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Posted on 04/08/2012
A hipótese de Jaynes é que, se numa linguagem não existe a palavra “eu” (e seus
pronomes), seus falantes não terão uma mente ou consciência no sentido em que nós a
temos. A ausência de uma representação de “eu” na linguagem escrita é indício de que em
uma determinada época ou cultura não havia nada parecido com uma “consciência”, talvez
nem mesmo em sua tradição oral.
Houve um momento na história da humanidade no qual os seres humanos eram capazes de
fazer várias coisas – falar, compreender, perceber e resolver problemas – mas não tinham
consciência. Esses seres humanos são chamados por Jaynes de bicamerais, pois em sua
época não havia introspecção e quando uma decisão precisava ser tomada, eles ouviam
vozes (alucinações) que vinham de fora.
Os seres humanos tinham uma mente cindida em duas; de uma delas vinham essas vozes,
que eram os conselhos dos deuses que serviam também para guiar as sociedades. Essas
vozes eram o que hoje chamaríamos de alucinações auditivas de um esquizofrênico, mas os
textos antigos as registram como algo absolutamente normal na época da mente bicameral.
A consciência é um “eu-narrador” internalizado que surge muito tempo depois e é
possibilitado pela evolução da linguagem.
Então o que haveria antes disso? Segundo Jaynes, antes do “eu”, havia a mente bicameral.
E agora voltando a Alister Hardy, ele fala nessa entrevista de coisas bastante curiosas. Por
exemplo, como o homem parece sempre procurar aconselhamento em algum ser superior.
Com o colapso da mente bicameral, e na ausência de alucinações, a noção de “deus” se
tornou abstracta. “Deus” perdeu sua antropomorfização e se tornou para a mente humana
uma entidade diferente, mais complexa. Hardy compara a relação dos homens com “deus”
com a relação que o cão tem com os homens. Esta é uma relação sobre a qual sei muito
pouco, mas me parece muito curioso, como indica Hardy, que a certa altura os cães teria
deixado de seguir o líder de sua matilha para seguir um ser de outra espécie. Isso me parece
muito curioso.
Muito curioso também as palavras inglesas para cão e deus (dog = cão e god = deus) se
mostrarem uma inversão uma da outra. Mera coincidência?
No discurso de Hardy se encontra algo que comecei a pensar recentemente. Que o problema
da religião não está na religião em si, mas nos seus líderes. E realmente, a diferença entre
um Papa e um Dalai Lama me parece atroz. Como diz Hardy, “se Jesus Cristo vivesse hoje
em dia, dificilmente seria um cristão”. Mas esse fenômeno, a que chamarei a decadência das
elites, existe em todas as outras áreas.
Gosto do que Alain de Botton diz nessa palestra no Ted Talks. Que pela primeira vez na
história, vivemos numa sociedade em que o homem se venera a si mesmo. Esta nova
religião, também conhecida como narcisismo, talvez seja um dos motivos de nossa
decadência. Ela deu origem à aberração da chamada “celebridade”, mas nem todos os egos
parecem estar preparados para enfrentar semelhante coisa. Portanto, alguns entram em
decadência.
Fonte: pos-agoristas.blogspot.com