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28 REVISTA DO SERVIÇO PÚ BLICO

MONOPÓLIOS PRIVADOS
R ichard L e w in s o h n
D r . te r . p o l.

I. ESBÔÇO HISTÓRICO Grécia pessoas especializadas na organização e


exploração dos monopólios ( 1 ) .
T Ê R M O “monopólio” é um dos mais po­ Demonstrando o mecanismo econômico,

0 pulares e antigos da economia, mas o seu Aristóteles assemelha o monopólio financeiro do


sentido muito tem variado no correr dos séculos.Estado ao monopólio especulativo privado. M as
Como a expressão “economia”, o têrmo monopólio que um particular faça um “corner” para se en­
riquecer ou que um govêrno monopolize a pro­
também nos vem de Aristóteles e parece ter sido tão
dução ou . o comércio de determinada mercado­
familiar aos gregos de seu tempo que êste, contra­
ria com . fins financeiros, não se trata evidente­
riamente a seu hábito, não dá definição dêle, mas
mente da mesma coisa .
apenas alguns exemplos. Assim conta êle que o
N o primeiro caso trata-se de uma ação de
filósofo Thales, tendo previsto, graças a seu ta­
usura, particularmente grave, porque o pfóprio
lento de astrólogo, uma farta colheita de azeito­
monopolizador cria as condições aflitivas que
nas para o ano seguinte, arrematou ainda no in­
lhe darão o ganho, enquanto o simples usurário
verno, a baixo preço, tôdas as prensas de azei­
aproveita da situação precária de outrem, e
tonas existentes nas ilhas de M ileto e Chio e, de­
pela qual não é êle diretamente responsável. No
pois da colheita, os cultivadores lhe pagaram pre­
segundo caso o “lucro” monopolista do Estado
ços extremamente altos pela utilização das pren­
— seja êle economicamente justificado ou não
sas. Caso idêntico ocorreu na Sicília, onde um — aproxima-se de um impôsto destinado a co­
homem empregava o dinheiro que lhe davam a brir as despesas públicas.
guardar, para apoderar-se de todos os estoques
Lutero é freqüentemente considerado o pro­
de ferro existentes nas casas comerciais, a fim de motor da luta contra os monopólios exercidos
vendê-los, em seguida, com grandes lucros, aos pelos trustes e cartéis; mas os exemplos que êle
consumidores. cita são também mais de “corners” . Além disso,
*
Esses dois casos filiam-se a uma categoria não foi êle o primeiro a denunciar as tendências
especial de monopólios a curto prazo, hoje de­ monopolistas das grandes companhias. Em
nominada “corner”, isto é, manobras especulati­ 1512, doze anos antes de Lutero publicar seu
vas que visam a provocar, pela escassez artifi­ célebre panfleto contra a usura ( 2 ) , a dieta do

cial de determinado artigo, uma alta de preços. Santo Império já tinha recomendado proceder
contra “as numerosas grandes sociedades e di­
O processo esteve muito em voga ainda no co-
versas pessoas que pretendem reunir em suas
mêço de nosso século nos mercados de matérias
mãos tôda sorte de mercadorias. . . e impor-lhes
primas, mas, com a legislação e controle mais
preços segundo sua fantasia” . M as quando o
rigoroso das Bolsas, tornou-se mais raro e sem
procurador da Câmara Imperial decidiu aplicar
grande importância econômica.
essa recomendação à maior emprêsa da época,
Aristóteles menciona ainda outra espécie a casa Fugger de Augsburgo, o próprio impera­
de monopólios de mercadorias : os monopólios dor interveio e abafou o processo.
financeiros do Estado. A facilidade com que o Adam Smith tratou da questão dos mono­
monopólio pode obter lucros, diz o filósofo, le­ pólios em diversas ocasiões, sem sistematizá-
vou diversas cidades a monpolizar o comércio
de certos artigos, com o fim de conseguir recei­ (1 ) A r i s t ó t e l e s , Política, l i v r o I, c a p . X I .
(2 ) M a r t i n L u T H E R , Von Kauíhandlung und W u-
tas. Havia mesmo na Administração pública da ch er (1 5 2 4 ). '
M ONOPÓLIOS PRIVADOS 29

Ia ( 3 ) . Segundo êle, o essencial do monopólio Inspirando-se na classificação estabelecida


privado é a tendência para manter o abasteci­ por Platão para os regimes políticos — monar­
mento do mercado e ,, em conseqüência, a oferta quia, oligarquia e democracia — distingue-se do
permanentemente abaixo da procura. Em prin­ monopólio o “oligopólio”, no qual o número de
cípio, Adam Smith é contra todos os monopólios, vendedores é muito limitado, e o caso especial
mas admite exceções, notadamente para as com­ do “duopólio”, quando a competição se reduz a
panhias que, por conta própria, queiram estabe­ dois rivais, situação não muito rara nas indús­
lecer “a new trade with some remete and bar- trias altamente concentradas. Além do oligo­
barous nation” . Quanto aos monopólios nas co­ pólio, existem condições de competição pura que
lônias, deve-se distinguir duas espécies : a exclu­ alguns autores chamam de “poliopólio” .
sividade do comércio direto em favor da metró­ O vendedor não é porém o únicc agente no
pole, como acontecia no Brasil antes da abertu­ mercado. E ’ preciso fazer diferenciação análo­
ra dos portos, e a concessão monopolista em fa­ ga do lado dos compradores. Se não há mais de
vor de uma empresa única, do tipo da Compa­ um comprador — por exemplo, o govêrno para
nhia das índias Orientais inglêsa. Ambas essas cs produtos da indústria de armamentos — fala-se
formas de monopólio são más, segundo Smith, de “monopsônio” (do grego “monos”-único; “opso-
mas a segunda ainda é pior que a primeira. nein”-ir a compras; “polein” -v e n d e r ). Se há dois
A literatura econômica do século X IX é, compradores, fala-se de “duopsônio” e, se o nú­
com raras exceções, antimonopolista. Ela con­ mero é um pouco maior mas ainda bem limitado,
dena todos os monopólios, privados e públicos. existe um “oligopsônio” . Podia-se, para conser­
A legislação, na maior parte dos países europeus, var a simetria, acrescentar ainda o “poliopsô-
e notadamente na América, segue a doutrina. M as nio”, ou seja, o mercado de vários compra­
na realidade os monopólios continuam a existir e dores (* ).
tendem mesmo a crescer em proporções sem pre­
O mercado só é verdadeiramente livre
cedentes. Grandes mercados nacionais e mesmo
quando o poliopólio e o poliopsonônio se encon­
o mercado mundial de artigos ds primeira neces­
tram, e o Estado não intervém de nenhuma for­
sidade são de fato monopolizados por empresas
ma . E nesse caso ainda se pode objetar que a
predominantes (trustes) ou por associações de
diversidade da localização dos vendedores e com­
empresas (c a rté is).
pradores, e as despesas de transportes que tal
Essas divergências manifestas levaram os
circunstância acarreta, tornam a competição im­
economistas a se ocuparem mais cuidadosamente
perfeita ( 4 ) .
do problema e darem principalmente à noção do
monopólio uma interpretação mais sutil. O mo­ Confrontando-se êsses diferentes tipos po­
nopólio puro é certamente tão raro ern nossos de-se construir, com maior ou menor aproxima­
dias como a concorrência ilimitada e absoluta­ ção da realidade, situações bem singulares, como
mente livre. Entre os dois extremes existe uma a colisão, no mercado, de um monopolizador com
gama de estados intermediários, para cuja desig­ um “monopsonizador” ( “monopólio bilateral” ) .
nação se introduziu a expressão “competição im­ Alguns economistas assemelham, muito artificial­
perfeita”, e em tôrno dessa idéia- central se ar­ mente, essa situação às disputas entre emprega­
mou viva discussão. dores e empregados, suposto que uns e outros
estejam estritamente organizados. A união
II. COM PETIÇÃO IM PERFEITA dos trabalhadores, segundo essa concepção, se­
ria o vendedor monopolista da mercadoria “tra­
Com a análise aprofundada, surgiu uma no­
balho” ; a êle se opõe o cartel dos compradores
va terminologia, que não se acha ainda bem es-
tandardizada. Cada autor tem suas próprias
nuanças, mas um sistema de noções e denomina­ ( ) O t êrmo “ m on opson y” foi criado pelo filólogo da
U iiiversidade de Cam bridge, B . L . HALTWARD, e intro­
ções vai pouco a pouco se cristalizando.
duzido na literetura por M rs . JOAN ROBINSON em sua
obra T h e E con om ics o í Im p eríect C om petition , Londres,
(3 ) A dam S m ith , W ealth o l Nations, livro I ca­ 1933, p á g . 2 1 5 .-
pítulo V II, — ca p . X I , parte I; livro III ca p . V II, (4 ) J . M . CLARK, Im p eríect C om petition T h eo ry
parte III — cap. V I I I ; livro V cap. I parte III — ca­ and B asic-P oin t P rcblem s. T h e Am erican E con om ic
R eview , ju nh o de 1943, p. 292.
pítulo II parte II art. 4 .°.
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— isto é, a associação dos empregadores. Os mais se opõem, como os princípios do bem e do


casos de monopólio bilateral são raros mas não m al. Entre o branco e o negro estende-se vasta
impossíveis pára as mercadorias verdadeiras, zona cinzenta e, quanto mais nuanças há, mais
por exemplo, entre um cartel de produtos semi- difícil se torna fixar o ponto onde começa o
manufaturados e uma união de fabricantes de inadmissível.
produtos acabados, que sejam, para êsses produ­ M esm o sob a sua forma mais agressiva, o
tos, os únicos consumidores. O resultado disso é, monopólio já não causa tanto espanto. O trus­
habitualmente, uma convenção vertical dos dois te monopolista não é mais comparado, como no
cartéis. tempo de Theodore Roosevelt, a um “octopus”,

Entrave mais freqüente do poder monopo­ polvo monstruoso que tudo agarra com seus oito
tentáculos. N a literatura sôbre a competição im­
lista existe no caso de um produtor ou cartel de
perfeita êle se apresenta como ser muito humano
produtores controlar efetivamente o mercado
de determinado produto que, sem grande incon­ no fundo, agindo de acôrdo com as mesmas refle­
xões e sujeito às mesmas reações que a teoria da
veniente para os consumidores, possa ser substi­
utilidade marginal atribui ao “homo ceconomicus” .
tuído por outro igualmente monopolizado. Nessa
ocorrência, caracterizada paradoxalmente como O monopolizador deve respeitar também a
“competição monopolista”, cada monopolizador de­ capacidade do mercado. Se êle produz em ex­
ve tomar em consideração o que faz o seu concor­ cesso o preço de monopólio baixará, seguindo a
rente potencial. N o grande domínio das maté­ lei imperiosa da utilidade marginal decrescente,
rias sintéticas, nos mercados virtualmente mono­ segundo a qual cada unidade adicional de deter­
polizados por patentes ou marcas de fábrica, minada mercadoria dá ao consumidor menos sa­
e também para produtos aparentemente mui­ tisfação que a precedente e faz, por conseguinte,

to diferentes um do outro, êsse fator representa recuar o preço. M as o monopolizador não pode,
papel de considerável importância. Por vêzes, por outro lado, restringir a seu taíante a produ­
como no duopólio e no oligopólio, a competição ção para elevar os preços. Se assim fizesse atin­
monopolista age no sentido moderador, mas, giria logo o ponto em que, apesar da alta exor­
na maioria dos casos, êle é eliminado, sem luta bitante dos preços, diminui não somente o pro­
ou depois dela,'pala constituição de um truste, duto total das vendas, mas, igualmente, o seu

por convenções formais ou por pactos tácitos para lucro. Será êle então obrigado, em seu próprio

a defesa dos preços. interesse, a manter a produção em um nível que


lhe forneça o njáximo lucro. Certamente êsse
Todos êsses esquemas, combinações e anta­
nível não é o mesmo no regime monopolista e
gonismos da economia monopolista foram minu­
no da livre-concorrência. M as os teóricos da
ciosamente estudados durante úitima década
competição imperfeita encontraram uma fórmu­
antes da guerra, sob o aspecto principal : como
la engenhosa e que se adapta aos dois regimes : o
se estabelecerão — teoricamente — os preços
lucro máximo será obtido no ponto em que a
em tais e tais condições ? A o impulso de dois
renda marginal iguala as despesas marginais,
trabalhos importantes, publicados quase simul-
isto é, quando o aumento da produção cobre
tâneamente em 1933, “The Economics of Imper-
exatamente o seu custo.
fect Competition” da economista inglesa Joan R o-
Em suma, o monopolizador está longe de
binson, e “T he Theory of Monopolistic Compe­
ser o tirano que pode explorai o consumidor
tition” do americano Edward Chamberlin, sur­
como bem lhe pareça. Ele parece antes o pri­
giu uma vasta literatura que elevou os proble­
sioneiro de seu próprio poderio. Se bem que
mas terrenos do monopólio à atmosfera pura
esta comprovação em nada altere os inconve­
da teoria transcendental.
nientes do regime monopolista, é de qualquer
Ainda que a maioria dos autores, pelo menos forma um conceito consolador.
nos países anglo-saxões, não esconda a sua pre-
I I I . RACIONALIZAÇÃO E RESTRIÇÕES
ferênéia pelo princípio da livre concorrência, a
M ONOPOLISTAS
exposição que fazem tem antes o efeito con­
trário . Graças à classificação mais diferenciada Sob outro aspecto ainda a opinião sôbre
as categorias da competição è do monopólio não , os monopólios começa a mudar. Um dos prin­
1 • . ' I

MONOPÓLIOS PRIVADOS 31

cipais argumentos da escola liberal contra os que nenhuma outra em medidas de racionaliza­
monopólios, não importa sob que forma, é que ção técnica, porque ela não pode mais reduzir
tôda supressão ou entrave da livre concorrên­ as despesas por unidade pelo aumento de suas
cia reduz, tanto qualitativa como quantitativa­ vendas, em detrimento dos competidores.
mente, a eficácia das atividades econômicas. A questão de saber se a economia monopo­
“M onopoly is a great enemy to good manage- lista, em seu conjunto, impede o abastecimento
ment”, disse Adam Sm ith. A competição esti­ mais abundante da população, é mais complexa.
mula o z ê lo ; o monopólio acarreta a preguiça Os cartéis são constituídos para regular e li­
— tal é a proposição básica. Ela é essencial­ mitar a oferta. Sua arma principal na luta para
mente técnica, sem preconceitos de ordem moral a manutenção ou para a elevação dos preços são
e social; se fôsse sempre válida constituiria, sem as restrições da produção e das vendas. E ’ fato
dúvida, um argumento dos mais fortes para negar incontestável que, sob o domínio dos monopó­
tôda razão de ser aos organismos e às tendências lios, uma parte importante da capacidade de pro­
monopolistas. dução fica inutilizada. «
A tese sempre estêve muito em voga, prin­ M as seria mais elevada a exploração da
cipalmente entre os economistas norte-america­ capacidade no regime da livre concorrência ?
nos ( 5 ) . Na maioria das vêzes, entretanto, a dis­ Em alguns casos, pode-se acreditar que sim e
cussão fica nas generalidades. Com efeito, as admitir que, sem as restrições monopolistas, uma
provas concretas não são numerosas no que con­ produção maior seria vendível a preços que dão
cerne às restrições qualitativas. Entre elas figu­
aos produtores uma base de existência. M as
ra em primeiro lugar a aquisição das patentes feita
paremos nssse ponto e, antes de tirar conclusões
na intenção de não as utilizar imediatamente para
mais gerais, olhemos o reverso da medalha.
não pôr em perigo o capital investido em um
processo menos eficiente. O inventor, bem ou A exploração da capacidade é noção rela­

mal remunerado, torna-se involuntàriamente cúm­ tiva, cuja significação real depende da própria

plice do monopólio, enquanto os consumidores capacidade; e essa, ademais, não é uma gran­

ficam privados de usar uma inovação útil. deza fixa. Durante a grande crise econômica
os “techocratas” da Columbia University preten­
Os casos dêsse gênero são talvez mais fre­
deram que se pudesse multiplicar a capacidade
qüentes do que o público julga (G )v Todavia,
de produção e essa afirmação tem sido confirma­
seria exagerado tirar daí a conclusão generalizante da, pelo menos parcialmente, pelas experiências
de que os monopólios são um obstáculo ao pro­ da guerra. Por outro lado a capacidade, em sua
gresso técnico. N ão se poderá negar que nas situação presente, já é em grande parte o resul­
indústrias em que as tendências monopolistas são tado de uma economia monopolista e não é ab­
particularmente acentuadas, como a indústria solutamente certo que fôsse tão grande sem a
química e a de eletricidade, o progresso técnico fôrça expansionista dos trustes.
foi notável. Causa e 1efeito são aqui recíprocos. A pro­
Embora as emprêsas monopolistas não se­
dução em massa, á estandardização, a organiza­
jam forçadas a oferecer aos consumidores, no
ção racional da distribuição, necessitam gran­
mais curto prazo, todo melhoramento possível
des unidades comerciais e industriais e favore­
no produto acabado, elas têm todo interesse em
cem gr&ndes unidades administrativas e finan­
aplicar as inovações técnicas que íeduzam^ suas ceiras. N ão é possível racionalização sem con­
despesas de produção. A empresa que possui um centração e esta cria condições monopolistas,
monopólio absoluto é até mais interessada do
quando não forçosamente monopólios efetivos.
Ela provoca o nascimento do oligopólio e mes­
(5 ) B ruce W . K n i g h t , “ Prices under M on op o­
ly ” , in E con om ic Principies and Problem s, trabalho ed i­
mo do duopólio, os quais, em suas repercussões
tado por W alter E . Spahr, 4.a edição, N . Y ork 1940 econômicas, não diferem de muito do monopólio
vol. I, págs. 3 9 7 -4 0 1 . — F r a n k P . G R A H A M , Social
puro.
G oals and E con om ic Institutions, Princeton, 1 1942, p. 65.
(6 ) T em p ora ry N ational E con om ic C om m ittee, O motivo da racionalização também influi
In vestigation o i C oncentration o i E con om ic P ow er ^
Final R e p o r t and R ecom m en dation . 77.° Congresso, 1. por vêzes na formação dos cartéis. Sob a livre
Sessão. Scnate D ocu m en t n.° .35, W ashington 1941, concorrência as emprêsas tendem a atingir o II-
págs. 36, 357-380.
32 REVISTA DO SERVIÇO PÚ BLICO

mite de sua capacidade, mas os preços não per­ mente metais, eram produzidas em um só local
mitem às meno(s eficazes dentre elas ampliar e e por uma única emprêsa. M as à medida que se
melhorar sua aparelhagem. Um as constroem, foi cavando a terra, mais jazidas foram apare­
mas as instalações das outras tornam-se antiqua­ cendo, e destruindo os antigos monopólios.
das e obsoletas. A capacidade total aumenta em A evolução da indústria do radium constitui
ritmo menos acentuado do que nas indústrias que a êsse respeito exemplo típico. Quando êsse me­
se acham protegidas por cartéis, salvo no caso das tal foi descoberto, a única jazida conhecida se
jovens indústrias altamente especulativas. encontrava na Boêmia e os minérios de urânio
Com as reservas exigidas por um julgamen­ que o contêm, antes considerados de nenhum
to geral sôbre as questões tecnológicas, diversas valor, alcançaram preços fabulosos. Depois de-
para cada indústria, poder-se-á então dizer que, algum tempo o monopólio foi rompido pela des­
na livre concorrência, a capacidade efetiva de coberta de radium nos Estados U n id os; mas es­
produção é mais restrita em relação às possibi­ sas jazidas logo se esgotaram. Então o Congo-
lidades técnicas, mas a exploração da capacida­ Belga tornou-se o único fornecedor de radium e
de é mais ampla do que no regime monopolista. uma companhia anglo-belga, a União Mineira
No fim de contas, a produção, no regime em do Alto-Katanga, enfeixou por longos anos ver­
que preponderam as empresas ou organizáções dadeiro monopólio mundial. Em 1930 ricas ja­
monopolistas, não é menor, sendo provàvelmente zidas foram descobertas no Canadá. Em segui­
mais. elevada, do que seria em uma compétição da a um período de duopólio os dois produtores,
sem entraves. a União Mineira e a Eldorado Gold Mines L td .,
proprietária das jazidas canadenses, formaram em
IV . BASES DO M ONOPÓLIO 1938 um cartel e dividiram o mercado mundial
na relação de 6 0 % : 40% . A guerra acarretou
Um julgamento sôbre os organismos mono­
a dissolução do cartel em 1941 (8 ) e depois o
polistas não pode basear-se unicamente no grau
preço do radium, apesar do aumento de consu­
de monopolização (monopólio puro, duopólio,
mo, baixou consideràvelmente.
oligopólio) e muito menos em suas formas de
Enquanto os monopólios mundiais de re­
organização (holding, união de interêsse, gentle-
cursos naturais se têm tornado raríssimos, os
merís agreement, e t c .) (7 ). E ’ preciso indagar
monopólios nacionais dêsse gênero são ainda
também qual a base do poder monopolista em
freqüentes. Em todos os países de industriali­
cada caso. Em geral a resposta não sèrá difícil,
zação incipiente, ocorre que uma emprêsa única
mas freqüentemente, em vsz de uma causa única,
detém efetivamente o monopólio quer de um quer
encontraremos um conjunto de fatores e circuns­
de outro produto mineral, pelo simples fato de
tâncias que permitirão a uma ertiprêsa ou a uma
não haver outras. Às vêzes as condições de tra­
associação de emprêsas o domínio do mercado.
balho ou de transporte dão à emprêsa monopolista
Dêsses fatores distinguiremos cinco principais:
posição inatacável em face da concorrência es­
1.° recursos naturais trangeira. N a maioria dos casos, dado que a pro­

2.° exclusividade técnica dução baste ao msrcado interno, o Estado a pro­

3.° condições de transporte tege com direitos de importação proibitivos.

4.° acordos monopolistas Os monopólios de ordem técnica são pre-

5.° concessões governamentais. sentémente os mais discutidos, principalmente


nos Estados Unidos. Bem éntendido que, se o
A primeira categoria, também chamada sim­ poder monopolista de determinada emprêsa de­
plesmente “monopólio natural”, representava an­ corre unicamente da superioridade na organiza­
tigamente papel importante na economia mun­ ção, da perfeição do processo de trabalho, do
dial, porque muitas matérias primas, notada- progresso extraordinário de certa técnica espe­
cial, não há razão para a intervenção do go-
(7 ) C f. os artigos d o autor sôbre “ Form as da Or­ vêrno. M as os monopólios técnicos repousam
ganização E con ôm ica ” . R ev ista do S erviço P ú blico, no­
vem b ro de 1941, págs. 47-51 ; dezem bro de 1941, pági­
nas 2 3 -3 0 . — E . A . G . R o e i n s o n , M on op ólio (tradução (8 ) Britannica B ook o f the Y ear 1943. P u blicado
espanhola de V icto r L . U rq u id ), M éxico 1942, cap. V : pela “ Encyelopaedia Britannica” . Chicago — T oron to
“ Form as de organizacion m on opólica ” . — London, 1943, pág. 58 3 .
M ONOPÓLIOS PRIVADOS 33

em grande parte em patentes, ou seja, em direi­ peito, de grande significação para a formação dos
tos de exclusividade concedidos e garantidos pe­ preços e manutenção da livre concorrência. Ela
lo Estado. Por essa razão o Estado tem o dever toca nos velhos problemas sempre atuais da ren­
de se ocupar com a maneira pela qual êsses da territorial e notadamente da renda urbana.
direitos são utilizados. O monopólio estabelecido por meio de
O comércio de licenças tornou-se meio de acordos entre particulares, industriais ou comer­
subjugar indústrias inteiras, como foi o caso da ciantes do mesmo ramo ou de ramos vizinhos, é

indústria de garrafas na América do Norte ( 9 ) . naturalmente o principal objeto da legisla­

Já nos referimos ao abuso da não utilização das ção e das medidas administrativas no domínio

patentes. Existe a questão de saber se é desejá­ monopolista. A economia de guerra, a regula­


mentação geral dos preços e o racionamento, têm
vel que as patentes se acumulem nas mãos de
parcialmente englobado os problemas econômi­
uma empresa só. E ’ um problema econômico e
cos e sociais que surgem das atividades abertas
jurídico delicado, ainda sem solução. Todavia,
ou veladas dos cartéis e organismos similares.
pode-se dizer, de maneira geral, que depois de
M as outras questões subsistem e reclamam solu­
um período de proteção extremada das patentes,
ção. A necessidade de uma legislação -especial
certa reação se manifesta no sentido de assegu­
faz-se sentir cada vez mais e quem a reclama
rar à comunidade os benefícios do gênio inven­
não são apenas os consumidores, é também a
tivo.
própria indústria. No Brasil o Conselho Federal
As condições de transporte são talvez a cau­
do Comércio Exterior instituiu recentemente
sa mais freqüente dos monopólios, decisiva prin­
uma comissão para estudar “uma legislação que
cipalmente nos países cujas vias e meios de ^
vise a proteção das indústrias existentes no país
transporte são ainda muito limitados. M as a em face da ação dos trustes ou cartéis, qualquer
questão do monopólio local — “spatial monopo- que seja a forma por que se apresentem” ( 1 1 ) .
ly” (1 0 ) na terminologia de Chamberlin — é,
Os monopólios da quinta categoria, aquêles
também nos países mais favorecidos a êsse res-
que se apoiam em concessão governamental, já
pertencem até certo ponto aos monopólios pú­
(9 ) E . P . A l d ERFER 0 H . E . M i c h l , E conom içs blicos, assunto que estudaremos em nosso pró­
o t A m erican Industry, N . Y ork London 1942, pági­
ximo artigo. .
nas 2 1 1-215.
(1 0 ) E d w a r d C h a m b e r l i n , T h e T h eory o l M o-
n opolistic C om petition, 3.® edição, Cam bridge ( M a s s .) ,
1939, p. 62 . (1 1 ) B oletim do C . F . C . E . , m arço de 1944, p. 11.

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