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Manual de Contabilidade e

Análise Financeira
Sílvia Cortês
2018
Manual de Contabilidade e Análise Financeira

Este manual destina-se a ser utilizado no âmbito das disciplinas de Contabilidade e Análise Financeira. Não
pretende ser uma exposição exaustiva destes tópicos mas sim um apoio à matéria dada nas aulas.

Está dividido em três partes:

 Contabilidade financeira: explicam-se as bases contabilísticas necessárias para se perceber a


realidade financeira das empresas e para criar uma linguagem comum aos gestores, desenvolvendo-se a
capacidade de compreensão dos documentos contabilísticos.

 Análise económico-financeira: pretende-se sistematizar os conceitos fundamentais da análise


económico-financeira com base numa adequada interpretação dos documentos contabilísticos.

 Aplicação prática das matérias desenvolvidas anteriormente.

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Manual de Contabilidade e Análise Financeira

TÓPICOS

I. A CONTABILIDADE FINANCEIRA ............................................................................................. 4


1. A informação contabilística ...................................................................................................... 4
1.1. A contabilidade como instrumento de gestão .................................................................. 4
1.2. Enquadramento contabilístico ......................................................................................... 5
1.3. Demonstrações Financeiras ............................................................................................ 6
2. O Balanço ................................................................................................................................ 7
2.1. Introdução........................................................................................................................ 7
2.2. Ativo................................................................................................................................. 8
2.3. Capital Próprio e Passivo ................................................................................................ 9
2.4. Leitura do Balanço ......................................................................................................... 10
3. A Demonstração de Resultados ............................................................................................ 11
4. A Demonstração de Fluxos de Caixa .................................................................................... 14
5. As notas anexas .................................................................................................................... 15
6. Os Balancetes e os lançamentos contabilísticos ................................................................... 16
6.1. Quadro de contas .......................................................................................................... 16
6.2. Balancetes ..................................................................................................................... 17
6.3. O método das partidas dobradas................................................................................... 18
7. Detalhes de algumas contas ................................................................................................. 19
7.1. Acréscimos e diferimentos............................................................................................. 19
7.2. Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).................................................................... 21
7.3. Processamento de salários ........................................................................................... 22
7.4. Descontos...................................................................................................................... 23
7.5. Inventários ..................................................................................................................... 24
7.6. Locações ....................................................................................................................... 26
7.7. Capital Próprio ............................................................................................................... 27
8. Nomenclatura utilizada nas contas consolidadas .................................................................. 29
II. ANÁLISE ECONÓMICO-FINANCEIRA .................................................................................... 32
9. Análise de rácios ................................................................................................................... 32
10. Estrutura de financiamento .................................................................................................... 32
11. Demonstração de Resultados reclassificada ......................................................................... 34
12. Rácios de rendibilidade ......................................................................................................... 35
13. Decomposição da Rentabilidade do Capital Próprio.............................................................. 37
14. Rácios de funcionamento ...................................................................................................... 39
15. Rácios de liquidez ................................................................................................................. 41
16. Fundo de Maneio e equilíbrio financeiro ................................................................................ 42
17. Cobertura da dívida e dos juros, e custo do passivo ............................................................. 45
18. Análise da Demonstração de Fluxos de Caixa ...................................................................... 46
APLICAÇÃO PRÁTICA...................................................................................................................... 47
19. Análise do Balanço ................................................................................................................ 47
20. Rácios de financiamento ....................................................................................................... 49
21. Análise da Demonstração de Resultados .............................................................................. 50
22. Rácios de rendibilidade ......................................................................................................... 51
23. Decomposição da Rentabilidade do Capital Próprio.............................................................. 52
24. Rácios de funcionamento ...................................................................................................... 53
25. Rácios de liquidez ................................................................................................................. 53
26. Fundo de Maneio e equilíbrio financeiro ................................................................................ 54
27. Cobertura da dívida e dos juros, e custo do passivo ............................................................. 54
28. Demonstração dos Fluxos de Caixa ...................................................................................... 55
29. Conclusão.............................................................................................................................. 56

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I. A CONTABILIDADE FINANCEIRA

1. A informação contabilística

1.1. A contabilidade como instrumento de gestão

Contabilidade é a ciência que estuda e interpreta o registo dos fenómenos que afetam o património de uma
empresa. A contabilidade é inseparável da gestão pois fornece a informação para a tomada de decisão.

A análise dos documentos contabilísticos permite obter muita informação sobre a empresa que está a ser
analisada, nomeadamente:
 Que tipo de bens e direitos a empresa tem
 Que investimentos fez
 A quem deve dinheiro
 Quanto faturou
 Quais os resultados obtidos
 Como utilizou o dinheiro
 …

Há diversos intervenientes económicos interessados nesta informação. Conforme o seu envolvimento na


empresa estes poderão ter mais ou menos informação. Os utilizadores internos têm mais informação e
informação mais fidedigna. Os externos normalmente não têm tanta informação.

Como utilizadores internos, que necessitam da informação para gerir a empresa, podemos destacar:
 Administração e direção
 Todos aqueles que tomam decisões

Já no que diz respeito aos utilizadores externos, que precisam da informação para avaliar o nível de risco da
empresa com a qual estão envolvidos, salientamos:
 Acionistas/potenciais investidores
 Instituições financeiras
 Fornecedores
 Clientes
 Concorrentes
 Estado
 Empregados

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1.2. Enquadramento contabilístico

A informação contabilística tem de ser construída e apresentada segundo regras pré-definidas.

Em Portugal, até 2005, estas estavam estipuladas no Plano Oficial de Contabilidade (POC).

Em 2002 a União Europeia, através do regulamento (CE) nº 1606/2002 do Parlamento Europeu e do


Conselho, veio a prever a adoção e utilização na Comunidade das Normas Internacionais de Contabilidade
para as empresas cotadas e consolidadas, a partir do exercício de 2005. Para as restantes empresas cada
Estado Membro poderia decidir o que fazer.

Em Portugal a decisão tomada foi de continuar a usar o POC até 2009.

Em 2010 o POC foi substituído pelo Sistema de Normalização Contabilística (SNC) e pela Normalização
Contabilística para Microentidades (NCM).

Em 2016 o Sistema Nacional foi reorganizado, ficando definida a seguinte situação:

 IAS / IFRS *, obrigatório, para empresas cotadas

 IAS / IFRS, optativo, para empresas não cotadas mas com certificação legal de contas

 Sistema de Normalização Contabilística em que estão previstas 4 situações:


 Microentidades
 Pequenas entidades
 Médias entidades
 Grandes entidades (ultrapassem 2 dos 3 limites ou sejam de interesse público)

Para uma empresa ser considerada micro, pequena ou média entidade não pode ultrapassar 2 dos 3 limites
seguintes:

Não ultrapassem Total do Volume de Número médio


2 dos 3 limites Balanço (€) negócios líquido (€) de empregados

Microentidades 350.000 700.000 10

Pequenas entidades 4.000.000 8.000.000 50

Médias entidades 20.000.000 40.000.000 250

(*) O sistema internacional é composto por IAS: International Accounting Standards e IFRS: International
Financial Reporting Standards.

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1.3. Demonstrações Financeiras

O conjunto de demonstrações financeiras obrigatórias nos vários sistemas alternativos, Normas Internacionais
e Nacionais é o apresentado no quadro seguinte.

A Normas Internacionais permitem uma maior flexibilidade que o SNC, com o objetivo de adaptar a
informação às características concretas de cada empresa. O sistema é mais simples para as pequenas
entidades e ainda mais para as micro.

Normas Normas Nacionais


Internacionais Grandes Médias Pequenas Micro

1. Balanço Sim Sim Sim Sim Sim

2. Demonstração Por natureza ou Por Por Por Por


de Resultados por funções natureza natureza natureza natureza
3. D. Alterações no
Sim Sim Sim -- --
Capital Próprio
4. D. de Fluxos de
Sim Sim Sim -- --
Caixa

5. Anexo Sim Sim Sim Sim --

1. O Balanço é a base da informação financeira. Representa o património da empresa num determinado


momento.
2. A Demonstração de Resultados explica o que aconteceu durante o ano, mostrando como se obteve o
resultado líquido que aparece no Balanço.
3. A Demonstração de Alterações no Capital Próprio mostra a evolução do capital próprio.
4. A Demonstração de Fluxos de Caixa põe em evidência a forma como a empresa obteve e investiu o seu
dinheiro.
5. As notas anexas fornecem informação complementar sobre diversas rubricas dos restantes documentos
contabilísticos

É de salientar que estas Demonstrações Financeiras estão todas interligadas:

BALANÇO

Capital Próprio
Ativo .....
..... Resultado líquido DEMONSTRAÇÃO
DEMONSTRAÇÃO Caixa e equivalentes DE RESULTADOS
DE FLUXOS DE CAIXA Passivo
.....

Notas anexas

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2. O Balanço

2.1. Introdução

O Balanço é o documento que representa a situação patrimonial da empresa num determinado momento.
Nesse sentido diz-se que é um documento estático.

As empresas são obrigadas a apresentar o Balanço pelo menos uma vez por ano, normalmente a 31 de
Dezembro. As empresas cotadas na Bolsa de valores Mobiliários têm essa obrigatoriedade trimestralmente.

O Balanço está dividido em duas partes:


 Bens e direitos da empresa  Ativo
 Obrigações e responsabilidades / fontes de financiamento Passivo e Capital Próprio

Em qualquer momento o Ativo = Capital Próprio + Passivo

De seguida apresenta-se um exemplo de Balanço:

ATIVO CAPITAL PRÓPRIO E PASSIVO


Ativos não correntes Capital Próprio
Ativos fixos tangíveis Capital
Propriedades de investimento Reservas e resultados transitados
Ativos intangíveis Resultado líquido
Investimentos financeiros TOTAL DO CAPITAL PRÓPRIO
Ativos por impostos diferidos Passivos não correntes
Outros ativos não correntes Provisões
Total de ativos não correntes Empréstimos obtidos
Ativos correntes Outros passivos não correntes
Total de passivos não correntes
Inventários Passivos correntes
Clientes Empréstimos obtidos
Estado Fornecedores
Outras contas a receber Estado
Outros ativos correntes Outras contas a pagar
Caixa e equivalentes de caixa Outros passivos correntes
Total de ativos correntes Total de passivos correntes
TOTAL DO PASSIVO
TOTAL DO ATIVO = TOTAL DO C.P. E PASSIVO

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2.2. Ativo

A definição formal de ativo é “um recurso controlado pela empresa, como resultado de acontecimentos
passados e do qual se esperam que fluam para a empresa benefícios económico futuros”. Em termos mais
simples o ativo representa os bens e direitos da empresa numa determinada data.

Está dividido em ativos não correntes e ativos correntes, conforme a maturidade das rubricas:
 Ativos não correntes  bens duradouros, têm uma maturidade superior a 1 ano
 Ativos correntes  bens com maturidade inferior a 1 ano

Ativo não corrente:

De seguida apresenta-se a explicação das principais rubricas dos ativos não correntes:

 Ativos fixos tangíveis: bens duradouros e com forma física. Exemplos: edifícios, máquinas, viaturas…

 Propriedades de investimento: bens imóveis (terrenos e/ou edifícios) que não são usados na
atividade mas sim para deles se retirar rendimento direto através de rendas ou revalorização.

 Ativos intangíveis: direitos duradouros. Exemplos: patentes, marcas adquiridas, trespasses…

 Investimentos financeiros: investimento em ativos financeiros. Estes são os ativos que outras
empresas emitem para se financiar. Exemplos: ações, obrigações…

 Ativos por impostos diferidos: direito de pagar menos IRC no futuro. Não está relacionado com a
conta corrente do ano atual que aparece refletida no Estado.

Ativo corrente:

De seguida apresenta-se a explicação das principais rubricas dos ativos correntes:

 Inventários: stock de bens que a empresa tem para venda ou transformação na data de balanço.
Podemos dividir em mercadorias (bens que a empresa adquire para posteriormente vender sem transformar),
matérias-primas (bens que a empresa compra para transformar) e produtos (bens que a empresa produziu
para vender).

 Contas a receber: dívidas que terceiros têm para com a empresa. Exemplos: dívidas de clientes,
dívidas do Estado, dívidas dos sócios…

 Outros ativos correntes: incluem acréscimos e diferimentos.

 Caixa e seus equivalentes: caixa, depósitos e aplicações financeiras (de curto prazo e risco reduzido).

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2.3. Capital Próprio e Passivo

O capital próprio e o passivo representam as obrigações/responsabilidades da empresa.

A definição formal de passivo é “uma obrigação presente da empresa, proveniente de acontecimentos


passados da liquidação da qual se espera que resulte uma saída de recursos da empresa”. Em termos mais
simples o passivo representa as obrigações da empresa perante os seus credores, numa determinada data.

Já no que diz respeito ao capital próprio a sua definição é “o interesse residual nos ativos da empresa depois
de deduzir todos os seus passivos”. Simplificando, representa a parcela do ativo que pertence aos
acionistas/sócios.

Passivo

O passivo está dividido em passivo não corrente e passivo corrente, conforme a maturidade das rubricas.

 Passivo não corrente  tem uma maturidade superior a 1 ano


 Passivo corrente  tem uma maturidade inferior a 1 ano

Passivo não corrente:

 Provisões: são passivos de tempestividade e quantia incerta, isto é, não se tem a certeza de quando
ou quanto se vai ter de pagar. Exemplo: um empregado coloca a empresa em tribunal. Na data do Balanço a
empresa ainda não sabe se terá de pagar e quanto porque o processo ainda está a decorrer. Caso a
probabilidade de ter de pagar seja superior a 50%, a empresa deverá reconhecer imediatamente a perda e a
correspondente obrigação potencial.

 Empréstimos obtidos: dívidas que a empresa tem perante instituições financeiras, obrigacionistas… e
que só terão de ser pagas a mais de 1 ano. Normalmente vencem juros.

Passivo corrente:

 Empréstimos obtidos: dívidas que a empresa tem perante instituições financeiras e que terão de ser
pagas durante o próximo ano. Normalmente vencem juros.

 Fornecedores: dívidas que a empresa tem perante os seus fornecedores.

 Contas a pagar: outras dívidas que a empresa tem perante terceiros. Exemplos: dívidas ao Estado,
dívidas aos sócios, dívidas ao pessoal…

 Outros passivos correntes: incluem acréscimos e diferimentos.

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Capital Próprio

Em termos gerais podemos dividir o capital próprio em três partes distintas:

 Capital: valor histórico das contribuições dos acionistas/sócios durante a constituição e vida da empresa.

 Reservas e resultados transitados: resultados de anos anteriores que não foram distribuídos aos
acionistas/sócios.

 Resultado líquido: resultado do próprio ano, cuja determinação é explicada na Demonstração de


Resultados.

2.4. Leitura do Balanço

Ao analisar o Balanço devem ser seguidos 4 passos:

 Saber o que faz a empresa  para fazer a relação entre a sua atividade e o tipo de ativos e passivos.

 Ver o total do ativo e a sua evolução  esta é uma das medidas de dimensão da empresa.

 Analisar a composição do ativo  saber o tipo de ativos que a empresa tem é fundamental para a sua
análise. Não é o mesmo a empresa ter imóveis, inventários em stock, dívidas de clientes ou dinheiro.
Devem salientar-se os ativos que tenham um peso significativo, que tenham grandes variações ou que
tenham peso reduzido devido às especificidades do negócio.

 Identificar as fontes de financiamento  perceber como é que a empresa se está a financiar: se


maioritariamente por capitais próprios ou alheios, qual o tipo de capitais alheios…

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3. A Demonstração de Resultados

A Demonstração de Resultados, tal como o nome indica, demonstra como se conseguiram obter os
resultados do ano. Explica o que aconteceu durante o ano em termos de rendimentos e gastos da empresa.

Rendimentos: benefícios económicos obtidos num período, que resultaram da atividade regular da empresa,
e cujos influxos resultam num aumento do capital próprio que não está relacionado com contribuições dos
acionistas/sócios.

Gastos: redução de benefícios económicos sofrida num período cujos exfluxos resultam numa redução do
capital próprio que não está relacionada com contribuições dos acionistas/sócios. Os gastos são
reconhecidos quando se usa o bem ou serviço e não quando se compra ou paga o mesmo.

Resultado: diferença entre os rendimentos e os gastos

Como exemplo podemos observar a seguinte Demonstração de Resultados:

+Vendas e serviços prestados


+ Subsídios à exploração
+/- Variação nos inventários da produção
+ Trabalhos para a própria entidade
-Custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas
- Fornecimentos e serviços externos
- Gastos com o pessoal OPERACIONAL
-/+ Imparidades
-/+ Provisões
+/- Variações por justo valor
+Outros rendimentos e ganhos
- Outros gastos e perdas
Result. antes de dep. gastos de finan. e impostos
-Gastos de depreciação e amortização
Resultado operacional
+ Juros obtidos FINANCEIRA
- Juros suportados
Resultado antes de impostos FISCAL
-Imposto sobre o rendimento
Resultado líquido do período

Temos de distinguir entre a parte operacional, que reflete o desempenho do funcionamento corrente da
empresa, a parte financeira, relacionada com juros pagos e recebidos, e a parte fiscal, representada pelo
imposto sobre o rendimento.

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Operacional

Os resultados operacionais resultam da diferença entre os rendimentos operacionais e os gastos


operacionais. São um indicador muito importante pois refletem o funcionamento da empresa.

Rendimentos operacionais:

 Vendas e prestação de serviços: vendas efetuadas e serviços prestados pela empresa,


independentemente de terem sido recebidos.

 Subsídios à exploração: subsídios recebidos para compensar perdas de rendimentos ou aumentos de


gastos.

 Variação nos inventários da produção: reflete a variação dos stocks de produtos.

 Trabalhos para a própria entidade: serve para compensar gastos que estão na DR mas que não
deveriam estar pois deram origem a um bem duradouro e por isso devem passar para o ativo.

 Aumentos de justo valor: aumento da cotação de ativos valorizados ao justo valor, como por exemplo
no caso de ações cotadas em Bolsa.

 Outros rendimentos e ganhos: podem incluir diversas rubricas como rendimentos suplementares,
descontos de pronto pagamento obtidos, mais-valias na venda de ativos fixos, entre outros.

Gastos operacionais:

 Custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas: custo das mercadorias que a empresa
vendeu e das matérias-primas que a empresa consumiu.

 Fornecimentos e serviços externos: representam o uso das aquisições feitas ao exterior que não sejam
inventários. Exemplo: eletricidade, água, trabalhos especializados, livros e documentação técnica,
rendas e alugueres...

 Gastos com o pessoal: salários e despesas relacionadas como sejam as contribuições para a
segurança social ou os seguros de acidentes de trabalho.

 Provisões e perdas por imparidade: provisões constituídas durante o ano para fazer face a potenciais
perdas e correções feitas às diversas rubricas do ativo quando o seu valor recuperável é inferior ao
valor contabilístico.

 Reduções de justo valor: redução da cotação de activos valorizados ao justo valor, como por exemplo
no caso de ações cotadas em Bolsa.

 Outros gastos e perdas: menos-valias na venda de ativos fixos, impostos diversos (como sejam o
imposto de selo ou o imposto municipal sobre imóveis), descontos de pronto pagamento concedidos…

 Depreciações e amortizações: representam o uso/desgaste do ano dos ativos tangíveis e intangíveis.

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Financeira

 Juros obtidos

 Juros suportados: relacionados com a estrutura de financiamento da empresa. Quanto maior o


endividamento mais juros a empresa tem de suportar.

Fiscal

 Imposto sobre o rendimento.

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4. A Demonstração de Fluxos de Caixa

A Demonstração de Fluxos de Caixa (DFC) dá-nos informação sobre onde a empresa vai buscar e gastar o
seu dinheiro durante um determinado período. Esta demonstração só contempla factos que impliquem uma
movimentação de dinheiro. A DFC está dividida em três fluxos: atividades operacionais, atividades de
investimento e atividades de financiamento. A soma dos três dá origem à variação de caixa e seus
equivalentes.

ATIVIDADES OPERACIONAIS
Recebimentos
Pagamentos

ATIVIDADES DE INVESTIMENTO
Recebimentos
Pagamentos

ATIVIDADES DE FINANCIAMENTO
Recebimentos
Pagamentos

VARIAÇÃO DE CAIXA E SEUS EQUIVALENTES

O fluxo das atividades operacionais representa a capacidade da empresa gerar dinheiro com o seu
funcionamento corrente. Está relacionado com recebimentos de clientes e pagamentos a empregados,
fornecedores e Estado.

O fluxo das atividades de investimento está relacionado com os pagamentos ou recebimentos dos
investimentos ou desinvestimentos que a empresa faz. De uma forma simplificada podemos dizer que está
ligado aos bens duradouros, ativos tangíveis, intangíveis, propriedades de investimento e investimentos
financeiros. Os recebimentos (fluxos positivos) resultam de vendas ou rendimentos destes ativos e os
pagamentos de aquisições.

Através do fluxo das atividades de financiamento podemos avaliar a evolução das fontes de financiamento
durante o ano. Está relacionado com o capital próprio e o passivo remunerado que é aquele que vence juros.
Temos como exemplos empréstimos bancários, por obrigações ou locações financeiras. Os fluxos positivos
representam entradas de dinheiro derivadas de aumentos de empréstimos bancários ou de capital. Os fluxos
negativos derivam de juros e dividendos pagos assim como de reembolsos de empréstimos entre outros.

A variação de caixa e seus equivalentes resulta da soma dos três fluxos anteriores e também é geralmente
igual à variação de caixa e seus equivalentes que aparece no Balanço. (As IFRS definem a variação de caixa
e seus equivalentes como a soma de caixa, depósitos e aplicações financeiras de curto prazo e risco
reduzido)

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5. As notas anexas

O anexo às contas ganhou uma importância crescente com as Normas Internacionais e o Sistema de
Normalização Contabilística pois os documentos contabilísticos são mais sucintos do que com o antigo Plano
Oficial de Contabilidade e grande parte da informação está em anexo.

Para procurar a informação adicional relativa a cada rubrica dos documentos contabilísticos tem de se ir à
nota anexa que aparece referenciada na segunda coluna do Balanço.

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6. Os Balancetes e os lançamentos contabilísticos

Para obter a informação é necessário proceder aos registos contabilísticos. O processo contabilístico divide-
se em quatro etapas:

 Receção dos documentos contabilísticos

 Lançamentos contabilísticos com base nos documentos recebidos

 Obtenção de Balancetes (listagem das várias rubricas contabilísticas com o respetivo valor)

 Apresentação das Demonstrações Financeiras (documentos base para a análise)

6.1. Quadro de contas

A contabilidade está organizada por contas.

As contas são um conjunto de elementos patrimoniais expressos em unidade de valor (euros) e que
apresentam uma caraterística comum.

As contas estão divididas em 8 classes:

Classes referentes a rubricas do Balanço:

 Classe 1 – Meios monetários líquidos (Ativo)

 Classe 2 – Contas a receber e a pagar (ativo ou passivo conforme sejam a receber ou a pagar
respetivamente)

 Classe 3 – Inventários e ativos biológicos (Ativo)

 Classe 4 – Investimentos (Ativo)

 Classe 5 – Capital, reservas e resultados transitados (Capital Próprio)

Classes referentes a rubricas da Demonstração de Resultados:

 Classe 6 – Gastos

 Classe 7 – Rendimentos

Classes referentes a rubricas do Balanço e da Demonstração de Resultados:

 Classe 8 – Resultados

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6.2. Balancetes

Os Balancetes são documentos de trabalho e não são os documentos finais de prestação de contas. É destes
documentos que os contabilistas retiram a informação para construir o Balanço e a Demonstração de
Resultados.

A informação contida nestes documentos é menos user friendly do que a dos restantes documentos
contabilísticos porque muitas vezes estes só são analisados por profissionais da matéria.

Existem vários tipos de Balancetes nas empresas. Estes estão organizados segundo:

O grau de descriminação:
 Balancete sintético (do razão).
 Balancete analítico (geral).

O tipo de Balancete:
 Balancete de abertura: regista os saldos que transitaram do ano anterior.
 Balancete de cada um dos meses: regista o somatório de todos os lançamentos até à data.
 Balancete de regularizações: regista regularizações a fazer no final do ano. Por exemplo
depreciações quando estas são anuais.
 Balancete de apuramento: transfere os saldos das contas de rendimentos e gastos para as contas de
resultados, apurando assim o resultado do período.
 Balancete de fecho: salda as contas todas em contrapartida do balancete de abertura do ano
seguinte.

Todos os Balancetes estão organizados segundo o código das contas e têm 8 colunas.
 1ª coluna: código da conta.
 2º coluna: nome da conta.
 3ª coluna: lançamentos do mês feitos a débito.
 4ª coluna: lançamentos do mês feitos a crédito.
 5ª coluna: lançamentos do ano feitos a débito.
 6ª coluna: lançamentos do ano feitos a crédito.
 7ª coluna: saldo devedor (diferença entre a coluna 5 e 6 quando o valor da 5 é maior do que o valor
da 6).
 8ª coluna: saldo credor (diferença entre a coluna 6 e 5 quando o valor da 6 é maior do que o valor da
5).

Exemplo:

1 2 3 4 5 6 7 8
Ct. Nome da conta Débito Crédito Débito Crédito Saldo Saldo
do mês do mês Acumulado Acumulado Devedor Credor
11 Caixa 7.800 5.300 2.500
12 Depósitos à ordem 200,00 300,00 92.010 53.710 38.300
21 Clientes 1.500,00 95.200 79.200 16.000
22 Fornecedores 700,00 25.020 31.520 6.500

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Na análise do Balancete as colunas mais importantes são a 1, 2, 7 e 8. As duas primeiras dão-nos informação
sobre que contas estamos a analisar e as duas últimas dão-nos o resultado de todos os lançamentos do ano.

Mas o que significa o valor aparecer a débito ou a crédito? O próximo tópico vai dar a resposta a esta
questão.

6.3. O método das partidas dobradas

O método das partidas dobradas é baseado no princípio de que cada lançamento contabilístico tem dois
lados, que estão sempre equilibrados, o do débito e o do crédito. Assim, ao efetuar cada lançamento
contabilístico temos sempre de lançar o mesmo valor a crédito e a débito.

Por convenção o lado esquerdo é o dos débitos e o direito dos créditos. Tanto o ativo como os gastos
aumentam-se debitando e diminuem-se creditando, o passivo, capital próprio e rendimentos aumentam-se
creditando e diminuem-se debitando. Estes conceitos apresentam-se de seguida em esquema:

DÉBITO CRÉDITO

BALANÇO
Ativo Capital próprio
Passivo

DEMONSTRAÇÃO DE RESULTADOS
Gastos Rendimentos

Quando estamos a analisar um Balancete, as contas da classe 6 (gastos) apresentam-se com saldo devedor
enquanto as da classe 7 (rendimentos) apresentam-se com um saldo credor.

Já para as contas do Balanço, sabemos que se estas tiverem um saldo devedor isso representa bens ou
direitos e se tiverem um saldo credor já representam responsabilidades e obrigações. Desta forma
conseguimos perceber se é a empresa que está a dever a determinado terceiro (saldo credor - passivo) ou se
é o terceiro que está a dever à empresa (saldo devedor - ativo).

Utilizando o exemplo da página anterior verificamos que o saldo da conta 21-Clientes é devedor o que
significa que a empresa tem um direito e consequentemente este valor aparece no ativo.

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7. Detalhes de algumas contas

7.1. Acréscimos e diferimentos

Os acréscimos e diferimentos resultam do regime do acréscimo, segundo o qual os rendimentos e gastos são
reconhecidos quando obtidos ou incorridos, independentemente do seu recebimento ou pagamento.

Nesse sentido devem ser levados à Demonstração de Resultados todos e só os rendimentos e gastos desse
exercício.

Consegue-se desta forma colocar os rendimentos e os gastos no “período certo”.

Exemplo de um facto que dá origem a acréscimos e diferimentos:

A empresa adquiriu e pagou o seguro de uma carrinha, no montante de 1.200 euros, para o período que vai
de 1 de novembro de n a 31 de outubro de n+1.

Em n quanto é que a empresa pagou? 1.200 euros


E quanto é que a empresa usou? 200 euros = 1.200/12 x 2 meses. Só este montante é que vai para gastos.
O que acontece aos restantes 1.000 euros? São um direito com que a empresa fica de ter a carrinha segura
durante mais 10 meses. Se é um direito aparece no Balanço, mais concretamente no ativo.

Em n+1 quanto é que a empresa paga? Nada


Mas usa 10 meses de seguro: 1.000 euros vão para gastos.
Gasta o direito que tinha: anula o ativo no montante de 1.000 euros.

O total de gastos para a empresa foi de 1.200 euros, 200 euros em n e 1.000 euros em n+1. O papel dos
acréscimos e diferimentos foi o de colocar os gastos no ano correto, em que são usados.

Existem 4 tipos de acréscimos e diferimentos, dois deles dando origem a direitos, pelo que aparecem no Ativo
e dois dando origem a obrigações pelo que aparecem no passivo. São eles:

Ativo Direitos

Devedores por acréscimos de rendimentos

Rendimentos a reconhecer no próprio exercício, uma vez que o serviço/ venda foi realizado, mas sem
documentação vinculativa. A empresa fica com o direito a emitir a fatura, altura em que transfere o acréscimo
de rendimento para dívidas de clientes.
Exemplo: serviços vendidos e prestados e ainda não faturados

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Gastos a reconhecer (ou gastos diferidos)

Faturas recebidas relativa a serviços que só irão ser “consumidos” nos exercícios seguintes, pelo que não
podem ser reconhecidos como gastos deste exercício.
Exemplo: Seguro anual pago em 1/set/n :4/12 é gasto de n, e 8/12 só é gasto em n+1

Passivo Obrigações

Credores por acréscimos de gastos

Gastos a reconhecer no próprio exercício, uma vez que o “consumo/ utilização/ desgaste” foi realizado no
exercício, mas sem documentação vinculativa. Quando a fatura for recebida são transferidos para dívidas a
fornecedores.
Exemplo: FSE – água, eletricidade, comunicações, etc. (de Dezembro, antes da chegada da factura do
fornecedor); Remunerações a liquidar (férias e subsídio de férias, vencidos num ano mas só pagos no ano
seguinte)

Rendimentos a reconhecer (ou rendimentos diferidos)

Faturas emitidas e provável recebimento relativas a serviços que só irão ser prestados nos exercícios
seguintes, pelo que não podem ser reconhecidos como rendimento deste exercício.
Exemplo: empresa de telecomunicações: carregamento de telemóveis ainda não usado nos pré-pagos.

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7.2. Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA)

A lógica inerente ao imposto sobre o valor acrescentado é a do mesmo recair sobre o consumidor final. No
entanto ele vai sendo cobrado e sucessivamente recuperado ao longo de toda a cadeia de valor
acrescentado, por uma questão de facilidade de controlo e maior dificuldade de evasão fiscal.

Por assim ser as empresas têm a obrigação de cobrar IVA aos seus clientes e de entregar o mesmo ao
Estado. Exemplo: venda de mercadorias no valor de 500 euros ao qual acresce IVA liquidado à taxa de 23%:
Vendas: +500
Estado: +115 (empresa fica a dever ao Estado)
Clientes: +615

Por outro lado, para a maior parte das compras as empresas não são consideradas consumidor final e podem
deduzir o IVA. Têm de o pagar na altura da compra mas conseguem recuperá-lo posteriormente. Exemplo:
compra de material de escritório no valor de 200 euros ao qual acresce IVA dedutível à taxa de 23%:
FSE: +200
Estado: + 46 (Estado fica a dever à empresa)
Fornecedores: +246

Para as compras em que a empresa é considerada consumidor final o IVA não é dedutível, o mesmo
acontecendo quando a empresa é isenta de IVA nas vendas. Nesse caso o IVA aparece associado à rubrica
que lhe deu origem. Exemplo: pagamento de almoço com um cliente no valor de € 100 ao qual acresce IVA
não dedutível à taxa de 13%:
FSE: +113
Caixa: +113

O apuramento do IVA é mensal ou trimestral conforme a maior ou menor dimensão da empresa. Na altura do
apuramento a empresa faz a diferença entre o IVA que liquidou e tem de entregar ao Estado (IVA liquidado) e
o IVA que suportou e pode recuperar (IVA dedutível). Deduz ainda IVA de períodos anteriores que tinha a
recuperar e não optou por pedir reembolso.

Se o saldo for negativo a empresa tem de entregar imposto ao Estado, o que terá de fazer no até ao dia 10
(se o regime for mensal) ou 15 (se o regime for trimestral) do mês n+2. Exemplo: o IVA referente ao mês de
dezembro tem de ser entregue até ao dia 10 ou 15 de fevereiro.

Se o saldo for positivo a empresa pode optar por pedir o reembolso ou transferir o saldo para entrar no
cálculo do apuramento do IVA no período seguinte.

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7.3. Processamento de salários

É importante perceber quanto custa um trabalhador à empresa, tendo a informação sobre o montante da sua
remuneração bruta.

O custo para a empresa engloba não só a remuneração bruta mas também a contribuição para a segurança
social da responsabilidade da empresa e o seguro de acidentes de trabalho. Para além disso é necessário
não esquecer que os empregados vão trabalhar 11 meses mas receber salários de 14.

Vamos então assumir um exemplo hipotético de um trabalhador com um salário de 1.000 euros. O gasto para
a empresa será:
Salário bruto: 1.000,00
Segurança social: 237,50
Total: 1.237,50

E quanto é que o empregado recebe? A empresa necessita de lhe fazer retenção na fonte relativa à
contribuição para a segurança social da responsabilidade do empregado e também relativa ao IRS:
Salário bruto: 1.000,00
Segurança social: 110,00
IRS : 100,00 (assumindo 10% do ordenado)
Total: 790,00

No próprio mês a empresa vai ter de pagar ao empregado 790,00 euros e no mês seguinte vai ter de entregar
à Segurança Social 347,50 euros (237,50+110,00) e à Administração Fiscal 100,00 euros.

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7.4. Descontos

Os descontos podem ser classificados em descontos financeiros e descontos comerciais.

Os descontos financeiros são aqueles que resultam de uma antecipação do pagamento da fatura, sendo por
isso normalmente designados por descontos de pronto pagamento.

Já os descontos comerciais são obtidos devido à relação comercial com o fornecedor. Podem ser feitos no
preço, a empresa paga um montante mais baixo por unidade ou podem resultar de ofertas de unidades
adicionais. Para além do desconto feito imediatamente na fatura pode ainda existir uma outra situação
chamada de rappel: o desconto só é calculado no final do ano com base nas quantidades compradas durante
o ano.

O desconto financeiro abate ao montante que tem de ser pago e é imediatamente registado como um
rendimento (referimo-nos ao que se passa em Portugal para as empresas que utilizam o SNC), tendo
consequentemente reflexo na Demonstração de Resultados no momento da aquisição.

No desconto comercial na fatura não há qualquer impacto na Demonstração de Resultados na altura da


compra. O que acontece é que se regista o desconto no próprio valor do inventário que fica
consequentemente valorizado por um montante mais baixo. A vantagem é que quando a empresa vender o
inventário o custo da venda vem mais baixo, logo a margem é maior e a empresa tem um resultado mais alto.
Isto acontece quer o desconto seja no preço ou em oferta de unidades pois em ambos os casos o valor
unitário do bem fica mais baixo.

Relativamente ao desconto de rappel quando este é calculado a maior parte dos inventários que lhe deram
origem já estão vendidos, razão pela qual o mesmo é imediatamente reconhecido como um rendimento.

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7.5. Inventários

A rubrica de inventários que aparece no ativo diz respeito a inventários em stock na data do Balanço.

Podemos dividir esses inventários em 3 grandes grupos:


 Mercadorias: inventários que a empresa compra com a finalidade de vender sem transformar.
 Matérias-primas: inventários que a empresa compra com a finalidade de transformar em produtos.
 Produtos: inventários produzidos pela empresa.

Contabilização dos inventários:

Os inventários podem ser contabilizados segundo o sistema de inventário permanente ou de inventário


intermitente.

O sistema de inventário permanente é obrigatório para empresas de média e grande dimensão: por cada
venda é registado imediatamente o correspondente gasto.

Em qualquer momento:
 A conta Compras está saldada
 O saldo da conta de inventários reflecte o stock em armazém
 O CMVMC reflete o custo das mercadorias vendidas e das matérias consumidas até à data

O sistema de inventário intermitente só é aceite para pequenas empresas: o custo das vendas só é apurado
periodicamente, após realização de um inventário físico das mercadorias em armazém.
No final do ano, antes do apuramento de resultados:
 A conta Compras representa as compras feitas até à data
 O saldo da conta de inventários reflete o stock do início do ano
 O CMVMC não está apurado

Formas de custeio:

Os inventários só são lançados em gasto quando são consumidos ou vendidos. Se foram sendo adquiridos
por preços diferentes, como valorizar o gasto na altura do uso?

Existem 3 alternativas:
 Custo específico: para os itens que não sejam geralmente intermutáveis e de bens ou serviços
produzidos e segregados para projetos específicos.
Para os restantes casos:
 Custo médio ponderado ou
 FIFO – first in, first out

Sílvia Cortês 24
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Exemplo:

Uma empresa adquire 100 unidades a 20 euros cada.


Um mês mais tarde adquire mais 100 unidades a 22 euros cada.
Passado uma semana vende 50 unidades a 35 euros cada.

Qual o custo da venda?


 Se usar o custo específico tem de saber expressamente que unidades está a vender e quanto custou
cada uma delas.
 Se usar o custo médio ponderado considera que o custo foi de 50 unidades a multiplicar por 21 euros
((100x20+100x22)/200).
 Se usar o FIFO considera que o custo foi de 50 unidades a multiplicar por 20 euros pois este foi o
custo das primeiras 100 unidades.

Variação da produção:

Só existe variação da produção em empresas em que existe produção, normalmente em empresas


industriais.

A variação da produção corresponde à variação dos stocks de produtos. Se é positiva isso significa que a
empresa tem mais stock no final do ano do que tinha no início. Se é negativa isso significa que a empresa
tem menos stock no final do ano do que tinha no início.

Mas porque aparece esta rubrica na Demonstração de Resultados?

Porque na Demonstração de Resultados temos os gastos daquilo que produzimos e queremos ter os gastos
daquilo que vendemos, para haver uma relação direta entre os gastos e os rendimentos (vendas).

Para corrigir os gastos de produção por forma a que representem o custo das vendas necessitamos de usar a
variação da produção:

Se variação positiva  mais stocks produtos  Produzi mais do que vendi  representa rendimento a
compensar os gastos em excesso.

Se variação negativa  menos stocks produtos  Produzi menos do que vendi  representa gasto dos
produtos que foram vendidos este anos e produzidos em anos anteriores.

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7.6. Locações

Existem dois tipos de locações:


 Locação financeira (normalmente chamada de leasing)
 Locação operacional (normalmente com a designação de renting)

A contabilização destas locações é atualmente totalmente diferente:

A locação financeira é equivalente a ter adquirido o bem e solicitado um empréstimo. Embora o bem esteja no
nome da empresa locadora (empresa de leasing) o bem aparece no balanço da empresa locatária (que vai
usar o bem) pois todos os riscos e direitos passaram para esta empresa.

Na altura do contrato o ativo aumenta, assim como o passivo.

Na altura do pagamento da renda esta é composta por uma parcela referente ao juro e outra referente ao
reembolso do empréstimo.

A locação operacional é equivalente a alugar o bem.

Na altura do contrato não se faz lançamento contabilístico.

Na altura do pagamento da renda esta é considerada um FSE, em rendas.

Como distinguir entre as duas?

A nível do sistema nacional a NCRF#9 define que na locação financeira o locador transfere para o locatário
todos os riscos e vantagens, independentemente do título de propriedade ser transferido.

Especifica alguns exemplos em que um contrato de locação tem de ser considerado como locação financeira,
nomeadamente quando:
 Haja acordo de transferência da propriedade do bem no final do prazo
 Exista uma opção de compra do bem a um preço mais baixo do que o normal de mercado
 O prazo da locação abranja a maior parte da via útil do bem
 O valor presente dos pagamentos da locação seja igual ou superior ao justo valor do bem
 Os ativos locados sejam de tal forma específicos que não possam ser utilizados por outra entidade
sem grandes transformações

O sistema internacional era semelhante ao nacional. No entanto vai sofrer uma grande alteração com a
implementação da IFRS #16-Locações, que deverá ser aplicada o mais tardar em janeiro de 2019. Todas as
locações passaram a ser contabilizadas como financeiras. Como consequência o ativo e o passivo das
empresas que utilizem locações passarão a ser superiores, o que irá piorar os rácios de endividamento.

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7.7. Capital Próprio

No capítulo 2.3. assumimos uma versão simplificada do capital próprio que envolvia somente três rubricas,
capital social, reservas e resultados transitados e resultado líquido.

Na realidade, embora as rubricas já referidas sejam as mais importantes o capital próprio é composto por
mais rubricas, nomeadamente:
1. Capital
2. (Ações (quotas) próprias)
3. Prestações suplementares e acessórias
4. Prémios de emissão
5. Reservas
6. Resultados transitados
7. Ajustamentos em ativos financeiros
8. Excedentes de revalorização
9. Outras variações no capital próprio
10. Resultado líquido
11. (Dividendos antecipados)

Capital: valor histórico das contribuições dos acionistas/sócios durante a constituição e vida da empresa.
Consiste no capital realizado, registado pelo valor nominal (valor inscrito no título e referido no Pacto Social).

Ações (ou quotas) próprias: ações que a empresa compra dela própria
 Aparecem a deduzir ao capital porque são a operação inversa a um aumento de capital: a empresa
recompra as ações e entrega dinheiro aos acionistas que as vendem.
 Têm como limite máximo 10% do capital para evitar que a empresa fique descapitalizada.
 Obrigam à constituição de uma reserva especial do mesmo montante.
 Razões que justificam a compra de ações próprias:
 Boa aplicação financeira se as acções estiverem subavaliadas.
 Provocar ou reagir contra ações na Bolsa.
 Forma de remunerar e incentivar o pessoal através de distribuição de ações próprias.
 Forma de remuneração de acionistas quando a tributação das mais-valias é menos
penalizadora do que a tributação dos dividendos.

Prestações suplementares e acessórias: entradas de dinheiro exigidas aos sócios para reforço do Capital da
Sociedade.
 Não há registo na conta de Capital, não obrigando a escritura.
 Podem ser restituídas aos sócios se eles os deliberarem e desde que o Capital Próprio não fique
inferior ao Capital Social + Reserva Legal.
 Surgem no capital próprio e não podem ser remuneradas.
 Não confundir com Suprimentos: empréstimos de Sócios (Passivo) e com possibilidade de vencerem
juros e serem devolvidos a qualquer momento.

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Prémio de emissão: resulta da diferença entre o preço de emissão das ações e o seu valor nominal. Quando
há um aumento de capital e o preço de emissão é superior ao valor nominal o acréscimo no capital social é só
pelo valor nominal, pelo que a diferença deste face ao valor que os acionistas pagam pelas ações tem de ir
para a rubrica de prémio de emissão.

Reservas: são constituídas principalmente por retenção de lucros visando o aumento dos meios de ação das
empresas. Não são dinheiro. Pelo facto de não terem sido distribuídos dividendos o dinheiro não saiu da
empresa mas pode estar investido no negócio.
Podem ser divididas em:
 Reservas Legais: que são obrigatórias por lei. As sociedades por quotas e anónimas deverão
reservar 5% dos lucros obtidos em cada exercício à constituição de reserva legal até que esta atinja 20% do
Capital.
 Reservas Livres: que são constituídas por decisão da Assembleia Geral e têm como objetivo reter
fundos na empresa para reforço da situação financeira.

Resultados transitados: conta que recebe anualmente o Resultado do exercício anterior.


 Quando são negativos representam prejuízos acumulados
 Quando são positivos representam lucros acumulados. Neste caso o facto da empresa em
Assembleia Geral não determinar o que fazer com esses resultados transmite a mensagem que ainda não
sabe o que fazer com eles.

Ajustamentos em ativos financeiros: Resultam da utilização do método da equivalência patrimonial como


valorização de investimentos.financeiros.

Excedentes de revalorização: Resultam da aplicação do modelo de revalorização aos ativos tangíveis e


intangíveis.

Resultado líquido: resultado do próprio ano, cuja determinação é explicada na Demonstração de Resultados.

Dividendos antecipados: dividendos que são distribuídos no ano de geração do resultado a que dizem
respeito. Aparecem a subtrair no capital próprio, significando que embora o resultado tenha sido de X, neste
momento já só estão na empresa X - dividendos antecipados, dado que estes últimos já foram distribuídos
aos acionistas.

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8. Nomenclatura utilizada nas contas consolidadas

Podemos considerar dois tipos de Demonstrações Financeiras quando nos referimos a grupos económicos:
 Separadas – de uma única empresa
 Consolidadas – de um grupo de empresas, apresentadas como as de uma única entidade

Os termos utilizados nas demonstrações financeiras consolidadas que não aparecem nas contas simples são
basicamente três:
 Goodwill
 Interesses sem controlo no Balanço (capital próprio)
 Interesses sem controlo na Demonstração de Resultados (resultados)

Para se compreender o que cada um significa é necessário perceber os mecanismos básicos da consolidação
de contas.

A consolidação de contas consiste em apresentar as contas de um conjunto de empresas como se tratasse


de uma única entidade. Esse conjunto de empresas tem o nome de Grupo e este é constituído pela empresa-
mãe e todas as suas subsidiárias. O conjunto das empresas do grupo também é referido como perímetro de
consolidadção.

As relações entre empresas podem ser de diferentes intensidades:

 Subsidiária: é uma entidade que é controlada por outra entidade, a empresa-mãe. Normalmente a
participação financeira é superior a 50%.

 Empreendimentos conjuntos: há partilha de controlo.

 Associada: entidade sobre a qual o investidor tenha influência significativa, isto é, o poder de
participar nas decisões das políticas financeira e operacional da empresa mas que não é controlo nem
controlo conjunto. Normalmente a participação financeira é entre 20% e 50%.

 Outros: restantes situações.

Podemos então concluir que o que determina a intensidade da relação entre as empresas é o controlo.
Normalmente o controlo está relacionado com uma participação financeira superior a 50% mas não é
obrigatório que isso aconteça.

Nota: Controlo: um investidor controla uma investida quando está exposto, ou tem direitos, a retornos variáveis deste envolvimento
e tem a capacidade de afectar esses retornos através do seu poder sobre a investida. Para ter o controlo um investidor tem de
cumprir todos os seguintes requerimentos:
 ter poder sobre a investida (conseguir dirigir as atividades relevantes)
 ter direitos e exposição a retornos variáveis
 ter a capacidade de afetar esses retornos através do poder que tem
Participação financeira: é a soma das percentagens do capital detido pela empresa-mãe e pelas suas subsidiárias.

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A forma de tratamento das participações nas contas consolidadas do grupo depende da relação entre as
mesmas e está explícita no seguinte quadro:

Subsidiárias Consolidação integral

Empreendimentos conjuntos Equivalência Patrimonial (IAS/IFRS)


Ou Consolidação proporcional (SNC)

Associadas Equivalência patrimonial

Outros investimentos Custo ou justo valor

O método da consolidação integral agrega as contas da empresa-mãe e das suas subsidiárias. Por isto
queremos significar que soma cada uma das rubricas das demonstrações financeiras da empresa-mãe e das
suas subsidiárias, retirando as relações entre si.

Ao aplicar este método normalmente é gerado o Goodwill, que deve ser reconhecido à data de aquisição.
Este representa um pagamento feito pela adquirente, em antecipação de benefícios económicos futuros, de
ativos que não sejam capazes de ser individualmente identificados e separadamente reconhecidos.

Goodwill = custo de aquisição – % de participação x justo valor dos valores contabilísticos identificáveis à data
da participação

O Goodwill normalmente é positivo, o que significa que o adquirente pagou pela participação mais do que o
justo valor contabilístico da mesma. Isto não acontece necessariamente porque se fez um mau negócio mas
sim porque há uma série de fatores que vão determinar a performance futura da empresa e que não estão
contemplados na contabilidade da mesma. Exemplos são clientes fiéis, empregados motivados, marcas
desenvolvidas internamente…

Quando o Goodwill é positivo deve ser reconhecido no ativo e representa precisamente todos os fatores que
afetam o valor de mercado mas não o valor contabilístico da participada, nomeadamente os exemplos dados
no parágrafo anterior.

Quando o Goodwill é negativo (o que é muito menos comum) é necessário reavaliar a identificação e a
mensuração dos ativos e passivos identificáveis pois provavelmente a original está errada (dificilmente se
pede menos dinheiro pela empresa do que o seu valor contabilístico). Após a reavaliação deve reconhecer-se
imediatamente nos resultados (rendimentos) qualquer excesso remanescente.

A razão pela qual na consolidação integral se soma 100% da subsidiária, mesmo que a participação
financeira seja inferior a esse montante, é porque se a empresa-mãe tem o controlo então todos os
rendimentos e gastos são resultantes das suas decisões, o mesmo se passando com a gestão dos ativos e
passivos.

Sílvia Cortês 30
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Quando se utiliza o método da consolidação integral e a subsidiária não é detida a 100% surgem os
chamados interesses sem controlo, tanto no Balanço como na Demonstração de Resultados. Se as rubricas
são todas somadas a 100% temos de colocar em evidência a parcela que não pertence ao grupo.

Interesses sem controlo na Demonstração de Resultados representam a parcela do resultado líquido


gerado por empresas que fazem parte do grupo, mas que não pertence ao grupo mas sim aos pequenos
acionistas que detêm uma posição minoritária.

Interesses sem controlo no Balanço representam a parcela do capital próprio de empresas que fazem parte
do grupo, mas que não pertence ao grupo mas sim aos pequenos acionistas que detêm uma posição
minoritária.

Sílvia Cortês 31
Manual de Contabilidade e Análise Financeira

II. ANÁLISE ECONÓMICO-FINANCEIRA

9. Análise de rácios

Um rácio é a divisão de 2 rubricas.

A utilização de rácios na análise económico-financeira é muito útil pois estes permitem apresentar uma
síntese da informação financeira.

É necessário analisar a sua evolução (análise temporal) ou comparar rácios de empresas do mesmo setor de
atividade (análise setorial).

Vamos apresentar de seguida alguns rácios. Não pretendemos ser exaustivos mas sim selecionar os mais
importantes. Para cada um deles vamos explicar o que significa, como se calcula, e as principais conclusões
que dele se podem retirar.

10. Estrutura de financiamento

Objetivo: analisar a forma como a empresa se está a financiar

Rácios utilizados:

Capitais Próprios
Rácio de autonomia financeira =
Ativo

Passivo
Rácio de endividame nto =
Ativo

Passivo não corrente


Rácio de endividame nto não corrente =
Ativo

Passivo corrente
Rácio de endividame nto corrente =
Ativo

Passivo remunerado
Rácio de endividame nto remunerado =
Ativo

Passivo não remunerado


Rácio de endividame nto não remunerado =
Ativo

Sílvia Cortês 32
Manual de Contabilidade e Análise Financeira

Devem analisar-se estes rácios aos pares porque a sua informação é complementar.

Rácios de autonomia financeira e endividamento

Deve começar-se por dividir as fontes de financiamento em capital próprio versus capital alheio para ver se a
empresa está a recorrer sobretudo aos detentores do capital ou a credores.

A soma dos 2 rácios tem de ser igual a 100% pois o Ativo é igual ao Passivo mais Capital Próprio.

Quanto maior o rácio de endividamento maior o risco financeiro da empresa. No entanto não se está a
defender que o ideal é ter endividamento zero. Na realidade este proporciona um benefício fiscal para além
de permitir que as empresas possam fazer investimentos para os quais de outra forma não teriam dinheiro. O
nível de endividamento ótimo varia conforme o setor de atividade. Empresas em setores com maior risco
operacional devem ter um endividamento menor.

Depois deve desenvolver-se a informação sobre a forma como a empresa recorre a capitais alheios.

Em primeiro lugar determinar se estamos a falar de passivo não corrente ou corrente: análise do prazo de
maturidade das dívidas.

De seguida devemos desenvolver outro conceito importante que é o do passivo remunerado versus passivo
não remunerado: determinar qual o peso do passivo que vence juros.

Rácios de endividamento corrente e não corrente

O passivo corrente é aquele que a empresa terá de liquidar durante o ano seguinte. O passivo não corrente
tem uma maturidade superior a 1 ano.

A maturidade do passivo deve levar em conta a maturidade dos ativos e o nível dos capitais próprios mas à
partida quanto maior for o rácio de endividamento corrente face ao não corrente maior a pressão na
tesouraria da empresa.

Rácios de endividamento remunerado e não remunerado

O passivo remunerado é aquele que vence juros. Temos como exemplos empréstimos bancários, por
obrigações, locações financeiras…

O passivo não remunerado não é contratado com o objetivo de uma remuneração. São exemplos os
fornecedores ou o Estado.

Quanto maior o peso do passivo remunerado mais elevados serão os custos financeiros que a empresa
terá.

Sílvia Cortês 33
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11. Demonstração de Resultados reclassificada

Para mais facilmente analisar a Demonstração de Resultados e calcular os rácios de rentabilidade vamos
utilizar uma Demonstração reclassificada. O objetivo desta reclassificação é colocar em evidência a
performance operacional que reflete o funcionamento corrente da empresa, a extra-operacional que diz
respeito a fatores não relacionados diretamente com a atividade base da empresa e que não se repetem de
uma forma sistemática, o impacto do financiamento, refletido nos custos financeiros e o impacto fiscal,
resultante do imposto sobre o rendimento.

+ Vendas e prestações de serviços


- CMVMC
- FSE
- Gastos com pessoal
+/- Outros operacionais OPERACIONAL
- Provisões e perdas por imparidade
RESULTADOS OPERACIONAIS BRUTOS (EBITDA)
- Depreciações e amortizações
RESULTADOS OPERACIONAIS (EBIT-OP)
+/- Resultados de investimentos EXTRA-OPERACIONAL
+/- Resultados não recorrentes
RES. ANTES JUROS E IMPOSTOS (EBIT)
- Juros suportados líquidos FINANCIAMENTO
RESULTADOS ANTES DE IMPOSTOS (RAI)
-Imposto sobre o rendimento FISCAL
RESULTADOS LÍQUIDOS (RL)
(*) Poderemos utilizar como aproximação os Resultados Financeiros

RL: Resultado líquido: é o bottom line, o que, no fim de tudo, sobra para poder ser distribuído aos acionistas.

RAI: Resultado antes de impostos: é o resultado de tudo excluindo o imposto sobre o rendimento (IRC).

EBIT: Earnings Before Interest and Taxes: Resultado antes de juros e impostos: mede o resultado antes das
funções financeira e fiscal.

EBIT-OP: Earnings Before Interest and Taxes - Operating: Embora muitos autores ignorem este indicador,
consideramos que é da maior importância. O objetivo é separar dentro do EBIT o que é verdadeiramente
operacional daquilo que não está relacionado com o core business da empresa. No extra-operacional temos
os resultados de investimentos e os resultados não recorrentes. Nestes últimos temos o que não é
operacional e não se repete de uma forma sistemática. Como exemplo mais e menos valias de vendas de
bens duradouros, custos de reestruturação...

EBITDA: Earnings Before Interest and Taxes Depreciation and Amortization: as depreciações são separadas
dos restantes gastos operacionais pois têm características diferentes. Não têm de ser pagas e são decididas
internamente. Por vezes as provisões e imparidades também são retiradas do EBITDA pois têm
características mais semelhantes às das depreciações do que às dos restantes gastos. Mas não é uma
decisão consensual.

Sílvia Cortês 34
Manual de Contabilidade e Análise Financeira

12. Rácios de rendibilidade

Objetivo: analisar o retorno gerado pela empresa

Em qualquer rácio de rentabilidade temos no numerador um resultado. Já no denominador teremos a rubrica


sobre a qual pretendemos medir essa mesma rentabilidade.

Vamos apresentar 3 rácios de rentabilidade diferentes: das vendas, do ativo e do capital próprio.

Rentabilidade das vendas  analisa a margem

Rentabilidade do ativo  analisa o retorno dos investimentos

Rentabilidade do capital próprio  analisa o retorno para os acionistas

Estes rácios apresentam-se sempre em percentagem e quanto mais elevados forem melhor para a empresa.

Rácios utilizados:

Rentabilidade das vendas:

EBIT-OP
Rentabilidade operativa das vendas =
Vendas

EBIT
Rentabilidade das vendas antes de juros e impostos =
Vendas

RAI
Rentabilidade das vendas antes de impostos =
Vendas

RL
Rentabilidade líquida das vendas =
Vendas

Mede a margem aos vários níveis, operacional, antes de juros e impostos, antes de impostos e líquida. Ao
apresentar a Demonstração de Resultados em percentagem dos volume de negócios (vendas + prestações
de serviços) temos estes rácios automaticamente calculados e conseguimos perceber de onde provem a
variação da margem. Tendo de escolher um único destes rácios, o de melhor qualidade é o da rentabilidade
operativa, pois é aquele com uma maior ligação entre o numerador e o denominador.

Sílvia Cortês 35
Manual de Contabilidade e Análise Financeira

Rentabilidade do ativo:

EBIT
Rentabilidade do Ativo antes de juros e impostos =
Ativo

Uma vez que o ativo representa os investimentos feitos pela empresa ao longo dos anos, este rácio mede o
retorno dos investimentos da empresa, independentemente da forma como esta se financia e da taxa de IRC.

Rentabilidade do capital próprio:

Resultado Líquido
Rentabilidade do Capital Próprio=
Capital Próprio

Mede o retorno contabilístico para os acionistas, relacionando o resultado líquido (que é o que sobra para os
mesmos) com o capital próprio (que é o investimento contabilístico que estes têm na empresa).

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13. Decomposição da Rentabilidade do Capital Próprio

O rácio de rentabilidade do capital próprio é muito importante porque é um indicador do retorno contabilístico
para os acionistas. Devemos perceber quais são os drivers desse retorno para poder tomar as decisões de
gestão mais adequadas. O método da decomposição da rentabilidade do capital próprio foi inicialmente
desenvolvido pela DuPont Corporation. Existem diversas variantes deste método sendo a aqui utilizada a
seguinte:

 EBIT   EBIT JS  P 
RCP       1  T 
 A   A P  CP 

Esta fórmula põe em evidência 3 efeitos:

 Investimento
 EBIT 
 
 A 

Financiamento
 EBIT JS  P
  
 A P  CP

Fiscal
1  T  com T = taxa de imposto (IRC/RAI)

O efeito investimento  não é mais do que o retorno do ativo. Podemos começar por concluir que quanto
maior este retorno mais favorável é para os acionistas. Assim um dos objetivos da gestão deverá ser
conseguir um elevado retorno sobre os investimentos.

Podemos ainda decompor este rácio da seguinte forma:

 EBIT  OP V EBIT 
   
 V A EBIT  OP 

Em que EBIT-OP/V corresponde à margem operacional, Vendas/Ativo à rotação do ativo (volume de vendas
face ao ativo) e EBIT/EBIT-OP ao impacto extra-operacional.

A rentabilidade do ativo é tanto melhor quanto mais alta a parte operacional. Resultados conseguidos à custa
da margem e/ou do volume são muito positivos. Há empresas que têm mais margem e outras que têm mais
volume, dependendo do tipo de atividade.

Sílvia Cortês 37
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Já o impacto extra-operacional
operacional pode ser igual a 1 (o que significa que a parte extra-operacional
extra não tem
qualquerer impacto), superior a 1 (está a empolar a parte operacional) ou inferior a 1 (está a contrariar a parte
operacional). Isto assumindo que a parte operacional é positiva. Caso esta seja negativa quanto menor o
efeito extra-operacional melhor.

O efeito financiamento  impacto do financiamento para o retorno dos acionistas.

Divide-se em duas parcelas:


 O diferencial entre o retorno do ativo e o custo do passivo (EBIT/A
( – JS/P) e,
 O nível de endividamento da empresa (P/CP).

No que diz respeito ao primeiro


ro fator o ideal é que seja positivo, e quanto mais elevado melhor pois isso
significa que a empresa está a conseguir gerar retornos mais elevados e/ou a pagar uma taxa de juro mais
baixa.

Já o endividamento tem de ser visto com maior cautela porque um maior maior endividamento implica mais risco
financeiro. Se o diferencial for negativo o facto da empresa ter endividamento vai reduzir a rentabilidade para
os acionistas. Se o diferencial for positivo já vai aumentar
aumentar o retorno mas, como referido, também vai aumentar
aumen
o risco.

O efeito fiscal  impacto do imposto sobre o rendimento. Igual a (1 – taxa de imposto efectiva)

Quanto maior for a taxa de imposto mais é entregue ao Estado e menos fica para os acionistas.

A fórmula completa é então a seguinte:

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14. Rácios de funcionamento

Objetivo: analisar a eficiência da gestão de clientes, stocks e fornecedores

Rácios utilizados:

Clientes
Prazo médio de recebimentos =  360
Vendas e prestação de serviços

Inventários
Prazo médio de inventários =  360
Custo das vendas

Fornecedores
Prazo médio de pagamentos =  360
Compras

Prazo médio de recebimentos (PMR)  número de dias que a empresa demora a receber dos seus
clientes

Deve ser o mais baixo possível (desde que não inviabilize as vendas) devido aos seguintes factos:
 Problemas de tesouraria: quanto mais tarde a empresa receber dos seus clientes mais difícil é fazer face
aos pagamentos correntes ao pessoal, fornecedores…
 Custo do dinheiro: se os clientes pagam tarde a empresa tem de recorrer a crédito oneroso
 Risco de crédito: quanto mais tarde pagarem os clientes maior o risco da empresa não vir a receber o
dinheiro.

Prazo médio de inventários (PMI)  número de dias de vendas que a empresa pode efetuar com os
inventários em stock.

A fórmula utilizada acima é apenas adequada para empresas comerciais (as que compram mercadorias para
a sua revenda). Para empresas industriais já deveriam ser considerados dois outros prazos médios de
inventários:

Matérias primas
Prazo médio de matérias primas=  360
Custo das matérias consumidas

Produtos
Prazo médio de produtos=  360
Custo das vendas*
Sílvia Cortês 39
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(*) O indicador mais adequado é o Custo das vendas da Demonstração de resultados por funções. Caso não
se disponha deste, poder-se-ão utilizar as vendas como aproximação. Neste caso, o prazo fica subavaliado
pois os produtos estão a preço de custo e as vendas já incluem a margem.

Independentemente de respeitar a mercadorias, matérias-primas ou produtos acabados, deve ser o mais


baixo possível desde que não provoque rutura de stocks porque:
 quanto mais cedo a empresa comprar os inventários mais cedo tem de os pagar
 os inventários têm de estar armazenados, o que tem custos de espaço, manuseamento…
 os inventários podem estragar-se, perder validade ou ficar obsoletos.

Prazo médio de pagamentos (PMP)  número de dias que a empresa demora a pagar aos seus
fornecedores

Deve ser o mais alto possível enquanto for gratuito. No entanto tem de se tomar em consideração que muitas
vezes ele não é gratuito, sobretudo quando se ultrapassa o prazo acordado em que, dependendo da posição
negocial de cada uma das partes, o fornecedor pode deixar de fornecer, cobrar juros de mora, solicitar preços
mais elevados…

Nota: as compras incluem as compras de inventários e fornecimentos e serviços externos. As compras de inventários não
aparecem diretamente nas demonstrações financeiras. Ou estão disponíveis numa nota anexa ou têm de ser calculadas através da
fórmula CMVMC + Inventários de mercadorias e matérias final do ano – Inventários de mercadorias e matérias início do ano.

Cuidados a ter com estes rácios:

 Problema inerente a rácios que comparam rubricas do Balanço e da Demonstração de Resultados. A


posição da rubrica do Balanço (clientes, inventários ou fornecedores) é a do final do ano e pode estar
influenciada por fatores de sazonalidade ou por alguma compra/venda esporádica.

 IVA: tanto a rubrica de clientes como a de fornecedores inclui o valor do IVA enquanto que isso não
acontece com as vendas e as compras. Assim o PMR e o PMP estão empolados pelo IVA. Se a taxa média
do IVA for de 23% eles aparecem nos cálculos com um valor 23% superior ao real. Como corrigir? Sabendo a
taxa de IVA média para a empresa é fácil. Ou retiramos o IVA aos clientes ou incluímos nas vendas. Caso
não se saiba a taxa do IVA já é mais complicado. Nesse caso uma boa solução é não fazer a correção. A
comparação com outras empresas do setor ou com outros anos para a mesma empresa continua a ser
possível pois o erro está em todas as situações.

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15. Rácios de liquidez

Objetivo: analisar a capacidade da empresa em solver os seus compromissos de curto prazo

Rácios utilizados:

Ativo corrente
Liquidez Geral =
Passivo corrente

Ativo corrente - Inventários


Liquidez Reduzida =
Passivo corrente

Caixa e eq.
Liquidez Imediata =
Passivo corrente

Liquidez geral  compara os ativos que no curto prazo se vão transformar em dinheiro com os passivos que
vão ser exigidos também no curto prazo. Como indicador genérico podemos apontar que este valor deve ser
superior a 1 pois nesse caso vamos ter dinheiro suficiente para cobrir os passivos que se vão vencendo no
ano seguinte.

Liquidez reduzida  de entre os ativos correntes aquele que está mais longe de se transformar em dinheiro
é a rubrica de inventários (ainda têm de ser vendidos, vão gerar dívidas de clientes e só mais tarde estes irão
pagar). Assim, retirando este valor aos ativos correntes, estamos a ser mais conservadores e a analisar se
ainda assim estes conseguem cobrir o passivo corrente.

Liquidez imediata  mede se a empresa tem caixa e equivalentes suficientes para pagar a totalidade dos
passivos correntes.

Temos de ter cuidado com a análise destes rácios:

 Se eles forem mais elevados o risco de liquidez é menor mas se forem elevados demais a empresa não
está a ter uma boa gestão de tesouraria. Isto é particularmente evidente no rácio de liquidez imediata. Não faz
sentido a empresa ter muito dinheiro parado.

 Estes rácios funcionam muito bem quando o prazo de vencimento dos activos é parecido com o prazo de
vencimento dos passivos. No entanto nem sempre isso acontece. Quando falamos em curto prazo podemos
referir-nos a 1 dia, 1 mês, 3 meses… até 1 ano. Quando o prazo de vencimento dos ativos é maior que o dos
passivos os rácios têm de ser mais altos para que a empresa tenha uma posição de tesouraria confortável. Já
quando o contrário acontece (na distribuição por exemplo) os rácios podem ser mais baixos porque os ativos
vencem-se várias vezes face aos passivos.

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16. Fundo de Maneio e equilíbrio financeiro

Objetivo: analisar a relação entre o prazo de vencimentos dos ativos e das fontes de financiamento, o
equilíbrio financeiro

O conceito de Fundo de Maneio (FM) é muito semelhante ao de liquidez: deve haver uma relação entre o
prazo de vencimento dos ativos e dos passivos.

Começa-se então por agregar os elementos do Balanço segundo o seu prazo: divide-se o ativo em corrente e
não corrente e as fontes de financiamento em correntes e duradouras (incluindo estas últimas não só o
passivo não corrente como o Capital Próprio).

Capital Próprio
Ativo +
não corrente Passivo
não corrente
Fundo de Maneio

Ativo Passivo
corrente corrente

O Fundo de Maneio pode calcular-se de duas formas distintas, que dão exactamente o mesmo valor:

FM = Ativo corrente (Ac) - Passivo corrente (Pc) (mesma lógica do rácio de liquidez geral, compara os activos
que no curto prazo se vão transformar em dinheiro com os passivos que vão ser exigidos também no curto
prazo).

FM = Capital Próprio + Passivo não corrente - Ativo não corrente (estamos a analisar se os ativos duradouros
estão a conseguir ser financiados por fontes de financiamento também duradouras).

Concetualmente, preferimos adotar a segunda fórmula e referir que o fundo de maneio corresponde à parcela
de capitais permanentes que financia ativos correntes.

Na análise tradicional diz-se que a empresa está em equilíbrio quando consegue um Fundo de Maneio
positivo, o que é equivalente a ter um rácio de liquidez geral maior que 1.

Não há assim valor acrescentado face à análise de liquidez, pois quando o FM (Ac-Pc) é positivo, o rácio de
liquidez geral (Ac/Pc) é maior que 1.

Mas é aqui que vamos introduzir dois novos conceitos ̶ as Necessidades de Fundo de Maneio (NFM) e a
Tesouraria Líquida (TL) ̶ que vão complementar a análise tradicional, e permitir retirar informação mais
relevante.

Nesta abordagem, em vez de se dividir o Balanço em 4 partes, faz-se uma subdivisão do Ativo Corrente em
Necessidades de Exploração e Ativos de Tesouraria e do Passivo Corrente em Recursos de Exploração e
Passivos de Tesouraria, de que resulta uma divisão do Balanço em 6 partes, chegando-se, então, aos já
referidos dois novos conceitos:

Sílvia Cortês 42
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Capital Próprio
Ativo +
não corrente Passivo
não corrente
Fundo de Maneio
Necessidades
de exploração Recursos
de exploração

Ativos
de tesouraria Passivos
de tesouraria

 Necessidades de Fundo de Maneio (NFM) = Necessidades de exploração – Recursos de exploração

 Tesouraria Líquida ( T L) = Ativos de tesouraria (AT) – Passivos de tesouraria (PT)

Pela equação fundamental de Balanço, podemos relacionar o conceito de FM com os novos conceitos de
NFM e de T através da fórmula que se segue:

FM – NFM = TL

Para uma empresa operar precisa não só de ativos tangíveis, escritórios, lojas, fábricas, equipamentos... mas
também de ativos de curto prazo tais como inventários em stock ou dívidas de clientes. As necessidades de
exploração são os ativos correntes de que a empresa necessita para operar.

Do lado do financiamento a empresa tem financiamentos correntes onerosos, empréstimos, mas também tem
financiamentos correntes que resultam diretamente da sua atividade e que normalmente são gratuitos, como
dívidas a fornecedores ou ao Estado. Estes últimos são os recursos de exploração, fontes de financiamento
de curto prazo geradas pela exploração e gratuitas. Refira-se, no entanto, que nem todos os financiamentos
gratuitos correspondem a recursos de exploração: por exemplo, o crédito que um fornecedor de ativos fixos
tangíveis conceda num determinado momento a uma empresa não é um recurso relacionado com o ciclo de
exploração da empresa – como tal, deve ser classificado como passivo de tesouraria.
Ora se a empresa necessita no seu ciclo normal de exploração de recursos (necessidades de exploração)
mas tem uma parte dos mesmos que é financiada “automaticamente” e a título gratuito (recursos de
exploração) é importante verificarmos se em termos líquidos a empresa tem de investir nesses recursos ou
se, pelo contrário, tem excedentes. Daí calcularem-se as Necessidades de Fundo de Maneio, que são a
diferença entre os dois.

O ideal neste caso é ter NFM negativas pois isto significa que os financiamentos correntes “automáticos” são
superiores aos ativos correntes necessários à atividade pelo que temos excedentes de fundos.

É natural que isso aconteça no caso de empresas de distribuição, pois o valor dos clientes normalmente é
reduzido, uma vez que a quase totalidade paga a pronto, e o valor dos fornecedores é muito elevado, devido
ao grande poder negocial de quem compra.

A questão que de seguida se levanta é a seguinte: apesar das NFM estarem classificadas como ativos e
passivos correntes, pois vão ser recebidos/pagos no curto prazo, podemos dizer que grande parte das
mesmas são, na realidade, permanentes. Isto porque pelo ciclo operacional da empresa estão
sistematicamente a acontecer. Um cliente paga a dívida mas, entretanto, já temos outro a dever, e assim
sucessivamente.

Sílvia Cortês 43
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Nesta lógica então, as NFM permanentes deverão ser financiadas com fontes de financiamento duradouras.

Assim, o equilíbrio financeiro consegue-se quando as fontes de financiamento duradouras conseguem cobrir
não só os ativos não correntes mas também as NFM:

Capital Próprio + Passivo não corrente deve cobrir o Ativo não corrente + Necessidades de Fundo de
Maneio.

De outra forma: FM-NFM>0 --> equilíbrio financeiro

Quanto maiores forem as NFM de um negócio, maior deverá ser o FM para que a empresa esteja em
equilíbrio financeiro. É o típico caso de empresas industriais com stocks elevados e grandes dívidas de
clientes. Por outro lado, se as NFM forem negativas a empresa "aguenta" um FM negativo pois vai ter outras
fontes de financiamento permanentes.

É nesta lógica que se pretende com o cálculo da Tesouraria Líquida (como FM-NFM ou, como resulta das
diversas definições desta abordagem, como AT – PT) aferir do equilíbrio financeiro da empresa. Salienta-se
que este conceito de Tesouraria não corresponde ao de meios financeiros líquidos – antes pretende ser um
indicador para aferir a liquidez da empresa mais adequado do que os utilizados na análise financeira
tradicional.
Uma última nota: também nestes indicadores a sazonalidade pode provocar distorções quando se calculam
valores no final do ano. Uma alternativa é calcular um FM médio e umas NFM médias e comparar os valores
para então aferir da existência (ou não) de equilíbrio financeiro.

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17. Cobertura da dívida e dos juros, e custo do passivo

Há atualmente 2 rácios muito utilizados para medir o risco financeiro, não através da estrutura financeira, mas
sim pela capacidade de pagamento dos juros e da dívida. Para isso relacionam resultados com a dívida e
com os juros. Também é muito comum calcular uma aproximação à taxa de juro do ano, através do custo do
passivo.

Objetivo do rácio de cobertura da dívida: conseguir uma aproximação de quantos anos a empresa
demoraria a pagar a dívida

Dívida líquida Passivo remunerado - caixa e equivalentes


=
EBITDA EBITDA

A dívida líquida representa os empréstimos subtraídos da caixa, uma vez que esta poderia servir para
imediatamente pagar os primeiros.

O EBITDA é uma aproximação ao cash flow operacional, caso não houvesse variações das necessidades de
fundo de maneio, isto é, se os prazos de recebimentos de inventários e de pagamentos se mantivessem
constantes.

Ao relacionar os dois fica-se com a informação de quantos anos demoraríamos a pagar a dívida, assumindo
que tanto esta como o EBITDA se mantinham constantes.

Quanto mais alto o rácio mais tempo se demora a ter capacidade para pagar a dívida e maior é o risco.

Objetivo do rácio de cobertura dos juros: quantas vezes a empresa consegue pagar os juros com o
resultado antes de juros e impostos

EBIT
Interest cover =
Juros suportados líquidos

Pretende-se medir a capacidade de pagar os juros com os resultados gerados. Quanto mais elevado o rácio
mais favorável é para a empresa

Objetivo do custo do passivo: analisar quanto custa o passivo da empresa, ie, uma aproximação à
taxa de juro da empresa

Juros suportados
Custo do passivo=
Passivo
Juros suportados
Custo do passivo remunerado=
Passivo remunerado

Quanto mais baixo for o custo do passivo mais favorável é para a empresa.

Sílvia Cortês 45
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Ambos os rácios medem o custo do passivo, mas enquanto o primeiro mede o custo do passivo total o
segundo mede o custo do passivo remunerado.

O custo do passivo remunerado é uma aproximação à taxa de juro que a empresa paga. O custo do passivo
total é sempre menor do que o custo do passivo remunerado porque os juros suportados (gerados só pelo
passivo remunerado) são divididos pelo passivo total.

Cuidados a ter com os dois rácios:


Problema inerente a rácios que comparam rubricas do Balanço e da Demonstração de Resultados. A posição
da rubrica do Balanço (passivo) é a do final do ano e os juros foram gerados pelo passivo ao longo do ano.
Se o passivo não variar muito durante esse período o rácio está correto, se houver grandes variações o rácio
pode estar subavaliado (se o passivo aumentar) ou sobreavaliado (se o passivo diminuir).

18. Análise da Demonstração de Fluxos de Caixa

Pela Demonstração de Fluxos de Caixa (DFC) podemos analisar onde a empresa vai buscar e gastar o seu
dinheiro. Esta demonstração só contempla factos que impliquem uma movimentação de dinheiro. A DFC está
dividida em 3 fluxos: atividades operacionais, atividades de investimento e atividades de financiamento. A
soma dos 3 dá origem à variação de caixa e seus equivalentes.

O fluxo mais importante é o das atividades operacionais. Representa a capacidade da empresa gerar
dinheiro com o seu funcionamento corrente. Este fluxo deve ser:
 Positivo
 Crescente
 E deve cobrir os juros e dividendos pagos.

Já o fluxo das atividades de investimento pode ser negativo pois isso significa que a empresa está a investir
e consequentemente a desenvolver a sua atividade. Caso seja positivo é importante analisar se o
desinvestimento é em ativos tangíveis (e consequentemente relacionado com a atividade) ou em
investimentos financeiros.

Através do fluxo das atividades de financiamento podemos avaliar as fontes de financiamento.


Conseguimos perceber quanto a empresa gasta em juros e em dividendos (remuneração dos credores e dos
acionistas), se a empresa está a reembolsar ou a pedir mais empréstimos e se há algum aumento de capital.

Pela variação de caixa e seus equivalentes não tiramos grandes conclusões. Será que é favorável ela ser
positiva ou negativa? Depende:
 da situação inicial de caixa: se já for positiva não é necessariamente bom que a empresa fique com
muita caixa e equivalentes no final do ano;
 da origem dos fundos: é completamente diferente a empresa aumentar a sua caixa devido aos fluxos
operacionais ou por ter pedido mais empréstimos.

Sílvia Cortês 46
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APLICAÇÃO PRÁTICA

O exemplo de seguida apresentado foi criado para efeitos de exemplificação de uma análise económico-
financeira. A base foi desenvolvida considerando a normal atividade operacional de uma empresa numa
determinada área de negócio mas não pretende representar nenhuma empresa real.

Vamos supor que a empresa em análise é uma empresa comercial, mais concretamente na área da grande
distribuição.

19. Análise do Balanço


Para permitir uma melhor análise o Balanço deve ser apresentado em milhares de euros, em percentagem do
ativo e com as taxas de crescimento de cada uma das rubricas.

BALANÇO X X-1 X X-1 Variação


(Milhões €) (Milhões €) (%) (%) (Milhões €) (%)
Ativos fixos tangíveis 1 200 1 100 69,0 64,7 100 9,1
Ativos intangíveis 70 60 4,0 3,5 10 16,7
Investimentos financeiros 30 100 1,7 5,9 -70 -70,0
Total de ativos não correntes 1 300 1 260 74,7 74,1 40 3,2
Inventários 230 200 13,2 11,8 30 15,0
Clientes 9 10 0,5 0,6 -1 -10,0
Outras contas a receber 95 80 5,5 4,7 15 18,8
Outros ativos correntes 14 10 0,8 0,6 4 40,0
Caixa e equivalentes de caixa 92 140 5,3 8,2 -48 -34,3
Total de ativos correntes 440 440 25,3 25,9 0 0,0
TOTAL DO ATIVO 1 740 1 700 100,0 100,0 40 2,4
Capital 300 300 17,2 17,6 0 0,0
Reservas 110 60 6,3 3,5 50 83,3
Resultado líquido 114 76 6,6 4,5 38 50,0
TOTAL DO CAPITAL PRÓPRIO 524 436 30,1 25,6 88 20,2
Empréstimos obtidos 414 218 23,8 12,8 196 89,9
Provisões 19 18 1,1 1,1 1 5,6
Total de passivos não correntes 433 236 24,9 13,9 197 83,5
Empréstimos obtidos 97 328 5,6 19,3 -231 -70,4
Fornecedores 540 550 31,0 32,4 -10 -1,8
Outras contas a pagar 70 80 4,0 4,7 -10 -12,5
Outros passivos correntes 76 70 4,4 4,1 6 8,6
Total de passivos correntes 783 1 028 45,0 60,5 -245 -23,8
TOTAL DO PASSIVO 1 216 1 264 69,9 74,4 -48 -3,8
TOTAL DO C.P. E PASSIVO 1 740 1 700 100,0 100,0 40 2,4

Sílvia Cortês 47
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Total do ativo =1.740me, ligeiramente superior ao ano anterior (+2,4%):

Sobretudo ativos não correntes: 1.300me (74,7% do A) e que aumentaram 3,2%:


 Ativos fixos tangíveis de 1.200me (62,5% do A) e aumentaram 9,1%: lojas próprias, equipamento das
lojas… aumento provavelmente resultou da abertura de novas lojas.
 Investimentos financeiros reduziram 70% ou devido a venda ou devido a desvalorização. Neste caso deverá
ter sido devido a uma venda com mais-valia pois na Demonstração de Resultados temos resultados não
recorrentes elevados e na Demonstração de Fluxos de Caixa temos um grande desinvestimento em
investimentos financeiros.

Ativos correntes: 440me (25,3% do A), tendo-se mantido constante:


 Inventários têm valor muito elevado porque a empresa é comercial: mercadorias que têm à venda e cujo
valor aumentou 15%.
 Caixa e equivalentes de 92me: também tem peso significativo, o que é normal numa atividade
predominantemente de retalho alimentar em que os saldos são especialmente avultados no final do ano. Houve
uma redução significativa (-34,3%). Poderemos perceber porquê através da análise da Demonstração de
Fluxos de Caixa.
 Dívidas de clientes com valor muito baixo (0,5% do A): os clientes pagam a pronto na sua quase totalidade.

Financiamento do ativo:

O ativo foi sobretudo financiado por passivo em ambos os anos, embora este tenha reduzido o seu peso no
ativo (passou de 74,4% para 69,9%).

O passivo é sobretudo corrente (783me) embora este tenha baixado muito (-23,8%) devido à redução dos
empréstimos obtidos. A principal rubrica do passivo corrente diz respeito a fornecedores (31% do A) o que
reflete a enorme capacidade negocial que existe na indústria da distribuição, junto dos respetivos fornecedores.

No que diz respeito ao passivo não corrente, este tem um peso de 24,9% e subiu muito devido ao aumento dos
empréstimos obtidos, que também são a principal rubrica. Parece ter havido uma reestruturação da dívida com
vista a transferir empréstimos de curto prazo em médio e longo prazo.

O capital próprio é de 524me e é composto maioritariamente por capital social. Aumentou 20,2%, devido à
retenção de resultados do ano X-1 e aos resultados do ano X.

Sílvia Cortês 48
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20. Rácios de financiamento

Rácios de Financiamento X X-1


Capital próprio / Ativo 30,1% 25,6%
Passivo / Ativo 69,9% 74,4%
Passivo não corrente / Ativo 24,9% 13,9%
Passivo corrente / Ativo 45,0% 60,5%
Passivo remunerado / Ativo 29,4% 32,1%
Passivo não remunerado / Ativo 40,5% 42,2%
Passivo remunerado 511 546

A empresa está-se a financiar sobretudo por capitais alheios (69,9%) tendo no entanto o endividamento
diminuído. Isto significa que a empresa está com menos risco financeiro. A redução do endividamento foi
sobretudo devida à diminuição de empréstimos correntes.

O endividamento é sobretudo corrente em ambos os anos. No entanto o endividamento não corrente


aumentou 11pp, passando de 13,9% para 24,9%. Como verificámos no ponto anterior isto resultou de uma
restruturação da dívida de curto prazo para médio e longo. Com isto conseguiu-se uma menor pressão na
tesouraria da empresa.

O endividamento é sobretudo não remunerado (40,5%) devido ao grande montante de dívidas a


fornecedores, normal nesta actividade. Tanto o endividamento remunerado como o não remunerado
diminuíram, em linha com o decréscimo do endividamento total.

Sílvia Cortês 49
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21. Análise da Demonstração de Resultados

Também para permitir uma melhor análise a DR deve ser apresentada em milhares de euros, em
percentagem da faturação e com as taxas de crescimento de cada uma das rubricas.

DEMONSTRAÇÃO DE RESULTADOS X X-1 X X-1 Variação


(Milhões €) (Milhões €) (%) (%) (Milhões €) (%)
+Vendas e prestações de serviços 2 500 2 600 100,0 100,0 -100 -3,8
-CMVMC -1 940 -2 000 -77,6 -76,9 60 -3,0
-FSE -340 -320 -13,6 -12,3 -20 6,3
-Gastos com pessoal -320 -300 -12,8 -11,5 -20 6,7
+/- Outros operacionais 180 200 7,2 7,7 -20 -10,0
-Provisões e perdas por imparidade -1 -1 0,0 0,0 0 0,0
RESULTADOS OPERACIONAIS BRUTOS (EBITDA) 79 179 3,2 6,9 -100 -55,9
- Depreciações e amortizações -75 -70 -3,0 -2,7 -5 7,1
RESULTADOS OPERACIONAIS (EBIT-OP) 4 109 0,2 4,2 -105 -96,3
+/-Resultados de investimentos 20 -5 0,8 -0,2 25 -500,0
+/-Resultados não recorrentes 125 10 5,0 0,4 115 1150,0
RESULTADOS ANTES JUROS E IMPOSTOS (EBIT) 149 114 6,0 4,4 35 30,7
- Juros suportados líquidos -25 -21 -1,0 -0,8 -4 19,0
RESULTADOS ANTES DE IMPOSTOS (RAI) 124 93 5,0 3,6 31 33,3
-Imposto sobre o rendimento -10 -17 -0,4 -0,7 7 -41,2
RESULTADOS LÍQUIDOS (RL) 114 76 4,6 2,9 38 0,5

Total de faturação de 2.500me que diminuiu 3,8% face ao ano anterior. Rendimentos operacionais serão
maioritariamente vendas porque estamos perante uma empresa comercial.

A principal rubrica de gastos operacionais diz respeito ao custo das mercadorias vendidas e matérias
consumidas e registou uma redução em valor mas um aumento no peso da faturação (passou de 76,9% para
77,6%), o que significa que a empresa está com uma menor margem comercial. Tanto os FSE como os
gastos com o pessoal aumentaram, enquanto que os outros rendimentos operacionais diminuíram (estes
deverão ser sobretudo proveitos suplementares, provavelmente pagamentos dos fornecedores para
colocarem as suas mercadorias em localizações privilegiadas).

Pelas razões anteriormente referidas o EBITDA diminuiu 55,6% e passou a representar 3,2% das vendas.

O EBIT-OP também diminuiu, registando uma quebra de 4,2% das vendas para 0,2%, devido à redução do
EBITDA e ao aumento das depreciações e amortizações.

O EBIT tem um comportamento claramente distinto, aumentando 30,7% e passando de 4,4% para 6,0% das
vendas. Apesar da quebra da parte operacional o impacto extra-operacional foi muito positivo devido aos
resultados não recorrentes. Estes poderão ser mais-valias na venda de ativos financeiros.

Também o RAI aumenta, influenciado pelos resultados não recorrentes e apesar do acréscimo dos juros
suportados.

Finalmente, o resultado líquido aumentou, devido sobretudo à parte extra-operacional, e também ajudado
pela redução de IRC, já que o resultado operacional diminuiu e os juros aumentaram.

Sílvia Cortês 50
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22. Rácios de rendibilidade

Rácios de rentabilidade X X-1


EBITDA/Vendas 3,2% 6,9%
EBIT-OP/Vendas 0,2% 4,2%
EBIT/Vendas 6,0% 4,4%
RAI/Vendas 5,0% 3,6%
RL/Vendas 4,6% 2,9%
EBIT/Ativo 8,6% 6,7%
RL/Capital Próprio 21,8% 17,4%

Rentabilidade das vendas: reflete o que já foi referido na análise da Demonstração de Resultados, já que
vamos estar a analisar os diversos resultados em percentagem da faturação. Resumidamente:

EBITDA/V: -3,7pp – reflete a redução das vendas e o aumento dos gastos operacionais exceto depreciações
e amortizações, provisões e perdas por imparidade. É mau sinal!

EBIT-OP/V: -4,0pp – agrava-se a redução pois à redução do EBITDA acresce o aumento das depreciações.

EBIT/V: +1,6pp – inverte-se a situação: os resultados não recorrentes mais do que compensam a redução do
EBIT.

RAI/V: +1,4pp – ainda crescente devido ao RAEFI, mas com os juros suportados a aumentarem.

RL/V: +1,7pp – a redução do IRC ajudou o aumento do RAI.

Rentabilidade do ativo: passou de 6,7% para 8,6%. Representa a rentabilidade dos investimentos.

Rentabilidade do capital próprio: rentabilidade para os acionistas, aumentou de 17,4% para 21,8%, o que dá
uma boa remuneração contabilística aos acionistas. Vamos perceber o porquê deste aumento através da
decomposição da RCP.

Sílvia Cortês 51
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23. Decomposição da Rentabilidade do Capital Próprio

X X-1
Rentabilidade do Capital Próprio 21,8% 17,4%
Efeito investimento 8,6% 6,7%
Efeito financiamento 15,1% 14,6%
Efeito fiscal 0,92 0,82
EBIT-OP / Vendas 0,2% 4,2%
Vendas / Ativo 1,44 1,53
EBIT / EBIT-OP 37,25 1,05
JS / Passivo 2,1% 1,7%
Passivo / Capital próprio 2,32 2,90

EBIT-OP Vendas EBIT EBIT JS Passivo 1- Tx RL


Vendas Ativo EBIT-OP Ativo Passivo CPróprio Imposto CPróprio

X-1 [ ( 4,2% x 1,53 x 1,05 ) + ( 6,7% - 1,7% ) x 2,90 ] x 0,82 = 17,4%


X-1 ( 6,7% + 14,6% ) x 0,82

X [ ( 0,2% x 1,44 x 37,25 ) + ( 8,6% - 2,1% ) x 2,32 ] x 0,92 = 21,8%


X ( 8,6% + 15,1% ) x 0,92

Rentabilidade do capital próprio elevada e que aumentou de 17,4% para 21,8%, influenciada positivamente
pelos efeitos investimento, financiamento e fiscal.

Efeito investimento (rentabilidade do ativo): aumentou de 6,7% para 8,6%. No entanto este facto ficou a
dever-se à parcela extra-operacional que acrescenta valor e que aumentou de 1,05 para 37,25, já que a parte
operacional piorou claramente: a margem operacional desceu de 4,2% para 0,2% e o volume caiu de 1,53
para 1,44.

Efeito financiamento: aumentou de 14,6% para 15,1%, apesar do endividamento ter diminuído. A razão
principal para a subida foi o diferencial, devido exclusivamente ao aumento da rentabilidade do ativo, dado
que o custo do passivo também aumentou. No entanto não podemos esquecer que a rentabilidade do ativo foi
muito empolada pelos fatores extra-operacionais. A redução do endividamento diminuiu a rentabilidade (pois
o diferencial é positivo) mas também reduziu o risco financeiro.

Efeito fiscal: aumentou de 0,82 para 0,92 significando que a empresa pagou relativamente menos IRC.

Conclusão: embora o retorno para os acionistas tenha aumentado, a parte operacional da empresa está
claramente pior.

Sílvia Cortês 52
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24. Rácios de funcionamento

Rácios de funcionamento (dias) X X-1


Prazo médio de recebimentos 1 1
Prazo médio de inventários 43 36
Prazo médio de pagamentos 84 84
Compras mercadorias 1.970 2.030
FSE 340 320

Prazo médio de recebimentos: é muitíssimo pequeno (1 dia), o que reflete que a maioria dos pagamentos é
feita a pronto.

Prazo médio de inventários: aumentou 7 dias, passando de 36 dias para 43 dias: este é um rácio muito
importante para empresas comerciais em que os inventários são uma parcela importante dos seus ativos. O
aumento deste valor é normalmente desfavorável para a empresa e deve ser objeto de grande atenção.

Prazo médio de pagamentos: manteve-se em 84 dias, refletindo o grande poder negocial das empresas de
distribuição junto dos seus fornecedores.

O prazo médio de pagamento é superior à soma do prazo médio de recebimentos com o prazo médio de
inventários. Isto significa que a empresa só paga aos seus fornecedores depois de já ter recebido dos seus
clientes Ciclo de caixa negativo que é típico deste setor de atividade e muito favorável. Em termos de
evolução, no entanto, o ciclo tornou-se menos negativo devido ao aumento do prazo médio de inventários, o
que já é desfavorável.

25. Rácios de liquidez

Rácios de Liquidez X X-1


Liquidez geral 0,56 0,43
Liquidez reduzida 0,27 0,23

Liquidez geral inferior a 1, o que geralmente é preocupante mas é normal nesta actividade em que os activos
correntes se vencem a um ritmo muito mais elevado que os passivos correntes. Verificamos que o rácio
melhorou, passando de 0,43 para 0,56, o que foi conseguido sobretudo à custa da restruturação da dívida.

Liquidez reduzida significativamente inferior á liquidez geral dado a empresa ter avultados valores de
inventário.

Sílvia Cortês 53
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26. Fundo de Maneio e equilíbrio financeiro

Fundo de Maneio e Equilíbrio Financeiro X X-1


Fundo de Maneio -343 -588
Necessidades de Fundo de Maneio -338 -400
Tesouraria Líquida -5 -188

Sendo a liquidez geral inferior a 1, o Fundo de Maneio é necessariamente negativo, mas podemos verificar
que é menos negativo do que no ano anterior (-588me --> -343me), o que poderá indicar menos pressão na
tesouraria. Esta melhoria foi conseguida através da transferência de empréstimos obtidos de curto prazo para
longo prazo.

No que diz respeito às Necessidades de Fundo de Maneio estas são negativas, devido à atividade da
empresa, o que é favorável.

No entanto tornaram-se menos negativas (-400me --> -338me), sobretudo devido ao aumento dos
inventários, o que é pior para a empresa.

Equilíbrio financeiro = FM-NFM passou de francamente negativo (-188me) para quase nulo (-5me) o que
significa que melhorou muito, estando a empresa praticamente em equilíbrio. Isto foi devido à melhoria do FM
e apesar das NFM terem sido menos favoráveis (menos negativas).

27. Cobertura da dívida e dos juros, e custo do passivo

Cobertura de dívida e de juros X X-1


Dívida líquida / EBITDA 5,24 2,26
EBIT / Juros suportados 5,96 5,43
EBIT-OP / Juros suportados 0,16 5,19

A cobertura da dívida piorou muito significativamente. A manter-se o EBITDA a empresa agora precisaria de 5
anos para gerar fundos para conseguir pagar a dívida. Esta evolução foi sobretudo devida à grande redução
do EBITDA, estudada na análise da Demonstração de Resultados.

Já a cobertura dos juros melhorou, devido ao aumento do EBIT. No entanto este foi devido a resultados não
recorrentes que muito provavelmente não se tornarão a repetir. Utilizando o EBIT-OP a conclusão seria a
oposta.

Custo do passivo X X-1


Custo do passivo total 2,1% 1,7%
Custo do passivo remunerado 4,9% 3,8%

Tanto o custo do passivo total como o do passivo remunerado aumentaram, refletindo uma subida das taxas
de juro. Esta pode ser provocada pela conjuntura económica ou pelo risco da empresa.

Sílvia Cortês 54
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28. Demonstração dos Fluxos de Caixa


DEMONSTRAÇÃO DOS FLUXOS DE CAIXA X
(Milhões €)
ATIVIDADES OPERACIONAIS
Recebimentos de clientes 2 501
Pagmentos a fornecedores -2 320
Pagmentos ao pessoal -320
FLUXOS GERADOS PELAS OPERAÇÕES -139
Pagamento/rec. do imposto sobre o rendimento -10
Outros rec./pag. relativos à at. operacional 157
FLUXOS DAS ATIVIDADES OPERACIONAIS 8

ATIVIDADES DE INVESTIMENTO
Recebimentos provenientes de:
Ativos fixos tangíveis 0
Investimentos financeiros 195
Juros recebidos 20
Total dos recebimentos 215
Pagamentos respeitantes a:
Investimentos 0
Ativos tangíveis e intangíveis -185
Total dos pagamentos -185
FLUXOS DAS ATIVIDADES DE INVESTIMENTO 30

ATIVIDADES DE FINANCIAMENTO
Recebimentos provenientes de:
Empréstimos obtidos 0
Aumentos de capital 0
Total dos recebimentos 0
Pagamentos respeitantes a:
Reembolso de empréstimos -35
Juros -25
Dividendos -26
Total dos pagamentos -86
FLUXOS DAS ATIVIDADES DE FINANCIAMENTO -86

VARIAÇÃO DE CAIXA E SEUS EQUIV. -48

Fluxo das atividades operacionais = 8me, positivo mas insuficiente para cobrir juros e dividendos pagos
(25me + 26me). Desequilíbrio que se pode explicar pela redução da margem operacional bruta (de 180 me
para 80me) e pelo acréscimo do stock de inventários.

Fluxo das atividades de investimento = +30me, positivo, o que significa que a empresa está a desinvestir. No
entanto o desinvestimento diz respeito a participações financeiras, que não são o core business da empresa.
A empresa investiu significativamente nos ativos tangíveis e intangíveis (185me).

Fluxo das atividades de financiamento = -186me. A empresa reembolsou empréstimos, pagou juros e
dividendos.

Variação de caixa = -48me. A empresa foi buscar dinheiro que tinha no banco para financiar os vários fluxos.

Sílvia Cortês 55
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Conclusão: a empresa gerou poucos fluxos operacionais e estes foram claramente insuficientes para pagar
os juros e os dividendos. Para além disso ainda reembolsou empréstimos. Como o conseguiu? Fez um
desinvestimento em ativos financeiros que lhe permitiu pagar o investimento em ativos tangíveis e parte dos
juros e dividendos, e usou dinheiro de caixa e equivalentes para financiar o remanescente.

29. Conclusão

Em termos operacionais a empresa piorou, com uma margem mais baixa e uma redução nas vendas. A
gestão de stocks também foi mais fraca, com o prazo de inventários a aumentar. Tudo isto levou a que os
fluxos das atividades operacionais fossem insuficientes para cobrir os juros e dividendos pagos.

Em termos positivos temos uma redução e restruturação da dívida, que provocou uma redução no
endividamento e um aumento na liquidez que estava bastante baixa.

Sílvia Cortês 56

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