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CAPITULO DOIS – TEORIA1


Por que teoria?
Diálogo
O problema sério para qualquer artista ou educador é recriar uma linguagem comum para a
comunicação de ... conhecimentos. Nós não temos uma linguagem comum, porque não temos
uma visão comum do universo em que vivemos. Nós não compartilhamos mais premissas. Eu
não acho que podemos ressuscitar completamente quaisquer das tradições em suas formas
antigas. Mas podemos voltar a explorar estas civilizações ... retraduzir suas idéias em formas
adequadas para o presente. Vamos recriar nossa cultura, indo de volta para as raízes
(Kathleen Raines – Revoring a Common Language).

Por que teoria?

Teoria serve como uma base.


Cada indivíduo opera a partir de uma base teórica. Esta base pode não estar articulada.
Ela pode permanecer não reconhecida, não dita, não formada, mal imaginada. Quer articulado ou
não, cada um de nós tem um sentido subjacente da estrutura na base de nossa experiência. Quer
articulado ou não a musicoterapia, como um campo, também tem uma estrutura subjacente.
Em geral, teoria é abstrata. O objetivo é descrever os elementos constantes de nossa
experiência. (Cada nova situação traz elementos novos e variados em nossa estrutura, que são
específicos ao contexto, ja transpiram uma estrutura invisível de nossa teoria).
Teoria reflete o quadro geral. No livro de Carlos Castaneda, The power of silence, o tema
central deste trabalho é um conceito chamado “abstract cores”2. Isto significa que a estrutura pode
conter um milhão de histórias diferentes. E é claro, há muitas opções de “abstract cores”.
Uma teoria é algo como um núcleo abstrato. Aprendemos sobre isso por termos muitas
experiências. Depois de um certo número de experiências em um determinado campo,
começamos a perceber constancias, os quais permeiam as nossas experiências, não importa o
quão variada dessas experiências possam ser.
O resultado desse processo de observação é que a teoria, o nucleo abstrato ou mesmo
esquema, podem ser reciclados em experiência e pode nos ajudar a avançar para um novo nível
de compreensão e apreciação sobre a nossa experiência, como nós nos observamos nelas.
A teoria implica um tipo de arquitetura do pensamento – uma estrutura de padrões,
conexões, formas. De certa maneira, uma teoria pode ser imaginada para ser um símbolo de
nossa experiencia.
Poderíamos então interpretar o nosso símbolo, traduzindo-o em palavras como conceitos,
princípios, elementos, constructos.
Há muitos riscos no processo de construção da teoria. Um destes riscos é particularmente
significativo na tarefa da construção teórica para o campo da musicoterapia.
Quando examinamos as raízes do trabalho teórico em musicoterapia isto irá nos trazer
para casa novamente, para uma outra variação da problemática divisão mente-corpo - processo
versus produto, linear versus circular, verbal versus não-verbal, lógico versus intuitivo, explícito
versus implícito. Isso não é surpresa, já que a musicoterapia caminha entre os dois mundos, o da
arte e o da ciência.

1
Do livro THE FIELD OF PLAY – A GUIDE FOR THE THEORY AND PRACTICE OF MUSIC THERAPY. Carolyn Bereznak
Kenny. 1989. Tradução livre de Sheila Volpi.
2
"núcleos abstratos"
2

No entanto, é hora de começar o diálogo entre os mundos, esses dois mundos dentro de
cada um de nós. É hora de começar a exploração na teoria para iniciar a fundação. Na maioria
dos casos, a musicoterapia tem olhado para uma teoria fora para se apoiar. Talvez até mesmo por
causa da nossa posição "entre os mundos", teremos algo a oferecer, aquela parte que é única em
nossa experiência como musicoterapeutas.
Colocando a questão global de lado, é importante lembrar que o objetivo principal de uma
teoria é apoiar a campo: praticantes da musicoterapia, educadores, estagiários de musicoterapia,
pesquisadores de musicoterapia, associações e, posteriormente, aqueles que recebem o nosso
serviço.
Há anos, sempre que eu pergunto a musicoterapeutas de todas essas categorias, o que
eles sentem, o que eles necessitam para apoiar o seu trabalho, suas respostas geralmente se
resume a uma “nova linguagem” para descrever a nossa experiência.
O musicoterapeuta perspicaz é cauteloso no uso da linguagem que descreve o trabalho.
Talvez esse discernimento venha da natureza não-verbal de nossa disciplina, da dimensão
estética, da importância da intuição, do fato de que a música em si é outra linguagem. Talvez nós
estejamos procurando palavras que expressam mais claramente do que as palavras usuais, a
relação entre condição humana e música, a relação da humanidade com o som.
Esta nova linguagem vai ser um tipo de jogo, uma nova criação, um outro aspecto de ser
ou dançar ou cantar entre dois mundos.
A nova linguagem deve ser tão suave e translúcida que ela pode conter um milhão de
variações. O processo de criação é o cerne do nosso trabalho e, portanto, as nossas teorias
devem representar formas dinâmicas. Sólido não pode significar estático. Claro não pode
significar fixado. E devemos "ouvir" a nossa experiência nestas formas teóricas, símbolos que
carregam temas contundentes.
Ao examinarmos as raízes de uma parte do trabalho teórico em musicoterapia nós
fazemos esta pergunta: podemos ouvir temas contundentes de experiências humanas com estas
palavras? Podemos sentir uma ordem subjacente? Como cada um de nós começa o processo de
explorar nossas próprias inclinações teóricas individuais ? Nós podemos perguntar: nossas
palavras ressoam nossa vida com a música e as pessoas em estado de transformação, cura,
humanidade, beleza, luta, resolução, decepção, alegria, amor? É assim o nosso encontro com o
homem e a música?

Volta as raízes
Porque as raizes da musicoterapia são tão firmemente estabelecidas na medicina, uma
tendência geral nos esforços na construção da teoria tem sido unir forças com teorias ou modelos
que se baseiam no campo da medicina em si e para evitar o contexto discreto de musicoterapia.
Even Ruud, em seu texto Music Therapy and Other Treatment Modalities, examina a relação da
musicoterapia com modelos médicos, modelos de comunicação e modelos de psicologia, muito
dos quais também tem suas origens na medicina.
Ruud descreve musicoterapia como estando numa “fase pré-paradigmática” de Thomas
Kuhn e incentiva o design de modelos que respeitam a natureza interdisciplinar da arte ja que
emergem da parte única da disciplina, a relação entre o homem e a música. Ruud nos orienta a
formação da teoria no campo da musicoterapia em si.
Nos últimos anos, tem havido um interesse crescente entre os terapeutas criativos e
expressivos da arte em geral, para trabalhar em direção a teorias que reflitam o processo criativo
das artes em terapia. Este interesse, em grande medida foi provocada pela falta de resultados
sólidos de pesquisa em psicoterapia, que é uma escola frequentemente abraçada por
musicoterapeuta que procuram modelos teóricos.
3

Feder e Feder (1981) comentam: "um número crescente de terapeutas de artes


expressivas começaram a se perguntar em voz alta se ... as terapias expressivas não devem
desenvolver estruturas teóricas independentes.
Esse interesse reflete a ausência de uma teoria bem fundamentada. A verdadeira
responsabilidade não pode ser satisfeita por métodos de pesquisa encontrando sua origem nas
teorias que não tratam os elementos essenciais da experiência de um processo criativo, um
aspecto fundamental das terapias em Artes Criativas.

Musicoterapia: a tradição teórica

Apesar dessa carência, alguns fragmentos teóricos existem no campo da musicoterapia.


Historicamente, essas obras são descobertas em conjunto com o desenvolvimento de programas
de formação na Universidade do Kansas. Como é frequente neste caso, tais questões práticas
como a formação, o desenvolvimento de oportunidades de emprego, e a prática clínica estão
intrinsecamente ligados com a concepção teórica.
Um dos primeiros programas de formação de musicoterapeutas neste país foi estabelecido
na Universidade do Kansas pelo pioneiro E. Thayer Gaston. Seu texto Music in Therapy (1968),
ainda serve como um texto básico para muitos programas de musicoterapia. O texto de Gaston foi
uma das primeiras obras a retratar a musicoterapia como um campo e, assim, ajudou muito a
lançar a musicoterapia como uma profissão.
Este texto pode ser visto como um trabalho altamente paradoxal. O livro é essencialmente
uma antologia de artigos sobre a prática. Gaston tem muito pouco a dizer sobre teoria da
musicoterapia e principalmente abraça a existente teoria científica na forma de behaviorismo.
Feder e Feder comentam:

Apesar do repúdio de Gaston a uma dependência de uma teoria psicológica particular,


um exame dos programas específicos descritos nesta coleção e as pesquisas incluídas,
revelam que operacionalmente, a maioria estão baseadas diretamente em modelos
comportamentais (p.119).

A possível interpretação do trabalho de Gaston é que ele tinha um sentido de movimento


teórico, mas ficou dividido entre sua crença no potencial único da musicoterapia e as pressões
para lançar as bases para a prática clínica responsável e empregos para praticantes da
musicoterapia.
No entanto, as sementes da teoria da musicoterapia estão contidas no texto de Gaston.
Um dos artigos na antologia intitula-se “Process of Music Therapy”. Este artigo foi escrito por
William Sears, colega e sucessor de Gaston na Universidade de Kansas.
No âmbito deste artigo Sears estabelece claramente as raízes teóricas da musicoterapia
em “processo”.

O processo da Musicoterapia

Sears descreve três classificações que fundamentam os processos de Musicoterapia: “1)


experiência dentro da estrutura; 2) experiência na auto organização; 3) experiência na relação
com outros” (Gaston, p.31).
4

No plano teórico, Sears oferece uma abordagem do meio - uma que oferece campos,
condições, relações e auto-organização. Explícito dentro de suas três classificações são auto-
organização e relacões (relativa). Implícito são campos e condições.
Operacionalmente, este projeto/concepção quebra o dilema de construções teóricas versus
pressões para estudos de resultados aceitáveis, na concepção do behaviorismo - mudança
comportamental observável.
Por exemplo, em sua articulação de experiências na auto-organização, Sears lista seus
elementos de auto-organização:
1. Música proporciona a auto expressão;
2. Música proporciona esforços compensatórios para o indivíduo deficiente;
3. Música proporciona oportunidades para recompensa socialmente aceitável e não
recompensa;
4. Música proporciona o reforço do orgulho em si mesmo. (p.33)

Talvez o item mais dramático nesta lista é o item 3. Este item foi o mais prontamente aceito
pelos defensores da pesquisa comportamental e reflete um desenvolvimento significativo na
interface entre o pouco de teoria que este campo teve, a prática clínica e resultados de estudos.
Esta tendência para o behaviorismo parece ser o resultado da necessidade da profissão para
sobreviver e criar estruturas de prestação de contas em um sistema médico da época, geralmente
evitado as teorias estéticas de dimensão de auto-organização interna, desenvolvimento, auto-
suficiência e autonomia.
Além disso a lista de Sears levanta a questão: “auto-expressão” e “socialmente aceitável”
são mutuamente compatíveis? Essa é uma característica do estilo da Sears de ambigüidade e de
paradoxo. Na análise final ele estimula mais questões e envolve o leitor num processo de auto
exame.
Na própria análise final de Sears, ele deve ter tido uma noção das consequências desta
exposições criativas. Isso se reflete nas declarações finais do seu artigo sobre o processo:

uma formulação teórica como esta pode sofrer destinos diversos: pode passar para historia
tendo recebido pouca consideração. Pode ser examinado e considerado em falta, mas porque
o estudo foi necessário, resultam em uma formulação diferente, mais adequada da teoria.
Finalmente, pode ser de bastante interesse e valor e ser posta à prova na prática e nae
pesquisa e ser modificada, melhorada e expandida. Felizmente, o destino último virá a
acontecer. Em qualquer caso, os processos em musicoterapia ocorrem por envolvimento único
(grifo do autor) a experiência individual dentro da estrutura, experiencia na auto-organização e
experiência no relacionamento com os outros (Gaston, p 44).

Para uma teoria da musicoterapia

Logo depois da morte de William Sears, a Universidade de Nova Iorque e o Musicians'


Emergency Fund patrocinou um simpósio internacional sobre musicoterapia, reunindo 36
musicoterapeutas, psicólogos da música e musicistas de vinte países do mundo. Barbara Hesser,
da Universidade de Nova Ioque organizou este simposio e intitulou o encontro: “Music in the Life
of Man: Toward a Theory of Music Therapy3”. Depois de seis dias e noites de estudos em grupo,

3 Música na vida do homem: para uma teoria da musicoterapia.


5

os membros do Simposio emitiram apreciações críticas sobre o sistema operacional do Estado da


Arte para o campo da musicoterapia. Uma das declarações foi:

A musicoterapia facilita o processo criativo de mover em direção à totalidade, desenvolvendo a


capacidade e vontade de utilizar o potencial do indivíduo para o bem-estar em áreas como a
independência, a liberdade de mudar, adaptabilidade, equilíbrio e integração. A implementação
da musicoterapia envolve a interação terapeuta, cliente e música. Estas interações iniciam e
mantem processos de mudanças musicais e não-musicais que podem ou não ser observáveis.
Como os elementos musicais ritmo, melodia e harmonia são elaborados ao longo do tempo, o
terapeuta e o cliente pode desenvolver relações existenciais que otimizam a qualidade de vida.
Acreditamos que a musicoterapia faz uma contribuição única ao bem-estar porque a
capacidade de resposta do homem à música é única. (Proceedings from the International
Symposium on Music in the Life of Man, 1982).

O grupo de Nova Iorque descreveu a musicoterapia com um “processo criativo”, ou mais


especificamente o papel da musicoterapia como processo criativo. Apesar de Sears não ter
descrito seu processo especificamente como “criativo”, a relação entre o processo de Sears e o
grupo de Nova Iorque é evidente. A frase de Sears “experiência dentro da estrutura” é a chave.
Para o musicoterapeuta, a estrutura na música, os “elementos musicais”, de acordo com o grupo
de Nova Iorque, é a luz guia da experiência. A abordagem de Sears está em conformidade com a
declaração do papel da musicoterapia com o grupo do Simposio de Nova Iorque. A declaração do
simpósio também destaca os elementos essenciais de relação e auto-organização. Isto é indicado
na seguinte descrição: "como os elementos musicais ritmo, melodia e harmonia são elaborados
ao longo do tempo, o terapeuta e cliente podem desenvolver relações existenciais que otimizam a
qualidade de vida”.
Dentro da estrutura da experiência musical, as relações entre cliente e terapeuta, as
relações entre som, pensamento e sentimento, etc. Estas relações determinam as “condições” do
campo da experiência, atualizado em musicoterapia como um campo sonoro e da pessoa
humana. As interações, determinadas e definidas através de condições, que são criadas através
dos relacionamentos, podem "iniciar e sustentar processos de mudança musical e não musical ...".
Assim, há implicação de ambas: as condições e os campos.
Musicoterapia, segundo Sears, cria um “envolvimento único”. O grupo de Nova Iorque vai
mais longe e afirma: “Musicoterapia faz uma contribuição única ao bem-estar porque a capacidade
de resposta do homem à música é exclusivo/único”.
William Sears criou uma parte siginificativa do quadro teórico, o que poderia ajudar a
explorar e definir esta singularidade. O grupo de New York, expandiu esses fragmentos para
incluir um projeto arquitetônico ainda mais completo.

Uma abordagem ambiental: o campo de som

Sears introduziu o conceito de ambiente4 e implicado a um campo sonoro.


Nos estágios iniciais deste trabalho, Sears tinha desenvolvido cinco classificações dos
processos antes de refinar essas cinco para os três mencionados acima. Sua formulação original
era: 1) gratificação; 2) experiencia estruturada; 3) ambiente propício para a recuperação; 4)
relações; 5) diagnóstico e evolução”. (p.31)
Nesta articulação anterior, no item três Sears expressa interesse explícito "no campo/
ambiente.
4
Do original em inglês environmental
6

Bonny em alguns dos trabalhos mais atuais usa o termo “presença sonora5” e ”envelope
6
sonoro ” (em conversa particular). Bonny descreve este fenômeno com um
recipiente seguro ou campo sonoro em que as pessoas sentem apoio no processo de cura.
Bonny era, ao mesmo tempo, membro da comunidade de Gaston. Quando se tornou claro
que a Musicoterapia poderia seguir o caminho das ciências do comportamento, Bonny rompeu
com esta corrente de desenvolvimento da Musicoterapia e tomou sua pesquisa na direção da
consciência e da espiritualidade. Os trabalhos mais recentes desenvolvimentos por Bonny
representam seu retorno à medicina e uma integração de seus estudos de consciência no
contexto médico. Sua “presença sonora” é um sistema projetado para hospitais, trazendo-a de
volta a um círculo completo em medicina.
Os termos “presença sonora” e ”envelope sonoro” são similares ao conceito de “ambiente”
de Sears. Música proporciona um campo seguro para mudança, crescimento e recuperação.
Ambos, Sears e Bonny são ambientalistas, neste sentido.
Outros fragmentos da teoria estão disponíveis para dar suporte ao conceito de campo ou
ambiente na literatura da Musicoterapia.
Kenny (1985) oferece uma descrição de “ambiente” no artigo intitulado: “Music: A Whole
Systems Approach”. Seu contexto é a improvisação musical clínica.

O tempo/espaço da improvisação musical é uma síntese de tempo e espaço em que


uma pessoa é naturalmente atraída para dar forma e padrões através da expressão
musical. Existe aleatoriedade e espera e recepção das formas autênticas do movimento
humano, que são ambos espelhados e atualizada através do ritmo, melodia, dinâmica,
etc. A improvisação musical encoraja a pessoa a identificar um modelo ou forma de
organização em que tem significação pessoal e sentido para o improvisador. Dentro da
improvisação, este campo de ser e agir no som, ideias e sentimentos são permitidos
para flutuar livremente até que os padrões profundos naturais emerjam. Desta forma o
musicoterapeuta cria um ambiente, um espaço ritual (1985, p.8).

Em um trabalho anterior, Kenny (1982) implica este mesmo tipo de campo:

Música é um poço de recursos. Ela contem muitas coisas – imagens, padrões(modelos),


sugestões de humor, texturas, sentimentos, processos. Se selecionada e usada com
respeito e sabedoria, os clientes ouvirão o que eles necessitam ouvir na música e usar o
ritual como um contexto de apoio (p.5).

As técnicas de Nordoff/Robbins de improvisação musical são provavelmente, com um


grupo, uma dos mais aceitas formas de Musicoterapia. Embora em seus textos (1965, 1971, 1977)
Nordoff/Robbins concentram-se em descrições da prática, focando na forma musical e ordenação
de princípios, eles tambem, implicam um ambiente:

Música pode tornar-se alguma coisa rara, evocativa ou consoladora. Pode se tornar uma
outra paisagem para ela (a criança em terapia), aquela em que ela será capaz de
encontrar mais do que os limites do seu próprio ser ... torna-se uma paisagem, segura e
fértil de experiência na qual ele se sinte acelerado numa responsta comunicativa - uma
nova corrente emocional começa a fluir, nutrindo, uma nova consciencia do self e da
capacidade expressiva (1967, p.56).

5
Do original em inglês “sound presence”
6
Do original em inglês “envelope of sound”
7

McMaster (1976), um praticante da Nordoff/Robbins, tambem implica um processo criativo


em um meio ou campo seguro. Comentando sobre o seu trabalho com crianças emocionalmente
perturbadas, ela observou que a criança aprende o seguinte em suas experiencias de
improvisação musical: “1) extender experiências passadas seguras, familiares; 2) perceber e
avaliar um momento expressivo; 3) concentrar-se em uma atividade; 4) sustentar uma atividade
agradável.”

Este modelo proporciona um papel fuído para o terapeuta, um quadro que pode incluir
diferentes niveis de participação, um processo criativo e orgânico decorrentes de, e um
desenvolvimento através da natureza mutável da totalidade (p.6).

Sua totalidade representa um campo de experiência na improvisação musical.


Boxill (1985) define seu trabalho através “continuum of awareness”, emprestado da
tradição da Gestalt, mas dentro do “campo sonoro”. Ela descreve isto como um processo criativo
que usa a música funcionalmente como uma ferramenta da consciência para despertar, aumentar
e expandir a consciência do self, outros e o meio (p.71).
Boxill vê o processo de interação com o meio (fisiologicamente e psicologicamente)
começando com sensações. Seu trabalho teórico encontra origem na sua prática com portadores
de deficiência mental. Ela descreve a música como uma “ferramenta da consciência”. Boxill define
música como som tonal estruturado movendo-se no tempo e espaço (p.5).

Organização e auto-organização

Uma ampla porção da literatura tenta descrever a experiência da musicoterapia, pelo


menos, em uma direção teórica, focando na tendência da música em encorajar o sistema humano
a se organizar. Sears, do grupo de Nova Iorque e outros mencionados anteriormente tem
enfatizado a importância da estrutura e auto-organização.
Dada a orientação behaviorista de muitos musicoterapeutas, esta tendência para a
“organização” muitas vezes significa que o terapeuta escolhe música que irá ‘puxar’ o paciente
para um tipo particular de organização que é “saudável”. Música relaxante pode acalmar uma
criança hiperativa. Música estimulante pode ativar um adulto depressivo.
Uma considerável quantidade de pesquisas confirma que o sistema humano faz, na
verdade, é adaptar a entrada de som tanto em níveis físicos como psicológicos, isto é, uma
“presença sonora”, para emprestar o termo de Bonny, faz a mudança na pessoa.
Um exemplo desta pesquisa na literatura da musicoterapia discute a importância do
“rhytmic entrainment”. Depois de descrever seus achados num estudo explorando a relação entre
musicoterapia e aprendizagem, Rider (1985) afirmou categoricamente que “sincronização rítmica
desempenha um papel tão importante na aprendizagem que a sua função não pode ser
subestimada” (p.19). Rider então passa a descrever a possibilidade de combinar as
sincronizações rítmicas do aluno a fim de iniciar uma mudança terapêutica.
Rhythmic entrainment é frequentemente demonstrado no que o musicoterapeuta chama de
princípio de “iso”, termo introduzido por Altshuler, em 1948 em um artigo intitulado: “Uma
experiência psiquiátrica com música como um agente terapêutico7”. O princípio de “iso" instrui o
musicoterapeuta para coincidir o paciente ao nível ritmico, melódico, timbrístico, etc do próprio
paciente. Presume-se que se o paciente vê que o terapeuta está disposto a embarcar com ele, ou
se juntar a ele em suas representações sonoras, essa vontade incentiva o paciente a ser mais

7
Do roiginal em inglês “A Psychiatrist’s Experiences with Music as a therapeutic Agent”.
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aberto para explorar e embarcar com os ritmos do terapeuta, que, idealmente, irá refletir padrões
saudáveis.
O principio de “iso” esta em conformidade com os principios de organização, contudo, é
questionável em termos de “auto-organização”. Esta é uma questão altamente controversa entre
musicoterapeutas e toca em questões de intervençao versus direito para se expressar, ou ainda
mais especificamente, “conformidade versus expressão”.
Como nós temos demonstrado, parece haver um paradoxo fundamental na cultura geral
sobre essa questão em musicoterapia. Sears salienta auto-organização, operacionalmente ainda
configura uma entrada para o reforço positivo para a expressão apenas socialmente aceitável.
Sears ainda afirma: “experiência em auto-organização inquieta respostas interiores que só
podem ser inferidas a partir do comportamento e tem a ver com as atitudes, interesses, valores e
apreciações, de uma pessoa com o seu significado para ela mesma (Gaston, p.39).
Sears falou de “respostas internas”, mas operacionalmente, os pacientes foram
recompensados apenas para “respostas socialmente aceitáveis” na economia simbólica.

O dilema da unicidade

A ironia da obra de William tem a ver com a clareza que ele expressa em termos do
processo criativo, o valor da acomodação da expressão individual ao sistema externo. O campo
da musicoterapia, talvez acomodado um pouco na sua própria singularidade, a fim de estabelecer
uma base de aceitação para a prática. Contudo, neste processo, talvez alguns dos elementos
essenciais da musicoterapia estiveram desvalorizados, num resultado natural de um processo de
consenso. Um destes elementos foi o processo criativo.
O contexto em que para observar e para alterar estas acomodações surge como uma
tendência teórica de organização/auto-organização.
Wheeler, um dos membros do Simpósio de Nova Iorque expressa esse dilema em sua
apresentação para num artigo do simpósio:

parece que, muitas vezes, os musicoterapeutas pesquisadores podem ter


deixado os elementos da individualidade nos assustar ou até mesmo tentar
classificar ou categorizar mas, embora tentativas iniciais possam ser grosseiras,
devemos olhar para as relações e explora-las de forma sistematica."
(Proceedings from the International Symposium on Music in the Life of Man,
1982, Wheeler, p.1).

Wheeler expõe o dilema – o medo da individualidade – a ligação para o sistema de auto-


organização e ainda mais, musicoterapia como um sistema de auto-organização, como a
“comunidade de profissionais”, nas palavras de Kuhn. Wheeler busca os elementos da experiência
em Musicoterapia, constituindo uma aproximação fenomenológica, uma redução eidética. Em sua
propria linguagem teórica, ela identifica três elementos em musicoterapia:

Primeiro é que as pessoas são variáveis; cada pessoa traz seu conjunto de
características para a situação. O segundo elemento é que a música é complexa; uma
música é composto de diferentes melodias, harmonias, ritmos, timbres, dinâmicas, etc.
E terceiro, o processo de terapia significa que, em qualquer momento especifico da
terapia, Certas coisas são exercidas e individuais apenas para aquele momento
(Proceedings from the International Symposium on Music in the Life of Man, 1982,
Wheeler, p.1).
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Resumo

Esta revisão exploratória tem estudado algumas das raízes históricas do movimento
teórico no campo da musicoterapia. Pode não haver uma teoria abrangente e bem fundamentada.
Contudo, há tendências para a teoria, que constituem as sementes para o crescimento teórico
neste campo. Neste estudo são observadas tendências para :

1) considerar a musicoterapia como um processo criativo;


2) imaginar esse processo como um campo;
3) apreciar/avaliar o significado da relação no campo;
4) apreciar/avaliar o poder da organização e auto-organização na experiência musical;
5) considerar as condições no campo.

Se estamos preparados a considerar a musicoterapia como um processo orientado em arte e


ciência, nós podemos assim identificar quatro elementos essencias da experiência em
musicoterapia a partir deste de raízes teóricas. Estes quatro elementos são:
1) condições;
2) campos ou meios;
3) relações;
4) organização/auto-organização.

Talvez o primeiro seja o menos explorado dos elementos. Condições são consideração
importante em qualquer campo. "Quais condições o terapeuta coloca no campo sendo e agindo
(ou por ser e agir) quem ele/ela é no contexto do som?"
Ha muitas outras perguntas sobre o elemento condição. A expressão sonora pode ser
entendida para expressar as condições as quais ajuda a definir o campo. É importante considerar
estas “condições” mesmo antes do inicio da relação terapêutica, uma vez que eles podem
constituir PISTAS não verbais no campo. Que condições trazem o cliente para o campo?
Condições representam pontos fortes e limitações. Condições determinam o que é aceito ou
rejeitado no campo.
Atenção para o “campo” é um outro fator significativo. Isto é a “sound presence” de Bonny
e “envelope of sound”, “environment” de Sears, “resource pool” de Kenny e “landscape” de
Nordoff and Robbins. Isto é o recipiente para a mudança, o contexto de apoio.
Ambos, música e sistema humano são abstratos e sensoriais e ambos são sistemas
relacionais. Eles operam em interação com partes do seu próprio sistema e com muitos outros
sistemas. Isto é um contexto para crescimento e mudança. Portanto, é fundamental olhar para o
aspecto das “relações” criadas na interação entre o homem e a música.
O aspecto da organização é igualmente significativo. Organização é consistentemente um
é tema de preocupação teórica entre musicoterapeutas. A pessoa organiza a música ou a música
organiza a pessoa? Quando e onde cada um é apropriado?

Diálogo

Agora que nós conseguimos descobrir alguns marcos no caminho para a teoria da
musicoterapia, a questão permanece: o que fazemos com estes pedaços de informação?
A primeira tarefa é envolver-se na análise crítica. Seria difícil argumentar o ponto que a
musicoterapia é inerentemente um esforço “criativo”. Nós podemos observar praticantes que
parecem fixos ou sem criatividade. Nós poderiamos, em alguns momentos, nos sentir um pouco
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sem criatividade. Ainda, a criatividade encontra-se profundamente enraizada na natureza do


nosso trabalho.
A análise critica permite-nos manter ativo este movimento criativo. Esta análise pode
assumir a forma de fazer perguntas, especificamente questionar a autoridade. Neste caso, a
autoridade poderia se representada por estas pessoas que tem articulado pedaços de teoria. Nós
podemos concordar com seus conceitos, com sua linguagem? Sua descrições combinam com
nossa experiência única de musicoterapia? Talvez nós possamos concordar com algumas partes
destas formulações e não com outras.
Comparação é uma outra forma de crítica. Onde é que os proprios construtores teóricos
concordam e discordam? Eles não são todos em uma cor, um tom, uma matiz, um pensamento.
Há aqui um vasto espectro de tom e cores.
Uma tarefa que é, as vezes difícil, mas necessária no pensamento crítico é abraçar o
paradoxo, a fim de explorar o rico continuum entre os opostos.
Outra importante questão: o que é minha visão de mundo? Quais são minhas suposições?
Como eu vejo o mundo e assim meu trabalho através dele? Será certamente mais difícil
compartilhar uma teoria com alguem cujas visões de mundo é diamentralmente oposta as nossas.
Estas diferenças tornam-se mais afinadas quando nós entramos na geometria de nossa
experiência. Como nós aproximamos tempo e espaço? Somos orientados para considerações
espaciais ou temporais? Ambas? Um pouco de cada? Quanto de cada uma? Quando e onde? Um
termo idiossincrático tal como “comportamento ordenado pelo tempo” assume uma perspectiva
ampla quando se peneira as camadas de nossa experiência em teoria. Quais são os pontos fortes
e fracos deste tipo de linguagem na “grande imagem”?
Cada um de nós traz a sua teoria em cada situação, em cada sessão de musicoterapia, em
cada classe de técnicas, em cada desenho de pesquisa. As vezes não é necessario articular
nossa teoria. Mas é essencial estar consciente de seu desenvolvimento. Tal consciência não
significa que a teoria está totalmente formada ou compreendida. Significa saber que nossa teoria
esta “em processo”, uma parte viva e crescente em nós, que tem uma influência direta sobre
aqueles vidas que tocamos, especialmente nossos clientes.
Uma ferramenta útil para se engajar neste processo é a tarefa de diálogo.
Há um diálogo entre duas fontes. Uma fonte é a soma total de todos os “outros” que se
envolveram na tarefa de construção da teoria – professores, escritores, pesquisadores, colegas,
etc. A outra fonte é você em sua própria experiência direta em musicoterapia e seu interesse
próprio e único na concepção de uma base para si mesmo. Esta concepção pode comprtailhar um
padrão geral no campo da musicoterapia ou não.
Em ambos os casos, é uma representação da singularidade que é você.
Um bom jeito de engajar neste contato com a fonte do self, na tarefa da contrução teórica é
recordar um movimento particular numa sessão de musicoterapia, com um cliente e mergulhar
em sua memória para a profundidade dessa experiência direta – o encontro direto entre a
música e a pessoa humana, na forma da experiência em musicoterapia. Isto é o seu
conhecimento imediato, sua fonte imediata.
Então quando você sentiu essa memória completa e você sentiu a sua profundidade e
sua força, toque com a intenção de descrever a si mesmo, ou para amigos, ou colegas em uma
linguagem que soe verdadeira a sua experiência. Por meio deste tocar ou improvisar com a
linguagem, o diálogo entre as duas fontes pode começar.
Se nós dermos atenção para este diálogo, cada um de nós e o campo da musicoterapia
como um todo pode beneficiar-se. Alguns resultados possíveis são:
1. você se sentir mais seguro, que você está desenvolvendo uma fundamentação/base para
si mesmo;
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2. o campo da musicoterapia é mais seguro porque os musicoterapeutas estão


desenvolvendo suas formulações únicas, garantindo assim o curso criativo da construção
da teoria;
3. a nossa consciência dos ciclos abstratos voltam-se para a prática. Isto pode aumentar a
compreensão, o que nos permite passar para outro nível da prática. Desta forma, nossos
clientes são atendidos. Isto requer o compromisso de um diálogo constante na
relação entre teoria e prática;
4. o campo da musicoterapia permanece em contato próximo com a experiência direta, não
uma nem duas ou três vezes afastado;
5. nós avançamos na criação de uma nova linguagem para descrever a nossa experiência em
musicoterapia.

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