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UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS – UFLA DEPARTAMENTO DE


ESTUDOS DA LINGUAGEM – DEL CURSO: ESPECIALIZAÇÃO – ENSINO DE
LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA DISCIPLINA: LITERATURAS
CONTEMPORÂNEAS DE LÍNGUA PORTUGUESA: OPERADORES DE
LEITURA ROTEIRO DE ESTUDOS AUTÔNOMOS PROF. DENIS LEANDRO
FRANCISCO
DISCENTE: CARMINA LEMOS DE OLIVEIRA

ORIENTAÇÕES

1. Releia os textos teórico-críticos indicados para leitura nas semanas 2, 4 e


6.

2. Assista à aula gravada e já disponibilizada;

3. Após realizar a releitura dos textos indicados e assistir à aulas gravada,


faça a Atividade 1 e a Atividade 2.

ATIVIDADE 1: verificação de leitura

Responda, por escrito, às questões 1 a 5 a seguir.

QUESTÃO 1: De acordo com Boaventura de Sousa Santos, qual a


especificidade do processo de colonização português no Brasil em
relação à colonização hegemônica inglesa?

De acordo com Boaventura, a especificidade no processo de


colonização português no Brasil é que em relação à colonização hegemônica
inglesa é que Portugal sendo o país colonizador do Brasil, . Se a
especificidade é a afirmação de um desvio em relação a uma norma geral,
nesse caso a norma é dada pelo colonialismo britânico: é em relação a ele
que se define o perfil — subalterno — do colonialismo português. Tal
subalternidade é dupla, porque se manifesta tanto no domínio das práticas
como no dos discursos coloniais. No domínio das práticas, a subalternidade
está no fato de que Portugal, como país semiperiférico, foi ele próprio, durante
longo período, um país dependente — em certos momentos quase uma
"colônia informal" — da Inglaterra.
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QUESTÃO 2: De acordo com Silviano Santiago, por que a literatura


brasileira pode ser caraterizada como uma “literatura anfíbia”?

Para Santiago, a forma literária anfíbia requer a lucidez do criador e


também a do leitor, ambos impregnados pela condição precária de cidadãos
numa nação dominada pela injustiça. Para o autor, uma literatura anfíbia diz
respeito a mesclagem entre arte e política nos textos dos escritores do século
XX.

QUESTÃO 3: Defina literatura colonial. Dê 2 exemplos de obras literárias


coloniais escritas língua portuguesa (exemplos diferentes dos textos
indicados na disciplina).

Podemos definir literatura colonial como aquela que surgiu nos


primórdios do descobrimento do Brasil, caracterizada por uma literatura
romance, poesia, narrativas de viagem, relatos de missionários, diários, livros
de notas e outros que propagandearam a ideia de império sobretudo a partir
do século XIX. No Brasil, podemos citar como exemplo de literatura colonial a
carta de Pero Vaz de Caminha, uma literatura informativa do colonizado, o
Diário de Navegação de Pero Lopes de Souza. O Diário traz o registro da
expedição de Martim Afonso de Souza, relatando a viagem de Portugal ao
Brasil. Nesse Diário, Pero Lopes de Souza faz referência à história de
Pernambuco, às lutas com contrabandistas franceses de pau-brasil, à
presença de um português na Bahia e outro em Cananéia e à fundação de
São Vicente por Martim Afonso de Sousa, em 1532.

QUESTÃO 4: Defina literatura pós-colonial. Dê 2 exemplos de obras


literárias pós- coloniais escritas em língua portuguesa (exemplos
diferentes dos textos indicados na disciplina).

A literatura pós-colonial considera-se, em geral, que tem início após a


II Guerra Mundial sendo definida por Elleke Boehmer como “a literature which
identified itself with the broad movement of resistence to, and transformation
of, colonial societies.” (Colonial & Postcolonial Literature. Migrant Metaphors,
Oxford University Press, 1995, p. 184). Entre as duas barreiras temporais
citadas encontra-se todo um conjunto de textos que registam diferentes
atitudes face ao império e que não poderão enquadrar-se numa designação
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única, já que, segundo a mesma autora, “initiatives which we now call


postcolonial first began to emerge before,the time of formal independence, and
therefore formed part of colonial literature” (Op.cit., p.5). Na verdade, já em
Conrad e Forster se registam atitudes de resistência ao poder colonial, as
quais iriam também encontrar expressão nos anos 20 e 30 nas obras de
autores como Léopold Sédar Senghor (Senegal), Aimé Cesaire (Martinica) ou
Bernard Binlin Dadié (Costa do Marfim). Vivendo em Paris, estes escritores
tornaram positiva a imagem de “negritude”, anteriormente identificada como
negativa e inferior pelo colonizador, passando a celebrá-la
enquanto símbolo do institivo e misterioso da África negra. As produções
literárias pós-coloniais reflectem os medos e as ansiedades da época,
sentimentos esses provenientes dos colonizadores em relação a uma possível
alienação dos elementos da civilização britânica ao entrarem em contacto com
os povos colonizados durante demasiado tempo. Como revelação do
imaginário no romance, destaca-se “viagem e aventura, descoberta e
exotismo” como “parte do imaginário de todos nós” (PINTO COELHO 2004: 8)

QUESTÃO 5: Defina estudos pós-coloniais.

Entende-se por estudos Pós-Coloniais temáticas sobre


descolonizações imperiais (BRANTLINGER 2009: 55) através de documentos
escritos, nomeadamente romances sobre um imaginário escuro e sombrio,
onde, sumariamente, se incentivavam as forças imperiais, de modo
subliminar, a abandonarem as colónias. Esses documentos eram produzidos
por escritores do país imperialista, que levavam vidas boémias, e a favor dos
países colonizados, integrando-se nos movimentos nacionalistas desses
mesmos países dos finais do século XIX e do início do século XX.

Segundo Boaventura, o pós-colonialismo deve ser entendido em duas


acepções principais. A primeira é a de um período histórico, aquele que se
sucede à independência das colônias, e a segunda é a de um conjunto de
práticas e discursos que desconstroem a narrativa colonial escrita pelo
colonizador e procuram substituí-la por narrativas escritas do ponto de vista do
colonizado
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ATIVIDADE 2: elaboração de um texto de leitura literária especializada

1. Leia o conto “A menina que carregava bocadinhos”, do autor


português Valter Hugo Mãe (disponibilizado juntamente com esse
Roteiro de estudos autônomos);

2. Elabore um texto crítico que apresente uma leitura especializada


desse conto. Seu texto crítico deve:

a) estabelecer um diálogo com os textos teórico-críticos lidos nas


semanas 2, 4 e 6 e com a aula assistida;

b) ter como público-alvo leitores especializados em literatura;

c) ter entre 3 e 5 páginas de texto efetivamente produzido por você (ou


seja: desconsiderando-se as referências bibliográficas ).

d) seguir a norma padrão escrita da língua portuguesa e a normatização


da ABNT.

A MENINA QUE CARREGAVA BOCADINHOS (Valter Hugo Mãe)

O conto A Menina que Carregava Bocadinhos narra a história de uma


garotinha que vive à margem da sociedade da época, a pequena e frágil
menina encontra abrigo na casa de uns senhores, que lhe dão abrigo e comida
em troca da mão de obra da pequena, nesse gesto dos patrões, ela ver a
possibilidade de comer e engordar um pouquinho, talvez assim fique até mais
corada.

A menina entrou na casa grande com nove anos para trabalhar em


troca de sopa e de um colchão estreito. Estava muito salva, diziam-lhe
ajuizadamente todas as pessoas. Se não a tomassem como criada teria
apenas a miséria

No trecho acima podemos constatar uma relação de trabalho análoga à


escravidão e exploração do trabalho infantil, pelo contexto e pelas relações que
são evocadas ao ler o texto, podemos constatar que a história se passa em
uma época em que não existiam leis específicas que tratassem das leis
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trabalhistas e da proteção das crianças em relação ao trabalho infantil.


“Naqueles tempos, a pobreza não se curava senão com a piedade de quem
podia, e ela acedeu ao seu destino assim pequena [...]”. Contudo, apesar do
conto ser ambientado no contexto de uma sociedade extremamente patriarcal e
preconceituosa, em que não existiam proteção ao menor e leis trabalhistas,
podemos afirmar que são temas bem contemporâneos, que ainda se fazem
presentes na atualidade.
No início, ela se ver sozinha naquela casa, uma de suas tarefas era
alimentar e cuidar dos cães que eram os guardiães da casa, à primeira vista,
os cães não gostam da menina, mas com o passar do tempo, passaram a ser
amigos fiéis da menina.
Nos primeiros dias, os cães odiaram a menina. Depois, aprenderam a
amá-la no modo invariavelmente irritado que tinham de existir. Com o
tempo, ela haveria de se sentir uma esquisita irmã dos cães, como eles
aprisionada e grata, aprisionada e fiel, o que era diferente de ser feliz
ou, sequer, entender a felicidade

No fragmento podemos observar que com o passar do tempo, a


menina sofre um processo de animalização, visto que a partir da convivência
com os cães ela passa a se comportar igual a eles, ou seja, a menina se torna
também uma cadelinha fiel aos seus senhores, sempre pronta para obedecer
as suas ordens. “A menina cuidava de não se magoar. Escutava as ordens,
aligeirava-se, dizia sempre que sim, e trabalhava sem muitas conversas.”
A menina vivia na casa como um utensilio, e como tal, não podia ser
notado, então ela fazia o possível para que sua presença não fosse motivo de
incômodo para os seus senhores, assim, ela apagava a si mesma, nada de
enfeite, nenhum água de colônia, nada que pudesse conflitar com o ambiente.

Entendia que, para fazer parte daquela vida requintada, teria


também de arranjar-se num enfeite bastante, para não
descombinar com as mobílias ou com as passadeiras
aprumadas. Importava que estivesse branca, lavada, para ser
uma presença sem susto e sem cheiros na delicadeza que era
a vida rica dos seus nobres senhores.

Assim, ela foi se esquecendo de quem ela era, “lentamente, aprendeu


a esquecer-se da sua própria família, para não lhe sentir a falta, para não
carregar incompletudes”. Esquecer era uma forma gratidão pelo que tinha
recebido, mas também era uma forma de não perder tempo, afinal ela tinha
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que dá conta de suas obrigações enquanto empregada, tinha que cuidar para
que tudo fosse perfeito diante da vida requintada dos moradores daquela casa,
por isso, evitava tudo que pudesse tirar o seu tempo com os afazeres da casa.
No entanto, um acontecimento faz com que a criada que até então não
sonhava, que vivia para servir os seus senhores com toda dedicação,
esquecendo até de si mesma, “a menina recebeu da patroa um grande lenço
de pescoço incrivelmente sedoso e brilhante que se rasgara numa das pontas.
A menina ficou fascinada com a beleza do tecido, o lenço trouxe uma nova
perspectiva para a moça, que foi tomada por uma espécie de felicidade toda
vez que contemplava a beleza do tecido que guardara em sua gaveta.
Tempos depois, a menina aprendeu a costurar com uma das criadas
da casa, com isso, passou a costurar com uma perfeição extrema, costurava,
fazia laços e remendava como ninguém, “aproveitava as tiras que restavam
para guardanapos, inventava laços para adornar os cantos.” Um certo dia, a
menina resolveu ir à missa, então vestiu sua linda blusa, que havia feito com o
tecido do lenço doado por sua patroa, a roupa ficou deslumbrante o que
chamou a atenção de todos.
As pessoas espantavam-se, porque as criadas não acediam a
um tal requinte. E tanto se espantaram que a patroa veio saber
o que se passava, como se houvesse culpa em alguém se
mudar para bonito. A moça transformara o velho lenço
rasgado. Como quem costura charcos de água, ela criou uma
obra perfeita e, ainda que a saia preta sob o avental de serviço
a mantivesse a trabalho, quem a encarava julgava ver uma
moça com a possibilidade de ser feliz. A patroa,

Ao ver a criada vestida daquele jeito, a patroa ficou furiosa e ordenou


que a moça entrasse imediatamente para dentro de casa, onde já se viu,
empregada vestir-se de tal forma, era como se quisesse enganar a sociedade,
que poderia confundi-la com uma moça rica, a patroa ordenou que tirasse a
roupa imediatamente, e mais uma vez a subalterna sucumbira ao seu ofício,
sem sonhos, sem vida.
Assim se despiu daquela coisa de água e a devolveu à
escuridão da gaveta igual a um peixe vazio, sem ar. Coube,
depois, novamente na sua camisa de hábito. Ponderou
regressar à rua para atender ainda à missa, mas desistiu

E assim, mais uma vez a menina que ousou a sonhar e ser feliz se
resignara com o seu destino, trabalhar e obedecer aos seus senhores, após
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esse acontecimento, a dona da casa ordenou que ela passasse a carregar


bocadinhos de terra, “a criada então fazia. Escadas acima e abaixo, com dois
baldes de terra limpa que escolhia ao lado das hortas, obedecia já sem
tristezas, apenas a força de sempre.”
Os anos se passaram, e a doméstica continuava ali, costurando e
trabalhando, tratou de apagar qualquer coisa que lembrasse aquele dia em que
ela atreveu-se ser bonita como as moças ricas da época. Contudo, quando
estava próximo de completar seus dezoito anos, um rapaz que fazia entrega na
casa grande começou a se interessar pela moça, e novamente o seu coração
se encheu de esperança, talvez ela visse naquele rapaz a possibilidade de
encontrar a felicidade que fora reprimida diante daquele acontecimento acerca
da blusa que vestira, e com isso, sonhara com uma vida diferente daquela em
vivia na casa de seus patrões, talvez pudesse construir uma família ao lado da
pessoa amada, ter um mínimo de dignidade fora daquele ambiente opressor,
talvez aquele junto ao rapaz, ela pudesse transgredir o seu destino cruel, de
servir, ou seja, uma criada que deveria sempre zelar para que sua presença
não se sobressaísse a elegância e a perfeição daquele esplêndido contexto de
riqueza, então, ela voltou a sonhar.
Todavia, a senhora da casa ao perceber o que estava acontecendo,
tratou logo de destruí qualquer vestígio do rapaz na casa, “a senhora,
proprietária e desagradada, ordenou que o rapaz não voltasse àquela casa.”
Assim, a menina viu novamente os seus sonhos serem estilhaçados, e assim,
mais uma vez se conformou e aceitou o seu destino, achou muito justo o que a
sua patroa fez. No entanto, ela estava desolada por dentro, sofria, chorava e
pensava, o pouco que conheceu do amor a transformou, assim como os cães
aprisionados na casa, ela também era prisioneira como um animal, mas como
um animal, ela sentiu desejo de se libertar, então, em um dia de domingo ela
vestiu novamente a sua linda blusa, soltou os cães da casa e partiu rumo a
liberdade.

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