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METODOLOGIAS PARA

APRENDIZAGEM ATIVA
Ingrid Gayer Pessi
Aprendizagem baseada em
projetos e em problemas
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„ Definir as metodologias pautadas em resolução de problemas e sua


relevância para o contexto social vigente.
„ Identificar os diferentes modos de se elaborar a questão norteadora.
„ Descrever os modos de aplicação das estratégias pedagógicas basea-
das em problemas, projetos e o aprendizado em times, bem como
possibilidades de avaliação.

Introdução
A aprendizagem baseada em projetos e em problemas é uma metodo-
logia que coloca os alunos na posição de investigadores, separando-os
em pequenos grupos, tendo o professor como orientador. Essa moda-
lidade de aprendizagem permite a construção coletiva e colaborativa
do conhecimento.
Neste capítulo, você vai estudar os conceitos e as características prin-
cipais da aprendizagem baseada em projetos e em problemas (ABP), en-
tendendo como o professor pode transformar suas aulas em momentos
de reflexão e de interação, a partir da construção de bons problemas.
Você também conhecerá as estratégias que podem ser utilizadas no
desenvolvimento dessa metodologia e como construir uma avaliação
significativa. Por fim, você aprenderá aspectos importantes do planeja-
mento de projetos e a refletir sobre o uso da ABP na prática educativa.
2 Aprendizagem baseada em projetos e em problemas

Metodologias pautadas em resolução de


problemas
No final da década de 1960, professores da faculdade de Medicina da Uni-
versidade MacMaster, no Canadá, introduziram uma abordagem específica
educacional, com o objetivo de mudar a forma de ensino da medicina, de-
nominada aprendizagem baseada em problemas (ABP). O intuito da equipe
de professores era formar médicos que soubessem aplicar, na prática, todo o
conhecimento obtido de forma teórica. Para tanto, essa proposta era introdu-
zida nos últimos anos do curso, em que os alunos já possuíam conhecimento
teórico suficiente para resolver determinados problemas.
Conhecida como aprendizagem baseada em projetos, aprendizagem ba-
seada em problemas ou aprendizagem por descoberta, a abordagem é sem-
pre a mesma: colocar o aluno em contato com problemas ou situações que
se aproximem de sua realidade, para que possa resolvê-los utilizando seus
conhecimentos.
A maior diferença entre a aprendizagem baseada em projetos e a aprendi-
zagem baseada em problemas está na necessidade de integração das diferentes
áreas do conhecimento, na capacidade de solução da questão em forma de um
produto e na cooperação para resolução da proposta de trabalho.

Na aprendizagem baseada em projetos, o resultado está no produto ou no artefato,


e ela exige maior participação dos alunos, envolvendo-os ao longo de todo o processo
de construção do conhecimento. Já na aprendizagem baseada em problemas, o
foco está na busca pela solução do problema.

A ABP, originalmente denominada project based learning (PBL), representa


uma estratégia de ensino ativa e inovadora, em que o aluno irá construir o
conhecimento de forma coletiva e interdisciplinar, por meio de atividades de
Aprendizagem baseada em projetos e em problemas 3

projeto. Em linhas gerais, a ABP é a solução de um ou mais problemas que


podem se desenvolver durante o ensino de projeto.
Trata-se de uma abordagem pedagógica na qual os estudantes iniciam
sua atividade partindo de um problema que pode ser real ou uma situação
simulada de qualquer área do conhecimento, desde que atenda aos objetivos
de aprendizagem de um curso ou disciplina. É importante considerar que os
problemas são situações contextualizadas e apresentadas pelo professor em
forma de questões, casos e cenários que necessitam de uma solução/resposta
por meio de um processo investigativo realizado pelos discentes.
Apesar de ter sua origem na década de 1960, foi a partir de 1990 que a
ABP passou a ser aplicada nos Estados Unidos. É uma metodologia que tem
ganhado cada vez mais espaço, por ser “[…] um formato de ensino empolgante
e inovador, no qual os alunos selecionam muitos aspectos de sua tarefa e são
motivados por problemas do mundo real que podem, e em muitos casos, irão
contribuir para a sua comunidade” (BENDER, 2014, p. 15).
Diferentes universidades passaram a introduzir a metodologia em seus
cursos de Medicina, inclusive o Brasil, que em 1993, implantou a ABP pela
primeira vez na Escola de Saúde Pública do Ceará. Em seguida, a prática
começou a ser empregada em diferentes universidades e áreas que não fossem
somente da saúde, como administração, pedagogia, engenharias, entre outras.
Analisando o modelo educacional tradicional, baseado demasiadamente
em aulas expositivas e na memorização de conteúdos, entendemos a impor-
tância de repensarmos sobre metodologias inovadoras, que possibilitem maior
participação do aluno em seu processo de aprendizagem.
A ABP entende que o problema é apresentado para ajudar os alunos a
identificarem suas próprias necessidades de aprendizagem, à medida que
tentam entendê-lo, reunir, sintetizar e aplicar informações sobre o problema
e começar a trabalhar efetivamente para aprender com os membros do grupo
e com o tutor (professor). Os fundamentos da aprendizagem baseada em
problemas estão descritos a seguir.

„ Aprendizagem em grupos pequenos: a aprendizagem baseada em


projetos e em problemas ocorre em uma configuração de tutoria, em
grupos de sete a oito alunos. Um aluno é designado para um grupo
tutorial e há um facilitador diferente em cada uma das cinco áreas de
fundamentação. Os tutoriais ocorrem duas vezes por semana.
„ Facilitação por parte dos professores: o tutor procura estabelecer um
equilíbrio entre guiar a conversa do tutorial e solicitar ativamente o
4 Aprendizagem baseada em projetos e em problemas

feedback dos alunos, para garantir que suas lacunas de conhecimento


sejam abordadas e resolvidas.
„ Uso de casos reais: os alunos são apresentados a casos reais durante o
primeiro tutorial da semana. Espera-se que os alunos estudem, inves-
tiguem o caso e apresentem seus resultados durante o segundo tutorial
dessa semana.
„ Objetivos de aprendizagem: simplesmente propor aos alunos um caso
não garante que eles entenderão os conceitos apropriados. Cada caso/
tutorial é fundamentado em um conjunto de objetivos de aprendizagem
definidos, essenciais para garantir que os alunos abordem o conteúdo
correto e identifiquem seus pontos fortes e fracos naquela área em
particular.

Para Bruner (1976), o processo de aprendizagem ocorre a partir da aquisição


e da transformação de uma nova informação, adaptando novas ideias e ava-
liando a aquisição dessa informação. Entendendo o processo de aprendizagem
e considerando os fundamentos da ABP, é importante destacar que, para o
sucesso desse processo e para que o aprendizado realmente aconteça, é neces-
sário o envolvimento do aluno, seu interesse e sua curiosidade em aprender.
Para que esse interesse desperte no aluno, os problemas trazidos para
sala de aula não podem ser rotineiros: devem ser construídos, privilegiando
problemas reais, que desenvolvam as habilidades dos alunos, instiguem a
busca criativa de soluções e o pensamento crítico.
O papel do professor é fundamental, uma vez que ele é o mediador entre o
aluno e o conteúdo a ser estudado (Figura 1), estimulando-o em suas descober-
tas. É ele quem cria as situações de aprendizagem e seu papel na construção
dos problemas é fundamental, uma vez que ao formulá-los, ele precisa fazer
conexões entre a teoria e a prática, buscando as relações entre o que ensina e
as habilidades necessárias aos futuros profissionais, de forma que estimule
os alunos a tomarem suas próprias decisões.
Quando bem aplicada, a ABP pode produzir efeitos positivos na prática
educativa, levando os alunos a interagir com a realidade e a desenvolverem o
senso crítico. Ao analisar as constantes mudanças sociais, é de suma impor-
tância repensar os métodos adotados pelo professor em sala de aula, para que
estes também atendam às necessidades da sociedade.
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Professor

Aluno Conteúdo

Figura 1. Na ABP, o professor é o mediador entre o aluno e


o conteúdo.

Entendendo que a aprendizagem não é um processo passivo, em que um


obrigatoriamente ensina e outro aprende, a ABP coloca professor e aluno como
parceiros na construção do conhecimento. Para Mamede e Penaforte (2001),
a ABP possibilita que o aluno, autodirigindo sua aprendizagem, construa o
conhecimento de forma ativa e colaborativa, aprendendo de forma contextu-
alizada e dando um significado pessoal ao saber.
Nesse sentido, para construir um bom problema, o professor deve pensar
em atrair a atenção e o interesse de seus alunos, a fim de motivá-los a bus-
carem respostas para a questão, não esquecendo que este (o problema) venha
ao encontro dos objetivos da disciplina para que os educandos percebam a
correspondência entre o conteúdo e a proposta apresentada. Outro aspecto
importante é propor um problema desafiante, porém não muito extenso, que
contenha informações claras e contemple os conhecimentos prévios dos alunos
para que tenham interesse em pesquisar e descobrir mais.
6 Aprendizagem baseada em projetos e em problemas

A aprendizagem baseada em projetos e em problemas se diferencia em muitos as-


pectos da problematização. Primeiramente, por quem a executa: enquanto a ABP
envolve todos na gestão educacional, fazendo necessária a preparação do ambiente
educacional, a problematização é uma decisão do professor que não requer grandes
mudanças na estrutura e nos materiais. Trata-se de uma mudança comportamental
do professor e dos estudantes. Na problematização, o indicado é que os estudantes
possam identificar os problemas a partir da primeira fase da metodologia, que é a
observação da realidade, enquanto na ABP usualmente quem introduz o problema
é o professor e os estudantes devem resolvê-lo, pois este problema é elaborado de
acordo com o objetivo da aula/conteúdo ou da disciplina na qual será desenvolvida a
ABP. Em comum, ambas as metodologias oferecem a possibilidade de os estudantes
formularem hipóteses, incluem trabalho em grupo e partem de uma pergunta focal
como padrão para gerar novas informações, mediante processos de análise e de síntese.

Estratégias para o desenvolvimento e


para a avaliação das atividades
A aplicação da ABP em sala de aula requer profunda reflexão sobre o(s)
objetivo(s) que se pretende atingir, para que a partir disso seja elaborada a
questão que norteará a aprendizagem. No desenvolvimento da atividade, o
professor deve estar ciente de que não se trata de mera obtenção de conceitos
por parte dos alunos, mas do desenvolvimento de habilidades cognitivas como
compreensão, raciocínio e estratégia.
Para a aplicação da ABP, Souza e Dourado (2015) apresentam uma estrutura
básica de passos que podem ser adaptados e aplicados em diferentes níveis
de ensino.

„ Elaboração do cenário ou contexto problemático: deve ser de acordo


com o objetivo que se pretende atingir e chamar a atenção do aluno
para que este identifique o tema do objeto de estudo. Além disso, deve
haver relação com o conteúdo, ser funcional e de um tamanho ideal.
Aprendizagem baseada em projetos e em problemas 7

„ Questões-problema: ao receber as questões-problema, os grupos devem


organizar as informações, dividir as tarefas, esclarecer as dúvidas com
o professor/tutor para então decidirem como vão aprofundá-las.
„ Resolução dos problemas: é a fase em que os alunos colocam em
prática todas as ações planejadas anteriormente.
„ Apresentação do resultado e autoavaliação: o grupo deve elaborar
uma síntese com as reflexões e os debates realizados. Todos deverão
apresentar a solução encontrada para o grupo. No final, é importante
que o grupo e que cada aluno realizem uma autoavaliação junto ao
professor, que irá verificar se o objetivo foi ou não atingido, realizando,
assim, a avaliação da aprendizagem.

A construção de conhecimentos por meio da ABP se caracteriza não só


por ser uma oportunidade rica e significativa para que o aluno confronte suas
ideias com as de outros colegas, mas também propicia uma visão concreta e
prática do aprendizado.
Ao trabalhar em grupo, os alunos percebem a importância da troca de
saberes e da colaboração, apoiam-se mutuamente, significando a importância
de atingirem os objetivos que lhes são comuns, acordados pelo coletivo, o que,
por sua vez, exige o estabelecimento de relações que prezem pela liderança
compartilhada, pela confiança mútua e a corresponsabilidade para a condução
das tarefas.
A aprendizagem em grupo na ABP se configura como uma estratégia de
ensino na qual os sujeitos, de diferentes níveis de desempenho, trabalham
juntos e em pequenos grupos a fim de atingir uma meta — a partir da qual
entram em expressiva e significativa interatividade.
Uma das mais importantes mudanças que acontecem na prática docente
da ABP começa pela concepção que se tem de avaliação, uma vez que esta
deve vir carregada de significados e não ser apenas uma forma de mensurar
quantitativamente o quanto o aluno sabe ou não.
A ABP permite o feedback imediato para que o professor avalie o progresso
da aprendizagem dos alunos, obtendo pistas da assimilação do conteúdo e
das possíveis dificuldades encontradas. Já para o aluno, é a oportunidade de
refletir, em tempo real, sobre as estratégias utilizadas e avaliar o caminho
que percorreu.
Ao receber o feedback imediato, o aluno desmistifica a ideia negativa que
se tem do erro na aprendizagem, uma vez que o percebe como parte natural
do processo e isso o leva a experimentar diferentes formas de pensar.
8 Aprendizagem baseada em projetos e em problemas

Como elaborar questões norteadoras


Ao planejar a questão norteadora, o professor deve privilegiar para que a
avaliação ocorra durante todo o processo e na sua aplicação, estando atento
às impressões dos alunos.
Na elaboração de uma questão norteadora, deve-se considerar que:

„ as questões devem ser provocativas, ir além de superficialidades, ins-


tigando e despertando o interesse dos alunos;
„ devem ir além da obtenção por respostas fáceis, levando os alunos a um
pensamento superior, exigindo que eles integrem, sintetizem e avaliem
criticamente as informações;
„ não podem privilegiar apenas uma disciplina ou tópico; é importante
que promovam conexões e quando possível, a interdisciplinaridade;
„ podem surgir a partir de dilemas da vida real dos alunos e responder
às suas dúvidas ou curiosidades;
„ não se detenham a responder “o que é isso?” ou “quais são?”, mas sim,
“por que isso acontece?” ou “como isso acontece?”.

Além dessas dicas, é importante que o professor tenha claro seu objetivo
e evite “armadilhas”, pois a questão norteadora deve promover a reflexão por
parte dos alunos.
Isso o possibilitará a melhora de possíveis futuros aspectos que acabaram não
funcionando em determinada atividade. A avaliação contínua permite uma me-
lhor reflexão sobre as relações entre professor e aluno, professor e conhecimento,
estudante e estudante, estudante e conhecimento (SOUZA; DOURADO, 2015).
A avaliação se caracteriza como um dos maiores desafios da ABP, uma
vez que as instituições escolares ainda privilegiam avaliações formais. Nesta
metodologia, a avaliação acontece de forma contínua e exige cuidados por parte
do professor, uma vez que é baseada na observação direta, nos argumentos e
nos registros realizados pelos alunos.
O professor deve pensar em uma forma de avaliar por meio da APB, so-
licitando um produto final da solução encontrada pelo grupo, podendo ser:

„ uma apresentação de slides;


„ a produção de um artigo científico;
„ um relatório escrito;
„ qualquer outra produção que evidencie a construção significativa do
conhecimento.
Aprendizagem baseada em projetos e em problemas 9

É preciso ter em mente que a ABP possibilita a integração de conhecimentos,


uma vez que considera o conhecimento prévio do aluno para a construção
de novos conhecimentos. Nesse sentido, é importante valorizar aquilo que
o aluno já sabe, planejando questões que instiguem sua curiosidade e seu
pensamento crítico.

A ABP pode ser implementada em um ambiente on-line, sem alterar sua filosofia
fundamental. A riqueza de mídias que podem ser utilizadas no ambiente on-line
acaba fundamentando a experiência. Apesar da curva de aprendizado ser íngreme, o
treinamento e o planejamento podem ajudar estudantes e tutores a se adaptarem e a
desenvolverem a alfabetização on-line para se utilizar a ABP em educação a distância.
Apesar de seus desafios, a ABP on-line tem potencial para apoiar a aquisição e a
aplicação de novos conhecimentos em diversos contextos, além de criar a possibilidade
de aprendizagem interdisciplinar.

A aprendizagem baseada em projetos e em


problemas na prática
A aprendizagem baseada em projetos e em problemas não tem como objetivo
a mera transmissão e a aquisição de conteúdos, mas é caracterizada pela
articulação entre teoria e prática, com a intenção de apresentar ao aluno um
problema ou uma situação próxima da realidade, que resulte em uma solução e
leve o aprendiz a tomar consciência da sua participação efetiva nesse processo.
A aprendizagem baseada em projetos desenvolve nos educandos o senso de
responsabilidade, amplia seus conhecimentos e desperta a atenção às diferenças
individuais. Os resultados obtidos refletem a coletividade, favorecendo futuras
discussões e o intercâmbio de ideias, permitindo uma comunicação direta em
que todos percebam os problemas e as dificuldades durante a atividade. Esta
interação possibilita o desenvolvimento de lideranças, o compartilhamento de
expectativas, dificuldades e metas, promovendo o sentimento de coleguismo
e, principalmente, de aprendizagem colaborativa.
Segundo Bender (2014), para se conceber o planejamento dos projetos de
ABP são necessários alguns componentes essenciais, conforme descrito no
Quadro 1.
10 Aprendizagem baseada em projetos e em problemas

Quadro 1. Planejamento de projetos na ABP

Âncora do projeto Simples narrativas que descrevam o problema,


podendo ser algo mais envolvente e que desperte
o interesse dos alunos. É imprescindível que ela
descreva um projeto real para os alunos.

Questão motriz Em conjunto com a âncora, a questão motriz


deve tanto motivar os alunos quanto ajudá-los a
delinear parâmetros que orientem seu trabalho.

Voz e escolha O professor deve envolver os alunos na escolha do


dos alunos projeto, considerando não apenas os tipos de escolhas
de ABP significativas para eles, mas principalmente qual
delas tem maior possibilidade de funcionar para eles.

Processos Apenas algumas atividades e alguns processos de


específicos para aprendizagem devem ser estipulados pela tarefa
investigação inicial, proporcionando experiências autênticas para
e pesquisa que os grupos possam resolver o problema.

Investigação O professor deve usar meios que estimulem a investigação


e inovação e o pensamento inovador dos alunos durante o
dos alunos processo de planejamento, pesquisa e desenvolvimento
das atividades, por exercer o papel de facilitador.

Cooperação Ajudar os alunos a trabalharem juntos na


e trabalho resolução de um problema, desempenhando
em equipe diferentes papéis e se ajudando mutuamente.
É uma das principais contribuições da ABP.

Oportunidades Estimulando e levando o aluno a usar o pensamento


para a reflexão reflexivo, ele é capaz de encontrar soluções para
o problema de forma criativa e inovadora.

Feedback e revisão Quando o aluno recebe o feedback constante


dos caminhos percorridos em cada etapa e tem
a oportunidade de revisar seu trabalho, ele se
sente mais motivado durante o processo.

Apresentações O professor pode dar como alternativa para os


públicas dos alunos publicarem os resultados do projeto em
resultados dos formato de vídeos, relatórios, websites, apresentação
projetos de slides, entre outros, a fim de divulgar para
outras pessoas as soluções encontradas.

Fonte: Adaptado de Bender (2014).


Aprendizagem baseada em projetos e em problemas 11

Analisando o Quadro 1, temos uma visão geral de como a ABP pode con-
tribuir para a formação de um aluno com habilidades necessárias para atuar
em nossa atual sociedade por meio da comunicação, do raciocínio lógico, do
desenvolvimento da criatividade e do pensamento inovador.
A seguir, podemos analisar uma sequência didática de aplicação da me-
todologia da ABP.

a) O professor seleciona um problema, caso, cenário ou uma situação a


partir das necessidades do conteúdo trabalhado.
b) Os estudantes realizam pesquisas ou a coleta de informações, indi-
vidualmente ou em grupo, ou seja, passam a investigar o assunto/
solução conforme as especificidades de cada situação, com o intuito
de desvendar ou resolver o problema que receberam.
c) Para que os estudantes consigam solucionar o problema elencado, o pro-
fessor pode indicar as fontes ou autores de base para a investigação, mas
nesta forma de trabalho também é possível utilizar outras referências
como parte do processo de busca e de qualificação da resposta/solução.
d) O professor deve indicar a forma de apresentação da resolução do
problema, bem como critérios para sua solução, como a capacidade
de execução, a viabilidade, entre outros.

Para enriquecer sua proposta, o professor pode organizar o projeto fazendo


uso das tecnologias disponíveis para o ensino. Quando bem utilizadas, estas
aumentam a eficácia da aprendizagem e o envolvimento dos alunos na ativi-
dade, abrindo oportunidade para integrar, enriquecer e expandir os materiais
educacionais, apresentando novas maneiras de interação. É importante utilizar
tecnologias nas metodologias adotadas pelo professor, pois ao mesmo tempo
em que inovam a prática docente, elas também vão ao encontro da realidade
dos alunos.
Quando aplicadas à ABP, as tecnologias se tornam ferramentas que pro-
porcionam possibilidades de aprendizagem que colaboram para o professor
estreitar laços de fala e interação com os educandos. É possível planejar
atividades que utilizem a internet, softwares, celulares, câmeras fotográficas
e de vídeo, quadros interativos, aplicativos, jogos digitais, entre outros.
12 Aprendizagem baseada em projetos e em problemas

Para conhecer um pouco mais sobre o uso de recursos tecnológicos na ABP, leia o
artigo “Aprendizagem baseada em projetos: contribuições das tecnologias digitais”,
que traz importantes reflexões sobre as possibilidades e os desafios para a prática
educativa, disponível no link a seguir.

https://qrgo.page.link/gp3Yd

Tipos de projetos da ABP


Como mencionado anteriormente, o planejamento de um projeto deve vir ao
encontro da necessidade de se possibilitar uma aprendizagem significativa,
contemplando problemas contextualizados, que levem o aluno a fazer uso
do pensamento reflexivo e crítico. Moura (1993) apresenta três categorias de
projetos que podem ser adotadas no planejamento da ABP.

„ Projeto construtivo: tem o objetivo de construir algo novo, inovador


ou uma nova solução para um problema.
„ Projeto investigativo: adotando o método científico, o aluno utiliza
da pesquisa em diversas fontes para encontrar a solução do problema.
„ Projeto didático ou explicativo: com base nas questões: “Como?” e
“Para quê?”, explica a funcionalidade do objeto de estudo.

A ABP pode ser planejada por um ou mais professores, contemplando


diferentes disciplinas. O importante é que, em seu planejamento, o professor
privilegie oportunidades de interação e de interiorização dos conhecimentos
produzidos pelos alunos.

Para entender melhor como a ABP pode ser usada na prática pedagógica, vamos
imaginar que o professor, após ter trabalhado o conteúdo de alimentação saudável,
lança o seguinte desafio: como conscientizar as pessoas sobre a importância de uma
alimentação saudável? Pode ser que um grupo crie uma campanha com panfletos
Aprendizagem baseada em projetos e em problemas 13

e cartazes que informem os benefícios dos alimentos funcionais; outro grupo pode
criar um aplicativo com receitas saudáveis; enquanto o outro pode entrevistar um
nutricionista para aprofundar a questão. Portanto, na ABP não há um único caminho
para encontrar a solução de um problema: a aprendizagem é construída a partir da
curiosidade, da criatividade e da autonomia.

BENDER, W. N. Aprendizagem baseada em projetos: educação diferenciada para o século


XXI. Porto Alegre: Penso, 2014. 156 p.
BRUNER, J. S. Uma nova teoria de aprendizagem. 4. ed. Rio de Janeiro: Bloch, 1976. 162 p.
MAMEDE, S.; PENAFORTE, J. C. Aprendizagem baseada em problemas: características,
processos e racionalidade. In: MAMEDE, S.; PENAFORTE, J. C. (org.). Aprendizagem
baseada em problemas; anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza:
Hucitec, 2001. p. 27–48.
MOURA, D. G. A dimensão lúdica no ensino de ciências: atividades práticas como elemento
de realização lúdica. 1993. 311 f. Orientador: Ernst Wolfgang Hamburger. Tese (Doutorado
em Educação) — Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1993.
SOUZA, S. C.; DOURADO, L. Aprendizagem baseada em problemas (ABP): um método
de aprendizagem inovador para o ensino educativo. Holos, Natal, v. 5, p. 182–200, 2015.
Disponível em: http://www2.ifrn.edu.br/ojs/index.php/HOLOS/article/view/2880/.
Acesso em: 8 maio 2019.

Leituras recomendadas
BACICH, L.; MORAN, J. (org.). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma
abordagem teórico-prática. São Paulo: Penso, 2018. 260 p. (Série Desafios da Educação).
BERBEL, N. A. N. A problematização e a aprendizagem baseada em problemas: dife-
rentes termos ou diferentes caminhos? Interface — Comunicação, Saúde, Educação,
Botucatu, v. 2, n. 2, p. 139–154, fev. 1998. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_abstract&pid=S1414-32831998000100008&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt.
Acesso em: 8 maio 2019.
BUCK INSTITUTE FOR EDUCATION. Aprendizagem baseada em projetos: guia para pro-
fessores de ensino fundamental e médio. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. 200 p.
14 Aprendizagem baseada em projetos e em problemas

CYRINO, E. G.; TORALLES-PEREIRA, M. L. Trabalhando com estratégias de ensino-apren-


dizado por descoberta na área da saúde: a problematização e a aprendizagem baseada
em problemas. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n. 3, p. 780–788, maio/jun.
2004. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S0102-
-311X2004000300015&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 8 maio 2019.
PAULA, F. B. R. Da “Aprendizagem Baseada em Problemas” à “Aprendizagem Baseada em
Projetos”: estratégias metodológicas para o ensino de projeto nos cursos de Design à luz
dos paradigmas contemporâneos. Actas de Diseño, Buenos Aires, v. 9, n. 17, p. 142–146,
jul. 2014. Disponível em: https://fido.palermo.edu/servicios_dyc/publicacionesdc/
vista/detalle_articulo.php?id_libro=485&id_articulo=10252. Acesso em: 8 maio 2019.
METODOLOGIAS PARA
APRENDIZAGEM
ATIVA

Pablo Rodrigo Bes


Blended learning:
educação híbrida e sala
de aula invertida
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Explicar o modelo híbrido de educação, enfatizando algumas expe-


riências no Brasil e no mundo.
„„ Identificar os diferentes modelos de aplicação da educação híbrida,
enfatizando a sala de aula invertida (flipped classroom).
„„ Descrever diferentes instrumentos avaliativos e seus critérios, aten-
tando para as especificidades do trabalho pedagógico com os prin-
cipais modelos híbridos.

Introdução
As formas de viver em sociedade se reconfiguraram nas últimas déca-
das, nas áreas econômicas, políticas e sociais, principalmente devido ao
processo de globalização iniciado a partir da década de 1990 no Brasil
e no mundo. Estas mudanças que, a princípio, tinham como objetivo
promover maiores condições de desenvolvimento econômico para as
nações capitalistas por sua fusão em blocos, acabaram sendo impul-
sionadas pelo avanço das tecnologias de informação e comunicação,
modificando aspectos importantes da vida social, como as questões
educacionais que iremos estudar. Dessa forma, a aprendizagem nos
dias de hoje possui múltiplos formatos, o que torna esse processo ainda
mais rico se comparado com as antigas concepções didáticas. Nestas, o
professor agia como figura central, valendo-se de seu status de detentor
do conhecimento para cumprir com sua atribuição de ensinar. Com a
possibilidade de estudo pela internet, como os métodos de educação à
distância, a aprendizagem se tornou híbrida, podendo o professor utilizar
2 Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida

técnicas que aliem esta a atividades presenciais para promover melhores


resultados com seus alunos.
Neste capítulo, você irá aprender sobre os modelos híbridos de
educação, procurando conhecer alguns casos de sucesso no Brasil e
no mundo. Você também conhecerá modelos de educação híbrida,
entre eles, a sala de aula invertida. Além disso, você irá aprender sobre o
processo de avaliação, seus critérios e seus instrumentos mais utilizados
na educação híbrida.

O modelo híbrido de educação


Para que possamos entender o que significa um modelo híbrido de educação,
também conhecido internacionalmente como blended learning, podemos
partir de um entendimento do significado da expressão híbrido. Quando
nos referimos a algo híbrido, entendemos que este passou por um processo
de mistura entre os fatores que o constituem. Dessa forma, quando falamos
em aprendizagem híbrida, devemos entender que esta é composta tanto por
métodos e técnicas didáticas típicas do ensino presencial (off-line) quanto pelo
ensino à distância (on-line). No Brasil, ainda estamos mais familiarizados com
os modelos educacionais de ensino presencial, em que o professor articula
seus alunos a partir dos recursos existentes em sala de aula para que possam
aprender aquilo que se encontra como objetivo em seus planos. Portanto, para
aqueles que ainda não conheça o ensino à distância, é importante entender
algumas características que o constituem para que o conceito de hibridismo
entre ambas as práticas de ensino fique mais claro.
Segundo Moore e Kearsley (2007, p. 2) a educação a distância é como “[...]
o aprendizado planejado que ocorre normalmente em um lugar diferente do
lugar do ensino, exigindo técnicas especiais de criação do curso e de instrução,
comunicação por meio de várias tecnologias e disposições organizacionais e
administrativas especiais”. Para que a educação à distância possa ocorrer, faz-se
necessário que existam tecnologias digitais, o que normalmente é ofertado aos
alunos a partir de plataformas denominadas ambientes virtuais de aprendiza-
gem. Na atualidade, podemos aprender sobre múltiplos assuntos a partir da
internet. Você já teve a oportunidade de aprofundar seu conhecimento sobre
um assunto de seu interesse por intermédio de mídias digitais? Já percebeu
que existem inúmeros cursos on-line ofertados quando você utiliza a internet?
Horn e Staker (2015, documento on-line) associam o início do ensino
híbrido ao ensino on-line, destacando que “quando surgiu, o ensino on-line, de
Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida 3

modo previsível, tinha a reputação de ser uma alternativa secundária e barata


para a sala de aula presencial tradicional.” Segundo os autores, quando passou
a ser utilizado na educação básica norte-americana, o ensino on-line teve pouco
efeito, sendo utilizado somente para recuperações de aulas ou disciplinas que
alguns alunos não tivessem entendido plenamente. No entanto, ainda segundo
os autores, com o avanço nas tecnologias e inovações disruptivas, o ensino
on-line passou inclusive a substituir o ensino presencial em alguns casos. Um
ponto importante a ser destacado é que a educação híbrida pode ser ofertada
em qualquer etapa educacional, tanto na educação básica (educação infantil,
ensino fundamental e ensino médio) quanto no ensino superior, proporcionando
aos alunos uma aprendizagem mais personalizada a partir deste ensino.

Inovação disruptiva é um termo criado pelo professor Clayton M. Christensen, da


Universidade de Harvard, que se refere ao fenômeno pelo qual uma inovação trans-
forma um mercado ou setor existente ao introduzir a simplicidade, a conveniência e
a acessibilidade aos seus usuários.

No Brasil, alternativas de ensino on-line têm sido discutidas para a educação


básica pública, já sendo amplamente utilizadas em escolas privadas como apoio
à aprendizagem dos alunos. Existem boas iniciativas por parte de organiza-
ções do terceiro setor que procuram implementar cursos de capacitação de
professores na rede pública brasileira para que suas escolas possam estruturar
suas plataformas virtuais e que os alunos conheçam a educação híbrida. Uma
destas organizações é a Fundação Lemann e um exemplo de escolas que se
utilizam deste suporte para educação híbrida são os Ginásios Experimentais
Cariocas. Estes ginásios são escolas públicas que possuem uma plataforma de
ensino híbrido e que conseguiram, com o uso destas tecnologias educacionais,
promover uma melhoria significativa em resultados na aprendizagem de alunos
do 6º ao 9º ano do ensino fundamental.
No ensino superior, já encontramos práticas bem consolidadas de utili-
zação de estratégias educacionais on-line, tanto no ensino presencial quanto
na educação à distância. Um bom exemplo dessas experiências é o Centro
Universitário Uniamérica, instituição educacional comunitária sem fins lucra-
tivos, localizada em Foz do Iguaçu (PR). Essa instituição de ensino superior
4 Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida

tem aplicado muitos elementos do ensino híbrido em seus cursos presenciais


de graduação e pós-graduação, valendo-se de metodologias ativas e do ensino
on-line para enriquecer o aprendizado de seus acadêmicos. Outra instituição
de ensino superior de destaque na busca pela implementação da educação
híbrida em seus cursos de graduação e pós-graduação, incluindo mestrado
e doutorado, é a PUC–PR, que tem proporcionado a seus alunos uma apren-
dizagem enriquecida por meio de inúmeras propostas de customização das
aprendizagens via modelos híbridos postos em prática pelos professores. No
ensino à distância de Engenharia, destaca-se a Unicesumar, atualmente um dos
maiores grupos educacionais brasileiros. No âmbito da educação profissional
também percebemos, no Brasil, o crescimento e a proliferação de cursos com
a possibilidade de ser realizados on-line ou, ainda, em modelos híbridos que
associam períodos presenciais e virtuais em sua carga horária.
Ertl, Winkler e Mandl (2007, p. 132) observam que a “blended learning é
baseada na integração entre fases virtuais e fases presenciais”, sendo a inte-
gração entre o e-learning e a aprendizagem presencial ( face-to-face) muito
benéfica para que os programas híbridos tenham resultados mais eficazes.
Podemos considerar a educação híbrida como representada na Figura 1.

Presencial + Ensino
on-line = Ensino
híbrido

Figura 1. Educação híbrida (blended learning).

Podemos perceber os ganhos de resultados com o ensino híbrido a partir


dos inúmeros cursos de aperfeiçoamento corporativos (treinamentos e capa-
citações) propostos por organizações que se valem de programas estruturados
de ensino que mesclam cargas horárias em plataformas on-line com encontros
periódicos para promover a troca de experiências, interações e aprendizagens
complementares entre os aprendizes. Porém, utilizar o ensino híbrido é muito
mais do que equipar uma sala com equipamentos eletrônicos, como compu-
tadores e outros dispositivos, ou simplesmente adotar uma combinação de
ensino on-line com o ensino presencial.
Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida 5

Para que você possa aprender melhor a respeito do ensino híbrido, vamos
observar algumas de suas principais características, segundo Horn e Staker
(2015):

„„ o programa educacional é formal;


„„ parcialmente on-line;
„„ há um controle sob as atividades;
„„ o local físico é supervisionado;
„„ a aprendizagem é integrada.

O ensino híbrido deve fazer parte de um programa de educação formal,


o que o diferencia de qualquer outro tipo de aprendizagem que possa vir a
ser utilizada simplesmente via internet. Dentro desse programa educacional,
uma de suas partes necessariamente ocorrerá on-line para o aluno. Da mesma
forma, este aluno deverá ter algum mecanismo de controle sobre o seu apren-
dizado, o que envolve poder estudar no seu ritmo, em horários programados
e adequados a sua rotina diária.
A existência de um local físico supervisionado, onde os alunos possam
complementar o curso, é parte fundamental do ensino híbrido. Este local
deve ficar longe da casa do aluno, podendo ser uma escola em seu bairro ou
outro espaço formal que apresente uma estrutura física montada para esta
finalidade. Logo, podemos descartar algumas hipóteses que não se enquadram
neste aspecto: por exemplo, o caso de uma pessoa que estuda sozinha com seu
smartphone em um shopping não é considerado ensino híbrido.
A característica mais marcante do ensino híbrido é a que se refere a uma
experiência integrada. Dessa forma, “as modalidades ao longo do caminho de
aprendizagem de cada aluno em um curso ou uma matéria estão conectadas
para fornecer uma experiência de aprendizagem integrada” (HORN; STAKER,
2015). Ou seja, o ensino híbrido irá propor ao aluno que ele busque comple-
mentar o que vem aprendendo a partir das etapas que cursa presencialmente
e on-line, o que é diferente de acessar tópicos de conteúdo on-line indicados
pelo professor e, após isso, em sala de aula, estudar tais assuntos novamente.
Um exemplo internacional de sucesso com a aplicação do blended learning
são as Summit Public Schools, nos Estados Unidos, que se trata de uma rede
pública de escolas que possuem gestão privada e que utilizam plataformas
adaptativas de educação híbrida para alunos do ensino fundamental. Nestas
escolas, o aluno é protagonista e responsável por traçar suas trajetórias de
estudo on-line, que são reforçadas e postas em prática nos mais diversos
projetos em que se engaja no ensino presencial.
6 Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida

Sobre o ensino híbrido, podemos afirmar que este somente agrega àqueles
que estão interessados em aprender, rompendo com os antigos paradigmas
educacionais em que todos devem aprender os mesmos conteúdos, no mesmo
ritmo.

Uma das mudanças mais significativas a partir da educação híbrida é o fato de que a
aprendizagem pode ser adaptada à necessidade e ao nível de entendimento de cada
aluno, com o uso de programas computacionais em ambiente virtual.
A aprendizagem adaptativa rompe com a ideia de ensino universal, em que tanto
os conteúdos quanto os processos avaliativos ocorrem da mesma forma. Porém, cabe
aos professores se atualizar sobre estas possibilidades de ensino híbrido e fazer bom
uso delas.

Modelos de aplicação da educação híbrida


É fato que a educação está mudando, acompanhando as tendências mundiais
nas áreas de tecnologia da informação e comunicações digitais. Morán (2015,
p. 15), ao pesquisar sobre os processos de inovação voltados para a área edu-
cacional, comenta que “a educação formal está num impasse diante de tantas
mudanças na sociedade: como evoluir para tornar-se relevante e conseguir que
todos aprendam de forma competente a conhecer, a construir seus projetos de
vida e a conviver com os demais”. Essa evolução pode ser conquistada a partir
do ensino híbrido, como visto no tópico anterior, o que proporciona inúmeros
modelos que podem ser adaptados à cultura de cada organização em busca de
seus objetivos educacionais.
O blended learning ainda se encontra em fase de expansão e pode suscitar
algumas dúvidas nas instituições que se valem deste para conduzir e per-
sonalizar seus processos de ensino. Para que possa realizar essa tarefa com
eficiência, a instituição de ensino deverá conhecer e selecionar os modelos
de educação híbrida que serão aplicados. Vamos conhecê-los na Figura 2 e
detalhá-los a seguir.
Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida 7

4. Modelo
1. Modelo 3. Modelo à la
2. Modelo flex virtual
de rotação carte enriquecido

Rotação por
estações

Laboratório
rotacional

Sala de aula
invertida

Rotação
individual

Figura 2. Modelos de educação híbrida.

Modelo de rotação
O modelo de rotação é aquele utilizado em qualquer curso ou disciplina em que
o aluno costuma alternar entre as modalidades de aprendizagem presenciais e
on-line, o que podem fazer a partir de uma sequência fixa ou por outros critérios
criados pelo professor. Dentro deste modelo, temos a possibilidade de realizar
a rotação por estações, por laboratório funcional, pela rotação individual e
pela sala de aula invertida. Estas modalidades podem prever ações coletivas
ou individuais, de acordo com a técnica utilizada. Por exemplo, a rotação por
estações costuma se valer de grupos que realizam o rodízio entre as estações
em que terão que realizar atividades práticas a partir dos conhecimentos prévios
adquiridos on-line. Dessa forma, em cada estação será exigido um desafio,
uma solução de problema ou a execução de algum processo criativo pelo
grupo. Convém destacar que uma destas estações poderá disponibilizar ações
realizadas on-line pelo grupo. A rotação individual segue esta mesma ideia,
mas por ser realizada individualmente, fornecendo melhores subsídios sobre
o nível de aprendizagem de cada aluno. O laboratório rotacional usualmente
se vale dos laboratórios de informática ou outros existentes nas instituições
de ensino para que sejam realizadas atividades práticas e on-line dentro da
escola, alternando entre outros momentos de aprendizado propostos pelos
8 Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida

professores. O funcionamento da sala de aula invertida, o modelo de rotação


mais utilizado na atualidade, será detalhado em seguida.

Modelo flex
O modelo flex é aquele em que “o ensino on-line é a espinha dorsal do processo
de aprendizagem do aluno, mesmo que às vezes o direcione os alunos para
atividades presenciais” (HORN; STAKER, 2015, documento sem paginação).
O que caracteriza sua flexibilidade é a possibilidade de o aluno se movimentar
dentro do curso que realiza, de acordo com as necessidades de aprendizagem
que podem vir a surgir durante o curso ou a disciplina abordada. Essa mo-
dalidade costuma apresentar bons resultados para programas de recuperação
de estudos de disciplinas da educação básica.

Modelo à la carte
O modelo à la carte, como o próprio nome sugere, é aquele em que o aluno
tem a possibilidade de realizar um curso ou uma disciplina de sua matriz
curricular de forma completamente on-line, desde que frequente uma escola
física tradicional. Embora este modelo seja amplamente utilizado no ensino
médio nos Estados Unidos, percebemos que no Brasil é mais aplicado ao ensino
superior, em cursos presenciais que disponibilizam esta opção aos seus alunos.

Modelo virtual enriquecido


O modelo virtual enriquecido, por sua vez, é aquele utilizado em cursos que
oferecem sessões presenciais de aprendizagem, que serão complementadas
pelos alunos em períodos posteriores de forma on-line. Por exemplo, o aluno
estuda na escola física nas segundas e nas quartas-feiras e realiza atividades
on-line nas terças, quintas e sextas-feiras. Dessa forma, os alunos e o professor
não se encontram diariamente.

Sala de aula invertida (flipped classroom)


Dentre os modelos de rotação da educação híbrida, a sala de aula invertida
é a mais utilizada e conhecida ou, ao menos, a que possui maior destaque
nas mídias quando o tema é abordado. A sala de aula invertida recebe este
nome por inverter questões que normalmente ocorreriam em uma sala de aula
Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida 9

tradicional presencial. Dessa forma, os alunos terão acesso ao ensino e aos


conteúdos de forma on-line, em suas casas, e se encontrarão na escola para
realizarem práticas e projetos orientados pelo professor sobre os assuntos já
estudados. Perceba que, ao invés de realizarem lições de casa que reforçariam
seu aprendizado, os alunos têm como foco principal o ensino em seus lares e
as lições são feitas em sala de aula com o professor. Esta inversão é ilustrada
pela Figura 3.

Figura 3. Sala de aula invertida.


Fonte: Horn e Staker (2015, documento sem paginação).

Ao comentar sobre a sala de aula invertida, Morán (2015, p. 22) destaca


que “um dos modelos mais interessantes de ensinar hoje é o de concentrar
no ambiente virtual o que é informação básica e deixar para a sala de aula as
atividades mais criativas e supervisionadas”. Esta parece ser uma ótima saída
para grupos de alunos que apresentam desinteresse e desmotivação em relação
às aulas realizadas de forma tradicional, na qual os conteúdos costumam ser
repassados em aula, tomando quase que o tempo total da disciplina e costumam
apresentar, mesmo quando metodologias criativas são utilizadas, um espaço
menor para atividades de criação por parte dos alunos.
10 Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida

Este talvez seja o maior ganho do professor ao trabalhar com a sala de aula
invertida. Ele pode se valer de metodologias ativas para enriquecer o período
presencial com os alunos, o que pode ser feito a partir de desafios, situações
problema, cases, jogos, situações práticas do tipo aprender fazendo, entre
outras que se encaixem com os objetivos de aprendizagem. Outro aspecto
a destacar é que os encontros presenciais poderão alternar entre atividades
individuais e atividades coletivas ou em grupos que favoreçam a troca de
conhecimentos e a interação.
Segundo Bacich e Morán (2015, p. 46), a sala de aula invertida pode ainda
ser aprimorada a partir de práticas que se envolvam “[...] a descoberta, a
experimentação, como proposta inicial para os alunos, ou seja, oferecer pos-
sibilidades de interação com o fenômeno antes do estudo da teoria”. Partindo
desta observação dos autores, acompanhe o exemplo a seguir.

Imagine que você é professor do 5° ano do ensino fundamental e que sua escola
possui um sistema híbrido de educação. Você deverá começar a desenvolver com
seus alunos os conteúdos relativos à diversidade étnica e cultural que compõe a
nossa sociedade. Estes alunos, ao realizarem em suas casas a aproximação inicial
com o conteúdo, serão desafiados a utilizar um aplicativo disponível na plataforma
da escola, com o qual deverão construir um avatar que represente suas características
físicas e, no encontro presencial, deverão socializar com os colegas. Essa atividade,
além de sensibilizar a todos sobre as diferenças e as aproximações entre as pessoas
que compõe nossa sociedade, também promove o interesse dos alunos a partir da
utilização de uma linguagem digital, que costuma ser comum a eles, pois a criação
de avatars faz parte de muitos dos jogos com os quais os alunos estão familiarizados.

Ao utilizar um modelo de ensino híbrido, a instituição de ensino estará oportunizando


um espaço escolar que esteja em sintonia maior com o mundo exterior e, da mesma
forma, que os alunos entendam que a aprendizagem pode e deve ocorrer em outros
espaços além da sala de aula, o que caracteriza o blended learning. Trata-se de uma
abertura da escola para o mundo e vice-versa.
Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida 11

Instrumentos avaliativos para a educação


híbrida
A educação híbrida reconfigurou as formas de ensinar e aprender entre os
alunos, promovendo a alternância entre os estudos presenciais e on-line.
Nessa proposta, os processos avaliativos também devem ser repensados para
que possam contemplar as aprendizagens adquiridas pelos alunos nos mais
variados modelos de blended learning utilizados pela instituição de ensino.
As discussões sobre a avaliação na educação são antigas e densas, no
entanto, podemos concordar com Depresbiteris (1998, p. 163), que comenta
que “a avaliação e o planejamento são atividades inseparáveis; formam um
processo único, no qual devem ser definidos os objetivos, os conteúdos, as
estratégias de ensino, os critérios e as formas de avaliar”. Logo, ao propor um
modelo de educação híbrida que se alinhe à cultura da instituição de ensino, a
avaliação já deverá constar nestes planejamentos iniciais. Pensar na avaliação
dentro de uma proposta de educação híbrida deve ir além da simples medição
e classificação quantitativa dos alunos, procurando, como observa Bento
(2017, p. 68), “mostrar o progresso dos alunos durante todo o curso”. Ou seja,
busca-se muito mais o caráter formativo do que o caráter somativo, comum
às aulas mais tradicionais. Deverão existir estratégias de avaliação ao longo
de todo o processo para não se incorrer ao erro de superavaliar o ensino nos
encontros presenciais em detrimento dos estudos em casa, ou vice-versa.
Pelos resultados de inúmeras experiências exitosas na área da educação
híbrida, podemos apresentar alguns tipos de instrumentos avaliativos que
podem ser utilizados para mensurar os resultados obtidos pelos alunos com
eficiência, em termos de aprendizagem. São eles:

„„ avaliação em teia;
„„ diário de bordo;
„„ mapa conceitual;
„„ interatividade on-line;
„„ avaliação formal;
„„ autoavaliação;
„„ avaliação diagnóstica.

O primeiro aspecto a discutirmos sobre os formatos utilizados para ava-


liação é o fato de que esta deverá ser estruturada de forma a abranger tanto os
aspectos quantitativos quanto os qualitativos da aprendizagem. Dessa forma,
a avaliação não deve ser realizada somente ao final do processo de estudo de
12 Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida

um curso ou de uma disciplina, mas durante todas as etapas do modelo de


educação híbrida adotado. A seguir, iremos detalhar as ferramentas avalia-
tivas citadas no quadro acima, procurando relacioná-las com os modelos de
educação híbrida que aprendemos nos tópicos anteriores.

Avaliação em teia
A avaliação em teia consiste em propor uma estrutura de tecnologia que permita
avaliar continuamente os alunos, a partir dos itinerários que vão escolhendo
durante seus estudos on-line. Assim, quando o aluno acerta uma questão, pode
ir gradualmente elevando seu nível de estudo sobre o assunto e, caso erre,
retorna a uma questão de fundamentação e embasamento mais simples para
que retome o processo avaliativo. O importante é que a teia apresente questões
com diversos níveis de complexidade para que possa capturar os traços dos
respondentes e adaptar seu processo de aprendizagem. Silva (2016) aplicou
a avaliação em teia para o ensino de matemática na educação básica em um
protótipo de sala de aula invertida, em uma escola pública de Maceió com 46
alunos. O autor utilizou o Google Docs e a teoria de resposta ao item (TRI) para
construir seu processo avaliativo, destacando que este processo de avaliação
“é prospectivo e evidencia os dados qualitativos; seu escopo é compreender
a relação entre o aprendizado e o desenvolvimento das funções psicológicas
superiores” (SILVA, 2016, p. 40). Ou seja, este modelo se fundamenta no
entendimento de que as capacidades cognitivas podem ser modificadas com
o decorrer do tempo, sendo acrescidas a partir do desenvolvimento da teia.

A TRI é hoje amplamente utilizada nas provas do Enade e busca compreender como
os alunos analisam as alternativas (distratores) em relação a afirmativa correta. Logo,
ele utiliza teorias de estatística para tentar avaliar não apenas o número de acertos,
mas também a proficiência real do candidato em cada área de conhecimento.

Diário de bordo
A utilização de um diário de bordo pode ser uma boa alternativa para a edu-
cação híbrida, pois permite que os alunos construam um portfólio de seus
Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida 13

aprendizados a partir dos estudos realizados fora da escola. Estes diários


podem ser socializados durante os encontros presenciais, favorecendo a in-
teração e a troca de experiências entre os alunos e o professor. Silva, Silva e
Marques (2016) utilizaram o diário de bordo com seus alunos, que deveriam
descrever suas experiências de aprendizagem na plataforma Moodle. Estes
relatos, escritos em primeira pessoa, forneceram subsídios para a avaliação
dos conteúdos abordados pelos professores em suas disciplinas.

Mapa conceitual
O mapa conceitual também serve como instrumento para ser utilizado na
educação híbrida, pois os alunos podem descrever, pela representação grá-
fica, os conceitos abordados e suas principais características em direção aos
objetos de aprendizagem requeridos. Tanzi Neto, Schneider e Bacich (2017)
utilizaram os mapas conceituais na condução de um experimento de ensino
híbrido para a língua inglesa com alunos do ensino médio, que denominaram
de laboratório rotacional, no qual os alunos realizavam o rodízio entre a sala
de aula e o laboratório de informática e eram avaliados de forma individual e
coletiva, a partir da construção e da socialização dos mapas conceituais. Esse
método pode ser também utilizado na sala de aula invertida, uma vez que, ao
terem realizado os estudos domiciliares, os alunos podem expor seus níveis
de conhecimento adquiridos a partir da construção dos mapas conceituais
com o acompanhamento do professor.

Interatividade on-line
Outra forma de avaliação largamente utilizada no ensino híbrido é o uso de
alguma métrica para mensurar a interatividade dos alunos junto à plataforma
on-line disponibilizada para o curso ou a disciplina. Porém, não devem ser
somente computados os períodos em que o aluno está on-line na plataforma,
mas também os seus esforços ao desenvolver as atividades ali propostas.
Andrade e Souza (2016) utilizaram este formato de avaliação das interações
on-line para avaliar seus alunos tanto no modelo de rotação por estações quanto
na sala de aula invertida. As autoras esclarecem que, no modelo de rotação
por estações, devido ao trabalho com grupos menores em cada estação, os
professores podiam se valer de uma avaliação qualitativa mais consistente e
utilizavam de feedbacks constantes para que os alunos pudessem aprimorar
sua aprendizagem.
14 Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida

Avaliação formal
As avaliações formais, representadas por provas e testes que visam mensurar
os conhecimentos adquiridos, também fazem parte da educação híbrida e
são normalmente utilizadas no ensino superior à distância, interligadas a
atividades interativas on-line realizadas em casa. Valente (2014) destaca que
utilizou este procedimento em turmas de sala de aula invertida no ensino
superior, em cursos que apresentam a proposta de ensino à distância chamada
semipresencial, na qual os alunos estudam o conteúdo em suas casas e, se
encontrarem semanalmente ou mensalmente em sala de aula com seus tutores,
além de realizarem atividades práticas sobre os temas estudados, também
realizam provas presenciais.

Autoavaliação
Outro bom instrumento avaliativo que serve para que o aluno reflita sobre o
seu próprio desenvolvimento e corrija suas rotas de estudo, tanto presenciais
quanto on-line, é a autoavaliação, que se adapta a todas as modalidades híbri-
das utilizadas. A partir dela, tanto alunos quanto professores podem perceber
os ajustes que se fazem necessários ao processo de ensino e aprendizagem.

Avaliação diagnóstica
Outro aspecto das avaliações que ocorrem na educação híbrida é o caráter
diagnóstico do sistema de avaliação utilizado. Ou seja, devem estar presentes,
durante todas as etapas da aprendizagem, tanto no meio presencial quanto
nas atividades on-line, mecanismos que possam testar a aprendizagem dos
alunos em relação a pontos centrais dos assuntos tratados para que, quando
necessário, possam ser fornecidos ajustes nas trilhas de aprendizagem que
estão sendo seguidas. Uma maneira de realizar esses diagnósticos é por fóruns
específicos ou interdisciplinares, por enquetes ou outras atividades em que
o aluno tenha que compartilhar o que aprendeu naquele período específico,
como um desafio ou uma situação-problema que deva resolver. O Quadro 1
sintetiza os principais tipos de avaliação.
Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida 15

Quadro 1. Principais tipos de avaliação

Tipos Conceito Função

Formativa Ocorre durante o processo Obter evidências sobre a


de ensino e aprendizagem. aprendizagem e propor
Apresenta caráter condições para a tomada
regulador, mediador, de decisões sobre o (re)
inclusivo/ colaborativo, planejamento adotado.
reflexivo e dinâmico.

Somativa ou Tem como objetivo Para certificar, comparar,


classificatória verificar a aquisição de um medir o sucesso ou
conjunto de conhecimentos insucesso dos alunos
planejados pelo professor. com a aplicação de
É aplicada ao final de um notas ou conceitos. Seus
período determinado, resultados podem servir
normalmente pelo uso de como indicadores para
provas e testes que resultam ações a serem realizadas
em notas ou conceitos. pela gestão da escola.

Diagnóstica Permite que o professor Embasa a tomada


conheça o que os alunos de decisões para o
sabem sobre determinado planejamento do
assunto, normalmente professor em relação ao
sem atribuir notas. ensino dos conteúdos.

Uma das grandes vantagens da educação híbrida é a possibilidade de personalização


do ensino e aprendizagem pelo uso de tecnologias digitais de informação e comuni-
cação (TDICs). Acesse o link abaixo e acompanhe o relato da professora Juliana Guida,
que aplica o blended learning em sua escola com o suporte do Porvir Educação, uma
iniciativa do Instituto Inspirare, organização do terceiro setor que presta suporte para
a inovação da educação brasileira.

https://qrgo.page.link/AghE7
16 Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida

ANDRADE, M. C. F.; SOUZA, P. R. Modelos de rotação do ensino híbrido: estações


de trabalho e sala de aula invertida. Revista E-Tech: Tecnologias para Competitividade
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a avaliação através da plataforma Moodle. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE EDUCA-
ÇÃO A DISTÂNCIA: ENCONTRO DE PESQUISADORES EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA, 3.,
2016, São Carlos. Anais [...]. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2016. 17 p.
Disponível em: http://www.sied-enped2014.ead.ufscar.br/ojs/index.php/2016/article/
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Blended learning: educação híbrida e sala de aula invertida 17

TANZI NETO, A.; SCHNEIDER, F.; BACICH, L. Tecnologia no Ensino de Língua Adicional:
Personalização e Autonomia do estudante por meio de um modelo de Ensino Híbrido.
Revista CBTecLE, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 614–631, 2017. Disponível em: https://revista.
cbtecle.com.br/index.php/CBTecLE/article/view/29. Acesso em: 21 maio 2019.
VALENTE, J. A. Blended learning e as mudanças no ensino superior: a proposta da sala de
aula invertida. Educar em Revista, Curitiba, n. esp. 4, p. 79–97, 2014. Disponível em: http://
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S0104-40602014000800079&lng=
pt&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 21 maio 2019.

Leitura recomendada
HAYDT, R. C. C. Avaliação do processo ensino-aprendizagem. 6. ed. São Paulo: Ática,
2008. 159 p.
METODOLOGIAS PARA
APRENDIZAGEM
ATIVA

Amanda de Sena Fornarolli Pereira


Brainwriting/brainstorming
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Descrever o potencial da estratégia de aprendizagem ativa


brainstorming.
„„ Reconhecer o potencial da estratégia de aprendizagem ativa
brainwriting.
„„ Demonstrar exemplos de aplicação das estratégias brainwriting e
brainstorming nos diferentes contextos de aprendizagem.

Introdução
Como ajudar os alunos no desenvolvimento de habilidades essenciais
para o mundo do trabalho? De acordo com o The Conference Board of
Canada, as habilidades que deveriam ser consideradas para a atuação no
mundo do trabalho estão classificadas em: fundamentais (comunicação,
gerenciamento de informação, uso de números, pensamento e resolução
de problemas), gerenciamento pessoal (demonstrar atitude e compor-
tamento positivos, ser responsável, ser flexível, aprender continuamente e
trabalhar em segurança) e trabalho em times (trabalhar com os outros e
participar de projetos e tarefas) (EDUCATION..., 2019, documento on-line).
As estratégias brainstorming e brainwriting podem contribuir para a
melhoria das habilidades de pensamento e resolução de problemas, pois
incentivam a criatividade e a inovação na procura por possíveis soluções.
Também ajudam no desenvolvimento de atitudes e comportamentos
positivos, uma vez que os alunos precisam aprender a lidar com pessoas
e situações-problema de forma honesta, íntegra e ética, buscando reco-
nhecer seu esforço e o esforço dos colegas. Outra competência que pode
ser desenvolvida é a flexibilidade: a pessoa deve ser capaz de trabalhar
individualmente ou em grupo, se mantendo aberto às ideias e opiniões
de outros, reconhecendo e respeitando as diferenças.
2 Brainwriting/brainstorming

Neste capítulo, você irá conhecer duas estratégias de


metodologia para aprendizagem ativa que estimulam o processo
criativo e podem contribuir para o de-senvolvimento das habilidades
que se esperam do profissional contem-porâneo: o brainwriting e o
brainstorming.

Brainstorming na educação
Brainstorming é uma estratégia utilizada para estimular o processo criativo e
gerar ideias colaborativamente, com o intuito de resolver problemas, desen-
volver projetos ou levantar informações sobre um assunto. Foi criada pelo
publicitário americano Alex Osborn para expandir e enriquecer a criatividade
nas áreas de relações humanas, dinâmicas de grupos e publicidade e propa-
ganda (SIGNIFICADO..., 2014, documento on-line). Posteriormente, passou
a ser utilizada em diversas áreas, inclusive na educação.
De acordo com Al-Samarraie e Hurmuzan (2018), existem estudos que
demonstram o papel excepcional do brainstorming em estimular os indivíduos
nas soluções criativas, o que reforça a sua importância no desenvolvimento
de habilidades de criatividade e inovação.
O brainstorming em grupo consiste na exposição do maior número possível
de ideias geradas espontaneamente sobre um problema, desafio ou assunto.
Como premissa, quaisquer ideias apresentadas não devem ser julgadas ou cri-
ticadas. Essa estratégia propicia a troca de informações, o desenvolvimento da
criatividade, a associação e o desenvolvimento de ideias, o trabalho em equipe
e a reflexão e a tomada de decisão (CAMARGO; DAROS, 2018). Bacich e
Moran (2018) também descrevem como um momento em que os alunos podem
exercer seu protagonismo, pois podem escolher “o que e como produzir”, além
de “saber argumentar e convencer”. Isso demonstra que estão desenvolvendo
o senso crítico, visto que, em geral, esta é uma competência definida como
capacidade de escolher no que acreditar e fazer (PAUL; NOSICH, 1991).
Na educação básica ou superior, o brainstorming pode ser aplicado como
primeira etapa, ou em diversas etapas, da estratégia de aprendizagem base-
ada em projetos (BACICH; MORAN, 2018; BENDER, 2014). No ensino
fundamental, Bender (2014) ressalta que é importante ensinar os alunos a
realizar o brainstorming, visto que, ao entrar em contato com essa estratégia
pela primeira vez, podem ter dificuldades em aceitar as ideias dos colegas e
focarem nas críticas. No entanto, reforçamos que o objetivo dessa estratégia
é, em um primeiro momento, gerar o maior número possível de ideias que
posteriormente serão analisadas e selecionadas.
Brainwriting/brainstorming 3

Existem algumas normas a serem seguidas para o bom andamento do


brainstorming. De acordo com Bender (2014), as principais são as seguintes.

„„ Na parte inicial do brainstorming, quando os participantes devem lançar


suas ideias, todas estas devem ser expressas e listadas.
„„ Todas as ideias devem ser consideradas e respeitadas, ou seja, não deve
haver críticas ou julgamentos.
„„ No momento da análise, algumas ideias podem ser desconsideradas
por não serem primordiais ou relevantes, mas inicialmente nenhuma
delas deve ser descartada.

Para Bender (2014, p. 109), o brainstorming envolve um conjunto de normas, conforme


descrito a seguir.
„„ Identificar, considerar e aderir ao grande tópico sem se afastar muito dele.
„„ Gerar ideias que difiram daquelas apresentadas anteriormente.
„„ Listar todas as ideias sem qualquer eliminação ou edição inicial dos conceitos.
„„ Encorajar os outros a pensar de modo independente e diferente sobre o tópico.
„„ Focar-se na geração do máximo de ideias possíveis sem perder de vista o grande
tópico.
„„ Recusar-se a limitar a lista de ideias ou de conceitos, mesmo que uma grande lacuna
lógica ou falha seja evidente.
„„ Respeitar todas as ideias dignas de consideração.
„„ Realizar uma fase de encerramento, na qual as ideias são comparadas e sintetizadas
(ou seja, juntar duas ideias, caso elas representem uma ideia mais ampla e caso as
pessoas que as tenham sugerido concordem em uni-las em uma só).
„„ Demonstrar encorajamento e respeitar todos os participantes da discussão.

O artigo disponível no link a seguir (em inglês) apresenta algumas estratégias de


brainstorming.

https://qrgo.page.link/pho8o
4 Brainwriting/brainstorming

Como ensinar o brainstorming aos alunos


Para aproveitar de forma produtiva o momento do brainstorming, Bender (2014,
p. 110) sugere que ao aplicar a estratégia pela primeira vez, o professor precisa
esclarecer como será o andamento da atividade e aproveitar para ensinar aos
alunos sobre como devem se comportar.

1. O professor deve apresentar um pôster com as normas essenciais durante


a aplicação da estratégia. Podem ser o conjunto de normas descritas
por Bender (2014), adequando se necessário.
2. Dependendo do número de integrantes no grupo, deve ser escolhida
uma pessoa para anotar as ideias e outra para ser o líder das discussões.
O professor deve explicar que quem irá anotar, escreverá as ideias e os
pensamentos de forma sintética. O líder deve moderar, evitando que as
ideias sejam interrompidas ou criticadas e garantindo que todos sejam
ouvidos durante a sessão.
3. O professor deve iniciar a sessão, deixando que os dois alunos desem-
penhem seus papeis e os demais exponham suas ideias. O professor
deve intervir para ajudar a moderar a sessão somente se necessário.
4. Após esgotar o tempo em que as ideias são lançadas, o líder deve sugerir
a junção de ideias que possam formar uma única ideia, pedindo permis-
são aos que sugeriram originalmente e explicando o sentido em uni-las.
5. Ao finalizar a síntese, as ideias devem ser anotadas pelo responsável e
cópias devem ser distribuídas a todos os participantes.
6. Em futuras sessões de brainstorming, os alunos devem fazer a seleção
do líder e de quem irá fazer as anotações. Além disso, os alunos devem
revisar as regras do brainstorming registradas no pôster antes de cada
sessão.

Brainwriting: uma variação do brainstorming


Assim como o brainstorming, o brainwriting é uma abordagem de estímulo
ao processo criativo, usada inicialmente no marketing, na propaganda, no
design, na escrita e no desenvolvimento de produtos (LITCANU et al., 2015).
Na educação, ela “consiste em realizar o debate e a discussão de ideias sobre
determinado tema, assunto, desafio ou problema. O objetivo é promover
o protagonismo individual e coletivo do aluno, fazendo-o se posicionar e
lançar suas ideias e possíveis soluções do grupo” (CAMARGO; DAROS,
Brainwriting/brainstorming 5

2018). Watson (2018) aponta que a estratégia propicia ao aluno exteriorizar


seu conhecimento prévio, uma vez que as ideias surgem com base em suas
experiências. Assim, o professor consegue ter uma noção da extensão e pro-
fundidade do conhecimento de seus alunos.
As duas estratégias são realizadas em grupos e colaborativamente, mas
diferem, principalmente, na maneira como os alunos expõem suas ideias.
No brainstorming, as ideias são verbalizadas, enquanto no brainwriting, as
ideias são escritas individualmente. Não é permitida a comunicação entre os
integrantes durante o momento em que estes estão escrevendo suas ideias.
O brainwriting é também conhecido como Método 635. Cada um dos números
marca um ponto importante da estratégia: seis alunos por grupo, que lançam
individualmente três ideias a cada cinco minutos. Os números também resumem
a sequência didática: cada integrante do grupo recebe uma folha com três espaços
em cada linha (seis linhas) para serem preenchidas com ideias em cinco minutos.
Após se esgotar o tempo, o aluno passa sua folha para o participante do lado
direito e, na folha que recebe do colega do lado esquerdo, preenche mais três
ideias. O ciclo acontece até que a folha volte ao participante que preencheu a
primeira linha. São 108 ideias geradas em 30 minutos. Depois desse momento,
o professor recolhe as folhas e analisa as ideias com a turma, fazendo junções e
seleções de acordo com o problema ou assunto proposto incialmente. A Figura 1
ilustra o ciclo da escrita de ideias no brainwriting.

Figura 1. Ciclo da escrita de ideias.


Fonte: GzP_Design/Shutterstock.com.
6 Brainwriting/brainstorming

O brainwriting pode ser aplicado em momentos de produção textual, em língua


portuguesa ou estrangeira. Após levantar ideias sobre um determinado tema, é possível
questionar “como as ideias estão relacionadas?”; “vocês podem dar exemplos?”; “o que
vocês querem dizer com isso?” etc. As ideias e os questionamentos levam à reflexão e
podem ajudar os alunos a ampliar seu repertório e se aprofundar no tema.

Aplicação das estratégias


Você pode estar pensando em como escolher a estratégia a ser aplicada e, é
claro, não existe uma estratégia melhor que a outra, mas existem vantagens
(LITCANU et al., 2015; WATSON, 2018) em cada uma delas. Vejamos quais
são elas.

Brainstorming
„„ Rápido e fácil para obter novas ideias e soluções.
„„ Estimula a participação ativa.
„„ Desenvolve a criatividade, a espontaneidade e a autoconfiança.
„„ Desenvolve a habilidade de trabalhar em grupos.
„„ Favorece a inclusão dos alunos.
„„ Motiva os alunos a arriscar sem medo de errar.

Por exemplo, em uma disciplina de História para o ensino médio, o pro-


fessor poderia propor aos alunos a criação de um projeto que explicasse, de
maneira plena, coerente e descomplicada, para alunos da educação básica,
o processo de Independência do Brasil. Portanto, poderia propor a seguinte
questão: “como podemos explicar a Independência do Brasil?”. Além de ideias
relativas ao produto que poderia ser gerado, os alunos estariam resgatando e
refletindo sobre o que estudaram.
Brainwriting/brainstorming 7

Brainwriting
„„ O ato de escrever as ideias leva as pessoas a escrever com clareza e de
forma completa.
„„ Ajuda as pessoas que participaram de sessões de brainstorming mono-
polizadas por um ou dois integrantes.
„„ Os integrantes têm o mesmo tempo para pensar e escrever.
„„ É vantajoso se o grupo tende a socializar muito, perdendo o foco.
„„ É vantajoso se houver um conflito forte no grupo ou se o tópico for
muito contraditório. Embora o conflito seja bom, deve ser gerenciado
cuidadosamente.

Por exemplo, para um projeto da disciplina de Matemática para o ensino


fundamental, o professor poderia propor a seguinte questão: “como aproveitar
este terreno para atender um maior número de desabrigados?”. Anterior à
questão, o professor deve fazer a contextualização do problema, explicando
a situação de desabrigados por uma enchente e a possibilidade de construir
casas em um terreno doado. O brainwriting da questão seria a primeira etapa
de um projeto longo que, futuramente, poderia prever outros momentos de
brainwriting.

É importante lembrar que existem diversas técnicas para o desenvolvimento da criativi-


dade e que o brainstorming e o brainwriting são apenas duas delas. Vale ressaltar que o
brainstorming também é questionado por estudiosos da neurociência como processo
criativo (GOBBLE, 2014), visto que ideias não poderiam surgir de um ambiente rígido.
Ainda assim, tais estratégias contribuem para diversas habilidades como as listadas
anteriormente e, principalmente, motivam o respeito ao próximo e o trabalho em grupo.
8 Brainwriting/brainstorming

AL-SAMARRAIE, H.; HURMUZAN, S. A review of brainstorming techniques in higher


education. Thinking Skills and Creativity, [S. l.], v. 27, p. 78–91, Mar. 2018.
BACICH, L.; MORAN, J. (org.) Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abor-
dagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018. 260 p. (Série Desafios da Educação).
BENDER, W. N. Aprendizagem baseada em projetos: educação diferenciada para o século
XXI. Porto Alegre: Penso, 2014. 156 p.
CAMARGO, F.; DAROS, T. A sala de aula inovadora: estratégias pedagógicas para fomentar
o aprendizado ativo. Porto Alegre: Penso, 2018. 144 p. (Série Desafios da Educação).
EDUCATION and Skills Products. The Conference Board of Canada, Ottawa, 2019. Dispo-
nível em: https://www.conferenceboard.ca/topics/education/learning-tools.aspx?As
pxAutoDetectCookieSupport=1. Acesso em: 28 jun. 2019.
GOBBLE, M. A. M. The Persistence of Brainstorming. Research-Technology Management,
Arlington, v. 57, n. 1, p. 64–67, 2014.
LITCANU, M. et al. Brain-Writing vs. Brainstorming Case Study for Power Engineering
Education. Procedia - Social and Behavioral Sciences, [S. l.], v. 191, p. 387–390, 2 June 2015.
PAUL, R. W.; NOSICH, G. M. A proposal for the national assessment of higher-order thinking
at the community college, college, and university levels. Washington: U. S. Department
of Education Office of Educational Research and Improvement; National Center for
Education Statistics, 1991. 53 p. Disponível em: https://eric.ed.gov/?id=ED340762.
Acesso em: 28 jun. 2019.
SIGNIFICADO de Brainstorming. Significados, Matosinhos, 16 maio 2014. Disponível em:
https://www.significados.com.br/brainstorming/. Acesso em: 28 jun. 2019.
WATSON, S. How to Brainstorm in the Classroom. ThoughtCo, New York, 9 July 2018.
Disponível em: https://www.thoughtco.com/brainstorm-in-the-classroom-3111340.
Acesso em: 28 jun. 2019.

Leitura recomendada
NORDQUIST, R. Discover Ideas Through Brainstorming. ThoughtCo, New York, 4 Dec.
2018. Disponível em: https://www.thoughtco.com/brainstorming-discovery-stra-
tegy-1689180. Acesso em: 28 jun. 2019.
METODOLOGIAS PARA
APRENDIZAGEM ATIVA

Ingrid Gayer Pessi


Design thinking
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Definir os elementos norteadores da metodologia do design thinking


para a educação.
„„ Descrever a aplicação do design thinking, bem como os diferentes
recursos que podem ser utilizados.
„„ Reconhecer a relevância da metodologia para a educação criativa.

Introdução
O design thinking é uma estratégia que visa o trabalho colaborativo,
proporcionando uma vivência criativa e inovadora. Quando utilizada no
contexto educacional, possibilita colocar o aluno no centro do processo
de aprendizagem, levando-o a buscar soluções em um determinado
contexto, fazendo uso da razão e da criatividade, até em curto prazo
de tempo.
Neste capítulo, você irá estudar sobre os conceitos e as principais
características do design thinking, definindo os elementos norteadores
desta metodologia, assim como irá compreender as fases de aplicação
e a importância dos insights para abordar os problemas ao longo do
processo. Você também irá refletir sobre a relevância do design thinking
como metodologia para a educação criativa, que pode ser uma forma
de pensar e resolver diferentes problemas no contexto escolar.

Conjunto de ideias relacionadas


A metodologia denominada design thinking (Figura 1) é um processo de pen-
samento que existe, em essência, desde os mais antigos empreendimentos
humanos. A metodologia não deve ser compreendida como algo estritamente
voltado à atividade de designers, uma vez que pesquisadores, arquitetos,
artistas e cientistas empregavam o mesmo processo para atingir objetivos
2 Design thinking

específicos e solucionar os mais diversos problemas humanos antes mesmo


destes profissionais existirem. O que poderíamos traduzir como pensamento
do design ou pensamento por design está presente desde a construção de um
aqueduto capaz de levar água potável para uma comunidade, até a criação de
uma pequena lâmpada de vidro que, por meio de condutores elétricos, possa
iluminar ambientes durante os mais diversos períodos do dia ou da noite. O
design thinking está presente, ainda, na estruturação de uma pequena caixinha
repleta de condutores, baterias e sensores, que permite que o indivíduo se
conecte a outros, não importando a distância que os separa.
A metodologia do design thinking é antiga, mas como observam Cavalcanti
e Filatro (2017), ela adquire relevância e passa a se estruturar de maneira clara
a partir dos anos 1950, quando o design inicia seu processo de interferência na
criação de bens de consumo, compartilhamento de informações e, inclusive,
de construção de identidades. Contudo, como ressaltam as autoras, é somente
nos anos 2000 que o conceito e a abordagem do design thinking se estendem
para os mais diversos campos de atuação, como o da educação, recebendo,
assim, maior atenção de educadores, empresários e estudiosos.
Como defendem Brown e Katz (2011), esta metodologia adquire clara
estruturação em suas etapas a partir do momento em que se retira o processo
de pensamento do designer de dentro de estúdios ou escritórios de criação,
possibilitando a apropriação e a compressão de suas características específicas,
demonstrando ao educador a relevância da criatividade, da interdisciplinaridade,
do estabelecimento de interconexões de conhecimentos e, principalmente, do
trabalho em grupo para a resolução de problemas. Por meio desta metodologia,
o educador perceberá a organicidade do processo de pensamento, bem como
sua abertura para que os educandos busquem respostas por si, exercitando não
somente o conteúdo de uma disciplina específica, mas interligando os mais
diversos saberes para encontrar respostas e caminhos para atingir um dado
objetivo.
Neste sentido, poderíamos compreender o conceito de design thinking como
delineado por Brown (2008), que o define como uma metodologia baseada na
liberdade, oferecida aos educandos para que, ao trabalharem em grupo, sejam
capazes de explorar suas sensibilidades, habilidades e conhecimentos, empre-
gando o processo de pensamento de designers para a solução de problemas
elaborados pelo educador e, portanto, vindo a criar soluções para estes, além
de atingir os objetivos específicos do projeto criado pelo professor responsável
pela disciplina.
Design thinking 3

Figura 1. O design thinking é uma metodologia inovadora, que visa a busca de soluções cria-
tivas para um problema, ao mesmo tempo em que oferece maior liberdade de pensamento.
Fonte: Kirasolly/Shutterstock.com.

O design thinking pode ser usado por todos os envolvidos com o processo educacional,
como:
„„ gestores escolares: nas reuniões pedagógicas ou na formação continuada dos
professores, tornando esses momentos mais ricos, de forma que possam refletir
sobre esta metodologia e utilizá-la em sala de aula.
„„ professores: desde o planejamento até o momento de suas aulas, o professor
pode utilizar do design thinking, desenvolvendo competências como a capacidade
argumentativa e o trabalho em equipe.
„„ alunos: além de vivenciarem a metodologia em sala de aula com seus professores,
os alunos podem se beneficiar desta para aprender uma nova forma de estudar
ou resolverem problemas do seu cotidiano.

O design thinking na prática pedagógica


Antes de se comprometer com a implementação da metodologia design thinking
em sala de aula, o educador deve identificar algumas características e alguns
motivadores específicos no projeto que pretende implantar. Da mesma ma-
neira, deve ter em mente as principais fases deste processo de pensamento a
fim de permitir que cada atividade (ou o projeto como um todo) contemple
cada etapa, possibilitando melhores resultados e a verdadeira construção e o
compartilhamento de conhecimentos por parte dos educandos.
4 Design thinking

Segundo Brown e Wyaat (2010), o primeiro quesito a ser contemplado


pelo educador antes de iniciar o planejamento das atividades é sua viabilidade.
Busca-se analisar se o projeto educativo encontrará possibilidade de ser im-
plementado em sala de aula, observando elementos como os conhecimentos
envolvidos, o tempo gasto para o desenvolvimento das atividades e a relação
do projeto com o conteúdo programático. Em seguida, deve-se considerar sua
praticabilidade, avaliando os direcionamentos do projeto, como este funcionará
em sala de aula, quais ajustes ou apontamentos o professor poderá realizar uma
vez que o projeto esteja em curso e, por fim, o quesito mais sutil está ligado à
importância do projeto. Aqui, o educador deve se ater à relevância e à vontade
de planejar as atividades para a implantação da metodologia do design thinking
em sala de aula.
Uma vez compreendidos os quesitos anteriores à criação do projeto educa-
cional baseado no design thinking, é importante compreender as fases que serão
vivenciadas pelos educandos ao longo de seu processo de aprendizagem, no
qual estarão imersos na busca por solucionar um problema dado pelo professor
responsável pelo projeto. De acordo com Brown e Katz (2011), o processo de
pensamento iniciado com a implementação da metodologia design thinking se
caracteriza por três fases, descritas a seguir.

„„ Inspiração: fase em que o aluno recebe o problema a ser resolvido ou


o objetivo que seu grupo deve atingir com o desenvolvimento das ativi-
dades, liberando-os para observar, analisar e compreender o problema
por meio das mais diversas perspectivas e saberes. Neste momento,
observam-se as primeiras ideias, os debates e a busca por soluções,
tratando-se de uma fase de experimentos, descobertas e discussões sobre
as melhores formas de se atingir os objetivos esperados.
„„ Ideação: fase do processo de pensamento em que os alunos devem
elaborar, refinar e definir sua abordagem, apresentando sua solução para
o problema proposto. Espera-se que, ao longo da fase de ideação, os
alunos sejam capazes de interligar conhecimentos, ideias e pensamentos
levantados durante a fase de inspiração, construindo um único plano,
esquema ou abordagem para o problema em questão. Nesta fase também
se consolidam os protótipos de cada grupo, estes, compreendidos como
o produto resultante de todas as atividades realizadas até o momento.
Design thinking 5

Contudo, deve-se ter em mente que o protótipo não precisa se apresentar


como um objeto específico e definido (uma maquete, um instrumento
ou um utensílio), podendo adquirir diferentes formatos como quadros,
cartazes, esquemas ou quaisquer outros produtos resultantes da abor-
dagem estabelecida pelos alunos envolvidos.
„„ Implementação: trata-se da fase em que os alunos irão testar suas
ideias e seus produtos finais, implementando efetivamente seu trabalho
no contexto do problema proposto pelo professor, observando, ainda,
se ele foi capaz de solucioná-lo. Embora adquira aparência de término
do processo de criação, o professor deve lembrar e instigar os alunos
a analisar seus protótipos e abordagens, levando-os a compreender
suas falhas e seus aspectos positivos, além de elementos que precisam
de aperfeiçoamento. Deve-se avaliar se a ideia, o esquema, o produto
ou a abordagem foi capaz de atingir o objetivo final ou solucionar o
problema proposto. Deve-se, ainda, ressaltar que as possíveis falhas
no projeto confeccionado pelos alunos são oportunidades de melhorar,
de rever os caminhos trilhados até o momento e entender o que está
errado, demonstrando a possibilidade de retornar às fases anteriores
para aperfeiçoar suas ideias e testá-las novamente.

Considerando as fases anteriores, características da metodologia design


thinking, percebemos que sua implementação ao longo do processo de apren-
dizagem não se atém a um caminho linear, mas sim a um percurso cíclico no
qual educandos e educadores encontram oportunidades de retornar às etapas
anteriores, a fim de reverem conceitos, aperfeiçoarem ideias e construírem
novos conhecimentos, conforme demonstra a Figura 2. Por proporcionar esse
retorno às fases iniciais, estendendo ao educando meios de modificar suas
ideias, percebendo suas falhas e pontos a serem aprimorados, retira-se a pres-
são exercida pelo erro. Uma vez que o educando compreende a existência de
abertura para reparar os erros de seu projeto, eliminam-se também possíveis
inibidores de seu processo de aprendizagem, levando os alunos a tentarem e a
explorarem caminhos de maneira mais livre e criativa.
6 Design thinking

Figura 2. Ciclo proporcionado pela metodologia design thinking.


Fonte: Adaptada de Brown (2019, documento on-line).

Levando em consideração as características do processo de pensamento


proporcionado pelo design thinking no contexto educacional, é importante
destacar alguns aspectos a serem observados pelo educador ao planejar um
projeto, assim como ao longo de todo o desenvolvimento das atividades por
parte dos educandos. Como defendido por Brown e Katz (2011), as fases
de inspiração e ideação não devem se limitar ao recolhimento e à análise de
dados, mas devem instigar o educando a observar o problema por diferentes
perspectivas, compartilhando conhecimento com o grupo para que juntos
debatam ideias e venham a compreender as características do problema e os
possíveis caminhos para sua solução.
O educador pode optar pela formação de grupos heterogêneos, propiciando
maior riqueza de debates nos estágios iniciais das atividades, bem como dar
oportunidade para que os educandos confrontem ideias, saberes e visões,
garantindo que exercitem suas habilidades de trabalho em conjunto e busquem
sanar as dificuldades de cada membro do grupo ao longo d o processo. Por se
tratar de uma metodologia que preza pela interdisciplinaridade, pela formação
de grupos e pelo exercício da criatividade, o educador deve se manter alerta
para possíveis conflitos nas fases iniciais das atividades. Ao confrontarem
culturas, perspectivas, saberes e abordagens, podem surgir atritos entre os
membros dos grupos. Portanto, o professor deve se mostrar presente para
possíveis interferências ou para resgatar o foco do grupo para o problema que
deve ser solucionado.
Design thinking 7

Educadores e educandos devem compreender que o processo se enriquece


sempre que os membros do grupo compartilham novos conhecimentos, novas
perspectivas ou culturas e se demonstram capazes de relacioná-las à compreen-
são do problema proposto, visando conhecê-lo por seus mais diversos aspectos
e suas características. Ao permitir que os alunos busquem e confrontem dados,
abordagens e saberes, amplia-se as aberturas para o surgimento de novos
insights acerca do tema trabalhado, o que enriquece o processo como um todo.
Em relação à etapa de confecção ou à formulação do protótipo, é recomen-
dável que o educador reflita sobre os possíveis produtos resultantes do problema
proposto em sala de aula, prevendo, assim, possíveis necessidades de materiais,
tempo ou espaços específicos. Caso o problema ou o objetivo a ser atingido
se baseie em conceituações, desafios ou disciplinas teóricas, os educandos
podem elaborar seus protótipos em forma de cartazes, esquemas, quadros ou
apresentações em que exemplifiquem suas ideias e caminhos escolhidos para
chegar a uma solução. Quando se voltar para uma temática ou um assunto de
cunho prático, é possível solicitar aos alunos que construam maquetes ou outros
objetos capazes de exemplificar suas estratégias para solucionar o problema.
Porém, como Brown e Katz (2011) mencionam, a elaboração do protótipo não
deve se apresentar como o objetivo final das atividades realizadas em sala de
aula, não consumindo demasiado tempo e energia do educando e do educador
e não exigindo que este possua aspecto acabado. O intuito da criação de pro-
tótipos é facilitar a visualização da ideia consolidada pelos grupos por parte
de educandos e educadores, resultando em novas discussões e compreensões
acerca dos aprimoramentos a serem efetivados em cada produto final.

Os princípios básicos do design thinking são empatia, colaboração, criatividade e


otimismo. É importante que, ao planejar o uso desta metodologia no contexto escolar,
o professor deixe explícita a forma como esses princípios serão vivenciados pelos
alunos, a fim de garantir uma experiência significativa a eles.
8 Design thinking

Do planejamento à implementação
Com o intuito de delinear de forma clara as etapas e as estratégias necessárias
para o planejamento, desenvolvimento e implementação de projetos baseados na
metodologia design thinking, Martins Filho, Gerge e Fialho (2015) determinam
a observação de cinco passos, que estão listados a seguir.

„„ Descoberta: destina-se a observação, análise e coleta de dados por


parte do educador. Nesta etapa, espera-se que o professor responsável
pela disciplina pesquise temáticas, assuntos e informações relacionados
ao conteúdo, facilitando o surgimento de ideias para a consolidação
de projetos embasados no design thinking. Uma vez listadas as ideias
obtidas pelo educador, este deve revisar, definir e refinar seu plano de
aula com base nas oportunidades de inserção da metodologia ao longo
de atividades ou problemas específicos, levando sempre em consideração
os objetivos específicos da disciplina, o grupo de alunos com quem
irá trabalhar, bem como os estímulos, conhecimentos e dados a serem
oferecidos para os alunos de modo a garantir que possuam material
inicial para elaborarem suas próprias ideias.
„„ Interpretação: momento em que o educador apresenta o problema
escolhido em sala de aula, após planejar todas as atividades referentes
à disciplina ofertada, dividindo a turma em grupos para que, juntos,
iniciem sua própria jornada para entender todas as histórias, saberes
e informações disponíveis, visando observar o problema por diversas
perspectivas e compreendê-lo em seu contexto, suas peculiaridades e
seus aspectos gerais, além de elaborarem as primeiras abordagens e
ideias para solucioná-lo. A fase de interpretação condiz com as etapas
de inspiração e ideação, portanto, o educador deve se manter atento a
possíveis conflitos entre os membros de cada grupo, bem como para
possíveis momentos de distanciamento do foco dos alunos no problema
proposto.
„„ Brainstorming: nesta fase, o educador deve reunir os grupos e direcioná-
-los para uma mudança de foco nas atividades. Após discutirem sobre as
ideias que surgiram ao longo da fase de inspiração, os educandos devem
debater sobre como e quais abordagens serão interligadas, alteradas
ou deixadas de lado, partindo para a estruturação de suas soluções. Os
debates promovidos neste passo devem permitir que todos os membros
do grupo expressem suas ideias e compreendam características e detalhes
Design thinking 9

que não condizem com a estruturação de uma abordagem única, destinada


a solucionar o problema dado.
„„ Prototipação: também denominada experimentação, trata-se do passo em
que os educandos devem modelar suas ideias de maneira física, visual,
estrutural ou de qualquer outra forma como possam ser apresentadas e
explicadas aos colegas. Neste momento, os protótipos criados também
serão testados ou postos em prática. Espera-se que os alunos construam
seus próprios produtos, podendo ser estes cartazes, fórmulas, gráficos,
teorias ou maquetes, levando sempre em conta tudo o que discutiram
até o momento, assim como a capacidade do produto em solucionar o
problema proposto.
„„ Evolução: ao longo deste último passo do processo metodológico, os
educandos, juntamente ao educador, devem observar os produtos finais,
suas capacidades de solucionar o problema proposto e, na mesma medida,
salientar possibilidades de modificações e aperfeiçoamentos no protótipo.
Espera-se que as atividades e os debates finais não se atenham somente
aos elementos passíveis de alteração, mas que possibilitem aos educandos
retornar aos processos anteriores e reformular suas ideias e seus produtos
finais, adequando-os ao problema proposto e, consequentemente, vindo
a construir o conhecimento de maneira integrada e cooperativa.

Com o intuito de auxiliar a implementação do design thinking em sala de


aula, bem como oferecer apoio aos educadores imersos no processo de planeja-
mento de atividades e projetos baseados em seus preceitos, Cavalcanti e Filatro
(2017) destacam que o educador responsável ou os membros de cada grupo
podem nomear um líder. Caso haja necessidade de escolha de um líder, este
será responsável pelo gerenciamento das atividades, da possível delegação de
papéis e afazeres para cada membro, da retomada do foco das discussões e do
controle do tempo gasto em cada etapa. É possível dar início às atividades sem
nomear líderes em turmas em que as habilidades para se trabalhar em equipe
estão mais desenvolvidas ou em turmas mais tranquilas e acostumadas a lidar
com a metodologia. No fim, este é um aspecto a ser analisado pelo educador
responsável pela atividade proposta.
Alguns dos benefícios que o design thinking pode oferecer aos processos
educativos são:

„„ liderança;
„„ engajamento;
„„ trabalho em equipe;
10 Design thinking

„„ melhora da comunicação;
„„ autoconfiança;
„„ colaboração;
„„ tomada de decisões;
„„ criatividade;
„„ reflexão.

Para entender a aplicação do design thinking na prática, veja o exemplo abaixo desta
metodologia em curto prazo, retirado do livro A sala de aula inovadora: estratégias
pedagógicas para fomentar o aprendizado ativo, de Camargo e Daros (2018).

Sequência didática
1. Distribuir canetas e lápis de diversas cores para os alunos. Recomenda-se ao faci-
litador o uso de projetor multimídia com som para exibir o cronômetro que deve
ficar visível para todos na sala de aula.
2. O facilitador deve fazer uma breve exposição acerca do design thinking. Tempo de
duração: entre cinco e oito minutos.
3. O facilitador deve solicitar aos alunos a formação de equipes. O número de equipes
deve ser par, com no mínimo três e no máximo cinco alunos. Cada equipe deve
indicar/sugerir um líder e um escriba.
4. O facilitador deve solicitar ou distribuir aos alunos a experiência (missão) que a
equipe irá procurar redesenhar, registrando-a no formulário.
Design thinking 11

5. Cada grupo deve entrevistar o outro para assim fazer a sondagem empática. Por
exemplo, o grupo A entrevista o grupo B, o grupo C entrevista o grupo D, e assim
sucessivamente. Tempo de duração: seis minutos. O escriba deve anotar todas
informações relatadas na entrevista.

6. Inverter a ordem de entrevistas. Agora, o grupo B entrevista o grupo A, o grupo


D entrevista o grupo C, e assim sucessivamente. Tempo de duração: seis minutos.
7. O que os usuários querem. Registrar e anotar os achados obtidos na entrevista.
Tempo de duração: seis minutos.
12 Design thinking

8. Listar as principais necessidades apontadas. Tempo de duração: seis minutos.

9. Descrever o usuário, a necessidade a ser atendida e, por fim, definir o problema.


Design thinking 13

10. Criar quatro alternativas inovadoras para se testar. Tempo de duração: 10 minutos.

11. Cada líder de grupo deve compartilhar as soluções e fazer anotações dos feedbacks
pertinentes para as possíveis melhorias na solução/produto. Tempo de duração:
um minuto e 20 segundos por apresentação. A apresentação pode ser a venda do
produto ou da solução ou, ainda, a narração de uma história.

12. Assim, o grupo A, compartilha com o grupo C; o grupo B, compartilha com o grupo D, e
assim sucessivamente. Tempo de duração: um minuto e 20 segundos por apresentação.
13. Inverter a ordem. Agora, o grupo C compartilha com o grupo A, o grupo D, com-
partilha com o grupo B, e assim sucessivamente. Tempo de duração: um minuto
e 20 segundos por apresentação.
14 Design thinking

14. Os membros dos grupos se voltam para fazer anotações e dar o feedback por escrito
para o outro grupo. Devem relatar o que acreditam que funciona no protótipo
apresentado, o que poderia ser melhorado, sugerir ideias e questionamentos
para melhorias. Por fim, se acharem pertinente, podem apontar outras sugestões.
Tempo de duração: cinco minutos.

15. Encerramento. No encerramento da estratégia, o facilitador deve explicar/relatar


as etapas do design thinking, realizadas em um curto espaço de tempo. A atividade
foi iniciada com o processo de empatia (entrevista), em seguida foi feita a definição
e a ideação do problema. Posteriormente, construiu-se o protótipo e, por fim, foi
realizado o teste e a validação com a matriz de feedback.
16. Considerações. A aplicação desta estratégia leva o aluno a vivenciar todo o pro-
cesso de divergência e convergência, presente no diagrama do diamante duplo.
O diamante duplo é composto por quatro etapas: descobrir, definir, desenvolver
e entregar.
Revisão de viabilidade Revisão de conceito

Brief

Descobrir Definir Desenvolver Entregar


Fonte: Adaptada de Boschi (2012)
Design thinking 15

Link

Para conhecer um pouco mais sobre a aplicação do design thinking no contexto


educacional, leia o artigo “A contribuição do design thinking na educação”, que discute
como essa metodologia vem sendo trabalhada e como pode ser uma importante
abordagem no processo de aprendizagem.

https://qrgo.page.link/UAvN9

Uma metodologia para a educação criativa


Quando inserida de maneira crítica e estruturada no contexto educacional, a
metodologia design thinking pode gerar experiências de aprendizado frutíferas
e exercícios de conhecimento para os educandos, uma vez que possibilita a
troca de ideias, perspectivas e saberes entre os membros de cada grupo e,
consequentemente, da sala como um todo. A metodologia facilita a criação
de atividades e processos de pensamento interdisciplinar ao oportunizar a
exploração de novos caminhos, a inter-relação de saberes, o debate acerca
dos mais diversos temas e a compreensão do problema por meio de suas mais
diferentes facetas. Como os problemas escolhidos podem remeter a uma vasta
gama de elementos, os alunos, assim como os designers, são capazes de buscar
inspiração, caminhos ou conhecimentos de novas fontes, possibilitando um
maior protagonismo em seu percurso educacional.
A oportunidade de defender suas ideias e formular protótipos para a solução
de problemas específicos oferece aos educandos a possibilidade de comparti-
lharem entre si novas perspectivas, permitindo que o grupo interaja de modo
a aperfeiçoá-las. Sem se restringir à análise do conhecimento empregado para
chegar a uma solução, os alunos, juntamente ao professor, tornam-se capazes
de perceber e reconhecer o processo de origem.
Por fim, o aluno deve busca soluções após a efetivação de suas ideias,
consolidando seu protagonismo ao longo do processo de aprendizagem, bem
como a construção de seus próprios caminhos para atingir determinado objetivo.
Como observam Martins Filho, Gerge e Fialho (2015), solucionar problemas
de forma colaborativa, contextualizada e interdisciplinar permite que os educan-
dos explorem suas competências e habilidades por meio de novas abordagens
e de maneira aprofundada. Do mesmo modo, observa-se na implementação do
processo metodológico do design thinking um alto nível de atuação por parte
16 Design thinking

dos alunos, possibilitando ao educador considerar e analisar todos os materiais


produzidos pelos educandos ao longo do processo de aprendizagem. Assim,
garante-se que unidos em novos grupos ou juntamente ao educador, os alunos
repensem, reconstruam e assimilem o todo produzido sob as mais diversas
perspectivas, em diferentes contextos e no domínio de outras disciplinas.

O design thinking também faz uso de desenhos e de elementos gráficos com o ob-
jetivo de organizar as ideias e buscar soluções de maneira prática. Neste caso, o uso
desses elementos se torna uma importante ferramenta funcional na organização e
na transmissão de ideias.

Fonte: graphixmania/Shutterstock.com.
Design thinking 17

BOSCHI, M. T. O design thinking como abordagem para gerar inovação: uma reflexão.
2012. 100 f. Dissertação (Mestrado em Design) — Universidade Anhembi Morumbi,
São Paulo, 2012.
BROWN, T. Design thinking. Harvard Business Review, Cambridge, June 2008. Disponível
em: https://hbr.org/2008/06/design-thinking. Acesso em: 17 maio 2019.
BROWN, T. Design thinking defined. 2019. Disponível em: https://designthinking.ideo.
com/. Acesso em: 17 maio 2019.
BROWN, T.; KATZ, B. Change by design. Journal of Product Innovation Management, [s.
l.], v. 28, n. 3, p. 381-383, March 2011. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/
full/10.1111/j.1540-5885.2011.00806.x. Acesso em: 17 maio 2019.
BROWN, T.; WYAAT, J. Design thinking for social innovation. Stanford Social Innovation
Review, [s. l.], v. 8, n. 1, Winter 2010. Disponível em: http://www.ssireview.org/articles/
entry/design_thinking_for_social_innovation. Acesso em: 17 maio 2019.
CAMARGO, F.; DAROS, T. A sala de aula inovadora: estratégias pedagógicas para fomentar
o aprendizado ativo. Porto Alegre: Penso, 2018.
CAVALCANTI, C. C.; FILATRO, A. Design thinking: na educação presencial, a distância e
corporativa. São Paulo: Saraiva, 2017.
MARTINS FILHO, V.; GERGE, N. R. C.; FIALHO, F. A. P. Design thinking, cognição e educação
no século XXI. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 15, n. 45, 2015. Disponível em:
http://dx.doi.org/10.7213/dialogo.educ.15.045.ao01. Acesso em: 17 maio 2019.

Leituras recomendadas
BACICH, L.; MORAN, J. (org.). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma
abordagem teórico-prática. São Paulo: Penso, 2018.
GOMES, A. S.; SILVA, P. A. Design de experiências de aprendizagem: criatividade e inovação
para o planejamento das aulas. Recife: Pipa Comunicação, 2017.
OLIVEIRA, A. C. A. A contribuição do design thinking na educação. E-Tech: Tecnologias
para Competitividade Industrial, Florianópolis, n. Especial Educação, 2014. Disponível
em: http://etech.sc.senai.br/index.php/edicao01/article/view/454/368. Acesso em:
17 maio 2019.
VICKERY, A. Aprendizagem ativa nos anos iniciais do ensino fundamental. Porto Alegre:
Penso, 2016.
METODOLOGIA DO
ENSINO DE CIÊNCIAS

Gessiane Ceola
Alfabetização científica
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer termos científicos relacionados ao estudo e à pesquisa


em ciências.
 Identificar exemplos da linguagem e conceitos do cotidiano que se
referem à linguagem e ao pensamento científico.
 Elaborar questionamentos e hipóteses formatados de acordo com o
método e o pensamento científico.

Introdução
Quando se pode considerar um indivíduo alfabetizado cientificamente?
Essa pergunta envolve vários pontos importantes, por exemplo, os con-
ceitos ligados ao tema e como ele foi construído ao longo da história,
bem como a necessidade de a sociedade reconhecer a importância e os
méritos da ciência. Está relacionada a essa questão, ainda, a capacidade
do indivíduo de identificar a linguagem e os conceitos do cotidiano que
envolvem a ciência e a pesquisa, bem como de elaborar hipóteses e
questionamentos que envolvam o método e o pensamento científico.
Compreender a alfabetização científica é o primeiro passo para que
ela seja uma realidade ativa dentro do currículo escolar e contribua para
uma educação de qualidade, crítica e transformadora. A ciência vive em
constante mudança e aprimoramentos, e por isso a alfabetização científica
torna o indivíduo apto a acompanhar todos esses processos, mesmo após
concluir o ensino básico, levando essa capacidade por toda a sua vida.
Neste capítulo, você vai estudar sobre os conceitos e as aplicações da
alfabetização científica no ensino de ciências. Vai aprender ainda sobre a
linguagem típica da ciência e sobre a elaboração de questionamentos e
hipóteses dentro do campo das ciências.
2 Alfabetização científica

O estudo e a pesquisa em ciências


A alfabetização científica é uma alternativa que possibilita a formação da
cultura científica, a ressignificação da ciência e o desenvolvimento do espírito
crítico. Essas habilidades vão fornecer ao estudante conhecimento para com-
preender e avaliar os conteúdos, ampliando a sua cultura, além de reconhecê-
-los e aplicá-los no seu cotidiano (CHASSOT, 2011). Para compreender como
surgiu esse conceito e a necessidade de a sociedade aplicar e reconhecer as
ciências e a pesquisa e inseri-las no currículo escolar, você verá a seguir uma
breve revisão histórica sobre o tema.
Em 1620, o filósofo inglês Francis Bacon já chamava atenção para a ne-
cessidade de a sociedade estar preparada intelectualmente, incluindo nos
seus argumentos o conhecimento sobre as ciências. Em 1798, o então vice-
-presidente dos Estados Unidos, Thomas Jefferson, apoiava que a disciplina
de ciências fosse ensinada nas escolas em todos os níveis. Herbert Spencer,
biólogo e antropólogo inglês, também enfatizava que as escolas deveriam
ensinar conteúdos relacionados ao cotidiano do aluno e que a sociedade era
totalmente dependente dos conhecimentos que eram adquiridos pela ciência.
Nesse contexto, James Wilkinson, membro do Royal College of Surgeons
of London, lançou em 1847 um trabalho com o título Science for All, no qual
ele explorava como a motivação para a ciência é diferente para os cientistas
e para aqueles que buscam a sua aplicação. O texto também mostrava como
eram desconexas as descobertas da ciência feitas pela academia e a ciência
ensinada nas escolas, em função da sua aplicabilidade no cotidiano do aluno.
Com base nesses trabalhos publicados, o pesquisador norte-americano
Hurd foi quem utilizou pela primeira vez, em 1958, o termo scientific literacy
(em português, “alfabetização científica”), no seu livro Science Literacy: Its
Meaning for American Schools e, mais tarde, no seu livro Scientific Literacy:
New Minds for a Changing World, publicado em 1998.
No ano 2000, o conceito de alfabetização científica ganhou mais visibili-
dade com a publicação da obra Scientific Literacy: A Conceptual Overview,
por Laugksch (2000). O livro explanava os diversos significados que esse
conceito recebia, bem como as suas aplicações e interpretações, a partir da
visão de diferentes autores.
Pella, O’Hearn e Gale (1966) considerava um alfabetizado científico quem
tinha conhecimento das relações entre ciência/sociedade, ética, natureza da
ciência; sabia diferenciar ciência de tecnologia; tinha conhecimento sobre
conceitos das ciências e entendia as relações entre as ciências e as humanida-
des. Já os autores Hazen e Trefil (2009) fizeram a diferenciação entre “fazer
Alfabetização científica 3

ciência” e “usar ciência”. Para eles, a sociedade não precisa realizar pesquisa
científica, mas deve compreender como esses conhecimentos são gerados e
como os cientistas trabalham para produzir os dados e interpretá-los. Dessa
forma, o cidadão é capaz de entender os resultados divulgados pela ciência.
Os debates sobre o termo “alfabetização científica” ganharam espaço, nos
Estados Unidos, no final da década de 1950, com a Guerra Fria e a Corrida
Espacial. No período entre as décadas de 1970 e 1980, com a emergência do
Japão e de outros países como potências econômicas, o cenário da ciência e da
tecnologia passou a ser considerado essencial para o crescimento da economia
no mundo (LAUGKSCH, 2000).

Discussões sobre o conceito de alfabetização científica


Os diferentes conceitos de “alfabetização científica”, apesar de divergirem de
acordo com autores e épocas, têm muito em comum. O autor norte-americano
Miller (1983) abrange três eixos: o entendimento da natureza da ciência; a
compreensão dos conceitos-chave das ciências; e a consciência do impacto
da ciência e tecnologia. Fourez (1994) reforça que o ensino de ciências deve
englobar conhecimentos relacionados com a economia política, o social e o
humanista.
Bybee (1995) classifica a alfabetização científica como funcional, concei-
tual/procedimental e multidimensional. Esse autor, diferentemente dos demais,
apresenta esses conceitos voltados para o ensino de ciências com foco na sala
de aula. Assim, a alfabetização científica funcional abrange o vocabulário
de ciências; a conceitual/procedimental é como os educandos interpretam as
informações adquiridas e constroem o conhecimento para o seu cotidiano;
e a multidimensional envolve compreender e analisar todas as relações da
construção da ciência e a sua aplicabilidade na sociedade.
Shamos (1995) divide a alfabetização científica em cultural (construções
da ciência relacionadas à sociedade), funcional (utilização de conceitos para
comunicação, leitura e senso crítico) e a verdadeira (investigação científica).
Chassot (2003) conceitua alfabetização científica como o “conjunto de conhe-
cimentos que facilitariam aos homens e mulheres fazer uma leitura do mundo
onde vivem”, e enfatiza sobre a importância de o cidadão não se limitar a
fazer essa leitura, mas que seja também capaz de compreender e perceber a
necessidade de transformar o mundo positivamente.
O reconhecimento desse conceito como parte da educação voltada para
todos os cidadãos visando à participação nas decisões sociais é sugerido por
Cachapuz et al. (2011). Já os autores Sasseron e Carvalho (2011) realizaram
4 Alfabetização científica

uma revisão bibliográfica sobre o tema e, reunindo todas as informações,


caracterizam o que é uma pessoa alfabetizada científica/tecnologicamente,
de acordo com as seguintes capacidades:

 utilizar conceitos científicos;


 integrar valores e tomar decisões responsáveis no cotidiano;
 entender que a sociedade exerce controle sobre as ciências e as tecno-
logias e estas refletem na própria sociedade;
 reconhecer os limites da utilidade das ciências e das tecnologias para
o progresso do bem-estar humano;
 conhecer os principais conceitos, hipóteses e teorias científicas e ser
capaz de aplicá-los;
 entender que a produção da ciência depende de pesquisas e conceitos
teóricos;
 fazer distinção entre resultados científicos e opinião pessoal;
 compreender que o saber científico é provisório e sujeito a mudanças,
além de depender do acúmulo de resultados;
 considerar a ciência uma visão de mundo mais rica e curiosa.

Para que todos esses objetivos sejam alcançados, é preciso investir na for-
mação do aluno desde as séries iniciais. A formação dos professores também
deve ser constante e atualizada, uma vez que a sociedade, ciência e tecnologia
estão sempre em mudança. É preciso compreender que não é o suficiente
somente ensinar conceitos para que essa mudança de comportamento aconteça;
os valores se fazem importantes, pois se a ciência e a tecnologia nos ajudam
a compreender o mundo, os valores possibilitam a sua melhoria. A melhoria
e a eficiência do ensino de ciências estão, em grande parte, nas mãos do
professor, que deve aproveitar o desejo de conhecimento dos educandos de
agir, de dialogar, de interagir, de experimentar e teorizar (CHASSOT, 2003;
PAVÃO, 2011).
Mais tarde, os autores Viecheneski, Lorenzetti e Carletto (2015) concluem
que o sujeito alfabetizado cientificamente é aquele que pode compreender
quando o ensino da ciência contribui para a compreensão de conhecimentos
e valores. Assim, permitem-se aos estudantes as aplicações da ciência para a
melhoria da qualidade de vida, oportunizando escolhas responsáveis.
Ferreira (2013), por sua vez, usa a expressão “alfabetização científica”
relacionada à escrita e à leitura do texto científico e aquilo que envolve essas
habilidades, promovendo a construção do entendimento e a análise das informa-
ções. Com isso, pode-se afirmar que a alfabetização científica está relacionada
Alfabetização científica 5

diretamente com a alfabetização na própria língua. Nesse contexto, Chassot


(2011) defende que alfabetização científica é o conjunto de conhecimentos que
facilitariam uma leitura do mundo com vistas à sua transformação.

Quando uma área do conhecimento não é fundada no Brasil, normalmente as refe-


rências são em língua estrangeira. Por isso, na língua espanhola, o termo utilizado
é alfabetización científica; na língua inglesa, scientific literacy; na francesa, alpha-
bétisation scientifique; e em português de Portugal, literacia científica. Nos estudos
e publicações brasileiros, diferentes autores utilizam expressões como “letramento
científico”, “alfabetização científica” e “enculturação científica”.
Alguns autores têm preferência pelo termo “letramento científico”, definindo-o
como o resultado da ação de ensinar ou aprender a ler e escrever. Aqueles que
adotam o termo “alfabetização científica” defendem que qualquer pessoa deve ter
a capacidade de organizar o seu pensamento de maneira lógica e contribuir para
a construção de uma consciência mais crítica em relação ao mundo que a cerca.
Os autores que utilizam a “enculturação científica” entendem a ciência como uma
cultura com regras, valores e linguagem própria, e que, paralelamente, o ensino e a
aprendizagem das ciências devem ser planejados, permitindo que os alunos vivam
nesse universo cultural (CUNHA, 2017).

O ensino de ciências e a alfabetização científica


no Brasil
A alfabetização científica ganhou importância no Brasil a partir da década
de 1990. Porém, é preciso considerar que o ensino de ciências no país passou
por muitas mudanças até os dias atuais. Até 1960, o cenário escolar era do-
minado pelo ensino tradicional, o qual se baseava na transmissão e recepção
de conteúdo, e o docente era responsável pela transmissão de conceitos e dos
conhecimentos acumulados.
Com a Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961 — a Lei de Diretrizes
e Bases (LDB) —, houve a ampliação do ensino de ciências no currículo
escolar, que antes estava presente apenas nos dois últimos anos do ginasial
(atualmente o 8º e o 9º ano do ensino fundamental II). Assim, após essa Lei,
essa disciplina passou a ser obrigatória desde os primeiros anos do ginasial
(atualmente 6º ao 9º ano).
6 Alfabetização científica

Nesse sentido, o ensino de ciências passou a desenvolver, junto aos dis-


centes, a sua criticidade, por meio de métodos científicos para a construção
do conhecimento. Ele incluía a observação sistematizada, a investigação
científica e a valorização da participação do aluno, preparando o estudante
para se posicionar frente a decisões, utilizando o pensamento lógico e crítico,
com base nos conhecimentos adquiridos na escola (AZEVEDO, 2008).
A versão da LDB de 1971, na forma da Lei nº 5.692, de 11 de agosto de
1971, tornou o ensino de ciências obrigatório para os primeiros oito anos
do ensino fundamental (BRASIL, 1998). No entanto, o processo de ensino
ainda se pautava na transmissão de conteúdo, em que o aluno era receptor e
o professor era detentor do conhecimento.
Na década de 1980, as questões que envolviam o movimento “Ciência,
tecnologia e sociedade” ganharam mais espaço na educação. Já na década de
1990, havia a busca por um ensino de ciências transformador, participativo e
reflexivo, de maneira a contribuir com a formação do educando. A próxima
LDB, sancionada como Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, consolidava
uma profunda ressignificação do processo de ensinar e aprender. Nela os
conteúdos deixaram de ter importância em si, e passaram a ser compreendidos
como meio para produzir aprendizagem dos estudantes (AZEVEDO, 2008).
Em 1997, o Ministério da Educação implementou um novo modelo curricular,
por meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental,
recomendados para todos os sistemas de ensino. Assim, as ciências passaram
a contribuir para que os educandos compreendam o mundo, bem como as suas
transformações, de modo que reconheçam o homem como parte do universo
e como indivíduo, favorecendo “[...] o desenvolvimento de postura reflexiva,
crítica, questionadora e investigativa [...]” (BRASIL, 1997, documento on-line).
Atualmente, os avanços científicos e tecnológicos têm experimentado um
crescimento acelerado, e a sociedade está em constante transformação — o que
influencia diretamente o ambiente escolar. A escola não é mais vista como um
dos únicos lugares de transmissão de conhecimento: hoje os alunos têm diversos
meios de obter informações (internet, jornais, publicações científicas, aplicativos,
museus de ciências, oficinas de conhecimento, zoológicos, jardins botânicos e
a própria convivência e comunicação com a família, colegas de trabalho, etc.),
levando esses conhecimentos para a sala de aula. Nos dias atuais, o mundo
exterior adentra a escola, e o ensino de ciências deve alcançar níveis intelectuais
mais altos junto aos educandos. O ensino deve superar a mera apropriação de
conceitos e tornar-se questionador e capaz de estimular os alunos a relacionarem
o conhecimento adquirido com o cotidiano, alcançando a alfabetização científica.
Alfabetização científica 7

Veja no link a seguir o vídeo “Alfabetização Científica”, do cientista Neil de Grasse Tyson.

https://qrgo.page.link/XfihA

Linguagem e conceitos do cotidiano


no pensamento científico

Importância da linguagem e do pensamento científico


A alfabetização científica pode potencializar a leitura do mundo. Porém, a
prática escolar é complexa, e para isso os educadores precisam de esforço para
a sua integração no contexto cultural, histórico e político. O conhecimento
científico é essencial para a sociedade moderna, por possibilitar ao indivíduo
uma mudança na qualidade de interação com o mundo, que é influenciado
pelos conhecimentos e produtos da ciência.
A ciência e a tecnologia estão inseridas em um contexto global (não local ou
regional). Exercer a democracia nos dias atuais, para um analfabeto científico,
pode ser comparado a andar com os olhos vendados, sendo conduzido por um
estranho. Seria muito mais difícil para o cidadão, sozinho, discutir, defender
ou condenar algo que não domina e nem compreende, perdendo nesse processo
a sua autonomia de tomar decisões (OLIVEIRA, 2017).
O estudante em processo de alfabetização científica deve ser capaz de
saber muito mais do que reproduzir os conceitos científicos: ele deve estar
preparado para interagir social, tecnológica e culturalmente com o mundo em
que vive. A alfabetização científica oferece a capacidade de compreender como
se constrói o conhecimento científico e entender que ele nunca é definitivo
ou acabado. Assim, o aluno passa a enxergar o sentido da ciência e sentir-se
parte do mundo em que vive (CHASSOT, 2003).
Nesse cenário, o papel do professor é crucial, pois ele é o facilitador do
processo, o qual é eficaz se o docente partir da realidade e do interesse do aluno,
promovendo a construção dos novos conhecimentos e conferindo significado
a eles. Porém, esse processo não é espontâneo; é necessário que o professor
tenha oportunidades e condições de orientar o aluno, criando alternativas
interessantes e significativas (BRASIL, 1997).
8 Alfabetização científica

O conhecimento pode ser construído quando os conhecimentos prévios


forem confrontados, levando ao questionamento, com a mediação do professor,
dando sentido à construção de novos aprendizados. O interesse do aluno pelas
ciências continuará se o tema proposto em sala de aula tiver relação com a
vivência do aluno na sua casa, rua, país e mundo.
É necessário que o professor preste atenção à curiosidade do aluno, pois
tanto essa busca constante por respostas e soluções quanto o desejo de conhecer
devem ser aproveitados e incentivados em sala de aula. O aluno já apresenta
a vontade de entender o mundo, de saber os seus fenômenos, de questionar o
que está vendo e se inserir em uma realidade que é cada vez mais científica e
tecnológica — o que promove a sua alfabetização científica. Logo, o papel da
escola e do professor é estruturar essas informações e oferecer um ensino de
ciências que vai resultar nesse entendimento, independentemente da faixa etária.

O cotidiano do aluno inserido na ciência, tecnologia,


sociedade e meio ambiente
As mudanças climáticas e os problemas ambientais na atualidade têm gerado
muitas discussões relacionadas com o conhecimento científico e a sua influência
nesses temas. Com isso, as reflexões e relações entre ciência, tecnologia e socie-
dade têm sido intensificadas e são cada vez mais necessárias no ambiente escolar.
No ano de 1970, os currículos no ensino de ciências apresentavam os temas
ciência–tecnologia–sociedade. Angotti e Auth (2001) discutem a importância
de reconhecer também as consequências ambientais e, assim, os temas passam
a ser conhecidos como ciência–tecnologia–sociedade–ambiente, que nada mais
é que as inter-relações de ciência, tecnologia e sociedade com as implicações
ambientais. O objetivo central desse ensino na educação é promover a educa-
ção científica e tecnológica para que o aluno possa construir conhecimentos,
habilidades e valores necessários sobre questões de ciência e tecnologia na
sociedade, e atuar na solução e na tomada de decisões (TEIXEIRA, 2003).
Essa abordagem temática pode ser feita a partir da perspectiva de Freire
(1970), pela mediação dos saberes por uma educação com caráter reflexivo e
de arguição da realidade, em que o diálogo inicia a partir da reflexão sobre
contradições básicas de situações existenciais, constituindo uma educação
para a prática da liberdade. Portanto, a contextualização no currículo poderá
ser feita por meio de temas sociais e situações reais articulados de forma
dinâmica, que possibilitem a discussão, transversalmente aos conteúdos e
aos conceitos científicos, de aspectos sociocientíficos ligados a problemática
ambiental, econômica, social, política, cultural e ética. Essa discussão também
Alfabetização científica 9

deve envolver valores comprometidos com o planeta, em busca da preservação


ambiental e da diminuição das desigualdades econômicas, sociais, culturais
e étnicas.
Utilizar a investigação e a experimentação no ensino para estimular o debate
e resolver problemas é uma metodologia que auxilia na alfabetização científica.
Primeiramente, é necessário que os educandos saibam e tenham consciência
do que estão aprendendo e que sejam estimulados a pensar, questionar, deba-
ter, organizar e sistematizar os conhecimentos construídos. O estímulo pode
ter origem em debates, leituras, atividades escritas e artísticas, registros de
observações, etc. Todas essas sugestões dependem da atenção do professor
em promover troca de conhecimentos por meio da participação colaborativa
de todos os envolvidos no processo de ensino–aprendizagem (ABREU, 2008).
O ensino por investigação deve ser utilizado pelo professor, fazendo
com que os alunos sejam estimulados da seguinte forma (SASSERON, 2015):

 com as informações e os dados disponíveis, seja por meio da organi-


zação, da seriação ou da classificação de informações;
 ao levantamento e ao teste de hipóteses construídas, que são realizados
pelos estudantes;
 ao estabelecimento de explicações sobre fenômenos em estudo, buscando
justificativas para torná-las mais robustas e estabelecendo previsões
advindas delas;
 ao uso de raciocínio lógico e proporcional durante a investigação, e a
comunicação de ideias em situações de ensino e aprendizagem.

Esse método em sala de aula distancia o aluno de um ensino mecânico e


promove participação ativa dos educandos. Os experimentos podem ser de-
senvolvidos em laboratórios e oficinas, mas também podem ser entrevistas e
observações de elementos naturais, comparação de paisagens e muitos outros.
As atividades com base em experimentos não são a única alternativa para
o desenvolvimento de uma tarefa investigativa, nem a realização de atividades
não práticas, mas que tenham características investigativas. A alfabetização
científica também pode ser implementada por meio de leitura e escrita, refor-
çando a construção do conhecimento científico, pois aprender a ler e escrever
com textos científicos aumenta a curiosidade e gera questionamentos, argu-
mentos e reflexões. Os textos devem ser desafiadores, e o professor deve se
certificar de que o aluno tenha conhecimentos prévios (assim como no método
de experimentação). Para o ensino de ciências, é imprescindível a leitura e a
interpretação textual, uma vez que os textos científicos trazem explicações,
10 Alfabetização científica

esclarecimentos e contribuições de ciência, tecnologia, sociedade e ambiente


para o mundo. Assim, o educador tem benefícios quando utiliza esse método
(SILVA; SCHWANTES, 2014).
A alfabetização científica primária é necessária para que o aluno seja capaz
de pensar cientificamente desde os anos iniciais, e para que, ao longo do seu
desenvolvimento cognitivo, os seus questionamentos ocorram de maneira mais
clara. Assim, a alfabetização científica nas primeiras séries do ensino básico deve
ser objeto da formação de professores, para que estes sejam capazes de abordar os
temas nas suas aulas e, assim, iniciar esse processo de alfabetizar cientificamente
os seus alunos (CRIADO; GARCÍA-CARMONA; CAÑAL, 2014).
Por meio da sua didática, o professor deve apresentar os conteúdos cien-
tíficos com criatividade, inserindo-os no cotidiano do aluno. Por isso, outro
ponto importante é a formação continuada de professores do ensino de ciências.
A ciência, a tecnologia, a sociedade e o meio ambiente estão em constante
processo de mudança, principalmente nos dias atuais, dentro de uma conjuntura
de globalização e rápida disseminação de informações. Todo esse contexto
deve ser inserido na formação docente, e o educador deve se empenhar para
compreender que a ciência não é somente um conjunto de conhecimentos
científicos teóricos, e sim uma forma de ver e viver o mundo.

Veja no link a seguir o vídeo “Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente”, que discute
as possibilidades de trabalho com essa abordagem.

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Questionamentos e hipóteses no pensamento


científico
A hipótese tem um importante papel na construção e no desenvolvimento
do conhecimento científico. Trata-se de um processo complexo, que pode ter
origem a partir de ideias especulativas, reflexões e até mesmo do imaginário
do aluno. No entanto, é necessário enfatizar que a sua comprovação exige a
persistência em testes e exames que são cruciais para a sua elaboração.
Alfabetização científica 11

No ensino de ciências, a prática científica é composta por três fases: a


criação, a validação e a incorporação de conhecimentos. Essas fases corres-
pondem à formação de hipóteses, aos testes às quais são sujeitas e ao processo
social de aceitação e registro do conhecimento científico (HODSON, 1988).
Para criar e validar uma hipótese científica, é preciso perceber a com-
plexidade do questionamento e compreender a validação dos testes que po-
dem confirmar ou não a pressuposição inicial (hipótese aceita ou rejeitada).
A hipótese no ensino de ciências tem o objetivo de estabelecer um diálogo entre
as teorias e os experimentos com fundamentação teórica. A formulação da
hipótese exige dos alunos grande capacidade criativa, fundamentação teórica
e capacidade crítica, que devem ser mediadas pelo professor. O educador
deve oferecer ferramentas para instigar esse potencial nos alunos e sempre
lembrar que, quando a problemática envolve o cotidiano, o processo é facilitado
(PRAIA et al., 2002).
A atitude de investigação está em todos e precisa ser instigada em diferentes
espaços da escola. Todo estudante é capaz de formular hipóteses, mesmo
que sejam ilusórias. Assim, os professores vão dialogar com essas ideias, e a
intervenção docente em todo o processo será imprescindível. Vale lembrar que
o papel do professor não é dar todas as respostas, mas desafiar esse estudante
com boas perguntas, dentro de um movimento metodológico reflexivo.
O erro (rejeitar a hipótese) é um passo importante nas aulas de ciências,
sendo muitas vezes o motivo que vai levar os estudantes a outras ideias, outras
hipóteses, outras construções e análises sobre o que realmente está relacionado
e interferindo nos fenômenos que estão sendo estudados. É preciso estimular
com perguntas, pois verdades só são verdades até a próxima descoberta. É
isso que o ensino de ciências espera, é o que a sociedade espera do ensino de
ciências: pessoas que compreendam o mundo, atuem nele como cidadãos, com
ética, utilizando o conhecimento científico e tecnológico (PRAIA et al., 2002).

Experimentos e hipóteses em sala de aula


Ao aplicar o ensino de ciências em sala de aula, normalmente pensa-se em
fenômenos naturais regidos por leis universais e conceitos definidos, mas
é preciso perceber que esses fenômenos são complexos. A ciência requer a
obtenção de dados com significado, sendo o desenvolvimento de hipóteses e
a intervenção experimental fundamentais como meio capaz de gerar conhe-
cimentos relevantes e necessários. O “investigador” nunca experimenta ao
acaso, ele é guiado por uma hipótese “lógica”, que submete à experimentação
(CHALMERS, 1989; SANTOS; PRAIA 1992).
12 Alfabetização científica

A relação da ciência com o ensino por investigação utiliza estratégias de


ensino como forma de promoção da alfabetização científica, aplicando instru-
mentação e métodos como questionários, palestras, atividades experimentais
e pesquisas descritivas (RAMOS; SÁ, 2013). A experimentação científica
não deve funcionar no sentido da confirmação das hipóteses, mas no sentido
da retificação dos erros contidos nessas hipóteses. Isso exige uma grande
preparação teórica e técnica, precedida e integrada num projeto que a orienta.
A reflexão dos resultados pode vir de outro saber ou gerar novas perguntas.
Nesse contexto, a aprendizagem baseada em investigação tem estado presente
em estratégias para o ensino de ciências, permitindo atividades de experimentação
prática e investigação (PEDASTE et al., 2015). Nas fases da investigação, existem
várias etapas e caminhos, como você pode ver na Figura 1. Pode-se seguir três
estratégias: 1) orientação, questionamento, exploração, interpretação de dados
(possibilidade no ciclo de voltar ao questionamento) e conclusão; 2) orientação,
geração de hipóteses, experimentação, interpretação de dados (possibilidade de
retornar ao ciclo das hipóteses) e conclusão; e 3) orientação, questionamento,
geração de hipóteses, experimentação, interpretação de dados (possibilidade no
ciclo de voltar ao questionamento ou geração de hipóteses) e conclusão.

Discussão
Orientação

Orientação
Conceitualização

Questionamento Hipóteses
Comunicação

Reflexão
Exploração Experimentação
Investigação

Interpretação
de dados
Conclusão

Conclusão

Figura 1. Estrutura de aprendizagem baseada em investigação.


Fonte: Adaptação e tradução de Pedaste et al. (2015).
Alfabetização científica 13

A experimentação como recurso problematizador torna a sala de aula um


espaço proveitoso para o enriquecimento das teorias sobre os processos das
ciências. Além disso, as relações interpessoais entre professor e alunos são
favorecidas, uma vez que o diálogo é estabelecido e o aluno deixa de ser um
expectador das aulas em que o professor é o único detentor do conhecimento,
passando a questionar, pensar, argumentar, agir e inferir (SOUZA; RODRI-
GUES; RAMOS, 2016). Dessa forma, a escola tem um papel fundamental de
proporcionar ao educando o acesso ao conhecimento, fazendo com que ele
conheça e dialogue com as diversas concepções no meio em que vive. Cabe à
instituição escolar abordar temáticas na perspectiva da alfabetização científica,
fornecendo informações relevantes aos seus educandos, de forma que eles
possam construir os seus conhecimentos e a sua identidade.

Leia o artigo “Ferramenta teórico-metodológica para o estudo dos processos de


Alfabetização Científica em ações de educação não formal e comunicação pública da
ciência: resultados e discussões”, publicado pelo Journal of Science Communication
– America Latina.

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anais2015/resumos/R0409-1.PDF. Acesso em: 17 jun. 2019.

Leitura recomendada
MARANDINO, M. et al. Ferramenta teórico-metodológica para o estudo dos processos
de alfabetização científica em ações de educação não formal e comunicação pública
da ciência: resultados e discussões. Journal of Science Communication – América Latina,
[s. l.], v. 1, n. 1, 2018. Disponível em: https://jcomal.sissa.it/sites/default/files/documents/
JCOMAL_0101_2018_A03_pt.pdf. Acesso em: 17 jul. 20109.
ESTUDOS
CONTEMPORÂNEOS
EM DESIGN DE JOGOS
E ENTRETENIMENTO
DIGITAL

Rafael Marques Albuquerque


Gamificação: conceito
e aplicação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Conceituar gamificação.
 Identificar as ferramentas mais comuns de gamificação.
 Explorar casos específicos de gamificação.

Introdução
Os jogos estão presentes em muitas culturas, formando contextos em que
impulsos intensos dos participantes podem ser trabalhados. Muitos refle-
tiram sobre como essa poderosa motivação lúdica poderia ser canalizada
para outros fins, de forma a conciliar o prazer e o estímulo dos jogos com
algum outro tipo de resultado. Esse conceito de aplicação da estrutura
dos jogos em contextos alheios a eles recebe o nome de gamificação.
Neste capítulo, você vai aprender sobre o conceito de jogo, não
apenas sua definição básica, mas ideias anteriores que apontavam para
uma direção similar, e algumas das críticas que foram feitas a essa noção.
Além disso, aprenderá um pouco sobre ferramentas de gamificação, ou
seja, alguns dos conceitos-chave dos jogos que podem ser transpostos
para outros contextos. Por fim, dois casos concretos ilustrarão a gama de
atividades que podem ser modificadas por meio da gamificação.

O conceito de gamificação
O termo gamification, do inglês, pode ser traduzido em português como gamifica-
ção, ou ludificação. Sua ideia essencial é relativamente simples, como conceituam
Deterding et al. (2011, p. 2, tradução nossa), “[...] é o uso de elementos de game
design em contextos que não sejam de jogo”. Em outras palavras, gamificação
2 Gamificação: conceito e aplicação

é a utilização da estrutura, lógica, linguagem e sistema de jogos em contextos


diversos, que não são jogos, como educação, marketing, local de trabalho, etc.
Para ilustrar o que a gamificação pode fazer e como funciona, vejamos um
exemplo. O Google Maps usou a gamificação para enriquecer seus mapas pela
contribuição de usuários comuns, conforme descreve Yvkoff (2015, documento
on-line, tradução nossa): “Usuários se cadastram como guias locais [...] e co-
meçam a preencher o mapa com lugares, fotos, atualizações de informações ou
dicas. Cada lugar concede aos guias locais de um a cinco pontos”. Com esses
pontos, os usuários conquistam novos níveis, e a cada nível novas vantagens
são oferecidas. Dessa forma, mediante pequenas premiações, sensação de
progressão e medalhas motivacionais, a Google conseguiu popular seu website
com uma quantidade imensa de informação útil baseada no conhecimento de
moradores locais, por um pequeno valor. A função essencial da gamificação é
justamente motivar pessoas a fazerem coisas que, sem esse sistema motivador,
elas não fariam, ou fariam menos.
Embora o termo seja recente — seu primeiro uso data de 2008, mas se
difundiu somente por volta de 2010 (DETERDING et al., 2011) — as ideias
que sustentam o conceito não são tão novas. A percepção de que jogos re-
presentam poderosas ferramentas de motivação levou pensadores a buscar
maneiras de canalizar esse seu poder para outros fins, considerados “mais
úteis”. Um desses exemplos é o famoso livro de James Paul Gee (2007) What
video games have to teach us about learning and literacy, publicado origi-
nalmente em 2003. Inspirado pela prática de jogos digitais de seu filho, Gee
(2007) percebeu que os jogos utilizavam teorias didáticas de forma mais
inteligente do que normalmente associamos a nossos sistemas educacionais.
Seu livro descreve 36 princípios de aprendizagem que os jogos utilizam de
forma a tornar a experiência do usuário mais completa, e sugere que sistemas
escolares deveriam se inspirar nessa estrutura dos jogos digitais para melhorar
seu ensino. Em outras palavras, Gee está propondo que deveríamos observar
os jogos para buscar formas de melhorar nosso sistema educacional — não
mediante jogos educativos em si, mas pela forma de estruturar a experiência
que os jogos utilizam. Conceitualmente, a proposta de Gee pode ser comparada
com o conceito de gamificação.
Outras comparações são possíveis. O famoso livro de Mihaly Csikszent-
mihalyi (1990), Flow: the psychology of optimal experience, é amplamente
utilizado na área de game design como uma forma de compreender os fatores
que induzem um usuário à experiência de imersão, ou fluxo, assim como um
aprofundamento na compreensão deste estado cognitivo. O que é frequentemente
deixado de lado é que Csikszentmihalyi não estava escrevendo para embasar
Gamificação: conceito e aplicação 3

projetos de jogos. Seu objetivo era que pessoas comuns pudessem compreender
as condições que lhes permitem alcançar estados de felicidade — objetivos
claros, atividades moderadamente desafiadoras, etc. Ao compreender o que
torna uma atividade prazerosa, o indivíduo poderia então utilizar esse enfoque
em outras áreas de sua vida — na vida conjugal, na profissão, etc. — de forma
a criar experiências prazerosas inspiradas em jogos em outros momentos de sua
vida. Csikszentmihalyi (1990) defendia essa abordagem não apenas para que o
indivíduo sentisse motivação e prazer ao realizar suas atividades, mas também
porque esse estado de fluxo imersivo constitui um estado de intensa capacidade
humana. É o ponto de encontro entre prazer e eficiência, a experiência otimizada
de que somos capazes. De certa forma, ao propor que cada um de nós poderia
transferir um enfoque similar ao dos jogos para outros contextos de forma a
buscar motivação e contentamento, Csikszentmihalyi (1990) poderia ser visto
como uma espécie de precursor da gamificação. Porém, ele estava propondo
que o indivíduo ludifique a própria vida, e não que alguém faça isso por ele,
como normalmente se entende a gamificação.
Ideias similares podem, no entanto, ser encontradas em passados ainda mais
remotos. Especialmente quando aplicada a postos de trabalho, a gamificação
pode ser comparada às ideias da administração científica taylorista (DEWIN-
TER; KOCUREK; NICHOLS, 2014), que começaram a se difundir no início
do século XX, buscando gerar contextos onde trabalhadores alcançariam a
máxima eficiência produtiva. Podemos resgatar ideias análogas ainda mais
distantes no passado, ao compararmos a gamificação com pressupostos da
psicologia comportamental, que ganhou força no final do século XIX. Nessa
perspectiva, o comportamento humano poderia ser composto por pequenas
partes, de forma que o comportamento final do indivíduo poderia ser modelado
com precisão. Assim, ao perceber quais mecanismos de um sistema aumentam
a motivação do usuário, basta manipulá-los de forma a induzir o usuário a fazer
o que se deseja. Assim como as primeiras escolas comportamentalistas foram
criticadas por conceberem o ser humano de forma simplória, considerando
apenas seu comportamento e comparando-o aos dos animais, também é justo
argumentar que sistemas gamificados tendem a manipular o comportamento
humano como se adestra um animal, sem que haja uma conscientização e
autonomia mais profunda do ser humano no modo como ele lida com suas
atividades. Podemos interpretar que a novidade do conceito de gamificação,
quando comparado com movimentos anteriores que possuem certo alinha-
mento, é que sistemas gamificados consideram explicitamente a experiência
do jogo como a base para construir experiências motivadoras que dialogam,
portanto, com as teorias de game design.
4 Gamificação: conceito e aplicação

As técnicas de gamificação podem ser poderosas, e são uma ferramenta


que pode abrir novas perspectivas e oportunidades para profissionais que
concebem e trabalham com jogos. Contudo, é importante que profissionais
responsáveis desenvolvam uma perspectiva crítica sobre o assunto, percebendo
as implicações da técnica para os indivíduos e para a sociedade como um todo.
De acordo com Mattar (2018, p. 183):

Como a gamificação é uma estratégia persuasiva que, portanto, pode in-


fluenciar o comportamento dos alunos, usuários e consumidores, possui, por
consequência, uma dimensão moral, o que obriga os designers da gamificação
a incorporar a ética em seus processos.

Mas quais seriam essas questões éticas a serem problematizadas pelos profis-
sionais da área? A princípio, projetar sistemas que tornem atividades banais ou
desagradáveis em desafios interessantes pode parecer algo irrestritamente posi-
tivo. Uma das críticas feitas à gamificação, sobretudo no contexto do ambiente
de trabalho, é seu potencial de aumentar ainda mais a exploração do trabalhador.
Dewinter, Kocurek e Nichols (2014) salientam que a gamificação no contexto
laboral normalmente visa o aumento da produtividade e, portanto, a elevação
da produção e dos ganhos aos donos das empresas. O prazer e o bem-estar do
trabalhador são uma ferramenta para o aumento da produtividade, o que não
significa melhores condições trabalhistas — como ocorreria com a diminuição
das horas de trabalho, mais períodos de pausa e descanso, remuneração digna
etc. Na pior das hipóteses, podem até piorar a vida do trabalhador. Sistemas
gamificados de trabalho podem criar um imperativo de pressão e competição
sobre a produtividade ainda mais avassalador sobre os funcionários.
Imagine-se trabalhando em uma função repetitiva e cansativa, com todos
seus colegas produzindo muito mais por estarem envolvidos em sistemas
gamificados. Rapidamente isso fará com que a sua meta de produção também
aumente, levando-o a se envolver com a atividade gamificada mesmo que você
não queira, para tentar produzir tanto quanto seus colegas, encantando-se com
medalhinhas e rankings de desempenho. Mesmo que essas ferramentas não
aumentem a sua motivação própria — nem todo mundo possui um “espírito
competitivo” — agora o patamar de exigência de produção já aumentou. No
final, nesse contexto fictício, a gamificação serviu para tornar a condição de
trabalho mais degradante, e não mais divertida, como se poderia imaginar em
uma visão mais ingênua. É nesse sentido que as críticas de Dewinter, Kocurek
e Nichols, assim como de outros autores, podem servir como um ponto de
reflexão sobre situações sinistras engendradas pela gamificação.
Gamificação: conceito e aplicação 5

Em uma perspectiva mais distópica, os autores alertam ainda para a des-


truição da noção de “círculo mágico” dos jogos. A perspectiva dos jogos como
contextos envoltos em um círculo mágico foi descrita por Johan Huizinga
(2012). Para ele, diferentes culturas manifestam jogos, e normalmente há
uma aura especial sobre eles. O círculo mágico delimita a área do jogo, onde
tudo é regido por regras próprias, incluindo seu objetivo lúdico e separado do
trabalho. Dewinter, Kocurek e Nichols (2014) questionam se a gamificação
não pode dissolver esse limite entre o trabalho e diversão, de forma que a aura
dos jogos e do lazer perca seu sentido, ou ainda pior, que diversão e trabalho
passem a se confundir, em detrimento das experiências de lazer e diversão.
Buckingham e Scanlon (2003), ao tratar de jogos educativos, demonstram a
preocupação de que o espaço de lazer seja colonizado pela lógica produtivista,
de forma a retirar a legitimidade dos jogos puramente para entretenimento.
De modo similar, um movimento progressivo de gamificação das atividades
humanas pode misturar trabalho e diversão de uma maneira que poucas cul-
turas parecem manifestar, criando uma armadilha como a seguinte reflexão
ética: “por que eu deveria desperdiçar tempo simplesmente me divertindo se
posso me divertir enquanto também consigo ser produtivo de alguma forma?”.
Essa mentalidade poderia, hipoteticamente, destruir o prazer do ócio ou das
atividades descompromissadas, sem ambição e frívolas, que fazem parte de
nossa existência.
Visões críticas sobre a gamificação não precisam ser fatalistas, decretando
que ela sem dúvida levará a uma perda de legitimidade das atividades pura-
mente lúdicas e a novas formas de exploração do trabalho. Mais adequado seria
seguir a proposta de Mattar (2018) sobre a importância da reflexão ética dos
profissionais nessa questão. A gamificação é, de certa forma, uma estratégia
para manipular a motivação de seres humanos e induzi-los a se comportarem de
certas formas. Embora possa trazer benefícios, é importante que não se perca de
vista a condição humana dos usuários, bem como suas necessidades e desejos.

Elementos de gamificação
As técnicas de gamificação variam bastante, já que podem abranger uma
variedade de características absorvidas do game design. Elas variam desde
apropriações mais estéticas — como badges — até questões mais amplas,
como a metodologia de desenvolvimento de jogos. Neste capítulo, alguns
desses elementos serão discutidos; porém, uma descrição exaustiva incluiria
a quase totalidade da literatura sobre game design.
6 Gamificação: conceito e aplicação

Um dos conceitos mais essenciais em game design é o de recompensa.


A sensação de recompensa ativa um dos mecanismos mais simples que temos
de prazer. Schell (2011, p. 191) descreve como um bom sistema de recompensas
pode ser gratificante, mesmo quando artificial:

Há uma tendência de que, quanto mais recompensas as pessoas recebem, mais


se acostumam a isso, e o que era gratificante há uma hora agora não representa
muita coisa. Um método simples que muitos jogos utilizam para superar isso
é gradualmente aumentar o valor das recompensas à medida que o jogador
vai avançando no jogo. De certa forma, esse é um truque grosseiro, mas fun-
ciona — mesmo quando você sabe que o designer utiliza e por que o utiliza.

O sistema de recompensas é um fator muito importante para se conceber um


sistema gamificado. As recompensas podem ser mais superficiais, como badges
ou medalhas, que são dadas para valorizar cada conquista do usuário. Essas
medalhas podem ser simples, conforme os usuários avançam em uma progressão
relativamente linear, ou mais complexas, de forma que o jogador pode colecionar
medalhas de acordo com sua trajetória. Nesse caso, o sistema pode incorporar
elementos de customização, o que também o enriquece. Schell ainda ressalta
outros tipos de recompensa simbólica, como elogios, pontos, gratificação estética
de algum tipo (visual e/ou auditiva) e oportunidade de expressão pessoal — como
escolher itens cosméticos. Recompensas podem ganhar uma atração especial se
forem parcialmente aleatórias. Ou seja, em vez de recompensas fixas e previsíveis,
pode-se criar recompensas com variações aleatórias e imprevisíveis, de forma
que o usuário fique motivado a saber o que encontrará na próxima vez que for
recompensado. Schell (2011, p. 191) explica esse fenômeno:

Uma boa maneira de evitar que os jogadores se acostumem com as recompensas


é torná-las variáveis em vez de fixas. Em outras palavras, se cada monstro
que você derrotar lhe der 10 pontos, isso se torna previsível e entediante bem
rapidamente — mas se cada monstro que você derrotar tiver uma probabilidade
de 2/3 de lhe dar zero ponto e uma probabilidade de 1/3 de lhe dar 30 pontos,
isso continua sendo recompensador por muito mais tempo, embora você, em
média, distribua o mesmo número de pontos.

Além de recompensas meramente simbólicas, há também formatos mais


significativos. Um exemplo é o modelo do Google Maps descrito anteriormente,
que oferece recompensas na forma de vantagens dentro do sistema Google — tal
como mais espaço de armazenamento ou outros recursos. Essas recompensas
são chamadas de exógenas, pois são algo que o usuário usa fora do sistema.
Gamificação: conceito e aplicação 7

Em um sistema de trabalho, pode haver remuneração; em um sistema de


aprendizagem, o educando pode ser recompensado com nota.
Porém, há recompensas que são endógenas e significativas, ou seja, ofere-
cem vantagens ao usuário de forma prática — não apenas cosmética e simbólica
— dentro do próprio sistema. Para criar um sistema assim, provavelmente o
usuário terá, de início, acesso a uma versão limitada, de modo que novos tipos
de ação e bônus vão sendo habilitados conforme o usuário avança. Vejamos
um exemplo disso num sistema gamificado de ensino a distância. Digamos
que, depois de acumular alguns pontos, o usuário ganhe a chance de responder
uma segunda vez ao errar uma pergunta. Em outro exemplo, o aluno poderia
ganhar a opção de acessar os conteúdos de unidades anteriores. Nesses casos,
o próprio sistema criaria limitações iniciais — impedir que o usuário veja
os conteúdos passados, ou definir que o usuário tenha apenas uma chance
de responder cada questão — para em algum momento futuro habilitar essa
função e provocar a sensação de recompensa e progressão. Essas limitações
que vão sendo progressivamente desbloqueadas costumam ser de especial
interesse quando o sistema é complexo e essa apresentação gradual de novas
ferramentas é útil para que o jogador aprenda aos poucos todas as funções do
jogo — já que sistemas mais complexos podem ser difíceis de serem aprendidos
com todas as suas ferramentas habilitadas desde o início.
Outras limitações típicas de jogos também podem ser impostas como forma de
criar uma sensação de dificuldade e ao mesmo tempo de gerar oportunidades de
recompensa ao posteriormente eliminar algumas dessas dificuldades. Exemplos
disso seriam um tempo limitado para realizar determinadas ações (com a oferta
posterior de tempo extra como recompensa) ou recursos limitados para realizar
uma atividade específica (de forma que novos recursos tornem-se recompensa).
Ao contrário da mentalidade tradicional da usabilidade de sistemas que tende
a facilitar ao máximo a experiência do usuário, a perspectiva lúdica exige a
criação de dificuldades intencionais (CYBIS; BETIOL; FAUST, 2015). Trata-
-se de um equilíbrio entre criar dificuldades crescentes e oferecer chances de
superá-las de maneira progressiva e equilibrada. Em sistemas gamificados em
que há interesse na produtividade do usuário (como para um representante de
vendas cuja função é gamificada), esse equilíbrio entre facilidade e dificuldade
é ainda mais delicado, já que qualquer dificuldade criada possui o risco de
prejudicar o objetivo final de aumentar a produtividade. Nesse sentido, alguns
sistemas gamificados optam por não criar dificuldades novas, mas apenas usar
da competição, mediante rankings e ferramentas similares. Dessa forma, mesmo
que a atividade seja fácil, ela se torna difícil ao se competir com outro usuário.
8 Gamificação: conceito e aplicação

Criar um sentido de progressão é uma ferramenta útil para manter o interesse


do usuário. Além de recompensas, uma das principais ferramentas de game
design é a organização progressiva da dificuldade. É o ponto central da teoria de
Csikszentmihalyi (1990) para que uma atividade seja imersiva e prazerosa. Existem
formas de progressão reais, em que o nível de habilidade e conhecimento do usuário
aumenta conforme a dificuldade se eleva. Embora seja o sistema ideal, nem sempre
é possível fazê-lo sem a inclusão de muitos impedimentos artificiais ao usuário, o
que pode ser penoso para o sistema. Dificuldades criadas artificialmente podem
diminuir a produtividade do usuário, ou ainda fazê-lo desistir se forem muito
árduas. Dessa forma, a progressão de habilidade virtual pode ser uma solução
menos poderosa, mas ainda com valor: o sistema não requer mais habilidade do
usuário, mas exige mais pontos conquistados previamente. Assim, mesmo sem a
progressão de habilidade real, há uma sensação de progressão.
Uma das mais poderosas ferramentas de entretenimento é a decisão signifi-
cativa (SALEN; ZIMMERMAN, 2004). Quando o usuário pode tomar decisões
dentro de um sistema de acordo com sua preferência, ele se sente agente de
sua experiência. Decisões significativas são aquelas que não são óbvias e que
parecem ter alguma relevância. Em jogos tradicionais, pode-se criar decisões
significativas interessantes por meio da narrativa (digamos, qual dos personagens
você prefere incluir em seu grupo: o herói arrogante ou o ex-criminoso?) ou
por meio das estratégias de jogo (por exemplo: é melhor investir em tropas de
cavalaria, mais ágeis e efetivas contra soldados, ou em armas de cerco, lentas e
efetivas contra construções?). Em sistemas gamificados, no entanto, muitas vezes
a variação das formas de interagir oferecidas ao usuário são mais limitadas, de
forma que decisões significativas podem focar em ferramentas mais simples,
como a customização cosmética. Um exemplo disso é o programa Fitness Bo-
xing para Nintendo Switch, publicado pela Imagineer em 2018. Embora possa
ser considerado um jogo — um exergame, jogo cujo objetivo é que o usuário
pratique exercício físico — ele é um programa que situa-se nessa área nebulosa
entre jogo e sistema gamificado. Além de oferecer opções de customização,
como a duração de cada treino e as partes do corpo que você quer enfatizar,
também oferece customização estética, pois você pode escolher um dentre vários
treinadores e editar sua vestimenta. A customização cosmética é organizada
de forma progressiva, assim como a dificuldade, pois os itens de vestuário são
liberados aos poucos, funcionando também como recompensa.
As estratégias mencionadas até aqui — recompensa, progressão e custo-
mização — podem ser potencializadas com a possibilidade de socialização e
competição. Para ilustrar o poder motivacional da competição, podemos lembrar
do que aconteceu com o Space Invaders, de 1978, um dos primeiros jogos de
Gamificação: conceito e aplicação 9

fliperama a adotar um sistema de placar em que as melhores pontuações eram


exibidas ao longo do dia. As pessoas jogavam tanto que chegou a faltar moedas de
100 ienes no Japão (LUZ, 2010). Embora Space Invaders tenha outros elementos
inovadores, provavelmente a possibilidade de superar desafios difíceis e exibir
suas iniciais para os outros contribuiu para seu sucesso. Embora a competição —
na forma de placares ou outras ferramentas — seja uma solução simples e óbvia
para sistemas gamificados, sistemas cooperativos também podem representar
poderosas ferramentas motivacionais. Sites de compras, por exemplo, podem
recompensar comportamentos colaborativos, como escrever reviews sobre
produtos ou avaliar a qualidade de reviews já postados, de forma a motivar
todos os usuários a criarem uma espécie de inteligência coletiva e colaborativa.
Uma das ferramentas mais poderosas para fazer com que um usuário
fique motivado a permanecer no sistema — especialmente se houver uma boa
combinação de recompensas e progressão — é o objetivo. Objetivos claros são
importantes para direcionar a vontade do usuário. Schuytema (2008) sugere
utilizar o que ele descreve como vitórias aninhadas. Trata-se de construir vários
objetivos (cuja concretização seja recompensadora) e espalhá-los de forma que
em qualquer momento da experiência o usuário esteja prestes a conquistar um
objetivo. Como é difícil para o usuário abandonar o jogo quando ele está quase
cumprindo uma meta, essa dinâmica de objetivos pode realmente impulsionar
o usuário a jogar mais e mais.
Finalmente, Deterding et al. (2011) lembra que não são apenas as características
formais dos jogos, como as descritas até aqui, que podem ser usadas em contextos
alheios aos jogos em si. Há ainda possibilidades de usar, segundo os autores, mode-
los teóricos utilizados por game designers para compreender a experiência — como
o modelo mechanics-dynamics-aesthetic (MDA), ou mecânica-dinâmica-estática
— ou aspectos metodológicos do desenvolvimento de jogos, como prototipagem,
validação e sessões de playtest. Nesse sentido, podemos considerar que profis-
sionais que entendem a indústria dos jogos poderiam aplicar uma variedade de
ferramentas e modos de pensar para criar experiências gamificadas, não apenas
no produto em si como também na forma de pensar e agir.

Estudo de casos gamificados


A noção de gamificação é bastante ampla e abrange uma variedade de formas de
aplicação. Neste capítulo, dois exemplos diferentes serão descritos, como forma
de ilustrar diferentes aplicações. Como os sistemas gamificados têm objetivos
que vão além do entretenimento, podemos encarar um sistema gamificado como
10 Gamificação: conceito e aplicação

uma solução para um problema do mundo real. Essa perspectiva aproxima-se


das visões clássicas do design, como o design de produtos e design gráfico,
pois o sistema gamificado é um projeto que visa resolver um problema. Nesse
sentido, descreveremos os dois casos como formas de solucionar problemas.
O primeiro caso envolve um website chamado Chore Wars (Figura 1),
criado por Kevan Davis e publicado em 2007. Embora possa ser considerado
um sistema gamificado, ele é um dos muitos casos que poderiam ser con-
siderados um jogo em si; McGonigal (2011) denomina-o como um jogo de
realidade alternativa. O problema que ele visa resolver é a preguiça ou falta
de motivação de pessoas comuns para realizar tarefas domésticas, como lavar
o banheiro ou colocar o lixo para fora. O website tenta, portanto, transformar
uma atividade rotineira em algo interessante, por meio do sistema gamificado.

Figura 1. Captura de tela do website de Chore Wars, lançado em 2007.


Fonte: Chore... ([2019], documento on-line).

Para jogar, os jogadores criam suas contas e cadastram as atividades que


precisam ser feitas, como lavar a louça ou varrer o chão, indicando os pontos
de experiência usados como recompensa para cada atividade (o sistema sugere
1 ponto de experiência por minuto, em média, que uma atividade demora para
Gamificação: conceito e aplicação 11

ser completada). Quando os usuários realizam as tarefas no mundo real, eles


registram seu feito no sistema e acumulam os pontos, passando de nível a
cada 200 pontos acumulados. Eis a seguir uma lista com alguns dos recursos
utilizados pelos designers de Chore Wars para criar esse sistema:

 Recompensa e punição: há obviamente a recompensa simbólica de


pontos de experiência e níveis, que representam recompensas cosmé-
ticas. O website também mostra imagens de um combate inspirado em
um contexto de fantasia medieval para ilustrar cada vitória, mas ainda
se trata de um efeito cosmético. No entanto, o sistema sugere que os
jogadores criem recompensas no mundo real para aqueles que obtive-
rem mais pontos — um grupo de amigos que divide apartamento, por
exemplo, pode decidir que quem consegue a maior pontuação com as
atividades domésticas não precisa pagar a cerveja no fim de semana.
Há também a sugestão oposta, para que o grupo negocie que a pessoa
que obtiver menos pontos — e, portanto, que menos colaborou com a
limpeza da casa — possa ser punida na forma de atribuições extras.
Digamos, por exemplo, que o grupo precisa que algo especial seja feito,
como montar um guarda-roupas. A pessoa que tiver a menor pontuação
pode ser designada para a função, de forma a compensar pela menor
participação nas atividades rotineiras.
 Progressão e customização: nesse sistema, a progressão mescla-se
com a customização. Os tipos de atividade desempenhadas definem
os tipos de atributos que um personagem ganha ao avançar de nível.
Digamos, por exemplo, que as tarefas realizadas sejam mais físicas: o
personagem ganha mais força e acaba tornando-se um guerreiro; para
atividades mais mentais, o personagem ganha mais pontos de inteli-
gência e torna-se um mago, etc. Dessa forma, embora o usuário não
possa escolher sua classe livremente, ele pode escolher quais tarefas
realizar para se expressar como bem preferir por meio do jogo, com
uma classe de personagem de sua preferência.
 Socialização: o jogo utiliza um dos recursos mais comuns de sistemas
gamificados, que é um placar mostrando os resultados semanais, disponível
a todos os usuários. Dessa forma, o desempenho de cada um torna-se
público, alimentando o senso de competição dos usuários — e, possivel-
mente, também o senso de colaboração, já que menos pontos significa que
a pessoa está colaborando menos com o interesse coletivo, compelindo-a a
ajudar o grupo ao perceber que está deixando a desejar frente aos demais.
12 Gamificação: conceito e aplicação

 Controle: embora o principal motivo para gamificar um sistema seja


aumentar a motivação dos usuários, às vezes existem outros objetivos
— sejam eles primários ou secundários. Nesse caso, um benefício se-
cundário do sistema poderia ser o registro e a organização das atividades
domésticas realizadas, de forma a manter o controle. Isso pode envolver,
por exemplo, quantas vezes por mês o banheiro está sendo limpo ou
com que frequência as pessoas da casa estão pedindo tele-entrega. Esse
registro pode ajudar o grupo a perceber sua rotina e propor mudanças
no funcionamento da casa.
 Dificuldade: nesse caso, o jogo não cria novas dificuldades aos usuá-
rios, pois a dificuldade é a própria realização da tarefa fora do sistema
do jogo. Porém, o sistema cria limitações aos usuários — como, por
exemplo, só poder visualizar as atividades realizadas por um usuário
nos últimos sete dias, mas não as atividades anteriores. Essa restrição
poderia ser utilizada como forma de recompensar usuários que obtêm
mais pontos com essas funções aprimoradas do jogo. No entanto, nesse
caso o designer utilizou essas restrições como estratégia de monetização.
Ao pagar 10 dólares, o usuário ganha uma conta gold permanentemente,
de forma que serão excluídas as restrições e também as propagandas,
sua outra estratégia de monetização.

Como fica claro no exemplo de Chore Wars, embora haja algumas instâncias
mais típicas de uso de sistemas gamificados, eles também podem ser utilizados
de forma criativa para instâncias especiais, como tarefas domésticas. No caso
de problemas diversos que existem na sociedade, a gamificação pode ser uma
estratégia para resolvê-los, especialmente quando a questão da motivação dos
usuários representa um elemento-chave para a solução.

Há uma variedade de situações que podem ser resolvidas pela aplicação de sistemas
gamificados. Mattar (2018) demonstra isso ao exemplificar aplicações, cujos contextos
incluem:
 Local de trabalho
 Educação presencial
 Educação a distância
 Comércio
Gamificação: conceito e aplicação 13

 Saúde
 Gerenciamento de atividades
 Sustentabilidade
 Ciência por crowdsource
 Conteúdo gerado por usuários para programadores
 Nutrição
 Turismo
 Capacitação e treinamento
 Museologia

O segundo caso a ser analisado neste capítulo é o caso do programa ProVi-


Tao, descrito em González et al. (2016). O problema que o sistema visa resolver
são as práticas pouco saudáveis dos usuários, especialmente crianças, e em
particular a obesidade infantil. É interessante perceber como neste caso a ideia
da gamificação foi implementada em um programa amplo de atividades, de
forma a envolver vários profissionais em diversas etapas. Este exemplo visa
ilustrar como sistemas de gamificação podem ser relativamente simples, como
o Chore Wars, ou estar imersos em um programa maior, como o ProViTao.
O programa ProViTao envolve profissionais de diversas áreas, assim como
crianças e seus pais e responsáveis, em um programa de atividades que segue
o calendário escolar e que possui acompanhamento individual de longo prazo.
O objetivo é a construção de hábitos saudáveis pelas crianças.
Os profissionais que acompanham os participantes sugerem atividades
diversas a serem realizadas tanto nos encontros presenciais quanto em casa,
incluindo jogos educativos sobre hábitos saudáveis ou exergames, e a exe-
cução dessas atividades gera pontos e insígnias que são contabilizados em
uma classificação geral. Essa classificação faz com que o participante possa
progredir entre os estágios, liberando partes de uma narrativa.
Percebe-se que o sistema, portanto, combina uma variedade de iniciativas, como
atividades a serem executadas em casa de maneira autônoma, encontros presenciais
e encontros por videoconferência. Também há um momento com atividades pré-
-definidas, e momentos em que os usuários precisam criar seus próprios projetos
de mudança pessoal, e seu desempenho recebe acompanhamento pela equipe.
O aplicativo criado para complementar o sistema gamificado (chamado ProViTao
App) tem a função de agrupar atividades e jogos educacionais, registrar os acon-
tecimentos e promover a comunicação entre os participantes — de forma que os
médicos possam, por exemplo, monitorar e fazer perguntas para as crianças pelo
aplicativo. Um dos jogos embutidos no aplicativo controla os passos do usuário, de
forma que ele recebe missões para “encontrar dragões perdidos” que estão a uma
14 Gamificação: conceito e aplicação

certa distância, estimulando a criança a caminhar mais. Outro jogo envolve uma
espécie de mapa do tesouro, em que locais de interesse para criação de hábitos
saudáveis, como praças e restaurantes de comida saudável, ficam marcados no mapa
local. Usando um sistema de geolocalização, o programa percebe e recompensa
quando o usuário explora esses locais de interesse.
Como se trata de um tema delicado, as atividades — normalmente recompensa-
das — são incluídas de forma não apenas a criar hábitos saudáveis, mas a pensar a
questão da autoestima, que está relacionada, assim como a resistência a mudanças,
um fator determinante na criação de hábitos. Nesse caso, pode-se perceber como,
de certa forma, um sistema gamificado é uma estratégia de manipulação do
usuário, de forma que uma compreensão psicológica mais ampla do que apenas
a motivação possa ser importante para criar um sistema responsável e eficaz.
Sendo assim, sistemas gamificados podem ser utilizados em uma ampla
variedade de contextos, e podem envolver estruturas mais simples, em que
um grupo de pessoas decide participar, editando por conta própria as funções
jogáveis, até um amplo sistema com a participação de profissionais de diver-
sas áreas. A descrição exata de quais recursos serão utilizados em casa caso
depende de uma análise cuidadosa de como os elementos de jogo podem ser
melhor adaptados a um sistema para que os objetivos sejam cumpridos da
melhor maneira possível, com respeito pelas pessoas envolvidas.

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METODOLOGIAS PARA
APRENDIZAGEM ATIVA

Pablo Rodrigo Bes


GV — grupo de
verbalização e GO —
grupo de observação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Descrever o potencial da estratégia de aprendizagem ativa pautada


nos grupos de verbalização e observação.
„„ Demonstrar a forma de aplicação dos modelos de grupo de verba-
lização e de grupo de observação, bem como suas possibilidades
de adaptação.
„„ Apontar modelos de cenários, temas e problemas que podem ser
utilizados nestas abordagens.

Introdução
As formas de ensino e aprendizagem evoluíram a partir da utilização
de metodologias ativas e da emergência da educação híbrida. Uma
excelente técnica didática que pode ser utilizada pelos professores para
que seus alunos desenvolvam as habilidades de verbalização, argumen-
tação, comunicação interpessoal, percepção e criticidade é o grupo de
verbalização e grupo de observação (GV–GO). Este método pode ser
aplicado em conjunto com outras metodologias, possibilitando que o
professor movimente o grupo em torno de discussões sobre o tema que
lhe interesse e conduza a turma aos seus objetivos educacionais.
Neste capítulo, você irá aprender sobre os potenciais da estratégia
de aprendizagem ativa dos GV–GO e aprenderá como esta pode ser
aplicada, observando sua versatilidade em relação aos inúmeros temas
e problemas que podem ser abordados com alunos da educação básica
e do ensino superior.
2 GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação

Potencial de utilização dos grupos de


verbalização e de observação
A educação híbrida emerge para romper paradigmas educacionais, promovendo
o aprendizado de forma mais dinâmica e significativa. Para que isso ocorra,
se faz necessária a utilização de metodologias ativas de aprendizagem pelos
professores, aliadas à utilização de tecnologias digitais que permitam o estudo
on-line. Como aprenderemos sobre o grupo de verbalização (GV) e o grupo
de observação (GO) é importante retomarmos o conceito de metodologia ativa
para que possamos perceber sua importância e suas possibilidades. Mas como
definimos uma metodologia ativa? Quais são suas características principais?
Barbosa e Moura (2013) apresentam os principais aspectos que costumam
envolver as metodologias ativas:

„„ participação do aluno;
„„ liberdade de escolha;
„„ grupos;
„„ recursos múltiplos;
„„ socialização;
„„ contextualização do conhecimento.

Conforme comentamos anteriormente, as metodologias ativas surgem para


romper com o paradigma de uma educação centrada no professor, na qual os
alunos atuam de forma passiva e interagem pouco em relação ao conteúdo
que estão estudando. Observando as principais características listadas acima,
vemos que uma delas diz respeito à participação dos alunos, ou seja, estes
devem estar envolvidos no processo de ensino e aprendizagem de forma ativa.
Para que isto ocorra, o professor deverá proporcionar momentos para que
seus alunos possam participar, o que normalmente é feito a partir de técni-
cas que promovem interação e sociabilidade. Essa característica é reforçada
pela construção de grupos de alunos, o que possibilita uma maior interação
durante as técnicas utilizadas nas aulas. Da mesma forma, a socialização das
aprendizagens é essencial e uma das características normalmente encontrada
no uso destas metodologias.
GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação 3

Outra característica importante de uma metodologia ativa é apresentar aos


alunos a possibilidade de realizar escolhas durante o processo de aprendizagem
em que está participando. Estas escolhas podem ser em relação aos conteúdos
e suas abordagens, aos grupos e projetos em que irá participar, à sequência
que irá utilizar ou mesmo na deliberação e escolha das próprias metodologias
que serão utilizadas.
Apresentar um conteúdo contextualizado também costuma fazer parte das
metodologias ativas, pois os alunos reagem melhor quando sabem ao que irão
aplicar o que estão aprendendo. Os alunos precisam perceber como aquilo que
estão discutindo se encaixa em suas realidades cotidianas. As metodologias
ativas também se valem do uso de recursos múltiplos para que se efetivem, ou
seja, recursos humanos (as pessoas), materiais (quadro, folhas, lápis, canetas,
tintas, argilas, livros), tecnológicos (áudio, vídeo, computadores, redes de
internet) e tempo.
A metodologia ativa que gostaríamos de aprofundar neste momento é a
de grupo de verbalização e grupo de observação, também conhecida como
GV–GO, que surge como estratégia para que o professor possa movimentar
seu grupo de alunos em torno da discussão de temas que se aliem aos seus
objetivos educacionais. Segundo Camargo e Daros (2018), esta técnica:

[...] consiste na análise de um tema sob a coordenação do professor, em que


os alunos são divididos em dois grupos, um de verbalização (GV) e outro de
observação (GO), visando desenvolver competências e habilidades críticas
no aluno, estimulando a participação ativa por meio da partilha de ideias
e facultar um ambiente propício a discussão e reflexão de novos assuntos.

Dessa forma, para utilizar o GV–GO, o professor deverá organizar o


layout de sua sala, dispondo um grupo de cadeiras ou classes em um cír-
culo menor ao centro, onde ficarão os alunos que pertencem ao grupo de
verbalização. Ao redor destes, compondo o círculo maior, ficam os alunos
que farão parte do grupo de observação. A Figura 1 ilustra como ficaria
este arranjo físico da sala.
4 GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação

Figura 1. Leiaute para o GV–GO.

Na Figura 1 temos a representação de uma turma de 20 alunos, em que


cinco estão ao centro, no grupo de verbalização, e os 15 restantes estão ao redor
destes, compondo o grupo de observação. Essa organização foi uma escolha
da professora, que já havia aplicado esta técnica a sua turma, por isso decidiu
ficar ao lado de fora, observando como os dois grupos realizam suas tarefas.
Neste caso, o grupo de verbalização tem contato com um tema específico por
meio de uma pergunta, problema, ou outro material disponibilizado (como
um disparador para o início da atividade) e, a partir daí, precisa verbalizar,
falar, contar o que entendem, o que sabem sobre o tema, enfim, discutir o
assunto posto em debate. O grupo de observação se mantém em silêncio,
cabendo a ele somente observar e registrar suas impressões, suas dúvidas e
inquietações sobre o tema verbalizado pelos colegas. Após o tempo estipulado
pela professora se encerrar, que costuma oscilar entre sete e 10 minutos, pode
haver trocas entre os membros do GV por outros membros do GO, revezando
as funções e mantendo ou alternando os temas a serem discutidos. Ao final
da aplicação da técnica, deve se realizar a discussão com o grupo todo (GV e
GO), quando, então, serão coletados os sentimentos sobre a vivência realizada
e sanada as dúvidas finais sobre a temática estudada.
GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação 5

Para que possamos perceber como o GV–GO é uma ferramenta potente a


ser utilizada, podemos observar a taxonomia de Bloom e verificar os ganhos
que ela proporciona, conforme a Figura 2.

Figura 2. Domínios da taxonomia de Bloom.

Considerando que, na taxonomia de Bloom, os objetivos educacionais se


encontram dispostos de forma crescente em relação ao seu nível de complexi-
dade, perceba como o GV–GO contribui para que os alunos possam transitar
entre todos os itens apontados na pirâmide ao longo do processo.
Dessa forma, podemos perceber que essa técnica apresenta um potencial
muito grande para ser utilizada pelo professor, pois em uma forma simples
e de fácil organização, permite que os alunos desenvolvam as habilidades
de análise, reflexão e verbalização sobre os itens estudados, assim como
gera espaço para contribuírem com seus saberes anteriores, fruto de suas
experiências. Além disso, ao realizar a observação, os alunos podem aguçar
sua percepção e desenvolver seu senso crítico sobre o assunto, competências
muito exigidas na contemporaneidade.
6 GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação

Uma ótima maneira para se organizar os assuntos que serão verbalizados na técnica
do GV–GO é confeccionar flashcards, também conhecidos como fichas de estudo. Um
flashcard é composto por uma pergunta ou uma afirmação em uma de suas faces e, no
verso, a resposta ou maiores explicações sobre o item citado. Este recurso instrucional
costuma ser uma boa estratégia para se iniciar as discussões do grupo de verbalização.

O site disponível no link a seguir é um excelente recurso para criar os flashcards, que
podem ser disponibilizados para os alunos via tablet, notebook ou computador pessoal
na aplicação da metodologia GV–GO.

https://qrgo.page.link/znG4r

Formas de aplicação de GV e GO
Agora veremos, de forma detalhada, como podemos aplicar a ferramenta
GV–GO aos nossos alunos, percebendo as particularidades e regras de cada
etapa e como o professor deve conduzi-las ao utilizar essa metodologia. Po-
demos dividir o GV–GO em quatro etapas ou momentos distintos, conforme
a seguir.

1. Montagem da estrutura e formação dos grupos.


2. Ações de verbalização/observação.
3. Relatos sobre a observação.
4. Consolidação dos resultados.
GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação 7

A etapa 1 é o momento em que o professor e seus alunos irão ajustar o


dispositivo que será utilizado na aplicação da técnica, arrumando a disposição
das cadeiras ou classes de modo a formar dois círculos concêntricos, sendo
o interno para o GV e o externo para o GO. Nesta etapa também é realizada
a divisão dos alunos nos grupos. Logo, alguns pertencerão, neste primeiro
momento, ao grupo de verbalização e os demais ao grupo de observação.
A etapa 2 é o momento em que o processo ocorre. Os alunos do GV deverão
verbalizar sobre os temas que receberam e o grupo de observação deve fazer a
apreciação e anotar as críticas e dúvidas pertinentes. É interessante que dentro
do grupo de verbalização exista um líder que se encarregue de coordenar as
discussões, bem como um relator, com a função de anotar os principais pontos
do assunto a ser verbalizado. Da mesma forma, todos do grupo deverão ter a
oportunidade de se expressar.
A etapa 3 consiste no momento em que os grupos de observação podem
fazer suas considerações, emitindo seus pareceres ou opiniões sobre o tema,
fazendo questionamentos e relatando suas observações de forma crítica quanto
ao método e aos assuntos abordados, mas de forma construtiva, dando um
feedback para os colegas.
A etapa 4 ocorre quando todos os alunos, agora em um único círculo,
consolidam as impressões sobre a técnica utilizada e sobre o tema que foi
discutido. É um momento rico para o professor perceber, além dos aspectos
relacionados à aprendizagem dos conteúdos em si, os fatores subjetivos que
envolvem sua turma: como alguns puderam reagir de forma diferente ao tema
tratado, qual o nível de entrosamento e empatia existente, como se posicionam,
qual seu temperamento e nível de inteligência emocional.
Leal, Miranda e Casa Nova (2017, p. 49) destacam que “[...] a técnica GV–
GO não só pode ser combinada com outros recursos didáticos, como também
permite adaptações, de acordo com as necessidades e/ou objetivos do professor
e dos alunos”. Dessa forma, embora estejamos aprendendo os passos e as etapas
que normalmente compõem a técnica, podem haver inúmeras variações em
sua utilização, conforme o objetivo que se queira atingir. A técnica pode ser
utilizada no início das discussões de um tema novo, cumprindo efeito explo-
ratório e realizando uma sondagem do que os alunos trazem consigo sobre
este. Pode, ainda, ser utilizada ao final de um período de pesquisas e estudos,
para consolidar e demonstrar o que foi aprendido por todos. Veja o Quadro 1.
8 GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação

Quadro 1. Dinâmica da atividade de GV–GO

Dividir os alunos em dois grupos, um para a verbalização


de um tema/problema e outro para a observação.

Organizá-los em dois círculos, um interno e outro externo,


dividindo o número de membros conforme o número de
alunos da turma. Em classes muito numerosas, o grupo de
observação será numericamente maior que o de verbalização.

No primeiro momento, o grupo interno verbaliza, expõe,


discute o tema. Enquanto isso, o grupo externo observa,
registrando conforme a tarefa que lhe tenha sido atribuída.
Em classes muito numerosas, as tarefas podem ser
Sequência diferenciadas para os grupos destacados na observação.
didática
No fechamento, o GO passa a oferecer sua contribuição de
acordo com a tarefa que lhe foi atribuída, enquanto o GV escuta.

Em classes com menor número de alunos, o


grupo externo pode trocar de lugar e mudar de
função, de observação para verbalização.

Divide-se o tempo conforme a capacidade do


tema em manter os alunos mobilizados.

Ao fechamento, o papel fundamental do docente


deve contemplar os objetivos. Portanto, deve incluir
elementos do processo e dos produtos obtidos.
Fonte: Adaptado de Anastasiou e Alves (2003).

Um dos maiores benefícios da aplicação do GV–GO com os alunos diz


respeito ao aprimoramento de sua capacidade de oratória. A oratória envolve
o processo mental de organização e desenvolvimento de uma ideia, o controle
de voz (ritmo e entonação), a utilização da linguagem corporal (postura, gestos
e expressões não verbais), a capacidade de ilustrar ideias, as possibilidades
de interação com a plateia e a capacidade de argumentar a favor do que está
comunicando.
Convém ainda observar que a glossofobia, conhecida como o medo de falar
em público, está atualmente entre as maiores fobias existentes. Segundo Khan
et al. (2015), em torno de 75% da população mundial sofre com a glossofobia,
o que é alarmante, pois basta imaginarmos que três em cada quatro pessoas
vivenciam a ansiedade e o mal-estar quando precisam expressar suas ideias aos
que estão a sua volta. Cabe salientar que “as pessoas que sofrem de ansiedade
GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação 9

falante tendem a confundir-se facilmente mesmo diante de uma pequena


multidão. Sua voz fica fraca e seu corpo começa a tremer. Eles podem até
suar, corar e sentir palpitações” (KHAN et al., 2015, p. 110). Essa fobia pode
ser controlada com a ajuda da escola, a partir da utilização de metodologias
ativas como esta que estamos estudando, a qual proporciona familiarização
com a prática comunicativa.
Outra importante habilidade que se propõe para que os alunos a desen-
volvam a partir da aplicação do GV–GO é a capacidade de argumentação.
Por argumentação entendemos, baseado em Van Eemeren et al. (1996), como
uma atividade complexa, de natureza discursiva e social que se caracteriza
pela defesa de pontos de vista, considerando as objeções e alternativas de
perspectiva, que podem ter como objetivo aumentar (ou reduzir) a aceitabili-
dade destes pontos de vista em questão. Como adultos, exercitamos a nossa
capacidade de argumentação cotidianamente, analisando as mais variadas
leituras de mundo possíveis para contrapor com a nossa e defender aquilo
em que acreditamos, o que acaba pautando nosso modo de viver. Já para as
crianças esta tarefa não é tão simples, pois é uma operação de pensamento que
exige esforço de análise entre múltiplas ideias, muitas vezes contraditórias e
divergentes e que acabam requerendo uma posição firme em relação ao que
se acredita ou pensa.
Leitão (2007, p. 454), ao realizar uma pesquisa com crianças procurando
entender a relação do processo de argumentação e a sua importância para o
desenvolvimento da capacidade reflexiva, afirmou que:

[...] tomadas em conjunto, a defesa de pontos de vista e a consideração de ideias


alternativas criam, no discurso, um processo de negociação que possibilita o
manejo de divergências entre concepções a respeito de fenômenos do mundo
(físico ou social). Este processo de negociação de diferenças de perspectivas
confere à argumentação um potencial epistêmico que a institui como recurso
privilegiado de constituição do conhecimento.

Para que seja exercitada a capacidade de argumentação, o professor poderá


separar o grupo de verbalização em dois polos binários sobre um respectivo
tema, procurando fazer com que cada subgrupo verbalize a favor de suas
ideias e procure combater as objeções do outro. Por exemplo, um professor
de História utilizou este recurso de disputa argumentativa ao dividir o grupo
de verbalização em dois e entregar dois temas que seriam discutidos. Um era
o Capitalismo, e o outro, o Socialismo. Essa separação motivou a discussão
e tornou a aula mais rica e significativa.
10 GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação

Como podemos perceber, o GV–GO constitui uma metodologia muito ver-


sátil e útil para o desenvolvimento de um grande número de competências que
muito contribuem para a aprendizagem dos alunos sobre os temas abordados,
bem como para que tenham um desempenho social mais eficiente e alinhado
com as exigências do mundo contemporâneo.

Ao defendermos uma argumentação, podemos nos deparar com objeções. Você


sabe o que isso significa? Uma objeção significa algo que se opõe ao que você vem
defendendo em sua fala, se apresentando como oposição, como um obstáculo a
sua argumentação. Um bom argumentador deve ser hábil para contornar objeções,
procurando sempre respeitar os pontos de vista alheios, mas sem deixar de tentar
persuadir aquele que pensa o contrário sobre seu ponto de vista.

Cenários, temas e problemas para GV e GO


É importante reforçarmos que é preciso promover práticas que preparem os
alunos para a vida em sociedade. Quando pensamos em desenvolvimento
pleno, temos que considerar a importância da vivência social, o que exige
habilidade de comunicação e relacionamento interpessoal. Ao abordarem as
metodologias educacionais que fazem o uso dos grupos, Anastasiou e Alves
(2003, p. 75) destacam que:

[...] as estratégias grupais constituem-se num desafio a ser reconhecido e


enfrentado. Sabemos que a aprendizagem é um ato social, necessitando da
mediação do outro como facilitador do processo; esse outro que estabelece a
mediação entre o aluno e o objeto de estudo pode ser o professor, os colegas
ou um texto, um vídeo, um caso a ser solucionado, um tema a ser debatido .

Vamos conhecer algumas aplicações do método GV–GO em cenários e


com objetivos diferentes, visando proporcionar aos alunos a discussão/obser-
vação de temas pertinentes aos objetivos de cada aula. Conforme comentamos
anteriormente, o GV–GO pode ser utilizado junto a outras metodologias de
educação híbrida, conforme veremos também nos casos citados.
GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação 11

O primeiro caso de utilização do GV–GO que analisaremos foi aplicado por


Santos et al. (2015) em uma turma de graduação de licenciatura em Ciências
Agrárias do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão
(IFMA). Observe o quadro abaixo com os dados dessa aplicação (Quadro 2).

Quadro 2. Aplicação do GV–GO na Licenciatura em Ciências Agrárias

Tema A educação inclusiva na perspectiva da


educação especial no Brasil.

Objetivo de Compreender o movimento histórico da educação


aprendizagem especial no Brasil e seus fundamentos.

No início da aplicação da técnica de GV–GO,


antes da divisão dos grupos, houve um momento
de sensibilização da turma para o tema com a
exibição do vídeo Visão histórica da deficiência.
O vídeo se encontra disponível no link:
https://qrgo.page.link/SKUtg.

A professora forma os grupos de verbalização e de


observação, sendo que os próprios alunos puderam realizar
a escolha sobre qual grupo gostariam de participar.

Forma-se o dispositivo na forma de dois círculos,


o interno para o GV e o externo para o GO.

As discussões do GV foram provocadas a partir de


quatro questões norteadoras, elaboradas para tal.
Sequência
didática Por se tratar de uma turma pequena, após a discussão
das quatro questões sobre o tema, os alunos do grupo
de verbalização trocaram de lugar com os alunos do
grupo de observação e, assim, os novos verbalizadores
também puderam se manifestar sobre suas quatro
questões, diferentes das propostas ao primeiro grupo.

Para os grupos de observação 1 e 2 também


foram estabelecidas três questões que
deveriam nortear suas observações.

À medida que a discussão avançava, os professores


lançavam questões ao grupo. Após a explanação do
grupo de verbalização 1, o grupo pôde colocar suas
observações sobre a atuação do GV, realizando questões
e comentários pertinentes sobre o tema abordado.
(Continua)
12 GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação

(Continuação)

Quadro 2. Aplicação do GV–GO na Licenciatura em Ciências Agrárias

Após isso, realizou-se a troca entre os


Sequência grupos e o processo se repetiu.
didática Ao final, foi realizado um grande círculo com todos os alunos
e se avaliou a aplicação da técnica e sua potencialidade.

Fonte: Adaptado de Santos et al. (2015).

Das impressões sobre a técnica aplicada, Santos et al. (2015, p. 8658) co-
mentam que “os alunos foram muito participativos, interagiram, mencionaram
trechos do vídeo exibido e relacionaram com fatos atuais, demonstrando,
assim, que houve aprendizagem e domínio do conteúdo abordado”. Ao ava-
liarem os resultados atingidos pelos alunos em relação ao tema, os professores
perceberam que estes atenderam aos objetivos propostos, pois demonstraram
compreensão plena a respeito da trajetória da educação especial no Brasil.
O método GV–GO pode ser utilizado durante toda a educação básica,
talvez sendo um pouco mais dificultosa sua aplicação na educação infantil e
no primeiro ano, pelo fato de as crianças não terem se apropriado da escrita.
No entanto, as observações do GO podem ser adaptadas, neste caso, para
desenhos ou outros tipos de representação realizados pelos alunos. Também
costuma se utilizar o método mesclado com outras metodologias.
Vamos acompanhar mais uma aplicação prática do GV–GO, agora em
uma turma do ensino médio, no curso técnico em Multimeios Didáticos do
Programa Pró-funcionário, ofertado por um Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do interior do Rio Grande do Sul, aplicado por Marchesan
et al. (2017). Salientamos que, neste caso, os docentes utilizaram os métodos
brainstorming e Philips 66 associados ao GV–GO. A utilização do GV–GO
nesta aplicação teve como objetivo “[...] discutir sobre as competências espe-
cíficas do Técnico em Multimeios Didáticos e a sua importância no processo
educativo das escolas” (MARCHESAN et al., 2017, p. 313).
GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação 13

Brainstorming, também conhecida como tempestade cerebral ou chuva de ideias,


consiste em uma dinâmica de grupo que implica na verbalização de um grande
número de ideias sobre determinado tema, na qual existem regras e tudo deve ser
registrado, sem haver juízos de valor sobre as ideias alheias.
O Phillip 66 também é uma técnica a ser utilizada em grupos e consiste em dividir a
turma em grupos de seis alunos que irão discutir durante seis minutos (66) sobre um
determinado tema que depois será apresentado ao grande grupo.

Por se tratar de uma turma pequena, foi utilizada como estratégia para a
divisão dos grupos a preferência entre dois tipos de bombons e como instru-
mento a ser verbalizado dois textos. Neste caso, ao realizar o rodízio entre os
grupos de verbalização e de observação, as informações dos textos verbalizados
se complementavam. Logo após, os grupos de verbalização e de observação
receberam as instruções apresentadas no Quadro 3.

Quadro 3. Orientações para a execução da estratégia GV–GO

Primeiro grupo de verbalização Primeiro grupo de observação

„„ Objetivo do grupo: discutir sobre „„ Objetivo do grupo: realizar a


a importância dos funcionários no observação da atividade como um
processo educativo das escolas. todo:
„„ Definição de papéis: facilitador, „„ Participação dos integrantes —
relógio (controlador do tempo). todos participaram?
„„ Atenção: cuidem para não „„ Como foi a condução da
revelarem os papéis. discussão?
„„ Durante a discussão: O grupo „„ Qual foi o tema abordado na
deverá seguir as orientações do discussão?
facilitador e do relógio, mas não „„ Como foi o aproveitamento e
deverá demonstrar a quem estes o controle do tempo? Após, o
papéis se referem. grupo apresentará os aspectos
„„ Tempo de discussão: quatro observados.
minutos. „„ Tempo para apresentação: dois
minutos.
(Continua)
14 GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação

(Continuação)

Quadro 3. Orientações para a execução da estratégia GV–GO

Segundo grupo de verbalização Segundo grupo de observação

„„ Objetivo do grupo: Discutir as „„ Objetivo do grupo: realizar


competências específicas do observação da atividade como um
ensino técnico em Multimeios todo:
Didáticos e apresentar sugestões „„ Participação dos integrantes —
de ações no auxílio e no suporte à todos participaram?
ação educativa. „„ Como foi a condução da
„„ Definição dos papéis: facilitador discussão?
(terá a função de coordenar a „„ Qual foi o tema abordado na
discussão, organizar as falas e discussão?
controlar o tempo). „„ Como foi o aproveitamento e
„„ Atenção: cuidem para não revelar o controle do tempo? Após, o
o papel. grupo apresentará os aspectos
„„ Tempo de discussão: quatro observados.
minutos. „„ Tempo para apresentação: dois
minutos.

Fonte: Adaptado de Marchesan et al. (2017).

Ao analisarem os resultados da aplicação do GV–GO com seus alunos, os


autores comentam que “durante a realização da estratégia observou-se que os
estudantes discutiram não somente as ideias apresentadas nos textos dispo-
nibilizados, mas também muito do que já haviam estudado anteriormente”
(MARCHESAN et al., 2017, p. 314). Isto evidencia o caráter interdisciplinar
que o ensino híbrido possui e como esta técnica pode ser utilizada de forma
articulada e complementar com outras atividades desenvolvidas pelos profes-
sores. Além disso, os alunos “conseguiram realizar análise crítica da realidade
dos funcionários na escola, de uma forma ampla, mas também, acentuaram o
perfil e a importância do Técnico em Multimeios Didáticos, construindo um
importante momento de síntese” (MARCHESAN et al., 2017, p. 315). Desen-
volver a capacidade de síntese é uma operação mental que exige esforço e o
GV–GO também ajuda para que os alunos possam desenvolver essa habilidade.
Ao utilizar a estratégia educacional do GV–GO, o professor ocupa a posição
de mediador do processo, observando como seus alunos conduzem suas nar-
rativas, como defendem suas ideias e argumentam a favor ou contra os temas
que norteiam a discussão. A técnica também é muito útil para proporcionar
um espaço para que os alunos possam esclarecer suas opiniões aos colegas e
produzir um diálogo respeitoso e ético, mesmo quando possuírem opiniões
GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação 15

contrárias ou divergentes dos demais. O professor deve ficar atento para que
alguns alunos mais expansivos não se apropriem do tempo e acabem por
monopolizar o discurso, impedindo que os demais, mais introvertidos, não
opinem ou comentem. Todos devem ser desafiados a contribuir com seus
conhecimentos, ideias e opiniões sobre o tema.
Como podemos perceber, o GV–GO se apresenta como excelente ferra-
menta para que os alunos possam desenvolver sua habilidade de expressão
e comunicação, desinibir-se, aprimorar sua oratória e lidar com situações
de improviso ao participarem do grupo de verbalização. Os alunos também
podem aperfeiçoar a sua percepção, seu senso crítico e empatia ao realizarem
a avaliação sobre a postura e os procedimentos adotados pelo grupo de ver-
balização. Ou seja, esta é mais uma metodologia ativa que apresenta ótimos
resultados ao integrar nosso portfólio didático para o desenvolvimento da
educação híbrida.

Professores que utilizam metodologias educacionais de aprendizagem baseadas em


problemas também costumam utilizar a técnica do GV–GO para sensibilizar a turma
para os temas que nortearão os trabalhos, bem como apresentar, pelo uso de flashcards,
os problemas que deverão ser abordados durante o processo, coletando as primeiras
impressões e hipóteses de seus alunos sobre as temáticas abordadas.

ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. (org.). Processos de ensinagem na universidade: pressu-


postos para as estratégias de trabalho em aula. Joinville: Univille, 2003. 145 p.
BARBOSA, E. F.; MOURA, D. G. Metodologias ativas de aprendizagem na Educação Profis-
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CAMARGO, F.; DAROS, T. A sala de aula inovadora: estratégias pedagógicas para fomentar
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KHAN, F. et al. Glossophobia among Undergraduate Students of Government Medical
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16 GV — grupo de verbalização e GO — grupo de observação

LEAL, E. A.; MIRANDA, G. J.; CASA NOVA, S. P. C. Revolucionando a sala de aula: como
envolver o estudante aplicando técnicas de metodologias ativas de aprendizagem.
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LEITÃO, S. Argumentação e desenvolvimento do pensamento reflexivo. Psicologia:
Reflexão e Crítica, Porto Alegre, v. 20, n. 3, p. 454–462, 2007. Disponível em: http://www.
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MARCHESAN, M. R. et al. Tempestade Cerebral, Phillips 66 e GV/GO: a prática com
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SANTOS, D. C. et al. Uso de GV/GO e debate como estratégias de ensino para a educação
inclusiva na perspectiva da educação especial. In: EDUCERE – CONGRESSO NACIONAL
DE EDUCAÇÃO, 12., 2015, Curitiba. Anais [...]. Curitiba: Pontifícia Universidade Católica
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pdf2015/18713_8641.pdf. Acesso em: 27 maio 2019.
VAN EEMEREN, F. H. et al. Fundamentals of argumentation theory: a handbook of historical
backgrounds and contemporary developments. Hillsdale: Routledge, 1996. 440 p.

Leitura recomendada
FERRAZ, A. P. C. M.; BELHOT, R. V. Taxonomia de Bloom: revisão teórica e apresentação
das adequações do instrumento para definição de objetivos instrucionais. Gestão &
Produção, São Carlos, v. 17, n. 2, p. 421–431, 2010. Disponível em: http://www.scielo.
br/scielo.php?pid=S0104-530X2010000200015&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso
em: 27 maio 2019.
O autor
Eric Mazur é o Balkanski Professor de Física e Física Aplicada da Harvard University.
Cientista e pesquisador internacionalmente reconhecido, lidera um programa robusto de
pesquisa em física óptica e supervisiona um dos maiores grupos de pesquisa do Departamento
de Física de Harvard. Fundou várias empresas e desempenha um papel ativo na indústria.
Recebeu inúmeros prêmios, incluindo o Esther Hoffman Beller, da Optical Society of
America, e a Medalha Millikan, da American Association of Physics Teachers. Em 2014,
tornou-se o destinatário inaugural do prêmio Minerva para Avanços na Educação Superior.
É autor ou coautor de 297 publicações científicas, 36 patentes e vários livros, incluindo
Principles and Practice of Physics (Pearson, 2014), livro que apresenta uma abordagem
inovadora para o ensino introdutório de física baseada em cálculo. Mazur é um palestrante
bastante requisitado nas áreas de óptica e da educação.

M476p Mazur, Eric.


Peer instruction : a revolução da aprendizagem ativa /
Eric Mazur ; tradução: Anatólio Laschuk. – Porto Alegre :
Penso, 2015.
xx, 252 p. : il. ; 23 cm.

ISBN 978-85-8429-062-8

1. Método de ensino - Física. 2. Peer instruction. 3.


Aprendizagem ativa. I. Título.

CDU 37.022:53

Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094

Mazur_Iniciais.indd ii 09/07/15 16:34


2
A Peer Instruction

U m dos problemas do ensino tradicional é a apresentação do conteúdo. Com frequên-


cia, é tirado diretamente dos livros ou das notas de aula do professor, dando aos
estudantes pouco incentivo para assistir às aulas. O problema é a apresentação tradi-
cional do conteúdo, que consiste quase sempre em um monólogo diante de uma plateia
passiva. Somente professores excepcionais são capazes de manter os estudantes atentos
durante toda uma aula expositiva. Mais difícil ainda é dar oportunidades adequadas
para que os estudantes pensem de forma crítica, usando os argumentos que estão sen-
do desenvolvidos. Consequentemente, as aulas expositivas simplesmente reforçam os
sentimentos dos estudantes de que o passo mais importante para dominar o conteúdo
ensinado está na resolução de problemas. O resultado é uma rápida escalada na qual os
estudantes solicitam mais e mais exemplos de problemas (para que possam aprender a
resolvê-los melhor), o que, por sua vez, volta a reforçar seus sentimentos de que a chave
do sucesso é a resolução de problemas.

Por que aula expositiva?


Na primeira vez que dei aula de introdução à física, dediquei muito tempo para preparar
as notas de aula que costumava distribuir aos alunos no final de cada aula expositiva. As
notas de aula se tornaram populares porque eram concisas e davam uma boa visão geral,
muito mais detalhada, da informação que estava no livro adotado pela disciplina.
Na metade do semestre, dois estudantes me pediram para entregar essas notas
antes das aulas para que eles não precisassem copiar tanto e pudessem prestar mais
atenção à minha aula. Eu concordei com satisfação e, na próxima vez que dei a mesma
disciplina, eu decidi distribuir todas as notas de aula de uma vez só no começo do se-
mestre. Entretanto, o resultado foi inesperado. No final do semestre, diversos estudantes
reclamaram em seus questionários de avaliação da disciplina que as minhas aulas eram
uma cópia das notas de aula!
Ah, a ingratidão! No início eu fiquei perturbado por essa falta de consideração,
mas desde então o meu posicionamento mudou. Os estudantes estavam certos: eu es-
tava realmente ensinando como estava nas notas de aula. Uma pesquisa me mostrou
que meus alunos teriam pouco benefício adicional assistindo às minhas aulas se antes
lessem minhas notas de aula. Se eu não estivesse dando aula sobre física, mas, digamos,

Mazur_02.indd 9 23/06/15 13:57


10 PARTE I Visão geral

sobre Shakespeare, eu certamente não ficaria lendo as peças durante as aulas para os
estudantes. Em vez disso, eu pediria aos estudantes que lessem as peças antes de virem
à aula e usaria o horário de aula para discuti-las, aprofundando a compreensão e apre-
ciação das peças de Shakespeare.
Nos anos seguintes, após a experiência reveladora descrita no Capítulo 1, eu ex-
plorei novas formas de ensinar a física introdutória. Procurei modos de focar a atenção
nos conceitos subjacentes sem sacrificar a capacidade dos estudantes de resolver proble-
mas. O resultado é a Peer Instruction, um método eficiente que ensina os fundamentos
conceituais da física introdutória e conduz os estudantes a um melhor desempenho na
resolução de problemas convencionais. É interessante notar que eu descobri que essa
abordagem também torna o ensino mais fácil e mais gratificante.
Para a Peer Instruction ser bem-sucedida, é necessário que o livro e as aulas ex-
positivas desempenhem papéis diferentes dos que costumam exercer em uma disciplina
convencional. Primeiro, as tarefas de leitura do livro, realizadas antes das aulas, introdu-
zem o material. A seguir, as aulas expositivas elaboram o que foi lido, esclarecem as difi-
culdades potenciais, aprofundam a compreensão, criam confiança e fornecem exemplos
adicionais. Finalmente, o livro serve de referência e guia de estudo.

O teste conceitual
Os objetivos básicos da Peer Instruction são: explorar a interação entre os estudantes
durante as aulas expositivas e focar a atenção dos estudantes nos conceitos que servem
de fundamento. Em vez de dar a aula com o nível de detalhamento apresentado no
livro ou nas notas de aula, as aulas consistem em uma série de apresentações curtas
sobre os pontos-chave, cada uma seguida de um teste conceitual – pequenas questões
conceituais abrangendo o assunto que está sendo discutido. A princípio é dado um tem-
po para os estudantes formularem suas respostas e, em seguida, eles devem discuti-las
entre si. Esse processo (a) força os estudantes a pensar com base nos argumentos que
estão sendo desenvolvidos e (b) dá-lhes (o professor incluído) um modo de avaliar a sua
compreensão do conceito.
Cada teste conceitual tem o seguinte formato genérico:
1. Proposição da questão 1 minuto
2. Tempo para os estudantes pensarem 1 minuto
3. Os estudantes anotam suas respostas individuais (opcional)
4. Os estudantes convencem seus colegas (Peer Instruction) 1–2 minutos
5. Os estudantes anotam as respostas corrigidas (opcional)
6. Feedback para o professor: registro das respostas
7. Explicação da resposta correta 2⫹ minutos
Se a maioria dos estudantes escolher a resposta correta do teste conceitual, a aula
prossegue para o próximo tópico. Se a porcentagem de respostas corretas for muito
baixa (digamos, menos de 30%), eu ensino novamente o mesmo tópico com mais deta-
lhes e mais devagar e faço uma nova avaliação com outro teste conceitual. Essa aborda-
gem de repetir se necessário evita a formação de um abismo entre as expectativas do

Mazur_02.indd 10 23/06/15 13:57


Capítulo 2 A Peer Instruction 11

professor e a compreensão dos estudantes – um abismo que, uma vez formado, só au-
mentará com o tempo até que a aula fique inteiramente perdida.
Vamos considerar um exemplo específico: o princípio de Arquimedes. Primeiro,
eu faço uma apresentação de 7–10 minutos sobre o assunto – enfatizando os conceitos
e as ideias que fundamentam o princípio e evitando equações e deduções matemáticas.
Essa pequena apresentação poderia incluir uma demonstração (o mergulhador cartesia-
no, ou ludião, por exemplo). Então, antes de prosseguir para o próximo tópico (princí-
pio de Pascal, talvez), eu faço uma projeção mostrando a questão da Figura 2.1.
Eu leio a questão para os estudantes, assegurando-me de que não há mal-entendi-
dos a seu respeito. A seguir, eu lhes digo que eles têm um minuto para escolher uma
resposta – mais tempo faria com que começassem a usar as equações em vez de pensar.
Como eu quero que cada estudante dê uma resposta individual, eu não permito que fa-
lem entre si. Eu me asseguro de que haja silêncio absoluto na sala de aula. Depois de um
minuto, primeiramente peço que cada estudante anote sua resposta e então tente con-
vencer o colega ao lado de que a resposta está correta. Eu sempre participo de algumas
dessas discussões animadas que surgem nos grupos. Isso me permite avaliar os erros
cometidos e ouvir como os estudantes que escolheram as respostas corretas explicam o
seu raciocínio. Depois de dar um ou dois minutos aos estudantes para discutir a questão,
eu peço que eles anotem a nova resposta. A seguir, eu volto a atenção ao slide projetado
e peço que eles levantem as mãos para fazer um levantamento das respostas. Os resulta-

EMPUXO

Imagine segurar dois tijolos idênticos debaixo da água. O tijolo A está imediatamente
abaixo da superfície da água, ao passo que o tijolo B está em uma profundidade maior.
A força necessária para manter o tijolo B no lugar é

1. maior do que
2. igual a
3. menor do que
a força necessária para manter o tijolo A no lugar.

FIGURA 2.1 Questão de teste conceitual sobre o princípio de Arquimedes. No caso de


um fluido incompressível como a água, a segunda opção é a correta.

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12 PARTE I Visão geral

dos da questão da Figura 2.1 estão mostrados na Figura 2.2. Naturalmente, durante a
aula, eu não disponho dos resultados detalhados da Figura 2.2. Entretanto, depois da
discussão para convencer o colega, é possível verificar que a maioria das respostas está
correta simplesmente olhando as mãos levantadas. Quando isso acontece, dedico alguns
minutos para a explicação da resposta correta e sigo para o próximo tópico.
Como resultado das discussões para convencer o colega, há um aumento siste-
mático tanto da porcentagem de respostas corretas quanto da confiança dos estudantes.
Normalmente, a melhora é maior quando a porcentagem inicial de respostas corretas
está em torno de 50%. Se essa porcentagem for muito mais elevada, haverá pouco espa-
ço para melhora; se for muito menor, haverá poucos estudantes na classe para convencer
os demais da resposta correta. Esse resultado está ilustrado na Figura 2.3, que mostra a
melhora nas respostas corretas e o aumento de confiança para todas as questões dadas
em um semestre. Observe que todos os pontos estão acima de uma reta de declividade
igual a 1 (pontos abaixo dessa reta indicam que o número de respostas corretas dimi-
nuiu após a discussão). Eu considerei ótima uma porcentagem inicial de respostas cor-
retas na faixa de 40 a 80%. Nos semestres seguintes, eu costumo modificar ou eliminar
as questões que estão fora dessa faixa.
A Figura 2.4 mostra como os estudantes modificaram suas respostas após a discus-
são da questão sobre empuxo proposta na Figura 2.1. De fato, 29% modificaram correta-
mente sua resposta inicial incorreta, ao passo que apenas 3% alteraram a resposta de cor-
reta para incorreta. A Figura 2.3 demonstra que sempre há aumento, nunca diminuição, na
porcentagem de respostas corretas. A razão é que é muito mais fácil mudar a mente de al-
guém que está errado do que mudar a mente de alguém que escolheu a resposta correta

Antes da discussão Após a discussão


160 160

120 120
Contagem

Contagem

80 80

40 40

0 0
1 2 3 1 2 3
Resposta Resposta

Adivinhando Adivinhando
Sem muita certeza
Sem muita
certeza
Com bastante Com bastante
certeza certeza
FIGURA 2.2 Análise das respostas da questão sobre empuxo da Figura 2.1. A resposta
correta é a 2. Os gráficos de pizza mostram a distribuição geral dos níveis de confiança.
Nos gráficos de barra, os sombreados cinzentos correspondem aos sombreados cinzentos
dos gráficos de pizza.

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Capítulo 2 A Peer Instruction 13

100 100

80 80
Após a discussão

Após a discussão
60 60

40 40
% respostas corretas
20 % respostas corretas 20 ponderadas com o
nível de confiança
0 0
0 20 40 60 80 100 0 20 40 60 80 100
Antes da discussão Antes da discussão
(a) ( b)
FIGURA 2.3 (a) A porcentagem de respostas corretas após a discussão versus a porcen-
tagem antes da discussão e (b) a mesma informação após ser ponderada com o nível de
confiança dos estudantes. Cada ponto de dado corresponde a uma única questão de teste
conceitual. O ponto cheio corresponde à questão sobre empuxo da Figura 2.1.

pelas razões corretas. A melhora observada na confiança também não surpreende. Os estu-
dantes que inicialmente estão corretos, mas não muito confiantes, tornam-se mais confian-
tes quando verificam que seus colegas escolheram a mesma resposta ou quando sua con-
fiança é reforçada ao construírem um raciocínio que conduz à resposta correta.
Algumas vezes, parece que os estudantes são capazes de ensinar os conceitos uns
aos outros de forma mais eficiente do que seus professores (veja a Figura 2.5). Uma
explicação provável é que os estudantes, os que são capazes de entender o conceito
que fundamenta a questão dada, acabaram de aprender a ideia e ainda estão cientes
das dificuldades que tiveram que superar para compreender o conceito envolvido. Con-
sequentemente, eles sabem exatamente o que enfatizar em sua explicação. De forma
semelhante, muitos professores experientes sabem que a sua primeira aula em uma nova
disciplina frequentemente é a sua melhor, marcada por uma clareza e uma leveza que
em geral deixam de existir nas versões posteriores, mais polidas. A razão que está por
trás disso é a mesma: à medida que o tempo passa e um professor permanece exposto
ao mesmo material, parece que as dificuldades conceituais vão desaparecendo e, conse-
quentemente, vão deixando de ser examinadas com cuidado.

3% 3%
24% 29% Incorreta para correta
Correta para correta
Incorreta para incorreta
Correta para incorreta
Sem segunda resposta

41%
FIGURA 2.4 Gráfico de pizza mostrando como as respostas foram modificadas depois da
“discussão para convencer seu colega” relativa à questão de empuxo da Figura 2.1.

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14 PARTE I Visão geral

FIGURA 2.5 A Peer Instruction em


funcionamento: estudantes ensinan-
do seus colegas em uma turma de
introdução à física com muitos alu-
nos. Nada torna as ideias mais claras
do que explicá-las aos outros.

Nesse novo formato de aula expositiva, os testes conceituais abrangem cerca de


um terço do tempo de cada aula. Isso deixa menos tempo para o professor fazer as suas
apresentações expositivas. Assim, um professor tem duas opções: (a) discutir na aula
apenas parte do material que é dado durante o semestre ou (b) reduzir o número de tó-
picos tratados no semestre. Em alguns casos, a opção (b) pode ser a escolha preferida,
mas eu optei pela (a): na aula, eu não trato de todo o material que está disponível no li-
vro e nas notas de aula (dadas no início da disciplina). Eu começo eliminando das mi-
nhas aulas os exemplos trabalhados e a maioria das deduções matemáticas. Para com-
pensar a omissão desses detalhes mecânicos, eu peço para os estudantes lerem o livro e
as minhas notas antes de virem para a aula. No caso de uma disciplina sobre ciência,
isso pode ser surpreendente, mas os estudantes estão acostumados a receber tarefas de
leitura em muitas outras disciplinas. Dessa maneira, ao longo do semestre, os estudan-
tes têm contato com a mesma quantidade de material que é ensinada em uma disciplina
convencional.
Antes de entrarmos nas partes específicas da Peer Instruction, deixe-me resumir
alguns dos resultados notáveis que obtive. Esses resultados também foram verificados
1
em outras instituições onde a Peer Instruction foi implementada.

Resultados
As vantagens da Peer Instruction são numerosas. As “discussões para convencer o cole-
ga” quebram a inevitável monotonia das aulas expositivas passivas, e, mais importante,
os estudantes não se limitam a simplesmente assimilar o material que lhes é apresenta-
do; eles devem pensar por si mesmos e verbalizar seus pensamentos.
Desde 1990, para avaliar o aprendizado de meus alunos, tenho utilizado dois tes-
tes de diagnóstico: o Force Concept Inventory (inventário sobre o conceito de força –
FCI) e o Mechanics Baseline Test (teste de linha de base para mecânica – MBT) (veja

1
Veja Sheila Tobias, Revitalizing Undergraduate Science Education: Why Some Things Work and Most
Don’t, Tucson, AZ: Research Corporation, (1992).

Mazur_02.indd 14 23/06/15 13:57


Capítulo 2 A Peer Instruction 15

os Capítulos 7 e 8).2,3 Os resultados dessas avaliações são apresentados nas Figuras 2.6
e 2.7 e na Tabela 2.1. A Figura 2.6 mostra o ganho dramático obtido no desempenho dos
estudantes no inventário sobre o conceito de força quando eu usei a Peer Instruction
pela primeira vez em 1991. Como a Tabela 2.1 mostra, esse ganho voltou a ocorrer
nos anos seguintes. Observe também como, no pós-teste da Figura 2.6, os escores se
deslocaram bastante em direção aos valores máximos (29 de 29) e como apenas 4%
dos estudantes permaneceram abaixo da linha de corte identificada por Hestenes como
sendo o limiar de compreensão da mecânica newtoniana. Na abordagem convencional
(Figura 2.7), o ganho foi apenas metade, concordando com o que foi obtido em outras
instituições de ensino convencional.

As habilidades para resolver problemas são


prejudicadas?
A melhora na compreensão conceitual é indiscutível, mas pode-se questionar a eficácia
dessa nova abordagem no ensino das habilidades de resolver problemas que são exigi-
das nos exames convencionais. No final das contas, a reestruturação da aula expositiva
e sua ênfase no material conceitual são obtidas à custa das horas de aula que são dedi-
cadas à resolução de problemas. O desenvolvimento das habilidades de resolver proble-
mas é deixado para as tarefas extraclasse e as sessões de discussão.
Uma resposta parcial a essa questão pode ser obtida examinando os escores do
teste de linha de base para mecânica, que envolve a resolução de alguns problemas
quantitativos. A Tabela 2.1 mostra que o escore médio desse teste aumentou de 67%
para 72% no ano em que a Peer Instruction foi implementada pela primeira vez e subiu
para 73% e 76% nos anos seguintes.

30 1991 30 1991
25 antes do FCI limiar 25 após o FCI limiar
Contagem

Contagem

20 20
15 15
10 10
5 5
0 0
1 5 9 13 17 21 25 29 1 5 9 13 17 21 25 29
Escore Escore
(a) (b)
FIGURA 2.6 Os escores para o inventário sobre o conceito de força (FCI) obtidos em
1991 (a) no primeiro dia de aula e (b) após dois meses de aula com o método da Peer Ins-
truction. O escore máximo do teste é 29. As médias das distribuições são 19,8 (de 29) para
(a) e 24,6 para (b).

2
D. Hestenes, M. Wells e G. Swackhamer, Phys. Teach. 30 (1992), 141.
3
D. Hestenes, M. Wells e G. Swackhamer, Phys. Teach. 30 (1992), 159.

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16 PARTE I Visão geral

100 1991–1994 1990


20
antes do FCI limiar após o FCI limiar
80
15
Contagem

Contagem
60
10
40

20 5

0 0
1 5 9 13 17 21 25 29 1 5 9 13 17 21 25 29
Escore Escore
(a) (b)
FIGURA 2.7 Os escores para o inventário sobre o conceito de força (FCI) obtidos (b) em
1990 após dois meses de aula convencional e, para comparação, (a) em 1991, 1992 e
1994, no primeiro dia de aula. As médias das distribuições são 19,8 de 29 pontos para (a)
e 22,3 para (b).

Para comparar de forma não ambígua as habilidades de resolução de problemas


em exames convencionais, com e sem Peer Instruction, eu apliquei os exames finais
de 1985 à classe de 1991. A Figura 2.8 mostra a distribuição dos escores dos exames
finais nesses dois anos. Tendo em vista a melhora no entendimento conceitual, eu já
teria ficado satisfeito se as distribuições fossem as mesmas. Em vez disso, houve uma
melhora marcante na média, além de uma elevação no valor mínimo dos escores. Apa-
rentemente, e talvez sem ser surpreendente, uma melhor compreensão dos conceitos
fundamentais levou a um melhor desempenho nos problemas convencionais.

TABELA 2.1 Escores médios para o inventário sobre o conceito de força (FCI) e o teste
de linha de base para mecânica (MB) antes e após a implementação da
Peer Instruction
FCI
a b
Método de ensino Ano antes após ganho Gc MB Nd

CONVENCIONAL 1990 (70%)e 78% 8% 0,25 67% 121

1991 71% 85% 14% 0,49 72% 177


f
1993 70% 86% 16% 0,55 73% 158
PEER INSTRUCTION
1994 70% 88% 18% 0,59 76% 216
g
1995 67% 88% 21% 0,64 76% 181
a
Dados obtidos no primeiro dia de aula.
b
Dados obtidos após dois meses de aula.
c
Fração do ganho máximo possível obtido.
d
Número de pontos de dados.
e
Sem pré-teste de FCI em 1990; médias de 1991–1995 mostradas.
f
Em 1992 não foram aplicados testes.
g
Dados de 1995 refletem o uso do manuscrito do livro que estava em preparação.

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Capítulo 2 A Peer Instruction 17

25 40
1985 35 1991
20 30
Contagem

Contagem
25
15
20
10 15
10
5
5
0 0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Escore do exame final Escore do exame final
(a) (b)
FIGURA 2.8 Os escores de exames finais obtidos em exames finais idênticos aplicados (a)
em 1985 (disciplina convencional) e (b) em 1991 (Peer Instruction). As médias das distribui-
ções são 62,7 de 100 para (a) e 69,4 para (b).

Feedback
Uma das grandes vantagens da Peer Instruction é que as respostas dos testes conceituais
fornecem um feedback imediato sobre o nível de compreensão dos alunos. Dependendo
da situação e do propósito, o levantamento das respostas pode ser obtido de diversas
formas:
1. Levantar a mão. O método mais simples é pedir para cada estudante levantar a
mão após responder a uma questão pela segunda vez. Isso permite perceber o
nível de compreensão da classe e possibilita que o professor ajuste a velocidade
com que está dando a aula. A desvantagem principal é uma perda de precisão, em
parte porque alguns estudantes podem hesitar em erguer a mão e em parte porque
é difícil fazer uma estimativa da distribuição. Uma boa solução é o uso de flash-
cards – cada estudante tem um conjunto de seis ou mais cartões com inscrições
4
de A a F para sinalizar a resposta a uma questão (veja a Figura 2.9). Outras limi-
tações são a falta de um registro (a menos que haja alguém fazendo esse registro)
e a ausência de qualquer dado obtido antes da discussão para convencer o colega
(levantar a mão antes da discussão poderia influenciar o resultado).
2. Ler os formulários. Como eu estou interessado em quantificar a eficiência da
discussão para convencer o colega, tanto a curto quanto a médio prazos, utilizo
formulários, que leio após a aula. Nesses formulários, os estudantes marcam as
suas respostas e seu nível de confiança, tanto antes quanto após a discussão. Esse
método gera uma grande quantidade de dados a respeito do comparecimento à
aula, da compreensão, do progresso e da eficiência a curto prazo das aulas com
Peer Instruction. As limitações desse método são: deve ser feito um trabalho de
leitura dos dados após cada aula expositiva e há um atraso no feedback devido aos

4
David E. Meltzer e Kandiah Manivannan, Phys. Teach. 34, (1996), 72.

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18 PARTE I Visão geral

FIGURA 2.9 Estudantes em uma aula de introdução à física na Southeastern Louisiana


University usando flashcards – um sistema de respostas simples, de baixo custo e fácil im-
plementação.

dados ficarem disponíveis somente após a leitura dos formulários. Por essa razão,
além de ler os formulários, também peço que os alunos levantem a mão após res-
ponderem, pela segunda vez, a cada questão.
3. Dispositivos portáteis. Desde 1993, eu tenho usado um sistema interativo de
respostas com computador denominado Classtalk, produzido pela firma Better
5
Education, Inc. O sistema permite que os estudantes forneçam suas respostas
aos testes conceituais juntamente com seus níveis de confiança. Para isso, são
utilizados diversos tipos de dispositivos, desde calculadoras gráficas até laptops.
Esses dispositivos podem ser compartilhados por pequenos grupos de três ou qua-
tro estudantes. As respostas são repassadas ao professor e exibidas na tela de um
computador, podendo também ser projetadas em uma tela para os estudantes. A
principal vantagem do sistema é que a análise dos resultados é mostrada imedia-
tamente, e informações sobre cada estudante (como o nome e o lugar onde está
sentado) ficam disponíveis para o professor. Isso permite que aulas com grande
número de alunos tornem-se mais pessoais. O sistema também pode manipular
questões numéricas e questões que não são de múltipla escolha – além disso, es-
ses dispositivos aumentam a interação com os estudantes. Como desvantagens, o
sistema requer um certo investimento de capital, além de tornar a aula expositiva
mais complexa.
É importante observar que, na Peer Instruction, o sucesso não depende do método
de feedback e, portanto, não depende de recursos financeiros ou tecnológicos.

5
Better Education, Inc., 4824 George Washington Memorial Highway, Suite 103, Grafton, VA 23692.
E-mail: info@bedu.com. Site: www.bedu.com.

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Capítulo 2 A Peer Instruction 19

Conclusão
Usando o formato de aula expositiva descrito aqui, é possível, com um esforço relati-
vamente baixo e sem investimento de capital, melhorar muito o desempenho dos estu-
dantes em disciplinas introdutórias de ciências – duplicando o nível de compreensão, tal
como é medido pelo inventário sobre o conceito de força, e melhorando o desempenho
em exames convencionais. Apesar do menor tempo dedicado à resolução de problemas,
os resultados mostram de forma convincente que a compreensão dos conceitos aumenta
o desempenho dos estudantes nos exames convencionais. Benefícios semelhantes foram
obtidos em uma série de situações acadêmicas com grupos muito diferentes de estu-
6
dantes. Por fim, pesquisas envolvendo estudantes mostraram que sua satisfação – um
importante indicador do seu sucesso – também aumenta.

6
Sheila Tobias, Revitalizing Undergraduate Science Education: Why Some Things Work and Most
Don’t, Tucson, AZ: Research Corporation, (1992). Também: R.R. Hake, AAPT Anouncer 24 (2), (1994)
55; “Interactive-Engagement vs. Traditional Methods: A Six-Thousand-Student Survey of Mechanics
Test Data for Introductory Physics Courses”. pré-impressão, Junho, 1995.

Mazur_02.indd 19 23/06/15 13:57


Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
METODOLOGIAS PARA
APRENDIZAGEM
ATIVA

Amanda de Sena Fornarolli Pereira


One minute thesis
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Descrever o potencial da estratégia de aprendizagem ativa one minute


thesis e sua relevância para o desenvolvimento da comunicabilidade
dos alunos.
„ Identificar a forma de aplicação da estratégia one minute thesis nos
diferentes contextos de aprendizagem.
„ Apontar diferentes possibilidades de adaptação da estratégia one
minute thesis.

Introdução
Algumas estratégias para aprendizagem ativa são consideradas
procedimen-tos de pausa (pause procedures). Nestas, o professor
planeja momentos durante uma aula em que os alunos podem rever
suas anotações, discutir com colegas ou participar de exercícios
interativos que os ajudam a assimilar e a reter informação durante
uma aula expositiva (CHOWDHURY, 2016). Bachhel e Thaman (2014)
apontam que os alunos não são capa-zes de se concentrar por mais
de 15 minutos em uma aula expositiva e que esse tipo de
procedimento pode aumentar a atenção e melhorar a aprendizagem.
A ideia é que os alunos tenham a oportunidade de refletir sobre
o que aprenderam e discutir conceitos-chave com seus colegas. É
uma maneira de praticarem a autorregulação, pois durante esse
processo eles podem rever, comparar e discutir suas anotações com
as dos colegas (CHOWDHURY, 2016).
Neste capítulo você irá conhecer as características do
procedimento de pausa one minute thesis, sua aplicabilidade,
adaptações e estratégias similares.
2 One minute thesis

O que é a one minute thesis e como contribui


para a aprendizagem
A one minute thesis é uma estratégia que ajuda o aluno a consolidar ou prever
novas conexões entre diversos temas estudados em uma disciplina. De acordo
com Lang (2016), quando se é especialista em alguma área, as conexões fluem
mais facilmente, pois já existe um conhecimento consolidado que é modificado
e novamente moldado a cada nova informação que se recebe. Para os inician-
tes na área, isso não acontece de maneira tão fácil: as informações, ideias e
habilidades existem, mas não de forma interligada, e embora os professores
tentem ensinar a conectá-las, Lang (2016) afirma que a aprendizagem só
acontece de verdade quando os alunos fazem as conexões por eles mesmos.
A one minute thesis coloca o aluno em ação, exercitando o raciocínio
analítico e sintético, além da comunicação. Ao usar essa estratégia, o professor
dá ao aluno a oportunidade para refletir sobre o que aprendeu e tentar fazer
conexões.
Segundo Lang (2016), para que os alunos se tornem especialistas, os pro-
fessores devem promover oportunidades para que eles façam as conexões
com frequência. Assim, quanto mais conexões os alunos conseguirem criar,
mais facilmente começarão a formular suas próprias ideias e terão uma visão
mais ampla de suas áreas.
Criada pelo professor James M. Lang, seu formato básico prevê que o
professor escreva no quadro alguns itens de diferentes categorias do que foi
estudado até o momento e pede para um aluno escolher um item de cada
categoria, desenhando uma linha entre eles (interligando os itens). Logo após
isso, pede para que pensem em uma ou duas frases (tese) que apresentem a
conexão entre os dois itens, levando apenas um minuto neste passo. Isso faz
com que o aluno exercite a análise e a síntese para comunicar de forma clara,
para que todos entendam.
A Figura 1 mostra um exemplo do que poderia estar no quadro do professor,
que apresenta o assunto, as categorias e os temas de cada categoria. Neste
exemplo, o professor poderia perguntar: qual a conexão entre a estratégia e o
princípio de aprendizagem ativa?
One minute thesis 3

Aprendizagem ativa

Estratégias Princípios
Blended learning Reflexão
Design thinking Engajamento

Peer instruction Raciocínio


de análise,
PBL síntese e avaliação

One minute thesis Atitudes e valores

Figura 1. Exemplo de quadro usado na estratégia de aprendizagem


ativa one minute thesis.

Os alunos formulam suas teses e depois podem compartilhar com os colegas.


O professor aproveita o momento para dar um feedback geral para a turma.

Como aplicar a one minute thesis


Além da estrutura básica apresentada anteriormente, a estratégia one minute
thesis pode sofrer variações, desde que as categorias com os conceitos es-
senciais da disciplina sejam criadas (pelo professor ou pelos alunos), exista
conexão entre elas e os alunos possam descrever como ou porque essas conexões
fazem sentido ou não.
As variações podem começar pelo número de categorias, podendo ser duas
ou mais, como mostra a Figura 2. Neste caso, o professor poderia perguntar:
como posso usar a estratégia one minute thesis em uma disciplina do curso
de história para promover a reflexão?
4 One minute thesis

Aprendizagem ativa

Estratégias Princípios
Blended learning Reflexão
Disciplinas curso de
Design thinking história
Engajamento

Peer instruction Raciocínio


de análise,
PBL síntese e avaliação

One minute thesis Atitudes e valores

Figura 2. Possível variação da one minute thesis.

No exemplo da Figura 2, de uma aula de história, os alunos poderiam criar


as colunas em vez do professor. Outra mudança poderia ser com base nas
respostas: o professor poderia propor que os alunos formulassem argumentos
para sustentar uma das teses em, no máximo, 10 minutos. Além disso, essa
estratégia também poderia ser aplicada em um ambiente virtual de aprendi-
zagem. O professor poderia postar as categorias e pedir para que os alunos
escrevam uma tese em um dia. A atividade poderia ser complementada com a
postagem de possíveis argumentações sobre a tese dos colegas (LANG, 2016).
A estratégia pode ser aplicada nos primeiros cinco minutos, no meio ou ao
final da aula. Pode ser uma vez por semana ou conforme as aulas avançam,
quando os alunos começam a fazer conexões entre os assuntos.
Além de propiciar a consolidação do conhecimento por meio de conexões,
a one minute thesis favorece a geração de ideias para trabalhos, como artigos
científicos ou resolução de problemas.

Estratégias similares
Nesta seção, você verá como a estratégia one minute thesis pode ser adaptada
em metodologias similares.
One minute thesis 5

One minute paper


A estratégia one minute paper surgiu na década de 1980 e, à medida que foi
se tornando popular, novas versões foram criadas. Seu principal objetivo é
fazer com que o aluno reflita sobre o que está aprendendo, resgatando os
conhecimentos.
De acordo com Stead (2005), originalmente, sua estrutura básica consiste
em fazer duas perguntas para os alunos ao final da aula:

„„ O que você aprendeu de mais importante?


„„ Você ficou com alguma dúvida?

Os alunos têm um ou dois minutos para escrever as respostas em um papel.


Em seguida, o professor recolhe as respostas, lê e responde na aula seguinte
para a turma toda ou para cada aluno, individualmente.
Dessa estrutura podem derivar diversas variações. Por exemplo, uma das
perguntas pode abordar mais especificamente o tema da aula e os alunos podem
respondê-la anonimamente ou não. O professor pode escolher atribuir uma
nota e as repostas podem ser construídas de forma colaborativa, em grupos
pequenos. Isto pode ser feito no começo ou no meio da aula.
A one minute paper pode gerar diversos benefícios. Por exemplo, quando
aplicada em grupos grandes, facilita a interação entre o professor e os alunos,
dando abertura para aqueles que têm alguma dificuldade em falar em público.
Além disso, é uma maneira de o aluno ver que o professor valoriza a sua
opinião e suas necessidades de aprendizagem.

No vídeo disponível no link a seguir, o professor também sugere o uso de smartphones


ou notebooks para a postagem das respostas.

https://qrgo.page.link/d4V6x
6 One minute thesis

Stead (2005) afirma que esta estratégia propicia aos alunos momentos de
reflexão sobre sua aprendizagem, desenvolvendo a habilidade de avaliação
ao escolher o que é mais importante e ganhando a oportunidade de rever
conceitos que não foram integralmente compreendidos.
Quando as respostas são anônimas, isso encoraja os alunos a responder o
que realmente pensam e não o que acham que os professores gostariam de ouvir.
O feedback instantâneo e imediato contribuiu para a compreensão dos
alunos. Stead (2005) relata que isso ajuda os professores a verificar se os re-
sultados de aprendizagem estão sendo alcançados, podendo rever os próximos
passos do seu planejamento. O feedback também auxilia professores iniciantes e
aqueles com disciplinas novas, pois é uma chance de validar o que planejaram.
Por fim, o feedback pode contribuir com a melhora na habilidade de escrita
e pode resgatar a atenção dos alunos no meio de uma aula (STEAD, 2005),
pois, se trata de uma pause procedure.

Three minute thesis


Three minute thesis é uma competição de comunicação de pesquisa desen-
volvida em 2008 pela universidade de Queensland. Ela dá ao pós-graduado a
oportunidade de apresentar sua pesquisa e, ao mesmo tempo, aprimorar sua
habilidade de comunicação. O participante deve ser capaz de consolidar suas
ideias e resultados de pesquisa, apresentando-os de maneira concisa, para
um público não especialista na área, em apenas três minutos (LA TROBE
UNIVERSITY, 2013).

Acesse o link a seguir e conheça a página da universidade que criou a competição 3MT.

https://qrgo.page.link/Qowvr
One minute thesis 7

BACHHEL, R.; THAMAN, R. G. Take a ‘pause’ and learn: effective use of pause procedure
to enhance student engagement and learning. Journal of Clinical and Diagnostic Rese-
arch, Delhi, v. 8, n. 8, p. XM01–XM03, Aug. 2014. Disponível em: https://www.jcdr.net/
article_abstract.asp?issn=0973-709x&year=2014&volume=8&issue=8&page=XM01&i
ssn=0973-709x&id=4691. Acesso em: 21 jun. 2019.
CHOWDHURY, F. The power of using pause procedure during accounting lecture: an
action research study. European Journal of Business and Social Sciences, [S. l.], v. 5, n. 6,
p. 101–108, Sep. 2016.
LA TROBE UNIVERSITY. Three Minute Thesis (3MT™) Student Handbook. Melbourne: La
Trobe University, 2013. 18 p. Disponível em: https://www.latrobe.edu.au/research/
downloads/StudentHandbook-3MT.pdf. Acesso em: 21 jun. 2019.
LANG, J. M. Small Changes in Teaching: Making Connections. The Chronicle of Higher
Education, Washington, 8 Feb. 2016. Disponível em: https://www.chronicle.com/article/
Small-Changes-in-Teaching-/235230/. Acesso em: 21 jun. 2019.
STEAD, D. R. A review of the one-minute paper. active learning in higher education. Active
Learning in Higher Education, Thousand Oaks; New Delhi, v. 6, n. 2, p. 118–131, July 2005.
METODOLOGIAS
PARA
APRENDIZAGEM
ATIVA

Letícia Rocha Machado


A aplicação de
metodologias ativas com
recursos tecnológicos
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Reconhecer a necessidade de atender as demandas sociais do século


XXI pela incorporação de recursos digitais.
„„ Incrementar o aprendizado por meio dos recursos de realidade au-
mentada e realidade virtual na educação.
„„ Listar diferentes recursos digitais aplicados à educação, bem como
exemplos de práticas pedagógicas aplicadas a diferentes contextos
de aprendizagem.

Introdução
A cada ano, muitas tecnologias digitais são desenvolvidas e
disponibi-lizadas para diferentes públicos as utilizarem no cotidiano
para entre-tenimento, trabalho, entre outros. Nesse panorama, a
educação deve iniciar e aprofundar debates sobre as possibilidades
que as tecnologias digitais podem proporcionar. Assim, é pertinente
que sejam realizadas discussões sobre possíveis estratégias
pedagógicas apoiadas por recursos tecnológicos e suas
potencialidades em sala de aula, além da aplicação prática destas
tecnologias.
Neste capítulo será apresentado o uso das tecnologias digitais na
edu-cação, tendo como foco a realidade aumentada e a realidade virtual
como estratégias inovadoras para uma educação dinâmica e
contextualizada.
2 A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos

Tecnologias digitais e a educação do século XXI


As tecnologias digitais já estão presentes no cotidiano escolar, o que implica
novas possibilidades de inovação nas práticas pedagógicas. No entanto,
ainda observamos práticas que valorizam a transmissão de conteúdo e não a
autoria, a criticidade e a autonomia do aluno.
As inquietações são inúmeras e recorrentes na sala de aula atual. Elas
estão relacionadas desde a definição de quais recursos tecnológicos utilizar
(e quando utilizá-los) até as estratégias pedagógicas mais adequadas para uma
sala de aula que possibilite o desenvolvimento de competências voltadas para
o século XXI. Dessa forma é possível perceber que são múltiplos os processos
e as interações envolvidos neste panorama, o que exige uma discussão mais
aprofundada sobre a temática.
É importante salientar que as tecnologias digitais por si só não são solu-
ções definitivas para a educação e muito menos irão possibilitar inovações
automáticas em sala de aula. Por vezes, observamos professores utilizando
tecnologias mais atuais, mas replicando estratégias tradicionais de educação,
como a repetição de conteúdos.
Nesse sentido, o professor tem papel fundamental neste processo, trans-
formando-se em um mediador entre o aluno, a tecnologia e o conhecimento.
Portanto, a ideia de professores que primam pela transmissão de conteúdo e
deixam de lado o potencial de desenvolvimento de alunos questionadores,
contestadores e reflexivos não é concebível na atualidade.
O aluno de hoje possui outro perfil, diferente dos alunos de alguns anos
atrás. Este aluno possui acesso ilimitado a diferentes informações, de forma
simultânea, pelo uso de dispositivos móveis, como smartphones e tablets. Esse
novo perfil de aluno que objetiva as relações sociais instantâneas, a conexão
ilimitada com a internet e o uso de recursos que primam pela mobilidade
exige que novas estratégias pedagógicas e metodologias educacionais sejam
adotadas frente às tecnologias presentes no cotidiano.
Assim, a união entre estratégias pedagógicas e tecnologias digitais pode
propiciar ao aluno do século XXI novas formas de pensar e construir com-
petências para a vida. Nesse sentido, existem muitas tecnologias digitais que
podem apoiar o processo de ensino e aprendizagem. Dentre as mais recentes,
podemos citar:
A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos 3

„„ a realidade aumentada;
„„ a realidade virtual;
„„ a robótica;
„„ a impressão 3D;
„„ as atividades de gamificação;
„„ as dinâmicas STEAM;
„„ as abordagens Makers (autoria e produção de conteúdos), entre outros.

No Quadro 1 são apresentadas algumas definições de recursos tecnológicos


que podem ser utilizados em sala de aula.

Quadro 1. Recursos tecnológicos para a sala de aula

Realidade A realidade aumentada, ou augmented reality, combina os


aumentada elementos de um ambiente real com elementos de um
ambiente virtual. A principal característica dessa tecnologia
é a possibilidade de visualização de um ambiente virtual
(como, por exemplo, objetos pequenos em tamanho
maior) além da interação com a realidade do ambiente real.
Também é conhecida como virtualidade aumentada.

Realidade A realidade virtual é uma tecnologia de interface avançada


virtual em que o usuário acessa uma imagem criada com o intuito de
gerar ao máximo a sensação de realidade e para se interagir.
No entanto, devido à utilização de técnicas e equipamentos
computacionais para a ampliação do sentimento de
presença do usuário, a interação é realizada em tempo real.

Dispositivos Os dispositivos móveis, mais conhecidos como recursos de


móveis tecnologia móvel, são todas as ferramentas que permitem o
uso durante a movimentação do usuário. Essa possibilidade
é considerada uma revolução, pois foi facilmente assimilada
no cotidiano da população, modificando as rotinas das
pessoas e as formas de tomar decisões. Os smartphones,
notebooks e tablets são exemplos de dispositivos móveis.

Plataformas As plataformas digitais de busca são portais que


digitais permitem a localização de sites que produzem
de busca conteúdos, como Google, Bing e outros.
(Continua)
4 A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos

(Continuação)

Quadro 1. Recursos tecnológicos para a sala de aula

Tecnologias As tecnologias inteligentes de voz são recursos


inteligentes tecnológicos que são acionados por comandos
de voz de voz do usuário, como a Siri, da Apple.

Vídeos Os vídeos imersivos são aqueles criados para gerar


imersivos uma experiência de realidade virtual. Esses conteúdos
são captados por equipamentos específicos para essa
finalidade ou gerados digitalmente a partir de softwares
de modelagem 3D. Imagens e vídeos 360 ou projetos
3D podem ser utilizados em vídeos imersivos.

QRCode O QRCode está relacionado ao seu significado (quick


response, código de reposta rápida). Trata-se de um código
de barras bidimensional criado para ser escaneado e
convertido em texto (interativo) como um endereço URL, um
número de telefone, uma imagem ou um link de acesso.

Assim, dentre os recursos tecnológicos apresentados, a realidade virtual e


a realidade aumentada são duas tecnologias que podem ser usadas tanto em
conjunto, de forma complementar, como separadas, em sala de aula. Ambas
possuem características e possibilidades educacionais infinitas para se utilizar
em sala de aula. Nesse sentido, é importante que os professores conheçam e
aprofundem seus conhecimentos sobre esses recursos, no intuito de transformar
suas práticas e, assim, inovar na educação.

É importante que você aprofunde seus conhecimentos sobre possibilidades de


inovação em sala de aula e como desenvolver estratégias que possam beneficiar a
aprendizagem ativa dos alunos. Um livro indicado é A sala de aula inovadora: estratégias
pedagógicas para fomentar o aprendizado ativo, dos professores Fausto Camargo e
Thuine Daros (2018), que apresenta possibilidades práticas e discute sobre o assunto.
A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos 5

Realidade aumentada e a educação


A realidade aumentada (RA) é uma tecnologia muito recente e ainda pouco
utilizada na educação por falta de conhecimento dos recursos necessários
para seu uso. A RA é a combinação de diferentes tecnologias digitais criadas
a partir da relação de recursos da informática (computador) com objetos
disponíveis no ambiente real.
A RA surgiu na década de 1990 para o treinamento de pilotos de aeronaves,
com o intuito de facilitar a aprendizagem dos mecanismos das companhias
aéreas. A partir destes primeiros usos, sua aplicação se ampliou e, com as
facilidades trazidas pelos recursos de smartphones e computadores, hoje pode
ser usada e desenvolvida por qualquer pessoa.
A tecnologia de realidade aumentada é relativamente simples, pois está
relacionada à sobreposição de objetos virtuais ao mundo real. Assim, os objetos
virtuais parecem coexistir no mesmo espaço e tempo que os objetos do mundo
real (AKÇAYIR; AKÇAYIR, 2017). Para tanto, é necessário que os objetos
reais sejam escaneados e transformados em objetos virtuais para que, depois,
façam parte da realidade novamente. Assim, para que esse processo ocorra é
necessário, na maioria dos casos, existir marcadores físicos em objetos con-
cretos. O marcador físico pode ser um QR Code ou um objeto qualquer (livros,
mapas, rótulos). Esses marcadores servem para o reconhecimento da imagem
que está inserida no objeto e, após os dispositivos móveis serem apontados
ao marcador, este reconhece e aumenta o elemento na tela do smartphone/
tablet. Outro formato de RA é a geolocalização, a partir de uma determinada
coordenada. Assim, quando o usuário estiver na coordenada estipulada ante-
riormente, ele poderá visualizar algum elemento (objeto, personagem) a partir
da tela do seu aparelho.

Existem muitos exemplos de aplicação da realidade aumentada com marcadores de


geolocalização. Um jogo que utiliza essa tecnologia é o Pokémon Go. Com um aplicativo
no smartphone, você pode apontar a câmera para uma determinada localização e será
possível visualizar um personagem Pokémon.
6 A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos

O QR Code possui informações preestabelecidas que poderão ser visualizadas por


meio de aplicativos de leitura. Essas informações podem ser textos, páginas da internet,
vídeos, entre outras.

É a interação do conteúdo virtual com o conteúdo real que possibilita a


realidade aumenta. Neste processo, o usuário pode manipular e controlar a
interação com o/do objeto, seja virtual ou real. Portanto, o sujeito deve, ini-
cialmente, ajustar o dispositivo móvel (smartphone ou tablet) no aplicativo que
possibilita a leitura e a visualização do objeto físico. Em seguida, o usuário
deve manipular e ajusta a posição física do objeto e do dispositivo móvel para
que haja interação entre os dois e, na tela dos smartphone/tablet, o usuário
poderá visualizar os objetos sobrepostos (real com virtual) (LIANG, 2015).
Esse conteúdo virtual pode ser representado por vídeos, imagens estáticas
ou animadas, textos, sons, entre outros. A Figura 1 ilustra a relação entre o
conteúdo virtual e o conteúdo real para a realidade aumentada.
As possibilidades de aplicação da realidade aumentada são muitas. No
entanto, apesar das inúmeras possibilidades de utilização, Liang (2015) res-
salta que existem poucas iniciativas acadêmicas cujo objetivo tenha sido o
desenvolvimento ou o uso dessa tecnologia em sala de aula.
Atualmente, a realidade aumentada pode ser utilizada em todos os níveis
de ensino, desde o ensino fundamental até a graduação e a pós-graduação. É
possível utilizar a RA como estratégia pedagógica integrada aos conteúdos
trabalhados em sala de aula, como experimentação e simulação de reações
químicas, situações-problema em que se utilize os QR Codes como meca-
nismos de possíveis respostas, como jogo em aplicações virtuais com reais,
entre muitas outras opções.
A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos 7

Interação

Rastreamento

Int
era ão
çã raç
e
o Int

Figura 1. Relação entre conteúdo virtual e real para a realidade aumentada.


Fonte: Untuk Dia/Shutterstock.com, GoTaR/Shutterstock.com e musmellow/Shutterstock.com.

Silva, Reis e Lopes (2018) desenvolveram um aplicativo chamado Adole-


tras. O aplicativo teve como objetivo auxiliar no processo de alfabetização de
crianças pela união de cards com letras que, combinados com smartphones,
apresentam um objeto correspondente em 3D na tela do aparelho das crian-
ças. Por se tratar de um tipo de jogo, é possível desenvolver, pela ludicidade,
diferentes competências importantes para as crianças, além de instigá-las e
motivá-las ao aprendizado.

Você ficou interessado no aplicativo Adoletras e quer testá-lo com seus alunos? Instale
o aplicativo no seu celular e explore todas as opções de realidade aumentada para
a alfabetização!
8 A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos

Já outros aplicativos possuem um conteúdo mais amplo e podem ser adap-


tados de acordo com a necessidade do aluno e do professor, como é o caso do
Atom Visualizer. Esse aplicativo não precisa de nenhum card ou impressão
para ser utilizado. Nele é possível visualizar, em 3D, os tipos de átomos, como
o potássio, o alumínio etc., em diferentes locais para os quais o dispositivo
móvel está apontado.

Você ficou interessado no aplicativo Atom Visualizer?


Assista ao vídeo disponível no link seguir ou no código
ao lado e observe as possibilidades pedagógicas de
aplicação deste aplicativo.

https://qrgo.page.link/n6iuZ

Cada vez mais, outras iniciativas no uso da RA em sala de aula estão sendo
criadas, como um manual musical no qual os alunos podem, ao apontar a
câmera do dispositivo móvel para o livro, visualizar os instrumentos musicais
em 3D e manuseá-los na tela (GOMES et al., 2016).
Existem muitas alternativas de aplicativos de RA disponíveis para a edu-
cação e outras que ainda podem ser criadas, como é o caso dos sites de QR
Codes ou de sites especializados em realidade aumentada, como o aplicativo
gratuito Qlone.
A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos 9

Acesse o Qlone nos links ou códigos a seguir.

„„ Para Android:

https://qrgo.page.link/bDLQ2

„„ Para iOs:

https://qrgo.page.link/Buo4G

O uso de realidade aumentada na educação é muito


amplo, existindo inúmeras possibilidades práticas para
se utilizar em sala de aula. O vídeo disponível no link a
seguir e no código ao lado contesta esse uso, apresen-
tando possíveis práticas pedagógicas que já utilizaram
essa tecnologia.

https://qrgo.page.link/GNocR

Realidade virtual e a educação


A tecnologia de realidade virtual está cada vez mais acessível e disponível
para diferentes públicos, desde crianças até adultos, idosos e pessoas com
deficiência. Esta é uma tecnologia que permite a imersão em outros
ambientes pelo uso de óculos e recurso tecnológicos combi-nados. Assim, a
realidade virtual pode ser de inida como um ambiente real ou
10 A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos

simulado no qual o sujeito se sente pertencente e pode interagir com os objetos


ou os personagens representados (QUEIROZ; TORI; NASCIMENTO, 2017).
A realidade virtual mais comum utiliza óculos que possibilitam a mo-
vimentação em um espaço tridimensional a partir do comando de voz, da
movimentação de braços, pernas, cabeça, etc. Assim, ao utilizar os óculos, a
tecnologia detecta os movimentos do corpo, por um dispositivo de captura, e
os integra ao ambiente virtual que replica os mesmos movimentos do mundo
presencial (SILVA; REIS; LOPES, 2018).
A realidade virtual está sendo utilizada para diferentes finalidades, inclusive
para tratamentos de saúde, como o treinamento de habilidades cirúrgicas. O
estudo de Silva, Reis e Lopes (2018), utilizou esse tipo de tecnologia para
aprimorar o equilíbrio a partir da experimentação de diferentes barreiras
em um ambiente imersivo. Outra possibilidade do uso da realidade virtual é
para a aprendizagem de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais). Nesse tipo
de tecnologia, a pessoa com deficiência poderá aprender ou aprimorar a
linguagem pelo uso de um jogo que utiliza recursos imersivos de realidade
virtual.

Acesse o link a seguir para ler o artigo LibrAR: aplicativo de aprendizagem de libras
usando realidade aumentada e realidade virtual em dispositivo móvel.

https://qrgo.page.link/8USUa

A realidade virtual é uma tecnologia que está aumen-


tando sua abrangência, inclusive na educação. Existem
muitas formas de aplicá-la em sala de aula. O vídeo dis-
ponível no link a seguir e no código ao lado apresenta o
uso de óculos de realidade virtual em sala de aula e suas
possibilidades práticas.

https://qrgo.page.link/Kvgnx
A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos 11

O uso de realidade virtual na educação é antigo. Em 1965, Sutherland (1965)


propôs o uso de abstrações para ensinar matemática aos seus alunos. Apesar de
o autor não utilizar tecnologias digitais para este desenvolvimento na época,
é possível perceber o interesse em se criar estratégias que possibilitassem a
visualização de elementos abstratos.
A realidade virtual é uma das tendências na educação que permite que
o aluno tenha acesso a situações e simulações não encontradas no dia a dia
do ambiente escolar, como aquelas que são economicamente mais caras para
serem vivenciadas: visitas a museus ou a manipulação de objetos químicos,
por exemplo. O sentimento de estar presente em determinado contexto, sem a
necessidade de sair de sua real localização, permite que o aluno experimente
e interaja com objetos além da sala de aula, abrangendo um número maior de
possibilidades educacionais para a construção do conhecimento (Figura 2).

Instiga a construção
colaborativa

Maior interatividade
do aluno com o
material

Favorece a prática
reflexiva

Apresenta instruções
menos abstratas

Apresenta tarefas mais


contextualizadas

Figura 2. Realidade virtual e suas possibilidades na educação.


Fonte: Adaptada de Halfpoint/Shuttersyock.com e Queiroz, Tori e Nascimento (2017).
12 A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos

Hoje em dia, é cada vez maior o número de universidades e escolas que


estão desenvolvendo projetos que incluem a realidade virtual como estratégia
pedagógica. Uma de suas possibilidades é desenvolver com os alunos ações que
possibilitem que ele construa seus próprios materiais de realidade aumentada
ou realidade virtual. Assim, o desenvolvimento da autonomia e do senso de
autoria é outra alternativa para enriquecer o processo de ensino e aprendiza-
gem dos alunos, principalmente se articulado com alguma tecnologia digital.
As possibilidades são inúmeras: cabe ao professor selecionar, analisar,
refletir e compartilhar experiências no uso das realidades aumentadas e das
realidades virtuais em sala de aula, no intuito de desenvolver práticas moti-
vadoras e inovadoras.

As aplicações de realidade aumentada ou virtual são muitas. No entanto, é importante


utilizar também ferramentas que possibilitem o desenvolvimento da autonomia e do
senso de autoria pelos alunos com este tipo de tecnologia.
O recurso AR SPOT foi desenvolvido para que as crianças possam projetar e aplicar a
realidade aumentada de objetos virtuais a objetos reais. O interessante desse software
é sua proposta que possibilita que a criança desenvolva a abstração de espaços virtuais
e sua relação com o real.

O AR SPOT é um ambiente de criação de realidade aumentada para


crianças. Uma extensão do projeto Scratch do MIT, esse ambiente per-
mite que as crianças criem experiências que misturam elementos reais
e virtuais. As crianças podem exibir objetos virtuais em uma cena do
mundo real observada por meio de uma câmera de vídeo e podem
controlar o mundo virtual por meio de interações entre objetos físicos.
Este projeto tem como objetivo ampliar o leque de experiências criativas
para jovens autores, apresentando a tecnologia de AR de maneira apro-
priada para esse público. Nesse processo, investigamos como crianças
pequenas conceituam experiências de realidade aumentada e modelam
o ambiente de autoria de acordo com esse conhecimento (GEORGIA
TECH, 2019, documento on-line, tradução nossa).

Você pode utilizar esse tipo de tecnologia com as crianças em sala de aula. Para
instalar o software e utilizá-lo em sala de aula, acesse o link a seguir.

https://qrgo.page.link/FRnUh
A aplicação de metodologias ativas com recursos tecnológicos 13

AKÇAYIR, M.; AKÇAYIR, G. Advantages and challenges associated with augmented


reality for education: a systematic review of the literature. Educational Research Review,
[s. l.], v. 20, p. 1–11, fev. 2017.
GEORGIA TECH. AR SPOT: an augmented-reality programming environment for children.
2019. Disponível em: http://ael.gatech.edu/lab/research/authoring/arspot/. Acesso
em: 06 jun. 2019.
GOMES, C. M. C. et al. Realidade aumentada e gamificação: desenvolvimento de au-
mentações num manual escolar de educação musical. In: ENCONTRO SOBRE JOGOS
E MOBILE LEARNING, 3., 2016, Coimbra. Atas [...]. Coimbra: Universidade de Coimbra,
2016. Disponível em: https://sapientia.ualg.pt/bitstream/10400.1/9113/1/15_EJML%20
2016_CoAut_J.Gomes.pdf. Acesso em: 06 jun. 2019.
LIANG, S. Research proposal on reviewing augmented reality applications for supporting
ageing population. Procedia Manufacturing, [s. l.], v. 3, p. 219–226, 2015.
QUEIROZ, A. C.; TORI, R.; NASCIMENTO, A. Realidade virtual na educação: panorama
das pesquisas no Brasil. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO,
28., 2017; CONGRESSO BRASILEIRO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO, 6., 2017. Anais [...].
[S. l.: s. n.], 2017. Disponível em: http://br-ie.org/pub/index.php/sbie/article/view/7549.
Acesso em: 06 jun. 2019.
SILVA, L. R.; REIS, D. S.; LOPES, M. C. LibrAR: aplicativo de aprendizagem de libras usando
realidade aumentada e realidade virtual em dispositivo móvel. In: CONGRESSO BRASI-
LEIRO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO, 7., 2018. Anais [...]. [S. l.: s. n.], 2018. Disponível em:
http://br-ie.org/pub/index.php/wcbie/article/view/8321/5997. Acesso em: 06 jun. 2019.
SUTHERLAND, I. E. The ultimate display. In: IFIPS CONGRESS, 1965, New York. Proceedings
[...]. New York: [s. n.], 1965. p. 506–508.

Leituras recomendadas
BACICH, L.; MORAN, J. (org.). Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma
abordagem técnico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018.
CAMARGO, F.; DAROS, T. A sala de aula inovadora: estratégicas pedagógicas para fo-
mentar o aprendizado ativo. Porto Alegre: Penso, 2018.
SILVA, T. S. C. et al. Adoletras: um jogo de realidade aumentada para auxiliar no processo
de alfabetização. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO, 6.,
2017. Anais [...]. [S. l.: s. n.], 2017. Disponível em: http://br-ie.org/pub/index.php/wcbie/
article/view/7386/5182. Acesso em: 06 jun. 2019.
METODOLOGIAS PARA
APRENDIZAGEM
ATIVA

Pablo Rodrigo Bes


Rotação por estações
e dramatização
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Identificar as possibilidades de aplicação da estratégia de rotação


por estações.
„„ Demonstrar como os desafios de cada estação podem ser aplicados
por meio de diferentes estratégias e recursos.
„„ Planejar cada desafio das estações, contemplando a interdisciplinari-
dade e a dramatização como possibilidades de aprendizado.

Introdução
A educação híbrida tem revolucionado as formas de promoção de ensino
e aprendizagem ao redor do mundo, sendo vista como a vanguarda dos
movimentos educacionais contemporâneos. É seu mérito romper com
as ideias cristalizadas sobre a educação realizada somente em sala de
aula, por meio da exposição de conteúdos pelo professor, fazendo com
que o aluno se aproprie do conhecimento em sua casa, a partir do uso
de tecnologias digitais, estudos on-line no ambiente virtual escolar, pela
prática destes na escola e pela realização das atividades planejadas e
propostas pelos professores. Isso exige que o professor conheça e planeje
suas atividades ativas em sala de aula, utilizando modelos educacionais
típicos do blended learning como a rotação por estações, que dispõe de
diferentes formatos e possibilidades a serem adaptadas aos objetivos de
aprendizagem requeridos.
Neste capítulo, você irá estudar sobre as possibilidades de utilização
da rotação por estações na educação híbrida. Conhecerá as estratégias e
os recursos a serem utilizados em cada tipo de estação proposto, assim
como aprenderá a planejar os desafios das estações a partir da interdisci-
plinaridade e do uso da dramatização.
2 Rotação por estações e dramatização

A rotação por estações e suas possibilidades


Existem muitos modelos dentro da educação híbrida e cada um deles apresenta
uma especificidade e características particulares, podendo ser utilizados para
compor o planejamento dos professores para a utilização de suas metodologias
ativas durante os encontros em que recebe os alunos em sala de aula. Uma
das maneiras interessantes e eficazes de reforçar, testar e complementar a
aprendizagem dos alunos na educação híbrida é a utilização da técnica co-
nhecida como rotação por estações. É importante percebermos que, conforme
salientam Horn e Staker (2015), as escolas já costumam utilizar o modelo de
rotação por atividades diferenciadas (estações) há muitas décadas. No entanto,
ao falarmos em educação híbrida, um novo e decisivo elemento se insere no
contexto atual: a fase on-line. Dessa forma, algumas das estações utilizadas
para enriquecer a aprendizagem a partir de atividades práticas deverão ser
realizadas on-line.
Na rotação por estações, o professor organiza os alunos em grupos que
deverão se alternar entre as estações, realizando as atividades propostas. Essas
atividades estão envolvidas com o planejamento realizado pelo professor e
podem se apresentar de maneiras bastante diversificadas, não deixando de
incluir as atividades realizadas on-line no circuito. Após cada grupo realizar
as práticas da estação em que se encontra, é realizado um rodízio entre os
grupos das estações para que todos participem das várias etapas que compõem
a rotação completa. Os alunos podem ser organizados, ainda, de modo a troca-
rem de grupos caso seu interesse não seja o mesmo dos colegas na sequência
que está sendo seguida. No entanto, ao final da rotação, todos deverão ter
concluído todas as estações.
As estações serão estruturadas de acordo com os objetivos que o professor
pretende que os alunos atinjam com as atividades, podendo apresentar os tipos
de estação listados a seguir.

„„ Estação da pesquisa.
„„ Estação de brainstorming.
„„ Estação mão na massa.
„„ Estação de representação.
„„ Estação de apresentação.
Rotação por estações e dramatização 3

A estação da pesquisa é a etapa em que o grupo receberá as informações


sobre aspectos relevantes dos conteúdos, incluindo os objetivos que deverão
atingir no decorrer de todo o processo rotacional. É importante que os alunos
compreendam que deverão cumprir com todas as estações para que adquiram
as aprendizagens necessárias e desenvolvam as habilidades propostas. É
comum que o professor localize as atividades on-line durante esta estação,
permitindo que os alunos acessem as informações disponíveis na internet, já
previamente preparadas e selecionadas pelos professores, como a assistência
de um vídeo sobre o tema, coleta de dados estatísticos e conhecimentos gerais
sobre o assunto. Os professores também podem se valer desta estação para
que os alunos utilizem o próprio ambiente virtual da escola para ter acesso a
conhecimentos pertinentes.
A estação de brainstorming deriva da técnica conhecida como tempestade
de ideias e sugere ao grupo de alunos que articulem seus pensamentos em
torno do tema estudado, apontando suas hipóteses e servindo como mecanismo
exploratório sobre o objeto pesquisado. Aqui o professor pode trabalhar coma
construção de cartazes, mapas conceituais, esquemas, croquis, entre outras
formas, para que os grupos possam registrar suas impressões diversas sobre
o tópico de estudo.
A estação mão na massa segue dentro da cultura maker e do aprender-
-fazendo. Esta estação prevê que os grupos tenham que construir algo, desem-
penhando alguma ação que se relacione com o tema que vem norteando sua
trajetória pelas estações. Por exemplo, em modelos de rotação por estações para
trabalhar os conteúdos de geometria, a estação mão na massa poderia exigir do
grupo a construção de algumas formas geométricas a partir de materiais diversos.
A estação de representação é aquela que irá se utilizar dos elementos da
criatividade e da inovação para que os grupos representem as aprendizagens
adquiridas até então com dramatizações, valendo-se de técnicas de teatro e
improvisação. Esta estação, além de permitir que os alunos elaborem melhor
seus conhecimentos adquiridos pela arte de representar, também propicia
que desenvolvam suas habilidades de relacionamento interpessoal e controle
emocional, contribuindo para a melhoria da comunicação e da desinibição.
A estação de apresentação é aquela em que ocorrerá a culminância do
processo de rotação e em que será realizado o relato oral (ou dramatizado) dos
resultados encontrados pelos grupos que realizaram a rotação. Esta estação
ajuda a reforçar as aprendizagens e permite que o docente faça um diagnóstico,
a partir das falas dos alunos, sobre quais itens devem ser mais bem aprofun-
dados com a turma, visando aperfeiçoar o modelo rotacional para quando for
utilizado novamente no futuro.
4 Rotação por estações e dramatização

Para que possa visualizar melhor o funcionamento da rotação por estações, acompanhe
este exemplo que uma professora de uma turma de 5º ano do ensino fundamental
preparou para a aprendizagem da unidade temática de matéria e energia, da disciplina
de Ciências, na qual trabalha, seguindo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), os
objetos de conhecimento sobre consumo consciente e reciclagem com seus alunos.
Segundo a BNCC (BRASIL, 2018, p. 341), os alunos deverão desenvolver as seguintes
habilidades: “[...] Construir propostas coletivas para um consumo mais consciente e
criar soluções tecnológicas para o descarte adequado e a reutilização ou reciclagem
de materiais consumidos na escola e/ou na vida cotidiana”. Acompanhe no esquema
abaixo como a professora estruturou sua rotação por estações.

Estação 1
Sensibilizando
para o tema

Estação 2
Estação 4
Sustentabilidade
Dramatizando
na prática

Estação 3
Afinal o que
é
degradação
ambiental?

Perceba que a professora optou pela construção de quatro estações para utilizar
durante o período de um dia de aula, sendo que montou seu cronograma da seguinte
maneira.
„„ Dividiu a turma em seis grupos de cinco alunos.
„„ Estruturou o espaço físico da estação 1 no laboratório de informática da escola
para que os alunos pudessem ter contato com o material que havia previamente
selecionado e pudessem pesquisar on-line.
„„ Definiu a estação 2, de caráter prático, prevendo a realização de atividades de
separação e classificação de resíduos e ideias criativas para os temas envolvidos, e
a estação 3, com caráter de brainstorming e análise das informações já adquiridas.
As estações foram estruturadas dentro da sala da professora.
Rotação por estações e dramatização 5

Ambos os grupos realizam a rotação entre as estações 1, 2 e 3 durante os primeiros


períodos de aula, antes do intervalo, uma vez que participam dois grupos por estação.
Após o intervalo, todos se dirigem, mantendo os grupos, para o ginásio da escola,
onde irão projetar, ensaiar e apresentar os resultados com pequenas dramatizações
sobre o tema. Estruturando as estações dessa forma, a professora pôde acompanhar
os alunos durante a maior parte dos momentos em que estiveram em atividade,
contando somente com o apoio da professora do laboratório de informática da escola.

Podemos perceber que a rotação por estações é um modelo que pode ser
adaptado às características da turma, aos recursos e espaços que a escola
oferece, bem como aos conteúdos e habilidades que são requeridos dos alunos,
fornecendo uma excelente opção para que os professores possam tornar suas
aprendizagens mais dinâmicas e significativas.

Um detalhe importante ao trabalharmos com a rotação por estações é o fechamento


da atividade, quando o professor deverá prever maneiras para que os grupos possam
expressar aquilo que aprenderam ao longo do processo de realização das atividades
de cada estação. Logo, planejar a utilização do modelo de rotação por estações
exige uma boa programação do tempo e das atividades, podendo ser utilizado um
cronograma para isto .

Desafios, estratégias e recursos das estações


As atividades de planejamento por parte dos docentes são imprescindíveis
para que o modelo de educação híbrida de rotação por estações possa cumprir
com suas finalidades de forma mais eficiente e, assim, atingir os objetivos de
aprendizagem propostos. O planejamento do professor deve ser feito a partir da
observação de três etapas decisivas: a análise, a reflexão e a previsão (HAYDT,
2006). O processo de planejamento educacional na educação híbrida também
deve partir da análise de condições existentes, de situações sobre a qual se
queira atuar buscando melhorias em algum aspecto pedagógico ou, ainda,
de dificuldades encontradas na escola, partindo para a reflexão sobre estes
aspectos, suas causas, suas variáveis determinantes e, enfim, prevendo formas
6 Rotação por estações e dramatização

de resolver tais questões, propondo-se um plano. Logo, podemos perceber que


enquanto o planejamento é um processo que envolve as três etapas citadas, o
plano é a materialização desse processo, o caminho que será utilizado para
nortear as ações que foram organizadas e previstas para resolver o problema
analisado e refletido pelo docente ou pelos gestores escolares.
O planejamento das estações que serão disponibilizadas aos alunos deve
nos fornecer respostas para as seguintes perguntas:

„„ O que pretendemos realizar?


„„ O que iremos fazer?
„„ Como iremos fazer?
„„ Quais são os recursos que se encontram aqui envolvidos (materiais,
financeiros, pedagógicos, humanos, tempo, tecnologias digitais)?
„„ Quando realizaremos?
„„ Quem participará?
„„ O que se deseja atingir como resultado dessa ação?

Responder a estes questionamentos possibilita a construção de um plano


bem estruturado e que aumentará as possibilidades de sucesso na conquista
dos objetivos de aprendizagem traçados.
Para que possamos traçar as melhores estratégias ao utilizarmos algum
modelo da educação híbrida com nossos alunos, podemos considerar em nosso
planejamento os itens a seguir:

„„ alunos;
„„ objetivos;
„„ recursos;
„„ conteúdos;
„„ tempo;
„„ procedimentos;
„„ avaliação.

A partir desses itens, podemos entender com mais clareza como iremos
estruturar as estações que farão parte da rotação que estamos planejando.
Vamos exemplificar com uma rotação por estações para a educação infantil.
Rotação por estações e dramatização 7

Alunos
Os alunos são de uma turma de educação infantil da pré-escola, tendo em
média cinco anos de idade. A turma conta com 18 alunos, sendo 12 destes
meninos e seis meninas. Todos demonstram certo nível de autonomia e não
apresentam grandes conflitos de relacionamento. Um colega apresenta trans-
torno do espectro autista.

Objetivos
A proposta da rotação por estações busca desenvolver alguns dos objetivos
de aprendizagem e desenvolvimento elencados nos seguintes campos de
experiência da BNCC (BRASIL, 2018): O eu, o outro, o nós e o corpo, gestos
e movimento. Os principais objetivos perseguidos são: “ampliar as relações
interpessoais, desenvolvendo atitudes de participação e cooperação” (BRA-
SIL, 2018, p. 45) e “demonstrar controle e adequação do uso de seu corpo em
brincadeiras e jogos, escuta e reconto de histórias, atividades artísticas, entre
outras possibilidades” (BRASIL, 2018, p. 47). Perceba que os objetivos estão
diretamente implicados com o formato que as estações irão tomar, pois são
eles que deverão ter sido apreendidos pelos alunos durante sua participação
nas estações.

Recursos
Os recursos devem ser planejados para cada tipo de estação específica. Neste
caso, a professora planeja utilizar três estações: uma do tipo pesquisa, uma
mão na massa e uma de representação/apresentação. Para que pudesse prever
os recursos necessários para cada estação, a professora construiu o Quadro 1.
8 Rotação por estações e dramatização

Quadro 1. Recursos por estação

Estação Recursos Tempo Observações

Estação da Computadores 13h – 15h A professora deslocou


pesquisa e rede on-line. três computadores
Vídeos curtos e do laboratório de
Título: animações em 15h: lanche informática da escola
Navegando que as atitudes para a sua sala de aula,
na internet de cooperação e que permitem acesso à
participação dos internet via rede wireless.
personagens são Para isso, montou
evidenciadas. uma estação em um
dos cantos da sala.

Estação mão Blocos de 13h – 15h Na área coberta em


na massa encaixe, frente à sala de aula,
colchonetes, a professora montou
Título: Eu almofadas, 15h: lanche um circuito no qual os
quero, eu bambolês, alunos deverão realizar
posso! cones, apito e atividades colaborativas
cronômetro. em sequência, contando
tempos individuais
e em equipes.

Estação Fantoches de 15h30min A apresentação dos


de repre- personagens – 17h30min resultados finais será
sentação/ diversos, realizada na sala de
apresentação tanto pessoas atividades múltiplas da
quanto animais, escola, que possui palco
Título: Ah... se frutas e outros para dramatizações e
meu fantoche elementos, teatro de fantoches.
falasse... estrutura para
apresentação
de teatro de
fantoches,
dedoches e
tatame com
almofadas para
a plateia.
Rotação por estações e dramatização 9

Conteúdos
Por se tratar da educação infantil, os conteúdos irão se alinhar com os campos
de experiência que a professora está focando, permitindo que alcance seus
objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, como comunicação entre as
pessoas, bons hábitos de educação no relacionamento (palavras mágicas:
com licença, obrigado, por favor, me desculpe), jogos e brincadeiras, escutar
e recontar histórias, entre outros.

Tempo
A distribuição do tempo também é um item fundamental para o sucesso da
rotação por estações. Neste caso, perceba na tabela dos recursos que o tempo
foi dividido entre os espaços antes e depois do lanche dos alunos, que costuma
ocorrer no refeitório da escola, em horário fixo. Para turmas de ensino fun-
damental, ensino médio ou, ainda, na educação superior, as estações podem
ser divididas em períodos de aula ou horas.

Procedimentos
Este item ajuda o professor a perceber como irá agir em cada estação. Por
exemplo, quando os alunos chegarem à estação navegando na internet, serão
recebidos pela monitora da turma, que explicará a proposta a todos. Depois
disso, irá explicar aos alunos que eles têm cinco possibilidades de vídeos e
animações e deverão escolher entre elas, chegando a um consenso do grupo
(lembre que um dos objetivos aqui é a participação e a colaboração). Após
a escolha, os alunos irão assistir ao vídeo selecionado. Em seguida, irão
acessar a uma plataforma de jogos que se relaciona com o tema deste vídeo
e, ao interagirem entre si e com o quiz, irão responder juntos. Ao pensar nos
procedimentos, o professor deve prever atividades que possam ser realizadas
caso um grupo apresente um ritmo diferente dos demais (mais lento ou mais
rápido) para que, em todos os casos, os objetivos sejam atingidos. Lembre
que, quando descrevemos o perfil dos alunos, comentamos que há um colega
autista. Neste caso, quais adaptações serão necessárias para que este aluno
passe pelas estações? Isso deve ser levado em conta.
10 Rotação por estações e dramatização

Avaliação
Para cada uma das estações, deverão ser previstos formatos de avaliação, de
acordo com a etapa de educação que está sendo aplicada à rotação de estações.
No caso da educação infantil, a professora e sua monitora (auxiliar) irão se
basear na observação e no registro dos grupos, assim como nos aspectos indi-
viduais mais pertinentes para comporem seus portfólios de avaliação da turma.

Inovação e motivação
Considerando ainda uma das funções didáticas importantes no contexto da
utilização das metodologias ativas na educação híbrida, gostaríamos de destacar
a inovação e a motivação. Conforme salientam Camargo e Daros (2018) em
suas conversas com alunos da educação básica e do ensino superior sobre os
modos de ensinar e aprender, constataram que:

[...] o ensino essencialmente transmissivo, centrado unicamente no conheci-


mento do professor, é motivo para muitas insatisfações. Reclamam não só do
fato de terem de ficar horas ouvindo, mas também da rigidez dos horários,
do distanciamento do conteúdo proposto com a vida pessoal e profissional
e dos recursos pedagógicos pouco atraentes. Ao conversar com professores,
as queixas são similares. Reclamam da falta de envolvimento, do excesso de
desinteresse dos alunos e das condições do exercício docente.

Dessa forma, para que exista motivação, é necessário que em toda estação
iniciada pelos alunos existam mecanismos desafiadores e criativos, que possam
trazer sua atenção para os temas que serão trabalhados, despertando o interesse
e os motivando a seguir em frente. Boas técnicas de introdução e motivação
costumam envolver um desafio, um enigma, um problema pertinente ao tema,
um disparador para pensar, um videoclipe, um vídeo curto chocante, a letra
de uma música ou, ainda, uma encenação por parte do professor, entre tantas
outras técnicas.
Rotação por estações e dramatização 11

Quando formos utilizar uma estação do tipo brainstorming, devemos trabalhar com os
alunos as regras básicas que cercam esta técnica de dinâmica grupal. Estas normalmente
giram em torno dos seguintes itens: cada um deve falar de uma vez; a quantidade
importa, deve-se procurar criar o máximo de ideias possíveis sobre o tema; construa
sobre a ideia dos outros; encoraje as ideias excêntricas; seja visual; mantenha o foco,
fique no assunto proposto inicialmente; não faça críticas ou julgamentos, todas as
participações são bem-vindas.

A interdisciplinaridade e a dramatização como


estratégias a serem utilizadas nas estações
Viemos aprendendo sobre os cuidados a se considerar no planejamento do
modelo híbrido de rotação por estações, uma vez que essa ação nos ajuda
a atingir a eficiência em relação aos objetivos que perseguimos com nossos
alunos. Gostaríamos de comentar sobre outros aspectos que também são de
grande relevância e que devem ser considerados ao se propor os desafios que
compõe as estações planejadas pelo professor: a interdisciplinaridade e a
dramatização.
A interdisciplinaridade é um dos temas que tem sido discutido, visando
modificar os paradigmas educacionais contemporâneos que proporcionam o
ensino dos conteúdos de forma fragmentada, sem estabelecer conexões entre
disciplinas e áreas do conhecimento. Buscar uma prática interdisciplinar sig-
nifica, de acordo com Fazenda (2018), “mais processo que produto”, não sendo
vista somente como “categoria do conhecimento, mas de ação”, significando
uma tentativa de romper com discursos soberanos nos sistemas educacionais
em que nos encontramos e, inclusive, subverter a própria maneira como fomos
ensinados durante nosso processo de escolarização.
Ao analisar as diversas fases pelas quais o conceito de interdisciplinaridade
percorreu ao longo das décadas de 1970, 1980 e 1990, a autora enfatizou que:

A revisão contemporânea do conceito de ciência orienta-nos para a exigência


de uma nova consciência, que não se apoia apenas na objetividade, mas que
assume a subjetividade em todas as suas contradições. A partir da constata-
ção de que a condição da ciência não está no acerto, mas no erro, passou-se
a exercer e a viver a interdisciplinaridade das mais inusitadas formas (FA-
ZENDA, 2018, p. 34).
12 Rotação por estações e dramatização

Partindo da citação da autora, percebemos que a interdisciplinaridade


considera a subjetividade em seu processo, o que também se faz presente nos
modelos da educação híbrida. Dessa forma, imagine o ganho na aprendiza-
gem a partir do momento em que você, como professor(a), passa a utilizar
o modelo de rotação por estações e possibilita aos seus alunos que optem
pelos itinerários que irão realizar entre as estações ou, ainda, que dentro de
cada estação poderão realizar escolhas, optando pelos assuntos que mais lhe
agradam e tendo como possibilidade a relação entre diversos conteúdos que
vêm aprendendo, inclusive em áreas de conhecimento diferentes.
Infelizmente, ainda são poucos os professores que se arriscam a buscar uma
postura interdisciplinar em seus projetos e planejamentos de aula, desfazendo-
-se das amarras das ciências cartesianas que, na maioria das vezes, fizeram
parte de nossa escolarização inicial. Veiga-Neto (2002, p. 23) nos leva a refletir
quando comenta que:

Todos nós que hoje exercemos a docência ou a pesquisa em Educação tivemos


uma formação intelectual e profissional nos moldes iluministas. Uma das
consequências disso é que talvez não estejamos suficientemente aptos para
enfrentar, nem mesmo na vida privada, as rápidas e profundas mudanças
culturais, sociais, econômicas e políticas em que nos achamos mergulhados.

Que possamos nos sentir desafiados a romper com os moldes nos quais
fomos escolarizados para nos tornarmos professores melhores, mais dinâmicos
e atualizados com as modificações que hoje são consideradas como os novos
paradigmas educacionais, entre eles a interdisciplinaridade e a utilização das
metodologias ativas e da educação híbrida.
A educação híbrida, a partir de seus modelos educacionais, proporciona
que as operações de pensamento possam se realizar de forma inovadora,
quebrando os padrões tradicionais ao incluir ações dessa natureza. Ao analisar
os processos de inovação que surgem a partir da educação híbrida, Camargo
e Daros (2018) chamam atenção para o fato de que

[...] é necessário considerar que o processo de ensino-aprendizagem é algo


extremamente complexo, possui caráter dinâmico e não acontece de forma
linear, exigindo ações direcionadas, para que os alunos possam se aprofundar
e ampliar os significados elaborados mediante sua participação.

Ao utilizar estratégias interdisciplinares, o professor pode manter a dina-


micidade e tornar as práticas vivenciais mais significativas para os alunos.
Rotação por estações e dramatização 13

Outro recurso interessante e importante para as estações é a dramatização,


o que pode ser feito em estações específicas para tal ou, ainda, articulada
com estações de representação/apresentação de resultados ao final da rotação
realizada pelos alunos. O teatro tem sido utilizado na área da educação com
mais intensidade em turmas de educação infantil, em que os alunos costumam
assistir suas peças, e na educação básica, como forma de projetos específicos
ou grupos teatrais que recebem aqueles que se interessam em participar, o que
é uma pena, pois acreditamos que, como descrito por Cavassin (2008, p. 48):

O teatro [...] pode ser a brecha que se abre na nova perspectiva da ciência e
ensino-aprendizagem, pois envolve essencialmente o que o soberanismo da
lógica clássica e do modelo racional excluía; o ilógico, as possibilidades (o
“vir a ser”), a intuição, a intersubjetivação, a criatividade... enfim, elementos
existentes nas relações dessa manifestação artística e que são princípios para
a concepção de Inteligência na Complexidade e vice-versa.

Dessa forma, tal como a educação híbrida surge para renovar a educação
contemporânea, quebrando paradigmas anteriores, também a utilização do
teatro remete ao uso de outras lógicas para a aprendizagem, que podem pro-
mover novos ganhos de criatividade e inovação sobre os objetos que estão
sendo estudados, partindo das manifestações artísticas dos alunos.
Ao se referir ao teatro espontâneo em pequenos grupos, Davoli (1999, p. 81)
comenta sobre alguns passos interessantes que devem ser utilizados, a título
de aquecimento anterior às práticas de dramatização. São eles:

1. ambientação;
2. grupalização;
3. preparação para o papel de ator;
4. preparação para o papel de autor;
5. preparação da plateia.

A ambientação serve para que os alunos possam se apropriar das caracterís-


ticas do local onde a estação está organizada, no qual irão atuar ao dramatizar
para os colegas. Todos os elementos do local devem ser explorados de forma
individual e coletiva, como as distâncias, a altura, os objetos ali dispostos, os
sons e os cheiros existentes. A grupalização serve para que o grupo possa
se conhecer melhor em relação à possibilidade de dramatização, percebendo
as características e aptidões de cada um, sua capacidade de improviso, níveis
14 Rotação por estações e dramatização

de desinibição, entre outros. Também é o momento em que devem ser reali-


zados exercícios teatrais com os participantes do grupo que irão dramatizar
posteriormente.
Após ambientados e com o processo de grupalização bem definido, pas-
samos para a preparação dos papéis de ator e de autor. Para os atores, deve
ficar claro que estarão desempenhando um papel em si, não serão mais a própria
pessoa e sim o personagem que construíram para a peça. Os atores devem
aquecer seus corpos e suas vozes para atuar. Já o papel de autor é escolhido
quando o grupo pensa sobre o que pretende dramatizar e cria a peça que
irão encenar posteriormente para a plateia . Este é o momento de se definir
o protagonista, o antagonista, a linguagem que será utilizada, os eventos que
ocorrerão, as emoções, entre outros pontos.
Segundo Davoli (1999), a fase de preparação da plateia apresenta inúme-
ras possibilidades, como a de incluir membros do grupo já aquecidos em seu
meio para que possam se infiltrar e participar da dramatização em momentos
combinados, envolver os demais que assistem, interagindo e compondo cenas
de forma voluntária, realizando sons que são necessários durante a peça,
entre outras estratégias que mantém o foco e a atenção de todos durante a
dramatização do grupo.
Perceba que utilizar uma estação para dramatização exige certo conheci-
mento e empenho por parte do professor, para que possa se extrair o máximo
dos grupos que ali participam. O melhor resultado alcançado com a dramati-
zação nem sempre é a peça apresentada, o produto final, mas sim as relações
interpessoais e os processos internos de cada aluno, que durante a vivência
das etapas vai sendo elaborado subjetivamente, reforçando ainda mais sua
aprendizagem sobre o tema específico que vem sendo desenvolvido ao longo
de toda a rotação por estações.
No Quadro 2 observamos as operações de pensamento que podem ser
realizadas a partir da rotação por estações.
Rotação por estações e dramatização 15

Quadro 2. Operações de pensamento que podem se realizar a partir da rotação por es-
tações

Operação de
Conceito/relações
pensamento

Aplicação de Solucionar problemas e desafios, aplicando aprendizados


fatos e princípios anteriores, usando a capacidade de transferências,
a novas situações aplicações e generalizações ao problema novo.

Busca de Supor é aceitar algo sem discussão, podendo ser


suposições verdadeiro ou falso. Temos de supor sem confirmação
dos fatos. Após exame cuidadoso, pode-se verificar quais
são as suposições decisivas, o que exige discriminação.

Classificação Colocar em grupos, conforme princípios, dando ordem à


existência. Exige análise e síntese por conclusões próprias.

Comparação Examinar dois ou mais objetos ou processos com a


intenção de identificar relações mútuas, pontos de
acordo e desacordo. Supera a simples recordação,
enquanto ação de maior envolvimento do aluno.

Crítica Efetivar julgamento, análise e avaliação, realizando


o exame crítico das qualidades, dos defeitos, das
limitações. Segue referência a um padrão ou critério.

Decisão Agir a partir de valores aceitos e adotados na escolha,


possibilitando a análise e consciência deles. A escolha
é facilitada quando há comparação, observação,
imaginação e ajuizamento, por exemplo.

Imaginação Imaginar é ter alguma ideia sobre algo que não está
presente, percebendo mentalmente o que não foi
totalmente percebido. É uma forma de criatividade,
liberta dos fatos e da realidade. Socializar o imaginado
introduz flexibilidade às formas de pensamento.

Interpretação Processo de atribuir ou negar sentido à experiência,


exigindo argumentação para defender o ponto
proposto. Exige respeito aos dados e atribuição de
importância, causalidade, validade e representatividade.
Pode levar a uma descrição inicial para depois haver
uma interpretação do significado percebido.

(Continua)
16 Rotação por estações e dramatização

(Continuação)

Quadro 2. Operações de pensamento que podem se realizar a partir da rotação por es-
tações

Operação de
Conceito/relações
pensamento

Levantamento Propor algo apresentado como possível solução para


de hipóteses um problema. Forma de fazer algo, esforço para explicar
como algo atua, sendo guia para tentar a solução de
um problema. Proposição provisória ou palpite com
verificação intelectual e inicial da ideia. As hipóteses
constituem um interessante desafio ao pensar do aluno.

Observação Prestar atenção em algo, anotando cuidadosamente.


Examinar minuciosamente, olhar com atenção,
estudar. Sob a ideia de observar existe o procurar,
identificar, notar e perceber. É uma forma de descobrir
informação. Compartilhada, amplia o processo
discriminativo. Exige objetivos definidos, podendo ser
anotada, esquematizada, resumida e comparada.

Obtenção e A base de um trabalho independente. Exige objetivos


organização claros, análise de pistas, plano de ação, definição de
dos dados tarefas-chave, definição e seleção de respostas e de
tratamento delas, organização e apresentação do material
coletado. Requer identificação, comparação, análise,
síntese, resumo, observação, classificação, interpretação,
crítica, suposições, imaginação, entre outros.

Planejamento Projetar é lançar ideias, intenções, utilizando-se esquema


de projetos e preliminar, plano, grupo, definição de tarefas, etapas,
pesquisas divisão e integração de trabalho, questão ou problema,
identificação das questões norteadoras, definição de
abrangência, de fontes, definição de instrumentos
de coleta dos dados, validação de dados e respostas,
etapas e cronograma. Requer identificação, comparação,
resumo, observação, interpretação, busca de suposições,
aplicação de princípios, decisão, imaginação e crítica.

Resumo Apresentar de forma condensada a substância do que


foi apreciado. Pode ser combinado com a comparação.

Fonte: Adaptado de Anastasiou e Alves (2015).


Rotação por estações e dramatização 17

Acesse o link a seguir e observe, pelas expressões das crianças, como a aplicação de
oficinas de teatro pode fazer a diferença nos processos de ensino e aprendizagem.
Esta também é uma excelente técnica a ser utilizada para compor uma das estações
do modelo de rotação por estações.

https://qrgo.page.link/yP19W

Como professor no ensino superior de uma turma de Pedagogia a distância, na mo-


dalidade semipresencial, em que nos encontrávamos em sala de aula uma vez por
semana, pude colocar em prática a interdisciplinaridade ao produzir os conteúdos que
compunham a plataforma dos alunos e também utilizei do recurso da dramatização
em sala de aula. Lembro de um desses momentos, quando os alunos estudavam
sobre os aspectos da educação, da diversidade e da cultura, em que criei fóruns que
tratavam de forma interdisciplinar estes tópicos em três disciplinas diferentes e que,
ao final, propunham como desafio uma narrativa de vida por parte de cada aluno,
abordando seus aspectos étnicos, sociais e culturais. No encontro presencial, propus
que dramatizássemos algumas das narrativas expostas pelos alunos. Para isto, reunimos
o grupo, foram escolhidas as histórias mais pertinentes e emocionantes que, com o
consentimento dos autores, foram preparadas, transformadas em pequenas peças,
ensaiadas e apresentadas a todos ao final da aula. Com as apresentações das histórias de
vida daqueles grupos de alunos entendi que os meus objetivos tinham sido plenamente
atingidos, pois as encenações ilustravam de forma prática, por meio de representações
cotidianas, alguns conceitos complexos que havíamos estudado, como a importância
da cultura e das tradições familiares para a formação da subjetividade humana.

ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. (org.). Processos de ensinagem na universidade: pres-


supostos para as estratégias de trabalho em aula. 10. ed. Joinville: Univille, 2015. 155 p.
18 Rotação por estações e dramatização

BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base nacional comum


curricular: educação é a base. Brasília: Ministério da Educação, 2018. 595 p. Disponível
em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofi-
nal_site.pdf. Acesso em: 26 maio 2019.
CAMARGO, F.; DAROS, T. A sala de aula inovadora: estratégias pedagógicas para fomentar
o aprendizado ativo. Porto Alegre: Uniamérica; Penso, 2018. 144 p.
CAVASSIN, J. Perspectivas para o teatro na educação como conhecimento e prática
pedagógica. Revista Científica / FAP, Curitiba, v. 3, p. 39–52, jan./dez. 2008. Disponível
em: http://periodicos.unespar.edu.br/index.php/revistacientifica/article/view/1624.
Acesso em: 26 maio 2019.
DAVOLI, C. Aquecimento: caminhos para a dramatização. In: ALMEIDA, W. C. (org.). Gru-
pos: a proposta do psicodrama. São Paulo: Ágora, 1999. p. 77–88.
FAZENDA, I. C. A. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. 18. ed. Campinas:
Papirus, 2018. 144 p.
HAYDT, R. C. C. Curso de didática geral. 8. ed. São Paulo: Ática, 2006. 327 p.
HORN, M. B.; STAKER, H. Blended: usando a inovação disruptiva para aprimorar a edu-
cação. Porto Alegre: Penso, 2015. 320 p.
VEIGA-NETO, A. Olhares. In: VEIGA-NETO, A. Caminhos investigativos: novos olhares na
pesquisa em educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. p. 23–38.
METODOLOGIAS PARA
APRENDIZAGEM ATIVA

Pablo Rodrigo Bes


Storyboard/storytelling
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Descrever o potencial das estratégias de aprendizagem ativa pautadas


em narrativas de problemas reais.
„„ Identificar o potencial das estratégias de aprendizagem ativa de story-
board e storytelling.
„„ Listar os diferentes modos de aplicação das estratégias storyboard e
storytelling nos contextos de aprendizagem.

Introdução
O uso da produção de narrativas é uma estratégia de aprendizagem
muito valiosa para que os alunos possam desenvolver suas capacidades
de descrição, organização e planejamento de ideias sobre um tema
proposto ou em direção à solução de um problema. No cenário contem-
porâneo, os professores podem utilizar recursos digitais para que seus
alunos produzam algumas destas estratégias ativas de aprendizagem que
envolvem as narrativas, como o storyboard e o storytelling, que ajudam
a organizar, estruturar as histórias e criá-las/contá-las, respectivamente,
de forma criativa e inovadora.
Neste capítulo, você aprenderá sobre os benefícios do uso de narra-
tivas para o desenvolvimento da aprendizagem. Além disso, você
aprenderá sobre as estratégias de storyboard e storytelling,
conhecendo suas características, potencialidades e formas de
aplicação.
2 Storyboard/storytelling

Potencial das narrativas


O uso de narrativas na convivência em sociedade faz parte da história da
humanidade, tendo nos acompanhado no decorrer de nossa própria evolução
e do aprimoramento de nossa cultura. Mesmo países ou continentes, que
inicialmente não aderiram ao surgimento da escrita e seus registros, como o
continente africano, por exemplo, mantiveram suas tradições e perpetuaram
sua cultura a partir do trabalho de hábeis contadores de história, que tinham
como função transmitir para as gerações por vir os ensinamentos, as tradições,
as vivências e as experiências exitosas ou mal sucedidas de seus antecessores.
As narrativas também foram utilizadas com conotação moral pelas fábulas e
pelos contos de fada, contribuindo para a formação de subjetividades desde
a infância, impondo modelos de papéis sociais abordados nas histórias. As
narrativas ainda podem ser utilizadas como recurso metodológico de pesquisas,
como as narrativas de si mesmo, nas quais aquele que narra normalmente
revisita suas memórias, selecionando e reescrevendo a própria história. As
narrativas têm tanto potencial externo quanto interno, pois afetam os sujeitos
que às leem, observam, e proporcionam que, internamente, por suas escritas
e imagens, seu criador também se modifique.
Trazendo a discussão para o cenário contemporâneo, podemos considerar
que a possibilidade de uso das narrativas se ampliou muito, acompanhando
as tendências dos avanços na área da comunicação. Para Kenski (2008,
p. 662), “a comunicação e a educação vivem momentos de efervescência”. Este
é o ponto inicial deste capítulo: de que forma a comunicação, com o uso de
tecnologias digitais de comunicação e informação (TDCIs), proporcionou que
o professor e os alunos pudessem experienciar novas maneiras de utilização e
construção de narrativas como recurso didático para uma aprendizagem ativa.
Ou seja, iremos abordar maneiras de entender como podemos utilizar essa
potência para modificar nossas práticas docentes, colocando o aluno como
protagonista, idealizador, planejador e criador de suas próprias narrativas.
No entanto, precisamos perceber que, ao propormos uma educação híbrida,
que utilize os recursos on-line e todas as possibilidades que as TDICs oferecem
atualmente, por muitas vezes podemos ser uma exceção dentro das escolas em
que desenvolvemos nossa docência. Conforme destaca Valente (2014, p. 142),
Storyboard/storytelling 3

Infelizmente as mudanças observadas no campo da comunicação não têm a


mesma magnitude e impacto com relação à educação. Esta ainda não incor-
porou e não se apropriou dos recursos oferecidos pelas TDICs. Na sua grande
maioria, as salas de aulas ainda têm a mesma estrutura e utilizam os mesmos
métodos usados na educação do século XIX: as atividades curriculares ainda
são baseadas no lápis e no papel, e o professor ainda ocupa a posição de pro-
tagonista principal, detentor e transmissor da informação.

As metodologias para aprendizagem ativa seguem na tendência


oposta da citada pelo autor, uma vez que colocam o aluno como
protagonista no processo de ensino e aprendizagem e transferem o foco para
a aprendizagem significativa, possibilitando-lhe escolhas bem como formas
de participação e envolvimento prático nas ações cotidianas da sala de aula e
dos períodos de estudo on-line, inclusive quando falamos de educação
híbrida. Dentro deste contexto surgem estratégias de aprendizagem ativa que
utilizam tecnologias digitais para oferecer suporte para a construção de
narrativas pelos alunos. Essas narrativas podem associar textos, contando
histórias que se desenro-lam junto ao decorrer do processo e o aumento de
sua complexidade, assim como incluir imagens e fotografias, procurando
criar uma linguagem mais acessível e de fácil entendimento sobre os
assuntos abordados. São exemplos dessas propostas de construção de
narrativas digitais pelos alunos (e pelos professores) o storyboard e o
storytelling, que conheceremos detalhadamente no próximo tópico.
Podemos afirmar que a criação de narrativas como parte das estratégias de
aprendizagem ativa é valiosa, pois permite que os alunos tenham benefícios em:

„„ cognição;
„„ memória;
„„ sentimentos;
„„ criatividade;
„„ percepção;
„„ seleção e organização;
„„ planejamento;
„„ comunicação;
„„ descrição;
„„ reflexão;
„„ crítica;
„„ autoavaliação.
4 Storyboard/storytelling

Ao construir suas narrativas, os alunos acionam seus conhecimentos prévios


e se tornam receptivos para as novas descobertas cognitivas propostas pelos
professores. Assim, se valem tanto de suas memórias quanto da criatividade
e da percepção sobre os temas ou situações propostos em que deverão atuar.
Muitas vezes, os alunos terão que planejar sua escrita a partir da seleção e
da organização de ideias, expressões e imagens, assim como terão que tomar
decisões sobre os elementos de comunicação que se encontram envolvidos
na construção de suas narrativas. Dessa forma, também desenvolvem sua
capacidade de descrição dos fatos, reflexão sobre os aspectos estudados,
possibilidades de crítica sobre os temas, além de autocrítica e autoavaliação
sobre a narrativa que construíram. Para Garcia-Lorenzo (2010), as histórias
permitem, ainda, que sejam expressas e reconstruídas as emoções dentro de
um limite, fornecendo um espaço seguro para que se explorem diferentes
formas de ser e ver o mundo.
O uso de narrativas combinado às TDICs tem sido amplamente realizado
a partir de estratégias de simulação na aprendizagem baseada em problemas,
em projetos ou em equipes, entre outras metodologias ativas, servindo como
passo inicial para que os alunos descrevam em detalhes o problema, suas
características e sua evolução, passando ao leitor, quadro a quadro, como o
fato descrito ocorreu. Estas ações envolvem:

„„ a idealização do problema;
„„ o planejamento de etapas de construção da narrativa;
„„ a escolha da linguagem mais adequada ao público e ao tema;
„„ a seleção de imagens que dialoguem com o texto descrito;
„„ os sentimentos que se desejam desencadear, entre outros.

Ao se referir à presença das narrativas em nossa vida cotidiana e seu uso


escolar, Silva e Sobrinho (2016, p. 362–363) reforçam o que viemos discutindo,
ao comentarem que:

[...] a escola necessita adotar novas estratégias para despertar a curiosidade


do seu público para aquilo que é proposto comunicar. Com isso, é perceptível
nesse meio, uma espécie de ― cabo de guerra em busca de atenção, consegue-a
aquele que tiver uma melhor história para contar, como: o filme em cartaz, a
espetáculo teatral, o enredo de um livro.
Storyboard/storytelling 5

Dessa forma, o desafio para os professores é compor, junto aos alunos,


histórias que ocupem espaço em suas mentes e possam concorrer com outros
campos do conhecimento que utilizam recursos midiáticos e de estratégias
narrativas para vender ideias, produtos ou serviços, como é o caso do marketing.
São inúmeros os ganhos com o uso de narrativas no processo de apren-
dizagem, uma vez que “histórias narradas ativam a memória, a reflexão, a
imaginação e atingem o lado emocional de quem conta e de quem as ouve ou
lê. Dessa forma, geram significados que perduram na memória e possibilitam
a autoavaliação e a construção de alternativas para inúmeras situações postas
em jogo” (QUINTANA; REBELLO; ROCHA, 2016, p. 163). Ao construir
uma narrativa, o aluno faz uso de seu repertório anterior sobre o tema, de
suas vivências, seus conhecimentos, seus sentimentos e sua reflexão, a partir
da seleção de dados de sua memória que julgar apropriados para se utilizar
na tarefa. Podemos perceber que são muitas as operações de pensamento que
serão realizadas e que irão desafiar os alunos a partir da construção destas
narrativas.

Os professores podem planejar o uso da produção de narrativas fazendo uso do


suporte oferecido pelos recursos digitais, como utilizado na educação híbrida, ou
simplesmente pedir que os alunos as realizem a partir de materiais simples, como
folhas sulfite ou cadernos, nos quais os alunos podem desenvolver suas histórias sobre
o tema proposto, seguindo o estilo das histórias em quadrinhos.

Storyboard e storytelling
Algumas abordagens para a construção de narrativas que têm sido amplamente
utilizadas na contemporaneidade e que utilizam metodologias de aprendizagem
ativa são o storyboard e o storytelling. O storyboard pode ser considerado
um protótipo, script ou esqueleto sobre o qual é planejada a história que será
contada. É no storyboard que serão inseridos os textos, as imagens, os áudios
e outros recursos que estarão presentes na narrativa que compõe o storytelling.
Imagine que você pretende criar uma narrativa sobre determinado tema e,
para isso, deve utilizar o programa PowerPoint. Neste caso, cada slide pode
6 Storyboard/storytelling

corresponder a uma cena em que irão se articular o texto, as imagens e os


áudios, como se o slide fosse a página de um livro ou um quadro de uma
história em quadrinhos. Moreira et al. (2018, p. 1088) acrescentam que:

O storyboard é um guia visual que retrata as principais cenas de um produto


audiovisual de forma rápida e objetiva, uma espécie de “história em qua-
drinhos” que apresenta o conteúdo de um material, na maioria das vezes,
audiovisual; porém é utilizado também para retratar sequências de conte-
údos em disciplinas escolares, entre outros. Geralmente, a imagem de um
storyboard precisa transmitir uma impressão mais fiel de uma imagem real,
sem, no entanto, determinar muitos detalhes, sendo importante transmitir a
sequência e clima de uma cena.

Já o storytelling é mais amplo, sendo considerado como a capacidade de


contar boas histórias. Porém, conforme enfatizam Quintana, Rebello e Rocha
(2016, p. 163), “existem várias definições de storytelling; mas, de um modo
geral, todas elas giram em torno da ideia de combinar a arte de contar história
com uma gama de recursos multimídia, tais como imagens, áudio e vídeo”.
Para que a história seja criada e que a combinação citada pelos autores ocorra,
é necessária a construção de um storyboard preciso e detalhado. É importante
percebermos que, na atualidade, com a internet e seus inúmeros aplicativos, a
criação dessas narrativas foi facilitada, sendo utilizada por vários campos de
atuação, como a publicidade e o marketing, e vem se introduzindo no cenário
da educação híbrida.
Ao se referir à construção de narrativas digitais, que compõe o storytelling,
Carvalho (2008, p. 87) comenta que:

A construção e produção de narrativas digitais se constituem num processo


de produção textual que assume o caráter contemporâneo dos recursos audio-
visuais e tecnológicos capazes de modernizar 'o contar histórias', tornando-se
uma ferramenta pedagógica eficiente e motivadora ao aluno, ao mesmo tempo
em que agrega à prática docente o viés da inserção da realidade tão cobrada
em práticas educativas.

Ou seja, ao utilizar a metodologia ativa de construção de narrativas digitais


com nossos alunos estaremos proporcionando um aumento do interesse e a
participação dos alunos por perceberem a inserção da tecnologia digital, que
faz parte do seu dia a dia, em suas práticas escolares. Podemos considerar
alguns passos para a criação de um storytelling digital, conforme ilustrado
na Figura 1.
Storyboard/storytelling 7

Passo 1. Passo 2.
Defina uma Pesquise,
ideia, um explore e
propósito aprenda

Passo 8.
Passo 3.
Reflita a partir
Escreva
dos feedbacks

Passo 4.
Passo 7. Planeje/
Compartilhe construa seu
storyboard
Passo 5.
Reúna ou crie
Passo 6. imagens,
Junte tudo áudios e
vídeos
Figura 1. Processo de criação de um storytelling.
Fonte: Adaptada de Morra (2019).

Perceba, seguindo os passos descritos na Figura 1, como a produção de


storytellings pelos alunos exige esforços de pesquisa, planejamento e seleção
de materiais que se aliem aos temas propostos a se desenvolver. Por exemplo,
um professor da educação básica propõe aos alunos o desafio de construir
um storytelling sobre o consumo na sociedade atual. Para isso, o professor
disponibiliza algum material impresso e pede que os alunos utilizem o la-
boratório de informática para realizar pesquisas on-line e se apropriar dos
elementos necessários para compor a narrativa. Enquanto alguns colegas se
familiarizam com o tema, outros já podem estar pensando na forma como
irão abordar o assunto, quais serão os personagens, que recursos utilizarão,
qual a linguagem e quais mensagens querem transmitir. Após isso, inicia-se
a construção do plano a ser seguido, o storyboard que estrutura a narrativa,
no qual os elementos são relacionados em forma do projeto que se tornará
8 Storyboard/storytelling

a história. Ao final, o storyboard é convertido em imagem e, valendo-se de


ferramentas de edição de imagens ou vídeo, pode assumir seu formato final,
que será compartilhado com a turma para que possa ser avaliado e receber os
feedbacks tanto dos colegas quanto dos professores e, se necessário, refazer
ou ajustar a narrativa.
É importante percebermos que durante todas essas fases proporcionadas
pela utilização desta estratégia para aprendizagem ativa, os alunos revisitam
seus conhecimentos sobre o assunto, procurando ampliá-lo e, ainda, refletem
sobre suas atitudes diárias que tangenciam o tema, produzindo novos
significados a sua forma de viver e ver o problema em sua vida diária,
podendo, inclusive, levá-los a mudança de comportamentos.
Ao desenvolver a estratégia do storytelling com o ensino superior, Quintana,
Rebello e Rocha (2016) apontam alguns passos utilizados para a criação de
storytellings pelos seus alunos do ensino a distância, conforme listado a
seguir.

1. Construção de personagens.
2. Construção de contextos.
3. Elaboração da narrativa.
4. Transposição para o formato de imagem.
5. Divisão da história em capítulos.
6. Inserção no AVA.

A construção de personagens é importante para que o desenrolar da nar-


rativa ocorra, procurando seguir a abordagem do tema de forma criativa,
compondo o arquétipo ou se aproximando das representações mentais existentes
sobre o tópico que será descrito e desenvolvido a partir da história contada.
Tendo definido os personagens, deve-se pensar no contexto em que a história se
insere, onde ela ocorre, quais características deverão ser destacadas e quais as
áreas do conhecimento ou campos da ciência a abordagem irá utilizar. Também
é importante que o contexto sirva de base para que os microlearnings possam
ser desenvolvidos no decorrer da história. Definidos os personagens e criado
o contexto, chega o momento de elaborar a narrativa, produzindo o texto e os
diálogos, caso venham a existir. Para a elaboração desta etapa, costuma-se criar
os storyboards, que em muitos casos são realizados pelo programa PowerPoint,
devido a sua facilidade de uso e de associar texto, imagem e outros recursos
de mídia. Ao finalizar o storyboard, este passa a ser convertido em imagem.
Caso seja necessário, o storytelling pode ser dividido em capítulos para que
Storyboard/storytelling 9

os alunos possam desenvolver os conteúdos abordados com maior precisão


e detalhamento. Após a realização dessas tarefas, cabe aos alunos colocar o
storytelling em funcionamento no ambiente virtual da universidade, que utiliza,
neste caso, a plataforma Moodle para a configuração da educação a distância.

„„ Arquétipos: termo criado pelo psiquiatra suíço Carl Jung que se refere aos conjun-
tos de imagens primordiais que são geradas a partir da repetição de uma mesma
experiência perceptiva ao longo das gerações. É como se uma repetição ancestral
formasse camadas que se acumulam nas profundezas do nosso inconsciente. É
neste campo fértil que a construção de significado ocorre.
„„ Microlearnings: são os demais conceitos e ideias que tangenciam o tema principal
da história e devem ser aprendidos pelos leitores ao longo do storytelling.
„„ Moodle: é o acrônimo de modular object-oriented dynamic learning environment,
um software livre de apoio à aprendizagem, executado em ambiente virtual. Por
ser gratuito, costuma ser amplamente utilizado por instituições de ensino como
plataforma para o ensino híbrido.

Desafiar os alunos a criar seus storytellings é uma excelente oportunidade


para que eles se desenvolvam em diferentes áreas, tornando-se uma proposta
dinâmica, interessante e alinhada com os aspectos motivacionais que nos
cercam na atualidade. Silva e Sobrinho (2016, p. 362) comentam sobre os
benefícios da utilização de storyboard e storytelling como estratégia para
a aprendizagem ativa, destacando que:

[...] além de provocar o aumento no desempenho escolar, ainda ajuda a melhorar


as habilidades exigidas no mercado de trabalho. Desse modo, exercitando a
escrita, a criatividade, a capacidade narrativa, a construção de argumentos
e o pensamento lógico, inclusive estimulando a capacidade de gerir o tempo
para cumprir os prazos estipulados pelo professor, sendo necessário ao de-
correr das atividades aprender a escutar uns aos outros e trabalhar em equipe.

Os ganhos são muito sólidos para a aprendizagem e o desenvolvimento de


competências atualmente requeridas de nossos alunos ao aplicar o storyboard
e o storytelling. Para isto, como professores, devemos propor-nos a inovar
nossas práticas pedagógicas, nos apropriando e inserindo novas metodologias
em nossos planos de aula.
10 Storyboard/storytelling

Aplicando o storyboard e o storytelling


A utilização do storyboard e do storytelling não se limita ao ensino superior;
pelo contrário, pode se encaixar muito bem na educação básica. Da mesma
forma, pode fazer parte de um processo ou de uma metodologia de apren-
dizagem maior utilizado pelos professores. Veremos a descrição de alguns
exemplos de utilização destas estratégias de aprendizagem ativa em sala de aula.
A primeira experiência que iremos analisar foi realizada com duas turmas de
alunos do 1º ano do ensino médio, na disciplina de Língua Portuguesa, em uma
escola da rede privada no Pará, tendo como objetivo facilitar a compreensão
de diferentes tipos de linguagens. Os alunos foram divididos em 11 equipes
de aproximadamente sete alunos e realizaram a produção de seu storytelling
ao longo de seis períodos de aula (de 45 minutos de duração), seguindo a
sequência didática apresentada no Quadro 1.

Quadro 1. Sequência didática de produção do storytelling no ensino médio

Explanação sobre a metodologia a ser utilizada pelos alunos.

Dividir os alunos das equipes que colocarão a estratégia em prática.

Processo de escolha dos temas pelos grupos. Tipos de linguagem: verbal


e não verbal, publicitária, cinema, história em quadrinhos e artes plásticas.

Definição da ideia central que conduzirá a criação da história pela equipe.


Sequência didática

Pesquisa sobre o tema e assuntos que se encaixem no


contexto a ser abordado na produção do storytelling.

Criação dos storyboards, primeiro a partir de


esboço e depois no PowerPoint.

Realizar a edição de vídeos a partir do software HitFilm 3 Express.

Produção das storytellings.

Divulgação ao grande grupo das storytellings produzidas.

Avaliação das storytellings e de todo o processo criativo.

Fonte: Adaptado de Silva e Sobrinho (2016).


Storyboard/storytelling 11

Silva e Sobrinho (2016) salientam ainda que utilizaram os seguintes recursos


de tecnologia digital para que seus alunos pudessem construir suas storytellings:
o programa Word para a escrita de roteiros pelas equipes, o programa Power-
Point para a criação dos storyboards e o editor de vídeo HitFilm 3 Express.
Utilizaram o Facebook para divulgar as histórias produzidas, e para coleta
dos feedbacks avaliativos, o programa Typeform.
Outro exemplo de aplicação do storyboard na área educacional ocorre
no atendimento educacional especializado (AEE), que deve ser estendido a
toda a educação básica, visando complementar e apoiar os estudos de alunos
que apresentam maiores dificuldades de aprendizagem. Moreira et al. (2018)
relatam a experiência realizada em oficinas visando instrumentalizar as salas
de recursos multifuncionais, na qual associaram a construção de storyboards
com atividades práticas realizadas pelos alunos e mediadas pela tecnologia
computacional Radio Frequency Identification (RFID). Pelo uso de cartões em
papel com RFID, podem se realizar as conexões com os recursos multimídias
utilizados e construir associações entre os componentes da história produzida
nos storyboards. A Figura 2 mostra como os storyboards foram utilizados na
formação dos professores da sala de recursos multifuncionais e com os alunos
que frequentam o atendimento especializado.

Figura 2. Aplicação do storyboard em oficinas na formação de professores e com alunos do AEE.


Fonte: Moreira et al. (2018, documento on-line).

Moreira et al. (2018, p. 1085) também comentam que:

No nosso ambiente, a intenção de uso dessa ferramenta é oferecer uma forma


de organizar ideias de modo a trabalhar narrativas com as crianças dentro
do tema proposto pelas professoras. Para isso propusemos uma adaptação da
12 Storyboard/storytelling

ferramenta, onde uma cena é composta por vários quadros do storyboard,


cada um deles associado a um cartão do ambiente computacional.

Dessa forma, os professores das salas de recursos multifuncionais adaptam


seus storyboards de forma a auxiliar a compreensão da cena retratada, muitas
vezes dividindo uma cena em vários quadros para que os alunos possam
interagir em sua construção, entendendo plenamente seu contexto.
Moreira et al. (2018) descrevem a utilização do storyboard em alguns modelos
de aplicação diferentes para os alunos desenvolverem suas atividades: desafios,
narração de histórias e atividades de sequência, conforme demonstra o Quadro 2.

Quadro 2. Atividades com a utilização do storyboard

Desafio O desafio consiste na tentativa de adivinhar o que estava sendo


comunicado na narrativa que o storyboard apresenta nos cartões
de comunicação. Antes disso, são definidos os temas possíveis
sobre os quais devem ser construídos os desafios. A utilização
dessa atividade proporciona a interação entre os alunos, que
podem realizar, em dupla ou grupos, a possibilidade de estabelecer
relações entre as imagens e suas vidas cotidianas, o que amplia
sua capacidade de comunicação e associação de ideias.

Narração A atividade consiste em contar ou recontar uma história


de histórias anteriormente contada por alguém, podendo também ser de
autoria própria ou baseada em livros, cantigas, etc. A atividade
pode ser realizada de forma individual ou em grupos e se espera
que as crianças consigam identificar os personagens da história
e organizar seus acontecimentos, trabalhando o conceito de
começo-meio-fim. Ao montar a história, os alunos também
devem verbalizá-la à medida que constroem os storyboards.

Sequência O objetivo desta atividade é trabalhar com sequências de


ações, seja de uma situação-problema, uma sequência
didática, uma sequência de apoio à realização de atividades
(por exemplo, atividades a realizar após usar o banheiro),
etc. A narrativa com os cartões de comunicação é utilizada
para dar comandos, de maneira a promover a associação
pela(s) criança(s) entre a ação e os símbolos dos cartões.

Fonte: Adaptado de Moreira et al. (2018).


Storyboard/storytelling 13

A utilização de estratégias para aprendizagem ativa baseadas em narrativas


se mostra muito rica no desenvolvimento de habilidades como a criatividade,
a organização e o planejamento de roteiros, a seleção de ideias e a redação de
textos que comuniquem suas mensagens pela escrita, por imagens ou demais
recursos audiovisuais que sejam empregados. Dessa forma, para a produção
destas narrativas pelos alunos, o storyboard e o storytelling surgem como
excelentes estratégias, podendo propiciar narrativas de forma digital, no
contexto da educação híbrida. Sobre a possibilidade da construção de narrativas
digitais e da emergência da textualidade eletrônica, Süssekind e Guimarães
(2004, p. 166) destacam que:

Essas formas são multimidiáticas na medida em que são semioticamente


híbridas, englobando o texto escrito, a exploração de suas possibilidades
gráficas, as distintas mídias imagéticas (gráficas, fotográficas e videográ-
ficas) e o som. [...] Está aí um dos poderes mais significativos da escrita na
nova mídia: reunir o texto com a imagem, assim como com outras mídias,
tais como som e vídeo.

Além disso, ao permitir que os alunos produzam suas histórias a partir da


formação de grupos ou equipes, o professor possibilita que enriqueçam sua
aprendizagem a partir da troca entre os colegas, aprimorando também suas
relações interpessoais.

Acesse o link a seguir e observe como o aplicativo PowToon pode ser utilizado para
a criação e a edição final de um storytelling, inclusive podendo importar storyboards
feitos no PowerPoint.

https://qrgo.page.link/KayrX
14 Storyboard/storytelling

Um professor de uma turma do sétimo ano do ensino fundamental procurou utilizar


a estratégia do storytelling com seus alunos, dividindo-os em equipes que deveriam
abordar o tema da interculturalidade no interior da escola, proporcionando um melhor
convívio entre todos os alunos, independente de questões étnico-raciais, religiosas, de
gênero ou culturais. Para isso, os alunos primeiro definiram o tema que pesquisariam
dentro deste eixo maior. Um dos grupos escolheu falar sobre o racismo. Após estudarem
sobre o assunto, criaram dois personagens principais: Juliana (negra) e Serginho (branco
de origem alemã), ambientaram a história no interior da escola e procuraram, pelos
storyboards feitos em folhas brancas e, posteriormente, no PowerPoint, retratar cenas
que poderiam ter conotação racista em simples atitudes ou nas falas dos persona-
gens. Somaram às cenas imagens que envolviam os sentimentos dos personagens e
escolheram como música de fundo melodias que alternavam entre ritmos africanos
e alemães. Ao final da história, os personagens se aliam e resolvem expressar suas
angústias e como poderiam se respeitar mesmo sendo diferentes. O título dado ao
storytelling foi: Viva! Somos diferentes!, sendo divulgado para os alunos pelo blog da escola
e tendo grande repercussão. Os demais alunos da turma e da escola procuraram ter
mais cuidados com seu comportamento após o contato com essa história construída
pelos colegas, o que demonstra que a aprendizagem foi significativa.

CARVALHO, G. S. As histórias digitais: narrativas no século XXI: o software MovieMaker


como recurso procedimental para a construção de narrações. Orientadora: Vera Lucia
Marinelli. 2008. 197 f. Dissertação (Mestrado em Educação) — Faculdade de Educação,
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Storyboard/storytelling 15

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VALENTE, J. A. A Comunicação e a Educação baseada no uso das Tecnologias Digitais
de Informação e Comunicação. Revista UNIFESO – Humanas e Sociais, Teresópolis, v. 1,
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revistaunifesohumanasesociais/article/view/17. Acesso em: 5 jun. 2019.
METODOLOGIA DO
ENSINO DE
CIÊNCIAS

Adriana Fernandes
Gonçalves
M593 Metodologia do ensino de ciência [recurso
eletrônico] / Organizadora, Adriana Fernandes
Gonçalves. – Porto Alegre : SAGAH, 2016.

Editado como livro impresso em 2016.


ISBN 978-85-69726-29-6

1. Educação. 2. Metodologia de ensino - Ciências.


I. Gonçalves, Adriana Fernandes.
CDU 37.022

Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094


UNIDADE 2
A falta de motivação na
aprendizagem de ciências
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
„„ Identificar os problemas e as possíveis causas do desinteresse dos
alunos em aulas de ciências.
„„ Analisar a metodologia aplicada nas aulas de ciências.
„„ Construir ações de intervenção para solucionar o problema.

Introdução
Neste texto você estudará as possíveis causas do desinteresse
dos alunos nas aulas de ciências e desenvolverá algumas ações
interventivas para esse problema.

Os tipos de aprendizagem
Aprendizagem nada mais é do que uma mudança de comportamento de uma
pessoa a partir de um estímulo. Muitos pesquisadores tratam desse assunto, e
Moreira (1982) propõe três tipos de aprendizagem, baseado na teoria de Auzubel:

„„ Aprendizagem cognitiva: é aquela que resulta no armazenamento orga-


nizado de informações na mente da pessoa que aprende. E esse complexo
organizado é conhecido como estrutura cognitiva.
„„ Aprendizagem afetiva: é aquela que resulta de sinais internos ao indi-
víduo e pode ser identificada como experiências, como prazer e dor, sa-
tisfação ou descontentamento, alegria ou ansiedade. Algumas experiên-
cias afetivas sempre acompanham as experiências cognitivas, portanto, a
aprendizagem afetiva ocorre ao mesmo tempo da cognitiva.
„„ Aprendizagem psicomotora: é aquela que envolve respostas musculares
adquiridas mediante treino e prática, mas alguma aprendizagem é geral-
mente importante na aquisição de habilidades psicomotoras, como apren-
der a tocar piano, jogar bola ou dançar.
46 Metodologia do ensino de ciências

Os tipos de conteúdo
Os quatro suportes da educação são: aprender a ser, aprender a conhecer,
aprender a viver juntos e aprender a fazer. Mas você deve estar se pergun-
tando: ser o quê? Conhecer o quê? Viver junto com quem e para quê? Fazer o
quê? Para responder a esses questionamentos utilizamos os conteúdos concei-
tuais, procedimentais e atitudinais.
Conforme Zabala (1998), os conteúdos conceituais referem-se à constru-
ção ativa de capacidades intelectuais para operar símbolos, imagens, ideias e
representações que permitam organizar as realidades. Os conteúdos procedi-
mentais referem-se ao fazer com que os alunos construam instrumentos para
analisar, por si mesmos, os resultados que obtêm e os processos que colocam
em ação para atingir as metas que se propõem. Os conteúdos atitudinais re-
ferem-se à formação de atitudes e valores em relação à informação recebida,
tendo como objetivo a intervenção do aluno em sua realidade.
De acordo com Zabala (1998), podemos resumir os conteúdos da seguinte
maneira:

„„ Conteúdos conceituais: aprender a conhecer

Todos os conteúdos necessitam de uma base teórica, de denominados con-


ceitos. Os conceitos nos transportam pela vida, sejam esses científicos, inte-
lectuais, filosóficos, calculistas ou de outros parâmetros. Esses nos revelam a
verdadeira base da descoberta do saber, estimulando a curiosidade de apren-
der. Os conceitos passam a desenvolver a parte cognitiva da pessoa, fazendo
com que ela desenvolva o intelecto, o raciocínio, a dedução e a memória,
proporcionando a construção do conhecimento.

„„ Conteúdos procedimentais: aprender a fazer

Os conteúdos procedimentais resumem-se em colocar em prática o co-


nhecimento que adquirimos com os conteúdos conceituais. Seja em forma
de maquete utilizando-se de escala, reprodução de um ambiente visitado, ou
uma letra de música transformada em paródia. Toda produção ou reprodução
é determinada pelos conteúdos procedimentais. Como já foi dito, primeira-
mente se considera o conceito do assunto e depois o do fazer, e para fazer é
necessário que sejam praticados os procedimentos corretos para ter o resul-
tado esperado.
A falta de motivação na aprendizagem de ciências 47

„„ Conteúdos atitudinais: aprender a viver juntos, aprender a ser

Os conteúdos atitudinais são a vivência do ser com o mundo que o ro-


deia. O aprendizado de normas e valores torna-se alvo principal para que esse
conteúdo seja adquirido por quem quer que seja, e na sua proporção e qua-
lificação só é desenvolvido na prática e em seu uso contínuo. O indivíduo é
moldado de acordo com suas vivências, mas não é escravo delas, podendo
redimir-se ou simplesmente questionar-se.

Metodologia para o ensino de ciências


Em qualquer disciplina é fundamental o uso de novas estratégias de ensino
para motivar os alunos e facilitar o aprendizado. O professor deve ser criativo,
inovar no planejamento das aulas, deve colocar-se no lugar do aluno e perce-
ber qual a melhor estratégia para atingir o maior número de alunos possível.
É claro que cada um aprende de uma maneira, cada aluno tem seu ritmo e se
apropria de forma diferente do conhecimento.
A pesquisa bibliográfica é uma metodologia que liga a leitura ao enrique-
cimento científico. A partir de um determinado conteúdo, o professor ou o
grupo formado pelo professor e os alunos pode decidir quais temas deverão
ser pesquisados dentro do referido conteúdo. É válido utilizar diferentes am-
bientes dentro da escola, como a biblioteca, sala de estudos, sala de informá-
tica ou outro disponível. Ao final da pesquisa, sugira aos alunos a divulgação
das pesquisas através de cartazes, blog, site da escola, maquetes, etc.
O uso de imagens é fundamental no ensino de ciências. Ele enriquece o
processo de aprendizagem, explora sentidos, facilita a compreensão de sis-
temas e esquemas dentro dos conteúdos de ciências. Não há nada mais mo-
tivador do que a imagem de animais ou plantas exóticos, de sistemas dentro
do organismo humano ou animal, ecossistemas a serem descobertos, entre
outros. Estas imagens podem ser estáticas (fotos) ou em forma de vídeos (do-
cumentários ou filmes).
Em geral, no primeiro dia de aula de ciências do ano letivo os alunos ques-
tionam o professor: quando iremos ao laboratório? Mas nem sempre as aulas
práticas precisam acontecer dentro do laboratório. Até mesmo o pátio da esco-
la pode ser usado como local para observação de pássaros, vegetação, tipos de
solo, animais invertebrados. Dentro de sala de aula é possível realizar experi-
mentos simples, que não necessitem de equipamentos sofisticados, observar
folhas de plantas, flores, rochas, etc. Incluímos aí a realização de trabalhos
48 Metodologia do ensino de ciências

em grupo, que facilita a socialização; o debate de temas polêmicos atuais,


deixando os alunos confiantes para argumentar, sempre com a supervisão do
professor; a produção textual, investindo na interdisciplinaridade e também
na análise de imagens e notícias de jornais e revistas; as saídas de campo (ou
saídas de estudo) planejadas para complementar os conteúdos abordados em
sala de aula, trilhas ecológicas, visita a museus, jardim botânico ou parques;
seminários apresentados pelos próprios alunos a partir de experimentos ou
pesquisas realizadas individualmente ou em grupos.

Fique atento

Alguns mitos pedagógicos no ensino de ciências:


„„ Todas as aulas devem ser experimentais: uma atividade prática não contempla todo
o conteúdo que deve ser abordado.
„„ Experiências só podem ser realizadas no laboratório: qualquer ambiente da escola
serve para a realização de uma experiência, desde que ela seja bem planejada pelo
professor. Nem sempre são necessários equipamentos sofisticados para realizá-las.
„„ Não é necessária a memorização de conteúdos: muitas vezes a memorização é ne-
cessária após a compreensão dos conteúdos. Não utilize somente uma lista de con-
ceitos, mas as terminologias utilizadas na disciplina não devem ser abandonadas.

Causas da falta de motivação


Muitos motivos podem causar a falta de motivação do aluno em relação à
disciplina de ciências. Até mesmo a falta de motivação do professor (por ques-
tões profissionais) pode influenciar na motivação dos alunos. Abaixo listamos
uma série de situações que podem acarretar na falta de motivação do aluno:

„„ Desmotivação do professor: um professor apático transfere esse senti-


mento aos alunos. É claro que ainda temos, no Brasil, diversos problemas
na área da educação, e um deles é a desvalorização do professor. Mas não
devemos permitir que isso influencie no trabalho pedagógico. Um profes-
sor motivado consegue transmitir os conteúdos com maior leveza, o que
facilita o aprendizado. A autoestima elevada estimula o aprendizado!
„„ Excesso de alunos em sala de aula: muito comum nas escolas, esse pro-
blema traz graves consequências, pois o professor não consegue atender a
A falta de motivação na aprendizagem de ciências 49

todos os alunos, que acabam se sentindo de lado, desamparados pelo pro-


fessor. Lembrando que nem todos aprendem da mesma maneira, é capaz
que o professor deixe aquele aluno com maior dificuldade sem resposta
aos seus questionamentos.
„„ Falta de conexão entre o conhecimento científico e conhecimento esco-
lar: estabelecer uma conexão entre o conhecimento científico e o conheci-
mento escolar é fundamental. O conhecimento escolar nada mais é do que
os conceitos científicos adaptados ao conteúdo, e nesse caso a realidade
do aluno e seu conhecimento prévio são fundamentais. O aluno precisa ver
um sentido naquele conteúdo que está sendo estudado. Alunos desmoti-
vados, que não veem sentido no conteúdo, costumam usar as afirmativas:
“não sei responder à atividade”, “não entendi o conteúdo”, “não sei fazer”,
“não vou conseguir”.
„„ Uso de metodologias inadequadas pelo professor: o uso de novas me-
todologias e novas tecnologias é fundamental para motivar os alunos. É
permitido errar, desde que o professor se autoavalie, perceba onde está
errando e modifique sua prática pedagógica. Muitas vezes a metodologia
usada em uma turma não funciona com outra ou então no mesmo nível em
escolas diferentes. É preciso se adequar e inovar. Ser criativo!
„„ Estrutura ruim da escola/sala de aula: ninguém gosta de frequentar um
local onde faltam lâmpadas, o reboco cai, a chuva pinga, os banheiros
são insalubres. Nem mesmo as crianças sentem-se a vontade em um local
assim. Infelizmente os baixos investimentos do poder público nas escolas
faz com que tenhamos estruturas precárias e desmotivadoras.
50 Metodologia do ensino de ciências

Exercícios
1. Pozo e Crespo (2009), na obra A „„ Os cientistas são muito inteligen-
aprendizagem e o ensino de Ciências, tes, mas um pouco estranhos, e
fazem uma síntese de algumas vivem trancados em seus labo-
atitudes e crenças inadequadas ratórios.
mantidas pelos alunos, em „„ O conhecimento científico está
relação à matéria de ciências e sua na origem de todos os descobri-
aprendizagem. Entre elas: mentos tecnológicos e vai acabar
„„ Aprender ciências consiste em substituindo todas as outras
repetir da melhor maneira possí- formas do saber.
vel aquilo que o professor explica „„ O conhecimento científico sem-
durante a aula. pre traz consigo uma melhora na
„„ Para se aprender ciências é forma de vida das pessoas.
melhor não tentar encontrar suas Diante do exposto, marque a
próprias respostas, mas aceitar o alternativa que apresenta uma
que o professor e o livro didático interferência metodológica adequada
dizem, porque isso está baseado para mudar as concepções citadas.
no conhecimento científico. a) Apresentar o método científico
„„ O conhecimento científico é utilizado pelos cientistas.
muito útil para trabalhar no b) Apresentar várias pesquisas sobre
laboratório, para pesquisar e para o mesmo assunto.
inventar coisas novas, mas não c) Apresentar uma pesquisa
serve praticamente para nada na científica, suas vertentes,
vida cotidiana. reformulações, ligações com
„„ A matéria de ciências proporciona outras ciências, avanços e
um conhecimento verdadeiro e aplicabilidade dessa pesquisa
aceito por todos. na vida dos indivíduos e da
„„ Quando existem duas teorias sociedade.
sobre o mesmo fato, é porque d) Propor a repetição da pesquisa
uma delas é falsa. A ciência vai feita por um cientista para
acabar demostrando qual delas é comprovar sua tese.
a verdadeira. e) Explicar o que é conhecimento
„„ O conhecimento científico é científico.
sempre neutro e objetivo.
A falta de motivação na aprendizagem de ciências 51

2. Para se pensar sobre o ensino de afirmativas I, II, III e V.


ciências naturais, o conhecimento c) Estão corretas apenas as
científico é importante, mas devemos afirmativas I, II e IV.
considerar que não é suficiente d) Estão corretas apenas as
quando usado como objetivo único afirmativas II, III, IV.
do ensino. Marque a alternativa que e) Estão corretas apenas as
melhor justifica essa afirmação. afirmativas I, II e III.
a) O conhecimento científico precisa 4. O enfoque construtivista a respeito
estar alinhado às tendências do que é aprender e ensinar implica
atuais de ensino. transformar a mente de quem
b) É preciso apresentar o aprende, que deve reconstruir e
conhecimento científico tal qual dar significado aos processos de
ele foi elaborado. aquisição de conhecimento. “Essa
c) O conhecimento científico é ideia não é, evidentemente, nova,
fundamental, mas não deve ser o uma vez que, de fato, tem uma
único objetivo do professor. Esse longa história cultural e filosófica.”
deve se preocupar em desenvolver (POZO; CRESPO, 2009, p. 20). Devido
em seus alunos várias habilidades às mudanças ocorridas na forma de
importantes para se chegar ao produzir conhecimentos em nossa
conhecimento científico. sociedade, entre eles os científicos,
d) O professor precisa desenvolver em faz-se necessário estender essa forma
seus alunos a crítica aos métodos de aprender e ensinar para quase
utilizados pelo pesquisador. todas as áreas da nossa vida, inclusive
e) Só se chega ao conhecimento para o ensino das ciências.
científico se o aluno tiver pré- Depois das discussões e conforme
requisitos para isso. a bibliografia estudada, veja os
3. Baseando-se nas discussões elementos que fazem parte da
levantadas acerca das possíveis elaboração do conhecimento
causas da desmotivação de alunos científico e que são responsáveis para
nas aulas de ciências, analise as se chegar à compreensão científica:
afirmativas a seguir: I. A aprendizagem de conceitos.
I. Os alunos não estão motivados II. O desenvolvimento de
porque não aprendem. habilidades cognitivas e de
II. Não está havendo interação entre raciocínio científico.
os alunos. III. O desenvolvimento de
III. Os alunos são indisciplinados. habilidades experimentais e de
IV. A metodologia está inadequada. resolução de problemas.
V. Há um excesso de trabalho do IV. O desenvolvimento de atitudes e
professor. valores.
Agora, marque a alternativa V. ___
CORRETA: Marque a alternativa que completa
a) Estão corretas apenas as CORRETAMENTE a lacuna acima:
afirmativas I, II, III. a) Compreensão do que trata a
b) Estão corretas apenas as disciplina de ciências.
52 Metodologia do ensino de ciências

b) Conhecimento da biografia de Identifique quais são os tipos de


cientistas renomados. conteúdo que contemplam os
c) Levantamento de problemas. três tipos de aprendizagem que se
d) Construção de hipóteses e pretendem construir.
elaboração de novas hipóteses. a) Conteúdos conceituais,
e) Divulgação de resultados. procedimentais e atitudinais.
5. Para desencadear o processo de b) Conteúdos conceituais e
construção do conhecimento específicos.
científico e garantir a compreensão c) Conteúdos específicos e gerais.
científica, o professor precisa priorizar d) Conteúdos atitudinais, conceituais
conteúdos e estabelecer objetivos e gerais.
específicos para garantir o sucesso e) Conteúdos gerais e
no seu trabalho. procedimentais.

Referências

MOREIRA. M. A. Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo:


Moraes, 1982.

POZO, J. I.; CRESPO, M. A. G. A aprendizagem e o ensino de Ciências: do conhecimento


cotidiano ao conhecimento científico. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.

ZABALA, A. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artmed, 1998.


METODOLOGIA DO
ENSINO DE
CIÊNCIAS

Adriana Fernandes
Gonçalves
M593 Metodologia do ensino de ciência [recurso
eletrônico] / Organizadora, Adriana Fernandes
Gonçalves. – Porto Alegre : SAGAH, 2016.

Editado como livro impresso em 2016.


ISBN 978-85-69726-29-6

1. Educação. 2. Metodologia de ensino - Ciências.


I. Gonçalves, Adriana Fernandes.
CDU 37.022

Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094


UNIDADE 2
A falta de motivação na
aprendizagem de ciências
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
„„ Identificar os problemas e as possíveis causas do desinteresse dos
alunos em aulas de ciências.
„„ Analisar a metodologia aplicada nas aulas de ciências.
„„ Construir ações de intervenção para solucionar o problema.

Introdução
Neste texto você estudará as possíveis causas do desinteresse
dos alunos nas aulas de ciências e desenvolverá algumas ações
interventivas para esse problema.

Os tipos de aprendizagem
Aprendizagem nada mais é do que uma mudança de comportamento de uma
pessoa a partir de um estímulo. Muitos pesquisadores tratam desse assunto, e
Moreira (1982) propõe três tipos de aprendizagem, baseado na teoria de Auzubel:

„„ Aprendizagem cognitiva: é aquela que resulta no armazenamento orga-


nizado de informações na mente da pessoa que aprende. E esse complexo
organizado é conhecido como estrutura cognitiva.
„„ Aprendizagem afetiva: é aquela que resulta de sinais internos ao indi-
víduo e pode ser identificada como experiências, como prazer e dor, sa-
tisfação ou descontentamento, alegria ou ansiedade. Algumas experiên-
cias afetivas sempre acompanham as experiências cognitivas, portanto, a
aprendizagem afetiva ocorre ao mesmo tempo da cognitiva.
„„ Aprendizagem psicomotora: é aquela que envolve respostas musculares
adquiridas mediante treino e prática, mas alguma aprendizagem é geral-
mente importante na aquisição de habilidades psicomotoras, como apren-
der a tocar piano, jogar bola ou dançar.
46 Metodologia do ensino de ciências

Os tipos de conteúdo
Os quatro suportes da educação são: aprender a ser, aprender a conhecer,
aprender a viver juntos e aprender a fazer. Mas você deve estar se pergun-
tando: ser o quê? Conhecer o quê? Viver junto com quem e para quê? Fazer o
quê? Para responder a esses questionamentos utilizamos os conteúdos concei-
tuais, procedimentais e atitudinais.
Conforme Zabala (1998), os conteúdos conceituais referem-se à constru-
ção ativa de capacidades intelectuais para operar símbolos, imagens, ideias e
representações que permitam organizar as realidades. Os conteúdos procedi-
mentais referem-se ao fazer com que os alunos construam instrumentos para
analisar, por si mesmos, os resultados que obtêm e os processos que colocam
em ação para atingir as metas que se propõem. Os conteúdos atitudinais re-
ferem-se à formação de atitudes e valores em relação à informação recebida,
tendo como objetivo a intervenção do aluno em sua realidade.
De acordo com Zabala (1998), podemos resumir os conteúdos da seguinte
maneira:

„„ Conteúdos conceituais: aprender a conhecer

Todos os conteúdos necessitam de uma base teórica, de denominados con-


ceitos. Os conceitos nos transportam pela vida, sejam esses científicos, inte-
lectuais, filosóficos, calculistas ou de outros parâmetros. Esses nos revelam a
verdadeira base da descoberta do saber, estimulando a curiosidade de apren-
der. Os conceitos passam a desenvolver a parte cognitiva da pessoa, fazendo
com que ela desenvolva o intelecto, o raciocínio, a dedução e a memória,
proporcionando a construção do conhecimento.

„„ Conteúdos procedimentais: aprender a fazer

Os conteúdos procedimentais resumem-se em colocar em prática o co-


nhecimento que adquirimos com os conteúdos conceituais. Seja em forma
de maquete utilizando-se de escala, reprodução de um ambiente visitado, ou
uma letra de música transformada em paródia. Toda produção ou reprodução
é determinada pelos conteúdos procedimentais. Como já foi dito, primeira-
mente se considera o conceito do assunto e depois o do fazer, e para fazer é
necessário que sejam praticados os procedimentos corretos para ter o resul-
tado esperado.
A falta de motivação na aprendizagem de ciências 47

„„ Conteúdos atitudinais: aprender a viver juntos, aprender a ser

Os conteúdos atitudinais são a vivência do ser com o mundo que o ro-


deia. O aprendizado de normas e valores torna-se alvo principal para que esse
conteúdo seja adquirido por quem quer que seja, e na sua proporção e qua-
lificação só é desenvolvido na prática e em seu uso contínuo. O indivíduo é
moldado de acordo com suas vivências, mas não é escravo delas, podendo
redimir-se ou simplesmente questionar-se.

Metodologia para o ensino de ciências


Em qualquer disciplina é fundamental o uso de novas estratégias de ensino
para motivar os alunos e facilitar o aprendizado. O professor deve ser criativo,
inovar no planejamento das aulas, deve colocar-se no lugar do aluno e perce-
ber qual a melhor estratégia para atingir o maior número de alunos possível.
É claro que cada um aprende de uma maneira, cada aluno tem seu ritmo e se
apropria de forma diferente do conhecimento.
A pesquisa bibliográfica é uma metodologia que liga a leitura ao enrique-
cimento científico. A partir de um determinado conteúdo, o professor ou o
grupo formado pelo professor e os alunos pode decidir quais temas deverão
ser pesquisados dentro do referido conteúdo. É válido utilizar diferentes am-
bientes dentro da escola, como a biblioteca, sala de estudos, sala de informá-
tica ou outro disponível. Ao final da pesquisa, sugira aos alunos a divulgação
das pesquisas através de cartazes, blog, site da escola, maquetes, etc.
O uso de imagens é fundamental no ensino de ciências. Ele enriquece o
processo de aprendizagem, explora sentidos, facilita a compreensão de sis-
temas e esquemas dentro dos conteúdos de ciências. Não há nada mais mo-
tivador do que a imagem de animais ou plantas exóticos, de sistemas dentro
do organismo humano ou animal, ecossistemas a serem descobertos, entre
outros. Estas imagens podem ser estáticas (fotos) ou em forma de vídeos (do-
cumentários ou filmes).
Em geral, no primeiro dia de aula de ciências do ano letivo os alunos ques-
tionam o professor: quando iremos ao laboratório? Mas nem sempre as aulas
práticas precisam acontecer dentro do laboratório. Até mesmo o pátio da esco-
la pode ser usado como local para observação de pássaros, vegetação, tipos de
solo, animais invertebrados. Dentro de sala de aula é possível realizar experi-
mentos simples, que não necessitem de equipamentos sofisticados, observar
folhas de plantas, flores, rochas, etc. Incluímos aí a realização de trabalhos
48 Metodologia do ensino de ciências

em grupo, que facilita a socialização; o debate de temas polêmicos atuais,


deixando os alunos confiantes para argumentar, sempre com a supervisão do
professor; a produção textual, investindo na interdisciplinaridade e também
na análise de imagens e notícias de jornais e revistas; as saídas de campo (ou
saídas de estudo) planejadas para complementar os conteúdos abordados em
sala de aula, trilhas ecológicas, visita a museus, jardim botânico ou parques;
seminários apresentados pelos próprios alunos a partir de experimentos ou
pesquisas realizadas individualmente ou em grupos.

Fique atento

Alguns mitos pedagógicos no ensino de ciências:


„„ Todas as aulas devem ser experimentais: uma atividade prática não contempla todo
o conteúdo que deve ser abordado.
„„ Experiências só podem ser realizadas no laboratório: qualquer ambiente da escola
serve para a realização de uma experiência, desde que ela seja bem planejada pelo
professor. Nem sempre são necessários equipamentos sofisticados para realizá-las.
„„ Não é necessária a memorização de conteúdos: muitas vezes a memorização é ne-
cessária após a compreensão dos conteúdos. Não utilize somente uma lista de con-
ceitos, mas as terminologias utilizadas na disciplina não devem ser abandonadas.

Causas da falta de motivação


Muitos motivos podem causar a falta de motivação do aluno em relação à
disciplina de ciências. Até mesmo a falta de motivação do professor (por ques-
tões profissionais) pode influenciar na motivação dos alunos. Abaixo listamos
uma série de situações que podem acarretar na falta de motivação do aluno:

„„ Desmotivação do professor: um professor apático transfere esse senti-


mento aos alunos. É claro que ainda temos, no Brasil, diversos problemas
na área da educação, e um deles é a desvalorização do professor. Mas não
devemos permitir que isso influencie no trabalho pedagógico. Um profes-
sor motivado consegue transmitir os conteúdos com maior leveza, o que
facilita o aprendizado. A autoestima elevada estimula o aprendizado!
„„ Excesso de alunos em sala de aula: muito comum nas escolas, esse pro-
blema traz graves consequências, pois o professor não consegue atender a
A falta de motivação na aprendizagem de ciências 49

todos os alunos, que acabam se sentindo de lado, desamparados pelo pro-


fessor. Lembrando que nem todos aprendem da mesma maneira, é capaz
que o professor deixe aquele aluno com maior dificuldade sem resposta
aos seus questionamentos.
„„ Falta de conexão entre o conhecimento científico e conhecimento esco-
lar: estabelecer uma conexão entre o conhecimento científico e o conheci-
mento escolar é fundamental. O conhecimento escolar nada mais é do que
os conceitos científicos adaptados ao conteúdo, e nesse caso a realidade
do aluno e seu conhecimento prévio são fundamentais. O aluno precisa ver
um sentido naquele conteúdo que está sendo estudado. Alunos desmoti-
vados, que não veem sentido no conteúdo, costumam usar as afirmativas:
“não sei responder à atividade”, “não entendi o conteúdo”, “não sei fazer”,
“não vou conseguir”.
„„ Uso de metodologias inadequadas pelo professor: o uso de novas me-
todologias e novas tecnologias é fundamental para motivar os alunos. É
permitido errar, desde que o professor se autoavalie, perceba onde está
errando e modifique sua prática pedagógica. Muitas vezes a metodologia
usada em uma turma não funciona com outra ou então no mesmo nível em
escolas diferentes. É preciso se adequar e inovar. Ser criativo!
„„ Estrutura ruim da escola/sala de aula: ninguém gosta de frequentar um
local onde faltam lâmpadas, o reboco cai, a chuva pinga, os banheiros
são insalubres. Nem mesmo as crianças sentem-se a vontade em um local
assim. Infelizmente os baixos investimentos do poder público nas escolas
faz com que tenhamos estruturas precárias e desmotivadoras.
50 Metodologia do ensino de ciências

Exercícios
1. Pozo e Crespo (2009), na obra A „„ Os cientistas são muito inteligen-
aprendizagem e o ensino de Ciências, tes, mas um pouco estranhos, e
fazem uma síntese de algumas vivem trancados em seus labo-
atitudes e crenças inadequadas ratórios.
mantidas pelos alunos, em „„ O conhecimento científico está
relação à matéria de ciências e sua na origem de todos os descobri-
aprendizagem. Entre elas: mentos tecnológicos e vai acabar
„„ Aprender ciências consiste em substituindo todas as outras
repetir da melhor maneira possí- formas do saber.
vel aquilo que o professor explica „„ O conhecimento científico sem-
durante a aula. pre traz consigo uma melhora na
„„ Para se aprender ciências é forma de vida das pessoas.
melhor não tentar encontrar suas Diante do exposto, marque a
próprias respostas, mas aceitar o alternativa que apresenta uma
que o professor e o livro didático interferência metodológica adequada
dizem, porque isso está baseado para mudar as concepções citadas.
no conhecimento científico. a) Apresentar o método científico
„„ O conhecimento científico é utilizado pelos cientistas.
muito útil para trabalhar no b) Apresentar várias pesquisas sobre
laboratório, para pesquisar e para o mesmo assunto.
inventar coisas novas, mas não c) Apresentar uma pesquisa
serve praticamente para nada na científica, suas vertentes,
vida cotidiana. reformulações, ligações com
„„ A matéria de ciências proporciona outras ciências, avanços e
um conhecimento verdadeiro e aplicabilidade dessa pesquisa
aceito por todos. na vida dos indivíduos e da
„„ Quando existem duas teorias sociedade.
sobre o mesmo fato, é porque d) Propor a repetição da pesquisa
uma delas é falsa. A ciência vai feita por um cientista para
acabar demostrando qual delas é comprovar sua tese.
a verdadeira. e) Explicar o que é conhecimento
„„ O conhecimento científico é científico.
sempre neutro e objetivo.
A falta de motivação na aprendizagem de ciências 51

2. Para se pensar sobre o ensino de afirmativas I, II, III e V.


ciências naturais, o conhecimento c) Estão corretas apenas as
científico é importante, mas devemos afirmativas I, II e IV.
considerar que não é suficiente d) Estão corretas apenas as
quando usado como objetivo único afirmativas II, III, IV.
do ensino. Marque a alternativa que e) Estão corretas apenas as
melhor justifica essa afirmação. afirmativas I, II e III.
a) O conhecimento científico precisa 4. O enfoque construtivista a respeito
estar alinhado às tendências do que é aprender e ensinar implica
atuais de ensino. transformar a mente de quem
b) É preciso apresentar o aprende, que deve reconstruir e
conhecimento científico tal qual dar significado aos processos de
ele foi elaborado. aquisição de conhecimento. “Essa
c) O conhecimento científico é ideia não é, evidentemente, nova,
fundamental, mas não deve ser o uma vez que, de fato, tem uma
único objetivo do professor. Esse longa história cultural e filosófica.”
deve se preocupar em desenvolver (POZO; CRESPO, 2009, p. 20). Devido
em seus alunos várias habilidades às mudanças ocorridas na forma de
importantes para se chegar ao produzir conhecimentos em nossa
conhecimento científico. sociedade, entre eles os científicos,
d) O professor precisa desenvolver em faz-se necessário estender essa forma
seus alunos a crítica aos métodos de aprender e ensinar para quase
utilizados pelo pesquisador. todas as áreas da nossa vida, inclusive
e) Só se chega ao conhecimento para o ensino das ciências.
científico se o aluno tiver pré- Depois das discussões e conforme
requisitos para isso. a bibliografia estudada, veja os
3. Baseando-se nas discussões elementos que fazem parte da
levantadas acerca das possíveis elaboração do conhecimento
causas da desmotivação de alunos científico e que são responsáveis para
nas aulas de ciências, analise as se chegar à compreensão científica:
afirmativas a seguir: I. A aprendizagem de conceitos.
I. Os alunos não estão motivados II. O desenvolvimento de
porque não aprendem. habilidades cognitivas e de
II. Não está havendo interação entre raciocínio científico.
os alunos. III. O desenvolvimento de
III. Os alunos são indisciplinados. habilidades experimentais e de
IV. A metodologia está inadequada. resolução de problemas.
V. Há um excesso de trabalho do IV. O desenvolvimento de atitudes e
professor. valores.
Agora, marque a alternativa V. ___
CORRETA: Marque a alternativa que completa
a) Estão corretas apenas as CORRETAMENTE a lacuna acima:
afirmativas I, II, III. a) Compreensão do que trata a
b) Estão corretas apenas as disciplina de ciências.
52 Metodologia do ensino de ciências

b) Conhecimento da biografia de Identifique quais são os tipos de


cientistas renomados. conteúdo que contemplam os
c) Levantamento de problemas. três tipos de aprendizagem que se
d) Construção de hipóteses e pretendem construir.
elaboração de novas hipóteses. a) Conteúdos conceituais,
e) Divulgação de resultados. procedimentais e atitudinais.
5. Para desencadear o processo de b) Conteúdos conceituais e
construção do conhecimento específicos.
científico e garantir a compreensão c) Conteúdos específicos e gerais.
científica, o professor precisa priorizar d) Conteúdos atitudinais, conceituais
conteúdos e estabelecer objetivos e gerais.
específicos para garantir o sucesso e) Conteúdos gerais e
no seu trabalho. procedimentais.

Referências

MOREIRA. M. A. Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo:


Moraes, 1982.

POZO, J. I.; CRESPO, M. A. G. A aprendizagem e o ensino de Ciências: do conhecimento


cotidiano ao conhecimento científico. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.

ZABALA, A. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artmed, 1998.


METODOLOGIA DO
ENSINO DE
CIÊNCIAS

Adriana Fernandes
Gonçalves
M593 Metodologia do ensino de ciência [recurso
eletrônico] / Organizadora, Adriana Fernandes
Gonçalves. – Porto Alegre : SAGAH, 2016.

Editado como livro impresso em 2016.


ISBN 978-85-69726-29-6

1. Educação. 2. Metodologia de ensino - Ciências.


I. Gonçalves, Adriana Fernandes.
CDU 37.022

Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094


Aprendizagem significativa:
do conhecimento cotidiano ao
conhecimento científico
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
„„ Analisar as formas de entendimento das relações entre
conhecimento cotidiano e conhecimento científico.
„„ Identificar as principais características da hipótese da integração
hierárquica do conhecimento.
„„ Construir propostas práticas de trabalho que evidenciem a
integração entre os conhecimentos cotidianos e científicos.

Introdução
Neste texto, você estudará as formas de entendimento das relações
entre conhecimento cotidiano e conhecimento científico. Você
também vai conhecer a importância da integração hierárquica entre
esses conhecimentos.

Aprendizagem significativa
No ano de 1980, os pesquisadores americanos Ausubel, Novak e Hanesian,
especialistas em psicologia educacional, disseram que o fator isolado mais
importante que influencia o aprendizado é tudo que o aprendiz já conhece.
Como já estudado antes, o conhecimento prévio do aluno é de extrema im-
portância e a partir dele novos caminhos mentais para o aprendizado são ini-
ciados. Em 1963, quando Ausubel formulou suas teorias, o behaviorismo era a
concepção válida no ensino da época; porém, ele acreditava que para aprender
novos conteúdos, era necessário acessar, ampliar e reconfigurar esses conhe-
cimentos prévios do aluno.
Aprendizagem significativa: do conhecimento cotidiano ao conhecimento científico 39

Fique atento

Behaviorismo (também conhecido como comportamentalismo): teoria que não acre-


ditava na importância do conhecimento prévio e que estímulos específicos poderiam
transformar (ou moldar) o comportamento de uma criança para que ela pudesse de-
senvolver qualquer atividade escolhida pelo orientador.

A teoria de Ausubel concorda com as teorias de desenvolvimento propos-


tas por Vygotsky e Piaget, no sentido de que para haver aprendizagem signifi-
cativa, o conteúdo deve fazer algum sentido na vida do aluno. Assim, ensinar
qualquer matéria sem levar em conta aquilo que o aluno já sabe é um trabalho
em vão, pois os novos conhecimentos não têm como se ancorar, estabelecer
conexões e relações. Portanto, é necessário que as atividades em aula consi-
gam possibilitar momentos de reflexão, para que não sejam automatizadas e o
aluno possa compreender o que o professor falou.
Ausubel também definiu a aprendizagem mecânica a partir da memori-
zação de frases prontas lidas no livro didático, escritas na lousa ou mesmo
faladas pelo professor. Ele afirma que essa memorização é importante, assim
como a aprendizagem significativa.
A professora Elisângela Fernandes (2011), no artigo A ponte para apren-
der, publicado na Revista Nova Escola explica:

De acordo com o pesquisador norte-americano, essas duas formas de


conhecer não são antagônicas. Ambas fazem parte de um processo con-
tínuo. Há ocasiões em que é preciso memorizar algumas informações que
são armazenadas de forma aleatória, sem se relacionar com outras ideias
existentes. No entanto, o processo de aprendizagem não pode parar aí.
Outras situações de ensino, assim como a interação com as demais crian-
ças, devem contribuir para que novas relações aconteçam, para que cada
um avance e construa seu conhecimento.

Resumindo, o fundamento do processo de aprendizagem significativa é


conseguir relacionar as ideias com as informações já existentes do aluno, por
meio de uma relação não arbitrária e substantiva.
40 Metodologia do ensino de ciências

Conhecimento cotidiano x conhecimento


científico
Entenda que o conhecimento cotidiano é aquele vivido no dia a dia das pes-
soas, como o nome diz, é influenciado pelo cotidiano de cada um. Essas in-
formações são passadas de geração em geração e de pai para filho, por isso
a maioria das pessoas tem acesso a esse tipo de conhecimento. Já o conheci-
mento científico é necessário para comprovar as afirmações feitas, pois não
há como saber o que é verdade ou mentira ao utilizar, apenas, o conhecimen-
to cotidiano. O conhecimento científico é baseado na lógica, o que também
não garante a verdade absoluta. Todos os dias surgem novas tecnologias que
podem trazer outra forma de compreender as situações que aparecem regu-
larmente. Cabe ao professor utilizar o conhecimento científico para estimular
seu aluno a questionar informações e buscar novas respostas.

Exemplo

Conhecimento cotidiano é observar uma maçã caindo de uma árvore e contar para
alguém. Conhecimento científico é formular as leis da gravidade a partir desse pen-
samento.

Ao levar em conta o conhecimento cotidiano e o conhecimento científico


você vai aprender como é possível, a partir da psicologia cognitiva do apren-
dizado, diferenciar essas três concepções: a compatibilidade, a incompatibi-
lidade e a independência. Ao incorporar esses três conceitos, você chegará
à integração hierárquica. A partir da leitura do capítulo 5 do livro A apren-
dizagem e o ensino de ciências, de Pozo e Crespo (2009), você terá o resu-
mo: hipótese da compatibilidade (ou da acumulação de saberes) diz que
o racionalismo científico é baseado na racionalidade humana; a hipótese da
incompatibilidade (ou da mudança conceitual) surge a partir da teoria que
a ciência e o conhecimento cotidiano não são compatíveis e a aprendizagem e
o pensamento não são próximos do racionalismo. O conhecimento cotidiano
sobre assuntos de conhecimento científico é entendido de uma forma não ra-
cional, utilizando conceitos específicos; a hipótese da independência (ou do
uso de conhecimento seguindo o contexto) propõe a coexistência das duas
Aprendizagem significativa: do conhecimento cotidiano ao conhecimento científico 41

maneiras de conhecimento, que não se exclui o conhecimento cotidiano ou o


conhecimento científico, mas que sejam utilizados de forma apropriada, con-
textualizada; já a hipótese da integração hierárquica (ou dos diferentes ní-
veis de representação ou conhecimento) diz que é possível uma integração
entre os saberes cotidiano e científico, sendo independentes no contexto, mas
integrados no conceito, de maneira que o aluno possa compreender a relação
que há entre estes conhecimentos, não excludentes entre si.
Veja que é necessário realizar uma mudança conceitual, entendida como
a construção do conhecimento científico a partir do conhecimento cotidia-
no, pois a base da ciência é tudo o que se observa no dia a dia. Para isso,
você necessitará: de uma reestruturação teórica das bases do conhecimento
científico, uma explicitação progressiva dos conceitos científicos e por fim, a
integração hierárquica do conhecimento.

Exercícios
1. Segundo Pozo e Crespo (2009), 2. Para Pozo e Crespo, a aprendizagem
a crise da educação científica é de ciências exigiria uma profunda
consequência da dificuldade dos mudança conceitual dessas
alunos para encontrar sentido para o teorias implícitas para formas do
ensino de ciências. Isso se deve: conhecimento científico
a) à escola não se propor a ensinar Baseando-se nas ideias apresentadas
seus alunos os conhecimentos por Pozo e Crespo (2009), existe
científicos. uma relação entre o conhecimento
b) ao ensino da ciência ser ineficaz cotidiano e conhecimento científico
para conseguir mudanças profun- que, do ponto de vista da psicologia
das e não apenas conceituais, mas cognitiva da aprendizagem e da
também de atitudes e procedi- própria tradição em didática de
mentos que a transição do conhe- ciências, que podemos classificar em
cimento cotidiano para o científico três concepções. Que são:
requer. I. Compatibilidade de
c) aos alunos não terem interesse em conhecimentos.
aprender conceitos científicos. II. Incompatibilidade de
d) ao ensino de ciências ser ineficaz conhecimentos.
porque as mudanças foram muito III. Independência entre as formas de
rápidas e o ensino não conseguiu conhecimento.
acompanhar. ( ) O conhecimento cotidiano
e) ao avanço do ensino de ciências é baseado em forma de
apenas na aquisição de procedi- pensamento e aprendizagem
mentos e atitudes de seus alunos. que se afastam. O conhecimento
42 Metodologia do ensino de ciências

cotidiano sobre os fenômenos basicamente da mesma natureza.


científicos é aprendido mediante Pessoas e cientistas pensam
processos implícitos. essencialmente iguais.
( ) Relação harmoniosa entre formas IV. A mente do cientista e do
próprias do pensamento científico aluno tem, em algum sentido,
e do conhecimento cotidiano. linguagens diferentes.
( ) Formas de conhecimento que V. Pode-se dizer que as afirmativas
servem para contextos e metas que complementam a citação
diferentes. A ideia não é substituir são:
uma pela outra, mas fazer com a) I e II.
que coexistam, além de saber b) II e III.
ativá-las no momento certo. c) III e IV.
Assinale a alternativa que apresenta a d) I e III.
sequência CORRETA: e) I e IV.
a) II, I, III 4. Segundo Pozo e Crespo (2009),
b) I, II, III partindo das diversas teorias sobre
c) II, III, I a construção do conhecimento
d) I, III, II científico em contextos escolares a
e) III, I, II partir do conhecimento cotidiano,
3. De acordo com Pozo e Crespo podemos identificar três processos
(2009): “Uma última versão dessas fundamentais na construção do
relações entre conhecimento conhecimento científico.
cotidiano e científico, que será a que Marque a alternativa que apresenta
defenderemos nesta exposição, a CORRETAMENTE quais são esses
partir da análise das anteriores, seria a processos.
integração hierárquica entre elas.” a) Reestruturação teórica, explicitação
Com base na citação acima, analise progressiva e compatibilidade de
as afirmativas: saberes.
I. Deveriam integrar-se b) Reestruturação teórica, explicitação
conceitualmente de modo que os progressiva e integração
alunos compreendam a relação hierárquica das teorias implícitas
genética que existe entre elas. dos alunos nas teorias científicas.
II. Além de diferenciar suas c) Explicitação progressiva, integração
próprias teorias implícitas do hierárquica das teorias implícitas
conhecimento científico que dos alunos nas teorias científicas e
lhes é ensinado, deveriam compatibilidades de saberes.
integrar as formas mais simples e d) Integração hierárquica das teorias
intuitivas do saber nos modelos implícitas dos alunos nas teorias
mais complexos, elaborados e científicas, compatibilidades de
explícitos, mas nem por isso, mais saberes e mudança conceitual.
úteis ou relevantes. e) Reestruturação teórica,
III. Os processos e produtos do explicitação progressiva e
conhecimento cotidiano mudança conceitual.
e científico compartilham
Aprendizagem significativa: do conhecimento cotidiano ao conhecimento científico 43

5. Para Pozo e Crespo: “[...] Essa ideia de científico envolve também um


aprendizagem da ciência entendida processo metacognitivo ou,
como a integração hierárquica melhor dizendo, metaconceitual
dos modelos implica, portanto, de explicitação das concepções
diferentes processos de construção mantidas teoricamente.
do conhecimento científico que vão c) A produção do conhecimento
além da mudança conceitual, tal científico requer construir estrutu-
como geralmente são entendidas.” rais conceituais mais complexas a
Com base nisso, assinale a alternativa partir de outras mais simples.
CORRETA: d) Os conteúdos conceituais não
a) A reestruturação implica devem ser trabalhados de forma
desconstruir a forma de organizar central e sim os conteúdos
o conhecimento em um domínio procedimentais e atitudinais.
que seja incompatível com as e) Podemos dizer que o processo de
estruturas anteriores. Seriam integração hierárquica permite
as mudanças das estruturas integrar as teorias teórica e
conceituais dos alunos. científica.
b) A construção do conhecimento

Referências

AUSUBEL, D. P.; NOVAK, J. D.; HANESIAN, H. Psicologia educacional. 2. ed. Rio de Janeiro:
Interamericana, 1980.

FERNANDES, E. A ponte para aprender. Revista Nova Escola, ed. 248, dez. 2011. Dispo-
nível em: <http://novaescola.org.br/formacao/david-ausubel-aprendizagem-significa-
tiva-662262.shtml?page=0>. Acesso em: 7 jun. 2016

POZO, J. I.; CRESPO, M. Á. G. A aprendizagem e o ensino de Ciências: do conhecimento


cotidiano ao conhecimento científico. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.

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