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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS – FACULDADE DE DIREITO

DISCIPLINA: Metodologia da Pesquisa e do Estudo em Direito – Prof.ª Caroline Barbosa


Contente Nogueira

Discente: Davi Gomes Martins Matrícula: 22051915

SANTOS, Boaventura de Sousa, Metodologia da Pesquisa Jurídica, Um discurso sobre as


ciências jurídicas, 5. Ed. – São Paulo: Cortez, 2008

O texto de Boaventura de Sousa Santos tem como principal objetivo induzir uma
reflexão e expor ao leitor uma discussão a respeito das ciências sociais sob a ótica dos
cientistas naturais. Diante disso, o autor busca estabelecer a definição mais bem aceita
por parte da comunidade científica hegemônica como "ciência natural" que presidiu a
partir do séc. XVI, bem como detalhar as suas características imprescindíveis para que
seja considerada como tal. Entretanto, com o avanço das percepções analíticas dessa
comunidade, Boaventura verifica a ascensão de um conhecimento que versa sobre as
relações humanas que é conhecido como o grupo das "ciências sociais". Dessa forma,
através da alcunha de "ciência", a emergente expressão acabou tendo certa contraposição
por parte da maioria destes cientistas naturais, por não possuir metodologia e
epistemologia própria, o que por sua vez seria contrário a definição básica que se tinha
por ciência. Portanto o autor busca com seu livro expor diversos exemplos, metáforas e
comparações para se legitimar a existência dos conhecimentos que estudam as relações
humanas como uma nova ordem científica emergente e inevitável.

Embora o autor promulgue seu percurso analítico a partir de hipóteses, o seu


raciocínio apresenta ter bastante lógica considerando sua forma de receber seus resultados
e conclusões. Assim, Santos fundamenta um encadeamento de fatos para explicar a tensão
existente entre as ciências, como: perda de motivos para se distinguir ciência natural da
social; a ciência natural surgindo como um fator de incentivo à união das duas ciências;
a abdicação das formas de positivismo lógico ou empírico por parte de ambas as ciências;
a não união destas, mas sim a existência de convergências temáticas; e por fim a
conclusão da ausência de uma hierarquia entre essas formas de conhecimento.
Primeiramente, para definir o paradigma dominante, e apresentar a ordem
científica hegemônica, o autor identifica um modelo global de racionalidade científica
que possui uma variedade interna mas que se autodeclara defensora de duas formas de
conhecimento não científico: o senso comum e os estudos humanísticos. Portanto, logo
nota-se um ideal, como bem dito pelo autor, de caráter totalitário por parte deste modelo,
haja vista que não reconhece a racionalidade para todas as formas de conhecimento que
não dispõem de seus princípios epistemológicos e suas regras metodológicas, uma vez
que para essa ordem científica totalitária, possuir uma metodologia e epistemologia
própria era fundamental.

Ademais, ao analisar as condutas científicas de Kepler e Descartes, é observado a


primeira tensão existente entre o saber aristotélico e o moderno. Este, sendo conhecido
como o saber da oposição ao dogmatismo e autoridade, o estabelecendo como uma
disputa entre natureza e humanidade, em que a natureza se mostra como “passiva” e a
humanidade identificada “como oportuna a controlá-la”.

Visando se opor aos modelos de "experiência", o autor discute a rigidez e a


profundidade da natureza presente nas ideias matemáticas, expondo seu valor
significativo para quantificar, representar e estruturar a matéria. Dessa forma, alinha os
pensamentos de Galileu e Einstein, que pensam na natureza como uma quebra-cabeças
geométrico. Assim, a partir da matemática ocupando essa posição central na ciência
moderna, deu-se origem a duas consequências importantes: em que conhecer significa
quantificar, ou seja, ignorando suas características qualitativas em cada elemento ainda
que distinto e reconhecendo apenas sua existência como elemento n e quantificado em n,
o que por sua vez torna irrelevante tudo aquilo que não seja quantificável; e o método
científico assentado na redução da complexidade.

Todavia, contrapondo Galileu, Descartes propõe a divisão do método em


"condições iniciais" e "leis da natureza", e as classificando como complicadas e simples
respectivamente, e definindo "leis da natureza" como assento da ciência moderna e
adicionando em sua metodologia, uma independência das condições iniciais para se obter
seu resultado, dessa forma acaba evidenciando a origem do principal teorema da
invariância física clássica proposta anteriormente por Wigner.

Uma vez reconhecidas as leis como parte do "método" da ciência moderna, que
fora rapidamente adicionada como categorias de inteligibilidade da metodologia, possui
sua predefinição baseada no conceito de causalidade escolhido pela física aristotélica. E
Aristóteles distingue quatro tipos de causa: a causa material, formal, eficiente e final.
Dessa forma, define-se as leis da ciência moderna como um tipo de causa formal que
privilegia o funcionamento das coisas em detrimento do agente e da finalidade das coisas,
ou seja, acaba englobando conceitos e objetivos de todas as formas supramencionadas de
causalidade, e é a partir deste pensamento que o conhecimento científico diverge do senso
comum.

“É que, enquanto no senso comum, e portanto no conhecimento prático em que


ele se traduz, a causa e a intenção convivem sem problemas, na ciência a
determinação da causa formal obtém-se com a expulsão da intenção. É este
tipo de causa formal que permite prever e, portanto, intervir no real e que, em
última instância, permite à ciência moderna responder à pergunta sobre os
fundamentos do seu rigor e da sua verdade com o elenco dos seus êxitos na
manipulação e na transformação do real.” – Uma discurso sobre as ciências,
Boaventura de Sousa Santos, 2008.

Já com a percepção de Newton para a ordem cósmica como uma simplicidade de


leis por ele definidas, acabou-se propiciando uma hegemonia racional para a ciência
moderna, que foi, paulatinamente, transferindo o estudo da natureza ao estudo da
sociedade, e focar nesta como novo objetivo para se encontrar leis, leis da/para sociedade.

Bacon, Vico e Montesquieu são os pioneiros a trabalhar nesta transferência.


Primeiro Bacon com a análise das composições jurídicas, sociais e políticas para compor
a perfectibilidade da natureza humana. Então Vico, sugerindo a governança da evolução
das sociedades a partir de fatores do determinismo para se encontrar razões coletivas de
necessidade. E Montesquieu deixa a herança para o início do que viria a ser a sociologia
jurídica ao coadunar as leis jurídicas com as leis da natureza.

Logo, o movimento de transferência supracitado acaba se alastrando com o


decorrer do século XVIII, o que propicia para a emergência das ciências sociais no século
XIX. E foi neste século que se atualizou as formas de conhecimento como: conhecimento
científico e as ciências empíricas segundo o modelo mecanicista. E a partir deste modelo
que se conferiu as ciências sociais como unica e precisamente empíricas. O mesmo
modelo distinguiu as ciências empíricas em duas vertentes: a aplicação dos princípios
epistemológicos e metodológicos que presidiam ao estudo da natureza e reivindicar um
estatuto epistemológico e metodológico próprio às ciências sociais.
No entanto para conferir tais reconhecimentos para a emergente ciência, a recém
chegada não estava privada de obstáculos a serem superados para sua incorporação à nova
ordem científica, muitos desses obstáculos eram:

“as ciências sociais não dispõem de teorias explicativas que lhes permitam
abstrair do real para depois buscar nele, de modo metodologicamente
controlado, a prova adequada; as ciências sociais não podem estabelecer leis
universais porque os fenómenos sociais são historicamente condicionados e
culturalmente determinados; as ciências sociais não podem produzir previsões
fiáveis porque os seres humanos modificam o seu comportamento em função
do conhecimento que sobre ele se adquire; os fenómenos sociais são de
natureza subjectiva e como tal não se deixam captar pela objectividade do
comportamento; as ciências sociais não são objectivas porque o cientista social
não pode libertar-se, no acto de observação, dos valores que informam a sua
prática em geral e, portanto, também a sua prática de cientista” - Uma discurso
sobre as ciências, Boaventura de Sousa Santos, 2008.

Apesar de o autor trabalhar arduamente para desmistificar o estigma se tem sobre


as Ciências sociais, Boaventura não nega o fato de concluir que o novo paradigma
dominante está enfrentando uma crise irreversível iniciado por Albert Einstein com a
mecânica quântica. Ele identifica essa crise como resultado de uma pluralidade de
condições sociais e teóricas. Para exemplificar, o autor apresenta o pensamento da
relatividade da simultaneidade, no qual ele identifica a simultaneidade de acontecimentos
presentes no mesmo lugar e a simultaneidade de acontecimentos astronomicamente
distantes, pondo-se a questionar a maneira que o observador estabelece a ordem temporal
de acontecimentos no espaço. Albert Einstein de modo brilhante verifica que para se
determinar a simultaneidade dos acontecimentos distantes é necessário conhecer se a
velocidade mas para se medir esta velocidade também é necessário conhecer a
simultaneidade dos acontecimentos. Dessa forma, Einstein também comprova que a
simultaneidade não pode ser verificada e portanto, é arbitrária.

Portanto, uma vez que não há simultaneidade Universal o tempo e o espaço


absolutos de Newton deixam de existir. Uma vez que se considera os princípios
metodológicos dos conhecimentos matemáticos como necessários para a compreensão
das ciências sociais, o rigor das leis que newton havia proposto sendo relativizando por
newton fez surgir um buraco de incompreensão neste paradigma científico agora
colapsado.
Evidenciado por Gõdel como o teorema da incompletude, e tido por Boaventura
como outra condição da crise do paradigma, vê-se o sistema formal, ainda que seguindo
com rigor às regras lógicas da matemática, é possível formular proposições flexíveis e de
significado potencialmente variante.

Entretanto, refletindo-se a âmbito epistemológico, tem-se esse princípio


abordando mais a respeito de seu conteúdo do que sua forma, o que portanto desmistifica
a seletividade das ciências sociais por forma, mais sim sobre o que versa, não reduzindo-
as a um robô da natureza e passando a considerar o inconsiderável e imprevisível do
comportamento humano.

“O rigor científico, porque fundado no rigor matemático, é um rigor que


quantifica e que, ao quantificar, desqualifica, um rigor que, ao objectivar os
fenóm enos, os objectualiza e os degrada, que, ao caracterizar os fenómenos,
os caricaturiza. É, em suma e finalmente, uma forma de rigor que, ao afirmar
a personalidade do cientista, destrói a personalidade da natureza.” - Uma
discurso sobre as ciências, Boaventura de Sousa Santos, 2008.

Assim, Boaventura explica que a crise do paradigma não se dá por ceticismos ou


irracionalismos, mas que apenas abandona os preceitos tradicionais que fora por séculos
estabelecidos e que apresenta um novo paradigma que agora não deixa mais o conforto
de segurança em suas definições e acepções, deixando a racionalidade de certa forma,
mais plural. Ademais, o autor apresenta a partir da caracterização desta crise do
paradigma dominante, surge-se o paradigma emergente

Ao finalizar o seu discuso sobre as Ciências, boaventura prevê o paradigma


emergente, que seria de certo modo, aquele que tem sua origem no presente, e ele afirma
que as suas minusculas raízes só podem ser especuladas pela imaginação sociológica. No
entanto, o autor apresenta teses justificadas para pré anunciar paradigma emergente. A
sua primeira tese assiste em que "todo o conhecimento científico-natural é científico-
social". Justifica-se então, os conceitos de sociedade, cultura e ser humano a partir da
concepção mecanicista da matéria e da natureza, e que apesar das ciências sociais terem
superado a dicotomia entre ela e a ciência natural não se nutre de motivos suficientes para
caracterizar o paradigma emergente mas ressalta que as vertentes principais para
formarem a caracterização das ciências sociais foi justamente a adoção dos modelos
metodológicos e epistemológicos positivistas e ao mesmo tempo o anti-positivismo e
essa segunda acabou marcando de modo irreversível como uma revolução à história do
paradigma emergente.

Em sua segunda tese que justifica "todo o conhecimento é local e total" propõe o
dilema básico da ciência moderna ao verificar que o rigor a ser cobrado da ciência
aumenta proporcionalmente a arbitrariedade de suas abordagens diante da realidade.
Assim, relembra a caracterização plural da ciência moderna como um fator necessário ao
paradigma emergente, sendo total e ao mesmo tempo local por relatar e denunciar temas
que sai adotados por grupos sociais específicos com objetivos delimitados.

Na sua terceira tese sugere que "todo o conhecimento é autoconhecimento" a partir


desta sentença o autor verifica a distinção epistemológica dos objetos de estudo e o sujeito
e a sua articulação e adequação metodológica com a distância empírica do sujeito e do
objeto, que por ventura eram os mesmos homens e mulheres que estudavam, eram
estudados por si. Assim através de uma análise antropológica o autor define a ciência
moderna como um fator de expansão da perspectiva de sobrevivência para um objetivo
de "saber viver".

Finalmente, define sua quarta tese em "todo o conhecimento científico visa


constituir-se em sendo comum", onde afins que a ciência moderna produz conhecimentos
e desconhecimentos, e que em contrapartida a ciência pós-moderna é ciente de que
nenhuma forma de conhecimento é plenamente racional, somente suas configurações.
Essas configurações, são racionais para se encaixar nos moldes de entendimentos
variados da sociedade, e por isso verifica o senso comum como uma prática sem
orientação, imetódica e indisciplinar, que surge espontaneamente no cotidiano

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