Você está na página 1de 223

Práticas Culturais

dos Portugueses.
Inquérito 2020
José Machado Pais
Pedro Magalhães
Miguel Lobo Antunes
(coordenadores)
Imprensa de Ciências Sociais

Instituto de Ciências Sociais


da Universidade de Lisboa

Av. Prof. Aníbal de Bettencourt, 9


1600-189 Lisboa – Portugal
Índice
Telef. 21 780 4700 – Fax 21 794 0274

www.ics.ulisboa.pt/imprensa
E-mail: imprensa@ics.ul.pt
Os autores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    17

Instituto de Ciências Sociais — Catalogação na Publicação Prefácio


Práticas culturais dos portugueses : inquérito 2020
/ coord. José Machado Pais, Pedro Magalhães, Miguel Lobo Antunes. Guilherme d’Oliveira Martins . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    19
– Lisboa : Imprensa de Ciências Sociais, 2022. – 23 cm
ISBN: 978-972-671-685-3 Introdução
ISBN E-PUB: 978-972-671-686-0
ISBN PDF: 978-972-671-687-7 José Machado Pais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    23
Práticas culturais-Portugal/ Sociologia da cultura/
Estudos culturais/ Cultura/ Inquéritos Capítulo 1
CDU 316.7
Aspetos metodológicos e sociografia dos inquiridos
Pedro Magalhães e Jorge Rodrigues da Silva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    47

Capítulo 2
Internet, práticas culturais online e distinção
Teresa Duarte Martinho e Tiago Lapa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    55

Capítulo 3
A domesticação da televisão e da rádio na era digital
«pós-radiodifusão»
Tiago Lapa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    99
© Instituto de Ciências Sociais, 2022

Capa: Mariana do Vale Capítulo 4


Paginação: Carlos Vieira Reis A leitura e a frequência de bibliotecas e arquivos no arranque
Revisão: Pedro Cerejo
dos anos 20 do século XXI
Impressão e acabamento: Gráfica Manuel Barbosa & Filhos, Lda.
Depósito legal: 494421/22 Emanuel Cameira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    143
1.ª edição: Fevereiro de 2022
Capítulo 5
Círculos ainda estreitos: museus, monumentos históricos,
sítios arqueológicos e galerias de arte
Teresa Duarte Martinho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    197

Capítulo 6
Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais
e festas locais
Vera Borges . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    235
Índice de Figuras, Gráficos,
Capítulo 7 Quadros e Tabelas
Participação artística e capitais culturais
Rui Telmo Gomes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    285
Figuras
Capítulo 8 Figura 5.1 - Distribuição da população no espaço social.
Práticas culturais e clivagens sociais Representação gráfica do plano fatorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 209
José Machado Pais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    311 Figura 8.1 - Dendrograma das cinco principais classes da partição
de sete clusters resultante de análise de clusters hierárquica . . . . . . . . . 315
Capítulo 9
Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais
Miguel Lobo Antunes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    351 Gráficos
Gráfico 1.1 - Distribuição da amostra por região (%) . . . . . . . . . . . . . . . 49
Anexos Gráfico 1.2 - Distribuição da amostra por habitat (%) . . . . . . . . . . . . . . . 49
Mapeamento dos inquéritos internacionais mais Gráfico 1.3 - Classes socioprofissionais (Oesch, oito categorias) (%) . . 52
utilizados (Anexo 1) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    389 Gráfico 2.1 - Características sociográficas dos utilizadores
Questionário (Anexo 2) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    391 da Internet (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65
Indicadores do questionário (Anexo 3) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    441 Gráfico 2.2 - Equipamentos de acesso à Internet habitualmente
usados (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
Gráfico 2.3 - Tipologia de utilizadores por número de equipamentos
de acesso à Internet habitualmente usados (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
Gráfico 2.4 - Frequência da ligação à Internet para trabalho
ou estudo (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
Gráfico 2.5 - Frequência da ligação à Internet por lazer (%) . . . . . . . . . . 71
Gráfico 2.6 - Média de horas por semana de ligação à Internet,
para trabalho ou estudo e por lazer . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
Gráfico 2.7 - Proporção de indivíduos que apresentam práticas online
frequentes (valores iguais ou superiores a 3) em cada índice (%) . . . . 83
Gráfico 2.8 - Pandemia e mudanças de hábitos no uso de serviços
digitais e da Internet no domínio cultural (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90

9
Práticas Culturais dos Portugueses Índices

Gráfico 2.9 - Principais usos intensificados de serviços digitais Gráfico 4.16 - Utilização da Internet para as seguintes atividades
no domínio cultural durante a pandemia, por idade (%) . . . . . . . . . . . . 90 específicas que envolvem a leitura (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 184
Gráfico 3.1 - Com que frequência se vê televisão (%) . . . . . . . . . . . . . . 107 Gráfico 4.17 - Fontes de informação através das quais se obtém
Gráfico 3.2 - Em média, quantas horas costuma… . . . . . . . . . . . . . . . . . 109 recomendações/ideias de leitura (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 185
Gráfico 3.3 - Média de número de horas de visionamento de TV, Gráfico 4.18 - Frequência com que, na infância e adolescência
por características sociodemográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111 (até aos 15 anos), os seus pais ou outros familiares responsáveis
Gráfico 3.4 - Confinamento e mudanças de hábitos no uso por si lhe liam histórias, ofereciam livros e iam a feiras do livro,
da televisão e da rádio, total (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132 livrarias ou bibliotecas (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 187
Gráfico 3.5 - Confinamento e mudanças de hábitos no uso Gráfico 4.19 - Frequência com que, nos 12 meses anteriores
da televisão e da rádio, por características sociodemográficas (%) . . . 133 ao início da pandemia, se deslocou a bibliotecas ou arquivos (%) . . . 188
Gráfico 4.1 - Objetivos com que se lê mais frequentemente (%) . . . . . 147 Gráfico 5.1 - Frequência das visitas a museus, monumentos históricos,
Gráfico 4.2 - Objetivos com que se lê mais frequentemente, sítios arqueológicos e galerias de arte nos 12 meses anteriores
por grau de instrução do próprio (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 148 à pandemia (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 201
Gráfico 4.3 - Objetivos com que se lê mais frequentemente, Gráfico 5.2 - Espaços patrimoniais visitados há menos tempo,
por idade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149 mesmo que depois do início da pandemia, por tipo (%) . . . . . . . . . . . 203
Gráfico 4.4 - Objetivos com que se lê mais frequentemente, Gráfico 5.3 - Características sociográficas dos visitantes (%) . . . . . . . . 204
por classe socioprofissonal (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 150 Gráfico 5.4 - Localização do espaço visitado (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211
Gráfico 4.5 - Leitura de livros, por formato, nos últimos Gráfico 5.5 - Com quem realizou a visita (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 214
12 meses (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151 Gráfico 5.6 - Atividades realizadas (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 215
Gráfico 4.6 - Frequência de leitura de livros impressos, por classe Gráfico 5.7 - Tipo de ingresso utilizado (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 217
socioprofissional, nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 153 Gráfico 5.8 - Modo de aquisição do ingresso (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 218
Gráfico 4.7 - Frequência de leitura de livros impressos, por tipos Gráfico 5.9 - Referência a ‘falta de interesse’, por grau de ensino
de leitores de livros digitais, nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . . . 159 e classe socioprofissional (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 220
Gráfico 4.8 - Frequência de leitura de livros digitais, por tipos Gráfico 5.10 - Referência a ‘o preço é elevado’, por grau de ensino
de leitores de livros impressos nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . 160 e classe socioprofissional (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 220
Gráfico 4.9 - Frequência e modalidades de acesso a livros Gráfico 5.11 - Frequência de visitas através da Internet (%) . . . . . . . . . 224
impressos, nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163 Gráfico 6.1 - Pessoas que foram ao cinema, por características
Gráfico 4.10 - Frequência e modalidades de acesso a livros digitais sociográficas e «orientação cultural» (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 247
nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 164 Gráfico 6.2 - Pessoas que assistiram a espetáculos e concertos
Gráfico 4.11 - Locais onde se costuma ler livros impressos ao vivo nos 12 meses anteriores ao início da pandemia (%) . . . . . . . . 253
ou digitais (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 165 Gráfico 6.3 - Pessoas que assistiram a espetáculos de ballet
Gráfico 4.12 - Géneros de livros (em formato impresso ou digital) ou dança clássica, por características sociográficas e pela
lidos com mais frequência, nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . . . . 167 «orientação cultural» (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 255
Gráfico 4.13 - Leitura de livros, jornais e revistas, por formato, Gráfico 6.4 - Pessoas que assistiram a espetáculos de teatro,
nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 172 por características sociográficas e pela «orientação cultural» (%) . . . 261
Gráfico 4.14 - Géneros de jornais mais lidos (em formato impresso Gráfico 6.5 - Pessoas que assistiram a espetáculos de circo,
ou digital) nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 175 por características sociográficas e pela «orientação cultural» (%) . . . 263
Gráfico 4.15 - Géneros de revistas mais lidas (em formato impresso Gráfico 6.6 - Pessoas que assistiram a festas locais, por características
ou digital) nos últimos 12 meses (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 178 sociográficas e pela «orientação cultural» (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 270

10 11
Práticas Culturais dos Portugueses Índices

Gráfico 6.7 - Frequência de consumo de filmes, espetáculos, Gráfico 9.1 - Práticas culturais por regiões (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 356
concertos, festivais e festas locais, uma vez por semana ou mais, Gráfico 9.2 - Práticas culturais por habitat (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 358
pela Internet (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 275 Gráfico 9.3 - Práticas culturais por género/sexo (%) . . . . . . . . . . . . . . . 360
Gráfico 6.8 - Omnívorismo digital e in situ, totais nacionais (%) . . . . . 277 Gráfico 9.4 - Frequência de participação em atividades culturais
Gráfico 7.1 - Práticas de lazer, segundo regularidade (%) . . . . . . . . . . . 286 nos últimos 12 meses, no grupo etário dos 65-74 anos (2015) (%) . . 362
Gráfico 7.2 - Práticas de lazer, segundo a perceção da situação Gráfico 9.5 - Práticas culturais por grau de ensino concluído
económica individual (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 287 ou frequentado (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 366
Gráfico 7.3 - Práticas de lazer, segundo género (%) . . . . . . . . . . . . . . . . 289 Gráfico 9.6 - Práticas culturais segundo a perceção dos inquiridos
Gráfico 7.4 - Práticas artísticas amadoras, segundo a situação sobre os conhecimentos que têm para desfrutar da
perante o emprego (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 291 oferta cultural (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 373
Gráfico 7.5 - Prática artística amadora, segundo o nível Gráfico 9.7 - Principais razões para não realizar práticas culturais (%) . 375
de escolaridade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 292 Gráfico 9.8 - Principais razões para realizar práticas culturais (%) . . . . 377
Gráfico 7.6 - Prática artística amadora, segundo a idade Gráfico 9.9 - Principais meios através dos quais surgem ideias
e regularidade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 293 de leitura e se toma conhecimento dos acontecimentos culturais . . . 379
Gráfico 7.7 - Prática artística amadora, segundo a classe
socioprofissional e regularidade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 293
Gráfico 7.8 - Motivações da prática artística amadora (%) . . . . . . . . . . . 294
Quadros
Gráfico 7.9 - Meios utilizados na realização de práticas artísticas
Quadro 1.1 - Composição das categorias de classe socioprofissional . . . 52
amadoras (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 295
Quadro 2.1 - Caracterização sociodemográfica e socioeconómica
Gráfico 7.10 - Meios utilizados na realização de práticas artísticas
dos perfis de internautas relativos às atividades culturais online . . . . . 87
amadoras, segundo o género (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 296
Quadro 3.1 - Caracterização sociodemográfica e socioeconómica
Gráfico 7.11 - Meios utilizados na realização de práticas artísticas
dos perfis relativos aos consumos televisivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116
amadoras, segundo a idade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 296
Quadro 3.2 - Caracterização sociodemográfica e socioeconómica
Gráfico 7.12 - Regularidade de visitas culturais durante infância
dos perfis relativos aos consumos radiofónicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127
e adolescência, segundo o contexto de visita (%) . . . . . . . . . . . . . . . . 297
Quadro 8.1 - Variáveis ativas (práticas culturais) e respetivas
Gráfico 7.13 - Visitas culturais durante infância e a adolescência,
escalas de frequência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 314
segundo a idade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 297
Quadro 8.2 - Variáveis suplementares (sociográficas) e respetivas
Gráfico 7.14 - Visitas culturais durante infância e a adolescência,
categorias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 315
segundo a classe socioprofissional (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 298
Gráfico 7.15 - Área de formação artística não curricular, segundo
o género (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 301
Gráfico 7.16 - Contextos de formação artística, segundo a idade (%) . . 302 Tabelas
Gráfico 7.17 - Fontes de informação sobre a oferta cultural (%) . . . . . 303 Tabela 1.1 - Distribuição da amostra por faixa etária . . . . . . . . . . . . . . . . 50
Gráfico 7.18 - Principais fontes de informação sobre a oferta Tabela 1.2 - Distribuição da amostra por grau de ensino mais
cultural, segundo a idade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 303 elevado concluído ou frequentado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
Gráfico 7.19 - Principais fontes de informação sobre a oferta Tabela 2.1 - Indicadores de acesso e uso da Internet
cultural, segundo a escolaridade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 304 na União Europeia (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
Gráfico 7.20 - Perceção individual de conhecimento para desfrutar Tabela 2.2 - Indicadores de escolaridade, remuneração
da oferta cultural, segundo a classe socioprofissional (%) . . . . . . . . . . . 305 e demografia na União Europeia (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60

12 13
Práticas Culturais dos Portugueses Índices

Tabela 2.3 - Frequência do uso da Internet para consumo Tabela 5.2 - Principais motivos que levaram a realizar a visita (%) . . . . 212
e acesso a conteúdos em formato digital, 2016 (%) . . . . . . . . . . . . . . . . 62 Tabela 5.3 - Com quem realizou a visita (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 214
Tabela 2.4 - Principais razões para não utilizar a Internet (%) . . . . . . . . . 66 Tabela 5.4 - Principais razões por que não visitou ou não visita
Tabela 2.5 - Fatores relevantes preditivos da utilização da Internet . . . . . 74 mais vezes (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219
Tabela 2.6 - Frequência de utilização da Internet para realizar Tabela 5.5 - Lugares reconhecidos como património mundial
as seguintes atividades culturais (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77 pela UNESCO visitados pelo menos uma vez na vida (%) . . . . . . . . 222
Tabela 2.7 - Equipamentos de acesso à Internet usados Tabela 5.6 - Visitas e visitantes em torno de dois conjuntos de lugares
habitualmente e práticas culturais online (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79 reconhecidos como património mundial pela UNESCO . . . . . . . . . . 223
Tabela 2.8 - Análise fatorial exploratória das variáveis respeitantes Tabela 6.1 - Distribuição dos unívoros e omnívoros pelas variáveis
à frequência com que utiliza a Internet para realizar determinadas sociodemográficas (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 243
atividades online . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81 Tabela 6.2 - Amostra dos omnívoros culturais pela Região
Tabela 2.9 - Valores médios dos índices relativos à frequência Norte e Área Metropolitana de Lisboa (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 245
do tipo de atividades online, por variáveis sociodemográficas Tabela 6.3 - Géneros de filmes, por características sociográficas
e socioeconómicas (1 – nenhuma frequência – 5 diariamente) . . . . . . . 85 e «orientação cultural» (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 248
Tabela 3.1 - Principal dispositivo onde habitualmente se vê Tabela 6.4 - Com quem foram ver o filme, por sexo, idade
televisão (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112 e «orientação cultural» (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 249
Tabela 3.2 - Programas televisivos habitualmente vistos (%) . . . . . . . . . 114 Tabela 6.5 - Motivos por que não vai mais vezes ao cinema,
Tabela 3.3 - Local habitual de audição de rádio, por idade, total (%) . . 124 por sexo e idade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 251
Tabela 3.4 - Principais dispositivos onde se ouve rádio (%) . . . . . . . . . . 124 Tabela 6.6 - Motivos por que não vai mais vezes ao cinema,
Tabela 3.5 - Programas de rádio habitualmente seguidos (%) . . . . . . . . 126 por grau de instrução, região e «orientação cultural» (%) . . . . . . . . . . 251
Tabela 4.1 - Tipo de leitores e não-leitores de livros impressos, Tabela 6.7 - Pessoas que assistiram a espetáculos e concertos
por ano (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152 nos 12 meses anteriores ao início da pandemia, por rendimento
Tabela 4.2 - Distribuição de percentagem de leitores de livros do agregado familiar e classe socioprofissional (%) . . . . . . . . . . . . . . 253
impressos, por variáveis de caracterização sociográfica, Tabela 6.8 - Pessoas que assistiram a espetáculos de ‘outras danças’,
face à amostra total (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 155 por características sociográficas e pela «orientação cultural» (%) . . . 257
Tabela 4.3 - Distribuição de percentagem de leitores de livros Tabela 6.9 - Pessoas que assistiram a espetáculos de ópera,
digitais, por variáveis de caracterização sociográfica, por características sociográficas e pela «orientação cultural» (%) . . . 259
face à amostra total (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 158 Tabela 6.10 - Pessoas que assistiram a concertos de música,
Tabela 4.4 - Distribuição de géneros de livros (em formato impresso por características sociográficas e pela «orientação cultural» (%) . . . 265
ou digital) lidos com mais frequência nos últimos 12 meses, por Tabela 6.11 - Pessoas que assistiram a festivais, por características
variáveis de caracterização sociográfica, face à amostra total (%) . . . 170 sociográficas e pela «orientação cultural» (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 268
Tabela 4.5 - Distribuição de géneros de jornais (em formato impresso Tabela 6.12 - Tipos de festas locais, pelas características
ou digital) lidos com mais frequência nos últimos 12 meses, por sociográficas e «orientação cultural» (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 271
variáveis de caracterização sociográfica, face à amostra total (%) . . . 177 Tabela 6.13 - Motivos pelos quais a população inquirida não
Tabela 4.6 - Distribuição de géneros de revistas (em formato impresso foi mais vezes assistir a espetáculos e concertos ao vivo, festivais
ou digital) lidos com mais frequência nos últimos 12 meses, por ou festas locais, por características sociográficas (%) . . . . . . . . . . . . . 272
variáveis de caracterização sociográfica, face à amostra total (%) . . . 180 Tabela 6.14 - Motivos pelos quais a população inquirida não foi
Tabela 5.1 - Número de vezes que visitou, nos últimos 12 meses, mais vezes assistir a espetáculos e concertos ao vivo, festivais
os seguintes espaços culturais (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 203 ou festas locais, por classe profissional (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 273

14 15
Práticas Culturais dos Portugueses

Tabela 6.15 - Motivos pelos quais a população inquirida não foi


mais vezes assistir a espetáculos e concertos ao vivo, festivais
ou festas locais, por região (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 274
Tabela 7.1 - Práticas artísticas amadoras realizadas no último
ano pela população de Portugal, Espanha, França e Malta (%) . . . . . . 290
Tabela 8. 1 - Perfis sociográficos das distintas classes (%) . . . . . . . . . . . 318
Tabela 8.2 - Internet, audiovisuais (televisão e rádio) e práticas
de leitura: consumos e perfis culturais das distintas classes (%) . . . . 322
Tabela 8.3 - Idas a espaços patrimoniais, cinema e espetáculos
ao vivo nos últimos 12 meses anteriores ao início da pandemia: Os autores
perfis culturais das distintas classes (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 330
Tabela 8.4 - Participação cultural, formação artística e socializações: Emanuel Cameira é investigador integrado no IHC-NOVA FCSH.
perfis culturais das distintas classes (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 336 É doutorado em Sociologia pelo ICS-Ulisboa e pós-graduado em
Tabela 8.5 - Algumas práticas culturais, segundo a mobilidade Estudos Curatoriais pela Faculdade de Belas-Artes da mesma uni-
escolar intergeracional dos inquiridos com 25 anos ou mais (%) . . . . 343 versidade. Como Professor Auxiliar Convidado, vem lecionando no
Tabela 9.1 - Práticas culturais por idade (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 362 Iscte-Instituto Universitário de Lisboa e na FCH-UCP. Tendo tra-
Tabela 9.2 - Frequência de participação em atividades culturais nos balho desenvolvido nas áreas das sociologias da leitura, do livro e da
últimos 12 meses, no grupo etário dos 65-74 anos (2015) (%) . . . . . 363 edição, venceu, em 2018, o Prémio Victor de Sá de História Contem-
Tabela 9.3 - Práticas culturais segundo o rendimento mensal porânea (Universidade do Minho).
do agregado (%) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 367
Tabela 9.4 - Práticas culturais atuais segundo a frequência com Jorge Rodrigues da Silva é consultor em análise de dados. Mestre
que foram desenvolvidas na infância e juventude (%) . . . . . . . . . . . . . 370 em Psicologia Social pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Edu-
cação da Universidade de Coimbra. Colabora com investigadores e
projetos de investigação no domínio das ciências sociais. Foi diretor
executivo do Festival Bons Sons nas edições de 2018 e 2019, e desen-
volve atividades de formação de produção cultural, no âmbito do
associativismo social e político.

José Machado Pais é investigador coordenador do Instituto de


Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, tendo lecionado em uni-
versidades europeias e sul-americanas. É doutorado em Sociologia
(Iscte-Instituto Universitário de Lisboa) e doutor Honoris Causa
pela Universidade de Manizales, Colômbia. A sua produção cientí-
fica abrange várias áreas das ciências sociais, entre as quais a da cul-
tura.

Miguel Lobo Antunes, licenciado em Direito, com uma vida pro-


fissional diversificada, começou a trabalhar na área cultural em 1983,
como vice-presidente do Instituto Português de Cinema, e além
16 17
Práticas Culturais dos Portugueses

de outros cargos foi administrador do Centro Cultural de Belém


e da Culturgest, com a responsabilidade da programação. Foi tam-
bém diretor artístico do Festival de Música de Mafra. Sozinho ou
em colaboração publicou alguns estudos nos domínios do Direito
Constitucional e da Ciência Política.

Pedro Magalhães é investigador principal no Instituto de Ciências


Sociais da Universidade de Lisboa. É doutorado em Ciência Política
pela Ohio State University. Faz investigação sobre opinião pública e
comportamentos políticos, com especial ênfase no uso de inquéritos Prefácio
por questionário.

Rui Telmo Gomes é investigador integrado do CIES-Iscte. Douto- O Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses 2020, reali-
rado em Sociologia (2013, Iscte-Instituto Universitário de Lisboa) zado pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa
e mestre em Investigação em Ciências Sociais (1996, ICS-Ulisboa). com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, constitui um amplo
Desenvolve investigação nos domínios da sociologia da arte e cul- levantamento pioneiro realizado à escala nacional sobre o modo
tura, privilegiando temas como: processos artísticos participativos; como os portugueses encaram as iniciativas culturais e o fenómeno
profissões artísticas e do setor criativo; políticas culturais. cultural, considerando a democratização do respetivo acesso, a parti-
cipação cultural, a divulgação do livro e das manifestações culturais,
Teresa Duarte Martinho é investigadora auxiliar no ICS-Ulisboa, os programas itinerantes, a descentralização e a animação cultural, a
onde foi bolseira de pós-doutoramento e bolseira convidada (2012- formação de públicos, a promoção das artes e o desenvolvimento das
2019). Foi investigadora no Observatório das Actividades Cultu- indústrias criativas.
rais (1996-2011). É doutorada em Sociologia pelo Iscte-Instituto Já nos anos setenta do século XX a Fundação Calouste Gul-
Universitário de Lisboa. Tem investigado principalmente o setor benkian foi igualmente pioneira num levantamento da oferta cultural
da cultura, com foco em políticas, profissões e modos de trabalho, disponível em alguns concelhos do país, em colaboração com a então
mediação e consequências da digitalização. Secretaria de Estado da Cultura. Uma década depois realizou-se um
Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses coordenado pelo
Tiago Lapa é professor auxiliar e investigador integrado no CIES- Professor Jorge Gaspar, a partir de uma amostra representativa da
-Iscte na Escola de Sociologia e Políticas Públicas. É doutorado pelo população portuguesa residente no Continente. Infelizmente, não
Iscte-Instituto Universitário de Lisboa e mestre pela Universidade chegou a ser publicado.
de Cambridge, Inglaterra. Desenvolve atividades académicas relacio- Nesse sentido, a iniciativa agora considerada pretende ser um
nadas com os estudos da internet e a literacia dos novos media. contributo importante para o aprofundamento do conhecimento do
panorama da cultura e dos hábitos de consumo de bens culturais
Vera Borges é investigadora integrada no CIES-Iscte. É doutorada em Portugal. O inquérito realizado considera como prática cultural
pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (Paris) e NOVA- um conjunto de atividades que se traduzem em indicadores, os quais
-FCSH, mestre pelo Iscte-Instituto Universitário de Lisboa. Leciona permitem aferir das ações efetivamente realizadas, da sua frequên-
políticas públicas para a cultura e gestão de projetos de artes cénicas, cia e variantes – e dos seus efeitos práticos. Trata-se de uma análise
no Mestrado em Estudos de Teatro, na Faculdade de Letras, da Uni- complexa e dinâmica, antecedida de uma extensa inventariação de
versidade de Lisboa. inquéritos internacionais. Daí resultou uma base de dados de cerca

18 19
Práticas Culturais dos Portugueses Prefácio

de 80 inquéritos realizados na Europa, América do Norte e do Sul, que coordenou e com enorme rigor realizou este Inquérito. A equipa
sobretudo na última década, bem como os resultados das estatís- do Programa Gulbenkian Cultura, dirigida primeiro por Rui Vieira
ticas sobre a cultura desenvolvidas pelo Instituto de Estatística da Nery e presentemente por Miguel Magalhães, merece a nossa grati-
UNESCO, cujas definições têm por objetivo e resultado facilitar as dão.
comparações internacionais. Tal método permitiu, aliás, ensaiar algu-
mas comparações publicadas no presente estudo. Guilherme d’Oliveira Martins
Pretende-se, deste modo, que os resultados do Inquérito pos-
sibilitem uma informação relevante para todos quantos nos planos
nacional ou local necessitem de elementos para orientarem as respe-
tivas políticas culturais. De facto, não é possível promover a demo-
cratização da cultura sem um conhecimento atualizado dos hábitos,
práticas e gostos culturais dos portugueses. Não podemos esquecer,
porém, a evolução recente no tocante às taxas de escolarização, aos
níveis de formação da população e a evolução positiva no aprovei-
tamento, nas aprendizagens e na redução do abandono escolar pre-
coce. Designadamente, a recente experiência do Ano Europeu do
Património Cultural 2018, que tive a responsabilidade de coordenar,
demonstra claramente a necessidade de um estudo com esta natu-
reza e âmbito, já que os resultados positivos obtidos basearam-se
em conhecimentos empíricos e na mobilização da população escolar
e da rede de bibliotecas escolares – havendo muitas potencialidades
a explorar, até pelos efeitos multiplicadores junto das famílias e dos
meios locais.
O facto de o Inquérito ter decorrido num período dominado
pela emergência pandémica significa ainda que houve necessidade de
considerar a avaliação de possíveis mudanças de hábitos na utilização
de recursos digitais, da Internet, da televisão e da rádio e de práticas
de leitura durante os períodos de confinamento em casa, fora dos
espaços das bibliotecas e arquivos. A rápida evolução da sociedade
portuguesa, designadamente no que respeita ao alargamento da esco-
larização e a oferta de formação, converte o presente estudo numa
base de dados de grande utilidade que exige uma avaliação futura dos
indicadores culturais ao longo do tempo, em especial no tocante às
políticas de democratização da cultura, à evolução das desigualdades
no respetivo acesso e à necessidade de as contrariar, bem como aos
incentivos à participação dos cidadãos e à consolidação da democra-
cia cultural.
Deixo, por fim, uma palavra reconhecida a José Machado Pais,
Pedro Magalhães e Miguel Lobo Antunes, bem como a toda a equipa

20 21
Introdução

1. Num contexto em que se equacionam os desafios e oportuni-


dades para a Europa no quadro da Agenda 2030 das Nações Unidas,
centrada nos objetivos do desenvolvimento sustentável, as vozes da
cultura (Voices of Culture 2021) não podem deixar de ser ouvidas a
este respeito. Entre elas, as dos públicos da cultura, sem esquecer as
dos que mais afastados se encontram do universo das práticas cul-
turais regulares. Com efeito, fazendo uso alegórico do título de um
romance de Salman Rushdie – The Ground Beneath Her Feet – como
avaliar a pertinência ou o êxito das políticas culturais desconsiderando
o solo que elas pisam? Em que medida as políticas culturais atendem
às carências ou às expectativas dos portugueses? É certo que os públi-
cos da cultura não deixaram de estar na mira das políticas culturais
dos sucessivos governos do pós-25 de Abril. Nos respetivos progra-
mas de governo, independentemente dos quadrantes político-parti-
dários, sobressaem referências e apelos à democratização do acesso
à cultura, à participação cultural, às políticas de divulgação do livro,
aos programas culturais itinerantes, à descentralização da cultura, à
difusão e animação cultural, à formação de públicos, à promoção das
artes e ao desenvolvimento das indústrias criativas. Porém, princi-
palmente no caso das políticas culturais municipais, os programado-
res culturais revelam, frequentemente, uma realística consciência da
margem de risco que as suas opções comportam (Lopes 2019, 226).
As dúvidas têm uma razão de ser: uma manifesta carência de dados
empíricos que sustentem a tomada de decisões e a sua monitorização.
Espera-se que os resultados do Inquérito às Práticas Culturais
dos Portugueses recém-realizado possibilitem uma informação
­relevante a todos quantos, a nível nacional e municipal, carecem

23
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

dela como alavanca das políticas culturais. Com efeito, como asse- de democratização da cultura tende a enclausurar-se no pressuposto
gurar um desenvolvimento cultural sustentável e generalizado ao da universalidade da cultura erudita, por essa razão considerada legí-
país quando se desconhecem as assimetrias da participação cultural? tima, o conceito de democracia cultural prioriza as políticas culturais
Como responder às suas necessidades de usufruto se não sabemos centradas na produção e no pluralismo culturais, sem desprimor para
como se diferenciam em termos de pertenças sociais, geracionais, as práticas artísticas amadoras. O Inquérito realizado reúne dados
regionais ou de género? Que motivações os mobilizam? Que razões que, porventura, poderão suscitar um reequacionamento das polí-
invocam para não lerem mais livros ou não frequentarem, mais ticas culturais, quer na vertente da democratização cultural, mais
assiduamente, bibliotecas, museus, monumentos históricos, sítios focada no acesso à cultura em prol de uma suposta equidade; quer do
arqueológicos ou galerias de arte? Porque não vão mais vezes ao lado da democracia cultural, onde a participação cultural é tomada
cinema ou a espetáculos ao vivo? O desinteresse em relação a alguns como testemunho de uma desejada liberdade. Quiçá os resultados
bens culturais será efeito de socializações pouco sensíveis ao valor do Inquérito possam suscitar novos questionamentos que levem a
intrínseco da cultura? Qual o papel da família, da escola, de outras uma ressignificação do próprio conceito de desenvolvimento cultu-
coletividades culturais ou dos próprios amigos na formação de capi- ral, enquadrável nos desígnios de uma sociedade em que o bem-estar
tais culturais entre os adolescentes? Qual o envolvimento dos por- e a coesão sociais beneficiam das dinâmicas de participação a que se
tugueses em práticas artísticas amadoras? Haverá uma desarticulação associa a cidadania cultural.
entre as áreas da cultura e da educação? Com que frequência se acede A busca de respostas às questões atrás levantadas, e a outras mais
à Internet com propósitos culturais? Até que ponto a pandemia terá que a análise dos dados suscite, exige informação relevante e fide-
intensificado o uso de serviços digitais no domínio cultural? Quais digna sobre a participação cultural dos cidadãos e também sobre os
os meios através dos quais os portugueses tomam conhecimento dos incentivos, motivações e obstáculos que os mobilizam ou não para o
acontecimentos culturais? Como orientar ou reajustar as políticas exercício das práticas culturais. À escala internacional, uma boa parte
culturais quando se desconhecem as tipologias de segmentação dos desta informação tem sido obtida através da realização de impor-
públicos da cultura? tantes inquéritos que, frequentemente replicados, permitem, dessa
No caudal destas interrogações, mais um questionamento que forma, análises longitudinais sobre a evolução dos indicadores cul-
convoca dois paradigmas de políticas culturais que se têm enfren- turais. Infelizmente, esse não é o panorama existente em Portugal,
tado nas últimas décadas: como promover uma «democratização salvo em alguns domínios sectoriais. Para uma boa parte dos indica-
da cultura» ou uma «democracia cultural» sem um conhecimento dores da cultura escasseiam dados estatísticos que permitam avaliar
atualizado dos hábitos, práticas e gostos culturais dos portugueses? tendências evolutivas.
A dissonância entre os conceitos que sustentam estes dois para- Com o Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses, reali-
digmas tem sido bastante debatida (Bellavance 2000; Lopes 2007; zado pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa,
Donnat 2011; Romainville 2016). O desígnio da democratização da com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, temos pela primeira
cultura – a que se associam as políticas de democratização cultural vez em Portugal um amplo levantamento, à escala nacional, das prá-
impulsionadas por André Malraux, ao tempo de Charles de Gaulle – ticas culturais dos portugueses, em vários domínios culturais. Nos
é o alargamento da cultura considerada «legítima» ao maior número anos 70 do século passado, a Fundação Calouste Gulbenkian havia
possível de pessoas, desse modo se acalentando a crença na redu- já sido mentora de uma iniciativa pioneira quando, em colaboração
ção das desigualdades de acesso à cultura erudita (Dubois 1999). Em com a Secretaria de Estado da Cultura, viabilizou a realização de um
contrapartida, o paradigma da democracia cultural, surgido nos finais levantamento cultural que tinha por objetivo o reconhecimento da
dos anos sessenta do século passado, reivindica um conceito mais oferta cultural em alguns concelhos do país. Cerca de uma década
alargado de cultura, dando primazia à cultura de base comunitária, depois, em 1984/85, a partir de uma amostra representativa da popu-
sensível à diversidade cultural. Neste sentido, enquanto o conceito lação portuguesa residente no Continente, realizou-se um Inquérito

24 25
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

às Práticas Culturais dos Portugueses, coordenado pelo Professor usado num sentido mais amplo do que o de prática cultural em razão
Jorge Gaspar (1985-1988). Deste projeto resultaram vários relatórios de, para além de contemplar consumos culturais de natureza recetiva,
preliminares que, todavia, não chegaram a culminar em publicação abranger formas de participação mais interventiva ou comprometida,
final. Espera-se que os resultados do Inquérito agora publicado – em como o exercício de práticas artísticas amadoras; a partilha, na Inter-
conjugação com outros importantes estudos e inquéritos sectoriais net, de conteúdos culturais de autoria própria; a interação online em
realizados no país, incluindo o Inquérito à Ocupação do Tempo 1999 temas relacionados com a cultura; o voluntariado e a participação em
(Lopes et al. 2001) e as Estatísticas da Cultura, do Instituto Nacional associações culturais. O Inquérito permite ainda saber em que práti-
de Estatística – constituam um importante contributo para o apro- cas artísticas amadoras os inquiridos se envolvem, com que frequên-
fundamento do conhecimento do panorama cultural português. cia e em que domínios: escrita, dança/ballet, música (composição
2. No Inquérito efetuado, o conceito de prática cultural reco- ou interpretação, num registo individual ou coletivo), teatro, circo,
bre um conjunto de atividades que se traduzem em indicadores que pintura, desenho, gravura, artes digitais, fotografia, vídeo e cinema.
certificam se essas atividades foram ou não realizadas e, em caso afir- Foram também pesquisadas as atitudes em relação à prática artística,
mativo, com que frequência e variantes. As variantes contemplam os as áreas de formação, o recurso a meios tradicionais e/ou digitais na
contextos ou circunstâncias em que as práticas culturais foram con- produção artística, bem como as razões de abandono da atividade
cretizadas. Por exemplo, se foram realizadas individualmente ou em artística ou as expectativas de seguir uma carreira profissional.
companhia de familiares ou amigos; ou se ocorreram no concelho de Como se dará conta nesta publicação, o Inquérito realizado per-
residência, noutro concelho do país ou no estrangeiro. As práticas mite analisar de que forma distintas variáveis de natureza sociográfica
culturais pesquisadas envolveram duas principais vertentes. Por um condicionam ou favorecem as práticas culturais, bem como diferen-
lado, o acesso à cultura foi aferido pela frequência de diversos espa- tes inscrições sociais da população inquirida se associam a distin-
ços culturais: bibliotecas e arquivos; museus, monumentos históri- tos perfis de participação cultural. Na exploração das desigualdades
cos, sítios arqueológicos e galerias de arte; salas de cinema e recintos sociais face à participação cultural foram também explorados indi-
ou áreas de espetáculos ao vivo, incluindo festivais e festas popula- cadores de capitais culturais, herdados ou adquiridos. Para o efeito,
res. Neste núcleo duro do Inquérito é disponibilizada uma impor- os inquiridos foram questionados sobre se, durante a infância ou a
tante bateria de indicadores sobre as motivações e os obstáculos que adolescência até aos 18 anos, os pais ou outros familiares lhes liam
mobilizam ou não os portugueses para o exercício dessas práticas. histórias, ofereciam livros e os acompanhavam a feiras do livro, livra-
Indicadores desta natureza, que percorrem o questionário transver- rias ou bibliotecas e, em caso afirmativo, com que frequência. Por
salmente, permitirão delinear estratégias de captação, ampliação e referência a esta fase de vida, foram também arroladas as deslocações
fidelização de novos públicos da cultura – desígnio que não é fácil a bibliotecas, exposições, museus, monumentos ou a espetáculos de
alcançar atendendo aos constrangimentos sociais e económicos que, qualquer tipo, promovidas pela escola ou por outras organizações
como se verá, afastam muitos dos inquiridos do universo das práticas (escuteiros, associações, etc.), realizadas com o apoio da família,
culturais regulares. Foram também questionados os meios através combinadas com amigos ou realizadas individualmente.
dos quais os inquiridos tomam conhecimento dos acontecimentos A conceção do Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses
culturais, bem como a perceção individual do conhecimento que têm foi antecedida por uma extensa inventariação de inquéritos interna-
para fruir da oferta cultural. Por outro lado, cotejaram-se conteú- cionais sobre a temática. Dessa pesquisa resultou uma base de dados
dos ou géneros culturais consumidos e respetivas modalidades de de cerca de 80 inquéritos, em larga maioria realizados na Europa, na
receção: mediadas pela Internet, rádio e televisão ou – em suportes América do Norte e na América do Sul, sobretudo na última década.
impressos e digitais – através da leitura de jornais, livros e revistas. Teve-se também em conta o marco das Estatísticas Culturais, desen-
Para além das práticas culturais de acesso e receção, foram reu- volvido pelo Instituto de Estatística da UNESCO, cujas definições
nidos outros indicadores de participação cultural. Este conceito é standard para as estatísticas culturais dos d
­ iferentes países têm por

26 27
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

objetivo facilitar as comparações internacionais. Assegurar condi- critérios objetivos. Elas reportam o número de vezes que se desen-
ções de comparabilidade internacional foi também um objetivo do volve uma atividade em diferentes unidades discretas de tempo: o
Inquérito agora realizado. Para o efeito, replicaram-se, com ajustes dia, a semana, o mês ou o ano. Escalas deste tipo foram usadas para
e adaptações, perguntas e indicadores dos inquéritos considerados avaliar a frequência de visitas a museus, monumentos históricos,
mais inspiradores, como foi o caso dos da Bélgica, Chile, Espanha, sítios arqueológicos e galerias de arte; de idas a cinemas, bibliotecas
Estados Unidos, França, Itália, Malta e Reino Unido (Anexo 1). Ao e arquivos; de assistência a concertos e espetáculos ao vivo. Oca-
replicarem-se perguntas adaptadas desses inquéritos não se apro- sionalmente, foram também aplicadas escalas de avaliação subjetiva
veitou apenas um conhecimento testado e consolidado de indica- – o que aconteceu, por exemplo, na avaliação da frequência de ativida-
dores de participação cultural a nível internacional. Assegurou-se, des desenvolvidas a uma significativa distância temporal, ao apelar-se
também, a possibilidade de nos virmos a conhecer melhor através à memória dos inquiridos para recordarem experiências e socializa-
do confronto com outros. Na presente publicação são já ensaiadas ções culturais ocorridas durante a infância e a adolescência. Foi tam-
algumas comparações. bém o que aconteceu quando se lhes perguntou se frequentemente,
A versão final do questionário aplicado (Anexo 2) resultou de algumas vezes, raramente ou nunca os pais ou outros familiares cos-
um trabalho de equipa que implicou sucessivas reformulações de tumavam ler-lhes histórias, oferecer-lhes livros ou acompanharem-
múltiplas outras versões que se foram consolidando ao longo do -nos a feiras do livro, livrarias ou bibliotecas.
processo. Tivemos de ser seletivos, formulando perguntas não sobre O período de referência a que se reporta a maioria das práticas
tudo o que desejávamos saber, mas tão-somente sobre tudo o que, culturais pesquisadas abrange 12 meses. Seguiram-se, aliás, as reco-
realisticamente, seria possível conhecer, com a garantia de resultados mendações do Instituto de Estatística da UNESCO, no Framework
fidedignos, teoricamente sustentados e socialmente relevantes. Na for Cultural Studies. Em relação a práticas culturais desenvolvidas
estruturação do questionário, o ordenamento das perguntas obede- em espaços que estiveram encerrados por efeito da Covid-19, o seu
ceu a critérios metodológicos, tendo estas sido agrupadas em módu- questionamento teve por período de referência os 12 meses ante-
los temáticos. Contudo, algumas variáveis são transversais a vários riores ao início da pandemia. Assim aconteceu com a frequência
módulos do questionário, como é o caso das que envolvem práticas de bibliotecas, arquivos, museus, monumentos históricos, sítios
culturais mediadas pela Internet. Por esta razão, o primeiro módulo arqueológicos, galerias de arte, cinemas, teatros, circos, recintos ou
do questionário inventaria os usos da Internet no domínio cultural. espaços abertos de acolhimento de espetáculos ao vivo, festivais e
Os módulos que se seguem cobrem as seguintes áreas: audiovisuais festas locais. Na maioria das restantes práticas culturais, o período
(televisão e rádio); leitura e bibliotecas; museus, monumentos his- de referência abrangeu os últimos 12 meses imediatamente anterio-
tóricos, sítios arqueológicos e galerias de arte; cinema e espetácu- res à realização das entrevistas. Assim aconteceu com a inquirição
los ao vivo, incluindo festivais e festas locais; participação artística e de práticas culturais envolvendo usos da Internet, da televisão e da
capitais culturais. O último módulo do questionário reúne variáveis rádio ou, ainda, de práticas de leitura – quando não realizadas, pre-
que permitem traçar o perfil sociográfico dos inquiridos: sexo, idade, sencialmente, em bibliotecas ou arquivos. Tomando-se por referên-
nacionalidade, situação conjugal, região, habitat, grau de instrução cia o período pandémico, considerou-se pertinente avaliar possíveis
do próprio e dos pais, situação perante o trabalho, profissão do pró- mudanças dos hábitos de utilização de recursos digitais e da Internet
prio e do cônjuge, classe socioprofissional, rendimentos do agregado no domínio cultural, a partir das experiências e perceções dos inqui-
familiar e perceção de conforto económico de acordo com esses ren- ridos. Finalmente, o Inquérito contempla uma considerável bateria
dimentos. de indicadores centrados na última deslocação realizada a vários
As escalas de frequência usadas variam em função da natureza espaços culturais: bibliotecas, arquivos, museus, monumentos histó-
das práticas culturais pesquisadas. No Inquérito realizado, as mais ricos, sítios arqueológicos, galerias de arte, cinemas, teatros, circos,
frequentemente utilizadas foram as escalas métricas de avaliação com recintos ou espaços abertos de acolhimento de espetáculos ao vivo,

28 29
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

incluindo festivais e festas locais. Neste caso, considerou-se sempre à cultura? Qual a repercussão das tecnologias digitais no impulso
a última deslocação ao espaço cultural em causa, quer tivesse ocor- ou intensificação das práticas culturais? Para dar resposta a estas e a
rido antes ou depois da eclosão da pandemia. outras questões, as práticas culturais foram problematizadas a partir
A consulta de um vasto conjunto de inquéritos estrangeiros, de diferentes perspetivas teóricas.
como atrás se referiu, ajudou a fundamentar decisões sobre a escolha 3. Passando agora a uma breve apresentação da estrutura do
das perguntas do questionário, em consonância com os questiona- livro, a lógica da sequência dos capítulos segue a das secções do ques-
mentos de partida, que se foram ampliando rizomaticamente. A lista- tionário, com uma exceção. Enquanto as variáveis sociográficas do
gem dos indicadores do questionário (Anexo 3) foi sendo construída Inquérito realizado são abordadas, pela sua relevância analítica, no
à medida que as perguntas iam sendo concebidas, num processo que capítulo inicial do livro, as perguntas com elas relacionadas foram
exigiu reflexões aprofundadas sobre hipóteses de investigação teori- remetidas para o final do questionário, no pressuposto de que, no
camente problematizadas. Por exemplo, no estudo das práticas cul- decorrer das entrevistas, uma crescente descontração dos entrevista-
turais tem sido bastante convocada a teoria da legitimidade cultural dos os predisporia a uma maior recetividade a perguntas de carácter
desenvolvida por Pierre Bourdieu – teoria que, consagrando o erudi- mais intimista, como é o caso da informação sobre os rendimentos
tismo da chamada cultura cultivada, estabelece uma forte correlação auferidos. Assim, o capítulo 1 (Aspetos metodológicos e sociografia
entre origem social e gostos culturais, de tal forma que o conjunto dos inquiridos), desenvolvido por Pedro Magalhães e Jorge Rodri-
das práticas culturais apareceria fortemente segmentado em função gues da Silva, centra-se na análise das características sociográficas
da hierarquização social dos inquiridos, por efeito dos seus capitais da população inquirida, antecedida de uma descrição dos procedi-
económicos, escolares e culturais. Este pressuposto teórico, sem ser mentos metodológicos que orientaram a constituição da amostra de
desvalorizado, não impediu a pesquisa de perfis culturais que esca- estudo, o trabalho de campo e o apuramento dos dados. As variáveis
pam, ou não, à rigidez da homologia que associa o gosto cultural ao sociográficas descritas que, para efeito de análises bivariada e multi-
estatuto social. A teoria da legitimidade cultural foi então confron- variada, serão convocadas nos capítulos que se seguem compreen-
tada com a teoria do padrão omnívoro de Richard Peterson, segundo dem a região, o habitat, o sexo/género, a idade, a situação conjugal,
a qual os status hierárquicos produzidos pela oposição entre cultura o grau de ensino, o nível de escolaridade parental mais elevado, a
de elite e cultura de massas não invalidam a emergência de novas seg- situação perante o trabalho, a avaliação subjetiva dos rendimentos
mentações culturais como as que decorrem da oposição entre consu- do agregado familiar e a perceção da situação económica individual.
mos omnívoros e unívoros. No rol das variáveis sociográficas agregou-se uma variável compó-
Em diálogo com estas e outras teorias, as práticas culturais sita tendo em vista a determinação da classe socioprofissional dos
foram analisadas em função do perfil sociográfico dos inquiridos, inquiridos. Construída segundo a proposta metodológica de Oesch,
procurando-se averiguar em que medida diferentes inscrições sociais trata-se de uma variável cuja potencialidade heurística, revelada em
condicionam ou estimulam a intensidade e a diversidade das práti- pesquisas internacionais, se comprovou na análise aos dados do pre-
cas culturais; isto sem colocar de lado a hipótese do esbatimento de sente Inquérito.
algumas hierarquias socioculturais poder associar-se a consumos cul- O capítulo 2 (Internet, práticas culturais online e distinção), da
turais mais ecléticos, possível efeito de uma mais livre escolha do que autoria de Teresa Duarte Martinho e Tiago Lapa, começa por um
se consome, expressão de uma provável individualização dos gostos levantamento estatístico à escala europeia sobre as tecnologias de
culturais. Esta e outras hipóteses de investigação suscitaram novas informação e os usos da Internet de âmbito cultural, possibilitando,
interrogações. Por exemplo, qual o impacto na vida cultural dos dessa forma, uma contextualização dos dados do Inquérito reali-
portugueses de uma aparente diversificação dos meios de acesso à zado. Nesse cenário comparativo, as diferenças registadas, decor-
cultura, principalmente através da Internet? Como se interpenetram rentes de ritmos diferenciados de desenvolvimento informacional,
os efeitos de socialização de novos e tradicionais meios de acesso suscitam uma expectável correlação entre as modalidades de acesso

30 31
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

à Internet e as práticas culturais online. Articulando indicadores De seguida, para um maior aprofundamento das relações entre
como o acesso à Internet, os equipamentos utilizados e as razões as práticas culturais online, Teresa Duarte Martinho e Tiago Lapa
pelas quais não se usa a Internet, constata-se que o tipo de vincu- avançam com uma delineação de distintos perfis de práticas culturais
lação à Internet decorre das diferentes inscrições sociográficas da online, chegando a uma tipologia na qual o perfil mais inclusivo é
população inquirida. Assim, enquanto todos os inquiridos dos 15 o dos «buscadores de informação noticiosa e enciclopédica». Este
aos 24 anos afirmam ter usado a Internet, entre os inquiridos com perfil agrega 42% dos internautas portugueses, maioritariamente
65 anos ou mais apenas cerca de um quarto deles a usa. Para além usufruindo de rendimentos elevados e com nível de ensino superior.
da idade, os inquiridos estão tanto mais desconectados da Internet Finalmente, sonda-se o impacto da pandemia (Covid-19) no uso da
quanto mais baixos são os seus níveis de instrução e de rendimen- Internet em atividades culturais, constatando-se uma relativa inten-
tos. Aliás, de entre as razões assinaladas para não se usar a Internet sificação, principalmente por parte dos mais jovens, os quais pas-
sobressaem défices de conhecimento («falta de interesse/não vê uti- saram a ver mais filmes e séries; a ler mais livros, jornais e revistas
lidade»; «não sabe como usar/sente-se confuso com a tecnologia») online; e a ver mais espetáculos de música.
e económicos («não tem acesso a um computador ou à Internet»; «é No capítulo 3 (A domesticação da televisão e da rádio na era digi-
muito caro»). O potencial discriminativo das variáveis sociográficas tal «pós-radiodifusão»), Tiago Lapa começa por fazer um enquadra-
volta a revelar-se quando os autores apresentam uma tipologia dos mento macrossocial do campo mediático em análise, questionando,
utilizadores da Internet a partir do número de equipamentos para a teoricamente, a transição da sociedade de massas e de radiodifusão
ela acederem. Os chamados utilizadores transmediáticos, tecnolo- para uma era digital pós-radiodifusão. De seguida, discorre sobre a
gicamente mais apetrechados (utilizam três ou mais equipamentos presença da televisão e da rádio nas rotinas quotidianas, tomando a
para se interconectarem), tendem a ser mais jovens, mais instruídos, «domesticação dos media» como alavanca conceptual e teórica da
com rendimentos mais elevados e de classes socioprofissionais mais análise dos dados. Para o efeito, explora as variantes sociográficas
privilegiadas. Outro dado relevante é a clara afirmação do telemóvel, que caracterizam as audiências quanto aos hábitos de utilização e aos
usado por 89% dos internautas, como dispositivo preferencial de consumos televisivos e radiofónicos. Os dados sugerem uma rela-
acesso à Internet, numa lógica de conectividade permanente. tiva persistência da centralidade da televisão nas «dietas mediáticas»
O capítulo avança para a análise dos usos da Internet, consta- da maioria dos portugueses, muito embora os padrões e contextos
tando-se que os inquiridos passam mais tempo interconectados por de consumo audiovisual sejam, atualmente, bastante diversificados.
trabalho ou estudo (em média, 18 horas por semana) do que por A proporção de inquiridos que veem diariamente televisão (90%) é
lazer (10 horas). No entanto, se a média de horas semanais de acesso mais do dobro dos que diariamente ouvem rádio (40%) ou usam a
à Internet para trabalho ou estudo é semelhante entre homens e Internet (41%).
mulheres, já no que respeita ao lazer enquanto os homens despen- Tanto em relação aos consumos televisivos quanto aos radiofóni-
dem, em média, 12 horas por semana, as mulheres não ultrapassam as cos, Tiago Lapa avança para a construção de tipologias de consu-
9 horas. Quanto aos usos da Internet para atividades culturais, veri- midores tendo em conta, respetivamente, os programas televisivos
fica-se que, pelo menos uma vez por semana, mais de 30% dos inqui- habitualmente vistos e os programas de rádio habitualmente segui-
ridos ouviram música e leram sites de notícias. Por outro lado, uma dos. O perfil de consumo dominante entre a maioria dos telespec-
ou várias vezes por mês, entre 20% a 25% dos inquiridos partilharam tadores portugueses (63%) é o que agrega os chamados «grandes
conteúdos culturais (vídeos, música, imagens, outros) criados pelos consumidores de ficção televisionada», perfil que reúne uma larga
próprios, leram ou escreveram em blogues e interagiram em temas maioria de inquiridos com elevados rendimentos, ensino superior,
relacionados com cultura, colocando mensagens e likes em sítios de gestores e quadros superiores do terceiro sector, estudantes, jovens
redes sociais e outros grupos virtuais. Estes indicadores sinalizam as e inquiridos do sexo masculino. O perfil dominante nos consumos
potencialidades digitais no incremento da participação cultural. radiofónicos, abrangendo também 63% dos inquiridos, é o que agrega

32 33
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

os designados «ouvintes de conteúdos informativos e relativos ao livros e os locais onde habitualmente se leem, em larga maioria em
desporto», perfil que reúne sobretudo inquiridos do sexo masculino espaço doméstico. Os géneros de livros, revistas e jornais são tam-
e de meia-idade. Mais expostos à televisão encontram-se os idosos bém cotejados, sobressaindo os livros de romance, sobretudo entre
e os inquiridos com rendimentos mais baixos, em claro contraste as mulheres, e os jornais generalistas/diários. Quanto às revistas o
com os mais jovens, os mais instruídos e os de mais elevados ren- que ressalta é a enorme dispersão de gostos.
dimentos. Aliás, os dados analisados sugerem que, principalmente Dado o alargamento do campo de possibilidades de leitura com
entre os inquiridos mais jovens e urbanos, os consumos televisivos recurso à Internet, exploram-se também as leituras neste registo rea-
confrontam-se com a concorrência de experiências comunicativas lizadas, evidenciando-se a consulta de sites de notícias, a procura de
suscitadas por uma pluralidade de plataformas e modalidades mediá- informações precisas e a busca de informação sobre livros, música,
ticas relativamente às quais as audiências acorrem de acordo com os cinema e espetáculos. Emanuel Cameira mostra-nos que as esco-
seus perfis e interesses, daí derivando a sua segmentação. Em relação lhas de leitura não surgem do acaso, confirmando-se que são forte-
à rádio, sobretudo ouvida em deslocações de carro pela maioria da mente influenciadas pelas redes sociais, sejam elas offline ou online.
população inquirida, os programas habitualmente mais seguidos são Recomendações de leitura surgem principalmente da família, amigos
os de «notícias e informação» e música popular. Alfim, o capítulo e colegas de trabalho; de comentários de amigos nas redes sociais
termina sinalizando uma intensificação dos consumos televisivos e online; e de buscas em sites especializados na leitura e avaliação
radiofónicos em contexto pandémico: 23% dos inquiridos passaram de livros. As socializações familiares vividas durante o período da
a ver mais televisão, sobretudo os mais jovens e os residentes em infância e da adolescência dos inquiridos foram também pesquisadas,
contextos urbano e intermédio urbano; em contrapartida, apenas 5% constatando-se que a maioria deles não beneficiou de estímulos à lei-
passaram a ouvir mais rádio. tura gerados em contexto familiar. Nunca os pais ou qualquer outro
No capítulo 4 (A leitura e a frequência de bibliotecas e arquivos familiar os acompanharam a uma livraria, a uma feira do livro ou a
no arranque dos anos 20 do século XXI), Emanuel Cameira procura uma biblioteca; nem tão-pouco os deleitaram com a leitura de um
identificar distintos perfis de leitores, avaliando as variáveis socio- livro de histórias. Porém, os inquiridos mais jovens e aqueles cujos
gráficas que, num contexto de crescente informatização e digitaliza- pais têm ou tinham qualificações académicas superiores reconhecem,
ção, mais associadas aparecem aos hábitos de leitura. Outro objetivo com mais frequência, esse apoio familiar. São dados que denunciam
é a prospeção de tendências evolutivas nas práticas de leitura a nível a persistência de assimetrias sociais na criação de hábitos de leitura,
nacional, a par de algumas comparações internacionais. O capítulo mas também sinalizam uma mudança. O facto de os jovens de hoje
começa por salientar a proeminência da leitura de livros por prazer, terem pais mais escolarizados do que os das gerações mais velhas e,
indiscutivelmente o objetivo que mais mobiliza os leitores (68% por isso mesmo, mais sensíveis ao valor cultural da leitura evidencia
deles). No entanto, nos últimos 12 meses apenas 39% dos inquiri- um importante elo de transmissão geracional: a democratização do
dos leram livros impressos, menos ainda em formato digital (10%), acesso à educação potencia ganhos culturais nas gerações sucessoras.
percentagens aquém das registadas em Espanha e em França. As Finalmente, o capítulo termina com uma análise da frequência de
principais razões invocadas para não se ter lido livros radicam na bibliotecas e/ou arquivos nos 12 meses anteriores ao início da pan-
preferência por realizar outras atividades e na falta de tempo. Os demia, bem como das razões que suscitam ou desincentivam a sua
leitores de livros, impressos ou digitais, surgem sobretudo entre os frequência.
que atingiram o ensino superior e cujos pais (pai ou mãe) alcança- Teresa Duarte Martinho analisa as práticas culturais centradas nos
ram esse mesmo nível de ensino. Os mais assíduos leitores de livros espaços culturais consignados no título do capítulo 5 (Círculos ainda
são os jovens, os estudantes e os que vivem em agregados familia- estreitos: museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e gale-
res de mais elevados rendimentos. Para além do número de livros rias de arte). Não descurando as comparações com outros inquéritos
lidos, é também dada informação sobre as modalidades de acesso aos nacionais e internacionais, o capítulo tem por objetivo a produção de

34 35
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

um conhecimento dos frequentadores desses espaços patrimoniais, das ­visitas, através da Internet, a museus, monumentos históricos,
sustentado na análise dos seus perfis sociográficos e nas razões pelas sítios arqueológicos e galerias de arte. Embora se constate que as
quais não os visitam mais vezes ou nem sequer os visitam, bem como visitas virtuais ficam significativamente aquém das presenciais, fica-
nas motivações que os levam a realizar essas visitas. Antecipando mos a saber que elas superam, ligeiramente, as visitas virtuais rea-
alguns resultados, de entre os espaços culturais listados os mais lizadas pelos espanhóis, em 2018-2019, qualquer que seja o espaço
visitados foram os monumentos históricos e os museus. Os mais cultural considerado. Por outro lado, veremos que o contexto pan-
frequentes visitantes distinguem-se pelo entrecruzamento de vários démico favoreceu a intensificação dessas visitas através da Internet,
traços sociográficos, reunindo jovens, estudantes, inquiridos com tendo permanecido o interesse preferencial por monumentos histó-
elevadas qualificações académicas, rendimentos elevados e inserções ricos e museus.
socioprofissionais prestigiadas. A maior parte das visitas a estes espa- No capítulo 6 (Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao
ços patrimoniais foi realizada não no concelho de residência, mas vivo, festivais e festas locais), Vera Borges começa por colocar em
noutro concelho do país. Este trânsito interconcelhio, movido pelo confronto distintos perfis e públicos da cultura, avançando com uma
desejo de acercamento ao património cultural, afigura-se potencia- estratégia analítica que beneficia de uma problematização teórica que
dor do reforço da identidade nacional. Não surpreende que, no con- convoca para debate o argumento da distinção, a pluralidade de per-
junto dos espaços reconhecidos como património mundial, os mais tenças socioculturais e as tendências ao omnivorismo cultural. É nesta
visitados, pelo menos uma vez na vida, tenham sido o Mosteiro dos matriz teórica que analisa a forma como, entre os inquiridos, se pro-
Jerónimos, a Torre de Belém e o Mosteiro da Batalha. Aliás, de entre cessa a abertura à diversidade das práticas culturais arroladas para aná-
os motivos que levaram os inquiridos a visitar estes espaços culturais lise, sempre que possível recorrendo a comparações internacionais.
destaca-se a sua importância histórica. Para além desta motivação de Os resultados sugerem que os espetáculos que outorgam uma mais
natureza identitária, sobressaem motivações de natureza sociabilís- elevada distinção – como a dança clássica, a ópera ou os concertos de
tica (convívio com outras pessoas) e estética (beleza do espaço e música clássica – são frequentados por inquiridos com qualificações
das obras expostas). A sociabilidade associada a estas visitas ressalta académicas elevadas e inscrições socioprofissionais que, possibili-
ao constatar-se que a maior parte delas foi realizada com familiares, tando-lhes uma maior diversificação dos seus relacionamentos sociais
namorado/a ou amigos. De entre as razões invocadas para não se ter e culturais, os levam a participar em «metamorfoses da distinção».
visitado, ou ido mais vezes, a um espaço patrimonial destacam-se a Quanto às tendências ao omnivorismo, elas encontram-se sobretudo
falta de tempo, a falta de interesse ou preferência por outras ativida- presentes entre os profissionais socioculturais e os inquiridos jovens,
des e o preço elevado. É entre os inquiridos com mais baixas qualifi- com nível de ensino superior, escolaridade parental também superior
cações académicas ou de classe socioprofissional modesta (operários e rendimentos mais elevados. Os dados analisados sugerem que a pro-
e trabalhadores dos serviços) que mais se alega a falta de interesse pensão a um consumo cultural mais omnívoro por parte dos jovens,
ou a preferência por outras atividades como razão de escusa para a em consonância com os resultados de outros estudos europeus, não
visita destes espaços patrimoniais, razão frequentemente invocada invalida o peso de outras variáveis sociográficas na estratificação dos
em outros estudos europeus. consumos culturais e na variabilidade do ecletismo cultural.
Ao longo do capítulo, Teresa Duarte Martinho discorre sobre Antecipando alguns dados do capítulo, constata-se que a percen-
outros indicadores de modalidades de acercamento e fruição dos tagem de jovens (15-24 anos) que foram ao cinema (82%) duplica
públicos da cultura em relação aos espaços culturais analisados: o a da média nacional (41%). A assiduidade nas idas ao cinema apa-
tipo de ingresso utilizado (bilhete normal ou com desconto, passe rece também associada a inquiridos com formação superior, grandes
turístico, acesso gratuito, isenção), a forma de aquisição (na bilhe- empresários, profissionais liberais e residentes na área metropolitana
teira, pela Internet, por telefone) e as atividades desenvolvidas de Lisboa e na Região Autónoma da Madeira. Os jovens distinguem-
durante a visita. O capítulo encerra com uma avaliação da frequência se ainda por serem dos que mais filmes de ação viram e dos que mais

36 37
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

frequentemente foram ao cinema com amigos ou namorado/a. Os internacionais, Rui Telmo Gomes avança para a análise da frequên-
motivos mais conducentes à escolha do último filme r­adicam em cia de práticas artísticas amadoras. Fica a saber-se que a ­afeição dos
atributos intrínsecos do mesmo: o tema do filme e os atores ou o inquiridos a estas atividades, com particular evidência entre os estu-
realizador. Assinalam-se também as recomendações vindas de fami- dantes e os mais jovens, é tanto mais expressiva quanto mais elevado
liares e amigos, o convívio e as críticas. De entre as principais razões é o seu grau de ensino. Porém, no conjunto da população sondada, as
para não se ter ido mais vezes ao cinema destacam-se a falta de práticas artísticas amadoras não têm grande expressividade, sobres-
tempo – principalmente reconhecida entre os inquiridos com nível saindo a escrita, à qual se dedicaram 8% dos inquiridos, e de seguida
de ensino superior – e a falta de interesse, sobretudo expressa por a fotografia/vídeo/cinema, a pintura/desenho/gravura e a música.
idosos e inquiridos com um grau de instrução inferior ao 3.º ciclo. A razão que mobilizou a maioria dos inquiridos para a prática de
Entre os 59% de inquiridos que não foram ao cinema nos últimos 12 atividades artísticas foi o prazer (66%), embora também se invoque
meses anteriores ao início da pandemia sobressaem os de rendimen- a expressão pessoal, a distração da vida quotidiana e a partilha entre
tos abaixo dos 800 euros mensais. amigos e família. Vimos, no capítulo 4, que o prazer foi também a
Passando aos espetáculos e concertos ao vivo, os mais frequen- razão que mais mobilizou os inquiridos para a leitura. São indica-
tados foram os festivais e festas locais, bem como os concertos de dores que claramente sugerem que a cultura não pode deixar de ser
música. As festas locais atraem quem tem habilitações escolares mais convocada para dar resposta a objetivos como o do bem-estar social.
reduzidas, tendo uma forte implantação na Região Autónoma dos É também dada informação sobre os meios utilizados na produção
Açores. As mais frequentadas são as festas tradicionais populares e artística (tradicionais, digitais ou ambos), variável associada à idade
as festas religiosas. Em contrapartida, os espetáculos eruditos – mú- e ao sexo/género dos inquiridos. Segue-se um importante conjunto
sica clássica, ópera e ballet ou dança clássica – encontram-se clara- de indicadores sobre capitais culturais herdados e adquiridos. Cha-
mente associados a inquiridos com rendimentos elevados, grandes mados a relembrar a sua infância e adolescência, ficamos a saber
empresários, profissionais liberais, profissionais socioculturais e que a maior parte dos inquiridos (61%) apontaram a escola como a
gestores. Finalmente, considerando a assistência a filmes e a espetá- instituição que, nessa fase da vida, mais se empenhou na realização
culos ao vivo, Vera Borges confronta o omnivorismo in situ com o de visitas a bibliotecas, exposições, museus, monumentos e idas a
omnivorismo digital, entreabrindo uma janela de observação e ques- espetáculos de qualquer tipo. As deslocações com o apoio da família
tionamento de possíveis efeitos, nos processos de democratização foram referidas por 40% e as combinadas com amigos por 34%.
cultural, da expectável crescente acessibilidade à cultura, mediada Em relação à formação artística, quando questionados sobre
pela Internet. se alguma vez participaram em oficinas artísticas ou usufruíram
O capítulo 7 (Participação artística e capitais culturais), desen- de aulas/lições de alguma disciplina artística, não incluídas no cur-
volvido por Rui Telmo Gomes, centra-se em práticas artísticas ama- rículo escolar, os inquiridos voltaram a destacar o papel da escola.
doras e nos capitais culturais adquiridos ao longo da vida, desde a A formação artística adquirida em contexto escolar beneficiou
infância e adolescência. No trilho de uma tradição que vem dos pri- sobretudo os mais jovens (15-24 anos) da geração nascida no pós-
meiros inquéritos europeus aos tempos livres, pois nesse domínio 25 de Abril. Finalmente, exploram-se os meios através dos quais os
eram então recenseadas as atividades culturais, o capítulo começa por inquiridos tomaram conhecimento dos acontecimentos culturais a
analisar a frequência de práticas culturais de entretenimento e lazer que assistiram ou em que participaram, avaliando-se também o tipo
nas suas vertentes lúdicas, sociabilísticas e de voluntariado. As mais de conhecimentos que julgam ter para desfrutar da oferta cultural.
expressivas, envolvendo entre um quarto e um terço da população No primeiro caso, veremos que os círculos sociais aparecem na dian-
inquirida, distribuem-se por jogos sociais, festas populares e segui- teira das fontes de informação, mais especificamente, as recomen-
mento ou criação de receitas culinárias, estas últimas mais associadas dações de alguém e as redes sociais online, com a televisão (notícias,
ao género feminino. De seguida, projetando algumas comparações informações, etc.) pelo meio intrometida, sendo assinalada uma

38 39
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

i­mportante diferença: enquanto as redes sociais (online ou offline) dissonâncias. Como justificar que no mesmo feixe de afinidades
são as fontes de informação privilegiadas pelos jovens, os mais ido- eletivas coexistam as culturas erudita e popular? O que se descobre
sos colhem principalmente informação da televisão e de recomenda- é uma associação, confirmada noutros países, entre práticas cultu-
ções de alguém. Quanto à perceção individual do conhecimento para rais omnívoras e elitistas. Mas descobre-se mais. As afinidades ele-
desfrutar da oferta cultural, ela varia consideravelmente de acordo tivas que convergem para o ecletismo cultural também sobressaem
com as qualificações académicas. entre inquiridos que protagonizam trajetórias de mobilidade escolar
No capítulo 8 (Práticas culturais e clivagens sociais), inspirando-se ascendente. A conclusão que se antecipa é que o ecletismo cultural
no conceito de afinidades eletivas que Goethe tomou dos alquimis- tanto pode corresponder a uma reafirmação de distinção social por
tas medievais, José Machado Pais explora conexões entre diferen- parte de algumas elites culturais como estar associado a trajetórias de
tes práticas culturais e distintos perfis sociográficos, a partir de uma mobilidade social ascendente.
análise de clusters hierárquica que distribui a população inquirida Finalmente, na área que reúne indicadores de participação cultu-
por cinco classes cuja caracterização e confronto percorrem todo ral, formação artística e socializações culturais ocorridas na infância
o capítulo. Para efeitos analíticos, as práticas culturais selecionadas e adolescência constata-se que o perfil cultural dos inquiridos é tanto
foram agregadas, sendo a sua problematização suscitada por vários mais fecundo quanto mais associado a socializações nestas faixas etá-
questionamentos que apelam à reflexão e ao debate. Assim, na área rias, a práticas de leitura, à participação cultural em associações, a
que reúne indicadores da Internet, audiovisuais e práticas de leitura, ações de voluntariado, a atividades artísticas e à formação artística
questiona-se a hipotética expansão da cultura em domicílio, sobre- extraescolar. Perante estas óbvias convergências, sugerem-se políti-
tudo fomentada pelas tecnologias digitais. A hipótese não foi plena- cas educativas e culturais que valorizem a formação artística. O capí-
mente confirmada. Embora, em contexto pandémico, os consumos tulo termina problematizando o futuro de um país cujo proporção
culturais através da Internet se tenham intensificado, podendo de deserdados culturais é ainda significativa. No entanto, a pesquisa
recrudescer no futuro, não é certo que culminem numa expansão da dá conta de expressivas brechas emancipatórias, proporcionadas por
cultura em domicílio: por um lado porque apenas 16% dos inquiri- trajetórias de mobilidade escolar intergeracional que, ao quebrarem a
dos usam habitualmente o computador fixo para se conectar à Inter- rigidez das cadeias de reprodução cultural, possibilitam o resgate de
net; por outro lado, o acesso a esta não significa, necessariamente, uma parte dos culturalmente deserdados, condição social sinalizada
acesso à cultura. Tudo depende dos usos da Internet. Em uma das pelos reduzidos capitais escolares dos seus progenitores. Se a ten-
cinco classes do dendrograma, representando 32% dos inquiridos, dência se consolidar, em conjugação com outras dinâmicas sociais,
a maior parte com baixo nível de instrução, veremos que todos é expectável, conclui-se, que a participação cultural dos portugueses
eles têm acesso à Internet mas nenhum a usa para atividades cul- possa ter, no futuro, uma evolução positiva.
turais, das quais, na realidade (offline), vivem apartados. A cultura Por último, o capítulo 9 (Algumas notas sobre práticas, política e
em domicílio permite também debater a tese que sustenta que os programação culturais), ao mesmo tempo que encerra o livro, entrea-
jovens leem menos livros por estarem mais expostos à televisão e à bre portas para um dos principais desafios do Inquérito realizado:
Internet. Porém, as classes com inquiridos que mais livros leem são o de colocar à disposição de programadores culturais e de outros
precisamente as que têm uma prevalência de jovens e de estudantes agentes atuando na esfera das políticas culturais um valioso conjunto
– e nem por isso deixam de ver televisão ou de aceder à Internet. de dados que possam dar suporte às suas decisões. O contributo de
O que sobressai é uma forte associação entre práticas de leitura e Miguel Lobo Antunes, aliando um profundo conhecimento de ter-
usos da Internet de pendor cultural. reno a uma espontânea sensibilidade sociológica nas interrogações
Na área que envolve a frequência de espaços patrimoniais, a que submete os dados do Inquérito, pressagia a concretização
cinema e espetáculos ao vivo busca-se o desvelamento dos trânsi- desse objetivo. Na verdade, como sói dizer-se, os dados não falam
tos enigmáticos que o ecletismo cultural encerra, nas suas a­ parentes por si, mas se os soubermos interrogar eles acabam por falar. É esse

40 41
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

diálogo entre uma realidade interpelada e o desejo de a interpretar escola, as tenham concretizado nos últimos 12 meses. Estes achados
para melhor a transformar que acaba por pautar o andamento deste suscitam o reconhecimento da necessidade de incorporar na análise
­capítulo. A partir de uma seleção criteriosa de práticas culturais das práticas culturais as motivações ou razões para as realizar ou
transversais a todo o capítulo, começa por se indagar como se distri- não, eixo analítico fundamental no desenho das políticas culturais,
bui a frequência das práticas culturais em função das variáveis socio- sobre as quais se discorre tendo em vista um incremento genera-
gráficas de quem as desenvolve. Avança-se depois para uma análise lizado e equitativo das práticas culturais. Para o mesmo objetivo
dessas práticas culturais segundo a frequência com que foram desen- concorre a análise da perceção dos conhecimentos que os inquiri-
volvidas na infância e adolescência. De seguida exploram-se as razões dos dizem possuir para desfrutar da oferta cultural. Constatando-se
invocadas pelos inquiridos para a realização ou não dessas práticas e que 35% deles não possuem tais conhecimentos e que 29% apenas
os meios através dos quais tomam conhecimento dos acontecimen- têm alguns, mas não os suficientes que lhes permitam desfrutar da
tos culturais a que assistem ou em que participam. Por último, aus- generalidade ou de toda a oferta cultural, as indagações analíticas
culta-se a sua opinião sobre os conhecimentos que consideram ter realizadas revelam uma correlação significativa entre a intensidade
para, em geral, poderem desfrutar da oferta cultural. das práticas culturais e a amplitude dos conhecimentos possuídos
As sistemáticas indagações sobre o significado dos dados do para se desfrutar da oferta cultural. Daí se demandar a necessidade
Inquérito levam Miguel Lobo Antunes a concluir que a política e de as programações culturais darem uma maior atenção às fontes
a programação culturais, tendo por objetivo uma mais equilibrada de informação e conhecimento da oferta cultural, tendo em vista
distribuição das práticas culturais pelo país, não podem deixar de não apenas os públicos fidelizados mas também os potencialmente
identificar e questionar a razão de ser das disparidades regionais interessados.
encontradas. Porém, alerta, nem as assimetrias do lado da oferta cul- 4. Com esta breve apresentação dos capítulos do livro identi-
tural se projetam necessariamente na procura nem é certo que um ficaram-se algumas significativas desigualdades no acesso à cultura,
aumento da primeira induza um correlativo acréscimo na segunda. cuja extensão e interpretação merecerá reflexões mais profundas ao
Ademais, outras desigualdades identificadas no acesso à cultura – em longo dos mesmos. Há práticas culturais minoritárias, com destaque
desfavor das mulheres, dos idosos e dos inquiridos com mais baixos para os espetáculos eruditos, que, pela distinção que os caracteriza,
níveis de rendimentos ou de instrução – suscitam a necessidade de não estão ao alcance de todos. Por outro lado, é possível que a oferta
políticas culturais orientadas por um mais equitativo acesso aos bens cultural registada nas plataformas digitais em contexto pandémico,
culturais, realidade que, como bem sugere, não tem sido adequada- bem como a intensificação do uso da Internet com propósitos cul-
mente considerada nos apelos à democratização do acesso à cultura, turais, possa acentuar-se no futuro. A crescente escolarização dos
sobretudo quando equacionada do lado da oferta, sintonizada com jovens, registada nas últimas décadas, poderá também ampliar os
segmentos da população mais abastada e escolarizada. horizontes de participação cultural quando se equaciona o futuro do
Colocar na mesma equação as relações de dependência entre país. Porém, o Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses, como
os capitais culturais adquiridos no âmbito de diferentes socializa- qualquer outro, recolhe uma informação datada, deixando escapar o
ções e as assimetrias de acesso aos bens culturais é um importante efeito que a variabilidade do tempo produz nas práticas culturais.
requisito para se aferir os níveis de democracia cultural e desen- Esse objetivo só é alcançável quando se avalia a sua evolução numa
volvimento humano. É neste trilho de pesquisa que o capítulo perspetiva longitudinal, como acontece em outros países. Espera-se
avança, constatando-se que as deslocações a bibliotecas, exposições, que o impulso dado pela Fundação Calouste Gulbenkian à realização
museus, monumentos ou a espetáculos de qualquer tipo, realizadas deste Inquérito permita o que até agora tem sido apenas viável em
durante a infância e a adolescência, aparecem correlacionadas com alguns domínios sectoriais da cultura: uma avaliação, fundamentada
as práticas culturais atuais, embora nem todos os que, nessa fase da na análise de indicadores culturais ao longo do tempo, das políticas
vida, beneficiaram dessas experiências, sobretudo com o apoio da de democratização da cultura no esbatimento das desigualdades de

42 43
Práticas Culturais dos Portugueses Introdução

acesso à mesma, bem como das políticas de fomento à participação Referências bibliográficas
cultural, base constitutiva da democracia cultural.
A presente publicação está longe de esgotar as explorações analí- Bellavance, Guy, dir. (em colaboração com Micheline Boivin e Lise Santerre) 2000.
ticas que os dados do Inquérito realizado possibilitam. Porém, a base Démocratisation de la culture ou démocratie culturelle? Deux logiques d’action
de dados ficará disponível, em acesso aberto, no Arquivo Português publique. Québec: Presses de l’Université Laval.
de Informação Social (APIS) e no consórcio PASSDA (Production Donnat, Olivier. 2011. «Democratização da Cultura: fim e continuação?». Revista
Observatório Itaú Cultural, n.º 12: 19-34.
and Archive of Social Science Data), constituindo um valioso acervo
Dubois, Vincent 1999. La politique culturelle: Genèse d’une catégorie d’intervention
de informação para decisores políticos, programadores culturais, publique. Paris: Belin.
jornalistas, pesquisadores, estudantes e outros cidadãos interessa- Gaspar, Jorge, coord. 1985-1988. Práticas Culturais dos Portugueses. Relatórios preli-
dos em explorar os dados, de acordo com os seus interesses.1 Deste minares, 9 volumes. Lisboa: Direção-Geral de Ação Cultural, Centro de Estudos
modo, o Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa Geográficos (INIC) e Direção de Ação para o Planeamento Regional e Urbano.
(ICS-ULisboa) e a Fundação Calouste Gulbenkian afirmam o seu Lopes, Guilhermina Calado, Edviges Coelho, Heloísa Perista, Maria das Dores
compromisso com as políticas europeias de ciência aberta, através da Guerreiro, José Soares Neves, e Rui Telmo Gomes. 2001. Inquérito à Ocupação
disponibilização e partilha do conhecimento produzido, permitindo do Tempo 1999: Principais Resultados. Lisboa: Instituto Nacional de Estatística.
Lopes, João Teixeira. 2007. Da Democratização à Democracia Cultural: Uma Refle-
que os dados do Inquérito sejam consultados e trabalhados por um
xão sobre Políticas Culturais e Espaço Público. Porto: Profedições
público alargado. Destarte, é justo reconhecer o apoio fundamental Lopes, Sandra Cristina Rodrigues Santana. 2019. «Políticas culturais municipais: Da
da Fundação Calouste Gulbenkian, que tornou possível a realiza- história social do campo aos reportórios de ação dos agentes». Tese de doutora-
ção do Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses 2020. Agra- mento, Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas – Universidade Nova
decimentos são devidos a Isabel Mota, Presidente do Conselho de de Lisboa.
Administração; Guilherme d’Oliveira Martins, Administrador; Rui Romainville, Céline. 2016. «Les dissonances entre démocratisation et démocratie
Vieira Nery, Diretor do Programa Gulbenkian Cultura ao tempo culturelle dans le droit des Centres culturels». Droit et société, n.º 92: 53-73.
em que o projeto foi aprovado pela Fundação; Miguel Magalhães, Voices of Culture. 2021. Culture and the UN Sustainable Development Goals. Chal-
lenges and Opportunities (Structural dialogue between the European Commis-
atual Diretor desse Programa; e Maria Helena Melim Borges, Dire-
sion and the cultural sector). Bruxelas: Brainstorming Report, fevereiro de 2021.
tora-Adjunta do mesmo Programa. Agradecimentos são também Comissão Europeia e Goethe-Institut.
devidos a Karin Wall, Diretora do Instituto de Ciências Sociais da
Universidade de Lisboa, pelo apoio logístico dado por esta institui-
ção à realização do Inquérito. Finalmente, o registo de um profundo
reconhecimento pelo interesse com que estas autoridades acompa-
nharam, desde o início, o desenvolvimento deste projeto.

José Machado Pais

1
A base de dados pode ser consultada em: http://www.apis.ics.ulisboa.pt.
A brochura Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses 2020. Síntese de Resulta-
dos, cuja versão impressa foi lançada com o presente livro, encontra-se disponível
online, também traduzida em inglês. Ambas as publicações, incorporando o ques-
tionário do Inquérito, são consultáveis em: https://www.ics.ulisboa.pt/flipping/
praticasculturais2020/.

44 45
Pedro Magalhães
Jorge Rodrigues da Silva

Capítulo 1

Aspetos metodológicos
e sociografia dos inquiridos

Ao longo deste capítulo inicial, apresentamos de forma sucinta


os principais aspetos metodológicos do Inquérito realizado e as
características sociográficas fundamentais da amostra da população
recolhida.
O questionário através do qual se recolheram os dados utilizados
neste estudo foi concebido pela equipa do projeto, atendendo aos
seus objetivos e recorrendo, nalguns casos, a questionários utilizados
em estudos nacionais e estrangeiros anteriores, de forma a permitir a
comparabilidade e o recurso a formatos já testados. Apesar disso, foi
realizado um pré-teste utilizando a primeira versão do questionário,
aplicado a 26 inquiridos com características diversificadas do ponto
de vista do sexo, idade e instrução, de forma a testar a duração média
da entrevista, a compreensão das perguntas e as dificuldades sentidas
pelos inquiridos, assim como avaliar o script de CAPI (Computer
Assisted Personal Interview). A partir dos resultados deste pré-teste
foi produzida uma segunda e final versão do questionário.
O universo deste estudo – a população acerca da qual se pre-
tende fazer inferências sobre as suas práticas culturais – é com-
posto pela população com 15 ou mais anos residente em Portugal,
no Continente como nas Regiões Autónomas. Os inquiridos foram
selecionados aleatoriamente dentro de cada domicílio, cada domicí-
lio de forma igualmente aleatória – random route – dentro de cada
localidade, e cada localidade também de forma aleatória respeitando

47
Práticas Culturais dos Portugueses Aspetos metodológicos e sociografia dos inquiridos

uma matriz de distribuição da população-alvo/inquéritos, formada viviam num habitat urbano, 39% em habitat rural, e 18% em habitat
pelo cruzamento entre regiões NUTII e a dimensão das localida- intermédio urbano.1
des. Quando o inquirido aleatoriamente selecionado se encontrava
ausente, foram feitas – no máximo – mais três revisitas para garan- Gráfico 1.1 – Distribuição da amostra por região (%)
tir a obtenção de resposta por parte dessa pessoa. Após a terceira
revisita sem sucesso, procurou-se realizar a entrevista em alojamento
adjacente, inquirindo o residente com características iguais às do
anterior do ponto de vista de género e escalão etário, se conhecidas.
O trabalho de campo foi realizado pela Metris GfK, com a par-
ticipação de 57 entrevistadores. Decorreu entre os dias 12 de setem-
bro e 28 de dezembro de 2020. A informação foi recolhida através de
entrevista direta e pessoal na residência dos inquiridos, em sistema
CAPI.
A amostra tem uma dimensão de 2000 inquiridos. A taxa de
resposta – a proporção dos inquiridos que aceitaram responder
integralmente ao questionário em relação ao total daqueles que
potencialmente deveriam ter feito parte da amostra – foi de 39%. Por
outras palavras, as 2000 entrevistas completas correspondem a 39%
de um total composto por entrevistas completas, entrevistas par-
ciais, não-entrevistas (recusa e abandono) e todos os restantes casos
de elegibilidade desconhecida. Já a taxa de cooperação – a proporção Gráfico 1.2 – Distribuição da amostra por habitat (%)
dos inquiridos que aceitaram responder integralmente ao questio-
nário em relação aos efetivamente contactados – foi de 55%. Isto
significa que as entrevistas completas correspondem a 55% de um
total composto pelo número de entrevistas completas, entrevistas
parciais e não-entrevistas (recusa e abandono). Uma amostra alea-
tória de 2000 inquiridos tem associado um erro amostral máximo de
2,2%, com 95% de confiança.
De seguida abordamos a sociografia da amostra da população
recolhida neste estudo, dando ênfase àquelas variáveis que, nos res-
tantes capítulos, serão cruzadas com as práticas culturais que são
o objeto fundamental do estudo. Do ponto de vista geográfico, os
2000 indivíduos inquiridos para este estudo distribuem-se por região
de forma muito próxima da distribuição conhecida da população A amostra é tendencialmente feminina, composta por 58% de
residente com 15 ou mais anos, por força da estratificação da amos- mulheres e 42% de homens. A idade média dos inquiridos era de
tra: 35% residiam na região Norte, 27% na região da Área Metropo-
litana de Lisboa, 22% na região Centro, 7% na região do Alentejo,
1
As percentagens referidas foram arredondadas à unidade pelo que, como
acontece na tabela 1.1, o seu somatório pode não coincidir com 100%. Em cada grá-
4% na região do Algarve, 3% na região da Madeira e 2% nos Açores.
fico, o valor do «N» corresponde à base amostral em relação à qual as percentagens
No que diz respeito à dimensão das localidades, 43% dos inquiridos são calculadas.

48 49
Práticas Culturais dos Portugueses Aspetos metodológicos e sociografia dos inquiridos

53 anos. Os inquiridos mais jovens tinham 15 anos, ao passo que o Para além do grau de ensino dos inquiridos, apurou-se tam-
mais velho tinha 94 anos. Observando a distribuição dos inquiridos bém o nível de escolaridade parental mais elevado. Esta variável foi
por faixas etárias, 9% dos inquiridos situavam-se entre os 15 e os 24 ­operacionalizada considerando o grau de instrução da mãe e do pai
anos, 12% entre os 25 e os 34 anos, 14% entre os 35 e os 44 anos, do inquirido para identificar o grau de escolaridade mais elevado
14% entre os 45 e os 54 anos, 18% entre os 55 e os 64 anos e 33% entre os dois, definido pelas categorias: inferior (menos que 3.º ciclo
com 65 anos ou mais. e 3.º ciclo); médio (secundário); superior (superior). Para 74% da
amostra, o nível de escolaridade parental mais elevado não ultrapassa
Tabela 1.1 – Distribuição da amostra por faixa etária
o 3.º ciclo (categoria inferior), com 20% dos inquiridos a reportarem
o nível de escolaridade médio, e apenas 5% o nível de escolaridade
parental superior. Os resultados mostram assim uma amostra que,
previsivelmente e em consonância com a população em geral, tem
um percurso de mobilidade escolar ascendente.
No que diz respeito à situação profissional nos sete dias anterio-
res à aplicação do inquérito, 47% dos inquiridos declararam estar a
fazer trabalho pago (seja por conta de outrem ou própria), 35% refe-
riram ser reformados ou pensionistas e 8% declararam estar desem-
pregados(as). As restantes situações têm frequências inferiores. 20%
dos inquiridos reportaram que o seu agregado familiar tem rendi-
mentos mensais líquidos inferiores a 500 euros, 35% tinham ren-
dimentos entre os 500 e os 800 euros e 30% entre os 800 e os 1500
Em termos de situação conjugal, 54% dos inquiridos referiram euros. Apenas cerca de 15% dos inquiridos afirmaram ter rendimen-
estar casados(as) ou em situação de união de facto, 22% solteiros, tos superiores. Contudo, note-se que tal como sucede geralmente
15% viúvos(as) e 9% divorciados(as)/separados(as). Já quanto ao neste tipo de estudos, estas distribuições dizem respeito a apenas
grau de ensino mais elevado concluído ou frequentado, cerca de 13% 57% do total dos inquiridos, dado que 43% afirmaram não saber ou
dos inquiridos referem o curso superior, 23% o curso secundário e recusaram prestar esta informação.
16% o 3.º ciclo do ensino básico. 48% afirmaram não ter atingido o Pelo contrário, a esmagadora maioria dos inquiridos aceitou res-
3.º ciclo. ponder a uma questão na qual se pedia uma avaliação subjetiva do
seu rendimento. 17% afirmaram viver «confortavelmente» com o
Tabela 1.2 – Distribuição da amostra por grau de ensino mais rendimento que auferem, 49% «razoavelmente», 27% «com algumas
elevado concluído ou frequentado dificuldades» e 8% «com muitas dificuldades». Apenas 1 em cada 100
inquiridos não respondeu a esta questão.
Finalmente, na base das respostas à pergunta sobre a ocupação
atual ou anterior do/a inquirido/a ou do seu cônjuge, construiu-se
uma variável de classe socioprofissional baseada no esquema de clas-
ses de Oesch (Oesch e Rennwald 2018), com oito categorias, descri-
tas no quadro 1.1.
A lógica subjacente a este esquema de classes socioprofissionais
consiste em combinar duas dimensões. A primeira é hierárquica, refle-
tindo relações de trabalho mais ou menos vantajosas, ­normalmente

50 51
Práticas Culturais dos Portugueses Aspetos metodológicos e sociografia dos inquiridos

Quadro 1. 1 – Composição das categorias de classe socioprofissional amostra), seguidos de 10% de pequenos empresários e comerciantes,
7% de empregados de escritório, 6% de profissionais socioculturais,
4% de técnicos e especialistas e de gestores, e finalmente um número
muito reduzido de grandes empresários e profissionais liberais.
A amostra aleatoriamente selecionada acabou por exibir desvios
em relação à informação das estatísticas oficiais conhecida à data do
inquérito sobre a população residente com 15 ou mais anos no que
toca ao sexo, à idade e à instrução, tal como sucede frequentemente
em amostras aleatórias. Em particular, a amostra sobrestimou o peso
das mulheres nessa população, dos escalões etários acima dos 54
anos e dos indivíduos com menores níveis de instrução. Procedeu-se
por isso à criação de um ponderador pós-amostral, que permite que,
em todas as inferências para a população na base da amostra, se atri-
bua ao inquirido um «peso» que faz com que os resultados obtidos
decorram de distribuições em termos de sexo e escalão etário iguais
às das estimativas da população residente com 15 ou mais anos e
relacionadas com maiores ou menores competências ou maior ou mitigando os desvios da amostra em relação ao grau de instrução.
menor capital económico e cultural. A segunda dimensão é horizon- O ponderador em causa resultou de um procedimento de ajuste ite-
tal e distingue diferentes lógicas de trabalho: independente (peque- rativo proporcional, recorrendo ao módulo ipfweight do software
nos e grandes empresários), técnico (técnicos e especialistas, mas estatístico Stata. O valor mais baixo desse ponderador é 0,7 e o mais
também operários), organizacional (gestores e empregados de escri- alto é 1,98. Todos os resultados apresentados neste estudo, exce-
tório) e «interpessoal» (profissionais socioculturais mas também tuando os que dizem respeito à sociografia dos inquiridos, resultam
trabalhadores dos serviços). O gráfico 1.3 mostra a distribuição da da aplicação deste ponderador.
amostra deste ponto de vista. Mostra o predomínio dos operários
e dos trabalhadores dos serviços (totalizam em conjunto 62% da

Gráfico 1.3 – Classes socioprofissionais (Oesch, oito categorias) (%)

52 53
Práticas Culturais dos Portugueses

Referências bibliográficas Teresa Duarte Martinho


Tiago Lapa
Oesch, Daniel, e Line Rennwald. 2018. «Electoral competition in Europe’s
new tripolar political space: Class voting for the left, centre-right and radical
right». European Journal of Political Research, 57, n.º 4: 783-807.

Capítulo 2

Internet, práticas culturais online


e distinção

A transição das tecnologias analógicas para as digitais e a con-


solidação do modelo de organização social designado «sociedade da
informação» (Masuda 1981) ou «sociedade em rede» (Castells 2002)
têm vindo a impulsionar crescentemente a interpenetração entre o
online e o offline. A exposição a quantidades e fluxos muito vastos de
informação e a capacidade particular de equipamentos digitais para
os experienciar espacial e temporalmente, potenciada pela conetivi-
dade móvel, remodelou de modo significativo os perfis dos consu-
midores, estilos de vida e modos de relação com a cultura. Desafiou
recursos materiais, cognitivos e sociais, suportando diversas com-
petências, aptidões e disposições para (re)criar, disseminar e aceder
a conteúdos e serviços culturais em suporte digital. Ainda em fase
exploratória, a investigação dedicada ao envolvimento ativo em ati-
vidades culturais online, enquanto dimensão da participação cultural
e do lazer, tem vindo a revelar processos de não inclusão, estrati-
ficação e distinção social nas práticas culturais na Internet, uma
esfera de entrada e navegação só aparentemente universal e ilimi-
tada. A Internet, mais do que um medium «monolítico», constituiu
um espectro de práticas, tecnologias de software e hardware, modos
de representação e interação que podem ou não ser interligados por
participantes, máquinas ou programas (Miller e Slater 2000, 14).
O presente capítulo pretende facultar um contributo para esta
linha de pesquisa, explorando os fatores sociodemográficos que

54 55
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

i­nfluenciam e condicionam as modalidades de acesso e utilização da c­hamada ‘sociedade da informação’ (Comissão das Comunidades
Internet e as configurações sociais identificáveis nas práticas cultu- Europeias 1993). A revolução significava um conjunto de mutações
rais online dos portugueses. muito rápidas, com efeitos nas técnicas e nos modos de organização
A primeira parte do capítulo introduz elementos estatísticos do trabalho, baseadas nas telecomunicações. Implicava um processo
que favorecem a compreensão das tendências apuradas no Inqué- de desmaterialização da economia em que a posse e a circulação de
rito. Traça-se uma perspetiva comparada da situação em Portugal e informação se constituíam como princípio organizador e o com-
noutros países de diferentes regiões da União Europeia (UE) sobre putador assumia um papel nuclear (Bell 1974), num modelo que os
a distribuição das tecnologias de informação e comunicação e a rea- Estados Unidos da América e o Japão tinham começado a ensaiar
lização de práticas online com finalidades culturais, levantando cliva- (Masuda 1981).
gens digitais e explorando a relação com indicadores de desigualdade Na transição do século xx para o xxi, a União Europeia já tinha
social. A segunda secção foca analiticamente os resultados do Inqué- identificado o problema da «divisão digital» (van Dijk 2009) e da desi-
rito acerca do grau de utilização da Internet para vários propósitos, gualdade digital, termo que alguns autores consideram mais incisivo
apresentando um retrato sociodemográfico inicial dos internautas para designar as clivagens que vão além de ter ou não ter acesso, de
portugueses, que ressalta as variáveis associadas de maneira mais usar ou não usar a Internet, e que remetem para graus muito diferen-
significativa com a apropriação das tecnologias digitais. Na terceira tes de autonomia, competências, apoio social disponível, variedade de
parte detemo-nos sobre a frequência de diversas práticas online rela- objetivos e articulação com a atividade offline (DiMaggio e H ­ argittai
cionadas com cultura, integrando desde a procura de informação ao 2001). Perante a vaga de desafios sociais emergentes no contexto
visionamento direto de obras e conteúdos, variando entre o setor da pandemia de Covid-19, como a intensificação do teletrabalho e
comummente designado cultivado ou de ‘alta cultura’ e o popular/ do ensino online, a UE realçou em 2021 a urgência de reforçar as
massificado. O objetivo é identificar diferentes perfis de utilizado- capacidades em domínios como a conectividade e a microeletrónica,
res com base nas relações entre as características sociográficas e a destacando a importância dos projetos plurinacionais para reduzir
frequência de realização de práticas que remetem para atividades cul- as clivagens digitais existentes entre Estados-Membros e no interior
turais. Na quarta seção analisa-se a variação do grau de utilização da de cada país, que adiante se especificam (Comissão Europeia 2021).
Internet para diversas atividades culturais em conjuntura pandémica. Em Portugal, as principais tendências no acesso e utilização da
Os principais resultados da análise desenvolvida neste capítulo são Internet denotam discrepâncias características de países onde a pro-
condensados na síntese conclusiva. moção da sociedade da informação, como orientação programática
das políticas públicas e da economia, tem sido mais tardia, num tra-
jeto que a análise histórica e política contribui para compreender, mas
Divisões digitais em Portugal e na Europa: que não integra as problemáticas nucleares deste capítulo (­Martinho
uma perspetiva comparada 2016; Garcia et al. 2018). A incursão comparativa que se segue con-
corre para um empreendimento mais vasto, o de refletir sobre a
Apresentam-se nesta secção dados estatísticos diversos que equação entre tradição e mudança na sociedade portuguesa, no qua-
apesar de não entrarem diretamente em diálogo com a informação dro do seu desenvolvimento como sociedade semiperiférica crescen-
obtida pelo Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses 2020 temente integrada num dos polos centrais do sistema-mundo, ainda
facultam enquadramentos que concorrem para a contextualizar. que em posição dependente (Silva 1994; Conde 2000). Num grupo
No final de 1993, ano da inauguração do acesso livre a uma de países da UE, representativo das regiões nórdica, mediterrânica,
rede de computação de alcance mundial, a União Europeia dissemi- central e de leste, e com base na informação do Eurostat, Portugal
nou o primeiro apelo mais estruturado à reflexão dos países mem- (84%) figura entre aqueles cuja proporção de agregados familiares
bros sobre a maneira de enfrentar uma «nova revolução industrial» com ligação à Internet se situa, em 2020, abaixo da taxa média da

56 57
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

UE (91%) (tabela 2.1).1 Ressalta o contraste entre a situação dos e digitais em atualização permanente. Em 2020, 63% dos portugue-
países mediterrânicos, com a exceção de Espanha (95%), e de leste ses utilizavam a Internet em mobilidade, distanciando-se novamente
e o panorama dos Estados do centro e do norte da Europa, onde em da média europeia (75%) e principalmente da Suécia, Dinamarca e
2011 os espaços domésticos com acesso à Internet variavam entre 84 Holanda (93%, 92% e 89%, respetivamente). Assinale-se que, em
e 94%. Os diferenciais no ritmo de desenvolvimento informacional Portugal, este tipo de uso triplicou entre 2011 e 2020, traduzindo a
detetam-se igualmente no uso de dispositivos móveis para conexão à generalização do acesso aos media digitais.
Internet fora de casa ou do trabalho. Está em causa um tipo de tecno- Um indicador suplementar de comparação entre países europeus
logia cujo funcionamento publicitado como «intuitivo» exige, afinal corresponde ao acesso por grau de urbanização, que permite reco-
– e devido a fatores relacionados com design, dimensão e amplitude nhecer desigualdades em resultado da presença (ou ausência) de cli-
de funcionalidades e extensões possíveis –, competências percetivas vagens digitais geográficas. Enquanto no norte e no centro da Europa
o acesso à Internet surge paritário em cidades, vilas e subúrbios e
áreas rurais, em Portugal avistam-se desfasamentos notórios entre
Tabela 2.1 – Indicadores de acesso e uso da Internet cidades e territórios rurais (taxas de acesso de 87% e 70%, respeti-
na União Europeia (%) vamente), numa distribuição que desvenda fragilidades persistentes
da sociedade portuguesa quanto ao desenvolvimento informacional
(Lapa e Vieira 2019). Em 2019, de acordo com a informação do Ins-
tituto Nacional de Estatística (INE), a área metropolitana de Lisboa
detinha a maior de taxa de ligação à Internet (89%) (INE 2019). E de
acordo ainda com os dados do Eurostat, o cruzamento das variáveis
‘grau de urbanização’ e ‘frequência de uso da Internet’ continua a
revelar o desfasamento da disseminação no território em diferentes
países de diversas regiões da Europa. Sobressai a distância entre paí-
ses mediterrânicos e países nórdicos e do centro. Em Portugal, o uso
‘diário’ (Eurostat 2021b) da Internet separa em 16 pontos percen-
tuais as cidades e as áreas rurais; nos países nórdicos, como a Suécia
ou a Dinamarca, o diferencial ronda os 4 ou 5 pontos percentuais;
nos países do centro, tende a não haver diferença, como ocorre na
Holanda e na Bélgica.
Motivos relacionados com o nível de escolaridade, os rendimen-
tos e a idade dos inquiridos contribuem para interpretar as dispari-
dades no acesso e utilização da Internet, principalmente à medida
que o contacto com o digital se torna mais exigente em literacia,
Fonte: Digital economy and society statistics – households and individuals https://ec.europa capacidade e habilidade, como sucede no caso dos equipamentos
.eu/eurostat/statistics-explained/index.php?title=Digital_economy_and_society_statistics_- com conectividade móvel. Portugal é, no conjunto aqui conside-
_households_and_individuals.
Percentagem sem casa decimal na fonte. rado, o país onde o grau ‘baixo’ de escolaridade entre cidadãos dos
* Com idade entre 16 e 74 anos. 25 aos 52 anos e dos 55 aos 74 anos assume uma expressão maior
(37,5% e 71,9%, respetivamente), sendo menos compensado pelo
grau ‘médio’ (tabela 2.2). Simultaneamente, a remuneração média
1
As estatísticas oficiais sobre utilizadores da Internet apuraram, em 2003, 26%
de utilizadores entre os 16 e os 74 anos (AAVV. 2007). mensal no cenário português situa-se no patamar abaixo dos 900

58 59
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

Tabela 2.2 – Indicadores de escolaridade, remuneração e demografia Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) relativos
na União Europeia (%) a 2019, a utilização da Internet abrangia quase todos os que con-
cluíram o ensino superior, a contrastar com uma taxa de utilização
de 56% na população com um grau de escolaridade até ao 3.º ciclo
do ensino básico (INE 2019). De acordo com a fonte referida, a
proporção de utilizadores de Internet diminui de modo acentuado
com a idade: para as pessoas com menos de 55 anos o grau de utili-
zação situava-se acima dos 80%; no grupo dos 55 aos 64 anos era de
59%; e na população com 65 ou mais anos de idade correspondia a
34%. Nos grupos etários dos 16 aos 44 anos, a utilização era pratica-
mente ­universal. Conclui-se, pois, que a sociedade informacional em
­Portugal c­ ontinua a caracterizar-se pela existência de uma divisória
social pronunciada entre os que cresceram em adaptação constante
às tecnologias de informação e comunicação e aqueles que se encon-
tram já retirados da esfera laboral e possuem principalmente um grau
Fontes: Educational attainment statistics https://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/
index.php?title=Educational_attainment_statistics#Level_of_educational_attainment_by_
de escolaridade baixo.
age. As preferências dos utilizadores da Internet para aceder a con-
How do earnings vary across the EU? https://ec.europa.eu/eurostat/web/products-eurostat- teúdos online apuradas no Flash Eurobarometer 2016 3 evidenciam
news/-/ddn-20210316-2?redirect=%2Feurostat%2Fweb%2Fmain%2Fnews%2Fwhats-new.
Population structure indicators at national level https://ec.europa.eu/eurostat/databrowser/ um interesse dirigido maioritariamente à leitura de jornais e textos
product/page/DEMO_PJANIND. noticiosos (tabela 2.3) (Eurobarometer 437 2016). A maior parte dos
Percentagens com uma casa decimal nas fontes. cidadãos da UE declarou usar a Internet para aceder a vários tipos
Nota: o grau de escolaridade ‘baixo’ inclui até ao 9.º ano de escolaridade; o grau ‘médio’ inte-
gra o ensino secundário (10.º, 11.º e 12.º anos de escolaridade) e o ensino pós-secundário de conteúdos culturais em formato digital com proeminência para
(curso de especialização tecnológica); o grau ‘alto’ corresponde ao ensino superior (curso o contacto ‘todos os dias (ou quase)’: 45% afirmaram que o faziam
técnico superior profissional, bacharelato, licenciatura, mestrado e doutoramento). para aceder à imprensa e a notícias, seguindo-se a procura de conteú-
dos relacionados com música (33%), imagens (fotografias, pintura,
euros, tal como ocorre na Hungria, formando um segmento que, de desenho) (26%) e filmes ou séries televisivas (24%). Todos os tipos
novo, se distancia particularmente dos países nórdicos e do centro de conteúdos foram predominantemente acedidos de modo gratuito,
da Europa. principalmente a imprensa e notícias online (87%) (ibidem, 4). Para
A menor disseminação do acesso e da utilização da Internet os quatro géneros de conteúdos, a possibilidade de acesso sem paga-
em Portugal, comparativamente com a média europeia, afigura-se, mento constitui, aliás, o critério mais saliente na escolha de um ser-
portanto, indissociável de fatores relacionados principalmente com viço/plataforma fornecedor, seguindo-se a boa qualidade audiovisual
o capital cultural institucionalizado (diplomas escolares). Pesam (no acesso a música e filmes e séries televisivas) e a não obrigatorie-
ainda o nível remuneratório, o grau de urbanização e a estrutura dade de registo/inscrição (na procura de imagens, imprensa e notí-
demográfica do país, a qual apresenta uma das taxas mais altas da cias). O acesso dos internautas portugueses a imprensa e ­notícias e
população com 65 e mais anos, precisamente a geração que menos
pode beneficiar do alargamento do sistema educativo (tabela 2.2).2 A Organização das Nações Unidas prevê que Portugal será, em 2030, o terceiro país
mais envelhecido do mundo.
3
O inquérito abrangeu os utilizadores de Internet dos 15 aos 45 anos, por cor-
2
Os países com uma população mais idosa, por ordem decrescente, são: Itá- responderem, segundo os autores, ao grupo que mais utiliza os conteúdos online
lia, Grécia, Finlândia, Portugal, Alemanha, Suécia, Eslovénia, Dinamarca e outros. focados (Eurobarometer 437 2016, 2).

60 61
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

Tabela 2.3 – Frequência do uso da Internet para consumo e acesso a imagens foi superior à média europeia. Verifica-se igualmente que
a conteúdos em formato digital, 2016* (%) entre os países nórdicos a proporção dos que ‘nunca’ acedem na
Internet àqueles conteúdos culturais é mais elevada. Tal poderá estar
relacionado com, entre outros possíveis fatores, as especificidades
de políticas educacionais e culturais, como as particularidades nas
regulamentações nacionais de direitos de autor e direitos conexos,
e também com a existência de níveis remuneratórios superiores, que
favorecem a possibilidade de aceder a circuitos de participação e con-
sumo cultural presencial.
A leitura de sites relacionados com imprensa volta a afirmar-se
no inquérito do Eurostat sobre usos das tecnologias de informação e
comunicação seguindo-se, na União Europeia, ver televisão ou vídeo
e ouvir música (Eurostat 2021a). No contexto português, a atenção
aos sites noticiosos assume maior expressão e a audição de música
surge em segundo lugar. São consumos praticados principalmente por
indivíduos dos 16 aos 24 anos, pertencentes ao género masculino e
que concluíram ou frequentaram o ensino superior. No que respeita
à variável escolaridade, verifica-se que em Portugal a diferença per-
centual entre os que têm algum grau de ensino secundário e o ensino
superior é muito mais vincada, excetuando a leitura de sites de notícias,
que no nosso país e na UE representa uma prática também distribuída
de forma mais equilibrada entre diferentes géneros e grupos etários.

Acesso e tempo de conexão online para trabalho,


estudo e lazer

Na continuidade do enquadramento anterior, o Inquérito às


Práticas Culturais dos Portugueses 2020 revela a existência de taxas
menores de utilização da Internet na sociedade portuguesa: 71% dos
inquiridos referem utilizar a Internet,4 enquanto 29% declaram não
4
Note-se que os dados do Eurostat anteriormente apresentados referem-se ao
acesso no agregado doméstico nos indivíduos dos 16 aos 74 anos, enquanto o indi-
cador usado no Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses 2020, que contem-
pla uma amostra representativa de todos os indivíduos com idade igual ou superior
a 15 anos, é a utilização da internet. Tal é importante referir para enquadrar as dis-
Fonte: Flash Eurobarometer 437. Internet User’s Preferences for Accessing Content Online crepâncias entre os dois estudos. Pesquisas anteriores mostram repetidamente que,
UE, 2016. Percentagem sem casa decimal na fonte. em Portugal, o acesso doméstico tem sido maior que a utilização da Internet (Lapa
* Não abrange formatos digitais em suporte físico, como CD ou DVD. et al. 2018; Lapa e Vieira 2019). Por outras palavras, em lares com acesso à Internet
** Inclui fotografias, reprodução de pintura, desenho, etc. poderemos ter membros não utilizadores.

62 63
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

ter contacto com a Web. Os padrões sistematicamente identifica- Gráfico 2.1 – Características sociográficas dos utilizadores
dos por outros estudos acerca de desigualdades digitais na sociedade da Internet (%)
portuguesa (Alves 2008; Gomes 2016; Lapa e Vieira 2019) verificam-
-se neste Inquérito, desde logo no que respeita a clivagens resultan-
tes da distribuição da variável idade e da posse de capital cultural
institucionalizado (gráfico 2.1). É nas faixas etárias mais jovens e
entre os indivíduos com graus superiores de escolaridade que a taxa
de utilizadores da Internet aumenta, sendo que na geração designada
Z5 o uso da Web é praticamente absoluto (100% nos inquiridos dos
15 aos 24 anos, nascidos entre a segunda metade de 1990 e o começo
de 2010). Já no segmento dos seniores (65 e mais anos), os dados
sublinham uma infoexclusão substancial, visto que apenas 26% dos
respondentes neste grupo etário utilizam a Internet.
Se bem que a idade, a educação e o rendimento sejam fatores
que influenciam e condicionam a apropriação da Internet em várias
sociedades, as consequências diferenciadoras de recursos obser-
vam-se nesta incursão no contexto português de modo vincado,
facultando pistas para a necessidade de intensificar as intervenções
desenvolvidas nas últimas duas décadas com vista à redução do
fosso digital. Quanto ao grau de instrução, o uso da Internet veri-
fica-se entre 98% dos que concluíram ou frequentaram o ensino
superior, 96% dos que atingiram a educação secundária, 87% dos
que alcançaram o 3.º ciclo e é somente 33% entre os que possuem
instrução até ao 3.º ciclo. A não inclusão digital também se rela-
ciona diretamente com fatores de ordem económica, geográfica e
de género. A percentagem de utilizadores reduz-se a 31% no grupo
dos que contam com rendimentos líquidos familiares até 500 euros
e aumenta à medida que cresce o volume dos recursos financei- mulheres (75% e 68% utilizadores, respetivamente), num diferencial
ros. Entre os que auferem rendimentos acima de 2700 euros, 98% superior ao que se verificava em 2019 na Europa (84% na popula-
são utilizadores. Constata-se ainda que a utilização da Internet ção masculina e 80% entre mulheres), segundo o departamento da
predomina em habitat urbano (76%), decresce no território inter- Organização das Nações Unidas para as tecnologias de informação
médio urbano (72%) e nos meios rurais torna-se mais rarefeita e comunicação (ITU 2020), e nos Estados Unidos da América (91%
(65%). A presença masculina online é mais acentuada do que a das de utilizadores do género feminino e 90% de utilizadores do género
masculino), de acordo com o Pew Research Center (PRC 2021).
5
A definição sociológica de geração é mais complexa do que as distinções e Entre os motivos de não utilização da Internet sobressai a falta
rótulos geracionais, geralmente assentes num refente tecnológico por trás, vulgari- de interesse e a perceção de ausência de utilidade desta prática (64%)
zados, em larga medida, na comunicação social, nos estudos de mercado e relatórios (tabela 2.4). A segunda principal razão apontada pelos inquiridos
relativos aos consumos mediáticos (ver, por exemplo, Cardoso e Baldi 2020), entre
outros. Determinados rótulos geracionais, como o de geração Z, são aqui adotados
não utilizadores (49%) é o desconhecimento e o sentir-se confuso
pela sua recognição social. perante a tecnologia, salientes principalmente entre o género femi-

64 65
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

nino. A falta de acesso a computador ou à Internet é referida por 11% reconhecimento motivada por uma familiarização escassa com as
dos respondentes e 5% consideram que são usos economicamente tecnologias de informação e comunicação.
muito dispendiosos. A não utilização da Internet assenta numa com- O inquérito apurou que 89% dos internautas usam habitualmente
binatória de escolhas, interesses e disposições e haverá casos de res- o smartphone para aceder à Internet (gráfico 2.2). A seguir, surge o
pondentes com acesso à Internet, embora não façam uso direto dela, computador pessoal portátil, usado recorrentemente por 54% para
como mencionado acima. É frequente que os utilizadores incluídos a conexão à Internet, depois o tablet, mencionado por 26%, e 16%
por procuração mobilizem vários contactos sociais (familiares, ami- assinalam o computador pessoal fixo. Emerge uma transformação
gos, colegas de trabalho) para desempenharem, no seu lugar, funções notória no padrão de uso da Internet a favor dos aparelhos móveis,
diversificadas, desde o envio de emails à compra de viagens, passando uma vez que, em 2013, apenas 39% usavam a Internet em disposi-
por obtenção de certificados. Por outro lado, as subtilezas das intera- tivos móveis (Cardoso e Mendonça 2014). A mutação tecnológica,
ções para além do uso ou não uso da Internet, que implicam as lógi- cada vez mais na direção da miniaturização, multifuncionalidade e
cas de partilha dos espaços domésticos e as redes de sociabilidades, portabilidade de equipamento, sugere também a constante reconfi-
devem ser ressalvadas perante o entendimento da Internet como um guração dos cenários e das interações nas casas, nos locais de traba-
mero meio de empoderamento (Selwyn, Gorard e Furlong 2005). lho e outros espaços públicos, bem como a intensificação da relação
Repare-se na referência à desabilidade tecnológica, tradicio- entre digitalização e individualização. A hegemonia da cultura digital
nalmente mais declarada pelo género feminino, a qual poderá ser móvel acarreta a conectividade em qualquer lugar e a qualquer hora,
exagerada de modo a levar os companheiros a contribuírem para o a interpenetração de tempos e espaços, a interação em rede generali-
desempenho de deveres domésticos, convertendo uma atitude apa- zada, a redefinição de antigos usos como ouvir música, ir ao cinema
rentemente submissa numa estratégia de resistência (Gray 1992). Ao ou ler livros, e a invenção de novos usos e aplicações, por exemplo
mesmo tempo, importa realçar que o significado da ‘falta de inte- a comunicação instantânea, desprovida de sede territorial, via What-
resse’ ou de atribuição de inutilidade é mais complexo que a equiva- sapp, Skype, Zoom ou redes sociais online (Pais 1998; van Dijk 2009;
lência a uma opção informada. Daqui decorre que o distanciamento Ariño Villarroya 2015; Martinho, Lopes e Garcia 2016; Martins e
pode envolver dificuldades em apropriar equipamentos e desenvol- Garcia 2016).
ver competências digitais, demonstrando falta de conhecimento e

Gráfico 2.2 – Equipamentos de acesso à Internet habitualmente


usados (%)
Tabela 2.4 – Principais razões para não utilizar a Internet (%)

66 67
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

A centralidade do uso dos smartphones como terminais privi- Gráfico 2.3 – Tipologia de utilizadores por número de equipamentos
legiados de acesso às redes digitais pode levar a crer que o uso da de acesso à Internet habitualmente usados (%)
Internet entrou na era «pós-PC» (King 2012). Se, por um lado, os
dispositivos móveis oferecem novos tipos de acesso à Internet, por
outro, a relação entre dispositivos móveis e outros equipamentos de
acesso é mais complexa do que a simples substituição de um disposi-
tivo por outro, como igualmente apontam estudos anteriores (Blank
e Dutton 2013). Mesmo num quadro de maior generalização no
acesso à Internet, as divisões digitais de primeira ordem, que se refe-
rem a diferenças na quantidade e nos tipos de dispositivos usados
e de tipos de acesso, constituem um processo dinâmico, em cons-
tante evolução (Livingstone 2004). As reconfigurações do acesso
advêm da natureza dinâmica da evolução tecnológica que acompanha (N=1419)
o processo de (re)produção social das desigualdades (digitais). Por
exemplo, a gradual digitalização, ou a expansão do segmento de dis-
positivos portáteis e móveis (Blank e Dutton 2012; Cardoso, Liang ou com ­incapacidade (64%), com rendimentos até 500 euros (73%)
e Lapa 2013), levou a novas camadas de desigualdade. Nos EUA, o e entre os 500 e 800 euros mensais (56%), dos trabalhadores não
estatuto socioeconómico apareceu, no passado, como fator explica- qualificados (61%) e dos operários (59%).
tivo da posse de smartphones (Smith 2011), tal como se destacava Já os ‘utilizadores duplos’ detêm um peso de 35% entre os utili-
como um dos principais fatores na previsão do acesso à Internet, à zadores da Internet. Estes repartem o acesso usual à Internet entre
banda larga, entre outros recursos tecnológicos. Estas considerações dois equipamentos, entre eles o smartphone, em 95% destes casos.
levam ainda a observar que a inclusão digital não é um estado binário, Verificam-se proporções distribuídas de forma mais igualitária entre
sendo antes pautada por gradações num «espectro digital». homens e mulheres em comparação com os unimediáticos. É entre
Neste âmbito, podemos diferenciar os internautas portugueses os indivíduos com mais de 65 anos, com menos do que o 3.º ciclo de
consoante o número de dispositivos que utilizam habitualmente para escolaridade, nas pessoas domésticas, com rendimentos mais baixos
aceder à Internet (gráfico 2.3). Verifica-se que 38% são «utilizado- e com trabalhos não qualificados que se observam as menores per-
res unimediáticos», que só utilizam habitualmente um equipamento. centagens de ‘utilizadores duplos’.
Outro dado importante é que entre estes utilizadores 78% usam O grupo menor em termos percentuais é o dos ‘utilizadores
habitualmente o smartphone como único meio para aceder à Inter- transmediáticos’, mais apetrechados tecnologicamente, que repre-
net, com tudo o que isso implica em termos de constrangimentos senta cerca de 27% dos utilizadores da Internet em Portugal. Estes
quanto ao leque e natureza de práticas online. utilizadores acompanham a ampliação de usos e a multiplicação dos
Entre os utilizadores unimediáticos há uma maior proporção de próprios contextos de utilização da Internet e são análogos aos «uti-
indivíduos do meio intermédio urbano (45%) em comparação com lizadores de última geração» («next generation users») de Blank e
o meio rural (41%) e o meio urbano (33%). Também se verifica um Dutton (2013), agnósticos quanto aos locais de acesso e dispositivos,
contingente superior de mulheres (41%) face à população mascu- e para quem o contacto com a Internet consiste num fluxo contí-
lina (35%). O grupo de utilizadores da Internet ‘unimediáticos’ nuo independentemente do meio. O desdobramento das atividades
inclui a maioria dos indivíduos com mais de 65 anos (62%) e dos informacionais e culturais online em vários dispositivos, ao invés de
55 aos 64 anos (54%), com menos do que o 3.º ciclo de escolari- ser interpretado como indicador da fragmentação ou do «fim» das
dade (74%), das pessoas domésticas não remuneradas, reformadas audiências (Gassner 2007) deve ser considerado, segundo Jenkins

68 69
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

(2006), como revelador de uma lógica contemporânea de uso dos r­ aramente se conectam (gráfico 2.5). O uso diário da Internet por
media não fragmentária, mas integrada (ou articulada em rede) e lazer é mais expressivo entre homens (61%) do que entre mulheres
‘transmediática’. Daí a classificação dos utilizadores de vários apa- (55%). A distribuição é idêntica à que se observa no inquérito rela-
relhos com acesso à Internet como utilizadores ‘transmediáticos’. tivo a práticas culturais em Espanha, onde as populações masculina e
Em contraste com quem acede habitualmente à Internet somente feminina nesta situação correspondem a 67% e 62%, respetivamente
através de um dispositivo, verifica-se uma maior proporção de (MCUDa 2019, 441).
homens (30%) do que de mulheres (24%) na categoria dos utiliza- No total, em média, os internautas portugueses passam perto de
dores ‘transmediáticos’. É igualmente no espaço urbano que há uma 30 horas semanais ligados à Internet (gráfico 2.6). São os indivíduos
maior percentagem deste tipo de utilizadores (30%), em compara- mais novos que despendem mais tempo global na Internet, desta-
ção com o intermédio urbano (26%) e o rural (24%). São ainda ten- cando-se o tempo de ligação por lazer (17 horas, em média). Por
dencialmente mais novos, o seu peso vai decrescendo com a idade, contraste, as pessoas com mais de 65 anos passam o menor número
e mais escolarizados. Quase metade dos indivíduos com o ensino de horas na Internet quer para trabalho ou estudo, quer por lazer. Os
superior que utilizam a Internet (48%) estão incluídos naquela internautas mais escolarizados e com rendimentos líquidos familia-
categoria de internautas. Verificam-se ainda maiores probabilidades res entre os 1800 e os 2700 euros predominam entre os que passam,
de os utilizadores ‘transmediáticos’ serem estudantes ou trabalha- em média, mais tempo ligados à Internet. Estes representam os que
dores, pertencerem a classes sociais mais privilegiadas, integrarem se encontram, em média, mais tempo conectados por questões labo-
os grupos de técnicos e especialistas ou de grandes empresários e rais ou de estudo (cerca de 22 horas). Verifica-se uma tendência de
profissionais liberais e de auferirem rendimentos elevados. Entre os decréscimo no tempo gasto na Internet nos escalões menos esco-
inquiridos que usam equipamentos para aceder à Internet, 62% dos larizados e com menores rendimentos, em especial por razões de
que auferem rendimentos superiores a 2700 euros mensais e 49% dos trabalho ou de estudo. Estes resultados convergem com o que tem
que ganham entre 1800 e 2700 euros pertencem à categoria dos uti- sido demonstrado em inquéritos similares, que apontam para uma
lizadores ‘transmediáticos’ face a 3% dos que ganham até 500 euros. tipologia de utilização menos focada na procura de lazer do que na
A conetividade para finalidades de trabalho, estudo ou lazer, e o busca de informação ou reforço dos laços sociais em indivíduos com
tempo respetivo investido manifestam padrões diferenciados. Entre
os utilizadores da Internet, 43% nunca se conectam para trabalho
ou estudo, 41% utilizam-na diariamente para estas finalidades, 10% Gráfico 2.4 – Frequência da Gráfico 2.5 – Frequência da
estabelecem a ligação à Internet uma ou várias vezes por semana, ligação à Internet para trabalho ligação à Internet por lazer (%)
mas não diariamente (gráfico 2.4). Os restantes 6% raramente usam ou estudo (%)
a Internet para trabalho ou estudo. Observa-se que 38% dos homens
e 47% das mulheres nunca se ligam à Internet para trabalhar ou estu-
dar. A utilização diária da Internet com estes objetivos é referida
por 14% dos operários e por 23% dos trabalhadores dos serviços.
Entre profissionais socioculturais, 69% conectam-se diariamente e
97% dos grandes empresários e profissionais liberais ligam-se todos
os dias.
Já na ligação à Internet por motivos de lazer verifica-se que
uma expressiva maioria dos utilizadores, 82%, conecta-se diaria-
mente para tal finalidade, 13% estão online por lazer uma ou várias
vezes por semana, mas não diariamente, e os restantes 4% apenas (N=1419)

70 71
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

maiores recursos socioeconómicos e competências digitais (Lapa et Gráfico 2.6 – Média de horas por semana de ligação à Internet,
al. 2018; Hargittai e Hinnart 2008). para trabalho ou estudo e por lazer
Em média, é nos espaços urbanos que se despende mais tempo
online, quer para trabalho ou estudo (20 horas por semana, em
média), quer por lazer (12), notando-se que os valores médios são
mais baixos no território intermédio urbano. Quanto à média global
de horas passadas na rede, verifica-se um desnível de género em bene-
fício dos homens, sendo esta diferença estatisticamente significativa
para a média de horas gastas na Internet por lazer. A discrepância na
intensidade da presença feminina e masculina online provém de dife-
renças socioeconómicas e de fenómenos específicos de género que se
interligam, como diferenças na cognição e comunicação, a associação
cultural entre identidade masculina e tecnologia (Bimber 2000) e o
desempenho maioritário pelas mulheres de tarefas domésticas e cui-
dadoras. Os dados da Organização para a Cooperação e Desenvol-
vimento Económico (OCDE) sobre o tempo dedicado ao trabalho
e ao lazer sinalizam um gender gap; em todos os países analisados,
o tempo médio de lazer para os homens é superior ao das mulheres
(­Ortiz-Ospina, Giattino e Roser 2020). A Noruega e Portugal polari-
zam o fosso de tempo livre: no primeiro, o diferencial é muito escasso,
enquanto no contexto português o tempo de lazer disponível para os
homens duplica o da população feminina (ibidem). Um dos fatores
que impulsionam as diferenças no tempo de lazer dedicado à navega-
ção online corresponde às disparidades de género no desempenho de
trabalho não remunerado, incluindo atividades domésticas (ibidem). substancial ou forte de cerca de 0,650. A seguir, surge a idade, que
Além disso, em alguns territórios domésticos a posse e o controlo de assume igualmente um coeficiente de associação substancial com o
equipamentos com acesso à Internet tornam-se alvo de concorrência uso da Internet de 0,647. Esta constitui uma variável explicativa que
entre os membros das famílias, tendendo mais as mulheres a ceder e a muitos relacionam com as clivagens geracionais face à utilização das
emprestar (Burke 2003; Selwyn, Gorard e Furlong 2005). tecnologias digitais. Para Tapscott (1998) e Prensky (2001) há uma
Em consonância com outros estudos que incidem sobre a reali- evidente divisão entre as gerações, definida pelos processos de socia-
dade portuguesa (Alves 2008; Lapa e Vieira 2019), reafirma-se a pre- lização diferenciados em diferentes eras mediáticas.7 Defende-se,
ponderância de variáveis relativas à escolaridade e à idade enquanto
variáveis preditivas da utilização da Internet para vários fins (tabela 7
A abordagem de Tapscott e Prensky reproduz uma versão suave de deter-
2.5). O grau de ensino do próprio é o fator que ostenta o maior minismo tecnológico, definindo os limites de uma geração, essencialmente, pela
poder preditivo com um coeficiente de associação (V de Cramer)6 sua relação com determinadas tecnologias e ecologias mediáticas. Em contraponto,
Buckingham ressalva que a definição de uma geração é um empreendimento mais
complexo (2006, 11) que deve incluir não só variáveis relativas à ordem tecnológica,
6
Varia entre 0 e 1. O valor 0 corresponde a ausência de associação entre as mas também de cariz social ou cultural (como importantes eventos históricos ou
variáveis, valores próximos de zero correspondem a fraca associação e valores mais características culturais marcantes de uma era) na definição de uma experiência de
próximos de 1 correspondem a associação mais forte. vida partilhada entre os indivíduos incluídos numa mesma coorte geracional.

72 73
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

nesta perspetiva, que novas literacias relativas à manipulação de pelo foco nos sectores mais jovens e na educação. Além disso, muitas
vários recursos de media e de comunicação digitais têm sido intuiti- políticas digitais executadas no passado e implementadas no presente
vamente incorporadas pelas crianças e jovens – os putativos «nativos interligadas à cultura privilegiam a proteção dos direitos de autor e o
digitais». Tendo como referente a sociedade holandesa, Loos (2012) suporte ao desenvolvimento de certos sectores das indústrias criativas
opõe-se a caracterizações binárias, essencialistas e generalizantes e e culturais, aparecendo mais desconexas quanto à promoção do acesso
chama a atenção para que crianças e seniores encontram-se dispersos à cultura e da participação cultural entre os vários grupos sociais.
por um «espectro digital». O tipo de caracterizações que contrapõem A outra variável no grupo cimeiro de fatores preditivos do uso da
«nativos digitais» a «imigrantes» ou excluídos digitais subestimam, a Internet é a situação perante o trabalho, com um coeficiente de asso-
priori, o poder preditivo de outras variáveis como a escolaridade ou ciação substancial de 0,6. Dado o impacto das redes digitais na orga-
o capital cultural e a capacidade de gerações distintas lidarem com as nização do trabalho, gradualmente modificada para se ajustar aos
inovações tecnológicas, de acordo com as suas próprias motivações sistemas baseados na Internet, na participação na tomada de decisões,
ou disposições, necessidades e interesses. Tais caracterizações des- na mobilização de recursos no trabalho (Emmanouilides e Hammond
consideram os vários caminhos em que as mudanças tecnossociais 2000) e na atuação no mercado de trabalho, a situação perante o tra-
afetam, direta ou indiretamente, crianças e adultos. O recurso a des- balho tem sido recorrentemente identificada como fator preditivo
crições homogeneizantes e essencialistas para definir coortes ofusca de modalidades de uso mais ativas e frequentes. Assim, como apon-
um debate crítico sobre a relação de crianças e jovens com as novas tam os nossos dados, é mais provável que um indivíduo empregado
tecnologias (Lapa e Vieira 2019). use a Internet (em 89% dos casos) do que uma pessoa desempregada
Os padrões diferenciados de difusão da utilização da Internet entre (84%). Os extremos são revelados ao compararmos os estudantes,
países europeus, expostos anteriormente, indicam que as divisões com uma taxa de utilização de 100%, com as categorias de ‘doméstico
digitais entre diferentes grupos sociais e «gerações» variam consoante não remunerado’, com uma taxa de utilização de 43%, e de ‘reforma-
as sociedades, sendo mais pronunciadas em países como Portugal, do(a) ou com incapacidade’, com uma taxa de uso de 30%. A tabela
caracterizados por um menor desenvolvimento informacional. É de 2.5, acima, mostra ainda a relevância da variável rendimento na pre-
enfatizar, no contexto português, o acumular de desvantagens cul- dição da utilização da Internet, com um coeficiente de 0,413, e em
turais e económicas por parte importante dos seniores, as quais se menor medida a classe social, com um coeficiente de 0,341, fatores
interligam com a falta de recursos e competências informacionais em preditivos igualmente utilizados no estudo de situações de exclusão
comparação com outros sectores da sociedade. Podemos ainda indi- social. Considerando a importância de diversos fatores (culturais,
car o viés geracional das políticas públicas tecnológicas em Portugal geracionais, ocupacionais e económicos) nas diferenciações entre
grupos e sociedades quanto à qualidade das modalidades de uso
das redes digitais, outros critérios devem ser ponderados, nomea-
Tabela 2.5 – Fatores relevantes preditivos da utilização da Internet
damente os relativos à qualificação informacional da população de
acordo com parâmetros de literacia digital e às suas consequências
na condução da vida pessoal, na educação, no trabalho, e no próprio
acesso e participação culturais.

Do acesso à participação cultural online

O envolvimento em práticas culturais online tem vindo a ser


considerado uma forma de participação cultural com significado

74 75
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

ampliado na sociedade atual, pois as Tecnologias da Informação e da da qual a literacia para os novos media desempenha um papel con-
Comunicação (TIC), com a sua penetração e conectividade perma- siderável. É também sob esta luz que podemos olhar para os dados
nente, constituem potenciais pontos de acesso a mais experiências sobre as práticas de partilha de conteúdos culturais (vídeos, música,
culturais e numa modalidade on-demand. Por um lado, os disposi- imagens, outros) criados pelo próprio. Todavia, entre os 1419 inqui-
tivos digitais possibilitam uma variedade maior de conteúdos cul- ridos que utilizam Internet, 70% apontam que nunca o fizeram.
turais na forma de bens digitais. Por outro lado, a exclusão digital, Ademais, 64% mencionam que nunca interagem online em temas
que caracterizámos atrás, pode exacerbar ainda mais a estratificação relacionados com cultura, colocando mensagens e likes em sítios de
do consumo cultural. É este o eixo analítico que norteia os dados redes socias e outros grupos virtuais. Portanto, os dados relativizam
seguintes, assim como outros estudos em torno da relação entre as a ideia de uma Internet povoada de prossumidores ou de utilizadores
divisões digitais e a forma como estas influenciam os usufrutos cul- que também são produtores, mobilizando novas literacias. Por um
turais (Ateca-Amestoy e Castiglione 2016). Esta perspetiva implica lado, é verdade que os instrumentos podem estar nas redes, mas os
ir além das divisões digitais de primeira ordem no acesso à Internet utilizadores que também são produtores ou participativos online no
(ter ou não ter) e olhar para as diferenciações ou desigualdades de âmbito cultural e do consumo parecem ser uma minoria. Pode, no
segunda ordem nos tipos de conhecimento e de literacia, nos consu- entanto, questionar-se o que significa produzir conteúdos e se é pos-
mos e práticas online entre os utilizadores da Internet. Neste qua- sível diferenciar os utilizadores quanto a graus de interatividade, de
dro, van Dijk (2005) defende que as divisões de segunda ordem no participação e de produção.
âmbito das utilizações digitais podem ser mais severas do que os fos-
sos mediáticos respeitantes à utilização dos media tradicionais, uma
vez que os novos media reclamam aprendizagens, competências e Tabela 2.6 – Frequência de utilização da Internet para realizar
habilidades novas. A atmosfera digital, com as suas particularidades, as seguintes atividades culturais (%)
continua, pois, a propiciar a manifestação da distinção e de outros
fenómenos sociais que envolvem as práticas culturais e distinguem
os indivíduos nos seus modos de relação com a cultura (Bourdieu
2010).
Nos consumos e práticas online destaca-se a leitura de sites de
notícias como a mais frequente entre os respondentes, sendo que
29% referem que o fazem diariamente (tabela 2.6). Cerca de 64%
assinalam procurar informações precisas online com, pelo menos,
alguma regularidade. Todavia, mais de metade aponta que nunca lê
a Wikipédia ou outras enciclopédias online. A maioria indica que
nunca lê e/ou escreve em blogues e nunca lê e/ou escreve críticas
em sítios como a Tripadvisor. Estas últimas práticas remetem para a
relativa facilidade de contribuir com conteúdos na Internet, refletido
na noção de consumidor-produtor – ou prosumer (prossumidor), no
original (Toffler 1980). Neste âmbito, Jenkins et al. (2009) subli-
nham a relevância daquilo que designam por «cultura participativa»
na era digital, referente a uma cultura mediática em que os sujeitos
não agem como simples recetores/consumidores, mas, em diferentes
escalas, como colaboradores ou produtores (prossumidores), no seio

76 77
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

Quanto a práticas mais explicitamente ligadas à cultura, aproxi- maior preponderância de determinadas práticas culturais online, uma
madamente metade dos utilizadores procura informação sobre livros, vez que as podem realizar de forma ubíqua em regime de multitarefa
música, cinema e espetáculos, pelo menos com alguma regularidade. ou nos interstícios das deslocações espaciais e dos compromissos
Inversamente, os internautas portugueses interessam-se menos pela temporais. Com base na tabela 2.7, trata-se igualmente de perceber
procura de informação sobre bibliotecas e arquivos e sobre formas
de acederem a bibliotecas e arquivos virtuais. Ouvir música a partir Tabela 2.7 – Equipamentos de acesso à Internet usados habitualmente
da Internet destaca-se entre as atividades culturais mais frequentes, e práticas culturais online (%)
partilhada por mais de metade dos respondentes e realizada diaria-
mente por 18% e uma ou várias vezes por semana por 17%. Outra
prática regular para pouco mais de 40% dos inquiridos é ver, comprar
ou descarregar filmes ou séries. Por último, também uma pequena
minoria aponta que compra ou reserva entradas para cinema, con-
certos, teatro ou museus com alguma frequência e 71% admitem que
nunca o fazem. É provável que estes dados estejam relacionados com
vários aspetos. Em primeiro lugar, podem ser o reflexo online de
práticas já em si minoritárias nas práticas culturais offline. E, com
uma utilização cada vez mais generalizada da Internet, os dados que
incidem sobre os internautas portugueses refletem tendências nos
hábitos culturais da população em geral. Em segundo lugar, pode-
rão estar em jogo fatores relacionados com a confiança e a perce-
ção do risco na compra de entradas para eventos culturais online.
Aqui importaria determinar em que medida a experiência de compras
online se articula com o risco percebido na aquisição de bens cultu-
rais (em particular, quando o provisionamento do serviço está no
futuro, como no caso das entradas de espetáculos e em momentos de
incerteza, como o atual contexto pandémico), se o risco percebido
varia entre as categorias de produtos ou serviços culturais e se certos
tipos de risco (como a eventualidade de não poder comparecer ao
espetáculo face à possibilidade de o espetáculo esgotar, por exem-
plo) são mais importantes na aquisição de determinados produtos
ou serviços culturais. Aspetos adicionais a considerar rementem para
a literacia dos utilizadores e a divulgação dos eventos, entre outros.
Outro tema que exploramos é a relação da frequência das práti-
cas online mais destacadas com os equipamentos de acesso à Inter-
net habitualmente usados. Como vimos, atualmente os dispositivos
móveis salientam-se claramente como os equipamentos usualmente
utilizados para aceder à Internet, com destaque para o smartphone
(gráfico 2.2, acima). A principal questão associada que surge é se
entre os utilizadores habituais de equipamentos móveis há uma

78 79
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

se, num contexto mediaticamente rico, estaremos perante uma pos- É uma técnica que permite a redução de dados e a identificação de
sível especialização ou coexistência de equipamentos quanto à fre- dimensões latentes das práticas culturais em torno das quais criámos
quência com que se encetam determinadas práticas culturais online. um novo conjunto de variáveis, menor do que o original (Hongyu
No entanto, os dados não permitem retirar conclusões claras. Por 2018), que se empregou para traçar perfis de práticas e de internau-
exemplo, seria de esperar que o uso do smartphone para ouvir, com- tas. Por esta via, foi possível identificar quatro componentes ou
prar ou descarregar música com frequência a partir da Internet fosse dimensões latentes que descrevem a inter-relação entre as variáveis
mais expressivo do que é, em particular em comparação com outros que se encontram mais correlacionadas entre si (tabela 2.8). Na com-
dispositivos, e pelo facto de ser o aparelho mais utilizado para aceder ponente 1, a frequência da procura de informação sobre bibliotecas
habitualmente à rede. Em geral, os valores apresentados na tabela
2.7 não se distanciam muito, nem sugerem uma especialização de Tabela 2.8 – Análise fatorial exploratória das variáveis respeitantes
equipamentos para determinadas práticas. Confirmam ainda a fraca à frequência com que utiliza a Internet para realizar
incidência de um conjunto de práticas online de cariz cultural no determinadas atividades online
conjunto da população internauta portuguesa.
Como se observou anteriormente (gráfico 2.3), mais de um
terço dos internautas portugueses são utilizadores ‘unimediáticos’,
concentrando num único dispositivo a possibilidade de desenvolver
atividades online. Os dados sugerem que, em larga medida, os indi-
víduos que usam mais do que um dispositivo são agnósticos quanto
aos equipamentos utilizados para a generalidade das práticas online.
Podemos colocar como hipótese que utilizam os equipamentos mais
por uma lógica de oportunidade de consumo (usam o dispositivo
que está mais disponível no momento) do que pela maior adequação
de um dado dispositivo para usufruir de determinado bem ou serviço
informacional ou cultural. Os dados parecem igualmente reforçar a
tese da navegação ‘transmediática’ de Jenkins, descrita como «the
ability to follow the flow of stories and information across multiple
modalities» (2006, 4), em que as audiências se guiam mais por inte-
resses específicos que seguem e consomem numa rede composta por
vários dispositivos e plataformas. Por exemplo, quem tem interesse e
possibilidade de ouvir ou partilhar frequentemente música através da
Internet ou encetar práticas regulares de consumo relacionadas com
esse interesse fá-lo quando surge a oportunidade para tal, indepen-
dentemente do meio ou do equipamento.
Para melhor compreender a conexão das práticas culturais online
entre si realizámos uma análise fatorial exploratória que consiste em
identificar inter-relações subjacentes entre as variáveis medidas.8

8
A medida de Kaiser-Meyer-Olkin verificou a adequação amostral para a aná-
lise (KMO = 0,913) e o teste de esfericidade de Bartlett (p-value<0,001) indicou que as correlações entre os itens são suficientes para a realização da análise.

80 81
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

e arquivos encontra-se bastante correlacionada com a frequência do a ausência de práticas e 5 uma frequência diária de todo o tipo de
acesso a bibliotecas ou arquivos virtuais, bem como com a frequên- práticas que estiveram na base da construção do índice. Além disso,
cia da procura de informação sobre museus, galerias de arte e sítios calcularam-se as proporções de indivíduos com valores iguais ou
arqueológicos, etc. superiores a 3 (considerado um valor a partir do qual se indiciam
Rotulámos a componente 1 de «consumo de informações e práticas online frequentes), apresentadas em baixo (gráfico 2.7).
artefactos relativos a cultura cultivada» tendo em conta o cariz da Salienta-se, de longe, que o conjunto de práticas mais habituais
maioria das variáveis que constituem a componente. A componente corresponde a leitura e procura de conteúdos noticiosos e enciclo-
2 foi designada como «consumo e cultura participativa em torno de pédicos, apresentando uma percentagem de 42% de utilizadores fre-
conteúdos culturais», integrando práticas que podem ser colocadas quentes (gráfico 2.7). Tendo como objetivo a identificação de perfis
no âmbito do interesse pelos produtos das indústrias culturais e cria- e a construção de uma tipologia quanto às práticas culturais online no
tivas e da «cultura participativa» caracterizada por Jenkins (2006), nosso país, apelidaram-se estes utilizadores de ‘buscadores de infor-
entendida, grosso modo, como o envolvimento direto dos consu- mação noticiosa e enciclopédica’. Num lugar mais recuado, cerca de
midores na geração de conteúdos. Nesta componente, pode desta- 12% dos respondentes assinalam práticas frequentes relativas a ‘pro-
car-se o usufruto, compra ou descarga de música, filmes ou séries. sumption: leitura e comentários em blogues e sites comerciais’ e ao
Ainda incluídas nesta dimensão, mas com menores correlações com ‘consumo e cultura participativa em torno de conteúdos culturais’.
as outras variáveis da mesma componente, estão as variáveis de par- Pode dizer-se que identificámos na nossa amostra representativa
ticipação cultural nas plataformas digitais – «partilhar conteúdos 12% de ‘prossumidores’ e de ‘apreciadores envolvidos de indústrias
culturais (vídeos, música, imagens, outros) criados pelo próprio» culturais e criativas’, respetivamente. Por último, somente 7% dos
e «interagir online em temas relacionados com cultura (colocando portugueses inquiridos revelam práticas frequentes relativas ao ‘con-
mensagens e likes em sítios de redes socias e outros grupos virtuais)» – sumo de informações e artefactos relativos a cultura ­cultivada’ e que
e de consumo de espetáculos e museus («comprar ou reservar entra-
das para cinema, concertos, teatro ou museus»).
A terceira componente foi designada «prosumption: leitura e Gráfico 2.7 – Proporção de indivíduos que apresentam práticas
comentários em blogues e sites comerciais», visto que as duas variá- online frequentes (valores iguais ou superiores a 3)
veis que compõem esta dimensão são «ler e/ou escrever blogues» e em cada índice (%)
«ler e/ou escrever críticas (Tripadvisor, Amazon, etc.)». A etiqueta-
gem desta componente foi inspirada na figura do consumidor-pro-
dutor ou prosumer (prossumidor) de Toffler (1980). Finalmente, a
quarta componente foi nomeada «leitura e procura de conteúdos
noticiosos e enciclopédicos», uma vez que, aqui, as variáveis referen-
tes à leitura de sites de notícias, da Wikipédia ou de outras enciclo-
pédias online e à procura de informações precisas aparecem como as
mais correlacionadas entre si.
Esta redução de dados e arranjo entre variáveis fundamentou a
construção de quatro novas variáveis (ou índices) designadas com
os nomes das componentes. Os índices relativos a cada componente
(média dos valores das variáveis que constituem cada componente),
com valores resultantes compreendidos entre 1 e 5, indicam a frequên-
cia com que se desenvolve cada tipo de práticas, sendo que 1 s­ ignifica

82 83
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

podemos apelidar de ‘consumidores online de formas de cultura cul- Tabela 2.9 – Valores médios dos índices relativos à frequência do tipo
tivada’. de atividades online, por variáveis sociodemográficas e
Ainda tendo em consideração os valores médios de cada índice, socioeconómicas (1 – nenhuma frequência – 5 diariamente)
que figuram em baixo (tabela 2.9), reafirma-se a leitura e procura
de conteúdos noticiosos e enciclopédicos como o tipo de práticas,
em média, mais frequentes (com um valor médio de 2,56), seguido
do consumo e cultura participativa em torno de conteúdos cultu-
rais (com um valor médio de 1,86). A análise dos valores médios
para cada categoria das variáveis sociodemográficas e socioeconó-
micas também nos permite explorar de outra forma as divisões de
segunda ordem no campo das práticas culturais online em Portu-
gal. Os valores superiores à média geral encontram-se assinalados a
negrito (tabela 2.9).
Em todos os tipos de atividades online verificam-se médias supe-
riores à média global, indicadoras de práticas mais frequentes, entre
os inquiridos dos escalões etários mais jovens, com graus de ensino
e rendimentos mais elevados. Quanto às diferenças de classe ou de
estatuto socioprofissional, observam-se, em geral, médias mais altas
nos segmentos profissionais dos grandes empresários e profissionais
liberais, gestores, técnicos especialistas e profissionais socioculturais.
As diferenças de médias entre as categorias das variáveis de caracte-
rização social supramencionadas são estatisticamente significativas,
com p-value ≤ 0,01 para todos os testes, como se pode notar no
quadro 1.11. Considerando o habitat, só se verificam diferenças esta-
tisticamente significativas entre as médias das categorias para as com-
ponentes 1 (consumo de informações e artefactos relativos a cultura
cultivada) (p-value ≤ 0,05) e 3 (prosumption: leitura e comentários
em blogues e sites comerciais) (p-value ≤ 0,1). Quanto à primeira
componente, curiosamente, é no espaço rural que se observa a média
mais elevada e, portanto, maior frequência de consumo de informa-
ções e artefactos relativos a cultura cultivada. O efeito do tipo de
habitat parece indicar que o tipo de atividade cultural da componente
1 pode estar sujeito a algum efeito positivo ou negativo da distância
em que se encontram diversas ofertas culturais. Na verdade, ape-
sar de, no contexto português, a taxa de utilizadores da Internet ser
visivelmente menor nos espaços rurais, pode colocar-se a hipótese
de que, para um segmento dos internautas, quanto maior a distância
ou outro tipo de constrangimento, maior a apetência para colmatar * Estatisticamente significativo para um nível de confiança de 90%.
** Estatisticamente significativo para um nível de confiança de 95%.
a inacessibilidade atrás dos serviços culturais online. Por exemplo, o *** Estatisticamente significativo para um nível de confiança de 99%.

84 85
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

consumo de artes visuais pela Internet pode ser um substituto ou um Quadro 2.1 – Caracterização sociodemográfica e socioeconómica
complemento para a frequência a museus (Ateca-Amestoy e Casti- dos perfis de internautas relativos às atividades
glione 2016). De acordo com os nossos dados, as divisões digitais de culturais online
primeira ordem entre indivíduos, por idade e por escolaridade, são Perfis Caracterização
ainda mais pronunciadas no habitat rural. O facto de os internau-
tas rurais constituírem tendencialmente um grupo jovem e escolari- Os consumidores Estes utilizadores representam cerca de 7% dos internautas
online de formas portugueses. É no habitat rural que se verifica a maior percen-
zado, mas distanciado de eventos ou equipamentos culturais, poderá de cultura tagem de internautas portugueses com este perfil (9%), e obser-
­traduzir-se numa apetência para um determinado tipo de práticas cultivada vando-se a menor proporção no habitat urbano (6%). Como
referido anteriormente, este dado parece secundar a hipótese
online numa lógica de substituição das suas necessidades culturais.
que um maior afastamento de centros que concentram eventos
Quanto à terceira componente, é nos espaços urbanos que se verifica e equipamentos culturais poderá propiciar práticas culturais
a maior média e, portanto, práticas mais frequentes. online numa lógica de substituição das carências culturais.
Há maior probabilidade de estes utilizadores serem homens
No que respeita às diferenças de género, só são estatisticamente (7,9%) do que mulheres (6,5%) e de serem jovens dos 15 aos
significativas para as componentes 2 (consumo e cultura participa- 24 anos (14,2%) do que indivíduos dos 45 aos 54 anos (2,1%)
tiva em torno de conteúdos culturais) (p-value ≤ 0,01) e 4 (leitura e ou com 65 ou mais anos (2,3%). A idade média dos indivíduos
deste perfil é de 35 anos. Avista-se ainda uma maior probabi-
procura de conteúdos noticiosos e enciclopédicos) (p-value ≤ 0,01) lidade de atingiram o ensino superior completo (13,2%) do
e, nas duas componentes, em detrimento das mulheres. Tal é con- que graus de instrução mais baixos – secundária (5,5%), 3º
sonante com os dados do gráfico 2.6, apresentados atrás, que evi- ciclo (6,3%) e menos que 3º ciclo (2%), de usufruírem de mais
de 2700 euros de rendimento familiar (10,8%) e de serem
denciam um hiato de género no tempo médio de lazer despendido estudantes (22%). Temos somente 1,2% de pessoas reforma-
online, superior entre os homens. Representam indicadores de desi- das ou com incapacidade neste perfil e 0% de domésticos não
gualdades de género de segunda ordem persistentes na esfera das remunerados. Verifica-se igualmente a maior probabilidade de
serem quadros superiores dos serviços e grandes empresá-
atividades online. rios e profissionais liberais.
Terminamos este segmento do capítulo com a tipologia de utiliza-
Os apreciadores Este perfil participativo retrata cerca de 12% dos utilizadores da
dores portugueses quanto às suas práticas culturais e informacionais envolvidos de Internet em Portugal. Verificam-se probabilidades semelhantes
online, indicada atrás, e respetiva caracterização sociodemográfica e indústrias culturais de indivíduos de diferentes habitats fazerem parte deste grupo
socioeconómica (quadro 2.1, página anterior). A construção da tipo- e criativas (as diferenças são iguais ou menores que 1%). Há, mais uma
vez, maior probabilidade de estes internautas serem homens
logia e a descrição de cada perfil teve por base a caracterização dos (12,6%) do que mulheres (10,8%) e de pertencerem ao grupo
internautas portugueses que apresentam um valor igual ou superior etário dos 15 aos 24 anos (25,6%) do que face a 1,8% dos
a 3 (que consideramos como equivalente a apresentar práticas regu- indivíduos dos 45 aos 54 anos e a 2,3% daqueles com 65 ou
mais anos. Trata-se do grupo que possui idade média mais
lares, isto é, em média, para o conjunto das atividades incluídas no baixa: cerca de 31 anos. Observa-se também uma maior pro-
índice, pelo menos uma ou várias vezes por mês) em cada variável babilidade de deterem o ensino superior completo (19,7%)
do que graus de instrução abaixo – a percentagem mais baixa
relativa a práticas culturais e informacionais online.
verifica-se entre aqueles com menos do que o 3º ciclo (3,2%)
-, de auferirem mais de 2700 euros de rendimento familiar
(26,3%) e de serem estudantes (39,4%). Meramente 2,3% de
indivíduos reformados ou com incapacidade pertencem a este
perfil. Também existe uma maior probabilidade de serem traba-
lhadores dos serviços (independentemente de serem quadros
superiores ou não) e técnicos e especialistas.

Os prossumidores O grupo dos prossumidores representa, tal como o perfil ante-


rior, cerca de 12% dos portugueses que usam a Internet. É no
habitat intermédio urbano que que se verifica a maior percen-

86 87
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

Perfis Caracterização
Utilização da Internet num contexto pandémico
e de conectividade intensificada
Os prossumidores tagem de utilizadores com este perfil (13,7%), e a menor
corresponde ao habitat rural (10,8%). Neste grupo, os inter-
nautas masculinos, com 12,8% de prossumidores, mantêm a
O panorama pandémico gerou disrupções na «domesticação»
vantagem sobre as mulheres, entre as quais temos 11,3% com quotidiana das tecnologias da informação e comunicação, isto é, na
este perfil. Verifica-se ainda maior probabilidade de este tipo de forma como essas tecnologias se infiltram nas práticas e rotinas do
utilizadores pertencerem ao grupo etário dos 25 aos 34 anos
(20,2%), face a 1,5% do grupo etário menos representado no
dia a dia, segundo as disposições, motivações e interesses dos indi-
perfil composto por inquiridos com 65 ou mais anos. A idade víduos, e o seu uso se pode intensificar ou abrandar (Haddon 2007;
média dos respondentes que compõem este perfil é cerca de Sørensen 1994). Este contexto inesperado, que lançou no confina-
35 anos. Tal como nos outros perfis, observa-se uma maior
possibilidade de de terem concluído ou frequentado o ensino mento, em Portugal, milhões de pessoas e trouxe a imposição de
superior (21,5%) do que possuírem graus de instrução mais regras, medidas e modos de conduta em nome da saúde pública, veio
baixos, em particular face àqueles com menos do que o 3º ciclo reequacionar abruptamente a apropriação e integração dos disposi-
(2,8%), de terem mais de 2700 euros de rendimento familiar
(35,1%) e de serem estudantes (20,5%). Também aqui só um tivos mediáticos, das suas funcionalidades e conteúdos por parte de
conjunto muito restrito de pessoas reformadas ou com incapa- grande parte dos públicos e consumidores. Muitos estudos da cha-
cidade (correspondente a 1,2%) pertence ao perfil dos prossu- mada domesticação mediática contemplam essencialmente o período
midores. Existe igualmente uma maior probabilidade de estes
serem trabalhadores dos serviços, grandes empresários e de tempo em que se opera a incorporação de uma tecnologia até esta
profissionais liberais e gestores. se tornar um dado adquirido no quotidiano (Haddon 2007), não
Os buscadores Trata-se do perfil mais inclusivo, que engloba cerca de 42% contemplando subsequentes mudanças nessa incorporação. Com a
de informação dos internautas portugueses. Verificam-se as maiores percen- rutura introduzida pelo confinamento podemos estar perante pro-
noticiosa tagens deste tipo de utilizadores nos habitats urbano (43%)
cessos de «re-domesticação», no caso da intensificação ou adoção
e enciclopédica e rural (42,5%). Os desequilíbrios de género persistem neste
perfil, com os homens mais representados (44,4%) do que as de usos e práticas, e «des-domesticação», no caso da diminuição ou
mulheres (39,9%). Os indivíduos deste perfil são tendencial- afastamento face a usos (Sørensen 1994).
mente mais velhos que os perfis anteriores, verificando uma
idade média de 38 anos. Note-se que 55,4% dos internautas
Em resultado do confinamento, 24% dos internautas portugue-
portugueses dos 25 aos 35 anos e 50% com idades compreen- ses referem ter passado a usar mais a Internet para ver filmes e séries.
didas entre 35 e 44 anos estão representados neste perfil, O uso da rede para ler livros, jornais e revistas online também se
verificando-se, mais uma vez, menor representatividade nos
indivíduos com 65 ou mais anos (20,5%). Entre os internautas
intensificou para 12% da amostra e 11% declaram que recorreram
com o ensino superior completo, 64,9% pertence a este perfil mais à Internet para ver espetáculos de música (gráfico 2.8). Quanto
face a apenas 16,3% dos internautas com menos que o 3º ciclo. a estas atividades, dada a sua intensificação para percentagens não
À semelhança dos outros perfis, os indivíduos com maiores
rendimentos familiares (mais de 2700 euros) estão igualmente
negligenciáveis da população internauta, podemos eventualmente
representados em peso neste perfil (em 70,3% destes casos), falar de «re-domesticação» dos modos de utilização da Internet.
sendo que a percentagem de utilizadores que pertencem a este Os internautas portugueses dos 15 aos 24 anos destacam-se na
grupo vai decrescendo gradualmente nos escalões de rendi-
mento mais baixos. Destacam-se neste conjunto ainda os estu- intensificação das práticas culturais supramencionadas, sendo que
dantes (56,7%), seguidos dos trabalhadores (46,2%), como as 40% assinalam que passaram a usar mais a rede para ver filmes e
categorias relativas à situação profissional mais representadas séries, 21% indicam que passaram a ler mais livros, jornais e revis-
neste perfil. Os quadros superiores dos serviços são os mais
representados (com 65,8%), seguidos dos outros trabalhadores tas online e 16% que passaram a ver mais espetáculos de música na
dos serviços (57,5%). Internet durante o confinamento (gráfico 2.9).
Simultaneamente, os estudantes também se destacam na inten-
(N=1419)
sificação destas atividades. Para 46% desta população, ver filmes
e séries foi uma atividade online que se reforçou, 32% sinalizam

88 89
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

Gráfico 2.8 - Pandemia e mudanças de hábitos no uso de serviços incidência entre os portugueses da intitulada geração Z, dos 16 aos
digitais e da Internet no domínio cultural (%) 23 anos.
Voltando aos dados que apurámos, na faixa etária dos 65 e mais
anos, o grupo mais infoexcluído, a leitura de livros, jornais e revis-
tas representou a atividade online que mais foi reforçada durante
a pandemia, sendo referida por 8%. Para os seniores, ver filmes e
séries online constituiu a prática cultural menos intensificada.
É igualmente entre os mais escolarizados que se verificam percen-
tagens maiores de inquiridos que assinalam que as suas práticas
culturais online aumentaram. É de ressalvar que os dados relativos
à categoria ‘deixou de usar/não usou’ não significam que a reação
dominante ao confinamento tenha sido uma quebra generalizada no
uso da Internet no domínio cultural para a maior parte das pessoas.
Estes valores podem significar, em larga medida, que os indivíduos já
antes não usavam a Internet para os vários usos culturais.

Gráfico 2.9 – Principais usos intensificados de serviços digitais


no domínio cultural durante a pandemia, por idade (%) Síntese conclusiva

O presente capítulo demonstra as claras inter-relações entre as


divisões digitais de primeira ordem (modalidades de acesso) com as
de segunda ordem (relativas às competências e práticas digitais), nas
quais podemos incluir as práticas culturais online. Em primeiro lugar,
os dados reforçam a ideia de que Portugal ainda está afastado das car-
ruagens da frente do desenvolvimento informacional no contexto
europeu (Lapa e Vieira 2019), com reflexos nas atividades online. Além
disso, o nosso estudo indica que, mesmo perante uma maior generali-
zação do acesso em vários grupos sociais, as divisões de primeira ordem
são persistentes, embora de maneira reconfigurada em desigualdades
de acesso material, e englobam a posse de vários meios para sustentar
o uso enriquecido da Internet no quotidiano. Em Portugal, 38% usam
que leram mais livros, jornais e revistas online e 22% declaram que habitualmente apenas um equipamento para aceder à Internet, e na
viram mais espetáculos de música na Internet. Recorde-se que os larga maioria esse equipamento é o smartphone, o que trará constrangi-
inquiridos destas faixas etárias fazem parte dos segmentos com mentos face ao usufruto alargado de atividades de consumo e culturais
taxas mais elevadas de utilizadores da Internet (gráfico 2.1). Estes online. Também o equipamento tecnológico que se possui (ou não),
dados ­confluem com as conclusões obtidas por outro estudo por- bem como a diversidade/cumulatividade de ­utilizações e ligações com
tuguês sobre a relação entre a pandemia e os consumos mediáticos o offline, operam como marcadores de distinção social.
(Cardoso e Baldi 2020), que mostra um acréscimo dos consumos Ao contrário de previsões otimistas que encaravam a generaliza-
mediáticos e culturais pela Internet no confinamento, com maior ção das TIC como sinal de equalização digital entre grupos sociais

90 91
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

(Compaine 2001), deixando o acesso à Internet de ser uma vantagem europeus (Eurostat 2021a). Acresce que os consumidores online
comparativa, a evidência empírica quanto às desigualdades na posse portugueses são essencialmente jovens (INE 2019). Este constitui
de equipamentos com acesso às redes digitais demonstra que as divi- um dado relevante, uma vez que as modalidades de consumo cultural
sões de primeira ordem não são facilmente resolúveis e devem ser online podem contribuir para contornar desvantagens como a insu-
entendidas como um processo dinâmico que acompanha a mudança laridade, a distância face aos grandes centros urbanos e de consumo.
tecnológica e a capacidade de os indivíduos apropriarem vários dis- O confinamento provocado pelas medidas de enfrentamento da
positivos e atividades culturais e comunicacionais. As novas fraturas pandemia de Covid-19 provocou alterações nas práticas culturais
materiais aparecem como resultado de transformações tecnológicas dos portugueses em diversas dimensões, num reajustamento favore-
muito rápidas, da grande variedade de dispositivos disponíveis ao cido pela possibilidade de acesso sem pagamento. Como observado
público em geral, mas que suscitam oportunidades online diferen- na primeira seção deste capítulo, este representa um critério muito
ciadas. As disparidades estruturais surgem quando segmentos espe- saliente de seleção não só de serviços e plataformas digitais como do
cíficos da população, sistematicamente e por períodos prolongados, próprio tipo de formas culturais que são acedidas. Com a declaração
aproveitam os equipamentos mais elaborados, enquanto outros usam do estado de emergência, em março de 2020, os internautas portu-
dispositivos (como por exemplo, smartphones menos capazes ou gueses confinados nos seus espaços privados passaram, porventura,
desatualizados) que permitem menos funcionalidades e oportunida- por processos de re-domesticação das suas práticas e atitudes comu-
des (no uso, por exemplo, de aplicações ou plataformas específicas). nicacionais (no visionamento de espetáculos de música, por exem-
Observam-se ainda divisões de segunda ordem na sociedade por- plo), mudanças que são particularmente visíveis nas camadas mais
tuguesa quanto ao leque e manifestação de práticas culturais online. jovens da população portuguesa.
Tal como as divisões de primeira ordem, as atividades culturais De modo a prevenir o papel meramente substitutivo da Internet,
online estão sujeitas aos efeitos da escolaridade, da idade, da situação importa ainda lançar uma chamada de atenção para a relevância cada
­profissional, dos rendimentos e da classe social, embora em diferen- vez maior da conjugação de políticas educacionais, culturais e infor-
tes medidas. Os dados obtidos neste módulo sugerem, portanto, que macionais. Como o capítulo mostrou, continuam por transpor desi-
as atividades culturais online assentam num conjunto alargado de pré- gualdades no acesso e na utilização da Internet, tal como permanece
-requisitos de acesso à tecnologia, mas também de literacia digital, na a necessidade de assegurar o apoio à criação e produção cultural, que
qual podemos incluir um conjunto de novas competências, pessoais permita a heterogeneidade (Martinho 2020). Paralelamente à explo-
e sociais, cognitivas, performativas e culturais (Jenkins et al. 2009). ração e experimentação das possibilidades do digital, é indispensável
É entre os inseridos num meio social privilegiado que é mais prová- garantir as condições para a experiência presencial, por ser intrínseca
vel encontrar os internautas que maior proveito tiram das oportuni- ao teatro, dança, música, cinema e outras formas culturais. Para além
dades das redes e que demonstram um espectro de atividades mais do contexto familiar, a escola e outras entidades podem contribuir
alargado, sofisticado, criativo e conhecedor. E é também por via das para cultivar, desde cedo, o interesse e a atenção a expressões cul-
práticas culturais online que é possível estabelecer a ponte entre lite- turalmente diferentes e ajudar a esbater distinções sociais baseadas
racia digital, participação cultural e cidadania. na exclusividade de algumas práticas culturais, incluindo aquelas que
São os usos informativos da Internet que maior destaque assu- têm lugar ao vivo e onde a entrada requer pagamento.
mem entre os portugueses, em convergência com o que se observou
no panorama europeu, na primeira parte do capítulo. Já as atividades
frequentes de consumo de cultura online e relativas à participação
cultural são mais parcas em Portugal. Tais resultados são ­coerentes
com o peso baixo do consumo e de compras online, no qual se
podem incluir bens e serviços relativos à cultura, face a outros ­países

92 93
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

Referências bibliográficas março de 2021. Disponível em https://ec.europa.eu/commission/presscorner/


detail/pt/QANDA_21_984.
Compaine, Benjamin M. 2001. «Information Gaps: Myth or reality?». In The Digi-
AAVV. 2007. A Sociedade da Informação em Portugal 2007. Lisboa: UMIC – Agên- tal Divide: Facing a Crisis or Creating a Myth?, org. Benjamin Compaine. Cam-
cia para a Sociedade do Conhecimento. bridge, MA: MIT Press, 105-118.
Alves, Nuno de Almeida. 2008. «Perfis dos utilizadores da Internet em Portugal». Conde, Idalina. 2000. «A nossa múltipla condição». In A Definição dos Espaços
Análise Social, XXXXIII, n.º 188: 603-625. https://doi.org/10.2307/41012654 Sociais, Culturais e Políticos do Mundo Ibero-Atlântico (de Finais do Século
Ariño Villarroya, Antonio. 2015. «La cultura en España en la era digital». In España XVIII até Hoje), coord. Maria da Graça Alves Mateus Ventura. Lisboa: Edições
2015. Situación Social, org. Cristóbal Torres Albero. Madrid: Centro de Investi- Colibri, 95-110.
gaciones Sociológicas, 1356-1379. DiMaggio, Paul, e Eszter Hargittai. 2001. «From the ‘Digital Divide’ to ‘Digital
Ateca-Amestoy, Victoria M., e Concetta Castiglione. 2016. «The Consumption Inequality’: Studying Internet Use as Penetration Increases». Working Paper 15,
of Cultural Goods through the Internet. How is it Affected by the Digital Center for Arts and Cultural Policy Studies.
Divide?». ACEI Working Paper Series (Maio). Emmanouilides, Christos, e Kathy Hammond. 2000. «Internet Usage: Predictors
Bell, Daniel. 1974. The Coming of Post-Industrial Society: A Venture in Social Fore- of Active Users and Frequency of Use». Journal of Interactive Marketing, 14, n.º
casting. Harmondsworth: Penguin. 2: 17-32.
Bimber, Bruce. 2000. «Measuring the Gender Gap on the Internet». Social Science Eurobarómetro. 2016. Internet User’s Preferences for Accessing Content Online.
Quarterly, 81, n.º 3: 868-876. Flash Eurobarometer 437. Bruxelas: Comissão Europeia.
Blank, Grant, e William Dutton. 2013. «Next Generation Users: Changing Access Eurostat. 2021a. Culture Statistics – Use of ICT for Cultural Purposes, Disponível em
to the Internet». Selected Papers of Internet Research, 1-5. Disponível em http:// https://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/index.php?title=Culture_sta
spir.aoir.org/index.php/spir/article/view/693. tistics_-_use_of_ICT_for_cultural_purposes&oldid=518677#Use_of_the_
Bourdieu, Pierre. 2010 [1979]. A Distinção – Uma Crítica Social da Faculdade de Internet_for_cultural_purposes.
Juízo. Lisboa: Edições 70. Eurostat. 2021b. Internet Use by Individuals. Luxemburgo: Gabinete de Estatísticas
Buckingham, David. 2006. «Is There a Digital Generation?». In Digital Generations: da União Europeia. Disponível em https://ec.europa.eu/eurostat/databrowser/
Children, Young People, and New Media, eds. David Buckingham e Rebekah view/tin00028/default/table ?lang=en.
Willett. Mahwah: Lawrence Erlbaum. Garcia, José Luís, João Teixeira Lopes, Teresa Duarte Martinho, José Soares Neves,
Burke, Catherine. 2003. «Women, Guilt and Home Computers». In The Wired Rui Telmo Gomes, e Vera Borges. 2018. «Mapping Cultural Policy in Portugal:
Homestead: An MIT Sourcebook on the Internet and the Family, eds. Joseph From Incentives to Crisis». International Journal of Cultural Policy, 24, n.º 5:
Turow e Andrea Kavanaugh. Cambridge, MA: MIT Press, 325-336. 577-593. Disponível em https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/102866
Cardoso, Gustavo, e Sandro Mendonça. 2014. A Internet em Portugal: Sociedade em 32.2016.1248950.
Rede 2014. Lisboa: OberCom. Disponível em https://obercom.pt/wp-content/ Gassner, Patricia. 2007. «The End of the Audience: How the Nature of Audiences
uploads/2016/06/A-Internet-em-Portugal-Sociedade-em-Rede-2014.pdf. Changed». Global Media Journal-African Edition, 1, n.º 1: 120-129.
Cardoso, Gustavo, e Vania Baldi, coord. 2020. Pandemia e Consumos Mediáticos. Gomes, Rui, superv. 2016. As Novas Dinâmicas do Consumo Audiovisual em Portu-
Lisboa: Obercom. Disponível em https://obercom.pt/wp-content/uploads/20 gal. Lisboa: Entidade Reguladora para a Comunicação Social.
20/10/ Final_Pandemia_media_Geral.pdf. Gray, Ann. 1992. Video Playtime: The Gendering of a Leisure Technology. Londres:
Cardoso, Gustavo, Guo Liang, e Tiago Lapa. 2013. «Cross-National Comparative Routledge.
Perspectives from the World Internet Project». In The Oxford Handbook of Haddon, Leslie. 2007. «Roger Silverstone’s Legacies: Domestication». New Media
Internet Studies, ed. W. Dutton. Oxford: Oxford University Press, 216-236. & Society, 9, n.º 1: 25-32.
Castells, Manuel. 2002. A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura, Vol. I, Hargittai, Eszter, e Amanda Hinnart. 2008. «Digital Inequality: Differences in
A Sociedade em Rede. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. Young Adults Use of the Internet». Communication Research, 35, n.º 5: 606-621.
Comissão das Comunidades Europeias. 1993. Livro Branco sobre Crescimento, Com- Hongyu, Kuang. 2018. «Análise fatorial exploratória: resumo teórico, aplicação e
petitividade, Emprego. Os Desafios e as Pistas para Entrar no Século XXI. Luxem- interpretação». E&S Engineering and Science, 7, n.º 4: 88-103.
burgo: CCE. Disponível em https://infoeuropa.eurocid.pt/registo/000000500/ INE – Instituto Nacional de Estatística. 2019. Sociedade da Informação e do Conhe-
Comissão Europeia. 2021. «Orientações para a digitalização até 2030: a via euro- cimento. Inquérito à Utilização de Tecnologias da Informação e da Comunicação
peia para a Década Digital», comunicação da Comissão Europeia apresentada em pelas Famílias.

94 95
Práticas Culturais dos Portugueses Internet, práticas culturaisonline e distinção

ITU – International Telecommunication Center. 2020. Measuring Digital Develop- Secretaría General Técnica, Ministerio de Cultura y Deporte. Disponível em
ment Facts and Figures. Genebra: International Telecommunication Union. http://www.culturaydeporte.gob.es/ dam/jcr:1712f192-d59b-427d-bbe0-db0f3e
Jenkins, Henry. 2006. Convergence Culture. Nova Iorque: New York University 9f716b/encuesta-de-habitos-y-practicas-culturales-2018-2019.pdf.
Press. Miller, Daniel, e Don Slater. 2000. The Internet: An Ethnographic Approach. Oxford
Jenkins, Henry et al. 2009. Confronting the Challenges of Paticipatory Culture. Media e Nova Iorque: Berg.
Education for the 21st Century. Chicago, IL: The John D. and Catherine T. Ortiz-Ospina, Esteban, Charlie Giattino, e Max Roser. 2020. «Time Use». OurWor-
MacArthur Foundation. Disponível em <https://mitpress.mit.edu/sites/defau ldInData.org. Disponível em https://ourworldindata.org/time-use.
lt/files/titles/free_download/9780262513623_Confronting_the_Challenges. Pais, José Machado. 1998. «As ‘cronotopias’ das práticas culturais do quotidiano».
pdf>. Boletim OBS, 4: 7-9. Disponível em http://www.gepac.gov.pt/oac-1996-2013/
King, Rachael. 2012. «IDC: We’re in the Midst of the ‘Great PC Exodus on the gepac-oac/oac-documentos-electronicos.aspx.
Internet’». ZDNet. 29 de Outubro, 2012. Acedido em 5 de Setembro de 2021. PRC – Pew Research Center. 2021. Internet/Broadband Fact Sheet. Disponível em
Disponível em https://www.zdnet.com/article/idc-were-in-the-midst-of-the-gr https://www.pewresearch.org/Internet/fact-sheet/Internet-broadband/?menu
eat-pc-exodus-on-the-Internet/. Item=6d2e5a1d-0fea-4cff-84ef-5999713abe5e#who-uses-the-Internet.
Lapa, Tiago, e Jorge Vieira. 2019. «Divisões digitais em Portugal e na Europa. Por- Prensky, Marc. 2001. «Digital Natives, Digital Immigrants: Part 1». On the Horizon,
tugal ainda à procura do comboio europeu?». Sociologia on Line, 21: 62–82. 9, n.º 5: 1-6.
https://doi.org/10.30553/sociologiaonline. Selwyn, Neil, Stephen Gorard, e John Furlong. 2005. «Whose Internet is it Anyway?
Lapa, Tiago, Jorge Vieira, Joana Azevedo, e Gustavo Cardoso. 2018. «As desigual- Exploring Adult’s (Non) Use of the Internet in Everyday Life». European Jour-
dades digitais e a sociedade portuguesa. Divisão, continuidades e mudanças». In nal of Communication, 20, n.º 1: 5-26.
Desigualdades Sociais. Portugal e a Europa, org. Renato Miguel do Carmo, João Silva, Augusto Santos. 1994. «Tradição, Modernidade e Desenvolvimento: Portugal
Sebastião, Joana Azevedo, Susana da Cruz Martins e António Firmino da Costa. na Integração Europeia». Revista Crítica de Ciências Sociais, 39: 147-161.
Lisboa: Editora Mundos Sociais, 257-270. Smith, Aaron. 2011. Smartphone Adoption and Usage. Washington: Pew Research
Livingstone, Sonia. 2004. «What is Media Literacy?». Intermedia, 32, n,º 3: 18-20. Center, Pew Internet & American Life Project.
Loos, Eugène. 2012. «Senior Citizens: Digital Immigrants in Their Own Coun- Sørensen, Knut H. 1994. «Technology in Use: Two Essays in the Domestication of
try?». Observatorio, 6: 1-23. Disponível em http://dare.uva.nl/record/461270. Artefacts». Centre for Technology and Society Working Paper, 2: 94.
Martinho, Teresa Duarte. 2016. «Em linha com a União Europeia? O digital na Tapscott, Don. 1998. Growing Up Digital: The Rise of the Net Generation. Nova
política para a cultura em Portugal». In Cultura e Digital em Portugal, org. Teresa Iorque: McGraw-Hill.
Duarte Martinho, João Teixeira Lopes e José Luís Garcia. Porto: Afrontamento, Toffler, Alvin. 1980. The Third Wave: The Classic Study of Tomorrow. Nova Iorque:
51-71. Bantam.
Martinho, Teresa Duarte. 2020. «E depois de um ano descontinuado? Implicações van Dijk, Jan A.G.M. 2005.The Deepening Divide: Inequality in the Information
da pandemia de Covid-19 para a cultura ao vivo». Life Research Group Blog, ICS- Society. Thousand Oaks, Londres, Nova Deli: Sage.
Lisboa. Disponível em https://liferesearchgroup.wordpress.com/2020/12/16 van Dijk, Jan A. G. M. 2009. «One Europe, Digitally Divided». In The Routledge
/e-depois-de-um-ano-descontinuado-implicacoes-da-pandemia-de-covid-1 Handbook of Internet Politics, org. Andrew Chadwick e Philip Howard. Londres
9-para-a-cultura-ao-vivo/. e Nova Iorque: Routledge, 114-127.
Martinho, Teresa Duarte, João Teixeira Lopes, e José Luís Garcia. 2016. «Introdu-
ção». In Cultura e Digital em Portugal, org. Teresa Duarte Martinho, João Tei-
xeira Lopes e José Luís Garcia. Porto: Afrontamento, 9-16.
Martins, Hermínio, e José Luís Garcia. 2016. «A hegemonia cibertecnológica em
curso – uma perspetiva crítica». In Cultura e Digital em Portugal, org. Teresa
Duarte Martinho, João Teixeira Lopes e José Luís Garcia. Porto: Afrontamento,
19-37.
Masuda, Yoneji. 1981. The Information Society as Post-Industrial Society. Washing-
ton, DC: World Future Society.
MCUDa (Ministerio de Cultura y Deporte). 2019. Encuesta de Hábitos y Prácti-
cas Culturales en España 2018-2019. Madrid: División de Estadística y Estudios,

96 97
Tiago Lapa

Capítulo 3

A domesticação da televisão e da
rádio na era digital
«pós-radiodifusão»

No campo do audiovisual, temos vindo a assistir, ao longo das


décadas, a mudanças estruturais nos padrões de consumo mediático
e a inovações recorrentes nos suportes tecnológicos da televisão e da
rádio. Estes putativos «velhos» media, também apelidados de clás-
sicos ou tradicionais, têm-se reconfigurado recorrentemente nos
conteúdos e formatos, assim como tecnologicamente, ao longo do
percurso da sociedade moderna. Concomitantemente, os padrões de
consumo das suas audiências constituem uma manifestação socioló-
gica das preferências informativas, de entretenimento e culturais de
uma dada sociedade. Rejeitando um determinismo tecnológico na
explicação das transformações do campo audiovisual, podemos dizer
que mudanças de cariz tecnológico, como a comunicação mediada
pelas redes digitais, económicas, organizacionais, sociais e culturais
se promovem umas às outras, dando azo a inovações nos produtos
e serviços que, por sua vez, moldam gostos, preferências, disposi-
ções e estilos de vida. Neste sentido, ao procurarmos os fatores que
comandam a mudança de meios de comunicação como a televisão e
a rádio, entre outros, podemos falar de transformações tecnossociais
desses meios.
A tecnologia, a sua conceção, desenvolvimento, implementa-
ção e disseminação societal, através da identificação ou exploração

99
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

de «necessidades», também é fruto da sociedade onde se insere. dos aparelhos e conteúdos mediáticos nas práticas e rotinas quoti-
Seguindo Livingstone (2002, 18), a génese ou a evolução de tec- dianas dos indivíduos. Esta perspetiva está na base da interpretação,
nologias de comunicação (como a televisão e a rádio) podem ser nas secções seguintes, de um conjunto de resultados do inquérito.
consideradas como atividades sociais. Não é, porventura, possível A terceira parte centra-se nos resultados empíricos respeitantes ao
identificar fatores explicativos unívocos no que respeita à evolução estado da domesticação da televisão em Portugal, apresentando um
da televisão e da rádio, enquanto tecnologias, e dos seus consumos. retrato sociográfico das audiências quanto aos hábitos de utilização
Todavia, podemos assumir que o determinismo tecnológico é uma e aos programas ou géneros televisivos consumidos. São aqui identi-
verdade parcial (MacKenzie e Wajcman 1999), uma vez que as par- ficados diferentes perfis de consumo que demonstram apropriações
ticularidades de um dado dispositivo tecnológico – a sua semiótica, diferenciadas da televisão delineadas por fatores sociodemográficos
as suas histórias e potencialidades – devem ser abrangidas na análise e socioeconómicos. Na quarta secção focamo-nos sobre a utilização
social dos seus usos e apropriações. Há situações em que os conteú- da rádio, considerando a frequência, os meios e os lugares de uso e os
dos se adaptam às possibilidades e limitações tecnológicas e às práti- programas mais consumidos. Procedemos à caracterização dos gran-
cas sociais que as acompanham. Temos como exemplos os formatos des ouvintes e perfilhamos diferentes perfis de consumo radiofónico
de apresentação dos conteúdos adaptados ao consumo audiovisual e respetivos ouvintes-tipo. Na quinta e penúltima parte analisam-
fora do espaço doméstico, em trânsito, em ecrãs mais pequenos, ou se as perceções dos inquiridos quanto às variações do seu grau de
em dadas plataformas digitais e canais de distribuição como as redes utilização da televisão e da rádio durante o confinamento de 2020,
sociais online ou a produção de fonogramas ou músicas que, para em resposta à pandemia da doença Covid-19. Os resultados mais
além de considerações de ordem comercial ou estética, são concebi- salientes do estudo levado a cabo neste capítulo são sintetizados e
dos tendo em consideração as limitações dos dispositivos (portáteis) discutidos na parte conclusiva.
de reprodução, as tecnologias de compressão e de distribuição e a
respetiva degradação do áudio ou a falta de fidelidade desses apare-
lhos. A reinvenção dos «velhos» media
A primeira secção do capítulo enquadra o campo mediático que
envolve a televisão e a rádio do ponto de vista macrossocial e de Uma crise global na indústria da publicidade, a base financeira
mudanças estruturais. Introduz elementos teóricos que suportam a predominante das indústrias de media, em grande parte ligada ao
interpretação das tendências apuradas no inquérito quanto ao con- impacto das redes digitais e das grandes empresas tecnológicas, tem
sumo audiovisual. São apontadas como forças motrizes a transição vindo a transformar os modelos de negócio das indústrias mediá-
da sociedade de massas e de radiodifusão (broadcasting), com o seu ticas (Gluck e Roca Sales 2008). A ecologia mediática global com-
correspondente modelo comunicacional, para uma era digital pós-ra- plexificou-se na presente era digital, na qual os consumos podem
diodifusão (post-broadcasting) (Schrøder 2019). Esta é alicerçada em ser pautados por regimes de mobilidade, multitarefa, ou on-demand,
ativos intangíveis possibilitados pelos meios eletrónicos, a desmate- conferindo aos consumidores maior controlo sobre onde, quando
rialização ou digitalização de bens culturais, entre outros, a articula- e como interagem com os media. Relançou igualmente as regras de
ção em rede e a convergência tecnológica de diferentes modalidades funcionamento da economia da atenção, num contexto mediatica-
de comunicação (Cardoso 2006). Tais tendências estão atualmente mente saturado, onde o peso das audiências e a sua atenção, enquanto
bem representadas nos dispositivos apelidados de smart (TV, phone, bem escasso, constituem o principal meio de valorização económica.
etc.), que permitem o usufruto de uma vasta gama de formas simbó- Neste contexto, as receitas de publicidade dividem-se em diferen-
licas e conteúdos. tes segmentos da indústria mediática que está cada vez mais diver-
A segunda parte, ainda de cariz teórico, introduz o leitor à aborda- sificada nas suas plataformas de distribuição de conteúdos. Segundo
gem da «domesticação» dos media, que olha os modos de ­penetração Colombo (2003), a televisão contemporânea (com exceção dos

100 101
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

canais noticiosos) é essencialmente uma fonte de entretenimento em sociais online como o Facebook e o Instagram e a distribuição e frui-
termos de programação, embora nem sempre tenha sido entendida ção dos seus conteúdos seguem uma lógica transmediática pois estão
como tal. É pautada muitas vezes por conteúdos que passam um tom presentes, e são consumidos, em vários media (telemóvel, rádio do
de informalidade na relação com o espectador, apelam à participação carro, redes sociais online ou plataformas de streaming com os seus
e à interatividade. Esforçam-se por agarrar a atenção dos espectado- podcasts) e suscitam o interesse das audiências em seguir os conteú-
res, cientes de que sofrem a concorrência de outros media inseridos dos radiofónicos e os seus intervenientes de forma mediaticamente
numa «economia da atenção» que compõe o sistema mediático em agnóstica. Os programas de rádio passaram a ser registados em vídeo
rede. A televisão que conhecemos hoje é ainda diferente da «lareira de modo a possibilitarem o formato transmediático e, em muitos
eletrónica» de antigamente, quando o modelo de comunicação de casos, os locutores deram lugar aos animadores. Uma estação de
massas era dominante, quanto à geografia doméstica e aos tipos de rádio, quando integrada em grupos de media, passa a partilhar recur-
dietas e práticas mediáticas que estruturam o espaço e o tempo do sos humanos e materiais e a criar sinergias com outras ofertas do
quotidiano dos portugueses. As ofertas (de canais, formatos, géneros grupo (estações de televisão, jornais, etc.), o que também tem mani-
televisivos) através da televisão digital terrestre (TDT), satélite, cabo festos efeitos organizacionais.
ou pelas redes digitais, e as cadeias de produção e distribuição expan- A liquidez da rádio adveio também das suas vantagens com-
diram-se e transformaram-se, seguindo a segmentação dos interesses petitivas, um meio maduro, ubíquo, portátil e bem implantado,
das audiências e a individualização nos consumos mediáticos. escalável do local ao global, com baixos custos de produção, o que
Também a rádio se foi transformando a par do percurso da socie- requer receitas de publicidade mais baixas. É também um meio que
dade moderna. A par de alterações nos hábitos individuais, nos usos funciona em ambientes de receção multitarefa (multitasking) e de
sociais e nos comportamentos coletivos, a rádio imiscui-se igual- duplicação das audiências, face ao desdobramento da sua atenção em
mente com inovações tecnológicas em termos de produção e difusão vários meios. Robinson e Godbey (1997) referem que a audição de
de conteúdos e invade plataformas e dispositivos como os recetores rádio costumava ser uma experiência absorvente, na qual as pessoas
fixos que captam ondas hertzianas, o automóvel, ou as redes digitais se envolviam de forma dedicada, excluindo outras atividades. Era,
do telemóvel e da Internet. Tal como a televisão, a identidade e o assim, comum as famílias reunirem-se em torno do dispositivo e
estatuto da rádio acompanharam o movimento da modernidade de ouvirem rádio. Mais tarde, a audição radiofónica foi passando gra-
tornar líquido o que outrora era sólido ou estável (Bauman 2000). dualmente a pano de fundo tornando-se, com o advento da televisão,
A base tecnológica da rádio hertziana é destabilizada assim como, quase exclusivamente uma atividade secundária, algo que escutamos
no eixo dos fatores de natureza sociológica, a audiência se liquidi- enquanto fazemos algo.
fica e individualiza em rede na modernidade tardia. A rádio líquida, Segundo Cardoso (2006), meios de massa como a televisão e a
flexível e adaptável, apropria-se das novas tecnologias da informa- rádio, enquanto realidades mediáticas, são produto de três condi-
ção e comunicação, molda-se a inovações organizacionais, a modelos ções: 1) a organização económica dos meios, que se reporta à forma
de negócio alternativos (baseados na publicidade, na subscrição ou como se relaciona o mercado televisivo ou radiofónico com os dife-
em parcerias) e imiscui-se nas dinâmicas dos grupos e comunidades rentes media em termos de canais de transmissão, produção e oferta
online. A mesma liquidez tem feito com que a evolução da rádio não de conteúdos; 2) as diferentes matrizes de media, que se reportam às
tenha sido linear ou unidirecional, seguindo caminhos diversos que nossas representações ou atitudes face à televisão ou à rádio e às for-
podem passar pelo narrowcasting (microssegmentação em públicos mas de classificação em função das nossas necessidades e objetivos;
comparativamente localizados ou especializados), a automação ou 3) e as nossas dietas mediáticas, ou práticas e consumos televisivos
semiautomação da programação, a rádio algorítmica ou a transfor- ou radiofónicos. Podemos daqui retirar que meios de comunicação
mação em cloud radio station, em que se funde nas, e é suportada tradicionais como a televisão ou a rádio estão longe de serem reali-
pelas, aplicações e ferramentas digitais. A rádio cresceu para as redes dades mediáticas estanques, estando antes em constante evolução,

102 103
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

reinventando-se, e sendo socialmente constituídas. Neste quadro, o contexto em que as pessoas vivem e experimentam tecnologias
apontam-se processos de reconstrução e até indefinição identitária como a televisão e a rádio enquadra as suas experiências mediáticas
quer do «pequeno» ecrã (Araújo et al. 2009), quer da rádio (Meneses (do ponto de vista atitudinal, normativo, simbólico e praxiológico).
2009; Vieira et al. 2013b). Até ao aparecimento de serviços da Web Outras influências incluem estudos sobre os consumos, tais como os
2.0, como o Youtube, diretorias de vídeo, modalidades de distribuição trabalhos de Bourdieu (2010) e McCracken (1990). Esta literatura
on-demand, redes sociais online, entre outros, o consumo de conteú- examinou como e porquê os agentes sociais escolhem certos apare-
dos dos meios tradicionais através da Internet era pouco expressivo lhos, e como se sentem, organizam e usam as tecnologias mediáticas
ou residual (Araújo et al. 2009). Se, por um lado, a televisão e a rádio que possuem. Partindo do trabalho de Silverstone e colegas (2005)
ainda podem ser entendidas como meios de comunicação de massas, podemos mobilizar uma série de conceitos para captar esses diferen-
por outro, desenvolvimentos recentes nestas realidades mediáticas, tes processos, sendo os mais relevantes a apropriação, objetivação,
num contexto de afirmação de um modelo comunicacional em rede incorporação e conversão. Respetivamente, eles descrevem como
(Cardoso 2006), apontam para a afirmação de modelos híbridos, em a entrada dos dispositivos mediáticos no quotidiano e no espaço
que tanto a audiência como o emissor coparticipam na, mas não con- doméstico é gerida, como essas tecnologias estão física e simboli-
trolam totalmente a, distribuição. Se outrora podiam ser confundi- camente presentes nos espaços domésticos e como se encaixam nas
das com os aparelhos de receção de ondas hertzianas, quais «lareiras rotinas dos agentes sociais. Isto significa olhar para os media como
eletrónicas», hoje poderão ser definidas com maior acuidade como meios estruturantes dos quotidianos, do ponto de vista espacial e
formatos de apresentação de conteúdos ou tipos de narrativa, com temporal, e como bens inseridos em domínios semióticos que os
uma linguagem, semiótica e histórias próprias. indivíduos exibem para os outros, provisionando mensagens (mais
ou menos distintivas) sobre si mesmos.
O conceito de apropriação na teoria da domesticação descreve
O estudo dos consumos televisivos e radiofónicos à luz a fase de mover um artefacto, meio ou tecnologia de fora para den-
da perspetiva da domesticação tro de casa. A família constitui uma «economia moral» onde as nor-
mas, valores e práticas do quotidiano são partilhados ou negociados
A principal perspetiva teórica que enquadra a leitura dos resulta- (­Silverstone e Hirsch 1992). Quer o artefacto seja um objeto mate-
dos do presente capítulo é a da domesticação dos meios de comuni- rial, como um aparelho de TV, ou imaterial, como programas de tele-
cação. A metáfora de «domesticação» é aqui aplicada para descrever visão, jogos digitais ou serviços digitais como as redes sociais online,
os processos envolvidos em «domar» os meios de comunicação ao eles são atribuídos a significados e adquirem familiaridade e impor-
trazê-los para os espaços privados e o quotidiano. A abordagem da tância no ambiente doméstico. O segundo conceito, incorporação,
domesticação teve as suas origens em várias tradições e interesses descreve aspetos práticos da mobilização rotinizada dos aparelhos
de pesquisa (Haddon 2007). No final da década de 1980 havia um mediáticos, o que engloba as diferentes modalidades de gestão do
interesse de longa data na análise das audiências nos estudos de tempo, práticas rotinizadas e rituais que envolvem o uso mediático
media, contudo, o grande domínio das abordagens semióticas neste doméstico. Um exemplo é a forma como as pessoas ou agregados
campo de estudos significava que havia um corpo empírico subs- se reúnem rotineiramente para assistir a determinados programas
tancialmente menor quanto às experiências reais dos espectadores televisivos (Morley 1986). O terceiro conceito, objetificação, tem
ou ouvintes. Neste âmbito, Hobson (1980) examinou o papel e o uma dimensão referente à geografia doméstica, pois pretende dar
significado da televisão na vida das donas de casa, e Bausinger (1984) conta do modo como os dispositivos são colocados fisicamente em
identificou a pertinência de estudar conjuntos de media e consumos áreas privadas, partilhadas ou disputadas do lar (Silverstone e Hirsch
mediáticos nos espaços domésticos enquanto processos coletivos. 1992). Tem ainda uma dimensão simbólica, pois os artefactos mediá-
É por via deste tipo de perspetivas que se aborda a questão de como ticos podem ser igualmente objetificados nas conversas familiares,

104 105
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

por exemplo, na forma como as personagens de telenovelas forne- Gráfico 3.1 – Com que frequência se vê televisão e ouve rádio (%)
cem uma base para a disputa e negociação normativa, a identificação
e autorrepresentação. O quarto e último conceito, conversão, des-
creve o que acontece quando um artefacto mediático se torna um
dado adquirido da vida quotidiana e parte constituinte da identidade
do indivíduo ou da família (Hynes e Rommes 2006).
Dadas as presentes possibilidades de desespacialização dos usu-
frutos mediáticos, podemos, no entanto, apontar algumas limitações
dos estudos mais pioneiros da domesticação, em particular, os bri-
tânicos, ao se concentraram nos processos ao nível do lar. Pesquisa-
dores noruegueses consideraram a «domesticação na sociedade» e a
necessidade de olhar para além do espaço doméstico (Lie e Sørensen
1996; Sørensen 2005), embora o contexto pandémico possa ter rea-
firmado a centralidade desse espaço. Seja como for, a disseminação
de dispositivos móveis exigiu que a pesquisa nesta tradição repen-
(N=2000)
sasse o âmbito da domesticação (Haddon 2007), expandindo-o para
considerar as interações extradomésticas com os artefactos mediá-
ticos (como a rádio no automóvel) e com os outros agentes sociais
através desses artefactos. O peso dos telespectadores diários é maior entre as mulheres
(92%) do que os homens (87%), vai aumentando com a idade, sendo
98% nos seniores com 65 ou mais anos e 73% nos jovens dos 15 aos
O estado da domesticação da televisão em Portugal 24 anos, e vai diminuindo com a escolaridade, atingindo o pico entre
os portugueses com menos do que o 3.º ciclo (95%) face a 84% dos
Independentemente das tendências que poderão moldar o futuro respondentes com o ensino superior. Ademais, o peso dos especta-
da televisão, o consumo televisivo continua a ser um artefacto mediá- dores mais ávidos é mais elevado entre os portugueses que usufruem
tico influente, domesticado pela larga maioria dos portugueses e rendimentos líquidos familiares de 800 a 1500 euros (95%) e até 500
estruturante dos seus quotidianos. Em 2020, praticamente toda a euros (92%) em comparação com 82% dos que fruem um rendi-
população portuguesa, 90% dos respondentes, refere visionar tele- mento doméstico de mais de 2700 euros, entre as pessoas reformadas
visão diariamente (gráfico 3.1). Esta distribuição vai de encontro ao ou com incapacidade (97%) e domésticas não remuneradas (97%),
que se verifica na sociedade espanhola (MCUDa 2019, 55), mas des- atingindo o ponto mais baixo entre os estudantes (75%), e entre os
taca os portugueses dos restantes habitantes da UE 28, cuja percen- empregados de escritório (95%) e os operários (93%), sendo bem
tagem média para o visionamento habitual de televisão se fixou nos menor entre os técnicos e especialistas (81%). Tal é confirmado por
81% em 2019 (Comissão Europeia, Direção-Geral da Comunicação, diferenças estatisticamente significativas (p-value ≤ 0,05) quanto à
2020). Vieira et al. (2013a) relevam identicamente a centralidade e frequência do visionamento de televisão nas variáveis sociodemográ-
transversalidade da televisão em Portugal, numa perspetiva de bem de ficas e socioeconómicas com a exceção do habitat.
consumo, de negócio audiovisual ou de influência social. Continuam Note-se que, como vimos no capítulo 2, são tendencialmente
a ser relevantes os usos sociais e gratificações dos conteúdos televi- os portugueses mais jovens que declaram que veem, compram ou
sivos, mesmo entre os indivíduos mais novos, embora o seu visiona- descarregam filmes ou séries na rede, o que pode compor uma con-
mento diário seja tendencialmente menos frequente entre estes. corrência, no âmbito da economia da atenção, à televisão. Tal parece

106 107
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

refletido nos resultados visto que, entre os não utilizadores da rede, Gráfico 3.2 – Em média, quantas horas costuma…
97% revelam que assistem diariamente à televisão, proporção que
desce para 87% entre os internautas. Pode-se argumentar que o
usufruto de conteúdos audiovisuais na televisão e na Internet são
duas experiências distintas com graus de possibilidades de escolha
e interatividade diferenciados, em que na televisão temos a ênfase
na grelha de programas pré-definida e com os serviços digitais há
maiores possibilidades práticas e efetivas de as audiências construí-
rem a sua própria dieta individualizada de programação. Todavia,
as fronteiras são algo ténues, uma vez que, tendo em consideração
as transformações sociotécnicas no audiovisual apontadas atrás, a
televisão e os serviços de radiodifusão enquanto tecnologias aproxi-
(N=1863; N=1859; N=964; N=902, respetivamente)
maram-se sucessivamente das possibilidades de autoprogramação,1 e
os serviços digitais (como o YouTube ou serviços de streaming), ao
procederem ao profiling algorítmico (o ato ou processo de extrapo-
lar informações sobre um consumidor com base em características audiências, poderão esconder, contudo, situações muito ­diferenciadas
ou tendências indicadas pelos dados pessoais recolhidos nas plata- quanto à qualidade da exposição. A atenção do espectador pode ser
formas digitais), aproximam-se do provisionamento pré-definido da focada ou intermitente e em regime de multitarefa, como já foi refe-
grelha de programas, embora de forma individualizada, à medida das rido. Ademais, com a diversificação da oferta televisiva, Cardoso,
preferências concretas de cada membro da audiência. O uso das pos- Espanha e Lapa (2006) indicam que o zapping se tornou uma prática
sibilidades tecnológicas e de domesticação dos meios audiovisuais comum, isto é, mudar de canal frequentemente em curtos interva-
quanto ao controlo da programação pode seguir padrões sociais, los de tempo.2 Os autores acrescentam ainda que na grande maioria
com as audiências mais novas pautadas por um consumo menor de dos agregados com crianças a televisão está ligada às horas das refei-
formas audiovisuais pré-definidas na televisão e na rádio e pela pre- ções e uma parte muito substancial dos respondentes confessa que
ferência por meios que lhes permitem o maior controlo das suas a televisão fica acesa mesmo quando ninguém esteja a ver, o que se
dietas mediáticas quanto aos conteúdos (Cardoso, Espanha e Lapa enquadra nos usos estruturais de ambiente (som de fundo, compa-
2009). nheirismo e entretenimento) tipificados por Lull e Bryant (1990).
Ademais, quanto à incorporação da televisão na vida quotidiana, Neste quadro, Pereira (1998) releva que a experiência televisiva no
e como seria expectável, os inquiridos apontam que visionam, em seio familiar está longe de ser linear e fluida, sendo com frequência
média, mais horas de televisão durante o fim de semana (4) do que uma atividade intermitente e descontínua. A televisão poderá já não
durante um dia de semana típico (3) (gráfico 3.2). É de notar que
o valor médio de tempo à frente da TV durante um dia de semana 2
Este fenómeno tem merecido a atenção de analistas de mercado e dos pró-
típico fica acima de 4 horas entre os não utilizadores da Internet. prios produtores de conteúdos televisivos. É uma preocupação não só manter fiel
a audiência como captar a atenção dos espectadores nos períodos de publicidade, a
Atendendo à integração do consumo televisivo numa utilização maior fonte de receitas das estações de televisão comerciais. Neste quadro, temos
mediática em rede (Cardoso 2006), cabe referir que se os dados per- modelos de duplicação das audiências que têm como função aferir a existência de
mitem aferir a perceção da intensidade da exposição por parte das regularidades nos consumos mediáticos, e que separam tipos de espectadores: ins-
tantâneos, separados ou acumulados no tempo (Metheringham 1964; Keller 1966).
Bloom (2000), entre outros, distingue ainda entre a exposição mediática efetiva e a
1
A própria introdução dos videogravadores no mercado de consumo na década possibilidade dessa exposição ou OTS (opportunities to see), além de outros crité-
de 80 veio permitir maiores possibilidades de autoprogramação. rios, para aferir a qualidade da exposição mediática.

108 109
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

ser vista essencialmente como um meio de transmissão de conteúdos Gráfico 3.3 – Média de número de horas de visionamento de TV,
sequenciais, mas como meio de transmissão de conteúdos episódi- por características sociodemográficas
cos ou pontuais. É num sentido adjacente que Vieira et al. (2013a,
251) apontam uma «desintegração organizada» da experiência televi-
siva que se transforma «num sistema de ecrãs imerso numa rede de
usos e conteúdos tão intensos em vitalidade quanto em volatilidade».
A própria lógica de programas como as telenovelas e os próprios
telejornais permite mais ou menos o seguimento dos acontecimen-
tos olhando pontualmente para o ecrã, seguindo apenas alguns acon-
tecimentos mais interessantes para o espectador.
Ao invés das novas tecnologias da informação e comunicação
é o segmento da população com menos rendimentos e com mais
idade que passa, em média, mais tempo frente ao ecrã da televisão, 5
horas durante o fim de semana e 4 horas durante um dia de semana
típico (gráfico 3.3). Pelo contrário, são os indivíduos mais novos,
mais instruídos e com maiores rendimentos que, tendencialmente,
passam menos tempo à frente do ecrã da televisão, no fim de semana
e durante a semana. Não obstante, os dados indicam uma presença
transversal da televisão no quotidiano e poderá constituir um fator
estruturante dos espaços e dos tempos quotidianos das famílias. Os
media não constituem inevitavelmente forças centrífugas de ero-
são dos quadros familiares, podendo ser mobilizados como recur-
sos estruturantes, a par de outras atividades não mediatizadas, dos
quotidianos e dos espaços domésticos, e a sua utilização pode ser
entendida como expressão dessa estruturação. Apesar de pressões
individualizantes, a televisão poderá ser o principal elemento na eco- (N=1863; N=1859, respetivamente)
logia dos media, que se manifesta como força social centrípeta que
segura e molda biografias e narrativas mediatizadas partilhadas entre Quando se fala da individualização do uso da televisão, designa-
audiências e membros do mesmo agregado familiar. Neste quadro, se um processo multidimensional que inclui indicadores geográfi-
Lull e Bryant (1990) sinalizam que a televisão poderá ser mobilizada cos (localização e espaços de usufruto televisivo) e quantitativos
nas relações familiares, considerando os seus usos estruturantes na (número de dispositivos domésticos que permitem o acesso a con-
regulação comportamental, na delineação do tempo e das atividades, teúdos televisivos, o que não se cinge ao aparelho de televisão pro-
ao nível da padronização das conversas e na facilitação da comunica- priamente dito), mas igualmente indicadores referentes a formas
ção entre membros do agregado. Tal como também indica o estudo individualizadas de domesticação da televisão e à fragmentação de
de Pereira (1998), as interações sociais e as formas simbólicas pro- audiências (Katz 1996). No entanto, praticamente toda a população
porcionadas pela experiência televisiva extravasam o quadro ime- usa o aparelho de televisão como o principal meio de visionamento
diato da receção, uma vez que esta pode ser partilhada antes e depois de conteúdos televisivos, embora o inquérito não tenha contem-
dos momentos de consumo e é parte integrante dos universos sim- plado o número de aparelhos e o lugar de visionamento no espaço
bólicos partilhados dos indivíduos e das famílias. doméstico (tabela 3.1).

110 111
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital«pós-radiodifusão»

Tabela 3.1 – Principal dispositivo onde habitualmente Vieira et al. (2013a), confirma-se a resiliência do aparelho de televi-
se vê televisão (%) são como principal dispositivo para aceder a conteúdos televisivos,
mesmo num contexto de convergência de media, isto é, de fusão de
tecnologias e plataformas de media anteriormente distintas por meio
da digitalização e das redes digitais. Mas, ainda que o uso dos novos
media com o intuito de assistir à televisão seja residual, as diferenças
etárias quanto a esse uso são estatisticamente significativas (p-value
(N=1941) ≤ 0,05). É essencialmente entre os mais novos que temos telespec-
tadores que usam o computador ou tablet ou o telemóvel como os
principais dispositivos de exposição à TV (tabela 3.1). E, visto de
De acordo com os dados de Cardoso, Espanha e Lapa (2009), outra forma, entre os que usam o computador ou tablet como princi-
uma parte bastante significativa das audiências infantis afirma ter pal meio de consumo de conteúdos televisivos, 50% são jovens dos
duas ou três televisões em casa (70%) e 22% entre 4 e 7 televisões. 15 aos 24 anos e entre os que visionam principalmente no telemóvel,
Só uma pequena minoria de 3% diz ter apenas um aparelho em casa. 39% são desse grupo etário e 31% têm entre 25 e 34 anos.
Entre os respondentes dos 9 aos 18 anos, a sala de estar continua Uma outra via para aferir as potencialidades centrípetas da tele-
a ser o sítio por excelência do visionamento de televisão (em 81% visão que poderão concorrer para modalidades de integração social é
dos casos), no entanto, 51% costumam ver televisão no quarto. olhar para as preferências das audiências por tipo de programa. Para
A cozinha é outro dos locais onde há uma percentagem algo expres- além das práticas rotinizadas em torno dos dispositivos, os progra-
siva de inquiridos (34%) a ver TV. A expansão do ecrã televisivo pela mas populares dotam importância aos media na constituição de uma
casa poderá significar uma fragmentação dos consumos no agregado memória social comum e na manifestação de um «espírito» geracio-
familiar e uma solução para interesses divergentes. Tal sugere ainda nal por via da produção cultural e dos usos a ela conferidos. Esta
experiências televisivas isoladas, pelo menos em parte do tempo, com perspetiva assume que os media são a nossa conexão entre o vivido
menores períodos de mediação familiar, entendida como «processos e o representado. É através deles que a generalidade das audiências
através dos quais a família (ou outras instituições) filtra as influên- constrói a experiência, como nos relembra Thompson (1995).
cias educacionais, protege, interpreta, critica, reforça, complementa, Os programas televisivos mais populares são os relativos a notí-
contradiz, reage e transforma» (Bryce e Leichter 1983, 310). cias, reportagens e informação, uma vez que 81% da população assiste
Vieira et al. (2013a) identificam um conjunto de características habitualmente a este tipo de conteúdos, dado que reforça a noção da
do panorama televisivo atual, defendendo que a televisão significa centralidade deste meio como fonte de informação (tabela 3.2). Em
hoje ecrãs diferentes com conteúdos idênticos, pautados por graus termos de géneros televisivos, a ficção assume claramente um lugar
de qualidade e facilidade de acesso diferenciados, e por diferentes central na dieta televisiva dos portugueses, uma vez que 57% veem
graus de interatividade. Todavia, os nossos resultados indicam que só habitualmente filmes nesse meio, 43% costumam ver séries e 40%
uma ínfima minoria aponta os novos media (computador ou tablet telenovelas. A relevância social da ficção televisiva é apontada por
ou o telemóvel) como dispositivos preferenciais para consumo tele- vários autores, dada a sua ligação com as construções simbólicas e
visivo (tabela 3.1). A pesquisa de Vieira et al. (2013a) aponta em con- identitárias nas culturas quotidianas. Liebes e Katz (1990) assinalam
sonância que, quanto ao consumo televisivo na Internet, somente que uma pessoa pertencente a uma dada classe ou grupo social avalia
uma minoria dos inquiridos afirma que visiona conteúdos televi- um dado programa à sua maneira, ao comparar e medir o seu conhe-
sivos ou filmes disponíveis na Internet ou que entra numa página cimento e cultura face às estórias e personagens do programa. Barker
da Internet relacionada com um programa de televisão. Embora os (1999) argumenta que vários tipos de identidades, que se cruzam com
nossos dados não possam ser diretamente comparados com os de diferenças de classe, de género, de sexualidade e moralidade, entram

112 113
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

Tabela 3.2 – Programas televisivos habitualmente vistos (%) atendendo a uma certa plebeização da exposição mediática através dos
reality shows. Thompson não esquece os efeitos privados para os rece-
tores destes conteúdos que através de interações quasi-mediadas, ou
de interações e relações parassociais, são incorporados nos universos
quotidianos, simbólicos e práticos, das audiências3.
Os consumos televisivos podem ainda ser organizados em visio-
namentos regulares correlacionados, que constituem, por sua vez, a
base da construção de uma tipologia das audiências televisivas, a par-
tir da qual realizamos uma caracterização sociodemográfica e socioe-
conómica dos diferentes perfis de telespectadores (quadro 3.1).
A edificação desta tipologia e a exposição dos perfis que a consti-
tuem baseou-se na construção dos seguintes índices: 1) ‘consumo de
entretenimento televisivo’ – composto pela assistência habitual de
‘programas de entretenimento’, ‘concursos de cultura geral’, ‘outros
concursos’, ‘telenovelas’ e ‘programas de entrevista’; 2) ‘grande con-
sumo de conteúdos informativos e relativos ao desporto’ – inclui o
visionamento frequente de ‘programas desportivos’, ‘notícias, repor-
tagens e informação’, ‘debates’ e ‘documentários’; 3) ‘consumo tele-
(N=1942) visivo de cultura «cultivada»’ engloba o consumo habitual de ‘teatro’
e ‘outros programas de artes cénicas’, ‘programas relacionados com
livros e leitura’ e ‘outros programas culturais’; 4) ‘consumo diletante
em jogo na interpretação de telenovelas e outros tipos de programas de programas musicais’, abrange o visionamento de ‘concertos de
de ficção. Liebes e Katz (1990) defendem ainda que as audiências música clássica’, ‘concertos de música popular’ e ‘outros programas
mais jovens moldam ativamente as suas identidades – e, porventura, de música’; 5) ‘consumo televisivo de ficção’, que inclui ‘filmes’ e
cruzam barreiras culturais – quando comparam o comportamento ‘séries’. Os grandes consumidores de cada tipo ou conjunto de pro-
e as identidades dos personagens na televisão com as suas próprias gramas são identificados como aqueles que apresentam pelo menos
experiências quotidianas. O visionamento habitual de documentários um valor de 0,5 em cada índice, o que equivale à presença de pelo
é comum a 36% de telespectadores, e aparece, surpreendentemente, menos metade das práticas habituais de consumo de programas tele-
acima dos programas desportivos (33%), talvez por efeito do con- visivos que compõem o índice.
texto pandémico, dos concursos de cultura geral (30%) e dos progra- A assistência regular de desenhos animados é comum a 7% dos
mas de entretenimento (reality shows, talk shows, humor, etc.) (28%) portugueses, apesar de o inquérito ter sido aplicado a pessoas com 15
(tabela 3.2).
Ainda sobre a relevância social da televisão, Thompson (1995) lem-
3
O termo interação parassocial é utilizado na literatura para descrever um tipo
de relação psicológica vivida durante as exposições aos conteúdos dos meios de
bra-nos, na relação entre media e modernidade, que a difusão pública massas, em que as audiências experienciam sentimentos de identificação e/ou inti-
de conteúdos torna incertas as demarcações entre público e privado. midade com as personalidades mediáticas, apesar da ausência de interação efetiva
Isto significa essencialmente uma certa indiferenciação dos domínios (embora, as redes sociais online, entre outras formas de comunicação, possam faci-
público e privado para um conjunto de agentes sociais visibilizados ou litar as interações com as personalidades, o que poderá reforçar ainda mais a ilusão
parassocial). Se esta relação se estende no tempo, para além dos períodos de exposi-
«celebridades» com acesso privilegiado aos espaços e tempos de pro-
ção e com manifestação recorrente no quotidiano, torna-se uma relação parassocial
dução, nos telejornais, nos filmes, vídeos de música e séries, mesmo (ver, por exemplo, Rojek 2015).

114 115
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital«pós-radiodifusão»

Quadro 3.1 – Caracterização sociodemográfica e socioeconómica


Perfis Caracterização
dos perfis relativos aos consumos televisivos
de 55% destes fazem parte deste grupo) e estão menos repre-
sentados entre os jovens dos 15 aos 24 anos (35%). A idade
Perfis Caracterização média deste tipo de telespectador ronda os 50 anos. O capital
cultural institucionalizado (grau de instrução) é igualmente um
Consumidores Cerca de 4% dos telespectadores portugueses podem ser fator estruturante na constituição deste grupo: a maior propor-
televisivos englobados neste perfil. É no habitat urbano (5%) que se ção destes grandes consumidores de informação e programas
de cultura verifica a maior proporção de telespectadores portugueses com desportivos encontra-se entre os os que atingiram o ensino
«cultivada» este perfil, face a 3% nos habitats intermédio urbano e rural. As superior (65%). A representação deste perfil decresce gradual-
(N=79) diferenças não são estatisticamente significativas entre homens mente nos graus de instrução mais baixos, atingindo o ponto
e mulheres assim como entre escalões etários, mas observa- mais baixo entre os telespectadores com menos do que o 3.º
se um pendor feminino e para os telespectadores com idades ciclo (43%). O peso deste perfil nos escalões de rendimento
a partir dos 55 anos. A idade média dos telespectadores que familiar segue, mais ou menos, o mesmo padrão. Vai subindo
compõem este conjunto é cerca de 52 anos. Entre os telespec- com os rendimentos, começando em 33% entre os telespecta-
tadores deste perfil, as diferenças entre categorias relativas dores portugueses com os rendimentos mais baixos até atingir
ao grau de instrução e relativas à classe social são estatistica- o pico entre os consumidores televisivos que usufruem de
mente significativas com uma maior probabilidade de este tipo mais de 1800 a 2700 euros de rendimento familiar (59%).
de telespectadores ter concluído ou frequentado graus de ins- Todavia, desce entre os que desfruem de mais de 2700 euros
trução iguais ou superiores ao 3.º ciclo e de pertencer a clas- (53%). Neste perfil, observam-se ainda claras clivagens entre
ses sociais privilegiadas como os profissionais de colarinho telespectadores com diferentes situações perante o trabalho:
branco, gestores (9%) e os grandes empresários e profissionais os trabalhadores (55%), seguidos dos reformados(as) ou
liberais (8%), mas também os profissionais socioculturais com incapacidade (51%), são os mais representados, o que
(8%), face a 2% de operários. No entanto, o papel do capital contrasta com os(as) domésticos(as) não remunerados(as)
cultural institucionalizado (grau de instrução) e, em particular, do (19%). Também se observa uma maior probabilidade de serem
económico, parece ser aqui matizado e pouco evidente. Estes profissionais de colarinho branco e de terem profissões qua-
consumidores têm uma maior probabilidade de fruírem de entre lificadas, com destaque para os técnicos e especialistas (81%
mais de 800 euros a 1800 euros de rendimento familiar (5%), destes encaixam no perfil). Todas as diferenças retratadas neste
estando, porém, menos representados nos telespectadores com grupo são estatisticamente significativas.
rendimentos entre mais de 1800 e 2700 euros (2%), e de serem
trabalhadores (5%) ou reformados (4%), em comparação com Consumidores O grupo de consumidores de entretenimento televisivo engloba
2% de desempregados. Mas também aqui as diferenças não de entretenimento cerca de 23% dos telespectadores. É no habitat urbano que se
são estatisticamente significativas. Talvez esteja em jogo nestes televisivo apura a maior percentagem de consumidores de TV com este
consumos diferenças quanto àqueles que usufruem de eventos (N=443) perfil (25%), embora as diferenças com os habitats intermédio
de cultura «cultivada» noutros meios ou fora de casa (onde, por- urbano e rural não sejam estatisticamente significativas, sendo
ventura, se fazem mais sentir os efeitos dos capitais económico a única variável em que tal acontece. Estes fãs estão mais
e cultural) e aqueles que consomem formas de cultura «culti- representados entre as mulheres (29%) do que os homens
vada» televisionada, eventualmente como forma de colmatar a (16%) e o seu peso vai subindo com a idade, partindo dos 18%
falta de outras formas de consumo cultural. entre os espectadores dos 15 aos 24 anos e atingindo os 29%
entre os seniores. A idade média deste tipo de consumidores é,
Grandes Metade dos telespectadores portugueses podem ser considera- aliás, a maior: 53 anos. A representação destes fãs de entrete-
consumidores dos grandes consumidores de conteúdos noticiosos, informati- nimento televisivo desce gradualmente com o aumento do grau
de conteúdos vos e desportivos. Averiguam-se maiores probabilidades de os de instrução, sendo maior entre aqueles com menos do que o
informativos consumos informativos e desportivos na televisão serem mais 3.º ciclo (27%) e menor entre os detentores do ensino superior
e desportivos prevalecentes nos espaços rurais (54%), seguidos dos espaços (14%). Embora com oscilações, a mesma tendência se verifica
(N=976) intermédio urbanos (51%), face a 45% nas zonas urbanas. Há quanto aos escalões de rendimento: este perfil retrata 31% dos
um claro pendor de género, em favor dos homens. 68% destes telespectadores com até 500 euros de rendimento familiar
encaixam no perfil, em comparação com 35% de mulheres. e somente 4% dos que fruem de mais de 1800 a 2700 euros.
Também existem evidentes clivagens etárias: os grandes consu- Em consonância com a caracterização feita até aqui, é entre as
midores de informação e programas desportivos encontram-se pessoas reformadas ou com incapacidade e domésticas não
sobretudo nos escalões etários entre os 35 e os 64 anos (cerca remuneradas (28%) que temos as maiores proporções de

116 117
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

Perfis Caracterização Perfis Caracterização

fãs de entretenimento televisivo, seguidas pelos espectadores 84% entre os espectadores com 15 a 24 anos e atinge o ponto
em situação de desemprego (26%). É nos estudantes que este mais baixo entre os seniores (37%). Trata-se de um perfil
perfil tem menos peso (18%). Averiguam-se igualmente maiores caracterizado pela idade média mais baixa: à volta de 44 anos.
proporções destes fãs entre os espectadores com trabalhos A representação destes grandes consumidores de ficção na TV
não qualificados (29%) e dos serviços (28%). sobe com o grau de instrução e com os rendimentos familia-
res: estão menos representados entre aqueles com menos do
Apreciadores Há 5% de telespectadores apreciadores de programas musicais que o 3º ciclo (42%) e com rendimentos até 500 euros (39%),
de programas na televisão. As diferenças entre habitats quanto ao peso deste e mais representados entre os titulares de um grau do ensino
musicais perfil são estatisticamente significativas. Este é um tipo de con- superior (78%) e que registam um rendimento familiar de
na televisão sumidor tendencialmente mais urbano (7%) do que intermédio mais de 2700 euros (84%). É entre os estudantes (91%), os
(N=95) urbano (4%) ou rural (3%). Não há diferenças de género assina- quadros superiores do terceiro sector (77%) e os gestores
láveis e também não se encontram diferenças estatisticamente (85%) que igualmente encontramos as maiores proporções de
significativas entre escalões etários. Não obstante, é entre os fiéis telespectadores de ficção na televisão. Todas as diferenças
telespectadores com idades compreendidas entre os 55 e os 64 indicadas neste perfil são estatisticamente significativas.
anos que encontramos a maior percentagem destes apreciado-
res (8%), encontrando-se as mais baixas nos mais jovens e nos
seniores (menos que 4% nas duas categorias). A média etária
dos apreciadores de programas musicais televisionados ronda
os 49 anos. É entre os inquiridos com o 3.º ciclo completo que ou mais anos. Não tendo sido incluída nos perfis fazemos, contudo,
encontramos a proporção maior de apreciadores de programas uma caracterização: as maiores percentagens de consumidores regu-
musicais (7%) e entre aqueles com menos do que o 3.º ciclo
a menor (3%). A representação deste perfil é maior entre as lares de desenhos animados estão nos escalões dos 25 aos 34 anos
pessoas desempregadas (7%) e inexistente entre as domésticas e dos 35 aos 44 anos, decrescendo drasticamente a partir daí, entre
não remuneradas. As diferenças entre categorias relativas ao as mulheres, entre os inquiridos com pelo menos o 3.º ciclo de ins-
grau de instrução e à situação profissional podem ser conside-
radas estatisticamente significativas, no último caso para um trução completo, descendo acentuadamente entre os respondentes
p-value ≤ 0,1, mas o mesmo não se passa para os rendimentos, com menos do que o 3.º ciclo, entre os desempregados, seguidos dos
nem para as variáveis relativas à classe social. O peso deste per-
estudantes e trabalhadores, entre indivíduos com rendimentos altos,
fil vai oscilando entre escalões de rendimento, mas, seja como
for, tem o ponto mais elevado nos telespectadores com rendi- embora com oscilações, entre os comerciantes e os profissionais
mentos familiares acima dos 2700 euros (8%), entre os tra- socioculturais. O facto de as percentagens maiores de espectadores de
balhadores dos serviços e os técnicos e especialistas (perto
de 7% nos dois casos). Tal como no caso dos espectadores de
desenhos animados não se encontrarem entre os respondentes mais
programas culturais, no consumo habitual de programas relativos novos, mas nos escalões etários a seguir, em idades onde é comum
à música o papel do capital cultural institucionalizado (grau surgirem descendentes, pode indiciar situações de covisionamento
de instrução) e do económico é pouco claro e aparentemente
pouco estruturado por fatores tradicionais de distinção social.
desse tipo de programas quando há crianças no agregado, mas não
Uma explicação possível para esta situação é a concorrência temos forma de o aferir. Outra interpretação é que há espectadores
de outros meios e a migração do usufruto de conteúdos de cariz que têm um gosto adquirido pelo visionamento de desenhos anima-
musical para outras plataformas em determinados segmentos da
população, como os públicos juvenis ou os mais escolarizados.
dos que segue as suas dietas mediáticas ao longo da vida, apesar de ser
um tipo de conteúdos conotado com as audiências mais novas.
Grandes Este perfil é o mais representativo dos telespectadores por-
consumidores tugueses e retrata uma maioria de 63% destes. É no habitat
A prática de visionamento da missa ou de programas religiosos,
de ficção intermédio urbano que se apura a maior percentagem de partilhada por 11% dos telespectadores, não foi igualmente incluída
na televisão espectadores com este perfil (67%), e percentagens menores na tipologia por se afastar de outros géneros televisivos, mas apre-
(N=1224) nas zonas urbanas (65%) e sobretudo rurais (60%). Verifica-se
uma maior proporção de telespectadores deste tipo entre sentamos a caracterização dos seus praticantes habituais: são ligeira-
homens (70%) do que mulheres (57%). O peso de consumido- mente mais comuns nos espaços intermédios urbanos e rurais (mas
res de TV com este perfil decresce com a idade: parte dos sem diferenças estatisticamente significativas), entre as mulheres

118 119
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital«pós-radiodifusão»

(verificando-se uma diferença de género acentuada e estatistica- Mas apesar do sucesso adaptativo da rádio, ao contrário da rela-
mente significativa), entre os telespectadores seniores (sendo uma ção da larga maioria dos portugueses com a televisão, somente 40%
prática residual entre os escalões etários mais novos), com qualifica- declaram ouvir rádio diariamente (gráfico 3.1). Se são raros os casos
ções baixas, reformados(as) ou com incapacidade ou domésticos(as) de inquiridos que visionam com pouca ou nenhuma frequência tele-
não remunerados(as), com rendimentos familiares até 500 euros e visão, no caso da rádio mais de um terço dos portugueses (36%)
no fundo pertencendo às classes sociais mais desprivilegiadas. É bas- apontam que nunca ouvem conteúdos radiofónicos. Por outro lado,
tante verosímil que esta caracterização se aproxime muito das carac- ouvir rádio é uma atividade que foi mais recorrente em 2019 em
terísticas mais comuns dos praticantes religiosos em Portugal, no Espanha (num total de 76%) do que em 2020 em Portugal. Con-
seu todo, nomeadamente os católicos. tudo, estas diferenças podem refletir o efeito do atual contexto pan-
démico, como argumentaremos adiante.
Os «ouvintes»4 diários de rádio em Portugal, que podemos ape-
Consumo de rádio num contexto de radiomorfose lidar de grandes ouvintes, têm um perfil bastante diferenciado dos
espectadores diários de televisão. É de notar previamente que as dife-
Do lado da oferta de rádio é indicado que os casos de sucesso renças apontadas quanto à frequência da utilização da rádio entre as
se destacam na articulação entre este clássico meio difusor de categorias das variáveis sociodemográficas e socioeconómicas (e que
­informação e a tendência para uma maior «customização» na abor- permitem traçar o perfil de grandes ouvintes) são todas estatistica-
dagem às audiências com recurso às plataformas digitais. Do lado da mente significativas (p-value ≤ 0,05). Enquanto o visionamento diá-
procura, a tendência identificada em estudos anteriores é para uma rio da televisão é mais transversal do ponto de vista territorial, o peso
maior mobilidade e fragmentação da atenção dos consumidores, bem dos ouvintes diários é maior nos espaços rurais (43%) ou intermé-
como as possibilidades de envolvimento destes na avaliação, seleção, dios urbanos (43%) face ao espaço urbano (37%). Ao contrário da
edição e na própria cocriação de conteúdos, em particular nas pla- televisão, há uma percentagem maior de ouvintes quotidianos entre
taformas digitais onde as estações estão presentes (Vieira, Cardoso os homens (46%) do que mulheres (35%) e vai aumentando com a
e Mendonça 2016). Porém, como vimos no capítulo 2 em relação escolaridade, atingindo o pico entre os portugueses com o ensino
às práticas culturais online de cariz participativo, apenas podemos superior (57%) face a uma minoria que não chega a um terço dos res-
considerar como muito envolvidos uma pequena percentagem de pondentes com menos do que o 3.º ciclo. O uso diário da rádio apa-
utilizadores portugueses da Internet e, em sequência, podemos assu- rece ainda associado aos indivíduos dos escalões etários intermédios,
mir que o mesmo acontece aos ouvintes e seguidores dos conteúdos em idade ativa e ao trabalho remunerado. Além disso, o peso dos
radiofónicos nas redes sociais online. Podemos ainda conjeturar que grandes ouvintes é mais elevado entre os portugueses que usufruem
o consumo diário de rádio faz geralmente parte de uma dieta mediá- rendimentos líquidos familiares maiores que 2700 euros (69%), des-
tica variada uma vez que entre os ouvintes diários uma clara maio- cendo progressivamente até atingir a percentagem mais baixa entre
ria de 80% usa a Internet. Será razoável arrogar que a rádio soube os indivíduos com rendimentos domésticos até 500 euros (26%), e
adaptar-se aos impactos da digitalização de conteúdos e à comuni- entre os gestores (61%), sendo menor entre os trabalhadores dos
cação em rede (Cardoso 2006) e estabelecer sinergias com os usos serviços (30%) e os trabalhadores não qualificados (33%).
das plataformas digitais. Esta realidade de radiomorfose (Vieira et al. É entre os indivíduos com idades compreendidas entre os 35 e
2013b) veio provocar evoluções no conceito tradicional de rádio e 44 anos e os 45 e 54 anos que se encontram as maiores proporções
suavizou a entrada numa lógica mais diretamente concorrencial com de grandes ouvintes, 52% e 51%, respetivamente. Estes são seguidos
os media sociais na atual «economia da atenção», inserindo-a numa
lógica de navegação transmediática (Jenkins et al. 2009) nos consu- 4
Termo que pelas razões adiantadas atrás tem vindo a perder a sua conotação
mos informativos e de entretenimento. literal e que é aqui usado essencialmente como convenção.

120 121
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital«pós-radiodifusão»

pelos inquiridos dos 25 aos 34 anos, que apresentam uma proporção e converteram no seu quotidiano com a entrada na idade ativa e no
de 48% de uso quotidiano da rádio. Curiosamente, é entre os portu- mercado de trabalho. Seja com os seus usos estruturais no ambiente
gueses mais velhos (65 ou mais anos) e os mais novos (15 aos 24 anos) e no fluxo do quotidiano e relacionais, temos proporções apreciá-
que se encontram as menores percentagens de ouvintes diários, 26% veis de portugueses, em particular nas classes sociais relacionadas
e 30%, respetivamente. Não podemos aqui destrinçar de forma clara ao trabalho qualificado e às profissões de gabinete, que apropriaram
a natureza dos efeitos da variável idade, isto é, se estamos perante a rádio, sobretudo nas deslocações para o local de trabalho, entre
diferenças de ciclo de vida ou geracionais quanto às modalidades de outras situações que se coadunam com a conformidade à pré-defini-
domesticação da rádio. Porém, podemos argumentar que os dados ção musical e com o consumo de programas de rádio em movimento
sugerem que esta domesticação segue, em larga medida, efeitos de e/ou em regime de multitarefa.
ciclo de vida, uma vez que a utilização quotidiana da rádio exprime Estudos anteriores apontam que as gerações mais velhas man-
uma clara clivagem entre, por um lado, os portugueses em idade ativa têm uma relação mais próxima com a rádio, com a sua pré-definição
e inseridos no mercado de trabalho (com 52% de grandes ouvintes), musical (Cardoso, Espanha e Lapa 2009). No entanto, os nossos
e, por outro, os indivíduos pertencentes às outras categorias relati- dados sugerem que, pelo menos atualmente, uma parte substancial
vas à situação perante o trabalho – estudante, desempregado, refor- dos seniores, socializados numa ecologia mediática marcada pelos
mado(a) ou com incapacidade e doméstico(a) não remunerado(a) meios de massa, des-domesticam eventualmente a rádio com a saída
–, que apresentam proporções de consumidores quotidianos entre do mercado de trabalho e o eventual menor uso do automóvel, fal-
vinte e trinta pontos percentuais menores. tando ainda saber se a favor de outras atividades e meios, tradicionais
Nesta senda, é ainda de relevar que uma parte substancial dos como a televisão ou novos como as plataformas digitais.
grandes ouvintes eram as crianças e adolescentes que Prensky (2001) Contrariando, mais uma vez, os padrões de utilização identifica-
apelidava de «nativos digitais» há 20 anos. Por um lado, é assumido dos para a televisão, na rádio a tendência inverte-se quanto ao tempo
que os novos media, em detrimento dos meios tradicionais, seriam e despendido na sua utilização: os respondentes passam, em média,
são centrais no contexto de socialização dos «nativos digitais», por menos horas a ouvir rádio durante o fim de semana (2) do que num
outro, em Cardoso, Espanha e Lapa (2009), é indicado que os ado- típico dia de semana (3) (gráfico 3.2), o que se consubstancia com a
lescentes conferem tendencialmente maior valor à audição de música associação tendencial entre consumo de rádio e a situação de traba-
gravada em suporte físico (embora o seu consumo tenha perdido lhador. Claramente, é no carro que uma maior proporção de ouvin-
progressivamente expressividade em detrimento das compras e con- tes escuta rádio (66%), o que salienta o carácter deste meio marcado
sumos digitais), bem como ao visionamento de canais televisivos de por usos estruturais de ambiente, o movimento e a multitarefa, em
música e à troca e audição de ficheiros com conteúdos fonográficos comparação com 40% que ouvem em casa (tabela 3.3). O local de
no computador ou num leitor portátil, em detrimento da audição trabalho é o espaço habitual de audição para 12% dos respondentes
pré-definida de rádio. que escutam rádio (valor que aumenta para 16% entre os grandes
Como apontam os nossos dados, é claramente entre os jovens ouvintes e 18% entre os inquiridos dos 35 aos 44 anos e entre aqueles
portugueses dos 15 aos 24 anos que há uma maior proporção (39%) com a situação de trabalhadores). Apenas uma escassa minoria de
daqueles que ouvem música a partir da Internet (através de qualquer ouvintes refere a rua e os parques públicos ou os transportes públi-
serviço de streaming como o Spotify) diariamente, decaindo clara- cos como locais habituais de audição de rádio. Podemos ainda iden-
mente nas categorias etárias seguintes, atingindo o mínimo entre os tificar padrões de usufruto rotinizado da rádio consoante os escalões
indivíduos com 65 ou mais anos (5%). Em sequência e perante a dis- etários, provavelmente refletindo o retrato quotidiano da distribui-
tribuição etária dos grandes ouvintes, podemos assumir que, com as ção geográfica de indivíduos de diferentes coortes. A domesticação
mudanças do ciclo de vida, muitos «nativos digitais» domesticaram da rádio no automóvel tem ainda maior expressão nos ouvintes com
o meio tradicional ou clássico da rádio, o apropriaram, incorporaram idades compreendidas entre os 25 e os 44 anos de idade (80%), a

122 123
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital«pós-radiodifusão»

audição habitual em casa tem maior prevalência entre os consumido- 24 anos que usa o telemóvel como um dos principais meios de audi-
res de rádio seniores (74%) e o uso da rádio nos espaços públicos é ção de rádio (25%). Ademais, também se verificam percentagens
mais prevalecente nos ouvintes mais novos. superiores de indivíduos que usam a conexão online do computador
ou tablet como meio principal para ouvir rádio entre os escalões até
aos 44 anos.
Tabela 3.3 – Local habitual de audição de rádio, por idade, total (%) Com a preponderância da utilização do rádio do carro como
principal dispositivo de audição, importará equacionar ainda, em
pesquisas futuras, como a rádio e a sua domesticação irá adaptar-se
à própria evolução tecnológica do carro e à sua integração nas redes
digitais e na Internet das coisas (a nidificação dos objetos quotidianos
nos fluxos informacionais das redes). A baixa expressão dos disposi-
tivos móveis como meios principais de audição insinua uma reduzida
(N=1281) taxa de audição de rádio nas redes digitais e que é na utilização destes
dispositivos que se acentua a lógica concorrencial na economia da
atenção com outras modalidades de usufruto de conteúdos audiovi-
Concomitantemente, entre os ouvintes de rádio 66% usam o suais. É no uso dos meios digitais que se sentem os maiores impactos
rádio do carro como dispositivo principal, acima da proporção de concorrenciais do lançamento de novas tecnologias de difusão, em
respondentes que aponta o aparelho de rádio tradicional como um que a rádio tradicional concorre com formatos como o podcast, que
dos seus principais meios de audição (41%), e bem acima da fração surgiu como uma nova maneira de distribuir material radiofónico
que indica o telemóvel (8%) ou o computador ou tablet (4%) como sob demanda, entre outros conteúdos audíveis relacionados dispo-
principais meios de audição de conteúdos radiofónicos (tabela 3.4). nibilizados online (Pérez 2012). Seja como for, em Portugal, a rádio
Estes dados não diferem muito entre os grandes ouvintes. Porém, online, independentemente de esta ser o principal meio de usufruto
também neste item há uma clara estruturação por idade do tipo de de conteúdos radiofónicos ou não, tem ganho terreno, sendo que a
dispositivos utilizados para a audição de rádio: as maiores proporções sua taxa de penetração na população portuguesa era de 3% em 2008 e
de utilização do aparelho tradicional de rádio aparecem nos seniores 7% em 2010 (Vieira et al. 2013b) e estudos mais recentes (Marktest,
(73%), a taxa de utilização do rádio do carro atinge o pico na genera- Bareme Rádio 2020) assinalam um acréscimo claro do consumo de
lidade dos escalões correspondentes à idade ativa (geralmente acima rádio pela Internet em Portugal nos últimos anos, pouco acima dos
dos 70%) e há claramente uma maior proporção de jovens dos 15 aos 20% em 2019 e 33% no segundo semestre de 2020, porventura por
efeito do confinamento. Tais dados confluem com o que também
aconteceu em Espanha no mesmo período (Blasco, Castella e Raso
Tabela 3.4 – Principais dispositivos onde se ouve rádio (%) 2020). Segundo a pesquisa da Marktest, Bareme Rádio (2020) são
os jovens portugueses dos 25 aos 34 anos que possuem maior afi-
nidade com ouvir rádio online, comum a cerca de 57% deles, o que
é coerente com o maior uso da rádio nos dispositivos digitais por
parte dos mais novos, apurado pelos nossos dados. Os valores decli-
nam marcadamente com o aumento da idade, para um mínimo de 5%
junto dos seniores com 65 ou mais anos.
Do total de ouvintes, 59% mostram preferência por programas
(N=1281) noticiosos e de informação e 50% pela audição de música popular,

124 125
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

com preferência menor por outros programas de música (36%), Quadro 3.2 – Caracterização sociodemográfica e socioeconómica
e tertúlias (ex. Manhãs da Comercial, Café da Manhã, etc.) (28%) dos perfis relativos aos consumos radiofónicos
(tabela 3.5). Uma minoria escuta habitualmente programas de des-
porto (17%), de entretenimento (16%) ou ouve música clássica na Perfis Caracterização
rádio (12%). Afere-se ainda uma incidência muito baixa de progra-
mas com entrevistas, performances, etc. (7%) e outros programas Consumidores Este perfil representa uma minoria de 6% dos ouvintes portugue-
radiofónicos ses. É nos habitats intermédio urbano (6%) e rural (6%) que
culturais (6%), da escuta de missas ou outros programas religio- de cultura se verificam as maiores percentagens de ouvintes portugueses
sos (4%) e de programas relacionados com livros e leitura (2%). «cultivada» com este perfil, e observando-se a menor proporção no habitat
(N=72) urbano (5%). É de ressalvar, contudo, que as diferenças não são
Saliente-se que, em comparação com a televisão, o consumo de
estatisticamente significativas, mas, como referenciado em rela-
notícias e informação mantém a sua importância e os programas de ção às práticas culturais online no capítulo 2, estes dados podem
música ganham relevo. indicar que um maior afastamento de centros que concentram
eventos e equipamentos culturais poderá propiciar a procura
No que concerne os consumos radiofónicos procedemos à cons- de conteúdos culturais em meios alternativos numa lógica de
trução de uma tipologia de ouvintes portugueses (baseada numa suprimento de carências desse cariz. As diferenças quanto ao
técnica estatística de redução de dados) e respetiva caracterização peso dos ouvintes de cultura «cultivada» também não são esta-
tisticamente significativas na variável sexo/género, assim como
sociodemográfica e socioeconómica (quadro 3.2). A construção des- na variável idade. Seja como for, comparando escalões etários,
ta tipologia e a descrição de cada perfil que a compõe teve por base observa-se um maior peso dos que procuram programas radio-
a construção de índices relativos a géneros de conteúdos (de cul- fónicos de cultura «cultivada» entre os ouvintes dos 15 aos 24
anos (8%) e dos 55 aos 64 anos (7%), face a 4% nos ouvintes
tura «cultivada»; de informação e desporto; entretenimento; música com 65 ou mais anos. A idade média dos indivíduos deste perfil é
popular), caracterizando os ouvintes com pelo menos um valor de de cerca de 47 anos. As diferenças entre categorias relativas ao
0,5 em cada índice, o que equivale à presença de pelo menos metade grau de instrução e relativas à classe social são as únicas esta-
tisticamente significativas com uma maior probabilidade de este
das práticas radiofónicas que compõem o índice. Como o último tipo de ouvintes ter atingido o ensino superior (10%) do que
perfil só é composto por um tipo de consumo (‘audição de progra- graus de instrução mais baixos – secundária (5%), 3.º ciclo (4%)
mas de música popular’) fez-se a caracterização dos ouvintes que e menos do que o 3.º ciclo (4%), e de pertencerem a classes
sociais pautadas por um maior volume de capital cultural
como os quadros superiores dos serviços (11%) ou os técni-
cos e especialistas (11%) e os profissionais socioculturais
(14%). Também se afere uma maior probabilidade de fruírem
Tabela 3.5 – Programas de rádio habitualmente seguidos (%) de mais de 2700 euros de rendimento familiar (9%), estando
menos representados nos ouvintes com rendimentos entre mais
de 500 e 800 euros (2%). Mas também aqui as diferenças não
são estatisticamente significativas.

Ouvintes Este perfil é o mais representativo dos utilizadores de rádio em


de conteúdos Portugal e retrata uma maioria de 63% dos ouvintes portugue-
informativos ses. Verificam-se maiores probabilidades de os consumos infor-
e relativos mativos e relativos ao desporto serem mais prevalecentes no
ao desporto espaço urbano (65%), embora não haja grandes discrepâncias
(N=808) entre habitats, o que é secundado pela ausência de diferenças
estatisticamente significativas. Constata-se uma maior propor-
ção de ouvintes deste tipo entre homens (70%) do que mulhe-
res (55%) e entre indivíduos a partir dos 35 anos, com o pico
nos ouvintes entre os 45 e 54 anos (70%) e a proporção mais
baixa entre os jovens dos 15 aos 24 anos (41%). Trata-se de um
grupo caracterizado por uma idade média de cerca de 49 anos.
(N=1281)

126 127
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

Perfis Caracterização Perfis Caracterização

No entanto, as diferenças entre categorias relativas ao grau com 65 ou mais anos estão aqui representados. A média etária
de instrução quanto ao peso deste tipo de ouvintes não são dos apreciadores de música popular na rádio é de cerca de
estatisticamente significativas, sendo, portanto, transversal no 50 anos. É igualmente um perfil com maior expressão entre
que respeita à escolaridade. O mesmo pode ser dito em relação os inquiridos com graus de instrução mais baixos. O seu
aos rendimentos, embora haja um maior peso deste perfil entre peso vai decrescendo com o aumento da escolaridade. Entre
os ouvintes com rendimentos familiares iguais ou inferiores os ouvintes com menos do que o 3.º ciclo, 63% pertencem
a 1500 euros. Quanto à situação perante o trabalho já temos a este perfil face a 37% dos ouvintes com o ensino superior.
diferenças estatisticamente significativas e é entre os traba- É igualmente um perfil que pauta os hábitos radiofónicos de
lhadores (66%), seguidos dos ouvintes reformados ou com ouvintes com rendimentos familiares mais baixos (temos
incapacidade (65%) e dos desempregados (60%), que temos as 64% de apreciadores de música popular entre os ouvintes
maiores percentagens de consumidores radiofónicos de notícias, com menos de 500 euros de rendimento familiar em contraste
informação e conteúdos audíveis relativos ao desporto, em con- com 12% daqueles com rendimentos acima dos 2700 euros),
traste com 28% dos estudantes. Também se observa uma maior operários (60%), em trabalhos não qualificados (65%) ou em
probabilidade de serem trabalhadores dos serviços (indepen- circunstâncias de desocupação quanto à sua situação perante o
dentemente de serem quadros superiores ou não), pequenos trabalho – desemprego, reforma ou com incapacidade, e com
empresários e de terem profissões qualificadas como técni- a condição de doméstico(a) não remunerado(a). Entre estes,
cos e especialistas, gestores ou profissionais socioculturais. verifica-se perto de 60% de apreciadores de música popular na
rádio. Refira-se ainda que metade destes nunca ou raramente
Fãs de O grupo dos fãs de entretenimento radiofónico engloba cerca ouvem música a partir da Internet. Isto poderá querer dizer que
entretenimento de 38% de ouvintes. É no habitat urbano que se apura a maior temos uma divisão neste perfil entre aqueles cuja proximidade
radiofónico percentagem de utilizadores de rádio com este perfil (41%), e com a música popular é efetivada essencialmente através dos
(N=484) percentagens menores nos espaços intermédio urbano (36%) e meios tradicionais e a parte composta por aqueles que terão um
rural (35%). Porém, estas diferenças não são estatisticamente perfil transmediático e omnívoro, entre a autoprogramação e a
significativas, assim como a diferença entre homens e mulheres. pré-definição, nos consumos musicais.
Já entre escalões etários as diferenças são significativas do
ponto de vista estatístico, sendo o peso daqueles que procuram
entretenimento radiofónico maior entre os ouvintes dos 25 aos 34
anos e menor nos seniores (22%). A idade média dos ouvintes
que compõem este conjunto é a mais baixa entre os perfis de
apresentam essa prática. É ainda de notar que na análise estatística a
consumos radiofónicos, sendo cerca de 44 anos. Observa-se audição de música popular aparece negativamente associada à audi-
uma maior possibilidade de estes buscadores de entretenimento ção de outros programas de música e desassociada da música clás-
radiofónico terem atingido o ensino superior (49%) do que
graus de instrução mais baixos, em particular menos do que
sica. Ao invés do que acontece com a televisão, entre os consumos
o 3.º ciclo (26%), e de usufruírem de mais de 2700 euros de radiofónicos surge uma distinção entre a música relacionada com a
rendimento familiar (52%), com o peso deste perfil a decrescer cultura popular e a música clássica que aparece no campo da cultura
gradualmente com os rendimentos. Curiosamente, o peso destes
consumidores é simultaneamente maior entre as audiências
«cultivada».
trabalhadoras (45%) e domésticas sem remuneração (46%), Ao contrário da televisão, onde os consumos de programas
e menos de metade destas proporções entre os estudantes e audiovisuais de música aparecem associados uns aos outros, na rádio
reformados. Averiguam-se igualmente maiores proporções des-
tes diletantes do entretenimento radiofónico entre os pequenos os consumos musicais diferenciam-se, pautados por distinções etá-
empresários, quadros superiores dos serviços, empregados rias, de classe social e pelo volume de capital económico e cultu-
de escritório e profissionais socioculturais. ral dos ouvintes. É nos ouvintes mais velhos e das classes populares
Apreciadores Há 50% de ouvintes que apreciam música popular na rádio. que encontramos os maiores fãs de música popular, o que faz jus à
de música Verificam-se as maiores percentagens deste tipo de ouvintes no designação. Quanto à construção dos restantes índices: o ‘consumo
popular na rádio habitat rural (53%), com maior representação entre as mulheres
(N=641) (52%) do que entre homens (49%). Os ouvintes deste perfil são radiofónico de cultura «cultivada»’ engloba a audição de música clás-
tendencialmente mais velhos: 59% dos ouvintes portugueses sica, programas relacionados com livros e leitura, outros programas
culturais e programas com entrevistas, performances, etc.; a ‘audição

128 129
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

de conteúdos informativos e relativos ao desporto’ abrange o con- quando, por exemplo, ocorrem mudanças relativas ao ciclo de vida
sumo de notícias e informação e de programas relativos ao desporto dos indivíduos (sair de casa dos pais, casar, ter filhos, entrar no mer-
(relatos de futebol, notícias, debates); e o ‘consumo de entreteni- cado de trabalho, etc.), acontecimentos drásticos ou situações crí-
mento radiofónico’ é composto pela audição de tertúlias (ex. Manhãs ticas, ao nível pessoal ou societal, como é o caso da pandemia, com
da Comercial, Café da Manhã, etc.) e de outros programas de entre- efeitos disruptivos no quotidiano e nas suas rotinas. Recorde-se que
tenimento. o conceito de domesticação tem uma dimensão praxiológica que se
A prática minoritária de audição habitual de programas religio- refere ao modo como um determinado meio se imiscui nas práti-
sos não se encontra associada a outros hábitos radiofónicos e não cas e rotinas quotidianas, até que essa utilização mediática se torne
foi incluída na tipologia, mas, fazendo a sua caracterização, esta é um dado adquirido. Para colmatar esta limitação, Sørensen (1994)
essencialmente decalcada do que ocorre com os programas religio- avança com as propostas conceptuais de «re-domesticação» e «des-
sos televisivos: são uma audiência dos espaços intermédios urbanos domesticação» que aqui mobilizamos na análise das mudanças de
e rurais, muito feminizada, envelhecida, com baixas qualificações e hábitos no uso da televisão e da rádio nos períodos de confinamento.
rendimentos até 500 euros, reformada ou com incapacidade ou com Como é indicado por outros estudos que incidem sobre os efei-
a situação de doméstica não remunerada. Entre os ouvintes cren- tos da pandemia nos consumos mediáticos em Portugal e em Espa-
tes, cerca de dois terços também seguem programas religiosos na nha (Cardoso e Baldi 2020; Blasco, Castella e Raso 2020), as práticas
televisão. Nos casos em que a prática religiosa mediatizada seguir ou dietas de media mudaram, independentemente do grau de conec-
ainda outros meios poderemos falar de um culto transmediático. Na tividade do tipo de media. Relativamente a Portugal, a visualização
generalidade, e no nosso entender, a relação com a rádio e consumos de televisão registou aumentos assinaláveis durante o confinamento,
associados descrita na tipologia em baixo espelha bem as clivagens em particular entre os consumidores mais jovens, enquanto a utili-
sociais quanto a volumes de capital (económico e cultural) e a forma zação tradicional de rádio foi particularmente afetada pela negativa
como se manifestam nos consumos audiovisuais e culturais. (Cardoso e Baldi 2020). Quanto a Espanha (Blasco, Castella e Raso
2020), é igualmente indicado que a televisão recuperou a audiência
dos segmentos mais jovens que parecia ter perdido em favor dos
Confinamento e mudanças de hábitos no uso da televisão meios digitais e que o consumo de rádio não se destacou face à proe-
e da rádio minência de outros meios. No fundo indiciam um processo de re-
domesticação da televisão entre os consumidores mais jovens.
Muitos cidadãos confinados encontraram-se numa situação mar- Em consonância com o estudo de Cardoso e Baldi (2020), os
cada pelo tempo disponível em casa para se informarem e se entre- nossos dados indicam que os consumos televisivos aumentaram em
terem. Daí o particular interesse em indagar sobre as mudanças Portugal durante a pandemia e, porventura com o teletrabalho e o
produzidas pela pandemia nos hábitos de domesticação mediática menor uso do carro, os de rádio diminuíram (gráfico 3.4): 23% dos
adquiridos durante os períodos de confinamento e detetar tendên- inquiridos apontam que passaram a ver mais TV, comparando com
cias, novos interesses e distribuições de tempo para ver ou ouvir, rea- 5% que assinalam um acréscimo no uso da rádio no mesmo período.
lizando uma comparação entre segmentos da população portuguesa. Apenas 1% declara que deixou de usar ou não usou televisão, mas
Se, por um lado, o contexto de confinamento veio devolver ao espaço 17% indicam que deixaram de usar ou não usaram a rádio. Estes
doméstico a centralidade nos processos de domesticação mediática, dados sugerem um claro pendor para processos de re-domesticação
por outro, evidencia uma limitação respeitante ao carácter algo linear na utilização da televisão durante o confinamento, incluindo even-
e estanque com que usualmente se encara na literatura esses pro- tualmente audiências pouco dadas a despender tempo a ver televisão
cessos. Sørensen (1994) reconhece que os usos mediáticos também antes da pandemia, com potenciais impactos, que não conseguimos
podem sofrer mudanças dramáticas após a conversão ser alcançada, aqui apurar, nas várias rotinas, tipos de uso e gratificações individuais

130 131
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

e familiares. Por outro lado, para uma parte dos inquiridos, a rádio Gráfico 3.5 – Confinamento e mudanças de hábitos no uso da televisão
deixou de marcar o fluxo do quotidiano pelo que podemos falar de e da rádio, por características sociodemográficas (%)
uma des-domesticação nesses casos.
Estes movimentos de re-domesticação e des-domesticação não
terão ocorrido uniformemente entre a população portuguesa. Há
maiores proporções de indivíduos mais novos e dos contextos
urbano e intermédio urbano que passaram a usar mais a televisão
(gráfico 3.5). Também entre os indivíduos que declaram um ren-
dimento familiar de mais de 1500 a 1800 euros e de mais de 1800
a 2700 euros verificam-se das maiores proporções de respondentes
que apontam um acréscimo no uso da TV. Pelo contrário, é entre os
segmentos da população que já utilizavam de forma mais intensa a
televisão (indivíduos mais velhos, menos escolarizados e dos meios
rurais) que temos menores frações de respondentes a indicarem o
aumento do uso da televisão. É, portanto, entre esses segmentos que
se verifica um «ceiling effect», ou seja, como o visionamento da tele-
visão já é tão elevado é aí que as modalidades de domesticação da
televisão sofreram menos mudanças.
Infelizmente, o nosso estudo não nos permite vislumbrar de
forma clara os processos de des-domesticação da rádio por razões
metodológicas, uma vez que a categoria ‘deixou de usar/não usou’

(N=1999; N=2000, respetivamente)


Gráfico 3.4 – Confinamento e mudanças de hábitos no uso da televisão
e da rádio, total (%)

não permite destrinçar as situações de des-domesticação das de não


domesticação. Todavia, dada a centralidade do automóvel no uso da
rádio, e uma domesticação mais pronunciada deste meio entre os
indivíduos em idade ativa e inseridos no mercado de trabalho, pode-
mos assumir com alguma segurança que foi entre estes que os pro-
cessos de des-domesticação da rádio foram mais acentuados. Outra
limitação dos nossos dados quanto à domesticação dos artefactos
mediáticos durante a pandemia é que eles incidem numa dimensão da
domesticação da televisão e da rádio, isto é, a intensidade do seu uso,
e não contemplam a domesticação de conteúdos com reflexos nas
dietas de consumo mediático. Mesmo que a domesticação se tenha
mantido para muitos em termos de intensidade ou frequência de uso,
(N=1999; N=2000, respetivamente) a pandemia pode ter trazido mudanças quanto à des-domesticação

132 133
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

ou re-domesticação de tipos de conteúdo (informação, entreteni- ainda a robustez da centralidade da televisão nas dietas mediáticas da
mento, cultura), trazendo a proeminência de uns nas dietas de media generalidade dos portugueses num contexto de uma «economia da
em detrimento de outros, em particular num contexto de avidez atenção» povoada por possibilidades multimediáticas. Esta robustez
informativa quanto às questões de saúde pública. observa-se não só na domesticação do aparelho e da sua presença no
É, no entanto, de relevar que, mesmo num contexto de elevada quotidiano, mas igualmente na popularidade dos consumos televi-
concorrência entre meios e plataformas, a televisão reforçou com sivos de informação e ficção. Inspirando-nos em Webster (2005),
a pandemia a sua centralidade nas práticas de consumo mediático. podemos evocar a imagem de que as audiências se tornaram omnívo-
Como indicam Cardoso e Baldi (2020), cerca de 20% dos portugue- ras quanto às suas dietas mediáticas, deambulando entre conteúdos
ses subscreveram algum serviço de informação ou entretenimento de nicho e outros bastante populares. A perspetiva de uma total indi-
online de que não dispunham antes do atual contexto pandémico, vidualização dos usos e dietas mediáticas é igualmente contrariada
sendo de destacar a elevada taxa de retenção destes produtos, já por domesticações diferenciadas, mas estruturadas, dadas as tendên-
que 84,4% dos que subscreveram aquele tipo de serviços indicam cias sociais identificáveis nos consumos dos meios tradicionais por
que não irão cancelar a generalidade destes novos vínculos. Como idade, sexo/género, grau de instrução, rendimento e classe social.
sugerido pelo estudo de Blasco, Castella e Raso (2020), uma possí- No que respeita a diferenças etárias, Cardoso, Espanha e Lapa
vel explicação, entre outras, é o entendimento que a população tem (2009) assinalam que a importância subjetiva que as audiências mais
da televisão como a fonte informativa mais credível, em particular, novas atribuem à televisão tem decrescido, em particular face a
num quadro de «infodemia», declarada pela Organização Mundial outros media como a Internet ou o telemóvel. Neste sentido, os nos-
da Saúde e paralela à pandemia (Eysenbach 2020), em que sobres- sos dados apontam para uma diminuição do tempo de visionamento
sai a sobrecarga informativa e a elevada circulação de desinformação de televisão de quem utiliza a Internet, quer durante a semana, quer
relativa à Covid-19 e à gestão da saúde pública em vários canais e ao fim de semana (comprovado por diferenças estatisticamente sig-
plataformas digitais. Entre os mais novos, a telescola, entre outros nificativas entre utilizadores e não utilizadores da Internet). Ora,
conteúdos televisivos de cariz educativo, também é um fator de re- isto indicia que as experiências comunicativas proporcionadas pelas
domesticação da televisão a considerar. plataformas digitais estão a ocupar o espaço da televisão nos univer-
sos simbólicos partilhados de muitos consumidores, em particular
os mais novos. Mas, ao invés de questionarmos o posicionamento da
Síntese conclusiva televisão como elemento central quer do sistema dos media, quer da
cultura dominante nas sociedades contemporâneas, há outra forma
À medida que mais ofertas são apresentadas nas redes de banda de interpretar as atuais tendências de valorização da televisão em
larga e mais opções on-demand e de streaming estão disponíveis, os determinados segmentos da população. Segundo Jenkins (2006),
padrões de consumo audiovisual tornam-se mais amplamente distri- as audiências hodiernas guiam-se mais por interesses específicos
buídos (Webster e Ksiazek 2012). Se, por um lado, são comemoradas que consomem agnosticamente numa rede transmediática, na qual
essas mudanças como um sinal de um mercado ágil e de uma esfera a televisão é um elemento muito importante, mas entre outros. Se
pública robusta (Benkler 2006), outros autores equacionam a seg- as audiências tiverem interesse pelo consumo de formas simbólicas
mentação das audiências com o fim de um fórum cultural comum referentes a celebridades, ligadas a um imaginário ou interesse espe-
e com a própria fragmentação social (Katz 1996). No entanto, para cífico, irão mobilizar a capacidade de acompanhar e participar no
Portugal, os nossos dados parecem secundar o que Webster e Ksiazek fluxo de estórias e informação respeitantes a essas formas simbólicas
(2012) indicam para a realidade norte-americana, as ofertas popula- através de várias modalidades mediáticas.
res continuam a dominar o mercado mediático, apesar das evidências Mas se ainda podemos falar da televisão como meio de consumo
de maior fragmentação das audiências face ao passado. Confirmam de massas transversal à população, olhando para o panorama da

134 135
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

sua domesticação em termos de programas e géneros televisivos, a entrada no mercado de trabalho. Inversamente, com a saída do
verificamos clivagens populacionais assinaláveis comandadas pelos mercado de trabalho, muitos seniores poderão ter des-domesticado
fatores sinalizados atrás e onde operam os volumes de capital econó- a rádio a favor de outras práticas, mediatizadas ou não. Tal comple-
mico e cultural dos indivíduos. Em termos de caminhos de pesquisa xifica a equação, apresentada muitas vezes de maneira simplista e
podemos seguir as propostas de Vieira et al. (2013a) para interligar essencialista, que normalmente associa os consumidores mais novos
um conjunto de eixos analíticos com as reconfigurações nas moda- às novas tecnologias da informação e comunicação e as audiências
lidades de domesticação da experiência televisiva. Neste sentido, mais velhas aos meios tradicionais. Contudo, também se pode argu-
análises futuras podem tentar perceber a associação entre as novas mentar que a rádio de muitos «nativos digitais» hodiernos, com ida-
práticas de consumo audiovisual nas audiências e as estruturas de des entre os 15 e os 24 anos, é a que ouvem no telemóvel, visto que
negócio preexistentes. Analisar a capacidade dos participantes de 25% daqueles indicam que este dispositivo móvel é o principal meio
influenciarem e moldarem a experiência televisiva, seja em termos em que consomem conteúdos radiofónicos, o que demarca esta
de inovação tecnológica, criação e partilha de conteúdos e criação coorte das demais. Além disso, apesar da popularidade transversal
de novos usos. Compreender até que ponto as audiências pensam a das notícias e da informação nos meios tradicionais, podemos vis-
experiência televisiva (ou radiofónica) em função das possibilidades lumbrar uma certa especialização de meios face a conteúdos, com a
da navegação transmediática, movendo-se pelas diversas platafor- ficção a dominar a televisão, e a música a dominar a rádio, a seguir à
mas consoante as suas disposições e interesses. E perceber até que informação e ultrapassando em ambos os casos outras propostas de
ponto podemos identificar, nos quadros quotidianos das audiências, entretenimento, mesmo num contexto de franco crescimento das
a emergência de três perfis-tipo de audiências de televisão, para além subscrições das plataformas de streaming em Portugal (Cardoso e
dos perfis tradicionais (Vieira et al. 2013): a audiência em rede, que Baldi 2020).
mobiliza as diversas modalidades tecnológicas para aceder às formas Os dados deste capítulo apontam ainda para a resiliência da
simbólicas; a audiência-participante, que interage, recria e adapta domesticação dos meios tradicionais durante os confinamentos
experiências televisivas nos canais personalizados dos serviços e das desencadeados pela pandemia de Covid-19. Porém, os movimentos
plataformas digitais; e o editor-espectador, que utiliza ativamente os de domesticação não ocorreram uniformemente entre a população
novos media para conceber uma dieta audiovisual individualizada e portuguesa e entre meios. A televisão ganhou mais com o contexto
personalizada. pandémico do que a rádio, mesmo num contexto multimediático
Averiguam-se perfis diferenciados entre o telespectador diário, e de maior uso das plataformas digitais, que constituem também
mais representado entre as mulheres, nos seniores, entre os menos fontes de (des)informação. Foi entre as audiências mais jovens e
escolarizados, com menores rendimentos familiares e aqueles que dos contextos urbano e intermédio urbano que o uso da televisão
estão fora do mercado de trabalho, e o grande ouvinte típico, com aumentou em maior proporção durante o primeiro confinamento.
maior representação entre os homens, os habitantes dos espaços A proeminência dos consumos noticiosos e informativos de teles-
rurais ou intermédios urbanos, os mais escolarizados, com maio- pectadores e ouvintes revela não só a centralidade dos meios tradi-
res rendimentos familiares e entre os indivíduos em idade ativa. É cionais como fontes de informação como também a confiança neles
defendido, aliás, que os resultados deste estudo suportam a noção depositada. Segundo Rodero (2020), estes meios são geralmente
de que há efeitos de ciclo de vida nas modalidades de domestica- considerados pela população como as fontes de informação mais
ção da rádio, sendo que a utilização quotidiana deste meio aparece credíveis ​​e as redes sociais online as menos confiáveis, apesar do seu
associada à existência de atividade laboral e de deslocações de auto- uso crescente e contínuo nos últimos anos. O aumento de notícias
móvel. Muitos daqueles que poderiam ser apelidados «nativos digi- falsas e de rumores na Internet pode ser um dos principais moti-
tais» há dez ou vinte anos (Prensky 2001) são hoje ouvintes diários vos de desconfiança. Estudos anteriores mostram que a exposição
e poderão ter domesticado a rádio (em particular, no carro) com a notícias falsas leva a níveis mais baixos de confiança nos media e

136 137
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

a uma identificação menos precisa de notícias «reais» (Van Duyn e Referências bibliográficas
Collier 2019). Tais fatores podem ter contribuído para processos de
re-domesticação dos meios tradicionais durante os confinamentos Araújo, Vera, Rita Espanha, Susana Santos, Tiago Lapa, e Gustavo Cardoso. 2009.
em alguns setores, assim como a apropriação, entre as audiências «As audiências e as suas dietas». In Da Comunicação de Massa à Comunicação em
mais novas, dos conteúdos educativos incorporados nas grelhas Rede, org. Gustavo Cardoso, Rita Espanha e Vera Araújo. Porto: Porto Editora,
de programação, o que também veio relançar o papel da televisão 145-170.
Barker, Chris. 1999. Television, Globalization and Cultural Identities. Buckingham:
enquanto serviço público de educação. Para além da sua capacidade
Open University Press.
de adaptação a uma ecologia dos media em constante mutação, é nos Bauman, Zygmunt. 2000. Liquid Modernity. Cambridge: Polity Press.
serviços que prestam, no seu reconhecimento e valorização social e Bausinger, Hermann. 1984. «Media, Technology and Everyday Life». Media, Cul-
na confiança que conferem que os meios tradicionais poderão man- ture and Society, 6, n.º 4: 343-352.
ter a sua relevância face à avalanche multimediática. Benkler, Yochai. 2006. The Wealth of Networks: How Social Production Transforms
Markets and Freedom. New Haven, CT: Yale University Press.
Blasco, Mireia Montaña, Candela Ollé Castellà, e Montse Lavilla Raso. 2020.
«Impacto de la pandemia de Covid-19 en el consumo de medios en España».
Revista Latina de Comunicación Social, 78: 155-167.
Bloom, Derek. 2000. «Measuring the Audience to Poster Advertising». Internatio-
nal Journal of Market Research, 42, n.º 4: 1-13.
Bourdieu, Pierre. 2010. A Distinção: Uma Crítica Social da Faculdade do Juízo. Lis-
boa: Edições 70.
Bryce, Jennifer W., e Hope Jensen Leichter. 1983. «The Family and Television:
Forms of Mediation». Journal of Family Issues, 4, n.º 2: 309-328.
Cardoso, Gustavo. 2006. Os Media na Sociedade em Rede. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian.
Cardoso, Gustavo, e Vania Baldi, org. (2020). Pandemia e Consumos Mediáticos.
Lisboa: Obercom.
Cardoso, Gustavo, Rita Espanha, e Tiago Lapa. 2009. Do Quarto de Dormir para o
Mundo: Jovens e Media em Portugal. Lisboa: Âncora Editora.
Colombo, Fausto. 2003. Introduzione allo studio dei media. Roma: Carocci.
Comissão Europeia, Direção-Geral da Comunicação 2020. Media Use in the Euro-
pean Union: Report. Comissão Europeia. Disponível em: https://data.europa.eu/
doi/10.2775/80086
Eysenbach, Gunther. 2020. «How to Fight an Infodemic: The Four Pillars of
Infodemic Management». Journal of Medical Internet Research, 22, n.º 6:
e21820.
Gluck, Marissa, e Meritxell Roca Sales. 2008. The Future of Television: Advertising,
Technology and the Pursuit of Audiences. Los Angeles: USC Annenberg. The
Norman Lear Center.
Haddon, Leslie. 2007. «Roger Silverstone’s Legacies: Domestication». New Media
& Society, 9, n.º 1: 25-32.
Hobson, Dorothy. 1980. «Housewives and the Mass Media». In Culture, Media,
Language, org. Stuart Hall, Dorothy Hobson, Andrew Lowe e Paul Willis. Lon-
dres: Routledge, 105-114.

138 139
Práticas Culturais dos Portugueses A domesticação da televisão e da rádio na era digital« pós-radiodifusão»

Hynes, Deidre, e Els Rommes. 2005. «“Fitting the Internet into our Lives”: IT Pérez, J. Ignacio Gallego (2012). «Podcasting in Spain: A New Business Model or a
Courses for Disadvantaged Users». In Domestication of Media and Technology, Reflection of Traditional Radio?». Radio Journal: International Studies in Broad-
org. Thomas Berker, Maren Hartmann e Yves Punie. Maidenhead: Open Uni- cast & Audio Media, 10, n.º 1: 23-34.
versity Press, 123-144. Prensky, Marc. 2001. «Digital Natives, Digital Immigrants: Part 1». On the Horizon,
Jenkins, Henry. 2006. Convergence Culture: Where Old and New Media Collide. 9, n.º 5: 1-6.
Nova Iorque: New York University Press. Robinson, John, e Geoffrey Godbey. 1997. Time for Life. Pensilvânia: Penn State
Jenkins, Henry, et al. 2009. Confronting the Challenges of Paticipatory Culture. Media Press.
Education for the 21st Century. Cambridge, MA: The John D. and Catherine T. Rodero, Emma. 2020. «La radio: el medio que mejor se comporta en las crisis. Hábi-
MacArthur Foundation e MIT Press. tos de escucha, consumo y percepción de los oyentes de radio durante el confina-
Katz, Elihu. 1996. «And Deliver Us from Segmentation». The Annals of the Ameri- miento por el Covid-19». El Profesional de la Información, 29, n.º 3: 1-15.
can Academy of Political and Social Science, 546: 22-33. Rojek, Chris. 2015. Presumed Intimacy: Parasocial Interaction in Media, Society and
Keller, Paul. 1966. «Patterns of Media Accumulation». Journal of Marketing, 30, n.º Celebrity Culture. Nova Jérsia: John Wiley & Sons.
2: 32-37. Schrøder, Kim Christian. 2019. «Audience Reception Research in a Post-Broadcas-
Lie, Merete, e Knut Sørensen, org. 1996. Making Technologies Our Own? Domesti- ting Digital Age». Television & New Media, 20, n.º 2: 155-169.
cating Technology into Everyday Life. Oslo: Scandinavian University Press. Silverstone, Roger, org. 2005. Media, Technology and Everyday Life in Europe.
Liebes, Tamar, e Elihu Katz. 1990. The Export of Meaning. Cross-Cultural Readings Aldershot: Ashgate.
of Dallas. Nova Iorque: Oxford University. Silverstone, Roger, e Eric Hirsch, org. 1992. Consuming Technologies: Media and
Livingstone, Sonia. 2002. «Part One: The Changing Social Landscape. Introduc- Information in Domestic Spaces. Londres: Routledge.
tion». In Handbook of New Media: Social Shaping and Consequences of ICTs, org. Sørensen, Knut. 1994. «Technology in Use: Two Essays in the Domestication of
Sonia Livingstone and Leah Lievrouw. Londres: Sage. Artefacts». Centre for Technology and Society Working Paper, 2, 94.
Lull, James, e J. Bryant 1990. «‘Families’ Social Uses of Television as Extensions of Sørensen, Knut. 2005. «Domestication: The Enactment of Technology». In Domes-
the Household». In Television and the American Family. Hillsdale, NJ: Lawrence tication of Media and Technologies, org. Thomas Berker, Maren Hartmann e Yves
Erlbaum, 59-72. Punie. Maidenhead: Open University Press, 123-144.
MacKenzie, Donald, e Judy Wajcman, org. 1999. The Social Shaping of Technology. Thompson, Jonh B. 1995. The Media and Modernity: A Social Theory of the Media.
Buckingham: Open University Press. Cambridge: Polity Press e Blackwell.
Marktest, Bareme Rádio. 2020. Consumo de rádio pela Internet continua a aumen- Van Duyn, Emily, e Jessica Collier. 2019. «Priming and Fake News: The Effects
tar. Disponível em https://www.marktest.com/wap/a/n/id~2710.aspx of Elite Discourse on Evaluations of News Media». Mass Communication and
McCracken, Grant. 1990. Culture and Consumption: New Approaches to the Symbo- Society, 22, n.º 1: 29-48.
lic Character of Consumer Goods and Activities. Bloomington: Indiana Univer- Vieira, Jorge, Sandro Mendonça, Tiago Quintanilha, e Gustavo Cardoso. 2013a.
sity Press. «Ecrãs em rede: Televisão, tendências e prospectivas». In A Sociedade dos Ecrãs,
MCUDa (Ministerio de Cultura y Deporte). 2019. Encuesta de Hábitos y org. Gustavo Cardoso. Lisboa: Tinta-da-china, 245-301.
Prácticas Culturales en España 2018-2019. Madrid: Ministerio de Cul- Vieira, Jorge, Sandro Mendonça, Miguel Paisana, e Gustavo Cardoso. 2013b.
tura y Deporte, División de Estadística y Estudios, Secretaría General «Radiomorphosis: Rádio, tendências e prospectivas». In A Sociedade dos Ecrãs,
Técnica. org. Gustavo Cardoso. Lisboa: Tinta-da-china, 303-358.
Meneses, João Paulo. 2009. «Cem anos depois, a rádio muda; acaba?». In Media, Vieira, Jorge, Gustavo Cardoso e Sandro Mendonça 2016. Os Novos Caminhos da
Redes e Comunicação, org. Gustavo Cardoso, Francisco Rui Cádima e Luís Lan- Rádio: Radiomorphosis. Tendências e Prospectivas. Lisboa: OberCom. Disponí-
derset Cardoso. Lisboa: OberCom e Quimera. vel em: https://obercom.pt/wp-content/uploads/2016/06/Os-novos-caminhos-
Metheringham, Richard. 1964. «Measuring the Net Cumulative Coverage of a Print da-radio-Radiomorphosis.pdf
Campaign». Journal of Advertising Research, 4: 23-28. Webster, James G. 2005. «Beneath the Veneer of Fragmentation: Television
Morley, David 1986. Family Television: Cultural Power and Domestic Leisure. Lon- Audience Polarization in a Multichannel World». Journal of Communication, 55,
dres: Comedia. n.º 2: 366-382.
Pereira, Sara. 1998. A Televisão na Família. Processos de Mediação com Crianças Webster, James G., e Thomas B. Ksiazek. 2012. «The Dynamics of Audience Frag-
em Idade Pré-Escolar. Braga: Instituto de Estudos da Criança, Universidade do mentation: Public Attention in an Age of Digital Media». Journal of Communi-
Minho. cation, 62, n.º 1: 39-56.

140 141
Emanuel Cameira

Capítulo 4

A leitura e a frequência de bibliotecas


e arquivos no arranque dos anos 20
do século XXI

A leitura: uma actividade que pode ser um passatempo,


um culto, uma profissão,
um recurso, uma necessidade, uma operação altamente
especializada.
David Mourão-Ferreira

Sendo indesmentível que a capacidade que os indivíduos têm


de «ler o mundo», através da palavra ou da linguagem escrita, muda
o modo como eles próprios vivem (Freire 1989; Zweig 2021), é de
sublinhar que a leitura, enquanto prática multiforme a que os portu-
gueses se podem ou não dedicar, obedece a regularidades sociais que
importa conhecer em profundidade, sem esquecer, por um lado, que
«o desejo de ler provém de uma atitude cultural e de uma tomada
de consciência da importância da leitura, seja para fins profissio-
nais, para o cumprimento de obrigações sociais, seja para a obtenção
de prazer» (UNESCO 1982, 36), mas também, por outro, que «os
hábitos de leitura […] dos indivíduos, não mais que os seus outros
comportamentos sociais, não podem estar separados do contexto
em que têm lugar» (Poulain 2011, 201), nem tão-pouco possuem
uma c­ onfiguração desligada do atual modelo de sociedade (em rede),

143
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

c­aracterizado pela omnipresença e convergência das tecnologias com ­clareza, uma significativa (e analiticamente proveitosa) altera-
digitais – o que, naturalmente, abre espaço para diversas e assina- ção de focagem, deixando de restringir o ato de ler às práticas basea-
láveis transformações, tais como a de, num quadro de exponencial das nos tradicionais suportes impressos (livros, jornais, revistas)
aumento dos textos transmitidos eletronicamente, «tornar viável transmissores dos textos, para fazer justiça a essa ideia propalada por
uma leitura de mobilidade conectada, afastada da clássica visão do inúmeros autores, entre os quais se conta o historiador Roger Char-
homo typographicus» (Cameira e Cardoso 2015, 11). tier, de que «a revolução do texto electrónico será também ela uma
Refira-se, porém, que a abordagem a desenvolver aqui, tendo revolução da leitura, […] mutaç[ão] [que] comand[a], inevitavel-
presente que, dentro da Sociologia da Arte latamente considerada, mente, imperativamente, novas maneiras de ler, novas relações com
é comum situar-se nas últimas três, quatro décadas do século xx a escrita, novas técnicas intelectuais» (Chartier 1997, 142). A uma
o marco a partir do qual se procedeu à progressiva e mais regular perspetiva que tendia a demarcar práticas ledoras e de utilização da
mensuração estatística das práticas culturais, visando quer avanços Internet (desconsiderando o que, no quotidiano, é objeto de leitura
de conhecimento, com base nos preceitos metodológicos das ciên- online através da utilização/domesticação de diversos tipos de ecrãs
cias sociais (Heinich 2002, 71), quer a melhoria dos processos deci- ou gadgets: e-books, textos publicados em blogues ou redes sociais,
sionais (Garzón 1997), designadamente no âmbito da elaboração e em websites noticiosos ou de diferente cariz, etc.), sucedeu pois uma
monitorização de políticas públicas (veja-se, entre outras iniciativas outra, reconceptualizadora, preocupada em não olhar essas duas rea-
merecedoras de destaque, a do Plano Nacional de Leitura, imple- lidades como mutuamente exclusivas – mesmo se, tanto em papel
mentado, em Portugal, desde 2006), a abordagem a desenvolver como digitalmente, «qualquer indivíduo l[ê] muito mais textos do
aqui, dizia-se, segue outra via que não a da perceção estética, isto é, que aqueles que toma por alvo dessa prática» (Cardoso e Cameira
da indagação propriamente qualitativa do ato, performático, de ler 2015, 230) – e, por conseguinte, mais apta para discutir, isto é, de um
(Zumthor 2018), do nível de apropriação da matéria textual (San- modo menos rigidificado (não redutível ao domínio do impresso, do
tos 1992), inscrevendo-se antes numa linhagem de estudos socio- offline), a vitalidade da cultura de leitura1 da sociedade portuguesa,
lógicos de diferente recorte mas de escopo extensivo/quantificador cuja crescente informatização/digitalização condiciona as práticas
(Tengarrinha 1973; Freitas e Santos 1992; Freitas, Casanova e Alves culturais, sempre a ler como algo estruturado pelos processos de
1997; Santos et al. 2007; Cardoso et al., coord., 2015), genericamente socialização e pelos desiguais graus de recursos dos seus protagonis-
orientados para retratar, ao longo do tempo e no que à sociedade tas (Lopes 2016).
portuguesa respeita – marcada por défices educativos e culturais
endémicos (Dionísio 1994) –, a realidade das práticas de leitura da
sua população. Trata-se pois, num novo fôlego, de identificar ten- 1
Em articulação com o conceito classe de leitores, por cultura de leitura entende
a norte-americana Wendy Griswold «um local (uma cidade, uma região, um país),
dências/evoluções, os determinantes sociais da(s) leitura(s), assim
onde a maioria das pessoas, para além das exigências do seu trabalho ou educação,
como perfis de leitores, não abdicando de estabelecer, sempre que leem habitualmente materiais impressos em busca de entretenimento e informação.
oportuno, no decorrer da argumentação, comparações com dados […] Podemos afirmar que existe uma cultura de leitura numa sociedade em que
provenientes de inquéritos internacionais. a taxa de alfabetização seja relativamente elevada, não excluindo qualquer estrato
social. Tal cultura assume a alfabetização como condição para a plena participação
social, vista como um direito; e o analfabetismo como um fracasso pessoal ou sis-
témico. Os meios de comunicação comuns na vida económica, política e comer-
Alargar o corpus analítico da leitura cial ocorrem através da escrita. A existência de uma imprensa popular juntamente
com outras formas massificadas de edição impressa, assim como de publicações
Não será despiciendo recordar que só há menos de uma década um pouco mais específicas e de sistemas eficazes de distribuição, fazem com que
os materiais de leitura estejam amplamente disponíveis. A leitura é uma atividade
os estudos sociológicos sobre a leitura desenvolvidos em Portugal
habitual na vida profissional das pessoas, assim como no seu tempo de lazer» (apud
(nomeadamente, Cardoso et al., coord., 2015) passaram a assumir, Neves 2015, 70-71).

144 145
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

A proeminência da leitura por prazer variáveis, e ­discorrendo, claro, como a certos tipos e intensidades
de leitura correspondem categorias de indivíduos com determina-
Como bem diagnosticou Maria Augusta Babo, «a leitura e a sua das características, comece-se por analisar à lupa os objetivos com
ausência estabelecem o limiar da sociabilização, que, após a alfabe- que os portugueses se envolvem mais frequentemente na atividade
tização, ganhou hoje na (i)literacia o seu novo patamar» (2003, 51). da leitura, e isso independentemente das modalidades do escrito que
Dito de outro modo, tanto a leitura como a escrita se apresentam, privilegiam (livros, jornais, revistas…) e dos formatos (impresso ou
nos tempos que correm, numa era da informação e do conhecimento, digital) onde os textos se fixam.
como dois requisitos decisivos para a plena integração dos indivíduos É desde logo de salientar que uma larga maioria (68%) da popu-
nas mais diversas esferas da vida social. Aliás, nas últimas décadas, lação portuguesa que lê declara ler sobretudo por prazer (gráfico
não só se assistiu, na sociedade portuguesa, a um progressivo alarga- 4.1). Pese embora a enorme latitude semântica da expressão, remete-
mento da escolarização, dotando um contingente populacional cada -se aqui para a leitura que não é meio para a prossecução de qualquer
vez mais amplo das competências necessárias ao exercício da leitura outra tarefa, que não é, portanto, instrumental (Lopes e Antunes
e da escrita (Freitas, Casanova e Alves 1997, 25-26), «como são tam- 2001, 21), estando o leitor estritamente voltado para usufruir do
bém cada vez mais as ocasiões, os contextos e os domínios, assim prazer que a linguagem escrita proporciona. Seguem-se, mas bas-
como os suportes, que apelam à sua utilização» (Ávila 2008, 74). tante distanciadas percentualmente, as leituras levadas a cabo para
Não obstante, o facto de a leitura se apresentar enquanto ato fins escolares/académicos (14% dos portugueses leem sobretudo
polimórfico (o adjetivo é de Jean-Claude Passeron – 1986) difi- com esse propósito) e as que se destinam ao exercício da profissão
culta, em termos analíticos, a apreensão de todas as suas variantes (assinaladas por 8% dos inquiridos). Apenas 4% dos portugueses
específicas, na medida em que se está perante uma prática que pode avançam como principal objetivo para a leitura a necessidade de se
ter lugar nos tempos de trabalho e de lazer, e revestir-se ora de um manterem atualizados sobre os acontecimentos do presente.
carácter cultivado/erudito (distintivo ou legítimo, consoante o apport Registe-se igualmente que a leitura por prazer tem primazia
teórico que se entenda invocar), ora de uma feição mais banal ou independentemente do grau de escolaridade completado ou fre-
corrente, associável a todo um conjunto de ações quotidianas, utili- quentado (gráfico 4.2). Nota-se, aliás, que é entre os indivíduos com
tárias (comunicar, divertir-se, documentar-se… – cf. Baudelot e Car-
tier 1998, 26-27; Dufays 2005) que, podendo também ocorrer em
qualquer um dos enquadramentos temporais acima referidos, não Gráfico 4.1 – Objetivos com que se lê mais frequentemente (%)
buscam primeiramente nos textos uma fruição de índole estético-li-
terária – não por acaso, «o termo leitor […] é usado para designar
o aluno que, ano após ano, sublinha manuais para passar nos exa-
mes, quem devora romances policiais nos transportes públicos […];
alguém que compra livros […] e os lê por obrigação […]; alguém
que compra e lê livros para passar o tempo (mas que provavelmente
desistirá desse hobby quando as circunstâncias mudarem), alguém
que tem feito da leitura um modo de vida […]» (Goldin 2006, 74)…
Ainda assim, no arranque deste esforço de inteligibilidade apostado,
relembre-se, em examinar a leitura não como atividade de receção
mas sim como prática cultural – distinção epistemológica particular-
mente operativa, cunhada por Olivier Donnat (vide, a este propósito,
Neves 2011, 27) –, sopesando o potencial explicativo de múltiplas (N=821)

146 147
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Gráfico 4.2 – Objetivos com que se lê mais frequentemente, Gráfico 4.3 – Objetivos com que se lê mais frequentemente,
por grau de instrução do próprio (%) por idade (%)

(N=821)

menor grau de ­instrução que tal razão ganha maior relevo (90% dos
que têm menos do que o 3.º ciclo do ensino básico afirmam ler com (N=821)
esse objetivo, quase não se envolvendo noutro género de leituras).
Em contrapartida, é no grupo dos mais escolarizados (com nível
de instrução superior) que é comparativamente mais elevada a per- vida ativa (35-44 anos), e comparando com outros escalões etários,
centagem daqueles cujo móbil principal para a leitura é o estudo/a é superior a percentagem dos que leem sobretudo por razões profis-
realização de trabalhos escolares, académicos (20%) ou o exercício sionais (14%). Não passa também despercebido o facto de o privi-
da profissão (16%). Mais: constata-se que a centralidade da leitura légio concedido à leitura por prazer se verificar seja qual for a classe
por prazer continua a ser transversal à generalidade da população socioprofissional dos portugueses. Todavia, destaque-se que aqueles
portuguesa quando se convocam outras variáveis de caracterização que leem sobretudo para o exercício da profissão se encontram pro-
sociográfica, como o sexo/género (ainda que as mulheres a prati- porcionalmente em maior número entre os grandes empresários e
quem mais do que os homens, respetivamente 75% e 60%), o habitat profissionais liberais (25%), os técnicos e especialistas (24%) e os
(urbano, intermédio urbano e rural) ou a idade (gráfico 4.3). profissionais socioculturais (17%) – ocupações que, à partida, recla-
Sendo uma prática mais privilegiada à medida que a idade avança, mam um maior acesso a informações e conhecimentos, obtidos por
não deixa ainda assim, entre os indivíduos dos 15 aos 24 anos, de via da leitura, com vista a guiar a prática profissional –, em claro
estar ao nível do tipo de leitura com que estes mais ocupam o tempo, contraste com o que sucede entre os empregados de escritório (6%),
a leitura escolar/académica. Já entre os que se encontram a meio da os trabalhadores dos serviços (1%) e os operários (0%), três g­ rupos

148 149
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

socioprofissionais onde a leitura por prazer é consideravelmente ‘fora do solo’, a escrita ‘fora do livro’ conhece um vento favorável»
mais mobilizadora face ao que sucede nos demais (gráfico 4.4). (Régis Debray apud Melot 2012, 16), percebe-se que só 39% leram
livros impressos nos últimos 12 meses (anteriores à realização do
Inquérito), baixando esse valor para 10% se se considerar a leitura
Gráfico 4.4 – Objetivos com que se lê mais frequentemente, de livros digitais. Comparando, por exemplo, com dados de 2018/19
por classe socioprofissional (%) relativos à vizinha Espanha (MCUD 2019, 154) – gráfico 4.5 – ou
com a radiografia de 2018 relativa a França2 (Lombardo e Wolff 2020,
6), a prática da leitura de livros em Portugal, independentemente do
formato, atinge valores substancialmente inferiores. Esta tendência
reafirma-se quando os dados são comparados com os do Inquérito
à Leitura realizado em 2007 (Santos et al. 2007), o qual registava
uma percentagem de 55% de leitores de livros impressos. Porém, em
tal inquérito, que excluía as Regiões Autónomas, a amostragem era
diferente e o formato da pergunta de aferição dos leitores de livros
impressos era também distinto. Em contrapartida, o Inquérito à
Ocupação do Tempo, realizado em 1999 (INE 2001, 149), indicava
apenas 31% de leitores de livros em papel.

Gráfico 4.5 – Leitura de livros, por formato, nos últimos 12 meses (%)

(N=821)

Quem lê o quê? Primeiro, os livros…


(Portugal – N=2000)
À luz daquilo que os dados do Inquérito permitem apurar, no
que concerne especificamente ao lugar que o objeto-livro ocupa
na vida dos portugueses, e num cenário onde «os signos fora dos
2
62% dos franceses com 15 ou mais anos leram pelo menos 1 livro (não se
contabiliza aqui a leitura de «banda desenhada») nos últimos 12 meses. É um dado
grilhões livrescos escapam como uma liberação, um voo em dire- divulgado na última edição do Enquête sur les pratiques culturelles (Ministère de la
ção a uma promissora e lisonjeira ubiquidade. Como a agricultura Culture).

150 151
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Este panorama, em que a maioria dos portugueses não leu, no Gráfico 4.6 – Frequência de leitura de livros impressos, por classe
último ano, qualquer livro em papel (e, muito menos, em formato socioprofissional, nos últimos 12 meses (%)*
digital), vai ao encontro de uma ideia salientada nalguns dos últimos
inquéritos aos hábitos e práticas de leitura, a de que se estaria perante
uma tendência de quebra percentual da população leitora de livros
impressos (tabela 4.1).
Ora, no sentido de se traçar um retrato mais fino deste tipo de
leitura, há que vincar que tanto as qualificações escolares como a
idade permanecem, conforme evidenciado em estudos preceden-
tes, como fatores determinantes da realização e da intensidade da
prática sob escrutínio. Empiricamente, confirma-se que os portu-
gueses que leem livros em papel numa base diária ou semanal têm
maior representação entre os que atingiram o ensino superior, assim
como entre os que se incluem nos escalões etários mais jovens (15-
-24 e 25-34 anos): no cômputo geral, a leitura é então menos recor- (N=241)
rente à medida que a idade aumenta e que as qualificações diminuem. * Nota: foram consideradas para análise as frequências nas categorias ‘diariamente’ e ‘uma ou
mais vezes por semana’.
Ademais, a percentagem de leitores regulares3 de livros impressos é
menor entre os homens do que entre as mulheres (12% contra 16%),
sendo que, quanto à pertença socioprofissional, é nos profissionais Ainda que bastante mais incipiente/minoritária, do ponto de vista
socioculturais (32%), nos grandes empresários ou profissionais libe- da relação que os portugueses mantêm com ela, é possível afirmar
rais (31%) e nos técnicos e especialistas (29%) que se encontra mais que a prática da leitura de livros em formato digital se pauta, grosso
abundantemente esses leitores (gráfico 4.6). modo, por algumas destas características, ou seja, tem associada
leitores regulares com um perfil social predominantemente jovem,
Tabela 4.1 – Tipo de leitores e não-leitores de livros impressos, assume maior incidência entre os que atingiram o ensino superior –
por ano (%) ainda que 76% dos inquiridos com este grau não tenham lido livros
digitais no último ano – e nos grupos socioprofissionais onde tam-
bém se descobrem os mais regulares leitores de livros impressos.
Mas já aqui, com outro enfoque, se regressará.
Um passo adiante na caracterização da população leitora de
livros impressos, a partir do que o Inquérito permite concluir (pres-
te-se novamente atenção à tabela 4.1, que exclui os dados relativos
aos indivíduos que não quantificaram o número de livros lidos no
decurso do ano anterior), passa por identificar que ela se constitui
Nota: relativamente aos dados de 2007, não contabilizam os que só leram livros escolares/ maioritariamente por pequenos leitores (27% dos portugueses, que
profissionais.
(2020: N=2000) leram entre 1 e 5 livros4 naquele formato), sendo que os médios

3
Agrupa, por um lado, os que declararam ter lido livros impressos, nos últimos 4
Para a construção da tipologia de leitores, são aqui adotados os limiares quan-
12 meses, com assiduidade diária e, por outro, os que o fizeram pelo menos «uma ou titativos de que se fez uso nos estudos de Freitas, Casanova e Alves (1997) e de
várias vezes por semana» (mesmo se não todos os dias). Santos et al. (2007).

152 153
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

l­eitores (6-20 livros) se cifram em 7% e os grandes leitores (+ de Tabela 4.2 – Distribuição de percentagem de leitores de livros
20 livros) em 1% – (des)equilíbrio que se mantém no que se refere à impressos, por variáveis de caracterização sociográfica,
população leitora de livros digitais (pequenos leitores – 5%; médios face à amostra total (%)
– 1%; grandes – 0%).
Na verdade, se os dados do inquérito A Leitura em Portugal (San-
tos et al. 2007), quando comparados com o que foi realizado, uma
década antes, por Freitas, Casanova e Alves (1997), corroboravam a
ideia de que o então real crescimento dos pequenos leitores (de 34
para 37%) «se dev[ia] não à diminuição dos grandes leitores mas sim
dos não-leitores», contrariando-se portanto a «interpretação negati-
vista do aumento dos ‘fracos leitores’ […], uma vez que a amplifica-
ção de uma leitura ‘fraca’ em quantidade deve antes ser tomada como
sinónimo de alargamento e não de fragilização da leitura» (Neves
2011, 155), o presente Inquérito, no confronto com os dados de
A Leitura em Portugal, não parece apontar na mesma direção inter-
pretativa, em virtude de ser agora sugerido que, de 2007 para 2020,
tanto diminuiu o contingente dos ditos pequenos leitores (em dez
pontos percentuais) como se deu o alargamento dos não-leitores (de
45 para 61%), um enfraquecimento, pois, do número de portugueses
que se dedicam à leitura de livros impressos. Um reparo importante:
se se compararem os dados do Inquérito à Ocupação do Tempo (INE
2001, 149) relativos a 1999 com os do Inquérito de 2020 (ICS-FCG),
a leitura é já outra – em duas décadas, passa-se de 31% de inquiridos
que leram livros nos últimos 12 meses para os atuais 39%.
De acordo com o que é apresentado na tabela 4.2, onde se pro-
cede à distribuição estatística dos leitores de livros impressos por
uma plural gama de variáveis, e face à amostra total de portugueses
inquiridos,5 muitos são os pontos dignos de menção. Percebe-se de

5
O que não deve ser confundido com a caracterização interna (sociográfica)
das três categorias de leitores (pequenos, médios e grandes) de livros impressos.
Porém, numa análise rápida desta subamostra, não deixa de valer a pena referenciar
os seguintes aspetos: nota-se um maior número de indivíduos do sexo masculino
entre os que compõem o grupo dos pequenos leitores; a maioria dos leitores de
média e grande dimensão (respetivamente, 54 e 57%) é detentora de qualificações
escolares superiores (contra os 34% de pequenos leitores que alcançaram esse grau
de instrução); por comparação com as outras duas categorias, é na dos médios lei-
tores que se encontra um maior contingente de profissionais socioculturais (29%,
valor que cai para 16% entre os pequenos leitores e para 5% entre os grandes); é
(N=700)
percentualmente mais significativo na composição dos grandes leitores o contin-
gente de indivíduos com idades compreendidas entre os 35 e os 54 anos, assim como

154 155
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

imediato que, entre os portugueses com grau de instrução superior, (14%). Os únicos grupos socioprofissionais que não contam nos seus
47% são pequenos leitores e 18% de tipo médio, valores bem distan- efetivos com uma maioria leitora de livros impressos são os operários
ciados dos que se aplicam aos que detêm menos do que o 3.º ciclo (15%), os trabalhadores dos serviços (30%) e os pequenos empresá-
(respetivamente, 12% e 1%). Aliás, se se somarem as percentagens rios e comerciantes (37%). Duas notas adicionais: para sublinhar que
das três categorias de leitores, só entre os portugueses que alcança- o grupo dos grandes empresários e profissionais liberais é aquele que
ram o ensino universitário há uma maioria leitora de livros em papel é composto por uma percentagem mais elevada de grandes leitores
(68%). Por outro lado, mais feminizada, a leitura destes livros ocupa (7%), e que os valores para a leitura de livros impressos são global-
entre 44 a 46% dos portugueses jovens e adultos até aos 44 anos mente mais salientes entre os portugueses que residem em ambiente
(mesmo sendo eles sobretudo pequenos leitores), baixando para um urbano, apesar de em nenhuma região do país haver uma maioria de
total de 22% entre os que têm 65 ou mais anos. Outro aspeto a assi- indivíduos com essa mobilização leitural (41% na Área Metropolitana
nalar prende-se com o grau de instrução dos pais dos inquiridos: a de Lisboa, dos quais 33% são pequenos leitores).
maioria daqueles cujos pais (pai ou mãe) completaram pelo menos o Se a incursão for pela leitura de livros digitais, o que muda? Para
ensino secundário declara ter lido livros impressos ao longo do ano responder a isso, a tabela 4.3 é particularmente elucidativa. Através
transato (destacam-se aí assinaláveis percentagens de médios leito- dos dados que nela constam, constata-se, por exemplo, que a leitura de
res), caindo os valores para menos de metade entre os portugueses livros em formato digital, ao contrário do que se observa na variante
com pais que nem o 3.º ciclo concluíram, o que acaba por indiciar em papel, é mais saliente entre os portugueses do sexo masculino,6
os efeitos (nunca deterministas, retenha-se) que a matriz cultural de perdendo a ênfase de prática tendencialmente urbana. Contudo,
origem (Freitas, Casanova e Alves 1997, 118), que as origens sociais, percorrendo as restantes variáveis, chega-se a idênticas conclusões,
implicando determinados processos de socialização e estruturas de a saber: trata-se de uma prática mais significativa entre os que con-
recursos – os capitais escolares dos pais, nomeadamente (Bourdieu cluíram ou frequentaram o ensino superior (11% de pequenos lei-
1996) – têm na construção das disposições dos indivíduos para a lei- tores e 5% de leitores médios); mais relevante entre os portugueses
tura, mesmo se distinta da realizada pelos respetivos progenitores. jovens e adultos até aos 34 anos (a partir dos 45 anos de idade, não
No referente à condição perante o trabalho, apenas entre os estu- há registo estatístico de médios e grandes leitores de livros digitais),
dantes sobressai uma maioria que não se demite da prática da leitura entre os estudantes (27%, contra os 9% dos que são trabalhadores),
de livros impressos (65%), contra os 40% de ativos e os 22% de refor- entre aqueles cujos pais atingiram o ensino superior (se bem que a
mados que são efetivos leitores de tal suporte. É também sinalizável a distribuição se afigure aqui menos linear, quando ­comparada com a
relação existente entre os rendimentos derivados da atividade profis-
sional e a leitura de livros em papel – verifica-se uma maioria leitora
6 Em termos da subamostra que compõem, os portugueses leitores de livros
entre os portugueses que auferem mensalmente uma remuneração
digitais – os que afirmam ter lido livros nesse formato ao longo do ano anterior
acima dos 1800 euros, sendo de situar nesse contingente percentagens – são maioritariamente do sexo masculino (56%). 81% alcançaram pelo menos o
de médios leitores de 14 e 15% (os valores baixam para um terço, 4 ensino secundário (sendo que, desses, 50% atingiram grau de instrução superior)
e 5%, entre os que auferem entre 500 e 1800 euros ). Já em matéria e 58% têm idades compreendidas entre os 15-24 (31%) e os 25-34 anos (27%).
dos grupos socioprofissionais em que se está inserido, é entre os pro- Repartem-se, com maior presença estatística, pelos grupos socioprofissionais de
trabalhadores dos serviços (24%), profissionais socioculturais (21%) e técnicos e
fissionais socioculturais que se encontram proporcionalmente mais especialistas (18%). De assinalar também que, ao observar-se a distribuição dos lei-
médios leitores (21%) e, logo depois, entre os técnicos e ­especialistas tores de livros digitais pelas categorias pequenos, médios e grandes, é notório tanto
o peso que a posse de um grau de instrução superior tem na intensificação da prática
pertencentes ao grupo socioprofissional dos trabalhadores dos serviços (48%) – em causa (há, respetivamente, 44, 62 e 86% de pequenos, médios e grandes leitores
isto apesar de os portugueses que leram livros impressos no último ano e que se com o ensino superior), como o facto de esta, tornando-se mais intensa, envolver
enquadram neste grupo serem, na sua grande maioria, pequenos leitores de livros progressivamente um menor número de leitores nos escalões etários acima dos 45
em formato papel (79%). anos (conclusão já ventilada em Cardoso e Cameira 2015, 239).

156 157
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Tabela 4.3 – Distribuição de percentagem de leitores de livros que tem por referência a leitura de livros impressos), entre os que
digitais, por variáveis de caracterização sociográfica, se enquadram no topo dos intervalos de rendimento (8% de médios
face à amostra total (%) leitores para os que usufruem de remunerações acima de 2700 euros)
e nos sectores socioprofissionais dos técnicos e especialistas (17%),
dos profissionais socioculturais (12%) e dos grandes empresários e
profissionais liberais (11%), continuando a revelar-se neste último
grupo a maior percentagem de grandes leitores (6%).
Entretanto, interessará atentar nas relações que possam existir
entre aquilo que são as práticas de leitura de livros em ambos os for-
matos, procurando confirmar, no seguimento de investigações como
a que esteve na base de O livro, o leitor e a leitura digital – susten-
tava-se aí que «ao contrário de um receio expresso amiúde na opinião
pública, […] a leitura de livros em formato digital não substituiu a
leitura de livros em formato papel» (Cardoso e Cameira 2015, 246) –,
se os resultados do Inquérito7 indicam que os maiores leitores de
livros digitais tendem a ser, entre os que leem livros nesse formato,
os mais assíduos leitores de livros impressos e, por arrasto, se é pos-
sível identificar um padrão quanto à frequência da leitura de livros
digitais no tocante às diferentes categorias de leitores de livros em
papel. Dentro dessa lógica de raciocínio, o gráfico 4.7 fornece dados
deveras esclarecedores: se só 6% dos pequenos leitores de livros

Gráfico 4.7 – Frequência de leitura de livros impressos, por tipos


de leitores de livros digitais, nos últimos 12 meses (%)

(N=131)
(N=131)

7
Desta feita, aplicado a uma amostra representativa da população portuguesa,
não composta exclusivamente por internautas.

158 159
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

digitais se envolveram «diariamente», no último ano, na leitura de em papel que leem muito em formato digital e outros que, embora
livros impressos, as percentagens atingem, respetivamente, os 14 e leiam muito em papel, leem muito poucos livros digitais» (Cardoso
os 29% quando se toma em consideração a recorrência das práti- e Cameira 2015, 245), tal não significa a impossibilidade de compro-
cas dos médios e grandes leitores de livros digitais (mais: no caso var uma articulação entre as práticas de leitura de livros impressos
dos médios leitores de livros digitais, praticamente metade, 49%, leu e digitais, até porque, além do que já ficou dito, os valores percen-
livros impressos pelo menos semanalmente, o dobro do valor verifi- tuais relativos aos leitores de livros impressos que nunca leram livros
cado para os que são pequenos leitores). em formato digital vão diminuindo de maneira progressiva, isto é,
Complementarmente, incidindo a análise na periodicidade de lei- à medida que se passa da categoria dos pequenos (82%) para a dos
tura de livros digitais conforme levada a cabo pelos que leem livros médios leitores (77%), e desta para a dos grandes (71%).
impressos (gráfico 4.8), observa-se que é na categoria dos grandes Mas quais as razões invocadas pelos portugueses para a não-lei-
leitores que tem maior expressão (19%) o contingente dos que leem tura de livros, quer impressos, quer digitais? No que respeita à não-
diária e digitalmente livros (em qualquer uma das outras duas cate- -leitura de livros em papel, são principalmente três as justificações
gorias, que compõem a quase totalidade da subamostra de leitores de avançadas: a ‘preferência pela realização de outras atividades’ (48%
livros em papel, a percentagem não ultrapassa os 4%). Se, a priori, dos não-leitores sublinharam este aspeto), a ‘falta de tempo’ (identi-
«ter acesso a muitos livros em formato papel não implica necessa- ficada por 30% desses não-leitores) e o facto de se considerar ‘a lei-
riamente ler muito em digital. Haverá ‘grandes’ leitores de livros tura como uma atividade aborrecida’ (23% indicaram-no). Diga-se,
todavia, que quase metade (49%) dos não-leitores de livros impres-
sos que preferem ocupar o tempo com alternativas à leitura desses
Gráfico 4.8 – Frequência de leitura de livros digitais, por tipos suportes têm menos do que o 3.º ciclo de escolaridade e mais do que
de leitores de livros impressos nos últimos 12 meses (%) 55 anos (47%). Trata-se de uma razão apontada sobretudo por res-
pondentes do sexo masculino (60%) e por indivíduos enquadráveis
nas situações socioprofissionais do operariado (46%) e dos traba-
lhadores dos serviços (29%) – apenas 2% dos que invocaram aquela
razão concreta integram o grupo dos profissionais socioculturais.
Por seu turno, entre os que evocam o argumento da falta de tempo,
nota-se uma maior expressão de não-leitores que são trabalhado-
res (79%), que cabem nos intervalos etários 35-44 (27%) e 45-54
(30%), assim como nos grupos dos operários (28%), dos trabalha-
dores dos serviços (25%) e dos pequenos empresários e comercian-
tes (17%). Quanto aos que percecionam a leitura de livros impressos
como uma atividade entediante, motivo pelo qual não se ligam a ela,
concentram-se, na sua esmagadora maioria (71%), entre os que, no
máximo, concluíram o grau de instrução de 3.º ciclo. É também esta
uma razão apresentada mais por homens (60%) do que por mulhe-
res (40%) e, no atinente ao sector profissional em que se inscrevem,
mais por operários (42%) e trabalhadores dos serviços (31%). Se
dirigida a atenção para a não-leitura de livros em formato digital,
duas das justificações repetem-se: 14% dos não-leitores de livros
(N=698) digitais escudam-se na ‘falta de tempo’, ao passo que 21% (a segunda

160 161
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

principal razão referida) adiantam a ‘preferência pela realização de Gráfico 4.9 – Frequência e modalidades de acesso a livros impressos,
outras atividades’. Quanto à principal razão, assinalada por 39% de nos últimos 12 meses (%)
não-leitores de livros digitais – inseridos num contexto nacional que
experimentou já «a emergência e o rápido crescimento para níveis
relativamente significativos da edição de documentos eletrónicos
[…] pouco depois de tal ter ocorrido nos EUA, em 2008, com o
volume de negócios dos e-books» (Neves 2016, 198) –, consiste na
«preferência em ler livros impressos», ainda que valha a pena aduzir
que a grande maioria que o alega é composta por pequenos leitores
de livros em papel. De resto, uma alusão suplementar aos 15%, pre-
dominantemente do sexo feminino, que afirmam desconhecer o que
são livros digitais: 58% têm 65 ou mais anos, 77% atingiram menos
do que o 3.º ciclo de escolaridade (a percentagem sobe para 92%
se somada à dos que detêm esse grau de ensino), e inserem-se tam-
bém especialmente em grupos socioprofissionais caracterizados por
reduzidos capitais escolares e por alguma insegurança económica –
no caso, operários (50%) e trabalhadores dos serviços (33%). (N=783)

Formas de acesso a livros e contextualização espacial proporcionalmente menos as mulheres (6%) do que os homens
da sua leitura (8%) a adquiri-los com maior frequência (pelo menos 1 vez por
mês), assim como os que têm menor nível de instrução – 12% dos
Elucidar acerca das modalidades mediante as quais os portugue- leitores com ensino superior compram-nos ‘1 vez por mês ou mais’,
ses acedem a livros exige, desde logo, que se destaque a compra como contra 1% dos que detêm menos do que o 3.º ciclo. Tal sucede mais
via de acesso privilegiado aos de formato impresso. Como se pode regularmente também entre os que se incluem nos escalões etários
observar pelo gráfico 4.9, uma esmagadora maioria de leitores desse 25-34 e 35-44. Como seria esperável, à medida que o patamar de
tipo de livros (82%) refere comprá-los, apesar de a maior percenta- estatuto económico aumenta, cresce também a probabilidade de se
gem dizer respeito aos que o fazem mais espaçadamente por ano, isto comprar livros mais recorrentemente (3% dos leitores que auferem
é, 1 ou 2 vezes (51%); apenas 6% assumiram comprar livros em papel entre 500 e 800 euros adquirem livros impressos pelo menos uma
pelo menos uma vez por mês. Em termos de importância relativa, o vez por mês, contra 18% dos que o fazem, com essa frequência,
pedido de empréstimo acaba, pois, por surgir como a segunda moda- tendo uma remuneração mensal entre acima de 1800 e 2700 euros).
lidade de acesso mais recorrente, seguindo-se a requisição de livros Ideia que sai reforçada pela seguinte: entre os leitores que acham
impressos em bibliotecas, mesmo se só assinalada por 18% dos por- viver «confortavelmente» com o rendimento de que dispõem, 11%
tugueses leitores, com 10% deles levando-a à prática apenas ‘1 ou 2 compram livros ‘1 vez por mês ou mais’, contra os 5% que o fazem
vezes por ano’. O recurso à fotocópia, de livros académicos, técnicos com essa regularidade e que afirmam viver ‘com algumas dificulda-
ou de outros géneros editoriais, é um procedimento minoritário por des’. São sobretudo os técnicos e especialistas (12%), os grandes
comparação com as demais modalidades de acesso a livros impressos. empresários e profissionais liberais, os profissionais socioculturais
No que se reporta especificamente à compra, os resultados apu- e os gestores (três grupos socioprofissionais onde o valor atinge os
rados mostram que, entre o público leitor de livros em papel, são 9%), os que contam com um contingente proporcionalmente mais

162 163
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

e­ levado de leitores que compram livros em papel numa base mensal de instrução superior (18%) do que junto dos leitores que apenas
(ao invés, a percentagem é de 1% entre os que pertencem ao opera- alcançaram o ensino secundário (5%). Finalmente, saliente-se que
riado ou à categoria empregados de escritório). mais de metade dos portugueses que acedem a e-books ora graças à
E quanto aos livros em formato digital, quais as formas de acesso prática da aquisição (65%), ora por via do download gratuito (69%),
mais preponderantes? Revela o gráfico 4.10 que, mais significativa do cabem na categoria dos chamados pequenos leitores (de livros digi-
que a compra através de um website ou de uma livraria online (este o tais e/ou impressos).
segundo principal meio de acesso a livros eletrónicos: 42% dos seus Sobre os locais onde os portugueses leem habitualmente livros,
leitores utilizam essa via, ainda que só 5% o faça ‘1 vez por mês ou independentemente do formato dos mesmos, os dados do gráfico
mais’), a descarga gratuita de e-books aparece como a modalidade que 4.11 não oferecem dúvidas: a quase totalidade (98%) dos inquiridos
colhe maior preferência: 70% utilizam esse procedimento para obter (o valor para Espanha é de 97% – cf. MCUD 2019, 47) identifica
livros digitais (pelos vistos, no acesso aos livros, pagar ou não pagar o espaço doméstico como lugar por excelência da leitura livresca.
pode fazer a diferença…), sendo de 16% o valor relativo aos que Contudo, a enorme distância percentual, e identificados por menos
assim procedem pelo menos uma vez por mês. Comparativamente, de 10% dos respondentes leitores, outros dois contextos devem ser
o recurso a bibliotecas ou a serviços de troca de livros digitais ligados referenciados: a escola/a universidade e o local de trabalho. Todos os
a blogues ou redes sociais constitui a maneira menos privilegiada de restantes espaços elencados, sejam eles de carácter público ou semi-
aceder aos livros em questão, sobressaindo, em ambos os casos, uma público, denotam uma fraca apropriação para o exercício da prática
larga maioria de leitores (respetivamente, 76 e 83%) que nunca os leitural: repare-se que somente 3% dos leitores de livros afirmam
obteve desse modo. De notar que a compra de e-books é, por exem- ter o costume de os ler numa biblioteca, «por definição lugar de lei-
plo, mais frequente (‘1 vez por mês ou mais’) entre quem detém grau tura aturada e séria» (Freitas, Casanova e Alves 1997, 224), sendo
inclusivamente superior a percentagem dos que geralmente os leem
Gráfico 4.10 – Frequência e modalidades de acesso a livros digitais
nos últimos 12 meses (%)
Gráfico 4.11 – Locais onde se costuma ler livros impressos
ou digitais (%)

(N=189) (N=819)

164 165
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

em espaços associados a momentos de interregno laboral, tais como no estudo A Leitura em Portugal10 (Santos et al. 2007, 102), como
cafés ou transportes públicos. Convém não ignorar que, ao cruza- o género mais lido (46% dos que leram livros no último ano afir-
rem-se os principais locais de leitura com os três objetivos com que mam ter-se dedicado sobretudo à sua leitura). Só depois surgem,
os portugueses leem mais frequentemente (por prazer, para fins referidos por um contingente de leitores substancialmente menor
escolares, académicos e por necessidades profissionais), sempre a (gráfico 4.12), outros quatro géneros editoriais: ‘história’ (24%),
casa aparece, para mais de 90% dos indivíduos, como o espaço pri- ‘técnico ou científico (ciências exatas ou sociais e humanas)’ (23%),
vilegiado para a atividade ledora. Porém, 52% dos que afirmam ler ‘ficção científica’ (22%) e ‘crime, thrillers ou mistério’ (20%). Em
fundamentalmente por razões de estudo identificam a escola/a uni- sentido inverso, não sendo géneros de leitura frequente senão para
versidade como o espaço habitual das suas leituras, da mesma forma 5% ou menos dos inquiridos, impõe-se mencionar o ‘teatro’ (2%), o
que 49% dos que leem sobretudo por motivos profissionais aludem ‘infantojuvenil’ (3%), os livros de ‘religião/espiritualidade (Bíblia)’
ao local de trabalho. (4%), os de ‘ensaios’ (4%), os de ‘banda desenhada’ (4%) e de ‘arte’
(5%). Comparando-se os dados deste Inquérito com os que foram
trabalhados em A Leitura em Portugal, constata-se, por exemplo,
Géneros de livros e hierarquias de preferências

A propósito dos dezanove géneros editoriais sobre os quais se Gráfico 4.12 – Géneros de livros (em formato impresso ou digital)
inquiriu os leitores de livros, precisamente com o intuito de disse- lidos com mais frequência, nos últimos 12 meses (%)
car inclinações maioritárias e minoritárias, determinadas hierarquias
de preferências em matéria de práticas de leitura,8 saliente-se que o
‘romance’ – aqui tomado numa aceção genérica, o que, até por isso,
não invalida que «uma mesma espécie bibliográfica compulsada em
contextos diferentes e por isso vinculada a usos sociais particulares
po[ssa] gerar atribuições de géneros distintos» (Freitas, Casanova e
Alves 1997, 132) – se apresenta, flagrantemente, e à semelhança do
que se concluíra quer na Encuesta de Hábitos y Prácticas Culturales
2018-2019 (MCUD 2019), centrada na sociedade espanhola,9 quer

8
Sem negar que, como aduziu José Tengarrinha, «h[á] normalmente um certo
pudor de declarar as leituras preferidas quando estas têm manifestamente nível infe-
rior» (Tengarrinha 1973, 70-71).
9
Uma ressalva metodológica: apesar de certos dados da Encuesta de Hábitos
y Prácticas Culturales (MCUD 2019, 47) não serem totalmente comparáveis (por
exemplo, em termos das práticas de leitura de livros por géneros editoriais, o estudo
espanhol reporta-se temporalmente a um trimestre e não aos últimos 12 meses),
cabe ao ‘romance’ um lugar de absoluto destaque, nomeadamente à ‘novela con-
temporânea’ (77%). Frise-se que, aí, a categoria ‘romance’ surge desagregada em
(N=819)
‘novela contemporânea’ e ‘novela clássica’ (17%), ambas incluídas na supercategoria
da ‘criação literária’. Além do mais, e ao contrário dos dados mais recentes para
Portugal, os da Encuesta… referem-se, exclusivamente, às leituras realizadas em 10
Onde se apurou o valor de 47%, resultante da agregação de ‘romances de
tempo de ócio, não sendo contabilizadas as que acontecem por razões escolares ou amor’ (18,1%), ‘romances de grandes autores contemporâneos’ (17,4%) e ‘roman-
profissionais. ces históricos’ (11,8%).

166 167
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

a diminuição da importância de certos géneros entre os leitores (os verdade, o inverso sucede nos livros de ‘crime, thrillers ou mistério’
casos da ‘banda desenhada’ e dos ‘ensaios’, recuando de 7 para 4%, e de âmbito ‘escolar/educativo’, lidos predominantemente por indi-
ou dos livros de ‘culinária, decoração ou jardinagem’, de 11 para víduos do mais jovem escalão etário. De qualquer forma, além destes
7%), bem como o aumento do peso de outros: da ‘poesia’, que sobe dois géneros, aqueles onde os leitores dos 15 aos 24 anos têm mais
de 5 para 11%; do ‘escolar/educativo’, de 8 para 11%; do ‘técnico ou peso são o ‘romance’ (34%) e o ‘técnico ou científico’ (31%). No
científico’, de 14 para 23%; da ‘arte’, de 2 para 5%; da ‘ficção cien- que concerne à poesia, os seus leitores habituais repartem-se pelos
tífica’, à qual corresponde agora, isoladamente, um valor de 22%, intervalos etários mais velhos (55-64 e 65 ou mais anos) e pelo mais
quando antes, estando integrada na categoria dos livros policiais e de jovem deles todos (15-24), contando com menos interessados nas
espionagem, contribuía para um total de 17%; ou mesmo, entre os idades intermédias. Se é entre os de mais avançada idade que princi-
livros de teor prático, dos de ‘viagens/férias’, antes lidos com mais palmente vinga a leitura de livros de ‘história’, os textos dos géneros
frequência por 6 e não pelos atuais 8%. ‘romance’, ‘técnico ou científico’ e ‘ficção científica’ são os que aca-
Admitindo, na peugada de Patrick Parmentier, que o mais instru- bam por envolver mais leitores do segmento etário 35-44.
tivo, no processo de digestão do material empírico, «são as tabelas E em função da escolaridade, que variações se afiguram detetá-
cruzadas, as percentagens calculadas por subpopulações (de acordo veis? As mais sensíveis, alinhando uma maior frequência de leitura
com as idades, os sexos, os níveis de escolaridade, as categorias com o aumento do grau de instrução, registam-se em diversos géne-
socioprofissionais), [é que] ao compará-las entre si podemos iden- ros mas, notoriamente, naqueles a que está normalmente associada
tificar variações» (1988, 129-131) sociologicamente relevantes, que uma componente de erudição: ‘técnico ou científico’, ‘ensaios’,
caracterização dos leitores por géneros de livros é então possível? ‘arte’. O inquérito à participação cultural que, em 2011, foi realizado
Os resultados do Inquérito permitem perceber que a leitura de em Malta,11 país com um PIB per capita mais alto que o de Portugal,
certos géneros editoriais ora assume preponderância entre leitores pô-lo a nu de maneira evidente, pelo que, assim sendo, tais varia-
do sexo masculino, ora do sexo feminino. Conforme atestado pela ções não devem ser encaradas como uma especificidade da população
tabela 4.4, são enquadráveis na primeira situação os livros das catego- leitora portuguesa. No que ao ‘romance’ respeita, seja qual o for o
rias ‘história’, ‘técnico ou científico’, ‘divulgação científica’, ‘ficção grau de escolaridade, a percentagem de leitores que o elegem como
científica’, ‘crime, thrillers ou mistério’ e ‘banda desenhada’. Dentro género preferencial é sempre superior a 40%, atingindo o valor mais
das práticas de leitura de livros mais feminizadas, destacam-se as que elevado (52%) entre os que não chegaram a completar o 3.º ciclo, o
envolvem o ‘romance’ (54% de mulheres colocam este género entre que efetivamente sugere que a designação ‘romance’ engloba uma
os mais lidos, por comparação com os 28% de homens que o fazem multiplicidade de configurações textuais, indo do popular ao eru-
– assimetria que Jean-Pierre Esquenazi (2006, 23) já sinalizara para dito, implicando vários patamares de legitimidade social (Parmentier
a sociedade francesa), a ‘culinária, decoração ou jardinagem’, a ‘poe- 1988, 141-142). Géneros como ‘história’ e ‘contos’ assumem uma
sia’, o ‘escolar/educativo’ ou a ‘religião/espiritualidade’, continuando distribuição bastante uniforme em termos das qualificações educa-
assim a manifestar-se a inclinação que as mulheres têm por géneros cionais dos seus habituais leitores, o que não se verifica ao nível dos
«cujos enredos operam internalizações das emoções/dos sentimen- livros de ‘religião/espiritualidade’, crescentemente lidos à medida
tos […] ou onde os seus papéis tradicionais, desde logo no seio da que a escolaridade decresce (o contrário do que acontece com os
família, são reconhecíveis» (Freitas, Casanova e Alves 1997, 135). géneros ‘auto/biografias’ e ‘autoajuda’).
Mas os resultados, quando contemplada a variável idade, mostram Examinar ainda o consumo dos diferentes géneros de livros à
também que a leitura de determinados géneros se vai tornando mais luz da categoria socioprofissional em que se está inserido possibilita
habitual à medida que se é mais velho. Veja-se o que sucede no caso revelar, por exemplo, que, para o ‘romance’, são quatro os grupos
do ‘romance’, com muito mais leitores frequentes nos escalões etá-
rios 55-64 e 65 ou mais anos do que entre os que têm de 15 a 24 – na 11
Cf. National Statistics Office 2012, 51.

168 169
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

em que a maioria dos leitores não o toma como alvo privilegiado Géneros como o da ‘poesia’ e do livro ‘escolar/educativo’ encontram
de leitura (grandes empresários e profissionais liberais; pequenos sobretudo leitores mais assíduos entre os grandes empresários e pro-
empresários e comerciantes; técnicos e especialistas; gestores). Por fissionais liberais e os profissionais socioculturais, apesar de, para
seu lado, e sem grande surpresa, no género ‘técnico ou científico’ aqueles dois géneros, não se dever negligenciar as percentagens de
sobressaem as percentagens de habituais leitores relativas aos técni- leitores integrados nos grupos dos técnicos e especialistas e dos tra-
cos e especialistas (46%) e aos grandes empresários e profissionais balhadores dos serviços. Se o ‘infantojuvenil’ e o ‘teatro’, em matéria
liberais (42%). Já o maior protagonismo de quem lê habitualmente dos géneros que mais alimentam a leitura de livros, têm implantação
livros de ‘divulgação científica’ acaba por dividir-se pelos p
­ rofissio- nula na esfera do operariado, as ‘auto/biografias’ são proporcional-
nais ­socioculturais (23%) e pelos técnicos e especialistas (29%). mente mais lidas no grupo dos grandes empresários e profissionais
liberais (38%), categoria que, depois da dos gestores, é a que conta
com um valor mais alto de indivíduos que conferem primazia à lei-
Tabela 4.4 – Distribuição de géneros de livros (em formato tura dos livros de ‘arte’. No que aos ‘ensaios’ se refere, tendem a ser
impresso ou digital) lidos com mais frequência nos crescentemente escolhidos para a prática leitural no grupo dos pro-
últimos 12 meses, por variáveis de caracterização fissionais socioculturais (10%).
sociográfica, face à amostra total (%)

Nota: GE e PL = Grandes empresários e profissionais liberais; PE e Com. = Pequenos empre- (N=819)


sários e comerciantes; Técn. e Esp. = Técnicos e especialistas; Oper. = Operários; Gest. =
Gestores; E. Escrit. = Empregados de escritório; Prof. Sociocult. = Profissionais sociocultu-
rais; Trab. Seviços = Trabalhadores dos serviços.

170 171
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Quem lê o quê? Agora, em volta dos jornais e das revistas… Ora, antes de se escalpelizar quais os géneros de jornais e revistas
lidos com maior e menor assiduidade, há que perguntar quantos por-
Vale a pena iniciar a presente secção sublinhando que se dados de tugueses se entregaram, cumulativamente, à leitura de livros, jornais e
2007 (Santos et al. 2007) apontavam o jornal como o objeto da cul- revistas nos 12 meses que precederam a aplicação do Inquérito. Con-
tura tipográfica com mais leitores em Portugal, o mesmo continua a cretamente, no plano do impresso, representam 17% da população.
verificar-se à luz dos dados deste Inquérito (43% dos portugueses Esses leitores, ditos totais – conceito que, num primeiro momento
com 15 ou mais anos leram jornais em papel no último ano), pese de definição sociológica, de alcance analítico mais restrito, não refle-
embora, e contrariamente a 2007, os livros impressos tenham con- tia ainda os contributos da abordagem desenvolvida por Cardoso e
tado com mais leitores do que as revistas (39% vs. 32%) – gráfico Cameira (2015), abordagem essa que procurou ampliar os contornos
4.13. Também na esfera digital os jornais são a publicação mais lida substantivos daquela noção –, caracterizam-se, tipicamente, por «um
(por 21% dos portugueses inquiridos), vindo só depois, a maior dis- acesso recorrente e plural aos três [referidos] conjuntos de publica-
tância, os livros e as revistas (10% de leitores para ambos os supor- ções» (Freitas e Santos 1991, 68). Nesta ótica, os leitores parcelares
tes). Adende-se aqui que os jornais sobressaem face às revistas não seriam produto de múltiplas combinações de práticas de leitura (por
somente em termos do seu mais expressivo número de leitores mas, exemplo, de livros e de revistas, ou de livros e de jornais, ou de jor-
de igual maneira, ao nível da frequência da prática leitural: se respe- nais e de revistas…), mas sem cumprirem a plenitude característica
tivamente 8 e 7% declararam ler ‘diariamente’ jornais nos formatos do leitor total (tipologia que, em bom rigor, vê aqui alargados os seus
impresso e digital (no caso dos jornais em papel, 17% leram-nos ‘1 critérios de inclusão a todos os que leram livros, jornais e revistas
ou 2 vezes por semana, mas não todos os dias’), ainda mais esporá- mesmo se não diariamente – sublinhado importante – no último ano).
dica se afigura a leitura de revistas, visto que só 1% dos inquiridos Feita a precisão, explicite-se que entre esses 17% de leitores totais
afirmou fazê-lo todos os dias no último ano (e isso independente- (exclusivamente de publicações em papel, não se esqueça) é maior
mente do formato), traduzindo-se em 8% o valor dos leitores sema- a percentagem dos que leem ‘diariamente’ jornais (17%) do que
nais deste suporte, quando impresso (a percentagem cai para os 3% livros (10%), sendo que só 5% se dedicam à leitura diária de revistas.
se se considerar as revistas digitais). A transposição pura e simples, para o plano das publicações digitais,
deste conceito de leitor total mais primitivo (isto é, apenas alusivo
aos 5% de portugueses que leem, cumulativamente, livros, jornais e
Gráfico 4.13 – Leitura de livros, jornais e revistas, por formato,
nos últimos 12 meses (%) revistas neste outro formato) não introduz nenhuma alteração signi-
ficativa de perspetiva, já que também, entre esse grupo de indivíduos,
é superior a percentagem dos que leem ‘diariamente’ jornais (18%)
por comparação com as dos leitores diários de livros (12%) ou de
revistas (7%). Neste sentido, mesmo entre os que estabelecem con-
tacto com estes três veículos da cultura escrita, comprova-se que a
primazia do jornal face aos demais suportes não se perde.
Porém, porque a discussão contemporânea acerca da leitura
exige obrigatoriamente que se reconheça que a utilização da Inter-
net – «acontecimento […] tão incorporado no quotidiano que se
‘naturalizou’ tanto ou mais como qualquer outro fenómeno cultural,
ou ‘tecno-facto’ da vida pré-digital» (Martins e Garcia 2013, 285) –
e a multiplicação de ecrãs mudaram a relação que os indivíduos esta-
(N=2000) belecem com aquela prática cultural, quer do ponto de vista dos

172 173
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

conteúdos lidos, quer relativamente ao modo como se lê, tornou- leitores de livros (impressos ou digitais).13 No que respeita aos resul-
-se desejável, nos anos mais recentes, a tentativa de reformulação tados do Inquérito que informam sobre os géneros de jornais mais
do conceito de leitor total, doravante associável «a todos os indiví- lidos pelos portugueses (gráfico 4.14), o destaque vai, claramente,
duos que, lendo em papel, efetivamente leem ou já leram livros em para os ‘generalistas/diários’ (74% dos leitores de jornais colocam-
suporte digital (independentemente da forma como o fizeram, via nos entre os mais lidos nos últimos 12 meses), ficando respetiva-
download, em formato imagem, etc.), que ‘diariamente’ leem nas mente, em segundo e terceiro lugares, e a larga distância percentual,
redes sociais e utilizam um motor de busca do tipo Google para se os ‘desportivos’ (28%) e os ‘generalistas/semanários’ (20%). Já os
manterem informados, que todos os dias leem e-mails, que frequen- ‘gratuitos’, ‘temáticos’ e especificamente ‘económicos’ não chegam
temente se dedicam à leitura de jornais digitais, e que fazem tudo a ser de leitura frequente para 10% do conjunto dos leitores de jor-
isso quer no computador (seja ele de secretária ou portátil) quer nais, cabendo aos ‘regionais’ (menos lidos em habitat urbano,14 onde
noutro dispositivo digital móvel, da tablet ao smartphone» (Cardoso existe maior oferta leitural à disposição do público) a captação de um
e Cameira 2015, 258). Não obstante o Inquérito deixar de fora cer- número de consumidores apreciável.
tas questões que garantiriam a verificação cabal dos critérios elenca-
dos,12 e a partir das quais se poderia quantificar mais rigorosamente Gráfico 4.14 – Géneros de jornais mais lidos (em formato impresso
a percentagem de leitores totais portugueses (em moldes que não os ou digital) nos últimos 12 meses (%)
de uma sociologia da leitura pré-Internet), pode, ainda assim, afir-
mar-se com segurança que é praticamente nulo (0,4% da amostra
total de inquiridos) o valor relativo aos indivíduos com 15 ou mais
anos que leram nos últimos 12 meses, pelo menos com periodicidade
semanal, e cumulativamente, os três tipos de publicações impressas
(livros, jornais e revistas), além de jornais digitais e de sites noticio-
sos não ligados a periódicos; indivíduos esses que também leram
livros em formato digital, e que são utilizadores de Internet, a que
habitualmente acedem através de um dispositivo fixo e/ou móvel.
No quadro deste reequacionamento tipológico, quando se procura
apurar um determinado perfil de leitores parcelares (por exemplo,
todos os que cumprem os requisitos anteriormente referidos à exce-
ção da leitura de revistas e jornais em formato impresso – apenas
2% dos inquiridos cabem nesta categoria), constata-se que mesmo
(N=1038)
o contingente de indivíduos que praticam regularmente a leitura de
forma não tão omnívora (combinada, sim, nos planos impresso e
digital, mas sem que se adira a todos os tradicionais suportes de
cada um desses domínios) é, realmente, ínfimo entre a população
13
Realce-se, no entanto, que a grande maioria dos inquiridos que afirmaram
ter lido jornais nos últimos 12 meses, fossem eles impressos ou digitais, não leram
portuguesa. livros neste último formato ao longo do período em causa (ao nível da leitura de
Mas não se descure a caracterização da leitura de jornais e revis- livros em papel, a maioria dos leitores de jornais fê-lo). No que toca à leitura de
tas que, quando diária, adquire maior protagonismo entre os grandes revistas, só entre os que as leram em formato impresso foi possível identificar uma
maioria de não-leitores de livros (neste caso, digitais).
14
É nas regiões ‘Açores’ (47%), ‘Alentejo’ (37%) e ‘Centro’ que se encontram
mais adeptos da leitura de jornais ‘regionais’. Em ‘Lisboa’ e no ‘Norte’ os valores
12
Nomeadamente, a questão relativa à leitura nas redes sociais online. são, respetivamente, de 7 e 12%.

174 175
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Enveredando por um exercício análogo àquele gizado para os Tabela 4.5 – Distribuição de géneros de jornais (em formato
géneros de livros lidos, isto é, detalhando os atributos dos seus impresso ou digital) lidos com mais frequência nos
diferentes públicos-ledores, interessa por exemplo assinalar, em últimos 12 meses, por variáveis de caracterização
sociográfica, face à amostra total (%)
consonância com os dados da tabela 4.5, que a leitura de jornais
‘desportivos’ é uma prática fortemente masculinizada (45% versus
4%), sendo comparativamente mais as mulheres leitoras de perió-
dicos ‘regionais’ e ‘gratuitos’. A diferenciação entre os sexos está
longe de ser vincada no que se reporta aos restantes tipos de jornais.
Por outro lado, notam-se variações etárias merecedoras de referên-
cia: repare-se que é entre os indivíduos com idade mais avançada
(dos 55 anos em diante, designadamente) que é mais frequente a
leitura de jornais ‘regionais’, precisamente o contraponto do que
ocorre com os ‘gratuitos’, que têm maior incidência no escalão
15-24. Ao nível dos ‘generalistas/diários’, fica patente que é entre
os mais jovens (15-24) que a mobilização para a sua leitura é menor
(63%), crescendo depois substancialmente nas duas faixas etárias
seguintes, com indivíduos até aos 44 anos. Percebe-se também que
os jornais ‘temáticos’ (onde se integram os de natureza cultural)
são objeto de leitura mais assídua entre os adolescentes e jovens
adultos, ou que os ‘desportivos’ tendem a ser menos consumidos
na segunda metade, mais velha, do arco etário. Em termos do grau
de escolaridade, diga-se que quanto maior ele é, mais frequente se Nota: GE e PL = Grandes empresários e profissionais liberais; PE e Com. = Pequenos empre-
torna a leitura de géneros como os ‘generalistas/semanários’, os sários e comerciantes; Técn. e Esp. = Técnicos e especialistas; Oper. = Operários; Gest. =
‘económicos’ ou os ‘temáticos’. Já os jornais ‘desportivos’, ao invés, Gestores; E. Escrit. = Empregados de escritório; Prof. Sociocult. = Profissionais sociocultu-
rais; Trab. Seviços = Trabalhadores dos serviços
recrutam sobretudo leitores entre os indivíduos que atingiram uni- (N=1038)
camente o 3.º ciclo (33%) ou até menos (31%), decrescendo pau-
latinamente a sua leitura nos outros patamares de escolaridade. Se a
leitura de jornais ‘gratuitos’ tem comparativamente menor penetra- triplo da que cabe aos leitores incluídos no grupo dos trabalhadores
ção entre quem detém o ensino superior, a de ‘generalistas/diários’ dos serviços – 14%). Os jornais ‘económicos’ são consumidos pre-
não varia no sentido de ser tanto mais praticada quanto mais elevada ferencialmente por profissionais socioculturais (15%), empregados
é a instrução. de escritório (13%), gestores, bem como por técnicos e especialistas
Imediatamente salta à vista, quando se traz à equação a situa- (11% em ambas as categorias), com os ‘gratuitos’ a terem mais leito-
ção socioprofissional dos leitores de jornais, que os ‘generalistas/ res frequentes entre os trabalhadores dos serviços e os profissionais
diários’ são lidos com mais frequência pela maioria dos efetivos de socioculturais (11%). Comparativamente, é entre os grandes empre-
cada categoria, pese embora tenham menos adeptos entre os grandes sários e profissionais liberais, mais inclinados para a leitura de jornais
empresários e profissionais liberais (58%) e os gestores (65%). Os ‘temáticos’ (13%), que os leitores de ‘generalistas/semanários’ têm
‘desportivos’ são o único género em que o operariado tem a prima- maior protagonismo (38%), género que também ocupa, regular-
zia em matéria de recrutamento de leitores (43%, mais do dobro da mente, cerca de um terço ou mais dos leitores pertencentes às cate-
percentagem associada aos profissionais socioculturais – 21% – e o gorias dos profissionais socioculturais (36%) e dos gestores (32%).

176 177
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Profissionais socioculturais e pequenos empresários e comerciantes t­ ambém identificadas, como sendo das mais lidas, por 14% dos res-
são os grupos com maior incidência de leitores frequentes de jornais pondentes.
‘regionais’. Veja-se, agora, em jeito panorâmico, algumas das característi-
E no que concerne ao consumo de revistas, o que se conclui (grá- cas dos leitores de revistas consoante os diferentes géneros lidos.
fico 4.15)? Primeiro que tudo, que as mais lidas são as de ‘interesse A tabela 4.6 revela, por exemplo, que certos tipos de revistas ten-
geral’ (28%), seguindo-se as ‘femininas’ e os ‘guias TV’ (22%), as dem a ser quase exclusivamente lidos por indivíduos do sexo mascu-
‘revistas de jornais’ (21%) e as de ‘entretenimento’ (19%). Em sen- lino (‘desporto/automóveis’, ‘computadores e eletrónica’), havendo
tido contrário, há géneros cuja leitura é francamente escassa, tais também casos em que acontece o oposto (‘mexericos/celebridades’,
como ‘vídeo/cinema’ (apenas 4% dos leitores de revistas o deram ‘crianças e adolescentes’), para já não salientar aquelas publicações
como um dos mais lidos no último ano), ‘masculinas’, ‘banda dese- cujo público-alvo é, declaradamente, de um só género (as revistas
nhada’ e ‘crianças e adolescentes’, nenhum deles ultrapassando ditas ‘masculinas’ e ‘femininas’). Todavia, a diferenciação entre os
os 2%. Captando um número intermédio de leitores, destaque-se sexos manifesta-se também nas práticas de leitura de vários outros
o papel que cabe às revistas de ‘desporto/automóveis’ (15%), de géneros de revistas: as de ‘temas políticos, filosóficos ou religiosos’,
foro ‘técnico ou científico’ (14%) ou de ‘mexericos/celebridades’, de âmbito ‘técnico ou científico’, de ‘interesse geral’, de ‘entrete-
nimento’, sobre ‘cultura/arte/antiguidades/livros…’ ou ‘dinheiro/
finanças’ são sobretudo lidas por homens, ao passo que os ‘guias
Gráfico 4.15 – Géneros de revistas mais lidas (em formato impresso
TV’ têm maior recetividade junto das mulheres (29% das leitoras de
ou digital) nos últimos 12 meses (%)
revistas declararam tê-las lido com frequência no último ano, mais
do dobro do valor apurado para o homens – 12%).
No capítulo da idade, torna-se evidente o sentido da variação da
leitura de certos géneros de revistas: as de cariz ‘técnico ou científico’
e as de ‘desporto/automóveis’ são sobretudo lidas nos escalões mais
jovens, perdendo leitores à medida que se progride para as faixas mais
velhas. Se as revistas de ‘música’, de ‘vídeo/cinema’ e de ‘entreteni-
mento’ recrutam comparativamente mais leitores na faixa dos 15 aos
24 (idades onde é menos habitual ler-se ‘revistas de jornais’), a lógica
inversa pode ser encontrada ao nível das de ‘mexericos/celebridades’,
lidas com mais frequência entre os indivíduos com 55 ou mais anos.
Ainda neste capítulo, refira-se que as de ‘interesse geral’ são sobretudo
consumidas por quem tem entre 25 e 44 anos, ou que os ‘guias TV’ são
objeto de leitura tanto mais frequente quanto mais avançada é a idade.
É claro que, segundo a escolaridade, demais variações podem ser
sublinhadas. Tal como se verificara para os livros do mesmo género,
as revistas de carácter ‘técnico ou científico’ e as de ‘cultura/arte/
antiguidades/livros…’ – assim como as de ‘interesse geral’, bem
entendido –, mostram mais elevadas percentagens de leitores nos
escalões médio-alto de instrução, situação radicalmente distinta da
que envolve as revistas ‘femininas’ (15% dos seus leitores ­alcançaram
(N=695) o ensino superior versus os 34% que não atingiram o 3.º ciclo), de

178 179
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

‘mexericos/celebridades’ ou mesmo os ‘guias TV’, todas com maior profissionais liberais (13%). Ou que as revistas de ‘interesse geral’
incidência de leitura entre os que possuem fracas qualificações esco- encontram um maior contingente de leitores entre os efetivos das
lares. No caso das revistas de ‘entretenimento’, suporte por excelên- categorias gestores (46%) e técnicos e especialistas (44%), só se lhe
cia da cultura massificada, são os indivíduos com o 3.º ciclo os que dedicando com mais frequência 22% dos trabalhadores dos serviços.
mais recorrentemente as leem. Por seu turno, técnicos e especialistas compõem o grupo socioprofis-
Para fecho de incursão, afirme-se que os ‘guias TV’ são muito sional onde tem maior peso a leitura de revistas de ‘música’ (19%) e de
mais lidos por trabalhadores dos serviços (36%) e operários (31%) do ‘computadores e eletrónica’ (25%). Como seria de prever, as revistas
que por profissionais socioculturais (12%) ou grandes ­empresários e de teor ‘técnico ou científico (ciências exatas ou sociais e humanas)’
recrutam leitores sobretudo entre os técnicos e especialistas (33%),
os profissionais socioculturais (29%) e os grandes empresários e pro-
Tabela 4.6 – Distribuição de géneros de revistas (em formato impresso
fissionais liberais (27%) – trata-se de um género de publicação que
ou digital) lidos com mais frequência nos últimos
12 meses, por variáveis de caracterização sociográfica, só é consumido preferencialmente por 6% de inquiridos incluídos
face à amostra total (%) na categoria do operariado, provavel-
mente especializado. Adiante-se tam-
bém que as revistas ‘femininas’, tendo
nas suas fileiras leitores que pertencem
principalmente aos grupos constituídos
por trabalhadores dos serviços (31%),
operários (26%) ou pequenos empre-
sários e comerciantes (24%), denotam
um consumo não negligenciável junto
dos profissionais socioculturais ou dos
gestores (19%). É entre os trabalhado-
res dos serviços (31%) e, depois, entre
os empregados de escritório (17%), que
é mais significativa a leitura de revistas
ditas cor-de-rosa (‘mexericos/celebrida-
des’), que só recrutam 5% de leitores
inclusos na categoria dos profissionais
socioculturais. Das de ‘cultura/arte/
antiguidades/livros…’, diga-se que a
sua leitura é pouco privilegiada entre
os empregados de escritório (2%), os
trabalhadores dos serviços (5%) e os
pequenos empresários e comerciantes
(9%), em claro contraste com o que
Nota: GE e PL = Grandes empresários e profissionais liberais; PE e Com. = Pequenos empre- (N=695) sucede entre os grandes empresários e
sários e comerciantes; Técn. e Esp. = Técnicos e especialistas; Oper. = Operários; Gest. = profissionais liberais (33%) e os gesto-
Gestores; E. Escrit. = Empregados de escritório; Prof. Sociocult. = Profissionais sociocultu-
rais; Trab. Seviços = Trabalhadores dos serviços. res (19%).

180 181
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Leituras específicas do espaço digital também a construir-se no espaço virtual da Web, ao mesmo tempo
que se escreve e lê, substituindo essa visão que remonta aos séculos
É certo, como ficou já explanado neste capítulo, que, de 2007 xviii/xix e segundo a qual tal perfil de indivíduo estava preso à pala-
para 2020, não se registou, em Portugal, uma evolução positiva vra noticiosa em papel (Portela 2003, 51-52), confundindo-se, tout
quanto à leitura de livros (impressos).15 Mais se diga: o presente court, com a figura do leitor de jornais, modalidade democratizadora
Inquérito revelou que um terço dos portugueses inquiridos (33%) do impresso (Darnton 2011, 143). Se bem que o Inquérito não tenha
não leu, cumulativamente, nos últimos 12 meses, nenhum dos três auscultado acerca da(s) leitura(s) que ocorre(m) particularmente nas
suportes (livros, jornais e revistas), nos formatos impresso ou digi- redes sociais online – e são elas que abrem portas para a massificação
tal. Perante estes dados, e tendo em consideração que em 2015 se da leitura digital, por vezes de feição mais deambulante, acidental,
concluíra que «a leitura em Portugal tende a generalizar-se, que a lei- célere mas, ainda assim, leitura; «nas redes sociais lê-se mais, há mais
tura de livros parece atravessar um período de retrocesso após 2007 gente a escrever, desencadeiam-se também processos de comentá-
– período coincidente com a aguda crise económica – quando até aí rio», aí se dá a «rápida circulação dos mais variados tipos de tex-
os estudos mostravam avanços significativos nos índices de leitura, tos (no limite, é incontrolável onde vai parar o que se escreve, alvo
o que mostra a fragilidade da ‘emergente’ ou ‘inacabada’ cultura de de sucessivas partilhas ou redistribuições por diferentes grupos de
leitura portuguesa» (Neves 2015, 83), interessará averiguar também internautas)» (Cameira e Cardoso 2015, 21) –, o gráfico 4.16 permite
com que frequência levam os portugueses a cabo, no ambiente digi- constatar que metade ou mais destes indivíduos utilizam a Internet
tal, outras práticas leiturais que não as que giram em torno da cultura para atividades que implicam o exercício da leitura, mesmo se não na
do objeto impresso (Chartier 1998), dos tradicionais tipos de publi- sua dimensão erudita ou de fruição estética (a leitura comum ou nor-
cações, sabendo-se da influência transformadora que a Internet tem mal de que fala Robert Darnton), seja para «procurar informações
nesse domínio (Cameira e Cardoso 2015), na(s) leitura(s) que hoje precisas – significado de palavras, factos históricos, etc.» (65%), seja
se faz(em). É que, conforme sustentou Olivier Donnat, não é possí- com o intuito de «procurar informação sobre livros, música, cinema
vel ignorar que «a leitura como atividade […] está sujeita […] a uma e espetáculos» (50%). Tratando-se de práticas de leitura transversais
concorrência acrescida devido à emergência de novos usos do tempo à generalidade da população portuguesa utilizadora da Internet (pese
livre e do incremento da cultura do ecrã» (2011, 39). embora sejam tendencialmente mais frequentes entre os mais esco-
Com efeito, e como demonstra o gráfico 4.16, uma larga maioria larizados e os mais jovens),16 não se deixe igualmente de referir que
dos utilizadores da Internet (71%) socorre-se dela para a leitura de 43% recorrem a ela ‘para ler na Wikipédia ou outras enciclopédias
sites noticiosos não vinculados a jornais ou revistas (29% fizeram-no online’ (cerca de 16% declararam envolver-se nessa tarefa ‘uma ou
‘diariamente’ e 25% ‘uma ou várias vezes por semana’, mas não todos várias vezes por mês’, ao passo que 13% assumiram fazê-lo sema-
os dias). O facto de a maior parte dos portugueses não ter lido jor- nalmente), sendo substancialmente mais baixas as percentagens dos
nais (ou livros ou revistas) no último ano não anula, portanto, a vali- que leem/escrevem em blogues ou dos que praticam a leitura (e/ou
dade da ideia de que o sujeito informado – «o cidadão que pretende a escrita) em sites que comportam a produção crítica/avaliativa sobre
estar bem informado» e que «por essa […] razão tem de formar uma este ou aquele assunto.
opinião razoável e procurar informação» (Schütz 1946) – passou Se são vários os autores que assinalam a hodierna omnipresença
da palavra escrita, e o surgimento de novos leitores (Vandendorpe
15
A percentagem de portugueses (dados de 2020) que afirmaram ter lido pelo 2008; Hayles 2010), muitos deles familiarizados, em diversos graus,
menos um livro impresso nos últimos 12 meses (39%) perde inclusivamente para com uma experiência de leitura que se transfigurou, lato sensu, «num
a apurada, em 2011, nas Estatísticas Culturais da União Europeia: 41% (Eurostat
2016, 117), valor que apenas suplanta os que aí são apresentados para dois países,
Turquia (31%) e Roménia (30%), ambos com um indicador de PIB per capita infe- 16
Essas as duas variáveis (escolaridade e idade) de maior pendor explicativo no
rior ao de Portugal. que diz respeito às práticas de utilização da Internet.

182 183
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Gráfico 4.16 – Utilização da Internet para as seguintes atividades as indicações fornecidas por indivíduos dos seus círculos de pro-
específicas que envolvem a leitura (%) ximidade (familiares, amigos, colegas de trabalho), mostrando-se
as mulheres mais recetivas do que os homens (50% versus 44%) a
seguir as sugestões que emanam da sua teia relacional. Note-se que,
independentemente da idade ou do nível de escolaridade, é esta a
fonte de recomendações ou ideias de leitura que os portugueses mais
prezam. De qualquer modo, ponderada a situação socioprofissional
dos inquiridos, saliente-se que é entre os que pertencem à categoria
dos gestores que essa fonte de informação é mais valorizada, por
62%, contra os 21% de grandes empresários e profissionais liberais
que o assinalam (nos restantes grupos, são entre 43 e 53% os que
leem em função dessas recomendações).
Surgem depois num mesmo plano, mas orientando as práticas
de leitura de uma muito menor percentagem de indivíduos, outras
três fontes de informação: ‘a exposição nas prateleiras de uma livra-
ria a que se foi’ (17%), os ‘comentários publicados por amigos em
(N=1418)
redes sociais’ (16%) e a ‘crítica de livros em jornais ou revistas’
(16%). Ora, a crítica especializada, mais reconhecida pelos homens
autêntico kit de estratégias de receção variadíssimas, que têm como (18%) do que pelas mulheres (15%), é um critério tanto mais
marco um ecrã todo-poderoso» (De La Flor 2004, 91), é inapro- mediador das leituras realizadas quanto maior o grau de instrução
priado pensar-se que só se dedica à leitura quem lê os textos encer- dos inquiridos: 32% dos que atingiram o ensino superior identifica-
rados nos convencionais suportes do livro, do jornal ou da revista.
Aliás, e em abono desta premissa, convém realçar que mesmo entre
os não-leitores cumulativos (ou seja, entre os que afirmaram não ter Gráfico 4.17 – Fontes de informação através das quais se obtém
lido livros, jornais e revistas nos 12 meses anteriores à aplicação do recomendações/ideias de leitura (%)
Inquérito) foram detetadas práticas leiturais, no meio digital, que
importa referenciar: a maioria desses não-leitores (55%) leu sites de
notícias (22% ‘diariamente’ e outros 22% ‘uma ou várias vezes por
semana’); 44% acederam à Internet a fim de ‘procurar informações
precisas – significado de palavras, factos históricos, etc.’ (22% ‘uma
ou várias vezes por mês’) e um quarto deles (25%) com o objetivo
de ‘procurar informação sobre livros, música, cinema e espetáculos’.

Recomendações de leitura e socialização leitural na família

Em boa verdade, a partir de que fontes de informação obtêm


os portugueses recomendações ou ideias de leitura? Como eviden-
cia o gráfico 4.17, são destacadamente privilegiadas para esse efeito (N=1340)

184 185
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

ram-no, ao passo que só 7% dos que têm menos do que o 3.º ciclo da família17 ou, inclusivamente, de um conjunto de práticas exo-
o fizeram também. É sobretudo entre os que estão incluídos nos domiciliares como idas a feiras do livro, livrarias ou bibliotecas
intervalos etários 25-34 e 35-44 que esta fonte de recomendações (gráfico 4.18).
tem mais pregnância, assim como nos que pertencem aos grupos Sublinhe-se, porém, que no escalão etário 15-24 são em maior
dos grandes empresários e profissionais liberais (42%) e dos profis- número os que tiveram pais ou outros familiares lendo-lhes histórias
sionais socioculturais (27%), por contraste com o que sucede com ‘frequentemente’ ou ‘algumas vezes’ do que ‘raramente’ ou ‘nunca’.
os trabalhadores dos serviços (12%) ou com os operários (9%).
Quanto aos comentários publicados por amigos em redes sociais,
Gráfico 4.18 – Frequência com que, na infância e adolescência
e comparando com a crítica de livros difundida em periódicos, são
(até aos 15 anos), os seus pais ou outros familiares
valorizados quase em igual medida por homens e por mulheres responsáveis por si lhe liam histórias, ofereciam livros
(respetivamente, 15% e 16%), mas tendem a receber maior aten- e iam a feiras do livro, livrarias ou bibliotecas (%)
ção junto de uma população ainda mais jovem – 11% dos que têm
entre 15 e 24 anos indicam a crítica especializada como fonte de
recomendações de leitura, subindo o valor para 25% quando o que
está em jogo são os comentários publicados por amigos em redes
sociais. Profissionais socioculturais (18%) e grandes empresários
e profissionais liberais (21%) contam com um menor número dos
seus efetivos privilegiando as recomendações ou ideias de leitura
obtidas por esta via.
Ainda mantendo o gráfico 4.17 sob foco, não se deixe de reparar
que as funções de aconselhamento (sobre o que ler) tradicional-
mente adstritas a profissionais como o livreiro ou o bibliotecário
tendem, em termos comparativos, a ser pouco consideradas, nomea-
damente entre os portugueses que possuem menores qualificações
escolares.
Num outro registo, que remete para o papel que a célula fami- (N=1340)
liar, enquanto coletivo social, desempenha, até ao período da ado-
lescência, na aproximação (ou não) dos portugueses ao universo do 17
Se é inquestionável que «todos os estudos disponíveis confirmam a fortíssima
correlação entre condição social e consumo cultural. Mostram, em particular, que
livro e da leitura (o contexto familiar como força atuante, influen-
este consumo, tende a ser mais regular e intenso entre os grupos detentores de mais
ciando, de maneira mais ou menos direta, por omissão ou incen- elevados diplomas escolares; entre os grupos socioprofissionais de actividade téc-
tivação quotidiana, as disposições que se criam para a leitura), o nica, científica e liberal; e entre os jovens, designadamente, os estudantes do ensino
Inquérito permite chegar ao conhecimento de alguns dados inte- superior», assim como é verdade que «a população […] viveu, em geral, uma trans-
ressantes. Se revela que quanto mais jovem se é, e quanto mais ele- lação para cima, no espaço social; [pelo que] serão […] frequentes trajectórias de
mobilidade ascendente» (Silva et al. 2000, 10; 13), não se afigura estranho que seja
vadas as qualificações académicas dos pais, maior é a probabilidade entre os que pertencem às categorias socioprofissionais dos operários e dos traba-
de se ter usufruído, na infância e na adolescência, de experiências lhadores dos serviços onde se encontram maiores contingentes de indivíduos que
de contacto com o mundo do livro e da leitura espoletadas pelos ‘nunca’ usufruíram, até aos 15 anos, quer da oferta de livros (respetivamente, 70% e
progenitores ou por outros familiares, importa frisar que a maio- 54%), quer da leitura de histórias por parte da família (respetivamente, 73% e 62%).
Por sua vez, são principalmente os que hoje se inserem nos grupos dos profissionais
ria dos inquiridos ‘raramente’ ou ‘nunca’ desfrutou, até aos 15
socioculturais e dos grandes empresários e profissionais liberais os que afirmam ter
anos de idade, da leitura de histórias e da oferta de livros por parte tido, ‘frequentemente’, experiências de contacto com os bens culturais em questão.

186 187
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

O mesmo é válido quanto à oferta de livros, com idêntica manifesta- tencionam ler. Já entre os motivos que justificam a ida a bibliotecas
ção no escalão dos 25-34 anos. Entre outras razões, estes resultados, ou arquivos, emerge, com especial destaque (isto é, referida por 44%
permitindo entrever um potencial sinal de mudança, podem explicar- dos frequentadores), a necessidade de ‘estudar/trabalhar’, seguindo-
-se pelo facto de os jovens de hoje terem pais mais escolarizados do -se os objetivos de ‘pesquisar no catálogo da biblioteca e requisitar
que os de gerações mais velhas e, por consequência, mais sensíveis ao livros, revistas ou jornais’ (28%); de ‘ler, no local, livros, jornais ou
valor cultural da leitura. revistas’ (21%); ou de se dirigirem aos ditos equipamentos a fim de
‘acompanhar um filho ou outro familiar’ (13%).
Convirá acrescentar, à laia de comparação, que tanto em Espa-
Sobre a frequentação de bibliotecas ou arquivos nha (23%) como em França (27%) os valores relativos à utilização
e algumas práticas culturais do âmbito do livro e da leitura de bibliotecas pelas respetivas populações são mais elevados do que
antes e após o início da pandemia aquele que se aplica a Portugal (20%).18 Todavia, por cá, e tal como
no país vizinho, a frequentação desses equipamentos é sobretudo
No que toca ao(s) regime(s) de frequência de bibliotecas ou levada a cabo por mulheres, é mais recorrente entre os que detêm o
arquivos (gráfico 4.19), e tendo por referência os 12 meses anteriores ensino superior, e principalmente determinada por razões de estudo
ao início da pandemia, assinale-se que 80% dos portugueses nunca os ou de requisição de livros. Se, na sociedade portuguesa, os frequen-
visitaram nesse período. Entre os que não realizaram qualquer visita tadores mais assíduos de bibliotecas ou arquivos (os que admitiram
presencial, a larga maioria (79%) apresenta como principal razão para tê-lo feito ‘uma vez por semana ou mais’) assumem maior peso rela-
essa ausência o não ter necessidade de frequentar tais equipamentos, tivo na faixa mais jovem da distribuição etária – dos 15-24 (8%) –, é
sendo que 17% declaram arranjar, por outros meios, os materiais que também este o único escalão onde existe uma minoria de indivíduos
(48%) que ‘nunca’ se deslocou a espaços bibliotecários ou arquivos
no último ano. Por conseguinte, em consonância com as realidades
Gráfico 4.19 – Frequência com que, nos 12 meses anteriores ao início de França (Lombardo e Wolff 2020, 41-43)19 e Espanha (MCUD
da pandemia, se deslocou a bibliotecas ou arquivos (%) 2019, 45), os frequentadores de bibliotecas ou arquivos são, em Por-
tugal, privilegiadamente recrutados entre os indivíduos com idades
até aos 24 anos, o que parece denotar um possível efeito da condição
estudantil.
Mas os dados do Inquérito possibilitam igualmente que se con-
clua o seguinte: que o acesso a bibliotecas ou arquivos digitais se
consubstancia, também ele, como prática ultraminoritária, no caso,
entre os internautas portugueses. É que 80% deles afirmam ‘nunca’
realizar essa atividade quando se ligam à Internet (só 1% o fazem
18
Em Espanha, 23% acederam presencialmente a bibliotecas nos 12 meses ante-
riores à realização do inquérito do MCUD (2019, 45), e 10% através da Internet. Ao
contrário do Inquérito ICS-FCG e do Enquête sur les pratiques culturelles (2018),
que não destrinçam as visitas a bibliotecas e a arquivos, o inquérito espanhol chega
a um valor de frequentação destes últimos (por 7% de espanhóis, no último ano).
19
Acerca dos dados (reportados a 2018) de frequentação de bibliotecas em
França, vide https://www.culture.gouv.fr/Sites-thematiques/Etudes-et-statistiques
/L-enquete-pratiques-culturelles/L-enquete-2018/Generations-tous-les-resultats-
(N=266) de-l-enquete-2018/Bibliotheques.

188 189
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

‘diariamente’, enquanto 8% se dedicam a tal ‘uma ou várias vezes que a sua visita a sites de bibliotecas e arquivos aumentou em virtude
por ano’). Na mesma linha, 79% declaram ‘nunca’ procurar informa- da pandemia.
ção sobre bibliotecas ou arquivos nas suas deambulações online (1%: Quanto à leitura de livros, jornais e revistas online, recrudesceu
‘diariamente’; 10%: ‘uma ou várias vezes por ano’). para uma maior percentagem de internautas: 12% (49% manteve o
Dirigido o olhar para o campo offline, mas ainda tendo em conta uso e 37% não usou ou deixou de usar a Internet para esse efeito).
os 12 meses que antecederam o deflagrar da pandemia, atente-se que No que concerne à caracterização dos que passaram a dedicar-se
uma larga maioria de inquiridos ‘nunca’ esteve presente nos eventos mais àquelas leituras, incremento que teve praticamente o mesmo
literários que se listam em seguida: ‘feiras do livro’ (71%); ‘festivais impacto entre mulheres (13%) e homens (12%), interessa realçar
literários’ (95%); ‘festivais de ilustração e de BD’ (97%); ‘clubes do que foram sobretudo os mais jovens, até aos 24 anos (22%), os que
livro e tertúlias’ (97%). Especificamente no que se refere aos não- passaram a usar mais a Internet para ler aquelas publicações, bem
-frequentadores de feiras do livro, e apesar de a diferenciação entre como indivíduos com um grau de instrução superior (21%, versus
os sexos não ser aí cavada, há mais homens do que mulheres a não os 2% com menos do que o 3.º ciclo). Novamente, foi entre os uti-
participar (73% versus 69%). Os menos escolarizados são maiorita- lizadores de Internet dos grupos técnicos e especialistas (18%) e
riamente não-participantes (91% dos que têm menos do que o 3.º profissionais socioculturais (18%) que se encontrou um maior con-
ciclo ‘nunca’ visitaram esses certames no período em causa) face tingente de indivíduos intensificando as referidas leituras.
aos 47% de indivíduos com grau de instrução superior em idêntica Por aqui se vê, ao obter-se informação empírica sobre práticas
situação. É no escalão etário dos 65 ou mais anos que se encontra a culturais num contexto de exceção como o que foi suscitado pela
maior proporção de não-frequentadores de feiras do livro (85%; a pandemia, que não se deve abordar a realidade da leitura em Portugal
percentagem baixa para 59% para os que têm entre 35 e 44 anos), menosprezando a convivência entre modelos, ou seja, descurando
assim como entre os que pertencem às categorias socioprofissionais que a esfera digital é também ela aproveitada, se bem que por um
do operariado (86%) e dos trabalhadores dos serviços (79%). grupo minoritário de internautas, com um determinado perfil, para
Cabe agora perguntar se a conjuntura pandémica, que levou um consumo leitural que, consoante as circunstâncias, até pode tor-
ao encerramento de equipamentos e a uma limitação de circula- nar-se mais recorrente, e sem implicar necessariamente um afasta-
ção impeditiva de concretizar certas práticas culturais nos moldes mento de partida face às tradicionais leituras de suportes impressos
habituais (em especial, as que pressupunham a saída do universo (refira-se, por exemplo, que 71% dos que responderam ter passado,
doméstico), produziu alterações quer do ponto de vista do acesso com o início da pandemia, a ler mais livros, jornais e revistas online
a sites de bibliotecas ou arquivos, quer ao nível da leitura de livros, são leitores de livros em papel).
jornais ou revistas em formato digital. Para estas interrogações, que
respostas fornece o Inquérito? Que só uma ínfima minoria de inter-
nautas (4%) se abalançou, após o início da pandemia, a utilizar mais Considerações finais
a Internet para visitar sites de bibliotecas e arquivos (45% manteve
o uso e 50% não usou ou deixou de usar com esse propósito). Os Não sendo exaustivo, o retrato multidimensional das práticas
poucos que afirmaram ter passado a dedicar-se mais a essa atividade de leitura a que se procedeu ao longo destas páginas, chamando a
envolvem 4% dos inquiridos de ambos os sexos e denotam mais atenção para um conjunto de variáveis causais, ou melhor, para um
peso nas faixas etárias 15-24 (6%) e 55-64 (5%), nos diplomados do jogo de determinações pela instrução, pela idade, pelo género ou
ensino superior (6%) e entre os técnicos e especialistas (9%) e os pela classe socioprofissional, permitiu, entre outros aspetos, com-
profissionais socioculturais (6%). Ainda assim, porque repartidos provar que os públicos-leitores do clássico tridente de publicações
em matéria de perfil socioprofissional, 2% de inquiridos pertencen- (livros, jornais e revistas, nas versões em papel ou eletrónica) con-
tes ao operariado e 3% dos trabalhadores dos serviços declararam tinuam a ser minoritários entre os portugueses com 15 ou mais

190 191
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

anos, e isto mais de uma década decorrida sobre o lançamento de lização da Internet não deixou de crescer também de forma relevante
uma relevante medida de política pública como o Plano Nacional entre as gerações mais velhas e menos qualificadas, [o que obriga a
de Leitura, apostado, nas suas diferentes etapas e diretrizes,20 em considerar que] a sociedade em rede, enquanto nova modalidade de
tornar mais robusta a cultura de leitura em Portugal. É, pois, caso organização social e tecnológica, tem impulsionado e tornado parti-
para questionar se, na ausência desta iniciativa, o panorama não cularmente decisiva a capacidade cultural e cognitiva dos indivíduos
seria mais desanimador. de adaptação às novas tecnologias e ao constante processamento de
No entanto, perspetivando o futuro e os desafios de intervenção informação em contextos quotidianos» (Cardoso et al. 2015, 139).
que se levantam, há decerto que tirar ilações prometedoras a partir Precisamente por isso, e apesar de algumas práticas assumirem, em
de um dos resultados saídos deste Inquérito sociológico: se a maior 2020, valores mais baixos do que em anos anteriores (as que dizem
parte dos inquiridos não beneficiou, na sua infância e adolescên- respeito ao consumo de livros impressos, por exemplo), não é sem
cia, de estímulos à leitura gerados no seio da constelação familiar, fundamento que se termina esta reflexão admitindo a hipótese de
a análise empreendida demonstra serem os mais jovens e aqueles que, em Portugal, a atividade da leitura, independentemente do teor
cujos pais têm ou tinham qualificações académicas superiores os e da extensão dos textos lidos, dos veículos em que estão assentes e
que reconhecem, com mais frequência, esse apoio ou condição favo- das motivações que possam estar associadas ao ato de ler, não experi-
recedora da prática leitural. O que, a bem dizer, tanto revela a per- menta um retrocesso por comparação com a realidade de há mais de
sistência de assimetrias sociais na criação de hábitos de leitura como uma década (data de 2007 o último grande inquérito especificamente
indicia um processo de mudança, ainda que lento. Tendo os jovens centrado nas práticas de leitura dos portugueses).
de hoje, por força da dinâmica de recomposição social, pais mais
escolarizados do que os das gerações mais velhas e, por isso mesmo,
mais sensíveis à importância do ato de ler (Paulo Freire), adquire
evidência empírica um poderoso elo de transmissão geracional: a
democratização do acesso à educação potencia ganhos culturais nas
gerações sucessoras.
Ora, cada país conta com a sua diversidade de leitores: do jovem
estudante ao apaixonado pelos livros, passando pelo adulto recém-
-alfabetizado ou pelo reformado que se limita à consulta diária do
jornal desportivo ou regional que encontra no balcão do café…, indi-
víduos que leem diferenciadamente consoante o seu perfil social, os
momentos do ciclo de vida, os contextos em que se movem e as
tecnologias que usam. E que realizam ou não, e que prolongam ou
não, as suas leituras aquando do acesso à Internet. Se algumas destas
foram aqui examinadas, cabe a estudos ulteriores o aprofundamento
analítico, estruturado em torno de um mais amplo leque de questões
(focadas, em particular, nas redes sociais), dessa plural leitura digital
«escondida sob a capa do uso ‘normal’ do computador» (Kopeć et al.
2016, 275) ou de outros dispositivos, nomeadamente porque a «uti-

20
Vide Quadro Estratégico do Plano Nacional de Leitura 2027, disponível em:
https://www.pnl2027.gov.pt/np4EN/file/8/QE.pdf.

192 193
Práticas Culturais dos Portugueses Leitura e frequência de bibliotecas e arquivos no arranque dos anos 20 do séc.
XXI

Referências bibliográficas Freitas, Eduardo de, e Maria de Lourdes Lima dos Santos. 1991. «Inquérito aos
hábitos de leitura». Sociologia – Problemas e Práticas, n.º 10: 67-89.
Freitas, Eduardo de, e Maria de Lourdes Lima dos Santos. 1992. Hábitos de Leitura
Ávila, Patrícia. 2008. A Literacia dos Adultos – Competências-Chave na Sociedade do
em Portugal: Inquérito Sociológico. Lisboa: Publicações Dom Quixote.
Conhecimento. Oeiras: Celta.
Freitas, Eduardo de, José Luís Casanova, e Nuno de Almeida Alves. 1997. Hábi-
Babo, Maria Augusta. 2003. «A experiência da leitura ou a leitura como prática».
tos de Leitura. Um Inquérito à População Portuguesa. Lisboa: Publicações Dom
Trajectos – Revista de Comunicação, Cultura e Educação, n.º 3: 51-60.
Quixote.
Baudelot, Christian, e Marie Cartier. 1998. «Lire au collège et au lycée». Actes de la
Garzón, Álvaro. 1997. La politique nationale du livre. Un guide pour le travail sur le
recherche en sciences sociales, n.º 123: 25-44.
terrain. Paris: Éditions UNESCO.
Bourdieu, Pierre. 1996. Distinction. A Social Critique of the Judgement of Taste. Lon-
Goldin, Daniel. 2006. Los días y los libros. Divagaciones sobre la hospitalidad de la
dres: Routledge.
lectura. Barcelona: Paidós.
Cameira, Emanuel, e Gustavo Cardoso. 2015. «A sociologia da leitura e o (novo)
Hayles, Katherine. 2010. «How We Read: Close, Hyper, Machine». ADE Bulletin,
paradigma digital: uma relação a explorar». In O Livro, o Leitor e a Leitura Digi-
n.º 150: 62-79.
tal, coord. Gustavo Cardoso. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 9-28.
Heinich, Nathalie. 2002. La sociologia dell’arte. Bolonha: Il Mulino.
Cardoso, Gustavo, coord. 2015. O Livro, o Leitor e a Leitura Digital. Lisboa: Fun-
INE (Instituto Nacional de Estatística). 2001. Inquérito à Ocupação do Tempo
dação Calouste Gulbenkian.
1999. Lisboa: Instituto Nacional de Estatística. Disponível em https://www.ine.
Cardoso, Gustavo, António Firmino da Costa, Ana Rita Coelho, e André Pereira.
pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_publicacoes&PUBLICACOESpub_
2015. A Sociedade em Rede em Portugal. Uma Década de Transição. Coimbra:
boui=138463&PUBLICACOESmodo=2&xlang=pt.
Almedina.
Kopeć, Jarosław, Izabela Korys, e Dominika Michalak. 2016. «Digital and Print
Cardoso, Gustavo, e Emanuel Cameira. 2015. «A leitura digital no contexto global
Hybrids». Literature and Society, n.º 2: 262-279.
e nacional: resultados de um inquérito aos leitores digitais em 16 países». In O
Lombardo, Philippe, e Loup Wolff. 2020. Cinquante ans de pratiques culturelles
Livro, o Leitor e a Leitura Digital, coord. Gustavo Cardoso. Lisboa: Fundação
en France. Paris: DEPS/Ministère de la Culture. Disponível em https://www.
Calouste Gulbenkian, 227-269.
culture.gouv.fr/Sites-thematiques/Etudes-et-statistiques/Publications/Collec-
Chartier, Roger. 1997. A Ordem dos Livros. Lisboa: Vega.
tions-de-synthese/Culture-etudes-2007-2021/Cinquante-ans-de-pratiques-cul-
Chartier, Roger. 1998. As Utilizações do Objecto Impresso. Lisboa: Difel.
turelles-en-France-CE-2020-2.
Darnton, Robert. 2011. Apologie du livre. Demain, aujourd’hui, hier. Paris: Galli-
Lopes, João Teixeira. 2016. «Participação sociocultural e mundos digitais: novas
mard.
oportunidades, novos constrangimentos». In Cultura e Digital em Portugal, org.
De La Flor, Fernando R. 2004. Biblioclasmo. Por Uma Prática Crítica da Lecto-Es-
Teresa Duarte Martinho, João Teixeira Lopes e José Luís Garcia. Porto: Edições
crita. Lisboa: Cotovia.
Afrontamento, 183-191.
Dionísio, Eduarda. 1994. «As práticas culturais». In Portugal 20 Anos de Democra-
Lopes, João Teixeira, e Lina Antunes. 2001. Novos Hábitos de Leitura: Análise Com-
cia, coord. António Reis. Lisboa: Círculo de Leitores, 443-489.
parativa de Estudos de Caso. Lisboa: Instituto Português do Livro e das Bibliote-
Donnat, Olivier. 2011. «Lecture, livre et littérature. Évolution 1973-2008». In Lec-
cas e Observatório das Actividades Culturais.
tures et lecteurs à l’heure d’Internet. Livre, presse, bibliothèques, dir. Christophe
Martins, Hermínio, e José Luís Garcia. 2013. «Web». In Portugal Social de A a Z
Evans. Paris: Éditions du Cercle de la Librairie, 27-40.
– Temas em Aberto, org. José Luís Cardoso, Pedro Magalhães e José Machado
Dufays, Jean-Louis. 2005. «Lecture littéraire vs lecture ordinaire: une dichotomie à
Pais. Lisboa: Expresso e Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa,
interroger». In L’expérience de lecture, org. Vincent Jouve. Paris: Éditions L’im-
285-293.
proviste, 309-322.
MCUD (Ministerio de Cultura y Deporte). 2019. Encuesta de Hábitos y Prácti-
Esquenazi, Jean-Pierre. 2006. Sociologia dos Públicos. Porto: Porto Editora.
cas Culturales en España 2018-2019. Madrid: Ministerio de Cultura y Deporte,
Eurostat (Gabinete de Estatísticas da União Europeia). 2016. Culture Statistics.
División de Estadística y Estudios, Secretaría General Técnica. Disponível em
Luxemburgo: Publications Office of the European Union. Disponível em
http://www.culturaydeporte.gob.es/dam/jcr:1712f192-d59b-427d-bbe0-db0f3e
https://ec.europa.eu/eurostat/documents/3217494/7551543/KS-04-15-737-
9f716b/encuesta-de-habitos-y-practicas-culturales-2018-2019.pdf.
EN-N.pdf/648072f3-63c4-47d8-905a-6fdc742b8605.
Melot, Michel. 2012. Livro,. São Paulo: Ateliê Editorial.
Freire, Paulo. 1989. A Importância do Ato de Ler (Em Três Artigos que se Comple-
National Statistics Office. 2012. Culture Participation Survey 2011. Valletta: Unit
tam). São Paulo: Autores Associados e Cortez.
C1 – Demographic, Social and Culture Statistics, National Statistics Office.

194 195
Práticas Culturais dos Portugueses

Neves, José Soares. 2011. «Práticas de leitura da população portuguesa no início do Teresa Duarte Martinho
século XXI». Tese de doutoramento em Sociologia, Lisboa, ISCTE-IUL.
Neves, José Soares. 2015. «Cultura de leitura e classe leitora em Portugal». Sociolo-
gia – Problemas e Práticas, n.º 78: 67-86.
Neves, José Soares. 2016. «Modos de relação com a leitura impressa e digital em
Portugal». In Cultura e Digital em Portugal, org. Teresa Duarte Martinho, João
Teixeira Lopes e José Luís Garcia. Porto: Edições Afrontamento, 193-208.
Parmentier, Patrick. 1988. «Lecteurs en tous genres». In Pour une sociologie de la
lecture. Lectures et lecteurs dans la France contemporaine, dir. Martine Poulain.
Paris: Éditions du Cercle de la Librairie, 125-153.
Passeron, Jean-Claude. 1986. «Le plus ingénument polymorphe des actes culturels: Capítulo 5
la lecture». In Bibliothèques publiques et illettrisme, ed. Claudie Tabet e Marie-
Joseph Buffin. Paris: Ministère de la Culture/Direction du Livre et de la Lecture,
17-22. Círculos ainda estreitos: museus,
PNL (Plano Nacional de Leitura). 2017. Quadro Estratégico Plano Nacional de
Leitura 2027. Lisboa: Plano Nacional de Leitura. Disponível em https://www. monumentos históricos, sítios
pnl2027.gov.pt/np4EN/file/8/QE.pdf.
Portela, Manuel. 2003. O Comércio da Literatura. Lisboa: Edições Antígona.
arqueológicos e galerias de arte
Poulain, Martine. 2011. «La construcción de sí mesmo como lector, con o contra su
família». Perfiles Educativos, XXXIII, n.º 132: 195-204.
Santos, Maria de Lourdes Lima dos. 1992. «O público-leitor e a apropriação do Tão constantes quanto os desígnios de defesa do acesso e pre-
texto escrito». In Percepção Estética e Públicos da Cultura, coord. Idalina Conde. servação do património cultural nas políticas para a cultura têm sido
Lisboa: ACARTE/Fundação Calouste Gulbenkian, 19-29. as atribulações dos museus e outros espaços deste tipo na consoli-
Santos, Maria de Lourdes Lima dos, José Soares Neves, Maria João Lima, e Marga- dação da sua presença e da captação de interesse. De modo a manter
rida Carvalho. 2007. A Leitura em Portugal. Lisboa: GEPE. a identidade fundada no trabalho de conservação, documentação e
Schütz, Alfred. 1946. «The Well-Informed Citizen. An Essay on the Social Distri-
educação, as entidades do património cultural, cruciais na vivência
bution of Knowledge». Social Research, n.º 13: 463-478.
Silva, Augusto Santos, Felícia Luvumba, Helena Santos, e Paula Abreu. 2000. Públi-
do simbólico e na guarda da memória, a que procura salvar o passado
cos para a Cultura, na Cidade do Porto. Porto: Edições Afrontamento e Câmara para servir o presente e o futuro (Le Goff 1984), enfrentam múlti-
Municipal do Porto. plos reptos. Precisam de conseguir reconhecimento e proporcionar
Tengarrinha, José. 1973. A Novela e o Leitor Português. Estudo de Sociologia da Lei- aprendizagens ao longo da vida dos visitantes, assegurando o papel
tura. Lisboa: Prelo Editora. educativo, mediador e emancipador da experiência sem o deixar envie-
UNESCO. 1982. Vers une société de lecture. Objectifs pour les années 80. S/l: s/ed. sar pela lógica da economia da experiência.1 Missão mais exigente
Vandendorpe, Christian. 2008. «Reading on Screen: The New Media Sphere». In num tempo em que o cultural assume presença ubíqua e também
A Companion to Digital Literary Studies, eds. Susan Schreibman e Ray Siemens.
as cidades e territórios se tornam marcas concorrentes, afirmando a
Oxford e Cambridge: Blackwell Publishing, 203-215.
Zumthor, Paul. 2018. Performance, Recepção, Leitura. São Paulo: Ubu Editora.
valia do património cultural em mercados nacionais e mundializados
Zweig, Stefan. 2021. «O livro como acesso ao mundo». In Encontros com Livros. (Zhu 2021). Outro esforço a prosseguir consiste em abrirem-se aos
Lisboa: Relógio D’Água Editores, 9-19. cidadãos, chamando e integrando pessoas, ­comunidades e grupos

1
A economia da experiência (Pine e Gilmore 1999; Sundbo e Sørensen 2013)
preconiza cobrar o acesso a bens e serviços pesando, prioritariamente, o valor da
transformação que uma experiência é capaz de propiciar. O tópico é desenvolvido
no decorrer do capítulo.

196 197
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

diversos, alargando o círculo para além dos mais munidos em esco- parte do capítulo traça-se um retrato dos visitantes numa perspetiva
laridade, estatuto socioprofissional, interesse e participação cultu- sociodemográfica e retomam-se padrões e regularidades no acesso
ral; dos jovens e dos estrangeiros emoldurados em visitas escolares a espaços patrimoniais, estabelecendo uma visão comparativa com
e turísticas. Necessitam cumprir a transição para o digital, instigada outros países. Focam-se depois as visitas, considerando o local onde
obrigatoriamente em 2020, momento de exposição de fragilidades tiveram lugar, os motivos para as realizar e as atividades praticadas
tecnológicas, para não ficarem excluídos do entrecruzamento de no museu, monumento, sítio arqueológico ou galeria de arte. Pro-
online e offline nas práticas culturais. Num cenário de mutações e cura-se perceber as razões de distanciamento, por que motivos não
redefinições potenciais, têm de lidar com tendências fortes de evolu- se visita ou não se visitam mais vezes os lugares considerados neste
ção demográfica, como o crescimento destacado da população mais módulo do Inquérito. Afere-se também o grau de conhecimento de
velha, a que menos tem transposto as portas de entrada destes espa- alguns espaços do património mundial em Portugal, com papel anco-
ços no contexto português, numa particularidade que o confina na rador da identidade nacional. As visitas digitais a museus, monumen-
Europa. tos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte, em tempo de
O capítulo presente pretende contribuir para o conhecimento isolamento social e migração em massa das entidades culturais para o
dos que visitam museus, monumentos, sítios arqueológicos e galerias digital, constituem o último tópico analisado, delineando-se depois
de arte, tal como é possível alcançá-los através de um inquérito, des- algumas considerações finais.
conhecendo de que modo os ingressos vão ou não cultivar hábitos.
Procura relacionar traços sociodemográficos, motivações e outras
dimensões das visitas, mostrando como a socialização com tais cir- Os visitantes: polarização educacional e etária
cuitos culturais se cruza com diferenças sociais entre indivíduos e como tonalidade principal
estilos de vida. Visa reforçar uma linha de pesquisa em crescimento
desde os anos 1960 e 1970, cuja pertinência assenta, por um lado, Numa agenda de investigação relacionada com caracterização de
no conhecimento dos perfis daqueles que frequentam lugares patri- visitantes de museus, inaugurada nos anos 1960 sobre museus de arte
moniais e na compreensão da participação cultural como fenómeno europeus (Bourdieu e Darbel 1969) reconhecem-se três tópicos cen-
complexo e multidimensional, e no contributo para uma maior apro- trais: a identificação dos perfis sociais e padrões de práticas culturais
ximação entre instituições e visitantes, por outro lado. Reconhece-se de públicos de museus, monumentos históricos e outras entidades
o valor da pesquisa extensiva para sedimentar a reflexão sobre o lugar patrimoniais com a finalidade principal de delinear programação e
e o papel das instituições patrimoniais nas comunidades e para rever iniciativas de captação de novos frequentadores; as consequências
problemáticas e debates centrais na sociologia da cultura e da arte, das oscilações dos financiamentos públicos em cultura no acesso a
como a influência da destituição de recursos materiais e simbólicos bens, serviços e espaços culturais como museus e monumentos, num
no cultivar de interesses e na participação cultural, especialmente contexto de desestatização generalizada das intervenções públicas
em círculos associados à denominada cultura cultivada.2 Na primeira
A cultura letrada é diferenciada internamente por integrar os seus próprios polos de
2
É de ressalvar que as transformações no campo da produção, circulação e rece- nova e antiga especialização erudita, questionadoras da demarcação entre cultura de
ção de bens culturais, como por exemplo a maior interpenetração da cultura, do distinção (burguesa), cultura de pretensão (pequeno-burguesa) e cultura de priva-
lazer e da vida quotidiana, têm induzido o desenvolvimento de novas misturas e ção (popular) (Conde 1992; Santos 1988). Ver ainda Pais 1998, sobre as cronotopias
combinatórias de consumos e atitudes dos públicos, abrindo cruzamentos novos no das práticas culturais do quotidiano, incluindo as «manifestações polifónicas» das
interior da ‘cultura cultivada’ e também entre a ‘cultura popular’. suas espacialidades; Gomes 2004, focando tipologias de públicos a partir de inqué-
Apesar de tal mutação se registar no sentido de uma maior variedade, hetero- ritos realizados no Porto 2001 Capital Europeia da Cultura e no Festival Interna-
geneidade e ecletismo, ela não esbate a estrutura hierárquica das formas culturais, cional de Almada; Lopes 2004, acerca do papel socializador da experiência estética;
pois a cumulatividade dos recursos dos mais competentes ou cultivados confere- Costa, 2004, propondo o conceito de ‘modos de relação com a cultura’ no lugar de
lhes uma capacidade particular para conhecer, apropriar e expor diferentes formas. ‘públicos da cultura’.

198 199
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

(Harvey 2005); a variação internacional nos consumos culturais e Gráfico 5.1 – Frequência das visitas a museus, monumentos históricos,
os fatores que a permitem interpretar e compreender. Se o acesso à sítios arqueológicos e galerias de arte nos 12 meses
cultura e a defesa e preservação patrimonial constituem finalidades anteriores à pandemia (%)
transversais e duradouras nas políticas culturais (Santos et al. 1998;
Santos et al. 2005; Garcia et al. 2018; Lähdesmäki et al. 2021), a parti-
cipação neste círculo denota ainda seletividade na composição social,
com relevo para os museus, que têm cativado gradualmente a aten-
ção sociológica. Entende-se por património uma construção socio-
cultural que mobiliza um conjunto dinâmico e complexo de práticas,
que envolve agentes e agências; implica processos sociais a partir dos
quais se geram demandas de patrimonialização de um determinado
bem, assim como valores e sentidos que o legitimam (Motta 2014).3
Nos 12 meses que precederam a pandemia e o confinamento
social, 31% e 28% dos 2000 inquiridos dizem ter visitado, respetiva-
mente, monumentos históricos e museus. A procura de sítios arqueo-
lógicos e galerias de arte assumiu expressão menor, sendo referida (N=2000)
por 13% e por 11% dos mesmos (gráfico 5.1). Nos espaços patrimo-
niais tutelados pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC)
observa-se também a procura mais proeminente de monumentos, um monumento, 41% frequentaram um museu, 22% deslocaram-se a
que costumam registar afluência superior (Silva e Silva 2019).4 A ten- um sítio arqueológico e 16% entraram numa galeria de arte (MCUD
dência de maior preferência por visitar monumentos deteta-se nos 2019b, 6-8). No contexto francês, a análise da informação recolhida
resultados do Eurobarómetro sobre património cultural (Euroba- pelo inquérito às práticas culturais, realizado periodicamente, revela
rómetro 2017), verifica-se no inquérito referente a Espanha (2018- que os monumentos históricos, no período de 1973 a 2018, foram
-2019), no qual se apurou que 49% tinham visitado no último ano constantemente mais procurados do que os museus: a frequência dos
monumentos tem variado entre 32% (1973) e 34% (2018) e a dos
3
Conceção compatível com a definição estabelecida pela Convenção de Faro, museus oscilou entre 28% (1973) e 29% (2018) (Lombardo e Wolff
de 2005, que entende por património cultural um conjunto de recursos herdados do 2020). Já o inquérito realizado no Chile, em 2017, mostrou que os
passado que as pessoas identificam, independentemente do regime de propriedade museus registaram um grau maior de procura no último ano do que o
dos bens, como reflexo e expressão dos seus valores, crenças, saberes e tradições em
permanente evolução (Conselho da Europa 2005, Convenção de Faro, Artigo 2.º).
património arquitetónico, num fluxo menos expressivo (21% e 16%,
Ver ainda Agenda Temática de Investigação e Inovação Cultura e Património Cul- respetivamente) (Chile 2018, 110-114).
tural, iniciativa da Fundação par a Ciência e Tecnologia (FCT 2019) https://www. De acordo com o inquérito realizado em Portugal, o ritmo pre-
fct.pt/agendastematicas/docs/Agenda_I&I_CPC.pdf. dominante da visita correspondeu a ‘1 ou 2 vezes por ano’, como
4
São 25 os espaços patrimoniais a cargo da DGPC, em 2021: 17 museus, seis
assinalado por 95% dos frequentadores de monumentos históricos,
monumentos e dois palácios. A clivagem na distribuição pelo território continental
é notória: apenas três espaços se encontram a sul do Tejo e ressalta ainda o fosso 96% dos visitantes de museus, 98% dos que indicaram sítios arqueo-
entre litoral e interior, que concentra seis espaços. lógicos e 98% dos que apontaram ter frequentado galerias de arte.
As Direções Regionais da Cultura (Norte, Centro, Alentejo e Algarve) tutelam Entre os espaços visitados há menos tempo, mesmo que a visita
12 espaços, situados no território que lhes está afeto: oito museus, três monumen- tenha decorrido após o começo da pandemia, 47% dos respondentes
tos e um palácio.
Os 37 museus, monumentos e palácios «nacionais» distribuem-se por 19 conce- procuraram monumentos históricos, seguindo-se os museus (38%)
lhos, destacando-se Lisboa, com 15 entidades. (gráfico 5.2). Trata-se de uma distribuição que converge, principal-

200 201
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

mente no referente a monumentos, com os resultados obtidos para Gráfico 5.2 – Espaços patrimoniais visitados há menos tempo,
Portugal pela inquirição do Eurobarómetro acerca de património mesmo que depois do início da pandemia, por tipo (%)
cultural, ainda que as categorias comportem diferenças na designa-
ção (tabela 5.1). No panorama transnacional considerado, Portugal
e a Hungria sobressaem pelo facto de mais de metade da população
não ter visitado, nos últimos 12 meses, monumentos, palácios, caste-
los, igrejas e espaços similares. No caso dos museus e galerias de arte,
o contexto português volta a salientar-se por registar quase 75% de
indivíduos que não tiveram contacto com estes espaços, seguindo-se
Malta (62 %) e Espanha (61%), em contraste notório com os países
nórdicos (Suécia e Holanda com 20% e 26%, respetivamente).
O Inquérito às Práticas Culturais dos Portugueses 2020 mostra
que as galerias de arte (6%) e os sítios arqueológicos (6%) são pro- (N=684)
curados por uma parcela muito diminuta (gráfico 5.2). É de referir
que não foi perguntado aos inquiridos a especificação da entidade
visitada, resultando um tecido patrimonial indistinto, cujo único
contorno demarcador – além de serem monumentos históricos,
museus, galerias ou sítios arqueológicos – é, no caso dos museus, a
Tabela 5.1 – Número de vezes que visitou, nos últimos 12 meses,
natureza diversa de acervos e coleções. Os museus de história e de
os seguintes espaços culturais (%)
arte tiveram maior afluência, seguindo-se os museus de ciência, as
casas-museu, os museus multidisciplinares e de etnografia. De facto,
as entidades museológicas dedicadas à história e à arte figuram entre
as que têm tido um crescimento mais significativo (Santos et al.
2005), talvez por terem faltado ao país, durante quase todo o século
xx, museus com arte do seu tempo (Sardo 2015). Refira-se ainda
a tendência, verificada nas últimas décadas em Portugal, de cresci-
mento do número de museus e de centros de ciência, se bem que
a taxa de frequência destes espaços seja baixa, não correspondendo
nem acompanhando o investimento forte, nas últimas décadas, na
promoção da cultura científica (Delicado 2006; Martinho 2014).
O acesso aos espaços patrimoniais continua a assumir uma rela-
ção muito significativa com o grau de ensino (gráfico 5.3). Assim,
70% dos que concluíram ou frequentaram o ensino superior visi-
taram estas entidades, seguindo-se 44% daqueles que têm o ensino
secundário, 32% dos que atingiram o 3.º ciclo do ensino básico e 11%
dos que assinalam escolaridade até ao 3.º ciclo. Reafirma-se o traço
de perfis qualificados e seletividade social que tem caracterizado os Fonte: Eurobarómetro 466 (2017). Percentagem sem casa decimal na fonte.
frequentadores de espaços patrimoniais, identificado em diversos Nota: O subconjunto de 14 países da UE foi constituído procurando representar as regiões
estudos (Bourdieu e Darbel 1969; Hendon, Costa e Rosenberg 1989; norte, mediterrânica, central e de leste do território europeu.

202 203
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

Gráfico 5.3 – Características sociográficas dos visitantes (%) ­ artinho e Gomes 2005; Santos e Neves 2005; DGPC 2015; Euro-
M
barómetro 2017; Semedo, Ganga e Oliveira 2018).5 Considerando a
situação perante o emprego, sobressai a população em idade escolar:
58% dos estudantes visitaram museus, monumentos, sítios arqueo-
lógicos e galerias de arte. Por seu lado, a presença de trabalhadores
decresce (43%), acentuando-se o distanciamento entre desemprega-
dos (23%), reformados ou com incapacidade (19%) e domésticos não
remunerados (9%). A proporção maior dos grandes empresários e
profissionais liberais (88%) e dos profissionais socioculturais (70%)
contrasta com a de operários (16%) e trabalhadores de serviços
(23%).
O recuo a meados dos anos 1990 descobre uma linha contínua
de regularidades «pesadas» (Silva et al. 2000). Num balanço intensivo
de estudos sobre as práticas culturais dos portugueses in e outdoors,
era salientado o contacto muito pouco expressivo dos portugueses
com o circuito de museus, galerias e espaços similares (Conde 1996).
Destacava-se o aumento entre 1984 e 1994 da proporção de ‘grupos’
na população que afluía aos museus, potenciado pelo vulto mais sig-
nificativo, em 1994, de estrangeiros e públicos escolares no conjunto
dos visitantes em grupo (35% e 27%, respetivamente). Considerando
os resultados do inquérito realizado em 1994 sobre as práticas cultu-
rais na zona da Grande Lisboa (Pais et al. 1994), por ocasião da reali-
zação do festival cultural multidisciplinar Lisboa Capital da Cultura
94 – cuja campanha publicitária frisava que Portugal deixara de ser
um país simplesmente lá no extremo do continente europeu e con-
finado ao isolamento cultural –, pode verificar-se que a esmagadora
maioria dos residentes na capital não tinha entrado, nem que fosse
uma vez na vida, em museus e espaços similares.6 A contextualizar
este resultado, surgia a combinatória omnipresente na configuração
da procura e participação cultural no contexto português: a presença

5
São algumas referências ilustrativas para o contexto nacional e internacional,
não se esgotando aqui as referências, ainda mais ampliáveis, porventura, por via da
produção de teses académicas sobre a temática.
6
Deixam-se alguns exemplos de familiarização escassa com museus e outros
(N=684) circuitos patrimoniais, a partir do Inquérito sobre Práticas Culturais, de 1994, na
região de Lisboa, indicando-se a percentagem dos que entraram pelo menos uma
vez: Museu da Electricidade, 8%; Palácio Galveias, 9%; Museu do Azulejo, 12%;
Museu de Etnologia, 14%. Os mais conhecidos: Palácio da Ajuda, 41%; Fundação
Calouste Gulbenkian, 40%; Museu do Traje, 33%; Museu Nacional de Arte Antiga,
27% (Pais et al. 1994).

204 205
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

esbatida de grupos mais destituídos em condições socioeconómicas países como S­ uécia, Dinamarca e Finlândia.
e a polarização permanente entre os jovens, ocupando com maior As discrepâncias mais marcadas no panorama europeu associam-
probabilidade a esfera cultural, numa aproximação favorecida pela -se à idade, ainda de acordo com o trabalho referido. Se na maio-
escola, e os seniores (ibidem). ria dos países a frequência das visitas a museus e locais históricos e
O padrão de idas dos portugueses aos museus e outros espaços patrimoniais tem lugar ao longo da existência, em Portugal, Grécia
patrimoniais decresce com a idade. Quase metade dos que têm entre e Estados que passaram a integrar a UE em 2004 (Malta, Hungria e
15 e 24 anos figuram entre os visitantes. Nos segmentos dos 25 aos República Checa, entre outros) quanto mais se avança etariamente,
54 anos, a percentagem situa-se entre 40% e 42%, decresce nos gru- mais progride o distanciamento dos museus e dos espaços patrimo-
pos dos 55-64 anos (32%) e dos 65 e mais anos (18%). Uma distri- niais. Noutras latitudes desvela-se a mesma tendência de participação
buição igualmente decrescente deteta-se nos resultados do inquérito decrescente com a idade, como é percetível no estudo sobre práticas
referente ao Chile (2017), porém com percentagens inferiores: 27% culturais no Chile (Chile 2018, 111).
dos indivíduos com 15 a 29 anos, 24% do intervalo etário dos 30 No estudo sobre públicos dos museus nacionais, promovido pela
aos 44 anos, 16% da faixa 45-59 e 11% dos que têm 60 ou mais anos Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), realizado em 2014
(Chile 2018, 111). A presença de inquiridos masculinos é superior e 2015, emergem as características habituais da população que fre-
(37%) aos respondentes do género feminino (32%). Porém, a dis- quenta lugares de património cultural: qualificados em termos de ati-
tribuição por género oscila de acordo com o tipo de espaço frequen- vidade socioprofissional e escolaridade; média de idade de 42 anos;
tado. As mulheres predominam no grupo dos visitantes de museus predominância feminina; presença maioritária de estrangeiros (53%,
e galerias de arte, a convergir com o que se evidencia noutros con- associados diretamente a fluxos turísticos); recursos escolares mais
textos (Bourdieu e Darbel 1969; DGPC 2015). Já a percentagem de elevados entre estrangeiros (79% com pelo menos um diploma supe-
homens eleva-se entre os frequentadores de monumentos históricos rior, perante 68% de portugueses com idêntica condição escolar);
e sítios arqueológicos. predominância de ‘estreantes’ (81%), a contrastar com uma parcela
A variação do peso das características demográficas e socioe- de 13% de ‘assíduos’ (DGPC 2015; Neves e Mourão 2016). A pouca
conómicas na decisão e no hábito de visitar e o número de idas a representatividade dos diferentes grupos sociais ressalta igualmente
museus, galerias de arte, monumentos históricos e sítios arqueológi- na caracterização dos visitantes e das experiências da frequência de
cos na União Europeia é analisada em detalhe num estudo de Martin três espaços patrimoniais na região Norte de Portugal, facultando
Falk e Tally Katz-Gerro, a partir de dados relativos a 350 000 adultos um panorama convergente com aquele até aqui observado: os inqui-
em 24 países da UE. Aí se conclui que a probabilidade e o volume ridos tinham em média 43 anos, possuíam escolaridade e profissões
deste tipo de visitas dependem principalmente de fatores como o qualificadas e integravam-se maioritariamente no segmento social da
rendimento familiar per capita, a escolaridade, o estatuto sociopro- ‘pequena-burguesia intelectual e científica’ (Semedo, Ganga e Oli-
fissional e o país de nascimento (Falk e Katz-Gerro 2016). Carac- veira 2018). Os estudos de públicos realizados nos espaços expo-
terísticas como o rendimento e o capital cultural institucionalizado sitivos (museus e outros) do município de Cascais corroboram o
(diplomas escolares) assumem transversalmente um papel indutor padrão anterior (Martinho e Gomes 2005; Santos e Neves 2005).
da participação cultural, com poucas variações entre diferentes paí- A análise anterior das variáveis de caracterização sociográfica
ses. Contudo, os autores notam que o efeito marginal do ensino (gráfico 5.3) facultou já um perfil genérico dos inquiridos que visi-
superior é ligeiramente maior do que a média na Áustria, República taram há menos tempo, mesmo que depois do começo da pande-
Checa, Portugal e Hungria, onde a população trabalhadora detém mia, um museu, um monumento histórico, um sítio arqueológico
graus de ensino superior significativamente abaixo da média. Em ou uma galeria de arte. Procura-se, de seguida, conhecer as rela-
contraste, a influência da educação superior na intensidade da pro- ções que se estabelecem entre os atributos sociais dos inquiridos,
cura de museus e lugares históricos surge menos pronunciada em a partir das respostas à questão inicial deste módulo: nos 12 meses

206 207
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

anteriores ao início da pandemia, com que frequência costumava Figura 5.1 – Distribuição da população no espaço social.
visitar um museu, um monumento histórico, um sítio arqueológico, Representação gráfica do plano fatorial
uma galeria de arte? Para tal, recorreu-se à análise de homogenei-
dade, através da qual é possível obter uma representação gráfica do
espaço social característico da população inquirida. Foi considerado,
numa análise de correspondências múltiplas, o seguinte conjunto
de variáveis: sexo/género; região; idade, classe socioprofissional;
situação conjugal; grau de escolaridade; rendimento; visita (ou não)
a museu; visita (ou não) a monumento histórico; visita (ou não) a
sítio arqueológico; visita (ou não) a galeria de arte. Identificaram-se
duas dimensões que concentram grande parte da variabilidade dos
dados. A primeira distingue os indivíduos em função principalmente
do grau de escolaridade e da frequência de espaços patrimoniais; a
segunda dimensão diferencia-os mais a partir das variáveis região,
idade e situação conjugal. A representação gráfica do plano fatorial
(figura 5.1) permite visualizar o resultado da diferenciação operada
pelas diferentes variáveis em cada uma das dimensões, sendo possí-
vel recortar três segmentos sociais, delimitados a cores verde, azul e
vermelha.
A linha azul abrange o que se avista como um grupo ainda jovem
e curioso por monumentos e museus, representando 39% dos inquiri-
Legenda:
dos. É composto proporcionalmente por homens (51%) e mulheres Dimensão 1 - eixo horizontal, polariza as variáveis relativas ao grau de instrução e à frequência
(49%), sobressaindo a residência na Área Metropolitana de Lisboa de espaços patrimonais.
(41%). Integra sobretudo indivíduos com idades nos grupos 15-24 Dimensão 2 - eixo vertical, polariza as variáveis relacionadas com a idade, o sexo/género e a
situação conjugal.
anos (25%), 25-34 (22%) e 35-44 anos (25%). O grau de ensino (N=2000)
predominante é o secundário (43%), depois surge o 3.º ciclo (37%).
Inclui mais trabalhadores de serviços (37%), operários (25%) e
empregados de escritório (15%). Os rendimentos daqueles que se elementos residem principalmente na região Norte (42%). Integra
situam neste aglomerado social oscilam entre mais de 500 a 1800 uma ­proporção mais vasta de pessoas com 65 e mais anos (55%) e
euros. É maior a probabilidade de encontrar solteiros (46%) do que 55-64 anos (24%), tendo escolaridade principalmente inferior ao 3.º
pessoas casadas (37%); a proporção de pessoas a viver em união de ciclo (84%). Predominam operários (53%) e trabalhadores de ser-
facto é mais elevada (11%) do que nos outros dois segmentos, talvez viços (29%), com rendimentos que variam entre 500 e 1500 euros.
por se tratar de fases iniciais das trajetórias. As visitas dirigem-se em São principalmente casados (56%) e viúvos (26%). O contacto com
primeiro lugar aos monumentos (23%) e depois aos museus (16%). monumentos (7%) e museus (6%) é parco e os circuitos dos sítios
A esmagadora maioria encontra-se ausente dos circuitos dos sítios arqueológicos e das galerias de arte são-lhes estrangeiros, quase
arqueológicos e das galerias de arte. todos nunca lá entraram.
Já a linha vermelha refere-se ao que pode designar-se como Reconhece-se também um grupo jovem/meia-idade sintonizado
grupo idoso cruza-se com monumentos e museus, que engloba 40% com património cultural variado, abrangido pelo círculo a verde.
dos respondentes. Tende a ser mais feminizado (61%) e os seus Concentra 21% dos inquiridos, que denotam afinidades com os

208 209
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

praticantes da ‘cultura cultivada’, como ter maior propensão para a Gráfico 5.4 – Localização do (UE) e uma minoria estreita
cumulatividade: desdobram-se na direção de monumentos (91%), espaço visitado (%) (2%) frequentou este tipo de
museus (89%), sítios arqueológicos (57%) e galerias (52%). O grau espaços culturais num país fora
de ensino prevalecente é o superior (63%) e inclui profissionais socio- da UE (gráfico 5.4). A visita
culturais (31%), técnicos e especialistas (13%) e gestores (12%). no estrangeiro é assinalada por
Os rendimentos situam-se entre mais de 800 e mais de 2700 euros 21% dos que frequentaram
(24% com mais de 2700 euros). O conjunto caracteriza-se ainda pela museus no inquérito relativo a
proporção aproximada de homens (52%) e mulheres (48%), com Espanha (MCUD 2019, 6).
residência distribuída maioritariamente pela Área Metropolitana de Da exploração da relação
Lisboa (27%), Centro (29%) e Norte (23%). É maior a presença de entre a localização do último
indivíduos com 35-44 anos (24%) e 45-54 anos (22%). Destaca-se o espaço visitado e a região de
maior volume de casados (48%), sendo 33% solteiros e estando 9% residência retiram-se várias
ligados por união de facto. conclusões. Em primeiro lugar,
São contornos captados pela inquirição como no retrato instan- a incursão no concelho onde
(N=684)
tâneo de um coletivo, do qual não temos imagens de outras épocas. reside é mais provável na
Ficam, pois, algumas incógnitas quanto à fisionomia social futura Área Metropolitana de Lisboa
dos inquiridos, ou seja, no que se refere ao modo como se (re)distri- (AML) e nos Açores, talvez pela oferta patrimonial na AML assumir
buirá esta população na realidade social. Quais do segmento azul irão maior volume e diversidade (Santos et al. 2005) e por um efeito de
transitar, noutros momentos, para círculos como o verde ou verme- insularidade no arquipélago açoriano. As visitas num outro concelho
lho, em consequência de variações na composição de recursos cultu- associam-se diretamente à região Centro, o que pode explicar-se pela
rais, económicos e sociais? E no círculo a vermelho permanecerá o dimensão menor do parque patrimonial disponível neste território
cruzamento com monumentos e museus em modo principalmente e pelo interesse direcionado a entidades patrimoniais situadas nas
fugaz, incluído em roteiros atraentes pelo convívio e pela ideia de outras regiões (ibidem). Este aspeto articula-se com o convívio, o
saída, aproveitando oportunidades de interação e de aprendizagem passeio e o recreio que se supõe constituir um motivo muito mobi-
que não houve mais cedo? Continuará o conjunto verde a deslocar- lizador da visita a património cultural, como se verá adiante. Por sua
-se a monumentos históricos, museus, sítios arqueológicos e galerias vez, as deslocações a um outro país da UE denotam uma associa-
em fases mais tardias das suas trajetórias? Realizarão tais atividades ção muito significativa com a região do Algarve. A visita de museus,
ainda em modo de cumulatividade ou restringindo o leque de espa- monumentos e outros locais patrimoniais num país não integrado na
ços patrimoniais frequentados? UE assume uma relação forte com o Algarve e a Madeira.
Analisando agora a relação entre a idade e a localização do
último espaço visitado, verifica-se que a ida a entidades patrimoniais
As visitas: onde, porquê, com quem e quais atividades no concelho onde reside encontra-se relacionada de modo signifi-
cativo com a faixa etária mais jovem (15-24 anos), sendo possível
Considerando o museu, o monumento histórico, o sítio arqueo- que se trate principalmente de grupos das escolas, que optam mais
lógico ou a galeria de arte que a população inquirida visitou há menos por incursões realizadas num perímetro próximo, economizando
tempo, mesmo que a deslocação tenha ocorrido depois do início da também o tempo. As deslocações a países da UE (assinaladas por
pandemia, mais de metade (58%) fizeram-no noutro concelho de 10%, gráfico 5.4) para conhecer património cultural são mais pra-
Portugal, diferente do município onde residem, 28% assinalam o ticadas por parte de pessoas dos 25 aos 34 anos, enquanto a visita a
concelho onde habitam, 10% apontam outro país da União Europeia museus, monumentos e espaços patrimoniais em países fora da UE

210 211
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

(­referida por 2%) é mais provável entre indivíduos dos 45 aos 54 No estudo sobre museus conduzido por William Hendon nos
anos. ­Prosseguindo a exploração com foco no estatuto socioprofis- EUA, nos anos 1980, percebeu-se que os visitantes frequentes des-
sional, verifica-se haver uma relação forte entre as visitas num outro locam-se a estes espaços para estarem com as pessoas, fazerem algo
concelho e o grupo dos empregados de escritório; já as deslocações a que considerem ter utilidade, fruírem ambientes em que se sintam à
países não integrados na UE são praticadas com maior probabilidade vontade, aproveitarem a oportunidade de aprender e participar ati-
por grandes empresários e profissionais liberais e por gestores. vamente de uma experiência que valorizam. A deslocação e o pas-
O principal motivo que leva os inquiridos a realizarem a visita seio-turismo «cá dentro» – 58% visitaram um espaço patrimonial
é a importância histórica do espaço (40%) (tabela 5.2). O conví- num concelho diferente daquele que habitam – são possíveis vias de
vio com outras pessoas afigura-se mobilizador para 33%, sendo a estilização dos quotidianos, um estar dentro e fora da vida diária e
razão que mais pesou entre indivíduos com 65 e mais anos e moveu da sociedade que a enquadra (Shields 1992; Pais 1998). Combinam-
especialmente as pessoas casadas e as pessoas viúvas. A beleza do -se diferentes disposições para convívios e aprendizagens em movi-
espaço e das obras expostas é referida por 31%. Têm peso (28%) mento, deambulando por monumentos históricos, museus, sítios
as recomendações de familiares, amigos ou outras pessoas, consti- arqueológicos e paisagens vizinhas, com o atributo da beleza. O habi-
tuindo o fator mais dinamizador da visita entre pessoas dos 25 aos 34 tus de cada um, um mapa desde muito cedo recebido e orientador das
anos. A possibilidade de aprofundar o conhecimento sobre o tema ações e interações, que vai sendo atualizado ao longo da vida, molda
da exposição/coleção é referida por 12%, mais por pessoas solteiras os julgamentos de valor sobre a arquitetura, o arranjo dos espaços,
e em união de facto. As recomendações de guias e roteiros (9%) e as os artefactos e símbolos encontrados nas exposições, estes apropria-
opiniões e as imagens visionadas nas redes sociais (7%) representam dos de acordo com a relação dos indivíduos com o mundo em que
motivos indicados com menor frequência. De todos os fatores elen- habitam. Nas palavras de Bella Dicks (2016), a visita é uma prática
cados, os que menos influenciaram a decisão da visita distanciam-se social que mobiliza dimensões simbólicas de memória e experiência
das redes de sociabilidade: publicidade (3%), críticas de profissionais de classe. Em que medida é esta prática, para os diferentes visitantes,
(2%) e website do espaço (2%). No inquérito referente a Espanha, transformada simbolicamente em festa, procurando tornar legíti-
93% apontaram o lazer e o entretenimento como uma causa para ir a mas a exposição dos sentidos, a exploração e a fruição, à maneira de
museus, enquanto 7% realizaram a atividade por motivos laborais ou turista experimentado (Fortuna 1995)? Uma outra inquirição, inte-
de estudo (MCUD 2019, 6). grando abordagens qualitativas, ajudará a descobrir a resposta.
Os visitantes deslocam-se a museus, monumentos e os outros
espaços considerados principalmente na companhia de familiares
Tabela 5.2 – Principais motivos que levaram a realizar a visita (%) (65%) e 27% realizaram a visita com namorado/a e ou amigo/s (grá-
fico 5.5). Por sua vez, a ida integrada num grupo de escola é refe-
rida por 8%, enquanto 5% apontam outro grupo organizado e 4%
percorrem o espaço a solo. A última modalidade é mais frequente
nas faixas etárias 35-44 anos e acima de 65 anos, denotando maior
associação com pessoas divorciadas/separadas.
A análise cruzada das modalidades de acompanhamento por
espaço visitado reafirma a maior frequência da visita a monumentos
históricos, museus, sítios arqueológicos e galerias de arte na compa-
nhia de familiares (tabela 5.3). Sugere o papel indutor da escola no
contacto dos mais jovens (15-24 anos) com museus e monumentos;
mas o roteiro não parece contemplar os sítios arqueológicos. É de

212 213
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

Gráfico 5.5 – Com quem realizou a visita (%) O universo das galerias de arte é tendencialmente mais feminizado,
na continuidade do que se verificou em estudos anteriores, como
no caso de um inquérito aos públicos das galerias de arte em Lisboa,
realizado em 1999 (Santos et al. 2000).
Visitar a coleção permanente representa a atividade principal rea-
lizada pelos inquiridos que se deslocaram a museus, monumentos
históricos, sítios arqueológicos ou galerias de arte, seguindo-se o
interesse pela exposição temporária (20%) (gráfico 5.6). O leque de
iniciativas educativas captou atenção diminuta, com a visita orien-
tada a salientar-se (18%), tendo apenas 4% indicado outras ativida-
des pedagógicas. A visita ao espaço em si (4%), a ida a espetáculos
(N=684)
(3%) ou a frequência de cursos e seminários (1%) colheram adesão
minoritária.
Tabela 5.3 – Com quem realizou a visita (%) O envolvimento muito pouco expressivo em atividades educati-
vas resultará, talvez, de fatores como a ausência de serviços educativos
nos espaços frequentados, o desencontro entre visitas espontâneas e
o programa de iniciativas pedagógicas disponíveis, a ainda baixa ade-
são que estes serviços conseguem obter, além de grupos escolares,
de turistas e de uma minoria de frequentadores fidelizados. O papel
educativo dos museus, que remonta à origem destas instituições e é
também apropriável por monumentos históricos e sítios arqueoló-
(N=684)
gicos, tem sido substancialmente reforçado pelo maior dinamismo
dos serviços educativos e pela crescente aproximação das escolas,
que encontram nestas e noutras instituições culturais e artísticas um
notar ainda o crescimento da visita a solo nos grupos etários a partir local complementar de aprendizagem, que se distingue por assentar
dos 35 anos e a presença mais saliente de mulheres que se deslocam
a monumentos, museus e sítios arqueológicos em grupos organiza-
dos, principalmente depois dos 65 anos. Terão, então, nesta fase das
Gráfico 5.6 – Atividades realizadas (%)
suas trajetórias, mais tempo livre, maiores possibilidades de saída do
espaço doméstico para finalidades culturais e poder expandir o gosto
por conviver e passear, também porque é provável que o cônjuge não
esteja já presente e os filhos, se os houver, se tenham autonomizado.
Considerando as iniciativas de alguns municípios e associações, que
promovem passeios com vertente cultural e educativa para seniores,
tais atividades parecem estar para os mais idosos como as entidades
escolares para os mais jovens. Propiciam a aproximação, ainda que
ocasional, e são contextos de fruição e aprendizagens inesperadas,
acolhidas com interesse, provavelmente maior quando o conheci-
mento é transmitido de modo informal, sem a tensão da avaliação. (N=684)

214 215
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

na experiência (Hein 2000). O incremento de uma cultura de parce- questão da coabitação de um público regular e conhecedor com um
ria entre escolas e museus tem propiciado o cruzamento dos respe- público ocasional e profano, ou, por outras palavras, são a área cultu-
tivos curricula e lógicas de trabalho (Martinho 2007; Lopes 2011). ral onde mais se cruza a «relação cultivada» e a «relação espetacular»
Mas os museus dirigem-se a toda a comunidade e o entendimento com a cultura (Donnat 1993, 40).
da entidade museológica, principalmente desde os anos 1960, como Cerca de 57% dos inquiridos que visitaram museus, monumen-
espaço potencial de experiências e de educação informal, que ocorre tos históricos, sítios arqueológicos ou galerias de arte pagaram um
ao longo de uma vida, favorece o acolhimento de grupos etários e bilhete normal (gráfico 5.7).7 No inquérito referente a Espanha, 48%
sociais diversos. Tal perspetiva, resultante maioritariamente dos con- afirmaram aceder de modo similar (MCUD 2019, 6). Em Portugal,
tributos da psicologia de Jean Piaget e da filosofia de John Dewey, 18% dos respondentes estavam isentos de pagamento, 12% entra-
concorre para uma visão dos museus como lugares especializados em ram num período de acesso gratuito e 7% adquiriram o bilhete com
objetos que representam tanto a cultura como a natureza e tornam- algum desconto. Entre os que declararam viver com muitas dificul-
-se centrais para qualquer esforço educacional quando o foco passa dades, 74% adquiriram um bilhete normal, 16% compraram uma
da palavra escrita para a participação ativa de quem aprende através entrada com algum desconto e 10% entraram num período de acesso
da interação com os objetos (Hein 2000). Dois princípios indissociá- gratuito. Não parece, pois, que as visitas sejam realizadas pensando
veis constituem a experiência, na perspetiva de Dewey. De um lado, previamente nas possibilidades de o fazer usufruindo de um preço
a interação entre o indivíduo e os objetos, acontecimentos, obras mais baixo, possivelmente pelo carácter mais casual dos ingressos
ou outras pessoas; do outro, a continuidade da experiência, pois ela nos espaços ou ainda pelo conhecimento diminuto das diferentes
tanto se baseia em experiências anteriores como pode modificar, de modalidades de entrada.
alguma maneira, as experiências seguintes (Dewey 1938). Para os que acederam de modo não gratuito, a compra na bilhe-
Tal noção de experiência encontra-se cada vez mais em compe- teira prevalece (83%) e a aquisição do bilhete na Internet foi praticada
tição com o conceito de economia da experiência (Pine e Gilmore
1999; Sundbo e Sørensen 2013), este especialmente afim da valo-
Gráfico 5.7 – Tipo de ingresso utilizado (%)
rização da cultura na base da sua capacidade de contribuição para
o crescimento económico (Jacobi 2017); o turismo cultural, forte-
mente ancorado no património, detém peso económico significativo
no leque das indústrias criativas, particularmente nos países do sul da
Europa (Menger 2010; Zhu 2021). A economia da experiência reco-
menda cobrar o acesso pesando, para além dos fatores tradicionais
de fixação do preço (como tempo e custo), o valor da transformação
que uma experiência poderá oferecer. Experiências, transformações
e emoções, e não mais bens ou serviços, seriam a base para o cresci-
mento económico futuro e para a formação de uma era económica
nova em que todas as entidades se dedicariam a delinear aconteci- (N=684)
mentos e eventos inesquecíveis ​​para os seus públicos e clientes, que
assim teriam mais oportunidades de acesso a vivências individualiza- 7
O preço médio de um bilhete inteiro para museu ou monumento nacional
das, à medida de cada consumidor (ibidem). Tal lógica tem vindo a rondava, com base em informação de 2015, 5 euros. Nos museus, variava entre 1,60
ser apropriada pelos espaços patrimoniais, a começar pelos museus, euros (Museu Municipal de Loulé) e 10 euros (Museu de Arte Contemporânea de
Serralves). Nos monumentos nacionais, oscilava entre 2 euros (Ruínas Romanas de
as entidades culturais que, como observou Olivier Donnat, repre-
Milreu, Algarve) e 10 euros (Mosteiro dos Jerónimos) (Observatório do Patrimó-
sentam, porventura, o sector onde se coloca com mais intensidade a nio 2017).

216 217
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

Gráfico 5.8 – Modo de aquisição do ingresso (%) Tabela 5.4 – Principais razões por que não visitou ou não visita
mais vezes (%)

(N=684)
(N=684)

Contudo, é provável que a dita «falta de interesse» signifique,


por 8%, estando mais associada ao segmento dos 15-24 anos (gráfico afinal, desconhecimento ou pouca familiarização com algumas práti-
5.8), a única faixa etária com 100% de utilizadores da Internet na cas culturais ao vivo (Bourdieu 2010), bem como a relevância maior,
amostra (ver capítulo 2). Já no inquérito relativo a Espanha, 17% dos embora não admitida prioritariamente, das razões económicas. No
inquiridos adquiriram a entrada através da internet (MCUD 2019, inquérito realizado em Portugal apurou-se que entre os indivíduos
6), indiciando haver uma integração mais alargada de serviços digi- que expressaram viver ‘com muitas dificuldades’, pelo rendimento
tais para práticas culturais. No contexto da Europa mediterrânica, que têm, 46% apontaram não terem interesse em visitar museus e
e comparativamente com Portugal, Grécia ou Itália, em Espanha a outro património cultural, 38% indicaram que o preço é elevado e
generalização das tecnologias de informação e comunicação tem sido 18% mencionaram a falta de tempo. Já a ausência de tempo consti-
experienciada num ritmo mais rápido (capítulo 2). tui o motivo mais referido por quem disse viver ‘confortavelmente’
(54%) e ‘razoavelmente’ (41%).
De acordo como o perfil sociográfico dos que visitaram há
Motivos de distanciamento: tempo, interesse, dinheiro menos tempo estes espaços culturais, mesmo que a visita tenha
decorrido após o começo da pandemia, observa-se que a referência à
A falta de tempo (39%) e a ausência de interesse (38%) consti- falta de interesse e a preferência por realizar outras atividades assu-
tuem as duas razões indicadas com maior recorrência pelos inqui- mem uma relação direta com o grau de ensino do próprio e a classe
ridos para justificarem o facto de não visitarem ou não visitarem socioprofissional (gráfico 5.9). A ausência de interesse é manifes-
mais vezes museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos tada por 17% dos que atingiram o ensino superior, 33% dos que
e galerias de arte (tabela 5.4). Entre os respondentes, 21% e 16% alcançaram o ensino secundário, 42% dos inquiridos chegaram ao
referem, respetivamente, o preço elevado e a falta de proximidade. 3.º ciclo e metade dos respondentes com habilitações inferiores. O
A ausência de interesse é o motivo central indicado pelos cidadãos peso maior desta razão para não visitar ou não visitar mais vezes
da União Europeia para não realizarem práticas culturais outdoors, museus, monumentos, sítios arqueológicos e galerias de arte iden-
como conhecer património cultural, ir ao cinema, ver um espetáculo tifica-se em categorias socioprofissionais como trabalhadores dos
(Beck-Domzalska 2019, 145). É uma linha transversal a países com serviços (43%) e operariado (50%). No que respeita ao custo ele-
níveis de desenvolvimento diferenciados, detendo maior expressão vado do ingresso (gráfico 5.10), nota-se uma menor relação com o
na Bélgica, Luxemburgo, Portugal, Áustria, Malta e Croácia (idem, grau de ensino entre os que apontam este motivo, com 3 pontos
41). Também são invocadas razões como existência de limitações percentuais separando os que têm menos do que o 3.º ciclo (20%)
financeiras e falta de proximidade. e os que atingiram o ensino superior (17% apontam tal motivo).

218 219
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

Gráfico 5.9 – Referência a ‘falta de interesse’, por grau de ensino São os grandes empresários e os profissionais liberais quem mais
e classe socioprofissional (%) assinala este fator (31%), porventura refletindo alguma tendência
a desvalorizar o custo dos bens culturais, comparativamente com
bens e serviços considerados «de primeira necessidade», e revelando
desconhecimento do funcionamento e das condições de trabalho
no setor cultural. Daí que os profissionais socioculturais, tenden-
cialmente mais próximos e familiarizados com as dinâmicas deste
campo, refiram menos o custo alto do ingresso como obstáculo à
frequência mais ativa dos espaços patrimoniais.

Identidade nacional, memória e história

O Mosteiro dos Jerónimos, a Torre de Belém, o Mosteiro da


Batalha e o Convento de Cristo foram os primeiros monumen-
tos portugueses a serem reconhecidos como património mundial,
segundo a classificação da UNESCO em 1983. Têm em comum
(N=684) serem panteão dos reis que deram início, no século XV, à expan-
são e às viagens oceânicas e encontram-se ligados ao período equi-
parado ao apogeu histórico português, com facetas ainda pouco
conhecidas, como o contributo das viagens marítimas ibéricas para
Gráfico 5.10 – Referência a ‘o preço é elevado’, por grau de ensino
e classe socioprofissional (%) o surgimento da modernidade científica europeia (Sobral 2012;
Hooykaas 1983). Não surpreende, pois, o relevo dos monumen-
tos históricos num conjunto de 12 dos 17 espaços do património
mundial em Portugal, tendo sido pedido aos inquiridos para assi-
nalarem os que tinham visitado pelo menos uma vez na vida: 63%
entraram no Mosteiro dos Jerónimos e 61% estiveram na Torre de
Belém (tabela 5.5). Depois do eixo Lisboa-Belém, montra oficial
da identidade portuguesa e lugar proeminente nos roteiros e pro-
gramas turísticos (Sobral 2012), são referenciados outros monu-
mentos dos mais simbólicos da história de Portugal: Mosteiro da
Batalha (59%), Mosteiro de Alcobaça (43%), Real Edifício de
Mafra (36%) e Centro Histórico de Guimarães (35%). A frequên-
cia diminui no campo dos sítios arqueológicos: 9% indicam ter
visitado pelo menos uma vez na vida o Parque Arqueológico do
Vale do Coa. Quanto ao Centro Histórico do Porto, referido por
45%, é de ter em conta a atratividade suscitada pela coexistên-
cia de edificações com mais longevidade e presença monumen-
(N=684) tal e entidades que comercializam bens culturais e atraem vasto

220 221
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

Tabela 5.5 – Lugares reconhecidos como património mundial Tabela 5.6 – Visitas e visitantes em torno de dois conjuntos
pela UNESCO visitados pelo menos uma vez na vida (%) de lugares reconhecidos como património mundial
pela UNESCO*

* Alguns autores consideram que uma análise fatorial com itens binários pode gerar resulta-
dos enviesados na medida em que o procedimento estatístico assume que as variáveis são de
(N=2000) nível intervalar. Para assegurar que os resultados são robustos, foi realizada uma análise de
componentes principais categórica (CATPCA) com o mesmo conjunto de variáveis. Os resul-
tados da CATPCA demostraram totalmente congruência com a análise fatorial apresentada.
(N=2000)

c­ ontingente de visitantes, lojas envoltas em atmosfera histórica,


de raridade e funcionamento orientado pela lógica da economia da sociodemográficas8 sexo/género; idade; instrução do próprio; situa-
experiência. Tal como noutros centros históricos e bairros cultu- ção profissional; região; e classe socioprofissional.
rais, um leque de entidades diversas, em idade e valor simbólico, O grupo designado ‘património a Sul’ apresenta o maior número
participa de processos de contemporanização do passado (Fortuna de visitas em relação à amostra, com apenas 18% que nunca entraram
2016; Zhu 2021). num dos monumentos incluídos neste segmento. Contrasta com
Através da análise fatorial dos dados sobre a visita, pelo menos 41%, no total da amostra, que nunca estiveram nos monumentos
uma vez na vida, a 12 dos 17 lugares reconhecidos, em Portugal, pela inseridos no segmento denominado ‘património a Norte’.
UNESCO como património mundial (especificados na tabela 5.5), Em termos de mobilidade, medida em função da região de resi-
foram exploradas as correlações detetáveis no conjunto. A análise dência e o grupo de património visitado, observa-se que a proximi-
permitiu identificar dois segmentos de espaços, assinalados a som- dade geográfica se associa preferencialmente à procura da região mais
breado claro e a sombreado mais escuro na tabela 5.6. A composição próxima, com o ‘património a Norte’ a ser mais abordado por pes-
de cada grupo sublinha a demarcação entre a região Sul e a região soas residentes nesta região e o ‘património a Sul’ recebendo maior
Norte, com o Mosteiro da Batalha a operar como a linha de fron- volume de residentes na Área Metropolitana de Lisboa, no Centro e
teira (tabela 5.7); daí as designações ‘património a Sul’ (fator 1) e no Alentejo. Considerando os que fizeram incursões em entidades
‘património a Norte’ (fator 2). Seguidamente, procurou-se caracte- patrimoniais de um e de outro bloco, destaca-se que aqueles habi-
rizar as pessoas que visitam cada um dos espaços, mediante análises
descritivas, e procedeu-se uma análise de associação entre as ­variáveis 8
Com recurso a testes qui-quadrado.

222 223
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

tualmente mais ausentes de práticas culturais fora do espaço domés- v­irtualmente museus (9%) e sítios arqueológicos (5%) (MCUD
tico (idosos, mulheres, pessoas domésticas não remuneradas) têm 2019, 6-8).
maior expressão no grupo ‘património a Sul’ do que no ‘património a Em 2020, o confinamento poderá ter levado os portugueses a
Norte’. No núcleo dos que frequentam lugares patrimoniais a Norte buscarem mais no ambiente virtual estes espaços culturais, os quais
verifica-se uma assimetria maior de distribuição de capital cultural procuraram rapidamente assegurar a visibilidade e as iniciativas nas
institucionalizado: 55% de visitantes com o 3.º ciclo e 86% com o plataformas digitais. Isto ainda que a atividade cultural mais inten-
ensino superior. Por seu lado, no ‘património a Sul’ as percentagens sificada, por via da web, tenha sido ver filmes e séries (ver capítulo
correspondentes a estes graus de instrução são 81% e 98%. Nos dois 2). Tendências similares resultam de um estudo realizado em con-
grupos, a proporção de homens é mais elevada do que a presença texto brasileiro, evidenciando que a prioridade da procura cultural
feminina, havendo uma menor disparidade de sexo/género entre os no ambiente digital se dirigiu à audição de música, seguida de visio-
que já visitaram o ‘património a Sul’ do que na população que se des- namento de filmes, séries e, numa posição mais recuada, «shows»; os
loca ao ‘património a Norte’. espetáculos de teatro e as visitas a museus e exposições alcançaram a
menor atenção (Instituto Itaú Cultural e Datafolha 2020).
Ao compararem a evolução das práticas culturais em França
De offline para online e nos EUA, Angèle Christin e Olivier Donnat questionavam, em
2014, se a proliferação recente de ecrãs não teria produzido uma
A frequência das visitas a museus, monumentos históricos, sítios situação semelhante à de meio século atrás, quando o equipamento
arqueológicos e galerias de arte através da Internet (gráfico 5.11) intensificado das residências americanas com televisões susci-
caracteriza-se pelo foco principal nos monumentos e nos museus, tou uma competição desfavorável com outros usos do tempo livre
referidos por 14% e 13% dos inquiridos, respetivamente. Apesar (Christin e Donnat 2014). Se o distanciamento do apetrechamento
de o contacto virtual – visionando o espaço geral e/ou uma expo- com tecnologias digitais pode ser explicado, entre outros fatores,
sição, ouvindo podcasts relacionados – ser menos recorrente do que pela apreensão com a concorrência entre ingresso à distância via
a visita presencial (gráfico 5.1), constata-se um padrão idêntico no media digitais e visitas presenciais, o confinamento social de 2020
modo como o interesse se reparte. No inquérito relativo a Espanha, obrigou à deslocação massiva para a atmosfera digital, desde logo
10% ingressaram em monumentos através da Internet e visitaram para comprovar o não encerramento total das entidades culturais.
Fez emergir, assim, a necessidade, que vinha sendo objeto de uma
reflexão crescente, de os museus e os seus profissionais adotarem
Gráfico 5.11 – Frequência de visitas através da Internet (%) uma perspetiva ativa e interessada no equipamento digital de modo
a garantir a continuidade do trabalho de envolvimento de visitantes.9
O estudo das implicações do lockdown na situação do sector cultural
em Portugal apontou limitações e constrangimentos em matéria de
9
A investigação dos panoramas museológicos de Portugal, Itália e Grécia iden-
tificou quatro perfis profissionais cada vez mais necessários na inserção dos museus
na era digital: digital strategy manager; digital colletion curator; digital interactive
experience developer; e online community manager (Carvalho e Matos 2018). Con-
servação, curadoria, comunicação, programação e educação avistam-se em poten-
cial mutação também no que se refere ao ensino, sendo relevante que a formação
integre e articule estudos culturais, ciências sociais e humanidades para enfrentar a
tendência a deixar o sector da cultura sob gestão, pesquisa e avaliação exclusivas de
(N=2000) engenharia computacional (Martinho 2018).

224 225
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

recursos e p­ rofissionais q
­ ualificados em media digitais, designada- mais vezes, a um espaço patrimonial sobressaem a falta de tempo, a
mente no sector dos museus e monumentos (Camacho 2020). Ao ausência de interesse ou a preferência por outras atividades e o preço
mesmo tempo, um estudo da Rede de Organizações Museológicas elevado, sendo que a questão do interesse pode encobrir dificuldades
Europeias (NEMO) sobre as consequências do confinamento na de reconhecimento, mais do que ser uma escolha fundamentada no
reorganização destas entidades mostrou alguns sinais, em Portugal, conhecer ou no gostar. Talvez os monumentos se apresentem mais
de diversificação da atividade digital durante a crise pandémica; mas a atrativos pela sua arquitetura de maior abertura e equilíbrio na dis-
intensidade maior de resposta digital dos museus europeus registou- tribuição de espaços fechados e abertos, pela história e pela narra-
-se no Reino Unido e na Rússia (NEMO 2020, 13). A partir de uma tiva provavelmente mais difundidas e reconhecidas. Podem, pois, ter
análise comparativa das respostas políticas, em todo o mundo, à crise um papel indutor do interesse e das visitas aos museus e aos sítios
disseminada no sector cultural e criativo, Portugal figura entre os paí- arqueológicos, renovando o panorama dos modos de frequentação.
ses que não foram abrangidos por políticas estruturais no referente a As incursões em lugares patrimoniais em Portugal formam um
digitalização, entre outras dimensões (Travkina e Sacco 2020). círculo socialmente estreito, facultando mais uma ilustração do
padrão constante da procura e participação cultural no contexto
português, caracterizado pela presença esbatida de grupos mais des-
Síntese conclusiva munidos em condições socioeconómicas e pela polarização perma-
nente entre os jovens – ocupando com maior probabilidade a esfera
O nosso estudo mostrou o interesse e a presença predominantes cultural, numa aproximação favorecida pela escola – e os seniores.
dos portugueses em redor dos monumentos históricos, surgindo os O distanciamento tanto maior quanto mais se avança na idade repre-
museus em lugar secundário, numa área menos conhecida; e apenas senta uma tendência que isola Portugal e que importa inverter, atra-
os roteiros das incursões dos estratos mais qualificados integram os vés também de iniciativas que possam tirar proveito de um efeito
sítios arqueológicos e as galerias de arte. Falar em públicos e pro- contagiante entre monumentos e museus e dos frutos antevistos na
curas continua a merecer ressalvas quando se dispõe de um leque união de esforços, considerando especialmente, mas não de maneira
mais elementar de questões, como aquele que foi abordado neste exclusiva, o envolvimento de seniores. Referimo-nos ao estabeleci-
módulo do Inquérito; propõe-se, então, mencionar preferencial- mento de parcerias entre museus, palácios e monumentos e organi-
mente incursões, por ser uma incógnita o grau em que as idas se vão zações de cidadãos, associações de defesa do património cultural e de
constituir como hábito e ritual.10 solidariedade social, entidades culturais coletivas – teatros, bibliote-
A maior parte das visitas realiza-se noutro concelho do país, com cas, associações multidisciplinares – e mesmo artistas. A criação e o
grande probabilidade enquadradas em passeio, convívio e interesses desenvolvimento de intervenções articuladas entre museus, monu-
temáticos, numa deambulação intermunicipal dinamizada pela von- mentos históricos e as entidades regionais de turismo dos diferentes
tade de aproximação do património cultural e porventura alavancada territórios também pode integrar o trabalho cooperativo e em rede,
por referências fundadoras da identidade nacional. Aliás, de entre as ainda que não formalizada, com o objetivo de realizar projetos con-
razões que levaram os inquiridos a visitarem museus, monumentos juntos relacionados com a criação de roteiros e de itinerários cultu-
históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte destaca-se a impor- rais, beneficiando de financiamento dos sectores público, privado e
tância histórica do espaço, a sociabilidade e a beleza dos espaços, terceiro sector.
sugerindo um tempo livre que suspende as obrigações e os cená- As novas perspetivas e correntes na museologia e noutras áreas
rios do quotidiano concentrado no trabalho e no espaço doméstico. do campo cultural têm enfatizado a relevância dos projetos colabo-
No conjunto de razões invocadas para não se ter visitado, ou ido rativos e das iniciativas participativas que reforçam a intervenção das
entidades culturais como mediadoras, atribuindo um lugar nuclear
10
Ver Conde (1992 e 1996). aos cidadãos e às comunidades nas iniciativas e programações que

226 227
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

promovem. É neste cenário que o conceito de visitante transita para Referências bibliográficas
a noção de participante ativo, um coprodutor ou prosumer em con-
texto presencial, que pode ter voz e intervir em projetos participa- Beck-Domzalska, Marta, ed. 2019. EUROSTAT. Culture Statistics. Luxemburgo:
tivos, da curadoria à execução, passando pela governança através de Publications Office of the European Union. https://ec.europa.eu/eurostat/
associações e outras figuras coletivas de que façam parte. O maior documents/3217494/10177894/KS-01-19-712-EN-N.pdf/915f828b-daae-1cca
povoamento e visitação regular do tecido patrimonial é tão mais -ba54-a87e90d6b68b.
Bourdieu, Pierre, e Alain Darbel. 1969. L’Amour de L’Art: Les musées d’art européens
crucial por duas razões, tendo como mote a palavra coesão. Este
et leur public. Paris: Minuit.
vocábulo tem sido associado repetidamente à possibilidade de a pro- Bourdieu, Pierre. 2010 [1979]. A Distinção – Uma Crítica Social da Faculdade do
moção do valor económico e social do património gerar ligação entre Juízo. Lisboa: Edições 70.
geografias diversas e desconetadas: litoral e interior; zonas urbanas e Camacho, Clara, coord. 2020. Grupo de Projeto Museus no Futuro. Relatório Final.
localidades rurais; Continente e Ilhas.11 Além disso, e como o termo Disponível em http://www.patrimoniocultural.gov.pt/static/data/docs/2020/07/
coesão remete para ligação, comunidade e coletivo, é de relembrar 15/relatoriomuseusfuturo7_7.pdf.
que os museus e outros espaços patrimoniais, bem como mais enti- Carvalho, Ana, e Alexandre Matos. 2018. «Museum Professionals in a Digital
dades culturais, têm o valor de criarem situações de receção, sem World: Insights from a Case Study in Portugal». Museum International, Spe-
cial Issue: Museums in a Digital World, 70, n.º 277.278: 34-47. Disponível em
as quais os públicos não se formam nem constituem (Dewey 2010
chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/viewer.html?pdfurl=
[1927]). Isto pela perceção que as pessoas têm umas das outras em http%3A%2F%2Fwww.project-musa.eu%2Fwp-content%2Fuploads%-
ações comuns, como observar a mesma exposição, deambular pelo 2F2019%2F01%2FCARVALHO-e-MATOS_Museum-Professionals-in-a-
mesmo monumento, ouvir e dialogar com o curador ou programa- Digital-World.pdf&clen=1560062&chunk=true.
dor cultural sobre os temas e a história da mostra/coleção, partilhar Chile. 2018. Encuesta nacional de participación cultural 2017. Disponível em http://
opiniões e expandir perspetivas sobre os significados dos artefactos e www.encuestas.uc.cl/cultura/img/documentos/enpc_2017.pdf.
dos símbolos, interagindo e tomando consciência da sua capacidade Christin, Angèle, e Olivier Donnat. 2014. «Pratiques culturelles en France et aux
e também do seu poder. États-Unis: Éléments de comparaison 1981–2008». Culture Études, 1, 1: 1-16.
Disponível em https://www.cairn.info/revue-culture-etudes-2014-1-page-1.htm.
Conde, Idalina. 1992. «Percepção estética e públicos da cultura: perplexidade e
redundância». In Percepção Estética e Públicos da Cultura, org. Idalina Conde.
Lisboa: ACARTE/Fundação Calouste Gulbenkian, 143-164.
Conde, Idalina. 1996. «Cenários de práticas culturais em Portugal». Sociologia, Pro-
blemas e Práticas, 23: 117-188.
Costa, António Firmino da. 2004. «Dos públicos da cultura aos modos de relação
com a cultura: Algumas questões teóricas e metodológicas para uma agenda de
investigação». In Públicos da Cultura. Actas do Encontro Organizado pelo Obser-
vatório das Atividades Culturais no Instituto de Ciências Sociais da Universidade
de Lisboa, org Rui Telmo Gomes. Lisboa: Observatório das Atividades Culturais,
121-140.
Delicado, Ana. 2006. «Os museus e a promoção da cultura científica em Portu-
gal». Sociologia, Problemas e Práticas, 51. Disponível em https://sociologiapp.
iscte-iul.pt/pdfs/51/532.pdf.
11
Ver, entre outros, os seguintes documentos programáticos: Programa Nacio- Dewey, John. 2010 [1927]. Le Public et ses problèmes. Paris: Gallimard.
nal para a Coesão Territorial; Programa de Valorização do Interior; Estratégia de Dewey, John. 1938. Experience & Education. Nova Iorque: Macmillan.
Desenvolvimento Comum Transfronteiriço; Estratégia Portugal 2030; Visão Estra- DGPC (Direção-Geral do Património Cultural). 2015. Resultados Globais do
tégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030. Ver ainda Estudo de Públicos de Museus Nacionais. Lisboa: DGPC. Disponível em http://
Dümcke e Gnedovsky (2013) e Valença et al. (2020).

228 229
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

www.patrimoniocultural.gov.pt/static/data/docs/2016/05/20/ResultadosGlo- Hooykaas, Reijer.1983. O Humanismo e os Descobrimentos na Ciência e nas Letras


baisEPMN.pdf. Portuguesas do Século XVI. Lisboa: Gradiva.
Dicks, Bella. 2016. «The Habitus of Heritage: A Discussion of Bourdieu’s Ideas Instituto Itaú Cultural e Datafolha. 2020. Hábitos Culturais. Expectativa de rea-
for Visitor Studies in Heritage and Museums», Museum & Society, 14, n.º 1: bertura e comportamento digital. Setembro.https://portalassets.icnetworks.org/
52-64. Disponível em https://journals.le.ac.uk/ojs1/index.php/mas/article/ uploads/attachment/file/100597/habitos_culturais.pdf
view/625/588. Jacobi, Daniel. 2017. Les musées sont-ils condamnés à séduire? Et autres écrits muséo-
Donnat, Olivier. 1993. «Les publics des musées en France». Publics et Musées, 3: logiques. Paris: MkF éditions.
29-43. Lähdesmäki, Tuuli, Katja Mäkinen, Viktorija L. A. Čeginskas, e Sigrid Kaasik-Kro-
Dümcke, Cornelia, e Mikhail Gnedovsky. 2013. The Social and Economic Value of gerus. 2021. Europe from Below. Notions of Europe and the European among Par-
Cultural Heritage: Literature Review. European Expert Network on Culture. ticipants in UE Cultural Initiatives. Leiden e Boston: Brill.
Disponível em chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/viewer. Le Goff, Jacques. 1984. «Memória». In Enciclopedia Einaudi. Volume 1 memória
html?pdfurl=https%3A%2F%2Fwww.interarts.net%2Fdescargas%2Finte- – História, coord. Fernando Gil. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda,
rarts2557.pdf&clen=1345759&chunk=true. 11-50.
Eurobarómetro. 2017. Special Eurobarometer 466. Cultural Heritage. Disponível em Lombardo, Philippe, e Loup Wolff. 2020. Cinquante ans de pratiques culturelles
https://data.europa.eu/euodp/en/data/dataset/S2150_88_1_466_ENG. Bruxe- en France. Paris: Département des études de la prospective et des statistiques
las: Comissão Europeia. (DEPS) du Ministère de la Culture.
Falk, Martin, e Tally Katz-Gerro. 2016. «Cultural Participation in Europe: Can We Lopes, João Teixeira. 2004. «Experiência estética e formação de públicos». In Públi-
Identify Common Determinants?». Journal of Cultural Economics, 40: 172-162. cos da Cultura. Actas do Encontro Organizado pelo Observatório das Atividades
FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia. 2019. Agenda Temática de Investigação Culturais no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, org Rui
e Inovação Cultura e Património Cultural. Disponível em https://www.fct.pt/ Telmo Gomes. Lisboa: Observatório das Atividades Culturais, 43-54.
agendastematicas/docs/Agenda_I&I_CPC.pdf. Lopes, João Teixeira. 2011. «Museus e territórios educativos de intervenção priori-
Fortuna, Carlos. 1995. «Turismo, autenticidade e cultura urbana: percurso teórico, tária: um triplo jogo». In El Pensamiento Museológico Contemporáneo/O Pensa-
com paragens breves em Évora e Coimbra», Revista Crítica de Ciências Sociais, mento Museológico Contemporâneo. II Seminario de Investigación en Museología
43: 11-46. de los países de lengua portuguesa y española, coord. Nelly Decarolis. Buenos
Fortuna, Carlos. 2016. «Património com futuro…ou sobre a resiliência das cida- Aires: Comité Internacional del ICOM para la Museología, 682-694. Disponível
des», Revista Património, 4: 7-13. em https://icom.museum/wp-content/uploads/2018/07/ICOFOM-LAM_2_
Garcia, José Luís, João Teixeira Lopes, Teresa Duarte Martinho, José Soares Neves, Seminario_museologia.pdf.
Rui Telmo Gomes, e Vera Borges, 2018. «Mapping Cultural Policy in Portugal: Martinho, Teresa Duarte, e Rui Gomes. 2005. O Centro Cultural de Cascais. Estudo
From Incentives to Crisis». International Journal of Cultural Policy, 24, n.º 5: de Um Equipamento Municipal. Lisboa: Observatório das Actividades Culturais.
577-593. Disponível em https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/102866 Martinho, Teresa Duarte. 2007. Apresentar a Arte: Estudo sobre Monitores de Visitas
32.2016.1248950. a Exposições. Lisboa: Observatório das Actividades Culturais.
Gomes, Rui Telmo. 2004. «A distinção banalizada? Perfis sociais dos públicos da Martinho, Teresa Duarte. 2014. «A história da ciência em exposição. Estudo de caso
cultura». In Públicos da Cultura. Actas do Encontro Organizado pelo Observató- sobre a mostra ‘360º Ciência Descoberta’». Comunicação apresentada no VIII
rio das Atividades Culturais no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Congresso Português de Sociologia. Disponível em https://repositorio.ul.pt/
Lisboa, org Rui Telmo Gomes. Lisboa: Observatório das Atividades Culturais, handle/10451/20439.
31-41. Martinho, Teresa Duarte. 2018. «Researching Culture through Big Data: Compu-
Harvey, David. 2005. A Brief History of Neoliberalism. Oxford: Oxford University tational Engineering and the Human and Social Sciences», Social Sciences, 7, n.º
Press. 12: 264. https://doi.org/10.3390/socsci7120264.
Hein, George E. 2000. Learning in the Museum. Londres: Routledge. MCUD (Ministerio de Cultura y Deporte). 2019. Encuesta de Hábitos y Prácticas
Hendon, William S., Frank Costa, e Robert Allan Rosenberg. 1989. «The Gene- Culturales en España 2018-2019. Síntesis de Resultados. Madrid: Ministerio de
ral Public and the Art Museum: Case Studies of Visitors to Several Institutions Cultura y Deporte, División de Estadística y Estudios, Secretaría General Téc-
Identify Characteristics of Their Publics», The American Journal of Economics nica. Disponível em http://ww w.culturaydeporte.gob.es/dam/jcr:a921316c -ed
and Sociology, 48, n.º 2: 231-243. Disponível em https://www.jstor.org/sta- cd-4d33-862f-677a13177eaa/sintesisde-resultados-encuesta-de-habitos-y-pract
ble/3487605?seq=1#metadata_info_tab_contents. icas-culturales-2018-2019.pdf.

230 231
Práticas Culturais dos Portugueses Museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte

Menger, Pierre Michel. 2010. «Cultural Policies in Europe. From a State to a City- Santos, Maria de Lourdes Lima, coord., e José Soares Neves. 2005. Panorama Museo-
Centered Perspective on Cultural Generativity». GRIPS (Graduate Institute for lógico em Portugal [2000-2003]. Lisboa: Observatório das Actividades Culturais
Policy Studies) Discussion Paper, 10-28. e Instituto Português dos Museus.
Motta, António. 2014. «Património». In Dicionário Crítico das Ciências Sociais dos Sardo, Delfim 2015. «O tempo que passa». In Artes Plásticas e Crítica em Portu-
Países de Fala Oficial Portuguesa, org Livio Sansone e Cláudio Alves Furtado. gal nos Anos 70 e 80: Vanguarda e Pós-Modernismo, Isabel Moreira. Coimbra:
Salvador: EDUFBA, 379-391. Imprensa da Universidade de Coimbra.
NEMO – Network European Museum Organizations. 2020. Survey on the Impact Semedo, Alice, Rafaela Ganga, e Célia Oliveira. 2018. Visitar Museus e Monumentos:
of the COVID-19 Situation on Museums in Europe. Final Report. Disponível em Um Estudo-Piloto de Fatores Motivacionais. Porto: CITCEM – Centro de Inves-
https://www.ne-mo.org/fileadmin/Dateien/public/NEMO_documents/NEM tigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória.
O_COVID19_Report_12.05.2020.pdf. Shields, Rob. 1992. Places on the Margin: Alternative Geographies of Modernity. Lon-
Neves, José Soares, e Teresa Mourão. 2016. «O estudo de públicos nos museus dres: Sage.
nacionais». Revista Património, 4: 140-144. Silva, Augusto Santos, Felícia Luvumba, Helena Santos, e Paula Abreu. 2000. Públi-
Observatório do Património. 2017. Património em Números 2016. Lisboa: Observa- cos para a Cultura. Porto: Edições Afrontamento e Câmara Municipal do Porto.
tório do Património. Disponível em https://issuu.com/observatoriopatrimonio/ Silva, Paula Araújo da, e Filipe Campos Silva, coord. 2019. Relatório de Atividades
docs/op_20vers_c3_a3o_20preliminar_20nov. 2018. Lisboa: Direção-Geral do Património Cultural. http://www.patrimonio-
Pais, José Machado, coord., João Sedas Nunes, Maria Paula Duarte, e Fernando cultural.gov.pt/static/data/instrumentosdegestaonovo/relatorios_planos_de_
Luís Mendes.1994. Práticas Culturais dos Lisboetas. Lisboa: Imprensa de Ciên- atividades/2018/relatoriodeatividades2018.pdf.
cias Sociais. Sobral, José Manuel. 2012. Portugal, Portugueses: Uma Identidade Nacional. Lisboa:
Pais, José Machado. 1998. «As ‘cronotopias’ das práticas culturais do quotidiano». Fundação Francisco Manuel dos Santos.
Boletim OBS, 4: 7-9. Disponível em http://www.gepac.gov.pt/oac-1996-2013/ Sundbo, Jon, e Flemming Sørensen, eds. 2013. Handbook on the Experience Eco-
gepac-oac/oac-documentos-electronicos.aspx. nomy. Cheltenham: Edward Elgar Publishing.
Pine, B. Joseph, e James H. Gilmore. 1999. The Experience Economy: Work is Thea- Travkina, Ekaterina, e Pier Luigi Sacco. 2020. Culture Shock: COVID-19 and the
tre & Every Business a Stage. Boston, MA: Harvard Business School Press. Cultural and Creative Sectors, OCDE. Disponível em https://www.oecd.org/
Santos, Maria de Lourdes Lima dos. 1988. «Questionamento à volta de três noções coronavirus/policy-responses/culture-shock-covid-19-and-the-cultural-and-
(a grande cultura, a cultura popular, a cultura de massas)». Análise Social, vol. creative-sectors-08da9e0e/.
XXIV, n.º 101-102: 689-702. Valença, Catarina Gonçalves, José Maria Lobo de Carvalho, e José Tavares. 2020.
Santos, Maria de Lourdes Lima dos, coord., Lina Antunes, Idalina Conde, Antó- Património Cultural em Portugal: Avaliação do Valor Económico e Social. Lisboa:
nio Firmino da Costa, Eduardo de Freitas, Rui Telmo Gomes, Carmen Gon- Fundação Millennium bcp.
çalves, Helena Seita Gonçalves, João Teixeira Lopes, Vanda Lourenço, António Zhu, Yujie. 2021. Heritage Tourism. From Problems to Possibilities. Cambridge:
Martinho, Teresa Duarte Martinho, José Soares Neves, João Sedas Nunes, Elsa Cambridge University Press.
Pegado, Isabel Pires, e Francisco Silva. 1998. Políticas Culturais em Portugal. Lis-
boa: Observatório das Actividades Culturais.
Santos, Maria de Lourdes Lima dos, coord., Alexandre Melo, e Teresa Duarte Mar-
tinho. 2000. Galerias de Arte em Lisboa. Lisboa: Observatório das Atividades
Culturais.
Santos, Maria de Lourdes Lima dos, coord., Rui Telmo Gomes, Vanda Lourenço,
Teresa Duarte Martinho, Ana Mocuixe Moura, e Jorge Alves dos Santos. 2005.
Contribuições para a Formulação de Políticas Públicas no Horizonte 2013 Rela-
tivas ao ‘Tema Cultura, Identidades e Património Cultural’. Relatório Final. Lis-
boa: Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e Observatório das
Actividades Culturais. Disponível em https://repositorio.ul.pt/handle/10451
/41376?mode=full.
Santos, Jorge, e José Soares Neves. 2005. Os Museus Municipais de Cascais. Lisboa:
Observatório das Actividades Culturais.

232 233
Vera Borges

Capítulo 6

Ecletismo ou distinção?
Cinema, espetáculos ao vivo,
festivais e festas locais

Este capítulo reúne e analisa um conjunto de indicadores relati-


vos ao acesso à cultura, sinalizado, no Inquérito às Práticas Culturais
dos Portugueses, pela frequência das salas de cinema, espetáculos
ao vivo, festivais e festas locais. Descrevemos cenários possíveis de
estruturação das práticas culturais pesquisadas e estamos interessa-
dos em identificar valores partilhados com outros países, paradig-
mas, modelos comuns ou diferenciados do consumo cultural. Vamos
dialogando com as tendências de evolução das políticas públicas para
a cultura (Bonet e Négrier 2018). Damos a conhecer as motivações
dos indivíduos e as razões pelas quais não vão mais vezes aos espe-
táculos, informação relevante sobre as condições de oferta e pro-
cura cultural no país. Não rejeitamos que as análises quantitativas
têm riscos e as comparações com países com décadas de trabalho de
perspetiva longitudinal têm alguns limites (Costa 2004; Katz-Gerro
2011). Todavia, este Inquérito nacional mede um escopo alargado
de consumos culturais e a sua análise incide sobre variáveis estrutu-
rais. Vai permitir-nos discutir o que as políticas públicas têm vindo
a fazer, o que ainda podem desenvolver, e aferir sobre os circuitos
de criação e difusão que as sustentam. A superação do grau zero do
consumo cultural está conseguida, o que fica a dever-se à ida às salas
de cinema, aos concertos, festivais e festas locais. Mas que t­ endências

235
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

de ­consumo estão reservadas à ópera, ao ballet ou à música clássica? No entanto, a literatura internacional chama a nossa atenção para a
Quais os perfis dos públicos de teatro, circo e outras danças? forte fragilização do consumo das atividades eruditas na ligação às
A qualidade da análise dos dados ganhará se tivermos em conta o classes sociais mais altas (DiMaggio e Muktar 2004).
conjunto das práticas e o ecletismo cultural contemporâneo. A nível Inquéritos nacionais, semelhantes ao nosso, como o Taking Part
nacional, os estudos pioneiros de J. M. Pais (1994), C. Fortuna e Survey, em Inglaterra, Les pratiques culturelles des français e o Survey
A. S. Silva (2002) e J. T. Lopes (2008) inscrevem-se nessa perspetiva, on Public Participation in Arts (SPPA), nos EUA, descrevem a evolu-
que seguiremos. Descrevemos o sentido do ecletismo e as combi- ção dos consumos culturais. A partir das bases de dados e indicado-
natórias do consumo cultural in situ. Revisitamos o argumento da res-chave, discutem-se os perfis de consumo e as clivagens sociais em
distinção cultural e procuramos testar a «orientação omnívora» dos diferentes países (Katz-Gerro 2002; López Sintas e García-­Álvarez
inquiridos. Veremos que é o ecletismo dos mais jovens e mais ins- 2002; Coulangeon e Roarik 2005; Coulangeon e Lemel 2007; Jæger
truídos que faz eco do «omnivorismo cultural». Por fim, discutimos e Katz-Gerro 2010). Mais recentemente, Reeves (2019) desenvol-
até que ponto se atenuam ou reforçam as clivagens sociais pela inten- veu uma pesquisa comparativa, com 30 países e regiões europeias,
sificação do consumo cultural online, durante a crise pandémica. Os e demostrou que, em alguns deles, parece existir uma aproximação
resultados refletem o longo caminho que a democratização cultural entre as classes sociais, e a distinção cultural não corresponde a uma
tem pela frente e permitem-nos concluir que, apesar dos efeitos da oposição estruturada das mesmas. A «alta cultura» pode ter uma
massificação do ensino, estes dados são perturbados pela origem e fraca conexão com a classe social em países onde os indivíduos se
posição social dos indivíduos na estrutura profissional. Feita a apre- identificaram mais vezes como fazendo parte da classe trabalhadora
sentação dos objetivos, a ressalva quanto aos limites da investigação, (Reino Unido, Finlândia e Portugal) ou, mais provocador, estas prá-
observemos as regularidades do consumo cultural destas práticas. ticas podem estar mais dissolvidas nesses contextos (Reeves 2019,
Começamos com uma breve revisão da literatura, segue-se a meto- 11). Aconteceu nos EUA, onde esta forma de capital cultural parecia
dologia, os resultados e a síntese conclusiva. estar em declínio (DiMaggio e Mukhtar 2004).
Subjacente aos padrões de consumo estão os gostos e estilos de
vida das populações e os modelos históricos de relação dos países
Ecletismo ou distinção? com a cultura. No caso norte-americano, a familiaridade das classes
superiores com a cultura erudita está ligada às formas de financia-
Esta questão, inspirada nos trabalhos de Bourdieu (1984), mento das instituições de produção e difusão cultural; no caso fran-
­ iMaggio (1987), DiMaggio e Muktar (2004), Peterson (1997),
D cês, está ligada aos modos de seleção e formação das elites. Também
Coulangeon (2004, 2005, 2011, 2017), Chan e Goldthorpe (2005, aqui os mecanismos de produção de desigualdades culturais deixa-
2007) e Reeves (2019), mostra-nos como a literatura sociológica ram de ser analisados como se existisse uma hierarquia de bens cul-
internacional mantém acesa a discussão em torno da evolução dos turais que se excluem uns aos outros. Neste país, a familiaridade com
paradigmas de consumo cultural: da cultura erudita ou «alta cultura», a alta cultura deve-se à antiguidade do financiamento público e à tra-
com espetáculos de ópera, ballet e concertos de música clássica, pas- dição do mecenato ligada aos equipamentos de produção e difusão
sando pelo cinema, teatro, dança, até à cultura popular, com festas – como os teatros, as óperas, os museus e os festivais – e aos artistas
locais, e os eventos de massas, de que são exemplo os concertos (­Coulangeon 2004, 69-70). Nos países anglo-saxónicos, a distinção
de música pop-rock. A cultura erudita tem sido considerada parte cultural está mais ligada à gestão das artes e marketing do que à fre-
integrante do capital cultural e fonte de distinção social. É escolhida quência dos espetáculos, valorizando-se o papel do mecenato e dife-
pelos indivíduos com posições sociais privilegiadas, rendimentos rentes estilos de participação cultural (Taylor 2016).
importantes (Reeves e de Vries 2018), graus de instrução elevados No caso português, historicamente, o setor cultural não foi um
(Bennett et al. 2009), e é legitimada pelas instituições (Larsen 2016). pilar central no pós-25 de Abril, depois do longo período de ditadura,

236 237
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

pelo que a democratização cultural tem ainda um longo caminho a argumento, o da autonomia relativa do indivíduo e a segmentação
percorrer. No entanto, certos segmentos da população têm vindo a das culturas de classe. As formas mais radicais deste argumento
introduzir a cultura na vida quotidiana, em territórios específicos, (Bauman 1988; Featherstone 1987) consideram que o indivíduo tem
dando sinais importantes do que pode ser a democracia cultural capacidade para se libertar do condicionamento social e de qualquer
(Rego e Borges 2021). Por outro lado, os resultados deste Inqué- influência para escolher e formar as suas identidades, estilos de vida
rito nacional mostram-nos que espetáculos como a dança clássica, a e preferências de consumo cultural. A estratificação social (estru-
ópera ou os concertos de música clássica são apenas consumidos por tura de desigualdade que prevalece na sociedade) e a estratificação
indivíduos com graus de escolaridade elevados e status profissionais cultural aproximam-se. Afirmar que os indivíduos das classes mais
com acesso a redes de relações alargadas e padrões de consumo varia- elevadas preferem e consomem a «alta cultura» e os indivíduos das
dos. São três as perguntas às quais podemos ainda tentar responder: classes inferiores consomem cultura popular não é compatível com
como é que a abertura à diversidade de consumo das práticas cultu- uma sociedade fundada na «pluralidade de pertenças» (Lahire 2008).
rais se expressa nos diferentes grupos sociais retratados? Quais são Este argumento defende que, nos meios mais cosmopolitas, onde
as suas implicações para a forma como se entende a estratificação predominam rendimentos elevados, as diferenças nos padrões de
cultural? Até que ponto estes resultados se assemelham ou afastam consumo cultural perdem a base explicativa na estratificação social.
daqueles publicados por outros países europeus?

O caso do omnivorismo cultural e o «canto do cisne»


O argumento da distinção
Por fim, examinamos o terceiro argumento, o «omnivorismo cul-
Para responder a estas questões, o primeiro argumento a revisi- tural». Trata-se de um padrão de consumo que prevê que o indivíduo
tar é o da herança ou legitimidade cultural, conhecido por modelo frequenta e assiste a uma diversidade de atividades culturais que têm
da «homologia estrutural» das posições sociais e estilos de vida. diferentes níveis de sofisticação. Até certo ponto, desafia os ante-
Este modelo dominou em França, desde os anos 70, e foi teorizado riores, da «homologia» e da «individualização». A sua importância
por Bourdieu (1984). Os gostos e práticas culturais e os elementos deve-se a Peterson (1992, 1997; Peterson e Simkus 1992; Peterson e
que caracterizam o estilo de vida dos indivíduos resultam do habi- Kern 1996). Os autores utilizaram os dados do SPPA e provaram que
tus, ou seja, de um conjunto de disposições, padrões de perceção o gosto musical das classes superiores não se caracterizava pela forte
e ação incorporados durante a socialização primária e que refletem familiaridade com a música clássica e a ópera (embora fosse maior do
as características sociais do meio. Este modelo apoia-se na ideia de que nas classes populares), mas pelo ecletismo das suas preferências.
transmissão do capital cultural e não tanto na acumulação de capi- Os «snobs da cultura», as elites dos EUA, estavam a participar em ativi-
tal pelo indivíduo, discutindo-se mais a reprodução intergeracional dades de cultura intermédia e popular. Desde então, os estudos sobre
das classes sociais, a herança cultural (Bourdieu e Passeron 1977). o «omnivorismo cultural» abriram perspetivas e muitas discussões
Por seu turno, a legitimidade cultural, as posições ocupadas na estru- (Peterson 2005; Johnston e Baumann 2007; Reeves 2012). O Inqué-
tura social e as preferências estéticas estão ligadas pelo princípio da rito português não foi construído para testar a hipótese do «omni-
homologia estrutural: a identidade social, a posição do indivíduo no vorismo cultural», no entanto os nossos resultados dão-lhe suporte.
espaço social dos gostos. A este modelo está associada uma visão uni- Descrevemos as variáveis que podem estar em jogo quando os portu-
ficada e hierarquizada dos consumos culturais e estilos de vida dos gueses mostram um portefólio variado de práticas como a ópera, os
indivíduos. A ópera, a música clássica e o jazz enquadram-se nesta concertos pop-rock, jazz, teatro, géneros e estilos musicais distintos.
dimensão do modelo, entretanto, discutido à luz das «metamorfo- Num relance, uma primeira hipótese que colocamos é que os nos-
ses da distinção» (Coulangeon 2011). Revisitamos, agora, o segundo sos resultados traduzem o ecletismo de uma parte dos p ­ ortugueses

238 239
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

pela acumulação de uma variedade de práticas culturais. Pergunta- f­requência com que estes participaram nos espetáculos: 0 = nunca
mos quais são os segmentos da população que mais participam nas frequentou; 1 = frequentou 1-2 vezes; 2 = frequentou 3-5 vezes; 3
atividades reconhecidas e legitimadas pelo apoio do Estado. E ainda: = frequentou mais de 5 vezes. Para o fazer, utilizou sete práticas cul-
quais são os segmentos que estão muito pouco comprometidos com turais, o teatro, o ballet, a dança e a ópera, entre outras, e construiu o
estas práticas culturais? Que motivos invocam para o seu afasta- «índice cumulativo da prática cultural» (Reeves 2019, 4-5). No caso
mento e que espetáculos mais frequentam? Uma segunda hipótese português, utilizamos as perguntas referentes à frequência com que
a explorar é a ideia oriunda da literatura que aproxima a acumulação os inquiridos foram ao cinema, espetáculos ao vivo, ballet, outras
de atividades com o alargamento da rede de relações sociais do indi- danças, ópera, teatro, circo, concertos e festivais e festas locais, nos
víduo (DiMaggio 1987). Será que este ecletismo de gostos e práticas últimos 12 meses. Depois, em função da frequência e intensidade das
é condicionado pela diversidade das relações sociais dos indivíduos? práticas foram atribuídos os seguintes pontos aos inquiridos: para
A sociabilidade está sujeita à acumulação, extensão e diversidade todas as práticas culturais (à exceção do cinema): 3 = uma vez por mês
da rede de relações dos indivíduos e tende a aumentar com a posi- ou mais; 2 = três ou mais vezes por ano, mas não todos os meses;
ção social do individuo. Qual será a classe socioprofissional que faz 1 = uma ou duas vezes por ano; 0 = nunca frequentou; para o cinema:
mais eco do «omnivorismo cultural»? Será que o consumo de uma 3 = uma vez por semana ou mais; 2 = uma ou várias vezes por mês,
variedade de práticas culturais pode alimentar e alargar as redes de mas não todas as semanas; 1= uma ou várias vezes por ano, mas não
relações sociais destes indivíduos (a hipótese inversa também é pos- todos os meses; 0 = nunca frequentou.
sível)? A terceira hipótese é que este «omnivorismo» está relacio- Em seguida, criámos uma nova variável que resultou do somató-
nado com o capital cultural dos indivíduos e dos pais, alarga-se às rio das nove práticas culturais aqui analisadas, de forma a obtermos
práticas culturais e disposições estéticas (Coulangeon 2017), tendo o «índice cumulativo de prática cultural». Tal como Reeves (2019),
estreita correlação com o nível de escolaridade dos indivíduos e o seu procedemos à atribuição dos pontos pelo baixo, médio, alto ou
grau de tolerância cultural (Chang 2019; Warde, Wright e ­Gayo-Cal muito alto nível de «omnivorismo cultural». A um índice de baixo
2008; Bryson 1996). Existem, no entanto, grupos sociais mais esco- consumo cultural correspondem os inquiridos que alcançaram entre
larizados que não são tão permeáveis a certas produções de cultura 0 e 5 pontos; médio consumo cultural = 6 a 13 pontos; alto consumo
popular. Mas talvez o «omnivorismo cultural» que observamos aqui, cultural = 14 a 17 pontos; muito alto consumo cultural = 18 a 27
nos mais jovens, reflita uma nova sensibilidade para a cultura. Nos pontos. Uma vez que a proposta do autor se aplicava a sete práticas
grupos etários mais jovens, entre os 15-24 anos, os indivíduos assi- culturais foi usada uma regra de três simples de modo a definir os
milam valores de tolerância cultural, contudo, precisaríamos de pes- limites mínimos e máximos para cada categoria, tendo por base as
quisa qualitativa para provar se estamos diante de indivíduos mais nove práticas culturais da versão portuguesa. Após a definição desta
tolerantes a diferentes tipos de espetáculos, estéticas e valores, ou se nova variável procedemos à distribuição por frequências. Observá-
corremos o risco de sermos levados pelo «canto do cisne». mos que 93% do total dos inquiridos se encontravam na categoria
de «baixo consumo cultural» (n=1850); 7% na categoria de «médio
consumo cultural» (n=143); 0,3% na categoria de «alto consumo
Dados e metodologia cultural» (n=6); e 0,1% na categoria de «muito alto consumo cul-
tural» (n=2). Optámos por recodificar a variável em duas categorias
Para explorar estas questões, utilizamos a base de dados do dicotómicas, de modo a operacionalizar a pesquisa no contexto por-
Inquérito Nacional às Práticas Culturais dos Portugueses e segui- tuguês. Considerámos que o perfil unívoro corresponde a um baixo
mos, depois, a estratégia metodológica de Reeves (2019). O autor consumo cultural e o perfil omnívoro corresponde a um médio/alto/
partiu dos dados do Eurobarómetro, produzido pela Comissão muito alto consumo cultural. Em seguida, apresentamos a relação
Europeia (2013), e atribuiu aos inquiridos pontos em função da entre as variáveis sociodemográficas (sexo/género, idade, grau de

240 241
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

instrução do próprio, nível de escolaridade parental mais elevado, Tabela 6.1 – Distribuição dos unívoros e omnívoros pelas variáveis
classe socioprofissional, rendimentos do agregado familiar e região) sociodemográficas (%)
e a probabilidade de um indivíduo ser omnívoro, com recurso a
um modelo de regressão logística. Por fim, descrevemos quem são
e como se distribuem os inquiridos pelos dois perfis de consumo.
Identificamos os efeitos diferenciados das variáveis nos grupos que
vamos descrever, tendo em conta a sua pertinência sociológica.

Quem são os omnívoros?

Como atrás se referiu, os omnívoros culturais são indivíduos que


têm padrões de consumo de «média e alta cultura», figurando nesta
categoria as atividades culturais com padrões «mais clássicos» (Silva,
Luvumba e Bandeira 2002, 199) – como a música clássica, o ballet e
a ópera. Contudo, os omnívoros apresentam uma orientação cultu-
ral mais diversificada que esbate as hierarquias entre as práticas: dos
«clássicos» ao cinema, teatro, outras danças, circo ou concertos. Os
unívoros culturais são indivíduos com um consumo cultural menos
«politeísta», para utilizar a expressão de Lopes (2010), e com uma
menor frequência nas práticas culturais. Ilustrando os dois perfis,
podemos dizer que, no ano anterior à pandemia, um indivíduo que
tenha ido ao cinema, uma ou várias vezes por mês, totalizará dois
pontos. Enquadra-se no perfil do unívoro. Um indivíduo que tenha
apresentado a mesma frequência de cinema, mas que tenha assistido
a espetáculos de teatro e circo, três ou mais vezes por ano, totaliza
seis pontos e tem um nível médio de consumo cultural. O que nos
leva a considerar tratar-se de um indivíduo com um perfil omnívoro. (Unívoros, N=1849; omnívoros, N=151)
Este será diferente de um omnívoro com um alto nível de consumo
cultural (23 pontos), que é o grau mais elevado – e o menos fre-
quente – de «omnivorismo cultural» que detetámos. De seguida, estudantes e trabalhadores, com os rendimentos do agregado familiar
mostramos as principais diferenças que determinam as duas orienta- mais elevados; e, em termos de classe socioprofissional, identificamos
ções do «omnivorismo cultural» (tabela 6.1). um eco mais forte de omnivorismo nos profissionais socioculturais,
Os resultados indicam que não existe uma associação entre o o que se confirmará mais adiante. No perfil unívoro concentram-se
sexo/género e o «omnivorismo cultural»; contudo, há uma relação os inquiridos que têm 65 ou mais anos, identificam-se mais frequen-
singular dos jovens, entre os 15-34 anos, com o perfil, relativamente, temente como domésticos não remunerados ou reformados e têm
mais elevado de «omnivorismo». A esta orientação do consumo cul- níveis de escolaridade parental e do próprio mais baixos. Podem per-
tural corresponde o grau de instrução do próprio mais elevado e a tencer a diversos grupos socioprofissionais, ­todavia, destaca-se o dos
escolaridade parental média e superior. Os omnívoros são mais vezes operários, cujo «univorismo cultural» é o mais elevado.

242 243
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

Da análise da relação entre as variáveis sociodemográficas e a Tabela 6.2 – Amostra dos omnívoros culturais pela região Norte
probabilidade de se ser omnívoro ressaltam duas constatações.1 Pri- e Área Metropolitana de Lisboa (%)
meira constatação: quando os pais têm um nível de escolaridade supe-
rior aumenta quase quatro vezes mais a hipótese de um indivíduo ter
uma orientação de consumo cultural omnívoro, quando comparado
com indivíduos cujos pais têm uma escolaridade inferior. Se o indi-
víduo tem uma escolaridade média aumenta cerca de seis vezes mais
a hipótese de ser «omnívoro cultural», quando comparado com os
indivíduos com escolaridade inferior. Caso o indivíduo tenha uma
escolaridade superior aumentará 19 vezes mais a probabilidade de
ter um perfil de consumo omnívoro, quando comparado com indi-
víduos com escolaridade inferior. Segunda constatação: a categoria
região tem relevância sociológica pelas diferenciações culturais que
produz. Se compararmos com a região Norte, os inquiridos do Cen-
tro e da Área Metropolitana de Lisboa têm menos hipóteses de ter
um perfil cultural omnívoro. Viver na região Norte aumenta a proba-
bilidade de «omnivorismo cultural». O que nos levou a explorar esta
pista de pesquisa (tabela 6.2).
O estudo comparativo dos unívoros e omnívoros, na região
Norte e na Área Metropolitana de Lisboa, ilustra algumas das dinâ-
micas e padrões do «omnivorismo cultural». Sublinharemos apenas
as diferenças estatisticamente significativas entre os grupos (usá-
mos o teste de qui-quadrado). Observamos que, na região Norte, os
omnívoros culturais se encontram nas faixas jovens (15-24 anos) e (Região Norte: unívoros, N=611; omnívoros, N=65. Área Metropolitana de Lisboa: unívo-
intermédias (35-44 anos), parecendo estar assegurada a continuidade ros, N=521; omnívoros, N=38)

na frequência geracional omnívora nesta região. Quanto ao grau de


instrução do próprio, verificamos que são os mais instruídos que têm
um perfil omnívoro nas duas regiões. representados entre os profissionais socioculturais que, como vere-
Na categoria classe socioprofissional é pertinente assinalar que mos, têm um portefólio cultural extenso e variado. Os rendimentos
os «omnívoros culturais» da região Norte se encontram mais vezes mensais do agregado familiar dão ecos diferenciados do «omnivo-
rismo cultural». Na Área Metropolitana de Lisboa e na região Norte
são os indivíduos com rendimentos mais elevados (acima de 2700
1
Estas duas constatações resultam de um teste de regressão logística realizado euros) que têm um consumo cultural omnívoro. Na região Norte,
para identificar os fatores preditores da orientação cultural dos indivíduos, «omni-
vorismo cultural», medido pelo «índice cumulativo da prática cultural», a partir do
o univorismo está na categoria ‘até 500 euros mensais’. Ao nível da
contributo de Reeves (2019). No modelo de regressão, a variável ‘grau de instrução escolaridade parental, os omnívoros culturais da Área Metropoli-
do próprio’ foi operacionalizada em três categorias: inferior (menos do que o 3.º tana de Lisboa provêm de famílias cujos pais têm o ensino supe-
ciclo e 3.º ciclo); médio (secundário); superior (superior). A variável ‘nível de esco- rior. Contudo, na região Norte, o perfil do omnívoro cultural pode
laridade parental mais elevado’ passou a conjugar o grau de instrução da mãe e do pai
estar ligado a um nível de escolaridade parental inferior e médio. Esta
e fez prevalecer o grau de escolaridade mais elevado. Foi também operacionalizada
nas categorias inferior, médio e superior. dimensão parece deixar pistas quanto à possível ligação intrínseca da

244 245
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

cultura à mobilidade social dos indivíduos naquela região. Vejamos, Gráfico 6.1 – Pessoas que foram ao cinema, por características
agora, como se organizam os consumos da população inquirida e as sociográficas e «orientação cultural» (%)
características do «omnivorismo cultural».

Cinema, a «locomotiva» dos jovens

O Inquérito mostra que o cinema é a atividade cultural com uma


taxa de participação mais elevada. Nos 12 meses anteriores ao início
da pandemia, 41% da população inquirida foi ao cinema e 59% nunca
foi ao cinema nesse período. Podemos dizer que a ida ao cinema é a
«grande locomotiva» da cultura, para utilizar a expressão de Lopes
(2008, 83). No entanto, a participação dos portugueses é mais redu-
zida face aos 58% de inquiridos espanhóis (MCUD 2019, 17) e os
63% de inquiridos franceses que indicaram ter frequentado esta
atividade (Pratiques culturelles. Cinéma 1973-2018). Em Portugal,
esta prática cultural é mais forte entre a população jovem, dos 15-24
anos, na qual 82% declaram ter ido ao cine​ma, contra percentagens
mais baixas na população com mais idade (gráfico 6.1). Já em Espa-
nha, as faixas etárias mais jovens concentram 90% dos inquiridos
que declaram ter ido ao cinema (MCUD 2019, 17). Em França nota-
-se a mesma tendência de juvenilidade: em 2018, dos inquiridos com
15-19 anos, 87% frequentaram as salas de cinema; no entanto, nos
últimos 40 anos, os dados mostram também que esta prática cultural
se tornou corrente nas faixas etárias intermédias e junto dos france-
ses com mais idade (Lombardo e Wolff 2020, 3; 44-48).
De acordo com os nossos resultados, os indivíduos que frequen-
tam, de forma mais regular, o cinema têm o ensino superior e aufe-
rem rendimentos entre os 1800 euros e mais de 2700 euros mensais
(os inquiridos com os rendimentos mais baixos, até 500 euros, indi-
cam nunca terem ido ao cinema, nos últimos 12 meses). São gran-
des empresários e profissionais liberais, profissionais socioculturais
e gestores, residentes na Área Metropolitana de Lisboa e na Região
Autónoma da Madeira – onde é mais elevada a percentagem de fre-
quentadores habituais das salas de cinema, em Portugal (gráfico 6.1).2

2
A análise da significância estatística (teste de qui-quadrado) indica que as
r­ elações entre as variáveis são significativas, exceto na associação da ida ao cinema e
o sexo/género dos inquiridos. (Cinema, N=821; unívoros, N=57; omnívoros, N=764)

246 247
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

No caso português, a escolha dos filmes é atravessada pela dife- mais vezes consumidores regulares de cinema do que os unívoros.
renciação de idade e género/sexo (tabela 6.3).3 Os mais jovens prefe- Os inquiridos com uma orientação unívora assistem mais aos filmes
rem os filmes de ação, terror e suspense. Já os inquiridos entre os 35 e de ação. Por contraponto, uma maior variedade de filmes se associa
os 44 anos preferem filmes de animação e documentários. Os inqui- às escolhas, e ao estilo de vida, dos «omnívoros culturais», para os
ridos com mais idade distribuem as suas preferências pelos policiais quais se destaca o visionamento dos filmes de animação, desenhos
e filmes de espionagem (entre os 55-64 anos). Em particular, na faixa animados, filmes históricos, biográficos, de terror e de suspense.
etária dos mais de 65 anos, verifica-se o gosto pelos musicais, filmes Os portugueses vão ao cinema com os familiares, namorados/as
clássicos, históricos e biográficos. Para os inquiridos femininos, os e amigos/as, destacando-se a sociabilidade dos comportamentos. A
géneros mais mencionados são os filmes de ação e animação, drama, categoria ir sozinho é mais frequente nos inquiridos do sexo mas-
clássicos e filmes de amor. A ficção científica e os filmes de espio- culino, como também ter assistido ao filme com o/a namorado/a
nagem são as preferências cinematográficas dos inquiridos do sexo e ou amigo/s. Já ter ido ao cinema com os familiares é mais vezes
masculino. É de notar que o cinema tem um impacto muito relevante referido pelos inquiridos do sexo feminino. Os «omnívoros cultu-
no «omnivorismo cultural» português. Nos dois tipos de orientação rais» vão mais vezes ao cinema acompanhados pelos/as namorados/
cultural, o cinema é o élan, dada a importância deste consumo cul- as e amigos, e grupos organizados, parecendo-nos que, nesta saída ao
tural para os portugueses, embora os «omnívoros culturais» sejam cinema, se aprofundam as suas redes de sociabilidade (tabela 6.4).4
Os principais motivos que levaram à escolha do último filme
relacionam-se com as suas dimensões intrínsecas como o tema, os
Tabela 6.3 – Géneros de filmes, por características sociográficas
e «orientação cultural» (%)

Tabela 6.4 – Com quem foram ver o filme, por sexo, idade
e «orientação cultural» (%)

(Masculino, N=388; feminino, N=393; unívoros, N=643; omnívoros, N=137)

(Masculino, N=388; feminino, N=393; unívoros, N=645; omnívoros, N=135)

3
Seguindo a nossa análise descritiva, o teste de qui-quadrado mostra que exis-
tem associações significativas entre a prática cultural do cinema e as variáveis estu- 4
As tendências da análise descritiva são seguidas pelos resultados significativos
dadas. do teste de qui-quadrado.

248 249
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

atores e o realizador; seguindo-se as recomendações de familiares e dência. Em geral, os inquiridos não argumentam terem falta de infor-
amigos, e, por fim, o convívio. A publicidade, os prémios e a pedido mação sobre os filmes, embora, na região Norte e na Madeira esse
dos filhos e/ou netos não são importantes para a escolha do filme. motivo tenha sido apontado. Já as incapacidades físicas do próprio
Por seu turno, as razões referidas pelos inquiridos para não irem são os motivos assinalados pelos residentes nos Açores, na medida
mais vezes ao cinema são a falta de tempo e a falta de interesse, os em que os inquiridos têm de se deslocar mais para assistir a um filme.
inquiridos poderem ver o filme em casa na televisão e noutros supor-
tes digitais, o preço dos bilhetes ser elevado e não haver cinemas na
zona de residência (tabela 6.5). Não ter interesse, por preferir reali-
zar outras atividades, é mais vezes referido pelos inquiridos entre os Tabela 6.5. – Motivos por que não vai mais vezes ao cinema,
55-64 e mais de 65 anos e pela classe socioprofissional dos operários. por sexo e idade (%)
O preço elevado dos bilhetes é um motivo mais vezes indicado pelos
inquiridos entre os 35-44 anos, do sexo feminino e trabalhadores dos
serviços.
Num relance, os resultados do Inquérito fornecem-nos pistas
sugestivas, que os testes de significância estatística corroboram,
sobre a diferenciação de género/sexo. Por exemplo, os principais
motivos para as mulheres não terem ido mais vezes ao cinema agru-
pam-se em torno da falta de oportunidade e a falta de tempo e de
interesse, pois preferem realizar outras atividades. São as mesmas
razões indicadas pelos respondentes masculinos, no entanto estes
últimos estão mais disponíveis do que os inquiridos femininos para
verem os filmes em casa, na televisão ou noutros suportes digitais
(Masculino, N=932; feminino, N=1068)
(25% de inquiridos masculinos contra 15% femininos). O que nos
leva a pensar que é na natureza dos fundamentos para a falta de
oportunidade e tempo que residem as diferenciações de género.
Os inquiridos com mais instrução referem a falta de oportunidade Tabela 6.6 – Motivos por que não vai mais vezes ao cinema,
como a razão principal para não irem mais vezes ao cinema e os por grau de instrução, região e «orientação cultural» (%)
inquiridos com menos do que o terceiro ciclo referem que não têm
interesse e consideram que já ‘estão velhos para isso’. São indivíduos
– destacam-se as mulheres que também não têm com quem ir – com
mais de 65 anos, que nos revelam aqui a perceção que têm sobre
a sua condição de vida e deixam antever a solidão destas gerações
(tabela 6.6).
Outra leitura dos resultados mostra-nos que a falta de tempo
para ir ao cinema é indicada mais vezes pelos inquiridos que vivem na
Área Metropolitana de Lisboa e no Alentejo. Os respondentes que
residem no Algarve referem que podem ver tudo em casa e não têm
interesse. Destaque para os Açores, Algarve e região Centro, onde
os indivíduos indicam que não têm cinemas perto da zona de resi- (Omnívoros, N=150; unívoros, N=1850)

250 251
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

As razões para os «omnívoros culturais» não irem mais vezes ao Gráfico 6.2 – Pessoas que assistiram a espetáculos e concertos ao
cinema prendem-se, acima de tudo, com a falta de oportunidade. O vivo nos 12 meses anteriores ao início da pandemia (%)
que não é de admirar dada a intensidade com que frequentam uma
variedade de práticas culturais. Contudo, estes omnívoros referem
que o preço dos bilhetes é elevado e que faltam cinemas na zona
onde residem; podem ver em casa nos suportes digitais, pois inte-
resse para assistir aos filmes in situ e online parece não lhes faltar (ver
«Omnivorismo digital?»).

Espetáculos ao vivo, o consumo cultural não está


por um fio!

Os festivais ou festas locais foram os espetáculos ao vivo a que


mais inquiridos disseram ter assistido nos 12 meses anteriores ao (Festival ou festa local, N=750; concerto de música ao vivo, N=476; teatro, N=259; circo,
início da pandemia; seguem-se os concertos de música ao vivo e os N=143; música clássica, N=117; outro tipo de dança, N=117; ballet ou dança clássica, N=95;
ópera, N=39)
espetáculos de teatro. Se compararmos estes resultados com as taxas
de frequência dos concertos de música clássica, espetáculos de ballet
e ópera, os indicadores de participação nestes últimos são inferiores Tabela 6.7 – Pessoas que assistiram a espetáculos e concertos nos 12
(gráfico 6.2). meses anteriores ao início da pandemia, por rendimento
Atendendo a duas categorias, a classe socioprofissional e os ren- do agregado familiar e classe socioprofissional (%)
dimentos auferidos pelos inquiridos que assistiram a espetáculos e
concertos ao vivo, nos 12 meses anteriores ao início da pandemia,
os respondentes cujo rendimento do agregado familiar é acima de
2700 euros são aqueles que frequentaram mais vezes os espetáculos
como a música clássica, o ballet e a ópera. Quando o rendimento
do agregado familiar é até 500 euros, os indivíduos participam mais
vezes nos festivais e festas locais; e, acima dos 500 euros até 800
euros, destacam-se os inquiridos que começam a diversificar o seu
consumo cultural entre as diferentes atividades consideradas, pelo
que um certo tipo de consumo in situ, com preços de saída mais
modestos, não parece estar ameaçado (tabela 6.7).

(Ballet ou dança clássica N=95; outro tipo de dança N=117; ópera N=39; música clássica N=117;
teatro N=259; circo N=143; concerto de música N=476; festival ou festa local N=750).

252 253
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

Ballet, a dança clássica é preferida pelos Gráfico 6.3 – Pessoas que assistiram a espetáculos de ballet ou dança
«omnívoros culturais» clássica, por características sociográficas e pela
«orientação cultural» (%)
Nos 12 meses anteriores ao início da pandemia, 5% da popu-
lação costumava assistir a pelo menos um espetáculo de ballet ou
dança clássica. Os espetáculos de dança clássica foram fruídos por
5% de inquiridos do sexo feminino que vão com uma frequência de
uma ou duas vezes por ano. Esta taxa mostra tratar-se de uma ativi-
dade circunscrita a um segmento restrito da população portuguesa.
Se atendermos ao caso espanhol, poderemos contar com a possível
feminização desta prática cultural no nosso país. Em Espanha, o
ballet ou a dança clássica tem uma taxa anual de assistência de 8%. As
taxas observadas são superiores para as mulheres (10% frente a 6%
de homens) (MCUD 2019, 14). Os resultados do Taking Part Survey
(2016-17, 17) mostram que 4% dos inquiridos ingleses foram ver um
espetáculo de ballet. Em França, em 2018, assistiram a espetáculos de
dança 9% dos inquiridos e, em 2020, os dados são perturbados pela
crise pandémica (Jonchery e Lombardo 2020). O caso francês mos-
tra que esta prática cultural permanece a menos comum, indepen-
dentemente da idade ou geração (Lombardo e Wolff 2020, 6; 51-52).
Os inquiridos portugueses que assistem, regularmente, aos espe-
táculos de ballet ou dança clássica têm entre 35-44 anos (três ou
mais vezes por ano) e 55-64 anos (uma ou duas vezes por ano).5
Os inquiridos atingiram o ensino superior, são residentes no Algarve
e identificam-se mais como sendo profissionais socioculturais, gran-
des empresários e profissionais liberais. Este grupo socioprofissional
está intrinsecamente associado ao perfil dos «omnívoros culturais»,
que assistem uma ou duas vezes por ano aos espetáculos de dança
clássica. Por seu turno, são os inquiridos com mais de 65 anos, e com
menos escolaridade, aqueles que afirmam nunca irem ver espetácu-
los de ballet, destacando-se os operários com um perfil de consumo
unívoro (gráfico 6.3).

5
Apesar de esta prática cultural ser minoritária, os dados sugerem-nos pistas de
análise interessantes. Seguindo a análise descritiva, procurámos confirmar a associa-
ção entre as variáveis, aplicando o teste de qui-quadrado. Este indica como é que as
variáveis se relacionam nos cruzamentos bivariados apresentados. Assim, a associa-
ção da dança clássica ao sexo/género, idade, grau de instrução, rendimento, classe
socioprofissional e orientação cultural é significativa. (Dança clássica, N= 95; omnívoros, N=46)

254 255
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

«Outras danças», as práticas culturais mais democratizadas? Tabela 6.8 – Pessoas que assistiram a espetáculos de ‘outras danças’,
por características sociográficas e pela «orientação
No mesmo período de análise, 6% da população costumava fre- cultural» (%)
quentar espetáculos de outros tipos de dança sem ser o ballet. Entre
aqueles que frequentaram estes espetáculos, 55% eram inquiridos
do sexo feminino e 45% do sexo masculino. O inquérito inglês,
referente a 2016-2017, apresenta uma taxa de 7% na frequência de
espetáculos de «outras danças». Sublinha-se que o interesse dos
inquiridos ingleses aumentou face ao anterior Taking Part. Acredi-
tamos que seja possível verificar-se a mesma evolução em Portugal.
Tomando-se por referência o último espetáculo de dança ao vivo que
se foi ver, destaca-se o ballet, a dança contemporânea, a dança fol-
clórica ou étnica, a dança de rua e a dança africana. Sem expressão
significativa ficaram a performance e a dança flamenca (tabela 6.8).
Uma análise cuidadosa deste universo heterogéneo das ‘outras
danças’ – cujos espetáculos apresentam taxas de frequência baixas,
mas pistas de análise sugestivas – mostra, quanto a nós, que estes
podem beneficiar de uma frequência socialmente menos diferen-
ciada do que outros espetáculos in situ, nomeadamente o ballet ou
a dança clássica.6 São os inquiridos com 45-54 anos que mais apre-
ciam assistir a espetáculos de dança contemporânea. Os inquiridos
residem no Algarve, Açores e na Área Metropolitana de Lisboa. (‘Outras danças’, N=117; dança contemporânea, N=34; dança de rua, N=23; dança folcló-
rica, N=28)
Esta atividade destaca-se como uma das muitas e variadas práti-
cas escolhidas pelos profissionais socioculturais. Já os mais jovens,
estudantes, entre os 15-24 anos, referem mais vezes ter assistido com o ensino superior. São grandes empresários e profissionais
a espetáculos de dança de rua (inclui hip hop, breakdance, locking, liberais, empregados de escritório e operários; residem no Alentejo.
popping, house e freestyle). São inquiridos com o terceiro ciclo com- No que respeita aos omnívoros, evidencia-se a sua forte participa-
pleto, operários e residentes na região Norte. São também os indi- ção nos espetáculos de dança contemporânea e algum consumo de
víduos das faixas etárias mais jovens da população, entre os 15-24 ­espetáculos de dança folclórica ou étnica, comprovando a plastici-
anos, que mais consomem os espetáculos de dança africana. São os dade dos seus gostos e preferências.
inquiridos residentes na região Centro e, na estrutura profissional,
são os técnicos, especialistas e operários que consomem este tipo de
espetáculos. Por seu turno, os portugueses com mais de 65 anos e Ópera, um grupo social muito restrito, mas muito
com menos do que o terceiro ciclo do ensino básico preferem assis- comprometido
tir aos espetáculos de dança folclórica ou étnica; embora neste tipo
de dança se destaquem também os inquiridos entre os 15-24 anos, Em Portugal, a ópera apresenta uma taxa de frequência de apenas
2%. Apesar de não ter a representação estatística desejável, os dados
são sugestivos, na medida em que os indivíduos que frequentam esta
6
As ‘outras danças’ apresentam resultados estatisticamente significativos nas
variáveis idade, grau de instrução do próprio e classe socioprofissional. prática cultural fazem-no de forma assídua (tabela 6.9), mostrando o

256 257
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

Tabela 6.9 – Pessoas que assistiram a espetáculos de ópera, estimou que 4% dos adultos inquiridos assistiram a espetáculos de
por características sociográficas e pela «orientação ópera (2016-17, 3).
cultural» (%) Uma análise das características sociais dos indivíduos que res-
ponderam ao Inquérito português mostra-nos que existem segmen-
tações de género, pelo que a frequência de três ou mais vezes por ano
é significativa para os homens. Em termos de idade, a ópera parece
ser da preferência dos inquiridos entre os 55-64 anos, mas destacam-
se os grupos etários dos 25 aos 44 anos. Este resultado é importante
dado o envelhecimento do público regular e a possível dificuldade de
renovação geracional dos públicos da ópera. Sublinhamos a predo-
minância dos inquiridos com o ensino superior e profissionais socio-
culturais. Por fim, salientamos que se trata de uma atividade que é
consumida quase exclusivamente pelos indivíduos com rendimentos
mensais acima dos 2700 euros; e, ainda, pelos «omnívoros culturais»,
à semelhança da dança clássica ou do ballet. Apesar do enquadra-
mento europeu e norte-americano mostrar a fragilização crescente
da ligação dos públicos com este tipo de prática cultural, a «rejeição»
ou o não envolvimento da população portuguesa devem ser devi-
damente contextualizados pelas políticas públicas e a frequência da
ópera e das operetas deverá ser incentivada junto de indivíduos com
perfis culturais mais modestos.

Teatro, o ténue envolvimento dos mais jovens

De acordo com os resultados do Inquérito, 13% dos inquiridos


dizem ter assistido a espetáculos de teatro. 14% dos inquiridos eram
(Ópera, N=39)
do sexo masculino e 12% do sexo feminino. No inquérito realizado
em Espanha, 27% assistiram a espetáculos de teatro e esta prática
cultural é mais frequente entre as mulheres (MCUD 2019, 13).
O inquérito inglês destaca que 37% dos inquiridos assistiram a um
seu provável envolvimento regular com a atividade.7 Convém acres- evento de teatro, cerca de 21% assistiram a um espetáculo de teatro
centar que esta prática cultural é muito minoritária, o que não difere e 20% a um espetáculo de teatro musical (2016-17). Em França, uma
de outras realidades europeias. Estes resultados são similares aos do análise da evolução das práticas culturais, de 1973 até 2018, apre-
inquérito realizado em Espanha (MCUD 2019, 14), que apresenta senta-nos um claro aumento das taxas de participação da população
taxas de frequência da ópera de 3%. O Taking Part, em Inglaterra, nesta prática cultural: 12% no início da década de 70, contra 21% em
2018 (Lombardo e Wolff 2020, 6; 52-54).
No caso português, os inquiridos que frequentam mais o teatro
7
No caso da ópera, os nossos resultados revelaram-se estatisticamente signifi-
cativos em todas as variáveis analisadas, excluindo a região. têm entre 35-44 anos e vão uma ou duas vezes por ano (gráfico 6.4).

258 259
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

Gráfico 6.4 – Pessoas que assistiram a espetáculos de teatro, Seguem-se os mais jovens, entre os 15-24 anos, com valores percen-
por características sociográficas e pela «orientação tuais que mostram o seu envolvimento com esta prática cultural, liga-
cultural» (%) ção que devemos promover através de uma intensificação da oferta
para estas idades e da sua ampla divulgação nos media e canais digitais.
Entre os 55 e os 64 anos encontramos públicos regulares que fre-
quentam o teatro três ou mais vezes por ano. As gerações mais anti-
gas (65 anos ou mais) parecem-nos pouco atraídas por este género de
espetáculos ao vivo, destacando-se entre os públicos casuais. A este
propósito, pode discutir-se se, em matéria de oferta cultural, esta é
suficientemente diversificada – tendo em conta diferentes segmentos
da população portuguesa – e regular – dada a fragilidade organizacio-
nal que atravessa a produção e a criação teatral portuguesa.
Os nossos resultados mostram diversidade na estrutura socio-
profissional dos públicos do teatro. São os grandes empresários e
profissionais liberais, profissionais socioculturais, gestores e técni-
cos especialistas aqueles que mais assistem aos espetáculos de tea-
tro; são também os inquiridos com o ensino superior e residentes
na Área Metropolitana de Lisboa. Tomando por referência o último
espetáculo, as respostas não mostram diferenciações significativas
pelo tipo de teatro (contemporâneo, de revista e teatro musical).
Há, no entanto, algumas segmentações de género que uma análise
descritiva sugere. Os inquiridos do sexo feminino consomem mais
leituras e recitais. Os inquiridos do sexo masculino com mais de 65
anos preferem o teatro de revista. Por fim, podemos concluir que são
os inquiridos com um perfil cultural omnívoro aqueles que mais se
envolvem neste domínio e fazem-no com reconhecida regularidade,
ou seja, três ou mais vezes por ano.8

Circo, a atividade socialmente pouco diferenciada,


onde a tradição conta

No Inquérito português, 7% dos inquiridos dizem ter frequen-


tado espetáculos de circo. No consumo desta prática cultural não
há diferenciações de género a registar, mas sim efeitos da idade: a

8
O teste de qui-quadrado segue as tendências da análise descritiva, com signifi-
(Teatro, N=259; omnívoros, N=200)
cância estatística nas variáveis idade, grau de instrução do próprio, rendimentos do
agregado familiar, classe socioprofissional e orientação cultural.

260 261
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

maior frequência do circo faz-se nas faixas etárias dos 34-44 anos.9 Gráfico 6.5 – Pessoas que assistiram a espetáculos de circo,
Os grandes empresários e profissionais liberais, pequenos empresá- por características sociográficas e pela
rios e comerciantes assistem a um espetáculo de circo pelo menos «orientação cultural» (%)
uma ou duas vezes por ano; já os técnicos, especialistas e empre-
gados de escritório chegam a frequentar o circo três ou mais vezes
por ano (gráfico 6.5). O circo tradicional é preferido pelos inquiri-
dos, seguindo-se o circo moderno e o novo circo, que se constata
ter ainda uma expressão muito reduzida entre a população inqui-
rida. Em geral, o circo interessa aos indivíduos com uma orientação
cultural omnívora e com uma frequência regular (a tradição conta).
No entanto, a frequência do circo parece-nos ser socialmente menos
diferenciada em relação a outros espetáculos in situ, aqui analisados,
destacando-se na ida mais regular os grupos sociais com rendimen-
tos de mais de 1500 a 1800 euros. Em Espanha, as taxas de frequência
são iguais às portuguesas, 7% dos inquiridos assistiram a um espetá-
culo de circo. As segmentações quanto ao tipo de espetáculo são as
mesmas, nota-se a preferência pelo circo tradicional (MCUD 2019,
14). Já em França, as taxas de frequência são um pouco mais eleva-
das, 11%, em 2018 (Lombardo e Wolff 2020, 6; 54-55).

Concertos de música, para todos os gostos e gerações

Nos 12 meses que precederam a pandemia, 24% da população


inquirida assistiu a um concerto de música ao vivo, 29% entre os
inquiridos masculinos e 20% entre os inquiridos femininos. Em
Espanha, a taxa de participação nos concertos de música é de 30%
e é uma percentagem mais alta entre os homens (31%) (MCUD
2019, 15). Em Inglaterra, cerca de quatro em cada dez indivíduos
(38%) assistiram a um evento de música (2016-17). Em Portugal,
considerando o último espetáculo de música ao vivo a que se assistiu,
mesmo que tenha ocorrido depois do início da pandemia, as taxas
de frequência mais elevadas são dos concertos de música pop-rock
(português, latino e estrangeiro) (14%). Em Espanha, a tendência
é semelhante, destacando-se o mesmo género musical, o pop-rock

9
A análise descritiva é acompanhada pelos resultados dos testes (qui-quadrado)
que são estatisticamente significativos nas variáveis idade, grau de instrução do pró-
prio, classe socioprofissional, rendimento e orientação cultural. (Circo, N=143; omnívoros, N=16)

262 263
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

espanhol (47%), seguido de longe pelo pop-rock estrangeiro (10%) Tabela 6.10 – Pessoas que assistiram a concertos de música,
(MCUD 2019, 15). Já os franceses frequentam concertos de rock e por características sociográficas e pela
jazz – que foram agregados desde 1988 –, apresentado uma taxa de «orientação cultural» (%)
resposta de 11% em 2018 (Lombardo e Wolff 2020, 6; 56-58).
No caso português, os concertos de música pop-rock são mais
frequentados pelos inquiridos do sexo masculino, jovens, entre
os 25-34 anos (tabela 6.10).10 A partir dos 54 anos, este género de
música não tem representação expressiva. São os inquiridos com o
ensino secundário e superior, trabalhadores dos serviços, profissio-
nais socioculturais e domésticos que mais frequentam estes concer-
tos. Sublinhamos que a esta prática está associada uma orientação
cultural unívora dos inquiridos. Nos concertos de jazz, a segmen-
tação de género é significativa: como nos concertos de pop-rock,
esta segmentação é a favor dos homens, que estão mais comprome-
tidos com este género de concertos. Uma vez mais são os inquiridos
muito jovens, entre os 15-24 anos, que mais participam nos con-
certos de jazz. Contudo, verificamos que a frequência das gerações
intermédias está assegurada. São inquiridos com o ensino superior e
secundário, profissionais socioculturais e residentes na Área Metro-
politana de Lisboa que frequentam estes concertos. A estes inquiri-
dos associa-se uma orientação cultural omnívora.
Já no que respeita à frequência dos concertos de música clás-
sica, os resultados não traduzem a feminização desta prática. São
inquiridos entre os 55-64 anos, ou com mais de 65 anos, com o
ensino superior que dizem mais vezes terem frequentado este tipo
de concertos. Sublinhamos que estes concertos concentram os indi-
víduos que são grandes empresários e profissionais liberais, perten-
cem ao grupo dos profissionais socioculturais ou são reformados,
­residentes na Área Metropolitana de Lisboa. A estes concertos, de
música clássica, está fortemente associado um perfil de consumo
cultural omnívoro.
Por seu turno, os concertos de música folclórica e tradicional
interessam aos inquiridos masculinos e femininos, com 65 ou mais
anos. São indivíduos com menos do que o terceiro ciclo e este é o
(Concertos de música ao vivo, N=476; pop-rock, N=270; jazz, N=13; clássica, N=41; fol-
10
Seguindo as principais tendências da nossa análise descritiva, os testes de sig- clórica, N=43; africana, N=9; latino-americana, N=14; popular brasileira, N=27; outras
nificância estatística (qui-quadrado) têm resultados relevantes nos cruzamentos de músicas do mundo, N=23; rap, hip-hop, N=27; fado, N=26)
todas as variáveis apresentadas, incluindo a orientação cultural. De assinalar apenas
que a frequência dos concertos ao vivo não está associada aos rendimentos dos agre-
gados familiares dos inquiridos.

264 265
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

estilo musical que mais parecem apreciar. Neste tipo de concertos, música folclórica e tradicional, mas também o gosto pela música lati-
encontramos uma taxa de participação muito forte por parte dos no-americana, a música popular brasileira e uma percentagem impor-
inquiridos reformados e residentes na região Norte. Os operários tante de inquiridos diz-nos frequentar os concertos de rap, hip-hop.
são aqueles que mais apreciam os concertos de música folclórica e Contudo, é na região Centro que o hip-hop – tão ligado aos valores
tradicional. Este género musical parece importante para os inquiri- e estilos de vida dos mais jovens – parece ter maior expressividade.
dos com um padrão de consumo cultural unívoro. Já os concertos de É nesta região que encontramos mais inquiridos interessados na
música africana são mais vezes referidos pelos inquiridos femininos. música latino-americana e no fado. Na Área Metropolitana de Lis-
O interesse pela música africana, por parte dos indivíduos com 35-44 boa existe uma fortíssima incidência de interessados nos concertos
anos, e algum envolvimento das faixas etárias mais jovens, residen- de jazz e música clássica; e, com valores menos significativos, subli-
tes na Área Metropolitana de Lisboa, são traços sociais e territoriais nhamos uma possível ligação desta região à frequência das músi-
relevantes para a análise. cas africanas e músicas do mundo. No Alentejo, a participação dos
Os concertos de música latino-americana são mais frequenta- inquiridos ora nos concertos de fado ora nos concertos de música
dos pelos inquiridos do sexo masculino, entre os 35-44 anos, com o pop-rock pode ser uma das explicações para os ecos de «omnivo-
ensino superior, pequenos empresários, residentes na região Centro. rismo cultural» desta região. No Algarve, sublinhamos a importância
A música popular brasileira, bossa nova, está associada às mulhe- dos concertos pop-rock. Os inquiridos que residem nos Açores e na
res, mais jovens, estudantes, profissionais socioculturais e aos ope- Madeira têm uma participação muito fraca nos concertos de música
rários. São inquiridos residentes na Área Metropolitana de Lisboa ao vivo (é caso para refletirmos sobre este tipo de oferta cultural
e a Norte. Os concertos de músicas do mundo são mais apreciados nestes territórios).
pelas mulheres, entre os 35-44 anos, técnicos especialistas, com o
ensino superior e residentes na Área Metropolitana de Lisboa. Os
concertos de rap, hip-hop agradam aos inquiridos mais jovens, do Festivais, os jovens nos festivais de música
género masculino, com o terceiro ciclo, são operários, residentes e o caso do Alentejo
na zona Centro. Por fim, são os inquiridos femininos aqueles que
mais parecem estar comprometidos com os concertos de fado, enri- Os festivais não têm uma história tão longa nas políticas públicas
quecidos pela oferta das jovens e intermédias gerações de fadistas. como outras práticas culturais aqui analisadas, contudo são deter-
Os inquiridos que mais frequentam espetáculos de fado têm 65 ou minantes para a análise dos consumos culturais contemporâneos
mais anos. Em geral, podem ter o ensino secundário ou superior, são (Taylor, Bennett e Woodward 2014; Négrier, Bonet e Guérin 2013).
empregados de escritório, reformados e residentes na região Centro. Seguidos por diferentes gerações de públicos, como o Festival de
Este género musical pode estar entre as preferências dos inquiridos Vilar de Mouros, 50 anos festejados em 2021 com os seus públicos
entre os 35-54 anos, o que poderá assegurar o desenvolvimento de e amplamente difundido (Belanciano 2021), os festivais podem arti-
públicos regulares neste domínio cultural. cular-se com políticas públicas para a cultura e serem uma das suas
Outra leitura possível destes resultados fornece informação componentes de reconhecimento, como acontece em França, com o
útil sobre as principais diferenciações geográficas na análise dos Festival d’Avignon (Ethis, Fabiani e Malinas 2008).
­concertos de música ao vivo. Por exemplo, os dados sugerem-nos Em Portugal, o fenómeno dos festivais e o seu funcionamento
que na região Norte há uma maior abertura ao consumo pela parti- na cena cultural teve um forte incremento e as elevadas percentagens
cipação dos inquiridos em concertos de diferentes géneros musicais. de participação cultural dos nossos inquiridos são o melhor indica-
Associado ao que escrevemos antes sobre esta região, podemos dizer dor disso mesmo. De acordo com os resultados, 11% da população
que estamos diante de um «omnivorismo cultural» mais em extensão portuguesa foi a um festival. Já o inquérito francês apresenta taxas
e relativamente menos seletivo. Nesta região predomina o gosto pela de participação de 19% em 2018 (Lombardo e Wolff 2020, 6). No

266 267
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

último festival a que assistiram, 13% dos inquiridos são do sexo mas- jovens. Os festivais de música clássica, jazz ou ópera são frequenta-
culino contra 9% do sexo feminino. Em geral, são os inquiridos do dos por uma minoria. Resta-nos concluir que são os inquiridos com
sexo masculino, dos grupos etários mais jovens, entre os 15 e os 34 uma orientação omnívora à cultura aqueles que mais participam nos
anos, e com um perfil omnívoro que dizem terem frequentado esta festivais de música pop-rock e nos festivais de música clássica, jazz e
prática cultural (tabela 6.11). Os inquiridos têm diferentes níveis de ópera, distanciando-se claramente dos comportamentos de orienta-
escolaridade, destacando-se, todavia, os que possuem ensino secun- ção unívora, cuja participação é mais flagrante nas festas locais.
dário e superior. De um ponto de vista geográfico, é a participação
dos inquiridos residentes na região do Alentejo que mais sobressai,
pois alguns dos mais reconhecidos festivais de verão têm lugar na Festas locais, cultura popular ao rubro e o caso inédito
costa alentejana. dos seniores
Quanto à posição socioprofissional, a frequência dos festivais
é segmentada: integra técnicos especialistas, gestores, profissionais A participação dos portugueses nas festas locais é forte: 26%
socioculturais e pequenos empresários. Estes grupos profissionais dos inquiridos dizem terem participado numa festa local; 28% entre
fazem a força dos festivais de música pop-rock, género que dá o maior os inquiridos do sexo masculino e 23% entre os inquiridos do sexo
impulso a este tipo de programação cultural. São os homens que feminino. São os inquiridos com mais de 65 anos, com o terceiro
dizem participar mais do que as mulheres, e são das faixas etárias mais ciclo, que têm uma adesão mais expressiva às festas locais se compa-
rarmos com outras práticas, das quais estão ausentes ou associados
a um perfil de participação cultural unívoro. O lado convivial e ver-
nacular das festas locais pode estar na origem da forte participação
Tabela 6.11 – Pessoas que assistiram a festivais, por características
sociográficas e pela «orientação cultural» (%)
destes unívoros culturais (gráfico 6.6).
Em geral, a importância da frequência destes eventos culturais,
por parte da população inquirida, faz-nos antever uma certa trans-
versalidade geracional que esbate as habituais clivagens em relação
à idade, detetadas noutras práticas culturais. É que apesar de se tra-
tar da prática que mais agrada aos inquiridos das faixas etárias mais
velhas, não podemos deixar de sublinhar que as festas tradicionais
e populares são também referidas pelos mais jovens, entre os 15-24
anos (tabela 6.12).11
Duas constatações emergem dos resultados. Primeira consta-
tação: Norte, Centro e Açores são regiões associadas à participa-
ção nas festas locais. Os Açores são a região onde se destaca o
consumo regular das festas locais, o que marca uma diferenciação
territorial importante face à participação mais fraca destes inquiri-

11
A análise descritiva destes dados é sugestiva e, seguida pelos resultados dos
(Festivais, N=210; Teatro, dança, artes de rua, N=28; Música clássica, jazz, ópera, N=8; Fes- testes qui-quadrado, revela a associação estatisticamente significativa dos mais
tival de músicas tradicionais ou músicas do mundo, N=55; Festivais de música pop-rock, jovens (15-24 anos) às festas tradicionais e populares; dos inquiridos com 45-54
N=112; Festivais de cinema, N=7) anos às festas religiosas e dos inquiridos entre os 25-44 anos às festas de gastrono-
Nota: Os testes de significância estatística (qui-quadrado) apresentam resultados relevantes mia e alimentação. Destacamos, ainda, a associação estatisticamente significativa
para as variáveis idade e orientação cultural. dos inquiridos que frequentam as festas religiosas e o perfil cultural unívoro.

268 269
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

Gráfico 6.6 – Pessoas que assistiram a festas locais, por características Tabela 6.12 – Tipos de festas locais, pelas características sociográficas
sociográficas e pela «orientação cultural» (%) e «orientação cultural» (%)

(Festas tradicionais e populares, N=242; festas religiosas, N=200; festas de gastronomia e


alimentação, N=56)

dos noutras práticas culturais. Segunda constatação: as festas locais


são relevantes no portefólio – mais limitado – dos inquiridos com
uma orientação unívora à cultura. Neste perfil de consumo cultu-
ral destaca-se a participação dos indivíduos nas festas tradicionais
e populares e nas festas religiosas. Os omnívoros culturais estão
associados às festas locais e, em particular, preferem as festas tra-
dicionais. Geralmente, a ida aos festivais e às festas locais é feita
com os familiares e o/a namorado/a e amigos. O motivo mais vezes
referido para justificar esta participação é o convívio. Seguindo-se
a programação e o tema do festival e a região onde este se realiza
como motivos importantes para a participação dos inquiridos. O
festival ou a festa local situa-se, predominantemente, no conce-
lho de residência dos inquiridos, o que significa que os mesmos
não saem em passeio ou lazer para assistirem ao evento, embora as
cidades de Lisboa e do Porto possam ser as escolhidas, quando os
inquiridos saem do seu concelho.

Motivos para não assistir mais a espetáculos ao vivo

A falta de tempo é o principal motivo pelo qual os portugueses


inquiridos declaram não irem mais vezes assistir aos espetáculos e
concertos ao vivo, festivais e festas locais (tabela 6.13). É uma cate-
goria de resposta indicada pelos inquiridos com idades compreen-
(Festas locais, N=524; omnívoros, N=210) didas entre os 35-44 anos. Não ter interesse como motivo para não

270 271
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

Tabela 6.13 – Motivos pelos quais a população inquirida não foi mais Tabela 6.14 – Motivos pelos quais a população inquirida não foi mais
vezes assistir a espetáculos e concertos ao vivo, vezes assistir a espetáculos e concertos ao vivo, festivais
festivais ou festas locais, por características ou festas locais, por classe socioprofissional (%)
sociográficas (%)

(Norte, N=677; Centro, N=444; Área Metropolitana de Lisboa, N=558; Alentejo, N=145;
(Masculino, N= 932; feminino, N=1068)
Algarve, N=85; Açores, N=41; Madeira, N=50; grandes empresários, N=26; pequenos
empresários, N=193; técnicos, N=99; operários, N=604; gestores, N=90; empregados de
escritório, N=150; profissionais socioculturais, N=164; trabalhadores dos serviços, N=513)

ter participado é referido mais vezes por inquiridos com mais de 65


anos, e é menos vezes referido pelos inquiridos entre os 25 e os 44
anos. Já a ideia de que o espetáculo é difícil de compreender é refe- profissionais socioculturais que apenas se queixam da falta de tempo
rida pelos indivíduos com mais de 65 anos e com níveis de instrução e da falta de atividades na sua zona de residência.
mais baixos, sendo importante aprofundar, ao nível da mediação cul- Uma leitura complementar dos resultados (tabela 6.15) mostra-
tural, a relação das instituições e equipamentos culturais com públi- nos, ainda, que são os inquiridos da Área Metropolitana de Lisboa
cos seniores com perfis culturais mais modestos. Quanto ao sexo/ aqueles que mais evidenciam não gostarem de sair à noite, podendo,
género dos inquiridos, destaca-se a relação dos inquiridos femininos depois, referir-se a sua falta de recursos económicos para pagar o
com dois motivos principais, não ter com quem ir aos espetáculos e preço dos bilhetes, a falta de tempo e de interesse. Nos Açores e
a incapacidade física, deficiência, surdez ou cegueira. Alentejo, os inquiridos destacam a falta de salas de espetáculos na
Se tivermos em conta a classe socioprofissional dos inquiridos sua zona de residência. Por fim, o Alentejo surge como a região
(tabela 6.14), verificamos que a principal razão para os grandes ­portuguesa mais associada à falta de oportunidade para participar nas
empresários e profissionais liberais não frequentarem mais as ativi- atividades culturais.
dades culturais é a falta de tempo. O preço elevado dos bilhetes e o
não terem com quem ir afetam as saídas dos empregados de escri-
tório e dos trabalhadores dos serviços. Por contraponto, a falta de
interesse ou o elevado preço dos bilhetes não são referidos pelos

272 273
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

Tabela 6.15 – Motivos pelos quais a população inquirida não foi mais Gráfico 6.7 – Frequência de consumo de filmes, espetáculos,
vezes assistir a espetáculos e concertos ao vivo, festivais concertos, festivais e festas locais, uma vez por semana
ou festas locais, por região (%) ou mais, pela Internet (%)

(Cinema, N=384; concertos de música ao vivo, N=249; festas e festivais ao vivo, N=116;
outras danças, N=89; Teatro, N=84; música clássica, N=88; ballet, N=64; ópera, N=43;
circo, N=47)
(Norte, N=677; Centro, N=444; Área Metropolitana de Lisboa, N=558; Alentejo, N=145;
Algarve, N=85; Açores, N=41; Madeira, N=50; grandes empresários, N=26; pequenos
empresários, N=193; técnicos, N=99; operários, N=604; gestores, N=90; empregados de
escritório, N=150; profissionais socioculturais, N=164; trabalhadores dos serviços, N=513)
foram os filmes, os concertos de música, festivais e festas locais, os
outros tipos de dança sem ser o ballet, o teatro e a música clássica
(gráfico 6.7). Foram mais vezes os inquiridos do sexo masculino,
Omnivorismo digital? com o ensino superior, residentes na região Norte, e com idades
compreendidas entre os 15-24 anos e os 35-44, que assistiram a
Durante a crise da pandemia, 26% dos inquiridos portugueses espetáculos pela Internet. Em França, durante o período do confina-
referem ter recorrido à modalidade recetiva digital para consumirem mento, o consumo digital, por domínio cultural, foi um pouco mais
filmes e espetáculos ao vivo.12 Trata-se de uma taxa de consumo cul- intenso do que em Portugal. Em 2020, os concertos on-line foram
tural que merece uma análise mais fina. Afere-se que os conteúdos acedidos por 13% dos inquiridos franceses contra 17%, em 2018.
online mais procurados, pelo menos uma vez por semana ou mais, Igual tendência foi observada no visionamento dos espetáculos de
teatro na Internet: em 2020, durante o período de confinamento,
12
Para calcular a percentagem de inquiridos que assinalaram terem recorrido à estes foram acedidos por 7% dos inquiridos franceses, contra 6%
modalidade digital utilizou-se a mesma variável criada para identificar o nível de fre-
quência de cada uma das práticas culturais online (v. gráfico 6.7): nunca assistiu através
em 2018.
da modalidade recetiva digital = 0; assistiu várias vezes por ano, mas não todos os Os franceses mais idosos triplicaram a taxa desta prática online
meses = 1; assistiu pelo menos uma vez por mês, mas não todas as semanas = 2; assis- que, como veremos, regista uma forte assimetria com Portugal, onde
tiu uma vez por semana ou mais = 3. Assim sendo, 26% é a percentagem de indivíduos este tipo de consumo cultural online, por parte dos mais idosos, é
que optaram pela modalidade recetiva digital, seja na frequência 1, 2 ou 3. Note-se
ainda muito modesto. De notar que as diferenças entre os mais ido-
ainda que 74% é a percentagem de indivíduos que nunca optaram pela modalidade
recetiva digital, no período dos últimos 12 meses, como considerado no Inquérito. sos e os jovens franceses reduz-se no que respeita ao visionamento de

274 275
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

espetáculos de dança, prática muito restrita quando comparada com Gráfico 6.8 – Omnivorismo digital e in situ, totais nacionais (%)
as restantes, e que diz respeito a 4% dos indivíduos durante o confi-
namento, contra 7% em 2018 (Jonchery e Lombardo 2020, 20-23).
Testar a ligação dos inquiridos que frequentam in situ cinema, espe-
táculos e concertos e o visionamento online é uma pista de pesquisa
a seguir.
Em Portugal, o consumo cultural digital mantém a forte cliva-
gem em relação à idade dos inquiridos, pelo contraste entre os mais
jovens (15-34 anos) e os inquiridos com 65 anos ou mais. Dos inqui-
ridos com mais idade apenas 2% assinalaram um consumo cultural
digital. No entanto, reduzem-se os desvios entre os diferentes gru-
pos de classe socioprofissional, como os trabalhadores dos serviços,
operários e profissionais socioculturais, uniformizando-se os seus
comportamentos com o uso da Internet. Convém ressaltar que,
em termos de estratificação social, algumas nuances emergem numa
análise mais fina, que conjugámos com interpelações que nos foram
surgindo durante este estudo (Weingartner 2020; Walmsley 2016;
Jonchery e Lombardo 2020, 36-38). Vejamos a relação do «omnivo-
rismo cultural» digital e in situ (gráfico 6.8).13
Da análise dos resultados ressaltam seis constatações. Primeira
constatação: no consumo dos filmes e espetáculos pela Internet são
os inquiridos do sexo masculino que têm uma orientação omnívora à
cultura um pouco mais expressiva. Quanto à idade, os valores percen-
tuais decrescem em todos os grupos etários, quando comparamos os
dois tipos de consumo, digital e in situ. Originam-se diferenciações
etárias muito fortes. O afastamento do consumo cultural, por parte
dos inquiridos com mais idade, acentua-se; e o consumo omnívoro
digital dos mais jovens mantém-se próximo do consumo ao vivo.
Segunda: no consumo digital – como já acontecera no consumo in
situ – são os inquiridos com uma escolaridade superior aqueles que
mais se destacam na prática «omnívora digital». Contudo, notamos
algum desinteresse e baixo consumo online por parte deste grupo
social, quando comparado com as suas taxas de frequência das salas
de cinema, concertos e espetáculos ao vivo. Terceira: os omnívoros
digitais são também filhos de pais com escolaridade superior, sendo
13
A análise descritiva sugere pistas que os testes de significância (qui-quadrado)
asseguram ser relevantes. Por exemplo, no que respeita a relação do «univorismo
cultural digital» e os operários e a relação do «omnivorismo cultural digital» e os (Unívoros digitais, N=1909; omnívoros digitais, N= 88; unívoros in situ, N=1849; omnívo-
ros in situ, N=151)
técnicos e especialistas e os gestores.

276 277
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

este um preditor importante no consumo de muitos e variados bens uma socialização alargada, junto das comunidades locais e digitais.
culturais, como estes que analisamos. Quarta: são os indivíduos com No entanto, apesar desta dinâmica geracional positiva, o consumo
rendimentos elevados que se destacam, pois têm – e podem ter – cultural é socialmente estratificado. A origem e posição social dos
uma orientação mais omnívora à cultura digital, o que significa mais indivíduos, tendo em conta o nível de escolaridade dos pais, amplia
tempo e recursos económicos para este tipo de consumo. Contudo, os efeitos do capital escolar do próprio, reproduzindo velhas cliva-
convém assinalar que, se compararmos os omnívoros in situ e os gens sociais e culturais, e, até certo ponto, limitando a progressão da
digitais, nos consumos digitais há uma clara retração por parte dos frequência das gerações intermédias e mais antigas.
inquiridos com os rendimentos mensais mais elevados, ultrapassados Segundo, as clivagens culturais entre os grupos sociais analisados
pelos inquiridos do segundo escalão de rendimentos mais altos, que e as suas segmentações internas são relevantes. A atitude cultural
participam mais online do que ao vivo. Quinta: o forte «omnivorismo dos indivíduos que têm uma escolaridade e uma posição profissio-
cultural» in situ, que reconhecemos aos profissionais socioculturais, nal mais elevadas parece criar um ethos que conjuga a diversidade
torna-se inexpressivo no acesso digital. Estarão alguns consumidores de gostos e práticas, e distingue consumos culturais mais do que
omnívoros dos espetáculos ao vivo a revelar-nos o seu desinteresse hierarquias de culturas. No entanto, no que respeita a estratifica-
pelos espetáculos online? A força do hábito e da p­ articipação in vivo, ção social, verificamos que os grandes empresários e profissionais
a falta de tempo e o alargamento dos modos de trabalho online, em ­liberais têm um portefólio variado e frequentam as atividades «clássi-
período de confinamento, poderão estar na origem deste resultado. cas». Os operários têm nas festas locais a sua prática mais expressiva.
Finalmente, sexta constatação: o elevado consumo de filmes online Os profissionais socioculturais são aqueles que mais se destacam por
associa-se fortemente aos padrões de consumo dos omnívoros digi- um ecletismo cultural relativamente aberto e democratizante. Será
tais, mas também dos unívoros; já a consulta de transmissões ao vivo essa abertura uma forma de tolerância (estética, cultural, política) a
de concertos de música clássica está mais associada ao perfil do uní- outros estilos e géneros culturais? Será a responsabilidade de fazer
voro digital. Que ligações existem entre o consumo cultural in situ e com que os seus gostos pareçam democraticamente inclusivos? Será
o visionamento online? Outro desafio a explorar, futuramente, ainda esse ecletismo responsável por reforçar a lógica da distinção social?
mais. Poderá esta orientação ajudar a consolidar redes de relações que per-
mitam aos indivíduos ascender a nível profissional? Precisaríamos
de pesquisas qualitativas para compreender melhor como se posicio-
Síntese conclusiva nam estes indivíduos face às suas escolhas, gostos e estilos de vida.
Uma pista de pesquisa a desenvolver.
A tendência dos dados, resultante do Inquérito às Práticas Cultu- Terceiro, o forte ecletismo dos grupos sociais – por exemplo,
rais dos Portugueses, mostra o poder explicativo das variáveis socio- dos inquiridos mais escolarizados – não existe em todos os domí-
demográficas e confirma, até certo ponto, o argumento da distinção nios culturais e pode não ser sistemático. Veremos num próximo
cultural, dando suporte ao paradigma contemporâneo que discute inquérito nacional, pois as temporalidades dos gostos são dimen-
uma orientação mais omnívora dos indivíduos à cultura (in situ e sões importantes (Ma 2021). As preferências musicais são disso
digital). Três resultados-chave emergem desta análise. esclarecedoras. Além da estratificação temporal dos gostos musicais
Primeiro, a educação generalizou-se no país e a singularidade cul- – a preferência pelo rap, por parte dos jovens, e a música clássica,
tural das gerações mais jovens é promissora. A influência dos jovens por parte daqueles que têm mais idade –, o perfil dos «omnívoros
no consumo omnívoro da cultura está em linha com os resultados culturais» conjuga o ecletismo, pela variedade das atividades con-
dos estudos europeus citados ao longo deste capítulo. É fruto da sumidas, e a distinção cultural, pela frequência de espetáculos in
expansão educacional dos países, mas também das políticas públicas situ, como o ballet ou a ópera, o jazz, e o acesso digital a filmes e
que articulam cultura e educação, e dos caminhos que se abrem a espetáculos «clássicos». No caso português, vale a pena valorizar

278 279
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

a ideia de que o «bom gosto» (Menger 1986) parece ditado pelos Referências bibliográficas
profissionais socioculturais. Em última análise, os indivíduos valo-
rizam práticas, estilos e géneros que se baseiam em valores pessoais Bauman, Zygmunt. 1988. Freedom. Milton Keynes: Open University Press.
e sociais próximos da sua cultura. Como ilustrado pela frequência Belanciano, Vítor. 2021. «Festival de Vilar de Mouros. Caos, nudismo e U2: quando
das festas locais, onde nos apercebemos do «à-vontade» da parti- Vilar de Mouros viu o futuro dos festivais». Público – Ípsilon. Disponível em
cipação dos menos escolarizados. O que nos leva a pensar sobre https://www.publico.pt/2021/08/28.
Bennett, Tony, Mike Savage, Elizabeth Bortolaia Silva, Alan Warde, Modesto Gayo-
a importância de aprofundarmos a relação dos indivíduos com a
Cal, David Wright. 2009. Culture, Class, Distinction. Londres: Routledge.
cultura que não é «trabalhada» na escola, mas com diferentes tipos Bonet, Lluís, e Emmanuel Négrier. 2018. «The Participative Turn in Cultural Policy:
de instituições e equipamentos culturais – como, por exemplo, a Paradigms, Models, Contexts». Poetics, 66: 64-73.
oferta de espetáculos, concertos e eventos, nas associações cultu- Bourdieu, Pierre. 1984. Distinction: A Social Critique of the Judgment of Taste. Cam-
rais locais, nos bairros, e os eventos de teatro nos museus –, com bridge, MA: Harvard University Press.
uma pluralidade de possíveis mediadores, técnicas de comunicação Bourdieu, Pierre, e Jean-Claude Passeron. 1977. Reproduction Education, Society,
dos conteúdos culturais, alinhadas com os diferentes segmentos de and Culture. Beverly ills, CA: Sage.
públicos, e com novas dinâmicas e parcerias – o Plano Nacional das Bryson, Bethany. 1996. «Anything but Heavy Metal: Symbolic Exclusion and Musi-
cal Dislikes». American Journal of Sociology, 102: 884-899.
Artes14 ou o projeto DESCOLA15 são casos paradigmáticos –, que
Chan, Tak Wing. 2019. «Understanding Cultural Omnivores: Social and Political
trazem mais cultura para a vida quotidiana dos portugueses. As polí- Attitudes». The British Journal of Sociology, 70, n.º 3: 784-806.
ticas públicas devem ter isso em conta para encorajarem o consumo Chan, Tak Wing, e John Goldthorpe. 2005. «The Social Stratification of Theatre,
cultural e o tornarem mais democrático. Dance and Cinema Attendance». Cultural Trends, n.º 14: 193-212.
Chan, Tak Wing, e John Goldthorpe. 2007. «Social Stratification and Cultural Con-
sumption: Music in England». European Sociological Review, n.º 23: 1-19.
Comissão Europeia (2013). Eurobarometer 79.2: Internal market, cultural activities,
non-urban road use, science and technology, and undeclared work and tax fraud,
abril–maio 2013. Alemanha: GESIS.
Costa, António Firmino da. 2004. «Dos públicos da cultura aos modos de relação
com a cultura: algumas questões teóricas e metodológicas para uma agenda de
investigação». Públicos da Cultura. Lisboa: Observatório das Atividades Cultu-
rais, 121-140.
Coulangeon, Philippe. 2004. «Classes sociales, pratiques culturelles et styles de vie:
le modèle de la distinction est-il (vraiment) obsolète?». Sociologie et sociétés, 36,
n.º 1: 59-85. https://doi.org/10.7202/009582ar.
Coulangeon, Philippe. 2005. «Educational Attainment and Participation in
‘Highbrow Culture». A Comparative Approach in European Union. Paris: Obser-
vatoire Sociologique du Changement.
Coulangeon, Philippe. 2011. Les métamorphoses de la distinction. Inégalités cultu-
relles dans la France d’aujourd’hui. Paris: Grasset.
Coulangeon, Philippe. 2017. «Cultural Openness as an Emerging Form of Cultural
Capital in Contemporary France». Cultural Sociology, 11, n.º 2: 145-164.
Coulangeon, Philippe, e Ionela Roharik. 2005. Testing the ‘Omnivore/Univore’
Hypothesis in a Cross-National Perspective. On the Social Meaning of Eclecticism
14
Ver: https://www.pna.gov.pt/premissa-e-valores/; https://www.facebook. in Musical Tastes in Eight European Countries. Paris: Observatoire Sociologique
com/PlanoNacionalArtes. du Changement.
15
Ver: https://descola.com.pt/sobre-o-descola/.

280 281
Práticas Culturais dos Portugueses Ecletismo ou distinção? Cinema, espetáculos ao vivo, festivais e festas locais

Coulangeon, Philippe, e Yannick Lemel. 2007. «Is ‘Distinction’ Really Outdated? Ma, Xiangyu. 2021. «What Are the Temporal Dynamics of Taste?». Poetics, 84. Disponí-
Questioning the Meaning of the Omnivorization of Musical Taste in Contem- vel em https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0304422X2030262X.
porary France». Poetics, 35, n.º 2-3: 93-111. MCUD (Ministerio de Cultura y Deporte). 2019. Encuesta de Hábitos y Prácti-
Dimaggio, Paul. 1987. «Classification in Art». American Sociological Review, 52, n.º cas Culturales en España 2018-2019. Madrid: División de Estadística y Estudios,
4: 440-455. Secretaría General Técnica, Ministerio de Cultura y Deporte. http://www.cultu-
Dimaggio, Paul, e Toqir Mukhtar. 2004. «Arts Participation as Cultural Capital in raydeporte.gob.es/dam/jcr:1712f192-d59b-427d-bbe0-db0f3e9f716b/encuesta-
the United States, 1982–2002: Signs of Decline?». Poetics: Journal of Empirical de-habitos-y-practicas-culturales-2018-2019.pdf.
Research on Culture, the Media and the Arts, n.º 32: 169-194. Menger, Pierre-Michel. 1986. «L’oreille spéculative. Consommation et perception
Ehis, Emmanuel, J.-L. Fabiani, e Damien Malinas. 2008. Avignon ou le public partici- de la musique contemporaine». Revue française de sociologie, 27, n.º 3: 445-479.
pant: Une sociologie du spectateur réinventé. Montpellier: L’Entretemps. Négrier, Emmanuel, Lluis Bonet, e Michel Guérin, ed. 2013. Music Festivals, a
Featherstone, Mike. 1987. «Lifestyle and Consumer Culture». Theory, Culture and Changing World, an International Comparison. Paris: Michel de Maule.
Society, 4, n.º 1: 55-57. Pais, José Machado, coord. 1994. Práticas Culturais dos Lisboetas. Lisboa: Instituto
Fortuna, Carlos, e Augusto Santos Silva. 2002. Projecto e Circunstância. Culturas de Ciências Sociais.
Urbanas em Portugal. Porto: Afrontamento. Peterson, Richard A. 1992. «Understanding Audience Segmentation: From Elite
Jæger, Mads Meier, e Tally Katz-Gerro. 2010. «The Rise of the Eclectic Cultural and Mass to Omnivore and Univore». Poetics, 21, n.º 4: 243-258.
Consumer in Denmark, 1964–2004». The Sociological Quarterly, 51: 460-483. Peterson, Richard A., 1997. «The Rise and Fall of Highbrow Snobbery as a Status
Johnston, Josée, e Shyon Baumann. 2007. «Democracy versus Distinction: A Study of Marker». Poetics, 25: 75-92.
Omnivorousness in Gourmet Food Writing». AJS, 113, n.º 1: 165–-204. Peterson, Richard A. 2005. «Problems in Comparative Research: The Example of
Jonchery, Anne, e Philippe Lombardo. 2020. Pratiques culturelles en temps de con- Omnivorousness». Poetics, 33: 257-282.
finement. Paris: Département des études, de la prospective et des statistiques, Peterson, Richard A., e A. Simkus. 1992. «How Musical Tastes Mark Occupational
Ministère de la Culture. Disponível em: CE-2020-6_Pratique culturelles en Status Groups». In Cultivating Differences: Symbolic Boundaries and the Making
temps de confinement-web (1).pdf. of Inequality, ed. M. Lamont e M. Fournier. Chicago: University of Chicago
Katz-Gerro, Tally. 2002. «Highbrow Cultural Consumption and Class Distinction Press, 152-186.
in Italy, Israel, West Germany, Sweden, and the United States». Social Forces, 81: Peterson, Richard A., e Roger M. Kern. 1996. «Changing Highbrow Taste: From
207229. Snob to Omnivore». American Sociological Review, 61, n.º 5: 900-907.
Katz-Gerro, Tally. 2011. «Cross-National Cultural Consumption Research: Inspi- Pratiques culturelles. 1973-2018. Cinéma. Disponível em: https://search.yahoo.com
rations and Disillusions». Kolner Zeitschrift Fur Soziologie Und Sozialpsychologie, /search?fr=mcafee_uninternational&type=E211PT885G0&p=Pratiques+cult
n.º 51: 339-360. urelles+1973-2018+%3A+Cin%C3% A9ma.
Lahire, Bernard. 2008. «The Individual and the Mixing of Genres: Cultural Disso- Reeves, Aaron. 2012. «Social Stratification, Gender and Sport Participation». Socio-
nance and Self-Distinction». Poetics, 36, n.º 2-3: 166-188. logical Research Online, 17, n.º 2: 1-12. https://doi.org/10.5153/sro.2598.
Larsen, Håkon. 2016. Performing Legitimacy: Studies in High Culture and the Public Reeves, Aaron. 2019. «How Class Identities Shape Highbrow Consumption: A
Sphere. Londres: Palgrave Macmillan. Cross-National Analysis of 30 European Countries and Regions». Poetics, 76.
Lombardo, Philippe, e Loup Wolff. 2020. Cinquante ans de pratiques culturelles en Disponível em https://doi.org/ 10.1016/j.poetic.2019.04.002.
France. Département des études, de la prospective et des statistiques. Ministère de Reeves, Aaron, e Robert de Vries. 2018. «Can Cultural Consumption Increase
la Culture, Disponível em : file:///C:/Users/ASUS/Downloads/CE-2020-2_Cin- Future Earnings? Exploring the Economic Returns to Cultural Capital». The
quante%20ans%20de%20pratiques%20culturelles%20en%20France%20(2).pdf. British Journal of Sociology. Disponível em file:///C:/Users/ASUS/Downloads/
Lopes, João Teixeira. 2008. «Políticas e práticas culturais no Norte de Portugal». CultureandIncome-BJS-ReevesanddeVries.pdf.
Revista de Investigaciones Políticas y Sociológicas, 7, nº 1. Santiago de Compos- Rego, Raquel, e Vera Borges. 2021. «The Transformative Role of Angels’ Cultu-
tela: Universidade de Santiago de Compostela, 71-93. ral Organisations under Austerity». Cultural Trends, 30, n.º 2: 156-173. Doi:
Lopes, João Teixeira. 2010. «Do politeísmo cultural contemporâneo ao trabalho 10.1080/09548963.2021.1873702.
escolar de eliminação da dissonância». Sociologia, 20: 281-290. Silva, Augusto Santos, Felícia Luvumba, e Graça Bandeira. 2002. «A arte de ser
López, Sintas J., e E. García-Álvarez. 2002. «Omnivores Show up Again. The Seg- culto: A formação e as práticas dos consumidores regulares». In Projeto e Cir-
mentation of Cultural Consumers in Spanish Social Space». European Sociologi- cunstância. Culturas Urbanas em Portugal, org. Carlos Fortuna e Augusto Santos
cal Review, 18, n.º (3): 353-368. Silva. Porto: Afrontamento, 163-210.

282 283
Práticas Culturais dos Portugueses

Taking Part Survey. 2016-2017. Dance, Music Profile. Disponível em: https://www. Rui Telmo Gomes
artscouncil.org.uk/sites/default/files/download-file/Dance_profile_2016_17_0.
pdf.
Taylor, Jodie, Andy Bennett, e Ian Woodward. 2014. Festivalisation of Culture. Far-
nham: Ashgate.
Taylor, Mark. 2016. «Nonparticipation or Different Styles of Participation? Alter-
native Interpretations from Taking Part». Cultural Trends, 25, n.º 3: 169-181.
Doi: 10.1080/09548963.2016.1204051.
Walmsley, Ben. 2016. «From Arts Marketing to Audience Enrichment: How Digital
Engagement Can Deepen and Democratize Artistic Exchange with Audiences».
Poetics, 58: 66-78. Capítulo 7
Warde Alan, David Wright e, Modesto Gayo-Cal. 2008. «The Omnivorous Orien-
tation in the UK». Poetics, 36: 148-165.
Weingartner, Sebastian. 2020. «Digital Omnivores? How Digital Media Reinforce Participação artística
Social Inequalities in Cultural Consumption». New Media Society. Doi: https://
doi.org/10.1177/1461444820957635. e capitais culturais

Introdução

O questionário previa – como aliás é habitual em inquéritos de


grande escala às práticas culturais – um módulo dedicado às ativi-
dades de lazer, permitindo desenvolver dimensões de análise com-
plementares. Uma perspetiva abrangente sobre práticas de lazer que
não apenas na esfera artística ou da cultura erudita, mas também com
uma componente lúdica e sociável, realizadas no contexto doméstico
ou fora dele, possibilita por hipótese um termo de comparação das
diversas vertentes do ócio mais e menos centradas na esfera cultu-
ral, abarcar uma parcela mais alargada de população e reter perfis
sociográficos mais diversos. Este é o exercício proposto no primeiro
ponto deste capítulo.
Num segundo ponto será considerado um conjunto de práticas
artísticas amadoras – dimensão de estudo igualmente habitual em
inquéritos às práticas culturais. Propõe-se uma leitura comparativa
de alguns indicadores de inquéritos internacionais, bem como um
retrato dos artistas amadores, das suas áreas artísticas preferenciais e
da regularidade da prática amadora no presente e no passado.
Nas terceira e quarta partes o enfoque é colocado sobre a forma-
ção de hábitos culturais, quer, por um lado, através da caracterização
de (eventuais) visitas a equipamentos culturais durante a infância e

284 285
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

juventude, quer, por outro, quanto à frequência e perfil de atividades charadas e sudoku, 21%), prática desportiva (19%), trabalhos de agu-
de formação artística extracurricular. lha (tricot, bordado e renda, 12%) e participação associativa (10%);
O capítulo finaliza com a análise de indicadores sobre o conhe- abaixo do limiar de um décimo encontram-se atividades como pesca
cimento da população portuguesa relativo à atividade cultural; con- ou caça (8%), artesanato (8%), voluntariado (6%) e colecionismo
cretamente, quanto às fontes de informação utilizadas e também (5%). Quando se pensa na regularidade, a ordenação das atividades
quanto à perceção do conhecimento próprio sobre a oferta cultural. é semelhante, mas apresenta algumas variações: desporto é a prática
de lazer com maior frequência diária ou semanal (12%); seguir ou
criar receitas culinárias é a mais assinalada numa frequência mensal;
Práticas de lazer as festas populares surgem como o principal evento lúdico ocasional.
As modalidades de lazer elencadas correspondem a periodicida-
A regularidade de modalidades ora mais lúdicas ora mais cria- des e interesses diferentes, o que se traduz numa desigualdade dos
tivas fornece um contraponto para a análise das práticas culturais, tempos de ócio, particularmente vincada em variáveis como idade,
em particular das práticas artísticas amadoras. Num plano geral dos escolaridade, rendimento e perceção de conforto material. Observa-
lazeres realizados pelo menos uma vez no ano anterior à pandemia, se uma clara relação entre a perceção de conforto material e modali-
as diversas modalidades consideradas são partilhadas por uma par- dades de lazer. Em quase todos os casos, a probabilidade de realizar
cela relativamente reduzida da população (gráfico 7.1). Mesmo as qualquer uma dessas modalidades é proporcional ao conforto per-
atividades mais comuns situam-se num patamar entre um quarto e cecionado, sendo o diferencial bastante vincado (gráfico 7.2). Essa
um terço da população: jogos sociais (32%), festas populares (28%) desigualdade é patente nas atividades de lazer mais comuns (com
e seguir ou criar receitas culinárias (25%); num patamar intermédio uma taxa de realização superior a 10%): os jogos sociais são um lazer
observam-se lazeres diversos como jogos lógicos (palavras cruzadas, de 41% dos que vivem confortavelmente contra 20% dos que vivem
com muitas dificuldades; o mesmo contraste se observa para a uti-
lização de receitas culinárias (33% contra 16%), passatempos (27%
Gráfico 7.1 – Práticas de lazer, segundo a regularidade (%)

Gráfico 7.2 – Práticas de lazer, segundo a perceção da situação


económica individual (%)

286 287
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

contra 14%), prática de modalidade desportiva (32% contra 8%), Gráfico 7.3 – Práticas de lazer, segundo género (%)
participação em associações recreativas e culturais (12% contra 4%).
Apenas duas modalidades de lazer contrariam este quadro geral: a
ida a festas populares é transversal aos diferentes graus de conforto
material (varia no intervalo relativamente estreito entre 25% e 30%);
os trabalhos de agulha têm maior expressão entre as pessoas que
vivem com algumas (mas não muitas) dificuldades (19%) e declinam
entre as que vivem razoável ou confortavelmente.
Observa-se um padrão semelhante para a escolaridade e, em
certa medida, para a idade: a maioria das modalidades de lazer são
mais prováveis para os mais escolarizados e mais jovens; pelo con-
trário, quem tem uma escolaridade até ao 3.º ciclo do ensino básico
apresenta taxas de realização muito inferiores à média da população.
A tendência geral de diminuição dos lazeres com a idade não é linear;
é mais visível em atividades como jogos sociais, desporto e culinária;
a ida a arraiais populares é um hábito partilhado por diferentes seg-
mentos da população; os trabalhos de agulha são a única das ativi-
dades elencadas no Inquérito cuja frequência aumenta com a idade,
ficando ao redor de 20% nos escalões etários acima dos 55 anos e
sendo aliás o lazer mais comum no escalão acima dos 75 anos (cujas
taxas de realização para os restantes lazeres são inferiores a metade
dos valores médios encontrados para a população). trabalhadores domésticos não remunerados são os grupos que apre-
A completar o perfil social das modalidades de lazer podemos sentam menores taxas.
verificar o respetivo recorte operado por género (gráfico 7.3). As Em suma, a regularidade com que são realizadas as práticas de lazer
atividades de lazer, pelo menos as mais comuns, são razoavelmente elencadas é fortemente marcada por fatores em grande medida associa-
contrapostas: com um perfil francamente feminizado, trabalhos de dos à detenção de capitais económicos e escolares. A transversalidade
agulha (23% vs. 2% para mulheres e homens respetivamente), e da participação em festas populares e a excecionalidade dos trabalhos
seguir ou criar receitas de culinária (35% vs. 13%); com um perfil de agulha constituem traços discordantes nesse panorama geral.
masculinizado, prática de modalidade desportiva (26% vs. 13%, para
homens e mulheres respetivamente), jogos sociais (39% vs. 26%)
ou, entre os lazeres com menos praticantes, pesca e caça (15% vs. Práticas artísticas amadoras
2%). A participação em festas populares, pelo contrário, é aproxi-
mada entre homens e mulheres (30% e 27%), bem como o volunta- O nível geral de realização de práticas artísticas amadoras entre
riado (7% e 6%), ainda que bem menos frequente. a população portuguesa é relativamente reduzido (ver tabela 7.1),
A situação perante o trabalho: os estudantes surgem como o o que pode ser verificado na comparação com outros inquéritos
grupo com práticas lúdicas mais regulares (em especial jogos sociais, recentes realizados em países europeus. Para lá das diferenças meto-
desporto e passatempos); o conjunto da população ativa apresenta dológicas, o padrão observado para a população portuguesa é mais
em geral taxas ligeiramente acima da média (em particular para jogos semelhante ao de um pequeno país como Malta (ACM 2017, 129-
sociais, seguir receitas culinárias e prática desportiva). Reformados e 133) do que ao de um país mais populoso como Espanha (MCUD

288 289
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

Tabela 7.1 – Práticas artísticas amadoras realizadas no último ano Gráfico 7.4 – Práticas artísticas amadoras, segundo a situação
pela população de Portugal, Espanha, França e Malta (%) perante o emprego (%)

Nota: Os valores assinalados (*) correspondem a categorias de teor ligeiramente diferente;


por exemplo, o Inquérito português considera a prática de fotografia, vídeo e cinema numa
única opção, ao contrário dos restantes inquéritos, que distinguem fotografia e vídeo.

2019, 35) ou França (Jonchery e Lombardo 2020, 5). Note-se tam-


bém que em Portugal se observa uma prevalência incomum da ati-
vidade de escrita e uma menor presença de outras atividades como
fotografia, vídeo, música ou dança (especialmente na comparação
com Espanha e França).
As várias práticas artísticas amadoras apresentam um perfil seme-
lhante: são, tal como se observou a respeito da maioria das modalida-
des de lazer, claramente mais prováveis entre os mais jovens, os mais
escolarizados (e principalmente com os pais mais escolarizados),
com maiores rendimentos e conforto. Uma variável relacionada e
particularmente explicativa é a situação perante o emprego (gráfico
7.4): os estudantes denotam, em quase todas as modalidades, um igualmente a prevalência de estudantes entre artistas amadores, mas
volume de práticas artísticas muito acima das restantes categorias não tão vincada (consoante as modalidades, a prática artística dos
– multiplicando o valor médio de cada modalidade entre 3 a 4 vezes –, estudantes é, em Espanha, cerca do dobro da média, sensivelmente
o que possivelmente remete para atividades formativas extracurricu- abaixo do que sucede em Portugal); no polo oposto, aposentados e
lares paralelas à frequência escolar (tópico retomado adiante). Dito trabalhadores surgem menos apartados das artes amadoras.
de outro modo, tal significa que embora os estudantes representem Agregando as várias práticas artísticas (gráfico 7.5), podemos
apenas 6% da população compõem entre um quarto e um quinto verificar que a respetiva regularidade está fortemente associada com o
de todos os artistas amadores (com exceção da escultura). Traba- nível de escolaridade. No cômputo global, 17% dos portugueses rea-
lhadores no ativo e desempregados apresentam taxas com ordens de lizaram pelo menos uma prática artística amadora no ano anterior à
grandeza semelhantes ao valor médio da população. Aposentados pandemia (a que acrescem 4% de antigos praticantes); se considerar-
apresentam um nível muito reduzido e trabalhadores domésticos não mos respondentes com nível de ensino superior, essa mesma prática
remunerados estão quase totalmente excluídos desta esfera cultural. atinge um pico de 32% (e 9% de antigos praticantes). Para efeitos
Na comparação com os indicadores do inquérito espanhol, recor- comparativos, refira-se que o inquérito francês regista 44% de pra-
dando que neste caso a prática amadora é mais generalizada, constata-se ticantes de artes amadoras em 2020 (Jonchery e Lombardo 2020, 5).

290 291
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

Gráfico 7.5 – Prática artística amadora, segundo o nível rias polares (quadros e empregados) não têm correspondência exata
de escolaridade (%) – uma enorme distância de perfis sociais da prática artística amadora
no caso português.

Gráfico 7.6 – Prática artística amadora, segundo a idade


e regularidade (%)

Por idade – sendo variáveis relacionadas – observa-se um pano-


rama muito semelhante (gráfico 7.6): maior frequência de práticas
amadoras entre os mais novos e também maior regularidade. A prá-
tica semanal é muito expressiva apenas na adolescência (17% entre
os 15 e os 19 anos); a partir dos 20 anos fica abaixo dos 10% e é
decrescente nos escalões subsequentes. A prática artística ao longo
da idade adulta oscila entre uma temporalidade mensal ou ocasional,
Gráfico 7.7 – Prática artística amadora, segundo a classe
ou mesmo o abandono – predominante entre os 45 e os 54 anos. socioprofissional e regularidade (%)
Neste quadro é ainda de referir que 44% dos estudantes mantêm
pelo menos uma prática artística, a que se somam 5% que a tiveram
no passado – ou seja, cerca de metade dos estudantes realizaram em
algum momento do seu percurso uma prática artística amadora.
A classe socioprofissional estabelece um hiato muito sensível
entre as categorias extremas (gráfico 7.7): apenas 10% dos operários
e 14% dos trabalhadores dos serviços alguma vez realizaram práticas
amadoras (8% e 12% nos últimos 12 meses), em contraste com 52%
dos grandes empresários e profissionais liberais e 42% dos profissio-
nais socioculturais (37% e 30% nos últimos 12 meses). A proporção
de praticantes amadores entre as categorias extremas corresponde
portanto a um ratio de 5,2 (ou 4,6 se considerarmos apenas os últi-
mos 12 meses). O valor equiparável para França é de 2,8 (Lombardo
e Wolff 2020, 73), o que sinaliza – embora ressalvando que as catego-

292 293
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

Entre as razões da prática artística amadora (gráfico 7.8), a mais Gráfico 7.9 – Meios utilizados na realização de práticas artísticas
citada é ‘dar prazer’ (66%); sendo a única referida por mais de metade amadoras (%)
dos praticantes, é também transversal a vários perfis sociográficos
recortados pelas variáveis que vêm sendo mais referidas, como sejam
idade, escolaridade, rendimento e classe socioprofissional. Outras
razões referidas por mais de um quinto dos praticantes são ‘expres-
são pessoal’ (31%), ‘distração da vida quotidiana’ (28%) e ‘partilha
entre amigos ou família’ (22%). Sem que se verifiquem diferenças
muito pronunciadas, é possível ainda assim observar que a partilha
entre amigos e família é previsivelmente mais assinalada entre os que
vivem com quatro ou mais corresidentes (30%), mas também entre
os que vivem com muitas dificuldades (39%); já a expressão pessoal
constitui motivo mais referido por diplomados do ensino superior
(36%).
Curiosamente, também entre antigos praticantes amadores se
destaca uma razão principal de abandono, igualmente apontada em
mais de metade dos casos – ‘falta de tempo’ (53%) –, a que se jun-
tam dificuldades com menor expressão tais como ‘perda de interesse’ um relativo equilíbrio entre o uso combinado de meios digitais e
(24%), ‘obstáculos profissionais/escolares’ (16%) e ‘obstáculos fami- tradicionais e o uso exclusivo ora de uns ora de outros; no caso da
liares’ (11%). fotografia e vídeo, é notório o uso mais frequente de meios exclu-
Observam-se (gráfico 7.9) três perfis de prática amadora em sivamente digitais, mas também alguma persistência de meios tra-
função dos meios utilizados: nas artes plásticas, o uso exclusivo de dicionais. Os meios tecnológicos utilizados parecem, pois, serem
meios tradicionais é largamente dominante; na escrita e música, há ainda determinantes na diferenciação das artes amadoras.
A utilização de meios tradicionais sugere um recorte por género
relativo aos modos de fazer: embora a utilização simultânea dos
Gráfico 7.8 – Motivações da prática artística amadora (%) dois tipos de recursos seja muito próxima entre homens e mulhe-
res (45% e 42% respetivamente), as mulheres utilizam com maior
frequência meios exclusivamente tradicionais (46% vs. 28% para os
homens), o que está associado à sua maior dedicação a artes visuais
e à escrita, ao passo que os homens sobressaem no uso exclusivo de
meios digitais (27% vs. 12% para as mulheres), ligado por seu turno
à preponderância da prática de fotografia e vídeo (gráfico 7.10).
A idade é um outro fator decisivo de diferenciação (gráfico 7.11):
os meios digitais têm um uso mais expressivo entre os 20 e os 34
anos (31% a 36%), decrescendo nos escalões etários seguintes, até
se tornarem residuais entre os mais velhos; ao contrário, os meios
tradicionais são mais frequentes com o avançar da idade; mesmo
o uso combinado de meios digitais e tradicionais diminui gradual-
mente com a idade.

294 295
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

Gráfico 7.10 – Meios utilizados na realização de práticas artísticas Gráfico 7.12 – Regularidade de visitas culturais durante
amadoras, segundo o género (%) a infância e a adolescência, segundo o contexto
de visita (%)

Gráfico 7.11 – Meios utilizados na realização de práticas artísticas


amadoras, segundo a idade (%) Acresce uma importante precisão em termos geracionais: todas
as formas de visita, com destaque para a escolar, são consideravel-
mente mais comuns para os escalões etários abaixo dos 50 anos,
também os mais escolarizados – ou seja, as gerações nascidas após a
instauração da democracia (gráfico 7.13).

Gráfico 7.13 – Visitas culturais durante a infância e a adolescência,


segundo a idade (%)

Visitas culturais na infância e na adolescência

As visitas familiares e/ou escolares a equipamentos culturais são


fatores conhecidos na transmissão e consolidação de capitais cul-
turais e, por essa via, na formação de públicos. A visita escolar é
efetivamente o dispositivo que abrange uma maior parcela da popu-
lação (61%), ao passo que todas as outras modalidades abrangem um
­contingente minoritário (gráfico 7.12).

296 297
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

Outras variáveis como a classe socioprofissional apontam igual- o tipo de visita. A escola é o principal canal deste tipo de socializa-
mente contrastes muito acentuados (gráficos 7.14): a formação do ção na esfera cultural para todas as categorias socioprofissionais; mas
hábito de visita a equipamentos culturais a partir da infância e da enquanto 87% de profissionais socioculturais tiveram essa experiên-
adolescência é claramente mais frequente para profissionais socio- cia, o mesmo é válido para apenas 41% dos operários (a única cate-
culturais, grandes empresários e profissionais liberais e gestores goria abaixo de 50% dos casos, e também a única abaixo de 25% de
– com valores elevados para todos os contextos observados –, em visitas realizadas em família ou com amigos).
oposição ao défice constatado para operários em qualquer que seja Um indicador que sintetiza a importância da escola nestas
visitas é a sua quase universalidade no presente: 91% dos atuais
estudantes assinalam essa experiência. Através de um processo de
Gráfico 7.14 – Visitas culturais durante a infância e a adolescência, longa duração, a escola vem, pois, contribuindo para uma aproxi-
segundo a classe socioprofissional (%) mação da população aos equipamentos culturais, enquanto dispo-
sitivo destacado de visita durante a infância e a adolescência; mas,
por outro lado, vêm ficando de fora desse processo de «demo-
cratização cultural» categorias sociais que se caracterizam preci-
samente pela privação de capitais escolares e culturais de partida
– esse parece ser um limite estrutural do papel da escola no acesso
à cultura.
Entre aqueles que realizaram visitas culturais durante a sua infân-
cia e adolescência, pouco mais de um quinto (22%) usufruíram de
iniciativas oferecidas pelos próprios espaços culturais. O padrão é
semelhante ao encontrado para as visitas quanto à idade e instrução:
são as coortes geracionais com menos de 50 anos que mais benefi-
ciaram dessas ofertas, em especial o escalão etário mais jovem (entre
15 e 19 anos) que apresenta o valor máximo (31%); em termos de
escolaridade, observa-se um grande diferencial entre a população que
não completou o 3.º ciclo (10%) e a aquela com escolaridade supe-
rior (30%). O recorte pela classe socioprofissional replica também o
que foi já observado para as visitas.
Os principais beneficiários das iniciativas oferecidas são grandes
empresários e profissionais liberais (44%), técnicos e especialistas
(33%) e profissionais socioculturais (30%), de novo contrastando
com operários (15%). Se considerarmos não apenas quem realizou
visitas culturais durante a infância e a adolescência, mas o conjunto
da população, incluindo os que não visitaram, podemos inferir que
as iniciativas oferecidas por instituições culturais chegaram a 42%
dos grandes empresários e profissionais liberais e a 7% dos operá-
rios – o que significa que os primeiros têm uma probabilidade de
terem beneficiado das iniciativas oferecidas seis vezes superior à dos
segundos.

298 299
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

Formação artística Gráfico 7.15 – Área de formação artística não curricular,


segundo o género (%)
Uma parcela minoritária mas relevante dos portugueses teve
alguma formação artística não curricular: 11% tiveram aulas ou
lições não incluídas no currículo escolar; 9% participaram em ofici-
nas artísticas; 13% experimentaram pelo menos uma das duas moda-
lidades (de onde se depreende uma grande sobreposição entre elas).
Como seria previsível, estas são atividades formativas fortemente
associadas à idade e à escolaridade. Quase um quarto (entre 22% e
23%) dos indivíduos nos escalões etários até aos 35 anos assinala ter
experimentado este tipo de formação no presente ou no passado, per-
centagem que decresce gradualmente nos escalões subsequentes, até
se tornar residual entre os 65 e os 74 anos (5%), e especialmente após
o limiar dos 75 anos (2%). O diferencial observado no nível de esco-
laridade é mais pronunciado, contrastando o nível de ensino superior
(33%) com o nível de escolaridade menor do que o 3.º ciclo (3%).
O nível de rendimento é também um fator determinante na pro-
babilidade de aceder a esta formação artística: abaixo dos 500 euros
de rendimento mensal essa probabilidade é residual (3%); entre os
500 e 1800 euros é superior, mas abaixo da média (variando entre
7% e 12%); a partir dos 1800 euros (23%) e especialmente dos 2700
euros (50%), tal probabilidade é acentuadamente maior.
Observando ainda a proporção dos atuais estudantes que fre-
quentaram formação artística não curricular (26%, o dobro do valor
médio para a população), este conjunto de indicadores sugere que
estas atividades, embora não estejam incluídas no currículo escolar, Tal como acima se verificou com a promoção de visitas a equipa-
constituem uma formação extracurricular paralela ao percurso edu- mentos culturais, a escola é o principal contexto de formação artís-
cativo e académico, que parece tornar-se mais comum entre as gera- tica não curricular (42% dos que experimentaram essa formação),
ções mais jovens, mas de acesso socialmente muito desigual. seguindo-se as associações e coletividades locais (28%) e as aulas
A principal área de formação artística não curricular é a música particulares (22%). A escola é relevante especialmente entre os esca-
(31%), seguida do teatro (24%) e das artes visuais (22%). Na maior lões etários mais jovens (gráfico 7.16). Ao nível das coortes etárias,
parte das áreas verifica-se um ligeiro predomínio feminino (gráfico observa-se a partir dos 35-45 anos uma complementaridade entre os
7.15), destacando-se contudo três casos com um perfil diferenciado, contextos escolar e associativo. Estando a formação artística sempre
compatíveis aliás com o que acima se observou a respeito das moda- positivamente correlacionada com o nível de escolaridade, essa com-
lidades de lazer e práticas artísticas amadoras: há uma expressiva plementaridade chama a atenção para um papel histórico das asso-
feminização da formação nas áreas de ballet/dança (opção de 24% ciações (em particular, nas coortes etárias entre os 35 e os 64 anos).
das mulheres vs. 3% dos homens) e artes manuais (6% vs. 0%); e Há uma estreita – e previsível – relação entre formação artística
masculinização das artes digitais (escolha de 14% dos homens e 1% extracurricular e prática artística amadora: 61% dos que experimen-
das mulheres). taram aulas ou oficinas artísticas declaram terem no presente ou

300 301
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

Gráfico 7.16 – Contextos de formação artística, Gráfico 7.17 – Fontes de informação sobre a oferta cultural (%)
segundo a idade (%)

t­ elevisão é um meio de uso transversal entre vários escalões etários


e níveis de qualificação – para algumas categorias sociais com menor
terem tido no passado alguma prática artística amadora; na ausência capital cultural é mesmo o único.
dessa formação artística a prática amadora é bastante menor (14%). Relativamente à idade (gráfico 7.18), a recomendação pessoal
As práticas amadoras em que a formação artística extracurricular é é transversal a diferentes escalões etários (em torno dos 40%, com
mais relevante são a dança (56%), a música (55%), as artes digitais exceção das categorias polares), atingindo o valor máximo entre os
(54%) e o teatro (52%). mais novos e o mínimo entre os mais velhos. A televisão é referida
‘Falta de interesse’ é a explicação mais vincada (52%) para a não
frequência de formações artísticas, superando largamente outros
fatores como a ‘inexistência de oferta local’ (19%) e a ‘falta de Gráfico 7.18 – Principais fontes de informação sobre a oferta cultural,
tempo’ (15%), entre outros. segundo a idade (%)

Conhecimento das atividades culturais

As principais fontes de informação da população portuguesa


sobre a oferta cultural são as recomendações pessoais (40%), a tele-
visão (35%) e as redes sociais (23%); outros canais como informação
local, Internet, rádio, anúncios, cartazes e jornais ficam num patamar
inferior de consulta (gráfico 7.17).
Idade e nível de escolaridade operam uma diferenciação impor-
tante: entre a população mais jovem e escolarizada, as redes sociais
superam a televisão como fonte de informação; ainda assim, a

302 303
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

sempre por uma parcela importante, mas até aos 34 anos é muito as diferentes categorias. As restantes fontes de informação crescem,
claramente suplantada pelas redes sociais, entre os 35 e os 64 anos como seria esperável, com a maior escolaridade. Ao contrário, a
é secundarizada pelas recomendações pessoais, tornando-se a partir ausência explícita de informação é característica da população menos
dos 65 anos a principal fonte de informação. O uso de redes sociais e escolarizada.
da Internet está muito marcadamente associado a jovens adultos – é O carácter transversal da televisão enquanto fonte de informa-
o meio mais consultado entre os 20 e os 34 anos, perdendo influência ção é patente na utilização muito semelhante que é feita pelas diver-
a partir dessa idade. A informação local é um suporte relevante para sas categorias socioprofissionais, num intervalo sempre próximo da
os vários escalões (entre 15% e 17%), exceto a partir dos 75 anos. média. Outras fontes assumem um carácter distinto: a recomen-
Um conjunto de outros suportes, com um patamar médio entre os dação pessoal é principalmente seguida por técnicos e especialistas
10% e os 15%, atinge os seus valores modais ao longo da idade adulta (53%), profissionais socioculturais (51%) e grandes empresários e
(rádio, anúncios, cartazes, jornais, programas). Uma nota para a profissionais liberais (51%), contrastando com operários (36%) e
referência explícita à não consulta de informação: embora represente trabalhadores dos serviços (36%). O contraste entre estes grupos
apenas 2% das respostas, está claramente associada à população mais observa-se igualmente para as fontes menos consultadas.
velha. A autoavaliação que os portugueses fazem do seu próprio conhe-
As duas principais fontes de informação – recomendação pessoal cimento sobre a oferta cultural é fortemente reveladora de desi-
e televisão – apresentam valores muito próximos, entre 35% e 40%, gualdades sociais e distinções simbólicas conhecidas no estudo das
para a população com nível de escolaridade até ao secundário (grá- práticas culturais e que se constatam de novo no presente Inquérito
fico 7.19); para a população com ensino superior, a consulta desses (gráfico 7.20): as categorias socioprofissionais mais qualificadas cor-
meios diverge com preferência para a recomendação pessoal (53%) respondem a uma maior familiaridade com a esfera cultural (63% de
em detrimento da televisão (32%). A utilização de redes sociais grandes empresários e profissionais liberais, bem como de profissio-
como fonte sobe com a escolaridade, atingindo um valor semelhante nais socioculturais, assumem um conhecimento abrangente da oferta
nos níveis secundário (39%) e superior (38%). A consulta de fon- cultural), ao passo que as categorias ligadas ao trabalho manual ou
tes locais ou da região, à semelhança da televisão, varia pouco entre

Gráfico 7.20 – Perceção individual de conhecimento para desfrutar


Gráfico 7.19 – Principais fontes de informação sobre a oferta cultural, da oferta cultural, segundo a classe
segundo a escolaridade (%) socioprofissional (%)

304 305
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

menos qualificado denotam um evidente distanciamento (51% dos português numa perspetiva comparativa internacional, mesmo para
operários e 42% dos trabalhadores dos serviços dizem não ter tais práticas de lazer que poderíamos supor mais disseminadas, é patente
conhecimentos). Se a distinção entre categorias é esperável, o grande e sugere algumas pistas de reflexão.
diferencial é explicado pelo nível de escolaridade – entre os portu- O papel da escola afigura-se decisivo e procurou-se aprofun-
gueses com menos do que o 3.º ciclo são 64% os que declaram não dar a sua análise a partir de módulos específicos do questionário.
conhecerem a oferta cultural, sendo o mesmo ratio de 6% entre os Importa começar por dizer que os seus efeitos não são lineares, pelo
licenciados. que propomos uma breve distinção entre duas dimensões analíticas:
É de referir, por fim, que o contingente dos que não conhecem efeito estrutural do capital escolar na reprodução do desigual acesso
a oferta cultural é o que menos utiliza qualquer um dos meios de à cultura; efeito da massificação da escolaridade avançada sobre as
informação referidos acima, com exceção da televisão – cujo uso, práticas culturais.
como se viu, é transversal a grupos sociais muito diversos. Num plano estrutural, os indicadores sobre práticas de lazer,
práticas artísticas amadoras e especialmente formação de hábitos
culturais na infância e juventude confirmam a persistência da cultura
Notas conclusivas como universo simbólico distintivo em que o capital escolar (pró-
prio ou familiar) é fator sobredeterminante. Essa distinção verifica-
Os dados recolhidos através do Inquérito dão conta de um se mesmo entre as gerações mais jovens e escolarizadas. Não estamos
reduzido nível de realização de práticas culturais amadoras quando perante a estrita associação entre capital escolar e repertórios cul-
comparado a nível internacional e mesmo da expressão minoritária turais eruditos apontada por Bourdieu (1979) no seu estudo clás-
entre a população portuguesa de lazeres de natureza mais lúdica ou sico sobre a legitimidade da prática cultural como fonte de distinção
sociável. Numa comparação parcial com o Inquérito à Ocupação social; mas deslocando esse modelo teórico do foco na cultura eru-
do Tempo realizado pelo INE em 1999 (Gomes 2001; Lopes et al. dita para repertórios mais variados – conceptualizados na bibliogra-
2001), os dados agora apurados apontam uma quebra em algumas fia como «ecléticos» (Donnat 1994), «omnívoros» (Peterson 1992),
das principais atividades de lazer consideradas. Este decréscimo afi- ou «dissonantes» (Lahire 2004) –, o contraste operado pelo capital
gura-se algo surpreendente à luz do que sucede habitualmente em escolar mantém-se como interpretação válida. A diferenciação sim-
séries de inquéritos internacionais, como os já citados, e dever-se-á bólica da prática cultural é ainda patente – e é-o em especial quando
em alguma medida ao período de referência do presente Inquérito observamos que a transmissão de hábitos culturais (através de visitas
coincidir com a pandemia e respetivas restrições de movimento, e atividades artísticas extracurriculares) durante a infância está muito
não obstante tal circunstância estar prevista e acautelada no próprio estreitamente associada aos capitais escolares familiares, que estão
questionário. Em todo o caso, o reduzido patamar global de ativi- também associados a combinatórias de práticas culturais variadas.
dades de lazer e práticas amadoras entre a população portuguesa faz Para além da associação entre capital escolar e prática cultu-
ressaltar contrastes entre diferentes grupos sociais. Fatores como ral, observa-se uma importante diferença entre as gerações acima e
idade, escolaridade (própria e familiar), classe socioprofissional e abaixo dos 45 anos, ou seja, nascidas e escolarizadas após a instaura-
conforto material operam uma diferenciação muito pronunciada. ção do regime democrático: entre os portugueses até aos 45 anos é
Os segmentos mais envelhecidos e menos escolarizados da popula- francamente mais comum a experiência de visita a equipamentos cul-
ção surgem em diversos indicadores excluídos da esfera cultural. Tal turais durante a infância e a adolescência. Mais importante do ponto
conclusão não é surpreendente em si mesma – pelo contrário, a desi- de vista do papel da escola é que, para uma parte significativa, essas
gualdade associada a essas variáveis é recorrentemente assinalada em visitas aconteceram exclusivamente através da escola. Nesse sentido,
inquéritos internacionais às práticas culturais (Coulangeon 2010). pode dizer-se que a escola tem contribuído, por via de um processo
Contudo, a magnitude dos contrastes agora apurados para o caso histórico longo, plurigeracional, para a chamada democratização do

306 307
Práticas Culturais dos Portugueses Participação artística e capitais culturais

acesso à cultura (Lopes 2007). Este é um aspeto com implicações Referências bibliográficas
políticas, na medida em que a articulação entre cidadania, educação
e cultura tem sido em diferentes países um eixo de fundamentação ACM – Arts Council Malta. 2017. Cultural Participation. Survey 2016. La Valletta:
ideológica dos regimes políticos democráticos, quer quanto aos pro- Arts Council Malta, The National Statistics Office e The Valletta 2018 Founda-
cessos históricos de massificação da escolaridade longa, quer quanto tion.
à fundamentação de políticas públicas sectorializadas no domínio da Bonet, Lluis, e Emmanuel Négrier. 2018. «The Participative Turn in Cultural Policy:
Paradigms, Models, Contexts.» Poetics, 66: 64-73.
cultura (Coulangeon 2021). No caso português, essa articulação tem
Bourdieu, Pierre. 1979. La Distinction: Critique Sociale du Jugement. Paris: Les Édi-
sido referência constante dos programas de governo, pelo menos ao tions de Minuit.
nível da retórica política. Coulangeon, Philippe. 2010. Sociologie des pratiques culturelles. Paris: La Décou-
Para além da escola, é de referir o papel desempenhado por insti- verte.
tuições culturais na formação de públicos, processo que nas últimas Coulangeon, Philippe. 2021. Culture de masse et société de classes: Le goût de l’alté-
décadas se manifestou por diferentes tendências: criação de servi- rité. Paris: PUF.
ços educativos (Gomes e Lourenço 2009); estratégias de desenvol- Donnat, Olivier. 1994. Les français face à la culture: De l’exclusion à l’éclectisme.
vimento de públicos (Kemp e Poole 2016); mais recentemente, a Paris: La Découverte.
Glow, Hilary, Anne Kershaw, e Matthew Reason. 2021. «Leading or Avoiding
aposta em projetos participativos envolvendo o público no trabalho
Change: The Problem of Audience Diversification for Arts Organisations».
de criação ou produção artística (Bonet e Négrier 2018). As visitas International Journal of Cultural Policy 27, n.º 1: 130-148.
a equipamentos culturais durante a infância e a adolescência aumen- Gomes, Rui Telmo. 2001. «Práticas culturais dos portugueses (I): actividades de
tam nas gerações mais recentes também através das redes familiares lazer». Folha OBS, 2.
e pessoais – em que se revela a influência persistente dos já referidos Gomes, Rui Telmo, e Vanda Lourenço. 2009. Democratização Cultural e Formação
capitais simbólicos. Vale a pena também referir aqui uma modali- de Públicos. Inquérito aos «Serviços Educativos» em Portugal. Lisboa: Observató-
dade específica de promoção cultural como a adesão às iniciativas rio das Actividades Culturais.
oferecidas pelas próprias instituições culturais; se entendermos estas Hanquinet, Laurie, Dave O’Brien, e Mark Taylor. 2019. «The Coming Crisis of
Cultural Engagement? Measurement, Methods, and the Nuances of Niche Acti-
iniciativas como parte das estratégias de formação de públicos da
vities». Cultural Trends, 28, n.º 2-3: 198-219.
cultura, os dados sugerem que o recrutamento de públicos decorre Jonchery, Anne, e Philippe Lombardo. 2020. Pratiques culturelles en temps de confi-
muito claramente nas franjas da população com capitais simbólicos nement. Département des études, de la prospective et des statistiques, Ministère
muito elevados à partida. Este é um dilema que se coloca e não ape- de la Culture. França: 2020.
nas às instituições culturais portuguesas (Glow, Kershaw e Reason Kemp, Elyria, e Sonja Martin Poole. 2016. «Arts Audiences: Establishing a Gateway
2021; Hanquinet, O’Brien e Taylor 2019; Walmsley 2019): aprofun- to Audience Development and Engagement». The Journal of Arts Management,
dar estratégias crescentemente sofisticadas de captação de públicos Law, and Society, 46, n.º 2: 53-62.
já predispostos pelos seus próprios capitais culturais ou apostar em Lahire, Bernard. 2004. La culture des individus: Dissonances culturelles et distinction
de soi. Paris: Éditions La Découverte.
processos de criação de públicos a partir de uma base social mais
Lombardo, Philippe, e Loup Wolff (2020). Cinquante ans de pratiques culturelles en
alargada. France. Département des études, de la prospective et des statistiques, Ministère
de la Culture. França: 2020.
Lopes, Guilhermina Calado, Edviges Coelho, José Soares Neves, Rui Telmo
Gomes, Heloísa Perista, e Maria das Dores Guerreiro. 2001. Inquérito à Ocu-
pação do Tempo 1999: Principais Resultados. Lisboa: Instituto Nacional de
Estatística.
Lopes, João Teixeira. 2007. Da Democratização à Democracia Cultural: Uma Refle-
xão sobre Políticas Culturais e Espaço Público. Porto: Profedições.

308 309
Práticas Culturais dos Portugueses

MCUD – Ministerio de Cultura y Deporte. 2019. Encuesta de Hábitos y Prácticas José Machado Pais
Culturales en España 2018-2019. Síntesis de Resultados. Madrid: Ministerio de
Cultura y Deporte, División de Estadística y Estudios, Secretaría General, Téc-
nica.
Peterson, Richard A. 1992. «Understanding Audience Segmentation: From Elite
and Mass to Omnivore and Univore.» Poetics, 21: 243-258.
Walmsley, Ben. 2019. Audience Engagement in the Performing Arts: A Critical Analy-
sis. Cham: Palgrave Macmillan/Springer.

Capítulo 8

Práticas culturais
e clivagens sociais1

Que tipo de conexões se podem estabelecer entre diferentes


práticas culturais e como se conjugam estas com o perfil sociográ-
fico de quem as realiza? Para responder a esta e a outras questões,
exploraram-se distintos perfis culturais e sociográficos, a partir de
um conjunto alargado de variáveis, segmentado em dois subcon-
juntos – um relativo a práticas culturais, outro reunindo variáveis
sociográficas – aos quais se aplicaram metodologias multivariadas,
direcionadas para uma análise hierárquica de clusters. Para efeitos
analíticos, as variáveis respeitantes às práticas culturais foram agre-
gadas em três áreas temáticas, o que não impediu a realização de
análises transversais a todas elas. A problematização destas áreas
foi suscitada por interrogações que apelam à reflexão e ao debate:
Internet, audiovisuais e práticas de leitura: a expansão de uma cultura
em domicílio? Espaços patrimoniais, cinema e espetáculos ao vivo: que
trânsitos encerra o ecletismo cultural? Participação cultural, formação
artística e socializações: óbvias convergências olvidadas? A estas inter-
rogações acrescentou-se mais uma, com o objetivo de problema-
tizar o futuro de um país cuja proporção de deserdados culturais é

1
Na aplicação das metodologias multivariadas, conducentes à análise de clusters
hierárquica, contei com o precioso apoio de Leonor Bacelar-Nicolau, Professora da
Universidade de Lisboa (Faculdade de Medicina, IMP&SP – Instituto de Medicina
Preventiva e Saúde Pública e ISAMB – Instituto de Saúde Ambiental) e da Univer-
sidade Nova de Lisboa (NOVA IMS Information Management School).

310 311
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

ainda significativa: Deserdados e mobilidade escolar intergeracional: Na a­ nálise de dados que neste capítulo se apresenta, o conceito de
que futuro? afinidade eletiva será usado como um recurso categorial de busca
De entre outras conclusões, os resultados analíticos sugerem e reconhecimento de associações não só entre as práticas culturais
que a cultura em domicílio, mais acentuada em contexto pandémico, arroladas, mas também entre estas e os perfis sociográficos de quem
não constituirá, necessariamente, uma ameaça às práticas culturais as desenvolve.
desenvolvidas em espaço público; o ecletismo cultural tanto poderá O que se busca, nessa teia de associações heterogéneas, não são
corresponder a uma reafirmação de distinção social por parte de determinações causais entre variáveis. O que se pesquisa são con-
algumas elites culturais como estar associado a trajetórias de mobi- junções entre perfis culturais e pertenças sociais, elos entre feixes
lidade social ascendente, ancoradas a socializações por antecipação; de práticas desencadeadas por diferentes sensibilidades culturais e
os inquiridos com formação ou atividade artística têm uma participa- distintas inscrições sociográficas. Para atingir este objetivo, recor-
ção cultural mais diversificada e intensa, uma óbvia associação que se reu-se a uma análise de clusters hierárquica. Neste tipo de análise
repercutirá, certamente, em áreas do conhecimento que, apelando à não se privilegiam os efeitos, isoladamente tomados, das variáveis
criatividade, beneficiam do diálogo com as artes; a mobilidade esco- sociográficas sobre as variáveis que respeitam às práticas culturais.
lar intergeracional tem um significativo impacto nas práticas cultu- O que se valoriza são as associações que se estabelecem entre todas
rais, ao permitir contornar a rigidez dos mecanismos de reprodução essas variáveis e que tendem a volatilizar-se em análises de estatística
social e cultural. Assim, por efeito do prolongamento das trajetórias bivariada. Para o efeito, selecionaram-se dois grupos de variáveis. O
escolares entre os mais jovens, em conjugação com outras dinâmi- primeiro grupo agrega as chamadas variáveis ativas, respeitantes às
cas sociais, é expectável que a participação cultural dos portugueses práticas culturais desenvolvidas nos últimos 12 meses anteriores ao
possa vir a ter, no futuro, uma evolução positiva. início da pandemia, com exceção das que se puderam desenvolver em
contexto pandémico, como ouvir rádio, ver televisão, ler livros ou
aceder à Internet (quadro 8.1).
Análise de clusters hierárquica e perfis sociográficos O segundo grupo reúne variáveis suplementares, de natureza
sociográfica: idade, sexo/género, região, habitat, situação conjugal,
As práticas culturais inscrevem-se em uma teia de associações grau de ensino do próprio, grau de ensino do pai, grau de ensino da
heterogéneas que nada têm de aleatório, pois o que as afasta ou mãe, situação profissional, classe socioprofissional, rendimentos e
aproxima são afinidades eletivas, nem sempre fáceis de decifrar. perceção da situação económica individual (quadro 8.2).
O conceito de afinidade eletiva surgiu entre alquimistas medievais Com vista a conhecer melhor cada uma das variáveis em estudo,
para explicar a atração ou afinidade recíproca entre elementos quí- aplicou-se uma análise univariada breve. De seguida, aplicaram-se
micos, ideia que inspirou Goethe ao abordar a química das paixões metodologias de estatística exploratória multivariada (Hair et al.
na novela cujo título (As Afinidades Eletivas) é testemunho dessa 1998) – análise fatorial de correspondências múltiplas e análise de
inspiração (Goethe 1978 [1809]). Posteriormente, Max Weber (2001 clusters – a cada um dos grupos de variáveis selecionadas. Mais pre-
[1905]) tomou o conceito de afinidade eletiva como um recurso para cisamente, aplicou-se uma análise de clusters – especificamente de
evitar explicações monocausais na interpretação das relações entre classificação hierárquica – aos fatores gerados pela análise fatorial de
a ética protestante e o ethos do capitalismo, embora o tivesse usado correspondências múltiplas, de modo a criarem-se classes de indi-
em outros diferentes contextos e sentidos (Löwy 2013, 77-96).2 víduos com perfis distintos.3 O método hierárquico baseia-se na

2
Bourdieu (1979, 267-268) também utilizou o conceito na sua obra La distinc- 3
Foram usados os softwares IBM-SPSS v26 (IBM Corp. Released 2019. IBM
tion. Critique sociale du jugement, mas de uma forma passageira, não aparecendo SPSS Statistics for Windows, Version 26.0. Armonk, NY: IBM Corp) e JMP Pro 15
sequer referenciado no índex do livro. (JMP®, Version 15. SAS Institute Inc., Cary, NC, 1989–2021).

312 313
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

Quadro 8.1 – Variáveis ativas (práticas culturais) e respetivas escalas Quadro 8.2 – Variáveis suplementares (sociográficas) e respetivas
de frequência categorias

* Entre parêntesis identificam-se as perguntas do questionário. Figura 8.1 – Dendrograma das cinco principais classes da partição de
sete clusters resultante da análise de clusters hierárquica
construção de uma matriz de semelhanças ou diferenças, possibili-
tando a representação dos clusters em forma gráfica, conhecida como
dendrograma. Da análise do dendrograma obtido (figura 8.1), bem
como de outros indicadores de qualidade, que aqui não são apre-
sentados, resultou a seleção de sete classes, das quais duas foram
desconsideradas por integrarem indivíduos outliers: uma classe tinha
apenas cinco indivíduos (0,3% em relação ao total dos inquiridos) e
outra apenas um (0,1%).4

4
De modo a verificar se as tendências observadas a nível descritivo poderiam
ser confirmadas com testes de hipóteses, aplicaram-se testes de qui-quadrado de
independência (ou testes exatos de Fisher, quando adequado e possível). Com-
plementarmente, foram aplicados testes de comparações múltiplas de proporções
emparelhadas, com uma correção de Bonferroni (ajustando o valor-p para o FWER
– family-wise error rate). Mais informações sobre estes testes podem ser consulta-
das em: https://www.ibm.com/docs/en/spss-statistics/26.0.0?topic=interface-cus-
tom-tables- test-statistics-tab.

314 315
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

Tomando por alvo de análise as cinco principais classes do den- consequentemente, a perceção da situação económica individual não
drograma selecionado, o que distingue cada uma delas são afinida- é tão negativa, embora cerca de uma quarta parte deles reconheça
des eletivas que aproximam os inquiridos que integram cada uma viver com algumas dificuldades. Diferenciando-se, também, por
dessas classes, quando se rastreiam as suas práticas culturais. Com um perfil mais urbano, a classe 1 distingue-se da 5 por registar uma
efeito, ao observar-se o dendrograma constata-se que as quatro pri- ligeira mobilidade intergeracional no que respeita aos capitais escola-
meiras classes entroncam num filão de origem comum, mas também res. Com efeito, embora mais de 80% dos progenitores (mães e pais)
sobressai uma nítida separação da classe 1, representando 32% da dos inquiridos da classe 1 não tenham concluído o 3.º ciclo, 32% dos
população inquirida, em relação às classes 2, 3 e 4, cada uma delas inquiridos desta classe concluíram esse grau de ensino e 26% termi-
representando, respetivamente, 21%, 13% e 5% do total dessa popu- naram o secundário. Apesar destas diferenças, é notória a proximi-
lação. No extremo oposto, visivelmente apartada, aparece a classe 5, dade do perfil sociográfico das classes 1 e 5, em ambas registando-se
representando 29% dos inquiridos. Na medida em que as diferentes uma preponderância de inquiridos de condição social inferior.
classes se distinguem por suas distintas afinidades eletivas, espera-se Em claro contraste, nas classes 3 e 4, especialmente nesta última,
que a análise das práticas culturais mais sobrerrepresentadas em cada é expressiva a sobrerrepresentação de inquiridos de condição social
uma das cinco classes permita tipificar a sua morfologia constitutiva, superior, desde logo refletida nos capitais escolares próprios (61%
ajudando também a decifrar o distanciamento da classe 5 em relação dos inquiridos da classe 4 atingiram o nível universitário) e nos
às demais. Antes, contudo, avance-se com a caracterização do perfil dos seus progenitores, embora não tão elevados. Com uma preva-
sociográfico de cada uma das cinco classes (tabela 8.1). lência das coortes etárias mais jovens, é também nas classes 3 e 4
Começando, precisamente, pela classe 5, constata-se que o seu que se registam as mais elevadas percentagens de empresários e
perfil sociográfico é caracterizado por uma expressiva s­ obrerrepre- comerciantes, de técnicos e especialistas (por exemplo, engenheiros
sentação de idosos. Com efeito, 87% dos inquiridos desta classe têm e arquitetos) e de profissionais socioculturais (por exemplo, profes-
55 ou mais anos, havendo 66% com mais de 65 anos. Não admira sores, jornalistas, artistas e assistentes sociais). Não admira que a
a concomitante prevalência de reformados e de viúvos ou viúvas. larga maioria dos inquiridos destas duas classes tenha uma perceção
Outro traço distintivo é a escassez de capitais escolares da larga positiva da sua situação económica individual, ao afirmar que vive
maioria dos inquiridos acolhidos nesta classe, pois 87% detêm um confortavelmente ou razoavelmente. As classes 3 e 4 registam ainda
grau de instrução inferior ao 3.º ciclo da escolaridade. Aliás, a carên- uma sobrerrepresentação de solteiros, mais expressiva na classe 4,
cia de capitais escolares estende-se aos progenitores, pois mais de onde também se destacam as uniões de facto.
90% – tanto mães quanto pais – também não concluíram o 3.º ciclo A proximidade dos perfis sociográficos destas duas classes não
de ensino básico. Nesta classe regista-se, ainda, uma sobrerrepre- apaga alguns traços distintivos. Para além dos já sinalizados, a classe
sentação de inquiridos do sexo feminino, residentes na região Norte 4 é a que averba a mais elevada percentagem de residentes em ­habitat
do país, em habitat rural, com profissões pouco qualificadas – uma urbano (53%), enquanto a classe 3 regista uma relativa paridade entre
prevalência de operários (53%) e de trabalhadores de serviços (29%) inquiridos que residem em habitat urbano (43%) e rural (41%). Por
– e compartilhando uma perceção negativa da situação económica outro lado, a classe 4 distingue-se das restantes por ser a que regista as
individual, pois metade deles reconhece viver com d ­ ificuldades. mais elevadas percentagens associadas a grandes empresários e pro-
De entre as classes em análise, a que apresenta um perfil socio- fissionais liberais; técnicos e especialistas (por exemplo, engenheiros,
gráfico mais próximo da classe 5 é a classe 1, embora os inquiridos arquitetos); e profissões socioculturais (por exemplo, professores,
nela mais representados não sejam tão idosos e, por isso mesmo, jornalistas, artistas, assistentes sociais). A classe 3, registando a
a situação profissional predominante seja a de trabalhador (60%), mais elevada percentagem (11%) de gestores públicos ou privados,
ainda que 14% se encontrem no desemprego. O status socioprofis- incluindo consultores e contabilistas, conquanto tenha uma signi-
sional dos inquiridos da classe 1 é ligeiramente mais favorecido e, ficativa sobrerrepresentação, menos a­ centuada do que na classe 4,

316 317
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

Tabela 8.1 – Perfis sociográficos das distintas classes (%)* de trabalhadores socioculturais
(23%) e de técnicos e especia-
listas (10%), acaba por também
dar acolhimento a empregados
de escritório (11%) e a inqui-
ridos que, estando sobrerre-
presentados nas classes 1 e 5,
não deixam de integrar a classe
3, contando com 12% de ope-
rários e 18% de trabalhadores
de serviços (empregados de
café ou restaurante, call centers,
auxiliares de ação educativa e
de enfermagem). Finalmente,
ainda que cerca de metade
(49%) dos inquiridos da classe
3 tenha alcançado o ensino
superior, os capitais escolares
dos seus progenitores são rela-
tivamente reduzidos, pois a
maioria deles (mães e pais) não
terminou sequer o 3.º ciclo da
escolaridade.
Quanto à classe 2, ela ocupa
uma posição intercalar entre
as classes 1 e 3. Aproxima-se
da classe 3 pelo predomínio de
jovens e de solteiros, mas tam-
bém pelo status socioprofissio-
nal e qualificações académicas,
ainda que mais reduzidas. Acer-
ca-se da classe 1 pelo semelhante
défice de capitais escolares dos
progenitores, embora menos
* As cores sinalizam a sobrerrepresentação percentual das categorias, decrescendo, sucessi-
acentuado. Em suma, as cinco classes do dendrograma distinguem-
vamente, do verde para o amarelo e o vermelho. Neste quadro, não se considerou a variável
objetiva dos rendimentos auferidos pelo agregado familiar, dado que 41% dos inquiridos do se por configurações sociográficas distintas, ressaltando uma proxi-
conjunto das 5 classes – mais sobrerrepresentados nas classes 2 (62%), 3 (64%) e 4 (61%) – midade entre as classes 3 e 4 e entre as classes 1 e 5, não obstante a
não responderam a esta questão ou disseram não saber.
(N=2000)
polarização destas últimas no dendrograma. A classe 2 oscila entra
a 1 e a 3. Assim sendo, tendo ficado por explicar, por razões socio-

318 319
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

gráficas, o distanciamento da classe 5 em relação às demais, o enigma dadas as oportunidades de criação, preservação, visibilidade e acesso
desse distanciamento adensou-se, conjeturando-se que os perfis cul- a bens e serviços culturais. Mas será que esta tão proclamada revo-
turais o possam esclarecer. Vejamos, então, como as configurações lução digital estará a promover uma democratização cultural e um
sociográficas se articulam com as variáveis ativas que definem os per- correlativo esbatimento das desigualdades sociais? A discussão desta
fis culturais das distintas classes. problemática é em Portugal prejudicada pela falta de inquéritos que
permitam identificar as variáveis dinâmicas que explicam as mudan-
ças nos hábitos culturais e os seus invólucros estruturais. Porém, a
Internet, audiovisuais e práticas de leitura: impossibilidade de espelhar o sincrónico no diacrónico não impede a
a expansão de uma cultura em domicílio? pesquisa das clivagens sociais nos usos das tecnologias digitais, nem
o cotejamento dos seus enquadramentos sociográficos. É o que se
Há uma década, Olivier Donnat (2011) antecipava um cenário fará de seguida, examinando-se, para além dos consumos culturais
cultural que a crise pandémica parece ter confirmado, conquanto o possibilitados pelas tecnologias digitais, outras práticas culturais que
que parece nem sempre corresponda à realidade. Referia-se Donnat integram a chamada cultura em domicílio: os consumos televisivos e
ao desenvolvimento de uma cultura em domicílio, sobretudo fomen- radiofónicos, bem como as práticas de leitura.
tada pelas tecnologias digitais. Esse cenário seria propício ao esba- Ao contrastar-se os usos da Internet nas cinco principais classes
timento de tradicionais barreiras de acesso à cultura, por efeito de da análise de clusters hierárquica (tabela 8.2), uma primeira obser-
uma oferta cultural mais diversificada e ao alcance de novos públi- vação merece relevo. Nenhum dos inquiridos da classe 5, represen-
cos. Este cenário parecer ter-se confirmado em França. Uma das tando 29% da população inquirida, usa a Internet. Em consequência,
­principais conclusões de um recente inquérito sobre as práticas cul- nesta classe regista-se uma completa ausência de atividades culturais
turais dos franceses em tempo de confinamento (Jonchery e Lom- mediadas pela Internet. Os livros também não fazem parte dos seus
bardo 2020) reconhece que a reorganização do tempo no espaço interesses culturais, pois 84% não leram qualquer livro nos últimos
doméstico incrementou o acesso aos bens e serviços culturais digi- 12 meses. Durante a sua infância e adolescência, também não terão
tais, tendo-se também intensificado outras formas de participação beneficiado de incentivos à leitura por parte dos pais ou de outros
cultural, como as atividades artísticas amadoras, o envolvimento nas familiares, pois apenas 5% tiveram o gosto de serem presenteados
redes sociais online, as visitas virtuais a espaços culturais e o acesso a com um livro. Nesta classe, a cultura em domicílio restringe-se aos
espetáculos através da Internet. Ou seja, ainda que o confinamento consumos televisivos e radiofónicos. Aliás, mesmo em relação à rádio,
tenha vedado, ou pelo menos restringido, a frequência de práticas a maioria (54%) não a ouve. Em contrapartida, a televisão é uma fiel
culturais em recintos ou espaços encerrados ao público (livrarias, companheira do dia a dia: 97% têm acesso diário à televisão, como
bibliotecas, museus, cinemas, teatros, entre outros), os consumos se ela fosse um elo de restabelecimento de vínculos sociais perdidos,
culturais incrementaram-se no espaço doméstico, graças às tecno- quiçá uma possibilidade de fuga à solidão. Compreende-se, final-
logias digitais, tendo-se também esbatido, segundo o mesmo inqué- mente, o distanciamento da classe 5 em relação às demais classes no
rito, algumas clivagens sociais e geracionais. dendrograma representadas (figura 8.1). Dela fazem parte os infoex-
Em Portugal, dados do Inquérito realizado comprovam que, em cluídos, os culturalmente deserdados que não conseguiram libertar-
contexto pandémico, também se intensificaram os usos da Inter- se dos seus destinos prováveis, preditos por suas origens sociais e
net no domínio cultural, sobretudo entre os jovens dos 15 aos 24 culturais. O seu perfil cultural, onde apenas a televisão parece impe-
anos. Passaram a ver mais filmes e séries; a ler mais livros, jornais rar nos seus consumos culturais domiciliados, está em consonância
e revistas online; e a ver mais espetáculos de música. Esta intensi- com o seu perfil sociográfico. Como vimos, são inquiridos com uma
ficação das práticas culturais reforça o que já é sabido. As tecno- destacada prevalência de idosos, reformados e viúvas. Os seus capi-
logias digitais transformaram o panorama do ecossistema cultural, tais escolares são exíguos, inscrevendo-se em engrenagens familiares

320 321
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

Tabela 8.2 – Internet, audiovisuais (televisão e rádio) e práticas de reprodução cultural, pois mais de 90% dos seus progenitores (pais
de leitura: consumos e perfis culturais e mães) também não possuíam níveis mínimos de escolaridade. Estes
das distintas classes (%) deserdados culturais, representando mais de um quarto da população
inquirida, constituem uma primeira evidência empírica da associa-
ção entre capitais escolares e
culturais.
O perfil cultural da
classe 1, representando 32%
da população inquirida, não
é muito distinto do da classe
5, embora exista uma impor-
tante diferença. A totalidade
dos inquiridos desta classe
tem acesso à Internet, ainda
que poucos a usem em ati-
vidades culturais. Apenas
30% a ela recorrem para
ouvir música. Porém, 75%
conectam-se diariamente
para atividades de lazer. Par-
cimoniosos em consumos
radiofónicos (apenas 39%
ouviram rádio) e leitura de
livros (pouco mais de 20%
leram livros), a maioria
(91%) vê diariamente tele-
visão. Que razões explicam
a proximidade das classes 1
e 5, quando se comparam os
respetivos consumos cultu-
rais, e como justificar a cliva-
gem nos usos da Internet, já
que ninguém da classe 5 tem
a ela acesso, enquanto todos
os da classe 1 se encontram
conectados? Justifica-se vol-
ver ao confronto dos perfis
sociográficos destas clas-
(N=2000) ses. Como se constatou, os

322 323
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

inquiridos da classe 1 são menos idosos do que os da classe 5, mais incluindo a leitura de livros; 75% deles usam-na para outras ativi-
urbanos e vivem com menos aperto económico. Existe outra dife- dades de lazer.
rença significativa. Enquanto a larga maioria dos inquiridos da classe A associação entre práticas de leitura e usos da Internet de pen-
5 (87%) tem um grau de instrução inferior ao 3.º ciclo, a classe 1 dor cultural ganha uma intensidade crescente da classe 2 para a 4.
acolhe 32% de inquiridos com o 3.º ciclo e 26% com o ensino secun- O que justifica esta progressão linear? Para além da idade, do status
dário, isto apesar de 80% de ambos os progenitores (pais e mães) socioprofissional e da perceção da situação económica individual, as
terem um grau de instrução inferior ao 3.º ciclo. Reforça-se, assim, variáveis relacionadas com capitais escolares têm um peso conside-
a evidência empírica atrás assinalada. Um incremento dos capitais rável. Com efeito, as classes que proporcionalmente mais inquiridos
escolares dos inquiridos em relação ao dos progenitores, ainda que acolhem com um nível de instrução superior são aquelas em que mais
pouco expressivo, não deixa de ter impacto nos consumos culturais. elevada é a percentagem dos que usaram a Internet para atividades
Entretanto, a análise do perfil de consumos culturais em domicí- culturais; mais livros leram em formato impresso ou digital; mais
lio permite debater uma tese cuja aparente robustez se transformou idas a feiras do livro realizaram; e mais frequentemente, durante a
num dogma do senso comum, ainda vigente. A referida tese sus- sua infância e adolescência, receberam livros oferecidos pelos pais
tenta que os jovens leem menos livros por estarem mais expostos à ou por outros familiares. O cume destas afinidades eletivas surge na
televisão. A análise de clusters realizada não lhe dá grande cobertura. classe 4, onde 76% dos inquiridos leram dois ou mais livros no der-
O que se constata é que as classes com inquiridos que mais livros radeiro ano, 21% dos quais leram sete ou mais. Nesta classe, a que
leem são precisamente as que têm uma prevalência de jovens e de dá mostras de uma maior envolvência com o universo das ­práticas
estudantes (classes 4, 3 e 2). Todavia, a larga maioria dos inquiridos culturais em análise, encontram-se ainda sobrerrepresentados os
­
destas classes vê diariamente televisão. É certo que a exposição à inquiridos que leram sete ou mais livros em formato digital (15%),
televisão é mais intensa nas classes 1 e 5, onde poucos livros se leem; que frequentaram feiras do livro (65%) e que, na sua infância e ado-
no entanto, nestas classes existe uma sobrerrepresentação de ido- lescência, receberam livros oferecidos por pais ou por outros familia-
sos e de inquiridos com reduzidas habilitações académicas. Aliás, res (94%). Este contacto precoce com os livros acaba por se traduzir
o Inquérito realizado mostra que entre os inquiridos com este na criação de hábitos de leitura. Ora, é precisamente na classe 4 que
perfil sociográfico a média do número de horas de visionamento se regista a mais elevada percentagem de inquiridos que atingiram o
diário da televisão é superior. Porém, as práticas de leitura não se ensino superior (61%), logo seguida da classe 3 (49%). É também na
correlacionam apenas com variáveis sociográficas, elas associam-se classe 4 que se averbam as mais elevadas percentagens de progenito-
a outras práticas culturais do mesmo feixe de afinidades eletivas. res com qualificações académicas superiores, seguindo-se a classe 3.
Constata-se, desde logo, uma forte associação entre práticas de lei- A classe 2, podendo considerar-se de transição entre a 1 e a 3, encerra
tura (número de livros lidos em formato impresso e digital) e usos características que lhe conferem uma relevância sociológica. Ela aco-
da Internet de pendor cultural: ver espetáculos (concertos, teatro, lhe inquiridos com mais elevada mobilidade escolar intergeracional,
etc.); visitar museus; ouvir música; ver, comprar ou descarregar também notória nas classes 3 e 4. Com efeito, havendo na classe 2
filmes/séries; partilhar conteúdos culturais na Internet (vídeos, um predomínio de inquiridos com progenitores cujo grau de ensino
música, etc.); e interagir online em temas relacionados com cultura. é inferior ao 3.º ciclo (65% tanto de pais como de mães), 35% dos
Estas afinidades eletivas não dão pleno suporte à tese que, na dis- inquiridos desta classe alcançaram o ensino superior e 38% o ensino
cussão do declínio do número de livros lidos pelos jovens, transfere secundário. Em claro contraste, esta mobilidade é praticamente ine-
a culpabilidade da televisão para a Internet. Tudo depende dos usos xistente na classe 5 e pouco expressiva na classe 1.
que se façam da Internet. Aliás, a conexão à Internet permite a lei- Dito isto, e voltando à questão inicialmente levantada, estare-
tura de livros em formato digital. Os inquiridos da classe 1, todos mos num cenário de expansão da cultura ao domicílio? Na reali-
eles, usam a Internet, mas quase nunca para atividades culturais, dade, em espaço doméstico, com recurso às tecnologias digitais, é

324 325
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

possível aceder a uma profusão de produtos culturais outrora ina- democratização do acesso à cultura e a própria democracia cultural
cessíveis. Aliás, durante o confinamento, por efeito da pandemia, serão facilitadas pela disponibilidade de uma oferta cultural acessível
a cultura em domicílio colmatou, ainda que muito parcialmente, o através das tecnologias digitais. É também possível que, em alguns
vazio criado pela impossibilidade de se frequentarem espetáculos ao segmentos da população, o acesso à Internet possa despertar consu-
vivo, bibliotecas, museus, galerias de arte, etc. Várias companhias de mos culturais mais ecléticos, contribuindo para uma diversificação e
teatro transformaram as redes sociais em palcos digitais, disponibili- intensidade das práticas culturais. Os usos da Internet no domínio
zando online diversos espetáculos. Aliás, Portugal foi um dos países cultural e, particularmente, a sua intensificação durante o período
europeus onde, durante o período de confinamento, mais se diver- pandémico sugerem que o cenário digital é já – e provavelmente
sificou a oferta cultural dos museus com recursos digitais (NEMO sê-lo-á ainda mais no futuro – um domínio com elevado potencial
2020, 13). Ou seja, se do lado da procura os inquiridos intensifi- de participação cultural. A Internet potencia um crescente acesso
caram o uso da Internet em atividades culturais, do lado da oferta a bens culturais que, na sua diversidade, alargam o campo de expe-
também houve um incremento de eventos culturais nas plataformas riências e sensibilidades, catalisando novos sentidos e descobertas
digitais. Será que estas tendências se acentuarão no futuro? Se assim no universo cultural. No entanto, este incremento da oferta cultural
acontecer assistiremos, possivelmente, a uma expansão da cultura mediada pela Internet não corresponde a um usufruto ao alcance de
domiciliária – expansão que, todavia, galgará as fronteiras do domi- todos, bem pelo contrário. A análise de clusters hierárquica sugere
cílio. Tenha-se em conta que apenas 16% dos inquiridos referem o que as clivagens sociais poderão manter-se ou acentuar-se por efeito
computador pessoal fixo como o equipamento de aceso à Internet das desigualdades no acesso às plataformas digitais, bem como por
­habitualmente mais usado. A maior parte dos inquiridos, com des- seus distintos usos ou apropriações. Tenha-se presente que a tota-
taque para os jovens, recorre ao smartphone, ao computador pessoal lidade dos inquiridos da classe 5, representando 29% da população
portátil e ao tablet, ou seja, a equipamentos que podem ser usados, inquirida, nem sequer usa a Internet. Por outro lado, se ela é usada,
ou não, em ambiente domiciliário (ver capítulo 2). Inicialmente praticamente em pleno, pela totalidade dos inquiridos das outras
amoldado ao planeamento das cidades, o conceito de smart mobility classes, constatou-se que na classe 1 raramente o seu acesso se foca-
tem abrangido outras formas de smart living. A chamada smart people liza em atividades culturais. É nas classes 2, 3 e 4 que o recurso às
prima pelo uso das tecnologias digitais nos mais variados contextos tecnologias digitais está mais direcionado para atividades culturais,
de vida – fora ou dentro de casa – numa lógica de conectividade que em particular entre os inquiridos das classes 3 e 4. E é precisamente
permite um acesso rápido a uma pluralidade de domínios, entre os nestas duas classes que se registam os mais entusiasmantes indicado-
quais a cultura. res de participação cultural mediada pelas tecnologias digitais: quer
Mais acentuada em contexto pandémico, a cultura em domicí- a partilha de conteúdos culturais (vídeos, música, imagens, outros),
lio não constituirá necessariamente uma ameaça às práticas culturais criados pelo próprio; quer a interação online em temas relacionados
desenvolvidas em espaço público. Num ecrã de computador ou de com cultura. Nesta ambiência cultural, as tecnologias digitais podem
televisão pode desfrutar-se de um espetáculo de ópera, de uma atua- suscitar conhecimentos de rede, estratégias de colaboração entre os
ção circense, de um concerto de rock ou de uma peça de teatro, mas artistas, experiências estéticas enriquecedoras, formas de produção
não é o mesmo do que assistir ao vivo a todos esses espetáculos. Por artística que apelam à experimentação tecnológica, novas formas de
isso é que os espetáculos ao vivo deixam de o ser quando subordina- avaliação e validação da arte. Em suma, podem fomentar a participa-
dos à transmissão. Como adiante se verá, os inquiridos mais afilia- ção cultural, sediada ou não em domicílio.
dos à cultura conjugam práticas culturais em domicílio e em espaço
público. Resta saber se o incremento da oferta cultural na Internet,
registado durante o período pandémico, terá continuidade e con-
tribuirá para um futuro reforço das práticas culturais. Em teoria, a

326 327
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

Espaços patrimoniais, cinema e espetáculos ao vivo: a frequência de museus, monumentos históricos, sítios arqueológi-
que trânsitos encerra o ecletismo cultural? cos e galerias de arte, bem como as idas ao cinema e a alguns espetá-
culos ao vivo – desde concertos de música clássica a festivais e festas
No estudo das práticas culturais tem havido um persistente apelo locais –, avança-se, de seguida, para a análise de clusters hierárquica
à teoria da «legitimidade cultural» desenvolvida por Pierre Bourdieu tentando desvendar em que medida e em que segmentos da popula-
(1979) – teoria que estabelece uma forte correlação entre origem ção inquirida emergirão, ou não, práticas culturais de natureza eclé-
social e gostos culturais, de tal forma que as práticas culturais apare- tica, geradas por afinidades eletivas abertas à diversidade. Que novas
ceriam fortemente segmentadas em função da hierarquização social formas de distinção cultural (Friedman et al. 2015) poderão estar a
dos inquiridos. Sem menosprezar este posicionamento teórico, não surgir? Em que teias culturais e sociográficas se desenvolverão pos-
é certo que exista um padrão exclusivo e excludente de consumos síveis novas identidades culturais? Que trânsitos de natureza estética
culturais rigidamente associado a heranças culturais (Chan 2010) ou ou social encerra o ecletismo social?
a princípios hierarquizantes da cultura (Santos 1998). Com efeito, O que mais ressalta da observação dos dados (tabela 8.3) é a ele-
fenómenos como o aumento da escolaridade ou a democratização vada proporção de inquiridos das classes 1 e 5 que, no conjunto dos
do acesso à cultura terão relativizado o poder explicativo que a estra- itens considerados, escapam ao duplo padrão de classificação pro-
tificação social outrora tinha na diferenciação dos consumos cultu- posto por Peterson (1992), opondo unívoros a omnívoros. Com
rais – o que não significa que tenha perdido relevância. Por outro efeito, a ampla maioria deles não se encaixa em qualquer dos padrões
lado, a hipótese da homologia entre estatutos sociais e gostos cul- pois, nos últimos 12 meses anteriores ao início da pandemia, abs-
turais (Bourdieu 1979; Donnat 1994, 2003; Fabiani 2007) enfrenta- tiveram-se de realizar qualquer uma das práticas culturais listadas.
-se com novas correntes socioculturais abertas ao ecletismo cultu- Distanciando-se um pouco desta tendência, uma pequena mino-
ral, ­sobretudo em contextos sociais cosmopolitas (Clevarec e Pinet ria – cerca de um em cada quatro dos inquiridos de ambas as clas-
2017; Hanquinet 2017). Tomo o conceito de ecletismo cultural por ses – mostra adesão aos festivais ou festas populares. No conjunto
referência a afinidades eletivas alargadas, eventualmente imprevistas, das práticas culturais até agora analisadas, os inquiridos da classe 5
ocorrendo em processos de transformação social nos quais práticas ­apenas se poderão considerar unívoros atendendo à sua teledepen-
culturais disjuntivas, outrora concretizadas separadamente por clas- dência diária; o mesmo se podendo dizer dos da classe 1, ressalvando
ses socialmente distintas, passam a ser realizadas em conjunção. os usos frequentes da Internet para atividades de lazer. Sabemos já
Na vaga destas novas correntes socioculturais, algumas pesquisas o perfil sociográfico destas duas classes. Elas acolhem os inquiridos
têm sugerido que da confluência de consumos culturais elitistas e que mais frequentemente vivem com dificuldades económicas. O
populares resulta uma possível superação das clivagens rígidas entre baixo nível de qualificações académicas também os desmobiliza de
uns e outros, como já acontece no domínio das artes (DiMaggio práticas culturais que pressupõem afinidades eletivas de natureza
1987; Stallabrass 2006). O reconhecimento do ecletismo cultural mais refinada ou elitista, como a frequência de museus, galerias de
ressurge ao contrapor-se à teoria da legitimidade cultural a teoria arte ou ­concertos de música clássica. Por outro lado, aliada às dificul-
do padrão omnívoro (Peterson 1992; Eijck 2000), com esta se admi- dades económicas, a avançada idade da maioria deles atravancará as
tindo que os status hierárquicos produzidos pela oposição entre cul- suas saídas culturais, mesmo para a frequência de espaços mais popu-
tura de elite e cultura de massas não invalidam a emergência de novas larizados, como os monumentos históricos, ou as idas ao circo ou ao
segmentações culturais como as que decorrem da oposição entre teatro, dependendo do género. Neste árido panorama cultural, men-
consumos omnívoros e unívoros – o que justificaria que, pelo menos ção aos cerca de 30% de inquiridos da classe 1 que foram ao cinema.
nos Estados Unidos da América, no domínio dos gostos musicais, os A situação é bem diferente nas restantes classes e é a partir da
inquiridos de mais elevados status social fossem mais omnívoros do análise do conjunto dos perfis culturais e sociográficos das diferen-
que snobs (Peterson e Kern 1996). Tomando-se por objeto de análise tes classes que se avança na discussão da problemática do ecletismo

328 329
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

Tabela 8.3 – Idas a espaços patrimoniais, cinema e espetáculos cultural. Para começar, a riqueza
ao vivo nos últimos 12 meses anteriores ao início e diversidade dos perfis culturais
da pandemia: perfis culturais das distintas classes (%) vai sucessivamente decaindo da
classe 4 para as classes 3 e 2, mais
abruptamente em relação às clas-
ses 1 e 5. Com efeito, é nas classes
3 e 4 que se regista uma prevalên-
cia de inquiridos mais orientados
por um padrão omnívoro, asso-
ciado à prevalência de práticas
culturais mais elitistas. Na classe
4 encontram-se os que mais
assiduamente assistiram a con-
certos de música clássica (38%
frequentaram-nos uma ou duas
vezes por ano; 17% três ou
mais vezes); os que que mais
visitaram museus (52% uma ou
duas vezes por ano; 38% três
ou mais vezes); galerias de arte
(50% uma ou duas vezes por
ano; 29% três ou mais vezes); e
monumentos históricos e sítios
arqueológicos (42% uma ou
duas vezes por ano; 52% três ou
mais vezes); e os que mais se des-
locaram ao teatro (mais de 80%
nos 12 meses ­ considerados).
Na classe 3, o envolvimento em
todas estas práticas culturais é
também eloquente, embora não
* Abreviatura da escala da frequência nas idas ao cinema: À semana (uma vez por semana ou
mais); Ao mês (uma ou várias vezes por mês, mas não todas as semanas); Ao ano (uma ou tão expressivo, principalmente
várias vezes por ano, mas não todos os meses). no que respeita às mais eruditas: apenas 12% dos inquiridos desta
(N=2000)
classe assistiram a concertos de música clássica, tendo 31% visitado
galerias de arte. Em contrapartida, nesta classe regista-se a mais ele-
vada percentagem de inquiridos que visitaram museus (63% uma ou
duas vezes por ano; 9% três ou mais vezes) e monumentos históri-
cos (70% uma ou duas vezes por ano; 11% três ou mais vezes). Os
inquiridos das classes 3 e 4 também se destacam por terem sido os

330 331
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

que mais frequentemente se deslocaram ao estrangeiro para visita- ­ estas duas classes, a condição geracional – com uma sobrerre-
N
rem qualquer um dos espaços patrimoniais considerados, incluindo presentação das coortes etárias mais jovens – entrecruza-se com a
galerias de arte. pertença social, aferida a partir do status socioprofissional. A coe-
A proximidade à chamada «cultura legítima» por parte da maioria xistência de uma cultura jovem, etariamente delimitada, e de uma
dos inquiridos que integram as classes 3 e 4 não os inibe de desen- cultura cultivada, assim designada por contemplar práticas e gostos
volverem práticas culturais popularizadas, daí resultando o padrão culturais eruditos, com mais ênfase na classe 4, parece favorecer o
omnívoro que singulariza os seus perfis culturais. Nos 12 meses ecletismo cultural. Porém, as afinidades eletivas que o caracterizam,
considerados, é nas classes 3 e 4 que se registam as mais elevadas assentam em aparentes dissonâncias. Como ­justificar que no mesmo
percentagens de idas ao cinema (84% na classe 3; 94% na classe 4); feixe de afinidades eletivas coexista o erudito e o popular?
de frequência de espetáculos de circo (18% na classe 3; 25% na classe Por outro lado, se outrora os estratos superiores tinham uma
4); de deslocações a concertos ao vivo (56% na classe 3; 88% na relação de exclusividade com a cultura erudita – e, nesse sentido,
classe 4); de idas a festivais ou festas locais (61% na classe 3; 77% eram unívoros –, o que explica os trânsitos do paradigma da distin-
na classe 4). Em contrapartida, na classe 2, intercalada entre a 1 e a ção social para o da omnivoridade? Três hipóteses interrogativas se
3, regista-se um declínio das práticas culturais em análise, embora os desfilam. Uma possível tentação, entre estratos superiores, de trans-
seus perfis culturais se aproximem bastante mais da classe 3 do que gressão das fronteiras entre géneros culturalmente estratificados,
da classe 1. Conquanto a larga maioria dos inquiridos da classe 2 se fenómeno outrora protagonizado por uma aristocracia boémia, ape-
encontre arredada dos concertos de música clássica e dos espetácu- gada aos bas-fonds da cultura popular (Pais 1985)? O surgimento de
los de teatro ou de circo, o certo é que 66% foram ao cinema; 43% novas sensibilidades estéticas associadas a processos de gentrificação
frequentaram museus; 50% monumentos históricos; 37% concer- das artes de cunho mais popular que passam a cativar a atenção de
tos ao vivo; e 46% festivais ou festas locais. Em suma, enquanto os quem delas se afastava por não conferirem distinção social (­Rosler
inquiridos maioritariamente representados nas classes 1 e 5 vivem 2017; Tunali 2021)? A acessibilidade a repertórios culturais mais
confinados a um universo muito restrito de práticas culturais, os ecléticos, por efeito de uma maior difusão da cultura popular, pro-
acolhidos nas classes 4 e 3 multiplicam as suas escolhas culturais, movida pelos mass media? Um fenómeno do «pós-modernismo em
concretizando uma maior propensão a consumos ecléticos. Os da estado de outlet» que desemboca numa «alta cultura descafeinada»
classe 2 tendem a aproximar-se da classe 3. (Santamaría 2019)?
A compreensão destas variações clarifica-se convocando as variá- Interrogações deste tipo corporizam hipóteses de investigação
veis sociográficas. As classes 3 e 4, com uma sobrerrepresentação de centradas na explicação dos trânsitos da «alta cultura» para a «cultura
inquiridos culturalmente mais engajados e afinidades eletivas mais popular». Sem contestar estas hipóteses e a pertinência do quadro
alargadas, são precisamente as classes em que se regista uma maior teórico que as sustenta, os dados da análise de clusters incitam a con-
proporção de indivíduos com qualificações académicas de nível templar uma outra hipótese, a que valoriza os trânsitos de s­ entido
superior e secundário. O grau de ensino atingido pelos seus proge- inverso, isto é, da «cultura popular» para a «alta cultura». Se esta
nitores é também mais elevado. Como já referido anteriormente, o vereda de pesquisa fizer sentido, o ecletismo poderá esconder dife-
predomínio de indivíduos com uma perceção positiva em relação à renças subtis cujo significado importa desvendar. Como bem sus-
situação económica individual associa-se ao status socioprofissional: tenta Hanquinet (2017), mais importante do que identificar padrões
na classe 4, aparecendo sobrerrepresentados os grandes empresá- omnívoros e dissonantes no universo das práticas culturais é o
rios e profissionais liberais; na classe 3, os gestores; em ambas, os entendimento do que pode significar a coexistência desses padrões,
pequenos empresários e comerciantes, os técnicos especialistas (por é a descoberta de como esses padrões emergem de tensões entre hie-
exemplo, engenheiros, arquitetos) e os profissionais socioculturais rarquias culturais existentes e emergentes, tanto a nível social como
(por exemplo, professores, jornalistas, artistas, ­assistentes sociais). individual. Tomando-se por referência os perfis culturais até agora

332 333
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

analisados, sobressaem, sobretudo nas classes 2 e 3, dissonâncias da cultura erudita ao encontro da cultura popular. Outra seguindo os
entre as afinidades eletivas associadas ao perfil cultural dos inquiri- trânsitos de sentido inverso, os que emergem de uma ambiência mais
dos nela sobrerrepresentados e a retaguarda das suas heranças cul- popular ao encontro da cultura erudita.
turais, sinalizadas pelos capitais escolares dos seus progenitores.
Essas dissonâncias culturais ressoam como dissonâncias intraindivi-
duais (Lahire 2002, 2004, 2008), parecendo associar-se a trânsitos de Participação cultural, formação artística e socializações:
mobilidade social. Tome-se como exemplo a classe 3. Se é certo que óbvias convergências olvidadas?
a maioria dos inquiridos nela acolhida detém elevadas qualificações
académicas – 49% atingiram o ensino superior e 32% o secundário, Avança-se agora para a análise dos perfis culturais das distintas
sendo que 17% ainda são estudantes –, os capitais escolares dos seus classes do dendrograma a partir de um conjunto de variáveis abran-
progenitores são relativamente reduzidos, a maioria deles (mães e gendo ações de voluntariado, participação em associações recreativas
pais) não terminou sequer o 3.º ciclo da escolaridade. e culturais, atividades artísticas amadoras (escrita; pintura/desenho/
Inscritos em trajetórias de mobilidade social ascendente, por gravura; fotografia/vídeo/cinema; música) e formação artística
efeito dos capitais escolares e culturais conquistados, não estranha extraescolar (oficinas e aulas/lições extracurriculares). Cotejam-se
que os inquiridos associados a este perfil mimetizem o padrão cul- também variáveis de aferição de socializações, de âmbito cultural,
tural das chamadas classes cultas. Por outro lado, havendo na classe durante o período da infância e da adolescência até aos 18 anos,
3 uma sobrerrepresentação de jovens, e sabendo-se que entre eles envolvendo deslocações a bibliotecas, exposições, museus, monu-
dominam processos de autonomização associados a uma mais livre mentos e a assistência a espetáculos de qualquer tipo, em diferentes
escolha do que consomem, os seus consumos culturais podem assim contextos de socialização. Estas socializações decorrem de visitas
interpretar-se como expressão de uma individualização dos gostos, culturais ora promovidas pela escola ou organizadas por associações
estudada pelas teorias da individualização (Foucault 1984; Giddens e organizações recreativas e culturais; ora realizadas em família ou
1991; Beck, Giddens e Lash 1994). Quanto aos inquiridos com afi- entre amigos (tabela 8.4).
nidades eletivas culturalmente mais eruditas, sobrerrepresentados na Em consonância com os dados já analisados, constata-se uma
classe 4, ainda que façam a apologia da diferença e da distinção, não se baixíssima participação cultural dos inquiridos que integram as clas-
inibem de frequentar festivais ou festas locais. Porém, a adesão a estes ses 1 e 5. Em ambas as classes, entre 94% e 99% não participaram
eventos culturais de cunho mais popular não significa o desapareci- em atividades de voluntariado, não se envolveram em associações
mento das hierarquias culturais. Afinidades eletivas aparentemente recreativas e culturais, nem desenvolveram qualquer atividade artís-
dissonantes escondem diferentes apropriações sociais e simbólicas tica amadora; entre 96% e 99% também não usufruíram de qualquer
da cultura. O ecletismo cultural tanto poderá corresponder a uma formação artística extraescolar. No que respeita às visitas cultu-
reafirmação de distinção social por parte de elites c­ulturalmente rais durante a infância e adolescência, os inquiridos da classe 1, em
­possidentes (Coulangeon 2004) quanto estar associado a trajetórias ­comparação com os da classe 5, beneficiaram mais dessas socializa-
de mobilidade social ascendente, ancoradas a processos de sociali- ções de âmbito cultural, mormente quando realizadas com o apoio da
zação por antecipação5 que, aliás, também ocorrem nas classes 2 e escola (61%). No polo oposto à classe 5, a classe 4 reúne, em todos
4. Por assim dizer, o ecletismo cultural tem duas faces como Janus, os itens considerados, os mais elevados índices de participação cul-
deus romano das transições. Uma olhando os trânsitos que partem tural. Mais de metade dos inquiridos desta classe tiveram formação
artística extraescolar, não admirando que uma boa parte deles tenha
desenvolvido atividades artísticas nos últimos 12 meses anteriores ao
5
O conceito de socialização por antecipação (anticipatory socialization), desen-
início da pandemia. A participação em associações recreativas e cul-
volvido por Robert Merton (1957, 225-386), refere-se à incorporação de hábitos
culturais característicos do grupo de referência que se pretende integrar. turais é também significativa (50%), podendo estar relacionada com

334 335
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

a elevada percentagem de inquiridos deste grupo (57%) que durante ficiou bastante mais de socializações de âmbito cultural promovidas
a sua infância ou adolescência se deslocaram a espaços culturais ou a pela escola (87%), família 64%) e amigos (55%). Estas saídas cultu-
espetáculos ao vivo sob os auspícios dessas coletividades. rais, na fase da infância e da adolescência, aproximam os inquiridos
Os contrastes entre as classes 1 e 5 atenuam-se quando o con- da classe 2 aos da classe 3. Aliás, o perfil cultural dos inquiridos das
fronto é feito com as demais classes. Nas vertentes de participação distintas classes é tanto mais fecundo quanto mais associado a socia-
cultural consideradas, o que mais ressalta é uma sintonia de inclusão lizações durante a infância e a adolescência – as quais se refletem
participativa nas classes 3 e 4, em contraste com uma sintonia de na participação cultural, nas atividades artísticas desenvolvidas e na
exclusão nas classes 1 e 5. Embora mais achegada à classe 1, a classe 2 formação artística extraescolar. Por sua vez, estas variáveis aparecem
afasta-se dela na participação em associações recreativas e culturais, fortemente associadas à frequência de quase todas as práticas cultu-
na formação artística extraescolar e em atividades artísticas relacio- rais arroladas na análise de clusters realizada, atingindo o apogeu na
nadas com fotografia, vídeo ou cinema. Além disso, a classe 2 bene- classe 4. São óbvias convergências. Mas como o óbvio cai frequente-
mente no esquecimento, valerá a pena uma brevíssima reflexão sobre
estas manifestas convergências.
Tabela 8.4 – Participação cultural, formação artística e socializações: É óbvio que a frequência das
perfis culturais das distintas classes (%)
práticas culturais desenvolvidas
depende dos capitais culturais
herdados. A família desempenha
um papel importante na sociali-
zação das crianças e adolescentes,
traduzível em hábitos culturais.
Quanto mais as famílias levam as
crianças a visitarem bibliotecas,
exposições, museus, monumentos
ou a assistirem a espetáculos de
qualquer tipo, mais elevada será a
possibilidade de essas saídas cul-
turais se repercutirem no futuro.
É também na família que, fre-
quentemente, ocorre a iniciação
à leitura, não apenas com a oferta
de livros, mas também com a lei-
tura de histórias e idas a feiras do
livro, bibliotecas e livrarias. Como
atrás se referiu (tabela 8.2), poucos
foram os inquiridos das classes 1 e
5 que, durante a infância e a ado-
lescência, beneficiaram da oferta de
livros (22%); muito poucos os da
(N=2000) classe 5 (5%). Em contrapartida, é

336 337
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

considerável a percentagem de inquiridos das outras classes que os nas redes sociais online, quer com a partilha de conteúdos culturais
receberam, numa evolução crescente da classe 2 (60%) para a classe 3 (vídeos, música, etc.) de criação própria, quer através de interações
(78%) e a classe 4 (94%). Por coincidência, que não é fruto do acaso, online em temas relacionados com cultura. Estes capitais sociabilísti-
há uma clara associação entre os livros recebidos durante a infância cos, desenvolvidos no âmbito de redes sociais online ou presenciais,
e a adolescência, os hábitos de leitura posteriormente expandidos são importantes na formação dos gostos e hábitos culturais. Gerando
– aferidos pelo número de livros lidos nos últimos 12 meses – e os afinidades eletivas, convertem-se em valiosos capitais culturais.
graus de instrução atingidos. Assim sendo, o apego à leitura (Singly O capital cultural, na aceção de Bourdieu, tem sito conceptual-
1993, 194) e a outras práticas culturais é frequentemente corolário mente tomado como um capital fixo, de natureza patrimonial, sus-
destas socializações familiares. cetível de ser transmitido ou herdado. Estudos mais recentes têm
A escola, como obviamente seria de esperar, desempenha um debatido os limites e alcances do conceito (Bennett e Silva 2011),
papel relevante na criação de hábitos culturais. Aliás, é a instituição enquanto outros têm convocado o conceito de capital cultural emer-
mais envolvida na organização de visitas de âmbito cultural. Prova- gente para dar conta de novas formas de participação cultural sob
velmente deveria investir-se ainda mais nestas ações educativas, tão o signo de um capital flutuante (Hanquinet, Roose e Savage 2014;
do agrado dos estudantes (Pais 1999, 33). A escola é também, ou Hanquinet e Savage 2016; Prieur, Skjøtt-Larsen e Rosenlund 2008;
deveria sê-lo, um espaço propício ao desenvolvimento do gosto pela Roose 2015). Ainda que não desvalorizem de todo a correlação entre
leitura. Políticas culturais de incentivo à leitura constituem um pre- participação cultural e capitais herdados ou adquiridos, nomeada-
cioso investimento que se repercute em outros domínios culturais. mente através dos circuitos de escolarização formal, esses estudos
As práticas de leitura aparecem fortemente associadas ao conjunto colocam em relevo novas formas de distinção cultural particular-
de práticas culturais arroladas. Através de mediações, representa- mente proeminentes entre os jovens (Clevarec e Pinet 2017). É pre-
ções, figurações simbólicas e encantamentos, a leitura constitui um cisamente nas classes 3 e 4 – onde se regista uma preponderância
­exercício de exotopia, um elo de inserção cultural. Se, como dizia de jovens – que maior propensão existe à aquisição desses capitais,
Jorge Luis Borges, «somos o que lemos», só lendo se aprende a saber através do desenvolvimento de atividades artísticas amadoras e de
o que somos e a reconhecer o mundo de que fazemos parte. Essa ações de formação artística aparentemente espontânea, à margem
inserção cultural, particularmente notória entre os inquiridos das dos circuitos formais de ensino. Como se viu, é também nestas clas-
classes 3 e 4, inscreve-se também em círculos de sociabilidade gera- ses que se identifica uma maior inclinação para consumos e práti-
dos por saídas culturais frequentemente combinadas com familiares cas culturais de natureza eclética. A este capital cultural emergente
e amigos.6 Dados do Inquérito realizado mostram que as escolhas estão associadas novas estratégias de distinção cultural que passam
de leitura, as visitas culturais ou mesmo a eleição de filmes a ver no por uma ampliação dos critérios estéticos de valorização da cultura,
cinema não são insensíveis a recomendações de familiares, amigos assente em novas tendências, estilos e manifestações artísticas, em
e colegas de trabalho ou a comentários de amigos nas redes sociais cenários cosmopolitas, de entrecruzamentos culturais. Tudo isto
online. Aliás, o convívio com outras pessoas é uma das razões invo- leva a robustecer a ideia de que a cultura não é apenas boa para pen-
cadas para se ir ao cinema e a espetáculos ao vivo. Uma das razões sar ou consumir, é um universo aberto à participação, incluindo a
alegadas para a prática artística amadora é também a possibilidade de produção artística amadora, frequentemente expressão de culturas
compartilhar as criações artísticas com familiares e amigos. Como subalternizadas.
atrás foi referido, esta dimensão sociabilística também se desenvolve Nesta aceção de participação, em que a cultura passa a ser um
objeto de partilha, sobretudo nas redes sociais online, os consu-
midores transformam-se em produtores. Os chamados prossumi-
6
A vinculação da cultura às tramas da sociabilidade tem sido identificada na
dores beneficiam das oportunidades das tecnologias digitais não
sociologia da cultura. Veja-se, por exemplo, DiMaggio (1987, 444) e Lopes (2007,
187). apenas para terem acesso a conteúdos culturais mas também para

338 339
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

­ ifundirem a sua produção artística e exercerem direitos de cidadania


d res.7 Com efeito, embora 34% deles não tenham concluído o 3.º ciclo
cultural. Neste cenário, as práticas culturais deixam de se inscrever do ensino, 32% alcançaram-no, 26% atingiram o secundário e 8% o
meramente no domínio da receção cultural, para passarem a con- superior. Em contrapartida, 87% dos inquiridos da classe 5 possuem
jugar receção com criatividade artística. A análise ensaiada mostra um grau de instrução inferior ao 3.º ciclo. Tenha-se em conta que,
uma óbvia correlação entre participação cultural, formação artís- na classe 5, o predomínio de idosos é mais avassalador (86% com 55
tica e socializações de âmbito cultural geradas em vários contextos anos ou mais) e, por conseguinte, muitos dos inquiridos que a ela
sociais: na escola, na família, em associações ou coletividades cul- pertencem não beneficiaram do processo de restruturação do ensino
turais e entre amigos. Por outro lado, nas classes do dendrograma que se esboçou em inícios da década de 1970, com a reforma educa-
analisadas, quanto mais representada está a categoria de profissionais tiva de Veiga Simão, vindo a consolidar-se no pós-25 de Abril.
socioculturais – a que, justamente, acolhe artistas e outras profissões A democratização do ensino, protagonizada por amplas camadas
com vocação cultural, como professores e jornalistas – maior é o de jovens crescentemente escolarizados, mormente a nível universi-
envolvimento em práticas culturais. Vimos ainda que os inquiridos tário, teve inegáveis efeitos socioculturais. Uma parte dos inquiridos
mais envolvidos em atividades artísticas, com franco predomínio nas nascidos depois do 25 de Abril, sobrerrepresentados nas classes 2,
classes 4 e 3, aparecem alinhados com os que apresentam um perfil 3 e 4, beneficiaram dessas reformas educativas. A classe 4 é a que
culturalmente mais eclético. Perante estas óbvias convergências, não regista a mais elevada percentagem de inquiridos que atingiram o
pode deixar de se sublinhar a importância do fomento da sensibili- ensino superior, idem em relação aos progenitores. A expectável cor-
dade estética e artística no quadro das políticas educativas (Martins relação entre as duas variáveis – inquiridos cujos pais alcançaram o
2017, 28). A formação artística faz parte da educação e esta acaba ensino superior tendem a alcançá-lo também – poderá explicar, par-
beneficiada em muitas áreas quando em diálogo com as artes. cialmente, a relativa linearidade do crescimento percentual de ambas
as variáveis da classe 1 para a classe 4 (tabela 8.1). No caso do grau de
ensino dos inquiridos, a percentagem dos que atingiram o nível uni-
Deserdados e mobilidade escolar intergeracional: versitário evolui de 8% (na classe 1) para 35% (classe 2), 49% (classe
que futuro? 3) e 61% (classe 4), evolução proporcional à dos progenitores com
o mesmo grau de ensino nessa fileira de classes. Mas esse não será o
A análise de clusters confirma que as afinidades eletivas entre dado mais relevante, quando se confrontam as habilitações escola-
as práticas culturais arroladas se associam ao perfil sociográfico de res dos inquiridos com as dos progenitores. A revelação porventura
quem as realiza, sendo mais ecléticas e intensas, por ordem crescente, mais instigante é a descoberta de brechas emancipatórias, proporcio-
nas classes 2, 3 e 4 e praticamente ausentes, salvo raras exceções, nas nadas por trajetórias de mobilidade escolar intergeracional que, ao
classes 1 e 5. É nestas duas classes – com uma sobrerrepresentação quebrarem a rigidez das cadeias de reprodução cultural, possibilitam
de idosos, profissões mal remuneradas, uma perceção pessimista da a emancipação de uma parte dos culturalmente deserdados, condição
situação económica individual e níveis de instrução baixos, do pró- social sinalizada pelos reduzidos capitais escolares dos seus progeni-
prio e dos progenitores – que mais assomam os deserdados culturais, tores. Isso mesmo se regista em todas as classes em análise, exceto
isto é, inquiridos culturalmente pouco ou nada engajados e cujos
progenitores, em larga maioria, não conseguiram sequer atingir o 3.º 7
O conceito de geração não é aqui tomado no sentido de geração social, nem
ciclo da escolaridade. Estão nesta situação mais de 80% das mães e sequer demográfico. Sabe-se a idade dos inquiridos, mas desconhece-se a dos seus
pais dos inquiridos da classe 1 e mais de 90% dos da classe 5 (tabela progenitores. No entanto, atendendo a que a média de idade dos inquiridos é infe-
8.1). Todavia, na classe 1, por comparação com a classe 5, regista-se rior à dos seus progenitores (mães e pais), é legítima a prospeção da mobilidade
escolar intergeracional, ainda que não se possam datar os seus marcos cronológicos.
uma ligeira mobilidade escolar intergeracional, ao confrontar-se o
Para um aprofundamento da problemática das gerações e das práticas culturais, ver
grau de ensino da geração dos inquiridos com a dos seus predecesso- Lapointe, Pronovost e Lemieux (2017).

340 341
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

na classe 5. Salvo esta exceção, em todas as outras classes a percenta- Tabela 8.5 – Algumas práticas culturais, segundo a mobilidade
gem de inquiridos que alcançaram o ensino superior é francamente escolar intergeracional dos inquiridos com 25 anos
superior à que se regista entre os progenitores. O diferencial é um ou mais (%)*
indicador da mobilidade escolar intergeracional.
Estas brechas de emancipação, possibilitadas pela mobilidade
escolar intergeracional, produzem efeitos sobre a participação cultu-
ral pois, como se constatou na análise de clusters, as práticas culturais
são mais ecléticas e intensivas nas classes que registam uma sobrer-
representação de inquiridos com nível de instrução mais elevado e,
em associação, inserções profissionais socialmente mais valorizadas
e economicamente mais compensatórias. A evidência empírica sai
reforçada ao analisar-se a frequência de algumas práticas culturais,
tomando-se agora por universo de análise a totalidade dos inquiri-
dos com 25 anos ou mais,8 segundo o nível de ensino mais elevado
atingido pelo pai ou a mãe (tabela 8.5). As estruturas de reprodução
cultural não desapareceram.
Elas são comprovadas pela existência de elos educacionais de
natureza endoclassista que se estabelecem quer entre inquiridos de
instrução elevada cujos progenitores possuem, igualmente, um ele-
vado nível de instrução; quer entre inquiridos e progenitores em que
ambos possuem um baixo nível de instrução. Num como noutro
caso, a reprodução dos capitais escolares tem claros efeitos sobre * Pai/Mãe inf. significa que o grau de ensino mais elevado atingido pelo pai ou a mãe cor-
responde ao 3.º ciclo completado ou frequentado, ou menos; Pai/Mãe méd. corresponde ao
as práticas culturais. Assim, inquiridos que tenham atingido o grau
secundário; Pai/Mãe sup. corresponde ao superior. O período de referência das práticas cultu-
de ensino superior e cujos progenitores, ou pelo menos um deles, rais corresponde aos 12 meses anteriores ao início da pandemia, com exceção da visualização
tenham alcançado o mesmo grau de ensino, destacam-se pelas suas de espetáculos pela Internet e da leitura de livros, atividades desenvolvidas nos 12 meses ante-
riores à data da realização da entrevista.
performances culturais, sobretudo as mais eruditas. Por exemplo, (N=2000)
34% deles assistiram a concertos de música clássica; 51% foram
ao teatro; 68% visitaram museus. Por outro lado, na totalidade das
­práticas culturais selecionadas, não há nenhum inquirido com grau grau de ensino superior, independentemente do grau de instrução
de ensino inferior cujos progenitores, ou pelo menos um deles, dete- dos seus progenitores, têm sistematicamente uma participação cul-
nham o nível superior de ensino. tural mais intensa do que a dos inquiridos com escolaridade média
Contudo, como atrás se sugeria, as estruturas de reprodução cul- ou inferior. Ou seja, a mobilidade escolar intergeracional torna
tural não impedem a existência de brechas de emancipação possibili- ­possível a existência de fraturas na cadeia de reprodução cultural.
tadas pela mobilidade escolar intergeracional. Com efeito, em todas Esta conclusão pode ser ilustrada analisando as práticas culturais dos
as práticas culturais consideradas, inquiridos que tenham atingido o inquiridos que alcançaram o nível de ensino superior, não obstante
nenhum dos seus progenitores ter ultrapassado o 3.º ciclo de escola-
ridade. Com efeito, este défice não impediu que 14% dos inquiridos
8
A inclusão, na tabela 8.5 dos inquiridos com menos de 25 anos distorceria as
correlações estatísticas em análise, pois uma parte deles poderia ainda não ter con-
nesta situação tivessem assistido a concertos de música clássica, 33%
cluído o ensino secundário ou universitário, por efeito da sua idade. tivessem ido ao teatro, 49% a feiras do livro, 54% a museus, 64% ao

342 343
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

cinema, 44% a festivais ou festas locais, 41% a concertos de música Em relação aos principais eixos problemáticos pesquisados, a
ao vivo, 37% tivessem assistido a espetáculos pela Internet e, last hipótese de uma possível expansão da cultura em domicílio, estimu-
but not the least, 70% tivessem lido livros (tabela 8.5). Apesar dos lada pelas tecnologias digitais, não foi inequivocamente confirmada.
reduzidos capitais escolares dos seus pais, estes inquiridos conse- É certo que, em contexto pandémico, os consumos culturais através
guiram alcançar um grau de ensino superior. A mobilidade escolar da Internet se intensificaram mas, em rigor, não se pode afirmar que
intergeracional que protagonizaram reflete-se nas suas práticas cul- esse incremento, mesmo que no futuro recrudesça, culminará, neces-
turais, sendo ao mesmo tempo reflexo da democratização do sistema sariamente, numa expansão da cultura em domicílio. Embora as tec-
de ensino. Se esta tendência persistir é expectável que a participação nologias digitais permitam aceder a uma profusão de bens culturais
cultural dos portugueses se valorize num futuro próximo. Tenha-se outrora inacessíveis, os inquiridos culturalmente mais comprometi-
em conta que a larga maioria dos inquiridos (58%) não ultrapassou dos – principalmente os das classes 3 e 4 – conjugam práticas cultu-
o 3.º ciclo da escolaridade obrigatória, 38% dos quais nem sequer o rais em domicílio e em espaço público. Por outro lado, apenas 16%
atingiram. Com o alongamento das trajetórias escolares, a hierarquia dos inquiridos com acesso à Internet usam habitualmente o compu-
dos capitais culturais herdados é desestabilizada por efeito dos capi- tador fixo para se conectarem (ver capítulo 2), o que significa que a
tais escolares adquiridos. As filiações culturais e correspondentes hipotética intensificação dos consumos culturais através da Internet
afinidades eletivas associam-se numa lógica combinatória de sociali- poderá não ficar necessariamente confinada ao espaço domiciliário.
zações compósitas que ao longo da vida vão germinando na família, Quanto à possibilidade de a proclamada revolução digital promover,
na escola, em coletividades culturais, em redes de sociabilidade. Nes- por si só, uma democratização cultural e um correlativo esbatimento
tas trajetórias de vida confluem aprendizagens e experiências, redefi- das desigualdades sociais, é uma hipótese a considerar, mas que fica
nem-se gostos e práticas culturais, redesenha-se o futuro do país e o por confirmar. Tenha-se em conta que nenhum dos inquiridos da
lugar que nele a cultura pode ter. classe 5, representando 29% da população inquirida, tem sequer
acesso à Internet. Por outro lado, se na classe 1, representando 32%
dos inquiridos, todos têm acesso à Internet, nenhum a usa para
Síntese conclusiva ­atividades culturais, das quais, na realidade (offline), vivem aparta-
dos, pois apenas uma minoria vai de vez em quando ao cinema ou a
O que distingue cada uma das cinco classes do dendrograma festivais e festas locais. Por esta razão, os usos da Internet são consi-
analisadas são afinidades eletivas que aproximam os inquiridos mais derados preditores fiáveis das práticas culturais (Lapointe e Lemieux
sobrerrepresentados em cada uma delas. A morfologia dessas classes 2013). Assim sendo, não é presumível que um aumento da oferta cul-
assenta num tripé formado por distintos tipos de capital – econó- tural através da Internet, por si só, mude, de forma imediata, as práti-
mico, social e cultural – identificados por Mike Savage (2015) no cas culturais desta expressiva maioria da população inquirida (61%),
Great British Class Survey sobre mobilidade e desigualdades sociais. podendo, contudo, diversificar e intensificar os hábitos culturais de
No ensaio analítico realizado, o capital económico associa-se ao sta- quem já os tem.
tus socioprofissional e à perceção da situação económica individual; Quanto ao afluxo omnívoro, nutrificando um ecletismo cultural,
o capital social é identificado por redes de conhecimento, atividades constata-se que essa tendência assoma sobretudo nas classes 3 e 4, ou
de voluntariado, participação em associações recreativas ou cultu- seja, nas que têm uma sobrerrepresentação de inquiridos de elevado
rais e inserções sociais online e offline; o capital cultural, herdado ou status socioprofissional, com uma perceção positiva da sua situação
conquistado, aparece associado a socializações de âmbito cultural na económica individual, detentores de qualificações académicas eleva-
infância e na adolescência, a trajetórias escolares, a ações de forma- das, além de uma prevalência de jovens, de estudantes e de solteiros.
ção artística, a atividades artísticas e a conexões envolvendo a parti- O omnivorismo tem sido analisado como um perfil cultural decor-
lha de conteúdos culturais, na Internet, de criação própria. rente de segmentações classistas, em cuja matriz as classes ou estratos

344 345
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

sociais mais elevados evidenciam uma maior propensão a consumos engajados com as práticas culturais arroladas na análise de clusters
culturais omnívoros. No entanto, pouca atenção tem sido dada às estão alinhados com os que usufruíram de formação artística, que
clivagens de natureza geracional. O envolvimento das gerações mais desenvolveram práticas artísticas amadoras e que durante a infância e
jovens em mais amplas redes sociais propicia uma maior abertura à a adolescência beneficiaram de socializações de âmbito cultural gera-
diversidade cultural, desde logo por estarem mais conectados com o das na escola, na família, em associações ou coletividades culturais e
mundo, dado o seu mais intenso uso das tecnologias de informação entre amigos. Há também uma clara associação entre os livros rece-
e comunicação. O ensaio analítico realizado sugere que as práticas bidos durante a infância, os graus de ensino atingidos e a variedade e
culturais aparecem associadas a diferentes temporalidades biográficas intensidade de práticas culturais realizadas. As idas a espaços cultu-
e sociais, variando segundo os diferentes ciclos de vida, etariamente rais e a espetáculos ao vivo, combinadas com amigos durante a infân-
demarcados. Nas classes que registam uma sobrerrepresentação de cia e a adolescência, sugerem que a formação de capitais culturais e
jovens (classes 2, 3 e 4), o omnivorismo não é apenas de natureza sociais se gera não apenas na família e na escola, ampliando-se a con-
consumista. A participação cultural e artística é um traço de distinti- textos informais de sociabilidade, incluindo redes sociais mediadas
vidade dos inquiridos nelas representados. A democratização da cul- pela Internet, domínio de acesso a conteúdos culturais e de partilha
tura beneficiou do processo de democratização do acesso ao ensino. de criações artísticas, de autoria própria. Neste cenário de conver-
Embora a heterogeneidade da população universitária possa ter aba- gência de indicadores de participação artística e de participação cul-
lado o enlevo de algumas práticas culturais elitistas, estas terão tam- tural (em lato sensu) – onde também se destaca a participação em
bém começado a atrair inquiridos em trajetórias de mobilidade social ações de voluntariado – admite-se que as afinidades eletivas resul-
ascendente. Estes trânsitos sociais entrecruzam-se com trânsitos de tantes dessa conjunção possam projetar-se num modelo de ecologia
sensibilidade estética. Neste sentido, o ecletismo cultural, expresso cultural, onde a própria cultura gera não apenas oportunidades de
no alargamento das afinidades eletivas, esconde diferenças subtis: por profissionalização (Kreidler e Trounstine 2005), mas também meios
um lado, poderá corresponder a estratégias de distinção social por de intervenção cultural em prol de uma sociedade socialmente mais
parte de elites culturalmente possidentes que, sem traírem as suas integrada. O próprio alinhamento das práticas artísticas com ações
afinidades eletivas de natureza erudita, estão a fim de outras experiên- de voluntariado e a partilha de conteúdos culturais na Internet, numa
cias culturais, marcadas pela diversidade; por outro lado, o ecletismo lógica colaborativa, sugere que a vitalidade cultural passa também
cultural pode também estar associado a trajetórias de mobilidade por ações comunitárias norteadas por valores de solidariedade, inter-
social ascendente, ancoradas a processos de socialização por anteci- câmbio e bem-estar social (Hawkes 2001).
pação, particularmente evidentes quando os horizontes culturais se L’amour de l’art, expressão que tomo de Bourdieu e Darbel
ampliam por efeito da escolarização e consequente inserção em redes (1996), que assim intitularam uma obra marcante no domínio da
de relacionamento mais alargadas. Por isso se sustentou que o ecle- sociologia da cultura, não é um afeto alheio aos capitais culturais
tismo cultural tem, como Janus, duas faces: uma olhando os trânsitos herdados, em grande parte gerados e acumulados no seio familiar.
da cultura erudita ao encontro da cultura popular, outra seguindo os Os resultados do Inquérito realizado corroboram essa ideia. Porém,
trânsitos de sentido inverso. Se observarmos atentamente as mira- também vimos que apesar de as práticas culturais continuarem asso-
das das duas faces de Janus, chegaremos provavelmente à conclusão ciadas aos capitais herdados, a rigidez das cadeias de reprodução
de que não interessa apenas pesquisar as variáveis que determinam cultural pode fraturar-se num cenário de mobilidade escolar inter-
distintas práticas culturais, importa também descobrir o papel que geracional, sinalizada pelo diferencial entre o grau de instrução dos
a cultura tem na (re)construção das identidades e trajetórias de vida inquiridos e o dos seus progenitores. Com efeito, os inquiridos que
das pessoas e no delineio de possíveis novos rumos societais. atingiram o grau de ensino superior, não obstante os seus progenito-
Os dados analisados evidenciam óbvias convergências que nem res possuírem, no máximo, o 3.º ciclo de escolaridade, têm práticas
sempre têm sido valorizadas. Os inquiridos culturalmente mais culturais mais ecléticas do que os inquiridos que alcançaram apenas o

346 347
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

ensino secundário ou o 3.º ciclo da escolaridade, independentemente Referências bibliográficas


dos graus de instrução dos seus progenitores. A identificação de uma
mobilidade escolar intergeracional nas classes do dendrograma cul-
Beck, Ulrich, Anthony Giddens, e Scott Lash. 1994. Reflexive Modernization: Poli-
turalmente mais engajadas sustenta a possibilidade de estas classes tics, Tradition and Aesthetics in the Modern Social Order. Cambridge: Polity Press.
acolherem indivíduos em trajetórias de mobilidade social ascensional Bennett, Tony, e Elizabeth Silva. 2011. «Cultural Capital: Histories, Limits, Pros-
que os leva à descoberta de novas afinidades e afiliações culturais, pects». Poetics, 39, n.º 6: 427-443.
sem perderem as da matriz cultural de origem. Tenha-se em conta Bourdieu, Pierre. 1979. La distinction: critique sociale du jugement. Paris: Les Édi-
que nas classes do dendrograma culturalmente mais ecléticas se tions de Minuit.
regista uma sobrerrepresentação de jovens e de estudantes, cujas tra- Bourdieu, Pierre, e Alain Darbel. 1966. L’amour de l’art: Les musées et leur public.
jetórias escolares – bem mais longas do que as dos seus progenitores Paris: Les Éditions de Minuit.
Chan, Tak Wing. 2010. Social Status and Cultural Consumption. Cambridge: Cam-
– possibilitam uma maior exposição a diferentes contextos sociais
bridge University Press.
e um maior envolvimento em círculos de sociabilidade. Em ambos Clevarec, Hervé, e Michel Pinet. 2017. «Is Cultural Eclecticism Axiological and a
os casos, criam-se oportunidades para o alargamento dos horizontes New Mark of Distinction? Cultural Diversification and Social Differentiation of
culturais e do feixe de afinidades eletivas de âmbito cultural. Tastes in France». Cultural Sociology, 11, n.º 2: 188-216.
A democratização de práticas culturais mais eruditas, relativa- Coulangeon, Philippe. 2004. «Classes sociales, pratiques culturelles et styles de vie:
mente condicionadas pelas origens sociais, aparece assim associada le modèle de la distinction est-il (vraiment) obsolète?». Sociologie et sociétés, 36,
à mobilidade escolar intergeracional. Porém, o desenvolvimento da n.º 1: 59-85.
cultura não depende apenas dos investimentos na educação formal. DiMaggio, Paul. 1987. «Classification in Art». American Sociological Review, 52,
n.º 4: 440-455.
Aos capitais culturais incorporados – tomados como uma herança
Donnat, Olivier. 1994. Les français face à la culture: de l’exclusion à l’eclectisme. Paris:
familiar ou um proveito resultante do alongamento das trajetórias La Découverte.
escolares – juntam-se outros capitais adquiridos ou conquistados Donnat, Olivier, dir. 2003. Regards croisés sur les pratiques cultureles. Paris: La Docu-
ao longo da vida: capitais sociais provindos de redes de sociabili- mentation Française.
dade desenvolvidas na escola, em associações culturais, em círculos Donnat, Olivier. 2011. «Democratização da Cultura: Fim e Continuação?». Revista
de amigos e em outras redes sociais (online e offline); capitais cul- Observatório Itaú Cultural, n.º 12: 19-34.
turais emergentes, associados à criatividade gerada no mundo das Eijck, Koen van. 2000. «Richard A. Peterson and the Culture of Consumption».
artes e das tecnologias digitais; outros capitais culturais e artísticos Poetics, 28, n.º 2-3: 207-224.
Fabiani, Jean-Louis. 2007. Après la culture légitime: objets, publics, autorités. Paris:
resultantes de investimentos autodidatas e de aprendizagens infor-
L’Harmattan.
mais, desde logo no domínio artístico. Estes capitais culturais são as Foucault, Michel. 1984. Le Souci de soi. Paris: Gallimard.
flechas de cupido que, sobretudo entre os jovens, desencadeiam ou Friedman, Sam, Mike Savage, Laurie Hanquinet, e Andrew Miles. 2015. «Cultural
avigoram o amor pela arte e a paixão pela cultura. Sociology and New Forms of Distinction». Poetics, 53: 1-8.
Giddens, Anthony. 1991. Modernity and Self-Identity: Self and Society in the Late
Modern Age. Londres: Polity.
Goethe, Johann Wolfgang. 2017 [1809]. As Afinidades Electivas. Lisboa: Bertrand
Editora.
Hair, Joseph, Barry J. Babin, William Black, e Rolph Anderson. 1998. Multivariate
Data Analysis. Nova Jérsia: Prentice Hall.
Hanquinet, Laurie. 2017. «Exploring Dissonance and Omnivorousness: Another
Look into the Rise of Eclecticism», Cultural Sociology, 11, n.º 2: 165-187.
Hanquinet, Laurie, e Mike Savage, eds. 2016. Routledge International Handbook of
the Sociology of Art and Culture. Nova Iorque: Routledge.

348 349
Práticas Culturais dos Portugueses Práticas culturais e clivagens sociais

Hanquinet, Laurie, Henk Roose, e Mike Savage. 2014. «The Eyes of the Beholder: Rosler, Martha. 2017. Cultural Class. Berlim: Sternberg Press.
Aesthetic Preferences and the Remaking of Cultural Capital». Sociology, 48, n.º Santamaría, Alberto. 2019. Alta cultura descafeinada: situacionismo low cost y otras
1: 111-132. escenas del arte en el cambio de siglo. Madrid: Siglo XXI.
Hawkes, Jon. 2001. The Fourth Pillar of Sustainability: Culture’s Essential Role in Santos, Maria de Lourdes Lima dos. 1988. «Questionamento à volta de três noções
Public Planning. Melbourne: Cultural Development Network. (a grande cultura, a cultura popular, a cultura de massas)». Análise Social, XXIV,
Jonchery, Anne, e Philippe Lombardo. 2020. Pratiques culturelles en temps de confi- n.º 101-102: 689-702.
nement. Culture Études. Paris: Ministère de la Culture. Savage, Mike. 2015. Social Class in the 21st Century. Londres: Penguin Books.
Kreidler, John, e Philip J. Trounstine. 2005. Creative Community Index: Measuring Singly, François de. 1993. Les jeunes et la lecture. Paris: Ministère de l’Éducation
Progress Toward a Vibrant Silicon Valley. San José, CA: Cultural Initiatives Sili- Nationale et de la Culture.
con Valley. Disponível em https://www.issuelab.org/resources/8886/8886.pdf. Stallabrass, Julian. 2006. High Art Lite. The Rise and Fall of Young British Art (Revi-
Lahire, Bernard. 2002. Portraits sociologiques: dispositions et variations individuelles. sed and Expanded Edition). Londres: Verso.
Paris: Nathan. Tunali, Tijen (ed.). 2021. Art and Gentrification in the Changing Neoliberal Lands-
Lahire, Bernard. 2004. La culture des individus: dissonances culturelles et distinction cape. Abingdon: Routledge.
de soi. Paris: Éditions La Découverte. Weber, Max. 2001 [1905]. The Protestant Ethic and the Spirit of Capitalism. Tradu-
Lahire, Bernard. 2008. «The Individual and the Mixing of Genres: Cultural Disso- zido por Talcott Parsons. Com uma introdução de Anthony Giddens. Londres e
nance and Self-Distinction». Poetics, 36, n.º 2-3: 166-188. Nova Iorque: Routledge.
Lapointe, Marie-Claude, e Jacques Lemieux. 2013. «Internet et les pratiques cultu-
relles au Québec». Communication, 31, n.º 2.
Lapointe, Marie-Claude, Gilles Pronovost, e Jacques Lemieux, dir. 2017. Généra- Software usado:
tions et pratiques culturelles. Québec: Presses de l’Université du Québec.
Lopes, João Teixeira. 2017. «Sociabilidade e consumos culturais: contributos para IBM SPSS Statistics.Version 26.0.0 (IBM Corp. Released 2019. IBM SPSS Statistics
uma sociologia da fruição cultural». Sociologia, Revista da Faculdade de Letras da for Windows, Version 26.0. Armonk, NY: IBM Corp).
Universidade do Porto, 8: 179-188. JMP Pro 15 (JMP®, Version 15. Cary, NC: SAS Institute Inc., 1989-2021).
Löwy, Michael. 2013. «Le concept d’affinité életive». In La Cage d’acier. Max Weber
et le marxisme wébérien, Michael Löwy. Paris: Stock, 77-96.
Martins, Guilherme d’Oliveira, coord. 2017. Perfil dos Alunos à Saída da Escolari-
dade Obrigatória. Lisboa: Ministério da Educação/Direção-Geral da Educação.
Merton, Robert K. 1957. Social Theory and Social Structure (Rev. ed.). Glencoe, IL:
The Free Press.
NEMO (Network European Museum Organizations). 2020. Survey on the Impact
of the COVID-19 Situation on Museums in Europe. Final Report. Berlim: The
Network European Museum Organizations.
Pais, José Machado. 1985. A Prostituição e a Lisboa Boémia do Século XIX aos Iní-
cios do Século XX. Lisboa: Editorial Querco.
Pais, José Machado. 1999. Consciência Histórica e Identidade: Os Jovens Portugueses
num Contexto Europeu. Oeiras: Celta.
Peterson, Richard A. 1992. «Understanding Audience Segmentation: From Elite
and Mass to Omnivore and Univore». Poetics, 21: 243-258.
Peterson, Richard A., e Roger M. Kern. 1996. «Changing Highbrow Taste. From
Snob to Omnivore». American Sociological Review, 61, n.° 5: 900-907.
Prieur, Annick, Jakob Skjøtt-Larsen, e Lennart Rosenlund. 2008. «Cultural Capital
Today: A Case Study from Denmark». Poetics, 36, n.º 1: 45-70.
Roose, Henk. 2015. «Signs of ‘Emerging’ Cultural Capital? Analysing Symbolic
Struggles Using Class Specific Analysis». Sociology, 49, n.º 3: 556-573.

350 351
Miguel Lobo Antunes

Capítulo 9

Algumas notas sobre práticas,


política e programação culturais

Introdução

Todos os textos recolhidos neste livro são da autoria de cientistas


sociais com especiais conhecimentos nas áreas que neles se abordam.
Exceto este. Não sou sociólogo, não tenho quaisquer habilitações,
formais ou informais, nesse domínio do conhecimento. Tive uma
atividade profissional durante décadas no chamado «sector cultural».
Com a ajuda dos meus amigos da comissão de coordenação deste
projeto e do Dr. Jorge Rodrigues da Silva,1 que me fez o favor de
fornecer todos os cruzamentos de respostas ao Inquérito cujos valo-
res estão na base das considerações que se seguirão, para além de ter
elaborado todos os gráficos que a minha absoluta inabilidade, tam-
bém nessa matéria, me impedia de desenhar, o que procuro fazer é
olhar para alguma informação recolhida de um ponto de vista de um
antigo profissional de gestão e programação de espaços e iniciati-
vas culturais, procurando retirar conclusões ou interrogações que se
relacionem com a política e a programação culturais.
Pretendo sobretudo chamar a atenção para a utilidade da infor-
mação agora disponível, sendo certo que estas notas carecem de
1
Agradeço, muito reconhecido, aos Professores Doutores José Machado Pais
e Pedro Magalhães e ao Dr. Jorge Rodrigues da Silva. Sem eles não teria conseguido
escrever estas notas.

353
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

profundidade que só uma análise mais pormenorizada, incompatível Práticas culturais por regiões
com os objetivos do livro, permitiria.
Começo por indagar se o comportamento dos inquiridos, relati- Quando se apura a relação entre as práticas culturais e as regiões
vamente a um conjunto de práticas que escolhi, tem flutuações con- onde vivem os inquiridos (gráfico 9.1) salta à vista que relativamente
soante a região onde vivem, o habitat (urbano, intermédio urbano às regiões autónomas dos Açores e da Madeira as práticas culturais
ou rural), o sexo/género, a idade, o grau de ensino, o nível de ren- referidas pelos inquiridos estão abaixo, nalguns casos muito abaixo
dimento, a opinião sobre a sua própria competência para desfrutar (leitura de livros na RAM, visitas a Museus ou Monumentos da
a oferta cultural e as práticas tidas durante a infância e adolescên- RAA, idas ao cinema na RAA, frequência de espetáculos de dança ou
cia. Nas secções finais olho para os motivos que os respondentes de concertos de música clássica nas duas RA, ou de música ao vivo na
invocam para terem ou não terem práticas culturais e para as for- RAM) da média nacional. Mas há notáveis exceções.
mas como dizem tomar conhecimento das atividades que frequen- A percentagem de respondentes que vivem na Madeira e dizem
tam. ir ao cinema é bastante mais elevada do que a média nacional, só
As práticas culturais que selecionei, diversas mas não muito superada pela Área Metropolitana de Lisboa (AML). Já os inquiridos
numerosas, são, por um lado, das mais citadas pelos inquiridos e, açorianos que vão a festivais e festas locais são em muito maior per-
por outro, das que têm uma mais assídua utilização como índices de centagem do que os habitantes de todas as outras regiões. Nos Aço-
nível cultural em análises de inquéritos semelhantes, estrangeiros ou res as festas locais têm uma forte adesão dos ilhéus (cf. o capítulo 6).
internacionais: leitura de livros impressos, visitas a museus e monu- Uma segunda observação que me ocorre é que, se se fizesse uma
mentos, idas ao cinema e a espetáculos (ballet, dança, concertos de ordenação decrescente das regiões por tipos de práticas segundo as
música clássica, teatro, concertos de música ao vivo [não clássica], respostas dadas pelos inquiridos, verificar-se-ia que nenhuma delas
festivais e festas locais). Nos gráficos e tabelas, e com frequência ocuparia o primeiro lugar em todas as práticas consideradas.
no texto, usam-se formas abreviadas: livros, museus, monumentos, Se na leitura de livros se destacam os respondentes da AML e do
ballet, dança, etc. O item música inclui todos os concertos e espe- Algarve, na visita de museus ou monumentos são os habitantes do
táculos que não sejam de música clássica (v. P.6E do Questionário, Alentejo que responderam ao Inquérito que em mais elevada percen-
Anexo 3). tagem dizem efetuar tais visitas.
A unidade de medida tomada em conta é o de uma prática Apesar de se localizar em Lisboa a maior quantidade de equipa-
mínima: ler pelo menos um livro no ano anterior ao da data da per- mentos de grande e média dimensão onde são apresentados espe-
gunta, praticar alguma das outras atividades pelo menos uma vez no táculos de música ao vivo (Meo Arena, Coliseu, Campo Pequeno,
ano anterior à pandemia. É esta a unidade usada correntemente em CCB, Casino de Lisboa, Tivoli, Culturgest…), não são os habitantes
estudos parecidos, que permite tirar conclusões sem tornar dema- dessa região que dizem ir em maior número a esse tipo de espetá-
siado complexa a exposição e fazer uma ou outra comparação com culos. São, antes, os que vivem no Alentejo e no Algarve que estão
outros países. muito acima da média nacional. Também nas idas ao cinema o Alen-
Nos gráficos e tabelas incluem-se as percentagens relativas à tota- tejo sobressai.
lidade do universo inquirido, para que seja fácil apreender os desvios Quando se olha para o conjunto das regiões do continente, veri-
a essa média nacional que são as respostas totais sobre as práticas. fica-se que, com exceção do Alentejo, há uma percentagem igual de
Essa percentagem é denominada «total». Tal só não acontece, por respondentes em cada região que dizem ir a concertos de música
motivos óbvios, nos gráficos 9.7 a 9.9. clássica, o que parece indiciar que a oferta será muito semelhante
pelo país, ou que nos casos em que a oferta é maior, a procura não
o é. Certamente há mobilidade entre regiões das pessoas que vão a
espetáculos, isto é, as pessoas irão assistir a concertos, visitar museus,

354 355
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Gráfico 9. 1 – Práticas culturais por regiões (%) etc., fora da região que habitam. Mas o que aqui estamos a analisar
são percentagens de frequência por região, seja onde for que tenham
as suas práticas culturais.
Compreender o porquê da ausência de diferenças ou as divergên-
cias acentuadas entre as várias regiões implica uma maior indagação,
não bastando ter em conta as percentagens do gráfico 9.1. Os resul-
tados do Inquérito, e não só, permitem outras pesquisas que podem
ajudar a essa compreensão.
Quando a política e a programação culturais têm como obje-
tivo uma equilibrada distribuição das práticas pelo país não pode,
a meu ver, deixar de se estudar onde e porquê acontecem desequilí-
brios acentuados. Porque é que se vai mais a espetáculos de dança no
Norte e no Algarve e tão pouco na AML? Porque se lê mais na AML
e no Algarve e muito pouco na Madeira? Porque é que na Madeira é
tão grande a percentagem das pessoas que vão ao cinema? Porque é
que no Alentejo os que dizem que visitam museus estão tão acima
da média nacional? E porque o inverso acontece na música clássica?
Porque é que se vai mais a concertos de música ao vivo no Alentejo
e no Algarve e muito menos na Madeira?

Práticas culturais por habitat

Poderia pensar-se que as práticas culturais que escolhemos seriam


mais frequentes entre os habitantes de meios urbanos. Por ser aí
que existem mais espaços que lhes são dedicados, se concentra mais
população (nas práticas culturais fora de casa um fator importante
de estímulo é o convívio com outros, como veremos mais à frente),
e se têm, em geral, horários e modos de vida mais compatíveis com
as saídas.
A informação recolhida (gráfico 9.2) não me surpreende pelos
números mais altos correspondentes ao habitat urbano, mas causa-
me perplexidade a diferença pouco acentuada em muitas das prá-
ticas minoritárias no conjunto do país, como ballet, dança, música
clássica, teatro, e também de outras mais frequentes como as idas a
monumentos ou a espetáculos de música.
Os inquiridos que moram em meios urbanos dizem, numa clara
percentagem maior do que os restantes, ler livros e ir ao cinema. São
(N = 2000) só essas as grandes diferenças a seu favor.

356 357
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Gráfico 9. 2 – Práticas culturais por habitat (%) s­uficientemente fundamentado o discurso que frequentemente se
ouve da existência de fortes assimetrias no acesso às artes decorren-
tes do local onde as pessoas vivem e, por isso, da necessidade de se
ter como objetivo de política e de programação a chamada coesão
territorial.2 Pode haver grandes extensões do território em que as
práticas sejam percentualmente muito reduzidas, mas provavelmente
há poucas pessoas nessas zonas. Se há assimetrias por parte da oferta,
não se revelam pelo lado da procura, e nada prova que o aumento da
primeira induza necessariamente o incremento da segunda.
A análise por regiões e habitat não será o único fator a ­considerar.
As respostas ao Inquérito permitem-nos ter ainda em consideração,
por exemplo, a dimensão das localidades urbanas em número de
habitantes. Outros dados relevantes para uma análise mais funda-
mentada serão os que se debrucem sobre a quantidade da oferta por
habitantes, ou sobre o número de visitantes dos diversos museus e
monumentos ou sobre a taxa de ocupação dos recintos onde ocor-
rem os espetáculos.

Práticas culturais por género/sexo

Das dez práticas selecionadas, em cinco há diferenças significati-


vas de comportamento entre os inquiridos do género masculino e os
do género feminino (gráfico 9.3).
São mais as mulheres do que os homens que disseram ler livros
impressos (43% contra 35%).
Já no que diz respeito a concertos de música, de vários tipos de
música, e às idas a festivais e festas locais, são, sempre em percenta-
gem, mais os inquiridos homens que vão do que as mulheres.
Mas nos outros quatro casos de diferenças de comportamento
(N = 2000) entre os géneros, são os homens que mais sobressaem: nas visitas a
monumentos (34% contra 28%), nas idas ao cinema (44% compa-
ram com 39%), nos concertos de música ao vivo (28% e 20%) e na
Ao contrário, são os que vivem no meio intermédio e no rural participação em festivais e festas locais (42% contra 34%).
que mais respondem ir a festivais e festas locais, supondo nós que
as festas locais terão um peso maior do que os festivais nesta prática 2
O Decreto-Lei n.º 103/2017, de 24 de agosto, sobre o regime de atribuição de
(cf. capítulo 6). apoios financeiros do Estado às artes visuais e performativas, com as duas alterações
a que foi sujeito, estabelece, no seu artigo 3.º, que os apoios têm como fim, entre
Se conjugarmos o que resulta desta informação com a referida
outros, «a fruição artística enquanto instrumento de correção de assimetrias regio-
no ponto anterior, sobre as práticas por região, pergunto-me se é nais» e como um dos objetivos estratégicos «a coesão social e territorial».

358 359
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Gráfico 9. 3 – Práticas culturais por género/sexo (%) todas essas três categorias é superior a percentagem de mulheres à
dos homens, embora só na ida a espetáculos ao vivo a diferença seja
maior do que um ponto percentual, no caso, quatro pontos percen-
tuais. Estamos a falar da média dos 28 países da UE, antes da saída
do Reino Unido.
Quando se veem os resultados país a país, os poucos em que a
percentagem de mulheres que dizem ter praticado uma qualquer ati-
vidade cultural é inferior à dos homens são Itália (mulheres 45,8%,
homens 48%), Luxemburgo (mulheres 78,4%, homens 80,1%), Paí-
ses Baixos (mulheres 83,2%, homens 84,3%), Portugal (mulheres
61,2%, homens 64,3%) e Roménia (mulheres 25,4, homens 29,6%).
Na Bulgária também os homens vêm à frente, se assim me posso
exprimir, mas pela diferença insignificante de 0,1%.
(N = 2000) Ou seja, Portugal é dos poucos países da UE em que há uma
diferença significativa entre as percentagens dos inquiridos mulheres
e homens que dizem ter uma participação cultural mínima, diferença
A maior propensão das mulheres para a leitura de livros é uma essa desfavorável para as mulheres. Esta realidade não pode deixar de
realidade generalizada nos países ocidentais desde há décadas e tem merecer reflexão, procurando-se descortinar as causas e os efeitos e,
sido objeto de estudo, designadamente procurando razões para que se for caso disso, os remédios a adotar.
tal aconteça (por todos, Neves 2011, 56 e seguintes).
Quando vemos as razões por que homens e mulheres dizem,
no Inquérito, não terem lido nenhum livro no ano anterior, há duas Práticas culturais por idade
principais, com comportamentos distintos segundo o género: prefe-
riram dedicar-se a outras atividades (homens 17 %, mulheres 10%) Quando se considera a relação entre práticas culturais e a idade
ou por falta de tempo (homens 11%, mulheres 6%). dos inquiridos salta à vista a percentagem reduzida de pessoas com
As outras diferenças significativas a favor dos homens são exce- 65 anos ou mais que referem ter alguma das práticas selecionadas,
cionais no contexto europeu. quer em absoluto, quer em comparação com a média nacional e as
Segundo o Eurostat (Beck-Domzalska 2019, 132-133),3 a par- pessoas mais novas (gráfico 9.4).
tir de um inquérito feito em 2015 nos então 28 países da União Socorrendo-nos de novo do estudo citado no ponto anterior
­Europeia (UE), as percentagens de pessoas, por género, que no (Beck-Domzalska 2019, 131) verificamos – só tomando uma prá-
último ano anterior à indagação participaram em pelo menos uma tica, a ida ao cinema, que é diretamente comprável – que Portu-
atividade cultural no conjunto desses países, são praticamente iguais: gal faz parte, com Letónia, Lituânia, Eslováquia, Hungria, Chipre,
63,8% de mulheres e 63,6% de homens. Quando se desagrega por Croácia, Roménia e Bulgária, do grupo de países em que a percen-
idas ao cinema, a sítios culturais (o conjunto museus, monumen- tagem de pessoas mais velhas4 que dizem ter ido ao cinema no ano
tos, sítios arqueológicos e galerias de arte) e espetáculos ao vivo, em anterior fica abaixo dos 10%. A média da UE 28 é de 27% (tabela
9.2 e gráfico 9.4).
3
Ao contrário do que fazemos nas percentagens reveladas pelo nosso Inqué-
rito, não arredondo as relativas ao inquérito europeu para respeitar a forma como 4
No estudo europeu consideram-se apenas as pessoas entre 65 e 74 anos, o que
são publicitadas. reduz o universo relativamente ao nosso Inquérito.

360 361
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Tabela 9. 1 – Práticas culturais por idade (%) Tabela 9. 2 – Frequência de participação em atividades culturais
nos últimos 12 meses, no grupo etário
dos 65-74 anos (2015)* (%)

(N = 2000)

Gráfico 9. 4 – Frequência de participação em atividades culturais


nos últimos 12 meses, no grupo etário
dos 65-74 anos (2015)* (%)

Nota:
(1) Estimativas.
(2) Baixa fiabilidade.
* Eurostat. Survey on Income and Living Conditions (EU-SILC ad hoc module on Cultural
Nota: and social participation, 2015).
(1) Estimativas.
(2) Baixa fiabilidade.
* Eurostat. Survey on Income and Living Conditions (EU-SILC ad hoc module on Cultural
and social participation, 2015).

362 363
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Os países em que mais pessoas entre os 65 e os 74 anos vão ao Pode-se encontrar nas respostas ao questionário mais ­informação
cinema (que é, em todos eles, a prática cultural menos frequente, que contribua para o entendimento desta realidade. Um exem-
comparada com os espetáculos ao vivo ou as visitas a museus, monu- plo: uma das principais razões que levam os respondentes a terem
mentos, sítios arqueológicos e galerias de arte) são Dinamarca, práticas de saída é o convívio com outras pessoas (cf. infra grá-
Suécia, Finlândia, Países Baixos, Reino Unido (em 2015 ainda era fico 9.8). Esse motivo vai-se esbatendo com o rodar dos anos.
membro da UE, recorda-se de novo), Luxemburgo e França e, fora Não serão as práticas culturais de saída que as pessoas mais velhas
dos 28, Suíça, Islândia e Noruega, todos países dos mais desenvolvi- usam de forma significativa para estarem com amigos e familia-
dos do continente. res.
O Inquérito revela uma desigualdade muito grande em desfavor Se olharmos só para os concertos de música clássica, aí os mais
dos mais velhos que qualquer política e programação culturais não novos estão um ponto percentual abaixo da média nacional, tal como
pode deixar de considerar. É uma obrigação da política cultural com- acontece, por razões que não intuímos, entre os que têm entre 45 e
bater essa desigualdade e outras já referidas e que referirei. Como 54 anos, enquanto todos os outros grupos etários (excluindo os de
me parece dever ser objetivo da programação de museus, teatros, 65 ou mais anos) estão ligeiramente acima da média. Sendo reduzida
centros culturais, tutelados pelo Estado, segundo a missão que lhes a percentagem de inquiridos que disseram assistir a concertos deste
for ­atribuída. tipo de música, não se confirma a hipótese de que são os mais velhos
Haverá muitas causas para as fraquíssimas práticas culturais dos que mais frequentam as salas de concerto. A prática ­mantém-se muito
mais velhos, do nível de rendimentos ao de escolaridade, do estado semelhante em todas os escalões etários. Esta verificação recorda-me
de saúde (é sabido que se a esperança de vida dos mais de 65 anos o que um excelente intérprete francês um dia me disse: concertos de
é, comparativamente com países mais desenvolvidos, semelhante, música clássica, não receio que acabem ou mesmo diminuam, por-
já o mesmo não sucede com a esperança de vida saudável) ao grau que são frequentados por pessoas mais velhas que serão cada vez
de mobilidade, da dependência de terceiros ao cansaço próprio da em maior número. Sem saber como a situação vai evoluir, o que nos
vida longa, etc., aspetos impossíveis de contrariar apenas através da pareceu uma observação perspicaz, hoje, pelo menos no nosso país,
­política cultural. Mas muita coisa poderá ser feita. E muitas estão a não será assim tão certeira.
ser executadas sobretudo a nível da programação de equipamentos.
Sem ilusões de resultados notáveis e gerais a curto prazo.
Outra evidência que se retira do gráfico é que, em quase todas as Práticas culturais por nível de escolaridade
práticas, a faixa etária em que há uma percentagem maior de inqui-
ridos com respostas afirmativas é a dos 15 aos 24 anos. Como o Quanto maior for a escolaridade das pessoas, em maior percen-
resultado do Inquérito dá apenas um retrato instantâneo, fica-nos tagem dizem ler livros, visitar museus ou monumentos, ir ao cinema
a curiosidade de saber se daqui a cinco ou dez anos vão aumentar as ou a espetáculos, incluindo as práticas mais populares como os con-
práticas no escalão etário seguinte, ou se com a idade os comporta- certos de música não erudita (gráfico 9.7).
mentos mudam e o interesse pelas artes esmorece seja o que for que O que não tem nada de singular. É o que revelam os inquéri-
se fazia quando se era mais novo. tos deste tipo feitos nos outros países. É também essa realidade que
O declínio da frequência de respostas positivas às práticas em resulta do por diversas vezes citado inquérito europeu (Beck-Dom-
geral começa, nalguns casos já acentuadamente, a partir dos 45 anos. zalska 2019, 134-135).
Ou seja, abrange muitas pessoas em plena vida ativa, mas que prefe- Note-se que é muito elevada a percentagem dos inquiridos com
rem ficar em casa, lendo pouco, a lerem ou saírem para visitar museus ensino superior frequentado ou concluído que não leram nem um
ou ver espetáculos. Resulte essa diferença de um efeito geracional ou livro no ano anterior (25%), não visitaram um único museu (39%),
apenas do passar do tempo. não foram a uma sessão de cinema (26%), a um espetáculo de dança

364 365
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

(85%), a um concerto de música clássica (82%) ou a um espetáculo Práticas culturais segundo o rendimento
de teatro (66%). do agregado
Ou seja, mesmo dentro do grupo social mais instruído, são mui-
tos, percentualmente, os que não têm práticas culturais mínimas. A relação evidenciada entre o nível de escolaridade e a frequên-
Não basta, pois, ter-se um nível de educação formal elevado. cia das práticas culturais tem o seu equivalente quando se atenta
O retrato fica mais impressivo se se recordar que se estima que aos escalões de rendimento que os inquiridos revelaram (47% das
só 20% das pessoas residentes em Portugal têm um grau de instru- pessoas responderam a essa pergunta com ‘Não sabe’ ou ‘Não res-
ção superior, (ver capítulo 3). Dentro da minoria que tem instrução ponde’) (tabela 9.3).
superior há muitos, nalguns casos imensos, que não têm práticas Olhando para a tabela, facilmente se conclui que quanto maior
mínimas. o rendimento, maior a percentagem de pessoas que afirmaram
ter as práticas culturais que selecionámos. Com uma exceção. As
Gráfico 9. 5 – Práticas culturais por grau de ensino concluído ­diferenças entre os níveis de rendimento atenuam-se relativamente à
ou frequentado (%) frequência de festivais e festas locais. Enquanto dos inquiridos situa-
dos no escalão mais baixo de rendimentos, 19% disseram que leram
pelo menos um livro por ano, 6% foram a um museu, 10% a uma
sessão de cinema, e por aí fora, nas pessoas situadas no nível mais ele-
vado de rendimentos, as percentagens sobem para 71% no caso dos
livros, 60% no dos museus ou 78% no dos cinemas, uma assimetria
enorme. Quando falamos de festivais e festas locais as percentagens
são de 20% e 42%, respetivamente. Não encontro explicação para
que a percentagem das pessoas incluídas no quarto escalão de rendi-
mentos que responderam irem ao teatro ser mais elevada do que as
incluídas no quinto escalão (15% e 11%, respetivamente).

Tabela 9. 3 – Práticas culturais segundo o rendimento mensal


do agregado (%)

(N = 2000) (N = 2000)

366 367
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Curiosamente, a percentagem dos inquiridos situados no 2.º O que se revela é mais uma desigualdade chocante que a política
escalão de maiores rendimentos que dizem ir a festivais e festas é cultural deve procurar combater.
significativamente superior aos que estão situados no escalão mais Não se pode esperar que o nível de desenvolvimento do país
elevado. Também não sei qual o motivo. Uma hipótese especulativa resolva o problema, mesmo sabendo que vai contribuir para o fazer. A
que carece de demonstração é que haja por parte dos mais ricos uma política cultural de um país tão desigual como o nosso não pode estar à
reticência à participação em acontecimentos mais populares. Por espera que mais ascendam em riqueza e instrução, tem de atuar já para
outro lado, os festivais constituem uma categoria híbrida, ainda mais atenuar as assimetrias, mesmo que sejam limitados os seus efeitos. Por
se acoplados às festas locais, não sendo possível associar perfis socio- vezes assimila-se o conceito de «criação de novos públicos», repetida-
gráficos a tipos de festivais frequentados. mente invocado, ao de democratização da cultura. Resta saber se dessa
Esta relação entre nível de riqueza e de práticas culturais ocorre «criação» resulta crescimento da inclusão dos que hoje passam ao lado,
em todos os países da UE 28 (Beck-Domzalska 2019, 137). apesar da sua vontade, dos benefícios do contacto com as artes.
É muito claro que as pessoas com mais escolaridade e maiores
rendimentos têm um nível de participação cultural muito maior do
que as que têm menos escolaridade e menos rendimento. Práticas culturais atuais e as havidas na infância
A informação não traduz necessariamente uma relação de causa e adolescência
e efeito, mas revela pelo menos um marcado grau de probabilidade.
Quanto maiores o rendimento e a escolaridade, maior a probabili- Com frequência se afirma que levando crianças e jovens a biblio-
dade de práticas. Mas dos mais instruídos e ricos apenas alguns, em tecas, museus, teatros, etc., com as escolas ou não, para participarem
muitas das práticas menos de metade, sentem o apelo das artes. nas inúmeras e imaginativas ações que os serviços educativos (para
Penso que a realidade que o Inquérito revela não tem sido devi- usar a terminologia tradicional em crise, mas ainda não substituída
damente considerada quando se fala de democratização do acesso por outra que seja generalizadamente aceite) promovem, se formam
à cultura,5 normalmente vista no nosso país como sendo resolúvel «novos públicos» querendo com isso dizer que quando chegarem
por um aumento da oferta e da proximidade dessa oferta, acrescen- a adultos com maior probabilidade frequentarão esses espaços ou
tada com algumas ações junto de grupos sociais específicos, sempre tipos de espetáculos com que contactaram em muito novos.
gotas de água num imenso oceano. Como não tem sido assumido Os resultados das respostas ao Inquérito fornecem informação
que as atividades culturais objeto das políticas e das programa- útil para se tentar perceber se aquilo que se acha é ou não verdade.
ções beneficiam sobretudo uma minoria mais abastada e escolari- Perguntou-se aos inquiridos se ‘na sua infância e até aos 18 anos
zada. teve oportunidade de se deslocar a bibliotecas, exposições, museus,
monumentos ou espetáculos de qualquer tipo’ e, caso tivessem tido,
5
O conceito de democratização cultural, nascido em França nos finais dos anos com que frequência (raramente, algumas vezes, frequentemente) e
1950, foi posto em crise, nos anos 1960, também inicialmente nesse país, propondo- em que contexto (deslocações promovidos pela escola, por outras
se a sua substituição pelo de democracia cultural. Na prática as políticas culturais organizações, com o apoio da família, combinadas com amigos ou
pouco mudaram. A recente «Carta de Porto Santo. A Cultura e a promoção da realizadas individualmente).
democracia: para uma cidadania cultural europeia», apresentada na conferência
promovida pela presidência portuguesa da UE e realizada naquela cidade em 27 e
61% dos inquiridos disseram que se deslocaram com a escola,
28 de abril de 2021, intitulada «Da democratização à democracia cultural: repensar 16% que o fizeram com outras organizações (como escuteiros, asso-
instituições e práticas», apresenta-se como um «mapa orientador de princípios e ciações, sindicatos), 40% com a família, 35% com os amigos e 18%
de recomendações para aplicar e desenvolver um paradigma da democracia cultu- individualmente.
ral na Europa». Nela se nota vibrantemente como a polémica dos anos 1960 ainda
A importância das escolas nessas práticas em idades mais recua-
não encontrou paz. A «Carta» pode ler-se aqui: https://www.culturcentro.gov.pt/
media/11842/pt-carta-do-porto-santo.pdf. das é inegável. Pouco mais de metade dos inquiridos disseram que as

368 369
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

escolas os levaram, sendo certo que essa abertura das escolas a ati- t­iveram na infância e na juventude. O que leva as pessoas a terem
vidades fora delas é uma realidade que pouco ou nada ocorria há 40 práticas em adultos é um conjunto de fatores, sobre os quais se
anos. A percentagem dos inquiridos em idades menos avançadas que ­fizeram no Inquérito perguntas específicas. O mais que se pode dizer,
dizem que tiveram acesso a bibliotecas, exposições, etc., em geral, parece-nos, é que quem teve práticas em novo vive num ambiente
e sobremaneira em contexto escolar, vai decrescendo significativa- mais propício a ler livros, ir a museus, etc. E será mais provável que o
mente com a idade (cf. capítulo 7, gráfico 7.13). façam em adultos se outras circunstâncias também ocorrerem. Não
Cruzaram-se as respostas a esta pergunta com as respostas das é possível afirmar que levar as crianças ao museu vai ter como con-
pessoas que disseram praticar, nos termos já referidos, as práticas sequência, por si só, que em adultos lá irão mais vezes do que os que
que selecionámos (tabela 9.4). não foram. Mas pode dizer-se, o que não é despiciendo, que há uma
Há uma nítida correspondência entre as pessoas que dizem ter correspondência entre a frequência de práticas em idades de forma-
tido práticas em novos e as que as têm atualmente. Quanto maior ção e a frequência em idade madura.
a percentagem dos que responderam que na sua infância e juven- Essa correspondência é maior ou menor consoante o ambiente
tude foram a bibliotecas, exposições, museus, etc., maior é a dos em que em novas as pessoas foram às bibliotecas, museus, monu-
que dizem que atualmente leem livros, visitam museus, etc. Simpli- mentos, etc.
ficando, quanto mais frequentes as idas em novos, maior a percenta- Os que responderam que foram a esses locais em idades preco-
gem das idas em adultos. ces por si só, individualmente, têm, em maior percentagem, práticas
Isto não quer dizer que haja uma relação de causalidade entre as em adultos. As que vão através da escola que, como se viu, é o que
práticas na infância e na juventude e as em adulto, mas tão-só que mais acontece, são as que menos frequentemente, comparando com
aumenta a probabilidade de em adulto se ter certas práticas se as outros contextos, vão em adultas. As que se deslocaram através de
organizações diversas, que são o caso menos frequente, superam, em
quase todas as práticas, as que vão com as escolas. Já os que dizem ter
Tabela 9. 4 – Práticas culturais atuais segundo a frequência com que ido com amigos, têm resultados em adultos variados.
foram desenvolvidas na infância e na juventude (%) Quando as escolas, os pais, etc., levam as crianças a bibliotecas,
museus, monumentos, espetáculos, não se estão a «criar novos públi-
cos». Estarão, julgo, a completar a educação que é dada no ensino aos
mais novos, o que por si só é de grande importância.
Ter isto presente e investigar as razões que levam as pessoas a
terem ou a não terem práticas culturais é fundamental para se poder
desenhar políticas que visem o aumento generalizado e equitativo
dessas práticas. Creia-se na democratização da cultura ou na demo-
cracia cultural, o objetivo de fazer crescer o número de pessoas que se
sintam atraídas pelo fascínio das artes permanece um desígnio gene-
ralizado das políticas e, entre nós, tem consagração constitucional
(artigos 73.º, 74.º, 78.º da Constituição da República Portuguesa).6

6
A invocação destes preceitos constitucionais é muitas vezes feita sem se ter
em conta a especial natureza dos direitos e deveres culturais garantidos na Lei Fun-
(N = 2000) damental.

370 371
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Práticas culturais segundo a perceção sobre os próprios que esperam compreender. O que anteveem como de difícil entendi-
conhecimentos mento não põem sequer a hipótese de ir ver, é como se aquele acon-
tecimento não existisse.
Perguntou-se aos inquiridos se achavam que tinham ‘conheci- Tendo em conta o que o Inquérito revela acerca da convicção
mentos para, em geral, poder desfrutar da oferta cultural (leitura e sobre o seu próprio capital cultural, julgo que um dos objetivos
todas as expressões artísticas)’. E admitiu-se quatro níveis de conhe- de políticas e programações, mesmo que não em prioridade abso-
cimentos: não os ter (resposta escolhida por 35% das pessoas), ter luta, deve ser o de oferecer fontes de informação e conhecimento
alguns que lhes permitissem desfrutar do que mais lhes interessa ­acessíveis aos que não têm práticas e aos que as têm, não só porque,
(28% dos inquiridos), ter suficientes para a generalidade do que lhes
interessa, mas com exceções (13%) e ter os suficientes para toda a
oferta cultural por que se interessam (23%).
Gráfico 9. 6 – Práticas culturais segundo a perceção dos inquiridos
Cruzando as respostas a esta pergunta com as respostas às práti- sobre os conhecimentos que têm para desfrutar
cas que escolhemos (gráfico 9.6), verifica-se que a percentagem dos da oferta cultural (%)
que dizem ter práticas culturais cresce com o aumento da perceção
que têm sobre a intensidade dos seus conhecimentos. As diferenças
entre a categoria inferior de conhecimentos e a categoria superior é
muitíssimo significativa. Mais atenuada no que diz respeito à prá-
tica de cariz mais popular, a ida a festivais e festas locais, mas, ainda
assim, 21 pontos percentuais de distância é imenso.
É de presumir – o Inquérito pode dar esse indicador, que não
usámos por economia de espaço deste texto – que as pessoas com
maior nível de escolaridade e de maiores rendimentos entendam que
têm mais conhecimentos sobre artes do que as menos escolarizadas e
de menores rendimentos. E que o que o gráfico revela seja, mais uma
vez, um sinal de clivagem nas práticas culturais entre ricos e pobres,
a juntar a outros.
São poucos os inquiridos que entendem ter conhecimentos sufi-
cientes para desfrutarem da oferta cultural que lhes interessa, com
ou sem exceções (36%).
Em aparente contradição, quando se pergunta sobre os motivos
por que não se visita ou não se visita com mais frequência museus,
monumentos, sítios arqueológicos, galerias de arte, só uma escassís-
sima minoria (4%) diz que lhe é difícil compreender o que vê nesses
espaços e ainda mais escassa é a percentagem dos que invocam a difi-
culdade de compreensão para não frequentarem espetáculos ao vivo
(1%).
Uma hipótese de explicação, que seria necessário demonstrar,
é a de que uma coisa é reconhecer em abstrato uma incapacidade,
outra é reconhecê-lo em concreto. O que terão desejo de ver será o (N = 2000)

372 373
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

provavelmente, é um motivo de autoexclusão, como porque, ao dar- À regra dos 10% há uma exceção, relativa ao preço. Apenas 2%
-se essa informação, se permitirá aos que vão aos espaços culturais dos perguntados referiram, em relação aos livros, ser o seu preço
terem experiências mais ricas e aprofundarem conhecimentos. obstáculo, o que contrasta fortemente com outras práticas. Sabendo-
Nos museus isto pode traduzir-se na disponibilidade frequente -se que os livros, fora os usados, não são baratos, considerados os
de bons áudio-guias, como tanto se vê em certos países, na u­ tilização ­rendimentos das pessoas, estranhar-se-á que o preço seja muito
das múltiplas possibilidades que as tecnologias digitais fornecem menos citado quando está em causa a leitura de livros do que para
ou, mais simplesmente e adequado ao museu, facultando aos visi- outras práticas em regra mais económicas, como a ida ao cinema. Por
tantes textos cuidados inteligíveis (sim, são difíceis de redigir) ou isso incluí no gráfico essa percentagem.
na procura de tornar as chamadas «visitas orientadas» uma prática Não irei especular sobre as razões dessa diferença entre a prática
frequente dos visitantes. da leitura e outras. O Inquérito não dá uma resposta direta a este
Sei bem a insuficiência de meios ao dispor dos museus e de como problema.
é penoso estabelecer prioridades na escassez. Relativamente às outras práticas, aqui agrupadas em visitas a
O que digo sobre museus, monumentos, etc., aplica-se a espetá- museus, monumentos, sítios arqueológicos e galerias de arte, ao
culos. Folhas de sala bem feitas, em linguagem não encriptada, são cinema e a qualquer espetáculo ao vivo, os motivos mais citados são
raras como o são as notas que anunciam os espetáculos e exposi-
ções da programação dos equipamentos e que pretendem seduzir os
espectadores ou visitantes.
Gráfico 9. 7 – Principais razões para não realizar práticas culturais (%)
Também noto que programas de televisão que têm a preocupação
de contribuir para aumentar os conhecimentos sobre as artes são raros.
Apresentar uma ópera, um ballet, um concerto de música clássica, um
espetáculo de dança ou de teatro na televisão, sem uma introdução que
forneça um mínimo de informação ao espectador, parece-me errado.
Recordo tempos em que não era assim, e como para mim foi bom.
Democratizar a cultura também passa por aqui, pelo forneci-
mento de mais informação. Em regra comunica-se para convertidos,
não se comunica para possíveis interessados. Ou mesmo para inte-
ressados que não dominam o jargão usado pelos profissionais.

As razões invocadas pelos inquiridos para a realização


ou não de práticas culturais

Quis-se saber dos inquiridos quais os motivos pelos quais não


tinham, ou não tinham com mais frequência, realizado certas práti-
cas culturais. A pergunta era acompanhada por uma lista aberta de
possíveis razões, com espaço para indicarem outras não constantes
do rol, e as pessoas podiam assinalar mais do que um motivo. Reuni
(gráfico 9.7) as razões que foram citadas, para cada prática, por mais
de 10% dos inquiridos. Leitura de livros, N= 1209; Outras práticas, N=2000

374 375
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

a falta de tempo e a falta de interesse, mas o preço é um fator referido suportar uma prática de leitura persistente. Não colocámos hipótese
por cerca de um quinto dos inquiridos, o que é significativo. Haverá semelhante nas perguntas referentes às visitas a museus, monumen-
muita gente que só não vai aos museus, monumentos, sítios arqueo- tos, sítios arqueológicos e galerias, idas ao cinema, a espetáculos ao
lógicos, galerias, ao cinema ou a espetáculos, por razões económicas. vivo ou a festivais e festas locais. Porventura devíamo-lo ter feito.
Gostariam, mas não podem. O convívio com outras pessoas é apontado como razão para se ir
O cinema tem, como era expectável, o seu principal concorrente a espetáculos ao vivo e a festivais e festas locais por, respetivamente,
na televisão. 20% dos respondentes dizem que não vão, ou não vão 57% e 60% dos inquiridos. Nas idas ao cinema, este fator é muito
mais ao cinema, porque o podem ver na televisão e outros suportes menos citado (20%). Ter nas salas lugares de encontro que sejam
digitais. 57% dos inquiridos que dizem ver televisão respondem que agradáveis para as pessoas estarem juntas, escolher os horários dos
ver filmes é o que mais habitualmente fazem quando estão em frente espetáculos de modo a facilitar momentos de convívio, incluindo a
ao ecrã. É a utilidade mais citada a seguir, embora a grande distân- presença de artistas, prosseguir uma política de bilheteira que esti-
cia, do que os inquiridos mais procuram, as notícias, a informação mule a compra de bilhetes por grupos, mesmo que pequenos, são,
(81%). Ver cinema na televisão é mais barato do que em sala. Será entre outros, tópicos sobre os quais os responsáveis pelos espaços
por isso que tantos respondem que o preço é obstáculo? ou quem os constrói deverão, julgo, meditar. Sei bem que são muito
Numa percentagem não despicienda, que varia entre 16% e 11%, raros os casos em que os nossos teatros têm zonas acolhedoras para
os inquiridos apontam a falta de museus, salas de cinema ou ­recintos antes e depois dos espetáculos, onde se possa beber e comer, ou
de espetáculos como um motivo para não terem, ou não terem mais,
as práticas referidas. Esta resposta dever ser conjugada, entre outras,
com a informação que resulta do cruzamento das práticas com a Gráfico 9. 8 – Principais razões para realizar práticas culturais (%)
região e o habitat em que as pessoas vivem (cf. supra práticas cultu-
rais por regiões e por habitat). A falta de equipamentos é citada por
uma minoria de pessoas, ainda assim uma minoria relevante.
10% dos inquiridos deram como razão já não terem idade para
irem a espetáculos ao vivo, o que será compreensível se se tiver em
conta que eles decorrem sobretudo à noite, quando as pessoas mais
velhas têm mais dificuldade e menos desejo de se deslocar fora de
casa, ao passo que o cinema tem, nas zonas mais populosas, sessões
diurnas.
Falta de interesse e falta de tempo são, repete-se, os motivos
mais invocados para não se ter práticas culturais. Quanto à falta de
tempo – admitindo que é uma razão objetiva, e não o resultado de
uma seriação de prioridades que cada um faz para ocupar os seus
«tempos lives», em que a falta de interesse tem o seu papel – pouco
poderão fazer a política ou a programação culturais.
Já quanto à falta de interesse parece necessário investigar sobre as
razões e as maneiras de a contrariar.
Fez-se um exercício semelhante sobre os motivos dados para se
ter práticas culturais (gráfico 9.8). 68% dos inquiridos dizem que Festivais e Festas Locais; N= 736; Espetáculos ao Vivo; N= 977; Cinema, N= 781; Museus,
leem por prazer, o que me parece ser o melhor motivo e o que pode monumentos históricos, sítios arqueológicos ou galerias de arte; N= 684; Livros, N= 677

376 377
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

s­implesmente não estejam desejosos de ver os espectadores pelas por que os inquiridos tomam conhecimento seja de livros, seja de
costas para fecharem a sala. Estas respostas revelam, porém, quanto museus, exposições, filmes ou espetáculos.
faz falta um bom acolhimento e quanto esse fator pode ser impor-
tante para atrair público.
A beleza dos museus e das suas obras ou das salas de espetáculo Como é que os inquiridos tomam conhecimento
é citada por 31% e 28% dos inquiridos. Há espaços que são mais das práticas disponíveis
atraentes do que outros, em que as pessoas se sentem bem lá, e por
isso terão maior frequência do que outros. A qualidade da receção Perguntou-se quais as fontes de informação a partir das quais os
dos visitantes e espectadores é, repete-se, um fator com relevância se inquiridos obtiveram recomendações ou ideias de leitura; ­também se
se pretende atrair mais pessoas. perguntou através de que meios tomaram conhecimento dos acon-
É vulgar dizer-se que cada «casa» tem o seu público. Não conheço tecimentos culturais a que assistiram ou em que participaram. As
estudo nenhum que fundamente com seriedade essa afirmação, mas perguntas, como outras do mesmo género, tinham sugestões de res-
é uma impressão com que se fica se se frequenta várias salas. Quando postas, mas permitiam a indicação de outras fontes ou meios, o que
os teatros têm um sistema de assinaturas muito concorrido é claro foi aproveitado por uma percentagem insignificante de respondentes.
que têm um público em grande parte definido, em que as pessoas se No gráfico 9.9 condensaram-se as escolhas referidas por 10% ou
conhecem umas às outras. É natural que as pessoas se afeiçoem a cer- mais de inquiridos, critério igualmente seguido nos gráficos 9.7 e 9.8.
tas salas por motivos diversos (é lá que encontram amigos e conheci-
dos com mais frequência, é lá que se apresentam espetáculos de que
mais gostam, é lá que se sentem bem, é lá que podem tomar refeições Gráfico 9. 9 – Principais meios através dos quais surgem ideias
antes ou depois da sessão de cinema ou do espetáculo, etc.). de leitura e se toma conhecimento dos acontecimentos
Os artistas envolvidos nos filmes e espetáculos ao vivo são, em culturais.
percentagens diferentes, citados como motivo de preferência. No
cinema por 31% dos inquiridos, nos espetáculos por 17%, nos fes-
tivais e festas por 22%. Confirma-se, quantificando, uma impressão
que quem frequenta esses eventos tem. Há realizadores ou atores no
cinema que atraem espectadores. Como há artistas visuais, encena-
dores, coreógrafos, músicos que têm esse poder. Uma atração sobre
quem já conhece ou gostava de conhecer tais artistas. O que é nor-
malmente reforçado na divulgação como um trunfo que é preciso
jogar.
Muito mais relevante, nas idas ao cinema, é o tema ou género
do filme que se vai ver, o que é corroborado, em geral, quando se
olha para as listas dos que, em cada ano, mais espectadores seduzem.
Também nos espetáculos ao vivo ou nos festivais e festas locais, mais
relevante do que os artistas é o tema ou género do que se vai assistir.
Conhecer esta realidade pode ajudar na forma de comunicação que
se estabelece com o público efetivo ou potencial.
A recomendação de outras pessoas é, por si só, um fator de
atração, reforçado, como veremos a seguir, por ser o principal meio Livros, N=2000; Outras práticas, N=2000

378 379
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Quer relativamente aos livros, quer aos acontecimentos culturais r­ elativamente a práticas em geral. A publicidade tem relevância, mas
em geral, a fonte principal de conhecimento são os outros, sejam eles não muito significativa.
familiares, amigos ou conhecidos. Aquilo a que se costuma chamar A seguir à recomendação de outras pessoas, é através da televisão
«boca a orelha» é a corrente de informação que mais leva pessoas a que o público toma conhecimento do que lhe é proposto. 35% dos
lerem um livro, visitarem uma exposição, irem a um espetáculo seja inquiridos citam-na.
ele qual for. Tendo em conta que 90% dos respondentes dizem ver televi-
Quem trabalha neste sector sabe da importância desta rede de são diariamente e desses 81% assistem a programas de ‘notícias,
informação. Salvo em casos óbvios ou que me pareciam óbvios, reportagens e informação’, grosso modo, telejornais e equiparados,
quase nunca consegui perceber porque é que essa corrente se forma pode inferir-se que notícias culturais que constem dos telejornais
ou não. ­parecem ter um potencial de divulgação elevado, desde que não
No tempo em que os espetáculos ou os filmes estavam em car- ­agastem ­espectadores. O que acontece, mesmo na estação de televi-
taz várias semanas, era mais fácil que o «boca a orelha» funcionasse. são pública, é remeter as notícias culturais para programas próprios,
Já não é assim. Por razões várias, os espetáculos e concertos de em horários de menor audiência do que os longos serviços noti-
música geralmente têm uma ou duas apresentações. No teatro, em ciosos. Não me parece ser a orientação mais adequada se se quer
certo tipo de teatro chamado «não comercial», as carreiras são um atrair pessoas para as práticas culturais. Julgo que os telejornais
pouco mais longas sobretudo quando ocorrem nas salas das próprias deviam ter, na sua estrutura diária, um tempo dedicado à vida cul-
companhias Têm, por isso – e é o que geralmente se faz, sobretudo tural.
no caso de espetáculos ou festivais de música que visam interessar
muitos milhares de pessoas –, de ser anunciados com antecedência
e com a informação que possa suscitar a curiosidade e o desejo. Os Síntese conclusiva
promotores apostam muito na informação antecipada nos meios de
comunicação. Mas nem sempre o conseguem porque é larga a oferta Ao longo da minha vida profissional verifiquei que as decisões de
nacional e escassa a atenção que os media dão a acontecimentos cul- política cultural, como as de programação, se baseavam em convic-
turais. ções não alicerçadas num conhecimento rigoroso da realidade, antes
Usam-se os meios que se consegue controlar como as redes numa opinião intuitiva resultante de impressões próprias confronta-
sociais online, citadas por 16% dos respondentes quanto aos livros das ou não com outras.
que leram e por 23% nas outras práticas. Outras formas de divulga- Ao contrário de outros domínios da atividade humana, no nosso
ção pela Internet são mencionadas por 10% dos leitores de livros e país a cultura não beneficia de estudos que, com rigor científico,
14% dos que acederam a outras práticas. retratem a realidade e possam confortar previsões de futuro em
São muito poucos os respondentes que dizem tomar conheci- consequência de ações que se pratiquem. Muitas vezes senti – no
mento dos acontecimentos culturais através do website dos promo- domínio da programação e gestão culturais, ou quando me pediam a
tores ou dos espaços (4%). opinião sobre política – que estava no meio de uma escuridão ou de
Tal não invalida que a Internet não seja um meio poderoso de um cerrado nevoeiro. Parecia-me que podia ou devia ser dada certa
divulgação de exposições, espetáculos, etc. Só que o manejamento orientação, mas desconhecia a probabilidade de essa orientação ter as
das ferramentas de marketing digital exige, para dele se tirar o melhor consequências que desejava. Os ensinamentos que retirava de estu-
proveito, formação específica e conhecimentos especializados fora dos de sociologia e economia da cultura realizados no estrangeiro
do alcance da esmagadora maioria dos espaços ou promotores. apontavam para certas direções, mas não era possível saber se a extra-
A publicidade na fachada ou os anúncios na comunicação polação para Portugal do conhecimento gerado noutros países era
social são referidos, em ambos os casos, por 10% dos inquiridos possível e até que ponto era possível.

380 381
Práticas Culturais dos Portugueses Algumas notas sobre práticas, política e programação culturais

Agora, no domínio das práticas culturais, em resultado do Inqué- Referências bibliográficas


rito, já não é assim. Temos um retrato bastante pormenorizado da
nossa realidade e que permite o confronto com o de outras. Beck-Domzalska, Marta, ed. 2019. Eurostat. Culture Statistics. Cidade do Luxem-
Ao longo deste texto, e sem as competências que uma formação burgo: Publications Office of the European Union. Disponível em https://
em sociologia me poderia dar, tentei selecionar informação retirada ec.europa.eu/eurostat/documents/3217494/10177894/KS-01-19-712-EN-N.
das respostas ao Inquérito que demonstrassem a sua utilidade para a pdf/915f828b-daae-1cca-ba54-a87e90d6b68b.
Eurostat. 2015. Survey on Income and Living Conditions (EU-SILC ad hoc module
definição de políticas e de programações.
on Cultural and social participation).
A informação que o Inquérito disponibiliza é imensa. O que Neves, José Soares. 2011. «Práticas de leitura da população portuguesa no início do
aproveitei é pouco. Muito mais se pode analisar. O meu objetivo é século xxi». Tese de doutoramento em Sociologia da Comunicação, da Cultura e
tão-só mostrar a utilidade dessa informação para o desenho de polí- da Educação, Lisboa, Escola de Sociologia e Políticas Públicas, Iscte-IUL.
ticas culturais e de algumas decisões de programação.

382 383
ANEXOS
Anexo 1

Mapeamento
dos inquéritos internacionais
mais utilizados

387
INQUÉRITOS MAIS UTILIZADOS NA CONSTRUÇÃO DO QUESTIONÁRIO
DO INQUÉRITO ÀS PR ÁTICAS CULTUR AIS DOS PORTUGUESES
Práticas Culturais dos Portugueses

388
Anexo 2

Questionário

389
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* APENAS PARA QUEM USA A INTERNET [SE P1A=1]

P.3A - DOS SEGUINTES EQUIPAMENTOS DE ACESSO À INTERNET QUAIS OS QUE USA


HABITUALMENTE?
(LER E REGISTAR TODAS AS QUE SE APLIQUEM)

ESTÁ A PARTICIPAR NUM ESTUDO SOBRE PRÁTICAS CULTURAIS DOS PORTUGUESES, REALIZADO PELO INSTITUTO DE COMPUTADOR PESSOAL FIXO/DESKTOP ............................................................ 01

CIÊNCIAS SOCIAIS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA, FINANCIADO PELA FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN. SE TEM COMPUTADOR PESSOAL PORTÁTIL .................................................................. 02
15 OU MAIS ANOS DE IDADE GOSTARÍAMOS DE O/A ENTREVISTAR PARA SABER AS SUAS OPINIÕES E PRÁTICAS
TABLET (EX: IPAD OU ANDROID)................................................................... 03
CULTURAIS. AS SUAS RESPOSTAS SERÃO TRATADAS INFORMATICAMENTE COM AS DE CENTENAS DE OUTROS
SMARTPHONE (EX: IPHONE OU ANDROID) ........................................................ 04
ENTREVISTADOS GARANTINDO-SE, DESSE MODO, A SUA CONFIDENCIALIDADE.
LEITOR DE LIVROS DIGITAIS (E-BOOKS) (EX: KINDLE, KOBO, ETC) .......................... 05

PLACA/ USB 3G/4G PARA ACESSO À INTERNET MÓVEL ....................................... 06

CONSOLA DE JOGOS (EX: XBOX, PLAYSTATION, NINTENDO SWITCH) ....................... 07

A. INTERNET E CONSUMOS CULTURAIS TELEVISÃO SMARTTV (COM SISTEMA OPERATIVO E APLICAÇÕES)............................. 08

NÃO SABE (NÃO LER) ................................................................................. 98

NESTA SECÇÃO VAMOS COLOCAR-LHE ALGUMAS QUESTÕES SOBRE O MODO COMO ACEDE E COMO NÃO RESPONDE (NÃO LER) .......................................................................... 99
UTILIZA A INTERNET.

* APENAS PARA QUEM USA A INTERNET [SE P1A=1]


P.1A - É UTILIZADOR DA INTERNET?
P.4A - PENSANDO NOS ÚLTIMOS 12 MESES, COM QUE FREQUÊNCIA SE LIGOU À INTERNET
SIM....................................................01 PASSAR PARA P.3A PARA TRABALHO/ESTUDO OU LAZER?
NÃO…………………………………………………02 PASSAR PARA P.2A E DE SEGUIDA PARA A PRÓXIMA SECÇÃO (MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA PARA CADA ITEM)

UMA OU VÁRIAS UMA OU VÁRIAS UMA OU VÁRIAS


DIARIA VEZES POR SEMANA, VEZES POR MÊS, MAS VEZES POR ANO,
*APENAS PARA QUEM NÃO USA A INTERNET [SE P1A=2] NUNCA NS NR
MENTE MAS NÃO TODOS OS NÃO TODAS AS MAS NÃO TODOS
DIAS SEMANAS OS MESES
P.2A - QUAIS AS PRINCIPAIS RAZÕES PARA NÃO USAR A INTERNET? 1) TRABALHO OU
(MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS) 05 04 03 02 01 98 99
ESTUDO

2) LAZER 05 04 03 02 01 98 99
FALTA DE INTERESSE/NÃO VÊ UTILIDADE ................................................. 01

NÃO SABE COMO USAR/SENTE-SE CONFUSO COM A TECNOLOGIA ..................... 02

NÃO TEM ACESSO A UM COMPUTADOR OU À INTERNET ................................. 03 *APENAS SE USA A INTERNET DIARIAMENTE OU UMA OU VÁRIAS VEZES POR SEMANA PARA TRABALHO OU ESTUDO
[SE P4A ALÍNEA 1=05 OU 04]
MUITO CARO ................................................................................... 04
P.5Aa - EM MÉDIA QUANTAS HORAS POR SEMANA ESTÁ LIGADO À INTERNET PARA
NÃO TEM TEMPO .............................................................................. 05 TRABALHO OU ESTUDO? E POR LAZER?

OUTRA. QUAL? ............................................................................... 97 1) PARA TRABALHO OU ESTUDO ........................................................|_____||_____| HORAS


NÃO SABE ...................................................................................... 98 NÃO SABE .............................................................................................. 98
NÃO RESPONDE................................................................................ 99 NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99

PASSAR PARA A INTRODUÇÃO ANTES DA P1B

390 391
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

*APENAS SE USA A INTERNET DIARIAMENTE OU UMA OU VÁRIAS VEZES POR SEMANA POR LAZER 10) PARTILHAR CONTEÚDOS
[SE P4A ALÍNEA 2=05 OU 04] CULTURAIS (VÍDEOS, MÚSICA,
IMAGENS, OUTROS) CRIADOS 05 04 03 02 01 98 99
PELO PRÓPRIO

P.5Ab - E EM MÉDIA QUANTAS HORAS POR SEMANA ESTÁ LIGADO À INTERNET POR LAZER? 11) INTERAGIR ONLINE EM
TEMAS RELACIONADOS COM
CULTURA (COLOCANDO
2) POR LAZER ..............................................................................|_____||_____| HORAS
MENSAGENS E LIKES EM SÍTIOS 05 04 03 02 01 98 99
NÃO SABE .............................................................................................. 98 DE REDES SOCIAS E OUTROS
GRUPOS VIRTUAIS)
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99

* PARA TODOS QUE USAM INTERNET [SE P1A=1]


* PARA TODOS QUE USAM INTERNET, NOVAMENTE [SE P1A=1]
P.7A - COM QUE FREQUÊNCIA UTILIZA A INTERNET PARA ESTAS OUTRAS ATIVIDADES?
P.6A - QUANDO SE LIGA À INTERNET, COM QUE FREQUÊNCIA REALIZA AS SEGUINTES (LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
ATIVIDADES?
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
UMA OU UMA OU UMA OU
VÁRIAS VEZES VÁRIAS VEZES VÁRIAS VEZES
DIARIA
POR SEMANA, POR MÊS, MAS POR ANO, MAS NUNCA NS NR
MENTE
UMA OU UMA OU MAS NÃO TODOS NÃO TODAS AS NÃO TODOS OS
UMA OU
VÁRIAS VEZES VÁRIAS OS DIAS SEMANAS MESES
VÁRIAS VEZES
DIARIA POR SEMANA, VEZES POR 1) LER SITES DE
POR MÊS, MAS NUNCA NS NR
MENTE MAS NÃO ANO, MAS NOTÍCIAS (NÃO INCLUI 05 04 03 02 01 98 99
NÃO TODAS AS
TODOS OS NÃO TODOS JORNAIS E REVISTAS)
SEMANAS
DIAS OS MESES
1) PROCURAR INFORMAÇÃO 2) LER NA WIKIPÉDIA OU
SOBRE MUSEUS, GALERIAS, DE 05 04 03 02 01 98 99 OUTRAS ENCICLOPÉDIAS 05 04 03 02 01 98 99
ARTE, SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS ONLINE

2) PROCURAR INFORMAÇÃO
3) LER E/OU ESCREVER
SOBRE BIBLIOTECAS E 05 04 03 02 01 98 99
05 04 03 02 01 98 99 BLOGUES
ARQUIVOS

4) LER E/OU ESCREVER


3) PROCURAR INFORMAÇÃO
CRÍTICAS (TRIPADVISOR, 05 04 03 02 01 98 99
SOBRE LIVROS, MÚSICA,
05 04 03 02 01 98 99 AMAZON, ETC.)
CINEMA E ESPETÁCULOS

4) VER ESPETÁCULOS A PARTIR 5) PROCURAR


DA INTERNET (CONCERTOS, INFORMAÇÕES PRECISAS
05 04 03 02 01 98 99 (SIGNIFICADO DE 05 04 03 02 01 98 99
TEATRO, DANÇA, ETC.)
PALAVRAS, FATOS
5) ACEDER A BIBLIOTEACAS OU HISTÓRICOS, ETC.)
ARQUIVOS VIRTUAIS 05 04 03 02 01 98 99

6) COMPRAR OU RESERVAR
ENTRADAS PARA CINEMA,
* PARA TODOS QUE USAM INTERNET [SE P1A=1]
05 04 03 02 01 98 99
CONCERTOS, TEATRO, MUSEUS
P.8A - GOSTARIA AGORA DE SABER ATÉ QUE PONTO A PANDEMIA MUDOU OS SEUS HÁBITOS
7) OUVIR MÚSICA A PARTIR DA DE USO DE SERVIÇOS DIGITAIS E DA INTERNET NO DOMÍNIO CULTURAL. PEDIA-LHE QUE
INTERNET (ATRAVÉS DE ME DISSESSE SE, PARA CADA UMA DAS SEGUINTES ATIVIDADES, COMEÇOU A USAR A
QUALQUER SERVIÇO DE 05 04 03 02 01 98 99 INTERNET, PASSOU A USAR MAIS, MANTEVE O USO HABITUAL, PASSOU A USAR MENOS,
STREAMING COMO O SPOTIFY) DEIXOU DE USAR OU NÃO USOU.
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
8) COMPRAR OU DESCARREGAR
MÚSICA 05 04 03 02 01 98 99

9) VER, COMPRAR OU COMEÇOU A PASSOU A MANTEVE PASSOU A DEIXOU DE NS NR


USAR USAR O USO USAR USAR/ NÃO
DESCARREGAR FILMES OU 05 04 03 02 01 98 99
INTERNET MAIS MENOS USOU
SÉRIES
1) VER ESPETÁCULOS DE DANÇA
05 04 03 02 01 98 99

392 393
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

COMEÇOU A PASSOU A MANTEVE PASSOU A DEIXOU DE NS NR B. AUDIOVISUAIS: TELEVISÃO E RÁDIO


USAR USAR O USO USAR USAR/ NÃO
INTERNET MAIS MENOS USOU
2) VER ESPETÁCULOS DE TEATRO 05 04 03 02 01 98 99 NESTA SECÇÃO VAMOS COLOCAR-LHE ALGUMAS QUESTÕES SOBRE OS SEUS CONSUMOS DE TELEVISÃO
3) VER ESPETÁCULOS DE MÚSICA E DE RÁDIO.
05 04 03 02 01 98 99
4) VISITAR SITES DE MUSEUS, * PARA TODOS
MONUMENTOS HISTÓRICOS,
SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS E 05 04 03 02 01 98 99 P.1B - COM QUE FREQUÊNCIA VÊ TELEVISÃO (CANAIS TDT, POR SATÉLITE E POR CABO)?
GALERIAS DE ARTE (LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)

5) VISITAR SITES DE BIBLIOTECAS DIARIAMENTE .......................................................................................................... 01


E ARQUIVOS 05 04 03 02 01 98 99
UMA OU VÁRIAS VEZES POR SEMANA, MAS NÃO TODOS OS DIAS………. ...................................... 02
6) LER LIVROS, JORNAIS E
REVISTAS ONLINE 05 04 03 02 01 98 99 UMA OU VÁRIAS VEZES POR MÊS, MAS NÃO TODAS AS SEMANAS ............................................... 03
7) VER FILMES E SÉRIES UMA OU VÁRIAS VEZES POR ANO, MAS NÃO TODOS OS MESES .................................................. 04
05 04 03 02 01 98 99

NUNCA...................................................................................................................05
 IR PARA P.5B

NÃO SABE (NÃO LER) ................................................................................................. 98


 IR PARA P.5B

NÃO RESPONDE (NÃO LER) ........................................................................................... 99


 IR PARA P.5B

[SE P1B=01 A 04]


P.2B - QUAL O PRINCIPAL DISPOSITIVO ONDE HABITUALMENTE VÊ TELEVISÃO?
(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)

APARELHO DE TELEVISÃO ............................................................................................. 01

COMPUTADOR OU TABLET ............................................................................................. 02

TELEMÓVEL .............................................................................................................. 03

OUTRO(S) EQUIPAMENTO(S). QUAIS? _________________________ ............................... 97

NÃO SABE (NÃO LER) ................................................................................................. 98

NÃO RESPONDE (NÃO LER) ........................................................................................... 99

*APENAS PARA QUEM VÊ TELEVISÃO DIARIAMENTE OU VÁRIAS VEZES POR SEMANA [SE P1B=01 OU 02]

P.3B - DIGA-ME, POR FAVOR, EM MÉDIA, QUANTAS HORAS COSTUMA VER TELEVISÃO NUM
DIA TÍPICO DE SEMANA? E NUM DIA DE FIM-DE-SEMANA?

1) DIA DE SEMANA (EXCETO FERIADOS) .................................................|_____||_____| HORAS

NÃO SABE .............................................................................................. 98

NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99

2) DIA DE FIM-DE-SEMANA .................................................................|_____||_____| HORAS

NÃO SABE .............................................................................................. 98

NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99

394 395
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* DE NOVO PARA TODOS OS QUE VEEM TELEVISÃO [SE P1B=01 A 04] NUNCA...................................................................................................05 IR PARA P10B

P.4B - DA SEGUINTE LISTA DE PROGRAMAS TELEVISIVOS, INDIQUE QUAIS OS QUE NÃO SABE ...............................................................................................98 IR PARA P10B
HABITUALMENTE VÊ:
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS) NÃO RESPONDE.........................................................................................99 IR PARA P10B

PROGRAMAS DESPORTIVOS (JOGOS, NOTÍCIAS, DEBATES, ETC.) .............................. 01


*APENAS PARA QUEM OUVE RÁDIO DIARIAMENTE OU VÁRIAS VEZES POR SEMANA [SE P5B=01 OU 02]
PROGRAMAS DE ENTRETENIMENTO (REALITY SHOWS, TALK SHOWS, HUMOR, ETC.) ....... 02
P.6B - DIGA-ME, POR FAVOR, EM MÉDIA, QUANTAS HORAS COSTUMA OUVIR RÁDIO NUM
CONCURSOS DE CULTURA GERAL (EX: QUEM QUER SER MILIONÁRIO, MENTAL SAMURAI).. 03 DIA TÍPICO DE SEMANA? E NUM DIA DE FIM-DE-SEMANA?

OUTROS CONCURSOS (EX: PREÇO CERTO, GOT TALENT PORTUGAL, ETC.) ................... 04
1) DIA DE SEMANA (EXCETO FERIADOS) .................................................|_____||_____| HORAS
TELENOVELAS (PORTUGUESAS OU ESTRANGEIRAS) .............................................. 05
NÃO SABE .............................................................................................. 98
CONCERTOS DE MÚSICA CLÁSSICA .................................................................. 06
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99
CONCERTOS DE MÚSICA POPULAR ................................................................... 07
2) DIA DE FIM-DE-SEMANA. ................................................................|_____||_____| HORAS
OUTROS PROGRAMAS DE MÚSICA ................................................................... 08
NÃO SABE .............................................................................................. 98
SÉRIES…. ............................................................................................... 09
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99
FILMES. ................................................................................................. 10

TEATRO ................................................................................................. 11
* DE NOVO PARA TODOS OS QUE OUVEM RÁDIO [SE P5B=01 A 04]
OUTROS PROGRAMAS DE ARTES CÉNICAS (CIRCO, ÓPERA, ETC.) ............................. 12
P.7B - ONDE OUVE HABITUALMENTE RÁDIO?
DESENHOS ANIMADOS OU OUTROS PROGRAMAS INFANTIS ...................................... 13 (MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

NOTÍCIAS, REPORTAGENS E INFORMAÇÃO ......................................................... 14 CARRO ................................................................................................... 01


DEBATES (PRÓS E CONTRAS, CIRCULATURA DO QUADRADO, EIXO DO MAL) ................. 15 CASA ..................................................................................................... 02
PROGRAMAS DE ENTREVISTA (EX: ALTA DEFINIÇÃO, GRANDE ENTREVISTA) ................. 16 LOCAL DE TRABALHO .................................................................................. 03
PROGRAMAS RELACIONADOS COM LIVROS E LEITURA ............................................ 17 RUA/ PARQUES PÚBLICOS ............................................................................ 04
OUTROS PROGRAMAS CULTURAIS ................................................................... 18 TRANSPORTES PÚBLICOS ............................................................................. 05
DOCUMENTÁRIOS ...................................................................................... 19 OUTROS LOCAIS. INDICAR _________________________ ............................. 97
MISSA OU OUTROS PROGRAMAS RELIGIOSOS ..................................................... 20
[SE P5B=01 A 04]
OUTRO (S). INDICAR _________________________ ................................... 97
P.8B - QUAIS OS PRINCIPAIS DISPOSITIVOS ONDE OUVE RÁDIO?
NÃO SABE .............................................................................................. 98
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99
APARELHO DE RÁDIO TRADICIONAL ................................................................. 01

RÁDIO DO CARRO ...................................................................................... 02


* PARA TODOS
COMPUTADOR OU TABLET, ATRAVÉS DA INTERNET ............................................... 03
P.5B - COM QUE FREQUÊNCIA OUVE RÁDIO?
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) TELEMÓVEL .............................................................................................. 04

DIARIAMENTE .......................................................................................... 01 LEITOR DE MP3 ........................................................................................ 05

UMA OU VÁRIAS VEZES POR SEMANA, MAS NÃO TODOS OS DIAS………. ...................... 02 OUTROS DISPOSITIVOS. QUAIS? _________________________ ...................... 97

UMA OU VÁRIAS VEZES POR MÊS, MAS NÃO TODAS AS SEMANAS ............................... 03 NÃO SABE ............................................................................................... 98

UMA OU VÁRIAS VEZES POR ANO, MAS NÃO TODOS OS MESES .................................. 04 NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99

396 397
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

[SE P5B=01 A 04] C. LEITURA E BIBLIOTECAS


P.9B - DA SEGUINTE LISTA DE PROGRAMAS DE RÁDIO, INDIQUE QUAIS OS QUE
HABITUALMENTE OUVE:
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

* PARA TODOS
DESPORTO (RELATOS DE FUTEBOL, NOTÍCIAS, DEBATES) ....................................... 01
* PARA QUEM NÃO USA A INTERNET [SE P1A=2], NAS ALÍNEAS 2, 4 E 6 CARREGAR AUTOMATICAMENTE “NUNCA”
NOTÍCIAS E INFORMAÇÃO ............................................................................ 02 (CÓD. 01)

PROGRAMAS DE ENTRETENIMENTO.................................................................. 03 NESTA SECÇÃO VAMOS COLOCAR-LHE ALGUMAS QUESTÕES SOBRE OS SEUS HÁBITOS DE LEITURA E O
USO DE BIBLIOTECAS.
MÚSICA CLÁSSICA...................................................................................... 04
P.1C - GOSTARIA DE SABER COM QUE FREQUÊNCIA NOS ÚLTIMOS 12 MESES LEU LIVROS,
MÚSICA POPULAR ...................................................................................... 05 REVISTAS E JORNAIS, SEJA EM FORMATO IMPRESSO OU DIGITAL
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
OUTROS PROGRAMAS DE MÚSICA ................................................................... 06

PROGRAMAS RELACIONADOS COM LIVROS E LEITURA ........................................... 07


UMA OU VÁRIAS UMA OU UMA OU VÁRIAS
OUTROS PROGRAMAS CULTURAIS ................................................................... 08 DIARIA VEZES POR SEMANA, VÁRIAS VEZES POR VEZES POR ANO,
NUNCA NS NR
MENTE MAS NÃO TODOS OS MÊS, MAS NÃO MAS NÃO TODOS OS
TERTÚLIAS (EX. MANHÃS DA COMERCIAL, CAFÉ DA MANHÃ, ETC.) ........................... 09 DIAS TODAS AS SEMANAS MESES
1) LIVROS
PROGRAMAS COM ENTREVISTAS, PERFORMANCES, ETC. ......................................... 10 IMPRESSOS 05 04 03 02 01 98 99

MISSA OU OUTROS PROGRAMAS RELIGIOSOS ..................................................... 11 2) LIVROS EM


FORMATO DIGITAL
05 04 03 02 01 98 99
OUTRO(S). INDICAR .................................................................................. 97 (E-BOOKS)

NÃO SABE .............................................................................................. 98 3) REVISTAS


IMPRESSAS 05 04 03 02 01 98 99
NÃO RESPONDE ……………………………………………………………………………… ...... 99
4) REVISTAS EM
FORMATO DIGITAL 05 04 03 02 01 98 99

* PARA TODOS, NOVAMENTE 5) JORNAIS


IMPRESSOS 05 04 03 02 01 98 99
P.10B - GOSTARIA AGORA DE SABER ATÉ QUE PONTO A PANDEMIA MUDOU OS SEUS
6) JORNAIS EM
HÁBITOS DE VER TELEVISÃO E OUVIR RÁDIO. NUM CASO E NOUTRO PEDIA-LHE QUE ME FORMATO DIGITAL 05 04 03 02 01 98 99
DISSESSE SE, COMEÇOU A USAR, PASSOU A USAR MAIS, MANTEVE O USO HABITUAL,
PASSOU A USAR MENOS, DEIXOU DE USAR OU NÃO USOU.
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
* QUEM REFERE NUNCA, NÃO SABE OU NÃO RESPONDE EM TODAS AS ALÍNEAS PASSA PARA A SECÇÃO SEGUINTE

COMEÇOU A PASSOU A MANTEVE O PASSOU A USAR DEIXOU DE USAR/


NS NR
USAR USAR MAIS USO MENOS NÃO USOU
* APENAS PARA QUEM NUNCA LEU LIVROS IMPRESSOS NOS ÚLTIMOS 12 MESES [SE P1C_1=01]
1) VER
TELEVISÃO 05 04 03 02 01 98 99 P.2C - POR QUE RAZÃO NOS ÚLTIMOS 12 MESES NUNCA LEU LIVROS IMPRESSOS?
(MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
2) OUVIR
RÁDIO 05 04 03 02 01 98 99
PREFIRO DEDICAR-ME A OUTRAS ATIVIDADES..................................................... 01

POR FALTA DE TEMPO ................................................................................ 02

POR FALTA DE DINHEIRO ............................................................................ 03

PORQUE CONSIDERO A LEITURA UMA ATIVIDADE ABORRECIDA ................................. 04

PORQUE TENHO OUTRAS FORMAS DE ME ENTRETER E MANTER INFORMADO ................ 05

PORQUE NÃO EXISTEM LIVRARIAS OU BIBLIOTECAS PERTO DO SÍTIO ONDE VIVO ........... 06

398 399
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

PORQUE PREFIRO LER LIVROS EM FORMATO DIGITAL (E-BOOKS) .............................. 07 POR FALTA DE TEMPO ..................................................................... .....................06

OUTRA RAZÃO. QUAL? ............................................................................... 97 POR FALTA DE DINHEIRO ................................................................. .....................07

NÃO SABE ............................................................................................... 98 PORQUE CONSIDERO A LEITURA UMA ATIVIDADE ABORRECIDA ...................... .....................08

NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99 PORQUE TENHO OUTRAS FORMAS DE ME ENTRETER E MANTER INFORMADO .......................... 09

OUTRA RAZÃO. QUAL ........................................................................................... 97

* APENAS PARA QUEM LEU LIVROS IMPRESSOS NOS ÚLTIMOS 12 MESES [SE P1C_1=05 A 02] NÃO SABE ......................................................................................................... 98
P.3C - NOS ÚLTIMOS 12 MESES, APROXIMADAMENTE QUANTOS LIVROS LEU EM FORMATO
NÃO RESPONDE .................................................................................................. 99
IMPRESSO?

Resposta: |_____||_____|

NÃO SABE (NÃO LER) ............................................................................... 98 * APENAS PARA QUEM LEU LIVROS EM FORMATO DIGITAL NOS ÚLTIMOS 12 MESES [SE P1C_2=05 A 02]
P.6C - NOS ÚLTIMOS 12 MESES, APROXIMADAMENTE QUANTOS LIVROS DIGITAIS (E-BOOKS)
NÃO RESPONDE (NÃO LER) ........................................................................ 99 LEU?

Resposta: |_____||_____|
* APENAS PARA QUEM LEU LIVROS IMPRESSOS NOS ÚLTIMOS 12 MESES [SE P1C_1=05 A 02]
NÃO SABE (NÃO LER) ............................................................................... 98
P.4C - PENSE NAS FORMAS ATRAVÉS DAS QUAIS TEM ACESSO A LIVROS IMPRESSOS. COM
NÃO RESPONDE (NÃO LER) ........................................................................ 99
QUE FREQUÊNCIA...
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)

* APENAS PARA QUEM LEU LIVROS EM FORMATO DIGITAL NOS ÚLTIMOS 12 MESES [SE P1C_2=05 A 02]

3 OU MAIS P.7C - PENSE NAS FORMAS ATRAVÉS DAS QUAIS TEM ACESSO A LIVROS DIGITAIS (E-
UMA VEZ
VEZES POR ANO, 1 OU 2 BOOKS). COM QUE FREQUÊNCIA...
POR MÊS OU NUNCA NS NR
MAS NÃO TODOS VEZES POR ANO (LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
MAIS
OS MESES

1) COMPRA UM LIVRO 04 03 02 01 98 99
UMA VEZ 3 OU MAIS VEZES
2) PEDE UM LIVRO 1 OU 2
04 03 02 01 98 99 POR MÊS OU POR ANO, MAS NÃO NUNCA NS NR
EMPRESTADO A ALGUÉM VEZES POR ANO
MAIS TODOS OS MESES

3) REQUISITA UM LIVRO NUMA 1) COMPRA UM E-BOOK ATRAVÉS DE


04 03 02 01 98 99 UM WEBSITE OU LIVRARIA ONLINE 04 03 02 01 98 99
BIBLIOTECA

4) FAZ FOTOCÓPIAS DE LIVROS


04 03 02 01 98 99 2) FAZ DESCARGA GRATUITA DE E-
ACADÉMICOS OU TÉCNICOS
BOOKS
04 03 02 01 98 99

5) FAZ FOTOCÓPIAS DE OUTRO


04 03 02 01 98 99 3) REQUISITA E-BOOKS NUMA
TIPO DE LIVROS
BIBLIOTECA
04 03 02 01 98 99

4) RECORRE A SERVIÇOS DE TROCA


* APENAS PARA QUEM NUNCA LEU LIVROS DIGITAIS NOS ÚLTIMOS 12 MESES [SE P1C_2=01] DE E-BOOKS EM BLOGUES OU REDES 04 03 02 01 98 99
SOCIAIS
P.5C - POR QUE RAZÃO NOS ÚLTIMOS 12 MESES NUNCA LEU LIVROS DIGITAIS (E-BOOKS)?
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

NÃO SEI O QUE É ................................................................................................ 01

NÃO SEI ONDE ENCONTRAR LIVROS DIGITAIS (E-BOOKS) QUE ME INTERESSEM ....................... 02

NÃO TENHO UM DISPOSITIVO DIGITAL APROPRIADO PARA O LER DE FORMA AGRADÁVEL ............ 03

PORQUE PREFIRO LER LIVROS IMPRESSOS ................................................................... 04

PREFIRO DEDICAR-ME A OUTRAS ATIVIDADES.......................................... .....................05

400 401
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* PARA TODOS QUE LERAM LIVROS IMPRESSOS OU DIGITAIS NOS ÚLTIMOS 12 MESES POESIA .................................................................................................................... 04
[SE P1C_1 E P1C_2=05 A 02]
CONTOS........................ ........................................................................................... 05
P.8C - DIGA-ME, AGORA, COM QUE OBJETIVO LÊ MAIS FREQUENTEMENTE?
(LER, MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) ROMANCE ................................................................................................................. 06

ENSAIOS ................................................................................................................... 07
PARA ESTUDAR / REALIZAR TRABALHOS ESCOLARES, ACADÉMICOS ........................................... 01
HISTÓRIA................................................................................................................. 08
PARA O EXERCÍCIO DA PROFISSÃO ................................................................................. 02
TÉCNICO OU CIENTÍFICO (CIÊNCIAS EXATAS OU SOCIAIS E HUMANAS) ........................................ 09
POR PRAZER ........................................................................................................... 03
DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA.............................................................................. ................ 10
PARA ESTAR A PAR DOS ACONTECIMENTOS ATUAIS .............................................................. 04
FICÇÃO CIENTÍFICA ...................................................................................................... 11
PARA PESQUISAR TEMAS ESPECÍFICOS NOS QUAIS ESTÁ INTERESSADO(A) ................................... 05
ARTE ...................................................................................................................... 12
PARA CONTAR HISTÓRIAS A FILHOS OU OUTROS FAMILIARES MENORES ..................................... 06
CULINÁRIA, DECORAÇÃO OU JARDINAGEM ........................................................................... 13
OUTRO(S). INDICAR_______________________________ .......................................... 07
VIAGENS / FÉRIAS ...................................................................................................... 14
NÃO SABE (NÃO LER) ................................................................................................. 98
TEATRO.................................................................................................................... 15
NÃO RESPONDE (NÃO LER) .......................................................................................... 99
CRIME, THRILLERS OU MISTÉRIO ...................................................................................... 16

AUTO/BIOGRAFIAS ....................................................................................................... 17
* PARA TODOS QUE LERAM LIVROS IMPRESSOS OU DIGITAIS NOS ÚLTIMOS 12 MESES
[SE P1C_1 E P1C_2=05 A 02] AUTOAJUDA .............................................................................................................. 18
P.9C - EM QUE LOCAIS COSTUMA LER LIVROS IMPRESSOS OU DIGITAIS? OUTRO(S). INDICAR _________________ .................................................................... 97
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
NÃO SABE ……………………………………………………………………………………………………………. 98
CASA .................................................................................................................... 01
NÃO RESPONDE……………………………………………………………………………………………………... 99
ESCOLA / UNIVERSIDADE............................................................................................. 02

LOCAL DE TRABALHO .................................................................................................. 03


* PARA TODOS OS QUE LERAM REVISTAS IMPRESSAS OU EM FORMATO DIGITAL NOS ÚLTIMOS 12 MESES
BIBLIOTECA ............................................................................................................. 04 [SE P1C_3 E/OU P1C_4=05 A 02]
CAFÉS .................................................................................................................... 05 P.11C - DOS SEGUINTES GÉNEROS DE REVISTAS, EM FORMATO IMPRESSO OU DIGITAL,
DIGA-ME, POR FAVOR, QUAIS OS QUE LEU COM MAIS FREQUÊNCIA, NOS ÚLTIMOS 12
TRANSPORTES PÚBLICOS ............................................................................................. 06
MESES?
RUA/PARQUES PÚBLICOS ............................................................................................ 07 (RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

OUTRO(S). INDICAR_______________________________ .......................................... 08


BANDA DESENHADA .................................................................................................... 01
NÃO SABE ............................................................................................................... 98
TEMAS POLÍTICOS, FILOSÓFICOS OU RELIGIOSOS................................................................. 02
NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99
TÉCNICO OU CIENTÍFICO (CIÊNCIAS EXATAS OU SOCIAIS E HUMANAS) ....................................... 03

CULTURA / ARTE / ANTIGUIDADES / LIVROS / LITERATURA / FOTOGRAFIA ................................ 04


* PARA TODOS QUE LERAM LIVROS IMPRESSOS OU DIGITAIS NOS ÚLTIMOS 12 MESES
DESPORTO / AUTOMÓVEIS ........................................................................................... 05
[SE P1C_1 E P1C_2=05 A 02]
MODA / DECORAÇÃO / CULINÁRIA E ALIMENTAÇÃO .............................................................. 06
P.10C - DOS SEGUINTES GÉNEROS DE LIVROS, EM FORMATO IMPRESSO OU DIGITAL, DIGA-
ME, POR FAVOR, QUAIS OS QUE LEU COM MAIS FREQUÊNCIA, NOS ÚLTIMOS 12 MESES? ERÓTICAS ............................................................................................................... 07
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
MASCULINAS ............................................................................................................ 08
BANDA DESENHADA ...................................................................................................... 01
FEMININAS .............................................................................................................. 09
ESCOLAR / EDUCATIVO ................................................................................................ 02
INTERESSE GERAL ...................................................................................................... 10
INFANTO-JUVENIL........................................................................................................ 03

402 403
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

DINHEIRO / FINANÇAS ............................................................................................... 11 * PARA TODOS NOVAMENTE

GUIAS TV ............................................................................................................... 12 P.13C - PENSE AGORA NA SUA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA ATÉ AOS 15 ANOS. COM QUE
FREQUÊNCIA OS SEUS PAIS OU OUTROS FAMILIARES RESPONSÁVEIS POR SI...
COMPUTADORES E ELETRÓNICA ...................................................................................... 13 (LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
CRIANÇAS E ADOLESCENTES .......................................................................................... 14
FREQUENTE
ALGUMAS VEZES RARAMENTE NUNCA NS NS
ENTRETENIMENTO ...................................................................................................... 15 MENTE

1) LIAM-LHE HISTÓRIAS 04 03 02 01 98 99
MÚSICA .................................................................................................................. 16

VÍDEO / CINEMA ....................................................................................................... 17 2) OFERECIAM-LHE LIVROS 04 03 02 01 98 99

NATUREZA / ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO / VIAGENS E FÉRIAS ..................................................... 18 3) IAM CONSIGO A FEIRAS DO LIVRO 04 03 02 01 98 99

MEXERICOS / CELEBRIDADES ........................................................................................ 19 4) IAM CONSIGO A LIVRARIAS 04 03 02 01 98 99

REVISTAS DE JORNAIS ................................................................................................. 20 5) IAM CONSIGO A BIBLIOTECAS 04 03 02 01 98 99

OUTRO(S). INDICAR ____________________ .......... ………………………………………………..97

NÃO SABE ……………………………………………………………………………………………………………98 * PARA TODOS

NÃO RESPONDE………………………………………………………………………………………………………99 P.14C - DAS SEGUINTES FONTES DE INFORMAÇÃO, INDIQUE AQUELAS A PARTIR DAS QUAIS
OBTÉM RECOMENDAÇÕES OU IDEIAS DE LEITURA.
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
* PARA QUEM LÊ JORNAIS IMPRESSOS OU EM FORMATO DIGITAL [SE P1C_5 E/OU P1C_6=05 A 02]
UMA BIBLIOTECA OU BIBLIOTECÁRIO, INCLUINDO O WEBSITE DA BIBLIOTECA .................................. 01
P.12C - DOS SEGUINTES GÉNEROS DE JORNAIS, EM FORMATO IMPRESSO OU DIGITAL,
UM FAMILIAR, AMIGO OU COLEGA DE TRABALHO ..................................................................... 02
DIGA-ME, POR FAVOR, QUAIS OS QUE LEU COM MAIS FREQUÊNCIA, NOS ÚLTIMOS 12
MESES? UMA LIVRARIA ONLINE .................................................................................................... 03
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
OS FUNCIONÁRIOS DE UMA LIVRARIA QUE VISITA PESSOALMENTE................................................. 04
GENERALISTAS - DIÁRIOS ............................................................................................ 01 A EXPOSIÇÃO NAS PRATELEIRAS DE UMA LIVRARIA QUE VISITA PRESENCIALMENTE ............................. 05
GENERALISTAS - SEMANÁRIOS ....................................................................................... 02 SITES DE REDES SOCIAIS VIRTUAIS ESPECIALIZADOS NA LEITURA/APRECIAÇÃO DE LIVROS ................... 06

ECONÓMICOS ........................................................................................................... 03 COMENTÁRIOS PUBLICADOS POR AMIGOS EM REDES SOCIAIS ...................................................... 07


CRÍTICA DE LIVROS EM JORNAIS OU REVISTAS ........................................................................ 08
DESPORTIVOS ......................................................................................................... 04
OUTRA FONTE. QUAL? _________________________ ..................................................... 97
TEMÁTICOS ............................................................................................................. 05
NÃO SABE ................................................................................................................... 98
REGIONAIS .............................................................................................................. 06
NÃO RESPONDE ............................................................................................................ 99
GRATUITOS ............................................................................................................. 07

OUTRO(S). INDICAR ____________......................... ………………………………………………..97 * PARA TODOS

NÃO SABE .............................................................................................................. 98 P.15C - COM O INÍCIO DA PANDEMIA, EM MARÇO DE 2020, ALGUMAS PRÁTICAS CULTURAIS
PODERÃO TER SIDO PREJUDICADAS. PENSE ENTÃO NOS 12 MESES ANTERIORES AO INÍCIO
NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99 DA PANDEMIA. COM QUE FREQUÊNCIA, NESSES 12 MESES, COSTUMAVA PARTICIPAR NOS
SEGUINTES EVENTOS LITERÁRIOS?
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)

3 OU MAIS VEZES POR


UMA VEZ POR 1 OU 2 VEZES
ANO, MAS NÃO TODOS NUNCA NS NR
MÊS OU MAIS POR ANO
OS MESES
1) FEIRAS DO LIVRO 04 03 02 01 98 99

2) FESTIVAIS
04 03 02 01 98 99
LITERÁRIOS

404 405
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

3) FESTIVAIS DE * PARA QUEM REALIZOU IDA PRESENCIAL A BIBLIOTECA(S) OU ARQUIVO(S) NOS ÚLTIMOS 12 MESES ANTES DO
04 03 02 01 98 99 INÍCIO DA PANDEMIA [SE P16C=01 A 03]
ILUSTRAÇÃO E DE BD

4) CLUBES DO LIVRO P.18C - QUAIS OS PRINCIPAIS MOTIVOS PARA A FREQUÊNCIA DE BIBLOTECA(S) OU


E TERTÚLIAS
04 03 02 01 98 99 ARQUIVO(S) NOS ÚLTIMOS 12 MESES ANTERIORES AO INÍCIO DA PANDEMIA?
(RODANDO A ORDEM DOIS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

* PARA TODOS PARA PESQUISAR NO CATÁLOGO DA BIBLIOTECA E REQUISITAR LIVROS, REVISTAS OU JORNAIS…….....01

P.16C - CONTINUANDO A PENSAR NOS 12 MESES ANTERIORES AO INÍCIO DA PANDEMIA, PARA LER NO LOCAL LIVROS, REVISTAS OU JORNAIS ............................................................. 02
COM QUE FREQUÊNCIA SE DESLOCOU A BIBLIOTECAS OU ARQUIVOS?
(MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) PARA REQUISITAR UM E-READER .................................................................................... 03

PARA LER LIVROS DIGITAIS (E-BOOKS) NUM E-READER NO LOCAL ............................................ 04


UMA VEZ POR SEMANA OU MAIS ...................................................................................... 01 P.18C
PARA UTILIZAR OS COMPUTADORES DA BIBLIOTECA PARA PROCESSAMENTO DE TEXTO ................... 05
UMA OU VÁRIAS VEZES POR MÊS, MAS NÃO TODAS AS SEMANAS ................................................ 02 P.18C
PARA UTILIZAR OS COMPUTADORES DA BIBLIOTECA PARA NAVEGAR NA INTERNET.......................... 06
UMA OU VÁRIAS VEZES POR ANO, MAS NÃO TODOS OS MESES………………………………………………..03 P.18C
PARA UTILIZAR OS COMPUTADORES DA BIBLIOTECA PARA ENVIAR EMAILS .................................. 07
NUNCA ................................................................................................................... 04 P.17C
PARA ESTUDAR/TRABALHAR ......................................................................................... 08
NÃO SABE................................................................................................................ 98 BLOCO D
PARA ENCONTRAR OUTRAS PESSOAS................................................................................ 09
NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99 BLOCO D
PARA ACOMPANHAR UM FILHO OU OUTRO FAMILIAR ............................................................. 10

PARA ASSISTIR A CONFERÊNCIAS, ENCONTROS OU DEBATES ................................................... 11


*APENAS SE NÃO REALIZOU IDA PRESENCIAL A UMA BIBLIOTECA OU ARQUIVO OS ÚLTIMOS 12 MESES ANTES DO OUTRA ATIVIDADE. QUAL? _________________________________________________ 97
INÍCIO DA PANDEMIA [SE P16C=04]
NÃO SABE ………………………………………………………………………………………………………… 98
P.17C - POR QUE RAZÃO, NOS ÚLTIMOS 12 MESES ANTERIORES AO INÍCIO DA PANDEMIA,
NÃO SE DESLOCOU A QUALQUER BIBLIOTECA OU ARQUIVO? NÃO RESPONDE…………………………………………………………………………………………………… 99
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

D. MUSEUS, MONUMENTOS HISTÓRICOS, SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS, GALERIAS DE ARTE


NÃO EXISTE NENHUMA BIBLIOTECA PERTO DO SÍTIO ONDE VIVO .............................................. 01

ARRANJO O QUE QUERO LER POR OUTRA(S) VIA(S) .............................................................. 02

NÃO CONSIDERO AS BIBLIOTECAS ESPAÇOS CONFORTÁVEIS ................................................... 03

A BIBLIOTECA MAIS PERTO DE ONDE VIVO TEM UMA OFERTA DE LIVROS REDUZIDA ....................... 04
* PARA TODOS
A BIBLIOTECA MAIS PERTO DE ONDE VIVO NÃO PERMITE REQUISITAR E-BOOKS ............................ 05
NESTA SECÇÃO VAMOS COLOCAR-LHE ALGUMAS QUESTÕES SOBRE OS SEUS HÁBITOS DE VISITA A
A BIBLIOTECA MAIS PERTO DE ONDE VIVO NÃO TEM O QUE ME INTERESSA...................................06 MUSEUS, MONUMENTOS HISTÓRICOS, SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS E GALERIAS DE ARTE
NÃO TIVE NECESSIDADE .............................................................................................07 P.1D - CONTINUE A PENSAR NOS 12 MESES ANTERIORES AO INÍCIO DA PANDEMIA. COM QUE
FREQUÊNCIA COSTUMAVA REALIZAR CADA UMA DAS SEGUINTES ATIVIDADES?
OUTRA RAZÃO. QUAL? ____________________________________________________ 97 (LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)

NÃO SABE ………………………………………………………………………………………………………… 98

NÃO RESPONDE………………………………………………………….…………………………………………99 3 OU MAIS


1 OU 2
UMA VEZ POR VEZES POR ANO,
VEZES NUNCA NS NR
MÊS OU MAIS MAS NÃO TODOS
POR ANO
OS MESES
1) VISITA UM MUSEU 04 03 02 01 98 99

2) VISITA UM MONUMENTO
04 03 02 01 98 99
HISTÓRICO

406 407
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

3) VISITA UM SÍTIO ARQUEOLÓGICO NÃO SABE (NÃO LER) ..................................................................................................... 98


04 03 02 01 98 99
NÃO RESPONDE (NÃO LER) .............................................................................................. 99
4) VISITA UMA GALERIA DE ARTE 04 03 02 01 98 99 [SE P.2D=01 A 04]

P.5D - DA SEGUINTE LISTA, PODERIA INDICAR QUAIS FORAM OS PRINCIPAIS MOTIVOS QUE
O/A LEVARAM A REALIZAR ESSA VISITA?
*APENAS PARA QUEM INDICOU TER VISITADO UM OU MAIS DOS ESPAÇOS CULTURAIS REFERIDOS (RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
[SE P.1D_1/2/3/4=04 A 02];
OS RESTANTES PASSAM PARA P.10D
A IMPORTÂNCIA HISTÓRICA DO ESPAÇO ............................................................................... 01
P.2D - PENSE AGORA NO MUSEU, MONUMENTO HISTÓRICO, SÍTIO ARQUEOLÓGICO OU A BELEZA DO ESPAÇO E DAS OBRAS EXPOSTAS ........................................................................ 02
GALERIA DE ARTE QUE VISITOU HÁ MENOS TEMPO, MESMO QUE O TENHA VISITADO DEPOIS
A POSSIBILIDADE DE APROFUNDAR O CONHECIMENTO SOBRE O TEMA DA EXPOSIÇÃO/COLEÇÃO ............. 03
DO INÍCIO DA PANDEMIA. QUAL ERA ESSE ESPAÇO?
(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) A PUBLICIDADE (ANÚNCIOS NOS JORNAIS, NEWSLETTER, AGENDA CULTURAL, OUTDOORS) ................. 04
A RECOMENDAÇÃO DE FAMILIARES/AMIGOS/OUTRAS PESSOAS ................................................... 05
VISITA UM MUSEU ..................................................................................................... 01 P.3D
AS OPINIÕES E AS IMAGENS QUE VIU NAS REDES SOCIAIS .......................................................... 06
VISITA UM MONUMENTO HISTÓRICO ................................................................................ 02 P.4D
O WEBSITE DO ESPAÇO ................................................................................................... 07
VISITA UM SÍTIO ARQUEOLÓGICO ................................................................................... 03 P.4D
AS CRÍTICAS DE PROFISSIONAIS ......................................................................................... 08
VISITA UMA GALERIA DE ARTE ....................................................................................... 04 P.4D AS RECOMENDAÇÕES DE GUIAS E ROTEIROS TURÍSTICOS, EM PAPEL E/OU EM FORMATOS DIGITAIS..........09
NÃO SABE (NÃO LER) ................................................................................................. 98 P.10D O CONVÍVIO COM OUTRAS PESSOAS....................................................................................10

NÃO RESPONDE (NÃO LER) .......................................................................................... 99 P.10D OUTRO (S). INDICAR _______________________...........................................................97
NÃO SABE ................................................................................................................... 98
[SE P.2D=01] NÃO RESPONDE ............................................................................................................ 99
P.3D - QUE TIPO DE MUSEU VISITOU?
(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
[SE P.2D=01 A 04]
MUSEU DE CIÊNCIA ........................................................................................................ 01
P.6D - COM QUEM REALIZOU A VISITA?
MUSEU DE ARTE ..................... ..................................................................................... 02 (RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
MUSEU DE HISTÓRIA ..................................................................................................... 03
MUSEU DE ETNOGRAFIA................................................................................................. 04 SÓ …………. ........................................................................................................... 01
MUSEU MULTIDISCIPLINAR .............................................................................................. 05 COM FAMILIARES……………………………………………………………………………………………………02
CASA-MUSEU ............................................................................................................. 06
COM NAMORADO/A E OU AMIGO/S ................................................................................. 03
QUAL? INDICAR ________________________________________ .................................. 07
COM GRUPO DA ESCOLA (VISITA DE ESTUDO)..................................................................... 04
NÃO SABE (NÃO LER) ..................................................................................................... 98
NÃO RESPONDE (NÃO LER)…………………………………………………………………………………...........99 COM OUTRO GRUPO ORGANIZADO (COLETIVIDADE, ASSOCIAÇÃO) ………………………………………….05

OUTRO(S). INDICAR______________________________________________________.97

[SE P.2D=01 A 04] NÃO SABE .............................................................................................................. 98

P.4D - ONDE SE SITUAVA ESSE ESPAÇO? NÃO RESPONDE .................................................... ……………………………………………….. 99


(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)

NO CONCELHO ONDE RESIDE ............................................................................................ 01


NOUTRO CONCELHO DE PORTUGAL..................................................................................... 02
QUAL? INDICAR ________________________________________ .................................. 03
NOUTRO PAÍS DA UNIÃO EUROPEIA .................................................................................... 04
NUM PAÍS FORA DA UNIÃO EUROPEIA .................................................................................. 05

408 409
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

[SE P.2D=01 A 04] * PARA TODOS, NOVAMENTE

P.7D - QUE TIPO DE INGRESSO UTILIZOU? P.10D - DA SEGUINTE LISTA, PODERIA INDICAR AS PRINCIPAIS RAZÕES POR QUE NÃO
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) VISITOU OU NÃO VISITA MAIS VEZES MUSEUS, MONUMENTOS HISTÓRICOS, SÍTIOS
ARQUEOLÓGICOS OU GALERIAS DE ARTE?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
BILHETE NORMAL………………………………………………..01
O PREÇO É ELEVADO ................................................................................................... 01
BILHETE COM ALGUM DESCONTO………………………………02
NÃO HÁ NA MINHA ZONA, SITUAM-SE LONGE DE ONDE VIVO .................................................... 02
PASSE TURÍSTICO ESPECIAL…………………………………….03
ENTROU NUM PERÍODO DE ACESSO GRATUITO ………………04 IR PARA P. 9D ESSES ESPAÇOS NÃO SE DIRIGEM A TODAS AS PESSOAS ......................................................... 03
(DIAS COM ENTRADA LIVRE, NOITE DOS MUSEUS, ETC.)
CIRCULA POUCA INFORMAÇÃO SOBRE A VIDA CULTURAL ......................................................... 04
ESTAVA ISENTO DE PAGAMENTO……………………………… 05 IR PARA P. 9D POR INCAPACIDADE FÍSICA, DIFICULDADES MOTORAS, DEFICIÊNCIA, SURDEZ, CEGUEIRA ................. 05
NÃO SABE…….……………………………………………… ... 98 IR PARA P. 9D
É-ME DIFÍCIL COMPREENDER O QUE VEJO NESSES ESPAÇOS..................................................... 06
NÃO RESPONDE…………………………………..………… ….99 IR PARA P. 9D
FALTA-ME TEMPO ....................................................................................................... 07
[SE P.7D=01 A 03] NÃO TENHO INTERESSE, PREFIRO REALIZAR OUTRAS ATIVIDADES ............................................. 08
P.8D - SE A ENTRADA NÃO FOI GRATUITA, COMO A ADQUIRIU? NÃO TENHO COM QUEM IR ............................................................................................ 09
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
HÁ POUCAS ÁREAS DE DESCANSO .................................................................................... 10

NA BILHETEIRA ......................................................................................................... 01 PREFIRO VISITAR ESSES ESPAÇOS EM SUPORTES DIGITAIS/ WEBSITES E APPS ESPECÍFICOS ............... 11

PELA INTERNET ......................................................................................................... 02 NÃO HÁ ESTACIONAMENTO PRÓXIMO ............................................................................... 12

RESERVA POR TELEFONE E LEVANTAMENTO NA BILHETEIRA ..................................................... 03 FALTAM TRANSPORTES PÚBLICOS ................................................................................... 13

OUTRO(S). INDICAR ______________________________________............................. 97 OUTRO(S). INDICAR __________________________________________________...... 97

NÃO SABE…………………………………………………………………………………………………………… 98 NÃO SABE ……………………………………………………………………………………………………………98

NÃO RESPONDE………………......................................................................................... 99 NÃO RESPONDE………………………………………………………………………………………………………99

* PARA TODOS
[SE P.2D=01 A 04]

P.9D - PODERIA DESCREVER AS ATIVIDADES QUE REALIZOU NESSE MUSEU, MONUMENTO P.11D - DO SEGUINTE CONJUNTO DE ESPAÇOS, PODE INDICAR QUAIS OS QUE VISITOU PELO
HISTÓRICO, SÍTIO ARQUEOLÓGICO OU A GALERIA DE ARTE? MENOS UMA VEZ NA VIDA?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS) (MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

TORRE DE BELÉM DE LISBOA ............................................................................................. 01


VISITA À COLEÇÃO PERMANENTE .................................................................................... 01
MOSTEIRO DOS JERÓNIMOS DE LISBOA ............................................................................... 02
VISITA A UMA COLEÇÃO TEMPORÁRIA .............................................................................. 02
MOSTEIRO DA BATALHA................................................................................................... 03
ATIVIDADES EDUCATIVAS - VISITA ORIENTADA .................................................................. 03
CONVENTO DE CRISTO DE TOMAR ....................................................................................... 04
ATIVIDADES EDUCATIVAS - ATELIÊ, WORKSHOP, OFICINA ...................................................... 04 CENTRO HISTÓRICO DE ÉVORA ........................................................................................ 05
CURSOS, SEMINÁRIOS, COLÓQUIOS, CONFERÊNCIAS ............................................................ 05 MOSTEIRO DE ALCOBAÇA ................................................................................................ 06

ESPETÁCULOS (MÚSICA, TEATRO, DANÇA, PERFORMANCE) .................................................... 06 MONUMENTOS E CENTRO HISTÓRICO DE SINTRA ..................................................................... 07
CENTRO HISTÓRICO DO PORTO ........................................................................................ 08
OUTRAS ATIVIDADES. QUAIS? ___________________________________ ...................... 97
PARQUE ARQUEOLÓGICO DO VALE DO CÔA ............................................................................ 09
NÃO SABE ............................................................................................................... 98
CENTRO HISTÓRICO DE GUIMARÃES ................................................................................... 10
NÃO RESPONDE… ...................................................................................................... 99
UNIVERSIDADE DE COIMBRA ........................................................................................... 11

410 411
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

REAL EDIFÍCIO DE MAFRA (PALÁCIO, BASÍLICA, CONVENTO, JARDIM DO CERCO, TAPADA) .................... 12 * APENAS PARA QUEM ASSISTIU A UM FILME NO CINEMA [SE P.1E=01 A 03]
NÃO SABE ................................................................................................................... 98
P.2E - PENSE AGORA NO ÚLTIMO FILME QUE FOI VER AO CINEMA, MESMO QUE O TENHA
NÃO RESPONDE ............................................................................................................ 99 VISTO DEPOIS DO INÍCIO DA PANDEMIA. QUE GÉNERO DE FILME ERA?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
* PARA TODOS, EXCETO OS QUE NÃO UTILIZAM A INTERNET [SE P1A=1]
COMÉDIA ................................................................................................................ 01
* PARA QUEM NÃO UTILIZA A INTERNET [SE P1A=2], CARREGAR AUTOMATICAMENTE “NUNCA” (CÓD. 01) EM
DRAMA ................................................................................................................... 02
TODAS AS ALÍNEAS

P.12D - DIGA-ME, POR FAVOR, COM QUE FREQUÊNCIA COSTUMA VISITAR MUSEUS, MUSICAL ................................................................................................................. 03
MONUMENTOS HISTÓRICOS, SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS E GALERIAS DE ARTE ATRAVÉS DA AÇÃO .................................................................................................................... 04
INTERNET (VISITAS VIRTUAIS AO ESPAÇO GERAL, VISITA A EXPOSIÇÃO, OUVIR PODCASTS
RELACIONADOS) POLICIAL, ESPIONAGEM ............................................................................................... 05
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
AVENTURA ............................................................................................................... 06
3 OU MAIS VEZES TERROR, SUSPENSE .................................................................................................... 07
1 OU 2
UMA VEZ POR POR ANO, MAS
VEZES NUNCA NS NR
MÊS OU MAIS NÃO TODOS OS
POR ANO
CLÁSSICO ................................................................................................................ 08
MESES
1) VISITAR MUSEUS 04 03 02 01 98 99 FICÇÃO CIENTÍFICA .................................................................................................... 09

2) VISITAR MONUMENTOS HISTÓRICO, BIOGRÁFICO ............................................................................................. 10


04 03 02 01 98 99
HISTÓRICOS
WESTERN ................................................................................................................ 11
3) VISITAR SÍTIOS ANIMAÇÃO, DESENHOS ANIMADOS .................................................................................. 12
04 03 02 01 98 99
ARQUEOLÓGICOS
FILME DE AMOR ......................................................................................................... 13
4) VISITAR GALERIAS DE ARTE 04 03 02 01 98 99
DOCUMENTÁRIO ........................................................................................................ 14

OUTRO(S). INDICAR ______________________________________________________97

NÃO SABE ............................................................ ………………………………………………..98


 IR PARA P.5E
E. CINEMA, ESPETÁCULOS AO VIVO, FESTIVAIS E FESTAS LOCAIS
NÃO RESPONDE ..................................................... ………………………………………………..99
 IR PARA P.5E
* PARA TODOS

NESTA SECÇÃO VAMOS COLOCAR-LHE ALGUMAS QUESTÕES SOBRE IDAS AO CINEMA, ESPETÁCULOS AO [SE P.2E≠98 OU 99]
VIVO, FESTIVAIS E FESTAS LOCAIS.
P.3E - DA SEGUINTE LISTA, PODERIA INDICAR-ME QUAIS FORAM OS PRINCIPAIS MOTIVOS
QUE O/A LEVARAM À ESCOLHA DESSE ÚLTIMO FILME A QUE ASSISTIU NO CINEMA?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
P.1E - COMEÇANDO PELO CINEMA. CONTINUE A PENSAR NOS 12 MESES ANTERIORES AO
INÍCIO DA PANDEMIA. COM QUE FREQUÊNCIA COSTUMAVA ASSISTIR A UM FILME NO
CINEMA? O TEMA DO FILME........................................................................................................................01
(MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
OS ATORES/ REALIZADOR DO FILME ..................................................................................................02

UMA VEZ POR SEMANA OU MAIS ............................................................................ 01 IR PARA P.2E A PUBLICIDADE (INCLUI ANÚNCIOS NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL OU NA INTERNET, NEWSLETTERS,

AGENDA CULTURAL, OUTDOORS, FOLHETOS) .................................................... ....................................03


UMA OU VÁRIAS VEZES POR MÊS, MAS NÃO TODAS AS SEMANAS ...................................... 02 IR PARA P.2E

UMA OU VÁRIAS VEZES POR ANO, MAS NÃO TODOS OS MESES…………………………………….. 03 IR PARA P.2E A RECOMENDAÇÃO DE FAMILIARES, AMIGOS, OUTRAS PESSOAS.............................. ....................................04

NUNCA ......................................................................................................... 04 IR PARA P.5E AS CRÍTICAS PROFISSIONAIS ....................................................................... ....................................05

NÃO SABE.......................................................................................................97 IR PARA P.5E AS OPINIÕES QUE VIU NAS REDES SOCIAIS OU NOUTROS LOCAIS VIA INTERNET ......... ....................................06

NÃO RESPONDE .............................................................................................. 98 IR PARA P.5E OS PRÉMIOS RECEBIDOS OU AS NOMEAÇÕES PARA PRÉMIOS ................................. ....................................07

412 413
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

A SALA ONDE O FILME FOI PROJETADO. .......................................................... ....................................08 OUTRA RAZÃO. INDICAR ___________________________________________________97

O ESPAÇO AO AR LIVRE ONDE O FILME FOI PROJETADO. ...................................... ....................................09 NÃO SABE ............................................................................................................... 98

O CONVÍVIO COM OUTRAS PESSOAS .............................................................. ....................................10 NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99

OUTRO(S). INDICAR _________________________________________________ ..........................97

NÃO SABE ............................................................................................ .....................................98


* PARA TODOS, NOVAMENTE
NÃO RESPONDE ..................................................................................... .....................................99
VAMOS AGORA FALAR SOBRE ESPETÁCULOS E CONCERTOS AO VIVO.

[SE P.2E≠98 OU 99]


P.6E - CONTINUE A PENSAR NOS 12 MESES ANTERIORES AO INÍCIO DA PANDEMIA. COM
P.4E - DIGA-ME, POR FAVOR, COM QUEM FOI VER ESSE FILME AO CINEMA? QUE FREQUÊNCIA COSTUMAVA ASSISTIR AOS SEGUINTES ESPECTÁCULOS?
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

SÓ …………. ........................................................................................................... 01 3 OU MAIS VEZES


1 OU 2
COM FAMILIARES……………………………………………………………………………………………………02 UMA VEZ POR POR ANO, MAS
VEZES NUNCA NS NR
MÊS OU MAIS NÃO TODOS OS
POR ANO
COM NAMORADO/A E OU AMIGO/S ................................................................................. 03 MESES
1) BALLET OU DANÇA CLÁSSICA 04 03 02 01 98 99
COM GRUPO DA ESCOLA (VISITA DE ESTUDO)..................................................................... 04
2) OUTRO TIPO DE DANÇA 04 03 02 01 98 99
COM OUTRO GRUPO ORGANIZADO (COLETIVIDADE, ASSOCIAÇÃO) …....…………………………………..05

OUTRO(S). INDICAR______________________________________________________.97 3) ÓPERA (INCLUI A OPERETA) 04 03 02 01 98 99

4) MÚSICA CLÁSSICA (INCLUI


NÃO SABE .............................................................................................................. 98
SINFÓNICA, CÂMARA, CORAL E 04 03 02 01 98 99
NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99 RECITAL)

5) TEATRO 04 03 02 01 98 99

* PARA TODOS, NOVAMENTE 6) CIRCO 04 03 02 01 98 99


P.5E - PODERIA DIZER-ME POR QUE NÃO FOI, OU NÃO VAI MAIS VEZES, ASSISTIR A UM
FILME NO CINEMA? 7) CONCERTO DE MÚSICA AO VIVO 04 03 02 01 98 99
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
8) FESTIVAL OU FESTA LOCAL 04 03 02 01 98 99
O PREÇO É ELEVADO ............................................ ..................................................... 01

NÃO HÁ CINEMAS NA MINHA ZONA, SITUAM-SE LONGE DE ONDE VIVO ........................................ 02

CIRCULA POUCA INFORMAÇÃO SOBRE OS FILMES EM EXIBIÇÃO................................................. 03 * QUEM REFERE NUNCA, NÃO SABE OU NÃO RESPONDE A TODOS ESTES ESPETÁCULOS PASSA PARA P.17E

POR INCAPACIDADE FÍSICA, DIFICULDADES MOTORAS, DEFICIÊNCIA, SURDEZ, CEGUEIRA ................. 04

FALTA-ME TEMPO ..................................................................................................... 05 *APENAS PARA QUEM ASSISTIU A UM ESPETÁCULO DE DANÇA: 1) BALLET OU DANÇA CLÁSSICA OU 2) OUTRO TIPO
DE DANÇA [SE P6E_1 OU P6E_2=04 A 02]
NÃO TENHO INTERESSE, PREFIRO REALIZAR OUTRAS ATIVIDADES ............................................. 06
P.7E - PENSE AGORA NO ÚLTIMO ESPETÁCULO DE DANÇA QUE FOI VER, MESMO QUE O
NÃO TENHO COM QUEM IR ........................................................................................... 07 TENHA VISTO DEPOIS DO INÍCIO DA PANDEMIA. QUE TIPO DE ESPETÁCULO DE DANÇA ERA?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
POSSO VER TUDO EM CASA NA TELEVISÃO E OUTROS SUPORTES DIGITAIS (CONSOLA DE JOGOS, PC,
MAC, TELEMÓVEL, TABLET) ........................................................................................... 08
DANÇA CONTEMPORÂNEA ............................................................................................. 01
JÁ SOU VELHO/A PARA ISSO .......................................................................................... 09
BALLET / DANÇA CLÁSSICA...........................................................................................02
NÃO HÁ ESTACIONAMENTO PRÓXIMO ............................................................................... 10
PERFORMANCE ......................................................................................................... 03
FALTAM MEIOS DE TRANSPORTE PÚBLICO .......................................................................... 11
DANÇA DE RUA (INCLUI HIP HOP, BREAKDANCE, LOCKING, POPPING, HOUSE E FREESTYLE) .............. 04

414 415
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

DANÇA AFRICANA ...................................................................................................... 05 MÚSICA CLÁSSICA ...................................................................................................... 03

DANÇA FLAMENCA...................................................................................................... 06 MÚSICA FOLCLÓRICA E TRADICIONAL ............................................................................... 04

DANÇA FOLCLÓRICA OU ÉTNICA .................................................................................... 07 MÚSICA AFRICANA ..................................................................................................... 05

OUTRA. INDICAR_______________________________________ ............................... 97 MÚSICA LATINO-AMERICANA ......................................................................................... 06

NÃO SABE ............................................................................................................... 98 MÚSICA POPULAR BRASILEIRA, BOSSA NOVA ....................................................................... 07

NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99 OUTRAS MÚSICAS DO MUNDO (SKA, SALSA, BLUES, SOUL, MÚSICA ASIÁTICA) ............................... 08

RAP, HIP HOP ........................................................................................................... 09

* APENAS PARA QUEM ASSISTIU A UM ESPETÁCULO DE TEATRO [SE P6E_5=04 A 02] FADO ................................................................................................................. 10

OUTRO(S). INDICAR ____________________________________________ .................97


P.8E - PENSE AGORA NO ÚLTIMO ESPETÁCULO DE TEATRO QUE FOI VER, MESMO QUE O
TENHA VISTO DEPOIS DO INÍCIO DA PANDEMIA. QUE TIPO DE ESPETÁCULO ERA? NÃO SABE ........................................................... ……………………………………………….98
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
NÃO RESPONDE ..................................................... ……………………………………………… 99

TEATRO CONTEMPORÂNEO ............................................................................................ 01

TEATRO CLÁSSICO...................................................................................................... 02 * APENAS PARA QUEM ASSISTIU A UM FESTIVAL OU A UMA FESTA LOCAL [SE P6E_8=04 A 02]

TEATRO DE REVISTA ................................................................................................... 03 P.11E - PENSE AGORA NO ÚLTIMO FESTIVAL OU FESTA LOCAL A QUE ASSISTIU, MESMO QUE
O TENHA VISTO DEPOIS DO INÍCIO DA PANDEMIA. QUE TIPO DE FESTIVAL OU FESTA LOCAL
TEATRO MUSICAL ...................................................................................................... 04 ERA?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
LEITURAS E RECITAIS .................................................................................................. 05

OUTRO(S). INDICAR ______________________________________________________97


FESTIVAL DE TEATRO, DANÇA, ARTES DE RUA.......................................................... 01
NÃO SABE ............................................................ ……………………………………………….98
FESTIVAL DE MÚSICA CLÁSSICA, JAZZ, ÓPERA .......................................................... 02
NÃO RESPONDE ..................................................... ……………………………………………… 99
FESTIVAL DE MÚSICAS TRADICIONAIS OU MÚSICAS DO MUNDO ..................................... 03

FESTIVAL DE MÚSICA POP, ROCK ......................................................................... 04


* APENAS PARA QUEM ASSISTIU A UM ESPETÁCULO DE CIRCO [SE P6E_6=04 A 02]
FESTIVAL DE CINEMA ...................................................................................... 05
P.9E - PENSE AGORA NO ÚLTIMO ESPETÁCULO DE CIRCO QUE FOI VER, MESMO QUE O
TENHA VISTO DEPOIS DO INÍCIO DA PANDEMIA. QUE TIPO DE ESPETÁCULO ERA? FESTIVAL DE ARTES PLÁSTICAS ........................................................................... 06
(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
FESTIVAL DE FOTOGRAFIA ................................................................................ 07

FESTA LOCAL. INDICAR ______________________________________________ 08


CIRCO TRADICIONAL .................................................................................................. 01
OUTRO TIPO DE FESTIVAL. INDICAR _____________________________________ 97
CIRCO MODERNO E NOVO CIRCO .................................................................................... 02
NÃO SABE .................................................................................................... 98 IR PARA P.14E
NÃO SABE (NÃO LER) ............................................... ………………………………………………..98
NÃO RESPONDE ............................................................................................. 99 IR PARA P.14E
NÃO RESPONDE (NÃO LER) ........................................ ………………………………………………. 99

[SE P.11E≠98 OU 99]


* APENAS PARA QUEM ASSISTIU A UM CONCERTO DE MÚSICA AO VIVO, INCLUINDO MÚSICA CLÁSSICA
[SE P6E_4 OU P6E_7=04 A 02] P.12E - ONDE SE REALIZOU ESSE FESTIVAL OU FESTA LOCAL?
(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
P.10E - PENSE AGORA NO ÚLTIMO CONCERTO DE MÚSICA AO VIVO A QUE ASSISTIU, MESMO
QUE O TENHA VISTO DEPOIS DO INÍCIO DA PANDEMIA. QUE GÉNERO DE MÚSICA ERA?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) NO CONCELHO ONDE RESIDE (SE DIFERENTE DE LISBOA OU PORTO) ......................................... 01

POP /ROCK (PORTUGUÊS, LATINO, ESTRANGEIRO) .............................................................. 01 LISBOA ................................................................................................................. 02

JAZZ ................................................................................................................. 02 PORTO ................................................................................................................. 03

416 417
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

REGIÕES AUTÓNOMAS DOS AÇORES OU DA MADEIRA ............................................................. 04 * FAZER A QUEM ASSISTIU A MAIS DO QUE UM TIPO DE CONCERTO OU ESPETÁCULO AO VIVO [SE P6E=04 A 02]

NUM PAÍS DA UNIÃO EUROPEIA ...................................................................................... 05 P.14E - DA SEGUINTE LISTA DE CONCERTOS E ESPETÁCULOS AO VIVO, DIGA-ME, POR
FAVOR, QUAL DELES FOI O ÚLTIMO A QUE ASSISTIU, MESMO QUE O TENHA VISTO DEPOIS
NUM PAÍS FORA DA UNIÃO EUROPEIA ............................................................................... 06 DO INÍCIO DA PANDEMIA.
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR UMA ÚNICA RESPOSTA)
OUTRA. INDICAR _________________________________________________.............97

NÃO SABE (NÃO LER) ................................................................................................. 98 BALLET OU DANÇA CLÁSSICA .................................................. 01


NÃO RESPONDE (NÃO LER) .......................................................................................... 99 OUTRO TIPO DE DANÇA ........................................................ 02

ÓPERA (INCLUI A OPERETA) ...................................................03

[SE P.11E≠98 OU 99] MÚSICA CLÁSSICA (INCLUI SINFÓNICA, CÂMARA, CORAL E RECITAL).... 04
P.13E - DA SEGUINTE LISTA, PODERIA INDICAR-ME QUAIS FORAM OS PRINCIPAIS MOTIVOS
TEATRO ...........................................................................05
QUE O/A LEVARAM À ESCOLHA DESSE FESTIVAL OU FESTA LOCAL?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
CIRCO .............................................................................06

CONCERTO DE MÚSICA AO VIVO .............................................. 07


O TIPO DE PROGRAMAÇÃO ........................................................................................... 01

O/A DIRETOR/A DO FESTIVAL........................................................................................ 02 FESTIVAL OU FESTA LOCAL..................................................... 08

OS ARTISTAS .......................................................................................................... 03 NÃO SABE .........................................................................98

O TEMA DO FESTIVAL ................................................................................................. 04 NÃO RESPONDE ..................................................................99

AS ATIVIDADES E EXPERIÊNCIAS CULTURAIS (DEBATES, ENCONTROS COM ARTISTAS, ETC.) .............. 05


* APENAS PARA QUEM ASSISTIU A UM CONCERTO OU A OUTRO QUALQUER ESPETÁCULO AO VIVO, FESTIVAL OU FESTA
A EXPERIÊNCIA GASTRONÓMICA (INCLUI PROVA DE PRODUTOS LOCAIS, MERCADINHOS).................. 06 LOCAL [SE P6E=04 A 02]

O CONVÍVIO COM OUTRAS PESSOAS ................................................................................ 07 P.15E - DA SEGUINTE LISTA, PODERIA INDICAR-ME QUAIS FORAM AS PRINCIPAIS RAZÕES
QUE O/A LEVARAM À ESCOLHA DESSE CONCERTO OU ESPETÁCULO AO VIVO?
A PUBLICIDADE (INCLUI ANÚNCIOS NOS JORNAIS, NEWSLETTER, AGENDA CULTURAL, OUTDOORS) ..... 08
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
A RECOMENDAÇÃO DE FAMILIARES, AMIGOS, OUTRAS PESSOAS................................................ 09
OS ARTISTAS INTÉRPRETES (INCLUI ATORES, CANTORES, BAILARINOS, MÚSICOS, MAESTROS, COMPANHIAS DE
AS OPINIÕES QUE VIU NAS REDES SOCIAIS E SUPORTES DIGITAIS ............................................. 10 TEATRO, DANÇA, CIRCO, AGRUPAMENTOS MUSICAIS, ARTISTAS CIRCENSES)......................................... 01

AS CRÍTICAS DE PROFISSIONAIS NOS JORNAIS ................................................................... 11 OS CRIADORES (INCLUI REALIZADOR, COREÓGRAFO, ENCENADOR, COMPOSITOR, AUTOR DO TEXTO DO
ESPETÁCULO OU DO LIBRETO DA ÓPERA, OBRAS MUSICAIS INTERPRETADAS, CANTAUTOR, CRIADORES
OS PRÉMIOS ATRIBUÍDOS ............................................................................................ 12 INTÉRPRETES, CENÓGRAFO, DESENHADOR DE LUZ OU SOM) ...........................................……………...02
O ESPAÇO, RECINTO DO FESTIVAL .................................................................................. 13 O TEMA DO ESPETÁCULO OU GÉNERO DE MÚSICA.........................................................................03
O LOCAL E A REGIÃO ONDE O FESTIVAL SE REALIZOU ............................................................ 14 A PUBLICIDADE (INCLUI ANÚNCIOS NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL OU NA INTERNET, NEWSLETTERS,
AGENDA CULTURAL, OUTDOORS, FOLHETOS) ................................ ..............................................04
OUTRO(S). INDICAR ______________________________________________________97
A RECOMENDAÇÃO DE FAMILIARES, AMIGOS, OUTRAS PESSOAS......... ...............................................05
NÃO SABE ............................................................................................................... 98
AS CRÍTICAS PROFISSIONAIS ................................................... ..............................................06
NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99
AS OPINIÕES QUE VIU NAS REDES SOCIAIS OU NOUTROS LOCAIS VIA INTERNET .................................. 07

OS PRÉMIOS RECEBIDOS OU AS NOMEAÇÕES PARA PRÉMIOS ............. ..............................................08

A SALA ONDE OCORREU O ESPETÁCULO. ..................................... ..............................................09

O ESPAÇO AO AR LIVRE ONDE OCORREU O ESPETÁCULO.................... ............................................ 10

O CONVÍVIO COM OUTRAS PESSOAS ........................................... .............................................11

OUTRO(S). INDICAR___________________________________________.............................97

418 419
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

NÃO SABE .......................................................................... .............................................98 NÃO SABE ............................................................................................................... 98

NÃO RESPONDE .................................................................... ............................................99 NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99

* PARA TODOS, EXCETO OS QUE NÃO UTILIZAM A INTERNET [SE P1A=1]


* APENAS PARA QUEM ASSISTIU A UM CONCERTO OU A OUTRO QUALQUER ESPETÁCULO AO VIVO, FESTIVAL OU FESTA
LOCAL [SE P6E=04 A 02]
* PARA QUEM NÃO UTILIZA A INTERNET [SE P1A=2], CARREGAR AUTOMATICAMENTE “NUNCA” (CÓD. 01) EM
TODAS AS ALÍNEAS
P.16E - DIGA-ME, POR FAVOR, COM QUEM FOI A ESSE ESPETÁCULO?
P.18E - PENSANDO NOS ÚLTIMOS 12 MESES, COM QUE FREQUÊNCIA ASSISTIU, ATRAVÉS DA
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
INTERNET, AOS SEGUINTES ESPETÁCULOS?
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
SÓ …………. ........................................................................................................... 01

COM FAMILIARES……………………………………………………………………………………………………02 UMA VEZ UMA OU VÁRIAS UMA OU VÁRIAS


POR VEZES POR MÊS, VEZES POR ANO,
COM NAMORADO/A E OU AMIGO/S ................................................................................. 03 NUNCA NS NR
SEMANA OU MAS NÃO TODAS MAS NÃO TODOS
MAIS AS SEMANAS OS MESES
COM GRUPO DA ESCOLA (VISITA DE ESTUDO)..................................................................... 04
1) CINEMA 04 03 02 01 98 99
COM OUTRO GRUPO ORGANIZADO (COLETIVIDADE, ASSOCIAÇÃO) ………………………………………….05
2) BALLET OU DANÇA 04
03 02 01 98 99
OUTRO(S). INDICAR______________________________________________________.97 CLÁSSICA

NÃO SABE .............................................................................................................. 98 3) OUTRO TIPO DE DANÇA 04 03 02 01 98 99

NÃO RESPONDE ........................................................................................................ 99 4) ÓPERA 04 03 02 01 98 99

5) MÚSICA CLÁSSICA 04 03 02 01 98 99

6) TEATRO 04 03 02 01 98 99
* PARA TODOS, NOVAMENTE
7) CIRCO 04 03 02 01 98 99
P.17E - PODERIA DIZER-ME, POR FAVOR, POR QUE NÃO FOI OU NÃO VAI MAIS VEZES
ASSISTIR A CONCERTOS E ESPETÁCULOS AO VIVO OU A FESTIVAIS E FESTAS LOCAIS? 8) CONCERTOS DE MÚSICA 04
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS) 03 02 01 98 99
AO VIVO

9) FESTIVAIS E FESTAS 04
O PREÇO É ELEVADO ............................................ ..................................................... 01 03 02 01 98 99
LOCAIS

NÃO HÁ NA MINHA ZONA, SITUAM-SE LONGE DE ONDE VIVO ................................................... 02

CIRCULA POUCA INFORMAÇÃO SOBRE OS CONCERTOS E ESPECTÁCULOS AO VIVO ........................... 03


* QUEM REFERE NUNCA, NÃO SABE OU NÃO RESPONDE A TODOS ESTES ESPETÁCULOS PASSA PARA SECÇÃO F
POR INCAPACIDADE FÍSICA, DIFICULDADES MOTORAS, DEFICIÊNCIA, SURDEZ, CEGUEIRA ................. 04

NÃO GOSTO DE SAIR À NOITE........................................................................................ 05

É-ME DIFÍCIL COMPREENDER......................................................................................... 06

FALTA-ME TEMPO ..................................................................................................... 07

NÃO TENHO INTERESSE, PREFIRO REALIZAR OUTRAS ATIVIDADES ............................................. 08

NÃO TENHO COM QUEM IR ........................................................................................... 09

POSSO VER TUDO EM CASA NA TELEVISÃO E OUTROS SUPORTES DIGITAIS (CONSOLA DE JOGOS, PC,
MAC, TELEMÓVEL, TABLET) ........................................................................................... 10

JÁ SOU VELHO/A PARA ISSO .......................................................................................... 11

NÃO HÁ ESTACIONAMENTO PRÓXIMO ............................................................................... 12

FALTAM MEIOS DE TRANSPORTE PÚBLICO .......................................................................... 13

OUTRA RAZÃO. INDICAR __________________________________________________.97

420 421
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* APENAS PARA QUEM USA A INTERNET [SE P1A=1] F. PARTICIPAÇÃO ARTÍSTICA E CAPITAIS CULTURAIS

* FAZER A P19E PARA TODOS OS ESPETÁCULOS REFERIDOS NA P18E, MAS APENAS A QUEM A ELES ASSISTIU [COD.
04 A 02]
* PARA TODOS
P.19E - DIGA-ME, POR FAVOR, SE ASSISTIU A ESSES ESPETÁCULOS, ATRAVÉS DE
NESTA SECÇÃO VAMOS COLOCAR-LHE ALGUMAS QUESTÕES SOBRE PARTICIPAÇÃO ARTÍSTICA E
TRANSMISSÃO AO VIVO (LIVE STREAMING) E/OU DESCARGA DIGITAL (DE ESPETÁCULO JÁ
GRAVADO) OUTRAS PRÁTICAS CULTURAIS DE LAZER E ENTRETENIMENTO. CONSIDERAREMOS APENAS PRÁTICAS
(LER ITEM A ITEM E REGISTAR UMA OU DUAS RESPOSTAS POR LINHA) ARTÍSTICAS AMADORAS (NÃO PROFISSIONAIS).

P.1F - PENSE NOS 12 MESES ANTERIORES AO INÍCIO DA PANDEMIA. COM QUE FREQUÊNCIA,
DESCARGA DIGITAL
LIVE STREAMING NESSES 12 MESES, COSTUMAVA REALIZAR AS SEGUINTES ATIVIDADES?
(DE ESPETÁCULO JÁ NS NR
(TRANSMISSÃO AO VIVO) (LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
GRAVADO)
1) CINEMA 01 02 98 99

2) BALLET OU DANÇA CLÁSSICA 01 02 98 99 UMA OU UMA OU


UMA OU
VÁRIAS VEZES VÁRIAS
DIARIA VÁRIAS VEZES
3) OUTROS TIPOS DE DANÇA 01 02 98 99 POR SEMANA, VEZES POR
MENTE POR MÊS, MAS NUNCA NS NR
MAS NÃO ANO, MAS
NÃO TODAS AS
4) ÓPERA 01 02 98 99 TODOS OS NÃO TODOS
SEMANAS
DIAS OS MESES
5) MÚSICA CLÁSSICA 01 02 98 99 1) JOGOS DE SOCIEDADE
(CARTAS / DOMINÓ / DAMAS / 05 04 03 02 01 98 99
6) TEATRO 01 02 98 99 XADREZ / MONOPÓLIO)

7) CIRCO 01 02 98 99 2) TRICOT / BORDADO / RENDA


05 04 03 02 01 98 99
8) CONCERTOS DE MÚSICA AO
01 02 98 99 3) PESCA / CAÇA
VIVO 05 04 03 02 01 98 99
4) COLECIONISMO
9) FESTIVAIS E FESTAS LOCAIS 01 02 98 99 05 04 03 02 01 98 99
5) PALAVRAS CRUZADAS /
CHARADAS / SUDOKU 05 04 03 02 01 98 99

6) VOLUNTARIADO 05 04 03 02 01 98 99
7) PARTICIPAÇÃO EM
ASSOCIAÇÕES RECRIATIVAS E
05 04 03 02 01 98 99
CULTURAIS

08) MODALIDADE DESPORTIVA


(INDIVIDUAL OU COLETIVA) 05 04 03 02 01 98 99

09) FESTAS POPULARES 05 04 03 02 01 98 99


10) ARTESANATO
05 04 03 02 01 98 99
11) SEGUIR / CRIAR RECEITAS
CULINÁRIAS 05 04 03 02 01 98 99

422 423
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* PARA TODOS AQUISIÇÃO DE COMPETÊNCIAS ÚTEIS PARA A VIDA PROFISSIONAL ............................ 11

P.2F - PENSANDO NOS ÚLTIMOS 12 MESES ANTERIORES AO INÍCIO DA PANDEMIA, COM QUE FAZER PARTE DA COMUNIDADE ...................................................................... 12
FREQUÊNCIA REALIZOU AS SEGUINTES ATIVIDADES ARTÍSTICAS? NÃO SABE .............................................................................................. 98
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99

UMA OU *APENAS PARA QUEM ASSINALOU ALGUMA ATIVIDADE ARTÍSTICA “NÃO NOS ÚLTIMOS 12 MESES, MAS HÁ MAIS
UMA OU NÃO NOS TEMPO" (SE P.2F=02)
VÁRIAS
UMA VEZ VÁRIAS VEZES ÚLTIMOS
VEZES POR
POR SEMANA POR MÊS, MAS 12 MESES, NUNCA NS NR
ANO, MAS P.4F - REFERIU QUE DEIXOU DE REALIZAR NOS ÚLTIMOS 12 MESES ANTERIORES À PANDEMIA
OU MAIS NÃO TODAS AS MAS HÁ
NÃO TODOS A(S) ACTIVIDADE(S) _______. POR QUE RAZÃO DEIXOU DE REALIZAR ESSA(S) ATIVIDADE(S)?
SEMANAS MAIS TEMPO
OS MESES (RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
1) ESCRITA 05 04 03 02 01 98 99
PERDA DE INTERESSE ................................................................................. 01
2) PINTURA/ DESENHO/
05 04 03 02 01 98 99
GRAVURA FALTA DE TEMPO ....................................................................................... 02
OBSTÁCULOS PROFISSIONAIS / ESCOLARES ....................................................... 03
3) FOTOGRAFIA/ VÍDEO/
CINEMA, COM 05 04 03 02 01 98 99 OBSTÁCULOS FAMILIARES ............................................................................ 04
PROPÓSITOS ARTÍSTICOS
MUDANÇA DE RESIDÊNCIA / LOCAL DE TRABALHO ................................................ 05
4) MÚSICA DESPESA INCOMPORTÁVEL ........................................................................... 06
(COMPOSIÇÃO OU
05 04 03 02 01 98 99 FALTA DE FORMAÇÃO ARTÍSTICA ACESSÍVEL ....................................................... 07
INTERPRETAÇÃO, SÓ OU
ACOMPANHADO) NÃO SABE ............................................................................................... 98
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99
5) DANÇA/ BALLET 05 04 03 02 01 98 99

6) TEATRO 05 04 03 02 01 98 99
*APENAS PARA QUEM NA PERGUNTA P.2F REALIZOU A ATIVIDADE 1), 2), 3) OU 4) – CÓDIGOS 05 A 03
7) CIRCO 05 04 03 02 01 98 99
P.5F - CONTINUANDO A PENSAR NOS ÚLTIMOS 12 MESES ANTERIORES À PANDEMIA, DIGA-
8) ESCULTURA/ ME POR FAVOR QUAIS DOS SEGUINTES MEIOS UTILIZOU NA REALIZAÇÃO DAS SEGUINTES
05 04 03 02 01 98 99
CERÂMICA/ARTESANATO ACTIVIDADES?
(MOSTRAR LISTA DE MEIOS E REGISTAR UMA RESPOSTA PARA CADA ITEM)
9) ARTES DIGITAIS 05 04 03 02 01 98 99

MEIOS APENAS
APENAS MEIOS
* APENAS PARA QUEM REALIZOU PELO MENOS UMA DAS ACTIVIDADES ARTÍSTICAS LISTADAS NA P.2F TRADICIONAIS MEIOS NS NR
TRADICIONAIS
E DIGITAIS DIGITAIS
P.3F - CONSIDERA A SUA PRÁTICA ARTÍSTICA COMO UMA FORMA DE... 1) ESCRITA 03 02 01 98 99
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
2) PINTURA / DESENHO/
03 02 01 98 99
GRAVURA
LHE DAR PRAZER ....................................................................................... 01
3) FOTOGRAFIA OU VÍDEO COM
DISTRAÇÃO DA VIDA QUOTIDIANA .................................................................. 02 03 02 01 98 99
PROPÓSITOS ARTÍSTICOS
PARTILHA ENTRE AMIGOS / FAMÍLIA ................................................................ 03
4) MÚSICA 03 02 01 98 99
EXPRESSÃO PESSOAL .................................................................................. 04
CONHECIMENTO DA HISTÓRIA DA ARTE ............................................................ 05
CONHECIMENTO DA HISTÓRIA DO PAÍS / REGIÃO ................................................ 06
DESCOBERTA DE CULTURAS DIFERENTES........................................................... 07
CONHECER PESSOAS COM INTERESSES COMUNS .................................................. 08
DESENVOLVIMENTO DO SENTIDO ESTÉTICO ....................................................... 09
DESENVOLVIMENTO DO SENTIDO CRÍTICO ......................................................... 10

424 425
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* PARA TODOS, NOVAMENTE * PARA TODOS, NOVAMENTE

P.6F - ALGUMA VEZ PENSOU EM EXERCER UMA ATIVIDADE ARTÍSTICA COMO PROFISSÃO? P.9F - ALGUMA VEZ PARTICIPOU EM OFICINAS ARTÍSTICAS OU TEVE AULAS/LIÇÕES, NÃO
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) INCLUÍDAS NO CURRÍCULO ESCOLAR, DE ALGUMA DISCIPLINA ARTÍSTICA?
(LER ITEM A ITEM E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
SIM, PENSEI EM SER E SOU ARTISTA PROFISSIONAL ............................................. 01
SIM, TENHO O OBJETIVO DE SER ARTISTA PROFISSIONAL ....................................... 02 SIM, NOS ÚLTIMOS SIM, HÁ MAIS
NÃO NS NR
SIM, SE A OPORTUNIDADE SURGIR .................................................................. 03 12 MESES DE UM ANO

SIM, NO PASSADO, NO PRESENTE JÁ NÃO .......................................................... 04 1) OFICINAS ARTÍSTICAS 03 02 01 98 99


NÃO, NUNCA TIVE ESSE OBJETIVO .................................................................. 05
2) AULAS/ LIÇÕES NÃO INCLUÍDAS NO
NÃO SABE .............................................................................................. 98 03 02 01 98 99
CURRICULO ESCOLAR
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99

* SE RESPONDEU NÃO, NÃO SABE OU NÃO RESPONDE EM AMBOS OS ITENS PASSAR PARA A P. 12F
* PARA TODOS

P.7F - GOSTARÍAMOS AGORA DE SABER SE NA SUA INFÂNCIA E ATÉ AOS 18 ANOS, TEVE * PARA OS QUE RESPONDERAM SIM EM PELO MENOS UMA ATIVIDADE NOS ÚLTIMOS 12 MESES OU HÁ MAIS DE UM
OPORTUNIDADE DE SE DESLOCAR A BIBLIOTECAS, EXPOSIÇÕES, MUSEUS, MONUMENTOS OU ANO [SE P.9F=03 OU 02]
ESPETÁCULOS DE QUALQUER TIPO. DIGA COM QUE FREQUÊNCIA E EM QUE CONTEXTO
OCORRERAM ESSAS DESLOCAÇÕES. ELAS FORAM... P.10F - QUE ÁREAS DE FORMAÇÃO ARTÍSTICA FREQUENTOU?
(LER ITEM A ITEM, MOSTRAR LISTA DE FREQUÊNCIAS E REGISTAR UMA RESPOSTA POR LINHA)
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)

FREQUENTE ALGUMAS LITERATURA/ ESCRITA ...................................................................................01


RARAMENTE NUNCA NS NR
MENTE VEZES

1) PROMOVIDAS PELA ESCOLA 04 03 02 01 98 99 BALLET OU DANÇA ........................................................................................02

2) PROMOVIDAS POR OUTRAS MÚSICA (LEITURA MUSICAL, COMPOSIÇÃO, INTERPRETAÇÃO SEJA INSTRUMENTO OU VOZ) ..03
ORGANIZAÇÕES (EX.:
04 03 02 01 98 99 TEATRO.....................................................................................................04
ESCUTEIROS/ ASSOCIAÇÕES/
SINDICATOS) CIRCO.......................................................................................................05

3) REALIZADAS COM O APOIO DA PINTURA/ DESENHO / GRAVURA ........................................................................06


04 03 02 01 98 99
FAMÍLIA
ESCULTURA/ CERÂMICA/ ARTESANATO ................................................................07
4) COMBINADAS COM AMIGOS 04 03 02 01 98 99
FOTOGRAFIA /VÍDEO /CINEMA .........................................................................08
5) REALIZADAS INDIVIDUALMENTE 04 03 02 01 98 99
ARTES DIGITAIS ...........................................................................................09

OUTRA. INDICAR..........................................................................................97
*SE RESPONDEU "NUNCA" EM TODOS OS ITENS DA P.7F, DEVE PASSAR À P.9F NÃO SABE ..................................................................................................98

NÃO RESPONDE ...........................................................................................99


[SE P.7F=04 A 02]

P.8F - NESSAS ATIVIDADES REALIZADAS NA SUA INFÂNCIA E ATÉ AOS 18 ANOS, PARTICIPOU
EM INICIATIVAS OFERECIDAS POR ALGUM DESSES ESPAÇOS CULTURAIS?
(REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)

SIM .................................................................................................... 01

NÃO ................................................................................................... 02

NÃO SABE............................................................................................. 98

NÃO RESPONDE.......................................................................................99

426 427
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* PARA OS QUE RESPONDERAM SIM EM PELO MENOS UMA ATIVIDADE NOS ÚLTIMOS 12 MESES OU HÁ MAIS DE UM ESCULTURA/ CERÂMICA / ARTESANATO ...............................................................07
ANO [SE P.9F=03 OU 02]
FOTOGRAFIA / VÍDEO / CINEMA .......................................................................08
P.11F - ONDE SE REALIZARAM ESSAS ATIVIDADES?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS) ARTES DIGITAIS ...........................................................................................09

OUTRA. INDICAR..........................................................................................97
COLÉGIO OU ESCOLA ..................................................................................01
NÃO SABE ..................................................................................................98
AULAS PARTICULARES................................................................................. 02
NÃO RESPONDE ...........................................................................................99
INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR............................................................... 03

ASSOCIAÇÃO / COLETIVIDADE LOCAL............................................................... 04


* PARA TODOS, NOVAMENTE
ACADEMIA ESPECIALIZADA…..……................................................................. 05
P.14F - DOS ACONTECIMENTOS CULTURAIS A QUE ASSISTE OU EM QUE PARTICIPA
OUTROS LOCAIS. INDICAR__________________________________...............97 DIGA-ME, POR FAVOR, ATRAVÉS DE QUE MEIOS TOMA DELES CONHECIMENTO?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS)
NÃO SABE ...............................................................................................98

NÃO RESPONDE.........................................................................................99
CARTAZES NO EDIFÍCIO DOS ESPAÇOS CULTURAIS ONDE DECORRE O ACONTECIMENTO OU FORA DELES ........01

ANÚNCIOS NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL (IMPRENSA, RÁDIO, TELEVISÃO, INCLUINDO ONLINE) .......02
* APENAS PARA OS QUE NA P. 9F RESPONDERAM NÃO EM AMBOS OS ITENS [SE P.9F=01]
PUBLICAÇÕES DO PROMOTOR DO ACONTECIMENTO (PROGRAMA, FLYERS, FOLHETOS E OUTRAS) ................03
P.12F - POR QUE RAZÃO NUNCA FREQUENTOU ESSAS ATIVIDADES?
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS RESPOSTAS) INFORMAÇÕES ENVIADAS DIRETAMENTE PELO PROMOTOR, VIA POSTAL, SMS, OU EMAIL ..........................04

JORNAIS EM PAPEL OU ONLINE (NOTÍCIAS, INFORMAÇÕES, PASSATEMPOS, ETC.) ..................................05


FALTA DE INTERESSE .....................................................................................01
REVISTAS EM PAPEL OU ONLINE (NOTÍCIAS, INFORMAÇÕES, PASSATEMPOS, ETC) ..................................06
FALTA DE TEMPO ..........................................................................................02
TELEVISÃO (NOTÍCIAS, INFORMAÇÕES, ETC)..............................................................................07
OBSTÁCULOS PROFISSIONAIS / ESCOLARES ..........................................................03
RÁDIO (NOTÍCIAS, INFORMAÇÕES, PASSATEMPOS, ETC.) ...............................................................08
OBSTÁCULOS FAMILIARES ...............................................................................04
PUBLICAÇÕES INFORMATIVAS PARA TURISTAS (EM PAPEL OU DIGITAIS)..............................................09
DESPESA INCOMPORTÁVEL ..............................................................................05
WEBSITE DOS PROMOTORES OU EQUIPAMENTOS .........................................................................10
INEXISTÊNCIA DE OFERTA NA MINHA ÁREA DE RESIDÊNCIA ........................................06
FACEBOOK E OUTRAS REDES SOCIAIS.......................................................................................11
NÃO SABE ..................................................................................................98
OUTRAS FORMAS DE DIVULGAÇÃO ATRAVÉS DA INTERNET ..............................................................12
NÃO RESPONDE ...........................................................................................99
RECOMENDAÇÕES DE ALGUÉM ...............................................................................................13

O LOCAL E A REGIÃO ONDE O ACONTECIMENTO CULTURAL SE REALIZOU .............................................14


* APENAS PARA OS QUE REFERIRAM INEXISTÊNCIA DE OFERTA [SE P.12F=06]
OUTRO(S). INDICAR _____________________________________________........................97
P.13F - SE NA SUA ÁREA DE RESIDÊNCIA EXISTISSEM OFICINAS ARTÍSTICAS OU CLASSES DE
FORMAÇÃO ARTÍSTICA DO SEU AGRADO, QUAL OU QUAIS AS ÁREAS QUE GOSTARIA DE NÃO SABE .......................................................................................................................98
FREQUENTAR?
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR TODAS AS RESPOSTAS) NÃO RESPONDE ................................................................................................................99

LITERATURA / ESCRITA ..................................................................................01

BALLET OU DANÇA ........................................................................................02

MÚSICA (LEITURA MUSICAL, COMPOSIÇÃO, INTERPRETAÇÃO SEJA INSTRUMENTO OU VOZ) ..03

TEATRO.....................................................................................................04

CIRCO.......................................................................................................05

PINTURA / DESENHO / GRAVURA .......................................................................06

428 429
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* PARA TODOS G. VARIÁVEIS DE CARACTERIZAÇÃO

P.15F - CONSIDERA QUE TEM OS CONHECIMENTOS PARA, EM GERAL, PODER DESFRUTAR DA


OFERTA CULTURAL (LEITURA E TODAS AS EXPRESSÕES ARTÍSTICAS)?
(RODANDO A ORDEM DOS ITENS, MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
INQUÉRITO Nº...............

NÃO TEM TAIS CONHECIMENTOS .............................................................................................. 01


LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA DO ALOJAMENTO
TEM ALGUNS QUE LHE PERMITEM DESFRUTAR DA OFERTA CULTURAL QUE MAIS LHE INTERESSA.................... 02 (IDENTIFICAÇÃO REALIZADA PELA EMPRESA DE SONDAGENS)
TEM OS SUFICIENTES QUE LHE PERMITEM DESFRUTAR DA GENERALIDADE DA OFERTA CULTURAL QUE LHE
FREGUESIA _____________________________________
INTERESSA, COM EXCEÇÕES ................................................................................................... 03
CONCELHO _____________________________________
TEM OS SUFICIENTES QUE LHE PERMITEM DESFRUTAR DE TODA A OFERTA CULTURAL QUE LHE INTERESSA ...... 04
DISTRITO ______________________________________
NÃO SABE ......................................................................................................................... 98
CÓDIGO POSTAL ______________
NÃO RESPONDE .................................................................................................................. 99

REGIÃO (CORRESPONDÊNCIA NUT3):

NORTE...................................... ............................. 01

CENTRO .................................................................. 02

LISBOA ................................................................... 03

ALENTEJO ................................................................ 04

ALGARVE................................................................. 05

REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES ................................... 06

REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA ................................... 07

HABITAT_1:

MENOS 2.000 HABITANTES...................................... ..... 01

2.000 A 9.999 HABITANTES ......................................... 02

10.000 A 99.000 HABITANTES...................................... 03

100.000 A 199.999 HABITANTES................................... 04

200.000 OU MAIS HABITANTES...................................... 05

HABITAT_2 (CODIFICAÇÃO INTERNA):

URBANO .............................................. 01

INTERMÉDIO URBANO................................ 02

RURAL ................................................. 03

430 431
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* A TODOS *SE NA P.5G RESPONDEU “01”, “NS” OU “NR”, PASSAR PARA P.7G

P.1G - SEXO/GÉNERO DO INQUIRIDO P.6G - QUANTAS, DESSAS PESSOAS, TÊM MENOS DE 18 ANOS?

MASCULINO .............................................................................................01 INDICAR |_____||_____|

FEMININO ...............................................................................................02 NÃO RESPONDE... .................................................................................... ....99

OUTRO ..................................................................................................03

NÃO RESPONDE ......................................................................................... 99 * A TODOS, NOVAMENTE

P.7G - QUAL O GRAU DE ENSINO MAIS ELEVADO QUE ATINGIU OU FREQUENTOU?


(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UM GRAU DE ENSINO)
* A TODOS

P.2G - IMPORTA-SE DE ME DIZER A SUA IDADE? UNIVERSITÁRIO / PÓS GRADUAÇÃO / MESTRADO / DOUTORAMENTO...........................01

INDICAR _________ .............................................................................. ... 01 CURSO POLITÉCNICO .....................................................................................02

NÃO RESPONDE ....................................................................................... .. 99 FREQUÊNCIA DE CURSO UNIVERSITÁRIO OU POLITÉCNICO .........................................03

12º ANO (7º ANO LICEU / 11º ANO) ..................................................................04

* A TODOS 9º ANO (5º ANO LICEU) .................................................................................05

P.3G - QUAL É A SUA SITUAÇÃO CONJUGAL ATUAL? 6º ANO (2º ANO LICEU) .................................................................................06
(REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
INSTRUÇÃO PRIMÁRIA COMPLETA ......................................................................07

CASADO (A) .............................................................................................01 INSTRUÇÃO PRIMÁRIA INCOMPLETA / ANALFABETO .................................................08

UNIÃO DE FACTO....................................................................................... 02 NÃO SABE ..................................................................................................98

DIVORCIADO(A)/SEPARADO (A)......................................................................03 NÃO RESPONDE ...........................................................................................99

VIÚVO (A)….............................................................................................04

SOLTEIRO (A)...........................................................................................05 * A TODOS, NOVAMENTE

NÃO RESPONDE ........................................................................................ .99 P.8G - QUAL O GRAU DE ENSINO MAIS ELEVADO QUE O SEU PAI ATINGIU OU FREQUENTOU?
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UM GRAU DE ENSINO)

* A TODOS UNIVERSITÁRIO / PÓS GRADUAÇÃO / MESTRADO / DOUTORAMENTO...........................01

P.4G - QUAL É A SUA NACIONALIDADE? CURSO POLITÉCNICO .....................................................................................02


(REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
FREQUÊNCIA DE CURSO UNIVERSITÁRIO OU POLITÉCNICO .........................................03

PORTUGUESA (INCLUI DUPLA NACIONALIDADE EM QUE UMA SEJA PORTUGUESA) ............ 01 12º ANO (7º ANO LICEU / 11º ANO) ..................................................................04

OUTRAS (ESTRANGEIROS, DUPLAS NACIONALIDADES DE ESTRANGEIROS, ETC.) ............. 02 9º ANO (5º ANO LICEU) .................................................................................05

NÃO RESPONDE ....................................................................................... … 99 6º ANO (2º ANO LICEU) .................................................................................06

* A TODOS INSTRUÇÃO PRIMÁRIA COMPLETA ......................................................................07

P.5G - CONTANDO CONSIGO, QUANTAS PESSOAS, INCLUINDO CRIANÇAS, FAZEM PARTE INSTRUÇÃO PRIMÁRIA INCOMPLETA / ANALFABETO .................................................08
DO SEU AGREGADO FAMILIAR?
NÃO SABE ..................................................................................................98
INDICAR |_____||_____| NÃO RESPONDE ...........................................................................................99
NÃO SABE................................................................................................ 98

NÃO RESPONDE ......................................................................................... 99

432 433
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

* A TODOS, NOVAMENTE * APENAS PARA QUEM TENHA UM TRABALHO REMUNERADO OU O TENHA TIDO NO PASSADO. NUM CASO PERGUNTAR
SOBRE O TRABALHO ATUAL; NOUTRO CASO SOBRE O ÚLTIMO TRABALHO REALIZADO NO PASSADO
P.9G - QUAL O GRAU DE ENSINO MAIS ELEVADO QUE A SUA MÃE ATINGIU OU FREQUENTOU?
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UM GRAU DE ENSINO) P.12G - NA SUA PROFISSÃO PRINCIPAL É/ERA…
(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)

UNIVERSITÁRIO / PÓS GRADUAÇÃO / MESTRADO / DOUTORAMENTO...........................01


TRABALHADOR POR CONTA DE OUTREM .....................................01 PASSAR PARA A P.14G
CURSO POLITÉCNICO .....................................................................................02 TRABALHADOR POR CONTA PRÓPRIA ........................................02 PASSAR PARA A P.13G, DEPOIS P. 15G
FREQUÊNCIA DE CURSO UNIVERSITÁRIO OU POLITÉCNICO .........................................03 TRABALHADOR NO NEGÓCIO OU EMPRESA DA FAMÍLIA ...................03 PASSAR PARA A P.14G
12º ANO (7º ANO LICEU / 11º ANO) ..................................................................04 NÃO SABE........................................................................ 98 PASSAR PARA A P.14G
9º ANO (5º ANO LICEU) .................................................................................05 NÃO RESPONDE ................................................................ 99 PASSAR PARA A P.14G
6º ANO (2º ANO LICEU) .................................................................................06
* APENAS PARA QUEM TENHA UM TRABALHO REMUNERADO OU O TENHA TIDO NO PASSADO. NUM CASO PERGUNTAR
INSTRUÇÃO PRIMÁRIA COMPLETA ......................................................................07
SOBRE O TRABALHO ATUAL; NOUTRO CASO SOBRE O ÚLTIMO TRABALHO REALIZADO NO PASSADO
INSTRUÇÃO PRIMÁRIA INCOMPLETA / ANALFABETO .................................................08 [SE NA P.12G=O2]

NÃO SABE ..................................................................................................98 P.13G - QUANTOS EMPREGADOS ASSALARIADOS TEM/TINHA?


(REGISTAR NÚMERO DE EMPREGADOS)
NÃO RESPONDE ...........................................................................................99
|_____||_____||_____||_____|

* A TODOS, NOVAMENTE NENHUM................................................00

P.10G - RELATIVAMENTE À PROFISSÃO, QUAL DAS SEGUINTES SITUAÇÕES SE APLICA NÃO SABE..............................................98
MELHOR AO QUE FEZ NOS ÚLTIMOS 7 DIAS?
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) NÃO RESPONDE........................................99

A FAZER TRABALHO PAGO (POR CONTA DE OUTREM, CONTA PRÓPRIA, NO NEGÓCIO DA FAMÍLIA) ……… 01
* APENAS PARA QUEM TENHA UM TRABALHO REMUNERADO OU O TENHA TIDO NO PASSADO. NUM CASO PERGUNTAR
A FAZER TRABALHO PAGO E TAMBÉM A ESTUDAR (TRABALHADOR-ESTUDANTE).............................. 02 SOBRE O TRABALHO ATUAL; NOUTRO CASO SOBRE O ÚLTIMO TRABALHO REALIZADO NO PASSADO

A ESTUDAR, MESMO SE DE FÉRIAS ...................................................................................03 P.14G - O SEU CONTRATO É/ERA…


(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
DESEMPREGADO(A) À PROCURA DE EMPREGO .................................... ................................. 04

DESEMPREGADO(A), À ESPERA DE EMPREGO, MAS NÃO À PROCURA DE EMPREGO............................ 05 UM CONTRATO DE DURAÇÃO ILIMITADA (PERMANENTE) ......................................... 01

EM SITUAÇÃO DE DOENÇA OU INCAPACIDADE/INVALIDEZ PERMANENTE ...... ................................ 06 UM CONTRATO DE DURAÇÃO LIMITADA (TEMPORÁRIO) ......................................... 02

NA REFORMA ........................................................................... ................................. 07 NÃO TEM/TEVE CONTRATO ........................................................................... 03

A FAZER TRABALHO DOMÉSTICO, A CUIDAR DE CRIANÇAS OU DE OUTRAS PESSOAS (SEM SER PAGO)..... 08 NÃO SABE ............................................................................................... 98

OUTRA SITUAÇÃO. INDICAR _________________________________________................ 97 NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99

NÃO SABE................................................................................................................ 98
* APENAS PARA QUEM TENHA UM TRABALHO REMUNERADO OU O TENHA TIDO NO PASSADO. NUM CASO PERGUNTAR
NÃO RESPONDE..........................................................................................................99 SOBRE O TRABALHO ATUAL; NOUTRO CASO SOBRE O ÚLTIMO TRABALHO REALIZADO NO PASSADO

P.15G - ESPECIFIQUE, DA FORMA MAIS DETALHADA POSSÍVEL, A ATIVIDADE PROFISSIONAL


QUE EXERCE/EXERCIA
*PARA QUEM NÃO ESTÁ A FAZER TRABALHO REMUNERADO [SE P.10G≠01 OU 02] (REGISTAR)
P.11G - ALGUMA VEZ TEVE UM TRABALHO REMUNERADO?
ATIVIDADE PEOFISSIONAL QUE EXERCE/EXERCIA _____________________________
SIM ...................................................................................................... 01
___________________________________________________________ 01
NÃO ..................................................................................................... 02
NÃO SABE ............................................................................................... 98
NÃO RESPONDE.........................................................................................99

434 435
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99 [SE NA P.18G=O2]

P.19G - QUANTOS EMPREGADOS ASSALARIADOS TEM/TINHA?


(REGISTAR NÚMERO DE EMPREGADOS)
*APENAS PARA OS QUE SÃO CASADOS OU VIVEM EM UNIÃO DE FACTO [SE P.3G=01 OU 02]
|_____||_____||_____||_____|
P.16G - RELATIVAMENTE À PROFISSÃO, QUAL DAS SEGUINTES SITUAÇÕES SE APLICA
MELHOR AO QUE O SEU CÔNJUGE OU PARCEIRO FEZ NOS ÚLTIMOS 7 DIAS?
NENHUM ............................................... 00
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
NÃO SABE...............................................98
A FAZER TRABALHO PAGO (POR CONTA DE OUTREM, CONTA PRÓPRIA, NO NEGÓCIO DA FAMÍLIA) ........ 01 NÃO RESPONDE........................................99
A FAZER TRABALHO PAGO E TAMBÉM A ESTUDAR (TRABALHADOR-ESTUDANTE).............................. 02

A ESTUDAR, MESMO SE DE FÉRIAS ...................................................................................03 * APENAS PARA QUEM TENHA UM TRABALHO REMUNERADO OU O TENHA TIDO NO PASSADO. NUM CASO PERGUNTAR
SOBRE O TRABALHO ATUAL; NOUTRO CASO SOBRE O ÚLTIMO TRABALHO REALIZADO NO PASSADO
DESEMPREGADO(A) À PROCURA DE EMPREGO .................................... ................................. 04
P.20G - O SEU CONTRATO É/ERA…
DESEMPREGADO(A), À ESPERA DE EMPREGO, MAS NÃO À PROCURA DE EMPREGO............................ 05
(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)
EM SITUAÇÃO DE DOENÇA OU INCAPACIDADE/INVALIDEZ PERMANENTE ...... ................................ 06
UM CONTRATO DE DURAÇÃO ILIMITADA (PERMANENTE) ......................................... 01
NA REFORMA ........................................................................... ................................. 07
UM CONTRATO DE DURAÇÃO LIMITADA (TEMPORÁRIO) ......................................... 02
A FAZER TRABALHO DOMÉSTICO, A CUIDAR DE CRIANÇAS OU DE OUTRAS PESSOAS (SEM SER PAGO)..... 08
NÃO TEM/TEVE CONTRATO ........................................................................... 03
OUTRA SITUAÇÃO. INDICAR _________________________________________................ 97
NÃO SABE ............................................................................................... 98
NÃO SABE................................................................................................................ 98
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99
NÃO RESPONDE..........................................................................................................99

* APENAS PARA QUEM TENHA UM TRABALHO REMUNERADO OU O TENHA TIDO NO PASSADO. NUM CASO PERGUNTAR
*APENAS SE O CÔNJUGE OU PARCEIRO NÃO ESTÃO A FAZER UM TRABALHO REMUNERADO SOBRE O TRABALHO ATUAL; NOUTRO CASO SOBRE O ÚLTIMO TRABALHO REALIZADO NO PASSADO

P.17G - O SEU CÔNJUGE OU PARCEIRO ALGUMA VEZ TEVE UM TRABALHO REMUNERADO? P.21G - ESPECIFIQUE, DA FORMA MAIS DETALHADA POSSÍVEL, A ATIVIDADE PROFISSIONAL
QUE EXERCE/EXERCIA
(REGISTAR)
SIM ...................................................................................................... 01

NÃO ..................................................................................................... 02
ATIVIDADE PROFISSIONAL QUE EXERCE/EXERCIA _____________________________
NÃO RESPONDE.........................................................................................99
___________________________________________________________ 01

NÃO SABE ............................................................................................... 98


* APENAS PARA QUEM O RESPETIVO CÔNJUGE OU PARCEIRO TENHA UM TRABALHO REMUNERADO OU O TENHA TIDO
NO PASSADO. NUM CASO PERGUNTAR SOBRE O TRABALHO ATUAL; NOUTRO CASO SOBRE O ÚLTIMO TRABALHO
NÃO RESPONDE ........................................................................................ 99
REALIZADO NO PASSADO

P.18G - NA SUA PROFISSÃO PRINCIPAL O SEU CÔNJUGE OU PARCEIRO É/ERA…


(LER E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)

TRABALHADOR POR CONTA DE OUTREM ..................................... 01 PASSAR PARA A P.20G


TRABALHADOR POR CONTA PRÓPRIA .........................................02 PASSAR PARA A P.19G, DEPOIS P. 21G

TRABALHADOR NO NEGÓCIO OU EMPRESA DA FAMÍLIA ................... 03 PASSAR PARA A P.20G

NÃO SABE ...................................................................... 98 PASSAR PARA A P.20G

NÃO RESPONDE ................................................................ 99 PASSAR PARA A P.20G

436 437
Práticas Culturais dos Portugueses

* PARA TODOS, NOVAMENTE Anexo 3


P.22G - NO MÊS PASSADO, QUAL FOI O RENDIMENTO LÍQUIDO TOTAL DO CONJUNTO DAS
PESSOAS QUE FORMAM O SEU AGREGADO FAMILIAR? (NÃO CONSIDERAR SUBSÍDIOS DE
NATAL OU DE FÉRIAS OU PRÉMIOS QUE SÓ OCORRERAM NESSE MÊS; EM CASO DE LAYOFF,
CONSIDERAR O RENDIMENTO EFETIVAMENTE RECEBIDO)
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA)

ATÉ 500 € ............................................................................................. 01

MAIS DE 500 € A 800 € ........................................................................... 02

MAIS DE 800 € A 1500 € ...........................................................................03

MAIS DE 1500€ A 1800 € ..........................................................................04


Indicadores
do Questionário
MAIS DE 1800 € A 2700 € ........................................................................ 05

MAIS DE 2700 € A 5800 € ......................................................................... 06

ACIMA DE 5800 € .....................................................................................07

NÃO SABE................................................................................................98

NÃO RESPONDE .........................................................................................99


1. INTERNET E CONSUMOS CULTURAIS
1.1. Acesso à Internet
* PARA TODOS
1.2. Razões pelas quais não se usa a Internet
P.23G - DIGA-ME, POR FAVOR, SE COM ESSE RENDIMENTO VIVE CONFORTAVELMENTE,
RAZOAVELMENTE, COM ALGUMAS DIFICULDADES OU COM MUITAS DIFICULDADES. 1.3. Equipamentos de acesso à Internet
(MOSTRAR LISTA E REGISTAR APENAS UMA RESPOSTA) 1.4. Frequência de acesso à Internet para trabalho ou estudo
vs. lazer
CONFORTAVELMENTE .................................................................................. 01
1.5. N.º de horas por semana em que se usa computador para
RAZOAVELMENTE ....................................................................................... 02
trabalho/estudo vs. lazer
COM ALGUMAS DIFICULDADES ................ ......................................................03
1.6. Frequência do uso da Internet em atividades culturais
COM MUITAS DIFICULDADES .................. ......................................................04
1.7. O impacto da pandemia (Covid-19) no uso da Internet
NÃO SABE................................................................................................ 98
em atividades culturais
NÃO RESPONDE ........................................................................................99

2. AUDIOVISUAIS: TELEVISÃO E RÁDIO


2.1. Frequência com que se vê televisão
2.2. Equipamentos em que se vê televisão
2.3. N.º de horas por semana a ver televisão
2.4. Programas televisivos habitualmente mais vistos
2.5. Frequência com que se ouve rádio
2.6. N.º de horas por semana a ouvir rádio
2.7. Locais onde se ouve rádio
2.8. Dispositivos em que se ouve rádio
2.9. Programas de rádio habitualmente mais ouvidos
2.10. O impacto da pandemia (Covid-19) nos hábitos de utilização
da TV e da rádio

438 439
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

3. LEITURA E BIBLIOTECAS 4.3. Concelho ou país da última visita a um museu, monumento


3.1. Frequência de leitura de livros, revistas e jornais em formato histórico, sítio arqueológico ou galeria de arte
impresso ou digital 4.3.1. Motivos para a realização dessa visita
3.2. Razões pelas quais não se leram livros, em formato impresso, 4.3.2. Com quem se realizou a visita
nos últimos 12 meses 4.3.3. Qual o tipo de ingresso utilizado
3.3. N.º de livros lidos, em formato impresso, nos últimos 12 4.3.4. Se a entrada não foi gratuita, como foi adquirida
meses 4.3.5. Atividades realizadas durante a visita
3.4. Frequência com que se compra, requisita, fotocopia ou pede 4.4. Razões pelas quais não se visitou ou não se visita mais vezes
emprestados livros impressos museus, monumentos históricos, sítios arqueológicos
3.5. Razões pelas quais não se leram livros, em formato digital, e galerias de arte
nos últimos 12 meses 4.5. Espaços culturais reconhecidos como património mundial
3.6. N.º de livros lidos, em formato digital, nos últimos 12 meses visitados em Portugal
3.7. Frequência com que se compra, descarrega, requisita ou troca 4.6. Frequência de visitas pela Internet a museus, monumentos
livros em formato digital históricos, sítios arqueológicos e galerias de arte
3.8. Principal objetivo com que se lê (livros impressos ou digitais)
3.9. Em que locais se costuma ler livros (livros impressos 5. CINEMA, ESPETÁCULOS AO VIVO, FESTIVAIS
ou digitais) E FESTAS LOCAIS
3.10. Géneros de livros (impressos ou digitais) que mais 5.1. Frequência de ida ao cinema para ver filmes
frequentemente se lê 5.1.1. Géneros de filmes vistos, considerando a última ida ao
3.11. Géneros de revistas (impressas ou digitais) que mais cinema
frequentemente se lê 5.1.2. Motivos para a escolha dos filmes, considerando a
3.12. Géneros de jornais (impressos ou digitais) que mais última ida ao cinema
frequentemente se lê 5.1.3. Com quem se foi ao cinema, considerando a última
3.13. Durante a infância e adolescência dos inquiridos, com que ida ao cinema
frequência os pais ou outros familiares lhes liam histórias, 5.2. Razões pelas quais não se foi ou não se vai mais vezes ao
ofereciam livros e iam a feiras do livro, livrarias ou bibliotecas cinema
3.14. Fontes de informação a partir das quais se obtêm 5.3. Frequência com que se assiste a espetáculos ao vivo, festivais
recomendações ou ideias de leitura e festas locais
3.15. Frequência de feiras do livro, festivais literários, de ilustração/ 5.4. Tipos de dança, considerando o último espetáculo
/BD e clubes do livro 5.5. Tipos de teatro, considerando o último espetáculo
3.16. Frequência de bibliotecas e/ou arquivos 5.6. Tipos de circo, considerando o último espetáculo
3.17. Razões pelas quais não se frequenta bibliotecas ou arquivos 5.7. Tipos de concertos de música ao vivo, considerando o último
3.18. Motivos para frequentar bibliotecas ou arquivos espetáculo
5.8. Tipos de festivais ou festas locais, considerando o último
4. MUSEUS, MONUMENTOS HISTÓRICOS, SÍTIOS espetáculo
ARQUEOLÓGICOS E GALERIAS DE ARTE 5.9. Concelho ou país da última ida a um festival ou festa local
4.1. Frequência de museus, monumentos históricos, sítios 5.10. Último espetáculo ao vivo, festival ou festa local a que se assistiu
arqueológicos e galerias de arte 5.10.1. Motivos para a escolha do último espetáculo a que se
4.2. Tipo do último museu visitado assistiu

440 441
Práticas Culturais dos Portugueses Anexos

5.10.2. Com quem se foi ao último espetáculo a que se assistiu 7. VARIÁVEIS DE CARACTERIZAÇÃO
5.11. Razões pelas quais não se foi ou não se vai mais vezes 7.1. Localização
a espetáculos ao vivo, festivais e festas locais 7.2. Região
5.12. Frequência de assistência, através da Internet, a espetáculos 7.3. Habitat
ao vivo, festivais e festas locais 7.4. Sexo/género do inquirido
5.13. Frequência de assistência, através de live streaming 7.5. Idade
ou download, a espetáculos ao vivo, festivais e festas locais 7.6. Situação conjugal
7.7. Nacionalidade
6. PARTICIPAÇÃO ARTÍSTICA E CAPITAIS CULTURAIS 7.8. Quantas pessoas fazem parte do agregado familiar
6.1. Frequência de práticas culturais de entretenimento e lazer 7.9. Instrução do próprio
6.2. Frequência de atividades artísticas amadoras 7.10. Instrução do pai
6.3. Razões de abandono de práticas artísticas 7.11. Instrução da mãe
6.4. Realização de atividades artísticas através de meios 7.12. Situação perante a profissão (do próprio e do cônjuge)
tradicionais e/ou digitais 7.13. Exercício de trabalho remunerado (do próprio e do cônjuge)
6.5. Expectativas de ser artista profissional 7.14. Situação perante o emprego (do próprio e do cônjuge)
6.6. Atitudes em relação à prática artística 7.15. Trabalhadores por conta própria (o próprio e o cônjuge)
6.7. Frequência de espaços culturais, durante a infância com assalariados
e adolescência, promovidas pela escola 7.16. Tipos de contrato de trabalho (do próprio e do cônjuge)
6.8. Frequência de espaços culturais, durante a infância 7.17. Atividade profissional específica (do próprio e do cônjuge)
e adolescência, promovidas por organizações (ex.: escuteiros, 7.18. Rendimento mensal líquido do agregado familiar
associações, sindicatos) 7.19. Perceção de conforto económico de acordo com
6.9. Frequência de espaços culturais, durante a infância o rendimento mensal líquido
e adolescência, combinadas com amigos
6.10. Frequência de espaços culturais, durante a infância
e adolescência, realizadas individualmente
6.11. Participação, durante a infância e adolescência, em iniciativas
oferecidas pelos espaços culturais visitados
6.12. Participação em oficinas artísticas e/ou aulas/lições de alguma
disciplina artística
6.13. Frequência de áreas de formação artística
6.14. Instituições ou locais em que se teve formação artística
6.15. Razões pelas quais não se frequentou oficinas ou aulas/lições
artísticas
6.16. Áreas artísticas que seriam frequentadas se existisse formação
artística na área de residência
6.17. Meios através dos quais se toma conhecimento
dos acontecimentos culturais
6.18. Perceção individual do conhecimento para desfrutar da oferta
cultural

442 443

Você também pode gostar