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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS


DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA

FILOSOFIA DA CIÊNCIA
PROF. PHD. SAULO DE FREITAS ARAÚJO

O CASO SOKAL REVISITADO: IMPLICAÇÕES PARA AS PRÁTICAS CIENTÍFICAS


NAS CIÊNCIAS HUMANAS

Allison Menezes - luganomenezes@hotmail.com Matrícula: 201732005


Marcos Paiva - paivapmarcos@gmail.com Matrícula: 201732006
Thales Rodrigues – ​thales.rodrigues@engenharia.ufjf.br​​ Matrícula: 201049058
Perguntas
1. Introdução: O que foi o caso Sokal
2. Qual a relação entre o caso Sokal e o recente episódio promovido pelos 3 autores?
3. Qual a tese central dos 3 autores e quais são os argumentos que eles utilizam para
justificá-la?
4. Qual foi o objetivo do experimento e como ele foi planejado?
5. Quais foram os resultados?
6. Quais foram as primeiras reações no mundo acadêmico? (prós e contras)
7. Qual é a posição do grupo diante do episódio?

Introdução

Nascido em 1955, Alan Sokal é um professor de física e matemática que trabalha

principalmente com métodos numéricos na teoria de campos quânticos e mecânica estatística na

New York University. Indo além das fronteiras de sua área habitual de pesquisa, Sokal

consagrou-se um crítico do pós-modernismo em 1996 através do que ficou conhecido como o

Caso Sokal.

Para que se possa entender o objeto da crítica de Sokal e como foi estruturado o

escândalo preconizado pelo seu trabalho “Transgredindo as fronteiras: Em direção a uma

hermenêutica transformativa da gravitação quântica” publicado em 1996, iremos recorrer ao que

disse Neto (1998) sobre a pós-modernidade:

"Mas para esse exame, será preciso, antes, caracterizar minimamente o sentido que estou

dando a pós-moderno. Para isso, começo recorrendo a Lyotard, para quem a

Pós-Modernidade é o ‘estado da cultura após as transformações que afetaram as regras do

jogo da Ciência, da Literatura e das Artes, a partir do final do século XIX’ (Lyotard,

1988, p.xv). Não se trata nem de uma ‘escola’ (unificada) nem de um ‘ismo’, mas de uma

condição ou, talvez, perspectiva, que rejeita um pensamento totalizante as metanarrativas


iluministas, os referenciais universais, as transcendências e as essências e que,

implodindo a Razão moderna, deixa-a nos cacos das racionalidades regionais, das razões

particulares.”

Segundo Candiotto (2006), a estrutura tradicional da filosofia estabelece um vínculo entre

o sujeito e o conhecimento, colocando o sujeito na posição de origem e fonte da verdade. O

autor, no mesmo contexto, ainda cita as delimitações do alcance do conhecimento propostas por

Kant seja pela sensibilidade, seja pelo entendimento dos fenômenos. Desta forma, o que ele

define como estrutura tradicional da filosofia são regras definidas por Lyotard em Neto (1998).

Em contrapartida, Toscano e Silva (2015) nos mostram como Foucault dedicara-se a

compreender como as práticas sociais influenciam o surgimento de novos domínios de saber, de

objetos e sujeitos de conhecimento. Assim, percebe-se uma mudança de paradigma na formação

do indivíduo através do que se propõe o seu saber e as práticas sociais de sua realidade e

conceituando, então, a Verdade como uma construção.

Thomas Kuhn e Paul Feyerabend, dois expoentes nos estudos da Filosofia da Ciência,

somam vozes a esse movimento fortalecendo a ideia de que ciência é muito mais que uma

concepção matemática sobre a percepção mundo. O físico formado em Harvard preconiza uma

abordagem histórico-social sobre esse conceito, definindo, assim, o centro de sua tese, dizendo

que, tudo estaria sujeito a um paradigma. Enquanto Feyerabend, coloca a ciência como um

organismo anárquico, recusando todo e qualquer tipo de autoridade centralizada, pois, esta

representa um grande obstáculo para a gênese de novas teorias válidas.

Em um mundo onde a Verdade - com letra maiúscula, pois, estamos aqui tratando da

conceituação do verbete - é colocada em cheque pelo movimento da pós-modernidade, que a


coloca como uma mera construção social, acaba-se por ignorar o que realmente o é. O professor

Alan Sokal, percebendo tais problemáticas, principalmente na área das humanidades, decide,

então, através do método científico, denunciar o abuso do academicismo no modo de fazer

ciência e na utilização irresponsável das ciências naturais pelas ciências sociais.

Para tanto, Silva (2004) mostra como o físico Pós-Modernista de “Transgredindo as

fronteiras” faz sugestões e analogias sobre a realidade física e a realidade social, tal como,

estabelece uma relação entre ambas através de uma suposta teoria quântica da gravitação. O

autor também coloca que, de acordo com o artigo, as críticas sociais e culturais podem contribuir

para a ciência mostrando-lhe a invalidade dogmática de suas proposições, pois:

“(...) ‘realidade’ física, não menos que a ‘realidade’ social, é no fundo uma construção

social e lingüística; que o conhecimento "científico", longe de ser objetivo, reflete e

codifica as ideologias dominantes e as relações de poder da cultura que o produziu; que

as afirmações da ciência são intrinsecamente dependentes da teoria e auto-referenciais; e,

em conseqüência, que o discurso da comunidade científica, apesar de seu inegável valor,

não pode pretender um status epistemológico privilegiado em relação às narrativas

anti-hegemônicas emanadas das comunidades dissidentes ou marginalizadas.”

O Caso Sokal e os Estudos de Ressentimento e Corrupção da Academia

Através do exposto acima, revisitando o ocorrido no Caso Sokal, os autores ​Helen

Pluckrose, James A. Lindsay e Peter Boghossian buscaram, analogamente ao matemático em

1996, questionar o modo de fazer ciência no ambiente acadêmico. Sobre isso, diferente do

americano, eles imprimem uma crítica direta às publicações de periódicos atuais referentes aos

direitos liberais de movimentos minoritários (negros, mulheres, LGBT+, entre outros). Para eles,
o método utilizado pelos revisores ao publicar tais artigos, não apenas deturpa o fazer científico

da academia como também negligencia o discurso de justiça almejado pelos liberais universais.

As obras aceitas e disseminadas pelos revisores, ao invés de contemplar a verdade verificável de

seus conteúdos estão entregues a um viés de confirmação político e ideológico. Nesse sentido, a

problematização do que está sendo propagado à sociedade com respaldo científico, devido a

constante e polêmica discussão no âmbito social e acadêmico, coloca em evidência a prática

promovida por esses autores.

Analisando a fundo esses fatos, as publicações dos trabalhos acadêmicos das ciências

humanas e sociais estão imersos a problemas de cunho epistemológicos e éticos. Desse modo,

para contrariar o método antiético de defesa dos desequilíbrios de poder e opressão sobre as

identidades desses grupos citados - os chamados de estudos de ressentimento, Pluckrose et al.

(2018) ​buscam pôr em xeque o modelo pós-moderno vigente nos artigos de hoje. Sobre esse

modo de enxergar o mundo, Sokal em seu livro ​Imposturas Intelectuais ​(1997) denomina:

“Vastos setores das ciências sociais e das humanidades parecem ter adotado uma filosofia

que chamaremos, à falta de melhor termo, de “pós-modernismo”: uma corrente

intelectual caracterizada pela rejeição mais ou menos explícita da tradição racionalista do

Iluminismo, por discursos teóricos desconectados de qualquer teste empírico, e por um

relativismo cognitivo e cultural que encara a ciência como nada mais que uma

“narração”, um “mito” ou uma construção social entre muitas outras.” (Sokal, 1997, p.

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Nessa perspectiva, o construtivismo radical entra em vigor demonstrando como as

experiências e a sociedade são baseadas em crenças socialmente construídas. Assim, a evidência

dos conteúdos antes verificáveis de forma objetiva e na realidade são modificados pela
intencionalidade de crenças - confirmação de viés ideológico e político - de grupos poderosos

sobre outros minoritários. Dessa forma, o que passa a ter valor não é a verdade (o conteúdo), mas

a padronização, o discurso, a persuasão, o sofismo. Portanto, os agentes perceberam que a

importância das publicações, enraizadas atualmente no modelo acima, era única e exclusiva

estrutural e não mais na matéria.

Por meio dessa constituição construtivista radical de pensar (e fazer) o mundo, a verdade,

dentro da ciência e da razão, não mais se unificam. As crenças como nova forma de justificar o

conhecimento sobressaem a verdade e, desse modo, destinam às outras abordagens

não-científicas um valor de igual expressão em relação ao método científico. Ou seja, tanto a

ciência (com suas coletas de dados, análise estatística, replicações de resultados, entre outros)

quanto a não-ciência seriam, nesse contexto, produção de conhecimento, independente destas

estarem ou não entregues a busca objetiva e verificável da verdade.

Os preceitos modernos de causalidade e invariância também são substituídos por

constructos pós-modernos de contingência. Tudo é “constructo”, e as forças que

subjazem à construção são a contingência. A substância das construções é o “contexto”.

A contextualidade é tanto causa como conseqüência. Contexto e contingência dirigem o

que é valorizado e avaliado como aceitável. A “verdade” é uma relação de força que

resulta de um contexto específico. Um contexto alternativo resultaria em uma

configuração diferente de crença e aceitação. A “verdade” pode ser definida como o que

vence a batalha entre os atores em competição, o que se torna dominante. (Latour &

Woolgar, 1979; Latour, 1987)

Pluckrose et al. (2018), preocupados com a implicação desse modelo nos periódicos,

buscaram, através das publicações de seus artigos, demonstrar como o método científico atual
necessita ser repensado e refeito bem como enfatizar que, apesar de problemático (como

qualquer outra forma de conhecimento), a ciência é o método mais viável para aproximar-se da

verdade.

A necessidade dessa prática desenvolvida pelos pesquisadores ressoou, para eles, como

fator fundamental e imprescindível. Analisando as consequências do modelo construtivista

radical dentro dos artigos, vislumbra-se como a confirmação de qualquer tipo de conhecimento

nessa área vai à margem do buscado pelos liberalistas universais. Ao confirmar a epistemologia

dessa abordagem acerca da “teoria do ponto de vista” - o valor de um discurso não equivale a

verdade, mas a justificativa que ele imprime, os periódicos passam a obter um relativismo

ideológico, político e moral, constituindo assim validação a discursos sexistas, racistas e

homofóbicos (contrários aqueles defendidos pelos liberais).

Todo esse enredo dentro dos atuais artigos acadêmicos, aprovados por revisores, fez com

que os autores, revisitando o caso Sokal, colocassem em pauta como esse modelo de crenças está

causando inúmeras problemáticas na academia e também na cultura. A disseminação dos

discursos por professores, ativistas e o povo no geral, decorrentes desses periódicos aprovados,

faz do método científico um instrumento tendencioso e voltado a confirmação de um viés

político e ideológico. O meio acadêmico, local ao qual a produção científica deveria ser

desenvolvida, que remete a sociedade um conhecimento verificável e verdadeiro, passa, por meio

dessa configuração, a consentir um viés antietico, causando a extrema divulgação de discursos

construídos em opressão e desequilíbrios de poder (o que difere do liberalismo que defende os

grupos marginalizados).
Dessa forma, Pluckrose et al. (2018) buscam, através das publicações moldadas no

modelo construtivista radical, fazer com que os resultados alcançados impliquem um desconforto

aos cientistas (revisores acadêmicos), a fim de reavaliar o modo de fazer ciência atual e que estes

retornem ao seu anseio objetivo da verdade e verificação. Pois, tendo em vista a relevância dos

periódicos à cultura, a entrega dos artigos ao segundo é de primordial necessidade, eliminando

qualquer tipo de “fraude” que coloque não apenas os direitos liberais como também os direitos

humanos em injustiças.

Observando os argumentos e justificativas elencados pelos autores, eles precisavam para

confirmar a hipótese que constituíam, uma metodologia para colocar em risco tais pressupostos

na publicação dos periódicos. Desse modo, os pesquisadores seguiram um padrão específico:

Cada artigo iniciava com uma tese antiética, irracional, ilógica e absurda como base e, através da

revisão da literatura, buscaram constructos para validar esses pressupostos defendidos.

Para além disso, ​Pluckrose et al. (2018) fantasiaram ainda mais sua metodologia de modo

a comprovar suas suposições. Implementaram em suas obras: estatísticas incongruentes,

sustentação de dados incoerentes com a tese, categorias de validação por métodos poéticos e

auto-etnográficos, entre outras práticas paradoxais. Revistas de renome nas áreas de direitos

liberais como ​Affilia​, ​Hypatia,​ ​Sexuality and Culture, Gender​, ​Place,​ ​and Culture foram alvos

das publicações dos pesquisadores para convicção dos seus pressupostos.

Os artigos tinham como defesa tópicos irracionais como: o treinamento de homens como

cães para prevenir acerca da cultura do estupro (“Parque dos Cães”), homens que se masturbam

pensando em mulheres cometem violência sexual (“Masturbação”), universitários brancos devem

ficar acorrentados na chão em sala de aula como forma de pagamento da dívida histórica (“Lista
Progressiva”). Outras considerações ilógicas: obesidade mórbida como modo de vida saudável e

a partir disso devia se tornar uma prática de competição do fisiculturismo (“Fisiculturismo

Gordo”), homens que se exercessem a penetração anal seriam menos transfóbicos, mais

feministas e se tornavam preocupados com a cultura do estupro (“Consolos”), entre outros. Nem

a constatação de “Helen Wilson” do registo de “um estupro canino por hora” em parques

urbanos para cães em Portland, foi motivo de suspeita reprovação pelos revisores.

Recordando o caso Sokal, podemos expor como em sua obra (1997), o americano já tinha

percebido essas práticas no âmbito acadêmico de sua época:

Existem distintos graus de abuso. De um lado, encontram-se extrapolações de conceitos

científicos para além de sua área de abrangência, que são errôneos mas por razões sutis.

Por outro lado, deparamos com numerosos textos que estão cheios de termos científicos

mas são inteiramente desprovidos de sentido. E há, é claro, uma massa de discursos que

podem estar situados em algum ponto entre esses dois extremos. (Sokal, 1996, p. 19)

Ao todo, os autores escreveram 20 artigos a serem propagados em revistas de renome nas

áreas de direitos liberais. Apesar da necessidade de virem a público para pronunciar sobre o fato,

até a data a disseminação do porquê e quais os resultados a partir do que fizeram, eles tiveram: 7

artigos aceitos, 4 publicados online. Outros 3 foram aceitos, porém não divulgados antes dessa

explicação ocorrer. 7 entraram em tramitação e foram abandonados. 2 passaram por revisão e

ressubmissão. 1 está sob revisão em periódico atual.

Dentre as consequências, os autores receberam, por conta delas, 4 convites para

tornarem-se revisores de outros artigos, tendo em vista o excelente trabalho acadêmico

promovido por eles. Não obstante e tão incrédulo quanto possa soar, 1 artigo (“Parque com

Cães”) ganhou um prêmio pela excelência de sua publicação pela revista ​Gender,​ ​Place,​ ​and
Culture, ​periódico que lidera a área de geografia feminista. No aniversário de 25 anos da revista,

o artigo foi um das doze obras reconhecidas nessa celebração.

Em análise do todo, 80% dos artigos postos à publicação foram aprovados em revisão, o

que corresponde a normalidade de 10-20% dos artigos reprovados sem qualquer revisão nas

divulgações atuais. Pela necessidade de vir a público, não foi possível concretizar após todas as

avaliações dos periódicos, no entanto, a estimativa dos pesquisadores estavam entre 10 a 12

publicações.

O conteúdo das obras continham 15 submundos do pensamento na visão dos estudos de

ressentimentos e no contexto dos direitos liberais, sendo esses: incluindo estudos (feministas) de

gênero, estudos de masculinidades, estudos ​queer​, estudos de sexualidade, psicanálise, teoria

crítica da raça, teoria crítica da branquitude, estudos da adiposidade, sociologia e filosofia

educacional. Todas essas temáticas englobava campos de estudos como: pós-modernismo,

ceticismo radical, construtivismo radical, epistemologia feminista e racial e crítica ao

construtivismo social crítico e a psicanálise.

O projeto teve de ser encerrado pois, Helen, James e Peter tiveram de ir a público, por

conta do enorme caos causado pelo artigo “Parque dos Cães”, atraindo até a atenção da uma

plataforma dedicada a publicação de artigos com péssima qualidade: a ​Real Peer Review. ​Com

isso, a autora Helen Wilson e a instituição inexistente criada por eles, a ​Portland Ungendering

Research Initiative (​ PURI), foram convocadas a provar sua identidade após a publicação e

reconhecimento na revista ​Gender,​ ​Place​, ​and Culture.

​ udando
Com o grande alarde promovido, a polêmica chegou até o ​Wall Street Jornal m

totalmente a ética do uso do projeto em questão. Avaliando a concretude do ocorrido, os autores


decidiram divulgar o propósito que tinham ao desenvolver tais práticas. Ao se esclarecer com os

jornais e as revistas que foram (ou iriam ser) submetidas os periódicos, os pesquisadores se

engajaram em preparar um resumo à população explicando o fato, mesmo tendo artigos em fase

final - ou quase isso - de publicação.

Resultados Observados

O episódio envolvendo os três autores e os estudos de ressentimento repercutiu na

comunidade científica, o que acarretou o posicionamento público de alguns teóricos acerca do

ocorrido. No artigo “The Grievance Studies Scandal: Five Academics Respond”, publicado na

revista Quillette Magazine, são expostas cinco análises sobre o escândalo, escritas por críticos

teóricos.

Nathan Cofnas, doutor em Filosofia, critica o modelo científico atrelado ao

pós-modernismo, que, segundo ele, dominou a maior parte das áreas de humanas e ciências

sociais. Cofnas aponta que os pós-modernos não possuem conhecimento aprofundado e que não

conseguem distinguir um artigo teórico embasado de um monte de informações sem sentido.

Além disso, normalmente tais informações são somadas ao ódio por grandes classes de pessoas

vistas como adversários políticos, tais como héteros, brancos e cisgêneros. Para ilustrar sua

crítica, Cofnas cita a bíblia para dizer que a fala dos pós-modernistas começa como idiotice e

termina como uma loucura maligna.

Neema Parvini, professor de inglês, também endereça sua crítica ao pós-modernismo,

afirmando que os pós-modernos rejeitam a razão e evidência e que buscam um “novo

paradigma” científico. Para Parvini, é uma falácia o argumento feminista que defende que a
ciência não pode ser objetiva e que o racionalismo e empirismo são “frutos do patriarcado”. O

professor afirma também que não se surpreendeu com o escândalo, dado que isso é uma

consequência da leitura pós-moderna da ciência.

Rosalind Arden, pesquisadora de Filosofia, atribui o sucesso da fraude ao fato de que nas

ciências sociais a razão foi substituída por ideologia. Ademais, elucida três problemas presentes

na academia que contribuíram para o incidente: a linguagem rebuscada subjetiva, o mau

entendimento dos modelos científicos pelos revisores e editores e a mudança na percepção do

que constitui uma ofensa (tradução livre). Para Arden, esta última é a mais importante, dado que

existe um grande medo de ser mal interpretado/citado e arcar com as consequências de soar

como sexista ou racista no meio acadêmico.

Neven Sesardic, também da Filosofia, sustenta que a filosofia feminista não é

caracterizada pelo rigor intelectual e altos padrões acadêmicos e que a revista Hypatia foi,

portanto, um alvo fácil. Sesardic também cita uma publicação verídica de filosofia feminista para

ironizá-la e criticar os autores por atacarem uma tendência pertencente à esquerda política e

precisarem se autodeclarar esquerdistas.

Por fim, Jonathan Anomaly, teórico da Filosofia, Política e Economia, direciona sua

crítica ao modelo de formação acadêmica americana, discutindo a questão dos impostos e os

investimentos feitos em estudos sem rigor científico. Nas universidades estadunidenses, os

alunos são obrigados a participar de atividades de “diversidade”, na qual incluem-se os estudos

atrelados à tendência pós-moderna. Anomaly vê tal participação como negativa e frisa que o que

acontece na academia não permanece nela.


Conclusão

Através da análise do caso Sokal, do escândalo dos estudos de ressentimento e dos

impactos do incidente no mundo acadêmico, algumas considerações podem ser tecidas. A

repercussão gerada pelo episódio convocou a análise de diversos teóricos, que buscaram atrelar

tal episódio às falhas do atual modelo científico.

Grande parte deles parece convergir no que diz respeito à influência negativa do

pós-modernismo na ciência, que a torna menos rigorosa, objetiva e, consequentemente,

inconfiável. Desta forma, mesmo a subjetividade devendo ser valorizada no que tange às ciências

humanas e sociais, a objetividade é fundamental na construção do saber científico.

Ao tratarmos da neutralidade política na ciência, colidimos com sua vasta

problematização, que convoca-nos a refletir sobre o alvo do saber científico. Para quem serve a

ciência? Para quem servirá um dado saber? Onde e como esse saber será aplicado? Ao

adentrarmos nessas questões percebemos que a neutralidade configura-se como uma ilusão. A

ciência é desenvolvida também dentro em um contexto sócio-político-cultural, ou um paradigma,

como disse Kuhn (1962), e possui objetivos claros, que são de caráter político.

Apesar disso, a ciência, embora não seja neutra, deve ainda almejar a objetividade e o

rigor metodológico. O material utilizado como embasamento para este trabalho serviu para

elucidar a problemática do modelo científico atual, impregnado pelo pós-modernismo. Tal crítica

é válida e precisa ser discutida dentro da academia.

Em verdade, pôde ser estabelecida ao longo do trabalho uma relação entre a ciência

tradicional, as ciências pós-modernas e como os casos Sokal e dos três autores se interligam

nesse embate de como o conhecimento é produzido, registrado e distribuído.


De um lado temos a hegemonia da comunidade científica, que dita o que pode ser ciência

e do outro a relatividade pós-moderna da verdade. Finalmente, concluímos que, deve-se

encontrar um equilíbrio entre ambos os lados. Os problemas de demarcação, previstos pelo

modelo científico vigente, representam uma grande barreira para o progresso de diversas áreas

que não conversam entre si. Por outro lado, a anarquia distorcida de Feyerabend propicia que

casos como os apresentados - sem a intenção de serem fraudes - sejam publicados sem

criticidade.

Assim, espera-se que, Pluckrose e seus colegas, assim como Sokal em sua época, abram

os olhos dos pesquisadores contemporâneos. Ofertando-lhes, então, clareza para que as Ciências,

em especial as Sociais, seja feita de modo responsável segundo seu contexto sociopolítico e de

forma coerente com o método científico.


Referencial Bibliográfico

Candiotto, C. (2006). ​Foucault: Uma História Crítica da Verdade.​ Trans/Form/Ação, São Paulo,
29(2): p. 65-78.

Kuhn, T. S. (1962). ​A Estrutura das Revoluções Científicas.​ Editora Perspectiva, São Paulo, v. 5

Latour, B., Woolgar, S. (1979). ​Laboratory life: the construction of social scientific facts.​ Los
Angeles/London: Sage.

Neto, A. V. (1998). ​Ciência e Pós-Modernidade. ​Episteme, Porto Alegre, v. 3, n. 5, p. 143-156

Silva, J. J. (2004). ​Imposturas intelectuais: algumas reflexões.​ Natureza Humana, São Paulo, v.
6, n. 1

Sokal, A., Bricmont, J. (1997).​ Imposturas Intelectuais.​ France/França: Record.

Toscano, S. G. R., da Silva, D. J. V. (2015). ​A questão do conhecimento e da verdade em Michel


Foucault: uma leitura a partir do perspectivismo​. Ágora Filosófica, Recife, p. 195-213

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