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ASSINCRONIA PACIENTE- CAPÍTULO

VENTILADOR E POSSÍVEIS
SOLUÇÕES
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Thiago Rios Soares
Pedro Henrique Barbosa
Thiago Araújo de Melo

O que você irá ver nesse capítulo:

✓ Introdução
✓ Assincronias paciente-ventilador - Conceitos e implicações
✓ Assincronias paciente-ventilador - Impactos clínicos e instrumen-
tos diagnósticos
✓ Interação paciente-ventilador e seus fundamentos na equação do
movimento
✓ Assincronia paciente-ventilador - Fatores de riscos
✓ Assincronia paciente-ventilador - Tipos de assincronias
✓ Assincronia de disparo
Disparo ineficaz ou falha de disparo
Hiperinsuflação dinâmica vs disparo ineficaz
O papel da PEEP extrínseca na diminuição dos esforços inefetivos
Nível de assistência vs falha de disparo
Autodisparo
Duplo disparo
Assincronia de fluxo
Assincronias de ciclagem
Assincronias nas fases de expiração
✓ Considerações Finais
✓ Quadro-resumo
✓ Quadro esquemático

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CAPÍTULO 9

INTRODUÇÃO

A síndrome gripal é uma doença que pode ter diferentes causas. En-
tre elas, a infecção pelo vírus influenza, parainfluenza, adenovírus ou
vírus sincicial respiratório, podendo ser ocasionada também por bacté-
rias. Tem como principais características clínicas a febre acompanhada
de tosse, dor de garganta, dor de cabeça, dor no corpo e dor articular. Os
sintomas geralmente são de curta duração com tempo médio de uma
semana. A influenza constitui uma das grandes preocupações em saúde
pública devido ao seu impacto na morbimortalidade da população.1
Em dezembro de 2019, um surto de uma nova doença de corona-
vírus (COVID-19) foi relatado em Wuhan, China, se apresentando como
um dos maiores desafios sanitários em escala global deste século. Na
metade do mês de abril, poucos meses depois do início da epidemia, já
havia ocorrido mais de 2 milhões de casos e 120 mil mortes no mundo
por COVID-19.2,3
Atualmente, no Brasil já foram registrados mais de cinco milhões de
casos confirmados e pouco mais de 158 mil mortes pela doença4. A apre-
sentação clínica se assemelha a sintomas leves de pneumonia viral e a
gravidade da doença pode variar de leve a grave. Aproximadamente 80%
dos pacientes apresentam manifestação leve e 20% desenvolvem formas
graves da doença, incluindo insuficiência respiratória aguda hipoxêmica
(IRpA), SARS, SDRA e insuficiência renal aguda (IRA) com necessidade de
admissão em unidade de terapia intensiva (UTI), requerendo até mesmo
a utilização de suporte ventilatório mecânico (SVM)5. Estudos apontam
que a gravidade da doença está associada à idade avançada, obesidade
e presença de comorbidades como hipertensão arterial6.
O uso de suporte ventilatório invasivo é determinante para a preser-
vação da vida nos casos graves e tratamento da insuficiência respirató-
ria aguda de natureza grave. Observa-se através de relatos científicos
que o tempo de ventilação mecânica (VM) pode variar chegando atingir
de duas a quatro semanas em alguns casos. Além disso, complicações,
como pneumonia associada à VM, tromboembolismo pulmonar e assin-
cronias paciente-ventilador de difícil resolução contribuem para o au-
mento da morbidade e mortalidade7.
O uso apropriado da ventilação mecânica reduz a mortalidade, a
ocorrência de complicações, o número de dias de VM, além do tempo de
permanência em UTI e os custos hospitalares. Contudo, erros nos ajustes

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ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

ou gerenciamento dos parâmetros do ventilador mecânico podem cau-


sar graves iatrogenias, prolongamento do tempo de ventilação e risco
de morte. Assim sendo, torna-se essencial um gerenciamento adequado
das demandas ventilatórias em pacientes ventilados artificialmente per-
mitindo apropriada adaptabilidade e correção da trocas gasosas.
Neste capítulo, abordaremos de forma concisa e didática as princi-
pais formas de assincronias existentes entre o paciente e o ventilador
mecânico, o papel do fisioterapeuta frente a este cenário, bem como as
soluções baseadas nas evidências científicas.

ASSINCRONIAS PACIENTE-VENTILADOR -
CONCEITOS E IMPLICAÇÕES

Comumente descrita como interação paciente x ventilador e/ou


sincronia paciente-ventilador e/ou assincronia paciente-ventilador, o
entendimento e compreensão da simultaneidade da atuação dos mús-
culos respiratórios com o ventilador mecânico artificial durante o supor-
te ventilatório invasivo e não invasivo traduz um campo de constantes
dúvidas na pratica clínica dos profissionais responsáveis pela condução
destes pacientes.11,12,13,20 De maneira geral, podemos conceituar sincro-
nia paciente x ventilador como a sincronização de todas as fases do ciclo
ventilatório programadas pelo ventilador com o estímulo neural do pa-
ciente. Define-se uma relação de equilíbrio ‘perfeito’ entre o tempo da
máquina (oferta) e o tempo neural do paciente (demanda).14,15
Ainda nesse contexto, a assincronia paciente-ventilador pode ser de-
finida como um desacoplamento entre o paciente, em relação às suas
demandas de tempo, fluxo, volume e/ou pressão, e o ventilador mecâ-
nico, que as ofertam durante o suporte ventilatório artificial.16 As assin-
cronias podem variar desde alterações sutis, que exigem alta suspeição,
monitorização refinada e formação técnica para sua detecção, até a evi-
dente ‘briga’ entre paciente e ventilador, perceptível pela simples inspe-
ção do paciente mecanicamente ventilado14,17.
Diante da complexidade do controle ventilatório do ser humano, a
tarefa de sincronizar a temporização ventilatória e o esforço do paciente
é desanimadora18. O fato de parecermos capazes (do ponto de vista clí-
nico) de conseguir o conforto do paciente e a sincronia na maioria deles
desmente essa complexidade, mas também pode representar a nossa

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CAPÍTULO 9

incapacidade em detectar a assincronia paciente-ventilador16. As assin-


cronias podem estar presentes de 10% a 80% de todos os ciclos ventila-
tórios e estão associadas a um prolongamento no tempo da ventilação
mecânica e no tempo da internação na UTI.19,21,24
Uma das consequências da assincronia reflete-se no binômio su-
bassistência e superassistência. A subassistência pode resultar em uma
carga excessiva nos músculos respiratórios ou lesão pulmonar devido
a volumes correntes excessivos e lesão autoinfligida pelo paciente. A
superassistência, por sua vez, em especial quando associado a drogas
depressoras do drive respiratório, pode resultar em menor trabalho ins-
piratório do paciente, maior desuso e disfunção da musculatura, além de
levar ao disparo reverso (tipo específico de assincronia discutida adian-
te), o que também poderá piorar a lesão pulmonar de forma multifato-
rial. Assim sendo, identificar o tipo de assincronia e suas causas é crucial
para um tratamento eficaz8.
Nas últimas décadas, houve um avanço e desenvolvimento tecnoló-
gico muito grande na confecção da maioria dos ventiladores mecânicos
artificiais. Esse avanço pode ser traduzido, dentre outras possibilidades,
na habilidade em mostrar as formas de ondas ventilatórias e assim per-
mitir de forma rotineira e dinâmica na beira do leito, a avaliação quali/
quantitativa da mecânica ventilatória estática e da interação paciente x
ventilador.25,26 Entretanto, e por causas multifatoriais na formação das
competências humanas correlacionadas ao manejo ventilatório, tais
adventos tecnológicos ainda não reportam manejos e diagnósticos es-
sencialmente assertivos no que tange à interação paciente x ventilador,
destacando-se que entre a modernidade do ventilador e o tão especiali-
zado controle neural respiratório do paciente, existe a operacionalização
profissional dependente e as consequências levadas ao paciente desta
interface homem-máquina.27,20,13
Ainda neste racional, parece confortável afirmar, junto a outros es-
pecialistas, que a interação paciente-ventilador, no que tange mais es-
pecificamente ao conceito de assincronia, poderia ser primariamente
descrita como assincronia ventilador-paciente e não assincronia pacien-
te-ventilador como habitualmente é descrita. Afinal, por vezes essa ‘bri-
ga’ durante o suporte invasivo começa primariamente entre os profissio-
nais que estão à frente deste gerenciamento com o ventilador, a partir
daí impactando o paciente. Tal razão não se trata de uma mera alusão

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semântica, e sim denota claramente que na grande maioria das vezes


esse desacoplamento, apesar de multifatorial e dependente de fatores
tanto do ventilador quanto do paciente como veremos adiante, reporta
a inabilidade dos operadores destas máquinas cada vez mais modernas
em gerenciarem-nas com foco em evitar as assincronias primariamente
oriundas do ventilador e/ou usar todas as potencialidade deste para ate-
nuar e/ou corrigir aquelas advindas do paciente28.

ASSINCRONIAS PACIENTE-VENTILADOR -
IMPACTOS CLÍNICOS E INSTRUMENTOS DIAGNÓSTICOS

Em termos clínicos, as consequências provocadas pela assincronia


são diversas, incluindo hipoxemia, comprometimento cardiovascular,
desconforto ventilatório, ansiedade, comprometimento da qualidade
do sono, ventilação mecânica prolongada, lesão diafragmática e possí-
vel correlação com mortalidade27,28,29. Tem sido relatado na literatura que
as assincronias ocorrem em 25% a 100% dos pacientes, independente-
mente do modo de ventilação mecânica9,10.
A fim de se quantificar o fenômeno, alguns autores têm proposto o
índice de assincronia (IA), definido como a proporção de eventos as-
sincrônicos em relação a todos os ciclos respiratórios, ou seja, tanto os
ofertados pelo ventilador quanto aqueles efetivamente deflagrados ou
não pelos pacientes (Figura 01) 21. Uma alta incidência de assincronia é
comumente definida como um índice de assincronia > 10% e pode estar
relacionada a desfechos clínicos e funcionais desfavoráveis, conforme é
mostrado na Figura 0220,21,27,29,30.

Figura 01: Cálculo do índice de Assincronia (IA)

IA = Números de eventos x 100%


FR total

Fonte: adaptado de Holanda MA, Vasconcelos RDS, Ferreira JC, Pinheiro BV. Assincronia
paciente-ventilador. J Bras Pneumol. 2018;44(4):321-33.

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CAPÍTULO 9

Figura 2: Implicações clínicas das assincronias paciente-ventilador

Diaphragmatic
dysfunction (VIDD) Difficult and prolonged
weaning

ASYNCHRONY

Sleep disruption

Temporary and/or persistent


Dyspnea neuropsychological alterations

Fonte: Adaptado de Mirabella L, Cinnella G, Costa R, Cortegiani A, Tullo L, Rauseo M, Conti G, Gre-
goretti C. Patient-Ventilator Asynchronies: Clinical Implications and Practical Solutions. Respir Care.
2020;65(11):1751-66.

Os índices para quantificação das assincronias são vários e calcula-


dos de forma desigual37. Essas discrepâncias podem, em parte, expli-
car por que diferentes estudos relatam resultados desiguais e às vezes
contrastantes com relação aos desfechos clínicos21,35. Em particular, os
estudos que consideram apenas as assincronias principais (assincro-
nias de disparo) parecem mais propensos a mostrar efeitos nos resul-
tados clínicos, em comparação com aqueles que também incluem as
assincronias secundarias no cálculo do IA. Além disso, as amostras de
pacientes são bastante pequenas na grande maioria dos estudos, o
que limita a possibilidade de destacar diferenças20,21,30.
Antes de projetar outras investigações clínicas para estabelecer se
existe uma relação entre a assincronia paciente-ventilador e os resulta-
dos clínicos, parece necessário alcançar uma padronização da maneira
como os índices que avaliam a taxa de assincronia são calculados32.
Além disso, estudos futuros devem ser desenhados para determinar o
papel das assincronias na predição do prognóstico dos pacientes e se

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ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

a relação entre a taxa de assincronia e a piora do resultado é causal ou


apenas associativa.29,30,31
Ainda dentro desse contexto, vale destacar que a variável mais im-
pactante quando falamos em prática baseada em evidência reporta ao
desfecho mortalidade. Assim, as correlações direta e indireta entre as
assincronias paciente-ventilador e tal desfecho traduzem um foco de
atenção independente e alguns estudos merecem destaque nessa aná-
lise específica.
Em uma análise secundária, Blanch et al31 descobriram que, embora
os pacientes com índice de assincronia > 10% tivessem taxas seme-
lhantes de reintubação e traqueostomia em comparação com aqueles
com taxas mais baixas, um índice de assincronia > 10% foi associado a
maior mortalidade na UTI e no intra-hospitalar, dados correlacionados
a maior duração de ventilação mecânica neste perfil de paciente. Va-
poridi et al33 concluíram que a presença de esforços ineficazes (assin-
cronia de disparo descrita adiante), bem como sua potência e duração,
estava associada à ventilação mecânica prolongada e maior mortali-
dade hospitalar. Finalmente, Rue et al34 usaram um modelo específico
para investigar o valor de adicionar informações sobre a taxa de as-
sincronia paciente-ventilador para pontuações no sistema Sequential
Organ Failure Assessment (SOFA) para prever resultados. Eles encontra-
ram uma associação entre o índice de assincronia e alta hospitalar, mas
incluir esta informação não melhorou a precisão do prognóstico do
escore SOFA sozinho. Eles concluíram que uma análise mais detalha-
da da assincronia paciente-ventilador, juntamente com outros dados
multidimensionais, seria necessária para confirmar o papel causal da
interação paciente-ventilador nos desfechos e comorbidades dos pa-
cientes ventilados.
A importância de uma análise precisa para diagnóstico e quantifica-
ção das assincronias é crucial. No entanto, conforme já descrito neste
capítulo, uma análise precisa ainda é um desafio na prática clínica di-
ária13,20,27,29,38.
Diante da inferência de que a identificação das assincronias, em
grande parte das vezes, é mais difícil porque a maioria delas ocorre sem
quaisquer sinais clínicos, vale aqui destacar que os princípios básicos
para o diagnóstico da interação paciente-ventilador se fundamentam
inicialmente na formação de especialidade profissional, no treinamen-

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CAPÍTULO 9

to e aperfeiçoamento continuado e principalmente na análise visual


do paciente e do ventilador mecânico29. Parece muito oportuno afir-
mar que a expertise e assertividade diante da avaliação da interação
paciente-ventilador virá de uma prática clínica pautada na ‘curiosidade’
e ‘inquietação’ de sempre partir da prerrogativa de que algo pode estar
errado e que olhar e olhar e olhar parece ser de fato algo crucial na
construção do diagnóstico.
Na prática clínica em pacientes mecanicamente ventilados, usual-
mente começamos a atentar para a interação paciente-ventilador a
partir da nossa percepção da presença do drive muscular respiratório.
De fato, o real entendimento da fisiologia do drive muscular respira-
tório, especialmente em pacientes críticos na UTI, desmente a nossa
percepção simplista e objetiva à beira-leito de resumir tal complexi-
dade neuromioarticular ao fato de buscarmos apenas a resposta so-
bre a prerrogativa do paciente estar ‘entrando/participando’ ou não da
ventilação nas suas diversas modalidades39. Compreender a complexa
neurofisiologia do drive muscular respiratório (Figura03) se torna es-
sencial para o dimensionamento do quão complexo é a avaliação da
interação paciente-ventilador.

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ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 03: Cálculo do índice de Assincronia (IA)

Fonte: adaptado de Jonkman AH, de Vries HJ, Heunks LMA. Physiology of the Respiratory Drive in ICU
Patients: Implications for Diagnosis and Treatment. Crit Care. 2020;24:104.

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CAPÍTULO 9

Outrora, rotineiramente a avaliação do drive muscular respiratório


nos pacientes mecanicamente ventilados perpassava a breve desco-
nexão da ventilação mecânica e inspeção do tórax para uma avaliação
qualitativa da função respiratória. Entretanto, e especialmente conside-
rando o surto de uma nova doença de coronavírus (COVID-19), na qual o
risco de contagio por aerolização é a principal gênese da disseminação
da doença, tal estratégia não mais passou a fazer parte do escopo de
avaliação dos profissionais no cuidado destes pacientes40.
Com o avanço tecnológico na confecção dos ventiladores mecânicos
artificiais e a habilidade destes em mostrar de forma dinâmica e contínua
as formas de onda ventilatória de forma acessível a todos, a assincronia
paciente-ventilador pode ser diagnosticada/avaliada através da análise
das curvas de fluxo, volume e pressão no tempo, bem como os loops
fluxo x volume e pressão x volume11,13,16,25,29. No entanto, se não houver
interpretação correta dessas curvas, a assincronia não será detectada e
corrigida adequadamente. A monitorização da pressão esofágica, ati-
vidade elétrica do diafragma, eletromiografia do diafragma, ultrassom
diafragmático e métodos automáticos incorporados a software podem
fornecer informações adicionais importantíssimas ao gerenciamento
das assincronias, entretanto, tais informações não são usadas rotineira-
mente, requerem custos adicionais associados e necessitam de disposi-
tivos invasivos41,42,43,44,45. Dessa forma, a análise das curvas do ventilador
acaba sendo mais prática no dia a dia para monitorização da sincronia
paciente-ventilador.

INTERAÇÃO PACIENTE-VENTILADOR E SEUS FUNDAMENTOS


NA EQUAÇÃO DO MOVIMENTO

A compreensão da interação paciente-ventilador tem subsídio teó-


rico e prático no entendimento da equação do movimento29,46 (Figura
04). Descrita desde a década de 1950, a equação do movimento diz
que durante o suporte ventilatório invasivo a força da máquina (ven-
tilador) mais a força dos músculos respiratórios devem sobrepujar os
componentes elástico e resistivo do sistema respiratório, ou seja, esses
dois vetores de força de forma isolada ou associada devem vencer a
impedância do sistema.

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ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 04: Euação do movimento

PSR = PAO + Pmus = V' x R + V + K [1]


C

onde PSR é pressão do sistema respiratório, PAO é a pressão na abertura


da via aérea, Pmus é a pressão gerada pela musculatura respiratória, V é o
volume, V' é o fluxo, R é a resistência das vias aéreas, C é a complacência
do sistema respiratório, e k é a constante que representa a positive end-
-expiratory pressure (PEEP, pressão expiratória final positiva, ou quando
associada a auto-PEEP, PEEP total).

Fonte: Saddy F. Avaliação da Mecânica Respiratória na Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo.


Pulmão RJ. 2011;20(1):31-36.

Apesar da análise da equação do movimento traduzir uma relação


mecânica direta e interdependente apenas do binômio força x carga
imposta, esta acaba sendo influenciada por diversos fatores que geram
a multifatoriedade que embasa a gênese da interação paciente-ven-
tilador29, (Figura 05). De fato, uma combinação de fatores químicos,
mecânicos, reflexos, comportamentais e emocionais contribui para o
impulso respiratório nos pacientes em suporte ventilatório e isso deve
ser devidamente compreendido e diagnosticado para melhor discer-
nimento sobre a sincronia paciente-ventilador e as perspectivas tera-
pêuticas corretivas ou permissivas durante o gerenciamento destes
pacientes39.

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CAPÍTULO 9

Figura 05: Fatores que influenciam diretamente


a equação do movimento durante a Ventilação Mecânica

Fonte: Adaptado de Branson R. Understanding and implementing advances in ventilator capabilities.


Current Opinion in Critical Care. 2004;10(1):19.

ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR - FATORES DE RISCOS

A principal função do sistema respiratório é realizar o intercâmbio ga-


soso e assim manter a normoxigenação e ventilação. O fato é que, como
uma entidade nosológica paralela à criticidade dos pacientes mecani-
camente ventilados, a dissincronia paciente-ventilador pode impactar
diretamente essa função e, a partir deste distúrbio ‘adicional’ nas trocas
gasosas (hipoxemia e hipercapnia), piorar desfechos clínicos e funcionais.
Fatores relacionados tanto ao paciente quanto ao ventilador mecânico
artificial estão correlacionados à interação paciente-ventilador conforme
mostram a Figura 06 e a Tabela 01 21,,29,31,49.

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ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 06: Fatores de riscos relacionados às características do paciente e do ventila-


dor na etiologia das assincronias. NIV = ventilação não invasiva

Patient's respiratory mechanics Leaks and interface


(obstructive or restrictive) characteristics
Palient effort during NIV

Sedatives
Cycle asynchrony
Level of assistance
Cycling criteria
(eg, time, volume, flow)

Ventilator setting Ventilator characterístics


(eg, turbine, gas compressed
expiratory valve technology)

Fonte: adaptado de Mirabella L, Cinnella G, Costa R, Cortegiani A, Tullo L, Rauseo M, Conti G, Gre-
goretti C. Patient-Ventilator Asynchronies: Clinical Implications and Practical Solutions. Respir Care.
2020;65(11):1751-66.

Tabela 01: Fatores de riscos associados a sincronia paciente-ventilador

Ventilator Factors
Trigger variables: esophageal pressure, flow, or shape signal
Sensitivity setting
Rise-time capability
Design, mode, and settings of the flow delivery system
Flow pattern selected
Design of the exhalation valve
How positive end-expiratory pressure is generated by the software
Extraneuos flow (eg, from a nebulizer or added oxygen)
Patiente Factors
Sedation level: pain, splinting
Inspiratory effort/respiratory drive; neural timing
Pathology of the respiratory system or abdomen; secretions
Intrinsic positive end-expiratory pressure
Size and type of airway
Presence of leaks
Fonte: adaptado de Nilsestuen JO, Hargett KD. Using ventilator graphics to identify patient-ventilator
asynchrony. Respir Care. 2005;50(2):202-34.

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CAPÍTULO 9

ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR -
TIPOS DE ASSINCRONIAS

Tradicionalmente, as assincronias paciente-ventilador eram correla-


cionadas única ou primariamente à fase de disparo do ciclo ventilatório
mecânico artificial29,49. Tal inferência tem respaldo na literatura, haja vista
que as assincronias de disparo, também conceituadas como assincronias
principais, são mais incidentes/prevalentes durante o tempo total de ven-
tilação mecânica, independentemente do perfil clínico-funcional do pa-
ciente estudado13,21,29,35,36,50.
Ainda neste contexto, vale destacar que assim como existe um claro
subdiagnóstico das assincronias de forma geral, quer seja pela falta de ex-
pertise e formação dos profissionais ligados ao cuidado destes pacientes,
quer seja pelo não acesso rotineiro a novos métodos diagnósticos mais
sensíveis/específicos para tal; é claro e explicito que a detecção das assin-
cronias de disparo é mais abrangentemente discutida e estudada tanto no
âmbito prático quanto cientifico.
A detecção automática das assincronias em tempo real, por exemplo,
método extremamente promissor e baseado em uma abordagem de
aprendizado da máquina através de softwares específicos, tem a maioria
dos seus sistemas operacionais primariamente e, por vezes, unicamente
destinada a reconhecer tipos específicos apenas de assincronia de dispa-
ro37,38,45,50. Em contrapartida, essas inferências não substituem a razão que
temos hoje de que, durante o suporte ventilatório invasivo, a má interação
paciente-ventilador ocorre nas quatro fases do ciclo ventilatório, ou seja,
nas fases de disparo, oferta do fluxo, ciclagem e expiração; e é isso que
discutiremos adiante29.

Assincronia de disparo

A assincronia de disparo inspiratório pode ser definida como uma fal-


ta de coordenação entre os critérios de início inspiratório do ventilador
mecânico e a saída dos centros respiratórios do paciente25,29. Para tal com-
preensão, entender os princípios operacionais da sensibilidade dos venti-
ladores mecânicos atuais parece básico e crucial.
Os ventiladores atuais usam dois diferentes mecanismos de disparo
durante a ventilação assistida ou espontânea: aqueles disparos correla-
cionados à sensibilidade a pressão e aqueles a fluxo. No disparo a pres-

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ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

são, esta variável é monitorizada e quando uma alteração na pressão nas


vias aéreas (de grandeza subatmosférica) for igual ou superior a um limiar
preestabelecido (por exemplo: - 1 cmH2O), o ventilador libera fluxo. No
disparo a fluxo, é utilizado um fluxo contínuo de ar no circuito e o meca-
nismo monitoriza a diferença de fluxo entre o circuito inspiratório e ex-
piratório. Quando a redução do fluxo for igual ao ajustado, o ventilador
insufla ar25,29,41,51.
As mudanças na pressão das vias aéreas durante qualquer esforço do
paciente em VM podem ser divididas em duas fases: a fase de disparo pro-
priamente dita (intervalo entre o início do esforço inspiratório do paciente
e o começo da oferta de fluxo pelo ventilador) e a fase pós-disparo (inter-
valo entre o início do fluxo até a máxima redução na pressão de vias aére-
as no tempo inspiratório)51. A fase pré-disparo pouco varia nos diferentes
modos e ajustes de um mesmo ventilador. Entretanto, a fase pós-disparo
sofre grande influência do modo em uso e dos ajustes dos parâmetros do
ventilador mecânico, tornando-a particularmente propensa a gerar dese-
quilíbrios entre atividade da musculatura inspiratória do paciente e o flu-
xo liberado pelo aparelho.
O disparo a fluxo tornou-se preferido por ter um tempo de respos-
ta mais rápido, ou seja, não exige que a válvula expiratória se feche
antes do disparo, diferentemente do disparo a pressão, que depende
de uma contração isométrica dos músculos, queda na pressão do cir-
cuito até um valor estabelecido seguido de fechamento da válvula
expiratória.
O disparo a fluxo, conforme já mencionado acima, ocorre mediante o
vazamento de um fluxo contínuo e baixo e assim a válvula de controle do
fluxo inspirado permanece sempre na posição aberta52. Tais particularida-
des mostram que o trabalho respiratório na fase de disparo é menor com
disparo a fluxo do que a pressão (Figura 07) e, além disso, na fase pós-dis-
paro, apesar dessa não ser uma inferência consensual entre os estudos,
a responsividade do disparo a fluxo pode ser maior do que o disparo a
pressão,51,52.

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CAPÍTULO 9

Figura 07: disparo a pressão e a fluxo VS esforço do paciente

Fonte: Adaptado de Hess DR. Applied Respiratory Physiology: Use of Ventilator Waveforms and Me-
chanics in the Management of Critically Ill Patients. Respiratory Care. 2005;50(1):26-7.

Em um estudo no qual foram comparados o disparo a fluxo e a pres-


são, Aslanian et al54 relataram que quando a sensibilidade selecionada
foi a fluxo, o tempo e o esforço para o disparo foram 43% e 62%, res-
pectivamente, menores em comparação com sua porcentagem duran-
te o disparo a pressão. No entanto, o esforço dos sujeitos durante a
fase pós-gatilho não foi significativamente diferente entre os modos
selecionados.
Giuliani e associados55, comparando disparo a fluxo e a pressão no
modo SIMV, utilizando o ventilador Bennet 7200ae, mostraram que
o produto pressão-tempo (PTP) foi menor com o disparo a fluxo, bem
como o esforço do paciente para sobrepor a hiperinsuflação dinâmica
(PEEPi).
No entanto, os benefícios relativamente modestos encontrados nos es-
tudos indicam que os sensores para disparo de pressão nos novos ventila-
dores estão muito melhorados em relação aos antigos29. Além disso, não
se sabe se essas diferenças encontradas entre os dois tipos de disparo têm
algum impacto na evolução e desfechos do paciente.
Um ponto extremamente relevante quando avaliamos a maior res-
ponsividade do ventilador mecânico artificial ao esforço do pacien-
te foi a aquisição do disparo ou trigger neural10,29. Neste, através da
passagem de uma sonda nasogástrica específica com uma série de
eletrodos na porção esofágica distal, mensuramos a pressão esofági-
ca (que traduz a pressão interpleural e, portanto, a presença de con-
tração muscular respiratória), o que permite a detecção de todos os

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ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

esforços inspiratórios, fornecendo informações precisas sobre a inte-


ração paciente-ventilador41. A observação simultânea das formas de
onda de Paw, fluxo inspiratório, fluxo expiratório e pressão esofágica,
permite ao profissional combinar corretamente o esforço inspiratório
do paciente com cada respiração mecânica. Isso, por exemplo, pode
permitir a identificação do esforço ineficaz (assincronia discutida
adiante) como uma deflexão da pressão esofágica que não é seguida
por um ciclo ofertado pelo ventilador38. No entanto, mesmo que esta
seja uma tendência extremamente promissora na avaliação quali/
quantitativa da interação paciente-ventilador e, portanto, uma técni-
ca padrão para detecção de assincronia, esta medida ainda não está
disponível para uso rotineiro na prática clínica devido à sua invasivi-
dade, custos associados e ausência de evidências mais consensuais
em relação a desfechos57,58.
As assincronias de disparo incluem o disparo ineficaz ou falha de dispa-
ro, o atraso de disparo, o autodisparo, o duplo disparo e o disparo reverso.
A seguir, estudaremos cada subtipo de forma específica.

Disparo ineficaz ou falha de disparo

O disparo ineficaz ou falha de disparo acontece quando o esforço


respiratório do paciente é incapaz de ser reconhecido pelo ventilador,
não permitindo o início do ciclo ventilatório mecânico frente à deman-
da do paciente. Alguns autores afirmam que tal assincronia, juntamente
com o duplo disparo (que discutiremos adiante), é a mais comumente
identificada/diagnosticada à beira-leito pelos profissionais ligados ao
cuidado desses pacientes13,16,29.
Esse evento é fisiologicamente caracterizado pelo aumento da pres-
são transdiafragmática ou por atividade elétrica do diafragma incapaz
de ser identificada pelo ventilador para iniciar o ciclo respiratório. O es-
forço ineficaz, principalmente quando ocorre durante fase expiratória,
ou seja, no recuo elástico do pulmão e ‘relaxamento’ diafragmático, cau-
sa danos estruturais na morfologia destas fibras musculares por gerar
contrações excêntricas ou pliométricas contra um sistema fechado e
sem geração de fluxo18,21,60.
Ademais, esses esforços ‘desperdiçados’ traduzem um somatório de
força no qual a geração de energia e gênese destas alterações/‘sofri-
mento’ muscular supracitado se perpetuam até a efetividade do trigger

17
CAPÍTULO 9

e geração do fluxo. Em tal cenário, quando correlacionado à criticidade


do paciente, a disfunção diafragmática induzida pelo uso do ventilador
e o cenário macro de baixa reserva cardiopulmonar ‘desenha’ um fator
causal prognóstico ruim, devendo ser sistematicamente diagnosticado,
corrigido e/ou minimizado.
Outro ponto extremamente relevante na essência dessa ‘fisiopato-
logia’ da assincronia paciente-ventilador e que merece destaque neste
momento que discorremos sobre a primeira fase do ciclo, o disparo, é o
fato de que as assincronias específicas se interdependem e algumas ve-
zes de forma cronológica e subsequente acontecem desacoplamentos
entre o tempo neural e o tempo da máquina em quase todas as fases
sequenciais do ciclo.
O disparo ineficaz pode ser devido a fatores relacionados ao venti-
lador mecânico, como alto nível de assistência, ciclagem inadequada,
sensibilidade e bias flow elevados, vazamentos, impedância aumenta-
da do circuito, dentre outros, ou por fatores relacionados ao paciente,
como presença de hiperinsuflação mecânica, fraqueza muscular respi-
ratória ou disfunção diafragmática induzida ou perpetuada pela VM,
depressão do drive respiratório (associada ou não à sedação), aumento
da resistência das vias aéreas e/ou diminuição da elastância, dentre ou-
tros, ou pela combinação de ambos21,25,29,54,61.
O esforço ineficaz tem o seu diagnóstico padrão ouro com o uso da
pressão esofagiana e/ou a avaliação da atividade elétrica do diafragma
ou mesmo o uso de métodos automáticos incorporados a software do
próprio ventilador29. Entretanto, como tais instrumentos diagnósticos
não estão disponíveis rotineiramente na prática clínica, a inspeção vi-
sual das formas de onda de fluxo/tempo e pressão/tempo nos permi-
te avaliar de forma dinâmica ciclo a ciclo a interação paciente-ventila-
dor13,21.
De forma prática e usual, podemos avaliar à beira-leito que o esfor-
ço do paciente incapaz de acionar o ventilador produz uma queda da
pressão nas vias aéreas (percebida no gráfico pressão x tempo) conco-
mitante a um aumento do fluxo, percebido no gráfico fluxo x tempo
como uma deflexão (uma ‘ondulação’ para cima) conforme mostram as
Figuras 8 e 9 13,23.

18
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 8: Gráfico de fluxo, pressão nas vias aéreas (Paw), e pressão esofágica (Pes),
respectivamente, evidenciando contração muscular respiratória (seta cinza) e a
grafia correspondente a falha de disparo indicadas pelas setas brancas

Fonte: Adaptado de Holanda MA, Vasconcelos RDS, Ferreira JC, Pinheiro BV.
Assincronia paciente-ventilador. J Bras Pneumol. 2018;44(4):321-33.

Figura 9: Gráfico de fluxo e pressão nas vias aéreas (Paw), respectivamente,


evidenciando a assincronia falha de disparo indicadas pelas setas vermelhas

Fonte: Thille AW, Cabello BB, Galia F, Brochard L. Reduction of patient-ventilator asynchrony by
reducing tidal volume during pressure-support ventilation. Intensive Care Med. 2008;34(8):1477-86.

19
CAPÍTULO 9

A maior causa da assincronia do tipo falha de disparo é a hiperinsufla-


ção dinâmica, que leva ao aparecimento da PEEP intrínseca (PEEPi). Desta
forma, a real compreensão deste fator causal na gênese deste tipo de as-
sincronia merece destaque.

Hiperinsuflação dinâmica vs disparo ineficaz.

O aprisionamento de ar representa o esvaziamento incompleto das uni-


dades pulmonares. As unidades pulmonares com tendência a aprisionar ar
são aquelas com constantes de tempo longas, isto é, com resistência alta e/
ou complacência elevada64. Esse estado de aprisionamento de ar ou hiperin-
suflação dinâmica é comum em pacientes com DPOC e representa o principal
fator complicador durante o suporte ventilatório invasivo nestes pacientes.
Ademais, vale destacar, diante do enfretamento recente que estamos tendo
no manejo ventilatório dos pacientes com COVID19, que esses efeitos exte-
nuantes da auto-PEEP gerada por uma base patológica são ‘mimetizados’ e,
portanto, também causados por consequência de técnicas de suporte venti-
latório de alto risco, incluindo nesta abordagem a ventilação mandatória con-
trolada e assisto-controlada com utilização de altas frequências respiratórias
e as abordagens que intencionalmente reduzem o tempo expiratório, estraté-
gias muito comuns na tentativa extrema de adequar a ventilação minuto com
alvo em uma acidemia pelo menos permissiva neste protótipo clínico50,63.
Ao aumentar a CRF e a pressão alveolar, a auto-PEEP aumenta a predis-
posição ao barotrauma. Além disso, regiões hiperinsufladas podem com-
primir áreas adjacentes normais e adversamente alterar a relação ventila-
ção/perfusão, diminuindo também o retorno venoso e o débito cardíaco64.
Este estado de aprisionamento de ar achata o diafragma e compromete o
funcionamento dos músculos respiratórios, consequentemente reduzin-
do a capacidade do paciente de assumir a carga de trabalho ventilatório.
Além disso, quando existe auto-PEEP, o paciente deve gerar um gradiente
maior de pressão para iniciar o fluxo espontâneo ou disparar o ventilador,
motivo causal na gênese desta assincronia66.
Desta forma, é relevante destacar que a presença da auto-PEEP deve
ser primariamente diagnosticada para assim ser tratada ou atenuada du-
rante o suporte ventilatório invasivo, independentemente do protótipo
clínico em questão. Para tanto, o diagnóstico da auto-PEEP se baseia em
uma avaliação quali/quantitativa usando as formas de onda ventilatória e
as mensurações da mecânica ventilatória65 (Figuras 10,11,12).

20
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 10: Gráfico fluxo-tempo evidenciando avaliação qualitativa para a presença


de auto-PEEP (presença do “degrau” na curva de fluxo x tempo)

Fonte: Adaptado de Blanch L, et al. Measurement of Air Trapping, Intrinsic Positive End-Expiratory Pressure,
and Dynamic Hyperinflation in Mechanically Ventilated Patients. Respiratory Care, Trieste. 2005;50(1):110-24.

Figura11: Gráfico de pressão nas vias aéreas (Paw), fluxo e volume por
tempo evidenciando a presença de auto-PEEP durante uma pausa
expiratória final (avaliação quali/quantitativa)

Fonte: Adaptado de Dhand R. Ventilator Graphics and Respiratory Mechanics in the Patient with
Obstructive Lung Disease. Respiratory Care. 2005;50(2):246-61.

21
CAPÍTULO 9

Figura 12: Curva fluxo-volume mostrando os fluxos inspiratórios e expiratório em


vários volumes pulmonares. A: curva fluxo-volume normal. B: curva fluxo-volume
de um paciente com PEEPi

Fonte: Dhand R. Ventilator Graphics and Respiratory Mechanics in the Patient with Obstructive Lung
Disease. Respiratory Care. 2005;50(2):246-61.

Intervenções que diminuem os esforços ineficientes incluem primaria-


mente medidas que diminuem a magnitude da hiperinsuflação dinâmica
(baixos volumes correntes, tempos expiratórios maiores, diminuição da
resistência de vias aéreas), medidas que aumentam o esforço muscular
respiratório (diminuição do nível de sedação), ajuste da sensibilidade e
do nível do suporte ventilatório e a aplicação de PEEP extrínseca21,25,29,65.
Ainda neste contexto, destaca-se que a titulação da PEEP extrínseca e o
racional sobre o nível de suporte em modo assistido merecem destaque e
serão abordados de forma específica neste capítulo.

O papel da PEEP extrínseca na diminuição dos esforços ine-


fetivos

Pacientes mecanicamente ventilados que desenvolvem PEEPi têm que


gerar uma pressão negativa intrapleural igual ao nível da PEEPi somada ao
nível de sensibilidade do ventilador antes que o disparo ocorra e a venti-
lação da máquina seja iniciada. Quando o esforço inspiratório do paciente
não atingir o valor limiar, o ventilador não entregará o suporte ventilatório
(BRANSON; MACINTYRE, 2001 apud DHAND, 2005). A PEEP/CPAP extrín-
seca (PEEPe) permite que as pressões das vias aéreas centrais e a pressão
alveolar se equilibrem. Como resultado, o gradiente de pressão necessário

22
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

para iniciar o fluxo espontâneo ou disparar o ventilador diminui e com ele


o trabalho respiratório (Figuras 13 e 14).

Figura 13: Efeito da PEEPe na atenuação da auto-PEEP (painel da direita)

Fonte: Dhand R. Ventilator Graphics and Respiratory Mechanics in the Patient with Obstructive Lung
Disease. Respiratory Care. 2005;50(2):246-61.

Figura 14: Efeito da adição de PEEPe (painel da esquerda) na auto-PEEP e na sensibi-


lidade de disparo durante um ciclo assistido pelo ventilador

Fonte: Dhand R. Ventilator Graphics and Respiratory Mechanics in the Patient with Obstructive Lung
Disease. Respiratory Care. 2005;50(2):246-61.

23
CAPÍTULO 9

Putensen e Wrigge68 afirmam que a utilização da PEEPe ≤ 85% do


valor da PEEPi, conhecida através do método de oclusão rápida das
vias aéreas, minimiza a carga inspiratória sem causar nenhum aumento
no volume pulmonar e na pressão intratorácica, contrabalançando a
PEEPi, diminuindo a carga resistiva pulmonar e facilitando o disparo
da máquina.
Em outro estudo, Guérin et al67, admitindo a hipótese de que o trabalho
respiratório decorrente da PEEPi, da resistência das vias aéreas, dos com-
ponentes dinâmicos do sistema respiratório, bem como das proprieda-
des viscoelásticas do tecido torácico, está aumentado nos pacientes com
DPOC e que nenhum estudo havia mostrado os efeitos da PEEPe nestes
componentes isolados do trabalho respiratório, conduziram um estudo fi-
siológico objetivando acessar os efeitos da PEEPe no trabalho inspiratório
(levando em consideração seus componentes específicos) e examinar o
contrabalanço da PEEPi pela PEEPe em dez pacientes com DPOC intuba-
dos e mecanicamente ventilados.
Neste estudo, PEEP em zero, 5, 10 e 15 cmH2O foram aplicadas me-
canicamente e realizadas medidas experimentais no período de 15 a
20 minutos. A adição de PEEPe gerou uma diminuição do trabalho res-
piratório (15,1±5,7; 12,6±5,7; 11,1±4,1 e 10,4±2,8 cmH2O/l nas PEEP de
zero, 5, 10 e 15 cmH2O, respectivamente (p<0,05)), sendo este evento
associado unicamente ao declínio do trabalho respiratório decorrente
especificamente da PEEPi, haja vista os outros componentes do trabalho
inspiratório estudados não serem afetados pela utilização da PEEP. Em
conclusão, afirma-se que aplicações de níveis de PEEP próximos a PEEPi
podem reduzir substancialmente o trabalho respiratório sem promover
ou perpetuar a hiperinsuflação dinâmica em pacientes com DPOC meca-
nicamente ventilados (Figura 15).

24
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 15: Média de valores do WoB estático (barra inteira) e WoB devido a
PEEPi (parte preta da barra) com a aplicação de quatro níveis de PEEP
em pacientes com DPOC em SVI

Fonte: Guérin C, et al. Effect of PEEP on Work of Breathing in Mechanically Ventilated COPD Patients.
Intensive Care Med. 2000;26([s.n.]):1207-14.

Nível de assistência vs falha de disparo

Paradoxalmente à principal causa de falha de disparo relacionado


ao paciente (a hiperinsuflação dinâmica), que fundamenta sua etiolo-
gia causal na própria fase de disparo e trigger do ventilador, os fatores
mais importantes do ventilador que contribuem para os esforços inefi-
cazes não estão relacionados à função de trigagem do ventilador, mas
aos eventos durante a oferta de fluxo, ciclagem e expiração. Neste con-
texto, destaca-se que alto nível de assistência (especialmente no modo
PSV) e assincronia expiratória na forma de retardo da ciclagem são os
fatores relacionados ao ventilador que são normalmente associados
aos esforços ineficazes14.
Leung e colaboradores69 relataram que um maior nível de assistên-
cia (PSV “alto”) pode diminuir profundamente o drive respiratório do
paciente, prolongando o tempo de disparo e/ou aumentando a inefe-
tividade do trigger. A gênese desse fator causal se fundamenta no fato
de que níveis altos de suporte pressórico (especialmente naqueles pa-
cientes com constante de tempo alta) traduzem um aumento do tem-
po da máquina em relação ao tempo neural. Tal tempo neural menor
que o tempo da máquina, por sua vez, conduzirá para uma ciclagem

25
CAPÍTULO 9

tardia que, em última instância, gerará o disparo inefetivo e/ou o atra-


so de disparo 14,69 (Figuras 16 e 17).
Outra assincronia também reconhecida e descrita na literatura, é
o atraso de disparo (Figura 17), que, por sua vez, pode ser associado
aos fatores causais supracitados, porém, como o próprio nome suge-
re, sem a magnitude de falhar em disparar, e sim em atrasar o disparo
da máquina. Ou seja, o atraso de disparo é um intervalo de tempo
entre o início do esforço do paciente e o início da pressurização do
ventilador29.
Para detectar o atraso de disparo, a pressão esofágica ou atividade elé-
trica do diafragma (EAdi) é necessária., logo, o alcance prático sobre a sua
identificação é muito baixo.

Figura 16: Relação entre o nível do suporte pressórico e a


incidência de Disparo inefetivo

Fonte: Kondili E, Xirouchaki N, Georgopoulos D: Modulation and treatment of patient-ventilator


desynchrony. Curr Opin Crit Care. 2007;13:84-9.

26
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 17: Gráfico de fluxo, pressão nas vias aéreas (Paw), e pressão esofágica
(Pes), respectivamente, de um paciente com DPOC severa, com hiperinsufla-
ção dinâmica, recebendo suporte pressórico alto e sem uso de PEEP extrínseca,
evidenciando que há um substancial atraso de tempo entre o início do esforço ins-
piratório do paciente e o início do fluxo pelo ventilador (linha vertical tracejada).
Existem também vários esforços inefetivos, indicados pelas setas pretas

Fonte: Adaptado de Blanch L, et al. Measurement of Air Trapping, Intrinsic Positive End-Expiratory
Pressure, and Dynamic Hyperinflation in Mechanically Ventilated Patients. Respiratory Care, Trieste.
2005;50(1):110-24.

Autodisparo

O autodisparo é uma assincronia oposta à anterior: o ventilador


dispara um ciclo ao reconhecer indevidamente uma variação de fluxo
ou pressão no circuito como sendo um esforço muscular respiratório
espontâneo do paciente. Em outras palavras, o sistema de sensibili-
dade do aparelho é ‘enganado’ por um limiar de disparo inspiratório
extremamente sensível ou por mudanças na pressão e no fluxo que

27
CAPÍTULO 9

podem estar relacionadas a ruído aleatório no circuito do ventilador


(por exemplo, condensação no circuito respiratório, vazamentos ou
oscilações cardiogênicas)18,21,29,70 (Figura 18). Em particular, um grande
volume de ejeção sistólica é capaz de acionar a respiração por oscila-
ção cardíaca, especialmente quando a sensibilidade do acionamento é
muito alta e o impulso do paciente é baixo (por exemplo, um paciente
sedado)18,70 (Figura 19).
Ademais, vale destacar que é muito comum na prática clínica obser-
varmos a grafia nas curvas de fluxo e pressão no tempo compatível com
disparo inefetivo associado aos batimentos cardíacos e às oscilações con-
sequentes sobre o tórax. Desta forma, as oscilações dos batimentos cardí-
acos podem estar associadas à assincronia tipo autodisparo. Entretanto,
na nossa casuística de prática clínica, tal evento se correlaciona mais a um
falso positivo de disparo inefetivo por uma falsa impressão de contração
muscular respiratória (Figura 19).

Figura 18: autodisparo devido a escape de ar por fístula broncopleural

Fonte: Adaptado de Rozé H, Ouattara A. Use of neural trigger during neurally adjusted
ventilatory assist in a patient with a large broncho-pleural fistula and air leakage.
Intensive Care Med. 2012;38:922-3.

28
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 19: Curvas volume-tempo, fluxo-tempo e pressão-tempo,


respectivamente, com respectiva analogia à atividade muscular respiratória
nula, ilustrando o impacto dos batimentos cardíacos na gênese do autodisparo
e na grafia da curva de fluxo tempo e pressão-tempo compatível com
disparo inefetivo (conforme setas), algo também muito comum e
associado a oscilações do precórdio sobre o tórax

Fonte: Adaptado de Holanda MA, Vasconcelos RDS, Ferreira JC, Pinheiro BV. Assincronia paciente-
-ventilador. J Bras Pneumol. 2018;44(4):321-33.

Duplo disparo

O duplo disparo consiste na oferta pelo ventilador de dois ciclos con-


secutivos para apenas um esforço muscular do paciente, ou seja, ocorre
quando um esforço do paciente dispara dois ciclos seguidos. Nesse caso,
o tempo neural inspiratório do paciente é maior que o tempo da máqui-
na21. O ponto importante para diagnóstico dessa assincronia, inclusive
para diagnóstico diferencial em relação ao disparo reverso (que veremos
adiante), é que, no duplo disparo, o primeiro disparo sempre resulta do
esforço do paciente (Figura 20).

29
CAPÍTULO 9

Figura 20: Curvas volume-tempo, fluxo-tempo e pressão-tempo, respectivamente,


com respectiva analogia à atividade muscular respiratória, ilustrando o duplo dis-
paro. Importante salientar que no duplo disparo o primeiro ciclo sempre é dispara-
do pelo paciente e depois, por um tempo na máquina menor que o tempo neural,
ocorre outro disparo com empilhamento do volume corrente

Fonte: Adaptado de Holanda MA, Vasconcelos RDS, Ferreira JC, Pinheiro BV. Assincronia paciente-
-ventilador. J Bras Pneumol. 2018;44(4):321-33.

Juntamente com o disparo inefetivo, o duplo disparo é descrito como a


assincronia mais frequente e prevalente durante o suporte ventilatório inva-
sivo, especialmente em algumas condições clínico-funcionais. Corroboran-
do, Ver et al37, partindo do objetivo de definir a gravidade das assincronias
paciente-ventilador de acordo com a recorrência, estabeleceram como re-
sultado que a assincronia mais comum foi o duplo disparo (64 episódios -
3,9%), e as ações corretivas mais comuns realizadas foram aumentar o fluxo
inspiratório, o volume corrente ou a sedação (35-38 vezes, respectivamen-
te). Ademais, também se concluiu que a presença de SDRA, uso de modo
ventilatório de controle assistido e não volumétrico e uso de dexmedetomi-
dina foram mais associados a esse tipo específico de assincronia.
Em outro estudo bem recente em pacientes com COVID-19, Huiqing et
al observaram que o IA foi de 4,95% (IQR: 1,69–18,93) no total das horas
50

observadas. Os não sobreviventes apresentaram mais IA do que os sobre-


viventes, indicando que a IA é um fator de risco para mortalidade, o que
foi consistente com outros estudos. Além disso, estabeleceu-se como resul-

30
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

tado que os parâmetros do ventilador podem ter efeitos diferentes para a


causa das assincronias. Por exemplo, embora a frequência respiratória mais
alta esteja associada a um risco menor de disparo inefetivo, ela está associa-
da a um risco maior de duplo disparo. O uso de bloqueios neuromusculares
foi associado a menor risco de falha de disparo e duplo disparo. No entanto,
não observamos efeito significativo dos sedativos sobre a IA.
Disparos duplos ocorrem na presença de suspiros, esforços associa-
dos a tosse ou em condições mais sérias em que o volume ou fluxo estive-
rem inapropriadamente baixos. Em seu estudo, Thille et al23 observaram
maior número de disparos duplos em modalidades assisto-controladas
do que em PSV. Os fatores associados aos disparos duplos foram índi-
ce de oxigenação (PaO2/FiO2) mais baixo, baixos tempos inspiratórios,
altos níveis de PEEP e altas pressões inspiratórias máximas, sugerindo
maior severidade da lesão pulmonar. Tais inferências trazem associações
diretas com o protótipo clínico do paciente com COVID-19 no que tange
às características clínico-funcionais da doença e o gerenciamento venti-
latório, apesar de estudos preliminares e observacionais nestes pacien-
tes corroborarem com esses dados.

Disparo reverso

O disparo reverso é uma forma frequentemente subreconhecida de assin-


cronia paciente-ventilador na qual o centro respiratório do paciente é ativado
em resposta a uma insuflação passiva dos pulmões21,29,32. Esta assincronia tem
origem no estimulo à contração dos músculos respiratórios desencadeada pelo
ventilador. Desta forma, o mecanismo fisiológico responsável pelo desencade-
amento reverso parece estar relacionado a mecanorreceptores nos músculos e/
ou parede torácica ou em reflexos espinhais complexos32,72,73. A insuflação passi-
va dos pulmões ativa o centro respiratório neurológico do paciente29,73.
Pesquisas recentes descobriram que o desencadeamento reverso pode
ocorrer não apenas em pacientes com síndrome do desconforto respirató-
rio agudo ou com diagnóstico de morte encefálica, mas em todos aqueles
que recebem ventilação mecânica. Uma vez que o desencadeamento re-
verso pode ser mais frequente do que o esperado e pode estar associado
a lesões no pulmão ou diafragma, a incidência e as causas do desencade-
amento reverso exigem investigação urgente32.
Se pararmos para analisar de forma qualitativa e comparativa as formas
de onda ventilatória nas assincronias de duplo disparo e disparo reverso,

31
CAPÍTULO 9

vamos perceber que ambas têm formatos e tradução funcional ‘iguais’. Afi-
nal, o disparo reverso também é um tipo de disparo duplo. Entretanto, o
fator causal para o estimulo muscular diverge e precisa ser compreendido
neste diagnóstico diferencial.
A monitorização da pressão esofágica é de crucial relevância para tal, pois
o esforço muscular não tem origem no centro respiratório do paciente, mas
sim em um ciclo ofertado pelo ventilador (Figura 21). O termo entrainment ou
arrastamento também tem sido usado para descrever o fenômeno72.
Figura 21: Curvas volume-tempo, fluxo-tempo e pressão-tempo, respectivamente,
com respectiva analogia à atividade muscular respiratória, ilustrando o disparo
reverso. Importante salientar que no disparo reverso o primeiro ciclo
sempre é disparado pelo ventilador conforme percebemos na análise
da contração muscular subsequente a insuflação passiva

Fonte: Adaptado de Holanda MA, Vasconcelos RDS, Ferreira JC, Pinheiro BV. Assincronia paciente-
-ventilador. J Bras Pneumol. 2018;44(4):321-33.

Yoshida et al73 recentemente demonstraram como o acionamento rever-


so pode piorar a lesão pulmonar preexistente por meio de um efeito Pen-
delluft de áreas pulmonares não dependentes em direção a áreas depen-
dentes devido à transmissão deficiente da contração do diafragma através
da superfície pleural em um pulmão lesado. Além disso, o disparo reverso
pode resultar em aumento de tensão e alongamento devido ao empilha-
mento de respiração durante o ciclo duplo causado13, 29,31,73.

32
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

O desencadeamento reverso aparece em pacientes profundamente


sedados, com ou sem lesão pulmonar, e parece particularmente comum
naqueles em transição do estado sedado para o estado desperto. Haro
e colaboradores8 relataram que um terço das respirações de ciclo duplo
foram disparadas reversamente, principalmente em associação com in-
divíduos profundamente sedados que não acionaram o ventilador.

Assincronia de fluxo

A assincronia de fluxo é reconhecidamente uma assincronia que surge


a partir do desequilíbrio entre a demanda ventilatória e a entrega do fluxo
aéreo, ou seja, o fluxo do ventilador mecânico não atinge a demanda do
paciente. Em termos práticos, diríamos que quando o ventilador não é con-
figurado de forma adequada, gera-se um fluxo baixo ou insuficiente que é
normalmente conseguido através da combinação entre o volume corrente
e um tempo inspiratório mal ajustado ou quando as demandas de fluxo ins-
piratório são altas e variam entre os diferentes ciclos ventilatórios.21
Assim sendo, dividiríamos essa assincronia em dois subtipos:

1. Assincronia por fluxo inspiratório insuficiente


Ocorre quando o fluxo ajustado não pode ser elevado pelos esforços
do paciente, como na modalidade volume-controlada (VCV). Nas modali-
dades pressão-controlada (PCV) e pressão de suporte (PSV), ocorre quan-
do os ajustes de pressão são insuficientes em relação ao equilíbrio entre
demanda e capacidade ventilatória do paciente.
2. Assincronia por fluxo inspiratório excessivo
Acontece em VCV, quando o fluxo é superior ao almejado pelo pacien-
te, ou em PCV ou PSV, por altas pressões ou um rise time mais rápido.

Compreendido conceitualmente como a velocidade com que o ar é


ofertado ao paciente, o gerenciamento do fluxo durante o suporte ventila-
tório invasivo traduz-se claramente em um desafio, sendo compreendido
por alguns especialistas como o ajuste mais ‘dinâmico’ dentre as variáveis
de controle direto e indireto. De fato, parece muito racional entendermos
que a variável fluxo correlaciona-se direta e intimamente com o binômio
oferta x demanda, que não somente rege o conceito mais amplo de in-
teração paciente-ventilador, mas guarda essa ‘intimidade’ com os ajustes
direto e indireto do fluxo durante a ventilação mecânica.

33
CAPÍTULO 9

Dessa forma, a abordagem terapêutica para aqueles pacientes com


desacoplamento na fase de oferta do fluxo pode incluir uma redução da
demanda ventilatória: correção de febre, ansiedade, dor, acidose, entre
outros, e/ou aumento da oferta de fluxo por ajustes apropriados a cada
modo observando-se o conforto, o uso da musculatura acessória, as vari-
áveis direta e indireta, disponíveis ou não de gasto energético e, em espe-
cial, a conformação da curva pressão-tempo18,21,29.
De fato, a simples análise da curva pressão x tempo, disponível em to-
dos os ventiladores mecânicos atuais e, portanto, de acesso a todos, ofere-
ce subsídios objetivos e qualitativos muito precisos sobre as assincronias de
fluxo13,25,28. De forma didática e objetiva, podemos inferir de forma direta se a
relação entre a oferta e a demanda está em equilíbrio, observando a ‘porção
ascendente’ da curva de pressão x tempo. Nesta, todas as vezes que temos
uma relação retilínea ou convexa voltada para a ‘porção superior’, podemos
afirmar que ali temos uma demanda atendida. Em contrapartida, todas as ve-
zes que se forma uma concavidade voltada para cima na curva de pressão x
tempo podemos inferir oferta aquém da demanda do paciente (Figura 22).

Figura 22: Curva de pressão x tempo durante um ciclo controlado e durante


a presença de drive muscular

Fonte: Adaptado de Nilsestuen JO, Hargett KD. Using ventilator graphics to identify patient-ventilator
asynchrony. Respir Care. 2005;50(2):202-34.

34
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Tal racional de fato tem impacto direto sobre o modo volumétrico


‘tradicional’, no qual a taxa de fluxo é uma variável de controle fixa e por
vezes a demanda supera a oferta de forma pontual ou mantida (Figuras
23 e 24).

Figura 23: Curva de pressão, fluxo e volume no tempo; evidencia-se dois ciclos
no modo volumétrico com fluxo titulado e fixo. No primeiro, temos um ciclo
controlado e, no segundo, temos presença de drive e uma concavidade voltada
para cima na conformação da onda pressão x tempo traduzindo demanda
não atendida. As linhas hachuradas seriam o padrão de equilíbrio

Fonte: Adaptado de Nilsestuen JO, Hargett KD. Using ventilator graphics to identify patient-ventilator
asynchrony. Respir Care. 2005;50(2):202-34.

35
CAPÍTULO 9

Figura 24: Curva de pressão, fluxo e volume no tempo no modo assisto-controlado


a volume, evidenciam-se três ciclos. No primeiro, temos um ciclo controlado e, no
segundo e terceiro, temos presença de drive muscular e uma concavidade progres-
siva entre os ciclos voltada para cima na conformação da onda pressão x tempo
traduzindo demanda não atendida (seta preta)

Fonte: Adaptado de Nilsestuen JO, Hargett KD. Using ventilator graphics to identify patient-ventilator
asynchrony. Respir Care. 2005;50(2):202-34.

Quando em modo VCV, uma mudança para os modos PCV ou PSV,


que têm fluxo livre, pode ser uma boa alternativa. Além disso, é também
relevante destacar que a evolução da ventilação mecânica ao longo de
décadas se fez com o propósito de melhor adequar a oferta e demanda
e tornar o ventilador ‘sensível’ ao paciente. Desta forma, alguns recursos
foram criados e disponibilizados nos ventiladores mecânicos mais atuais
com o objetivo primário de racionalizar a variável de fluxo, destacando o
rise time e a porcentagem de ciclagem.(Figura 25)

36
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Figura 25: Linha de tempo e novos recursos em pró da melhor interação


paciente-ventilador

Fonte: Adaptado de Branson R. Understanding and implementing advances in ventilator capabilities.


Current Opinion in Critical Care. 2004;10(1):19.

Neste particular, o ajuste de rise time (tempo de subida) influencia direta-


mente a oferta de fluxo logo após o disparo do ciclo respiratório; apesar desta
não ser uma variável direta sobre a taxa total do fluxo e sim como ele se com-
porta nos primeiros milissegundos em relação à velocidade da oferta (Figura
26). De fato, quanto mais curto for o rise time, mais rápida será a pressurização
inicial do sistema, sendo recomendável um tempo de subida curto em pa-
cientes com sinais clínicos de demanda ventilatória não atendida. A assincro-
nia por fluxo excessivo ocorre pela oferta exagerada de fluxo inspiratório. Em
alguns casos, uma pressurização excessiva pode ocorrer, caracterizando um
overshoot de entrada de fluxo nos modos PCV ou PSV13,18,21,29,52 (Figura 27).
Figura 26: Curvas de pressão e fluxo no tempo mostrando um ajuste com
rise time lento, médio e rápido

Fonte: Adaptado de Nilsestuen JO, Hargett KD. Using ventilator graphics to identify patient-ventilator
asynchrony. Respir Care. 2005;50(2):202-34.

37
CAPÍTULO 9

Figura 27: Curva de pressão e fluxo no tempo evidenciando um rise time


curto (rápido) visto pelas setas na curva de fluxo x tempo com tradução em
overshoot de entrada percebida pela espícula proximal no gráfico de
pressão x tempo também sinalizado pelas setas

Fonte: Adaptado de Nilsestuen JO, Hargett KD. Using ventilator graphics to identify patient-ventilator
asynchrony. Respir Care. 2005;50(2):202-34.

Outro ponto bem relevante neste racional sobre rise time é que fluxos
em excesso à demanda do paciente podem levar ao aumento do drive res-
piratório e assim podemos por vezes perceber um overshoot de entrada
seguido de um duplo disparo e/ou disparo reverso.

Assincronias de ciclagem

As assincronias ventilador-paciente do tipo ciclagem são aquelas que


dizem respeito à fase de transição da fase inspiratória para a fase expirató-
ria do ciclo respiratório e podem ser caracterizadas como assincronias por
ciclagem precoce (ou prematura) e ciclagem tardia.
O ideal é que o tempo inspiratório do ventilador fosse sempre equiva-
lente ao demandado pelo paciente, porém essa é uma tarefa relativamen-
te difícil, e este é o contexto em que as assincronias tipo ciclagem apare-
cem, sendo caracterizadas por uma diferença entre o tempo inspiratório
do paciente e o tempo inspiratório ajustado no ventilador mecânico.

38
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Altos níveis de suporte pressórico ou altos volumes levam a tempos


de inspiração mais elevados, bem como altos fluxos levam a uma entrega
por parte do ventilador e consequentemente tempos inspiratórios mais
reduzidos. Portanto, vale ressaltar que o tempo inspiratório ajustado no
ventilador pode ser reflexo de outras variáveis de ajustes ventilatórios
em diferentes modos ventilatórios, como fluxo inspiratório e/ou volu-
me corrente (no modo VCV) e porcentagem de pico fluxo inspiratório
(no modo PSV). Consequentemente, ajustes destes parâmetros alteram
o tempo inspiratório e por fim podem alterar o equilíbrio ou sincronia
entre a demanda ventilatória e entrega por parte do ventilador.

Ciclagem precoce ou prematura

A ciclagem precoce é caracterizada pelo tempo inspiratório redu-


zido em relação ao tempo inspiratório neural por parte do paciente,
ou seja, o fluxo inspiratório termina antes do tempo desejado pelo pa-
ciente, levando por vezes a assincronias posteriores, como duplo dis-
paro. Na figura abaixo, observamos um cenário onde o paciente ainda
não cessou a sua inspiração, entretanto, o ventilador abriu a válvula
expiratória.

Figura 28: Ciclagem prematura

Fonte: Adaptado de de Wit M. Monitoring of patient-ventilator interaction at the bedside. Respir


Care. 2011;56:61-72.

39
CAPÍTULO 9

Diante desse cenário, é importante que os ajustes ou correções das as-


sincronias sejam realizadas após uma análise de forma conjunta, e não
apenas sinalizando um ou outro tipo de assincronia única, haja vista que
geralmente as diferentes formas de assincronias acontecem de forma con-
junta no mesmo ciclo respiratório ou ciclo respiratório seguinte. Na figura
abaixo, o paciente está experimentando dois cenários. Nas setas (a), ob-
servamos assincronias tipo ciclagem precoce e, nas setas (b), observamos
assincronia tipo ciclagem precoce associada a duplo disparo.

Figura29: Em (a), observamos assincronias tipo ciclagem precoce e, em (b), observa-


mos assincronia tipo ciclagem precoce associada a duplo disparo

Fonte: Adaptado de de Wit M. Monitoring of patient-ventilator interaction at the bedside.


Respir Care. 2011;56:61-72.

O ajuste ventilatório diante de um diagnóstico de assincronia do tipo


ciclagem precoce, associada ou não a uma assincronia do tipo disparo du-
plo, baseia-se no aumento do tempo inspiratório para que haja equilíbrio
entre a demanda do paciente (tempo inspiratório neural) e a oferta de
fluxo inspiratório ao paciente (tempo inspiratório ajustado no ventilador).
No modo VCV, o ajuste deverá ser atribuído à redução do fluxo inspi-
ratório e/ou aumento do volume corrente, para que o tempo inspiratório
aumente. No modo PCV, o ajuste será diretamente no tempo inspiratório,
de forma cautelosa, até que desapareça o duplo disparo, ou seja, obser-
vando o limite estabelecido pela linha de equilíbrio ou fluxo zero da curva
fluxo x tempo (aumentos maiores não acarretam ganhos de volume). No
modo PSV, os ajustes resumem-se à redução da porcentagem do pico de
fluxo inspiratório e/ou aumentos dos níveis de pressão inspiratória.

40
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Ciclagem tardia

A ciclagem tardia é caracterizada pelo tempo inspiratório prolongado


em relação ao tempo inspiratório neural do paciente, ou seja, o fluxo ins-
piratório excede o tempo desejado pelo paciente, levando por vezes a re-
percussões musculoventilatórias e assincronias posteriores, como disparo
ineficaz. Nos cenários em que observamos um quadro de ciclagem tardia,
é possível observar claramente um sinal muito claro de que está haven-
do um desequilíbrio entre o tempo inspiratório ajustado no ventilador e
o tempo inspiratório neural do paciente: o ‘overshoot de saída’ na curva
pressão x tempo. Mas o que seria esse ‘overshoot de saída’? Este sinal cor-
responde à contração da musculatura abdominal, que é gerada na tenta-
tiva de o paciente expirar de forma ativa, gerando um aumento pressórico
ao final da inspiração que excede a pressão de suporte pré-estabelecida,
traduzindo justamente uma resposta ao tempo inspiratório prolongado.

Figura 30: Ciclagem tardia

Fonte: Adaptado de Hess DR. Ventilator waveforms and the physiology of pressure support
ventilation. Resp Care. 2005;50(2):166-86.

Diante de uma ciclagem tardia, existe o risco de aparecimento de


auto-PEEP ou hiperinsuflação dinâmica. Pode-se observar, em alguns
cenários clínicos de mecânicas respiratórias obstrutivas, um tempo ex-
piratório reduzido e consequente redução da capacidade de esvazia-
mento pulmonar. O ajuste ventilatório diante de um diagnóstico de
assincronia do tipo ciclagem tardia, associada ou não a uma assincro-
nia do tipo disparo ineficaz, baseia-se na redução do tempo inspirató-
rio. No modo VCV, o ajuste deverá ser atribuído ao aumento do fluxo

41
CAPÍTULO 9

inspiratório e/ou redução do volume corrente. No modo PCV, o ajuste


será diretamente no tempo inspiratório e, no modo PSV, os ajustes re-
sumem-se ao aumento da porcentagem do pico de fluxo inspiratório,
redução dos níveis de pressão inspiratória e/ou aumento do tempo de
subida (rise time).

Assincronias nas fases de expiração

As assincronias nas fases de expiração estão associadas às assin-


cronias de ciclagem, pois, diante de um quadro de ajuste de tempo
inspiratório do ventilador > tempo inspiratório neural do paciente,
observamos por vezes o aparecimento de hiperinsuflação dinâmica,
revelado na curva de fluxo x tempo, em que não observamos a curva
de expiração atingindo a linha de base. Apesar de o aparecimento de
auto-PEEP estar associado à monitorização de mecânica estática do
sistema respiratório, podemos considerar algumas das repercussões
negativas como frequentes formas de assincronia entre o paciente e o
ventilador na fase expiratória.
Diversas são as possíveis causas que geram a famosa auto-PEEP e
poderíamos classificá-las como causas extrínsecas ou intrínsecas.

Repercussões negativas da PEEP intrínseca/assincronias da fase expira-


tória:

• Aumento do tempo para o disparo do ventilador


• Aumento do nível para disparo do ventilador
• Episódios de disparo ineficaz (esforços inefetivos)

Dentre as causas extrínsecas, podemos citar os ajustes equivoca-


dos do ventilador mecânico em relação ao sistema respiratório do pa-
ciente, tais como frequência respiratória elevada, tempo inspiratório
elevado, níveis de pressão ou volume elevados. Por exemplo, ajustes
ventilatórios, únicos ou associados, que reduzam o tempo do ciclo res-
piratório podem gerar redução significativa do tempo expiratório e,
por fim, o aparecimento de auto-PEEP ou hiperinsuflação dinâmica.

42
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Nos pacientes com Sars-CoV2, por vezes em pacientes com me-


cânica pulmonar relativamente normal, o ajuste de frequência
respiratória mais elevada (na busca por vezes equivocada de
correção de PaCO2) tem grande potencial de gerar auto-PEEP e
suas repercussões negativas.

Dentre as causas intrínsecas, destacamos as disfunções respiratórias de


perfil obstrutivo, em que observamos uma limitação ao fluxo expiratório.
Ajustes ventilatórios dito ‘normais’ podem perpetuar a hiperinsuflação
dinâmica que esses pacientes apresentam. Portanto, tais ajustes devem
respeitar a fisiopatologia da doença para que tenhamos uma atenuação
ou desaparecimento da auto-PEEP. Nesses casos, a busca por níveis de
frequência respiratória mais baixos e/ou tempo inspiratório reduzido são
ajustes ventilatórios mais adequados para favorecer uma maior expiração
e observarmos a curva de expiração chegar à linha de base na curva fluxo
x tempo. Na figura abaixo, podemos presenciar as setas escuras revelando
padrão de obstrução e limitação ao fluxo expiratório e, nas setas claras, a
presença de auto-PEEP.

Figura 31: XXXXXXX

Fonte: Adaptado de Georgopoulos D, Prinianakis G, Kondili E. Bedside waveforms interpretation as a


tool to identify patient-ventilator asynchronies. Intensive Care Med. 2006;32:34-47.

43
CAPÍTULO 9

CONSIDERAÇÕES FINAS

Após a discussão dessa temática, sumarizamos os principais tipos de


assincronias e suas respectivas terapêuticas no Quadro abaixo.

Quadro 2. Principais tipos de assincronias paciente-ventilador, fatores associados e


estratégias terapêuticas.

Assincronias Fatores determinantes Estratégias terapêuticas

Disparo

Disparo ineficaz Ventilador:


Mau ajuste ou problemas no mecanis- Ajuste/correção de problemas da sensibilidade
mo de sensibilidade (fluxo mais sensível que pressão)
Tempo inspiratório prolongado Reduzir tempo inspiratório por ajustes em cada
modo (VCV, PCV e PSV)

Paciente:
Fraqueza muscular respiratória Reduzir ou suspender drogas depressoras do
Depressão do comando neural comando neural, sedação ou BNM
Hiperinsufl ação dinâmica (auto-PEEP) Minimizar a hiperinsufl ação e titular PEEP exter-
na (valores inferiores a auto-PEEP), reduzir níveis
de PS (modo PSV)

Duplo disparo Ventilador:


Tempo inspiratório muito curto em Aumentar o tempo inspiratório (VCV ou PCV) ou redu-
relação ao tempo neural zir o limiar de percentual de fl uxo para ciclagem (PSV)
Volume corrente baixo em modo VCV Sedação profunda e/ou BNM na fase precoce de
SDRA grave
Modos com possibilidade de variação do volume
corrente, como PCV

Disparo reverso Esforço muscular decorrente de Reduzir sedação, BNM na fase precoce de SDRA
insuflação mecânica grave

Autodisparo Ventilador:
Sensibilidade “excessiva” Otimização do ajuste de sensibilidade
Vazamento no sistema Correção de vazamentos
Condensado no circuito do ventilador Remoção de condensados
Paciente:
Transmissão de oscilações de pressão Otimização do ajuste de sensibilidade
e/ou fl uxo por batimentos cardíacos

44
ASSINCRONIA PACIENTE-VENTILADOR E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Assincronias Fatores determinantes Estratégias terapêuticas

Ciclagem
Ciclagem prematura Ventilador:
Tempo inspiratório muito curto em Em VCV, diminuir o fl uxo inspiratório e/ou
relação ao do paciente aumentar o volume corrente
Em PCV, aumentar o tempo inspiratório
Paciente:
Mecânica respiratória de padrão Em PSV, reduzir o percentual do critério de cicla-
restritivo no modo PSV, como na gem e/ou aumentar a PS
fibrose pulmonar

Ciclagem tardia Ventilador:


Tempo inspiratório muito longo em Em VCV, aumentar o fl uxo inspiratório
relação ao do paciente Em PCV, reduzir o tempo inspiratório
Paciente:
Mecânica respiratória obstrutiva no Em PSV, aumentar o percentual do critério de ci-
modo PSV, como na DPOC clagem e/ou reduzir a PS e/ou aumentar o tempo
de subida (rise time)

Fluxo
Fluxo insuficiente Ventilador:
Em VCV, ajuste de fluxo muito baixo Em VCV, aumentar o fluxo inspiratório ou mudar
Em PCV e PSV, pressão aplicada muito para modos PCV ou PSV (fluxo livre)
baixa, tempo de subida longo
Paciente:
Excesso de demanda ventilatória, Reduzir estímulo do comando neural e demanda
comando neural elevado metabólica: controlar febre, dor, acidose metabó-
lica e ansiedade

Fluxo excessivo Ventilador:


Em VCV, ajuste de fluxo muito alto Em VCV, reduzir o fluxo inspiratório
Em PCV e PSV, pressão aplicada muito Em PCV e PSV, reduzir a pressão aplicada, aumen-
alta, tempo de subida muito curto tar o tempo de subida (rise time)
(overshoot)

Fonte: Adaptado de Holanda MA, Vasconcelos RDS, Ferreira JC, Pinheiro BV. Assincronia paciente-
-ventilador. J Bras Pneumol. 2018;44(4):321-33..

Para finalizar, gostaríamos de ratificar a razão do complexo entendimen-


to da interação paciente-ventilador, reforçar a necessidade de formação de
especialista e a prática clínica fundamentada não somente na experiência
de tempo de formação como também no aperfeiçoamento contínuo e foco
no cuidado com práticas baseadas em evidências independentes do do-
mínio específico da sua profissão. Ademais, finalizamos este capítulo com
a mensagem que por mais expertise que você tenha no entendimento da
interação paciente-ventilador, mantenha o foco no processo de retirada do
paciente da ventilação mecânica. Afinal, a esta terapêutica daremos sempre
a notória de que ela salva vidas, mas pode piorar o prognóstico daqueles
que não conseguimos desmamar do ventilador.

45
QUADRO RESUMO

FALTOU O
QUADRO
RESUMO

46
QUADRO ESQUEMÁTICO

FALTOU O
QUADRO
ESQUEMÁTICO

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