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Intensivo FUVEST

Aula 2

Profs. Gabi e Luiz

Planejamento da macroestrutura
Planejar um texto não é simplesmente fazer tópicos que tenham a ver com o tema e, posteriormente, ligá-los com alguns
conectivos. Há precisão no planejar – e essa precisão tem a ver com a tese. É o ponto de vista que define a seleção dos
conteúdos a figurarem ou não em um texto e a sequência em que aparecerão. Nesse sentido, quando bem estruturado,
o posicionamento adotado se torna uma bússola para quem lê, mas, sobretudo, para quem escreve. Que tal, então,
compreendermos quais as orientações que as sistematizações de tese vistas na última aula nos oferecem?

Tese I

Criamos uma imagem [A] a respeito de [TEMA/ASPECTO IMPORTANTE DO TEMA], a qual não raro, é tomada
como absolutaD1. O efeito disso é [Z] D2 / No entanto, [Z] D2.

A partir dessa tese, independentemente do que tratemos para o trajeto, algumas paradas são inevitáveis. Não há como
continuar um texto iniciado por uma afirmação como essa sem explicar o que é “criar imagens” e qual a imagem que se
cria, como ela se torna absoluta e quais os efeitos disso. Sendo assim, as perguntas abaixo podem ajudar na elaboração
do que fazer:

D1)

• O que significa dizer que “criamos imagens”? A relação que estabelecemos com o tema é direta ou mediada?

• Quais os filtros que interferem na imagem que criamos especificamente em nossa tese?

• Como essa imagem passa a ser confundida com a realidade? Assimetria de poder? Ensimesmamento? Falta de
tempo para a reflexão?

D2)

• O que decorre de uma imagem ser tomada como realidade? Intolerância? Interdição de outras interpretações?
Condenarmo-nos sempre aos mesmos resultados?

• Por que esses efeitos se mantêm? O que significaria social ou individualmente reconhecer nosso ponto de vista
não como absoluto, mas como uma possibilidade dentre inúmeras outras?

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Tese II

Em um cenário marcado por [X], o tema [Y]D1. O efeito disso é [Z] D2 / No entanto, [Z]D2.

Dessa segunda sistematização, também decorre a obrigatoriedade de algumas paragens: não há como desenvolvê-la
sem explicarmos qual é a característica social X de que falamos e qual é a forma Y com que ela interfere no tema.
Tampouco se pode abrir mão do texto do trabalho com as consequências ou ressalvas Z que fizermos. Mais uma vez,
algumas perguntas que nos podem ajudar:

D1)

• Qual é a característica social X? Como ela aparece ou se mantém em nossa sociedade contemporaneamente?
Como descrevê-la de forma a levar em consideração o tema?

• Qual a relação Y do tema com essa característica? Ou, em outras palavras, a partir da característica X o que
ocorre com o tema? Como ele é entendido?

D2)

• Quais os efeitos da relação entre X e Y?

• Por que esses efeitos se mantêm? O que significaria social e individualmente romper com eles?

Agora que já temos uma ideia de como organizar um texto a partir das teses, que tal colocar isso em prática? Seguem
abaixo algumas teses feitas a partir da proposta da FUVEST de 2012, que você teve de escrever na aula passada.
Analise esses pontos de vista avaliando o quanto eles têm ou não fôlego como indícios de planejamento de uma
dissertação inteira.

a) Em um cenário profundamente imerso no individualismo e no ensimesmamento, a participação política, que implica a


relação com o outro, o convívio em meio à alteridade, perde espaço e parece ultrapassada.

b) Em um contexto em que as pessoas estão cada vez mais ensimesmadas, a participação política deixa de interessá-
las. O efeito disso é o individualismo.

c) Em um cenário de polarização acentuada, a participação política se transforma em guerra. O efeito disso é o


individualismo.

d) Em um contexto em que as pessoas estão cada vez mais ensimesmadas, a participação política deixa de interessá-
las. O efeito disso é a polarização que se vê na realidade brasileira contemporânea.

e) Em um cenário individualista, a participação política tende a se retrair. O efeito disso é a ampliação de um sentimento
de impotência frente à realidade social.

Agora, o exercício é como um quebra-cabeças. Seguem abaixo 3 introduções feitas a partir de um mesmo tema. Em
cada uma delas, você deverá identificar as teses e o que elas preveem como planejamento para D1 e para D2. A seguir,
entre os “parágrafos seguintes”, você deverá localizar o que corresponde a cada introdução e reorganizar os textos
originais.

D1 D2 Conclusão

Texto A

Texto B

Texto C

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Introdução A:

“Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu?” — a frase, imortalizada pela madrasta de “A Branca de
Neve”, indica uma pergunta falsa. O que a bruxa deseja como resposta não é a realidade, mas sim algo que confirme
suas próprias expectativas e desejos. Nesse sentido, ou vê a si mesma na superfície especular ou não pode suportar o
que escapa ao reflexo. Fora da ficção, ao nos informarmos, não parecemos tão distantes da postura da personagem:
ensimesmados, procuramos a nós mesmos nas telas e chamamos de mundo aquilo que é espelho; mais do que isso,
caso alguma diferença ouse aparecer, somos nós mesmos que as caçamos.

Introdução B:

O eu-lírico de Drummond nos avisa que tinha uma pedra no meio do caminho; que, no meio do caminho, tinha uma
pedra. Essa rocha lhe provoca um estranhamento. Ele para, reflete sobre ela, contorna-a por um lado, por outro, e, ao
fim e ao cabo, é por ela modificado a ponto de nunca mais poder se esquecer, na vida de suas retinas tão fatigadas, de
que havia uma pedra no meio do caminho. Fora dos versos, porém, apressados que estamos, talvez ignorássemos isso
que faz o poeta interromper seu trajeto. Imersos na correria do dia-a-dia, entendemos como obstáculo a ser prontamente
superado qualquer informação que não seja direta e facilmente aplicada aos afazeres. O efeito disso é petrificarmo-nos a
nós mesmos naquilo que somos e pensamos numa inércia total.

Introdução C:

“Tô pagando” era o bordão de Lady Kate, personagem interpretada por Katiuscia Canoro no extinto “Zorra Total”. Tal
expressão, acreditava, encerraria quaisquer desacordos, silenciaria quaisquer questionamentos que se pudessem fazer
a ela e a suas vontades. O que lhe conferia identidade, então, era, antes de mais nada, seu poder de compra. Fora dos
limites da esquete cômica, essa postura parece contemporaneamente dar o tom de como lidamos com as informações
que nos chegam: imersos nos valores do consumo, tendemos a compreendê-las como produtos iguais a quaisquer
outros. O efeito disso é que, tal qual personagens construídos em torno de frases feitas, passamos a apenas repetir
aquilo que é definido por quem de fato pensa esses produtos.

Parágrafos Seguintes:

1) O consumo, no entanto, é normalmente passivo e, consequentemente, tornamo-nos repetidores das fórmulas


elaboradas por outros. O consumidor, é importante observar, raramente participa ativa e criativamente do processo
de produção daquilo que compra: quando essa postura é levada para nossa relação com as informações, tendemos
a ficar reféns daqueles que as produzem e analisam. Immanuel Kant, no século XVIII, afirmava que uma das razões
para que o homem se mantivesse na menoridade, ou seja, sem fazer uso de seu próprio juízo, era poder pagar para
que outros pensassem; contemporaneamente, parece que intensificamos o processo descrito pelo filósofo. Sem o
hábito de observar como são construídas as informações que lemos, de confrontá-las com outras fontes, de determo-
nos cuidadosamente sobre algumas em vez de acumular várias, nossas opiniões reduzem-se a bordões em relação
aos quais não temos nenhuma participação.

2) A partir do momento em que a produção é a pedra de toque do tempo contemporâneo, o que afasta dela deve ser
minimizado. Posto que sustenta, de um lado, o que consumir e, de outro, o poder consumir, a produtividade se torna
o bem maior a ser preservado. Buscando ampliá-la, então, os indivíduos procuram rapidez, e de forma cada vez mais
veloz, tiram de seus caminhos tudo o que possa ser um entrave: uma notícia que implique uma atenção maior por
fugir daquilo que já se espera, por exemplo, ou por demandar a verificação das fontes é rapidamente descartada; um
posicionamento distinto, por sua vez, é bloqueado sem demora; uma análise social mais complexa é,
instantaneamente, categorizada como mimimi, esquerdismo, idealismo ou qualquer outro termo que permita se livrar
dela e manter a consciência tranquila e limpa para o que de fato interessa: produzir. As pedras no caminho, aqui,
devem ser chutadas para longe.

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3) Se, na ficção, as tentativas da madrasta de calar o real acabam fracassando, na vida real nem sempre as coisas
funcionam assim. Vidrados no faz-de-conta, cada vez mais nos agarramos à fantasia e o que desejamos aprisionado
no alto de uma torre, envenenado, é, enfim, aquilo que é fato.

4) Quando o consumismo impera, somos consumidores antes de sujeitos em busca dos fatos. Enquadrados desde
sempre nos limites da lógica econômica, experienciamos pouco ou nada daquilo que não tem preço: nascemos e
precisamos de uma moradia que não é direito; precisamos comer, mas “não existe almoço grátis”. Dentro desse
contexto, ou pagamos ou não temos; e não estranha, portanto, que a primeira e principal dimensão de nós mesmos a
que tenhamos acesso seja a de consumidor. É como tal, então, que lidamos com as informações que nos chegam:
se, diante das vitrines dos shoppings, procuramos os produtos que nos agradam, no mercado de notícias
selecionamos os fatos também a partir desse critério e não, por exemplo, do quanto são condizentes com a
realidade; se, como clientes, temos sempre razão, reagimos bastante mal a posicionamentos ou matérias que
contrariem nossos próprios interesses e crenças. Formados, assim, como consumidores, mais consumimos a
informação do que, de fato, informamo-nos.

5) Fechados em nossas fortalezas particulares, tornamo-nos a medida única de todas as coisas. Diferentemente do que
ocorria com os canais de informação tradicionais — controlados por poucos e, portanto, refletindo as visões de
mundo daqueles que detinham o poder — as redes de comunicação contemporâneas permitem que perspectivas
diversas sejam divulgadas. No entanto, não é porque existe o diverso que se pode acessá-lo. Funcionando a partir
de uma lógica algorítmica, essas redes fazem chegar ao usuário apenas aquilo que converge com ele mesmo: é raro
que alguém de direita se depare com notícias e textos que exaltem um político de esquerda; a um homem hétero
conservador, poucas são as chances de chegarem conteúdos sobre os direitos lgbtqia+. Empanturrado daquilo que é
somente reflexo de si, o sujeito que se informa apenas pelas redes perde os contrapontos e, sem eles, deixa de
questionar a veracidade daquilo que recebe: passa a ser ele o rei absoluto e, diante de seu espelho virtual, é só a si
que pode enxergar.

6) Nesse sentido, se a pretensão do quadro humorístico era fazer rir, no mundo fora dele nem sempre é isso que se
provoca. Consumidores antes de tudo, o que vemos acabar sendo consumido é nosso próprio senso crítico. Quanto
a este, por fim, não é possível pagar.

7) Consequentemente, porém, a inércia cristaliza o sujeito numa forma única de si mesmo. Nossas identidades são
formadas a partir de nossas existências e, quanto mais variadas forem as informações que acessarmos, mais
podemos fazer uso de nosso juízo e experimentar sensações e ideias diferentes, o que nos permite conhecer mais
do mundo e, no limite, de nós mesmos. A imersão nos anseios da produção, entretanto, tal qual uma medusa, ao
excluir tudo aquilo que os atrasa, petrifica o indivíduo que só para eles tem olhos. A imagem que fica retida nas
retinas é, tal qual no personagem do conto de Machado, apenas aquela em que envergamos a farda de nossa
profissão.

8) E pobres daqueles que desafiarem o monarca. Se alguma notícia teimar em escapar aos crivos dos próprios
algoritmos, esse rei está pronto a “cortar-lhes as cabeças”: o botão “bloquear”, por exemplo, dá a este que brinca de
príncipe a possibilidade de se manter em sua própria fantasia. Narcísica, essa figura acha feio o que não é espelho.
Mais ainda: precisa achar, afinal, o outro é sempre uma lembrança de que a realidade não é feita à sua imagem e
semelhança, o que, no limite, a obrigaria a ter de lidar com um mundo que lhe escapa, que lhe incomoda, que muitas
vezes lhe nega. Mais fácil é bloquear, é chamar de “fake-news” aquilo que destoa. Enquanto a resposta do espelho é
apenas eco do próprio sujeito, é possível manter alguma consciência tranquila.

9) Difícil, portanto, é parar e abrir-se a informações variadas quando é imperioso correr, trabalhar e produzir. Sem elas,
no entanto, quem enfim se transforma em pedra a rolar estupidamente e cada vez mais fatigada somos nós mesmos.

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Proposta de Redação (FUVEST 2016)

Instruções para envio do texto:

1) Você deve escrever sua redação à caneta na folha própria para isso que está disponível no drive: https://
drive.google.com/drive/folders/1VKtU5j9agSZGtLNm1koedmHXNxDTklsY?usp=sharing

2) Depois disso, deve escaneá-la e salvar o arquivo em formato .pdf. Para isso, sugerimos o app CamScanner.

3) O arquivo em pdf deve ser enviado para o e-mail luiz@pontofinalcursos.com

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