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LITERATURAS AFRICANAS ANGLÓFONA S

1. As origens e principais características da literatura pós -


moderna e dos estudos de língua inglesa nos países
colonizados.
Para se apresentar a história e principais características da
literatura pós -colonial e os estudos da língua inglesa nos
países colonizados, usaremos nessa aula, principalmente, a
obra The Empire Writes Back: Theory and Practice in Post -
Colonial Literatures , de Bill Ashcroft, Gareth Griffiths e Helen
Tiffin, de 1989, reimpressa em 2002.
“British colonial administrators, provoked by missionaries on
the one hand and fears of native insubordination on the
other, discovered an ally in English literature to support them
in maintaining control of the natives under the guise of a
liberal education.”
(Viswanathan, p. 17, 1987 apud Ashcroft et al., 2002)
Esse trecho mostra que a literatura servia como uma arma
para os colonizadores, uma ferramenta para questões
utilitárias primeiramente, mas quase que inconscientemente
servia também para naturalizar a constru ção de certos
valores, como a civilidade, a humanidade, etc. Porém,
diferente do esperado, essa literatura se rebelou, afirmando -
se como uma antítese à literatura tradicional europeia, sendo
objeto de uma força transformadora nesses novos países,
agora independentes.
Se, a princípio, a literatura se tornou central para a
subordinação cultural engendrada pelos impérios europeus,
ainda assim, quando novos elementos das colônias
ameaçaram a exclusividade reivindicada pela literatura da
metrópole eles foram ra pidamente incorporados, ao invés de
repelidos, o que acabou levando a muitos autores nativos a
escreverem obras “pra inglês ver”, como diz o ditado. Essa foi
uma estratégia usada pelos colonizadores para amortecer os
efeitos da literatura subversiva que su rgia de vez em quando
nas colônias. Uma das principais características da opressão
imperial se deu pelo controle sobre a língua. O sistema
educacional imperial instaurou uma versão “padrão” da
língua da metrópole com norma, e marginalizou todas as
outras “variantes” como impuras.
Quando as sociedades pós -coloniais conseguiram instaurar
sua diferença aos britânicos, a resposta daqueles que viam
uma cumplicidade na incorporação da linguagem, da
educação, e da cultura foi a de quebrar a relação entre
linguagem e literatura, dividindo os departamentos
universitários de língua inglesa em diferentes escolas:
linguística e literatura.
Na maioria das nações pós -coloniais, os elos de poder entre a
literatura e linguagem nativa, e a cultura britânica dominante
resistiram fortemente às tentativas de desmontá -los. Mesmo
depois dessas tentativas começaram a ter sucesso, a natureza
canônica e o status incontestável das obras de literatura
inglesa tradicional e os valores que eles incorporaram
permaneceram potentes na f ormação cultural e na ideologia
institucionais de educação e literatura. Neste contexto, o
desenvolvimento das literaturas pós -coloniais necessitava
questionar muitos das concepções nas quais o estudo da
língua inglesa era baseado. (Ashcroft et al., 1987)
A cultura europeia tinha como objetivo imperial se
estabelecer no continente africano de forma homogênea a
fim de reafirmar sua superioridade frente ao universo
cultural tão diverso e complexo da África. Em oposição a isso,
a literatura e cultura nativas d o período colonial e
independente viram na sua marginalidade uma fonte sem
precedentes de energia criativa.
2. Estratégias textuais na escrita pós -colonial.
2.1. Revogação e apropriação.
Dois processos se destacam como instrumentos da vontade
de se diferenciar da literatura tradicional, em prol de uma
literatura voltada a cultura nativa dos países colonizados. Um
deles é o processo chamado de revogação, o qual ocorre pela
rejeição do poder da metrópole sobre os meios de
comunicação. Outro é a apropriação e reconstituição da
língua da metrópole no processo de captura e remodelagem
da língua através de novos usos.
A revogação é a recusa das categorias da cultura imperial,
como a estética, o padrão formal. Porém apenas a revogação
não é capaz de manter o contra -ataque à tradição imperial,
para tanto necessita -se do processo de apropriação, pois
aquela apresenta apenas uma vontade de recusa, e não cria
algo novo.
Assim, a apropriação é o processo pelo qual a língua tem que
retratar aquilo que não é original do s eu “espírito”. Ou seja,
a nova produção feita pela literatura pós -moderna vive em
uma relação entre dois “mundos”, aquele tradicional
imperialista, e o novo a ser descoberto pelos autores nativos,
que devem se apropriar da língua imperial, como o inglês, e
usá-la para retratar a realidade da África, porém usando -se
de uma língua que não é original deste continente.
Ocorreu, então, que a literatura pós -colonial se desenvolveu
nesta contradição entre a revogação da literatura inglesa e a
afirmação da cultura nativa, pois precisava da primeira para
poder explorar e divulgar a segunda. Ainda nos primeiros
tempos da literatura pós -colonial, muitos autores foram
forçados a procurar autenticidade que lhes parecia escapar,
pois o conceito de autenticidade em si era endossado pela
metrópole à qual eles não mais pertenciam, além da
contradição que ocorria na experiência diária de
marginalização. (Ashcroft et al., p. 40, 2002)
2.2. Alusão e diferença.
A alusão é uma figura retórica em uso na literatura pós -
moderna que confere uma distância cultural em relação à
literatura tradicional ocidental. Ela ocorre na medida em que
o texto está inserido em algum contexto propício para a
alusão. Neste processo a “ cultura descrita” é, na maioria das
vezes, um produto de um encontro particular etnográfico,
assim o texto de alusão cria uma realidade baseada naquele a
que alude, ao se debruçar em sua descrição.
A diferença se dá no choque de culturas, línguas, formas d e
comunicação diferentes entre a literatura pós -colonial dos
países colonizados e a literatura tradicional da metrópole.
Essa diferença se dá principalmente na língua dessas
culturas. O texto literário se produz a partir da língua de
quem o escreve, sendo um discurso e uma forma de
comunicação comum àquela tradicional, porém, a experiência
mental de cada autor não se dá nesse meio comum entre as
duas culturas.
A variância da linguagem, é, portanto, uma característica de
todos os textos pós -coloniais. A "função" do escritor atende a
função do leitor na própria escrita que habita na interseção
de uma vasta gama de condições culturais. Essa escrita não
representa cultura nem oferece uma visão de mundo mais
ampla por si só, mas define o cenário de uma construção de
significado. As estratégias que essa escrita emprega para
manter a distância e a diversidade enquanto apropria a
linguagem é, portanto, uma constante demonstração das
possibilidades dinâmicas disponíveis para escrever dentro da
tensão do "centro" e da "margem". (Ashcroft, 1987, p. 58).
2.3. Interlinguagem
É comum na literatura pós -colonial situações em que palavras
específicas da língua nativa de determinada etnia são
“intraduzíveis” e são mantidas na suas formas originais nas
obras em língua inglesa. Este uso de palavras não -traduzidas
pode ser considerado como sinal de que essa relação entre as
línguas parece ser um caminho bem sucedido para realçar
distinções culturais, portanto, parece ainda mais rentável
tentar gerar uma "intercultura" pela fusão d as estruturas
linguísticas das duas línguas.
Como exemplo, temos um trecho do primeiro romance de
Amos Tutuola, de 1952, no qual o autor tenta misturar as
duas línguas, mantendo uma palavra na sua escrita original:
“I was a palm-wine drinkard since I was a boy of ten years of
age. I had no other work more than to drink palm -wine in my
life. In those days re -placing language we did not know other
money except cowries, so that everything was very cheap,
and my father was the richest man in town.’’ (Tutuola, 1 952,
p. 7, apud Ashcroft et al., 1987, p. 65 -66).
Este livro foi lido pelos críticos ingleses como um delicioso
exercício em neologismos, porém, acabou sendo rejeitado por
muitos africanos que o criticaram, alegando que as formas da
língua usada por Tut uola eram simplesmente um plágio mal
feito de contos orais tradicionais, embora, de fato, a relação
entre Tutuola e a escrita tradicional e moderna Yoruba era
mais complexa do que esta acusação sugeria (Afolayan, 1971,
apud Ashcroft, 1987, p. 66).
Importante como toda a controvérsia sobre, o trabalho de
Tutuola tem estado na articulação de diferentes posições
críticas na África. Visto em um contexto mais amplo, o
trabalho pode sugerir questões totalmente diferentes.
Fonte: Wikimedia Commons
3. O ato de escrever
A apropriação da língua inglesa é a primeira de uma gama de
apropriações que estabelecem um discurso anunciando sua
diferença da Europa. Estes incluem a adaptação ou evolução
das práticas metropolitanas: por exemplo, gêneros como "a
balada" ou "a novela" ou mesmo epistemologias, sistemas
ideológicos ou instituições como teoria literária. Mas a
apropriação que teve o significado mais profundo no discurso
pós-colonial é a de se escrever. É através de uma apropriação
do poder investido por escrito que este discurso pode
assumir a marginalidade que lhe é imposta e tornar a hibridez
e a sinceridade a fonte de recursos literários e culturais
redefinidos. Ao escrever fora da condição dos textos pós-
coloniais de "Otherness", afirmam o complexo de "periferias"
que se cruzam como a substância real da experiência. Mas a
luta que esta afirmação implica - a “realocação" do texto pós -
colonial - é focado em sua tentativa de controlar os
processos de escr ita. (Ashcroft et al., 1987, p. 77)
Referências
ABIOLA, Irele F. The Cambridge Companion to the African
Novel. London: Cambridge Companions to Literature, 2009.
ASHCROFT, Bill; GRIFFITHS Gareth; TIFFIN, Helen. The Empire
Writes Back: T heory and Practice in Post -Colonial Literatures .
London: New Accents, 2002.

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