Você está na página 1de 13

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS DE RIBEIRÃO PRETO

Ingridy Leticia Moreira Biscio


Rayssa Durães Marques

ENSINO INFORMAL DA MÚSICA


A DICOTOMIA ENTRE O MÚSICO TEÓRICO E O MÚSICO PRÁTICO

Ribeirão Preto – SP
Dezembro/2021
Ingridy Leticia Moreira Biscio
Rayssa Durães Marques

ENSINO INFORMAL DA MÚSICA


A DICOTOMIA ENTRE O MÚSICO TEÓRICO E O MÚSICO PRÁTICO

Artigo apresentado para avaliação da


disciplina de Metodologia e Projeto de
Pesquisa, sob orientação do Professor
Fernando Fagundes Ferreira.

Ribeirão Preto – SP
Dezembro/2021
SUMÁRIO
Resumo ....................................................................................................................... 3
Abstract ....................................................................................................................... 4
1. Introdução ............................................................................................................... 5
2. Educação musical no Brasil .................................................................................... 6
3. Dicotomia entre músico teórico e prático................................................................. 7
4. Estudo de Caso: Ensino Informal do Cavaquinho ................................................... 9
5. Discussão e Resultados ........................................................................................ 10
6. Conclusão ............................................................................................................. 11
7. Referências Bibliográficas ..................................................................................... 12
RESUMO

O objetivo deste trabalho é fazer uma reflexão sobre o aprendizado informal


da música, isto é, aquele em que se parte de um contexto prático sem a aplicação
de métodos bem fundamentados e teóricos. A problematização será acerca das
diferenças entre esse músico e aquele cujos métodos tradicionais e bem embasados
num estudo teórico antes de aprender o instrumento foram aplicados.

Palavras-chave: aprendizado; métodos musicais; teoria musical; prática musical.


ABSTRACT

The objective of this work is to reflect on the informal learning of music, that is,
one in which one starts from a practical context without the application of well-
founded and theoretical methods. The problematization will be about the differences
between this musician and the one whose traditional methods and well grounded in a
theoretical study before learning the instrument were applied.

Keywords: apprenticeship; musical methods; musical theory; musical practice.


5

1. INTRODUÇÃO

A prática formal da música ocorre nas instituições oficiais de ensino como


conservatórios, por exemplo, que são institutos que possuem uma sistematização
curricular, professores capacitados e formados, métodos próprios de estudo e que
disponibilizam um diploma ao final do curso, dando maior credibilidade a todo o
aprendizado apresentado.
Tratando-se da prática do ensino informal da música, observamos que ela ocorre
em estabelecimentos não oficiais de ensino como, por exemplo, em casa, na
comunidade, na igreja, entre outros. No Brasil, existem as escolas de samba, onde
as pessoas têm uma vivência musical forte e viva e, em alguns estados, onde se
tem ritmos predominantes e estilos regionais em comemoração a algumas festas,
também existe essa prática musical informal.
A formação musical informal do indivíduo acontece, em sua grande maioria, por
meio de pessoas conhecidas, familiares, amigos que disponibilizam essas aulas
informais por já terem alguma noção da música, porém sem nenhum tipo de
formação. Alguns desses músicos informais adquirem suas habilidades através do
desenvolvimento auditivo, que é alcançado frequentando ambientes com muita
música, como igrejas, por exemplos, sem necessariamente a supervisão de um
professor. Então, aprendem de forma casual e pessoal. E através da tecnologia de
fácil acesso que temos hoje, é possível estimular e acelerar esse aprendizado.
O problema começa quando muitas dessas pessoas, não de forma
generalista, sabem apenas reproduzir o que ouvem e a partir disso não conseguem
desenvolver a própria capacidade por terem um conhecimento limitado. Por
exemplo, no caso dos cantores, em que o seu instrumento é o próprio corpo, é
necessário um aquecimento, um autoconhecimento da própria voz e timbre e um
estudo pontuado das próprias dificuldades. Mas, quem exerce o canto por ouvir
outros cantores, acaba apenas imitando o timbre e a forma destes de cantar, sem
conseguir sua própria personalidade, digamos. Isso pode gerar frustração à própria
pessoa por não conseguir alcançar ou interpretar certas notas simplesmente pela
incapacidade de desenvolver o estudo sozinho, levando muitas vezes até a lesões
nas pregas vocais.
6

2. EDUCAÇÃO MUSICAL NO BRASIL

Os primeiros indícios de educação musical no Brasil se deram logo após o


descobrimento do mesmo, especialmente após a chegada dos jesuítas de Portugal.
Nesse período, nota-se que a música servia como ferramenta de transmissão da
religião e da cultura europeia aos índios brasileiros. Nesta ocasião a educação
musical estava voltada ao modo europeu de promover o ensino e prática musicais
em igrejas, conventos e colégios por meio de métodos progressistas com grande
ênfase na memorização. Somente com a chegada da Família Real ao Brasil em
1808, é que se estendeu a música para os teatros ao invés de ficar restrita à Igreja.
Apesar de a música estar presente desde o descobrimento do país foi somente em
1854 que se instituiu oficialmente o ensino musical nas escolas públicas brasileiras,
e em 1890 passou a exigir-se legalmente a formação específica para o professor de
música.
Mesmo com as exigências legais na segunda metade do século XIX, o
ensino de música não se fortaleceu no início do século XX, porém durante a década
de 1920, surgiram algumas importantes contribuições a favor da expansão do ensino
musical, caso dos defensores da escola nova no Brasil: Anísio Teixeira e Fernando
de Azevedo. Na década seguinte soma-se a contribuição do maestro Heitor Villa
Lobos que defendeu junto ao governo uma reformulação do ensino de música.
Surge assim, a disciplina de Canto Orfeônico obrigatório desde o ensino
fundamental como também no ginasial.
Em 1964 com o início da ditadura militar veio a necessidade de adequar a
educação brasileira ao período, com isso o canto orfeônico muda de nome passando
para Educação Musical, em 1964, e em 1971, o ensino de música é extinto do
currículo escolar sendo substituído pela Educação Artística que mantinha um caráter
interdisciplinar, dando ênfase nas quatro linguagens artísticas: dança, teatro, música
e artes plásticas.
Com o desenvolvimento da tecnologia e o fácil acesso a conteúdos de
qualquer tipo, a propagação do ensino informal de música foi consideravelmente
multiplicada, fazendo com que muitas pessoas preferissem estudar pelo
computador, por exemplo, do que se direcionar a uma escola formal. Houve essa
preferência por razões bem lógicas, mas principalmente o baixo custo fez com que a
demanda por vídeo aulas, não só de música, aumentassem.
7

3. DICOTOMIA ENTRE MÚSICO TEÓRICO E PRÁTICO

Segundo o prefácio do Tratado Nova Instrução Musical, de Francisco


Ignacio Solano (1720-1800) “[...] Os Cantores, e Instrumentistas que unicamente
executam Música por ministério da Arte são, e devem chamar-se Músicos Práticos;
mas sem este aditamento, só ao Teórico pertence o nome de Músico.” Esta
observação evidencia a compreensão de música nutrida por esse compositor que
dialogava com o pensamento da Antiguidade.
Conforme Thomas Christensen (2002, p.1), o conceito de conhecimento
teórico foi transformando-se com o passar do tempo. Irna Priore (2013, p.12)
também ressalta que “[...] A teoria musical não é estática, ou seja, ela muda de
acordo com o paradigma cultural da época.”
Na Grécia antiga a música era utilizada como uma das formas de trabalhar o
espírito, ela ocupava um lugar de destaque na educação grega. Desde a infância,
eles aprendiam a tocar instrumentos, visando uma formação mental consistente,
com uma nítida compreensão da necessidade de a música permear o social. Tal
necessidade se faz devido à música fazer parte da rotina diária do povo grego,
presente em festividades, competições musicais, cultos religiosos, acompanhamento
de atividades esportivas como forma de aumento de sincronização. Inclusive a
palavra música nasce na Grécia, onde “Mousikê” diz respeito à arte das Musas (na
mitologia grega, eram entidades a quem eram atribuídas à capacidade de inspirar a
criação artística ou científica). Dada a importância da música, ela era apresentada
iconograficamente como tema em muitos vasos e esculturas, tanto como o ato de
tocar um instrumento, como o ato do ensino musical.
A Grécia, através da sua educação musical com a matemática de Pitágoras,
traz em voga que a música devia ser ensinada desde a infância, sendo um alvo
importante para formação de futuros cidadãos.
Foram os filósofos gregos que criaram a teoria mais elaborada para a
linguagem musical na Antiguidade. Pitágoras acreditava que a música e a
matemática formavam a chave para os segredos do mundo, que o universo cantava,
justificando a importância da música na dança, na tragédia e nos cultos gregos.
Massin (1997, p.126) afirmava que “[...] desde o século VI, ocupar-se de
música era essencialmente elaborar uma filosofia musical, refletir sobre a função dos
sons – e, num plano secundário, compor melodias ou executá-las. […] É, portanto,
8

antes de tudo, objeto de considerações teóricas.” Desta forma, a distinção e, por


vezes, a oposição entre música teórica e música prática remonta à Antiguidade: às
doutrinas de Pitágoras de Samo (c.570 – c.495 a.C.), cuja essência se baseava no
número e na proporção (TOMÁS, 2005, p.23 e 34); à Platão (c.428 – c.348 a.C.),
sob as ideias de dualismo entre corpo (conhecimento pelos sentidos) e espírito
(conhecimento pela razão), para o qual a prática de um instrumento associava-se ao
conceito techné, apenas uma habilidade manual, destacando-se a noção de música
conceitual, relacionada a harmonia do universo (cosmos) (TOMÁS, 2005, p.22);
também à Aristóteles (384- 322 a.C.), para quem a reflexão sobre a música e o seu
ensino era uma capacidade própria aos eruditos, além de não ser destinada à
execução prática.
Em suma, um músico que teve todo o auxílio e suporte de uma escola
formal, onde se há uma estrutura embasada nas técnicas para facilitar o
desenvolvimento terá uma produtividade relativamente maior àquele que optou por
aprender por conta própria. Até porque com o acompanhamento de um professor, as
dúvidas podem ser sanadas de forma individual e pontuais a cada aspecto solicitado
pelo aluno, o que uma vídeo aula, por exemplo, não é capaz de suprir com
satisfação.
9

4. ESTUDO DE CASO: ENSINO INFORMAL DO CAVAQUINHO

Pedro de Almeida Monteiro em sua monografia de conclusão de curso de


Licenciatura em Música, fez um estudo de caso sobre o ensino formal do
cavaquinho. Para tal feito, ele teve o auxílio de Marcio Vanderlei, um cavaquinista e
banjoísta da cidade do Rio de Janeiro que começou a tocar com 18 anos. O seu jeito
diferente de tocar o levou ao palco junto com grandes artistas e virou referência a
novos músicos.
Marcio teve contato com a música desde criança, tocando instrumentos de ritmo
feitos em casa mesmo e depois teve alguns encontros com um amigo que lhe
apresentou o cavaquinho e lhe ensinava de forma totalmente informal algumas
cadências e sequências de ouvido que ele decorava. Não havia ensino de técnica
aplicada às “aulas”, mas se fundamentavam no conceito de que cada um tem a sua
maneira de tocar. Ele conta que se aprendia de tanto tocar e desenvolvia as próprias
técnicas.

“Mas se você for tudo pela técnica, aí o coração não pulsa. Você não emociona.
Acho que tem que estudar técnica sim, mas tem que deixar o organismo perceber e
deixar aquilo fazer sentido dentro de você.” (MONTEIRO, 2013, p.36). Nesse trecho
da monografia, Monteiro descreve a resposta de Marcio sobre como ele estudava as
técnicas. Assim, observamos que ele acreditava muito mais em suas expressividade
e improviso do que a aprendizagem teórica de conceitos técnicos.
Após 2 anos de estudos informais, Marcio sentiu a necessidade de procurar um
aprendizado formal para adquirir mais conhecimento quanto ao seu instrumento e
fez um estudou percepção, harmonia funcional e improvisação num curso de música
renomado na cidade. O que nos faz crer que apenas o ensino formal, no caso do
Marcio, não foi suficiente pra suprir as necessidades de conhecimento que ele tinha.
10

5. DISCUSSÃO E RESULTADOS

Através das pesquisas feitas para elaborar esse artigo, observamos que quando
se há a procura de uma instituição formal para o aprendizado da música, onde os
professores são devidamente capacitados, o rendimento das aulas é
consideravelmente maior. Isso ocorre porque existe um cronograma de aulas
embasados em métodos tradicionais que já funcionaram antes. Muitas vezes, na
aprendizagem informal, ocorre uma aleatoriedade nos estudos, sem uma sequência
adequada para que aos poucos o assunto seja absorvido e praticado para passar ao
próximo tópico.
Grande parte das pessoas que procuram um meio informal de aprendizado têm a
ânsia de tirar som do instrumento desde a primeira aula. Porém, muitas vezes é
necessário um estudo básico teórico para que não existam lacunas no aprendizado
que venham atrapalhar o desenvolvimento futuramente. Além disso, a postura
adequada é um ponto extremamente importante ao desenvolver a técnica de
qualquer instrumento, afim de evitar possíveis traumas ou lesões ergonômicas.

Monteiro (2013, p.39) afirma que “as modalidades vieram para separar e
organizar as práticas de ensinos que já existiam há muitos e muitos anos, e essas
conceituações servem um pouco para organizar os estudos e direcionar alguns
eventos educacionais.” Então, essas modalidades de ensino informal ou formal não
são excludentes.
11

6. CONCLUSÃO

As duas modalidades educacionais interagem ao mesmo tempo, mas haverá


uma diferença de um músico para o outro, dependendo em qual formação este se
dedicará mais. O músico que tem mais prática em “tirar” músicas de ouvido ao invés
de procurar partituras e/ou cifras, seu perfil é mais informal, o que não faz com que
ele seja um músico ruim, pelo contrário, não são todos que tem essa habilidade. Já
o músico que procura por uma partitura disponível tem o perfil de aprendizagem
formal, já que isso traz pra ele uma segurança maior e mais assertiva. Esses fatos
sustentam o conceito de que não há exclusividade nos modelos educacionais.
12

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COSTA, Rodrigo Heringer. Notas sobre a Educação formal, não-formal e


informal. Anais do SIMPOM, n. 3, 2014.

FELLER, Mônia; SBAFFI, Edoardo. (2018) Musicum versus Cantor: uma perspectiva
histórica acerca da dicotomia entre o Músico Teórico e o Músico Prático. Per Musi.
Belo Horizonte: UFMG. p.1-19.

MONTEIRO, Pedro de Almeida. O ensino informal do cavaquinho – um estudo de


caso: Marcio Vanderley. 2013. Monografia (Licenciatura em Música). Instituo
VillaLobos, Centro de Letras e Artes. Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro.

NESI, A.; PELLEGRINO, B.; VALOURA, T.; Educação na Antiguidade. Disponível


em:https://educacaonantiguidade.wordpress.com/2017/01/22/ensino-da-musica-na-
grecia-antiga/.

PARNCUTT, Richard. Musicologia Sistemática: a história e o futuro do ensino


acadêmico musical no ocidente. Em Pauta, Porto Alegre, v. 20 n. 34/35, 145-185,
janeiro a dezembro 2012. ISSN 1984-7491.

PINTO, Mércia. Ouvidos para o mundo: aprendizado informal de música em grupos


do distrito federal. OPUS, v. 8, n. 1, p. 86-101, 2002.

Você também pode gostar