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MATERIAL DE

TRANSIÇÃO

GEOGRAFIA
HISTÓRIA
SOCIOLOGIA

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COLEÇÃO LUMEN
Copyright © Editora Poliedro, 2022.
Todos os direitos de edição reservados à Editora Poliedro.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal, Lei n° 9.610
de 19 de fevereiro de 1998.

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Autoria: Murilo Medici Navarro da Cruz, Eduard Henry,
Fábio Monteiro, André Luiz de Souza Sampaio e
Paulo de Tarso Medeiros Valerio
Edição de conteúdo: Beatriz de Almeida Francisco,
Jaqueline Paiva Cesar, Luiza Delamare Quedinho e
Romulo Vitor Braga
Edição de arte: Fabiana Florêncio Fernandes, Patrícia
Monteiro e Leonardo Pires
Ilustrações: Equipe Poliedro
Design: Adilson Casarotti
Licenciamento e multimídia: Leticia Palaria de Castro,
Danielle Navarro Fernandes e Jessica Clifton Riley
Revisão: Rosangela Muricy, Bruno Freitas, Ingrid Lourenço
e Sara Santos
Impressão e acabamento: PifferPrint

A Editora Poliedro pesquisou junto às fontes apropriadas a existência de eventuais


detentores dos direitos de todos os textos e de todas as imagens presentes nesta
obra didática. Em caso de omissão, involuntária, de quaisquer créditos, colocamo-nos
à disposição para avaliação e consequentes correção e inserção nas futuras edições,
estando, ainda, reservados os direitos referidos no art. 28 da Lei nº 9.610/98.

Poliedro Sistema de Ensino


T. 12 3924 -1616
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Apresentação

O material de transição vai ajudá-lo a enfrentar os desafios do


Novo Ensino Médio.
Ele apresenta os capítulos que foram deslocados para a 1ª série na
edição de 2022 da coleção Lumen.
Assim, os alunos que usaram a Lumen em 2021 não terão falta de
conteúdo em sua formação.

Bons estudos!
O autor

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Sumário

GEOGRAFIA
FRENTE B
A dinâmica da globalização e a geopolítica do poder .............................................................6
Capítulo T1 – Sistema internacional .........................................................................................................................8
Relações internacionais .................................................................................................................................................................. 9
Organizações intergovernamentais ..........................................................................................................................................15
Outras organizações intergovernamentais.............................................................................................................................18
Aplicando conhecimentos..........................................................................................................................................................21
Consolidando saberes .................................................................................................................................................................22

Capítulo T2 – Ordem mundial da Guerra Fria ....................................................................................................... 28


Equilíbrio de poder e ordens mundiais ....................................................................................................................................29
Ordem Mundial Bipolar ..................................................................................................................................................................29
Formação da bipolaridade ...........................................................................................................................................................34
Fim da Guerra Fria...........................................................................................................................................................................42
Aplicando conhecimentos..........................................................................................................................................................44
Consolidando saberes .................................................................................................................................................................45
No Enem é assim ...........................................................................................................................................................................49

Gabarito ...................................................................................................................................................................... 52
Guenterguni/iStockphoto.com

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HISTÓRIA SOCIOLOGIA
FRENTE B Surgimento da Sociologia
Corte portuguesa no Brasil e formação como ciência ............................................ 104
do Estado Nacional brasileiro ................. 54 Capítulo T1 – Primeiras formulações do
pensamento social ................................................106
Capítulo T1 – Independência como processo..... 56 Sociedade em estágios: a perspectiva
A crise do sistema colonial........................................57 positivista de Comte ................................................ 107
Leitura de documentos.............................................64 Outras faces do positivismo................................... 115
Aplicando conhecimentos.......................................66 Positivismo e as crises hídricas brasileiras........ 118
Consolidando saberes ..............................................68 Aplicando conhecimentos.................................... 119
Capítulo T2 – Primeiro Reinado: Consolidando saberes ........................................... 121
cultura e política ...................................................... 72 No Enem é assim ..................................................... 124
Um problema chamado Estado-nação .................. 73
Leitura de documentos............................................. 79
Gabarito ..................................................................126
Aplicando conhecimentos....................................... 80
Consolidando saberes .............................................. 81
Capítulo T3 – Regência .......................................... 83
Uma experiência republicana...................................84
Leitura de documentos.............................................89
Aplicando conhecimentos.......................................90
Consolidando saberes ..............................................91
No Enem é assim ........................................................95

Gabarito ..................................................................102
Ministério da Cultura da Argentina
(CC BY-SA 2.0)

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Bandeiras dos países-membros em frente ao edifício da
Organização das Nações Unidas (ONU), em Genebra, Suíça.

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Geografia

B
FRENTE

A dinâmica da
globalização e a
geopolítica do poder
Nesta unidade, vamos nos dedicar ao estudo da glo-
balização e da geopolítica do poder.
Muitos dos temas que estudamos em Geografia, com
destaque para a globalização e a industrialização, estão
relacionados a redes e fluxos. A globalização se baseia
na integração dos lugares por meio dos sistemas de
transporte e comunicação e permite a intensificação das
trocas comerciais e de informação entre os mais distan-
tes pontos da superfície terrestre.
A geopolítica mundial descreve e estuda as relações
de poder no mundo. Essas relações ocorrem de formas
diversas e em diferentes instâncias: econômica, cultural,
política, entre outras. A guerra, que segundo Carl von
Clausewitz (1780-1831) – um dos maiores especialistas no
assunto – “é a continuação da política por outros meios”,
representa mais uma dessas instâncias.

De que formas os meios de transporte e as fontes de


energia se relacionam?
Cite mudanças que ocorreram nas relações
internacionais desde a Primeira Guerra Mundial.
Como a disputa pelo poder mundial interfere em
assuntos internos dos países?

nexus 7/Shutterstock.com

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T1
CAPÍTULO
Sistema internacional

mizoula/iStockphoto.com
Edifício-sede da ONU, em Nova York, Estados Unidos, em 2016.

Atualmente, existem 193 países (Estados nacionais) no mundo reconhecidos pela ONU, além de nações
que ocupam territórios não reconhecidos como Estados pela comunidade internacional. O complexo jogo
de poder e influência entre esses países, no espaço mundial, concilia uma dinâmica e intricada rede de
relações. A economia, a cultura e a política de todos os países inseridos no sistema mundial são influen-
ciadas pelas relações desse sistema, o que significa que as relações internacionais, no contexto global,
influenciam cotidianamente a vida de todos os seres humanos, mesmo que isso não esteja muito claro em
diversos momentos.
A organização político-territorial do mundo contemporâneo é relativamente recente. Diversos países
africanos, por exemplo, tornaram-se independentes a partir da segunda metade do século XX e no início
do século XXI, como o Sudão do Sul em 2011. Além disso, ainda hoje há casos de Estados que não são
reconhecidos pela comunidade internacional, como a Palestina. Assim, as nações e o sistema internacional
devem ser vistos como elementos dinâmicos que estão se transformando constantemente. Essa transfor-
mação, no entanto, não é aleatória, está baseada em princípios do Direito, da Economia, da Política e da
Geografia, que vêm sendo estipulados há séculos. Neste capítulo, trataremos desses princípios para me-
lhor compreender o funcionamento das relações internacionais no âmbito de um sistema mundial.

• O que é uma nação? Como ela se insere na dinâmica das relações internacionais?
• Qual é a importância da ONU no sistema internacional? Que funções ela pode assumir?

Neste capítulo, serão abordadas as habilidades EM13CHS203, EM13CHS204, EM13CHS603 e EM13CHS604.

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Relações internacionais
Segundo o historiador israelense Yuval Harari (1976-), a grande dife-
rença entre os humanos arcaicos, como o Homo erectus ou os Neander-
tais, e nós, Homo sapiens, é que nosso sistema cognitivo é capaz de criar
ideias que não existem e, o mais importante, acreditar nelas, pois não são
como mentiras, mas histórias imaginadas e compartilhadas por grupos
de pessoas. Graças a elas, milhares ou até milhões de pessoas que não
se conhecem, nem nunca se conhecerão, cooperam entre si, sejam em
termos econômicos, políticos, militares ou científicos.
O sistema internacional moderno é uma dessas grandes “invenções”,
criado por histórias compartilhadas coletivamente. Um sinal bastante cla-
ro disso é que não há, hoje, no mundo uma área sequer da superfície ter-
restre (ou marítima) que não seja regulada por esse sistema internacional,
delimitadas e regulamentadas por acordos multilaterais.
Países, nações, organizações intergovernamentais e diplomacia – Diplomacia: conjunto de meca-
conceitos fundamentais para compreender os últimos séculos – são, em nismos da política externa que os
grande parte, frutos de acordos e convenções estabelecidos ao longo da países utilizam para estabelecer
história pela comunidade internacional. relações pacíficas uns com os
A existência e o reconhecimento universal da diplomacia são sinais de outros.
que a maioria das pessoas aceita a existência dos países como um dado
da realidade. Todos os países têm seu corpo diplomático, ou seja, um gru-
po de funcionários públicos preparados para exercer a função diplomática.
Segundo Demétrio Magnoli (1958-), estudioso das relações internacionais
e da geopolítica, a diplomacia teria quatro funções de relevância:
• Facilitar a comunicação entre os líderes políticos dos Estados. Nesse
caso, fica subentendido que o diplomata é também um mensageiro
que, além de ter acesso aos territórios estrangeiros, representa seu
país de origem.
• Negociar acordos entre países. O que inclui o reconhecimento de
que, apesar das divergências políticas, econômicas, culturais etc. en-
tre os países, devem-se respeitar os interesses do outro para a busca
de acordos e equilíbrio entre as partes envolvidas.
• Reunir informações importantes sobre os outros países. Esta é uma fun-
ção de inteligência diplomática, que não deve ser confundida com es-
pionagem, veementemente condenada pela comunidade internacional.
• Minimizar as fricções e os conflitos entre os países. Considera-se que
conflitos de interesses entre países são legítimos e que a atividade
diplomática deve ser usada para minimizá-los, evitando grandes rom-
pimentos ou até conflitos militares.

Na prática, a diplomacia procura garantir a realização dos princípios


da política externa de cada país, ou seja, os objetivos nacionais no que
se refere às relações internacionais. Há, por exemplo, políticas externas
mais voltadas a promover o alinhamento de um país menor e menos po-
deroso a potências mundiais ou regionais. Por outro lado, pode haver
políticas alinhadas a princípios mais autonomistas, segundo os quais o
país procura marcar sua neutralidade e independência.
Para colocar em prática a política externa, cada país conta com um
corpo diplomático e instituições voltadas à preparação e manutenção
desse grupo de pessoas. No Brasil, por exemplo, foi fundado em 1945 o
Instituto Rio Branco, a escola oficial da diplomacia brasileira.
O nome do Instituto é uma homenagem a José Maria da Silva Para-
nhos Júnior (1845-1912), o Barão do Rio Branco, considerado o patrono da
diplomacia brasileira, principalmente por ter sido aquele que definiu os
princípios fundamentais da política externa do país, marcada, com raras
exceções, por neutralidade, pragmatismo e busca de autonomia.

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 9

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Para se tornar diplomata, é preciso ingres-
filipefrazao/iStockphoto.com

sar no Instituto Rio Branco e passar por um


processo seletivo exigente. Após a formação,
o candidato inicia sua carreira diplomática no
Ministério de Relações Exteriores, também
conhecido como Itamaraty, nome do edifício
sede em Brasília. A autoridade máxima do mi-
nistério é o ministro das relações exteriores,
por vezes chamado de chanceler, escolhido
pelo presidente da República.
Os diplomatas, tanto no Brasil como no
restante do mundo, podem trabalhar no pró-
prio país, no órgão responsável pela política
externa, mas também em embaixadas e con-
sulados localizados no exterior. As embaixa-
das e os consulados são os dois tipos mais
importantes de representações diplomáti-
cas fixados em território estrangeiro.
Palácio do Itamaraty, em Brasília, sede As embaixadas estão no topo da hierarquia diplomática e são a re-
do Ministério das Relações Exteriores do presentação direta do governo de um país no exterior, estabelecendo
Brasil, em 2015.
relações entre dois governos. Por isso, cada Estado nacional instala
apenas uma embaixada em território estrangeiro com que mantém rela-
ções diplomáticas diretas. Além das embaixadas, a rede consular brasi-
leira dispõe de consulados, vice-consulados e escritórios de represen-
tação vinculados à missão diplomática, o que a torna uma das maiores
do mundo.
Os consulados, por sua vez, são representações diplomáticas que
têm a função de manter possíveis conexões entre o governo e seus
próprios cidadãos que estão, temporária ou permanentemente, em
outros países.
O conjunto de atividades diplomáticas só é efetivo e funcional quan-
do há o reconhecimento mútuo entre os agentes envolvidos, de modo
que negociações, acordos e compromissos sejam firmados entre sujei-
tos (países, de modo geral) amparados pelo direito internacional. É pre-
ciso que todos os governos (ou ampla maioria), bem como o conjunto de
instituições e organizações supranacionais, como a ONU, reconheçam
e endossem a existência de determinado país, ou seja, o corpo formado
por governo, povo e território.

Sistema internacional moderno


O mundo, ao longo do tempo, organizou-se, em termos políticos, de
diferentes formas. Na maior parte da história, prevaleceram os impérios,
geralmente baseados em uma região, mas estendendo seus domínios
por vastas áreas da superfície terrestre. Podemos citar, por exemplo,
o Império Macedônico, o Romano, o Mongol, o Otomano, o Persa, o Inca
e o Asteca.
Nos últimos dois séculos, a consolidação e expansão do Estado mo-
derno levou à divisão política dos territórios em países, como conhecemos
hoje. Essas unidades, no entanto, não podem ser compreendidas de for-
ma isolada. A seguir, trataremos de seus componentes e funcionamento.

Estado-nação
O sistema internacional moderno é baseado em uma organiza-
ção político-territorial denominada Estado-nação, ou Estado nacional,
popularmente chamada de país. Essa organização é composta por três
elementos: o Estado moderno, a nação e o território. Vamos estudar um
pouco de cada um desses elementos.

10 GEOGRAFIA / Frente B

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Estado moderno
Em termos gerais, o Estado é a organização política de uma socieda-
de. Mas é preciso fazer uma ressalva: entendemos como sociedade um
agrupamento humano grande o suficiente para que as relações entre as Fique
pessoas estejam além dos vínculos pessoais, o que a difere da condição ligado
de comunidade, marcada pelo vínculo direto entre seus integrantes.
É importante diferenciar
Desde a formação das primeiras civilizações da Antiguidade, passou
os conceitos de Estado
a ser necessária a constituição de uma organização mais ampla e norma- e governo. Enquanto
tiva, a que chamamos, genericamente, de Estado. O que caracterizava o primeiro se refere à
esses agrupamentos era justamente o fato de não ser possível manter a organização política de uma
união do grupo apenas por meio de relações diretas entre as pessoas; sociedade, o segundo se
era necessário criar uma organização abstrata que regulasse a vida de refere ao grupo de pessoas
todas essas pessoas, de modo a mantê-las unidas como um grupo. que está, ou esteve, no
O Estado é, nesse contexto, um bom exemplo das histórias inventadas comando dessa organização
e compartilhadas coletivamente, das quais trata Yuval Harari. O Estado é durante certo período.
uma ideia aceita pela coletividade humana, ideia que orienta, regula e O Estado brasileiro, apesar de
ter mudado bastante, existe
normatiza a vida por meio de leis e regulamentos. As pessoas, em socie-
desde a independência do
dade, ou boa parte delas, aceitam seguir as leis, respeitar as autoridades
país, em 1822.
estatais e, dessa forma, cooperar com a coletividade. Isso vale tanto para Desde então, o país passou
as formas antigas de Estado como para os exemplos contemporâneos. por diferentes formas de
Apesar de podermos usar o termo Estado para tratar dessas antigas organização política e de
organizações, há estudiosos que não veem nelas as características que governo. Desde 1889, o Brasil
definem a organização estatal, principalmente por estarem muito pre- é uma República Federativa
sas às figuras concretas de líderes, mitos e crenças religiosas. O Estado e o chefe de governo é o
como um produto e, ao mesmo tempo, uma característica da modernida- Presidente da República.
de começa a surgir no século XV, com a ascensão das monarquias abso-
lutistas. As principais novidades, nesse contexto histórico, foram:
• a unificação do poder em um governo central e soberano, ou seja,
não submetido a nenhuma outra autoridade;
• a criação de corpos estáveis de funcionários públicos para cuidar da
burocracia estatal;
• a criação de exércitos regulares e profissionalizados;
• a criação de fronteiras bem definidas;
• a organização da cobrança de impostos em todo o território coman-
dado pelo Estado.
Além dessas novidades práticas, foi sendo moldada, aos poucos,
uma nova história coletiva que faria com que as pessoas vissem, no Es-
tado moderno, a mesma legitimidade que antes viam em líderes apoia-
dos por mitos e crenças religiosas. Alguns pensadores são até hoje
estudados por terem contribuído com a criação dessa história. De forma
muito simplificada, vejamos algumas de suas contribuições.
Nicolau Maquiavel
Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi importante na criação da ideia de
razão de Estado, ou seja, muitas ações do governante (“o príncipe”) po-
dem ter como motivação preservar a organização estatal, mesmo que se
dirijam contra uma parte de seus súditos.
Thomas Hobbes
Thomas Hobbes (1588-1679) deu sua principal contribuição ao criar a
ideia de que o Estado substituiu o “estado de natureza”, que teria exis-
tido antes da organização estatal, e era caracterizado pela “guerra de
todos contra todos”. Para viver em paz, os homens teriam renunciado a
sua liberdade em nome de um governo centralizado e absoluto. Provém
dessa ideia o monopólio do uso legítimo da violência, segundo o qual
apenas o Estado pode usar a violência ou permitir seu uso, o que seria
feito sempre em função do interesse coletivo.

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 11

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John Locke
John Locke (1632-1704) é considerado o fundador do liberalismo
político, contrapondo-se ao Estado absolutista e, dessa forma, contri-
buindo para a formação da concepção de Estado mais próxima da que
temos hoje. Uma de suas principais teses foi a defesa das liberdades
individuais, principalmente na escolha da religião e da propriedade
privada. Nesse contexto, a função do Estado passava a ser proteger
as liberdades.
Montesquieu
Montesquieu (1689-1755) foi o idealizador da divisão da autoridade
estatal em três poderes, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. A prin-
cipal ideia por trás da proposta é que cada um dos poderes seja limitado
pelos outros dois, de modo a garantir que o Estado não se transforme
em uma organização tirânica. Esse seria um caminho para que o governo
cumprisse sua função, como definida por Locke, de defender as liberda-
des individuais. A divisão em três poderes transformou-se no padrão de
todas as democracias modernas.
Rousseau
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) é autor do famoso livro Do con-
trato social. Sua obra radicaliza as concepções liberalizantes de John
Locke e Montesquieu. Para Rousseau, o surgimento do Estado acabou
com a liberdade e o equilíbrio entre os seres humanos, ideia comple-
tamente contrária à de Hobbes e seu “estado de natureza”. Mas, como
não seria possível retornar a uma condição pré-estatal, o pensador suí-
ço propõe que a legitimidade do Estado deveria se basear em um con-
trato social realizado por todos os cidadãos, fundamentado no ideal
de bem comum, acima do direito à propriedade. As ideias de Rousseau
influenciaram tanto as propostas socialistas como a criação do Estado
de bem-estar social.
Resumindo, podemos dizer que as ideias desses pensadores tradu-
zem características fundamentais do Estado moderno:
• a legitimidade das ações estatais com base na ideia de razão de
Estado;
• o monopólio do uso legítimo da violência;
• a defesa das liberdades individuais;
• a divisão da autoridade estatal em três poderes;
• a defesa do bem comum e da igualdade por meio da criação de um
contrato social, que tende a ser simbolizado por uma constituição.
Nação
… a Revolução Francesa O Estado moderno iniciou sua formação com as monarquias absolu-
representou um embate tistas, mas ele começou a ganhar mais consistência com as revoluções
entre três Estados, como liberais dos séculos XVII e XVIII. No século XVII ocorreram as revo-
eram chamados o clero luções inglesas (Puritana e Gloriosa) que limitaram o poder do Estado,
( 1o Estado), a nobreza respeitando os direitos individuais. No século XVIII ocorreram a indepen-
(2o Estado) e o restante da dência dos Estados Unidos e a Revolução Francesa, responsáveis
população (3o Estado). Este pela difusão das ideias de democracia, bem comum e, principalmente,
incluía tanto a burguesia da moderna concepção de nação.
como os artesãos e os
A nação é uma representação coletiva, cuja relevância tornou-se es-
camponeses, as pessoas
que pagavam impostos e
tratégica após a Revolução Francesa por dois motivos. Em primeiro lugar,
não tinham privilégios. Uma porque as antigas identidades estavam deixando de valer naquele mo-
grande parte da população, mento. Até então, os povos europeus se identificavam, coletivamente,
naquele momento, lutava por meio da religião ou como súditos de um mesmo monarca. O pro-
contra os privilégios da cesso revolucionário rompeu com as duas instâncias e deu lugar ao que
minoria. ficou conhecido como o terceiro Estado.

12 GEOGRAFIA / Frente B

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Em segundo lugar, podemos citar a influência das ideias de Rousseau
Mais
no movimento revolucionário. Para ele, a soberania estaria ligada ao povo
e não ao monarca ou a outro governante. Mas, afinal, o que é o povo? Sobre hinos nacionais e
As identidades nacionais foram construídas ao longo dos séculos
XIX e XX. Nesse processo, podemos dizer que a construção represen-
seus significados para um
tou dois sentidos diferentes. Por um lado, a nação representava a luta país, Politiquês.
pela liberdade de um povo, em relação às autoridades que não eram No link a seguir, você pode ouvir
mais legítimas. Esse lado acabou alimentando um importante princípio um podcast que conta com a
das relações internacionais, válido até os nossos dias: o princípio da au- presença de dois estudiosos dos
todeterminação dos povos, que corresponde à aplicação direta do ideal hinos nacionais: a historiadora
Verônica Calsoni Lima e o
rousseauniano de soberania do povo.
geógrafo Tiago Berg.
Portanto, se por um lado a identidade nacional surge como um re- Disponível em: http://p.p4ed.com/
conhecimento coletivo de que certas características unem um grupo de UOJOD. Acesso em: 12 jul. 2021.
pessoas para resistir a um poder exterior e ilegítimo, por outro, ela repre-
senta um sentimento criado por uma série de mecanismos, procurando
produzir uma identidade coletiva que não existia, necessariamente.
No Brasil, por exemplo, a figura de Joaquim José da Silva Xavier (1746-
-1792), mais conhecido como Tiradentes, condenado à morte em 1792
por ter participado da Inconfidência Mineira, foi recuperada no início da
República na tentativa de fazê-lo herói nacional. A narrativa oficial passou
a ligar suas ações à luta pela liberdade contra a monarquia estrangeira.
No século XX, os meios de comunicação modernos e a cultura de
massa por eles divulgada ampliaram o alcance e a intensidade da cons-
trução do sentimento de nacionalidade. O rádio e a televisão, ao transmi-
tir para todo o território nacional músicas, filmes e noticiários, ajudaram a
difundir símbolos da nacionalidade para toda a população.
Talvez este seja um dos melhores exemplos daquelas histórias inven-
tadas e compartilhadas coletivamente das quais fala Harari. Afinal, a iden-
tidade nacional foi, e continua sendo, uma das formas mais eficientes de
fazer as pessoas cooperarem entre si, quando organizadas em grupos
Fique
de milhões. A ideia de que há um interesse nacional e coletivo é, ainda ligado
hoje, uma das ideias mais fortes, com mais influência na política dos paí- As identidades coletivas
ses e, consequentemente, nas relações internacionais. são poderosos instrumentos
para garantir a cooperação
Território
entre pessoas que não se
Nas monarquias absolutistas, o Estado passou a ser diretamente liga- conhecem. Essa cooperação
do a uma área bem definida sobre a qual exercia o seu poder e domínio. pode ter como principal foco
Essa mudança esteve diretamente relacionada à centralização do poder o bem do próprio grupo,
e à delimitação dos limites territoriais. mas também pode ocorrer,
em determinados contextos
Na passagem do feudalismo para as monarquias absolutistas, o Estado
e circunstâncias, de modo
centralizou o poder para estabelecer o monopólio do uso legítimo da força, direcionado à dominação
pois retirou dos senhores feudais o direito de terem suas próprias tropas e ou à destruição de outras
de exercerem o poder pela violência. Porém, o processo de centralização coletividades, julgadas como
não foi apenas político, mas também espacial, pois foi necessário estabele- diferentes ou inferiores.
cer até onde (espaço físico) o poder de cada monarca estendia-se. Costuma-se fazer, nesse
A ideia de delimitação está relaciona às fronteiras, que em geral são sentido, uma diferenciação
entendidas como limite absoluto entre dois territórios. No entanto, nos entre patriotismo (sentimento
estudos de Geografia política a fronteira é uma zona de contato entre de pertencimento a uma
duas organizações políticas, cuja dimensão pode variar consideravel- pátria e de responsabilidade
mente, onde trocas, fluxos e relações tendem a ser intensos. Inclusive a para com ela) e nacionalismo
(sentimento de fixação e
identidade nacional tende a ser menos clara na zona fronteiriça por causa
de responsabilidade com
do tipo de relação que ali se desenvolve. Por isso, garantir o controle das o grupo nacional e seus
fronteiras é sempre uma grande preocupação dos Estados centralizados. interesses). O segundo, não
Quando observamos em um mapa os limites (linhas) traçados entre os raramente, costuma alimentar
territórios de países, por exemplo, estamos visualizando uma simplifica- sentimentos e tentativas de
ção da zona fronteiriça, como se de cada lado da linha representada no dominação e subjugação,
mapa existissem sociedades completamente diferentes. preconceito e xenofobia.

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 13

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Mundo: divisão política
0° OCEANO GLACIAL ÁRTICO
Círculo Polar Ártico

OCEANO
Trópico de Câncer
PACÍFICO

Equador

OCEANO
OCEANO OCEANO
PACÍFICO
ATLÂNTICO ÍNDICO
Trópico de Capricórnio

Meridiano de Greenwich
Círculo Polar Antártico
OCEANO GLACIAL ANTÁRTICO

Fronteiras internacionais 0 2 750 km

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Mapas. Disponível em: https://7a12.ibge.gov.br/images/7a12/mapas/mundo/planisferio_pol.pdf.


Acesso em: 12 jul. 2021.
Google Earth/DigitalGlobe/Image © 2019

shakzu/iStockphoto.com
Santana do Livramento

Rivera

Rivera (Uruguai) e Santana do Livramento (Brasil) na zona Mexicanos conversam com familiares que moram nos Estados
fronteiriça entre os dois países. Não há limites físicos entre as Unidos, através de muro de metal construído na fronteira entre
duas cidades. os dois países, em Playas de Tijuana, 2017.

Poder no sistema internacional


Apesar de o Estado-nação ser uma das bases políticas sobre a qual
se assenta a organização político-territorial do mundo moderno, não po-
demos entendê-lo como uma unidade isolada. Todos os países, sejam
os mais poderosos ou os mais fragilizados, dependem das relações que
estabelecem uns com os outros no contexto do sistema internacional.
Esse sistema é caracterizado pela convivência entre unidades políti-
cas que, salvo exceções, reconhecem a soberania umas das outras, ou
seja, aceitam o fato de que cada governo tem autoridade inquestionável
sobre seu território (soberania). Isso não significa, no entanto, a inexis-
tência de interesses conflitantes entre os agentes. Mesmo considerando
tal característica, esse sistema se baseia em três princípios que o distin-
guem de sistemas políticos anteriores. Os princípios foram definidos a
partir da chamada Paz de Vestfália, decorrente de uma série de acordos
assinados por várias unidades políticas europeias em 1648, pondo fim à

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Guerra dos Trinta Anos. Por isso, nos estudos das relações internacionais,
costuma-se chamar esse sistema de Ordem de Vestfália. Os três princí-
pios são os seguintes:
• consolidação da razão de Estado, que substituiu a orientação religio-
sa como princípio de organização e de administração da política dos
governos e das relações internacionais, mesmo que, internamente,
a religião tenha grande importância na definição de leis e costumes;
• equilíbrio de poder entre os Estados, situação na qual a maioria dos
países se comporta de forma a evitar os conflitos militares. É inte-
ressante ressaltar que a Guerra dos Trinta Anos foi muito violenta e
destrutiva, sendo considerada, proporcionalmente, a mais mortífe-
ra da história europeia. Isso contribuiu para que os líderes políticos
adotassem um comportamento contrário às grandes guerras, dando
prioridade ao reconhecimento das soberanias dos Estados, adver-
sários, e ao uso da diplomacia como forma de solucionar as disputas
de interesses;
• criação das condições para o início do desenvolvimento do direito
internacional. A relativa perda de poder da autoridade religiosa tornou
possível a criação de acordos e tratados internacionais.

Mesmo não acabando de vez com as guerras, os princípios de


Vestfália conseguiram garantir certa estabilidade nas relações interna-
cionais, o que tornou possível o desenvolvimento da diplomacia e fez
com que os tratados decorrentes daquele período fossem considerados
o marco do nascimento das relações internacionais modernas. No siste-
ma que se formou a partir de então, as disputas de poder passaram a se
dar de duas formas complementares, tanto dentro dos países como entre
eles. Por um lado, continuou valendo o uso da violência, legalmente um
monopólio dos governos. A força como forma de garantir o poder costu-
ma ser chamada de coerção, ou poder coercitivo, diretamente ligado à
capacidade militar de cada país.
O desenvolvimento da diplomacia, a busca pelo equilíbrio de poder e
a tentativa de evitar as guerras levaram à ascensão de uma nova forma
de garantir o poder: o estabelecimento do consenso. Nesse contexto, o
poder é baseado na criação de uma situação na qual aquele que detém
maior poder convence os que estão submetidos a ele de que essa situa-
ção é boa para todos, ou, pelo menos, inevitável. É uma estratégia muito
mais eficiente do que a primeira, pois, com menos recursos, é possível
garantir mais controle com menos chance de resistência.
A junção dessas duas estratégias para garantir o poder dá origem a
uma situação de hegemonia. Uma potência hegemônica é aquela que
alia coerção e consenso para garantir seu controle sobre outros países.
Entre o século XIX e o início do XX, França e Inglaterra se estabeleceram
como potências hegemônicas. No período, ambas conseguiram desen-
volver grande poderio militar e, ao mesmo tempo, tornaram sua cultura,
sua língua e seu modo de vida admirados internacionalmente, levando
muitos países a aceitar seu poder como benéfico a todos, exportando um
modelo superior de civilização europeia para o mundo.

Organizações intergovernamentais
A hegemonia da Inglaterra e da França começou a se deteriorar no
final do século XIX. Novas potências alimentavam pretensões expansio-
nistas, entre elas a Alemanha, o Japão, os Estados Unidos e a Rússia,
situação que gerou uma disputa imperialista, culminando na Primeira
Guerra Mundial (1914-1918).

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 15

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Apesar de ter passado por outros períodos problemáticos, como as
Guerras Napoleônicas (1803-1815), a Paz de Vestfália tinha se mantido, ou
sido recuperada e reformada. Mas a Primeira Guerra Mundial, na época
chamada de a Grande Guerra, tinha colocado um ponto-final nos arranjos
ligados à Vestfália. O maior sinal do rompimento seria a desconsideração
das soberanias nacionais pelos diversos Estados envolvidos no conflito.
A partir dessa contestação, alguns líderes políticos começaram a propor
uma nova forma de manter uma estabilidade razoável no sistema interna-
cional, a qual se baseava na criação de organizações intergovernamen-
tais. De acordo com a nova proposta, o compromisso dos países não era
mais suficiente para chegar a um resultado aceitável, sendo necessária a
criação de uma associação definitiva que tivesse como objetivo prevenir,
de forma permanente, as guerras.
O mais famoso proponente desse modelo foi Woodrow Wilson
Everett Historical/Shutterstock.com

(1856-1924), presidente dos Estados Unidos, no fim da Primeira Guerra


Mundial. Wilson tinha doutorado em Ciências Políticas, havia lecionado
em importantes universidades estadunidenses e era admirador da tese
da Paz Perpétua, proposta pelo filósofo alemão Immanuel Kant (1724-
-1804), segundo a qual a garantia da paz mundial deveria contar com a
criação de uma federação de Estados capacitada a tornar mais racional
a relação entre os países, evitando conflitos armados.
Nos acordos de paz da Primeira Guerra Mundial, Wilson propôs a
criação de uma associação visando a esses objetivos, dando-lhe o
nome de Liga das Nações (ou Sociedade das Nações). A Liga foi criada,
mas os Estados Unidos não ingressaram nela, pois a proposta não foi
aprovada pelo congresso do país. Esse fato fez a organização perder
força e essa fragilidade não permitiu que a Segunda Guerra Mundial
(1939-1945) fosse evitada.
Mesmo assim, dentro da Liga foram criadas organizações importan-
Woodrow Wilson. tes, entre elas a Organização Internacional do Trabalho, a Organização
da Saúde e o Tribunal Permanente de Justiça Internacional. As três orga-
nizações passariam a integrar a Organização das Nações Unidas (ONU),
depois do fim da Segunda Guerra Mundial, em outubro de 1945.

ONU
A Segunda Guerra Mundial foi o conflito armado que gerou mais mor-
tes na história, com batalhas travadas na Europa, na África e na Ásia.
Além das mortes e da destruição de cidades inteiras, as batalhas pro-
vocaram severas consequências para a economia dos países envolvidos,
com exceção dos Estados Unidos, que só entraram na guerra em 1941 e
cujo território permaneceu, praticamente, salvo de ataque. O crescimento
da economia estadunidense colocou o país em uma posição bastante
privilegiada no final da guerra.
Em 1945, a Europa e o Japão estavam devastados. Era clara a percep-
ção entre os grandes líderes mundiais da necessidade de se garantir o
reequilíbrio econômico e político mundial. Nesse momento e nos anos
posteriores, foram assinados alguns acordos e criadas algumas institui-
ções que contribuíram muito para esse objetivo. Vale destacar:
• o acordo de Bretton Woods (1944), que criou o Fundo Monetá-
rio Internacional (FMI), o Banco Internacional de Reconstrução e
Desenvolvimento (o Bird), hoje chamado de Banco Mundial, e o pa-
drão dólar-ouro;
• o plano Marshall (1947), uma grande ajuda financeira dos Estados Uni-
dos para a reconstrução econômica europeia;
• a OECD (1948), que em 1961 daria origem à Organização para Coope-
ração e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

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A mais importante dessas instituições é, inquestionavelmente, a ONU.

Drop of Light/Shutterstock.com
Fundada em 1945 por meio da Carta de São Francisco, ela é uma her-
deira direta da Liga das Nações e, portanto, uma continuidade da pro-
posta de Woodrow Wilson, baseada no ideal kantiano de se criar uma
associação entre os países para garantir a paz mundial. A sugestão da
criação da ONU partiu de outro presidente dos Estados Unidos, Franklin
D. Roosevelt (1882-1945), que sugeriu o nome da organização e começou
a negociar seus princípios e sua forma, ainda durante a Segunda Guerra
Mundial, com os líderes do Reino Unido, da União Soviética e da China.
Para que a ONU não tivesse o mesmo fim que a extinta Liga das Na-
ções, foi criado um grande sistema de organizações que deveriam cum-
prir diferentes funções na busca pela garantia da paz e do desenvolvi-
mento econômico e social. A ONU se baseia em cinco grandes órgãos:
• Assembleia Geral: é a reunião de todos os Estados-membros (inicial- Assembleia Geral das Nações Unidas
mente eram 51 e hoje são 193), presidida por um secretário-geral. En- em 2015.
tre as suas funções, estão: julgar recomendações gerais aos países
sobre paz, desenvolvimento, saúde e outros assuntos; analisar a en-
trada de novos membros; e tratar de questões orçamentárias. Além
disso, alguns importantes órgãos, conselhos e programas estão sub-
metidos à Assembleia Geral, como o Conselho de Direitos Humanos;
• Conselho de Segurança (CS): tem como objetivo tratar das questões
relacionadas à segurança mundial, ou seja, debater os conflitos e bus-
car soluções. Ele é composto por 15 países, sendo cinco permanentes e
dez rotativos. Os cinco permanentes são Estados Unidos, Reino Unido,
França, Rússia (que substituiu a extinta União Soviética) e China. Além
de serem permanentes, eles têm o direito de veto, que significa poder
bloquear uma decisão, mesmo que os outros quatorze a defendam; Fique
• Secretariado: composto pelo secretário-geral e um grupo de funcio- ligado
nários altamente qualificados. Tem como função dirigir a ONU como O Tribunal Internacional
um todo. O secretário-geral é o líder da organização, mas sua missão de Justiça não deve ser
é, como o nome do cargo procura indicar, cuidar do funcionamento confundido com o Tribunal
dos outros órgãos; Penal Internacional (TPI),
• Conselho Econômico e Social (ECOSOC): trabalha em parceria di- também chamado de
reta com a Assembleia Geral, tendo como objetivo gerenciar outros Corte Penal Internacional.
órgãos da ONU ou a ela associados, voltados para o desenvolvimento Enquanto o primeiro é um
econômico e social, com destaque para o FMI, o Banco Mundial, o órgão da ONU e tem a
PNUD (Desenvolvimento), o PNUMA (Meio Ambiente), o UNICEF (In- função de julgar processos
fância), a UNESCO (Ciência, educação e cultura), a FAO (Alimentação contra Estados-membros
da Organização, o segundo
e agricultura), a OMS (Saúde) e a Acnur (Refugiados);
não está ligado à ONU,
• Tribunal Internacional de Justiça: é o órgão jurídico da ONU que tem não é aceito por algumas
como função julgar países, considerando regras do direito internacio- potências, como os Estados
nal. Ele é composto por quinze juízes de diferentes nacionalidades e Unidos e a Rússia, e tem
suas decisões, condenando países, não têm aplicação imediata, pre- como função julgar pessoas,
cisando ser votadas dentro do Conselho de Segurança. É o único ór- quando acusadas de crimes
gão dos cinco principais da ONU que não fica na sede em Nova York, contra a humanidade.
mas sim em Haia, nos Países Baixos.

ONU e os direitos humanos


Apesar de retomar a ideia da Liga das Nações, a criação da ONU deu
um passo a mais na busca por organizar o direito internacional. Em razão
dos horrores da Segunda Guerra Mundial, havia um consenso em torno
da ideia de que era necessária, de forma clara e indubitável, a existência
de uma organização intergovernamental para a garantia da paz ou, pelo
menos, para a minimização dos conflitos armados. Estava evidente, tam-
bém, que a soberania dos Estados deveria ter um limite muito claro: o
direito de seus cidadãos.

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 17

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A ideia não era nova, afinal se aproxima bastante da tese de Rousseau

Fique de que a soberania deveria pertencer ao povo e, dessa forma, legitimar o


governo. No entanto, a ONU pretendeu internalizar essa ideia, que estava
ligado presente na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, produzida
pela Revolução Francesa e também presente no processo de indepen-
Em 1979, o jurista tcheco-
-francês Karel Vasak lançou
dência dos Estados Unidos.
a ideia de que os direitos A grande mudança, podemos dizer, foi o reconhecimento dos cida-
humanos poderiam ser dãos como sujeitos do direito internacional, em vez de apenas os Esta-
divididos em três gerações: dos serem reconhecidos como tal.
• Primeira geração: direitos Essa foi a proposta da Declaração Universal dos Direitos Humanos
civis e políticos; (DUDH), de 1948. Ainda assim, muito do que está previsto na declaração
• Segunda geração: direitos ainda não é realidade em grande parte dos países do mundo. A DUDH é
econômicos e sociais; composta por 30 artigos focados, principalmente, no direito à liberdade e
• Terceira geração: direitos à proteção e no acesso às condições dignas de vida, além de ser contra
da solidariedade. a discriminação.
Recentemente, foi proposta
Além do Conselho de Direitos Humanos ligado à Assembleia Geral, a
a quarta geração (direito aos
instrumentos da democracia
ONU busca promover os direitos humanos em todas as dimensões por
direta) e a quinta geração meio de órgãos ligados ao Conselho Econômico e Social, a exemplo do
(concepção da paz como um PNUMA, do PNUD, da OMS, do UNICEF e da UNESCO.
direito isolado).
Outras organizações
intergovernamentais
Ao longo do século XX, muitas outras organizações supranacionais
foram criadas, em geral com caráter mais limitado do que a ONU, tanto no
Discussão em sala número de países-membros como em relação aos objetivos.
• Organização Mundial do Comércio (OMC): em 1995 substituiu o
Cultura de massas Acordo Geral das Tarifas e Comércio (GATT), criado em 1947. Atual-
Para avaliar a situação de luta mente, abrange a grande maioria dos países e tem como objetivo
pelo poder mundial, Joseph promover o livre comércio. Costuma sofrer críticas por pressionar os
NyeC (1937-), cientista político países a abrir suas fronteiras comerciais, pois esse tipo de pressão
estadunidense, criou em 2002 poderia ferir a soberania nacional;
os conceitos de hardpower e • Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
softpower. O hardpower (OCDE): em 1961 substituiu a Organização Europeia para Coopera-
é equivalente ao uso da força ção e Desenvolvimento (OECD). A OCDE passou a incorporar países
na esfera internacional. não europeus e costuma ser chamada de “clube dos ricos”, porque a
O softpower está ligado à
maioria dos seus membros são países desenvolvidos;
divulgação de ideias e
valores culturais.
• G7: grupo dos sete países mais ricos do mundo. Não é uma organização
O sistema internacional moderno, formal, sendo apenas um fórum de reuniões e debates. Quando as pri-
portanto, é formado por diferentes meiras reuniões foram realizadas para discutir questões econômicas e
agentes e estratégias de busca e políticas, nos anos 1970, os sete países mais ricos eram Estados Unidos,
manutenção do poder. Canadá, Reino Unido, Alemanha, França, Japão e Itália. Apesar de não
Pensando sobre isso e serem os países mais ricos atualmente, eles continuam formando o G7.
considerando que no Ocidente a Entre 1997 e 2014, a Rússia também integrou o grupo, formando o G8;
produção cultural estadunidenses • G20: grupo das 20 maiores economias do mundo. Assim como o G7,
tem predomínio em escolhas o G20 não é uma organização formal. O grupo se reúne desde 1999, en-
relacionadas ao lazer, poderíamos globando 19 países mais a União Europeia (composta por 28 membros).
afirmar que a divulgação da
O G20 surgiu quando houve o reconhecimento de que os problemas
cultura estadunidense é parte
do projeto de poder dos Estados
da economia mundial não poderiam ser discutidos apenas no âmbito do
Unidos? O desenvolvimento da G7; era necessário incorporar outros países de relevância econômica e
internet e dos serviços de música política no sistema internacional, entre eles Brasil, China e Índia.
e de vídeo por streaming estaria Esses e outros grupos e organizações têm como objetivo a defesa
pulverizando as possibilidades de interesses econômicos e políticos de seus países-membros. De certa
de se constituir o softpower por forma, procuram compensar limitações da ONU, que não tem como ser o
outros países do mundo? único órgão para a defesa de tais interesses.

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Organizações intergovernamentais e a covid-19
A atuação da OMS no combate à pandemia da covid-19 constitui um
dos exemplos mais recentes da importância do sistema de relações
internacionais.
Fundada em 1948 no contexto em que a comunidade internacional
havia se comprometido a assegurar direitos fundamentais a todos, a OMS
surgiu com o objetivo de procurar garantir condições de vida saudáveis
em âmbito mundial. Desde que foi fundada, contribuiu com a defesa da
saúde ao organizar e liderar parceiros nas respostas à saúde, articular
centros de pesquisa localizados em diferentes regiões do mundo, reunir
dados globais para produzir respostas e definir procedimentos a serem
adotados em questões sanitárias, como normas de tratamento e avalia- Mais
ção da eficácia de medicamentos.
É por isso que, embora não tenha poder de decisão sobre os Estados, Cronograma de respostas
a OMS exerce influência sobre os 194 países-membros da organização
da OMS à covid-19
no que se refere aos princípios de responsabilidade mútua, transparência
No endereço eletrônico a seguir
e informação compartilhada no âmbito da saúde. E esse papel tem sido
você encontra uma linha do tempo
fundamental no contexto da pandemia da covid-19. interativa onde estão indicadas
O vírus que hoje é conhecido como Sars-Cov-2 foi identificado pela as ações da OMS em resposta
primeira vez no final de 2019, na cidade de Wuhan, capital da província à pandemia da covid-19. Entre
chinesa de Hubei. Desde o surgimento dos primeiros casos de covid-19, as medidas encabeçadas pela
na época caracterizados como uma pneumonia de origem desconheci- organização estão orientações
da, a OMS buscou articular as informações obtidas sobre os casos rela- para combater a doença, formação
tados na cidade chinesa com autoridades de saúde de todo o mundo. de conselhos, desenvolvimento de
A rápida propagação do vírus levou a organização, em janeiro de pesquisas científicas e estratégias
2020, a emitir o alerta de Emergência de Saúde Pública de Importância para a obtenção de recursos
Internacional (ESPII), adotado em casos que representam risco de saúde financeiros com o apoio de outras
organizações internacionais.
pública para outros países em virtude da disseminação internacional de
Disponível em: www.who.int/
doenças. Com o objetivo de prevenir ou reduzir a propagação mundial emergencies/diseases/novel-
de doenças e evitar interferências desnecessárias no comércio e tráfe- coronavirus-2019/interactive-
go internacional, esse alerta requer que haja uma resposta internacional timeline#!. Acesso em: 9 ago. 2021.
coordenada e imediata. Nesse momento, havia registro de 98 casos da O texto original está em inglês,
doença em 18 países fora da China. mas é possível selecionar a opção
Em março de 2020, considerando os níveis alarmantes de propaga- para leitura em português.
ção da covid-19, a OMS declarou estado de pandemia, caracterizado pela
ampla distribuição geográfica da doença, então encontrada em diversas
regiões do mundo.
Nessa ocasião, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, convocou
todos os países a tomarem medidas imediatas e contundentes para pre-
venir infecções, salvar vidas e minimizar os impactos sociais e econô-
micos causados pela doença e fez recomendações para dar apoio aos
países com sistemas de saúde mais fracos, acelerar o desenvolvimento
de vacinas, combater rumores e desinformação,
Alex Castellon/Shutterstock.com

além de compartilhar dados, conhecimentos e


experiências com a OMS e com o mundo, de
modo que houvesse amplo espírito de solidarie-
dade e cooperação.
Para enfrentar a situação, à medida em que
a OMS tomava conhecimento da nova doença,
uma série de recomendações foi feita para auxi-
liar os países no trabalho de frear a disseminação
da covid-19.

O uso de máscara, o distanciamento social, a adoção de


medidas de restrição à circulação de pessoas, o trabalho
remoto, o uso do oxigênio e outros recursos médicos foram
recomendações feitas pela OMS. Na foto, pessoas usando
máscaras em Madrid, 2020.

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 19

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Desenvolvimento de vacinas, parcerias internacionais e disputas geopolíticas
Embora a OMS seja uma referência internacional nas questões relacionadas à área da saúde, ela não tem
poder sobre os Estados, por isso coube a cada país adotar as medidas que julgou necessárias para combater a
covid-19. Nesse contexto, surgiram muitos conflitos de informação e divulgação de informações falsas que leva-
ram alguns países a questionar a validade das recomendações da OMS.
O caso mais crítico aconteceu em julho de 2020, quando o então presidente dos Estados Unidos, Donald
Trump, anunciou que seu país não participaria mais da OMS, fato que significaria a redução em 15% do orça-
mento da organização. De acordo com o porta-voz da presidência dos Estados Unidos, a OMS teria fracassado
no combate à pandemia e teria sido muito fiel às informações transmitidas pela China a respeito da dissemi-
nação do Sars-Cov-2. Nesse caso, no entanto, a guerra comercial e política entre as principais economias do
mundo (Estados Unidos e China) contribuiu para o ataque ao trabalho da organização.
No biênio 2018/2019 os Estados Unidos doaram 853 milhões de dólares à OMS, ocupando a primeira posição
entre os doadores. No entanto, em 2020/2021 caíram da primeira para a quarta posição. Desse modo, a contri-
buição estadunidense foi de apenas 340.2 milhões de dólares, em comparação com o período anterior.
Em novembro de 2020, Trump perdeu as eleições presidenciais para o candidato Joe Biden, do partido De-
mocrata. Como havia prometido ao longo de sua campanha à presidência, em janeiro de 2021, Biden desfez a
decisão de Trump ao anunciar que os Estados Unidos não sairiam da OMS. Além disso, Biden tornou obrigatório
o uso de máscaras em edifícios federais, em viagens interestaduais e em transportes públicos.
A pandemia da covid-19 não pode ser compreendida, portanto, fora do contexto geopolítico mundial. E nes-
se sentido as desigualdades entre as nações atingem diretamente a capacidade da comunidade mundial para
enfrentar a crise sanitária. Como se trata de uma doença provocada por vírus, a vacina é a única medida sanitá-
ria com eficácia no longo prazo. Portanto, facilitar o acesso à produção e compra da vacina, apesar da grande
concentração de renda em poucas empresas e nações, tornou-se uma questão emergencial no contexto da
pandemia.
Uma das soluções em pauta em 2021 é a quebra ou suspensão das patentes das vacinas já existentes, ou
seja, aquelas que já foram aprovadas pela OMS para uso emergencial. Ao suspender a patente de uma vacina,
qualquer país do mundo passa a ter acesso ao seu modo de produção, isto é, ao conhecimento necessário para
fabricá-la.
Considerando essa possibilidade, um grupo formado por cerca de 60 países, do qual o Brasil não faz par-
te, entrou em acordo para propor a suspensão temporária de patentes das “ferramentas médicas” disponíveis
contra a covid-19, inclusive das vacinas. Nesse ponto, a decisão e as medidas que serão definidas na OMC, foro
multilateral responsável pela regulamentação do comércio internacional, podem contribuir para diminuir as difi-
culdades no acesso à vacina.
No entanto, ainda que a decisão de quebrar as patentes das vacinas seja aprovada por todas as nações do
mundo, existem outros obstáculos para a democratização do acesso à produção do imunizante. Além da tecno-
logia laboratorial, poucos são os países que produzem os Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs) necessários para
a fabricação de vacinas. Os dois maiores produtores mundiais de IFA são a China e a Índia, que abriram seus
territórios para as indústrias farmacêuticas europeias e americanas ao longo das últimas décadas. Enquanto o
Brasil depende 100% dos IFAs produzidos na China e na Índia, os países da União Europeia importam 80% dos
IFAs utilizados na Europa dos países asiáticos. Ou seja, a dependência com relação aos gigantes asiáticos não
se restringe aos países em desenvolvimento, mas afetam de modo mais radical a produção de vacina nesses
países.
Como podemos perceber, o cenário mundial mar-
Ringo Chiu/Shutterstock.com

cado por incertezas nos campos social, econômico


e político que se estabeleceu com a pandemia da
covid-19 também foi responsável por destacar a im-
portância e a atualidade do sistema internacional mo-
derno, no qual todos os países, tanto desenvolvidos
quanto em desenvolvimento, estão profundamente
ligados pelas relações que continuamente estabele-
cem no contexto internacional.

A distribuição de vacinas contra covid-19 tem sido


marcada pela desigualdade. Enquanto os países
desenvolvidos detêm a maior parte das doses
disponíveis, alguns países não conseguiram sequer
vacinar a população mais vulnerável. Na foto, campanha
de vacinação em Boston, nos Estados Unidos, em 2021.

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Aplicando conhecimentos

1 Diferencie as embaixadas dos consulados, conside- 6 O que é nação? Indique dois elementos que podem
rando a função de cada uma dessas representações levar à sua formação e relacione ao ideal de autode-
diplomáticas. terminação dos povos.

7 Explique a diferença entre fronteira e limite, além de


2 Em 2018, os Estados Unidos tinham 167 embaixa- sua importância na determinação do território nacional.
das em países com os quais mantinham relações
diplomáticas. No mesmo ano, o Brasil tinha 137; a Índia,
124; a Argentina, 85; e a Austrália, 79. Indique duas
razões para as diferenças desses números.

8 Explique o princípio do equilíbrio de poder, funda-


mental no sistema da Paz de Vestfália.

3 Diferencie os conceitos de Estado e governo.

9 Explique o papel da coerção e do consenso na bus-


ca de hegemonia por parte das potências.

4 Indique três características do Estado moderno.

5 Explique as ideias de “razão de Estado” e “uso legíti- 10 De que forma a criação da ONU se relaciona à cri-
mo da Força”, tratadas, respectivamente, por Nicolau se do sistema de Vestfália, representada pelas duas
Maquiavel e Thomas Hobbes. Guerras Mundiais?

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 21

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CONSOLIDANDO SABERES

1 UFPR No livro O fim do Estado-nação, de Kenichi a) Paisagem, por ser um elemento geográfico que
Ohmae, a existência do Estado-nação é questiona- está ao alcance visual da população desses países.
da. Entretanto, ainda se observa que muitos povos b) Espaço, pois explica as relações sociedade/natu-
reivindicam a criação de um Estado para si, como é o reza e as contradições presentes na construção
caso dos palestinos e dos curdos. Caracterize o que histórica desses dois países.
é um Estado e por que os povos buscam criá-lo. c) Território, pois estabelece a linha divisória de
apropriação e delimitação dos poderes entre
2 UFPR 2014 No campo político, o nascimento do
duas nações.
Estado moderno definiu o marco da centralidade
d) Lugar, pois representa o zelo e a necessidade
territorial e institucional do poder político. Esta é
de preservação do povo americano pelo país ao
certamente a instituição política mais importante
qual pertence, vive suas relações cotidianas e
da modernidade, responsável pela delimitação do
dedica o sentimento patriótico.
território para o exercício do mando e da obediência,
e) Região, pois a cidade de Tijuana é o mais im-
segundo normas e leis estabelecidas e reconhecidas
portante centro metropolitano de influência na
como legítimas, sendo possível legalmente a coerção
região de fronteira entre o México e os Estados
física em caso de desobediência.
Unidos.
(CASTRO, Iná Elias. Geografia e Política – Território, escalas de ação e
instituições. Rio de Janeiro, Ed. Bertrand Brasil, 2005, p. 111).

Sobre as origens e características do Estado, é cor- 4 Ufes


reto afirmar: “Imagine que não haja nenhum paraíso [...]
a) A emergência do processo de globalização, com que não haja países [...] e nenhuma religião também
o fim das fronteiras rígidas, faz com que influên- [...]
cias econômicas, culturais e militares tornem legí- imagine todas as pessoas vivendo a vida em paz [...]
timo o exercício da soberania em outros países, imagine todos os povos compartilhando o mundo
como é o caso dos EUA em relação ao Iraque e todo [...]”
(John Lennon.)
ao Afeganistão.
b) O Estado moderno tem uma dupla origem: por
um lado, as cidades-estado da Grécia antiga e No imaginário de Lennon, não deveriam existir fron-
por outro, o ordenamento político-institucional do teiras entre os povos. Mas o que são fronteiras? Po-
Império Romano. de-se dizer que elas têm a função de separar territó-
c) No processo histórico de consolidação de poder, rios. Em Geopolítica, porém, as fronteiras
o Estado moderno submeteu a sociedade civil
sob seu controle, comprometendo a divisão entre I. Definem a extensão geográfica da soberania de
esfera pública e privada. um Estado.
d) Estado e nação são dois conceitos imbricados, II. Delimitam fenômenos dinâmicos e são constru-
pois o território que compreende uma nação, ções humanas.
compreende também um Estado Nacional. III. Revelam diferenças religiosas, linguísticas e étnicas.
e) O Estado continua sendo a Instituição que detém IV. Separam blocos políticos ou alianças militares.
soberania exclusiva sobre seu território, pois os
Na sequência em que aparecem, as informações aci-
organismos supranacionais como a ONU não têm
ma correspondem, respectivamente, à fronteiras
poder soberano.
a) culturais, políticas, estratégicas, culturais.
3 UEPB A figura mostra o muro que separa o México b) estratégicas, históricas, culturais, políticas.
dos Estados Unidos nas proximidades de Tijuana. c) estratégicas, históricas, políticas, estratégicas.
Assinale a alternativa que traz a categoria geográfica d) políticas, históricas, estratégicas, culturais.
que melhor explica a presença desse elemento de e) políticas, políticas, culturais, estratégicas.
separação entre os dois países.
5 Uerj Nessa forma de organizar o Estado, o sistema ha-
bilita o governo central a representar as várias entida-
des territoriais que possuem interesses em comum –
por exemplo, defesa, relações exteriores e comuni-
cações – e permite que essas entidades mantenham
suas próprias identidades, suas próprias leis, planos
Foto disponível em: de ação e usos em diversos campos.
<http://dignidaderebelde.
Adaptado de GLASSNER, Martin I. Geografia política. Buenos Aires:
blogspot.com/2009/03/
Editorial Docência, 2000.
o-muro-da-vergonha.html>.

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O texto remete a um elemento importante da organi- 8 Fuvest-SP
zação das sociedades contemporâneas: a dimensão
político-territorial.
No caso, a descrição feita no texto diz respeito ao
seguinte tipo de Estado Territorial:
a) misto
b) federal
c) unitário
d) associado

6 Unifesp De acordo com a capacidade de interven-


ção militar, o sistema internacional contemporâneo
pode ser definido como
a) assimétrico, graças à presença das tropas de paz
das Nações Unidas nos conflitos internacionais.
b) assimétrico, devido à existência de uma super- Fonte: Adaptado de Cadernos Le Monde Diplomatique, jan. 2002.
potência, os Estados Unidos, que atua segundo
seus interesses estratégicos. Com base na charge, apresente
c) simétrico, baseado na correlação de forças entre a) dois aspectos da realidade contemporânea que
países árabes e a OTAN, que perdeu poder de- atentam contra a soberania dos estados-nacio-
pois da Guerra no Golfo. nais. Justifique.
d) assimétrico, por causa da situação da Rússia, que b) um aspecto em que a soberania dos estados-
ainda detém milhares de ogivas nucleares disper- -nacionais seja exercida efetivamente sobre seu
sas pela Europa. próprio território. Justifique.
e) simétrico, dado o equilíbrio das forças militares
da União Europeia e dos Estados Unidos. 9 Fuvest-SP 2017 Leia o texto e observe a imagem.
Numa guerra não se matam milhares de pessoas.
7 PUC-SP A revolução militar é movida pelos EUA fun- Mata-se alguém que adora espaguete, outro que é
dindo: planejadores do Pentágono, o complexo indus- gay, outro que tem uma namorada. Uma acumula-
trial-militar americano e a tecnologia do Vale do Silí- ção de pequenas memórias.
cio. Os EUA são responsáveis por 40 a 45% dos gastos Nós que aqui estamos, por vós esperamos.
militares de 189 países do mundo. Direção de Marcelo Masagão. Brasil, 1999.

(KENNEDY, Paul. Poderio bélico dos EUA não garante segurança.


Folha de S.Paulo, 12 de setembro de 2002).

Considerando-se essa informação, é INCORRETO


afirmar que
a) as guerras são inerentes à política internacional
dos estados modernos; a força militar é argumen-
to decisivo em última instância.
b) o uso da força militar organizada como meio de
defesa do território e da sociedade é um dado da
soberania nacional no mundo moderno.
c) os EUA usam seu poderio militar como meio
de persuasão na política internacional, alegan- Foto de Nilüfer Demir, Bodrum, Turquia, 02/09/2015.
do a defesa de sua nação e dos valores da
liberdade. A partir do texto e da imagem, pode-se afirmar cor-
d) a força militar, embora represente um meio não retamente que
político de se fazer política internacional, sempre a) a história das guerras se resume a um teatro de com-
foi utilizada pelas potências, após decisão política bates travados no front por estadistas e militares.
na ONU. b) os relatos que abordam os conflitos apenas com
e) as atuais ações dos EUA em relação ao Iraque base nos tratados e armistícios são parciais e
são uma demonstração nítida do uso da força limitados.
militar como meio presente e aceito de se fazer c) o fim dos impérios, a xenofobia e a consolidação
política internacional. do projeto federativo garantiram a paz mundial.

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 23

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d) a banalização da morte e a experiência do exílio internacional com sede em Nova Iorque. Com objeti-
expressam a retração dos nacionalismos nos sé- vo de promover a paz mundial, promovendo o direito
culos XX e XXI. internacional, o desenvolvimento social e econômi-
e) as políticas de inclusão foram capazes de contro- co, e os direitos humanos; a organização serviu tam-
lar os fluxos migratórios globais. bém para legitimar a nova ordem internacional que
se esboçava a partir de então. O símbolo da ONU,
10 Fuvest-SP 2020 Dois eventos marcaram a diploma- representado abaixo, foi elaborado a partir de uma
cia brasileira em relação ao Oriente Médio no início projeção cartográfica cuidadosamente selecionada,
de 2019. Um deles foi voto contra a resolução da de forma a destacar o novo contexto geopolítico que
ONU que pedia a desocupação milita das Colinas de se consolidava a partir de então. A análise desse sím-
Golã e sua devolução à Síria. Outro evento foi anún- bolo permite concluir:
cio de transferência da embaixada brasileira de Tel
Aviv para Jerusalém, mesmo não tendo sido levada
adiante até setembro de 2019. Em relação a esses
eventos, é correto afirmar que eles representam

I. uma aproximação do Brasil em relação a posição dos


EUA.
a) II. um potencial distanciamento do Brasil em relação
à posição da maioria dos países do Conselho de Fonte: www.onu.org.br
Segurança da ONU.
I. um distanciamento do Brasil em relação à posição da a) A projeção escolhida procurou reforçar uma visão
Palestina e uma aproximação em relação ao conjunto eurocêntrica do mundo, aspecto essencial num
de países árabes. contexto em que a reconstrução do continente
b)
II. uma potencial aproximação do Brasil em relação europeu tornava-se prioritária na agenda mundial.
à posição da maioria dos países do Conselho de
b) A projeção deu grande destaque ao continente
Segurança da ONU.
africano, a partir de então escolhido como área
I. um distanciamento do Brasil em relação à posição de
Israel e uma aproximação em relação aos palestinos. prioritária de ação da Organização das Nações
c) II. um potencial distanciamento do Brasil em relação Unidas, em virtude do grande número de confli-
à posição da maioria dos países do Conselho de tos políticos e problemas sociais e econômicos.
Segurança da ONU. c) A utilização de uma projeção polar, elaborada a
I. um distanciamento do Brasil em relação à posição dos partir do polo norte, destacou a centralidade de
EUA. uma região que assumiu, a partir de então, uma
d) II. uma potencial aproximação do Brasil em relação importância geopolítica estratégica, em razão da
à posição da maioria dos países do Conselho de hegemonia de duas novas superpotências.
Segurança da ONU.
d) A projeção foi produzida a partir de uma visão
I. uma aproximação do Brasil em relação à posição da terceiro-mundista, visto que os continentes mais
Síria.
pobres ganharam destaque no centro da proje-
e) II. um potencial distanciamento do Brasil em relação
ção cartográfica.
à posição da maioria dos países do Conselho de
Segurança da ONU.
13 ESPM 2018 A ONU possui seis idiomas oficiais e
apresenta uma estrutura composta por sete órgãos
11 Uece 2016 A sigla da organização sediada em Nova principais os quais se destacam:
York, criada com a finalidade de preservar a paz e a a) a Unicef; a Unesco; o PNUMA.
segurança mundiais, promover a cooperação inter- b) o FMI; o Banco Mundial; a OMC.
nacional e atuar em questões econômicas, sociais, c) o PNUD; a OIT; o Conselho de tutela.
políticas, culturais e humanitárias é d) a OCDE; o TPI; o BID.
a) OTAN e) a Assembleia Geral; o Conselho de Segurança; o
b) FAO Secretariado.
c) ONU
d) CEPAL 14 ESPM 2018 O Conselho de Segurança da ONU é
considerado a instância máxima do poder mundial.
12 PUC-Minas 2015 As representações cartográficas Sobre essa entidade está correto afirmar:
não são neutras. Ao longo da história, a cartografia a) É composto por cinco países-membros.
foi utilizada como instrumento estratégico de do- b) É composto por dez países-membros, sendo que
minação e de disseminação de uma visão ideológica cinco exercem o poder de veto e outros cinco, não.
acerca do mundo. No ano de 1945 foi criada a ONU – c) É composto por quinze países-membros, dez ro-
Organização das Nações Unidas, uma organização tativos e cinco permanentes e com poder de veto.

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d) É composto por quinze países-membros, cin- I. Podem ser entendidos como uma crítica à saída
co com poder de veto e permanentes e outros dos EUA do acordo sobre as mudanças climáticas
dez com poder de veto, porém rotativos. construído na COP21 de 2015, em Paris, à época
e) É composto por cinco países-membros perma- assinado pelo ex-presidente Barack Obama. A
nentes que representam todos os continentes e saída foi justificada pelo atual presidente Donald
outros dez membros não permanentes, distribuí- Trump, afirmando que o acordo seria prejudicial à
dos de forma aleatória quanto aos continentes. economia americana.
II. Trata-se de um elogio à recente postura de algu-
15 UEPG-PR Assinale as alternativas, onde todos os mas autoridades do Reino Unido, o qual, em seu
órgãos estejam ligados à Organização das Nações processo denominado Brexit, pretende proteger
Unidas – ONU. a economia britânica, mas sem afetar seus com-
01. A Organização Mundial do Comércio – OMC promissos financeiros com o acordo de Paris de
dedica-se a promover o comércio entre os paí- 2015 e os relacionados com as questões estraté-
ses; Organização dos Países Exportadores de gicas coletivas da Comunidade Europeia.
Petróleo – OPEP organismo ligado à ONU que III. Faz-se uma crítica direta à França, que, mesmo
visa o controle dos preços globais do petróleo tendo sido a sede da COP21 de 2015, vem con-
e o fornecimento do produto. tinuamente desobedecendo a esse acordo, pois
02. O Fundo para Agricultura e Alimentação – FAO contraria as metas firmadas de emissão de CO2
da ONU, e o Órgão das Nações Unidas para a em suas atividades industriais.
Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO. Está correto o que se afirma em
04. O Fundo Internacional de Desenvolvimento a) I, apenas.
Agrícola – FIDA busca recursos financeiros para b) II, apenas.
melhorar a produção de alimentos, e o Fundo c) I e III, apenas.
Mundial para a Natureza – WWF trabalha em prol d) II e III, apenas.
da preservação da natureza (espécies e hábitats e) I, II e III.
ameaçados).
08. O Fundo das Nações Unidas para a Infância – 17 FGV-SP O trecho a seguir foi extraído da
UNICEF apoia técnica e financeiramente projetos Carta de São Francisco, de 26 de junho de 1945, do-
e ações para sobrevivência, desenvolvimento e cumento de fundação da Organização das Nações
proteção a crianças e adolescentes; Organização Unidas (ONU).
do Tratado do Atlântico Norte – OTAN organismo
de defesa dos países da região do Atlântico Norte. Art. 12, 2,: O Secretário-Geral, com o consenti-
16. Tribunal Penal Internacional – TPI julga acusados mento do Conselho de Segurança, comunicará à As-
de crimes de guerra e genocídio; Organização sembleia Geral, em cada sessão, quaisquer assuntos
Mundial de Saúde – OMS coordena programas relativos à manutenção da paz e da segurança inter-
de assistência sanitária. nacionais que estiverem a ser tratados pelo Conse-
Soma: lho de Segurança, e da mesma maneira dará conhe-
cimento de tais assuntos à Assembleia Geral, ou aos
16 Fuvest-SP 2018 Às vésperas da Cúpula do G20, que membros das Nações Unidas, se a Assembleia não
teve início em 07 de julho de 2017, em Hamburgo, na estiver em sessão, logo que o Conselho de Segurança
Alemanha, a chanceler alemã, Angela Merkel, discur- terminar o exame dos referidos assuntos.
sou no Parlamento e referiu-se a atores políticos im-
portantes no cenário mundial, conforme os trechos Considerando que o projeto político-diplomático da
transcritos a seguir. ONU está relacionado à manutenção da paz e da se-
Quem pensa que os problemas deste mundo po- gurança nas relações internacionais, com base da
dem ser resolvidos com o isolacionismo e o protecio- igualdade jurídica (isonomia) entre os 193 países
nismo está cometendo um enorme erro. Somente membros, é CORRETO afirmar:
juntos podemos encontrar as respostas certas às a) O princípio da igualdade jurídica entre os Esta-
questões centrais dos nossos tempos [...] Não pode- dos-membros da ONU é plenamente garantido,
mos esperar até que a última pessoa na Terra esteja pois todas as decisões são tomadas no plenário
convencida da evidência científica das mudanças da Assembleia Geral da ONU, da qual participam
climáticas. Em outras palavras: o acordo climático os 193 membros.
(de Paris) é irreversível e não negociável. b) Desde o final da II Guerra Mundial, a ONU
www.jb.com.br/pais/notícias. tem conseguido, com autoridade e respeito aos
direitos humanos, solucionar as controvérsias e
Analise as três afirmações seguintes, quanto aos ob- evitar a proliferação das guerras nas diversas par-
jetivos e ao teor desses trechos do discurso. tes do mundo.

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 25

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c) No caso das duas Guerras do Golfo (1990 e Considere as seguintes afirmações:
2002), a ONU exigiu dos EUA e de seus aliados
a plena obediência às convenções internacionais I. Povos primitivos precisam ser tutelados pela di-
sobre os direitos dos prisioneiros de guerra, a plomacia internacional ou reprimidos por forças
interdição do uso de armamentos químicos, das de nações desenvolvidas, para que conflitos
torturas e de outros crimes de guerra. locais ou regionais não perturbem o equilíbrio
d) Todos os Estados-membros possuem assento mundial.
permanente no Conselho de Segurança da ONU, II. Razões estratégicas, de localização geográfica,
“retratando a nova ordem mundial, multipolar, de orientação política ou de concentração de re-
subsequente ao fim da Guerra Fria”. cursos naturais, fazem com que certas regiões ou
e) O Conselho de Segurança da ONU possui cinco países sejam alvo de interesses, preocupações e
membros permanentes, com poder de veto, e de- intervenções internacionais.
libera sobre a tutela e proteção da paz e seguran- III. Diferenças étnicas, culturais, políticas ou reli-
ça nas relações internacionais, ou a provocação giosas, com raízes históricas, têm resultado em
de conflagrações legalizadas perante o direito preconceito, desrespeito e segregação, gerando
internacional. tensões que repercutem em conflitos existentes
entre diferentes nações.
18 Uerj
O envolvimento global em conflitos regionais é, cor-
Rússia e China rejeitam ameaça de retamente, explicado em
guerra contra Irã a) I, apenas
A Rússia e a China manifestaram sua inquietu- b) II, apenas
de com relação aos comentários do chanceler fran- c) I e III, apenas
cês, Bernard Kouchner, sobre a possibilidade de uma d) II e III, apenas.
guerra contra o Irã. Kouchner acusou a imprensa de e) I, II e III.
“manipular” suas declarações. “Não quero que usem
isso para dizer que sou um militarista”, disse o chan- 20 Unesp 2016
celer, dias antes de os cinco membros permanentes
do Conselho de Segurança da ONU – França, China,
Rússia, Reino Unido e Estados Unidos – se reunirem
para discutir possíveis novas sanções contra o Irã por
causa de seu programa nuclear.
Adaptado de www.estadao.com.br, 18/09/2007.

O Conselho de Segurança da ONU pode aprovar deli-


berações obrigatórias para todos os países-membros,
inclusive a de intervenção militar, como ilustra a repor-
tagem. Ele é composto por quinze membros, sendo
dez rotativos e cinco permanentes com poder de veto.
A principal explicação para essa desigualdade de
poder entre os países que compõem o Conselho
está ligada às características da:
a) geopolítica mundial na época da criação do A charge ironiza uma das variáveis que compõem
organismo o cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano
b) parceria militar entre as nações com cadeira ca- proposto pela Organização das Nações Unidas,
tiva no órgão a saber,
c) convergência diplomática dos países com capa- a) a renda, pela referência ao dia em que as perso-
cidade atômica nagens almoçaram.
d) influência política das transnacionais no período b) a expectativa de vida, pela alusão ao condiciona-
da globalização mento físico da personagem que move o carrinho.
c) a renda, pela referência aos objetos de alto valor
19 Fuvest-SP O mundo tem vivido inúmeros conflitos agregado que as personagens carregam.
regionais de repercussão global que, por um lado, d) a escolaridade, pela alusão à língua portuguesa em-
envolvem intervenções de tropas de diferentes paí- pregada em sua forma padrão pelas personagens.
ses e, por outro lado, resultam em discussões na Or- e) a mobilidade, pela referência ao meio de trans-
ganização das Nações Unidas. porte utilizado pelas personagens.

26 GEOGRAFIA / Frente B

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21 Uema 2015 O mapa representa as sete maiores eco- econômicas em prejuízo dos Estados ou povos subju-
nomias do mundo. gados, geralmente conexas com tais fenômenos...
As grandes potências econômicas – O Grupo dos Sete O texto, de autoria de Norberto Bobbio, expressa o
conceito de
CANADÁ REINO FRANÇA ALEMANHA a) liberalismo. d) socialismo.
UNIDO
ITÁLIA
b) dependência. e) globalização.
c) imperialismo.

24 Mackenzie-SP
Sob a influência de seu primeiro diretor-geral,
ESTADOS JAPÃO Julian Huxley, a Conferência Geral da UNESCO reco-
UNIDOS
nhecia, já em 1948, que o mundo do pós-guerra tinha
pela frente três grandes focos de problemas: o nacio-
nalismo, o aumento populacional e os obstáculos ao
Fonte: MOREIRA, Igor. Espaço geográfico. Geografia Geral do Brasil. 47. ed. progresso tecnológico.
São Paulo: Editora Ática, 2002. (Urzúa, R. – “O Correio da Unesco” – 1992)
Passados mais de 50 anos dessa conferência, a
O Grupo dos Sete foi criado em 1975, para ser um fó- declaração:
rum de discussões econômicas, políticas, ambientais I. Continua em parte atual, pois o nacionalismo re-
e sociais. Em 1998, o grupo passou a ser o G8, pois crudesceu, principalmente após a desintegração
houve a inserção de um país que recentemente tem do bloco soviético.
sido excluído das reuniões do grupo por questões II. Perdeu em parte a atualidade; pois se verifica,
de ordem geopolítica. Este país é a em praticamente todo o mundo, uma tendência à
a) China. c) Ucrânia. e) Sérvia. redução das taxas de fecundidade, e consequen-
b) Rússia. d) Croácia. temente do aumento populacional.
III. Continua em parte atual, pois grande parte das
22 UEL-PR O mundo não é mais apenas, ou principal- nações do mundo ainda não tem acesso ao pro-
mente, uma coleção de estados nacionais, mais ou gresso tecnológico alcançado pelos países in-
menos centrais e periféricos, arcaicos e modernos, dustrializados do Norte.
agrários e industrializados, dependentes ou indepen- IV. Perdeu em parte a atualidade, pois no mundo
dentes, ocidentais e orientais, reais e imaginários. As globalizado o nacionalismo desapareceu e o
nações transformaram-se em espaços, territórios ou progresso tecnológico disseminou-se por todo o
elos da sociedade global. planeta.
(Octávio Ianni. “A Sociedade global”. Rio de Janeiro: Das afirmações acima, são verdadeiras:
Civilização brasileira, 1993. p. 96.) a) apenas I, II e III d) apenas I, II e IV
b) apenas II e IV e) I, II, III e IV
A leitura do texto permite concluir que c) apenas I, II
a) a transnacionalização tem um caráter cultural e
político, mas pouco interfere nos campos sociais 25 UFRGS Assinale a alternativa que preenche corre-
e econômicos dos países. tamente as lacunas do texto a seguir, na ordem em
b) o fortalecimento das grandes empresas e con- que aparecem.
glomerados é acompanhado pelo crescimento O Conselho de Segurança (CS) da Organização das
da ideia de Estado nacional e de ampla defesa Nações Unidas (ONU) é o órgão que toma decisões
da soberania. sobre paz e segurança mundiais. O CS é composto
c) a ideia de Estado do Bem-Estar Social é mais pre- por cinco membros permanentes – Estados Unidos,
sente neste final de século quando há uma preo- Reino Unido, França, Rússia e _____________– e
cupação mundial com as diferenças entre os países. dez membros rotativos eleitos para mandato de dois
d) o enfraquecimento dos Estados-nações é uma das anos. Após a invasão do Iraque pelos Estados Unidos,
características mais importantes da globalização. sem o consentimento do CS, algumas nações come-
e) nem o capitalismo, nem o neoliberalismo têm çaram a pressionar por uma reforma no órgão. O G-4,
forças suficientes para adaptar os Estados a uma grupo de países formado pela Alemanha, Brasil, Ín-
nova lógica global. dia e __________, apresentou oficialmente sua pro-
posta de resolução para ampliar o número de assen-
23 Ufal tos permanentes no CS.
Uma expansão violenta por parte dos Estados, ou a) China - Japão d) Japão - África do Sul
de sistemas políticos análogos, da área territorial da b) China - Itália e) Itália - Japão
sua infuência ou poder direto, e formas de exploração c) Japão - China

CAPÍTULO T1 / Sistema internacional 27

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T2
CAPÍTULO
Ordem mundial da Guerra Fria

Vincent Grebenicek/Shutterstock.com
Bandeiras dos Estados Unidos e da União Soviética, as superpotências da Guerra Fria.

A Segunda Guerra Mundial marcou o fim do cenário que se estabeleceu no século XIX, em que a In-
glaterra exercia liderança econômica, abrindo caminho para o surgimento de outras potências mundiais.
Ao fim da guerra, os Estados Unidos e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (União Soviética)
ascenderam ao posto de superpotências mundiais, o que instituiu uma nova configuração geopolítica no
contexto global, conhecida como Ordem Mundial Bipolar.
A Ordem Bipolar, que se estendeu de 1945 a 1991, começou com as negociações de paz ao final da
Segunda Guerra Mundial e terminou após a dissolução da União Soviética. Durante o período, as duas
superpotências travaram disputas nos campos econômico, político, tecnológico, científico e ideológico.
A busca por manter ou ampliar o poder e a influência mundiais era uma característica latente da política
externa de ambos os Estados.

• O que você entende por ordem mundial?


• Por que a disputa entre os Estados Unidos e a União Soviética, durante a Ordem Bipolar, ficou
conhecida como Guerra Fria?

Neste capítulo, serão abordadas as habilidades EM13CHS503, EM13CHS603 e EM13CHS604.

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Equilíbrio de poder e ordens mundiais
No capítulo anterior, vimos que os acordos de Vestfália, assinados em
1648, marcaram a estruturação do sistema internacional moderno; uma
de suas principais características é o equilíbrio de poder. Nessa condi-
ção, os líderes políticos procuram evitar grandes conflitos bélicos. No en-
tanto, isso não significa que as disputas de interesse deixaram de existir,
mas que elas passaram a ocorrer de outras formas.
Em situações como a estabelecida por Vestfália, o poder mundial pas-
sou a se organizar segundo determinadas características que constituem
o que chamamos de ordem mundial. Nesse contexto global, as potên-
cias reconheciam a soberania de seus adversários, o poder político e
econômico, as fronteiras de outros países e o estabelecimento das zonas
de influência das potências.
Após as Guerras Napoleônicas (1803-1815), as quais promoveram o
rompimento do equilíbrio de poder da paz de Vestfália, estabeleceu-se
a Pax Britânica (1815-1914), período de relativa estabilidade política na
Europa, em que a Inglaterra ascendeu como a maior potência mundial,
organizando um dos maiores impérios navais e comerciais da história.
Como citado no capítulo anterior, a estabilidade foi rompida pela ascen-
são econômica e militar da Alemanha, dos Estados Unidos, da Itália e do
Japão. A nova situação de paridade de poder mundial levou os Estados à
corrida imperialista ao fim do século XIX e início do XX, e às duas Guerras
Mundiais, na primeira metade do século XX.
A Segunda Guerra Mundial foi a que causou maiores danos à huma-
nidade: em números absolutos foi a guerra com maior saldo de mortes
da história. Seus desdobramentos geraram as condições políticas para a
criação de uma nova ordem de organização do poder mundial: a deno-
minada Ordem Mundial Bipolar.

Ordem Mundial Bipolar


Quando estudamos as ordens mundiais, dois questionamentos são
importantes. Em primeiro lugar, quais são as potências que organizam o
poder mundial? Em segundo lugar, de que forma o poder é organizado?
A ordem mundial ao fim da Segunda Guerra Mundial se estabeleceu
sob a liderança de duas grandes potências: os Estados Unidos e a União
Soviética. A esse período histórico deu-se o nome de Guerra Fria. Veja-
mos isso de forma mais detalhada.

Superpotências da Guerra Fria


A Ordem Bipolar representou uma grande mudança na geopolítica
mundial em relação ao que havia sido o padrão dos séculos anteriores.
Desde o final do século XV, a Europa era o centro a partir do qual a polí-
tica e a economia mundial foram organizadas.
Primeiro, houve a colonização da América e o estabelecimento de ro-
tas comerciais da Ásia e da África para os países europeus ou para suas
colônias. A assinatura do Tratado de Tordesilhas (1494), entre Portugal e
Espanha, foi um símbolo da organização do mundo colonial sob domínio
europeu. Posteriormente, vieram a industrialização, a ascensão da Ingla-
terra e o neocolonialismo sobre a África e a Ásia.
As guerras mundiais, no entanto, devastaram e enfraqueceram as po-
tências europeias, ao passo que houve abertura para que os Estados
Unidos e a União Soviética pudessem ascender à condição de superpo-
tências mundiais.

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 29

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Estados Unidos como potência mundial
Os Estados Unidos da América foram formados a partir da indepen-
dência das treze colônias inglesas estabelecidas na costa leste da Amé-
rica do Norte. O modelo de colonização aplicado naquela região permitiu
o desenvolvimento de uma sociedade predominantemente democrática
e de economia capitalista dinâmica.
Apesar da escravidão e do sistema de plantation nas colônias do Sul,
dependentes da exportação de algodão para a Inglaterra, as colônias do
Norte abrigaram grupos que buscavam autonomia econômica em rela-
ção à metrópole britânica, assim como uma organização política e cultural
mais democrática, sob influência dos pensadores liberais do século XVIII.
Após a independência estadunidense, declarada em 1776, teve início o
desenvolvimento de um modelo social fortemente baseado na liberdade
econômica e política de seus cidadãos, porém sem incluir os escraviza-
dos ou os indígenas. Apesar disso, o modelo liberal contribuiu bastante
para o desenvolvimento do país ao longo do século XIX.
Por volta de 1820, a indústria começava a desenvolver-se na região
nordeste dos Estados Unidos. Nas décadas seguintes, o crescimento foi
estimulado pela expansão territorial do país, que levou seus domínios
até a costa oeste da América do Norte, conformando o território que co-
nhecemos hoje. Esse processo contribuiu para que os Estados Unidos
passassem a ter destaque econômico e político no final do século XIX,
chegando à primeira década do século XX como uma das maiores e mais
dinâmicas economias do mundo.
Esse crescimento foi afetado pela quebra da Bolsa de Valores de
Nova York, em 1929, decorrente de uma crise de superprodução (muitas
empresas investiram no aumento da produção sem que o consumo cres-
cesse na mesma proporção) e de atividades especulativas no mercado
de ações, mecanismo que levou o preço das ações a um patamar distan-
te de seu valor real. A recuperação se efetivou a partir dos programas
governamentais da década de 1930 e, principalmente, com o início da
Segunda Guerra Mundial, em 1939, que favoreceu a expansão econômi-
ca do país de modo acentuado, pois ele se tornara o principal fornecedor
de diversos gêneros industriais para a Europa.
A decisão de ingressar na Segunda Guerra Mundial, oficializada em
1941, significou vultosos investimentos no setor bélico, tanto para o de-
senvolvimento como para a fabricação de armamentos. Ao fim da guerra,
os Estados Unidos se tornaram a economia capitalista do globo e dispu-
tavam o título de maior potência militar.

Ascensão da União Soviética (URSS)


como potência mundial
A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS ou União So-
viética) foi um Estado socialista que existiu entre 1922 e 1991, forma-
do pela Rússia e por uma série de outros países do Leste Europeu.
A formação da União Soviética ocorreu a partir de mudanças políticas
e econômicas no Império Russo, com a Revolução Russa de 1917, que
culminou em um processo de fragmentação territorial e deu origem a
15 países independentes, entre eles a Rússia atual.
O Império Russo começou a se formar ainda no século XVI, em torno
da atual capital russa, Moscou. Até o século XIX, os exércitos russos con-
quistaram a maior área territorial contínua entre todos os impérios que
existiam no mundo naquele período. A expansão seguiu para o leste,
o sul, o sudeste, incorporando áreas próximas à divisão entre Europa e
Ásia, Extremo Oriente e Oriente Médio, atualmente. Observe esse pro-
cesso no mapa a seguir.

30 GEOGRAFIA / Frente B

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Expansão do Império Russo (séculos XVI-XIX)
90° L

Círc ul o
OCEANO GLACIAL ÁRTICO

P ola
Território russo em 1581


r tic
Território anexado em 1650 e

o
devolvido à China (1689) pelo
Tratado de Nerchinsk
Território anexado 1581-1589
Território anexado 1689-1725

Território anexado 1618-1689


Território anexado 1598-1618
OCEANO
Território anexado 1725-1762 PACÍFICO
Território anexado 1762-1800 Mar
Negro

N
Mar
de L. Baikal
Mar
Cáspio Aral
0 1040 km

Fonte: Atlas da História do Mundo. São Paulo: Folha de S.Paulo, 1995. p. 158.

Fatores de ordem política, militar e religiosa contribuíram para que o


Império Russo se desenvolvesse de forma relativamente isolada da Euro-
pa, não incorporando mudanças sociais que haviam ocorrido em países
como Inglaterra, França e Alemanha, principalmente relacionadas ao de-
senvolvimento da democracia e do Estado moderno, além da expansão
comercial e da Revolução Industrial.
No final do século XIX, o Império Russo ainda apresentava caracterís-
ticas consideradas arcaicas: economia de base agrícola, prolongamento
da servidão até a segunda metade daquele século, baixo desenvolvi-
mento comercial e urbano, ausência de industrialização, predominância
do analfabetismo entre os camponeses e forte concentração do poder
político na figura dos czares (imperadores) da família Romanov.
A situação de grande desigualdade começou a inspirar revoltas popula-
res ainda no final do século XIX. Essas revoltas eram alimentadas pelos ideais
socialistas, os quais também estavam se desenvolvendo na Alemanha, na
França e na Inglaterra principalmente, desde o começo do século XIX.
Everett Historical/Shutterstock.com

Último czar russo, Nicolau II,


com sua família, em 1914.

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 31

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Por volta de 1880, existiam várias correntes do socialismo na Europa;
a que vinha ganhando mais força era o socialismo científico. Karl Marx
(1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895), o primeiro, alemão, e o segun-
do, inglês, haviam escrito vasta obra crítica às contradições do capitalis-
mo e de proposta de uma organização dos trabalhadores para superar
esse sistema econômico. Suas teorias deram origem a uma linha que se
convencionou denominar “marxismo”. É importante ressaltar que ambos
não eram contrários à existência do capitalismo, pois o entendiam como
uma fase importante do desenvolvimento econômico e para a realização
de mudanças políticas e de consciência. Segundo suas obras, o sistema
capitalista geraria as condições para a realização de uma revolução que
acabaria com o processo de exploração dos trabalhadores, marca do
capitalismo.
Por criticar a grande desigualdade social e o processo de exploração
do trabalho, apontando que a riqueza dos capitalistas se originava da ex-
ploração da mão de obra operária e dos camponeses, o socialismo em-
polgava muita gente que vivia em situações de pobreza e desilusão na
virada do século XIX para o XX. É importante lembrar que, nesse contex-
to de recente industrialização, os trabalhadores fabris eram submetidos a
rigorosos e até desumanos regimes, que envolviam uma carga horária de
aproximadamente 12 horas de trabalho, inclusive para crianças.
A partir do final do século XIX e início do século XX, os ideais que
norteavam o modelo socialista começaram a perder fôlego na Europa
Ocidental, de modo geral. Nesse contexto, o capitalismo já se consolida-
va como um sistema político e econômico mais equilibrado, que, em par-
te, permitiu o enriquecimento de muitos e a melhoria de vida de alguns
setores da população. Dois importantes fatores a serem lembrados, que
fizeram parte desse contexto, foram a conquista de direitos trabalhistas e
a maior participação popular nas decisões políticas.
No Império Russo, porém, a manutenção da pobreza nos campos,
a alta exploração dos camponeses e a falta de liberdade política para a
população levaram à crescente expansão dos ideais socialistas. Isso oca-
sionou uma primeira grande onda de revoltas populares em 1905, a qual
obrigou o governo a fazer reformas, mas insuficientes para resolver os
problemas que assolavam a população.
A situação do czarismo russo ficou ainda pior com a entrada do país
na Primeira Guerra Mundial, em 1914. Com o passar dos anos, cresceu
a percepção de que a presença russa na guerra interessava apenas às
elites do país e às potências europeias, Inglaterra e França, suas aliadas.
O descontentamento popular crescente gerou as condições para que
ocorresse a Revolução Russa de 1917.
O movimento aconteceu em duas etapas. Na primeira, em fevereiro
Everett Historical/Shutterstock.com

do mesmo ano, um grupo político mais moderado, denominado de men-


cheviques, subiu ao poder com a promessa de democratizar o país e
tirar a Rússia da guerra, algo que não aconteceu. A revolta popular cres-
ceu e desembocou na revolução de outubro, organizada por Vladmir
Lenin, líder dos bolcheviques, ala socialista que defendia a luta armada,
se necessário.
Em 1922, os revolucionários venceram a guerra interna e fundaram
um novo Estado soberano, a União das Repúblicas Socialistas Soviéti-
cas. Esse nome revela três aspectos importantes: o termo “soviético”
era uma referência aos sovietes, grupos de trabalhadores que se reu-
niam para traçar as estratégias da revolução; o fato de ser uma união
de repúblicas (15 ao todo) expressava a grande diversidade étnica do
Estado; finalmente, o termo “socialista” indicava que esse Estado seria
Lenin, líder da revolução de outubro de o primeiro a tentar realmente colocar em prática as teorias propostas
1917, na Rússia. por Marx e Engels.

32 GEOGRAFIA / Frente B

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União Soviética: divisão política
ch
nwi OCEANO GLACIAL ÁRTICO

Círcu
ree
deG
o 1 - Rússia
ian

lo P
rid
Me Mar Siberiano

ola
Oriental 2 - Ucrânia
Mar da

Ár r
Noruega

tic
3 - Belarus
o Mar de
Barents
Mar de 4 - Moldova
Kara

Lituânia 5Estônia 5 - Estônia
7 6Letônia
6 - Letônia
3
Bielorrússia
45

Mar de 7 - Lituânia
°N

Okhotsk
4
Moldávia
2
Ucrânia 8 - Geórgia
Rússia
1
9 - Armênia

10 - Azerbaijão

8
Geórgia 11 - Casaquistão
Armênia9 Cazaquistão
11 12 - Usbequistão
10
Azerbaijão
Uzbequistão
Mar da 13 - Turcomenistão
China
13
Turcomenistão 12 N
14
Quirguistão
14 - Quirguistão

Tadjiquistão
15 15 - Tajiquistão
0 610 km
90° L

Fonte: TANJI, Thiago. "Último líder da União


Soviética, Mikhail Gorbachev chegava ao poder
A implementação do socialismo, no entanto, foi bastante complica- há 30 anos". In: Galileu, 11 mar. 2015. Disponível
da. Segundo a proposta de Karl Marx, antes da revolução era importante em: https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/
noticia/2015/03/ultimo-lider-da-uniao-sovietica-
que houvesse o desenvolvimento do capitalismo, que deveria promover mikhail-gorbachev-chegava-ao-poder-ha-30-
o avanço tecnológico e transformar as relações sociais, rompendo com anos.html. Acesso em: 12 jul. 2021. (Adapt.).
antigas formas de autoritarismo político e religioso.
A Rússia, no entanto, não vivenciou o processo da forma teorizada
por Marx. Em poucos anos, o país passou de um império agrícola com
grandes heranças absolutistas e feudais para o primeiro grande projeto
socialista da história.
Lenin procurou tratar dessa contradição por meio de um programa
governamental chamado Nova Política Econômica (NEP), que propunha
a inserção de características capitalistas na economia soviética, inclusive
com investimentos estrangeiros e a manutenção, em pequena escala, da

bissig/Shutterstock.com
propriedade privada dos meios de produção.
O líder bolchevique faleceu em 1927, poucos anos depois de chegar
ao poder. Após a morte de Lenin, houve disputas internas no Partido Co-
munista da União Soviética (PCUS) para decidir quem seria o novo líder.
Nesse momento, o nome mais cogitado era o de Trotsky. Contudo, o pos-
to foi, em meio a várias tensões, assumido por Josef Stalin (1878-1953),
que governou a União Soviética de 1928 a 1953.
O rumo definido por Stalin foi diferente do de Lenin. Sob a liderança
stalinista, o governo soviético promoveu a estatização total de terras, fá-
bricas e bancos e eliminou a propriedade privada dos meios de produ-
ção. Além disso, toda a economia ficou sob controle do Estado soviético,
por meio dos planos quinquenais, feitos a cada cinco anos para decidir
as prioridades de investimento governamental.
A implementação dessa proposta criou um modelo diferente do suge-
rido por Marx, Engels e Lenin. O Estado passou a representar uma espé-
cie de grande capitalista, proprietário dos meios de produção e detentor
dos “lucros” oriundos de fábricas e fazendas. A centralização do poder
estabeleceu-se no campo econômico e político, levando à criação de um Josef Stalin (1878-1953).

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 33

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governo autoritário, mas que, ao mesmo tempo, promoveu forte cresci-
Mais mento industrial. Quando teve início a Segunda Guerra Mundial (1939-
-1945), a União Soviética se constituía como grande potência econômica
World War II in Europe: e militar, assim como os Estados Unidos. Esse modelo ficou conhecido
Every Day. como socialismo real, ou soviético.
É interessante acompanhar a
expansão territorial das forças
nazifascistas e, posteriormente, Formação da bipolaridade
a retomada das áreas ocupadas
A Ordem Mundial Bipolar, marcada pela divisão de poder mundial en-
pelas potências aliadas. No vídeo
tre Estados Unidos e União Soviética, começou a se formar no fim da Se-
indicado a seguir, é possível
visualizar essas variações gunda Guerra Mundial. Durante o conflito, grande parte da Europa havia
territoriais no mapa europeu, dia a sido ocupada pelas forças nazifascistas. As tropas alemãs começaram
dia, entre 1939 e 1945. anexando a Áustria, a Tchecoslováquia e a Polônia, depois chegaram a
Disponível em: http://p.p4ed.com/ Paris e, finalmente, ocuparam o restante do Leste Europeu e parte consi-
RYFYA. Acesso em: 12 jul 2021. derável da União Soviética.
Contra os avanços da Alemanha e da Itália (forças do Eixo), na Europa,
formou-se uma aliança que contava, principalmente, com o Reino Unido,
a União Soviética e os Estados Unidos. Essa união ficou conhecida como a
das potências aliadas.
Durante a Segunda Guerra, os Estados Unidos e a União Soviética
se aliaram para combater o expansionismo alemão e italiano na Europa.

Divisão da Alemanha e de Berlim em áreas de ocupação – 1945


10° L
N

0 90 km

13° L

52° N
50° N

0 5 km

Ocupação britânica
Ocupação francesa
Ocupação norte-americana

Ocupação britânica Ocupação soviética Ocupação soviética


Ocupação francesa Ocupação norte-americana Muro de Berlim

Fonte: IEG-MAPS. Disponível em: www.ieg-maps.uni-mainz.de/mapsp/mappBerlin945_1.9.htm;


www.ieg-maps.uni-mainz.de/mapsp/mapp945d.htm. Acesso em: 12 jul. 2021.

34 GEOGRAFIA / Frente B

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Em fevereiro de 1945, as tropas britânicas e estadunidenses tinham
ocupado boa parte da Europa Ocidental e do oeste da Alemanha, en-
quanto as tropas soviéticas haviam ocupado os países do Leste Europeu Fique
e a parte da porção oriental da Alemanha. Com a iminente vitória das for- ligado
ças aliadas, os chefes de governo dos Estados Unidos, União Soviética e
A palavra ideologia pode
Reino Unido se reuniram em Yalta, na Crimeia, para negociar a divisão da
ter diferentes significados
Alemanha e da Europa em áreas de influência no pós-Guerra, que seria para a Filosofia e as Ciências
ratificada em Potsdam. Humanas. Durante a Guerra
Os acordos de Yalta e Potsdam marcaram o início da bipolaridade Fria, por exemplo, a ideologia
mundial. Esses acordos dividiram a Alemanha e Berlim, sua capital, em pode ser definida como
quatro áreas de ocupação militar. Observe o mapa da página anterior. um conjunto de ideias e
As áreas de ocupação militar, que deveriam funcionar apenas em um propostas sobre como
período de transição para a reorganização política da Europa, aumenta- a sociedade deveria se
ram as tensões entre os Estados Unidos e a União Soviética, marcando o organizar, tanto em termos
início da Guerra Fria. econômicos e políticos como
culturais e sociais; ora uma
democracia liberal, ora uma
Embates pelo poder república socialista.
A Guerra Fria ocorreu durante o período em que os Estados Unidos e
a União Soviética disputavam a influência global no âmbito político, eco-
nômico e ideológico – dicotomização denominada como Ordem Mundial
Bipolar. É importante ressaltar que o poder almejado por ambas as po-
tências era hegemônico, baseado tanto na coerção (hardpower) como na
produção de um consenso (softpower).
As duas potências nunca entraram em conflito militar direto, por isso
o nome Guerra Fria. A inexistência de conflitos diretos não significou que
as potências não tenham participado indiretamente em outros embates.

Disputa ideológica
Uma característica marcante da Guerra Fria foi a disputa ideológica
entre Estados Unidos e União Soviética.
Os Estados Unidos desenvolveram-se com base na ideologia da de-
mocracia liberal. Segundo essa visão, a propriedade privada dos meios
de produção, a livre iniciativa e a livre concorrência são capazes de levar
ao desenvolvimento e à justiça social. Além disso, a liberdade política e
a liberdade de expressão, de associação em partidos políticos e em mo-
vimentos sociais e de exercício da democracia por meio do voto seriam
fundamentais para uma boa convivência entre as pessoas.
No caso soviético, a ideologia se baseava no socialismo. A ideia cen-
tral era de que, no capitalismo, a justiça social seria impossível, pois a
permanência da propriedade privada dos meios de produção, segundo
ela, redunda, necessariamente, em exploração dos trabalhadores. Além
disso, a democracia capitalista também seria uma ilusão, porque tanto
Reprodução

Reprodução

Nos Estados Unidos, foram criados


super-heróis, como o Capitão América,
que desafiava os comunistas, como
diz o título dessa HQ de 1954. A União
Soviética contra-atacava com cartazes
distribuídos aos montes à população
com frases ufanistas como “Para
eles, é muito para poucos. Nós nos
esforçamos muito por todos”, de 1957.

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 35

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as eleições como a liberdade de expressão (jornais, canais de rádio e
televisão) seriam controladas pelo poder econômico da elite burguesa.
O governo soviético colocava-se como representante direto da clas-
se trabalhadora, munido de organização econômica e política voltada à
socialização da riqueza produzida por todos, em vez da acumulação nas
mãos dos donos dos meios de produção, os capitalistas.
Na disputa pelo domínio geopolítico, a propaganda foi uma das princi-
pais armas de difusão dos modelos. Do lado soviético, a propaganda de
Estado afirmava que os Estados Unidos e sua ideologia liberal represen-
tavam a manutenção da exploração dos trabalhadores. Do lado estaduni-
dense, construiu-se a imagem de que o socialismo e o comunismo repre-
sentavam ideias más, imorais, contrárias à religião, à família e à liberdade.
A propaganda negativa em relação ao adversário e positiva em rela-
ção ao seu modelo social aparecia no cinema, na música, nos cartazes,
nos livros etc. Mas também era possível vê-la em disputas esportivas in-
ternacionais, como as Olimpíadas, nas quais as duas superpotências e
seus aliados ficavam com a maior parte das medalhas.
Em termos mais objetivos, o início da disputa ideológica da Guerra
Fria foi marcado por uma declaração feita em 1947 pelo então presidente
dos Estados Unidos, Harry Truman (1878-1942), ao Congresso, segundo a
qual o país deveria assumir o compromisso de “defender o mundo livre
contra a ameaça comunista”. Essa declaração estimulou a formação de
uma área de influência estadunidense na Europa, como veremos a seguir.

Áreas de influência socialista e capitalista


Fique A declaração de Harry Truman deu início à Doutrina Truman. Nos estu-
dos de geopolítica e relações internacionais, doutrina é um conjunto de
ligado ideias que sustenta uma série de ações promovidas por Estados em sua
Apesar de a separação política externa. A ideia da Doutrina Truman era a defesa da sociedade
política entre as duas livre e contra o comunismo.
Alemanhas ter sido A primeira ação concreta foi a criação do Plano Marshall, em 1947, que
oficializada em 1949, o Muro consistia na oferta de ajuda financeira para a reconstrução da Europa, de-
de Berlim foi construído vastada pelos conflitos da Segunda Guerra Mundial. Mas, do ponto de vis-
apenas em 1961, sob ordens ta soviético, tratava-se de uma clara ação para garantir a hegemonia dos
do governo da Alemanha Estados Unidos no continente europeu. Como reação, no ano seguinte,
Oriental, que procurava evitar a União Soviética promoveu o Bloqueio a Berlim Ocidental, que consistia
que seus cidadãos fugissem
em proibir o acesso à parte da capital alemã que estava sob controle das
para o lado ocidental. O muro
não dividia a Alemanha como
potências capitalistas: Estados Unidos, Reino Unido e França.
um todo, apenas isolava a Em 1949, os Estados Unidos propuseram a criação da Organização
parte ocidental de Berlim, do Tratado do Atlântico Norte (Otan), uma associação de cooperação
que, apesar de pertencer à militar, envolvendo também o Canadá e vários países da Europa Ociden-
Alemanha Ocidental, estava tal. Seu objetivo declarado era proteger os países-membros de uma pos-
incrustrada no território sob sível invasão de forças soviéticas.
domínio da União Soviética. No mesmo ano, a União Soviética declarou a formação da República De-
mocrática Alemã (RDA), mais conhecida como Alemanha Oriental. É impor-
tante lembrar que os acordos de Yalta e Potsdam haviam dividido a Alema-
Mais nha e Berlim em áreas de ocupação militar, mas não em países diferentes.
Essa divisão política permanente, portanto, veio em 1949, quando foi criada
Ponte dos espiões. a República Federal Alemã, mais conhecida como Alemanha Ocidental.
Direção: Steven Spielberg. 2015. A divisão entre Ocidente (capitalista) e Oriente (socialista) não ocorreu
Classificação indicativa: 12 anos. apenas na Alemanha e em Berlim. Os países da Europa Oriental, que haviam
O filme se passa no momento da
sido libertados da ocupação nazista pelas tropas soviéticas, foram incorpo-
construção do Muro de Berlim. rados em sua zona de influência. Essa incorporação se deu, inicialmente,
Baseado em fatos, a obra trata com a escolha de governantes aliados aos soviéticos, o que aconteceu na
da questão da espionagem Polônia, na antiga Tchecoslováquia, na Hungria, na Romênia e na Bulgária.
promovida pelas superpotências Iugoslávia, atualmente dividida em vários novos países, e Albânia também
na Guerra Fria. se tornaram socialistas, mas com líderes independentes dos soviéticos.

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Para completar a formação de sua zona de influência, a União Soviética
criou, em 1955, o Pacto de Varsóvia em resposta à Otan. Estavam estabeleci-
das as áreas de influência dos Estados Unidos e da União Soviética. O limite
entre essas duas áreas ficou conhecido como Cortina de Ferro. Observe, no
mapa a seguir, a divisão da Europa após a Segunda Guerra Mundial.

Divisão da Europa após a Segunda Guerra Mundial


OCEANO GLACIAL
ÁRTICO
Círculo Polar Ártico

ISLÂNDIA

Meridiano de Greenwich
Mar da Noruega

FINLÂNDIA
NORUEGA

SUÉCIA
Mar do
Norte
UNIÃO SOVIÉTICA
DINAMARCA

IRLANDA REINO
HOLANDA RDA POLÔNIA
UNIDO
BÉLGICA
LUXEMBURGO RFA
TCHECOSLOVÁQUIA
OCEANO
ÁUSTRIA
ATLÂNTICO SUÍÇA HUNGRIA
FRANÇA
ROMÊNIA

IUGOSLÁVIA
Mar Negro
BULGÁRIA
ITÁLIA
ESPANHA ALBÂNIA
PORTUGAL
Mar Tirreno GRÉCIA
TURQUIA

Mar Mediterrâneo
Estados europeus da Otan e aliados ocidentais
Estados europeus do Pacto de Varsóvia
Estados neutros N

Estado socialista não alinhado


Cortina de ferro 0 300 km

Fonte: AFP. In: "The Iron Curtain: Five Things To Know". International Business Times.
Disponível em: https://www.ibtimes.com/iron-curtain-five-things-know-2859163. Acesso em: 12 jul. 2021. (Adapt.).

A criação das zonas de influência dos Estados Unidos e da União Soviética


começou na Europa e, posteriormente, foi se alastrando para o restante do mun-
do, criando a divisão entre os blocos capitalista e socialista. Nas Américas, na
África e na Ásia, também havia países “satélites”, no sentido de “orbitarem”
na influência das grandes potências.
Nesse contexto, alguns países procuraram resistir à pressão pelo ali-
nhamento a cada uma das duas superpotências. A partir da Conferência de
Bandung, realizada em 1955, eles criaram o grupo dos não alinhados, também
chamado de movimento terceiro-mundista. Os principais representantes eram
o Egito, a Índia, a Indonésia e a Iugoslávia.

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 37

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Discussão em sala Corrida armamentista
O marco que deu origem à corrida armamentista mais famosa da
As bombas atômicas história foi a construção das armas nucleares, ainda durante a Segunda
Há uma grande polêmica em torno Guerra Mundial.
do uso das bombas atômicas O desenvolvimento dos conhecimentos sobre Física Nuclear se ace-
pelos Estados Unidos em 1945. De lerou a partir do início do século XX. Na década de 1930, pesquisadores
um lado, há quem defenda que que trabalhavam nos Estados Unidos previram a possibilidade de criar
o uso das bombas evitou muito a bomba atômica. Diante dessa possibilidade – e do perigo de inimigos
mais mortes, pois o Japão não conseguirem desenvolver o armamento –, o governo estadunidense
aceitava se render, mesmo após a iniciou, em 1940, o Projeto Manhattan.
derrota alemã. De outro, há os que Após anos produzindo urânio enriquecido e criando diferentes
afirmam que o principal objetivo
protótipos para a bomba, os Estados Unidos, em 16 de julho de 1945,
dos Estados Unidos, ao usarem
as bombas, era mostrar para a
realizaram um teste bem-sucedido da primeira explosão nuclear, no
União Soviética o seu mais novo deserto do estado do Novo México. Menos de um mês depois, e pou-
equipamento militar. cos dias após a conferência de Potsdam, o país utilizou a bomba nas
• Pesquise evidências sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, no Japão. Em 1949, os soviéticos
duas posições para debatê-las fizeram seu primeiro teste de explosão nuclear, dando o contraponto
com os colegas em sala. da corrida.
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Modelo da “Little Boy”, bomba atômica lançada sobre Hiroshima, “Cogumelo nuclear”, nuvem de fumaça formada pela explosão da
no dia 6 de agosto de 1945. bomba atômica em Nagasaki, no dia 9 de agosto de 1945.
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O antigo Salão de Promoção Industrial de Hiroshima, após Memorial da Paz de Hiroshima, que mantém o antigo Salão de
lançamento da bomba atômica pelos Estados Unidos em 1945. Promoção Industrial, uma das poucas construções que resistiram,
em parte, à explosão.

Apesar de a bomba atômica ter sido utilizada contra o Japão, muitos


historiadores consideram que as duas explosões do início de agosto de
1945 foram o início da corrida armamentista entre americanos e soviéti-
cos. A partir desse momento, ter acesso a essa tecnologia parecia vital
para impor limites ao poder do inimigo.

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Nas décadas posteriores, os dois lados desenvolveram armas nu-
cleares cada vez mais poderosas, o que incluiu a bomba H, que fun-
ciona com a fusão nuclear, o mesmo tipo de reação que ocorre no Sol.
Essas bombas têm centenas de vezes mais poder de destruição do que
as bombas utilizadas em Hiroshima e Nagasaki. Após atingir esse ápice,
o poder de destruição nuclear começou a se estabilizar, principalmente
com a assinatura do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares
(TNP), em 1968, que deu origem à doutrina da dissuasão nuclear, ou
seja, a busca por limitar os arsenais atômicos do mundo. Um dos ca-
minhos foi restringir o número de países com acesso a esse tipo de
tecnologia militar.
É importante ressaltar, no entanto, que a corrida armamentista não se
limitou às bombas atômicas. Ela também incluiu outros tipos de armamen-
tos, como mísseis de médio e longo alcance (chamados de mísseis ba- Fique
lísticos), submarinos e porta-aviões movidos a energia nuclear, aviões de ligado
guerra e a instalação de bases militares em diversos lugares do mundo.
A construção de todo esse aparato militar está diretamente relacio- Nas aulas de Física, vemos
que a balística é a ciência
nada à busca da hegemonia na Ordem Mundial Bipolar. Primeiro, porque
que estuda o movimento de
é um sinal claro da construção de um equilíbrio de poder. Outro pon- projéteis e está diretamente
to importante é que, considerando que a hegemonia é constituída pela relacionada ao estudo de
coerção e pela produção do consenso, não há dúvida de que toda a cor- movimento oblíquo.
rida armamentista, desde o final da Segunda Guerra Mundial, teve como
objetivo garantir a parcela da coerção para as potências com pretensões
hegemônicas na política mundial. Ela era, portanto, o complemento à pro-
dução do consenso, com base na disputa ideológica.

Corrida espacial
De forma paralela, mas não desconectada da corrida armamentista,
ocorreu a corrida espacial entre os Estados Unidos e a União Soviética.
Em primeiro plano, essa corrida tinha uma função propagandista, tanto
no regime socialista como no capitalista, já que ambos buscavam provar
suas superioridades tecnológicas.
Nesse aspecto, a União Soviética liderou a corrida espacial nos pri-
meiros doze anos, com o primeiro satélite a orbitar a Terra (Sputnik 1), em
1957; o primeiro mamífero a ir para o espaço (a cadela Laika), em 1957;
e o primeiro ser humano a entrar em órbita (Yuri Gagarin), em 1961. Mas,
em 1969, os Estados Unidos passaram à frente, com a bem-sucedida mis-
são Apollo 11, que levou e trouxe de volta da Lua três astronautas (Neil
Armstrong, Buzz Aldrin e Michael Collins).
Apesar dessa face ideológica, a corrida espacial foi muito mais do
que isso. Durante as décadas em que ela se desenrolou, foram desen-
volvidas as primeiras versões de tecnologias importantes para a socieda-
de contemporânea, como os satélites de comunicação, imageamento e
meteorologia.

Conflitos indiretos
Apesar da ausência de um conflito militar direto entre os Estados Uni-
dos e a União Soviética, ocorreram diversos conflitos armados durante
esse período. Alguns desses conflitos não tinham nenhuma relação mais
clara com a disputa por hegemonia entre as duas potências, mas outros
se constituíram em verdadeiras guerras por procuração.
Chamamos de guerras por procuração (ou proxy wars, em inglês) os
conflitos que interessavam às potências e eram estimulados por elas,
mas travados por terceiros. Esses são chamados de proxies e podem ser
outros países ou grupos paramilitares lutando contra o governo de um
país. Durante a Guerra Fria vários conflitos com esses perfis se desenro-
laram. Vejamos a seguir alguns exemplos representativos.

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 39

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Guerra da Coreia
A Guerra da Coreia (1950-1953) foi o primeiro grande conflito indire-
to entre as duas superpotências da Guerra Fria. O país havia passado
décadas sob domínio militar japonês, mas, com a derrota do Japão na
Segunda Guerra Mundial, os coreanos se libertaram e puderam reorga-
nizar seu país. Durante a reorganização, ascenderam politicamente dois
grupos opostos: os defensores da adoção do capitalismo, apoiados pe-
los Estados Unidos, e os que queriam a adoção do socialismo, apoiados
pela União Soviética e pela China, que havia passado pela Revolução
Comunista em 1949.
Seguindo a Doutrina Truman, os Estados Unidos enviaram tropas para
a península coreana, com o objetivo de evitar que o país se tornasse
socialista. Os soviéticos, por sua vez, enviaram armamentos, munição e
mantimentos, além de treinar soldados coreanos. Após três anos de uma
guerra bastante destrutiva, as potências e a Organização das Nações
Unidas (ONU) promoveram um cessar-fogo, que estabeleceu a divisão
da Coreia em duas porções: a Coreia do Norte (socialista) e a Coreia do
Sul (capitalista) com base no paralelo 38° Norte. Essa divisão permanece
até hoje, sendo considerada uma das maiores heranças da Guerra Fria.
Observe o mapa a seguir.

Coreia do Norte e Coreia do Sul

CHINA

COREIA
DO NORTE
Mar do
Japão
Pyongyang
38° N

Seul

COREIA
Mar da DO SUL
Fonte: “Por que a Coreia do Norte e China
do Sul se separaram?”. Veja, 11 set. Oriental JAPÃO N
2017. Disponível em: https://veja.abril.
com.br/mundo/por-que-a-coreia-do- Capital
norte-e-do-sul-se-separaram/. 0 160 km
125° L
Acesso em: 21 jul. 2021. (Adapt.).

Guerra do Vietnã
A Guerra do Vietnã foi um dos mais marcantes conflitos da Guerra
Fria. Ela começou como uma guerra de independência da Indochina (an-
tigo nome da região) em relação à França. Após a independência, houve
a divisão do país em Norte (socialista) e Sul (capitalista). A partir de 1955,
os dois países iniciaram uma guerra para promover a reunificação, cada
qual sob seu comando. O Norte tinha apoio da China comunista, o Sul era
apoiado pelos Estados Unidos. A participação estadunidense se intensi-
ficou a partir de 1964, após um suposto ataque do Vietnã do Norte a um
navio dos Estado Unidos. A notícia do ataque, até hoje contestado por
historiadores, levou o congresso dos Estados Unidos a aprovar o envio
maciço de tropas para a região.
Cerca de 2,5 milhões de soldados estadunidenses foram lutar no
Vietnã, onde mais de 50 mil deles morreram em batalha. Apesar da su-
posta superioridade militar dos Estados Unidos, o grande empenho dos
norte-vietnamitas e as especificidades das batalhas travadas nas selvas
tropicais do país representaram grandes dificuldades para o oponente.

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Enquanto isso, os Estados Unidos viviam uma grande efervescência
cultural da juventude, com o crescimento do movimento negro e da luta
pelos direitos das mulheres, além do questionamento dos costumes e
das tradições vigentes. Nesse contexto, cresceram os protestos dos jo-
vens e dos pacifistas estadunidenses contra a participação do país na
guerra do Vietnã, o que acabou levando à retirada das tropas em 1973.
Após a saída dos Estados Unidos, o Vietnã do Sul ficou extremamente
enfraquecido e o país foi unificado sob o comando do Norte, tornando-se
socialista. Isso configurou uma derrota política para o governo dos Esta-
dos Unidos e um abalo na Doutrina Truman.
Cuba: a resistência latina aos Estados Unidos
Outro conflito importante, que acabou relacionando-se ao jogo de po-
der entre os Estados Unidos e a União Soviética, foi a Revolução Cubana
(1953-1959). O país, uma ilha localizada a menos de 200 km da costa
da Flórida, nos Estados Unidos, vivia sob um governo corrupto e aliado
a investidores estadunidenses. Nesse contexto, cresceu um movimento
revolucionário camponês, que, inicialmente, não estava alinhado ao so-
cialismo nem à União Soviética.
Em 1959, os revolucionários, liderados por Fidel Castro, Raúl Castro
e Ernesto “Che” Guevara, tiveram sucesso na empreitada e iniciaram
um processo de ampla reforma agrária e nacionalização de empresas
estrangeiras. O processo desagradou fortemente os investidores dos
Estados Unidos, que pressionaram o governo por uma intervenção.
A reação do governo estadunidense foi apoiar os exilados cubanos em
uma tentativa de voltar à ilha e retomar o poder, o que levou à cha-
mada Invasão da Baía dos Porcos, em 1961. Essa tentativa, no entanto,
foi totalmente frustrada, e o governo cubano começou a se aproximar
mais abertamente da União Soviética e a assumir seu caráter socialista.
Mesmo assim, somente em 1965 foi oficializada a criação do Partido
Comunista Cubano.
O ponto alto da questão cubana foi a Crise dos Mísseis, em 1962.
Aproveitando a aproximação de Cuba, o governo soviético criou um pro-
jeto para instalar cerca de 40 mísseis nucleares no país, de modo a equi-
librar o fato de os estadunidenses terem instalado mísseis do mesmo tipo
na Turquia, país relativamente próximo à União Soviética.
A tentativa soviética gerou um delicado impasse, pois, quando os
navios chegaram com os mísseis próximo a Cuba, barcos de guerra
da marinha estadunidense os cercaram e ameaçaram atacar, caso os
mísseis fossem desembarcados. Durante 13 dias, os líderes dos Esta-
dos Unidos e da União Soviética, John Kennedy (1917-1963) e Nikita
Kruschev (1894-1971), respectivamente, negociaram, de forma muito
tensa, uma saída diplomática para a situação. As negociações foram
bem-sucedidas: os soviéticos concordaram em retornar com os mísseis,
caso os projéteis estadunidenses da Turquia também fossem retirados;
além disso, houve o compromisso, por parte dos Estados Unidos, de
não invadir Cuba.
Após a resolução dessa crise, a União Soviética passou a ajudar
o regime cubano, principalmente com fornecimento de petróleo e
maquinário e com a compra de açúcar e tabaco, os dois principais
produtos cubanos. O objetivo era também geopolítico, afinal, o suces-
so do socialismo cubano poderia servir como modelo aos países da
América Latina.
Como reação, o governo dos Estados Unidos apoiou regimes antico-
munistas em toda a América Latina, inclusive as diversas ditaduras mili-
tares que irromperam a partir de 1960, podendo ser considerada uma
reação direta à Revolução Cubana.

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Fim da Guerra Fria
No final da década de 1970, o socialismo soviético tinha problemas
em evidência. A centralização das decisões econômicas nas mãos do
Estado dificultava a inovação tecnológica e desestimulava o aumento da
produtividade. A priorização de investimento dos recursos estatais em
indústrias de base e no setor militar mantinha as indústrias de bens de
consumo, as que mais diretamente podiam oferecer “melhorias” à popu-
lação, em estado de baixo desenvolvimento.
Paralelamente, ficavam mais claros os sinais do questionamento do
poder de Moscou (União Soviética) em países do bloco socialista, o que
refletia um avanço das ideias liberais no mundo.
A reação do governo soviético, na época comandado por Leonid
Brejnev (1906-1982), foi promover um combate contra o liberalismo, tanto
dentro como fora do país. A principal medida, nesse sentido, foi a inter-
venção militar no Afeganistão para apoiar o governo socialista implanta-
do no país, mas que sofria forte resistência interna, inclusive de grupos
armados.
A intervenção no Afeganistão, iniciada em 1979, ficou conhecida como
o Vietnã soviético. Para piorar, a União Soviética gastou muitos recursos
com a guerra, aumentando ainda mais a insatisfação interna com o regime.
Em meio a essa insatisfação e aos problemas econômicos que afeta-
vam a União Soviética, a produção agrícola começou a declinar, levando o
país a uma forte crise de desabastecimento que tornou inevitável a mudan-
ça de rumos pelo governo soviético. Após a morte de Brejnev, em 1982, a
situação ficou ainda pior. A consequência mais direta foi a escolha de um
sucessor com ideias novas para tentar salvar a União Soviética e o regime
socialista da crise econômica e política que se agravava a cada dia.
Foi nesse contexto que Mikhail Gorbatchev (1931-), o secretário-geral
Heide Pinkall/Shutterstock.com

do Partido Comunista soviético, ascendeu ao poder na década de 1980,


dando início a uma série de reformas que marcariam, definitivamente, o
futuro da União Soviética.
Primeiro, ele propôs mudanças econômicas que objetivavam dinami-
zar a economia. Foi criado um plano de ação denominado Perestroika,
que significa reestruturação, e incluía:
• a liberalização de importações, para amenizar a crise de abastecimen-
to que vinha ocorrendo no país;
• a diminuição da centralização do controle econômico nas mãos do
governo, incluindo liberalização de preços e mais autonomia para
as empresas estatais adotarem uma administração mais eficiente e
Mikhail Gorbatchev, líder das reformas na competitiva;
União Soviética, em foto de 1997.
• a diminuição dos gastos militares, principalmente no arsenal nuclear e
nas intervenções militares em países do bloco socialista.
Os cortes militares promoveram uma mudança na orientação da polí-
tica externa soviética, inaugurando o que ficou conhecido como Doutrina
Sinatra. A proposta dessa nova doutrina era dar maior liberdade aos paí-
ses socialistas, aliados à União Soviética, para que definissem seu pró-
prio caminho político e econômico. Com isso, teve fim a intervenção dos
soviéticos no Afeganistão.
Conjuntamente à Perestroika, Gorbatchev implementou um pacote de
mudanças políticas chamado de Glasnost, que significa transparência,
e incluía:
• liberdade de expressão para as pessoas e para os meios de comu-
nicação;
• diminuição da força e da centralização política nas mãos do Partido
Comunista da União Soviética (PCUS);

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• instituição de eleições com diversos candidatos para os cargos pú-
blicos, como prefeito e presidentes das repúblicas. Lembrando que
quem governava a União Soviética era o secretário-geral do PCUS,
que permanecia sob escolha da cúpula do partido.
A Perestroika e a Glasnost criaram grande polêmica entre os sovié-
ticos. Para os mais conservadores, elas eram demasiadamente ousadas
e tenderiam a levar à perda de poder do Partido Comunista na política
interna e da União Soviética no plano internacional. Para os mais liberais, Mais
no entanto, elas eram insuficientes, pois mantinham parte da estrutura
econômica intocada e não solucionavam os problemas do regime. Pas- Chernobyl.
sou a se formar, portanto, um embate entre reformistas e conservadores Direção: Craig Mazin. 2019.
no âmbito dos dirigentes da União Soviética. Classificação indicativa: 16 anos.
O fato é que, após a adoção dos pacotes de reformas, em 1985, a
situação da União Soviética se tornou mais frágil, tanto em termos econô- Com excelente qualidade técnica
e narrativa, os cinco episódios da
micos como em relação à instabilidade política e à insatisfação popular.
minissérie reconstroem detalhes
Os problemas também começaram a ser perceptíveis nos países socialis-
históricos, com um pouco de
tas aliados ao Pacto de Varsóvia. ficção, do acidente nuclear
Internamente, vale a pena destacar a polêmica gerada pelo acidente ocorrido em 1986 na República
da usina nuclear de Chernobyl, no norte da Ucrânia, em abril de 1986, Socialista Soviética da Ucrânia.
ainda no início da implementação das reformas de Gorbatchev. Após ten- É possível ter uma boa noção
tar esconder o acidente por quase 2 dias, o governo soviético foi pres- dos embates entre as tendências
sionado a ser mais transparente, o que ia diretamente ao encontro da opostas do governo soviético na
Glasnost. Essa pressão, no entanto, não agradou a muitos burocratas, era Gorbatchev.
acostumados a manter o controle das informações e das decisões.
Um dos acontecimentos mais importantes desse período foi a queda
Adeus, Lenin!
do Muro de Berlim, em 1989. Com a sinalização soviética de que não iria Direção: Wolgang Becker. 2003.
mais se impor sobre seus aliados socialistas, cresceram os protestos po- Classificação indicativa: 14 anos.
pulares contra o governo da Alemanha Oriental, que foi ficando cada vez A história da Alemanha Oriental
mais desmoralizado a ponto de não conseguir impedir que a população e da reunificação é tratada com
começasse a destruir o muro que simbolizava a separação entre os dois bom humor e detalhes históricos
países. Assim como o muro, o governo socialista alemão também caiu, e nesse filme.
o país se reunificou em 1990.

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Parque Memorial em Berlim, que mantém fragmentos do antigo muro, em 2019.

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mark reinstein/Shutterstock.com

Diante dos sinais de decadência do regime, da perda da influência e


do aumento da instabilidade interna, forças militares conservadoras, em
1991, promoveram um golpe contra Gorbatchev para assumir o poder e
eliminar as reformas, crendo que, desse modo, seria possível restaurar a
União Soviética. Entretanto, o clima de liberdade e a ascensão de novas
lideranças políticas possibilitaram uma grande reação popular à tentativa
de golpe, que fracassou.
Enquanto Gorbatchev via sua popularidade decair, Boris Yeltsin (1931-
-2007), representante dos grupos políticos mais liberais, os quais que-
riam reformas mais profundas, ascendeu no cenário político. Yeltsin uniu
sua popularidade aos líderes da Ucrânia e das repúblicas bálticas (Letô-
nia, Estônia e Lituânia) e, juntos, declararam independência. Com isso, a
União Soviética fragmentou-se em 15 Estados nacionais; o polo socialista
Boris Yeltsin, líder russo que foi um dos
responsáveis pela dissolução da União da Guerra Fria deixava de existir. Era o início da formação do que ficou
Soviética, em entrevista coletiva de 1992. reconhecido como uma Nova Ordem Mundial.

Aplicando conhecimentos

1 Por que a Ordem Mundial Bipolar tem esse nome? 3 Explique o que eram a OTAN e o Pacto de Varsóvia
durante a Guerra Fria. Qual era a função deles?

2 O que foi a disputa ideológica que caracterizou a Guer- 4 O que foi a corrida armamentista e qual sua relação
ra Fria? Indique uma forma pela qual ela se realizava. com o equilíbrio de poder da Guerra Fria?

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CONSOLIDANDO SABERES

1 IFSul-RS 2017 Configuração política internacional enviaram tropas em defesa da Coreia do Sul, comanda-
que caracterizou a Guerra Fria (do final da Segunda das pelo general norte-americano Douglas MacArthur.
Guerra Mundial a 1989-1991), centrada em dois Esta- Após três anos de combate, foi assinado um armistí-
dos, os Estados Unidos e a URSS, aos quais, de modo cio em 27 de julho de 1953, mantendo a divisão entre
mais ou menos consentido, os demais Estados alinha- as Coreias.
ram-se militar, política e ideologicamente. Adaptado de cpdoc.fgv.br.
DURAND, Marie-Françoise. Atlas da mundialização: compreender o espaço
mundial contemporâneo. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 157. O governo norte-coreano anunciou recentemente
que não mais reconheceria o armistício assinado em
A que importante período da Geopolítica mundial o 1953, o que trouxe novamente ao debate o episódio
texto faz referência? da Guerra da Coreia.
a) Liberalismo O fator que explica a dimensão assumida por essa
b) Bipolaridade guerra na década de 1950 está apresentado em:
c) Globalização a) mundialização do acesso a fontes de energia
d) Macarthismo b) bipolaridade das relações políticas internacionais
c) hegemonia soviética em países do Terceiro Mundo
2 Unicamp-SP 2020 No período da Guerra Fria, os d) criação de multinacionais japonesas no extremo
conflitos geopolíticos implicavam riscos nucleares e Oriente
ataques físicos a infraestruturas como estradas, re-
des elétricas ou gasodutos. Hoje, além dessas impli- 5 IFCE 2014 Sobre a Guerra Fria é falsa a afirmativa
cações, a Ciberguerra ou Guerra Fria Digital a) é o momento em que se inicia a bipolarização
a) representa uma possibilidade real de interferência mundial, com a divisão do mundo em dois polos
em sistemas informacionais nacionais, mas seu de poder.
uso efetivo mantém-se apenas como uma ameaça. b) a corrida espacial foi um marco na disputa entre
b) baseia-se na capacidade integrada de sistemas os blocos capitalistas e socialistas.
computacionais espionarem governos antagôni- c) durante a Guerra Fria, eliminou-se a possibilidade
cos, com o objetivo de manipular informações de de uma corrida armamentista, uma vez que o
todo tipo. cerne do conflito era apenas ideológico e as prin-
c) envolve o uso de softwares (malwares) e progra- cipais nações envolvidas temiam o desencadea-
ma robôs para invadir redes sociais e computado- mento de um conflito de maior porte.
res, mas nunca interferiu em processos eleitorais. d) os soviéticos foram os primeiros a lançar um sa-
d) visa ao controle da informação como uma forma télite e a enviar um homem ao espaço, enquanto
de poder político, mas inexistem, no mundo, ci- os estadunidenses organizaram a primeira expe-
bercomandos, ou seja, a quarta força armada. dição tripulada até a Lua. Desse modo, a Guerra
Fria teve sentido tecnológico, ideológico e cultural.
3 IFSP 2016 Para Almeida, “considerando que o foco e) além da corrida espacial, durante a Guerra Fria,
geográfico principal da Guerra Fria era a Europa cen- ocorreu a chamada corrida armamentista, que
tral e partes da Ásia e que, no plano estratégico global, teve início com o lançamento das bombas atô-
o que estava em causa era, essencialmente, uma”: micas sobre o Japão. Estados Unidos e União
(Fonte: ALMEIDA, Paulo Roberto. O Brasil e as relações internacionais no Soviética esforçavam-se em produzir bombas nu-
Pós-Guerra Fria. In: ______. Vinte Anos da Queda do Muro de Berlim. cleares com poder de destruição cada vez maior.
Palhoça: Unisul, 2009, p. 23 e 24).

a) competição pela hegemonia mundial entre as 6 Ifal 2018 A doutrina da dissuasão nuclear, que passa
duas superpotências. por um teste na atual crise entre Estados Unidos e
b) crise entre todas as potências mundiais, exceto Coreia do Norte, nasceu na Guerra Fria, quando as
União Soviética, Estados Unidos e China. duas potências da época afirmavam que qualquer
c) disputa pelo Oriente Médio e posterior aproxima- ataque teria represálias apocalípticas.
ção diplomática entre todas as potências. Esse possível conflito envolve diretamente alguns
d) ideia de superioridade interglobal ameaçada. países, entre eles:
e) destruição nuclear inevitável entre as potências. a) Rússia, China, Japão, Austrália e Nova Zelândia.
b) China, Japão, Singapura, Indonésia e Rússia.
4 Uerj 2014 Em 25 de junho de 1950, tropas da Coreia c) Coreia do Sul, China, Japão, EUA e Coreia do Norte.
do Norte ultrapassaram o Paralelo 38, que delimita- d) Japão, Coreia do Norte, Rússia, Síria e Coreia
va a fronteira com a Coreia do Sul. Com a aprovação do Sul.
do Conselho de Segurança da ONU, quinze países e) Coreia do Norte, EUA, China, Malásia e Japão.

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7 UEL-PR 2019 Analise o mapa a seguir.
O Mundo Bipolar (1945-1990)

OCEANO GLACIAL ÁRTICO

UNIÃO SOVIÉTICA
EUROPA
EUROPA ORIENTAL
ESTADOS OCIDENTAL
UNIDOS CHINA
JAPÃO
ORIENTE
CUBA MÉDIO
OCEANO
Mundo
ÁFRICA
Indiano PACÍFICO
OCEANO AMÉRICA
PACÍFICO LATINA OCEANO
ÍNDICO OCEANIA
OCEANO
ATLÂNTICO

Mundo capitalista Mundo socialista

CAPITALISMO SOCIALISMO

Principal polo ou centro Principal polo ou centro


político-militar e econômico político-militar e econômico
do sistema capitalista do socialismo

Centros secundários no Centros secundários no


sistema capitalista mundial mundo socialista

Periferias do capitalismo Áreas satelizadas pela


internacional superpotência socialista

Com base no mapa e nos conhecimentos da geopolítica mundial no século XX, atribua V (verdadeiro) ou F (falso)
às afirmativas a seguir.
( ) O término da Segunda Guerra Mundial inaugurou o período denominado Guerra Fria marcado pelo confronto
ideológico entre a URSS e os EUA, gerando diversos conflitos por disputas de territórios.
( ) Fidel Castro se aproximou do bloco socialista, do qual nasceu um plano que levou a uma das maiores crises
políticas da Guerra Fria: o conflito entre a União Soviética e os Estados Unidos (1962), designado como a Crise
dos Mísseis em Cuba.
( ) A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) é uma aliança militar fundada no princípio da segurança
coletiva com o objetivo de manter a paz entre os países membros e a democracia dentro deles.
( ) A corrida armamentista constitui-se em uma característica secundária desse período, já que a questão central
da geopolítica, pós Segunda Guerra Mundial, foi a disseminação da organização espacial mundial multipolar.
( ) A designação de “fria” vinculou-se a um período geopolítico no qual se destacava a abstenção das superpo-
tências nos conflitos militares nas áreas periféricas do mundo, de forma que os norte-americanos e os soviéti-
cos se desvincularam de guerras localizadas em outras partes do mundo.
Adaptado de: VESENTINI, J. W. O Ensino de Geografia e as Mudanças Recentes do Espaço Geográfico Mundial. São Paulo: Ática, 1992.

Assinale a alternativa que contém, de cima para baixo, a sequência correta.


a) V, V, V, F, F.
b) V, V, F, F, F.
c) V, F, F, V, V.
d) F, F, V, V, V.
e) F, F, F, V, V.

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8 UEM-PR 2017 Sobre o ordenamento geopolítico e 08. a Organização Mundial do Comércio (OMC) tem
econômico mundial do período pós-guerra (1945) até como principal objetivo criar as condições ne-
os dias de hoje, assinale a(s) alternativa(s) correta(s). cessárias para os acordos sobre livre movimen-
01. A Organização Europeia de Cooperação Econô- tação de pessoas, principalmente entre as popu-
mica (OECE) foi instituída em 1991, após o fim do lações do antigo “terceiro mundo”.
socialismo no Leste Europeu, a fim de adminis- 16. a Organização Internacional do Trabalho (OIT),
trar os recursos financeiros a serem investidos diferentemente de outras instituições internacio-
nos antigos países comunistas. nais, existiu apenas durante a vigência do bloco
02. Em 1989, o Muro de Berlim, que separava a an- liderado pela extinta União das Repúblicas So-
tiga capital alemã em duas, foi derrubado pelos cialistas Soviéticas.
próprios moradores e, nos anos seguintes, hou- 32. o Banco Internacional para Reconstrução e De-
ve uma fragmentação da antiga União Soviética, senvolvimento (Bird) tem na atualidade aproxi-
surgindo mais de uma dezena de países no ce- madamente 185 países-membros e iniciou suas
nário internacional. atividades auxiliando na reconstrução da Europa
04. A chamada crise dos mísseis de Cuba, durante a e de outros países devastados durante a Segun-
Guerra Fria, foi uma tentativa de a União Soviéti- da Guerra Mundial.
ca invadir os Estados Unidos com as tropas rus-
Soma:
sas aquarteladas em bases militares instaladas
em território cubano. 10 UEM-PR 2016 Uma das consequências da Segunda
08. O Plano Marshall (Programa de Recuperação Eu- Guerra Mundial foi o fim da hegemonia europeia so-
ropeia) foi idealizado para acelerar a recupera- bre o mundo e o início da disputa pelas supremacias
ção econômica dos países capitalistas da Europa militar, econômica, política e cultural entre os Estados
Ocidental e para frear a influência soviética. Unidos (EUA) e a União Soviética (URSS). Essa dispu-
16. A Guerra Fria foi um período que se iniciou após ta ficou conhecida como Guerra Fria. Sobre a Guerra
a Segunda Guerra Mundial e foi marcada por Fria, é correto afirmar que
uma bipolarização que resultou do antagonismo 01. caracterizou-se por ser uma corrida armamentis-
geopolítico e ideológico entre os Estados Uni- ta, ideológica e territorial, marcada por diversas
dos e a União Soviética, as duas superpotências hostilidades entre as superpotências envolvidas,
hegemônicas da época. apesar de nunca ter havido um enfrentamento
direto entre ambas.
Soma:
02. a Guerra das Malvinas, ocorrida na década de
9 UFSC 2016 Organizações internacionais são 1980, teve, como causa imediata, a disputa en-
entidades criadas pelas nações do mundo com o tre os EUA e a URSS pela hegemonia do Atlân-
objetivo de trabalhar em comum para o pleno de- tico Sul.
senvolvimento das diferentes áreas da atividade 04. durante a Guerra Fria, os principais países aliados
humana: política, economia, saúde, segurança, do eixo capitalista ficaram conhecidos como a
trabalho etc. Em relação às proposições abaixo, é Tríplice Entente, enquanto os países que compu-
CORRETO afirmar que: nham os pilares do bloco comunista formavam o
01. a Organização das Nações Unidas (ONU) foi cria- que se convencionou chamar de Tríplice Aliança.
da pelos países vencedores da Primeira Guerra 08. após a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha foi
Mundial – apesar da oposição da União Soviéti- dividida em dois países: a República Democrática
ca – e tem como principal objetivo manter a paz da Alemanha, com capital em Berlim, situada na
e a segurança internacionais. zona de ocupação soviética; e a República Fede-
02. a Organização do Tratado do Atlântico Norte ral da Alemanha, cuja capital era Bonn, localiza-
(Otan) foi constituída em 1949, no contexto da da na área que estava sob influência direta dos
Guerra Fria, como uma aliança militar das potên- países capitalistas.
cias ocidentais em oposição aos países do bloco 16. a cidade de Berlim foi dividida em duas partes
socialista, mas atualmente tem, entre seus asso- após a Segunda Guerra Mundial. Em princípio,
ciados, países do antigo bloco socialista. as pessoas podiam transitar entre essas partes,
04. uma das organizações mais bem-sucedidas até ser construído o chamado Muro de Berlim,
é o Fundo Monetário Internacional (FMI), cujo separando fisicamente o lado oriental (socialista)
principal objetivo é criar as condições para in- do lado ocidental (capitalista).
vestimentos em infraestrutura e educação, sem
Soma:
ligação com questões financeiras dos países.

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 47

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11 Fuvest-SP a) uma manifestação pelo reconhecimento interna-
cional da hegemonia asiática sobre a economia
do pós-guerra.
EUA b) uma ruptura com os padrões socioculturais pre-
conizados pela Tríplice Aliança e pela Tríplice
Entente.
c) a resistência política contra os confrontos arma-
dos entre os Países Aliados e os Países do Eixo.
CUBA d) a consolidação da influência socialista no hemis-
fério oriental, com a redefinição de antigas fron-
teiras políticas.
e) a tentativa de alguns países de se manterem
Tendo em vista o que a charge pretende expressar neutros diante da bipolaridade estabelecida pela
e a data de sua publicação, dentre as legendas pro- Guerra Fria.
postas a seguir, a mais adequada para essa charge é:
a) Suspensão do embargo econômico a Cuba por 14 IFCE 2016 Indica uma importante mudança ocorrida
parte dos EUA. na divisão territorial dos estados europeus a partir do
b) Devolução aos cubanos da área ocupada pelos fim da Guerra Fria
EUA em Guantánamo. a) a fragmentação da Iugoslávia em dois Estados,
c) Fim do embargo das exportações petrolíferas quais sejam, Croácia e Eslovênia.
cubanas. b) a estruturação do Estado Soviético e o ressurgi-
d) Retomada das relações diplomáticas entre os mento de vários Estados independentes.
EUA e Cuba. c) a divisão da Tchecoslováquia em diversos
e) Transferência de todos os presos políticos de Estados, a exemplo da República Tcheca e a
Guantánamo, para prisões norte-americanas. Eslováquia.
d) a unificação da Alemanha, com o fim da separa-
12 Unicamp-SP 2014 O cartaz abaixo foi usado pela ção entre a Alemanha Ocidental e a Alemanha
propaganda soviética contra o capitalismo ociden- Oriental.
tal, durante o período da Guerra Fria. O texto diz: e) a inexistência de conflitos armados prolongados,
“Duas infâncias. Na URSS (parte superior) crianças que a levaram a ser incorporada à geopolítica das
são apoiadas pelo amor da nação! Nos países ca- lutas anticoloniais e de libertação nacional.
pitalistas (figura inferior), milhões de crianças vivem
sem comida ou abrigo.” 15 IFSP 2017 Leia o trecho abaixo para responder à
questão.

“Em esfera internacional, a União Soviética bus-


cou dar sinais para o fim da Guerra Fria. As tropas
russas que ocupavam o Afeganistão se retiraram do
país e novos acordos econômicos foram firmados
junto aos Estados Unidos. Logo em seguida, as auto-
ridades soviéticas pediram auxílio para que outras
nações capitalistas fornecessem apoio financeiro
para que a nação soviética superasse suas dificulda-
des internas.”
Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/historiag/urss.htm.

Assinale a alternativa que não contribuiu para o co-


lapso da URSS.
a) Como o cartaz descreve a sociedade capitalista a) A postura do Partido Comunista em centralizar e
ocidental? controlar todo o Estado.
b) Cite dois conflitos bélicos do período da Guerra Fria. b) A falta de investimentos em outros tipos de indús-
trias, como a de base e a de consumo.
13 Unesp 2017 Em 1955 foi realizada na Indonésia a c) A imposição da cultura russa às populações per-
Conferência de Bandung, que lançou as bases do tencentes ao bloco soviético.
chamado Movimento dos Não Alinhados. Conside- d) Crise de desabastecimento agrícola.
rando o contexto do Pós-Segunda Guerra Mundial, a e) A localização geográfica da URSS.
Conferência de Bandung expressava

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No ENEM é assim
As questões selecionadas nesta seção são prioritariamente do Enem, mas questões de vestibulares diversos que apre-
sentam características semelhantes aos itens do referido exame também foram usadas como recurso para estudo.

1 Enem De todas as transformações impostas pelo 3 Enem PPL 2016 Os gargalos rodoviários do Brasil
meio técnico-científico-informacional à logística de e o caótico trânsito das suas metrópoles forçam
transportes, interessa-nos mais de perto a intermo- os governos estaduais e federal a retomar os pla-
dalidade. E por uma razão muito simples: o potencial nos de implantação dos trens regionais. Durante
que tal “ferramenta logística” ostenta permite que as últimas quatro décadas, a malha ferroviária foi
haja, de fato, um sistema de transportes condizente esquecida e sucateada, tanto que hoje, em todo o
com a escala geográfica do Brasil. país, apenas duas linhas de passageiros estão fun-
HUERTAS, D. M. O papel dos transportes na expansão recente cionando. Transportam 1,5 milhão de pessoas entre
da fronteira agrícola brasileira. Revista Transporte y Territorio, Belo Horizonte (MG) e Vitória (ES) e entre São Luís
Universidade de Buenos Aires, n. 3, 2010 (adaptado).
(MA) e Carajás (PA) – as duas operadas pela mine-
A necessidade de modais de transporte interligados, radora Vale. Nos anos 1960, mais de 100 milhões
no território brasileiro, justifica-se pela(s) de passageiros utilizavam trens interurbanos no
território nacional.
a) variações climáticas no território, associadas à in- Disponível em: www.estadao.com.br. Acesso em: 2 set. 2010.
teriorização da produção.
b) grandes distâncias e a busca da redução dos O sucateamento do meio de transporte descrito foi
custos de transporte. provocado pela
c) formação geológica do país, que impede o uso a) redução da demanda populacional por trens
de um único modal. interurbanos.
d) proximidade entre a área de produção agrícola b) inadequação dos trajetos em função da extensão
intensiva e os portos. do país.
e) diminuição dos fluxos materiais em detrimento de c) precarização tecnológica frente a outros meios
fluxos imateriais. de deslocamento.
d) priorização da malha rodoviária no período de
2 Enem 2017 Os maiores consumidores da infraestru- modernização do espaço.
tura logística para exportação no Brasil são os produ- e) ampliação dos problemas ambientais associados
tos a granel, dentre os quais se destacam o minério de à conservação das ferrovias.
ferro, petróleo e seus derivados e a soja, que, por pos-
suírem baixo valor agregado, e por serem movimen- 4 Enem PPL 2018 Os objetivos da ONU, de acordo
tados em grandes volumes, necessitam de uma in- com o disposto no capítulo primeiro de sua Carta, são
fraestrutura de grande porte e baixos custos. No caso quatro: 1) manter a paz e segurança internacionais; 2)
da soja, a infraestrutura deixa muito a desejar, resul- desenvolver ações amistosas entre as nações, com
tando em enormes filas de navios, caminhões e trens, base no respeito ao princípio de igualdade de direi-
que, por ficarem grande parte do tempo ociosos nas tos e de autodeterminação dos povos; 3) conseguir
filas, têm seu custo majorado, onerando fortemente uma cooperação internacional para resolver os pro-
o exportador, afetando sua margem de lucro e amea- blemas internacionais de caráter econômico, social,
çando nossa competitividade internacional. cultural ou humanitário; 4) ser um centro destinado
FLEURY P. F. A infraestrutura e os desafios logísticos das exportações a harmonizar a ação das nações para a consecução
brasileiras. Rio de Janeiro: CEL; Coppead; UFRJ. 2005 (adaptado). desses objetivos comuns.
GONÇALVES, W. Relações internacionais.
No contexto do início do século XXI, uma ação para Rio de Janeiro: Zahar, 2008 (adaptado).

solucionar os problemas logísticos da soja apresen-


tados no texto seria a De acordo com os objetivos descritos, o papel do
organismo internacional mencionado consiste em
a) isenção de impostos de transportes. a) regular o sistema financeiro global.
b) construção de terminais atracadouros. b) mediar conflitos de ordem geopolítica.
c) diversificação dos parceiros comerciais. c) legitimar ações de expansionismo territorial.
d) contratação de trabalhadores portuários. d) promover a padronização de hábitos de consumo.
e) intensificação do policiamento das rodovias. e) estabelecer barreiras à circulação de mercadorias.

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 49

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5 Enem Em conflitos regionais e na guerra entre na- d) os grandes debates nacionais acerca da in-
ções, tem sido observada a ocorrência de seques- serção internacional do Brasil foram emba-
tros, execuções sumárias, torturas e outras violações sados pelas elites do Império e da República
de direitos. por meio de consultas aos diversos setores da
Em 10 de dezembro de 1948, a Assembleia Geral das população.
Nações Unidas adotou a Declaração Universal dos e) a atuação do Brasil em termos de política externa
Direitos do Homem, que, em seu artigo 5º, afirma: evidencia que o país tem capacidade decisória
própria, mesmo diante dos constrangimentos
Ninguém será submetido a tortura nem a penas
internacionais.
ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
Assim, entre nações que assinaram essa Declaração, 7 Enem PPL Embora o aspecto mais óbvio da Guerra
é coerente esperar que Fria fosse o confronto militar e a cada vez mais fre-
a) a Constituição de cada país deva se sobrepor aos nética corrida armamentista, não foi esse o seu gran-
Direitos Universais do Homem, apenas enquanto de impacto. As armas nucleares nunca foram usadas.
houver conflito. Muito mais óbvias foram as consequências políticas
b) a soberania dos Estados esteja em conformidade da Guerra Fria.
com os Direitos Universais do Homem, até mes- HOBSBAWM, E. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991.
mo em situações de conflito. São Paulo: Cia. das Letras, 1999 (adaptado).

c) a violação dos direitos humanos por uma nação


autorize a mesma violação pela nação adversária. O conflito entre as superpotências teve sua expres-
d) sejam estabelecidos limites de tolerância, para são emblemática no(a)
além dos quais a violação aos direitos humanos
seria permitida. a) formação do mundo bipolar.
e) a autodefesa nacional legitime a supressão dos b) aceleração da integração regional.
Direitos Universais do Homem. c) eliminação dos regimes autoritários.
d) difusão do fundamentalismo islâmico.
6 Enem Colhe o Brasil, após esforço contínuo dilata- e) enfraquecimento dos movimentos nacionalistas.
do no tempo, o que plantou no esforço da constru-
ção de sua inserção internacional. Há dois séculos 8 Enem PPL O papel da Organização do Tratado do
formularam-se os pilares da política externa. Teve o Atlântico Norte (Otan) alterou-se desde sua origem
país inteligência de longo prazo e cálculo de oportu- em 1949. A Otan é uma aliança militar que se funda
nidade no mundo difuso da transição da hegemonia sobre um tratado de segurança coletiva, o qual, por
britânica para o século americano. Engendrou concep- sua vez, indica a criação de uma organização interna-
ções, conceitos e teoria própria no século XIX, de José cional com o objetivo de manter a democracia, a paz
Bonifácio ao Visconde do Rio Branco. Buscou autono- e a segurança dos seus integrantes. No começo dos
mia decisória no século XX. As elites se interessaram, anos de 1990, em função dos conflitos nos Bálcãs, a
por meio de calorosos debates, pelo destino do Brasil. Otan declarou que a instabilidade na Europa Central
O país emergiu, de Vargas aos militares, como ator afetava diretamente a segurança dos seus membros.
responsável e previsível nas ações externas do Estado. Foi então iniciada a primeira operação militar fora
A mudança de regime político para a democracia não do território dos países-membros. Desde então ela
alterou o pragmatismo externo, mas o aperfeiçoou. expandiu sua área de interesse para África, Oriente
SARAIVA, J. F. S. O lugar do Brasil e o silêncio do parlamento. Correio Médio e Ásia.
Braziliense, Brasília, 28 maio 2009 (adaptado). BERTAZZO, J. Atuação da Otan no Pós-Guerra Fria: implicações para
a segurança nacional e para a ONU. Contexto Internacional, Rio de
Janeiro, jan.-jun. 2010 (adaptado).
Sob o ponto de vista da política externa brasileira no
século XX, conclui-se que Os objetivos dessa organização, nos diferentes perío-
a) o Brasil é um país periférico na ordem mundial, dos descritos, são, respectivamente:
devido às diferentes conjunturas de inserção
internacional. a) Financiar a indústria bélica – garantir atuação global.
b) as possibilidades de fazer prevalecer ideias e b) Conter a expansão socialista – realizar ataques
conceitos próprios, no que tange aos temas do preventivos.
comércio internacional e dos países em desen- c) Combater a ameaça soviética – promover auxílio
volvimento, são mínimas. humanitário.
c) as brechas do sistema internacional não foram d) Minimizar a influência estadunidense – apoiar or-
bem aproveitadas para avançar posições volta- ganismos multilaterais.
das para a criação de uma área de cooperação e) Reconstruir o continente devastado – assegurar
e associação integrada a seu entorno geográfico. estabilidade geopolítica.

50 GEOGRAFIA / Frente B

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9 Enem 2018 acordo para tornar a República Autônoma parte da
Os soviéticos tinham chegado a Cuba muito cedo Rússia. O tratado foi assinado dois dias após o povo
na década de 1960, esgueirando-se pela fresta aberta da Crimeia aprovar em um referendo a separação da
pela imediata hostilidade norte-americana em rela- Ucrânia e a reunificação com a Rússia. A votação foi
ção ao processo social revolucionário. Durante três condenada por Kiev e pela comunidade internacio-
décadas os soviéticos mantiveram sua presença em nal, que a considera ilegítima.
Cuba com bases e ajuda militar, mas, sobretudo, com Disponível em: http://g1.globo.com. Acesso em: 28 out. 2014 (adaptado).
todo o apoio econômico que, como saberíamos anos
mais tarde, mantinha o país à tona, embora nos dei- A justificativa para o acordo descrito fundamentava-
xasse em dívida com os irmãos soviéticos – e depois -se na ideia de
com seus herdeiros russos – por cifras que chegavam a a) espaço vital.
US$ 32 bilhões. Ou seja, o que era oferecido em nome b) limite fronteiriço.
da solidariedade socialista tinha um preço definido. c) estrutura bipolar.
PADURA, L. Cuba e os russos. Folha de São Paulo, 19 jul. 2014 (adaptado). d) identificação cultural.
e) autonomia econômica.
O texto indica que, durante a Guerra Fria, as relações
internas em um mesmo bloco foram marcadas pelo(a) 12 Enem 2015 Atualmente, as represálias econômicas
a) busca da neutralidade política. contra as empresas de informática norte-americanas
b) estímulo à competição comercial. continuam. A Alemanha proibiu um aplicativo dos
c) subordinação à potência hegemônica. Estados Unidos de compartilhamento de carros; na
d) elasticidade das fronteiras geográficas. China, o governo explicou que os equipamentos e ser-
e) compartilhamento de pesquisas científicas. viços de informática norte-americanos representam
uma ameaça, pedindo que as empresas estatais não
10 Enem 2020 recorram a eles.
Embora inegáveis os benefícios que ambas as SCHILLER, D. Disponível em: <www.diplomatique.org.br>.
economias têm auferido do intercâmbio comercial, o Acesso em: 11 nov. 2014 (adaptado).

Brasil tem reiterado seu objetivo de desenvolver com


a China uma relação comercial menos assimétrica. As ações tomadas pelos países contra a espionagem
Os números revelam com clareza a assimetria. As ex- revelam preocupação com o(a)
portações brasileiras de produtos básicos, especial- a) subsídio industrial.
mente soja, minério de ferro e petróleo, compõem, b) hegemonia cultural.
dependendo do ano, algo entre 75% e 80% da pauta, c) protecionismo dos mercados.
ao passo que as importações brasileiras consistem, d) desemprego tecnológico.
aproximadamente, em 95% de produtos industriali- e) segurança dos dados.
zados chineses, que vão desde os mais variados bens
de consumo até máquinas e equipamentos de alto 13 Enem
valor. Do ponto de vista geopolítico, a Guerra Fria dividiu
LEÃO, V. C. Prefácio. In: CINTRA, M. A. M.; SILVA FILHO, E. B.; PINTO, a Europa em dois blocos. Essa divisão propiciou a
E. C. (Org.). China em transformação: dimensões econômicas e formação de alianças antagônicas de caráter militar,
geopolíticas do desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2015.
como a OTAN, que aglutinava os países do bloco oci-
Uma ação estatal de longo prazo capaz de reduzir a dental, e o Pacto de Varsóvia, que concentrava os do
assimetria na balança comercial brasileira, conforme bloco oriental. É importante destacar que, na forma-
exposto no texto, é o(a) ção da OTAN, estão presentes, além dos países do
a) expansão do setor extrativista. oeste europeu, os EUA e o Canadá.
b) incremento da atividade agrícola. Essa divisão histórica atingiu igualmente os âmbitos
c) diversificação da matriz energética. político e econômico que se refletia pela opção entre
d) fortalecimento da pesquisa científica. os modelos capitalista e socialista. Essa divisão euro-
e) monitoramento do fluxo alfandegário. peia ficou conhecida como
a) Cortina de Ferro.
11 Enem 2020 b) Muro de Berlim.
Entenda a crise na Ucrânia c) União Europeia.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, e dois lí- d) Convenção de Ramsar.
deres da Crimeia assinaram, em março de 2014, um e) Conferência de Estocolmo.

CAPÍTULO T2 / Ordem mundial da Guerra Fria 51

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Gabarito

FRENTE B baseado na produção de uma concordância dos países, ou


dos cidadãos, para gerar um equilíbrio e certa aceitação do
CAPÍTULO T1 poder de outrem sobre o sistema internacional.
Sistema internacional 10 A Paz de Vestfália pressupunha que o simples equilíbrio de
poder, consequente do respeito das soberanias dos países
Aplicando conhecimentos componentes do sistema internacional, era suficiente para mi-
1 As embaixadas têm a função de estabelecer as relações entre nimizar conflitos armados entre os países. Mas as duas guer-
os países, enquanto os consulados têm como objetivo manter ras mundiais demonstraram o contrário, abrindo caminho para
as relações entre um país e seus cidadãos que estão em paí- as propostas de criação de organizações internacionais
ses estrangeiros. para garantir o equilíbrio de poder. Após o fracasso da Liga das
2 Considerando que o estabelecimento de embaixadas e con- Nações, a ONU foi criada para cumprir essa função.
sulados representa custos para um país, um dos fatores que
contribui para que o número de representações diplomáticas Consolidando saberes
varie é o poder econômico de cada governo. Outro fator é a 1 Estado é a organização política que se estabelece em um
importância dada por cada país, ao longo de sua história, às território com fronteiras definidas e reconhecidas pela comu-
relações internacionais. nidade internacional, contando com governo e nação (povo).
3 Estado é a organização política permanente de uma socieda- A nação que compõe o Estado é o agrupamento de pessoas
de, enquanto o governo é o grupo de pessoas que comanda o com características históricas, étnicas e culturais semelhan-
Estado durante determinado período. tes, ou seja, que possuem uma identidade. Quando esses
4 A unificação do poder, num governo central e soberano, não conceitos são analisados é mais fácil a compreensão do mo-
submetido a nenhuma outra autoridade; criação de corpos tivo que leva os povos a requererem um Estado. A identida-
estáveis de funcionários públicos para cuidar da burocracia de, enquanto nação, já existe, pois há uma identidade entre
estatal; criação de exércitos únicos e sob controle do poder eles. Geralmente, esses povos estão estabelecidos em uma
governamental; criação de fronteiras bem definidas; organiza- área específica e possuem fronteiras definidas. O que eles
ção da cobrança de impostos etc. reivindicam é apenas o reconhecimento de suas fronteiras
5 Para Maquiavel, as ações dos governantes devem ter como ob- pela comunidade internacional.
jetivo a preservação do próprio Estado, mesmo que possam se 2 E
voltar contra parcelas da população. Essa ideia se aproxima à de 3 C
Hobbes, para quem o Estado pode usar a força contra parte 4 E
de sua população, de forma legítima. Essa legitimidade é 5 B
apoiada, justamente, na preservação da ordem para a qual o 6 B
Estado existe. 7 D
6 A nação é um grupo de pessoas que têm identidade nacional 8
entre si. Essa identidade pode se formar com base em ele- a) Dois aspectos a serem destacados como atentados à so-
mentos como a língua, a cultura, a religião e a história comum. berania aos Estados são a interferência de países ricos
A identidade nacional começou a se desenvolver a partir da em questões econômicas internas de países subdesen-
Revolução Francesa, movimento influenciado pelas ideias volvidos e emergentes e a diminuição de fronteiras al-
iluministas, entre elas as de Rousseau, que valorizavam a fandegárias, proporcionada, principalmente, pelos blocos
soberania popular e, portanto, a determinar seu próprio go- econômicos, por causa da globalização.
verno. Nação é a forma de identificar esse sujeito abstrato, b) Ainda hoje, os Estados-nacionais possuem, em grande
que é o povo. parte, plena soberania na institucionalização de acordos
7 A fronteira é uma faixa de largura variável, na qual se pode per- internacionais, além da criação e aplicação de leis internas
ceber a integração entre as pessoas de dois territórios diferentes. referentes à ordem pública.
Nessa faixa, as trocas (comerciais, culturais, populacionais) ten- 9 B
dem a ser intensas, a fim de garantir seu controle sobre o ter- 10 A
ritório nacional. O Estado procura transformar as fronteiras em 11 C
limites mais rígidos, impondo controles mais objetivos. 12 C
8 O sistema de Vestfália parte do pressuposto de que todos os 13 E
Estados, grandes e pequenos, devem ter sua soberania reco- 14 C
nhecida e respeitada. A consequência mais imediata é a prio- 15 Soma: 02 + 16 = 18
rização da diplomacia como forma de negociar os conflitos de 16 A
interesses, evitando enfrentamentos armados. 17 E
9 A coerção se baseia no uso da força para garantir o poder, 18 A
seja no âmbito nacional ou no internacional. O consenso é 19 D

52 GABARITO

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20 A Consolidando saberes
21 B 1 B
22 D 2 B
23 C 3 A
24 A 4 B
25 A 5 C
6 C
7 A
CAPÍTULO T2 8 Soma: 02 + 08 + 16 = 26
Ordem mundial da Guerra Fria 9 Soma: 02 + 32 = 34
10 Soma: 01 + 08 + 16 = 25
Aplicando conhecimentos 11 D
1 Bipolar, porque o poder mundial era dividido entre os Estados 12
Unidos e a União Soviética, que representavam dois polos de a) O cartaz representa a sociedade capitalista como desu-
poder e influência política, econômica e ideológica. mana e sem perspectivas de prosperidade, ao apresen-
2 Essa disputa esteve baseada na defesa de modelos opostos tar crianças magras e passando fome em contraste com
de sociedade por parte dos Estados Unidos e da União So- as crianças soviéticas felizes, bem alimentadas, ao que
viética, respectivamente a democracia capitalista liberal e o parece, e bem vestidas.
socialismo científico. Essa disputa realizava-se por meio de b) Podem ser citadas a Guerra do Vietnã e a Guerra da Coreia.
propaganda estatal direta ou indireta, assim como por meio da 13 E
corrida espacial e da formação de blocos de influência. 14 D
3 Essas duas organizações eram acordos promovidos, respecti- 15 E
vamente, entre os Estados Unidos e seus principais aliados e a
União Soviética e seus principais aliados. A ideia dos acordos No Enem é assim
era garantir uma cooperação militar entre as superpotências e 1 B
seus aliados, de maneira a assegurar a formação e a manuten- 2 B
ção de áreas de influência. 3 D
4 A corrida armamentista foi um processo no qual os Estados 4 B
Unidos e a União Soviética procuraram garantir a produção 5 B
de armas com maior capacidade de destruição do que a de 6 E
seu adversário, com destaque para os armamentos nucleares. 7 A
A produção de uma capacidade de destruição tão grande por 8 B
parte das duas potências levava ao equilíbrio de poder, pois 9 C
a consciência de que o conflito direto tenderia a representar 10 D
uma destruição de ambos tornava a guerra algo indesejável e 11 D
a ser evitado. 12 E
13 A

GABARITO 53

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Domenico Failutti. Retrato de Dona Leopoldina de Habsburgo e seus filhos,
1921. Óleo sobre tela, 233 × 133 cm. Museu Paulista, São Paulo. Nesta obra, a
imperatriz Leopoldina é retratada com vestido amarelo, cor que simbolizava
os Habsburgo. Ao carregar Pedro II no colo, acompanhado das irmãs, a
representação da cena vai além da síntese de um Estado nação, demonstrando
como os laços familiares indicam também prestígio social.

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História

B
FRENTE

Corte portuguesa
no Brasil e formação
do Estado Nacional
brasileiro
Nesta unidade, vamos traçar uma retrospectiva histó-
rica do período colonial, buscando compreender como
diferentes setores sociais resistiram ao pacto colonial e
demonstraram que a História é feita por pessoas e movida
por ideais, como a liberdade, a igualdade e a tolerância.
Nesse sentido, será estudado o período do Governo Joa-
nino, que levou ao processo de independência do Brasil.
Destacam-se também, as rupturas e as permanências
ao longo desse processo histórico. Nesse sentido, lati-
fúndio, monocultura, escravidão e uma noção restrita de
direitos contribuíram para alimentar diversas lutas da so-
ciedade em busca de condições sociais e políticas mais
justas. Assim, têm-se aqui as bases da origem histórica
da nação brasileira.

Atualmente, o que podemos dizer que faz do Brasil


a nação como conhecemos?
Quais aspectos seriam capazes de gerar um
sentimento de identidade nacional na população?
A associação de um regime aristocrático com a
escravidão negra foi capaz de deixar marcas de
longa duração?

Coleção Museu Paulista da USP, São Paulo

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T1
CAPÍTULO
Independência como processo

Georgina de Albuquerque/Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro


Georgina de Albuquerque. Sessão do Conselho de Estado, 1922. Óleo sobre tela, 210 x 265 cm. Museu Histórico Nacional, Rio
de Janeiro. Esta obra permite relativizar o mito do Grito do Ipiranga a partir da centralidade da arquiduquesa Leopoldina e o
aspecto burocrático do processo independentista.

A construção histórica da Independência do Brasil gira em torno de dois eventos do ano de 1822: o Dia
do Fico, em 9 de janeiro, e o Grito do Ipiranga, em 7 de setembro. Em ambos, a personagem central é o
príncipe regente Pedro de Alcântara e a dimensão pública de sua voz política.
Entretanto, é preciso levar em consideração as delicadas articulações políticas que antecederam os
eventos às margens do paulistano riacho do Ipiranga. Os arranjos entre Dom João VI, Pedro de Alcântara
e as negociações da arquiduquesa Leopoldina e de José Bonifácio conduziram os passos decisivos rumo
à soberania nacional.
Dessa maneira, a independência ganha maiores contornos se analisada como um processo, pois, mes-
mo após a declaração de autonomia, houve conflitos e guerras em províncias onde grupos sociais ten-
tavam manter-se leais à Coroa portuguesa, tal como ocorreu na Bahia e em Piauí. Neste capítulo, será
analisado o processo de independência e suas permanências no Brasil contemporâneo.

• Quais legados do período monárquico brasileiro perduram até hoje?


• Como as biografias podem contribuir para se compreender os momentos históricos?

Neste capítulo, serão abordadas as habilidades EM13CHS401 e EM13CHS603.

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A crise do sistema colonial
Os 13 anos em que a família real portuguesa permaneceu no Brasil
acarretou uma forma de renovação do controle metropolitano sobre a
administração do território brasileiro. Ao passar a depender dos negócios
ingleses, a Corte de D. João VI teve que ceder ao avanço do liberalismo
econômico, que relativizava o tradicional pacto colonial, o que pode ser
visto, por exemplo, na abertura dos portos às nações amigas, em 1808.
Outra medida nesse sentido foi a elevação do Brasil a Reino Unido de
Portugal e Algarves, em 1815, uma decisão que, se em um primeiro mo-
mento conseguiu equilibrar as relações entre metrópole e colônia, logo
apresentou sinais de desgaste político.
Com a Revolução do Porto de 1820 e o retorno de D. João e sua Corte
para Portugal, o Brasil, sob o comando do príncipe regente Pedro de Al-
cântara, passou a enfrentar novos desafios. Ao norte do continente, havia
o fascínio da Revolução Americana ocorrida em 1776 e que deu origem
aos Estados Unidos da América, na forma de uma República federativa
presidencialista, que foi bem-sucedida na composição de um regime re-
presentativo com base na divisão dos três poderes, além de garantir a
rotatividade no poder.
A América Hispânica também apresentava suas perspectivas políticas
no começo do século XIX. A invasão napoleônica sobre a metrópole es-
panhola tornou ainda mais agudas as tensões étnicas, culturais e políticas
que se desenvolviam a partir da presença dos ideais iluministas nas áreas
coloniais. Questões como as rebeliões nativas contra a persistência do tra-
balho compulsório, os embates entre chapetones e criollos em função dos
comandos administrativos coloniais – e também do jugo napoleônico –,
os conflitos entre a obediência real e o desejo de autonomia se tornaram
cada vez mais presentes no cotidiano hispano-americano.
A restauração absolutista espanhola, com a ascensão de Fernando VII
ao trono em 1813, estimulou lideranças como San Martín e Simon Bolívar a
conduzirem as lutas pela emancipação política das colônias espanholas
na América. Partindo da atual região da Argentina, San Martín conflagrou
uma série de episódios bem-sucedidos que garantiram a independência
de Chile e Peru. Já Simon Bolívar obteve êxito partindo das regiões da
Venezuela e Colômbia. O resultado desses conflitos foi a fragmentação
territorial do antigo domínio espanhol, com o surgimento de diversos re-
gimes republicanos.
Por essas razões, D. João VI costurou um acordo diplomático com o
Império Austro-Húngaro e promoveu a vinda da arquiduquesa Leopoldi-
na para o Brasil em 1817, assim como acatou as ordens das Cortes gerais
portuguesas e retornou a Portugal, em 26 de abril 1821. Isso indicava que
novos rumos estavam se desenhando.

Bonifácio, Leopoldina e Pedro


No século XIX, o Brasil comportava diversos projetos políticos. Exis-
tiam os setores sociais adeptos do iluminismo, que defendiam os ideais
republicanos e, portanto, eram tidos como liberais; outros apostavam no
separatismo e na defesa de autonomias locais, eram os radicais; e, por
fim, havia os absolutistas, setores conservadores mais próximos da re-
aleza que viam na centralização política a única saída possível para a
construção da ideia de nação que estava em andamento.
Nesse sentido, as lideranças administrativas das províncias, inicial-
mente, receberam com entusiasmo a convocação de representantes
brasileiros pelas Cortes Gerais e Extraordinárias, em 1820. A Bahia e o
Rio de Janeiro, bem como o Pará, mostraram-se a favor do constituciona-
lismo lusitano.

CAPÍTULO T1 / Independência como processo 57

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Nas Cortes, o Brasil teria direito a um deputado para cada 30 mil
Coleção Museu Paulista da USP, São Paulo

habitantes, ou seja, cerca de 77 deputados. Já Portugal tinha 100 repre-


sentantes, e as possessões africanas contavam com 16. Os primeiros a
comparecer foram os pernambucanos Muniz Tavares e Araújo Lima; de-
pois, os baianos Cipriano Barata e Francisco Agostinho Gomes, e, então,
a representação paulistana veio com José Bonifácio de Andrada.
Bonifácio era uma personalidade política, e seu projeto de nação era
bastante consistente para a época. Entre seus propósitos, estavam a
equivalência do número de deputados brasileiros e portugueses, a aboli-
ção lenta e gradual da escravidão e a catequização indígena. Além disso,
tinha consciência das heranças históricas que o Brasil acumulava: a eco-
nomia tropical era muito maior do que a da antiga metrópole; entretanto,
apesar da riqueza econômica, estima-se que, naquele momento, de cada
três pessoas uma era escrava.
Assim, Bonifácio via o federalismo com desconfiança, pois acreditava
que o estabelecimento desse sistema poderia causar uma guerra civil
ou mesmo étnica no território brasileiro. Logo, apostava na construção
de um centro de força e união em torno da figura de um imperador. Essa
Benedito Calixto. José Bonifácio
ideia ganhou mais consistência no ano de 1821, quando, no mês de ju-
de Andrada e Silva, 1902. Óleo
sobre tela, 140 cm × 100 cm. lho, as Cortes lusitanas criaram as Juntas Provisórias, responsáveis por
Museu Paulista, São Paulo. cancelar os atos de D. João VI que atribuíam a D. Pedro o governo-geral
do Brasil. Em setembro, as Cortes foram mais incisivas: transferiram para
Lisboa as principais repartições burocráticas instaladas no Brasil, manda-
ram mais destacamentos militares para o Rio de Janeiro, transformaram
as províncias brasileiras em províncias de Portugal – o que eliminava a
centralidade política da capital carioca – e, finalmente, foi assinado um
decreto exigindo o retorno do príncipe regente.
D. Pedro mostrava-se vacilante em relação a essa resolução; ao
mesmo tempo que afirmou que acataria as ordens das Cortes, o prín-
cipe regente revelou-se sensível às vozes das ruas e aos comentários
políticos de salão. Tanto que, em carta de dezembro de 1821, D. Pedro
escreveu ao pai dizendo: “a publicação dos decretos fez um mui cho-
que grande nos brasileiros e em muitos europeus aqui estabelecidos,
a ponto de dizerem pelas ruas: ‘se a Constituição é fazerem-nos mal,
leve ao diabo tal coisa’”. Nas linhas seguintes, ele ainda se mostraria
incerto: jurava lealdade aos decretos lusitanos, mas também afirmava o
contrário se fosse “obrigado pelo povo a não dar o exato cumprimento
a tão soberanas ordens”.
No início de 1822, o príncipe regente recebeu uma carta do conselhei-
ro José Bonifácio pedindo-lhe que não retornasse a Portugal e que não
cedesse às Cortes lusitanas. Além disso, cada vez mais Leopoldina se
fazia presente nos bastidores políticos, tendo sido uma grande influência
pró-independência. Sua formação erudita e conservadora contribuiu para
o alinhamento dos interesses em torno da permanência e do protagonis-
mo do príncipe regente no processo da emancipação.
Naquele momento, o chamado “partido brasileiro” – que, em realida-
de, não chegava a ser um partido político formal, mas sim um grupo de
articuladores independentistas – aglutinava-se em torno da permanência
de D. Pedro. Esse arranjo se consolidou em uma audiência do Senado
e da Câmara em 9 de janeiro de 1822, quando D. Pedro recebeu um
documento com mais de 8 mil assinaturas a favor de sua permanência no
Brasil. Esse documento estava sob o encargo de José Bonifácio e Maria
Leopoldina e buscava evitar que as resoluções das Cortes portuguesas
efetivassem uma ação recolonizadora do Brasil.
Diante disso, D. Pedro proferiu o seguinte discurso, publicado no dia
10 de janeiro de 1822:

58 HISTÓRIA / Frente B

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Convencido de que a presença de minha pessoa no Brasil interes-
sa ao bem de toda a nação portuguesa, e conhecendo que a vontade
de algumas províncias assim o requer, demorei a minha saída, até
que as Cortes, e meu augusto pai, e senhor, deliberem a este respeito
com perfeito conhecimento das circunstâncias que têm ocorrido.
Dom Pedro I. “Edital”. Diário do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, n.8, p. 1, 10 jan. 1822.
Discurso reproduzido por ROCHA, José Martins.

Como vimos, a famosa sentença “como é para o bem de todos e fe-


licidade geral da nação, estou pronto: diga ao povo que fico” não foi
exatamente o que D. Pedro disse naquele momento. Essa célebre frase,
que é muito mais assertiva do que transparece a original, foi publicada
nos jornais um dia depois como sendo a real fala de D. Pedro. Dessa for-
ma, aquele 9 de janeiro ficou conhecido como Dia do Fico. Observe os
editoriais do periódico Diário do Rio de Janeiro dos dias subsequentes à
decisão do príncipe:

Diário do Rio de Janeiro/Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro

Diário do Rio de Janeiro/Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro

Edital do periódico Diário do Rio de Janeiro, de 10 Edital do periódico Diário do Rio de Janeiro, em 11 de
de janeiro de 1822, noticiando a decisão de D. Pedro janeiro de 1822, com retratação sobre a fala de D. Pedro
quanto a sua permanência no Brasil, trazendo as na ocasião do Dia do Fico.
palavras do príncipe regente que selaram esse evento.

O Dia do Fico foi resultado de um processo ao qual podem ser atri-


buídos dois sentidos: enquanto as Cortes lusitanas reforçavam o desejo
de restauração política, desenvolvia-se, no Brasil, a consciência de que a
independência era o único caminho possível.
Portanto, é relevante notar que, na fala original, D. Pedro diz “demorei
a minha saída, até que as Cortes, e meu augusto pai e senhor, deliberem a
este respeito”; podemos interpretar que o príncipe regente ainda não
havia decidido ficar de vez no Brasil, mas sim até segunda ordem, ou
seja, até que as Cortes portuguesas decidissem sobre a questão. Talvez
tenha nascido daí a necessidade da retratação no jornal, com uma fala
que demonstrasse um príncipe mais resoluto em suas decisões.

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Independência entre moderados e radicais
A partir de janeiro de 1822, a situação política do Brasil alcançava no-
vos aspectos, e, apesar da proposta de maior autonomia em relação à
metrópole, isso ainda não havia se concretizado de fato.
Dessa forma, D. Pedro passou a ser pressionado para a elaboração
de uma Constituição. A escrita de uma Carta Constitucional selaria, de-
finitivamente, o futuro da desejada nação. Por outro lado, a polarização
política ainda era forte: enquanto os partidários de Bonifácio mantinham
a proposta de uma Constituição aliada à figura de um imperador, outras
lideranças surgiam em torno de Martim Francisco (irmão mais novo de
José Bonifácio) e do jornalista Gonçalves Ledo, os quais, considerados
como radicais, reivindicavam a convocação de uma Assembleia Consti-
tuinte (algo nos moldes revolucionários franceses).
D. Pedro, então, decretou a convocação da Constituinte brasileira
em junho de 1822. No final, o texto foi redigido por Bonifácio, mas as
ideias gerais eram de Gonçalves Ledo. Tratava-se de promover uma in-
dependência moderada em prol da união nacional – portanto, mantendo
a escravidão e evitando um processo com movimentos sociais radicais –,
além de tentar blindar o território brasileiro contra as frotas lusitanas,
que chegavam, cada vez em maior número, com as desagradáveis no-
tícias restauradoras. Assim, essa última medida ficou conhecida como o
“Cumpra-se”, e de acordo com ela qualquer resolução ou lei que viesse
de Portugal só seria aplicada no Brasil depois da aprovação de D. Pedro.
Nesse contexto, as forças moderadas venciam a facção radical: as li-
deranças políticas que orbitavam em torno dos interesses dos grandes
proprietários, comerciantes, exportadores e traficantes de escravizados
reforçaram a necessidade do centralismo político, tese defendida por
Bonifácio e Leopoldina. E, seguindo os conselhos de ambos, D.  Pedro
partiu para a pacificação política das províncias de Minas Gerais e São
Paulo, em uma espécie de conciliação nacional. Enquanto isso, a princesa
Leopoldina era empossada como regente.
E assim ela procedeu quando, em 28 de agosto de 1822, chegou ao
Rio de Janeiro a notícia de que as Cortes exigiam o retorno imediato do
príncipe regente e acusavam de crime de lesa-majestade (traição) todos
os ministros que o cercavam.
Diante disso, o Conselho de ministros, sob a presidência de Bonifácio,
elaborou uma carta a D. Pedro falando sobre a importância da permanên-
Fique cia do príncipe no Brasil e aconselhando-o a romper politicamente com
Portugal. Tais recomendações foram aprovadas e assinadas por Dona
ligado Leopoldina e enviadas a D. Pedro no dia 2 de setembro.
Lembre-se de que o Haiti e Dias depois, em 7 de setembro, montado em uma mula e com uma
o México, logo após seus farda comum, D. Pedro seguiu as recomendações do Conselho e oficiali-
respectivos processos de zou a independência, bradando: “É tempo!... Independência ou Morte! [...]
independência, também Estamos separados de Portugal”.
tiveram regimes monárquicos O príncipe regente rapidamente retornou ao Rio de Janeiro. Na cida-
no começo do século XIX. de, que havia sido preparada para receber a comitiva daquele que seria
Entretanto, por pouco o primeiro imperador brasileiro, D. Pedro foi recebido em praça pública,
tempo. O Império do Haiti em um clima de euforia que se seguiu até o dia 12 de outubro, quando foi
durou de 1804 a 1806 e o do
aclamado imperador, com o título de Dom Pedro I.
México, de 1821 a 1823. Vale
destacar que, em momentos
Os eventos públicos, além de entretenimento, também tinham que se
posteriores, essas nações converter em rituais políticos e, nesse caso, tiveram a função de ajudar a
passaram novamente por população a compreender a ruptura entre Brasil e Portugal. Além disso,
breves regimes monárquicos; as cores verde e amarela, próprias das dinastias Bragança e Habsburgo,
atualmente, ambas adotam o passaram a tomar conta do imaginário popular e foram cada vez mais
regime republicano. associadas à ideia de nacionalidade.

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Museu Paulista da USP, São Paulo
Pedro Américo. Independência ou Morte, 1888. Óleo sobre tela, 415 cm × 760 cm. Museu Paulista, São Paulo. Elaborada 66 anos após o
evento, essa tela traz a representação de uma cena que não aconteceu da maneira como foi retratada: não houve participação popular
nesse momento; como vimos, Dom Pedro não montava um cavalo e não vestia trajes de gala. Pedro Américo criou esse quadro no
momento da crise do Segundo Império, em que era necessário reavivar a imagem da monarquia.

As guerras de independência
Apesar do grito às margens do Rio Ipiranga e de ser aclamado impe-

Museu Paulista da USP, São Paulo


rador, D. Pedro I ainda teria que lutar para consagrar o processo de in-
dependência do Brasil: as tensões políticas não atingiam somente  as
elites que estavam no comando da burocracia central, mas também
as lideranças provinciais, que encampavam seus próprios projetos po-
líticos dentro do quadro geral do processo de independência do país.
Como exemplo, pode-se dizer que Santa Catarina, São Paulo e Mi-
nas Gerais estavam mais alinhados ao continuísmo da sede carioca. Na
Bahia, havia lideranças inspiradas nas tradições liberais de seu regiona-
lismo político. Entretanto, um sentimento comum marcava outras provín-
cias do Norte: a defesa de uma capital política mais alinhada à história
regional, como Salvador.
Os conflitos que ocorreram em Salvador estão entre os mais impor-
tantes das guerras pela independência. Algumas personagens, nesse
período, ganharam reputação, seja pela audácia seja pela bravura, tal
como a abadessa Joana Angélica e Maria Quitéria.
Joana Angélica era filha de família abastada, entrou para o Convento
Nossa Senhora de Conceição da Lapa e se converteu à ordem francis-
Domenico Failutti. Retrato de Soror
cana. Sob a sua direção, o convento chegou a abrigar tropas indepen- Joanna Angélica, 1925. Óleo sobre
dentistas. Na tentativa de defender as tropas, ela colocou-se à frente dos tela – marouflage, 157 × 125 cm. Museu
soldados portugueses que tentavam invadir o local e, então, teve o pei- Paulista, São Paulo.
to perfurado por baionetas. Por isso, é considerada a primeira mártir do
processo independentista. Sua morte aconteceu em fevereiro de 1822,
quando as lutas entre portugueses e brasileiros pró-emancipação já se
acirravam. Considerada uma heroína do país, Joana Angélica é tema de
livros, filmes e enredos de escolas de samba.

CAPÍTULO T1 / Independência como processo 61

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Maria Quitéria, por sua vez, foi uma criança órfã de

Museu Paulista da USP, São Paulo


mãe, tendo sido criada pelo pai. Em junho de 1822, quis
se alistar no Exército para lutar na guerra contra os por-
tugueses, mas seu pai não permitiu. Ela então fugiu de
casa, cortou os cabelos curtos, vestiu roupas masculinas
e se apresentou no comando do Exército como solda-
do Medeiros; ela entrou para a artilharia e depois para
a infantaria. Mais tarde, seu pai descobriu seu paradeiro
e revelou seu segredo, tentando fazer com que ela vol-
tasse, mas Maria Quitéria se recusou; e como já havia
se destacado entre os soldados, o Exército também não
permitiu sua saída. Foi, então, transferida para o Batalhão
de Caçadores Voluntários do Príncipe D. Pedro, conhe-
cido como Batalhão dos Periquitos, onde comandou um
grupo só de mulheres soldados. Tamanha sua bravura e
empenho, chegou a ser condecorada com a Grã-Ordem
do Cruzeiro do Sul pelas mãos do próprio imperador
D. Pedro I. Apesar de revolucionar os códigos morais e
sociais da sua época e se destacar como uma exímia mi-
litar na história brasileira, Quitéria morreu cega e pobre
aos 61 anos de idade.
Outra linha de força que deve ser considerada em re-
lação aos conflitos pela independência é a forte lealda-
de às Cortes que ainda havia entre os militares lusitanos
sediados no Brasil. Por esse motivo, é relevante analisar-
mos, mesmo que rapidamente, dois importantes confli-
tos decorrentes da independência do Brasil: a Batalha
do Pirajá e a Batalha do Jenipapo. Ambas expressaram
as disputas entre as antigas colônias e a metrópole em
torno do pacto colonial, assim como foram marcadas por
guerras civis.
Domenico Failutti. Retrato de Maria
Quitéria de Jesus Medeiros, 1920. Óleo Batalha do Pirajá
sobre tela, 233 × 133 cm. Museu Paulista
da USP, São Paulo. Maria Quitéria de
Pirajá foi um dos primeiros redutos de colonização no Recôncavo
Jesus Medeiros apresentou-se como baiano. Na manhã do dia 8 de novembro de 1822, mais de 200 soldados
homem para atuar nas lutas pela lusitanos desembarcaram em Salvador, pois a antiga capital demonstrava
independência na Bahia, no século XIX, sinais de resistência à independência declarada por D. Pedro.
em um período no qual a função de
soldado não era permitida às mulheres. O conflito inicial se deu porque as forças independentistas, orga-
Na imagem, ela usa saiote por cima da nizadas a partir do interior, lutavam para evitar o abastecimento da
farda masculina, após sua identidade ter cidade de Salvador, militarizada pelos portugueses. Há relatos de que
sido revelada. a batalha inicial chegou a durar quase oito horas e envolveu mais de
4 mil pessoas. As tropas brasileiras, comandadas pelo General Labatut,
saíram vitoriosas.
A Batalha do Pirajá segue na história como sendo um dos mitos fun-
dadores da Bahia, pois promoveu a construção de uma consciência po-
lítica local, além de sobreviver como inspiração para o desejo de autono-
mia nacional.
As batalhas da independência na Bahia estenderam-se até julho de
1823, e a participação do almirante inglês Lord Cochrane foi decisiva para
pôr fim ao conflito e garantir a vitória das tropas leais a D. Pedro I.
Em 1823, a tropas portuguesas estavam sob forte ataque dos brasilei-
ros em Salvador – último reduto lusitano –, sofrendo com privações de
todo tipo. Diante disso, em 2 de julho do mesmo ano, o coronel português
Madeira de Melo determinou a retirada do seu exército da cidade. Na
Bahia, esse dia é considerado a Independência desse estado e o verdadeiro
marco da emancipação brasileira em relação a Portugal. Atualmente, essa
data é feriado estadual, comemorado com muita festa.

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Palácio Rio Branco, Salvador
Antônio Parreiras. O Primeiro Passo para a Independência da Bahia, 1931. Óleo sobre
tela. Palácio Rio Branco, Salvador.

Batalha do Jenipapo
Essa batalha foi o mais sangrento conflito ocorrido durante o proces-
so de consolidação da independência do Brasil. Para compreendê-lo,
é preciso levar em consideração um acordo selado entre D. João VI e
D. Pedro I, para manter as províncias do Norte unidas a Portugal.
Como já vimos, as províncias do Maranhão, Pará, Ceará e Piauí tinham
destaque na produção de charque, derivados de couro e algodão, ma-
térias-primas fundamentais para a nascente indústria manufatureira eu-
ropeia. Para fazer frente aos movimentos independen-
tistas que se alastravam na região, o major João José Batalha do Jenipapo (1823)
Fidié, no comando de milhares de homens, entrou em
OCEANO ATLÂNTICO
conflito com os rebeldes. Esses combates passaram por Parnaíba
diversas fases.
Em meados de outubro de 1822, a cidade litorânea

ngá
R io Lo
a
el e i r
de Parnaíba, no Piauí, importante porto de escoamento Rio Gam
Ri
de matérias-primas, aderiu à independência do Brasil. N
o
P ir a
R i o Parnaíba
c ur uca

Major Fidié e seus milhares de soldados bem armados


marcharam, então, de Oeiras, capital da província – ou 0 85 km Caxias CEARÁ
seja, do interior, no sentido do litoral, em direção à Par- Campo Rio Po
ti

Teresina Ri Maior
naíba – e se encontraram com tropas lusitanas que esta-
o
Po
ti

vam no Maranhão; assim, com contingente numeroso e Rio Sã


o N icolau
bem equipado, conseguiu a pacificação de Parnaíba. To-
davia, em fevereiro de 1823, correu a notícia de que uma Rio
Sa
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bi
MARANHÃO to
nova rebelião independentista estourara em Oeiras, o
Rio

que levou o major Fidié a deslocar suas tropas rumo ao


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Oeiras

sertão novamente a fim de derrotar os revoltosos.


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Ciente, contudo, de que havia um acampamento de a


Rio
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revoltosos populares em Campo Maior, que se localiza- 8° S


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va no caminho entre Parnaíba e Oeiras, Fidié resolveu


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parar sua jornada de volta à capital para sufocar esse ei
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levante popular. Porém, os amotinados eram homens e R


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mulheres, piauienses, cearenses e maranhenses que


estavam munidos de facas, facões, foices e peixeiras. Cachoeira
Pedra de
Ri o

ia
Amolar urgue
Cu
As tropas de Fidié, por sua vez, além de numerosas rim
oG
Ri

atá

e bem preparadas, estavam munidas de arcabuzes e la- Deslocamentos das tropas


gartixas (uma espécie de canhão de ombro para tiros de do Major Fidié
44° O
longa distância). O conflito se deu às margens do Rio Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. “Piauí”. IBGE,
Jenipapo, no dia 13 de março de 1823, e foi uma batalha [s.d.]. Disponível em: ftp://geoftp.ibge.gov.br/produtos_educacionais/
das mais sangrentas. Estima-se que morreram mais de atlas_educacionais/atlas_geografico_escolar/mapas_do_brasil/mapas_
estaduais/fisico/piaui.pdf. Acesso em: 3 ago. 2021.
200 pessoas e outras 500 foram presas.

CAPÍTULO T1 / Independência como processo 63

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Fidié venceu a batalha, mas perdeu a guerra. Com os soldados esgo-
tados e sem munição, o major decidiu não terminar sua viagem a Oeiras e
seguiu para Caxias, no Maranhão, a fim de restabelecer suas tropas. Lá ele
ficou três meses, até ser deportado para Portugal por ordem de D. Pedro I.
O fim da guerra marcou a consagração da independência do Brasil, e
a data da Batalha do Jenipapo foi introduzida na bandeira do atual estado
do Piauí em 2005.
A vitória das tropas leais ao imperador selou definitivamente o proces-
so de independência do país, mas seus desafios se renovavam: agora
era necessário construir um Estado nacional brasileiro e lidar com os limi-
tes legais de uma Constituição.

Mais

Foices e Facões: a batalha do Jenipapo.

Reprodução
Bernardo Aurélio e Caio Oliveira.
Teresina: Quinta Capa, 2018.
Esse episódio histórico foi produzido em HQ
pelos irmãos Caio Oliveira e Bernardo Aurélio.
Intitulada Foices e facões, já serviu de roteiros para
espetáculos teatrais e musicais.

Leitura de documentos

A inglesa Maria Graham foi desenhista, pintora, escritora e historiadora. De passagem pelo Brasil por três anos
no século XIX, registrou suas impressões em diário publicado com o título Diário de uma viagem ao Brasil e de
uma estada nesse país durante parte dos anos de 1821, 1822 e 1823 (Journal of a Voyage to Brazil and Residence
there During Years 1821, 1822, 1823).
Apêndice II nos; uma até ficou conservada entre as folhas do livro.
Acerca de um exemplar desta obra que pertence- Conscienciosamente desempenhou a sua missão, pro-
ra à própria Maria Graham escreveu Oliveira Lima o curando convencer Manuel de Carvalho a ceder, já que
artigo que se segue, e que transcrevemos da Revista eram tão superiores as forças legais e que só podiam
do Instituto Arqueológico e Geográfico pernambucano resultar do conflito “derrota e miséria e um desperdí-
(vol. xii, 1906, p. 306) cio da vida humana que eu estava segura de que ele e
Mrs. Graham e a Confederação do Equador qualquer homem de bem devia desejar evitar”.
[...] [...]
Mrs. Graham conhecera muito no Chile Lord Co- Nas folhas em branco que encheu no Recife, faz
chrane, a quem estava confiada a missão de reduzir Mrs. Graham faz menção do “espírito republicano que
por mar a revolução, e que logo a foi visitar e almoçar sempre distinguiu Pernambuco e que estava diaria-
com ela a bordo, incumbindo-a de entender-se em ter- mente adquirindo forças; do sentimento federalista”,
ra onde ia hospedar-se em casa de seu compatriota queixando-se a província de ter-se esforçado e sofrido
Stewarts com o chefe rebelde e aconselhar-se a sujei- muito pela causa da Independência, haver sido a pri-
ção. A viajante estivera anteriormente em Pernambu- meira a tornar a Bahia capaz de resistir e expulsar os
co, sendo hospede de Luís do Rêgo e assistindo às pri- “pés de chumbo” e, entretanto, de serem todos os seus
meiras lutas constitucionais e à organização e vitória rendimentos sugados pela capital, “ficando despreza-
da Junta de Goiana. Conhecia por isso Manuel de Car- dos seus próprios trabalhos públicos, mantidos inati-
valho Pais de Andrade, presidente da Confederação, o vos na Corte ou bruscamente demitidos seus funcio-
qual, segundo ela nota no exemplar de que trato, fala- nários e não cumpridas as promessas de reformas em
va bem inglês e parecia ser um homem notável. todos os departamentos”.
Carregou Mrs. Graham consigo algumas cópias Lembra Mrs. Graham que Manuel de Carvalho se
impressas da Proclamação dirigida por Lord Cochrane, fizera revoltoso por motivo da dissolução da Consti-
de bordo da nau Pedro I, aos insurgentes pernambuca- tuinte, ocorrida “quando ele aconselhava o Imperador,

64 HISTÓRIA / Frente B

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em proclamações e outros documentos públicos, a ças, referindo-se às suas forças – tropa, na expressão
excluir do seu conselho e valimento todos os portu- da autora, composta em parte de meninos de dez anos
gueses europeus e modelar uma Constituição liberal e de negros de cabeça branca – afirmando que jamais
com a assistência da sua Assembleia Constituinte. A cederia diante do poder central a não ser que a mes-
dissolução, porém, daquela Assembleia, de um modo ma Assembleia Constituinte fosse convocada de novo,
arbitrário, exacerbou os sentimentos do partido a um não, porém, no Rio de Janeiro, em qualquer outro lugar
grau tal que o pôs fora dos eixos e acabou com toda fora do alcance dos regimentos imperiais. Ele pessoal-
a deferência para com o Imperador. Este e o seu po- mente achava-se resolvido a tornar o Brasil livre ou a
der entraram a ser desafiados e as províncias vizinhas morrer no campo da glória (sic).
chamadas a ajudar os pernambucanos, a defenderem “Tomei a liberdade”, escreve Mrs. Graham nas refe-
os seus direitos de homem e de cidadãos”. ridas notas manuscritas, “de contradizê-lo e mostrar-
Dom Pedro I, observava Mrs. Graham, era geral- -lhe quão imprudente havia sido a Assembleia, e como
mente tido por português e a situação imperial não cabia ao soberano o direito de dissolvê-la pela circuns-
aparecia muito lisonjeira, sendo sérias as esperanças tância dela se declarar permanente. Nossa conversa-
de adesão das províncias do Norte à causa republicana ção versou longamente sobre política abstrata.”
federativa. Já Filgueiras marchava do Ceará, segundo Não se esqueceu a medianeira de mencionar o pe-
no Recife avisaram à viajante, a Paraíba estava sob o rigo que pessoalmente corria o presidente rebelde e
influxo da força democrática de Goiana e o Piauí se as gravíssimas responsabilidades que ele assumira, ao
manifestava bem disposto em prol da Revolução. que Manuel de Carvalho se mostrou, segundo ela re-
Foi em 20 de agosto de 1824 que Mrs. Graham teve lata, sensível, declarando que se visse perdida a causa
a sua segunda entrevista com Manuel de Carvalho “es- que encarnava, se poria nas mãos de Lord Cochrane e
perando”, escreve ela, “que as minhas representações aí se julgaria seguro (He would put himself in his power
pudessem ainda poupar o derramamento de sangue”. and fell safe) acrescenta Mrs. Graham ter deixado Ma-
O presidente da Confederação do Equador recebeu- nuel de Carvalho com um sentimento penoso.
-a muito amavelmente, apresentou-lhes as filhas, fez GRAHAM, Maria. Diário de uma viagem ao Brasil e de uma estada nesse
servir frutas e vinho e comunicou-lhe suas esperan- país durante parte dos anos de 1821, 1822 e 1823. LACOMBE, Américo
Jacobina (trad.). São Paulo: Editora Nacional, 1856. p. 375-377.

a) Quais são as considerações iniciais de Graham a respeito da situação política de Pernambuco?

b) Segundo o texto, como Graham analisa as relações políticas entre os revolucionários e a Coroa?

c) Esclareça como Graham contribuiu como mediadora das tensões entre Pernambuco e o governo central.

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Aplicando conhecimentos

1 Identifique a influência dos ideais iluministas nos processos de desintegração da América hispânica e da América
portuguesa.

2 UFJF-MG Observe os mapas da América antes e depois dos processos de independência no século XIX.
Fonte: Disponível em:
<http://navegandonoestudo.blogspot.com.br/2010/07/
as-coloniasespanholas-na-america.html>. Acesso em: 3 ago. 2021.

Fonte: Disponível em: <http://historiamurilobenevides.blogspot.com.br/2012/02/


as-causasque-levaram-independencia.html>. Acesso em: 3 ago. 2021.
ESTADOS CUBA REPÚBLICA
Louisiana Estados Unidos UNIDOS (1898) DOMINICANA
(francesa (independente (1844)
VICE-REINO até 1808) em 1776)
DE NOVA
ESPANHA MÉXICO
cer (1821)
de Cân OCEANO
Trópico HAITI
BELIZE (1804) ATLÂNTICO
Capitania Geral (ING)
de Cuba
OCEANO
Capitania Geral GUATEMALA VENEZUELA
ATLÂNTICO (1819)
da Guatemala Capitania Geral (1838)
da Venezuela COLÔMBIA GUIANAS
VICE-REINO DE EL SALVADOR (1819) Equador
Guianas
NOVA GRANADA 0º (1838)
Equador EQUADOR
Capitania Geral 0º
HONDURAS (1822)
de Quito
(1838)

VICE-REINO NICARÁGUA PERU BRASIL


Brasil
DO PERU (português (1838) (1824) (1822)
até 1822)
OCEANO COSTA RICA BOLÍVIA
PACÍFICO (1838) OCEANO (1825)
PANAMÁ PACÍFICO
VICE-REINO (1903)
io
córn
apri DO PRATA
órn
io PARAGUAI
de C pric ARGENTINA
pico e Ca
(1811)
Tró d (1816)
pico
Tr ó CHILE
Capitania Geral (1818) URUGUAI
do Chile (1828)

N N

0 1060 km 0 1110 km
50º O 60º O

Mapa da América antes do processo de independência. Mapa da América depois do processo de independência.

a) Analise os mapas e aponte a principal diferença na composição dos territórios nacionais das antigas colônias
espanhola e portuguesa na América.

b) Aponte e analise uma semelhança histórica nos processos de independência da América Espanhola e da Amé-
rica Portuguesa.

66 HISTÓRIA / Frente B

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3 UFU-MG 2015 (Adapt.) Você sabe o quanto eu, since- 5 UEG-GO Que relação existe entre o Bloqueio Con-
ramente, detesto o tráfico de escravos, o quanto acre- tinental, lançado por Napoleão Bonaparte contra a
dito ser ele prejudicial ao país, o quanto desejo sua Inglaterra, e a Independência do Brasil?
total cessão, embora isso não possa ser feito imedia-
tamente. As pessoas não estão preparadas para isso,
e até que seja feito, colocaria em risco a existência do
governo, se tentarmos fazê-lo repentinamente.
Correspondência de José Bonifácio ao enviado britânico Henry
Chamberlain, 1823. Citada em: MAXWELL, Kenneth. Por que o Brasil foi
diferente? O contexto da independência. In: MOTA, Carlos Guilherme
(org.). Viagem incompleta. A experiência brasileira (1500-2000).
Formação: histórias. São Paulo: Editora Senac, 2000, p. 192 (adaptado)

A emancipação política do Brasil não significou uma


ruptura total com a ordem socioeconômica anterior, o
que pode ser demonstrado pela permanência da es-
cravidão. A respeito da questão escravista no I Reinado:
Apresente duas razões pelas quais, de acordo com
José Bonifácio, o fim do tráfico de escravos ameaça-
ria a própria existência do governo.

6 Enem No clima das ideias que se seguiram a revolta


de São Domingos, o descobrimento de planos para
um levante armado dos artífices mulatos na Bahia,
em 1798, teve impacto muito especial; esses planos
demonstravam aquilo que os brancos conscientes ti-
nham já começado a compreender: as ideias de igual-
dade social estavam a propagar-se numa sociedade
4 FGV-RJ 2015 A emancipação política brasilei- em que só um terço da população era de brancos e
ra não se explica apenas pelo chamado grito do Ipi- iriam inevitavelmente ser interpretados em termos
ranga de 7 de setembro de 1822. Há diversos outros raciais.
episódios reveladores do arranjo de forças que per- MAXWELL. K. Condicionalismos da Independência do Brasil.
In: SILVA, M.N. (coord.) O Império luso-brasileiro, 1750-1822.
mitiu uma independência tão peculiar, proclamada Lisboa: Estampa, 1986.
pelo herdeiro do trono português.
Nesse sentido, responda: O temor do radicalismo da luta negra no Haiti e das
a) Como a chegada da família real e da corte por- propostas das lideranças populares da Conjuração
tuguesa ao Brasil influenciou no processo de Baiana (1798) levaram setores da elite colonial bra-
emancipação política? sileira a novas posturas diante das reivindicações
populares. No período da Independência, parte da
elite participou ativamente do processo, no intuito de
a) instalar um partido nacional, sob sua liderança,
garantindo participação controlada dos afro-
-brasileiros e inibindo novas rebeliões de negros.
b) atender aos clamores apresentados no movimen-
to baiano, de modo a inviabilizar novas rebeliões,
garantindo o controle da situação.
b) Quais os significados dos confrontos armados c) firmar alianças com as lideranças escravas, per-
que culminaram no 2 de julho de 1823, na Bahia? mitindo a promoção de mudanças exigidas pelo
povo sem a profundidade proposta inicialmente.
d) impedir que o povo conferisse ao movimento um
teor libertário, o que terminaria por prejudicar
seus interesses e seu projeto de nação.
e) rebelar-se contra as representações metropolita-
nas, isolando politicamente o Príncipe Regente,
instalando um governo conservador para contro-
lar o povo.

CAPÍTULO T1 / Independência como processo 67

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CONSOLIDANDO SABERES

1 UFRGS (Adapt.) Embora a independência política c) os acordos comerciais com a Inglaterra garantiam
do Brasil tenha sido declarada somente em 1822, o comércio português de escravos para a agricul-
o início do processo de emancipação pode ser re- tura brasileira.
lacionado com uma conjuntura anterior, na qual um d) a vinda da família real limitou o comércio de ex-
acontecimento, do início do século XIX, de grande portação para portugueses e ingleses, assegu-
impacto desencadeou as mudanças que levaram à rando o monopólio da metrópole.
separação entre o Brasil e Portugal. Esse fato, que e) as antigas colônias espanholas, recém emancipa-
assinalou o final efetivo da situação colonial, foi das, auxiliaram os brasileiros nas guerras contra a
a) a Inconfidência Mineira, ocorrida em 1789, que metrópole portuguesa.
introduziu no Brasil as ideias iluministas e republi-
canas, minando a monarquia portuguesa. 4 Fuvest-SP 2018 Na edição de julho de 1818 do Cor-
b) a Inconfidência Baiana, ocorrida em 1798, que in- reio Braziliense, o jornalista Hipólito José da Costa,
troduziu no Brasil as ideias jacobinas e revolucio- residente em Londres, publicou a seguinte avaliação
nárias, levando ao fim do domínio lusitano. sobre os dilemas então enfrentados pelo Império
c) a transferência da Corte para o Brasil em 1808, português na América:
que significou a presença do aparato estatal me-
tropolitano na Colônia, a qual passou a ser a sede A presença de S.M. [Sua Majestade Imperial] no
da Monarquia portuguesa. Brasil lhe dará ocasião para ter mais ou menos in-
d) a Revolução Pernambucana de 1817, que trouxe fluência naqueles acontecimentos; a independên-
para o cenário político brasileiro o ideário maçô- cia em que el-rei ali se acha das intrigas europeias o
nico e republicano. deixa em liberdade para decidir-se nas ocorrências,
e) a convocação das Cortes de Lisboa em 1820, que segundo melhor convier a seus interesses. Se volta
exigiram o retorno de Dom João para Portugal e a para Lisboa, antes daquela crise se decidir, não pode-
recolonização do Brasil. rá tomar parte nos arranjamentos que a nova ordem
de coisas deve ocasionar na América.
2 PUC-Minas “Pedro, se o Brasil se separar, antes seja
para ti, que me hás de respeitar, do que para algum Nesse excerto, o autor referia-se
desses aventureiros.” A recomendação feita por a) aos desdobramentos da Revolução Pernambuca-
D. João VI ao filho D. Pedro, que permaneceria como na do ano anterior, que ameaçara o domínio por-
Regente do Brasil, logo após a partida de seu pai para tuguês sobre o centro-sul do Brasil.
Portugal em 1821, está diretamente relacionada com: b) às demandas da Revolução Constitucionalista
a) a vitória do movimento liberal da cidade do Porto, do Porto, exigindo a volta imediata do monarca
em 1820, que estabeleceu a monarquia constitu- a Portugal.
cional em Portugal, limitando os poderes absolu- c) à posição de independência de D. João VI em
tistas do Rei. relação às pressões da Santa Aliança para que
b) a divergência entre os representantes políticos interviesse nas guerras do rio da Prata.
brasileiros na Maçonaria e D. Pedro, que queria d) às implicações que os movimentos de indepen-
preservar os direitos da dinastia de Bragança. dência na América espanhola traziam para a do-
c) a revolta das tropas aquarteladas no Rio de Ja- minação portuguesa no Brasil.
neiro, contrárias à decisão do Príncipe regente, e) ao projeto de D. João VI para que seu filho D. Pedro
que pretendia permanecer no país. se tornasse imperador do Brasil independente.
d) a adesão imediata do "Partido Brasileiro" à polí-
tica defendida pelas "Cortes de Lisboa", favorá- 5 UnB-DF (Adapt.) A historiografia que trata da eman-
veis à manutenção do Reino Unido a Portugal e cipação política do Brasil põe quase sempre em evidên-
Algarves. cia a singularidade do nosso movimento com relação à
América Espanhola. Enquanto nesta última o processo
3 Unesp Sobre o processo de independência da de ruptura com a metrópole resultou na constituição
colônia portuguesa na América, no início do século de várias repúblicas, no Brasil, a independência monár-
XIX, é correto afirmar que: quica garantiu a integridade do território. Entretanto, o
a) foi liderado pela elite do comércio local, por inter- processo iniciado em 1808 e que alcançou o seu ponto
médio de acordos que favoreceram colonizados máximo em 1822 possui múltiplos aspectos.
e a antiga metrópole. Convém lembrar, Portugal não tinha condições
b) a ruptura com a metrópole europeia provocou re- de fazer frente às tropas francesas. Exercendo um
ações e, dentre elas, guerras em algumas provín- papel secundário na Europa, sua margem de ma-
cias, entre portugueses e brasileiros. nobra era extremamente limitada. O tratado de

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Fontainebleau assinado pela França e pela Espanha 7 FPP-PR 2018 Na interpretação mais conhecida so-
já havia decidido a partilha de Portugal e do seu im- bre a História do Brasil, a data de 7 de setembro de
pério. A transferência da Corte para o Brasil apresen- 1822 representou um marco, pois, nesse dia, D. Pe-
tou-se como a única solução. dro proclamou oficialmente a separação da Colônia
Maria Eurydice de Barros Ribeiro. "Os Símbolos do Poder". da metrópole portuguesa.
Sobre o processo de Independência do Brasil, assi-
Com referência à singularidade do movimento de nale a alternativa CORRETA.
emancipação política do Brasil, é possível afirmar que: a) As relações entre a Coroa portuguesa e o Brasil
a) Ao contrário da América Espanhola, o Brasil teve melhoraram quando Dom João VI, de Portugal,
um processo de independência liderado por for- apoiado pela Corte portuguesa, assinou um decre-
ças políticas renovadoras e ansiosas por uma to concedendo o título de Regente do Brasil a seu
profunda transformação das estruturas coloniais. filho Dom Pedro. Entretanto, aproveitando-se da au-
b) A sociedade política colonial que Portugal criou toridade que lhe foi concedida, no dia 7 de setem-
no Brasil permitiu uma independência tranquila, bro de 1822, Dom Pedro rompeu politicamente com
sem movimentos de contestação à transição da Portugal e proclamou a Independência do Brasil.
colônia à condição de país independente. b) A Independência brasileira foi um processo li-
c) A unidade territorial mantida no Brasil foi nego- derado, em grande parte, pelos setores sociais
ciada com a Corte Portuguesa tendo em vista que mais se beneficiavam com a ruptura dos la-
compensações financeiras. ços coloniais: os grandes proprietários de terra e
d) A crise do sistema colonial no Brasil tem causas os grandes comerciantes, pois a separação tinha
econômicas e políticas profundas e bastante di- como objetivo preservar a liberdade de comércio
versas daquelas que conduziram a América Es- e a autonomia administrativa. A maioria da popu-
panhola à independência. lação permaneceu na situação anterior à procla-
e) O viés autoritário e centralizador do processo de mação da Independência.
independência brasileiro permitiu a configuração c) Após o processo de Independência, a economia
de uma Monarquia Constitucional imperialista. brasileira tornou-se competitiva no mercado inter-
nacional, pois devido ao apoio econômico inglês o
6 UEMG 2017 Brasil começou a desenvolver a atividade industrial,
Ouvi, ó Povos, o grito, o que era proibido pelo governo metropolitano.
Que vamos livres erguer; d) A mudança mais significativa após a Indepen-
O Brasil sacode o jugo, dência do Brasil ocorreu no âmbito econômico-
Independência ou Morrer. -social, pois com o desenvolvimento econômico
surgiram novas classes sociais urbanas ligadas
Congresso opressor jurara ao processo industrial.
Nossos povos abater: e) A Inglaterra, interessada em manter os benefícios
Em seu despeito amamos comerciais garantidos pelos tratados de comér-
Independência ou Morrer. cio e navegação

Depois de trezentos anos 8 PUC-RS 2014 Considere as afirmações abaixo sobre


Livre o Brasil vai viver: a crise do Antigo Sistema Colonial e a Independên-
Deve a Pedro a Liberdade, cia do Brasil (1822).
Independência ou morrer. I. O movimento intelectual chamado de Iluminismo
("Independência ou morrer". Poesia anônima, publicada pela Tipografia do teve grande influência na crise do Antigo Sistema
Diário no ano de 1822, Rio de Janeiro. Apud: CARVALHO, José Murilo de, Colonial, pois, além de criticar as bases do An-
BASTOS, Lúcia & BASILE, Marcelo (Orgs.). Guerra literária: panfletos da
Independência (1820-1823). Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014, 257-258. 4 v.) tigo Regime, como o absolutismo monárquico e
os privilégios da nobreza, condenava também o
No cenário político em que a poesia acima foi ela- sistema colonial e o monopólio comercial.
borada, as relações entre Brasil e Portugal agrava- II. Os conflitos na Europa decorrentes da expansão do
ram-se devido à/ao império napoleônico estiveram na base desse pro-
a) tentativa das Cortes portuguesas de recolonizar cesso, na medida em que Napoleão, tentando blo-
o Brasil. quear o acesso da Inglaterra ao mercado colonial
b) objetivo das elites brasileiras de expulsar o Prín- ibérico, invadiu Espanha e Portugal, precipitando,
cipe Regente. assim, o processo de independência da América.
c) expectativa dos liberais portugueses em fortale- III. A vinda da corte portuguesa para o Brasil é con-
cer o absolutismo. siderada como um fator que retardou o processo
d) esforço dos deputados escravistas para criar a de independência brasileiro, pois a presença do
Constituição cidadã. monarca lusitano na América estreitou ainda mais

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os laços entre Brasil e Portugal, tornando o pri- e) Os republicanos, os monarquistas constituciona-
meiro ainda mais dependente do segundo. listas e os absolutistas lutaram lado a lado pela
IV. A Independência do Brasil foi marcada por um Independência, não deixando que as suas dife-
forte conflito entre o novo país e a sua antiga renças dificultassem o processo revolucionário.
metrópole europeia, devido à rejeição das elites
político-econômicas da antiga colônia portugue- 11 UFJF-MG Segundo José Murilo de Carvalho, “a prin-
sa ao modelo agroexportador implantado pela cipal característica da independência brasileira foi a
coroa lusitana, baseado na grande propriedade negociação entre a elite nacional, a coroa portuguesa
da terra e na mão de obra escrava. e a Inglaterra.” (CARVALHO, J.M. Cidadania no Brasil.)
Estão corretas apenas as afirmativas
a) I e II. d) I, II e III. Desta forma, em comparação com os demais países
b) I e III. e) II, III e IV. da América Latina, é INCORRETO dizer que:
c) II e IV. a) no Brasil, o processo de independência foi relati-
vamente pacífico, com conflitos militares isolados,
9 Cefet-MG 2018 A classe dominante brasileira era, como no Maranhão e na Bahia.
em sua maioria, conservadora (...). Desejava manter b) na América hispânica, houve a formação de gran-
as estruturas econômicas e sociais coloniais basea- des exércitos e a ascensão de figuras emblemáti-
das no sistema agrícola, na escravidão e na exporta- cas de "libertadores" como Simon Bolívar e Sucre.
ção de produtos agrícolas tropicais para o mercado c) um ponto comum no processo de independência
europeu. Contudo, havia nas cidades (...) alguns libe- da América Espanhola e do Brasil envolve a ques-
rais que esperavam mudanças mais profundas na tão do trabalho, ou seja, em ambos, o processo le-
política e na sociedade: soberania popular, democra- vou à abolição da escravidão indígena e africana.
cia e mesmo uma república. d) enquanto no Brasil foi instituída uma monarquia
(BETHELL, Leslie. A independência do Brasil. constitucional e mantida a unidade territorial, na
In: História da América Latina. São Paulo: EDUSP, 2009. V. 3, p. 213.) América Hispânica o movimento de independên-
cia, em geral, resultou na criação de diversas re-
A aceitação de D. Pedro pela elite senhorial, como públicas.
líder do processo de independência do Brasil, eclo- e) a Inglaterra, direta ou indiretamente, apoiou o
dido em 1822, visava a movimento de Independência do Brasil e do res-
a) manter nosso país sob a tutela da metrópole lu- tante da América Latina e também a formação do
sitana. exército de libertação de Bolívar.
b) evitar transformações mais bruscas na ordem
social e política. 12 Unifesp Realizada a emancipação política em 1822,
c) defender a República como sistema de governo o Estado no Brasil:
para o novo país. a) surgiu pronto e acabado, em razão da continuida-
d) impossibilitar a escolha do regime monárquico de dinástica, ao contrário do que ocorreu com os
após a emancipação. demais países da América do Sul.
b) sofreu uma prolongada e difícil etapa de consoli-
10 UFPE A Independência do Brasil despertou interes- dação, tal como ocorreu com os demais países
ses conflitantes tanto na área econômica quanto na da América do Sul.
área política. Qual das alternativas apresenta esses c) vivenciou, tal como ocorreu com o México, um
conflitos? longo período monárquico e uma curta ocupação
a) Os interesses econômicos dos comerciantes por- estrangeira.
tugueses se chocaram com o “liberalismo econô- d) desconheceu, ao contrário do que ocorreu com
mico” praticado pelos brasileiros e subordinado à os Estados Unidos, guerras externas e conflitos
hegemonia da Inglaterra. internos.
b) A possibilidade de uma sociedade baseada na e) adquiriu um espírito interior republicano muito se-
igualdade e na liberdade levou a jovem nação a melhante ao argentino, apesar da forma exterior
abolir a escravidão. monárquica.
c) As colônias espanholas tornaram-se indepen-
dentes dentro do mesmo modelo brasileiro: mo- 13 Uece ... diz Oliveira Lima que um oficial português
narquia absolutista. jurou a um oficial brasileiro que o Brasil continua-
d) A Guerra da Independência dividiu as províncias ria escravo de Portugal e que o príncipe embarcaria,
brasileiras entre o “partido português” e o “par- mesmo que para isto, tivesse sua espada de servir-
tido brasileiro”, levando as Províncias do Grão- -lhe de prancha.
-Pará, Maranhão, Bahia e Cisplatina a apoiarem, Fonte: LUSTOSA, Isabel. Perfis Brasileiros: D. Pedro I. São Paulo:
por unanimidade, a Independência. Companhia das Letras, 2006. p 132/133.

70 HISTÓRIA / Frente B

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O episódio acima narrado, refere-se ao famoso “Dia teóricas e metafísicas e, por isso, inexequíveis: assim
do Fico”. Em relação aos desdobramentos dele de- o prova a França, a Espanha e, ultimamente, Portugal.
correntes, considere as seguintes afirmativas: Elas não têm feito, como deviam, a felicidade geral,
I. A oficialidade portuguesa não se conformou com mas sim, depois de uma licenciosa liberdade, vemos
a decisão de D. Pedro I de permanecer no Brasil. que em uns países já aparece o despotismo, como
As tropas armadas portuguesas saíram dos quar- consequência necessária de ficarem os povos reduzi-
téis, armados de cassetetes, insultando transeun- dos à triste situação de presenciarem e sofrerem to-
tes e praticando desacatos. dos os horrores da anarquia.
II. Medidas para conter os desagravos das tropas HOLANDA, Sérgio Buarque de. (dir.). História Geral da Civilização
portuguesas não foram tomadas e contraditoria- brasileira. O Brasil Monárquico. Tomo II. Volume 3 [9ª. Edição]. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. p. 209 (Adaptado).
mente, D. Pedro I exigiu que as mesmas perma-
necessem no Brasil e posteriormente premiou as Ao se dirigir aos parlamentares da constituinte de
tropas, tornando-as sua guarda pessoal. 1823, Dom Pedro I se remete ao contexto político eu-
III. Instalou-se um clima de guerra com toda tropa de ropeu do final do século XVIII e primeiras décadas do
linha e miliciana do país. A estes juntaram-se ci- século XIX, demonstrando
dadãos de todas as classes: roceiros, agregados, a) preocupação com o avanço das ideias liberais e
negros forros, escravos dispostos a enfrentar a com o papel que lhe seria atribuído na nascente
divisão portuguesa. estrutura política brasileira.
São corretas b) inabilidade política, ao se colocar contrário aos
a) I, II e III c) apenas I e II desejos despóticos e centralizadores da classe
b) apenas I e III d) apenas II e III senhorial brasileira.
c) ressentimento com a Revolução do Porto, ocorri-
14 UFU-MG No início dos trabalhos da Constituinte de da em 1820, que vetou o retorno de D. João VI ao
1823, Dom Pedro I proferiu o seguinte discurso: Todas trono de Portugal.
as Constituições que, à maneira de 1791 e 1792, têm d) alinhamento com o modelo inglês de governo, al-
estabelecido suas bases, e se têm querido organizar, mejando o apoio dos britânicos no processo de
a experiência nos tem mostrado que são totalmente reconhecimento da Independência do Brasil.

SUPERAÇÃO

FICSAE-SP 2017 A vinda da Corte com o enraizamento do Estado português no Centro-Sul daria início à transforma-
ção da colônia em metrópole interiorizada. Seria esta a única solução aceitável para as classes dominantes em meio à
insegurança que lhes inspiravam as contradições da sociedade colonial, agravadas pelas agitações do constituciona-
lismo português e pela fermentação mais generalizada no mundo inteiro da época, que a Santa Aliança e a ideologia
da contrarrevolução na Europa não chegavam a dominar.
Maria Odila Leite da Silva Dias. A interiorização da metrópole e outros estudos. São Paulo: Alameda, 2005.

O texto oferece uma interpretação da independência do Brasil, que implica


a) o reconhecimento da importância do processo de emancipação, que influenciou a luta por autonomia na Europa
e em outras partes da América, impulsionou a economia mundial e estabeleceu as bases para um pacto social
dentro do Brasil.
b) a caracterização da emancipação como um ato meramente formal, uma vez que ela não foi acompanhada de
alterações significativas no cenário político, nem de reformas sociais e econômicas capazes de romper a de-
pendência externa do Brasil.
c) o reconhecimento da complexidade do processo de emancipação, afetado simultaneamente por movimentos
como os reflexos da Revolução Francesa, a Revolução do Porto, as disputas políticas na metrópole e na colônia
e as tensões sociais dentro do Brasil.
d) a caracterização da emancipação como uma decorrência inevitável do declínio econômico português provo-
cado pela invasão napoleônica, pelo endividamento crescente com a Inglaterra e pela redução nos recursos
obtidos com a colonização do Brasil.

CAPÍTULO T1 / Independência como processo 71

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T2
CAPÍTULO
Primeiro Reinado: cultura e política

Cicero Moraes (CC BY-SA 4.0)


Reconstituição facial de Dom Pedro I em 3D realizada em 2018, com autorização dos herdeiros no Brasil.
O processo partiu de uma fotografia coletada durante a exumação do imperador, em 2012.

O biógrafo de D. Pedro I, Paulo Rezzutti, autor do livro D. Pedro, a história não contada, nos ajuda a
dimensionar a personalidade de Pedro de Alcântara. Criado nas ruas cariocas, o futuro imperador do Brasil
era escrachado e autêntico no trato com as pessoas. Por isso, hoje D. Pedro I pode ser visto como um ho-
mem que tinha proximidade com o povo.
Em seus 36 anos de vida, dedicou-se ao Brasil e a Portugal, vivendo sob duas coroas. Apesar de grande
parte da sua vida pessoal – permeada por romances extraconjugais – ter se destacado em sua biografia
ao longo dos anos, D. Pedro também foi responsável por duas Constituições – a do Brasil, em 1824, e a de
Portugal, em 1834 – e foi um dos principais atores políticos na organização do Estado nacional brasileiro a
partir de 1822.
Neste capítulo, vamos analisar a formação desse Estado-nação, assim como seus desdobramentos
históricos.

• Como se constrói uma nação? Qual seria o projeto de desenvolvimento de um Estado nacional?
• Como se processa a história constitucional de um país?

Neste capítulo, será abordada a habilidade EM13CHS101.

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Um problema chamado Estado-nação
São vários os fatores que devem ser analisados ao se estudar a cons-
trução de um Estado-nação: território, língua, religião, hábitos, tradições e
aspectos simbólicos e culturais. Para alguns estudiosos, as definições de
“Estado” e “nação” andam juntas e estariam ligadas à identidade geográ-
fica de um povo; da mesma forma, é possível compreender a formação
de um Estado-nação a partir da difusão de uma língua em comum.
Assim, quando se trata da formação do Estado nacional brasileiro,
é possível encontrar algumas características comuns. Entre estas estão
uma população que habita um mesmo território e compartilha, no geral,
os mesmos aspectos culturais e possui autonomia política e soberania ju-
rídica para que essa unidade funcione. Todos esses fatores foram sendo
aglutinados a partir do Primeiro Reinado, iniciado em 1822.

Identidade nacional em construção


A independência do Brasil ganha mais profundidade quando anali-

Biblioteca Pública de Nova Iorque


sada em perspectiva, ou seja, enquanto um processo histórico, uma vez
que não foi resultado das ações de um só homem nem se deu somente
no dia 7 de Setembro. Ao contrário, José Bonifácio de Andrada e a arqui-
duquesa Leopoldina organizaram o pano de fundo das negociações que
garantiram elementos de continuidade entre a vida colonial e a indepen-
dente, como a manutenção das fronteiras territoriais, do sistema escravis-
ta e do regime monárquico centrado na figura do imperador.
Assim, a construção de símbolos nacionais não tardou: D. Pedro foi
aclamado imperador no dia 12 de outubro de 1822, e já em novembro Jean-Baptiste Debret, Coleta chamada
todo o corpo diplomático foi informado sobre uma nova bandeira para o Folia do Divino do Espírito Santo.
Brasil, criada pelo artista Jean-Baptiste Debret, nas cores verde, símbolo Bandeira e pavilhão brasileiros, 1835.
Litografia em cores, 51,4 × 33,4 cm.
da Casa dos Bragança, e amarela, símbolo da Casa de Habsburgo-Lore- Biblioteca Pública de Nova York,
na. O destaque ficaria por conta do losango – que seria uma homenagem Coleção Digital.
de D. Pedro a Napoleão – contendo uma circunferência com as estrelas
representando as províncias e envolvendo o brasão monárquico e as
armas imperiais somadas a plantas brasileiras.
Para se compreender a construção da identidade nacional brasileira
no império, é importante conhecer o projeto – encomendado pela Cor-
te – também elaborado por Debret, para o local onde D. Pedro faria seu
discurso de posse e assistiria a uma cerimônia em sua homenagem. Se-
gundo as pesquisadoras Lilia Schwarcz e Heloísa Starling, nesse projeto,
o Império é simbolizado “por uma mulher que trazia um manto de fundo
verde — como as florestas do local — e todo bordado de ouro, numa alu-
são à riqueza da terra. Ela apresenta, no braço esquerdo, uma espécie de
escudo com as armas do imperador e, no outro, a Constituição brasileira”.
Há, também, a representação de diferentes grupos populares que es-
tão armados: um conjunto de pessoas negras, indígenas e de sertanejos.
Nesse sentido, a população estaria unida em defesa do Império, que teria
sua centralidade simbolizada na figura feminina que ocupa o meio da
cena. Além disso, há, ainda, nessa alegoria, uma cornucópia com frutas Cornucópia: vaso em forma
nativas, sacas de café e açúcar – que eram os principais produtos da de chifre. A cornucópia é um
economia – e a representação de forças oficiais e da população. elemento iconográfico clássico
A análise desse projeto de Debret revela o modo como a elite brasileira, que, desde a Antiguidade, remete
que orbitava em torno do Império, enxergava a nova situação: caberia à mo- à abundância, à fertilidade e à
narquia a conciliação entre os valores europeus e os brasileiros, a pacificação riqueza.
e a “civilização” da população, assim como a integridade e a união do território.
Entretanto, é importante reconhecer a arbitrariedade por trás das es-
colhas dos símbolos nacionais, ou seja, como a escolha dos rituais sociais
envolvem decisões políticas e podem fabricar tradições e costumes, for-
jando um sentimento de unidade nacional.

CAPÍTULO T2 / Primeiro Reinado: cultura e política 73

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The New York Public Library, Coleção Digital
Discussão em sala

Identidade nacional
Você já refletiu sobre o que define
a identidade nacional brasileira
hoje em dia? Em outras palavras,
ainda compartilhamos os mesmos
símbolos, pavilhões e valores
nacionais desde a formação do
Estado nacional no século XIX?
Seria, então, válido perguntar: nós,
brasileiros e brasileiras, somos
antes nacionalistas ou patrióticos?
Reflita a respeito e debata em sala Jean-Baptiste Debret. Pano de boca executado para representação extraordinária no
de aula! teatro da corte, por ocasião da coroação do Imperador D. Pedro I, 1839. Litografia em
cores; 22,1 x 33,4cm. Biblioteca Pública de Nova York, Coleção Digital. Um dos muitos
símbolos construídos para reforçar a ideia de união e identidade nacional, essa obra de
Debret promovia uma comunicação eficiente com o público a partir de suas alegorias.

As contradições da realidade
No contexto da política externa, a realidade histórica tinha pouco a ver
com as idealizações que o Império promovia em suas alegorias. O pro-
cesso de independência da América hispânica transformou os quatro
vice-reinados coloniais em 14 diferentes Repúblicas, e, particularmente,
as nações latino-americanas do Cone Sul viam a ascensão do Brasil com
desconfiança, com receio de ações expansionistas brasileiras.
Já os Estados Unidos, que defendiam a “América para os america-
nos”, de acordo com a Doutrina Monroe, viam com bons olhos a eman-
cipação do Brasil e, por isso, foram a primeira nação a reconhecer a
independência brasileira, em 1824.
Portugal, por sua vez, reconheceu a independência brasileira somen-
te em 1825, por meio de um acordo mediado pela Inglaterra, que também
tinha interesse econômico nessa negociação. Segundo esse acordo,
Portugal concederia a independência ao Brasil após o pagamento, à ex-
-metrópole, de uma indenização de 2 milhões de libras esterlinas – algo
como metade de suas exportações anuais.
Uma vez satisfeita a vontade lusitana, vinha também o reconhecimento
da soberania brasileira pela Inglaterra. Para isso, o Brasil deveria manter,
por mais 15 anos, todas as vantagens comerciais que os ingleses haviam
negociado com Portugal com a vinda da Corte de D. João VI, em 1808:
tarifas alfandegárias de 15% para os produtos ingleses, enquanto todos os
demais pagavam 24%; um juizado especial para os crimes ingleses em
território brasileiro e liberdades religiosas para seus súditos. O Brasil ainda
comprometia-se a extinguir o tráfico negreiro no prazo de cinco anos.
Essas arranjo realizado com os ingleses foi estabelecido pelo Tratado
Mais
de Amizade e Aliança, de 29 de agosto de 1825, e foi desastroso para o
Brasil, pois, segundo o historiador Jorge Caldeira, estima-se que os acordos
Por que o Politize! existe?,
chegaram a custar aproximadamente 18% do PIB aos cofres brasileiros no
Politize! Primeiro Reinado.
Uma sugestão para acompanhar Já em relação à política interna, a centralização do território continuava
a história das diferentes escolas sediada na região Centro-Sul, a partir do Rio de Janeiro, de onde partiam as
econômicas é o portal de leis e as cobranças de impostos. No entanto, era no interior do país recém-
educação política Politize!
-constituído que se produziam as riquezas agroexportadoras. Mesmo com a
Disponível em: http://p.p4ed.com/
QWPWQ.
emancipação, o tripé colonial, latifúndio, monocultura e escravismo, manteve-
-se, marcando, assim, uma permanência histórica em meio às rupturas oriun-
das do processo.
Isso nos leva, também, a dimensionar o que era a escravidão no Brasil
naquele momento, especialmente para justificar a manutenção do caráter

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agrário do país, pois na mentalidade da elite política e comercial da época
era conveniente garantir o latifúndio monocultor escravista.
Essa elite esteve intimamente ligada ao processo de independência
e, portanto, também participou da elaboração da primeira Constituição
brasileira, em 1824, a qual manteve o tráfico negreiro e a escravidão,
uma vez que, como os escravizados eram a maior parte da população e
ocupavam-se dos campos e dos trabalhos manuais.
As promessas de abolição do tráfico negreiro estavam em sintonia com
o avanço do capitalismo no cenário mundial. O liberalismo econômico pre-
cisa de mercado consumidor e indivíduos livres e competidores que promo-
vam a lei da oferta e da procura. Portanto, o crescente avanço das pautas
abolicionistas em escala internacional tinha algo além do gesto humanitário:
a defesa e a ampliação do mercado consumidor, para dar vazão à crescente
produção derivada da Revolução Industrial.
No entanto, como se pode notar, a economia brasileira dependia do
sistema escravista. Em meados da década de 1810, aproximadamente
uma em cada três pessoas era escrava no Brasil. Além disso, um trafi-
cante de escravizados seria capaz de gerar 100% de lucro em apenas
uma viagem, chegando a lucrar, anualmente, cinco vezes mais do que um
senhor de engenho.
Portanto, o sistema escravista movimentava a economia nacional e,
nesse sentido, temia-se que a abolição, ainda que gradual, "quebrasse"
o país; afinal, sendo a pessoa escravizada uma forma de mercadoria, os
proprietários iriam buscar uma indenização do Estado para os prejuízos
sofridos em decorrência disso.

A Constituição de 1824
O espírito de emancipação política foi capaz de aglutinar as tendên-
cias políticas contra um inimigo comum: Portugal. Mas, passada a euforia,
surgiram as crises internas.
Após a independência, não se sabia ao certo sobre quais estruturas o
novo Estado iria se sustentar. Por isso, entre 1822 e 1824, os debates fo-
ram centrados no teor da Carta Constitucional, que seria a coluna cervical
da nova nação. Assim, em maio de 1823, ocorreu a primeira reunião da
Assembleia Constituinte. Naquele momento, pode-se dizer que três gru-
pos políticos distintos tentavam impor seus ideais:
• Os liberais moderados formavam um grupo composto de senhores
de engenho, burocratas e negociantes ligados à agroexportação e ao
tráfico negreiro. Eles defendiam reformas sociais no campo da econo-
mia e certas liberdades civis e políticas, mas sem transformar as es-
truturas sociais, apoiando a manutenção da escravidão, por exemplo;
além disso, buscavam restringir ao máximo o poder imperial e garantir
maior autonomia da Câmara dos Deputados e do Judiciário. Fique
• Os liberais exaltados constituíam um grupo variado, com setores ligado
ilustrados da sociedade. Apostavam em reformas amplas e profun-
Lembrando que, quando se
das da sociedade, tais como a separação entre Igreja e Estado, o fala em “partido português”
federalismo, a abolição lenta e gradual da escravidão, o sufrágio uni- ou “partido brasileiro”, não
versal e, em alguns casos, um regime republicano. se trata de partidos tal como
• Os bonifácios, como o nome indica, estavam articulados em torno os conhecemos atualmente,
da liderança de José Bonifácio. Os membros desse grupo defendiam com um projeto político e
uma monarquia centralizada, mas submetida à Constituição, bem uma burocracia próprios e
como a abolição gradual da escravidão. cujos membros normalmente
defendem ideias parecidas.
A facção política dos liberais moderados e a dos exaltados, juntas, No caso exposto no texto,
compunham o chamado “partido brasileiro”, e pregavam a divisão dos são grupos políticos que se
três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), mas defendiam maior juntavam em torno de um
autonomia do Legislativo em relação à pessoa do imperador. Ao contrário mesmo interesse, no sentido de
daqueles reunidos em torno do “partido português” (composto também serem contra ou a favor de algo.

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de brasileiros), grupo leal a D. Pedro I que defendia uma monarquia absolutista.
A partir de 1823, essas tendências políticas passaram a permear todo o período
imperial brasileiro.
Os representantes do "partido brasileiro" tomaram a dianteira na condução do
texto constitucional e propuseram a organização política dividida em três poderes:
ao imperador e seus ministros de Estado, caberia o Poder Executivo; o Legislativo
ficaria a cargo da Câmara dos Deputados e do Senado – sendo os deputados
eleitos para um mandato de quatro anos, e os senadores com mandato vitalício; e
o Judiciário seria composto de juízes e tribunais. O texto previa, ainda, o voto cen-
sitário, ou seja, só teria o direito ao voto quem tivesse uma renda, no caso, seria o
equivalente a 150 alqueires de farinha de mandioca; por isso, o projeto foi chama-
do de “Constituição da Mandioca” e demonstrava a força política da elite agrária.
Esse projeto sugeria um maior predomínio do Legislativo sobre o Executivo,
o que contrariava os interesses de D. Pedro I. Os portugueses, que apoiavam o
imperador, ficaram ainda mais insatisfeitos, pois a Constituição de 1823 negava
aos estrangeiros o direito de participar da vida política brasileira, fosse como de-
putados ou como senadores.
Essa situação gerou um clima de tensão que se estendeu ao longo de meses,
culminando com a dissolução da Assembleia, em 12 de novembro de 1823, por or-
dem do imperador. No entanto, os deputados se recusaram a sair e continuaram em
sessão, D. Pedro I determinou o uso das forças policiais do império para dispersá-
-los, e o evento entrou para a história como a Noite da agonia. Como resultado, seis
deputados foram deportados para a França, entre eles
três irmãos Andrada, incluindo José Bonifácio.
Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro

D. Pedro I, então, convocou dez pessoas de sua


confiança pessoal, todos brasileiros e juristas, para ree-
laborar o projeto constitucional, que, para ele, era liberal
demais. A nova Constituição foi apresentada em março
de 1824. Como o documento foi imposto pelo impera-
dor, não tendo sido elaborado e aprovado pela Consti-
tuinte, diz-se que a Constituição foi outorgada, ou seja,
imposta. Essa Carta foi a mais longeva do Brasil: durou
67 anos, sendo substituída somente em 1891, já no perío-
do republicano.
A Constituição de 1824 inspirava-se no modelo
liberal francês; mas a organização política, ou seja, a
divisão dos três poderes de Montesquieu, foi, aqui, al-
terada, adicionando-se um quarto poder, o Moderador,
de uso exclusivo do imperador e considerado acima dos
demais poderes.
Dessa forma, o imperador concentrava todas as de-
cisões, visto que o Poder Moderador personalizava na
figura real as prerrogativas de nomear a qualquer mo-
mento ministros de Estado, deputados, senadores e
magistrados do Judiciário. Ele também tinha o poder de
dissolver a câmara dos deputados. Além disso, não res-
ponderia judicialmente pelos seus atos. A Carta Magna
ainda submetia a Igreja ao Estado e dava ao imperador
o direito de conceder cargos eclesiásticos, conhecido
como padroado. A questão da escravidão não foi se-
quer mencionada, indicando que nada mudaria a esse
respeito.
Apesar de seu teor autoritário, efetivado pelo Poder
Moderador, a Constituição de 1824 trouxe avanços sociais:
garantiu a liberdade de culto religioso e as eleições, que já
Edital de 24 de março de 1824 do periódico Diário do Rio
de Janeiro anunciando a Constituição e convocando para o ocorriam desde as décadas iniciais da colonização, passa-
juramento que se daria no dia seguinte (25). ram a ser censitárias e indiretas em dois turnos.

76 HISTÓRIA / Frente B

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As eleições funcionavam da seguinte maneira: no primeiro turno, os
homens maiores de 25 anos e com renda mínima anual de 100 mil-réis
escolhiam os eleitores, na proporção de um eleitor para cada 100 domi-
cílios. Os analfabetos e os libertos também podiam participar do primeiro
turno eleitoral. Já no segundo turno, os votados elegiam os deputados
e senadores, sendo estes últimos em lista tríplice, da qual o imperador ... há uma discussão muito
escolhia o candidato de sua preferência. Tratava-se de um processo bas- importante nas Ciências
Sociais e no Direito
tante amplo para a época.
no que diz respeito à
No entanto, mesmo com pretensões liberais, é preciso reforçar o au- construção das noções de
toritarismo da Constituição de 1824: além de se valer da força para anular direitos. Historicamente,
o primeiro projeto, de 1823, D. Pedro I supervisionou todos os detalhes da convencionou-se dizer que
Carta outorgada, e o Poder Moderador deixava clara a centralização do primeiro tem-se os direitos
poder e indicava o caráter absolutista do imperador. civis, depois os direitos
políticos e, então, os sociais.
Os desafios imperiais
Apesar de o Império ter contratado Debret para elaborar uma rica
iconografia e apresentar a imagem de uma nação una e pacificada, a
realidade era outra. A centralização do poder nas mãos do imperador foi
questionada sempre que possível, devido à própria diversidade regional
e política do país, e desencadeou eventos que desgastaram tanto o go-
verno real quanto a imagem pessoal de D. Pedro I.
Confederação do Equador
Em 1817, a Revolução Pernambucana já denunciara como a presença
da Corte lusitana no país transformava o Rio de Janeiro em uma “nova Lis-
boa”, e, em 1824, a frustração das tradicionais aspirações liberais pela Carta
outorgada novamente deu volume às vozes regionais. Entre essas vozes
estava a do frei Joaquim do Amor Divino, também conhecido como Frei Ca-
neca. De origem humilde e com formação no seminário de Olinda, era jor-
nalista e ativista político, inclusive tendo participado da Revolução de 1817.
Em meio a um clima que já era tenso, o estopim para a primeira revolta
contra o caráter absolutista do Império foi a nomeação, para governador
da província de Pernambuco, do monarquista Francisco Pais Barreto, que
ia contra os interesses locais.
Pais Barreto havia sido nomeado por D. Pedro I, mas, diante de protestos,
renunciou ao cargo; então, foi eleito Manuel Pais de Andrade, liberal e líder
republicano. O imperador ainda exigiu o retorno de Pais Barreto ao governo
da província, mas os deputados republicanos não acataram a ordem.
Diante disso, D. Pedro I enviou navios de guerra; os pernambucanos,
por sua vez, em 2 de julho de 1824, proclamaram a independência de
Pernambuco. Algumas vilas do Ceará, do Rio Grande do Norte e da Pa-
raíba aliaram-se aos rebeldes e, com isso, formou-se a Confederação do
Equador, um “Estado federalista e independente”.
Mesmo após uma carta régia sentenciando os revoltosos à morte, a revo- Bandeira da Confederação do
lução ainda sobrevivia. No dia 12 de setembro, as tropas reais invadiram a ci- Equador. As ramas de cana-de-
dade do Recife e, em cinco dias, acabaram com a Confederação. Um históri- -açúcar e algodão ladeiam os
valores republicanos e federalistas,
co se iniciava: a utilização de forças militares contra a própria população civil. e no círculo branco estão as
Em Pernambuco, centenas de pessoas foram presas e tantas outras palavras “independência”, “união”,
julgadas e condenadas. Alguns processos arrastaram-se até abril de “liberdade” e “religião”. A bandeira
foi pioneira na defesa pública
1825. Frei Caneca foi condenado à forca, mas, uma vez que o responsá-
desses princípios políticos.
vel pelo enforcamento se recusou a executar a pena, ele acabou sendo
fuzilado. A Confederação havia acabado, mas os ressentimentos políticos
de ambos os lados não.
Desgaste da imagem do imperador
A vida pessoal de D. Pedro I sempre foi um assunto público. Os rom-
pantes políticos, sua fama de avarento e seus romances extraconjugais
eram assuntos comentados no cotidiano brasileiro. Um caso mereceu
particular atenção dos historiadores: sua vida com Domitila de Castro

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In: Nossa História. 35 ed. São Paulo: Vera Cruz, 2006.
Cerco a Recife pelas forças imperiais, em 1824, a fim de combater os confederados.

Canto e Melo, que recebeu o título de Marquesa de Santos, com quem o


imperador teve duas filhas (prestigiadas com os títulos de Condessa de
Iguaçu e Duquesa de Goiás).
Além de lidar com essas polêmicas pessoais, que cada vez mais to-
mavam conta da atenção pública, D. Pedro viu-se obrigado a lidar com
a sucessão do trono português logo após o falecimento de D. João VI,
em Lisboa, no ano de 1826. Para garantir a transmissão do poder em
Portugal, ele assumiu o trono português como D. Pedro IV e, do Rio de
Janeiro, enviou uma nova Constituição a Portugal. Ainda, articulou o ca-
samento de sua filha, Maria da Glória, com seu irmão D. Miguel, para que
este assumisse a regência de Portugal até que Maria da Glória atingisse a
maioridade para poder ser entronada como rainha. Feito isso, dias depois
renunciou em favor da filha.
Ainda no plano externo, a Guerra Cisplatina também contribuía para
o desgaste político do imperador. O conflito era uma espécie de atuali-
zação das constantes desavenças que Portugal e Espanha travaram na
região do Rio da Prata desde o século XVIII. Estava em questão a autono-
mia da província Cisplatina, uma região brasileira que contou com o apoio
da Argentina na conquista de sua independência em agosto de 1828.
Apesar de o Brasil ter vantagem numérica – em termos de soldados
e navios – sobre seus rivais, o país não teve fôlego para permanecer
em combate. Ao final, a Cisplatina conseguiu autonomia e tornou-se o
atual Uruguai. Quanto ao Brasil, estima-se que foram gastos mais de 30
milhões de dólares na guerra e contados quase 10 mil mortos.
No plano interno, o Brasil também sofria com uma crescente reces-
são econômica e carestia que comprometiam a vida da população. A má
gestão do tesouro público e a emissão de moedas de cobre esgarçaram
ainda mais a já deficitária economia brasileira.

O fim do Primeiro Império


Após o falecimento da arquiduquesa Leopoldina, D. Pedro casou-se
novamente, em 1829. Preocupado com as tendências políticas portugue-
sas, encontrou na jovem Amélia de Leuchtenberg, herdeira do Reino da
Baviera, a oportunidade de estabelecer novas alianças.
No entanto, a insatisfação popular com o imperador aumentava a
cada dia. A “gota d’água” foi a morte, em 20 de novembro de 1830, do
jornalista Líbero Badaró, liberal e crítico ferrenho do governo imperial.
Vítima de uma emboscada, o jornalista foi morto a tiros, supostamente a
mando de políticos ligados ao imperador.

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Em março de 1831, enquanto uma reunião de populares no Rio de
Janeiro marcava a crescente impopularidade de D. Pedro I, comercian-
tes partidários do imperador preparavam um banquete para recebê-lo do
seu retorno das Minas Gerais, onde havia estado justamente em busca
de conciliação política. Essa situação gerou um confronto entre partidá-
rios e contrários ao imperador que durou quase uma semana: ofensas,
depredações e gritos de “Viva a Constituição, a Assembleia e a liber-
dade” atravessaram as ruas do centro da capital no episódio que ficou
conhecido como Noite das garrafadas.
Seguiram-se novos tumultos naquele ano. No dia 5 de abril, D. Pedro I
fechou o ministério dos brasileiros e o substituiu por políticos portugue-
ses leais à Coroa; no dia seguinte, milhares de pessoas se aglomeraram
no Campo da Aclamação para protestar contra essa decisão.
No entanto, o imperador recusava-se a restituir aos brasileiros seus
cargos. Em contrapartida, os manifestantes mantiveram-se firmes e, inclu-
sive, chegaram a dar vivas à República e a se referir ao imperador como
traidor. A pressão alcançou tal ponto que, no dia 7 de abril de 1831, em
uma carta destinada à leitura pública, D. Pedro I abdicava do trono bra-
sileiro em favor de seu filho, Pedro, de apenas 5 anos. Essa decisão foi
recebida com salvas de palmas e festas.
Em Portugal, como D. Pedro IV, lutou contra o irmão D. Miguel pelo
trono lusitano. D. Pedro faleceu em 1834, em consequência de uma tuber-
culose, aos 36 anos de idade.

Leitura de documentos
Analise as imagens a seguir:
Museu Metropolitano de Arte, Nova Iorque

Museu Paulista da Universidade de São Paulo, São Paulo


Jean-Louis Ernest Meissonier. 1807, Friedland, 1875. Óleo sobre Pedro Américo. Independência ou Morte!, 1888. Óleo sobre tela,
tela, 135,9 × 242,6 cm. Museu Metropolitano de Arte, Nova 415 × 760 cm. Museu Paulista da Universidade de São Paulo,
Yorque. Representação da vitória de Napoleão na Batalha de São Paulo. Representação do grito de independência do Brasil.
Friedland durante a campanha expansionista na Rússia.

a) Indique a principal semelhança entre as pinturas apresentadas e uma possível razão para as afinidades artísticas
entre elas.

CAPÍTULO T2 / Primeiro Reinado: cultura e política 79

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b) Destaque as contradições entre os fatos e o discurso pictórico de Pedro Américo.

Aplicando conhecimentos

1 Quais eram as principais atividades econômicas da 3 Leia com atenção o texto e faça o que se pede.
sociedade brasileira na década de 1820? As ruas estão, em geral, repletas de mercadorias
inglesas. A cada porta, as palavras Superfino de Lon-
dres saltam aos olhos: algodão estampado, panos
largos, louça de barro, mas, acima de tudo, ferragens
de Birmingham, podem-se obter um pouco mais
caro do que em nossa terra nas lojas do Brasil, além
de sedas, crepes e outros artigos da China.
GRAHAM, Maria. “Diário de Uma Viagem ao Brasil”. In: CAMPOS,
Raymundo. História do Brasil. São Paulo: Atual, 1991, p. 98.

Identifique e analise uma causa histórica para as con-


dições sociais e econômicas observadas pela ingle-
sa Maria Graham.

2 É possível reconhecer, ainda hoje, algumas heranças


da Monarquia constitucional adotada após a inde-
pendência? Justifique sua resposta.

4 Identifique o papel do Brasil no cenário econômico


internacional a partir do século XIX.

80 HISTÓRIA / Frente B

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CONSOLIDANDO SABERES

1 Uece 2017 Atente ao seguinte excerto: “[...] Resul- 04. De acordo com o autor, os catarinenses de algu-
ta daí que a Independência se fez por uma simples mas vilas cometeram tamanhos excessos que tive-
transferência política de poderes da metrópole para ram de ser reprimidos pelas tropas portuguesas.
o novo governo brasileiro. E na falta de movimentos 08. Ao contrário do que o autor presenciou em Santa
populares, na falta de participação direta das massas Catarina, em outras províncias, como a da Bahia,
neste processo, o poder é todo absorvido pelas clas- Pará e Cisplatina, ocorreram reações desfavorá-
ses superiores da ex-colônia, naturalmente as únicas veis ao ato de D. Pedro.
em contato direto com o regente e sua política. Fez- 16. Segundo o texto, a notícia da independência foi
-se a Independência praticamente à revelia do povo; recebida com grande entusiasmo nas Vilas do
e se isto lhe poupou sacrifícios, também afastou por Desterro, Laguna e São Francisco.
completo sua participação na nova ordem política. A 32. Não obstante as reações de alguns portugueses
Independência brasileira é fruto mais de uma classe que temiam o fim dos seus privilégios, o governo
que da nação tomada em conjunto”. de Lisboa, forçado pela França, aceitou de pronto o
Caio Prado Jr. Evolução política do Brasil: Colônia e Império. rompimento. Em outubro de 1822 foi assinado o tra-
São Paulo: Brasiliense. p. 53. tado de reconhecimento, havendo grande júbilo em
Na perspectiva de Caio Prado Jr., caracterizam o todo o país, como bem atesta Dupperrey Lesson.
processo de independência do Brasil os seguintes Soma:
aspectos:
a) presença de movimentos populares, participação 3 Mackenzie-SP A respeito dos princípios presentes
do povo no poder e elitismo. na Constituição de 1824, outorgada por D. Pedro I, é
b) poder absorvido pelas classes inferiores, indepen- correto afirmar que:
dência feita à revelia da elite local e com grandes a) garantiam ampla liberdade individual e resguar-
sacrifícios para o povo que se envolveu no processo. davam a liberdade econômica, assegurando a
c) projeto de toda a nação, afastamento das classes participação política desvinculada da necessida-
superiores do poder e grande participação popular. de de uma renda mínima por parte do cidadão.
d) poder nas mãos das classes superiores, ausência b) garantiam as liberdades individuais inspiradas na
de participação do povo e independência feita a Declaração dos Direitos do Homem, elaborada
partir do interesse de uma classe e não da nação pelos revolucionários franceses em 1789.
como um todo. c) estabeleciam a igualdade de todos perante a lei,
estatuto que foi observado com rigor por toda a
2 UFSC O navegador Dupperrey Lesson, que em 1822 sociedade brasileira.
estava em Santa Catarina, assim descreveu a reação d) estabeleciam o princípio da liberdade religiosa,
dos catarinenses à independência do Brasil: segundo o qual o Estado permaneceria distante
“... Cheios de confiança em seus propósitos, os das questões religiosas.
partidários numerosos da independência estavam e) determinavam disposições jurídicas que eram as
inspirados com um entusiasmo (...) que seu espírito mais adequadas à realidade nacional da época,
ardente havia reprimido há longo tempo. No excesso não apresentando, portanto, contradições.
da sua alegria, eles haviam coberto de luzes as Vilas
de Nossa Senhora do Desterro, de Laguna e de São 4 UFPR Temos a tendência de pressupor que todas
Francisco, onde percorrendo as ruas entoavam can- as mudanças que decorreram de um movimento de
ções em honra de D. Pedro ...”. independência foram para o melhor. Raramente, por
DUPERREY, Louis Isidore. Voyage autour du monde. In: Ilha de Santa exemplo, consideramos um movimento de indepen-
Catarina, relatos de viajantes estrangeiros nos séculos XVIII e XIX. dência como uma regressão, um triunfo do despotis-
Florianópolis: UFSC, 1984.
mo sobre a liberdade, de um regime imposto sobre
Assinale a(s) proposição(ões) VERDADEIRA(S) com um regime representativo. Apesar disso, no caso da
base no texto e nos seus conhecimentos sobre o independência do Brasil, essas acusações foram na
processo de independência do Brasil. época imputadas ao novo regime.
01. A declaração de independência do Brasil, feita (Adaptado de MAXWELL, K. “Por que o Brasil foi diferente? O contexto
por D. Pedro I em 1822, foi aceita em Santa Cata- da independência”. In: MOTTA, C. G. (org.). Viagem incompleta: a
experiência brasileira. São Paulo: Editora Senac, 2000, p. 181.)
rina e em todas as demais províncias brasileiras,
com grande júbilo. Qual dos eventos citados a seguir gerou as acusa-
02. Segundo o visitante, houve nas ruas de algumas ções mencionadas no texto?
vilas de Santa Catarina um conflito entre os par- a) A outorga da Constituição de 1824, feita por
tidários da independência (que eram muito nu- D.  Pedro I depois de dissolvida a Assembleia
merosos) e os que eram contrários a ela. Constituinte que elaborava o texto constitucional.

CAPÍTULO T2 / Primeiro Reinado: cultura e política 81

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b) O tratado de comércio que estipulou vantagens c) A Constituição de 1824 conferia ao Poder Mode-
econômicas para a Inglaterra. rador, que era exercido pelo Senado, nomear e
c) O incentivo à imigração europeia e a gradual demitir livremente os ministros de estado, conce-
emancipação dos escravos, resultado de políti- der anistia e perdoar dívidas públicas.
cas públicas realizadas no período monárquico d) O Poder Moderador era o quarto poder do Impé-
com objetivo de promover a transição do traba- rio e era exercido pelo Imperador Pedro I. Com
lho escravo para o trabalho livre. base neste Poder, o Imperador poderia dissolver
d) A guerra empreendida contra o Paraguai na dé- a câmara dos deputados, aprovar e suspender
cada de 1860. resoluções dos conselhos provinciais e suspen-
e) A decretação da maioridade de D. Pedro II que, der os magistrados, entre outras prerrogativas.
em 1840, favoreceu as medidas de centralização e) O Poder Moderador de invenção maquiavélica,
do poder, chamadas à época de “regresso”. atribuído a Benjamin Constant, foi responsável
pelo golpe da maioridade em 1840.
5 Mackenzie-SP 2016 Em 1 de abril de 1808, durante a
regência de D. João, o alvará de 1785 foi revogado, 7 UFV-MG A primeira Constituição Brasileira, outor-
o que permitiu a liberação e o estabelecimento de gada em 1824, apresentava uma novidade em re-
indústrias e manufaturas no Brasil. Apesar disso, na lação às monarquias constitucionais existentes no
prática, essa providência não alcançou seus objeti- Ocidente: a existência de um quarto poder, o Poder
vos de capacitar o país para desenvolver suas indús- Moderador, idealizado pelo pensador liberal suíço
trias, porque Henri-Benjamim Constant de Rebecque, mas que na
a) os acordos de parceria estabelecidos entre o prática funcionava de maneira oposta à que ele havia
Brasil e a Inglaterra, para o incremento técnico concebido. Sobre as características do Poder Mode-
das manufaturas nacionais, foram cancelados por rador criado pela Constituição de 1824, é CORRETO
falta de interesse da elite agrária do nosso país. afirmar que ele assegurava:
b) D. João, apesar de ter permitido a instalação de a) o equilíbrio entre os demais poderes.
manufaturas no país, defendia a superioridade b) a participação do povo nas eleições.
dos produtos industrializados europeus perante c) a liberdade de imprensa no país.
os similares nacionais. d) o controle dos órgãos do Estado pelo Imperador.
c) faltava ainda, a adoção de uma política de prote- e) a igualdade de todos perante as leis.
ção alfandegária nacional, diante da concorrência
das mercadorias britânicas, além do nosso mer- 8 UFSC 2016 Sobre o Primeiro Reinado brasileiro
cado consumidor interno não ser muito amplo. (1822-1831), é CORRETO afirmar que:
d) novos acordos comerciais foram assinados com 01. O rápido crescimento econômico do país após
potências europeias, o que ampliou os privilégios a independência, baseado na consolidação do
dos comerciantes estrangeiros no nosso país, em café como principal produto nacional de expor-
detrimento dos interesses nacionais. tação, garantiu a estabilidade política que carac-
e) apesar da Inglaterra ter honrado os acordos terizou o reinado de D. Pedro I.
comerciais e entregado máquinas e equipamentos 02. Ao estabelecer o sufrágio censitário, a primei-
industriais, a nossa mão de obra escrava não tinha ra Constituição brasileira, promulgada em 1824,
especialização necessária para o trabalho na sustentava a tese liberal de que “todos os ho-
indústria. mens nascem livres e iguais”.
04. A Confederação do Equador, que eclodiu no Nor-
6 UFPE A Constituição de 1824, elaborada por “ho- deste em 1824, foi um movimento revolucionário
mens probos e amantes da dignidade imperial e da de tendência liberal, separatista e republicana.
liberdade dos povos”, segundo o Imperador Pedro 08. A oposição interna contra D. Pedro I reduziu-se
I, continha uma novidade em relação ao projeto de com a conquista da província Cisplatina, ocorri-
constituição de 1823: a criação do Poder Moderador. da após a guerra travada entre 1825 e 1828 que
Assinale a alternativa que melhor define este Poder. resultou na separação da República da Banda
a) Com base no Poder Moderador, o Imperador res- Oriental do Uruguai.
tringiu os poderes dos regentes unos – Padre 16. Após a ruptura definitiva com Portugal em se-
Diogo Feijó e Araújo Lima. tembro de 1822, grupos políticos alinhados com
b) O Poder Moderador conferia à Câmara de a Corte portuguesa resistiram ao comando de
Deputados a prerrogativa de vetar decisões do D. Pedro I em algumas províncias do império.
Imperador. Soma:

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T3
CAPÍTULO
Regência

Rodrigo Alberto de Oliveira (CC BY-SA 3.0)


Bandeira proposta pelo movimento autonomista “O Sul é o meu país” fundado em 1992.

Dois desafios marcaram a história do Brasil imperial: a manutenção da integridade territorial e da unida-
de política. Desde a independência, o Império se esforçou em garantir a hegemonia do poder central sobre
os interesses regionais, assim como buscou um equilíbrio político entre conservadores e progressistas. Po-
rém, o problema da unidade política continuou no cenário político brasileiro em outros contextos históricos.
A instabilidade social que tomou conta do país a partir de 2013 estimulou a organização de um movimento
emancipacionista chamado “O Sul é o meu país”, que pedia a autonomia de Paraná, Santa Catarina e Rio
Grande do Sul.
Em 2016, uma consulta informal e sem valor científico contou com 340 422 votos e indicou que 96,12%
dos envolvidos defendiam a separação dos estados do Sul do país. Apesar de o número ser menos de 2%
do total dos eleitores da região, isso evidencia como as ideias emancipacionistas continuam presentes no
imaginário político brasileiro, podendo legitimar projetos que ameacem a integridade territorial brasileira.
Neste capítulo, vamos analisar as lutas sociais que ameaçavam a unidade do território nacional durante
a Regência.

• Quais as diferenças entre uma manifestação e um movimento social?


• Atualmente, seriam legítimas as pautas autonomistas?

Neste capítulo, serão abordadas as habilidades EM13CHS101 e EM13CHS103.

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Uma experiência republicana
O reinado de D. Pedro I não chegou a durar uma década, porém foi
o suficiente para organizar as estruturas do Estado nacional brasileiro.
Dentre as características fundamentais, estavam a coincidência do territó-
rio nacional com o colonial, a definição de uma monarquia constitucional
baseada na divisão em quatro poderes e a manutenção da escravidão.
Todos esses fatores contribuíram para se construir um sentimento de
estabilidade política da nação brasileira – muito ainda em decorrência da
não fragmentação do território após a independência – e para garantir o
funcionamento do modelo econômico baseado no latifúndio agroexpor-
tador escravista. Porém, existiam grupos políticos que contestavam essa
estrutura política.
Estudamos anteriormente que províncias das regiões Norte e Nordes-
te questionaram o autoritarismo da Constituição de 1824 durante a Con-
federação do Equador. Além disso, na medida em que as reais intenções
de D. Pedro I se tornaram evidentes, diversos setores sociais da própria
capital chamaram para si a responsabilidade de contestar a representa-
tividade do imperador. Para evitar o crescimento das tensões sociais, a
Corte decidiu aclamar o jovem Pedro como novo imperador do Brasil.
Ele só tinha cinco anos e quatro meses e a aclamação ocorreu dois dias
depois da renúncia do pai.

Biblioteca Pública de Nova York, Estados Unidos


Jean-Baptiste Debret; Thierry Frères. Aclamação de D. Pedro II. Rio de Janeiro, 7 de abrill
de 1831; 1839. Litografia em cores, 17,5 x 33,1cm. Biblioteca pública de Nova York, Nova York,
Estados Unidos. Debret registrou a cerimônia de aclamação com pretensão realista, de modo
a valorizar a conciliação dos populares e da força militar na aclamação do pequeno Pedro II.

Apesar da euforia com a aclamação do novo imperador, existiam di-


versos projetos políticos em jogo, e isso criava tensões na sociedade
brasileira. De um lado, estavam aqueles que defendiam o retorno de
D. Pedro I e a manutenção das práticas absolutistas presentes na Cons-
tituição de 1824. Do outro, havia os partidários do novo imperador, que
defendiam reformas liberais e maior autonomia do Poder Legislativo.
Dessa maneira, para governar o país até que o imperador chegasse
à maioridade com 18 anos, foi organizado um sistema de regências. No
total, foram quatro regências, sendo duas trinas e duas unas.

Regências trinas
A primeira regência ficou conhecida como Regência Trina Provisória
e foi composta de três senadores: Francisco de Lima e Silva, tradicional
militar com forte atuação política; Nicolau Campos Vergueiro, advogado

84 HISTÓRIA / Frente B

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formado em Coimbra; e José Joaquim Campos Carneiro Campos, igual-
mente jurista e formado em Coimbra. Essa regência tinha o papel de garan-
tir a estabilidade durante a transição. Os políticos estavam mais alinhados à
causa conservadora, defendendo a centralidade política da capital carioca
sobre as províncias.
Logo houve um arranjo para a instalação de uma Regência Trina Per-
manente. Em 17 de junho de 1831, um grupo de deputados moderados
que defendia maior autonomia das províncias assumiu o comando da na-
ção. Foram eles os deputados José da Costa Carvalho, formado em Direi-
to em Coimbra; o jornalista maranhense João Bráulio Muniz e o senador
Francisco de Lima e Silva. Essa regência foi vista como mais homogênea
em termos políticos, pois reunia políticos com larga experiência no ser-
viço público do Império e que defendiam o fortalecimento do Legislativo
em detrimento do Executivo.
Nesse período, o sistema político brasileiro estava dividido em três
grandes grupos:
• Chimangos: como eram chamados os moderados, que defendiam
maior autonomia administrativa e fiscal para as províncias, mas sem
grandes alterações da ordem social e econômica;
• Exaltados: também conhecidos como "farroupilhas", defendiam o repu-
blicanismo federalista; esse grupo reunia ainda alguns abolicionistas;
• Caramurus: nome dado aos regressistas, os quais defendiam a reto-
mada das práticas absolutistas de D. Pedro I.

A Regência Trina Permanente colocou em prática medidas que inte-


ressavam aos chimangos, como a reforma do Poder Judiciário, e estabe-
leceu o tribunal do júri, trazendo os processos para dentro do foro das
províncias. Além disso, criou o Código de Processo Criminal em 1832,
ampliando os poderes dos juízes de paz, que passaram a ser escolhidos
por eleitores de cada município, resultando na descentralização de parte
das atribuições do Judiciário.
Outro exemplo de medida descentralizadora foi a criação da Guarda
Nacional, em agosto de 1831. Vinculada ao ministro da Justiça, essa guar-
da seria composta de cidadãos masculinos entre 21 e 60 anos de idade
que tinham o direito de voto. A Guarda Nacional tornou-se uma institui-
ção que controlava a ordem e fortalecia as elites locais. Seus principais
cargos foram ocupados pelos membros mais ricos e poderosos das di-
versas regiões do Brasil e funcionou de modo a atender aos interesses
desses grupos.
Finalmente, em 1834, a Regência publicou o Ato Adicional, medida
Fernando Bueno/Pulsar Imagens

que promoveu mudanças importantes na organização política do Brasil.


Dissolveu o Conselho de Estado, instituiu a Regência Una e criou Assem-
bleias Provinciais. Isso ampliou a descentralização política e abriu cami-
nho para o fortalecimento de grupos regionais, que passaram a contestar
o poder da Corte.

Cabanagem (1835)
Em janeiro de 1835, um levante popular tomou conta da cidade de
Belém, capital do Pará, com saques, destruições e motins. O movimento
durou oito meses e se alastrou pelas margens dos rios até alcançar os
estados do Piauí, Maranhão e o interior nordestino.
A região passou por um importante desenvolvimento econômico
a partir do final do século XVIII. Porém, a Corte carioca impunha uma
onerosa cobrança de impostos e adotava uma política repressiva con-
O Memorial da Cabanagem foi inaugurado
tra qualquer manifestação que contestasse essa situação. Além disso, em janeiro de 1985 para a celebração dos
apesar do crescimento econômico, grande parte da população da região 150 anos do evento. O monumento foi
Norte vivia na miséria e em péssimas condições de vida. projetado por Oscar Niemeyer.

CAPÍTULO T3 / Regência 85

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Sob a liderança de Antonio Vinagre e Eduardo Angelim, um grupo de
revoltosos tomou de assalto o Palácio do Governador de Belém em 7 de ja-
neiro de 1835. Francisco Vinagre (irmão de Antonio) chegou a governar a
província, mas foi destituído após fazer acordos com o governo regencial.
O movimento contou com grande participação de indígenas, negros,
mulatos, crioulos e forros e foi reprimido pela Guarda Nacional e por mer-
cenários contratados pelo governo. Com isso, mais de 30 mil pessoas
foram mortas.

Revolta dos Malês (1835)


Na madrugada de 25 de janeiro de 1835, teve início uma onda de revoltas
na cidade de Salvador. Nessa data era celebrado o dia de Nossa Senhora da
Guia, e a cidade toda estaria reunida em um único local. Os revoltosos usavam
armas brancas, porretes, instrumentos de trabalho e vestiam compridas túnicas
brancas, o abadá, uma vestimenta ritual usada pelos adeptos do Islamismo.
Naquele momento, a Bahia tinha cerca de 65 mil habitantes, sendo
40% escravizados; além disso, grande parte da população livre era com-
posta de africanos e seus descendentes. Somados, eles chegavam a 78%
da população, sendo que as pessoas brancas não passavam de 22%. Essa
população afro-brasileira era vista pelos brancos com desprezo e temor.
Nesse contexto marcado pelas violências da escravidão, a língua e os
Fique costumes iorubás tornaram-se um elo cultural que aproximou os diversos
grupos étnicos africanos que viviam na Bahia. Outro elemento que aju-
ligado dou na formação de alianças entre grupos diversos foi a religião islâmica,
O problema do racismo praticada por muitos africanos escravizados. Essas alianças possibilitaram
continua presente na sociedade uma mobilização política visando à contestação das relações escravistas.
brasileira contemporânea. Naquele dia 25 de janeiro, o levante dos malês atravessou o dia intei-
Nas últimas décadas, a ro, tentando subverter a ordem local. Porém, foi severamente reprimido
organização do movimento pelas tropas da Guarda Nacional: 70 manifestantes foram mortos, cerca
negro resultou na criação de de 500 foram punidos com penas de deportação, açoite e morte.
políticas afirmativas para
Essa não foi a primeira revolta de escravizados na região: da Conjuração
lutar contra as desigualdades
Baiana, de 1798, à Revolta dos Malês passaram-se quase 40 anos marcados
raciais e combater toda
forma de preconceito. Porém, por vários outros levantes. Em 1807 e 1814, a capital baiana já havia sido to-
ainda há muito a ser feito, e é mada por revoltas de negros islamizados contra a ordem escravista e suas
fundamental refletir sobre as assimetrias sociais. Assim como em 1816 e 1826, momentos nos quais o
estruturas históricas do racismo Recôncavo Baiano assistiu a levantes negros contra a escravidão baseados
e da desigualdade racial. em códigos identitários associados a práticas religiosas afro-brasileiras.

Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro

Jean Leon Pallière Grandjean Ferreira.


Um mercado em Bahia, Brasil, 1860.
Litogravura em aquarela. Fundação
Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro,
Brasil. Essa gravura oferece um registro
do comércio urbano realizado por
escravizados na cidade de Salvador em
meados do século XIX.

86 HISTÓRIA / Frente B

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Regências unas
Além das revoltas populares, o ano de 1835 foi marcado pelas elei-
ções para a Regência Una. O vitorioso foi o padre Antônio Feijó, repre-
sentante dos chimangos.
Seu governo durou menos de dois anos, pois, desgastado politicamen-
te, ele renunciou em setembro de 1837 para dar lugar a Pedro de Araújo
Lima, o marquês de Olinda. Representante dos caramurus, ou seja, dos re-
gressistas, Araújo Lima tratou de restringir os avanços legislativos liberais
que tinham sido adotados até então. Dessa maneira, reformou o Código do
Processo Criminal e, em 12 de maio de 1840, aprovou uma Lei de Interpreta-
ção do Ato Adicional. Ambas medidas anulavam a autonomia jurídica e po-
lítica dos presidentes provinciais, dando mais prevalência ao poder central.
Araújo Lima também foi o responsável pela criação do Colégio Dom
Pedro II e da Escola Militar, ambos no Rio de Janeiro. Ao longo da história,
essas duas instituições ganharam relevo político e intelectual.

Sabinada (1837)
As mudanças políticas não impediram que novas revoltas ocorressem
em diferentes regiões do Brasil. Em 6 de novembro de 1837, teve início
na Bahia um movimento ocasionado pelas insatisfações com os baixos
soldos militares, a contínua alta dos impostos e a crise econômica.
Liderado pelo médico e jornalista Francisco Sabino, o levante ficou co-
nhecido como Sabinada e teve a adesão de setores médios da sociedade
baiana, como militares que receavam a convocação para combater outras re-
voltas provinciais. O movimento não foi homogêneo e suas pautas não eram
um consenso: quanto à abolição, por exemplo, existiam divergências, mas Sa-
bino apoiou a libertação dos escravizados que aderissem à causa da revolta.
Inicialmente, os revoltosos conseguiram emancipar a província, mas
isso durou apenas alguns meses. A partir de março de 1838, as tropas re-
genciais reprimiram o movimento, e mais de 2 mil pessoas foram mortas
e outras 3 mil presas ou deportadas.

Balaiada (1838-1841)
Mais
O realinhamento do governo provincial ao conservadorismo de Araú-
jo Lima contribuiu para aprofundar o sentimento de insatisfação já exis-
tente nas províncias do Pará e do Maranhão. Isso deu início a uma grande
Uma história de amor
insurreição no Maranhão, em 1838. e fúria.
O movimento tomou conta de São Luís e conseguiu apoio de outros Direção: Luiz Bolognesi. 2013.
grupos sociais, inclusive de africanos libertos. A rebelião se intensificou, Classificação indicativa: 14 anos.
e os intelectuais liberais que inicialmente tinham aderido à insurgência se Animação que conta a história
afastaram. Em agosto de 1839, Araújo Lima convocou Luís Alves de Lima de um homem com quase 600
e Silva, um militar de carreira, para reprimir a Balaiada desde a capital. anos de idade que acompanha a
A insurreição foi contida em 1841, deixando um saldo de 12 mil pessoas história do Brasil enquanto procura
mortas. A vitória deu a Luís Alves o título de Barão de Caxias – mais tarde, a ressurreição de sua amada
devido à atuação na Guerra do Paraguai, ele adquiriu o título de duque. Janaína.
San Christovao. In: Johann Moritz Rugendas. Viagem
pitoresca através do Brasil. Paris: Lith. de Engelmann,
1835. Prancha 14

O registro de Rugendas exalta


a partida do batalhão da
Guarda Nacional em 1835.

CAPÍTULO T3 / Regência 87

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Farroupilha (1835-1845)
A última insurreição regencial a ser contida foi a Farroupilha, movi-
mento que durou uma década. Seu estopim foi a elevação da carga tribu-
tária sobre o charque, uma espécie de carne-seca.
A produção do charque foi responsável pelo desenvolvimento da
região desde meados do século XVIII, quando o crescimento da pro-
dução aurífera e do mercado interno aumentaram a procura pelo char-
que e por derivados de couro; isso intensificou o interesse do governo
português e brasileiro pelo controle da região, criando novos confli-
tos, como a Guerra Cisplatina (1825-1828). Assim, em 1832, motivado
por um sentimento antilusitano e pelo fato de o charque gaúcho sofrer
desvantagem em relação ao uruguaio por parte do governo, foi fundado
o partido farroupilha.
No entanto, na década de 1830, o governo brasileiro intensificou a
tributação do charque, e essas insatisfações locais fizeram do partido far-
roupilha um movimento separatista, liderado por membros da elite local,
como como Bento Gonçalves e Davi Canabarro.
Em 11 de setembro de 1836, foi proclamada a República Rio-Granden-
se, com a presidência de Bento Gonçalves. Apesar disso, o movimento
era contrário a mudanças sociais mais profundas, como o fim da escravi-
dão ou a reforma agrária.
O governo farroupilha manteve-se no poder até 1845, resistindo aos
fortes ataques das tropas imperiais. O Barão de Caxias foi enviado para
tentar acabar com a revolta e repetiu o que já havia feito na contenção
da Balaiada: conciliou as táticas militares com estratégias de negociação.
Assim, em 1845, foi assinado o Tratado de Poncho Verde. Esse acordo
envolveu a anistia aos participantes do movimento separatista, a inclusão
dos militares da elite gaúcha na hierarquia do Exército brasileiro e o aco-
lhimento das dívidas da República Rio-Grandense pelo Império. Estava
encerrada então a última das revoltas que ameaçaram a unidade territo-
rial brasileira.
Heritage Images/Getty Images

Guilherme Litran. Carga de Cavalaria, 1893, óleo sobre tela. Acervo do Museu Júlio
de Castilhos, Porto Alegre. Essa pintura idealiza as tropas farroupilhas como um grupo
homogêneo de homens brancos empunhando a bandeira germânica.

88 HISTÓRIA / Frente B

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O período regencial salientou dois grandes desafios do Brasil Império:
a conciliação política e a integridade territorial. Entretanto, ainda havia a
necessidade de um centro político unitário e, mesmo com os avanços na
pauta conservadora, Araújo Lima acabou cedendo aos apelos dos libe-
rais e, juntos, costuraram um acordo tendo em vista a ocupação do trono.
Assim, houve a antecipação da maioridade do imperador para os 14 anos
de idade, em julho de 1840.
A comoção diante do maior ritual público da história do país foi gran-
de. E, junto dela, houve a restauração do Conselho de Estado, a redefini-
ção do Código do Processo Criminal e a instalação de chefes de polícia
nas capitais das províncias. Todas essas medidas visavam fortalecer o
poder central e enfraquecer as autonomias provinciais, de modo a evitar
novas rebeliões.

Leitura de documentos
Leia o texto a seguir e faça o que se pede: Este viés interpretativo prevê a traição de Cana-
barro aos negros que estavam sob seu comando. Esta
Apesar de serem omitidos por grande parte da his- traição estaria relacionada a uma “facilitação” da as-
toriografia tradicional, os negros tiveram participação sinatura do tratado de paz, já que o Império mostra-
fundamental junto às forças rebeldes republicanas va-se contrário à libertação dos escravos insurretos
que lutaram contra o Império. Eles teriam compos- que estavam ao lado dos rebeldes. Outro grupo de
to, durante a Farroupilha, de um terço à metade do estudiosos argumenta que tal carta teria sido falsifi-
exército republicano e foram integrados ao exército cada pelos imperiais com a intenção de desmoralizar
farrapo em duas divisões: a cavalaria e a infantaria, o chefe da farroupilha e criar “tensões” no grupo. Se-
respectivamente, em 12/09/1836 e 31/08/1838, sendo gundo esse grupo, o episódio deveria ser classificado
denominadas “Corpos de Lanceiros Negreiros”. como uma “surpresa”, e não traição, já que todos (in-
Estes corpos eram compostos por negros livres e clusive Canabarro) estariam desprevenidos no mo-
escravos libertados pela República sob a promessa de mento do ataque. (...)
libertação ao fim de tal revolução. Os negros já haviam SALAINI, Cristian. Nossos heróis não morreram: um estudo antropológico
desempenhado papel fundamental antes mesmo da sobre as formas de “ser negro” e de “ser gaúcho” no estado do
Rio Grande do Sul. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do
criação destes corpos, na tomada de Porto Alegre, em Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2006. p. 36-7.
setembro de 1835 e a de Pelotas, em abril de 1836. Ne-
gros na condição de libertos e alforriados, assim como a) De acordo com o autor do texto, qual foi o papel
na de fugidos do Uruguai, contribuíram com a causa dos negros no exército republicano da Farroupilha?
farroupilha não somente como soldados. Foram tropei-
ros, mensageiros, campeiros e fabricadores de pólvoras.
O “Massacre de Porongos”, conhecido também
como “Surpresa”, “Batalha” ou “Ataque” de Porongos
ocorreu nos momentos finais da Farroupilha, quando
seria assinado o tratado de paz entre republicanos e
imperiais, conhecido como Tratado de Poncho Verde.
A morte de parte de um dos corpos de lanceiros negros
ocorreu na madrugada de 14/11/1844, no Cerro de Po-
rongos, então município de Piratini.
Esse episódio gerou polêmicas entre os historiado-
res e, atualmente, entre os protagonistas que revivem
tal acontecimento na atualidade. O elemento central
da discussão está na possibilidade do general David
Canabarro ter desarmado e separado os lanceiros ne-
gros das tropas momentos antes do ataque imperial.
O elemento que vai ao encontro dessa tese é a famosa
carta que teria sido enviada ao Coronel Francisco Pe-
reira de Abreu (comandante imperial) pelo líder impe-
rial Duque de Caxias.

CAPÍTULO T3 / Regência 89

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b) O episódio do Massacre dos Porongos recebeu diferentes interpretações históricas, cite quais foram elas.

c) Com base no texto, é possível afirmar que as políticas de anistia da Corte valeram para todos os grupos sociais
envolvidos na Farroupilha? Justifique sua resposta.

Aplicando conhecimentos

1 Enem Após a abdicação de D. Pedro I, o Brasil atra- Identifique duas causas para a ocorrência da Farroupilha.
vessou um período marcado por inúmeras crises:
as diversas forças políticas lutavam pelo poder e as
reivindicações populares eram por melhores condi-
ções de vida e pelo direito de participação na vida
política do país. Os conflitos representavam também
o protesto contra a centralização do governo. Nes-
se período, ocorreu também a expansão da cultura
cafeeira e o surgimento do poderoso grupo dos “ba-
rões do café”, para o qual era fundamental a manu-
tenção da escravidão e do tráfico negreiro.
O contexto do Período Regencial foi marcado 3 Identifique e analise um fator que permite caracteri-
a) por revoltas populares que reclamavam a volta da zar a Regência como uma “experiência federalista”.
monarquia.
b) por várias crises e pela submissão das forças po-
líticas ao poder central.
c) pela luta entre os principais grupos políticos que
reivindicavam melhores condições de vida.
d) pelo governo dos chamados regentes, que pro-
moveram a ascensão social dos “barões do café”.
e) pela convulsão política e por novas realidades 4 Cite e esclareça duas medidas adotadas pela Corte
econômicas que exigiam o reforço de velhas re- para pacificar o país na Regência.
alidades sociais.

2 A Farroupilha foi a mais longa rebelião contrária à


Corte. Ela durou 10 anos (1835-1845) e foi motiva-
da por traços particularidades da província do Rio
Grande do Sul.

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CONSOLIDANDO SABERES

1 EsPCEx-SP De 1831 a 1840, o Brasil vivenciou um pe- d) A revolta dos malês representou uma resistên-
ríodo [...] em que diferentes grupos disputavam o po- cia importante às estruturas sociais vigentes no
der. Como resultado, instalou-se um clima de grande Brasil, sobretudo à ordem social ligada à escra-
instabilidade que propiciou a irrupção de conflitos vidão africana.
em inúmeros pontos do país.
(KOSHIBA; PEREIRA, 2003) 3 UFPE Leia as afirmativas, a seguir, relacionadas com as
Regências Una e Trina na época do Império no Brasil.
A cabanagem foi um dos conflitos ocorrido nesse I. Foi criada a Guarda Nacional que reforçou os po-
período. Assinale a alternativa que corresponde a tal deres políticos da aristocracia.
conflito. II. Havia grupo político que defendia a volta de
a) ocorreu no atual estado do Rio Grande do Sul, D. Pedro I ao poder.
liderado pelos criadores de gado das fronteiras III. A Revolta dos Cabanos (1831-1832) mostrou a for-
com o Uruguai. ça dos comerciantes pernambucanos aliados aos
b) foi planejado e contava com participantes que grupos mais pobres da população da província.
haviam tido experiências anteriores de combates IV. O período Regencial contribui para estabilizar po-
na África, e objetivava promover a independência liticamente a sociedade, evitando a existência de
de Salvador e do Recôncavo Baiano. rebeliões.
c) foi um movimento conduzido por camadas popula- V. A Revolta dos Malês expressou descontentamen-
res do atual estado do Pará, que viviam margina- to social e articulação política dos escravos con-
lizadas na Região Amazônica. tra a opressão existente.
d) foi uma rebelião contra o poder central, ocorrida
na Bahia, e que contava com a camada média da Estão corretas apenas as afirmativas
sociedade baiana. a) I, II e IV. d) I, II e III.
e) ocorreu no atual estado do Maranhão e foi con- b) II, III e V. e) I, II e V.
duzida por um grupo de vaqueiros que visava c) III, IV e V.
combater os privilégios dos cidadãos de origem
portuguesa e o absolutismo de D. Pedro. 4 UFMG De 1835 a 1845, ocorreu o mais longo conflito
militar interno da história do Brasil – a chamada
2 UFU-MG Os malês encontraram na Bahia de 1835 Guerra dos Farrapos, ou Rebelião Farroupilha. Con-
um campo fértil onde semear a rebeldia escrava e siderando-se esse conflito, é CORRETO afirmar que
tentar mudar a sociedade em favor dos africanos. a) o apelido dado aos revoltosos – farroupilhas – fazia
Fundada na desigualdade étnico-racial e social, a alusão ao caráter do movimento e de seus principais
Bahia vivia nesse período uma crise econômica e líderes, oriundos das camadas populares gaúchas.
política. As revoltas das classes livres pobres e dos b) o Governo Central, a fim de possibilitar o final do
dissidentes liberais de um lado e, de outro, as dos es- conflito, atendeu a uma das principais reivindica-
cravos africanos, ameaçavam a hegemonia política ções dos rebeldes: a libertação dos escravos ne-
dos grandes senhores da Bahia e a própria ordem gros da Província.
escravocrata. c) o movimento rebelde, com diferentes correntes in-
REIS, João José. Rebelião escrava no Brasil: a história do levante dos ternas, defendia interesses rio-grandenses – como
malês em 1835. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. p. 545. diminuição de impostos e maior autonomia política.
d) os rebeldes rio-grandenses se uniram aos republica-
Considerando o texto acima, assinale a alternativa nos argentinos, com o objetivo de fortalecer as
correta sobre a revolta dos malês de 1835. tropas, aumentar o poderio bélico e reafirmar os
a) Os malês representavam uma identidade étnica ideais federalistas.
africana que foi recusada pela maioria dos outros
grupos de escravos, que vinham de regiões dife- 5 EsPCEx-SP O mais duradouro movimento rebelde
rentes da África. do Império foi a Revolução Farroupilha, ocorrida
b) Os malês estavam em uma camada intermediária no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina entre
entre as classes livres pobres e os escravos, pois 1835-1845. […] Em 1836, após importantes vitórias
estavam em uma situação social superior à dos sobre as tropas legalistas, os farroupilhas proclama-
escravos. ram a República Rio-Grandense.
c) As classes livres e pobres uniram-se aos grandes (BOULOS JR, 2011)
proprietários de terra na Bahia para derrotar os ma-
lês em sua revolta, pois ambos os grupos queriam Em 1842, Luís Alves de Lima e Silva, então Barão de Ca-
preservar a supremacia branca sobre os escravos. xias, é enviado pelo Império para comandar as forças

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legalistas. A atuação de Caxias pacificou a região já no ( ) A Cabanagem marcou o desfecho do longo ci-
ano de 1845. A seguir são listadas algumas medidas clo de revoltas que aconteceram em Pernambu-
que poderiam ser utilizadas para solução do conflito: co, e que possibilitou a consolidação do Brasil
I. Repressão violenta com prisão e fuzilamento de como Estado centralizado.
todos os líderes do movimento farroupilha. ( ) A Cabanagem instalou um governo que, devido
II. Aumento de taxas de importação do charque ao acirramento das tensões sociais, não durou
platino para tornar o similar rio-grandense-do-sul muito tempo.
mais competitivo no mercado nacional. a) V – F – F – V c) F – V – F – F
III. Cerco impiedoso sobre as maiores cidades rebe- b) F – V – V – F d) V – V – F – V
ladas provocando a morte de milhares de civis,
minando a moral do inimigo e levando os insur- 8 PUC-RS Responder à questão sobre os grupos po-
retos à rendição. líticos no Império (Período Regencial), numerando a
IV. Incorporação ao Exército Brasileiro de coman- coluna II de acordo com a coluna I.
dantes farroupilhas com os mesmos postos que Coluna I
ocupavam nas tropas rebeldes. 1. Farroupilhas
V. Reconhecimento, pelo governo imperial, da liber- 2. Chimangos
dade dos escravos que lutaram na revolução 3. Caramurus
como soldados.
Na ocasião, Caxias propôs Coluna II
a) todas as medidas acima listadas. ( ) Grupo composto basicamente por burocratas,
b) apenas as medidas I, II e III. comerciantes e proprietários cafeeiros do Cen-
c) apenas as medidas I, III e IV. tro-Sul. Defendiam o retorno de D. Pedro ao tro-
d) apenas as medidas II, III e V. no brasileiro.
e) apenas as medidas II, IV e V. ( ) Defendiam a manutenção da ordem através de
um governo centralizado, opondo-se às refor-
6 Fuvest-SP Nossas instituições vacilam, o cidadão vive mas sociais e econômicas, mas admitiam altera-
receoso, assustado; o governo consome o tempo em ções na Carta de 1824.
vãs recomendações... O vulcão da anarquia ameaça ( ) Defendiam reformas mais profundas, tais como
devorar o Império: aplicai a tempo o remédio. a extensão do direito de voto e a autonomia das
Padre Antônio Feijó, em 1836. províncias.
( ) Representavam parcelas de aristocracia agrá-
Essa reflexão pode ser explicada como uma reação à ria e também eram conhecidos como liberais
a) revogação da Constituição de 1824, que forne- moderados.
cia os instrumentos adequados à manutenção da
ordem. Relacionando-se a coluna da esquerda com a coluna
b) intervenção armada brasileira na Argentina, que da direita, obtêm-se, de cima para baixo, os números
causou grandes distúrbios nas fronteiras. na sequência:
c) disputa pelo poder entre São Paulo, centro econô- a) 2, 1, 3, 2 d) 1, 2, 3, 2
mico importante, e Rio de Janeiro, sede do governo. b) 3, 2, 1, 2 e) 3, 2, 1, 1
d) crise decorrente do declínio da produção cafeei- c) 3, 1, 2, 1
ra, que produziu descontentamento entre pro-
prietários rurais. 9 FGV-SP A abdicação de D. Pedro I em 1831 deu iní-
e) eclosão de rebeliões regionais, entre elas, a Ca- cio ao chamado Período Regencial, sobre o qual se
banagem no Pará e a Farroupilha no sul do país. pode afirmar:
I. As elites nacionais reformaram o aparato institu-
7 Ufla/PAS-MG A Cabanagem (1835-1840) foi uma re- cional de modo a estabelecer maior descentrali-
volta que marcou o Norte do Brasil durante o período zação política.
regencial (1831-1840). Analise as afirmações abaixo II. Foi um período convulsionado por revoltas, entre
sobre essa revolta, coloque V (verdadeiras) ou F (fal- elas, a Farroupilha e a Sabinada.
sas) e assinale a alternativa que apresenta a sequên- III. D. Pedro II sucedeu ao pai e impôs, logo ao assu-
cia CORRETA. mir o trono, reformas no regime escravista.
( ) A “Cabanagem” era um termo que se referia ao IV. O exercício do Poder Moderador pelos regentes
tipo de habitação da maioria dos participantes e pelo Exército conferia estabilidade ao regime.
do conflito, mestiços, índios e escravos libertos. As afirmativas corretas são:
( ) A Cabanagem foi um movimento amplo e com in- a) I e II. d) II, III e IV.
teresses contraditórios devido à diversidade das b) I, II e III. e) II e IV.
camadas sociais e políticas que a compunham. c) I e III.

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10 PUC-Rio COM EXCEÇÃO DE UMA, as alternativas Devido à menoridade do príncipe, seguiu-se o cha-
abaixo apresentam acontecimentos relacionados às mado período Regencial (1831-1840). Sobre este pe-
formas de resistência dos escravos negros à domi- ríodo, é correto afirmar:
nação escravista na experiência histórica do Brasil, 01. D. Pedro I renunciou porque não atendia mais
desde o século XVI. Assinale-a. aos interesses brasileiros, após envolver-se em
a) Ocorrida em Salvador no ano de 1835, a revol- fatos como a dissolução da Constituinte, a re-
ta dos malês somava-se às revoltas escravas de pressão violenta à Confederação do Equador e
1814 e 1816 na Bahia, embora a elas não se com- sucessão portuguesa.
parasse em amplitude. 02. De seu início até 1837, a Regência pode ser con-
b) Ao reivindicarem o direito de “brincar, folgar e siderada uma experiência autoritária e unificado-
cantar”, por ocasião do levante no Engenho San- ra que restringiu, ainda mais, a autonomia das
tana de Ilhéus, em 1789, os escravos demonstra- províncias.
vam que também lutavam por uma vida espiritual 04. O período que se iniciou com a abdicação foi
autônoma. um dos mais agitados do Império Brasileiro, com
c) Foi durante o período da ocupação holandesa a eclosão de inúmeras revoltas, como a Caba-
no atual Nordeste que o quilombo dos Palmares nagem, no Pará, a Farroupilha, no Rio Grande
consolidou sua posição de “Estado negro” encra- do Sul, a Sabinada, na Bahia, e a Balaiada, no
vado na colônia escravista. Maranhão.
d) Surgido em terras de um abolicionista, o quilom- 08. A Guarda Nacional, criada pelo padre Diogo An-
bo do Jabaquara constituiu-se em exemplo da tônio Feijó, em 1831, reforçou o poder dos latifun-
complexa negociação social e política que dis- diários, tornando-os representantes locais dos
tinguiu a resistência escrava nos anos finais da interesses do governo central.
escravidão. 16. A Constituição Imperial, outorgada em 1824, foi
e) A publicação do livro “O Abolicionismo”, de Joa- reformulada em parte pelo Ato Adicional de 1834
quim Nabuco, em 1883, constituiu-se em significa- que, entre outras medidas, criou as Assembleias
tivo libelo antiescravista ao afirmar que o escravo Legislativas provinciais e transformou a Regên-
e o senhor eram dois tipos contrários e, no fundo, cia Trina em Regência Una e eletiva.
os mesmos. Soma:

11 UFRGS 2015 A organização do Império brasileiro, no 13 UFPB Sobre as insurreições ocorridas durante o Pe-
século XIX, foi marcada por uma série de tensões ríodo Regencial e o II Reinado, relacione o movimen-
sociais, políticas e militares. Um dos episódios mais to social com sua característica.
relevantes desse período foi a chamada Guerra dos ( ) Rebelião iniciada 1. Praieira
Farrapos (1835-1845). Sobre o conflito, considere as em 1835 na provín- 2. Balaiada
seguintes afirmações. cia do Grão-Pará, 3. Sabinada
I. A promulgação da Lei Feijó (1831), que tinha por que levou as ca- 4. Farroupilha
objetivo fomentar o tráfico de africanos para o Bra- madas populares 5. Cabanagem
sil, contrariando assim os interesses republicanos ao poder.
das elites políticas da Província de São Pedro, foi ( ) Revolta ocorrida
um dos fatos desencadeadores da Guerra. na Bahia em 1837,
II. A Guerra dos Farrapos também pode ser inserida com predominân-
dentro de uma conjuntura platina na qual têm im- cia das camadas
portância as relações mantidas entre lideranças médias urbanas
sul-rio-grandenses e elites político-econômicas de Salvador.
uruguaias. ( ) Revolta de serta-
III. O Corpo de cavalaria dos Lanceiros Negros, for- nejos (vaqueiros
mado por parte da população escrava habitante e camponeses) e
da Província, foi dizimado pelas tropas imperiais, negros escravos,
na chamada “surpresa de Porongos”. que abalou o
Maranhão de 1838
Quais estão corretas? e 1841.
a) Apenas I.    d) Apenas lI e III. ( ) A mais longa re-
b) Apenas II.    e) I, II e III. volta da história do
c) Apenas I e II.    Império brasileiro,
ocorrida no Rio
12 UFPR O imperador D. Pedro I abdicou em favor de Grande do Sul, de
seu filho, Pedro de Alcântara, em 7 de abril de 1831. 1835 a 1845.

CAPÍTULO T3 / Regência 93

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O preenchimento dos parênteses está sequencial- c) I e II são corretas.
mente correto em: d) III e IV são corretas.
a) 1, 3, 4, 2 d) 3, 4, 1, 2
b) 2, 1, 4, 5 e) 1, 2, 3, 4 16 FGV-SP Leia atentamente as afirmações abaixo so-
c) 5, 3, 2, 4 bre a Guerra dos Farrapos e assinale a alternativa
correta.
14 UFRJ A criação da Guarda Nacional, em 1831, du- I. Foi a mais longa Guerra Civil do Brasil.
rante o governo regencial, teve como um de seus II. Constituíram-se, em meio à luta, das efêmeras
objetivos. Repúblicas: a Juliana, em Santa Catarina, e a Pira-
a) Apoiar o governo de Pedro I na consolidação da tini, no Rio Grande do Sul.
independência. III. Entre os participantes desse movimento estava a
b) Defender a integridade das fronteiras ameaçadas “heroína de dois mundos”, a republicana revolucio-
de invasão. nária Ana Maria de Jesus Ribeiro – Anita Garibaldi.
c) Conter as agitações e amotinações que ameaça- IV. Trata-se de uma revolução de caráter popular
vam a Nação. em que as elites foram postas à margem durante
d) Combater a influência da aristocracia rural na vida todo o processo.
política. V. O desfecho da revolução foi sangrento. Não hou-
e) Combater a escravidão. ve concessões nem anistia aos Farrapos. Todos
foram executados.
15 UFU-MG Durante o período das Regências e início
do Segundo Reinado, diversas rebeliões colocaram a) Apenas I, II e III estão corretas;
em risco a estabilidade política do Império e as re- b) Apenas II, III e IV estão corretas;
lações de dominação existentes. A respeito dessas c) Apenas II, IV e V estão corretas;
rebeliões podemos afirmar que d) Apenas III, IV e V estão corretas;
I. A Guerra dos Farrapos foi um movimento que pre- e) Todas as afirmações estão corretas.
tendia a independência do Rio Grande do Sul,
organizado pelos produtores de gado e charquea- 17 PUC-Rio Para muitos brasileiros que vivenciaram o
dores, contando com uma pequena base popular período regencial (1831-1840), aquele foi um tempo
de apoio. de impasses, mudanças e rebeliões. Sobre esse pe-
II. A prolongada rebelião de escravos na Bahia em ríodo, é correto afirmar que:
1835 (Levante Malê), que pretendia a indepen- I. a renúncia inesperada do Imperador D. Pedro I levou
dência da Bahia, espalhou-se por diversos esta- à nomeação de uma regência trina e à implantação,
dos nordestinos, recebendo a adesão dos ser- em caráter provisório, de um governo republicano.
tanejos e exigindo auxílio de tropas de estados II. a antecipação da maioridade de D. Pedro II, em
vizinhos para sufocá-la. 1840, garantiu o restabelecimento da ordem mo-
III. Submetidos à escravidão e/ou intensa explora- nárquica e a pacificação de todas as revoltas que
ção, índios, negros e mestiços se revoltaram con- ameaçavam a integridade territorial do Império.
tra os grandes proprietários no Maranhão entre III. houve uma série de revoltas envolvendo desde
1838 e 1841 (Balaiada), implantando uma efêmera elementos das tropas regulares até escravos,
república inspirada nos ideais do socialismo utó- destacando-se, entre elas, a Farroupilha, a Caba-
pico, difundido pelos jornalistas e padres que li- nagem e a Revolta dos Malês.
deravam o movimento. IV. a ausência provisória da autoridade monárqui-
IV. O “Manifesto ao Mundo”, programa político da ca estimulou a proliferação de projetos políticos
Revolução Praieira, propunha, entre outros itens, destinados à reorganização do Estado imperial.
voto livre e universal, plena liberdade de impren-
sa, trabalho como garantia de vida para o cidadão Assinale a alternativa:
brasileiro, inteira e efetiva independência dos po- a) se somente as afirmativas I e II estiverem corretas.
deres constituídos. b) se somente a afirmativa I estiver correta.
c) se somente as afirmativas II, III e IV estiverem
Assinale a alternativa correta. corretas.
a) II e III são corretas. d) se somente as afirmativas III e IV estiverem corretas.
b) I e IV são corretas. e) se todas as afirmativas estiverem corretas.

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No ENEM é assim
As questões selecionadas nesta seção são prioritariamente do Enem, mas questões de vestibulares diversos que apre-
sentam características semelhantes aos itens do referido exame também foram usadas como recurso para estudo.

1 Enem O alfaiate pardo João de Deus, que, na altura e Castro, em 18 de agosto de 1694, para comunicar
em que foi preso, não tinha mais do que 80 réis e oito ao Rei de Portugal a tomada da Serra da Barriga.
filhos, declarava que “Todos os brasileiros se fizessem (...) Não me parece dilatar a Vossa Majestade da
franceses, para viverem em igualdade e abundância”. gloriosa restauração dos Palmares, cuja feliz vitória
MAXWELL, K. Condicionalismos da independência do Brasil. SILVA, M. N. senão avalia por menos que a expulsão dos holande-
(Org.). O império luso-brasileiro, 1750-1822. Lisboa: Estampa, 1986. ses, e assim foi festejada por todos estes povos com
seis dias de luminárias. (...) Os negros se achando de
O texto faz referência à Conjuração Baiana. No con- modo poderosos que esperavam o nosso exército
texto da crise do sistema colonial, esse movimento metidos na serra (...), fiando-se na aspereza do sítio,
se diferenciou dos demais movimentos libertários na multidão dos defensores. (...) Temeu-se muito a
ocorridos no Brasil por ruína destas Capitanias quando à vista de tamanho
a) defender a igualdade econômica, extinguindo a exército e repetidos socorros como haviam ido para
propriedade, conforme proposto nos movimen- aquela campanha deixassem de ser vencidos aque-
tos liberais da França napoleônica. les rebeldes pois imbativelmente se lhes unir-se os
b) introduzir no Brasil o pensamento e o ideário libe- escravos todos destes moradores (...).
ral que moveram os revolucionários ingleses na Décio Freitas, República de Palmares – pesquisa e comentários em
luta contra o absolutismo monárquico. documentos históricos do século XVII. Maceió: UFAL, 2004, p. 129.

c) propor a instalação de um regime nos moldes


da república dos Estados Unidos, sem alterar a Sobre o documento acima e seus significados atuais,
ordem socioeconômica escravista e latifundiária. é correto afirmar que
d) apresentar um caráter elitista burguês, uma vez a) foi escrito por uma autoridade da Coroa na co-
que sofrera influência direta da Revolução France- lônia e tem como principal conteúdo a comemo-
sa, propondo o sistema censitário de votação. ração da morte de Zumbi dos Palmares. A data
e) defender um governo democrático que garan- de 20 de novembro, como referência ao líder do
tisse a participação política das camadas popu- quilombo, tem uma conotação simbólica para a
lares, influenciado pelo ideário da Revolução população negra em contraponto à visão oficial
Francesa. do 13 de maio de 1888.
b) o feito da tomada de Palmares, em 1694, pelos
2 Enem 2016 O que ocorreu na Bahia de 1798, ao con- exércitos da Coroa, é entendido como menos
trário das outras situações de contestação política na glorioso quando comparado à expulsão dos
América portuguesa, é que o projeto que lhe era sub- holandeses de Pernambuco, em 1654. Os dois
jacente não tocou somente na condição, ou no ins- eventos históricos não têm o mesmo apelo para
trumento, da integração subordinada das colônias no a formação da sociedade brasileira na atualidade.
império luso. Dessa feita, ao contrário do que se deu c) o texto de Caetano de Melo e Castro indica que
nas Minas Gerais (1789), a sedição avançou sobre a sua Palmares não gerou temor às estruturas coloniais
decorrência. da Capitania de Pernambuco. A comemoração
JANCSÓ, I.; PIMENTA, J. P. Peças de um mosaico. In: MOTA, C. G. (Org.). oficial do Dia da Consciência Negra é uma inven-
Viagem incompleta: a experiência brasileira (1500-2000). ção política do período recente.
São Paulo: Senac, 2000.
d) o Quilombo de Palmares representou uma ame-
A diferença entre as sedições abordadas no texto aça aos poderes coloniais, já que muitos eram os
encontrava-se na pretensão de rebeldes que se organizavam ou se aliavam ao
a) eliminar a hierarquia militar. quilombo. A data é celebrada, na atualidade, como
b) abolir a escravidão africana. símbolo da resistência pelos movimentos negros.
c) anular o domínio metropolitano.
d) suprimir a propriedade fundiária. 4 Unicamp-SP 2016 A aquarela do artista João Teófi-
e) extinguir o absolutismo monárquico. lo, aqui reproduzida, dialoga com a pintura de Pedro
Américo, “Tiradentes esquartejado” (1893). Sobre a
3 Unicamp-SP 2017 O documento abaixo foi redigido obra de João Teófilo, publicada na capa de uma re-
pelo governador de Pernambuco, Caetano de Melo vista em 2015, é possível afirmar que:

CAPÍTULO T3 / Regência 95

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Além disso, os jornais que circulavam na região
alertavam a população sobre a corrupção nos al-
tos cargos administrativos coloniais.
c) Sofrendo violenta opressão, a classe dominante
mineira conscientizou-se das contradições entre
os seus interesses e os da metrópole. Influencia-
da pelo pensamento iluminista e na iminência da
cobrança da derrama em Vila Rica, em 1789, pre-
parou uma insurreição.
d) Contando com adesão e apoio efetivo de diver-
sas parcelas da população mineira, os insurgen-
tes reivindicavam um governo republicano ins-
pirado nas ideias presentes na Constituição dos
EUA, mas foram traídos por um dos participantes
em troca do perdão de suas dívidas pessoais.
e) Mesmo sem ter ocorrido, de fato, a Inconfidên-
a) Trata-se de uma obra baseada em um quadro do cia Mineira, o apoio recebido da população re-
gênero da pintura histórica, sendo que no traba- voltada e influenciada pelos ideais iluministas
lho de Pedro Américo o corpo de Tiradentes no demonstrou a maturidade do processo pela in-
patíbulo afasta-se da figura do Cristo, exemplo dependência do país. Tal engajamento vai estar
maior de mártir. presente durante todas as lutas em prol da nossa
b) Utilizando-se das mesmas formas do corpo es- emancipação.
quartejado de Tiradentes pintado por Pedro Amé-
rico, o autor limita o número de sujeitos esquarte- 6 ExPCEx-SP 2016 No fim do Século XVIII, era grande
jados e acentua o tom conservador da aquarela. a insatisfação com a carestia e a opressão colonial.
c) A imagem fala sobre seu contexto de produção A isso se somava a simpatia que muitas pessoas de-
na atualidade, utilizando-se do simbolismo de monstravam em relação às lutas pela emancipação
Tiradentes, e procura ampliar a presença de ne- do Haiti (1791-1804) e à Revolução Francesa (1789).
gros como sujeitos sociais nas lutas coloniais e Para difundir esta ideia fundou-se a loja maçônica Ca-
antiescravistas. valeiros da Luz. Em agosto de 1798, alguns conspirado-
d) Tiradentes consolidou-se como um mártir nacio- res afixaram em muros e postes da cidade manifestos
nal no quadro de Pedro Américo, daí a necessida- exortando a população à revolução. Os panfletos pre-
de do pintor de retratar seu corpo esquartejado. gavam a proclamação da República, a abolição da es-
A obra de João Teófilo mostra que os mártires, cravidão, melhores soldos para os militares, promoção
embora negros, são um tema do passado. de oficiais, liberdade de comércio, etc. Denunciado por
um traidor, o movimento foi esfacelado. Alguns parti-
5 Mackenzie-SP (Adapt.) A Inconfidência Mineira re- cipantes foram presos, outros fugiram e quatro foram
presentou potencialmente uma das maiores ameaças condenados à morte: Luís Gonzaga das Virgens, Lucas
de subversão da ordem colonial. O fato de ter ocorrido Dantas de Amorim Torres, João de Deus do Nascimen-
na área das Minas, área na qual a permanente vigi- to e Manuel Faustino dos Santos.
lância e repressão sobre a população eram as tarefas (Adaptado de ARRUDA & PILETTI, p. 351.)
maiores das autoridades públicas, indica um alto grau
de consciência da capacidade de libertação da domi- O texto acima descreve, em parte, a
nação metropolitana. a) Revolta dos Alfaiates, ocorrida em Salvador, Bahia.
(Resende, Maria Eugênia Lage de. A Inconfidência Mineira. b) Inconfidência Mineira, desencadeada em Ouro
São Paulo: Global, 1988.) Preto, Minas Gerais.
c) Revolta de Beckman, que teve por palco São
De acordo com o texto acima assinale a assertiva correta. Luís, Maranhão.
a) A opulência da produção mineradora alcançou o d) Confederação do Equador, ocorrida em Recife,
seu apogeu na segunda metade do século XVIII, Pernambuco.
aumentando a ganância da metrópole portugue- e) Cabanagem, ocorrida em Belém, Pará.
sa, que acreditava que os mineiros estivessem
sonegando impostos e passou a usar de violên- 7 Mackenzie-SP 2014 Em 12 de agosto de 1798, as
cia na cobrança dos mesmos. paredes das igrejas de Salvador, lugares públicos e
b) O descontentamento dos colonos aumentava de paredes de casas, apareceram com panfletos ma-
acordo com o preço das mercadorias importadas, nuscritos que diziam: “Está para chegar o tempo feliz
já que eram proibidas as manufaturas na Colônia. da nossa liberdade, o tempo em que todos seremos

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irmãos, o tempo em que todos seremos iguais”. Tal 9 PUC-Campinas 2017 (Adapt.) Tiradentes era alguém
manifesto conclamava à revolução a população, que com todas as características e ressentimentos de um
estava insatisfeita com o agravamento do custo de revolucionário. Além do mais, ele se apresentava para
vida. A respeito dessa revolta é correto afirmar que o martírio ao proclamar sua responsabilidade exclu-
a) a Inconfidência Mineira foi influenciada pelos ide- siva pela inconfidência. Era óbvia a sedução que o
ais de liberdade vindos da Europa, pela indepen- enforcamento do alferes representava para o governo
dência das Treze Colônias da América do Norte e português: pouca gente levaria a sério um movimen-
pela opressão metropolitana. to chefiado por um simples Tiradentes (e as autorida-
b) a Inconfidência Baiana foi o mais importante e des lusas, depois de outubro de 1790, invariavelmente
significativo dentre os movimentos emancipacio- se referiam ao alferes por seu apelido de Tiradentes).
nistas, como a Inconfidência Mineira, a Conjura- MAXWELL, Kenneth. A devassa da devassa. A Inconfidência Mineira:
ção Baiana e a Conjura do Rio de Janeiro. Brasil e Portugal 1750-1808. São Paulo: Paz e Terra, 1995, p. 216.

c) tal movimento de rebeldia contra a Metrópole se


manifestou em um momento em que o próprio O texto de Kenneth Maxwell, ao se referir a Tiraden-
Estado Português afrouxou sua política de arre- tes, nos remete à Inconfidência Mineira. Sobre a In-
cadação fiscal sobre a Colônia. confidência Mineira, é correto afirmar que
d) a Conjuração Baiana, diferente das demais revol- a) o fracasso do movimento deveu-se, entre outros,
tas da época, não se limitou apenas aos ideais à precária organização do movimento e à falta de
de independência e liberdade, como propunha coesão efetiva entre os conspiradores.
mudanças estruturais para a sociedade brasileira. b) a conjuração resultou em reuniões nas quais se
e) a Revolta dos Alfaiates contou com a participação travaram debates políticos e filosóficos sem que
de todas as classes sociais da Bahia, ao contrário com isso resultasse em proposta de revolta.
dos outros movimentos emancipatórios, mas a lide- c) a ausência de princípios iluministas, como os de
rança coube aos grandes proprietários de terras. liberdade e igualdade jurídica, deu ao movimento
um caráter verdadeiramente revolucionário.
8 PUC-Campinas 2016 Considere o manifesto abaixo: d) o êxito da conspiração deu-se em função de ser
Manifesto dos Baianos, agosto de 1798 formada, principalmente, pelas camadas médias
(...) considerando os muitos e repetidos latrocí- e urbanas e dos grupos pobres da população.
nios feitos com os títulos de imposturas, tributos e e) as ideias do despotismo ilustrado deram origem
direitos que são cobrados por ordem da Rainha de a um movimento conspiratório e libertário no pro-
Lisboa (...) e no que respeita à inutilidade da escravi- cesso de ruptura política do país.
dão do mesmo Povo tão sagrado e digno de ser livre,
com respeito à liberdade e qualidade ordena, manda 10 PUC-Campinas 2014 (Adapt.) No século XVIII, emer-
e quer que para o futuro seja feita nesta cidade e seu giu nas Minas Gerais uma pequena elite, culta e letra-
termo a sua revolução para que seja exterminado da, que se ocupava de tarefas burocráticas e adminis-
para sempre o péssimo jugo da Europa. trativas e se dedicava às artes e à literatura. Atraída
(In: KOSHIBA, Luiz e PEREIRA, Denise M. F. História do Brasil, no contexto pelo ideal iluminista, essa elite foi protagonista de
da história ocidental. São Paulo: Atual, 2003, p. 157.) um surto literário inédito no Brasil, produzindo obras
de natureza poética. Os poetas líricos Tomás Antonio
Com base no manifesto pode-se afirmar que, para os Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa exaltavam a vida
conjurados baianos, bucólica e os amores tranquilos, seguindo a tradição
a) os movimentos de rebeldia favoreciam a divulga- dos modelos clássicos, em um movimento literário
ção das ideias liberais europeias e denunciavam a que ficou conhecido como Arcadismo. Formados em
exploração metropolitana das riquezas da colônia. Coimbra, Portugal, ambos ocupavam cargos públicos
b) o rompimento com a metrópole não significava nas Minas Gerais e, em 1789, protagonizaram uma das
apenas a autonomia política, mas também a manu- primeiras conspirações separatistas na colônia: a Con-
tenção da estrutura econômica tradicional no país. juração Mineira.
c) a independência não era apenas a ruptura dos la- NAPOLITANO, Marcos; VILLAÇA, Mariana. História para o ensino médio.
ços coloniais, mas também a alteração da ordem São Paulo: Saraiva, 2013. p. 293.

social, a começar pela abolição da escravatura.


d) a rebelião não era apenas uma manifestação O conhecimento histórico permite afirmar que a Con-
contra a metrópole, mas também uma forma de juração, a que o texto de Marcos Napolitano e Maria-
demonstrar o amadurecimento da consciência na Villaça faz referência,
colonial. a) tratou-se de uma revolução que propunha a perda,
e) autonomia política era a melhor maneira de elimi- pelos grupos dominantes, dos privilégios sociais
nar as desigualdades sociais e construir uma na- adquiridos depois de séculos do regime de produ-
ção baseada nos princípios do socialismo utópico. ção escravista.

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b) foi um movimento no qual a questão colonial fala- pria forma de organização do poder se torna o alvo das
va mais alto que a questão social, sendo o modelo críticas, e a sua substituição por outra afirma-se como
norte-americano sua maior inspiração. o objetivo que move os homens.
c) caracterizou-se por se apropriar do conteúdo social JANCSÓ, István. “A sedução da liberdade: cotidiano e contestação política
mais marcante da Revolução Francesa, chegando no final do século XVII” In: SOUZA, Laura de Mello e. História da vida
privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São
mesmo a questionar o sistema escravista na colônia. Paulo: Companhia das Letras, 1997, p.388-389, (adaptado)
d) representou o primeiro movimento de caráter
emancipacionista da história colonial com conteú- Ao analisar os eventos ocorridos na América portu-
do doutrinário definido e sólido apoio das camadas guesa no final do século XVIII, os historiadores bus-
populares. cam integrá-los ao quadro geral de transformações
e) mostrou que era possível vencer a dominação me- pelas quais passava o Império luso. Assim as “desa-
tropolitana e instaurar uma república independente feições ao Trono”
baseada na liberdade e igualdade entre os cidadãos. a) representavam a luta dos nacionais pela criação
de um estado independente, da mesma maneira
11 UFMG Leia este trecho, que contém uma fala atribuí- que havia ocorrido com os países hispânicos no
da a Joaquim José da Silva Xavier: começo do século XVIII.
... se por acaso estes países chegassem a ser inde- b) apresentavam-se como um combate pela trans-
pendentes, fazendo as suas negociações sobre a pe- formação social da colônia, via abolição da escra-
draria pelos seus legítimos valores, e não sendo obri- vidão e privilégios de nascimentos, manifestada
gados a vender escondido pelo preço que lhe dessem, na Inconfidência Mineira (1789).
como presentemente sucedia pelo caminho dos con- c) voltavam-se contra as reformas pombalinas que
trabandos, em que cada um vai vendendo por qual- visaram modernizar a colônia, por meio da expul-
quer lucro que acha, e só os estrangeiros lhe tiram a são dos jesuítas e separação entre a Igreja e o
verdadeira utilidade, por fazerem a sua negociação Estado brasileiro.
livre, e levado o ouro ao seu legítimo valor, ainda fi- d) simbolizavam a crise do Antigo Regime na perife-
cava muito na Capitania, e escusavam os povos de ria do sistema atlântico, decorrente do amadure-
viver em tanta miséria. cimento do capitalismo internacional e do adven-
Autos de Devassa da Inconfidência Mineira. 2. ed. to das ideias iluministas.
Brasília: Câmara dos Deputados; Belo Horizonte:
Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1980. v. 5, p. 117.
13 Enem 2014
A partir dessa leitura e considerando-se outros co- A transferência da corte trouxe para a América
nhecimentos sobre o assunto, é CORRETO afirmar portuguesa a família real e o governo da Metrópole.
que os Inconfidentes Mineiros de 1789 Trouxe também, e sobretudo, boa parte do aparato
a) acreditavam que o contrabando aumentava o va- administrativo português. Personalidades diversas e
lor recebido pelas pedras e ouro, pois dificultava funcionários régios continuaram embarcando para
sua circulação. o Brasil atrás da corte, dos seus empregos e dos seus
b) consideravam que o monopólio comercial explica- parentes após o ano de 1808.
va por que as regiões de que se compunha Minas NOVAIS, F. A.; ALENCASTRO, L F. (Orq.). História da vida privada no Brasil.
Gerais, cheias de pedras e ouro, ficavam mais ricas. São Paulo: Cia, das Letras, 1997.

c) defendiam o livre-comércio, por meio do qual pe-


dras e ouro adquiririam seu real valor, uma vez que Os fatos apresentados se relacionam ao processo de
seriam vendidos aos estrangeiros legalmente. independência da América portuguesa por terem a
d) pensavam que os estrangeiros poderiam tirar a) incentivado o clamor popular por liberdade.
vantagens do livre-comércio das pedras e ouro, b) enfraquecido o pacto de dominação metropolitana.
visando a aumentar seus lucros. c) motivado as revoltas escravas contra a elite colonial.
d) obtido o apoio do grupo constitucionalista português.
12 UFU 2014 Entre os anos de 1789 e 1801, as autoridades e) provocado os movimentos separatistas das províncias.
de Lisboa viram-se diante de problemas sem preceden-
tes. De várias regiões da sua colônia americana che- 14 Cesgranrio-RJ (Adapt.) Em agosto de 1820, irrom-
gavam notícias de desafeição ao Trono, o que era so- peu em Portugal uma revolução liberal inspirada
bremaneira grave. A preocupante novidade residia no nas ideias ilustradas. Os revolucionários procuravam
fato de que os objetos das manifestações de desagrado, enfrentar o momento de profunda crise na vida por-
frequentes desde os primeiros séculos da colonização, tuguesa. Crise política (...); crise econômica (...); crise
deslocava-se, nitidamente, de aspectos particulares de militar (...). Basta lembrar que, na ausência de D. João,
ações do governo para o plano mais geral da organiza- Portugal foi governado por um conselho de regência
ção do Estado. O que se percebe, agora, nos transborda- presidido pelo marechal inglês Beresford.
mentos da fronteira da legalidade estrita, é que a pró- FAUSTO, Boris. História do Brasil. Edusp. 1994.

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A Revolução do Porto de 1820 foi ambivalente na 16 Enem 2016 É hoje a nossa festa nacional. O Brasil in-
medida em que apresentou propostas liberais para teiro, da capital do Império a mais remota e insigni-
Portugal e conservadoras para o Brasil. A Revolu- ficante de suas aldeolas, congrega-se unânime para
ção do Porto pode ser lida como um empecilho ao comemorar o dia que o tirou dentre as nações depen-
Brasil, pois dentes para colocá-lo entre as nações soberanas, e
a) a aliança das Cortes de Lisboa com o chamado entregou-lhe os seus destinos, que até então haviam
“partido brasileiro”, que temia uma revolução po- ficado a cargo de um povo estranho.
pular, defendia a manutenção da subordinação Gazeta de Notícias, 7 set. 1883.
do Brasil à Metrópole.
b) propunha a anulação das medidas liberais ado- As festividades em torno da Independência do Brasil
tadas no Brasil, no Período Joanino, que bene- marcam o nosso calendário desde os anos imediata-
ficiaram tanto os ingleses quanto os grandes mente posteriores ao 7 de setembro de 1822. Essa
proprietários rurais brasileiros. comemoração está diretamente relacionada com
c) defendia a neutralização da pressão inglesa con- a) a construção e manutenção de símbolos para a
tra a recolonização, através do compromisso de formação de uma identidade nacional.
manter os privilégios comerciais obtidos pela In- b) o domínio da elite brasileira sobre os principais
glaterra no Brasil, entre 1808 e 1821. cargos políticos, que se efetivou logo após 1822.
d) pretendia enviar forças militares da Santa Aliança c) os interesses de senhores de terras que, após a
para conduzir a Família Real de volta a Portugal, Independência, exigiram a abolição da escravidão.
independente do desejo contrário dos brasileiros. d) o apoio popular às medidas tomadas pelo governo
e) o envio de um representante direto das Cortes imperial para a expulsão de estrangeiros do país.
de Lisboa para o Rio de Janeiro, que obrigava os e) a consciência da população sobre os seus direi-
representantes das províncias brasileiras a res- tos adquiridos posteriormente à transferência da
ponderem somente a ele. Corte para o Rio de Janeiro.

15 Enem 2015 É simplesmente espantoso que esses nú- 17 Enem Eleições, no Império, eram um acontecimento
cleos tão desiguais e tão diferentes se tenham man- muito especial. Nesses dias o mais modesto cidadão
tido aglutinados numa só nação. Durante o período vestia sua melhor roupa, ou a menos surrada, e exi-
colonial, cada um deles teve relação direta com a me- bia até sapatos, peças do vestuário tão valorizadas
trópole. Ocorreu o extraordinário, fizemos um povo- entre aqueles que pouco tinham. Em contraste com
-nação, englobando todas aquelas províncias ecológi- essa maioria, vestimentas de gala de autoridades ci-
cas numa só entidade cívica e política. vis, militares e eclesiásticas tudo do bom e do melhor
RIBEIRO, D. O povo brasileiro: formação e sentido do Brasil. compunha a indumentária de quem era mais que um
São Paulo: Cia. das Letras, 1988. cidadão qualquer e queria exibir em público essa sua
privilegiada condição.
Após a conquista da autonomia, a questão pri- CAVANI, S. Às urnas, cidadãos! In: Revista de História da Biblioteca
mordial do Brasil residia em como garantir sua Nacional. Ano 3, nº- 26, nov. 2007.

unidade político-territorial diante das característi-


cas e práticas herdadas da colonização. Relacio- No Brasil do século XIX, a noção de cidadania estava
nando o projeto de independência à construção vinculada à participação nos processos eleitorais. As
do Estado nacional brasileiro, a sua particularida- eleições revelavam um tipo de cidadania carente da
de decorreu da igualdade jurídica defendida nesse mesmo período
a) ordenação de um pacto que reconheceu os direi- por muitos movimentos europeus herdeiros do Ilumi-
tos políticos da população, independentemente nismo devido à
de cor, sexo ou religião. a) exclusão dos analfabetos, que impedia a maioria
b) estruturação de uma sociedade que adotou os da população de participar das eleições.
privilégios de nascimento como critério de hierar- b) raridade das eleições, que criava apenas a ilusão
quização social. de participação entre os cidadãos.
c) realização de acordos entre as elites regionais, c) vigência da Constituição do Império, que definia
que evitou confrontos armados contrários ao pro- como cidadãos apenas aqueles que eram eleitos.
jeto luso-brasileiro. d) presença do Poder Moderador, que significava,
d) concessão da autonomia política regional, que na prática, a inutilidade das eleições legislativas.
atendeu aos interesses socioeconômicos dos e) existência do voto censitário, que reafirmava as
grandes proprietários. hierarquias sociais.
e) afirmação de um regime constitucional monárqui-
co, que garantiu a ordem associada à permanên- 18 Enem Após o retorno de uma viagem a Minas Ge-
cia da escravidão. rais, onde Pedro I fora recebido com grande frieza,

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seus partidários prepararam uma série de manifes- governo que há formado o projeto iníquo de nos sub-
tações a favor do imperador no Rio de Janeiro, ar- meter à mais abjeta escravidão (...).
mando fogueiras e luminárias na cidade. Contudo,
na noite de 11 de março, tiveram início os conflitos O trecho do Manifesto Farroupilha de 1838, referia-
que ficaram conhecidos como a Noite das Garrafa- -se ao
das, durante os quais os “brasileiros” apagavam as a) fortalecimento do poder central nas mãos da elite
fogueiras “portuguesas” e atacavam as casas ilumi- latifundiária, ligados ao setor exportador, impe-
nadas, sendo respondidos com cacos de garrafas jo- dindo assim a participação política das camadas
gadas das janelas. médias urbanas, sobretudo dos militares.
VAINFAS, R. (Org.). Dicionário do Brasil Imperial. Rio de Janeiro: b) estabelecimento de tarifas alfandegárias favorá-
Objetiva, 2008 (adaptado). veis aos interesses dos estanceiros gaúchos e
charqueadores e maior autonomia aos governos
Os anos finais do I Reinado (1822-1831) se caracteriza- provinciais.
ram pelo aumento da tensão política. Nesse sentido, c) desejo de um governo federalista capaz de limi-
a análise dos episódios descritos em Minas Gerais e tar o anseio e efetiva participação das classes po-
no Rio de Janeiro revela pulares e ampliar o poder dos grandes proprietá-
a) estímulos ao racismo. rios de escravos junto ao governo.
b) apoio ao xenofobismo. d) anseio autonomista das diversas províncias do
c) críticas ao federalismo. país e eliminação do regime de produção escra-
d) repúdio ao republicanismo. vista, vigente também no sul do país, para tentar
e) questionamentos ao autoritarismo. dinamizar o mercado consumidor nacional.
e) repúdio à política centralizadora do governo im-
19 Enem Art. 92. São excluídos de votar nas Assembleias perial, assim como às demais rebeliões popula-
Paroquiais: res que assolavam o país, defendendo reformas
I. Os menores de vinte e cinco anos, nos quais não sociais e a adesão a um regime unitarista.
se compreendam os casados, e Oficiais Militares,
que forem maiores de vinte e um anos, os Bacha- 21 Unesp 2015 A escravatura, que realmente tantos ma-
réis Formados e Clérigos de Ordens Sacras. les acarreta para a civilização e para a moral, criou no
IV. Os Religiosos, e quaisquer que vivam em Comu- espírito dos brasileiros este caráter de independência
nidade claustral. e soberania, que o observador descobre no homem
V. Os que não tiverem de renda líquida anual cem mil livre, seja qual for o seu estado, profissão ou fortuna.
réis por bens de raiz, indústria, comércio ou empregos. Quando ele percebe desprezo, ou ultraje da parte de
Constituição Política do Império do Brasil (1824). Disponível em: https:// um rico ou poderoso, desenvolve-se imediatamente o
legislação.planalto.gov.br. Acesso em: 27 abr. 2010 (adaptado). sentimento de igualdade; e se ele não profere, conce-
be ao menos, no momento, este grande argumento:
A legislação espelha os conflitos políticos e sociais não sou escravo. Eis aqui no nosso modo de pensar, a
do contexto histórico de sua formulação. A Consti- primeira causa da tranquilidade de que goza o Brasil:
tuição de 1824 regulamentou o direito de voto dos o sentimento de igualdade profundamente arraigado
“cidadãos brasileiros” com o objetivo de garantir no coração dos brasileiros.
a) o fim da inspiração liberal sobre a estrutura polí- (Padre Diogo Antônio Feijó apud Miriam Dolhnikoff.
tica brasileira. O pacto imperial, 2005.)

b) a ampliação do direito de voto para a maioria dos


brasileiros nascidos livres. O texto, publicado em 1834 pelo Padre Diogo Antô-
c) a concentração de poderes na região produtora nio Feijó,
de café, o Sudeste brasileiro. a) parece rejeitar a escravidão, mas identifica efeitos
d) o controle do poder político nas mãos dos gran- positivos que ela teria provocado entre os brasileiros.
des proprietários e comerciantes. b) caracteriza a escravidão como uma vergonha
e) a diminuição da interferência da Igreja Católica para todos os brasileiros e defende a completa
nas decisões político-administrativas. igualdade entre brancos e negros.
c) defende a escravidão, pois a considera essencial
20 Mackenzie-SP 2017 ... esses males, nós os temos su- para a manutenção da estrutura fundiária.
portado em comum com as outras Províncias da d) revela as ambiguidades do pensamento conserva-
União Brasileira (...). Para que lançássemos mãos das dor brasileiro, pois critica a escravidão, mas enfati-
armas foi preciso a concorrência de outras causas (...) za a importância comercial do tráfico escravagista.
que nos dizem respeito (...) e que nos trouxeram ínti- e) repudia a escravidão e argumenta que sua ma-
ma convicção da impossibilidade de avançarmos na nutenção demonstra o desrespeito brasileiro aos
carreira da Civilização e prosperidade sujeitos a um princípios da igualdade e da fraternidade.

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22 UFV-MG Nas Revoltas subsequentes à abdicação, o b) ampla autonomia das províncias, de acordo com
que aparecia era o desencadeamento das paixões, um modelo que veio a ser adotado, mais tarde,
dos instintos grosseiros da escória da população; era a pela Constituição de 1891.
luta da barbaridade contra os princípios regulares, as c) revoluções e movimentos sediciosos, que exi-
conveniências e necessidades da civilização. Em 1842, giam um modelo centralizador, em benefício das
pelo contrário, o que se via à frente do movimento era várias regiões do país.
a flor da sociedade brasileira, tudo que as províncias d) revoluções e movimentos sediciosos, exigindo
contavam de mais honroso e eminente em ilustração, que o futuro D. Pedro II assumisse o trono para re-
em moralidade e riqueza. duzir a influência do chamado “partido português”.
(TIMANDRO. “O libelo do povo”, 1849) e) autonomia relativa das províncias, favorecendo o
poder das elites regionais mais significativas.
O texto anterior estabelece uma comparação entre
a composição social das rebeliões do início do pe- 25 Unesp 2017 A Revolta dos Malês, ocorrida em 1835
ríodo regencial e da revolução liberal de 1842. Essa na Bahia, contou com ampla participação popular e
visão refletia as distorções do ponto de vista da elite defendeu, entre outras propostas,
senhorial escravista ao julgar os movimentos popula- a) a rejeição ao catolicismo e a construção de uma
res. Historicamente, a Cabanagem e a Balaiada são ordem islâmica.
consideradas: b) a manutenção da escravidão de africanos e a am-
a) grandes revoltas de escravos, liberadas por Zum- pliação da escravização de indígenas.
bi dos Palmares. c) o retorno de D. Pedro I e o restabelecimento da
b) revoltas contra a dominação da metrópole portugue- monarquia absolutista.
sa, no contexto da crise do antigo sistema colonial. d) a ampliação das relações diplomáticas e comer-
c) revoltas de proprietários brancos, contrários à cen- ciais com os países africanos.
tralização política em torno da pessoa do Imperador. e) o reconhecimento dos direitos e deveres de todo
d) conflitos raciais e de classe, envolvendo índios, cidadão brasileiro.
vaqueiros, negros livres e escravos.
e) rebeliões sociais que, com o apoio dos militares, 26 Unespar-PR 2016 Sobre as revoltas provinciais de-
pretendiam a proclamação da república e o fim da flagradas no período regencial, considere as seguin-
monarquia. tes alternativas:
I. A Cabanagem – PA (1835-1840) foi um movimento
23 UEL-PR No governo do regente Araújo Lima (1837- popular com a participação de índios, caboclos
-1840) foi aprovada a Lei de Interpretação ao Ato Adi- e negros que se opôs à Regência e ocupou, por
cional. Esta lei alguns meses, o governo da província.
a) modificava alguns pontos centrais da Constitui- II. A Revolução Farroupilha – RS/SC (1835-1845) foi
ção vigente, extinguindo o Conselho de Estado, uma revolta motivada, sobretudo, pela política tri-
mas conservando o Poder Moderador e a vitali- butária do governo regencial, que, por sua vez,
ciedade do Senado. conseguiu conter o movimento, punir os líde-
b) buscava a centralização como forma de enfrentar res e impor as tarifas que causaram o início do
os levantes provinciais que ameaçavam a ordem movimento.
estabelecida, limitando os poderes das Assem- III. A Sabinada – BA (1837-1838) pregava a República
bleias Legislativas Provinciais. federativa, estabelecendo em 1837 o novo regi-
c) criava o Município Neutro do Rio de Janeiro, ter- me na BA, o qual se manteria até a maioridade
ritório independente da Província, como sede da do futuro imperador. Após reação dos senhores
administração central, propiciando a centraliza- de engenho do Recôncavo e do governo central
ção política. (com a Armada) a capital da BA foi retomada.
d) revelava o caráter liberal dos Regentes, suspenden- IV. As revoltas Cabanagem, Revolução Farroupilha e
do o exercício do Poder Moderador pelo governo, Sabinada tinham em comum demandas regionais
eixo da centralização política no Primeiro Reinado. não atendidas pelo governo central. Em nenhum
e) restabelecia os poderes legislativos dos Conse- caso, seus líderes pretendiam ampliar as conquis-
lhos Municipais, colocando nas mãos dos conse- tas para o âmbito nacional.
lheiros o direito de governar as Províncias. a) I, II e III estão corretas;
b) II e IV estão corretas;
24 Fuvest-SP A descentralização política do Brasil, no c) I, III e IV estão corretas;
período regencial, resultou em: d) Todas estão corretas;
a) deslocamento das atividades econômicas para a e) II, III e IV estão corretas.
região centro-sul, através de medidas de favoreci-
mento tributário.

CAPÍTULO T3 / Regência 101

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Gabarito

FRENTE B Consolidando saberes


1 C
CAPÍTULO T1 2 A
Independência como processo 3 B
4 D
Leitura de documentos 5 E
a) Maria Graham considera a província como um reduto político 6 A
liberal, republicano e federalista. 7 B
b) As relações políticas entre Dom Pedro I e Pernambuco eram 8 A
conflituosas, uma vez que a província defendia a adoção de 9 B
uma República federativa, em contraponto à monarquia cen- 10 A
tralizadora de poder. 11 C
c) Graham tratou de informar aos revolucionários que as “forças 12 B
legais” eram muitas e tinham condições de vitória. Junto disso, 13 B
relatou que Pernambuco poderia sofrer grande derrota e la- 14 A
mentou a resistência política dos revolucionários.
SUPERAÇÃO

Aplicando conhecimentos C
1 A fragmentação territorial da América hispânica contribuiu para
o avanço dos ideais republicanos, enquanto a centralização
monárquica manteve a integridade territorial brasileira. CAPÍTULO T2
2 Primeiro Reinado: cultura e política
a) É possível observar que, com a independência, houve a
fragmentação do território das colônias espanholas, en- Leitura de documentos
quanto o Brasil manteve sua unidade territorial tal como a) As duas imagens indicam a exaltação de um herói em ato
era na colônia portuguesa. militar. No quadro de Pedro Américo, há uma tentativa de
b) Ambos os processos independentistas foram resultado enaltecer D. Pedro I e o grito de independência, comparan-
das guerras napoleônicas, além de contar com ideais do do o imperador brasileiro ao imperador francês e seus feitos
liberalismo e do iluminismo. militares.
3 Porque diminuiria significativamente a mão de obra – o b) O momento da Proclamação da Independência não contou
que geraria uma crise econômica – e contrariava as elites que com a participação popular, assim como não foi um ato gran-
apoiavam a independência do país e o estabelecimento de dioso, como o demonstrado na imagem.
uma monarquia.
4 Aplicando conhecimentos
a) Com a chegada da família real houve a abertura dos por- 1 O charque no Sul e Sudeste, o comércio local no entorno das
tos, selando, assim, o fim do pacto colonial. Minas Gerais, a produção de açúcar no Nordeste e de algodão
b) As guerras de independência marcaram a expulsão defi- no Norte.
nitiva dos portugueses que ainda tentavam restabelecer o 2 Sim, como a unidade territorial e a configuração da maior parte
controle sobre o Brasil. das fronteiras.
5 O Bloqueio Continental imposto por Napoleão para tentar isolar 3 A estreita relação comercial entre Brasil e Inglaterra desde o
a Inglaterra economicamente foi desobedecido por Portugal, período colonial.
que manteve a aliança comercial com os ingleses. Diante dis- 4 Dependência econômica em relação aos países industrializa-
so, as tropas napoleônicas invadiram Portugal, levando a famí- dos do Hemisfério Norte e agroexportação.
lia real e toda a Corte portuguesa a refugiar-se no Brasil. Che-
gando ao Brasil, Dom João VI decretou a abertura dos portos, Consolidando saberes
o que significou o fim do pacto colonial e contribuiu para o 1 D 5 C
fortalecimento das elites nacionais, criando as condições para 2 Soma: 08 + 16 = 24 6 D
o processo de independência. 3 B 7 D
6 D 4 A 8 Soma: 04 + 16 = 20

102 GABARITO

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CAPÍTULO T3 Consolidando saberes
Regência 1 C 10 E
2 D 11 D
Leitura de documentos 3 E 12 Soma: 01 + 04 + 08 + 16 = 29
a) O autor do texto enfatiza que os negros tiveram um papel 4 C 13 C
fundamental na organização do exército republicano da 5 E 14 E
Farroupilha. Porém, a historiografia tradicional omite essa 6 E 15 B
participação. 7 D 16 A
b) Existem historiadores que defendem que os lanceiros negros fo- 8 B 17 D
ram traídos no episódio. Com isso, as autoridades enviadas pela 9 A
Corte poderiam evitar o problema da libertação dos escraviza-
dos que apoiaram a Farroupilha. Porém, há outros historiadores No Enem é assim
que defendem que isso foi uma falsificação e que os lanceiros 1 E
negros foram vítimas de uma emboscada das tropas imperiais. 2 B
c) Não. Como o texto destaca, o massacre dos lanceiros ne- 3 D
gros mostra que houve um tratamento assimétrico. Enquanto 4 C
a Corte negociou com os setores das elites envolvidos na 5 C
Farroupilha, muitos negros e escravizados foram massacrados 6 A
pelas tropas imperiais. 7 D
8 C
Aplicando conhecimentos 9 A
1 E 10 B
2 O primeiro fator a ser destacado é o contexto de instabilida- 11 C
de política próprio dos impasses da Regência; o segundo são 12 D
as tensões em torno dos impostos sobre o charque gaúcho. 13 B
Ambas as situações estimularam a decisão de autonomia por 14 B
parte dos sulistas e sua longeva independência do país. 15 E
3 O Ato Adicional de 1834, com sua proposta de descentraliza- 16 A
ção política e econômica, foi um fator decisivo para que his- 17 E
toriadores considerassem a Regência como uma experiência 18 E
federalista. Afinal, houve a possibilidade de uma gestão local 19 D
mais eficiente tendo em vista o maior controle administrativo 20 B
permitido às províncias. 21 A
4 Houve a criação da Guarda Nacional composta por setores da 22 D
elite financeira e latifundiária, o que reforçou a conservação do 23 B
status quo. Além disso, a Corte negociou com lideranças em 24 E
algumas revoltas visando à construção de acordos que garan- 25 A
tissem a unidade territorial do país. 26 C

GABARITO 103

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A evolução é uma das
palavras frequentemente
associadas ao mundo
atual, como nas
referências sobre a
tecnologia.
O estudo da evolução e
do desenvolvimento das
sociedades faz parte do
campo de investigação da
Sociologia.

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Conceito de internet das coisas
Sociologia

Surgimento da
Sociologia como ciência
O texto a seguir é parte de uma matéria de agosto
de 2019 do jornal eletrônico Correio da Paraíba e noticia
o lançamento de um livro sobre consciência e universo
digital, do brasileiro Fabio Pereira.
[...] Na prática, trata-se de um manual para ajudar pes-
soas a tomarem as rédeas de suas vidas e, assim, cons-
truírem um futuro melhor. A obra apresenta os “5 Cs” da
Consciência Digital e aborda ainda temas como o contro-
le do uso do celular, a identificação de ferramentas digi-
tais manipuladoras, e o direcionamento da tecnologia em
prol de uma sociedade evoluída.
Especialista lança livro e discute foco, autocontrole e segurança na era digital. Portal
Correio, 19 jul. 2019. Disponível em: https://portalcorreio.com.br/palestra-em-jp-discute-
autocontrole-foco-e-seguranca-na-era-digital/. Acesso em: 3 jul. 2021.

A notícia menciona “o direcionamento da tecnologia


em prol de uma sociedade evoluída”. O que você
entende por “sociedade evoluída”? Como essa noção
se relaciona com o mundo digital, hoje?
Um autor central, que abordaremos nesta Unidade, o
francês Auguste Comte, falava, no século XIX, sobre
relações entre sociedades e evoluções. Considerando
o que você já leu sobre esse período da história,
sobretudo em relação à Europa, com que evoluções ele
pode ter se deparado?
A ideia de evolução sempre traz uma perspectiva
positiva? Nesse sentido, seria justo dizer,
sociologicamente, que há sociedades mais “evoluídas”
e, portanto, “melhores” que outras?

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Primeiras formulações do

T1
CAPÍTULO
pensamento social

dabldy/iStockphoto.com
Bandeira brasileira. Ao fundo, o morro do Corcovado, no Rio de Janeiro (RJ). Qual será o sentido sociológico da expressão
“Ordem e Progresso”?
O texto, reproduzido a seguir, faz parte de uma matéria de 2018 da BBC Brasil publicada por ocasião do Dia da
Bandeira, comemorado em 19 de novembro. Leia-o com atenção. Em seguida responda às questões propostas.
Segundo o professor do Departamento de História da Faculdade de Ciências e Letras da UNESP
André Figueiredo Rodrigues, o uso de bandeiras para representar uma nação começou entre os
séculos 18 e 19, quando os países, ao passarem por revoluções, começaram a pensar em símbolos que
os identificassem como nação unida e soberana.
[...]
O lema escrito na bandeira [brasileira], “Ordem e Progresso”, tem inspiração em uma frase de
Auguste Comte, criador da filosofia positivista, que diz: “O amor por princípio e a ordem por base; o
progresso por fim”.
“Comte acreditava que o funcionamento da sociedade deveria promover o bem-estar. Para isso, seus
membros deviam aprender desde crianças a importância da obediência e da hierarquia. Daí vem o nosso
lema: o ‘progresso’ é resultado do aperfeiçoamento e do desenvolvimento da ‘ordem’”, explica Rodrigues. [...]
MODELLI, Laís. Dia da Bandeira: 10 coisas que você talvez não saiba sobre o símbolo brasileiro. BBC Brasil, 19 nov. 2018. Disponível em: https://www.
bbc.com/portuguese/brasil-46259929. Acesso em: 2 ago. 2019.

• Você conhecia a explicação sobre o lema escrito na nossa bandeira nacional?


• O professor na reportagem comenta as ideias de ordem e progresso, desenvolvidas por Comte,
teórico que estudaremos neste capítulo. Que outras relações você poderia fazer entre esses dois
termos?
• “Ordem e progresso” se fazem presentes na realidade social brasileira? Justifique.

Neste capítulo, será abordada a habilidade EM13CHS101.

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Sociedade em estágios:
a perspectiva positivista de Comte
O francês Auguste Comte (1798-1857) é considerado, tradicionalmen-

Granger/Shutterstock
te, o pai da Sociologia. Foi ele quem empregou pela primeira vez esse
termo, no quarto volume do seu Curso de Filosofia Positiva, em 1839
(publicação em seis volumes, entre 1830 e 1842).
Nessa obra, o teórico defende que os conhecimentos, no decorrer da
história, passaram por três estágios ou fases, tanto no indivíduo como na
espécie humana.

• Estágio teológico – Nesse primeiro estágio, as pessoas atribuíam


os fenômenos a causas mágicas, a divindades ou outras entidades
sobrenaturais. Nesse estado, a mitologia e a religião serviam como
principal método de conhecimento.
• Estágio metafísico – Nesse período, o ser humano buscava explicar
o mundo por meio de conceitos abstratos. É o estado em que a filoso-
fia é o principal método de conhecimento.
• Estágio positivo – Nessa fase última, a humanidade não mais busca
respostas nem em causas imaginadas nem em abstrações, mas se atém
aos fatos e à observação das leis da natureza descobertas pelas ciên- Auguste Comte, fundador da Sociologia.
cias naturais, consideradas agora a forma madura do conhecimento.

Essa doutrina, uma das bases principais do pensamento de Comte, Metafísico: referente à Metafísica,
ficou conhecida como lei dos três estados. Dessa forma, ele entendia o estudo filosófico das ideias de
que considerava ser uma evolução da humanidade. E fazia uma compa- ser e de tudo o que transcende a
experiência física ou sensível.
ração das sociedades com o próprio indivíduo humano, que, assim como
esse, também passaria por essas etapas ao longo da vida: o primeiro
estado seria a infância (teológico); o segundo, a juventude (metafísico); e
o terceiro, a fase de maturidade (positivo).
lemony/Shutterstock.com

Para Comte, o desenvolvimento do ser humano, agrupado em infância, juventude e Fique


maturidade, seria equiparável ao desenvolvimento da sociedade e dos conhecimentos.
ligado
“Positivismo” vem de positivo.
Comte considerava que o
Sob essa perspectiva, compreendendo que se encontrava na fase po- conhecimento em sua forma mais
sitiva da história humana, é que Comte apresenta seu pensamento, uma avançada se baseava tão somente
corrente que passou a ser conhecida como positivismo. Como veremos nos fatos observáveis, concretos,
mais à frente, é sob essa ótica que ele conceberá sua visão sociológica. que chamava de fatos positivos, daí
Mas, antes, vejamos o contexto sociocultural em que ela se desenvolveu. o nome de sua sociologia.

CAPÍTULO T1 / Primeiras formulações do pensamento social 107

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Pensadores da Ciências Sociais

Sobre a lei dos três estados

No texto reproduzido abaixo, do Curso de Filosofia Positiva, Comte disserta sobre sua concepção da lei dos três es-
tados. Ela é o fundamento do pensamento positivista e representa tanto uma teoria do conhecimento como uma teoria
sobre a história. O conhecimento propriamente dito seria o científico, ou positivo, como Comte o chamava. Por sua vez, a
história mostraria como o conhecimento nas sociedades teria evoluído das noções teológicas, passando pelas metafísicas
até chegar ao estado positivo, mais avançado, científico e maduro. O mesmo poderia ser percebido na evolução de um
indivíduo.

Em primeiro lugar, basta, parece-me, enunciar tal lei para que sua justeza seja imediatamente verificada por todos
aqueles que possuam algum conhecimento aprofundado da história geral das ciências. Não existe uma única, com
efeito, que, tendo chegado hoje ao estado positivo, não possa ser facilmente representada por qualquer pessoa como
essencialmente composta, no passado, de abstrações metafísicas e, se se remontar ainda mais no tempo, como intei-
ramente dominada por concepções teológicas. Teremos, infelizmente, mais de uma ocasião formal de reconhecer, nas
diversas partes deste curso, que as ciências mais aperfeiçoadas conservam, ainda hoje, alguns traços muito sensíveis
desses dois estados primitivos.
Essa revolução geral do espírito humano pode ser facilmente constatada hoje, duma maneira sensível embora
indireta, considerando o desenvolvimento da inteligência individual. O ponto de partida sendo necessariamente o
mesmo para a educação do indivíduo e para a da espécie, as diversas fases principais da primeira devem represen-
tar as épocas fundamentais da segunda. Ora, cada um de nós, contemplando sua própria história, não se lembra
de que foi sucessivamente, no que concerne às noções mais importantes, teólogo em sua infância, metafísico em
sua juventude e físico em sua virilidade? Hoje é fácil esta verificação para todos os homens que estão ao nível de
seu século. [...]
COMTE, Auguste. Curso de Filosofia Positiva. José Arthur Giannotti e Miguel Lemos (Trad.). São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. 38.

Preocupado com a dissolução social que poderia causar crises, Comte vê na Sociologia uma ferramenta para
compreender a realidade social, de forma a organizá-la sob critérios científicos e, assim, promover o progresso e o
bem-estar geral. Uma boa parte de seu pensamento não exerce influência direta nas escolas de Sociologia atuais,
mas sua obra deixou uma significativa herança, uma vez que ele foi um dos primeiros a considerar a importância da
observação sistemática como parte necessária dos estudos sociológicos. Entre seus principais trabalhos, incluem-se
Curso de filosofia positiva (1830-42); Discurso sobre o espírito positivista (1844); Visão geral do positivismo (1848); e
Religião da humanidade (1856).

Positivismo em contexto
A primeira metade do século XIX, na França, foi marcada por diversos
conflitos políticos e sociais, decorrentes das transformações posteriores
à Revolução Francesa (1789-1799). A produção de Comte acontece ma-
joritariamente nesse período. Entretanto, a era de disseminação do posi-
tivismo viria sobretudo depois, se estendendo, aproximadamente, do fim
da primeira metade do século XIX aos primeiros anos do século seguinte.
Na Europa Central e Oriental, em 1848, ocorria a Primavera dos Povos,
conjunto de revoluções que se insurgira sobretudo contra crises econô-
Autocrático: vem de autocracia. micas e governos autocráticos. A onda revolucionária, no entanto, seria
Um Estado é autocrático quando contida em menos de um ano, pelas forças contrarrevolucionárias. Dessa
governado por um único líder, tal forma, à exceção desses eventos, bem como de uma guerra na Crimeia
como um ditador. Muitas vezes em 1854 e de um conflito franco-prussiano no começo dos anos 1870, a
ao longo da história, como nas era de disseminação e de maior influência do positivismo foi pacífica no
sociedades agrárias, o Estado continente europeu.
autocrático foi formado por
Essa época foi também de expansão de domínios europeus na Ásia e
famílias reais que governavam
por direito tradicional.
na África. Era o chamado neocolonialismo ou imperialismo. Nesse cenário,
potências industriais (sobretudo Inglaterra, França, Alemanha) consolida-
ram as transformações da Revolução Industrial como modo de produção.

108 SOCIOLOGIA

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Nas ciências, houve desenvolvimentos diversos. Podemos citar,
entre outros trabalhos, as pesquisas de Michael Faraday (1791-1867)
sobre a eletricidade; de Heinrich Hertz (1857-1894) sobre eletromag-
netismo; de James Joule (1818-1889) e outros sobre a termodinâmica;
de Charles Darwin (1809-1882) sobre a origem e a evolução das espé-
cies; de Dmitri Mendeleiev (1834-1907) sobre elementos químicos; de ... o filósofo francês René
Louis Pasteur (1822-1895) sobre a microbiologia; de Antonio Meucci Descartes
ajudou a desenvolver o conjunto
(1808-1889) e outros sobre a telefonia.
de teses do racionalismo,
Tudo isso contribuiu para mudanças radicais no continente. Houve, segundo as quais: 1) o
por exemplo, expressivo aumento dos centros urbanos; também cres- conhecimento provém mais
ceu a produção de riquezas; a medicina passava a tratar de doenças propriamente do intelecto do
infecciosas e a expandir sua atuação; tecnologias entravam em lares que das sensações; 2) o método
mais abastados etc. da Matemática deveria ser usado
Com todas essas alterações na Europa, verificou-se um entusiasmo como base para outras formas
em torno da ideia de progresso humano. Era senso comum à época de conhecimento.
que esse progresso encontraria suas causas nas ciências modernas e Além disso, o Iluminismo adotou
muitas das teses do empirismo
na indústria, tidas então como a panaceia do mundo, isto é, a solução
inglês. Segundo essa corrente,
para todos os problemas. o conhecimento provém da
Além desses acontecimentos, é importante mencionar as bases cul- experiência, de modo que
turais da tradição positivista. Entre elas estavam o racionalismo, que se seriam as Ciências naturais,
desenvolveu, especialmente, de René Descartes (1596-1650) às filoso- pautadas na experimentação,
fias do Iluminismo (século XVIII). A cosmovisão iluminista estava centra- aquelas capazes de produzir
da na ciência e em um racionalismo crítico com relação à tradição. conhecimento propriamente dito.
Apesar das diferenças entre o
racionalismo cartesiano (isto é,

Joseph Derby/The The National Gallery, Londres Gallery, Londres


de Descartes) e o empirismo
de muitos iluministas, há um
contexto comum que contribuiu
para a formação do espírito
positivista: a criação da ciência
moderna e a ideia que essa
é a forma mais excelente de
conhecimento.

O Iluminismo é uma das tradições culturais que influenciaram o positivismo. Na obra


Experimento com um pássaro em uma bomba de ar (1768), de Joseph Derby (1734-1797),
pode-se notar um aspecto do Iluminismo: a valorização do experimento como método de
conhecimento.

Estágio positivo e Física social


Nesse cenário de valorização das ciências, que Comte identifica
como estágio positivo, análises teológicas e metafísicas estavam em
declínio, todavia ainda permaneciam presentes e influentes no âmbito
dos estudos de fenômenos sociais, o que para ele era algo lamentável.

CAPÍTULO T1 / Primeiras formulações do pensamento social 109

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No seu Curso de Filosofia Positiva, Comte argumenta que faltaria com-
pletar as ciências, formulando, para as análises sociais, um campo do
saber que ele chama de Física social. Esse é o primeiro nome que ele
dá à Sociologia. E essa ciência teria papel primordial, já que estaria no
topo em uma hierarquização das áreas do conhecimento (no gráfico,
você observa a hierarquia das seis ciências consideradas fundamentais
pelo positivismo). Isso devido à complexidade do seu objeto de estu-
do: a sociedade. Assim compreendia o teórico francês, que via nesse
saber a finalidade essencial do positivismo.

Sociologia

Biologia

Complexidade crescente
Química

Física

Astronomia

Matemática

Hierarquia comtiana das ciências.

E como ele concebia as ciências? Elas seriam campos voltados para


as investigações das leis dos fenômenos, permitindo que o ser humano
realizasse previsões a seu favor. Haveria, então, uma busca por leis cons-
tantes. Para o positivismo, os primeiros que se dispuseram a essa busca
foram os astrônomos e matemáticos da Grécia antiga. Francis Bacon
(1561-1626), Galileu Galilei (1564-1642) e René Descartes, na Idade Moder-
na, procuraram também isso, sendo considerados por Comte os verda-
deiros fundadores da perspectiva positivista. “Ver para prever” torna-se
um lema positivista, e a previsão é que levaria os humanos a exercer
domínio sobre a natureza.
Contudo, Comte possuía uma visão restrita da ciência. Segundo
ele, uma pesquisa só deveria ser conduzida se fosse provada de an-
temão sua utilidade prática. Segundo ele, isso contribuiria para uma
Discussão em sala estabilidade nas ciências e, por extensão, na sociedade. Dessa forma,
ela deveria ser incumbência não dos cientistas, e sim de “genuínos
Conhecimento científico e filósofos”.
sua utilidade Aplicada aos estudos da sociedade, a Física social ou Sociologia,
Você acredita que uma pesquisa pautada por fatos, iria chegar às leis científicas que regem os fenô-
científica só possa ser levada menos desse campo, de modo a resolver seus problemas e a prever
adiante se for evidenciada, desde e gerenciar situações futuras. Seria algo semelhante ao que a Física,
o início, sua utilidade? A história de por exemplo, faz com as leis do universo relativas ao movimento, à
importantes descobertas científicas matéria e à energia.
confirma ou não essa ideia de A concepção comtiana dividiu em dois ramos esse saber sociológico.
Comte? Uma investigação que hoje
De um lado, haveria a estática social, estudo das condições que diferen-
não tem tão clara sua utilização
tes sociedades, de diferentes tempos, teriam em comum e seriam mais
necessariamente não o terá em um
futuro a curto ou a longo prazo? Por permanentes, por exemplo: a sociabilidade dos seres humanos, o tra-
outro lado, em nossa educação, qual balho e sua divisão e os agrupamentos familiares. Conexões e esforços
é o papel do amor ao conhecimento em comum garantiriam essa estática. Além disso, haveria inter-relações
pelo próprio conhecimento? Discuta nessas dimensões. Assim, âmbitos econômicos, por exemplo, estariam
essas questões com seus colegas. vinculados a outras esferas, como as políticas.

110 SOCIOLOGIA

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De outro lado, estaria a dinâmica social. Esta abrangeria o estudo da-
quela dimensão da sociedade que é mais passível de transformações, de-
senvolvimentos e progressos. Seu fundamento seriam os três estados, vistos Fique
como uma lei científica. Atentando para a sociedade europeia e fazendo um ligado
recorte em sua história, Comte considerava que o primeiro estado equivalia O que garante também a
ao período medieval feudal (século V ao XV); o segundo, ao período que vai estática social é um fator já
das Reformas protestante e católica à Revolução Francesa (século XVI ao observado por Aristóteles
XVIII); e o terceiro, à era industrial (a partir dos séculos XVIII e XIV). (384-322 a.C.) e retomado
Notamos aqui a intenção de Comte de conciliar elementos contrários: por Comte: “a separação
o dinamismo e a estabilidade da sociedade. Como isso ocorre? Comte es- dos ofícios e a convergência
creve que nenhuma ordem legítima pode se estabelecer e durar se não dos esforços”. Isso quer
estiver compatível com o progresso. Ao mesmo tempo, nenhum progres- dizer que a sociedade é
so pode ocorrer se não for compatível com uma ordem. Desse modo, a composta de indivíduos,
dinâmica social se desenvolve harmonicamente quando há equilíbrio na que vão se diferenciando,
ou seja, vão realizando
estática social. Ou seja, só pode haver progresso (dinâmica social) à medi-
tarefas específicas, criando
da que este está assentado em uma ordem (estática social), e vice-versa. uma rede de colaboração,
Nesse contexto, qual a missão da Sociologia? Seria descobrir as leis de forma voluntária ou não,
das naturezas e das relações entre ordem e progresso, de modo a pôr a formando e mantendo,
sociedade nesse caminho, caso ela venha a se desviar. assim, a estabilidade social.
Limbourg brothers/Musée Condé, Chantilly, França

Jean-Pierre Louis Laurent Houël/


Biblioteca Nacional da França, Paris

The Picture Art Collection/Alamy/Fotoarena

A primeira imagem é a ilustração de um ambiente feudal em um livro de orações do século XV; a segunda, de Houël (1735-1813), retrata
um dos eventos da Revolução Francesa (A Tomada da Bastilha); a terceira, de Robert Stieler (1847-1908), ilustra uma área industrial.
Podemos dizer que, para Comte, cada acontecimento desses se encaixaria em um dos três estágios.

CAPÍTULO T1 / Primeiras formulações do pensamento social 111

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Poderíamos nos perguntar: como Auguste Comte propõe chegar
ao conhecimento sociológico e à definição das leis dos fenômenos
da sociedade? Para ele, três vias permitiriam isso: a observação, a
experimentação e uma metodologia. Funcionaria da seguinte manei-
ra: observa-se mediante a lei dos estágios; realizam-se experimentos
sem manipular os fatos e acontecimentos, procurando-se focar na
descrição objetiva deles; e, por fim, estabelece-se uma metodologia
por meio da comparação entre sociedades e momentos da história.

Influência de Saint-Simon
Claude-Henri de Saint-Simon (1760-1825) foi um aristocrata fran-
cês cuja obra no campo social inspirou profundamente importantes
autores da Sociologia, como o próprio Auguste Comte, mas também
Karl Marx e Émile Durkheim (cujas obras estudaremos nos próximos
capítulos). Três ideias fundamentais de Saint-Simon são responsáveis
por tal influência. Em primeiro lugar, o conceito conforme o qual a
história é evolutiva e se desenvolve por meio da relação entre novas
formas de pensar, como o Iluminismo e o positivismo, e de novas for-
mas de organização social, como o feudalismo e a industrialização.
Em segundo lugar, a ideia de que a vida social é regida por leis que
podem ser descobertas pela ciência. E, por último, a visão de acordo
com a qual os cientistas e os industriais seriam os mais aptos para
solucionar os problemas sociais, devendo, por esse motivo, ser os
organizadores da sociedade.
Comte foi colaborador e discípulo de Saint-Simon, mas, posterior-
mente, os dois romperiam a parceria, por alguns desentendimentos
ou divergências teóricas. Entre as ideias sansimonistas com as quais
Comte trabalhou mais especificamente estavam a de que a história
humana é marcada pela lei do progresso; a de que o progresso nas
ciências teria levado à superação de concepções teológicas e me-
tafísicas; e a do desenvolvimento do empreendedorismo industrial.

Por que apenas no século XIX?


Reflexões teóricas sobre a sociedade existem desde outros pe-
ríodos. Os gregos antigos, por exemplo, já viam o ser humano
como um ser social e político. As épocas posteriores também
conheceriam argumentações voltadas para esse tema. No en-
tanto, sobretudo em seu nascimento, a Sociologia parte da
análise da sociedade moderna, industrial e científica, ainda
Morphart Creation/Shutterstock.com

que não se limite a ela. Além disso, essa Sociologia nascen-


te procura realizar tal análise a partir de um método próprio,
análogo ao das ciências naturais, uma vez que considera
que uma sociedade científica (industrial) só pode ser com-
preendida cientificamente.
Em outras palavras, o pensamento sociológico só vi-
ria a se formar, de fato, no contexto do século XIX. No
decorrer desse mesmo século, ele ganhará desenvol-
vimentos e sistematizações enquanto ciência e saber
autônomo, como veremos nos próximos capítulos.

Saint-Simon, fonte de inspiração para


muitos dos primeiros sociólogos.

112 SOCIOLOGIA

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Organização social e progresso ordenado
Há pouco falamos da evolução social por meio dos estágios e da
dinâmica social. Mas como Comte entendia a questão da organização
Fique
política? Se observarmos os diferentes estágios, verificaremos que, do ligado
primeiro para o segundo, passou-se, em muitos casos, de monarquias, Embora Comte criticasse as
em que os reis eram tidos como representantes divinos e centralizavam guerras, isso não impediu
o poder, para Estados modernos, que possuem teorias como a da sepa- que muitos usassem os
ração de poderes (como Legislativo, Judiciário e Executivo). argumentos de inspiração
No entanto, no estágio positivo, Comte idealizava uma sociedade ge- positivista para, de fato,
rida de maneira diferente: justificar o neocolonialismo.
• haveria preservação de uma estabilidade ou ordem social;
• os cientistas e os industriais (uma minoria) governariam e definiriam as
condições sociais com base nas ciências (cabe lembrar da hierarquia
das ciências proposta por Comte);
• as mudanças sociais ocorreriam sem revoluções ou grandes saltos;
• dos governantes seria esperado responsabilidade, e dos governados
seria esperada obediência;
• a posição social de cada pessoa seria determinada pelas capacida-
des que apresentasse (o que levaria a uma justiça social com base na
meritocracia);
• o progresso conviveria com a ordem, ambos voltados para um pleno
desenvolvimento da humanidade.

Em termos de economia, Auguste Comte considerava a legitimida-


de da propriedade privada e do acúmulo de riquezas. O enriquecimento
seria indispensável ao progresso, uma vez que uma geração transmitiria
mais riquezas para as próximas. Nesse contexto, os que detinham mais
bens teriam mais poder; entretanto, o poder seria identificado com a ideia
de responsabilidade, em vista da sociedade.
Quanto a guerras, o positivismo entendia que estas teriam sido necessárias
em outros contextos, em conquistas territoriais, formações de Estados etc., mas
que não fariam mais sentido na sociedade positiva e industrial. Os conflitos se-
riam anacrônicos: o aumento de riquezas de uma nação ou um povo ocorreria
mediante a ciência e o trabalho, e não por meio de resultados bélicos.
As guerras, de acordo com Comte, seriam “[...] completamente incom-
patíveis com as mais perseverantes disposições de todas as populações
civilizadas” (Cours de Philosophie Positive, v. 6, p. 353). E ele acrescenta:
“[...] todos os espíritos verdadeiramente filosóficos devem facilmente
reconhecer, com uma perfeita satisfação, a um só tempo intelectual e mo-
ral, que é chegada, enfim, a época na qual a guerra séria e durável deve
desaparecer totalmente da elite da humanidade. [...]”
COMTE, Auguste. Cours de Philosophie Positive. 4. ed. Paris: Librairie J.-B. Baillière et fils, 1877. v. 6.
p. 354-55. (Tradução livre).
anna42f/iStockphoto.com

O desenvolvimento da Europa no século XIX foi importante para a consolidação do imaginário positivista. No desenho, Berlim (Alemanha).

CAPÍTULO T1 / Primeiras formulações do pensamento social 113

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Em semelhante linha, conquistas imperialistas em territórios da África
e da Ásia (neocolonialismo) eram vistas pelo positivismo como desastro-
sas, uma vez que criavam imposições por meios violentos. Comte critica,
inclusive, a escravidão colonial, que, nas palavras dele, se baseava em
uma “odiosa justificativa”, ligada ao “objetivo ilusório de estabelecer di-
retamente, no interesse final da civilização universal, a preponderância
material das populações mais avançadas sobre aquelas que são menos
avançadas” (COMTE, p. 352).

Culto à humanidade
Em Sistema de política positiva, obra publicada na década de 1850,
Comte, movido por um desejo de contribuir para o que ele entendia como
necessidade de profunda regeneração social, preconiza a fundação de
uma religião positivista. Em lugar da veneração a divindades, Comte pro-
põe a veneração da humanidade, apresentada como Grande Ser, englo-
bando vivos, mortos e os que ainda não nasceram.
Inspirado por sua admiração pela estrutura e pela universalidade da
Igreja Católica, o teórico baseou-se em certos conteúdos dessa religião
para elaborar sua proposta religiosa: a doutrina seria composta pelo
pensamento positivista e pelas ciências; haveria sacerdotes e ritos de ini-
ciação, como uma espécie de batismo, entre outros ritos de passagem;
Rito de passagem: celebração
os dias da semana seriam consagrados a uma das ciências tidas como
que, em determinada cultura,
marca alguma mudança de fase
fundamentais (incluindo-se a Moral); haveria dias e meses dedicados a
ou evento de significado especial comemorar pensadores ou autores consagrados (o que faz lembrar as
para um indivíduo ou um grupo, celebrações de datas e santos católicos); e a mulher figuraria como pro-
como aniversários, formaturas, tetora e anjo da guarda (o que foi inspirado em uma amada de Comte
casamentos, funerais etc. associada, ainda, à figura de Maria, mãe de Jesus).
O lema desse sistema religioso é a máxima positivista “O amor por
princípio e a ordem por base; o progresso por fim”, que, como vimos
na abertura deste capítulo, inspirou o lema da atual bandeira brasileira.
Templos positivistas chegaram a ser edificados, inclusive no Brasil.

Jean-Pierre Dalbéra (CC BY 2.0)/Flickr

Edifício religioso positivista em Paris.

114 SOCIOLOGIA

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Outras faces do positivismo
O ideário positivista envolve também outras vertentes culturais.
Fique
Veremos, a seguir, algumas delas. ligado
Tal tese de Taine poderia ser
Ainda na França compreendida como uma
Na França, a partir de Comte, outros desenvolveram visões que pos- espécie de determinismo.
suem influência das perspectivas positivistas. Alguns dos que se desta- Determinismo em geral é
caram foram Hippolyte Taine (1828-1893) e Claude Bernard (1813-1878). uma doutrina segundo a
O primeiro fez aplicações, sobretudo, na crítica artístico-literária, defen- qual as ações humanas têm
sua origem em elementos
dendo que qualquer obra nesse campo seria resultado de um contexto
externos à liberdade do
social e de condições psicológicas e históricas. Teorizava assim que o
indivíduo, como o meio, a
comportamento humano seria determinado por basicamente três fato- história, a biologia etc.
res: meio, raça e momento histórico. O segundo, ainda que não tenha
sido propriamente um positivista, como fisiologista, desenvolveu um
método experimental (laboratorial) na Medicina clínica: as hipóteses se- Fisiologista: a fisiologia é o
riam o objeto da experimentação, de maneira que a ciência nessa es- ramo da biologia que estuda as
fera poderia ser vista como uma resultante de tentativas, ou, em outras diversas funções dos seres vivos,
palavras, de erros e acertos. Tais contribuições ajudaram o desenvol- sejam físicas, químicas ou mecâni-
cas. É o estudo do funcionamento
vimento das ciências bem como o clima geral de confiança e otimismo
do organismo.
com relação aos seus métodos e resultados.

Léon-Augustin Lhermitte/Wellcome Colletion, Londres

O positivismo teve aplicações em áreas como a Medicina, no século XIX. A tela aqui reproduzida é Claude Bernard com seus alunos, do
artista Léon Lhermitte (1844-1925).

CAPÍTULO T1 / Primeiras formulações do pensamento social 115

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Na Inglaterra
Hi-Story/Alamy/Fotoarena

Na Inglaterra, o positivismo está, em uma verten-


te, associado ao evolucionismo. Em 1857, em um
ensaio, Herbert Spencer (1820-1903) emprega pela
primeira vez em contexto científico e filosófico o
vocábulo evolução, identificado como “progresso”.
Pouco depois, em 1859, a publicação de A origem
das espécies, marco da teoria de Darwin, consa-
graria esse termo. Contudo, vale observar que, di-
ferentemente do darwinismo, que se concentra na
evolução dos organismos vivos, Spencer dedica-se
a tratar da evolução de todo o universo. Em suas
considerações, o teórico expõe três aspectos prin-
cipais de sua teoria.
Para ele, uma evolução é uma transição ou passagem:
• de uma forma menos coerente para uma mais coe-
rente. Exemplo disso poderia ser visto na hipótese
nebular sobre a origem do Sistema Solar (um frag-
mento de uma nuvem molecular teria dado origem
ao nosso sistema);
• de uma realidade indefinida para uma definida. Isso
poderia ser verificado, por exemplo, no desenvolvi-
mento de sociedades humanas;
• de uma realidade homogênea ou indiferenciada
para uma realidade heterogênea ou diferenciada.
Assim como no âmbito biológico, em que organis-
mos animais e vegetais se desenvolvem diferen-
ciando tecidos e órgãos, qualquer outra realida-
de, fora desse contexto, também pode manifestar
essa transição.
Herbert Spencer, teórico do
evolucionismo, de influência positivista. Spencer, portanto, considera que evolução é uma lei geral para todo
o universo. Sobre isso observa o autor:

[...] esta lei do progresso orgânico é a lei de todo o progresso;


quer se trate das transformações da terra, do desenvolvimento da
vida à sua superfície ou do desenvolvimento das instituições polí-
ticas, da indústria, do comércio, da língua, da literatura, da ciência,
da arte, dá-se sempre a mesma evolução do simples para o com-
plexo, mediante sucessivas diferenciações. Desde as mais remotas
transformações cósmicas, de que ainda existem sinais, até aos mais
recentes resultados da civilização, vê-se que o progresso consiste
essencialmente na passagem do homogêneo para o heterogêneo.
SPENCER, Herbert. Do progresso: sua lei e sua causa. Eduardo Salgueiro (Trad.).
Lisboa: Editorial Inquérito, 2002. p. 14.

Ao procurar apresentar uma conceituação ampla de  evolução, pon-


derando que a seleção natural biológica também era aplicável a análises
da sociedade, Spencer assinalou que os socialmente mais aptos estariam
em posição favorecida. Essa visão é conhecida como darwinismo  ou
evolucionismo social e seria vinculada a teorias racistas, segundo as
quais haveria “superioridade” de algumas raças humanas sobre outras,
de maneira que algumas tenderiam naturalmente ao fracasso.
O positivismo também encontrou terreno para se disseminar em ou-
tros países, na Europa e fora dela.

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No Brasil
O florescimento do positivismo no Brasil iria acontecer a partir
da segunda metade do século XIX. Luís Pereira Barreto (1840-1923),
Miguel Lemos (1854-1917) e Raimundo Teixeira Mendes (1855-1927) se-
riam alguns dos que se introduziriam em estudos positivistas. O pri-
meiro via no positivismo uma forma possível de substituir o papel inte- ... ideias positivistas e
lectual exercido pelo catolicismo no país. Os dois últimos entenderam evolucionistas também
a doutrina positivista como fundamento para uma política considera- exerceram influência na
da mais racional, que procurou romper com a tradição monárquica Literatura, especialmente
em produções da estética
católica, para iniciar uma republicana, em harmonia com as ideias de
denominada Naturalismo.
modernidade, indústria e ciência.
Autores como Émile
Junto do militar Benjamin Constant (1836-1891), Lemos e Mendes pre- Zola (1840-1902) na França e
sidiriam o primeiro grupo ou sociedade positivista em território brasileiro, Aluísio Azevedo (1875-
fundado em 1876. Pouco depois, passaria a ter presença, em alguns esta- -1913) no Brasil são exemplos
dos do país, a religião positivista. disso. Obras desses autores
continham narrativas que
Rafael Andrade/Folhapress

pretendiam compreender
os personagens com base
em uma perspectiva próxima
à científica, analisando a
influência do meio natural, do
contexto histórico e social,
na formação desses.

Templo positivista no bairro da Glória, no Rio de Janeiro (RJ).

Ideias positivistas também puderam ser sentidas em meios polí-


ticos e sociais. Os positivistas também tiveram participação no mo-
vimento abolicionista (pelo fim da escravidão, que culminaria na Lei
Áurea, em 1888), na proclamação da República (1889), na primeira
Constituição republicana (de 1891, que adotou, por exemplo, a se-
paração entre Estado e Igreja) e na bandeira nacional pós-Império
(como já vimos).

CAPÍTULO T1 / Primeiras formulações do pensamento social 117

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Positivismo e as crises conhecimento e a industrialização como modelo de
desenvolvimento. No entanto, sabemos que no Bra-
hídricas brasileiras sil o positivismo influenciou significativamente os
Não é de hoje que o Brasil enfrenta uma crise hí- rumos da nossa história. Poderíamos dizer que, de
drica como as que vemos nos últimos tempos. Os re- forma geral, essa influência foi significativa des-
servatórios estão operando com a menor capacida- de a proclamação da república, encabeçada por
de das últimas décadas. Mas por que o Brasil, tendo Deodoro da Fonseca, até a era Vargas. Assim como na
o maior reservatório de água doce do mundo, passa Europa, seus defensores brasileiros queriam substituir
por essa escassez? Apesar de a água ser uma fonte a religião como força intelectual e definidora dos ru-
renovável, o nível de consumo excede tal capacida- mos do país pela filosofia positivista.
de. Em outras palavras: consumimos mais água do Essa confiança no progresso positivista dividiu o
que a capacidade de reposição. Além disso, a indús- mundo em dois: os desenvolvidos, cuja marca fun-
tria e, sobretudo, o agronegócio, possuem uma par- damental era a industrialização, glória da aplicação
cela significativa no consume de água. Essa água é técnico-científica, e os não desenvolvidos, ou seja,
utilizada, de forma geral, para irrigar e para consumo falta de industrialização e, por consequência, ausên-
animal. Embora o agronegócio seja o setor que mais cia de aplicação técnica. A julgar pelo critério posi-
produz emprego no Brasil, sendo também um dos tivista, o Brasil estava longe do progresso em razão
principais responsáveis pela melhora no Produto de sermos um país agrário, além, é claro, da nossa
Interno Bruto (PIB) a crise hídrica que enfrentamos industrialização tardia. Por ter dimensões continen-
hoje precisa ser debatida. Sabemos que crise mais tais, o país necessitava, com urgência, de infraestru-
recente não é a única. Em outros períodos, como no tura para enfrentar problemas graves. Dessa manei-
início do século XXI, enfrentamos racionamentos de ra, movido, de certo modo, pela diretriz positivista,
energia, apagões e desabastecimento. As caracte- Vargas cria uma série de estatais a fim de acelerar
rísticas das crises passadas, no entanto, são as mes- o processo de industrialização brasileira: criou a
mas de hoje: estiagem, consumo alto e pouca ca- Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a Vale do
pacidade de reposição. A questão do uso da água, Rio Doce e a Hidrelétrica do São Francisco. O pro-
da industrialização e do agronegócio, está calcado cesso de criação de estatais serviu para consolidar
num antigo debate a respeito da “vocação agrária de vez o ideal positivista e o de incluir o país no
do país”. Tal ideia remete ao final do século XIX, com rol de países ditos desenvolvidos. Algumas déca-
a chegada do positivismo ao país e a sua absorção das depois, por causa da intensa mecanização do
por pensadores e líderes políticos locais. trabalho rural, o país experimentou o êxodo rural.
Como vimos nesse capítulo, a filosofia positivis- O agronegócio cresceu em detrimento da indústria.
ta consistia na crença do progresso humano como Mas mesmo com todo o desenvolvimento tecnoló-
fundamento último de uma sociedade desenvolvi- gico para a produção de ponta, alguns problemas
da Comte desenvolveu sua filosofia a fim de expli- não foram resolvidos. A ausência de métodos para
car as mudanças ocorridas em grande escala no combater as crises hídricas, de forma definitiva,
século XIX, a partir de alguns pilares fundamen- poderia ser encarada como um contraste diante
tais: o otimismo moderno, a crença no desenvol- da cientificista de progresso indefinido herdado do
vimento técnico-científico como paradigma do positivismo.
daniele de matos vieira/Shutterstock.com

As constantes crises hídricas nacionais e o passado positivista brasileiro. Um possível contraste.

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Aplicando conhecimentos
1 A fotografia reproduzida a seguir, de 1892, mostra o Sobre o excerto lido, responda ao que se pede.
cientista Alexander Graham Bell (1847-1922), que pa- a) O texto faz uma referência implícita à determina-
tenteou o telefone, fazendo uso do aparelho. da teoria ou lei do pensamento positivista. Que
lei ou teoria é essa?

Library of Congress
b) Explique em que consiste essa teoria, descre-
vendo seus principais componentes.

Após observar a imagem, ressalte que relação ou


relações podemos estabelecer entre a cena re-
tratada, o seu contexto e a corrente sociológica
positivista.
3 O texto 1 a seguir, publicado no site da Igreja Posi-
tivista do Brasil, traz algumas informações e curio-
sidades sobre a religião inaugurada por Comte. Por
sua vez, o texto 2 é o registro de um fragmento que
representa o interior da Capela da Humanidade,
templo positivista em Paris.

Texto 1
A história da Religião da Humanidade está li-
gada ao encontro de Auguste Comte e Clotilde de
Vaux  (1815-1846), em Paris, em 1845. Comte ao
conhecer Clotilde se apaixonou imediatamente
por essa jovem mulher casada, porém abando-
nada pelo marido, que se exilou na Bélgica para
escapar de dívidas de jogo. Embora Clotilde não
tenha manifestado o mesmo tipo de sentimentos
pelo filósofo, os dois iniciaram uma intensa ami-
zade e relação intelectual e epistolar – foram 183
2 [...] Já que tais exercícios preparatórios constata- cartas trocadas em um ano, até o falecimento de
ram espontaneamente a inanidade radical das Clotilde, vítima de tuberculose. Essa experiên-
explicações vagas e arbitrárias, próprias da filo- cia dolorosa firmou a compreensão, aos olhos de
sofia inicial, teológica ou metafísica, de agora em Comte, da supremacia do sentimento sobre a racio-
diante o espírito humano renuncia de vez às pes- nalidade para a elevação moral dos homens. Inspi-
quisas absolutas, que só convinham à sua infância. rado portanto no sentimento amoroso despertado
Circunscreve seus esforços ao domínio, que agora por Clotilde, Comte começa a elaborar, a partir dos
progride rapidamente, da verdadeira observação, anos 1850, as bases de uma “religião positiva”, em
única base possível de conhecimentos verdadeira- torno de princípios cívicos e morais como o altru-
mente acessíveis, sabiamente adaptados a nossas ísmo e a honestidade. [...]
necessidades reais. [...] A RELIGIÃO da Humanidade. Templo da Humanidade, s.d. Disponível em:
COMTE, Auguste. Curso de Filosofia Positiva. José Arthur Giannotti e http://templodahumanidade.org.br/a-religiao-da-humanidade/.
Miguel Lemos (Trad.). São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. 127. Acesso em: 19 maio 2019.

CAPÍTULO T1 / Primeiras formulações do pensamento social 119

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Texto 2 d) Cite alguns outros aspectos da religião formula-
da por Comte.

Jean-Pierre Dalbéra (CC BY 2.0)/Flickr


e) Podemos observar que a fase da fundação da re-
Com base nos textos e no que você estudou, res- ligião positivista de certo modo difere conceitual-
ponda: mente da produção anterior de Comte. Qual é o
a) Em que instituição religiosa se inspira a religião centro dessa diferença? Justifique sua resposta a
positivista? partir do texto 1.

b) Cite uma diferença fundamental entre as duas


religiões.

4 — Não podemos julgar os meios — disse Dupin — a


partir de um exame tão superficial. A polícia parisien-
se, que é tão exaltada por sua argúcia, é esperta, mas
nada mais do que isto. Não existe método em seus pro-
cedimentos, além do método sugerido pela inspiração
do momento. Desfilam uma série de medidas tomadas
a fim de satisfazer ao público; mas não é infrequente
que estas sejam tão mal adaptadas ao objetivo propos-
to [...]. [...] Olhar uma estrela de relance, observá-la pelo
c) A fotografia (texto 2) mostra pinturas de bustos de canto dos olhos, voltando para ela as porções laterais
nomes consagrados, como Shakespeare (1564- da retina (mais suscetível às fracas sensações lumino-
-1616) e Descartes. Qual a razão dessas imagens sas que a parte central) significa percebê-la distinta-
no templo, considerando a doutrina religiosa do mente – é assim que apreciamos melhor o seu brilho –
positivismo? um brilho que vai se enfraquecendo na proporção em
que voltamos a visão diretamente sobre ele. De fato,
um número maior de raios cai sobre o olho neste úl-
timo caso, porém, no anterior, existe a capacidade de
compreensão mais refinada.
POE, Edgar Allan. Assassinatos na Rua Morgue e outras histórias.
William Lagos (Trad.). São Paulo: L&PM, 2002. 

O texto anterior integra o conto “Assassinatos da Rua


Morgue”, escrito por Edgar Allan Poe e lançado em
1841. Nessa ficção, há um crime considerado insolú-
vel até que entre em cena o detetive Auguste Dupin.

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a) Por que podemos afirmar que essa narrativa tem Com base no texto de Herbert Spencer, responda:
aspectos de caráter positivista? a) A que “lei geral” se refere o autor?

b) Qual a concepção dele sobre esse tema? Explique.


b) Nesse excerto, o narrador emprega uma metáfo-
ra. Qual é ela? E qual seu significado e sua aplica-
ção em relação à ciência?

c) O que ele quis dizer com “evolução dos produtos


do pensamento e da atividade dos homens”?

5 [...] A lei geral que se descobre na evolução do organis-


mo social também aparece, com a mesma evidência,
na evolução dos produtos do pensamento e da ativi-
dade dos homens – sejam concretos ou abstratos, se-
jam reais ou ideais. [...]
SPENCER, Herbert. Do progresso: sua lei e sua causa.
Eduardo Salgueiro (Trad.). Lisboa: Editorial Inquérito, 2002. p. 31.

CONSOLIDANDO SABERES

1 Unimontes-MG 2015 O Positivismo foi uma corrente b) O Positivismo persegue um objetivo principal:
de pensamento filosófico predominante no século XIX descobrir as leis gerais que regem os fenômenos
e início do século XX. Seu mais eminente representan- sociais.
te foi Auguste Comte (1798-1857), que é considerado o c) O Positivismo é uma doutrina filosófica que enfa-
precursor da Sociologia. No que tange às características tiza a busca pelo conhecimento das singularida-
fundamentais do Positivismo, pode-se afirmar, EXCETO: des sociais, dando ênfase ao estudo interpretati-
a) Para o Positivismo, o conhecimento científico é vo das ações de indivíduos em uma determinada
a “bússola da sociedade”. Nesse sentido, é im- coletividade.
prescindível que se tenha o conhecimento acer- d) O Positivismo preza pela regularidade, estabi-
ca dos fenômenos sociais, para que se consiga lidade e bom funcionamento das instituições
prever os mesmos e agir com eficácia. sociais.

CAPÍTULO T1 / Primeiras formulações do pensamento social 121

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2 UPE 2015 Leia o texto a seguir: 4 Unimontes-MG 2015 As preocupações intelectuais
Enquanto resposta intelectual à “crise social” de de Auguste Comte (1798-1857) decorrem, principal-
seu tempo, os primeiros sociólogos irão revalorizar mente, da herança do Iluminismo e da Revolução
determinadas instituições que, segundo eles, de- Francesa. Inspirado no método de investigação das
sempenham papéis fundamentais na integração e ciências da natureza, procurava identificar os princí-
na coesão da vida social. A jovem ciência assumia pios da vida social assim como outros cientistas ex-
como tarefa intelectual repensar o problema da plicavam a vida natural. Além de cunhar o nome da
ordem social, enfatizando a importância de insti- nova ciência de Sociologia, foi dele a primeira tenta-
tuições como a autoridade, a família, a hierarquia tiva de definir-lhe o objeto, seus métodos e proble-
social e destacando a sua importância teórica para mas fundamentais, bem como a primeira tentativa de
o estudo da sociedade. determinar-lhe a posição no conjunto das ciências.
MARTINS, Carlos Benedito. O que é Sociologia.
Considerando as reflexões e definições de Auguste
São Paulo: Brasiliense, 2006. p. 30. Comte sobre a natureza da Sociologia, analise as
afirmativas a seguir:
Com base nele, o surgimento da Sociologia foi mo-
I. Definiu a lei dos três estados, na qual o conheci-
tivado pelas transformações das relações sociais
mento está sujeito, em sua evolução, a passar por
ocorridas na sociedade europeia, nos séculos XVIII
três estados diferentes: o teológico, o metafísico
e XIX, contribuindo para o(a)
e o positivo.
a) aumento da desorganização social estabelecida
II. Propôs classificação das ciências, que tratam do
pela Revolução Industrial.
pensamento sobre cada domínio do universo e
b) organização de vários movimentos sociais con-
da sociedade, pela ordem, matemática/astrono-
trolados por pensadores como Saint-Simon e mia, física, química, biologia e sociologia.
Comte. III. Defendeu que a observação cuidadosa dos fa-
c) elaboração de um conceito de sociologia incluin- tos empíricos e o teste sistemático de teorias so-
do os fenômenos mentais como tema de refle- ciológicas tornam-se modos dominantes para se
xão e investigação. acumular conhecimento metafísico.
d) criação da corrente positivista, que propôs uma IV. Preocupou-se em definir a Sociologia como ciên-
transformação da sociedade com base na refor- cia da humanidade, capaz de desvendar as leis
ma intelectual plena do ser humano. da organização humana, cujo conhecimento de-
e) surgimento de uma “física social” preocupada veria ter utilidade prática a fim de melhorar a vida
com a construção de uma teoria social, sepa- das pessoas.
rada das ideias de ordem e desenvolvimento Estão CORRETAS as afirmativas
como chave para o conhecimento da realidade. a) I, II e III, apenas. c) I, II e IV, apenas.
b) I, III e IV, apenas. d) II, III e IV, apenas.
3 UEM-PR 2018 Auguste Comte (1798-1857), a quem
se atribui a formulação do termo Sociologia, foi o 5 UEL-PR 2016 A ordem e o progresso constituem
principal representante e sistematizador do Positi- partes fundamentais da Sociologia de Auguste
vismo. Acerca do pensamento comtiano, é correto Comte. Com base nas ideias comtianas, assinale a
afirmar que alternativa correta.
01. considerava os problemas sociais malefícios do a) A ordem social total se estabelece de acordo
desenvolvimento econômico das sociedades com as leis da natureza, e as possíveis deficiên-
industriais. cias existentes podem ser retificadas mediante a
02. teve grande influência sobre o pensamento so- intervenção racional dos seres humanos.
cial brasileiro do século XIX e início do século XX. b) A liberdade de opinião e a diferença entre os indi-
04. a inspiração para o método de investigação víduos são fundamentos da solidariedade na for-
dos fenômenos sociais de Comte veio das mação da estática social; essa diversidade produz
ciências da natureza. vantagens para a evolução, em comparação com
08. era uma tentativa de constituição de um méto- a homogeneidade.
c) O desenvolvimento das forças produtivas é a base
do objetivo para a observação dos fenômenos
para o progresso e segue uma linha reta, sem os-
sociais.
cilações e, portanto, a interferência humana é inca-
16. considerava o progresso e a evolução social
paz de alterar sua direção ou velocidade.
um princípio da história humana.
d) O progresso da sociedade, em conformidade com
Soma: as leis naturais, é resultado da competição entre os

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indivíduos, com base no princípio de justiça de que preservado as melhores linhagens, afirmava Charles
os mais aptos recebem as maiores recompensas. Darwin. Assim, um ser vivo com uma mutação favorável
e) O progresso da sociedade é a lei natural da dinâ- para a sobrevivência da espécie teria mais chances de
mica social e, considerado em sua fase intelectual, sobreviver e espalhar essa característica para as futuras
é expresso pela evolução de três estados básicos gerações. Ao fim, sobreviveriam os mais fortes, como
e sucessivos: o doméstico, o coletivo e o universal. interpretou o filósofo Herbert Spencer. Um século e
meio depois, um biólogo americano agita a comunida-
6 UEM-PR O evolucionismo social do século XIX teve de científica internacional ao ousar complementar a te-
um papel fundamental na constituição da sociologia oria da seleção darwinista. Segundo Edward Wilson, da
como ramo científico. Sobre essa corrente de pensa- Universidade de Harvard, o processo evolutivo é mais
mento, que reunia autores como Auguste Comte e bem-sucedido em sociedades nas quais os indivíduos
Herbert Spencer, assinale o que for correto. colaboram uns com os outros para um objetivo comum.
01. O evolucionismo define que as estruturas, naturais Assim, grupos de pessoas, empresas e até países que
ou sociais, passam por processo de diferenciação agem pensando em benefício dos outros e de forma
e integração que levam ao seu aprimoramento. coletiva alcançam mais sucesso, segundo o americano.
02. O evolucionismo propõe que a evolução das COSTA, Rachel. O poder da generosidade. IstoÉ, 11 maio 2012. (Adaptado).
sociedades ocorre em estágios sucessivos de
racionalização.  Embora divergentes no que se refere aos fatores
04. O evolucionismo considera o Estado Militar como que explicam a evolução da espécie humana, ambas
a forma mais evoluída de organização social, fun- as teorias, de Darwin e de Wilson, apresentam como
damentada na cooperação interna e obrigatória.  ponto comum a concepção de que
08. O evolucionismo rejeita o modelo político e a) influências religiosas e metafísicas são o principal
econômico liberal, baseado na livre iniciativa veículo no processo evolutivo humano ao longo
e no laissez-faire, considerando-o uma orienta- do tempo.
ção contrária à evolução social. b) são os condicionamentos psicológicos que in-
16. O evolucionismo defende a unidade biológica e fluenciam de maneira decisiva o progresso na
cognitiva da espécie humana, independente de história.
variações particulares. c) a sobrevivência da espécie humana ao longo da
história é explicada pela primazia de fatores de
Soma:
natureza evolutiva.
d) os fatores econômicos e materiais são os princi-
7 Unesp Encontrar explicações convincentes para a ori- pais responsáveis pelas transformações históricas.
gem e a evolução da vida sempre foi uma obsessão e) os fatores intelectuais são os principais respon-
para os cientistas. A competição constante, embo- sáveis pelo sucesso dos homens em dominar a
ra muitas vezes silenciosa, entre os indivíduos, teria natureza.

SUPERAÇÃO

UFPR 2017 A sociedade do século XIX era marcada por novas formas de produção material e pela intensa di-
visão do trabalho social entre os homens. É sobre esse assunto, por exemplo, que Auguste Comte (1798-1857)
se debruçou [...]. Segundo ele, a humanidade passaria por três estágios de conhecimento: o teológico, em que
os homens atribuiriam aos deuses as causas dos fenômenos objetivos; o metafísico, no qual os homens re-
correriam a conceitos abstratos para entender o mundo; e o estágio positivo, caracterizado pela organização
racional do trabalho, em que os homens aplicariam métodos científicos para compreender as causas dos fe-
nômenos. [...]. Comte acreditava que a sociologia – ou física social – estaria relacionada a uma hierarquia de
ciências, partilhando com outros ramos do conhecimento humano o mesmo espírito positivo que marcaria
modernidade industrial, mas diferenciando-se pela singularidade de seu objeto de estudo, que não poderia
ser explicado por aspectos biológicos, psicológicos etc. Assim, ao olharmos para a sociedade, deveríamos
buscar as leis sociais que determinariam o curso de evolução da humanidade [...]. Comte legou à imaginação
sociológica uma visão grandiosa dos poderes da disciplina, destacando a possibilidade de se usar o conheci-
mento das leis da sociedade para organizá-la de forma técnica, na direção do progresso pacífico.
MAIA, J. M. E.; PEREIRA, L. F. A. Pensando com a sociologia. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009. p. 10-11.

Com base nesse fragmento e nos conhecimentos sociológicos, caracterize a Sociologia na perspectiva comtiana, dis-
correndo sobre os aspectos relevantes dessa perspectiva apontados no texto-base e sua relação com o século XIX.

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No ENEM é assim
As questões selecionadas nesta seção são prioritariamente do Enem, mas questões de vestibulares diversos que apre-
sentam características semelhantes aos itens do referido exame também foram usadas como recurso para estudo.

1 Enem PPL 2015 O filósofo Auguste Comte (1798- c) a unidade metodológica entre ciências naturais e
-1857) preenche sua doutrina com uma imagem do ciências sociais.
progresso social na qual se conjugam ciência e polí- d) que o conjunto das ações individuais constitui a
tica: a ação política deve assumir o aspecto de uma sociedade.
ação científica e a política deve ser estudada de ma- e) a formulação de tipos ideais vazios de conteúdo
histórico.
neira científica (a física social). Desde que a Revo-
lução Francesa favoreceu a integração do povo na
vida social, o positivismo obstina-se no programa 3 Uece 2020 Dentre os primeiros teóricos e metodólo-
de uma comunidade pacífica. E o Estado, instituição gos da Sociologia, Auguste Comte (1798-1857) é pos-
to como um dos seus mais importantes iniciadores.
do “reino absoluto da lei”, é a garantia da ordem que
Ele cunhou o termo “Sociologia” para designar esta
impede o retorno potencial das revoluções e engen-
nova ciência social e procurava identificar as causas
dra o progresso.
necessárias ou as leis e lógicas sociais que regem e
BY, C. Introdução à filosofia política. São Paulo: movimentam as sociedades. Comte é um dos inven-
Editora da Unesp, 1998. (Adaptado). tores de uma das mais importantes correntes teórico-
A característica do Estado positivo que lhe permite -metodológicas do século XIX que foi base de muitas
garantir não só a ordem, como também o desejado outras ciências à época.
progresso das nações, é ser A corrente teórico-metodológica postulada por
a) espaço coletivo, onde as carências e desejos da Auguste Comte foi
população se realizam por meio das leis. a) o Positivismo, que procurava explicar, com base
b) produto científico da física social, transcendendo no raciocínio lógico e em métodos, as leis efeti-
e transformando as exigências da realidade. vas que atuam na organização dos organismos
c) elemento unificador, organizando e reprimin- sociais.
do, se necessário, as ações dos membros da b) o Materialismo Histórico Dialético, que demons-
comunidade. tra as bases materiais e históricas fundadoras das
d) programa necessário, tal como a Revolução contradições de classes sociais no capitalismo.
Francesa, devendo portanto se manter aberto a c) a Sociologia Compreensiva, que analisa os sig-
novas insurreições. nificados da ação social que é subjetivamente
e) agente repressor, tendo um papel importante a orientada pelas ações dos indivíduos em socie-
cada revolução, por impor pelo menos um curto dade.
período de ordem. d) a Sociologia Formal, que estuda como os interes-
ses e as finalidades dos indivíduos em interação
constante determinam as formas das sociedades.
2 UEG 2020 A sociologia nasce no contexto da
consolidação da ciência enquanto forma de pen- 4 UPE 2018 Leia os textos a seguir:
samento dominante. Com o desenvolvimento do TEXTO I
capitalismo e a progressiva urbanização, alguns Convicto de que a reorganização da sociedade exi-
pensadores começaram a refletir sobre os pro- giria a elaboração de uma nova maneira de conhecer
blemas da sociedade em transformação, como a a realidade, Comte procurou estabelecer os princípios
fome, o saneamento básico, as longas e fatigan- que deveriam nortear os conhecimentos humanos.
tes jornadas de trabalho etc. A partir desse mo- Seu ponto de partida era a ciência e o avanço que ela
mento, emerge a sociologia, como uma ciência vinha obtendo em todos os campos de investigação.
com objeto e método específicos, e surgem os [...] O advento da sociologia representava para Comte
primeiros sociólogos. Um destes sociólogos foi o coroamento da evolução do conhecimento científi-
Auguste Comte, que fundamentou a sociologia co, já constituído em várias áreas do saber.
a partir do método positivista. O positivismo de MARTINS, Carlos Benedito. O que é Sociologia. São Paulo: Brasiliense,
Comte defende 2006, p. 44.

a) que as ideias são desenvolvidas por seres huma-


nos reais e históricos. TEXTO II
b) o estudo dos fatos sociais enquanto coisas exte- O conjunto da nova filosofia tenderá sempre
riores aos indivíduos. a fazer sobressair, tanto na vida ativa como na

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especulativa, a ligação de cada um a todos, sob uma sé- três estados históricos diferentes: estado teológico [...]
rie de aspectos diversos, de modo a tornar involuntaria- estado metafísico [...] estado positivo [...].
mente familiar o sentimento íntimo da solidariedade (COMTE, A. Curso de filosofia positiva. Trad. José Arthur Giannotti. São
social, [...] Não somente a ativa busca do bem público Paulo: Abril, 1985, p. 9-11).

será sempre privada, será sempre representada como


a maneira mais conveniente de assegurar a felicidade A partir do fragmento transcrito e de conhecimentos
privada; mas, por uma influência [...] dos pendores gene- sobre o pensamento de Comte, assinale o que for
rosos, se tornará a principal fonte da felicidade pessoal. correto.
COMTE, Auguste. Discurso sobre o espírito positivo. 01. No estado teológico, o espírito humano apresen-
São Paulo: Escala, s/d, p. 74. ta os fenômenos como tendo sido produzidos
pela ação direta de seres sobrenaturais.
A Revolução Industrial e a Revolução Francesa im- 02. No estado metafísico, os agentes sobrenaturais
pulsionaram o surgimento da Sociologia como ciên- são substituídos por forças abstratas inerentes
cia voltada para compreender as novas relações en- aos diversos seres do mundo.
tre as pessoas. Essas relações envolviam agora um 04. No estado positivo, o espírito humano procura
complexo de hábitos e costumes e eram provocadas estabelecer as leis efetivas dos fenômenos, as
por causa da maneira de se produzirem e se consu- suas leis invariáveis de sucessão.
mirem os excedentes na Europa do século XIX. 08. A Sociologia, na visão de Comte, não pode ser
Sobre esse período da Sociologia e com base na estabelecida como ciência, pois os fatos huma-
concepção apresentada nos textos I e II, é CORRE- nos são variáveis, e não passíveis de exatidão.
TO afirmar que 16. A filosofia de Comte pode ser vista como uma
a) a Sociologia foi chamada de física social e deve- reação à Revolução Francesa de 1789, ao instituir
ria utilizar os métodos da filosofia teológica como a ordem de modo soberano.
instrumento de compreensão da sociedade.
Soma:
b) as investigações sociológicas deveriam utilizar os
mesmos procedimentos das ciências naturais, ou
seja, a observação, a experimentação e a com- 6 UEM 2020 Auguste Comte (1789-1857) é considera-
paração. do o fundador da sociologia moderna, porém tam-
c) o positivismo foi a corrente filosófica, que funda- bém direcionou suas reflexões à filosofia e à história,
mentou o surgimento da Sociologia como ciência na tentativa de resolver os problemas de uma reali-
da sociedade, pois tinha uma visão metafísica das dade que parecia caótica, construindo, assim, os pre-
relações entre as pessoas. ceitos do positivismo.
d) o principal representante da Sociologia nesse pe- Sobre o assunto, assinale o que for correto.
ríodo foi August Comte, que tinha uma visão po- 01. Para Comte, a evolução histórica compreende
sitiva de sociedade, ou seja, uma reflexão sobre um processo de questionamento quanto à desi-
a essência e o significado abstrato das relações gualdade de classes e à injustiça social.
sociais. 02. O positivismo acredita no progresso guiado pela
e) as ideias de Comte tinham como objetivo encon- técnica e pela ciência, caracterizando-se pelo
trar leis universais para explicar as relações so- entusiasmo em relação à industrialização e ao
ciais, com base nos princípios de subjetividade e progresso capitalista.
parcialidade, utilizados pelas ciências da natureza. 04. No Brasil, o positivismo influenciou, por exemplo,
Benjamin Constant, Ministro da Guerra no Gover-
5 UEM 2018 Estudando, assim, o desenvolvimento to- no Provisório (1889-1891).
tal da inteligência humana em suas diversas esferas 08. Comte concluiu que apenas a elite seria capaz
de atividade, desde seu primeiro voo mais simples de desenvolver a parte frontal do cérebro, sede
até nossos dias, creio ter descoberto uma grande lei da faculdade superior da inteligência e da mo-
fundamental, a que se sujeita por uma necessidade ral. Por isso, caberia à elite assumir o “progresso
invariável, e que me parece poder ser solidamente dentro da ordem”.
estabelecida, quer na base de provas racionais forne- 16. A frase estampada na bandeira brasileira está
cidas pelo conhecimento de nossa organização, quer associada à seguinte afirmação positivista: “O
na base de verificações históricas resultantes do exa- Amor por princípio e a Ordem por base; o Pro-
me atento do passado. Essa lei consiste em que cada gresso por fim”.
uma de nossas concepções principais, cada ramo de
Soma:
nossos conhecimentos, passa sucessivamente por

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Gabarito

CAPÍTULO T1 Dessa forma, nota-se uma visão que privilegia o método


Primeiras formulações científico. Certas ficções policiais, como essa de Allan Poe,
do pensamento social revelam a influência, no século XIX, desse aspecto das
concepções positivistas.
Aplicando conhecimentos b) A metáfora está na referência a observar uma estrela “vol-
1 Espera-se que os alunos relacionem a cena (de Bell fazendo tando para ela as porções laterais da retina”, de forma a
uso do telefone) ao contexto de industrialização e desenvol- “percebê-la distintamente”, o que permitiria uma “compres-
vimento tecnológico do século XIX, uma das bases da formu- são mais refinada”. Essa é uma alusão à necessidade cien-
lação do pensamento positivista. Comte, ao apontar para uma tífica de rigor metodológico.
hegemonia da ciência e da técnica, estava tecendo uma inter- 5
pretação sobre o mundo em que viveu e desenvolveu suas a) Trata-se de uma lei geral referente à evolução do Universo,
análises, a Europa industrial. Essa fase representaria, na defini- de todas as coisas.
ção do teórico, o chamado “estágio positivo”. b) Spencer explora a ideia de uma evolução de todo o
Universo. Para ele, essa evolução é uma transição de uma
2 forma ou realidade indefinida, homogênea e menos coe-
a) O texto alude à lei dos três estágios, proposta por Comte. rente para uma definida, heterogênea e mais coerente.
b) Para Comte, toda sociedade e história humanas evoluiriam c) Ao falar em “evolução dos produtos do pensamento e da
em etapas ou estágios, que seriam três: a etapa teológi- atividade dos homens”, o autor se refere à evolução de
ca, em que as pessoas atribuem os fenômenos a causas tudo aquilo que é produto ou criação humana (resultados
mágicas, a divindades ou outras entidades sobrenaturais; de trabalhos, organizações sociais, formas de conheci-
a etapa metafísica, em que se buscam explicações para o mento, artes etc.).
mundo por meio de conceitos abstratos; e, por fim, a etapa
positiva, em que não haveria mais buscas por abstrações e Consolidando saberes
causas imaginadas, estando o conhecimento pautado pe- 1 C
los fatos e pela observação das leis das ciências. 2 D
3 3 Soma: 02 + 04 + 08 + 16 = 30
a) A religião positivista se inspira na estrutura da Igreja 4 C
Católica. 5 A
b) Como principal diferença, pode-se citar o fato de que o 6 Soma: 01 + 02 + 16 = 19
catolicismo prega a fé e o culto a uma divindade, Deus, 7 C
enquanto a religião positivista põe no lugar disso o culto
SUPERAÇÃO
à humanidade.
c) A religião do positivismo presta homenagem, em certas Espera-se que os alunos discorram que a perspectiva socioló-
datas, a pensadores e escritores consagrados, o que faz gica formulada por Auguste Comte está intimamente associada
lembrar a veneração dos santos no contexto católico. A ao ambiente social da Europa da época do autor. Considerado
razão é prestar culto às grandes personalidades da cultura, o “pai oficial” da Sociologia, Comte entendia que a sociedade
revelando o caráter “sacro” que a religião positivista via na europeia do século XXI estaria alcançando um estágio de evo-
cultura humana. lução marcado pelo progresso, um estágio que ele chamou de
d) Na religião positivista, a doutrina é o pensamento positivis- “positivo”, o qual seria marcado pelo racionalismo e pelo cientifi-
ta, como também as ciências; há ritos de passagem; cada cismo. Nesse contexto, a Sociologia seria a ciência por excelên-
dia da semana é dedicado a uma ciência; há dias e meses cia e, conduzida por metodologia científica (como nas demais
dedicados a comemorar pensadores ou autores consagra- ciências), possibilitaria a compreensão das leis dos fenômenos
dos; e a mulher figura como protetora e anjo da guarda; o e do funcionamento das sociedades, e, assim uma organização
lema religioso é “O amor por princípio e a ordem por base; social científica que permitiria um contínuo progresso.
o progresso por fim”.
e) Apesar de Comte preconizar a hegemonia da razão e da No Enem é assim
ciência, na proposição de uma religião positivista, ocorre, 1 C
como observa o texto 1, uma “supremacia do sentimento 2 C
sobre a racionalidade para a elevação moral dos homens”. 3 C
4 4 A
a) Espera-se que os alunos observem que o trecho da narrati- 5 B
va, ao tratar dos procedimentos da polícia parisiense, tece 6 Soma: 01 + 02 + 04 + 16 = 23
uma crítica afirmando que o órgão não possui método. 7 Soma: 02 + 04 + 08 + 16 = 30

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Anotações

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Anotações

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