Você está na página 1de 3

“Homo Sapiens 1900”, dirigido por Peter Cowen e estreado na Suécia em

1998, aborda, de uma forma geral, as ideias de eugenia, higiene social e purificação
de raças, que assolavam o contexto social do início do século XX. Além dessas ideias,
o documentário também mostra que a eugenia não foi uma invenção dos alemães
nazistas, expondo os preceitos eugênicos que existiram também em povos como os
norte-americanos, soviéticos e suecos.

A ideia de superioridade e pureza, vistas durante o documentário, não


tem início com a eugenia; historicamente, esses ideais existem há muito tempo, desde
a antiguidade, por exemplo, com o ideal de corpo grego. Cowen mostra também que
uma parte dessa ritualística da eugenia já acontecia antes, como no costume ocidental
de abandonar ou o assassinar recém-nascidos que apresentavam “defeitos”.
Ademais, a presença dessas ideias de superioridade aparece em outros momentos
da história, como na Idade Média, em que existiu a questão da superioridade religiosa.

O documentário mostra como a arte está ligada aos ideais eugênicos,


como no século XV, com o corpo ideal de Leonardo da Vinci na obra “O Homem
Vitruviano”, em que as proporções do corpo perfeito são exaltadas. Nesse sentido, o
documentário mostra como os iluministas ajudaram também na construção da
eugenia, com seus preceitos sobre o contrato social e o homem. Dessa maneira,
vemos que não só a arte, mas também os pensadores e os filósofos contribuíram para
a constituição do que foi a eugenia.

Peter Cowen mostra como a teoria eugênica começou a partir do cientista


Francis Galton, que teorizou ideias de que a população “inferior” procriava mais
rapidamente, e que aqueles fossem considerados inferiores deveriam ser separados
dos considerados “superiores”. A partir disso, ocorrem o surgimento de correntes
ligadas a essas ideias eugênicas, onde elas são contrastadas entre si, sendo uma
dessas vertentes a ideia de uma eugenia positiva e uma eugenia negativa.

A eugenia positiva era a qual se buscava a melhora da raça humana a


partir do cruzamento entre seres superiores. A eugenia negativa, mais explorada no
documentário, buscava legitimar a esterilização, com o assassinato ou abandono de
recém-nascidos que se mostrassem incapacitados ou defeituosos. A ideia de eugenia
negativa foi mais difundida pois a “higiene social” acabou fazendo com que houvesse
justificativas para tais atos.
Sobre isso, pode-se afirmar também que área da Biologia foi muito
afetada por essas ideias, exemplificado no texto apresentado no cronograma da
disciplina, “A eugenia e sua genética histórica”, de Pietra Diwan. A autora aborda em
suas ideias que a Fisiologia, a Microbiologia e o Evolucionismo foram afetados, e, a
partir da Microbiologia, fundou-se essa percepção de higiene social, a fim de erradicar
doenças e epidemias. Essa é umas das bases que defendiam a ideia da eugenia
negativa, justificando-se que essa prática faria bem ao Evolucionismo ao longo do
tempo.

Um outro ponto que se mostrava destoante dentro da Biologia eram as


concepções do “Lamarckismo”, que divergiam das concepções do “Mendelismo”.
Enquanto Lamarck pregava que fatores externos influenciavam na genética humana,
e que características adquiridas ao longo da vida poderiam ser transferíveis, Mendel
dizia que somente as características herdadas pelos pais poderiam ser passadas
hereditariamente. No século XX, essas diferentes ideias eram rivais, sendo apoiadas
por uns e desaprovadas por outros.

Nesse sentido, a eugenia é vista e pensada de várias maneiras em


diferentes países, e Cowen busca explicitar essas visões, ampliando a concepção
comum de que a eugenia está totalmente e somente ligada à Alemanha e ao nazismo.
Para isso, o diretor aborda as percepções de eugenia da Suécia, dos EUA, da União
Soviética e da Alemanha.

A Suécia, como mostra o documentário, enxergava a eugenia como uma


condição de bem-estar social, já que supostamente aumentaria a produtividade do
país. Sendo assim, o bem-estar da nação estaria acima do bem-estar individual; além
disso, a procriação era vista como algo totalmente distinto do amor, sendo em primeiro
lugar uma responsabilidade social.

Já nos Estados Unidos e na Alemanha, o que predominava eram os


conceitos da eugenia negativa. Os dois países adotaram a teoria Mendelista, que dizia
que a genética seria passada de gerações para geração; portanto, todos aqueles que
nascessem com defeitos genéticos ou com alguma doença deveriam ser facilmente
descartados. Essas concepções eram totalmente voltadas para uma eugenia dos
corpos mais estéticos, que viria a ser uma grande influência para as ideias de Hitler.
Na União Soviética, o ideal eugenista era mais ligado ao intelecto, e,
portanto, as ideias de Lamarck predominavam. Os soviéticos acreditavam que
pessoas que adquirissem conhecimento e convivessem com outros indivíduos que
tinham a cabeça voltada para o pensamento da Revolução, iam dar continuidade a
ela, como uma herança adquirida.

O documentário mostra diversas vezes a Árvore da Eugenia, um símbolo


do pensamento eugênico. Nessa imagem, é mostrado como os mais variados campos
científicos dão base para as ideias eugênicas, sendo representados pelas raízes.
Nessas raízes, são evidenciadas a genética, a antropologia e a estatística, que por
sua vez dão origem a outras ciências secundárias, sendo todas elas estruturantes
para o pensamento. A figura, por mostrar tantas ciências atreladas à ideia de eugenia,
explicita como, para a época, um processo eugênico era totalmente atrelado a
evolução humana pelos mais diversos acadêmicos do século XX.

Por fim, Peter Cowen mostra como todos os estudos que os cientistas
fizeram na época, principalmente usando a estatística em combinação com a
genética, não funcionavam na prática, e que, na verdade, não é o material genético
que irá determinar o talento, a capacidade ou a beleza. Com a antropologia, é
mostrado como esses estudos do século passado eram carentes de informação, com
novos estudos comprovados cientificamente mostrando que as ideias de eugenia
estavam muito distantes do almejado desenvolvimento da raça humana.

Você também pode gostar