realizados no Canadá e na Jordânia durante a pandemia,
mostraram que, de um total de 973 médicos entrevistados na Jordânia, a prevalência de burnout
entre os médicos foi de 57,7% (ALRAWASHDEH; AL-TAMMEMI; ALZAWAHREH; et al.,
2021). Já no Canadá, em 803 entrevistados, a prevalência de burnout foi de 68%, afetando 2 a
cada 3 médicos da amostra, sendo mulheres e outras minorias os mais afetados. Além disso,
21% relataram que estavam considerando abandonar a profissão ou já tinham abandonado um
cargo (KHAN; PALEPU; DODEK; et al., 2021). Os resultados encontrados nesses estudos
corroboram com os expostos pelas publicações nacionais citadas, evidenciando o alarmante
número de profissionais afetados por SB devido a COVID-19.
Previamente ao surgimento do novo coronavírus, os médicos intensivistas já
apresentavam a maior prevalência de SB entre a classe médica. Durante a pandemia, devido a
evolução da gravidade da doença e a necessidade de internação dos pacientes em leitos de
unidades de terapia intensiva (UTI), esses profissionais estiveram expostos a um nível maior de
estressores no ambiente de trabalho do que o habitual. Em um estudo realizado entre 1001
médicos intensivistas de 85 países atuantes em UTIs durante a pandemia, participantes da
European Society of Intensive Care Medicine (ESICM), 846 participantes responderam o
questionário Maslach Burnout Inventory (MBI) para identificar os sintomas mais prevalentes
da síndrome. Foi constatado uma prevalência de burnout de 51% através das respostas colhidas
(AZOULAY; WAELE; FERRER; et al., 2020).
Os médicos residentes apresentaram altos índices de SB após o surgimento da COVID-
19, principalmente devido a necessidade de serem realocados de suas áreas de atuação
específicas, para trabalhar em pronto-socorros, unidades de terapia intensiva e enfermarias
COVID-19, a fim de suprir a necessidade do déficit médico (AGARWAL; SABADIA; ABOU-
FAYSSAL; et al., 2020; FONG; QADAN; MCKINNEY; et al., 2020). Um estudo aplicado em
médicos residentes atuando no enfrentamento a pandemia em São Paulo, revelou que em uma
amostra de 1392 profissionais, 49,2% apresentaram sintomas de burnout (MENDONÇA;
STEILII; GOIS, 2021).
Um outro estudo realizado entre 100 residentes atuantes na Romênia comparou a
prevalência de SB entre 50 médicos residentes trabalhando na linha de frente, em especialidades
como emergência, radiologia e unidade de terapia intensiva, e outros 50 que trabalham em
enfermarias normais de hospital, em especialidades como cirurgia, obstetrícia e ginecologia e
ortopedia. Os resultados obtidos foram de uma média de SB de 76% entre os médicos cerca de
dois meses após o início da pandemia no país, o que é superior aos estudos realizados em
períodos normais, sendo mais frequente entre os trabalhando em enfermarias “normais”, com
86% apresentando sintomas, do que entre os atuantes na linha de frente, dos quais 66%
apresentaram a SB (DIMITRIU; PANTEA-STOIAN; SMARANDA; et. al, 2020).
Considerando os estudos explorados nesta revisão, a maioria evidenciou um aumento
percentual da frequência de casos durante o primeiro ano da pandemia, comparando-se os dados
pré e pós pandêmicos. Boa parte dos estudos trabalhou com amostras muito heterogêneas,
abrangendo médicos de diversas especialidades, com apenas dois estudos focando em
especialidades consideradas de alto risco, o que torna difícil entender detalhes específicos de
cada especialidade e comparar a real diferença na prevalência de SB entre especialidades com
maior demanda durante a pandemia e as consideradas de menor risco.
Pode-se inferir, a partir dos dados encontrados, que a alta prevalência de SB na classe
médica durante a pandemia do COVID-19, possivelmente está associada a fatores de risco como
sexo feminino, falta de acesso a equipamentos de proteção individual (EPI) adequados, risco
de contaminação e medo de infectar amigos e familiares, desconhecimento sobre a doença,
sentimento de impotência diante da evolução negativa do quadro de pacientes, a necessidade
de trabalhar em áreas que não estão habituados, alto fluxo de pacientes, aumento das jornadas
de trabalho, falta de recursos e infraestrutura nos serviços de saúde e o atraso salarial.
4 CONCLUSÕES
O presente estudo pretende contribuir com a ampliação do conhecimento acerca da SB
e seus fatores determinantes, além de sua prevalência na classe médica, em especial no caótico
cenário pandêmico da COVID-19. De acordo com os dados encontrados, houve números
maiores na prevalência de SB nas amostras do contexto pandêmico. Enquanto no período
anterior à pandemia foram encontrados percentuais de no máximo 81,5%, as pesquisas no
âmbito da pandemia de COVID-19 revelaram números de até 100%. No entanto, para uma
melhor confiabilidade dos resultados, são necessários mais estudos que possam neutralizar
alguns dos vieses identificados por esta revisão: amostras muito heterogêneas, algumas muito
pequenas e estudos que não especificaram se o diagnóstico de SB foi confirmado por psiquiatra
experiente ou apenas por escala diagnóstica.
Algumas desvantagens observadas nos estudos sobre a prevalência de SB entre médicos
durante a pandemia da COVID-19 foram a dificuldade de encontrar trabalhos que
especificassem dados sobre a classe médica, pois a maioria era voltada para avaliação de
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