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DIREITO DAS

FAMÍLIAS
Proteção dos filhos
Janaina Marcos Souza

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Identificar as noções gerais e históricas sobre a proteção dos filhos.


>> Descrever as principais características da proteção dos filhos.
>> Definir alienação parental.

Introdução
Assim como a sociedade mudou, as famílias e seus núcleos familiares tam-
bém sofreram alterações. Aquela família composta por pai e mãe, casados até
o final da vida e com muitos filhos já não é mais o modelo padrão. Com isso,
o Direito teve de se adaptar à realidade. A valorização do afeto ganhou força,
sendo o sentimento o principal fundamento para o elo familiar. Nesse sentido,
a proteção legal dos filhos no cenário pós-divórcio deve ser atendida de maneira
especial e prioritária.
Neste capítulo, vamos explicar como se desenvolveram, historicamente,
os direitos das crianças e dos adolescentes e a proteção da figura dos filhos após
a separação dos pais. Também vamos tratar da Doutrina da Proteção Integral, dos
estatutos normativos que corroboram essa defesa e da Lei de Alienação Parental.

Noções gerais e históricas sobre a proteção


das crianças e dos adolescentes
Contemporaneamente, a legislação de matéria familiar prevê soluções para
diversas questões que atravessam os dilemas das famílias, inclusive aqueles
decorrentes do fim do vínculo afetivo entre casais e parceiros e do convívio
2 Proteção dos filhos

compartilhado com os filhos. A proteção legal destinada às crianças e aos


adolescentes é integral e aplica-se a toda coletividade de infantes e juvenis,
incluindo, assim, aqueles que integram um litígio de caráter familiar.
O Código Civil de 2002 traz uma série de regras sobre a proteção da pessoa
dos filhos, as quais se encontram no final das disposições do casamento,
compreendendo os arts. 1.583 a 1.590. Esses regramentos dizem respeito à
guarda e à convivência dos filhos menores de idade e dos maiores incapazes,
falando-se, ainda, brevemente em prestação de alimentos, quando no fim da
sociedade conjugal dos pais (BRASIL, 2002).
Conforme ensina Paulo Nader (2016), os pais não possuem direitos
em relação aos filhos, mas poder, advindo do poder familiar. Esse poder,
no entendimento do professor, não é um direito subjetivo sobre os filhos
menores, mas princípios e regras que permitem o pleno desenvolvimento
das capacidades físicas, mentais, culturais e afetivas dos menores. Trata-se
de um poder de fazer algo, como expressão de uma competência atribuída a
uma pessoa: a função parental às figuras do pai e da mãe.

Como a evolução da sociedade é anterior à formulação de leis e


de vocábulos jurídicos, algumas expressões sofrem o processo de
ressignificação com o avanço dos estudos. Uma delas é “poder familiar”, que,
atualmente, vem sendo substituída pela expressão função parental. A troca
busca uma relação familiar mais equânime, uma vez que a expressão “poder”
pode remeter, dependendo do contexto, a violência, agressão e abuso.

O poder familiar foi historicamente alterado na tentativa de superar a


relação abusiva dos pais com os filhos. Até pouco tempo atrás, na época do
Código Civil de 1916, era chamado de “pátrio poder”, sendo renomeado com
o advento do Código Civil de 2002, uma vez que, etimologicamente, a antiga
expressão se referia à palavra “pai” e possuía a conotação do homem como
chefe da família. Além disso, aludia à época do Direito romano e ao pater
potestas: o direito absoluto e ilimitado outorgado ao chefe da família, o pai,
sobre a pessoa dos filhos, não cabendo, ao Estado, qualquer interferência
na relação.
Proteção dos filhos 3

Por isso, atualmente, cabe ao pai e à mãe a percepção do verdadeiro


significado de paternidade e de maternidade a eles impostos, conforme
observam Gagliano e Pamplona Filho (2012), pois ostentam, frente aos filhos
menores, grande autoridade parental nos níveis jurídicos, morais e espirituais.
Consoante ao entendimento, Dias (2016) sustenta que o estado de família é
indisponível e que o elo familiar se perpetua mesmo depois da separação
de seus componentes.

Não por acaso, as disposições do Código Civil concernentes à proteção


aos filhos menores estão organizadas logo após àquelas que versam
sobre separação e divórcio dos cônjuges. O diploma civil se preocupou em garantir
que os pais cumpram o necessário para assegurar o pleno desenvolvimento
do infante ou juvenil até a fase adulta, independentemente de não haver mais
relação afetiva entre ambos. A proteção aos filhos deve ser integral até que se
cumpra a maioridade.

Rolf Madaleno (2012) atenta para o fato de a discussão da guarda e da


prestação alimentar acontecer junto aos atos processuais da separação e do
divórcio. O autor explica que esses tópicos devem ser discutidos juntos ao pro-
cesso que concretiza a separação. Assim, diante de uma ação ou homologação
de divórcio ou de separação, as propostas referentes à guarda e aos alimentos
dos filhos menores do casal devem ser apresentadas concomitantemente ao
pedido inicial. As regras também se aplicam na dissolução da união estável.
Além dos dispositivos do Código Civil que protegem os filhos quando seus
pais se separam, em 1990 o Brasil ratificou a Convenção sobre os Direitos das
Crianças, o tratado mais aceito sobre os direitos humanos das crianças, sob o
Decreto-Lei nº 99.710, de 21 de novembro de 1990 (BRASIL, 1990a). A convenção
foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1989 com o objetivo
de proteger a infância e promover a formação plena da criança, consagrando o
direcionamento do princípio da dignidade a todos os membros de uma família.
A Constituição Federal também possui grande importância na proteção
das crianças e dos filhos no Direito brasileiro sob o prisma da proteção aos
direitos humanos e fundamentais. O § 2º, art. 5º, assegura que todos os di-
reitos e garantias constitucionais internos não excluem outros, decorrentes
de tratados internacionais de que o País faça parte, como a Convenção sobre
os Direitos das Crianças (BRASIL, 1988). Essa convenção é fruto de um esforço
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histórico pelo reconhecimento e pela garantia dos direitos das crianças,


bem como pela busca da obrigatoriedade de tais regras protetivas no maior
número de países possíveis. Além disso, as medidas da convenção, por força
constitucional, têm aplicabilidade imediata e força de lei, resultado do avanço
na área das garantias fundamentais e do processo democrático no contexto
histórico da promulgação da Constituição em 1988.
Nesse sentido, o próprio texto constitucional, no art. 227, estabelece que
é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adoles-
cente e ao jovem, com prioridade, os direitos à vida, à saúde, à alimentação,
à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito,
à liberdade e às convivências familiar e comunitária, além da obrigação de
proteção de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).
Após a ratificação da referida convenção pelo Brasil, a legislação nacional
passou a ter um diploma específico para a proteção das crianças e dos ado-
lescentes. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069, de 13
de julho de 1990 (BRASIL, 1990b), chegou para reforçar direitos já existentes,
implementar novos, trazer novos conceitos e entendimentos ao Direito, além
de garantir a proteção integral prioritárias das crianças e dos adolescentes.

A partir da promulgação do ECA, o ordenamento jurídico passou a


entender as crianças e os adolescentes como sujeitos de direito.
No contexto familiar, os filhos não são coisas ou objetos. O documento também
estipulou que criança é a pessoa até 12 anos de idade incompletos e que ado-
lescente é aquela entre 12 e 18 anos de idade. O diploma ainda se destaca por
trazer, no art. 249, a possibilidade de aplicação de multa de três a 20 salários
aos pais que descumprirem, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao
poder familiar.

Outrossim, a Lei nº 11.698, de 13 de junho de 2008, instituiu a guarda


compartilhada no Código Civil de 2002, e a Lei nº 13.058, de 22 de dezembro
de 2014, estabeleceu o significado da expressão “guarda compartilhada”
e dispôs sobre sua aplicação. Quando os pais se separam, deve haver um
equilíbrio entre os direitos e deveres parentais, e a implementação da guarda
compartilhada intenta a divisão das tarefas e do convívio com os filhos de
maneira harmônica entre pai e mãe, observando as condições do caso concreto
e os interesses da criança.
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Como pode ser observado, as crianças e adolescentes, especialmente


quando inseridos no papel de filhos, contam com o amparo de leis, con-
venções e estatutos de salvaguarda. A proteção, no entanto, não deve ser
apenas legal: sua efetivação deve ser responsabilidade também da família,
da sociedade e do Estado.

A doutrina da proteção integral para


crianças e adolescentes
Depois das discussões em nível internacional acerca da Convenção sobre
os Direitos das Crianças, a Constituição Federal e o ECA trouxeram, ao or-
denamento jurídico, a figura da Doutrina da Proteção Integral, afirmando as
crianças e os adolescentes como sujeitos de direitos destinatários de um
complexo de garantias protetivas.
Como declara Dias (2016), pelo fato de as crianças e os adolescentes serem
mais vulneráveis e estarem em fase de desenvolvimento, cabe a promulgação
de uma lei que os torne destinatários de tratamento especial. Reforçando a
ideia, o art. 3º do ECA garante, à criança e ao adolescente, todos os direitos e
as garantias fundamentais inerentes à pessoa humana, além de serem sujeitos
da doutrina da proteção integral a qual o estatuto se refere (BRASIL, 1990b).
Por isso, os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes constan-
tes no art. 227 da Constituição Federal são absolutamente prioritários. Esses
direitos se traduzem em instrumentos de efetivação da proteção integral,
impondo limites à família, ao Estado e à sociedade e deles cobrando os meios
para o desenvolvimento saudável dos menores de idade.
A Doutrina de Proteção Integral, portanto, engloba o princípio do melhor
interesse da criança, o princípio da paternidade responsável e o princípio da
proteção integral. Isso posto, conforme nos lembra Lôbo (2011), a Doutrina
de Proteção Integral para crianças e adolescentes não é uma simples reco-
mendação de nível ético, mas uma diretriz determinante nas relações entre
crianças, adolescentes, filhos, pais, família, Estado e sociedade. Nesse sentido,
Maria Berenice Dias (2016, p. 81) explica:

As formas de implementar todo esse leque de direitos e garantias estão no Estatuto


da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990): microssistema com normas de
conteúdo material e processual, de natureza civil e penal, que reconhece crianças
e adolescentes como sujeitos de direito. O ECA rege-se pelos princípios do melhor
interesse, paternidade responsável e proteção integral, visando a conduzi-los à
maioridade de forma responsável, como sujeito da própria vida, para que possam
gozar de forma plena de seus direitos fundamentais.
6 Proteção dos filhos

O princípio da proteção integral se encontra respaldado no art. 1º do ECA,


o qual estabelece que tal estatuto “[...] dispõe sobre a proteção integral à
criança e ao adolescente” (BRASIL, 1990b, documento on-line). Aliás, o ECA
surge no ordenamento jurídico brasileiro com o objetivo de regulamentar e
implementar o sistema de proteção integral previsto na Constituição Federal
quando estabelece os direitos e garantias fundamentais aos menores.
O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente é um dos
pilares da Doutrina de Proteção Integral. Conforme alude o art. 3, item 1,
da Convenção sobre os Direitos das Crianças, todas as ações que se referem à
criança “[...] sejam elas levadas a efeito por instituições públicas ou privadas
de assistência social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legis-
lativos, devem considerar primordialmente o melhor interesse da criança”
(BRASIL, 1990a, documento on-line).
Já o princípio da paternidade responsável vem ganhando força nos últimos
anos. Sua essência existe antes de ser tutelado em lei, mas tanto a Carta Magna
quanto o ECA e a Convenção sobre os Direitos das Crianças impõem, aos pais,
a responsabilidade da presença de suas vidas nas vidas de seus filhos. Trata-
-se de uma garantia fundamental do acompanhamento dos filhos pelos pais.

Madaleno (2012) destaca que, atualmente, o conceito de família


é centrado no afeto, e isso impõe, aos pais, o dever de criar seus
filhos com o cuidado necessário para a formação plena de sua personalidade.
Assim, a convivência dos filhos com os pais não é um direito do genitor, mas do
filho, e, por isso, não se fala em obrigação de amar, mas no impostergável dever
de cuidar. Ainda de acordo com o professor, o valor jurídico do cuidado está
incorporado no sistema jurídico brasileiro, no art. 227 da Constituição Federal
e nas disposições infraconstitucionais, constantes no Código Civil e no ECA,
consubstanciando a denominada paternidade responsável.

Todos esses princípios reafirmam a dignidade da pessoa humana das


crianças e dos adolescentes, além de deixar elucidado como são sujeitos
de direito, embora sejam reconhecidas suas vulnerabilidades. Com a obser-
vância de todos os princípios norteadores do melhor desenvolvimento de
uma criança e de um adolescente até a vida adulta, tem-se a efetivação da
proteção integral. Esta, por sua vez, vai conduzir quaisquer decisões jurídicas
que envolvam a figura dos filhos no seio de uma lide familiar.
Proteção dos filhos 7

A guarda compartilhada e a proteção integral


A dissolução do vínculo conjugal importa, também, na decisão acerca da guarda
dos filhos. Seguindo a Doutrina da Proteção Integral, o ordenamento jurídico
brasileiro adota, como regra, a guarda compartilhada, que, por definição
legal do art. 1.583, § 1º, do Código Civil, compreende “[...] a responsabilização
conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam
sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns” (BRA-
SIL, 2002, documento on-line). O art. 1.584, § 2º, por sua vez, estabelece que:

[...] quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho,
encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada
a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que
não deseja a guarda do menor (BRASIL, 2002, documento on-line).

Assim, cabe ao magistrado estipular, em ordem prioritária, a guarda com-


partilhada, salvo se um dos pais não quiser ou não puder exercê-la. Nesse
caso, cabe a guarda unilateral, quando o menor tem residência fixa com um
de seus genitores, o qual terá maior responsabilidade nas decisões sobre a
criança. O pai que não morar com o filho na guarda unilateral tem direito de
convivência familiar e dever de pagamento de alimentos. Além disso, a lei
obriga, ao genitor não detentor da guarda, a supervisão dos interesses dos
filhos, podendo solicitar informações objetivas e subjetivas em assuntos
referentes à saúde e educação dos menores (BRASIL, 2002).
A doutrina especializada diverge acerca da compulsoriedade do compar-
tilhamento da guarda. Dias (2016) entende que, a fim de preservar a proteção
integral da criança e do adolescente, o melhor interesse da criança e a pa-
ternidade responsável, deve-se aplicar, compulsoriamente, a guarda com-
partilhada, ainda que a relação entre os pais seja precária. Gonçalves (2012),
por outro lado, aponta que fixar guarda compartilhada compulsoriamente
quando o casal não acorda a respeito seria uma tarefa árdua e ineficaz, pois,
ainda que, teoricamente, atenda ao melhor interesse da criança, o exercício
da guarda compartilhada somente será real quando os genitores acordarem
a respeito e entenderem seus benefícios.

Nader (2016) aponta que a fórmula da guarda compartilhada necessita


de consciência e entendimento entre os pais, que devem compreender
a importância do cumprimento dos deveres referentes à guarda.
Não havendo cumprimento, cabe penalização como, por exemplo, a redução
do número de horas de convívio.
8 Proteção dos filhos

Embora parte da doutrina entenda que, em casos de conflito entre os


pais, a guarda compartilhada deva ser aplicada compulsoriamente, para,
por exemplo, obrigá-los a conversarem, a tomarem decisões e a exerce-
rem responsabilidades conjuntas, trazemos ao estudo algumas reflexões.
Como será observada a proteção integral de uma criança inserida em guarda
compartilhada na qual seus pais brigam diariamente sobre as decisões que
dizem respeito a sua existência? Qual é a qualidade de saúde mental de uma
criança ou de um adolescente nesse contexto? Essas questões indicam que
as decisões que englobam o melhor interesse de uma criança não podem ser
uma tarefa imposta, mas assimilada em conjunto pelos pais.
Madaleno (2012) sugere um plano de parentalidade, um documento ela-
borado para estabelecer as obrigações de cada pai quando tiverem que
tomar decisões conjuntas acerca da educação, da saúde e do bem-estar
físico, social e emocional dos filhos. Dessa maneira, quanto mais hostil for o
relacionamento entre os pais, mais detalhadamente deve ser regulamentado
o regime de convivência. Um plano de parentalidade por tempo determinado,
entretanto, talvez não solucione o que anos que convivência não resolveram
e, por isso, deve-se estar atento aos fatos concretos de cada situação, a fim
de cobrar, dos pais, a responsabilidade que lhes é atribuída para efetivar a
proteção integral dos filhos.
Os pais, portanto, devem atuar além de suas vaidades quando as decisões
em litígio versarem sobre seus filhos. Independentemente da modalidade de
guarda acolhida no processo de separação, de divórcio ou de dissolução de
união estável, a autoridade parental não fica prejudicada. Madaleno (2012)
atenta que a guarda somente identifica quem tem o filho em sua companhia,
diante da inexistência ou dissolução da sociedade afetiva dos pais, perma-
necendo intacta a autoridade parental. Nesse sentido, Nader (2016) traz os
seguintes apontamentos:

Em matéria de guarda e proteção em geral dos filhos prevalece o Princípio do


Melhor Interesse, sempre que ao juiz for dado decidir a respeito. [...] Como o melhor
interesse dos filhos nem sempre se revela ao juiz em suas observações e análise
pessoal, na busca de seu convencimento poderá valer-se de laudo técnico emitido
por profissional ou equipe interdisciplinar. Igualmente, para efeito de estabelecer
o regulamento da guarda compartilhada.
Proteção dos filhos 9

De qualquer maneira, a fim de proteger os filhos remanescentes de um


casal em dissolução de vínculo conjugal, a ação jurídica correspondente deve
estabelecer a guarda e a prestação de alimentos de pronto. Como destaca
Madaleno (2012), o estabelecimento da guarda (compartilhada ou unilateral;
os fatos indicarão a melhor solução) é item condicional e inarredável para o
ajuste da quantia a ser paga à título de pensão alimentícia.

O direito ao convívio familiar


O art. 1.589 do Código Civil estabelece que “[...] o pai ou a mãe, em cuja guarda
não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o
que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar
sua manutenção e educação” (BRASIL, 2002, documento on-line). É importante
salientar que, atualmente, não se fala mais em “visitas”, mas em “convivência”
com os filhos. Nesse sentido, Madaleno (2012) preconiza que:

A visita que melhor seria identificada pela expressão convivência, pois pais con-
vivem com seus filhos e não apenas os visitam, é um expediente jurídico forjado
para preencher os efeitos da ruptura da convivência familiar, antes exercida no
primitivo domicílio conjugal. A convivência representa, em realidade, um desdo-
bramento da guarda definida com a separação dos pais, e como tal detém a tarefa
de assegurar a adequada comunicação e supervisão da educação dos filhos, do
pai ou da mãe não convivente a respeito dos filhos, cuja guarda foi outorgada
ao outro, a parente, a terceiro ou, mesmo, à instituição, consiste no direito de
manter um contato pessoal com o menor, da maneira mais ampla e fecunda que
as circunstâncias possibilitam.

O art. 227 da Carta Magna, com absoluta prioridade, reconhece o direito,


da criança e do adolescente, à convivência com sua família (BRASIL, 1988).
Trata-se, portanto, de um direito fundamental, que garante aos filhos o
desenvolvimento saudável de todas suas faculdades. Nesse sentido, Nader
(2016) aponta que o direito ao convívio dos pais com os filhos é irrenunciável,
posto que o interesse maior protegido é o das crianças, é natural, pois não
pode ser subtraído dos pais, e é líquido e certo, admitindo mandado de
segurança quando for necessário assegurar esse direito.
Como vimos, o caput do art. 1.589 do Código Civil brasileiro garante, ao pai
que não possui a guarda da criança ou do adolescente, a função de respon-
sabilidade referente à fiscalização do filho quanto ao modo de sua criação.
No entanto, esse direito não dá prerrogativas invasivas ou constrangedoras,
além de o genitor titular da guarda ter direito constitucional à privacidade.
10 Proteção dos filhos

A concepção de entidade familiar, então, reside no afeto. Assim, é de


suma relevância o vínculo dos genitores com seus filhos e o tempo
de convívio entre eles para a manutenção dos laços de afeição e a construção
da identidade pessoal. O tempo de convívio também se relaciona ao princípio
da paternidade responsável, bem como ao princípio da dignidade humana, por
ser um direito fundamental.

O tempo de convívio dos filhos com ambos os pais deve ser dividido de
maneira equilibrada, priorizando a proteção integral da criança e do adoles-
cente. A guarda compartilhada, quando ambos os pais possuem condições
de exercê-la, é obrigatória por força de lei (BRASIL, 2002) e essa modalidade,
por conceituação teórica e legal, determina a divisão do tempo de convívio
de forma equilibrada entre os pais.
Entretanto, a efetivação do direito ao convívio não se dá mediante simples
determinação da guarda compartilhada: é preciso o comprometimento e a
responsabilidade dos pais para que ela funcione da melhor maneira possível
para as crianças e os adolescentes. De fato, a decisão relativa à guarda e ao
direito de convivência pode ser reconsiderada a qualquer momento pela
justiça brasileira, bastando, para tanto, que a situação fática se altere, seja por
parte do pai, da mãe, de terceiros responsáveis pela a guarda ou do próprio
menor, em qualquer circunstância; porém, o princípio do melhor interesse
da criança deve prevalecer (NADER, 2016).

Alienação parental
O Brasil, desde 2010, possui uma lei que versa sobre atos classificados
como “alienação parental”. A Lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010, estipula,
no art. 2º, o conceito da alienação parental, bem como traz alguns exemplos
do que seriam esses atos na prática. Vejamos o teor do artigo (BRASIL, 2010,
documento on-line):

Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psico-


lógica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores,
pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade,
guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabele-
cimento ou à manutenção de vínculos com este.
Proteção dos filhos 11

Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos
assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou
com auxílio de terceiros:
I — realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da
paternidade ou maternidade;
II — dificultar o exercício da autoridade parental;
III — dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV — dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V — omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a
criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI — apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra
avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII — mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar
a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste
ou com avós.

De acordo com a psicologia, há possibilidades de crianças e adolescentes


sofrerem emocionalmente com o divórcio ou a separação dos pais. Devido ao
contexto estressante em que todos os participantes desse núcleo familiar se
encontram, é necessário tomar cautela e pensar com cuidado no bem-estar
dos menores.
No entanto, em alguns litígios familiaristas, em especial os que dizem
respeito à dissolução da união afetiva, pode haver desequilíbrio na gerência
das emoções pelas partes envolvidas. Se um dos pais causar dor em seu/sua
ex-cônjuge, utilizando-se do filho para promover campanha de difamação e
lavagem cerebral contra o outro pai/mãe, deve-se investigar melhor o caso.
Fala-se em alienação parental, portanto, quando um dos genitores, avós
ou quem tenha a guarda do menor, interfere intencionalmente na liberdade
psicológica de seus filhos de modo a produzir antipatia pelo outro genitor,
causando dano ao relacionamento ou rejeição. Rizzardo (2019) destaca que
os fatos que revelam a alienação parental são praticados em momentos
posteriores à definição das regras da guarda dos filhos e dos feitos que
tratam do divórcio.

O termo “alienação parental” foi cunhado pelo médico norte-ame-


ricano Richard Gardner em meados dos anos 1980, quando, a partir
de seu trabalho com litígios de divórcio envolvendo crianças nos tribunais dos
Estados Unidos e de sua interpretação dos fatos, entendeu que a mãe ou o pai
induzia, nos filhos, o rompimento dos laços afetivos intencionalmente com o
outro cônjuge (MADALENO, 2012).
12 Proteção dos filhos

Atualmente, o Brasil determina que, quando houver indícios de atos de


alienação parental, o processo terá tramitação prioritária e o juiz determinará,
com urgência e ouvindo o Ministério Público, as medidas necessárias para a
preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive
para assegurar a convivência com o genitor, caso esteja sendo impedida,
ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos.
Quem pratica atos de alienação parental é chamado de genitor alienador,
enquanto o outro pai é chamado de genitor alienado. A doutrina explica que
o motivo determinante da conduta do genitor alienador atravessa sentimen-
tos de possessividade, desejo de vingança, sentimento de injustiça e ciúme
(NADER, 2016).
As ferramentas da Psicologia auxiliam o Direito para melhor compreender
as motivações psicológicas da rejeição de um filho para com o seu pai ou
mãe, que podem ser múltiplas e complexas. Por isso, o juiz do caso, havendo
indícios de alienação parental, caso julgue necessário, determinará perícia
psicológica ou biopsicossocial.
Conforme explica a Lei nº 12.318/2010, o laudo pericial terá base em ampla
avaliação psicológica ou biopsicossocial com entrevista pessoal com as partes,
exame de documentos dos autos, do histórico do relacionamento do casal e
da separação e da cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos
envolvidos e análise da forma como a criança ou adolescente se manifesta
acerca de eventual acusação contra o genitor.

Apesar de transcrever uma série de condutas que se enquadram na


alienação parental, a lista da Lei não é taxativa, mas exemplificativa.
Por isso, de acordo com o que pontua Madaleno (2012), a legislação em tela
concede, ao juiz, a faculdade de reconhecer, por si, tais atos alienantes no
processo, ou utilizar-se do trabalho técnico da perícia.

A Lei também prevê penalidades de diferentes graus ao genitor alienador,


sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal, como declara-
ção da ocorrência de alienação parental e advertência ao alienador, ampliação
do regime de convivência em favor do genitor alienado, multa, acompanha-
mento psicológico e/ou biopsicossocial, alteração da guarda, fixação cautelar
do domicílio da criança ou adolescente e suspensão da autoridade parental
(BRASIL, 2010). Portanto, segundo o que explicam Gagliano e Pamplona Filho
Proteção dos filhos 13

(2012), existe uma gradação na sanção, desde uma medida mais branda,
a advertência, podendo culminar com uma imposição muito mais grave,
a suspensão do poder familiar. Os atos processuais, apesar disso, garantem
o contraditório e a ampla defesa em qualquer circunstância.
A guarda compartilhada abriga a esperança da divisão equânime entre as
atribuições de vigilância, companhia e proteção dos filhos, mesmo quando os
pais não vivem mais sob o mesmo teto ou não constituem entidade familiar
(NADER, 2016). Porém, o art. 7º da Lei nº 12.318/2010 define que, nos casos em
que são inviáveis a guarda compartilhada, a criança ou o adolescente ficará,
preferencialmente, com o genitor que viabiliza a efetiva convivência com o
outro genitor (BRASIL, 2010).
Cabe destacar que o juiz pode, provisoriamente, ouvindo especialistas,
restringir ou suspender o direito de convivência, na hipótese de um filho, por
causas conhecidas ou não, apresentar resistência ou rejeição à presença de
um dos genitores, medida cabível, por exemplo, quando um dos pais abusou
ou tentou abusar sexualmente de um filho, causando-lhe trauma (NADER,
2016). O art. 1.638, III, do Código Civil prevê perda do poder familiar em uma
situação como essa (BRASIL, 2002).
Gonçalves (2012) opina que a Lei nº 12.318/2010 tem mais caráter educa-
tivo, uma vez que o Judiciário já vinha aplicando providências para proteger
crianças e adolescentes quando constatadas práticas de alienação parental.
Quanto à matéria recursal, a Lei nada prevê, devendo ser aplicado o regime
do Código de Processo Civil, não do ECA (DIAS, 2016).
A guarda, em qualquer situação, deve ser exercida com responsabili-
dade, atendendo-se o melhor interesse dos filhos (NADER, 2016). Portanto,
deve-se atentar para o uso correto da Lei de Alienação Parental, uma vez
que, se utilizada de má-fé, como instrumento de beligerância entre pai e
mãe, mantém e prolonga o desgaste emocional das crianças e de todos os
envolvidos, não trazendo eficácia, tampouco focando na proteção integral
dos filhos, no superior interesse dos menores e na paternidade responsável.
A proteção integral das crianças e dos adolescentes deve ser sempre levada
em consideração e de maneira prioritária.

A alienação parental acontece quando, por exemplo, a mãe toma


iniciativa de pedir o divórcio, e o pai, por ressentimento, implanta,
nos filhos ideias, de desamor, de rejeição e de abandono, fazendo-os acreditar
que a separação é deles, semeando lembranças falsas e promovendo campanha
difamatória contra a mãe. Consequentemente, os filhos começam a rejeitar a mãe.
14 Proteção dos filhos

Referências
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BRASIL. Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990. Promulga a Convenção sobre os
Direitos da Criança. Diário Oficial da União, Brasília, 22 nov. 1990a. Disponível em: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d99710.htm. Acesso em: 23 nov. 2020.
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e
do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 16 jul.
1990b. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em:
23 nov. 2020.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial
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BRASIL. Lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e
altera o art. 236 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Diário Oficial da União, Brasília,
27 ago. 2010. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/
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DIAS, M. B. Manual de direito das famílias. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.
GAGLIANO, P. S.; PAMPLONA FILHO, R. Novo curso de direito civil. 14. ed. São Paulo:
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2012. 6 v.
LÔBO, P. L. N. Direito civil: família. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
MADALENO, R. Direito de família. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012.
NADER, P. Curso de direito civil: direito de família. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. 5 v.
RIZZARDO, A. Direito de família. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019.

Leituras recomendadas
BRASIL. Lei nº 11.698, de 13 de junho de 2008. Altera os arts. 1.583 e 1.584 da Lei
nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, para instituir e disciplinar a guarda
compartilhada. Diário Oficial da União, Brasília, 16 jun. 2008. Disponível em: http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11698.htm. Acesso em: 23 nov. 2020.
BRASIL. Lei nº 13.058, de 22 de dezembro de 2014. Altera os arts. 1.583, 1.584, 1.585
e 1.634 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), para estabelecer o
significado da expressão “guarda compartilhada” e dispor sobre sua aplicação. Diário
Oficial da União, Brasília, 23 dez. 2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13058.htm. Acesso em: 23 nov. 2020.
STAUDT, A. C. P.; WAGNER, A. A experiência da guarda compartilhada dos filhos: uma
revisão integrativa. Revista da Faculdade de Direito UFPR, v. 64, nº 3, p. 107–132, set./
dez. 2019. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/direito/article/view/65531. Acesso
em: 23 nov. 2020.
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