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As teorias feministas foram criadas a partir da ascensão do movimento feminista

moderno e o impacto da sociologia pós-moderna. Na década de 1990, a violência nos Balcãs


explicitou o uso do abuso sexual e de estupros como arma de guerra, direcionadas às
mulheres. Essa violência também estava presente em outros conflitos como no genocídio de
Ruanda. Ainda, o campo acadêmico de RI é percebido como o estudo da alta política, com
questões envolvendo paz, guerra e segurança internacionais a partir de uma perspectiva do
homem, sem perspectiva de gênero. Forças armadas, além disso, eram e são percebidos como
espaços masculinos, nos quais as mulheres enfrentam resistência no ingresso, na permanência
e na formulação de políticas. Em relação aos tratados internacionais e políticas externas, uma
vez que o papel da política era visto primariamente como um papel masculino, as
preocupações de gênero eram relegadas.

As teorias feministas, analisando esse cenário de exclusão da mulher das esferas de


poder, produziram novas perspectivas e abordagens para lidar com esse problema. A
variedade teórica dessa corrente propõe desde a facilitação da entrada de mulheres nos
espaços militares e de poder, vistas ou não como mais pacíficas, até a completa reformulação
das instituições vigentes, reconhecidas como espaços masculinos que perpetuam a violência
de gênero e dinâmicas de poder excludentes, indo além da mera inclusão das mulheres. É
importante ressaltar que, para algumas téoricas, as mulheres não são, necessariamente, mais
pacíficas que os homens, e sua inclusão em um espaço reconhecidamente masculino não é
suficiente para se alcançar a paz. Um ponto forte é a necessidade de incluir as temáticas de
gênero nas discussões de política internacional, a fim de melhor entender e evitar as violências
que afetam diretamente as mulheres em conflitos e políticas internacionais, ponto comum da
abordagem de Christine Sylvester e Ann Tickner, por exemplo.

A trajetória das mulheres na política externa brasileira começou apenas quase cem
anos após a criação do Itamaraty em 1821. A primeira diplomata brasileira, Maria José de
Castro Rebello Mendes, ingressou nos quadros apenas em 1918. Desde então, reformas na
instituição limitaram o acesso das mulheres à diplomacia brasileira, como a Reforma Oswaldo
Aranha. Tal reforma fechou o ingresso às mulheres até o segundo período Vargas. A primeira
embaixadora de carreira do mundo foi a brasileira Odette de Carvalho e Sousa em 1959,
representando o Brasil em Tel Aviv. A primeira mulher negra foi Mônica de Veyrac, ingressante
como terceira-secretária em 1979. Apesar desses marcos, a trajetória e a presença de
mulheres na formulação e aplicação da política externa brasileira enfrentou desafios como o
afastamento compulsório de diplomatas mulheres majoritariamente, ao acompanhar os
parceiros diplomatas no exterior, ou a limitação de que apenas um dos cônjuges,
normalmente os homens, pode receber o bônus de representação no exterior. As medidas
desiguais seriam retiradas apenas na década de 1990, no governo de Fernando Henrique
Cardoso.

Para o Brasil, país majoritariamente feminino, a participação da mulher na diplomacia


e na formulação da política externa é de suma importância. A partir da perspectiva de gênero,
o País pode se afirmar como respeitador e promotor dos direitos humanos, que são universais,
e melhor atuar para prevenir a violação de tais direitos não apenas no Brasil, mas também no
contexto regional e internacional. Como exemplo, a maior presença de mulheres em missões
de paz das Nações Unidas é indicada como um catalisador para a redução dos casos de
violência de gênero e para o aumento de confiança da população, em especial nas sociedades
em que mulheres desempenham papeis sociais relevantes como foi o caso do Timor Leste no
início do século XXI. Nesse caso específico, a presença da funcionária onusiana Carolina
Larriera foi de relevância para o aumento da confiança da sociedade civil fragmentada na
missão da instituição.

A agenda internacional tem incluído cada vez mais a temática de gênero em suas
discussões. A Agenda de Mulheres para a Paz ressalta a importância da inclusão das mulheres
nas discussões de paz e segurança internacionais e, assim, nas operações de paz da ONU. A
criação da ONU Mulheres em 2010 foi um passo a mais nesse sentido, trazendo ações mais
intensivas na proteção dos direitos civis, econômicos, sociais e culturais das mulheres,
promovendo sua participação e visibilização política. Os Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável incluem em um dos 17 focos a igualdade de gênero como base para o
desenvolvimento da sociedade internacional. Na diplomacia brasileira, a diplomata Maria
Laura da Rocha é a primeira Secretária-geral do Itamaraty, um avanço para a diplomacia pátria,
e a formação da Associação de Mulheres Diplomatas do Brasil, encabeçada pela diplomata
Irene Vida Gala, busca promover a perspectiva de gênero na formulação da política externa e
uma melhor resposta aos desafios vividos pelas mulheres no Itamaraty. Há, ainda, traços da
desigualdade da sociedade internacional contemporânea, um exemplo claro é a pouca
representatividade das mulheres nos discursos de abertura da Assembleia Geral da ONU em
2023.

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