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Resumo: O presente ensaio visa analisar as relações da pirataria nos séculos XVI e XVII com
a acumulação de capital primitivo que resultaria posteriormente na ascensão do sistema
capitalista. Nele será feita uma análise bibliográfica do tema, de forma a pavimentar a discussão
acerca deste movimento de múltiplas facetas que foi a pirataria, dando suporte teórico para esta
reflexão. Visa-se aqui, relacionar as motivações socioeconômicas que motivaram as
explorações marítimas, e consequente a pirataria, com a teoria inicialmente proposta por Marx
e posteriormente ampliada por inúmeros teóricos.
Palavras-chave: Pirataria, idade moderna, acumulação primitiva de capital.
INTRODUÇÃO
A pirataria é um ato de violência ilegal, para fins pessoais, que acontece em alto mar,
pela tripulação e um navio privado contra alguma outra embarcação, pessoas ou bens em um
local que não esteja submetido à jurisdição de qualquer Estado (ALENCAR, 2018). Este
conceito define o ato da pirataria de acordo com a legislação contemporânea do século XX/XXI,
porém na história a pirataria é um movimento muito antigo que remonta desde a Grécia
helenística como aponta Lewis (2019). Mas este movimento socioeconômico complexo da
pirataria, estando presente na história da humanidade em diversos contextos e momentos
históricos, na Grécia como antes mencionado, na Idade Média com as incursões escandinavas,
na Era de Ouro da pirataria, e inclusive na atualidade com um grande foco na costa da Somália,
este ato de piratear se modificou conforme o contexto histórico e a sociedade específica inserida
nesse contexto.
No século XVII houve um grande movimento marítimo, que causou uma mudança
radical na forma de se fazer comércio via marítima, e foi responsável por volatizar fortemente
as estruturas de poder na Europa e nas Américas, este movimento foi conhecido como a Era de
Ouro da Pirataria. Totalmente apoiada nas relações colonizais estabelecidas, até este recorte do
século XVII, a pirataria moderna teve grande impacto econômico nas costas das colônias
americanas, africanas e até mesmo orientais, e também, na política europeia.
CORSÁRIOS E PIRATAS
Já os corsários, eram basicamente piratas que recebiam uma carta de corso de seus
soberanos, tendo liberdade de assolar os inimigos do Estado, pilhando e aprisionando em nome
de sua coroa, como Hobsbawn descreve, “piratas oficiais” (HOBSBAWN, 1969, p. 84).
Corsários por muitas vezes estavam presentes dentro das marinhas reais (PELÚCIA, 2010), e
constituíam em grande parte a parcela da burguesia regional.
Dado as características de ambas as categoriais de bandoleiros, o “oficial” e o “não
oficial”, pode-se colocar em debate a questão da participação de cada um na acumulação de
capital. O pirata por ser um agente autônomo, pilhando para se sustentar e acumular riqueza,
poderia ser colocado num ponto de vista da acumulação primitiva, em contraparte ao Estado,
que neste ponto já utilizava das leis ao seu favor para cultivar a acumulação de capital, o pirata
por estar fora da alçada do Estado e nenhum seguir nenhuma lei, estaria então contribuindo
apenas com sua própria ascensão econômica, e inclusive muitos, conseguiram ascender à um
grau de burguesia, ao passo que muitos morreram em desonra e pobres por se colocarem demais
em risco na situação do ato de piratear.
Enquanto o pirata muitas vezes se opunha a legislação estatal controladora dos meios
de produção, das rotas comerciais e do acúmulo de capital emergente, o corsário surgiu como
resposta política ao banditismo marítimo posto pela pirataria. A contratação de piratas para
usufruto governamental e como agentes do caos sem culpabilidade direta ao Estado, era a
ferramenta perfeita para o controle dos mares, para a asseguração da injeção de capital
constante, e para o combate ao banditismo gerado pelas próprias políticas estatais. A pirataria
dificultava a acumulação de capital por base da burguesia, visto que o capital adivinha do
comércio marítimo fortemente atacado pelos piratas, as políticas estatais de controle dos mares,
que favoreciam o comércio da burguesia, eram burladas pelos bandoleiros dos mares, e em
contraparte, os corsários, ainda que também trabalhassem em vista de uma ascensão social,
deviam tributos aos seu soberanos estipulados em sua carta de corso (NETO, 2009), tributos
que totalizavam 1/5 da presa como afirma Duarte (2019), e isto contribuía ainda que de alguma
forma com o mantenimento da estrutura de poder que favorecia a acumulação de capital, porém
ainda se tratavam de piratas, mesmo com a carta de corso, seus atos eram políticos, muitas vezes
a cobrança desse tributo era dificultada ou inviabilizada pelos corsários. Como defende Neto:
Neste ínterim, podemos perceber que a pirataria, ainda que fizesse circular mercadorias,
bens, e riquezas, nas colônias, e na metrópole, era um movimento de foras da lei, muito
semelhante, ainda que com ressalvas, aos Negros da Inglaterra analisados por Thompson
(1987), em seu livro Senhores e Caçadores, a Origem da Lei Negra onde a perseguição aos
considerados bandoleiros, neste caso os negros das florestas inglesas, se acentuou com auxílio
do favorecimento legal à burguesia e aos detentores de terras. Portanto, era um movimento a
ser combatido, ainda que fosse completamente político.
É claro que uma economia não pode basear-se durante muito tempo no simples e puro
saque. Mas tampouco devemos crer que se tratou de um breve episódio. Os
holandeses, que difundiram uma versão bastante negra das crueldades espanholas na
América, não foram menos cruéis nas ilhas do Extremo Oriente, as quais ocuparam
no século XVII, nem os ingleses na Índia (século XVIII). Além do que, desde o tempo
de Elizabeth, uma das grandes fontes de enriquecimento da corte real inglesa fora a
pirataria, a pilhagem direta dos carregamentos espanhóis. A esta economia de
pilhagem, a colonização a seguir acrescenta uma exploração contínua e sistemática.
(VILLAR, 1971, p.43)
Para trazer à tona sua presença no espaço marítimo ou sua relação com o mar por
meios diversos, seja através de relações estabelecidas com homens do mar, seja
através do trabalho ou de outros elementos, buscamos desenvolver um trabalho
estruturado em dois capítulos. No primeiro destes, realizou-se a exposição de um
panorama acerca dos diversos meios através dos quais as mulheres puderam se
relacionar com o mar, estando ou não fisicamente presentes nesse espaço,
considerando questões diversas como a feitiçaria, a criminalidade, o degredo, os
ofícios femininos, a pirataria, o travestismo, as excursões naturalistas, as viagens
realizadas na companhia de familiares, a orfandade, dentre muitas outras situações
entre os séculos XVI e XIX. A intenção foi indicar a imensa quantidade de cenários
em que as mulheres estabeleceram contato com o espaço marítimo, sendo cada um
desses temas um espaço aberto a investigações, podendo-se tratar de mulheres e do
mar em locais e períodos bastante abrangentes, incluindo-se os continentes
americanos, asiático, europeu e africano e as conexões desses espaços entre si.
(FERREIRA, 2022, p.127/128)
Todas as questões, expostas por Ferreira (2022) em seus objetivos de análise, são
mostradas presentes nos meios marítimos, comprovando portanto, a presença feminina ativa
nesses processos tão relevantes para a acumulação primitiva de capital.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFRÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALENCAR, Andressa S. A pirataria marítima e as suas consequências nos contratos de
seguros marítimos. Monografia (Graduação em Direito) – Unidade de Ensino Superior Dom
Bosco. São Luís, p.66, 2018.
FEDERICI, Silvia. Calibã e a Bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva. São Paulo:
Elefante, 2017.