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BIOFÍSICA E

FISIOLOGIA

Camilla Lazzaretti
Sistema nervoso
central: encéfalo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Identificar as subdivisões do sistema nervoso.


„„ Descrever a visão geral do sistema nervoso central.
„„ Listar as principais estruturas que compreendem o encéfalo e suas
funções.

Introdução
O sistema nervoso comanda e integra todas as funções do organismo
para atingir a homeostase: o comportamento alimentar, a temperatura
corporal, os movimentos, a respiração, entre outras milhares de funções.
Basicamente, essas funções são geridas e executadas por duas subdivisões:
o sistema nervoso central (SNC) e o sistema nervoso periférico (SNP).
Nossos receptores periféricos recolhem informações externas, que são
levadas ao SNC por nervos, que atuam como cabos, realizando conexões.
No SNC, a informação é processada na medula espinal ou no encéfalo,
para que respostas adequadas sejam geradas para cada contexto em
que o indivíduo esteja inserido.
Neste capítulo, você vai estudar as partes do sistema nervoso, suas
estruturas e funções principais, além das peculiaridades importantes do
SNC, o grande maestro dessa orquestra que é o corpo humano.
2 Sistema nervoso central: encéfalo

Subdivisões do sistema nervoso


O sistema nervoso é subdividido em sistema nervoso central (SNC) e sistema
nervoso periférico (SNP). Basicamente, o SNC é constituído pelo encéfalo
e pela medula espinal. O encéfalo está contido dentro da caixa craniana e
possui inúmeras camadas, que circundam cavidades preenchidas por líquido
cerebrospinal. A medula está inserida no canal vertebral, ao longo da coluna.
Já o SNP é constituído pelos nervos e receptores sensoriais. Visualize essas
estruturas na Figura 1.

Figura 1. Sistema nervoso central e periférico.


Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 362).
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As células existentes no SNC e no SNP são os neurônios e as células da glia.


Os neurônios são células excitáveis, que recebem, processam e geram respostas
às informações a que estamos expostos. Histologicamente, os neurônios são
formados de partes específicas, como as que vemos a seguir.

„„ Corpo ou soma: parte que contém o núcleo celular, o citoplasma e o


citoesqueleto, com as principais organelas (retículo endoplasmático,
complexo de Golgi, mitocôndrias, entre outras).
„„ Axônio: é um prolongamento celular que realiza o transporte do po-
tencial de ação. Está rodeado ou não de bainha de mielina (formada de
camadas de fosfolipídeos de membrana, útil para o isolamento elétrico).
„„ Dendritos: ramificações que fazem a comunicação entre neurônios,
as sinapses.
„„ Terminal axonal: segmento final do neurônio que possui vesículas
sinápticas com neurotransmissores, para liberação na fenda sináptica.

Funcionalmente, podemos classificar os neurônios como (VANPUTTE;


REGAN; RUSSO, 2016; SILVERTHORN, 2017; MARIEB; HOEHN, 2008):

„„ Sensoriais. São aferentes, ou seja, conduzem informações sensoriais


ao SNC. Essa informação é adquirida na periferia e pode ser de tipos
diferentes (táteis, de temperatura, de dor, entre outras) e podem ser
mielinizados ou não.
„„ Interneurônios. Possuem vasta ramificação e fazem a comunicação
entre neurônios.
„„ Motores. São eferentes, isto é, conduzem informações motoras do SNC
para os músculos. Podem inervar órgãos viscerais por meio do sistema
nervoso autônomo (SNA), ou a musculatura esquelética, por meio do
sistema nervoso somático (SNS), e são altamente mielinizados.

Outra importante classificação dos neurônios se dá de acordo com sua


morfologia, podendo ser denominados conforme os fatores descritos a seguir.

„„ Unipolares, quando possuem apenas um prolongamento celular, o


axônio.
„„ Bipolares, quando possuem dois prolongamentos a partir do corpo
celular (os dois primeiros são comumente sensoriais).
„„ Anaxônicos, nos quais não se observa a presença de axônio aparente
(encontrados em interneurônios).
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„„ Multipolares, com inúmeras ramificações dendríticas e terminais


axonais mais largos, observados em neurônios eferentes.

Na Figura 2 você pode ver a anatomia dos neurônios, suas classificações


funcionais, estruturais e partes.

Figura 2. Anatomia dos neurônios e suas classificações funcionais, estruturais e partes.


Fonte: Silverthorn (2017, p. 230).
Sistema nervoso central: encéfalo 5

Já as células da glia realizam funções de suporte neuronal, proporcionando


isolamento elétrico e suporte energético. Também estão presentes em barreiras
protetoras. Sem a glia, os neurônios teriam sua sobrevivência prejudicada ou
nula, pois a proporção dessas células é em torno de 50 para cada neurônio.
A glia, no SNC, possui diferentes tipos de celulares, conforme vemos a seguir.

„„ Oligodendrócitos: contidos nas bainhas de mielina axonais.


„„ Microglia: representa as células imunológicas no sistema nervoso.
„„ Células ependimárias: localizadas nas zonas ventriculares, realizando
barreiras, e fornecem células tronco.
„„ Astrócitos: importantes atores no cenário neuronal. Participam do su-
porte energético neuronal captando íons, água, glicose, e regulam ações
neuroquímicas nas fendas sinápticas, recaptando neurotransmissores.

Já no SNP, estão presentes apenas dois tipos de glia:

„„ Células de Schwann: bainhas de mielina neuronais.


„„ Células satélites: gânglios nervosos.

Acompanhe, na Figura 3, mais informações sobre os tipos de célula da


glia e suas funções.
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Figura 3. (a) Tipos de células da glia e suas funções. (b) Neurônios e células da glia.
Fonte: Silverthorn (2017, p. 234).
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Sistema nervoso central


A organização celular do SNC pode ser visualizada com colorações diferentes,
como visto na Figura 3. A substância cinzenta é o constituinte mais escuro
do SNC, e ali se localizam células gliais, prolongamentos neuronais com
menor quantidade de mielina e, principalmente, os corpos dos neurônios.
No encéfalo, a substância cinzenta é denominada córtex cerebral, que constitui
a parte mais próxima à superfície. Nota-se que locais com conjuntos de corpos
celulares no SNC são denominados núcleos. Na substância branca encontram-
-se apenas prolongamentos neuronais mielinizados de cor mais esbranquiçada
e células da glia (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; SILVERTHORN,
2017; KANDEL et al., 2014). Mais adiante, veremos o SNC em mais detalhes.

Sistema nervoso periférico


O SNP representa todos os tecidos nervosos que estão fora do SNC. Fazem
parte desse sistema os receptores sensoriais, com formato de terminações
nervosas ou células singulares. Eles estão em locais como a pele, os órgãos
viscerais, os músculos e as articulações. Esses terminais se ligam a nervos
espinais, originados na medula espinal, e a nervos cranianos, que emergem
do encéfalo. Tais nervos normalmente são mistos, com uma parte sensorial,
com origem nas raízes dorsais da medula espinal ou em gânglios próximos
nos nervos cranianos; e uma parte motora, composta dos neurônios motores
que inervam músculos esqueléticos (SNS) e de órgãos viscerais (SNA), de
controle da musculatura lisa, glândulas e tecido muscular cardíaco (TORTORA;
DERRICKSON, 2017; SILVERTHORN, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO,
2016; MARIEB; HOEHN, 2008).
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A Figura 4 apresenta um resumo da organização do SNC e do SNP.

Figura 4. Organização do sistema nervoso: SNP e SNC.


Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 363).
Sistema nervoso central: encéfalo 9

A divisão eferente do SNP se subdivide em uma parte voluntária, que


inerva músculos esqueléticos por meio de sinapses, as junções neuromuscu-
lares do SNS. Já no SNA, o controle é involuntário, sem a necessidade de um
pensamento consciente para tal. O SNA se subdivide em (MARIEB; HOEHN,
2008; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016):

„„ SNA simpático, no qual sua inervação promove ações com maior com-
ponente excitatório, conhecido classicamente como “luta ou fuga”. Neste
sistema há presença de taquicardia, elevação da pressão arterial, e aumento
do suprimento de glicose na corrente sanguínea. O neurotransmissor
liberado em órgãos-alvo é a noradrenalina, causadora dessas ações.
„„ SNA parassimpático atua com predomínio de ações em repouso e
digestão, promovendo a motilidade gastrointestinal, a diminuição da
frequência cardíaca e da pressão arterial. Isso ocorre porque, há a
liberação de acetilcolina (ACh) nos órgãos inervados por esse sistema.

Há outra divisão do SNP que vem sendo bastante estudada atualmente, o


sistema nervoso entérico (SNE). Esse sistema controla os estímulos digestórios
intestinais por meio de reflexos gastrointestinais, de modo independente do
SNC. Juntamente a ele, o SNA trabalha realizando estas funções (SILVER-
THORN, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016). Veja mais sobre essas
subdivisões do SNP na Figura 5.
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Figura 5. SNP, parte sensorial e motora (somática e autônoma).


Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 364).
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Os espinhos dendríticos são protusões fisiológicas da membrana dos dendritos neu-


ronais, que proporcionam o aumento no número de sinapses. Sua função é relacionada
com eventos de plasticidade neuronal, como aprendizado e memória. No interior
dessa estrutura são observados polirribossomos e retículo endoplasmático liso para
o armazenamento de cálcio. Sabe-se que crianças com atraso no desenvolvimento
cognitivo podem apresentar alterações nesses espinhos, com menor conectividade
sináptica e espinhos de morfologia mais fina. O período da infância é um momento de
maior desenvolvimento dos espinhos, o que proporciona modificações em circuitos
cerebrais.

Fonte: Bear, Connors e Paradiso (2017, p. 47) e Merlo et al. (2011, documento on-line).

Visão geral do sistema nervoso central


Diferentes espécies animais possuem a capacidade de percepção de mudanças
externas no ambiente e posterior geração de respostas adequadas ao contexto.
Evolutivamente, as águas vivas já possuem células nervosas para a assimilação
do meio em que vivem; entretanto seu sistema nervoso é apenas uma rede de
nervos sensoriais, motores e interneurônios.
Nos vertebrados, o SNC já é bem delimitado, pois o encéfalo e a medula
espinal são organizados em estruturas singulares. Nos mamíferos em geral,
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estruturas comuns são observadas: cérebro, cerebelo e tronco encefálico. Na


espécie humana, percebe-se no cérebro uma diferenciação robusta e bem
desenvolvida, pois notam-se giros e sulcos que permitem que uma grande
massa encefálica fique contida nas dobras cerebrais (TORTORA; DERRICK-
SON, 2017; SILVERTHORN, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017;
VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; MARIEB; HOEHN, 2008). Compare
as diferenças entre encéfalos de mamíferos na Figura 6.

Figura 6. Diferenças entre encéfalos de mamíferos. Note a presença de regiões comuns a


todos (cérebro, cerebelo e tronco encefálico), e alguns desses animais já possuem sulcos
e giros.
Fonte: Bear, Connors e Paradiso (2017, p. 181).
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Desenvolvimento embrionário do SNC


O SNC inicia seu desenvolvimento nas primeiras semanas gestacionais. O tubo
neural inicia sua formação a partir de estruturas do ectoderma (um dos folhe-
tos embrionários da 3ª semana gestacional), próximo ao 20º dia gestacional,
como você pode ver na Figura 7. Esse tubo oco funde estruturas semelhantes
a cristas de ondas, as cristas neurais. Internamente, a parte celular de re-
vestimento que compõe o tubo serão células ependimárias ou células tronco
indiferenciadas; já externamente, são células que formarão neurônios e glia
do SNC. O SNP deriva das células da crista neural, que formarão neurônios
sensoriais e motores dos nervos periféricos.

Figura 7. Desenvolvimento embrionário do sistema nervoso — formação do tubo neural.


Fonte: Marieb e Hoehn (2008, p. 386).
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Na parte anterior do tubo neural, três estruturas encefálicas se desen-


volvem e dão origem às demais regiões encefálicas. A primeira estrutura, o
prosencéfalo, é a mais anterior de todas e origina o telencéfalo, que, por sua
vez, organiza-se em cérebro (onde se notam os lobos cerebrais) e diencéfalo
(que origina o hipotálamo e o tálamo). Circundados pelo telencéfalo estão os
ventrículos laterais, que são preenchidos por líquido cerebrospinal.
A segunda estrutura, o mesencéfalo, permanece com o mesmo nome ao
longo do desenvolvimento. Já a última estrutura, o rombencéfalo, originará
o metencéfalo (origina a ponte e o cerebelo) e o mielencéfalo (desenvolve
o bulbo). O desenvolvimento da parte final do tubo neural forma a medula
espinal, que, ao ser seccionada, demonstra regiões de substância cinzenta
em forma de borboleta, denominadas cornos dorsal e ventral. O restante são
colunas de substância branca que projetam axônios ascendentes e descendentes
(TORTORA; DERRICKSON, 2017; SILVERTHORN, 2017; BEAR; CON-
NORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; MARIEB;
HOEHN, 2008).
A Figura 8 ilustra e resume o desenvolvimento embrionário do SNC.

Meninges
O encéfalo e a medula espinal estão alocados em “caixas” ósseas: a caixa
craniana e o canal vertebral da coluna. Entretanto, não há contato direto do
SNC com os ossos, visto que a proteção é ocasionada por três membranas de
tecido conjuntivo, as meninges, que se estendem do encéfalo até o final da
coluna vertebral.
A meninge mais externa é a dura-máter, que significa “mãe rígida”. Possui
constituição firme, pois sua composição é de conjuntivo denso modelado, e
se une aos vasos sanguíneos que passam abaixo dela, por meio de cavidades
denominadas seios.
Abaixo da dura-máter está a aracnoide (arac vem de “aranha”). Ela é mais
frouxa, com fibras elásticas e colágenas semelhantes a uma teia. Nesse local
há um espaço subaracnóideo, por onde circula o líquido cerebrospinal, de
consistência salina e incolor, que protege química e mecanicamente o SNC,
diminuindo o peso encefálico em 30 vezes.
A mais fina e mais interna das camadas é a pia-máter, em que pia significa
“delicada”. Ela se adere ao encéfalo e se associa aos vasos sanguíneos que
nutrem o cérebro.
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Figura 8. Desenvolvimento embrionário do SNC.


Fonte: Silverthorn (2017, p. 278).

A dura e a aracnoide persistem até a região sacral, embora a medula fina-


lize na região lombar. Isso ocorre em razão do crescimento embriológico dos
ossos da coluna, que ocorre mais rapidamente do que o do sistema nervoso.
O líquido cerebrospinal é secretado pelo plexo coroide nas paredes dos
ventrículos cerebrais, que são dilatações derivadas do lúmen do tubo neural,
contínuas com o canal central medular. Em cada hemisfério há os ventrículos
laterais em formato de L, que se comunicam com o terceiro ventrículo. Este
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último liga-se com o quarto ventrículo, que tem seguimento com o canal
medular (MARIEB; HOEHN, 2008; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016;
TORTORA; DERRICKSON, 2017; BECKER, 2018; SILVERTHORN, 2017;
BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017).
Visualize essas estruturas na Figura 9.

Figura 9. Meninges, líquido cerebrospinal e ventrículos cerebrais.


Fonte: Silverthorn (2017, p. 281).
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Encéfalo
O encéfalo compreende todos os componentes contidos na caixa craniana,
isto é, tronco encefálico, cérebro e seus lobos e núcleos subcorticais. Muitas
vezes, traduzimos erroneamente a palavra brain, do inglês, para cérebro;
contudo essa tradução compreende apenas o córtex cerebral, com seus sulcos
(fendas) e giros (dobras). A existência dessas estruturas não é um mero acaso:
elas estão presentes porque são “dobraduras” que aumentam a quantidade de
tecido nervoso, ocupando um menor espaço do crânio. Imagine que temos
em torno de 80 bilhões de neurônios.
Quando comparado com o encéfalo de outros mamíferos, o encéfalo humano
demonstra maior tamanho da região do prosencéfalo, porém o bulbo olfatório
é menor, devido à menor capacidade olfativa. Você já deve ter observado cães
farejadores procurando minúsculas partículas de odor, quando nós, humanos,
não sentimos nada.
Podemos subdividir o encéfalo em partes (TORTORA; DERRICK-
SON, 2017; SILVERTHORN, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017;
VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; MARIEB; HOEHN, 2008):

„„ Hemisférios cerebrais: onde estão os dois lados do cérebro, formados


por córtex cerebral. São separados pela fissura longitudinal.
„„ Diencéfalo: com seus núcleos subcorticais, como hipotálamo, tálamo,
epitálamo.
„„ Tronco encefálico: formado de mesencéfalo, ponte e bulbo.
„„ Cerebelo: denominado assim pois se assemelha a um cérebro em
miniatura.

Os hemisférios cerebrais são divididos funcional e anatomicamente em


lobos. O lobo temporal leva esse nome porque fica próximo às têmporas,
primeiro local onde se notam os cabelos brancos durante o envelhecimento,
e fica abaixo do osso de mesmo nome. Delimitando o lobo temporal encon-
tramos o sulco lateral, que permite a divisa do lobo frontal, também situado
abaixo do osso de mesmo nome. Sua região caudal se limita com o sulco
central, onde se encontra a divisa com o lobo parietal, também relacionado
ao osso do crânio de sua proximidade. Anterior ao sulco central se observa o
giro pré-central e, posteriormente, o giro pós-central. Contínuo a esse último
lobo na região posterior do encéfalo, o sulco parietoccipital faz a divisa entre
os lobos parietal e occipital.
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Acompanhe as estruturas do encéfalo na Figura 10.

Figura 10. Regiões encefálicas anatômicas.


Fonte: Silverthorn (2017, p. 286).
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O córtex cerebral é integrado por seis camadas, que podem ser visualizadas
na Figura 11, e seus aspectos se diferenciam de outras regiões por características
peculiares não observadas em outros locais (BEAR; CONNORS; PARADISO,
2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; MARIEB; HOEHN, 2008):

„„ os corpos celulares estão organizados em lâminas, paralelos ao meio


externo;
„„ a camada mais superficial tem poucos corpos celulares e é denominada
camada molecular ou I;
„„ estão presentes células piramidais, que possuem longos dendritos api-
cais, onde se ramificam em múltiplos ramos.

Figura 11. Camadas corticais.


Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 439).

Medula espinal
A medula espinal tem formato cilíndrico e está dentro do canal vertebral, na
coluna vertebral. Mede, aproximadamente, 42 cm de comprimento e 1,8 cm
de espessura, estendendo-se do crânio, a partir do forame magno, passando
pelos segmentos vertebrais cervical (C), torácico (T) e lombar (L). Sua parte
final ocorre, aproximadamente, nas vertebras L1/L2 sendo mais encurtada
do que a coluna vertebral.
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Em uma secção transversal, a medula possui sulcos que a delimitam em


duas metades: o sulco mediano posterior (região dorsal) e a fissura mediana
anterior (região ventral). Nota-se, na Figura 12, a presença de substância branca
e cinzenta. A substância cinzenta tem formato de “H”, com a presença do
canal central, que contém líquido cerebrospinal.
O “H” medular é dividido em cornos. O corno dorsal é uma entrada de
axônios da raiz dorsal (posterior), que, por sua vez, transporta informações
sensitivas vindas de vísceras, pele e músculos. A presença de seus corpos
celulares é observada nos gânglios espinais, regiões externas à medula.
Já no corno ventral se observa a saída de informações motoras. Nesse local há
corpos de neurônios motores somáticos que realizam a contração de músculos
esqueléticos.
O corno lateral pode ser observado na parte medular torácica e lombar,
e contém os corpos de neurônios motores do SNA, que inervam musculatura
cardíaca, lisa e glandular. Associados a esses cornos estão os 31 nervos es-
pinais que inervam apele, músculos e vísceras. Esses nervos emergem das
raízes dorsal ou ventral da medula espinal e saem pelo forame intervertebral
da coluna, compondo assim parte do SNP.
A substância branca é constituída de projeções axonais aferentes e efe-
rentes, e se divide em funículos, que são colunas que possuem tratos (feixes
axonais). Esses tratos podem ser (MARIEB; HOEHN, 2008; TORTORA;
DERRICKSON, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017):

„„ tratos sensoriais — ascendem ao encéfalo e levam informações


sensoriais;
„„ tratos motores — transportam informações do encéfalo para a medula.

A hidrocefalia é um distúrbio em que há o comprometimento da circulação do


líquido cerebrospinal pelos ventrículos cerebrais. Com isso, pode haver a dilatação
dessas estruturas e o aumento da circunferência da cabeça em crianças. Adultos
também podem sofrer essa alteração, o que pode resultar em consequências ainda
mais graves, pela dificuldade de expansão do crânio.
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Figura 12. Secção transversal da medula espinal.


Fonte: Marieb e Hoehn (2008, p. 428).

Estruturas que compreendem o encéfalo


e suas funções
O encéfalo tem a proteção das meninges, do líquido cerebrospinal e da bar-
reira hematoencefálica. Essa barreira, que você pode visualizar na Figura 13,
está presente nos capilares encefálicos, que são muito menos permeáveis
a outros espalhados pelo corpo, uma vez que possuem junções oclusivas.
Essas junções são proteínas que ocluem espaços — neste caso, em células
do endotélio capilar —, promovendo a diminuição da permeabilidade para o
líquido intersticial. Acoplado aos vasos estão os astrócitos, que são indutores
da formação desta barreira no endotélio. Desse modo, os neurônios não ficam
em contato direto com os vasos sanguíneos (SILVERTHORN, 2017; BEAR;
CONNORS; PARADISO, 2017).
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Figura 13. Barreira hematoencefálica.


Fonte: Silverthorn (2017, p. 282).

O encéfalo humano possui cerca de 1.400 g de massa e, aproximadamente,


85 milhões de neurônios conectados, sendo que uma célula pode receber
até 200 mil sinapses. Os neurônios estão organizados em redes neuronais, e
essas redes podem ser interconectadas com a totalidade encefálica, ou quase
toda. Entretanto, suas regiões estão anatomicamente relacionadas a funções
específicas.

Córtex cerebral e suas funções


O córtex cerebral, como dito anteriormente, é a região de substância cinzenta
mais superficial do encéfalo, com cerca de 2 a 4 mm. Entretanto, 40% da
massa cerebral está distribuída nas circunvoluções, que atuam na percepção
de ações conscientes, sensações, comunicação, memória, raciocínio e início de
movimentos voluntários. Observam-se quatro características similares a todas
regiões corticais (SILVERTHORN, 2017; BEAR; CONNORS; PARADISO,
2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; MARIEB; HOEHN, 2008):
Sistema nervoso central: encéfalo 23

„„ existem áreas corticais de associação, motoras e sensoriais;


„„ cada hemisfério controla funções corticais contralaterais do corpo, ou
seja, o hemisfério esquerdo, por exemplo, controla funções do lado
direito do corpo;
„„ os hemisférios possuem uma lateralização de funções; apesar de serem
similares, suas funções não são totalmente iguais;
„„ as regiões estão totalmente interconectadas, nunca há a ação de uma
região sozinha. Entretanto, para melhor entendimento, muitas vezes
abordaremos as funções por região.

Discutiremos aqui as funções corticais de acordo com a classificação


determinada pelas áreas de Brodmann, que são 52 regiões elaboradas por K.
Brodmann, em 1906, e que você pode visualizar na Figura 14. Simultaneamente,
inseriremos o lobo em que a área está localizada, para uma compreensão mais
completa do tema (MARIEB; HOEHN, 2008).

„„ Áreas motoras: localizam-se em regiões posteriores do lobo frontal,


próximas ao sulco central. Controlam os movimentos voluntários e são
compostas de: córtex motor primário, córtex pré-motor, área de Broca,
e campo ocular frontal. Estão anatomicamente relacionadas à funções
específicas (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE;
REGAN; RUSSO, 2016; MARIEB; HOEHN, 2008).
„„ A representação cortical denominada Homúnculo motor demonstra
o córtex motor primário para cada parte do corpo. Entretanto, sabe-
-se que mais regiões estão envolvidas com os movimentos das partes
do Homúnculo (BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; MARIEB;
HOEHN, 2008).
„„ Áreas sensoriais: são localizadas nos lobos temporal, parietal, insular e
occipital. Controlam a percepção de inúmeras aferências, veja (BEAR;
CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016;
MARIEB; HOEHN, 2008):
■■ receptores sensoriais da pele, propriocepção muscular e articular
(córtex somatossensorial primário no lobo parietal);
■■ entradas sensoriais de temperatura, pressão, textura (córtex soma-
tossensorial de associação no lobo parietal);
■■ informações visuais da retina (córtex visual primário e área de as-
sociação visual no lobo occipital);
■■ informações auditivas (córtex auditivo primário e área auditiva de
associação no lobo temporal);
24 Sistema nervoso central: encéfalo

Figura 14. Principais áreas motoras, sensoriais e associativas.


Fonte: Bear, Connors e Paradiso (2017, p. 224).
Sistema nervoso central: encéfalo 25

■■ informações olfativas (córtex olfatório no lobo temporal e rinencéfalo


no bulbo olfatório e regiões frontais);
■■ informações gustativas (lobo da ínsula);
■■ informações viscerais (lobo da ínsula);
■■ informações de equilíbrio (córtex vestibular na região posterior
à ínsula).

Veja mais sobre as áreas motoras e sensoriais na Figura 15.

Figura 15. Áreas motoras e sensoriais corticais.


Fonte: Marieb e Hoehn (2008, p. 393).

„„ Áreas associativas multimodais: estas áreas recebem inúmeros tipos


de informações, bem como enviam projeções. Transformam informa-
ções em memórias e ações, dão significados e realizam uma tomada
de decisão apropriada ao contexto ambiental em que o indivíduo está
inserido. Por exemplo, caso você sinta o cheiro do seu bolo favorito,
talvez essa informação sensorial faça você lembrar da sua infância,
lembrar de o quão gostoso é tomar um café com bolo, ou lembrar da
pessoa que fez esse agrado para você um dia, gerando uma memória
afetiva. As áreas anatômicas envolvidas são as seguintes:
26 Sistema nervoso central: encéfalo

■■ área associativa anterior, ou córtex pré-frontal — controla habi-


lidades de raciocínio lógico, situações de aprendizagem, e intelecto;
■■ área associativa posterior, na parte do lobo occipital — atua no
reconhecimento de faces e de detalhes de espaços ou locais para o
discernimento do contexto. Por exemplo, você entende que está na
biblioteca quando vê estantes de livros, mesas de estudos e corredores,
todo o ambiente unido dá significado do local que você está;
■■ área associativa límbica — inclui o giro cingulado, para-hipocampal
e hipocampo. Essas áreas dão sentidos emocionais e geram memórias
de fatos e eventos que você passou durante o dia, por exemplo.

Diencéfalo e suas funções


Como já mencionado, o diencéfalo está localizado entre o tronco encefálico e
o cérebro. É constituído pelas seguintes regiões: tálamo, subtálamo, epitálamo
e hipotálamo, que podem ser visualizadas na Figura 16 (BEAR; CONNORS;
PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; MARIEB; HOEHN,
2008).

„„ Tálamo: é um conjunto de núcleos com porções laterais, unidos pela


aderência intertalâmica. Suas funções se relacionam à retransmissão
de informações sensoriais. Qualquer informação desse cunho passa
pelo tálamo, exceto as olfativas.
„„ Subtálamo: é uma região abaixo do tálamo que contém núcleos de-
nominados subtalâmicos, que recebem projeções do tronco encefálico
da substância negra e do núcleo rubro, e estão relacionados com in-
formações motoras.
„„ Epitálamo: esta região está localizada superior e posteriormente ao
tálamo, e sua grande característica é a glândula pineal, que secreta
melatonina. Está envolvida em ciclos de sono e vigília e é, normalmente,
mais ativa a noite.
„„ Hipotálamo: é formado por um agrupado de núcleos que controlam
processos vitais do organismo (comportamento alimentar, temperatura
corporal, ingestão de líquidos). É um grande centro controlador endó-
crino, que se conecta à hipófise por meio do infundíbulo (estrutura
que se assemelha a uma haste), atuando no comando dessa glândula.
Sistema nervoso central: encéfalo 27

Figura 16. Diencéfalo.


Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 437).

Tronco encefálico e suas funções


O tronco encefálico faz a conexão entre o cérebro e a medula espinal.
É composto de mesencéfalo, ponte e bulbo, como demonstra a Figura 17. Suas
funções são diversas, entre elas, controle das funções vitais, respiratórias, dos
batimentos cardíacos, dos reflexos e do sistema motor (BEAR; CONNORS;
PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016; MARIEB; HOEHN,
2008).

„„ Mesencéfalo: é a região do tronco encefálico de menor tamanho. Possui


os núcleos dos nervos cranianos oculomotor, troclear e trigêmeo. Ele
é subdividido em:
■■ teto — com saliências denominadas colículos superiores e inferiores,
que recebem aferências do sistema visual, auditivo;
■■ tegmento — possui tratos que ascendem da medula. Juntamente, há
núcleos como a substância negra e o núcleo rubro, envolvidos com
atividades motoras.
28 Sistema nervoso central: encéfalo

„„ Ponte: possui grande quantidade de núcleos, tendo tratos ascendentes


e descendentes. Atua no controle respiratório junto com o bulbo. Na
região posterior pontina estão nervos cranianos (V), abducente (VI),
facial (VII) e vestibulococlear (VIII).
„„ Bulbo: é a última parte do tronco encefálico, que também pode ser de-
nominada medula oblonga. Possui tratos sensoriais e motores, e núcleos
de substância cinzenta que agem em funções essenciais: batimentos
cardíacos, constrição de vasos sanguíneos, ação na respiração, vômito,
deglutição, soluço, tosse e espirro. Essas funções são anatomicamente
próximas nos núcleos bulbares, pois, caso um indivíduo engula algum
alimento contaminado ou não adequado, o ato da deglutição e vômito
estão próximos para a regurgitação. Nessa região algumas fibras rea-
lizam decussação e migram para o lado oposto da linha média, e isso
explica o controle contralateral do corpo nos hemisférios cerebrais.

Cerebelo e suas funções


Cerebelo significa “pequeno cérebro” e está localizado dorsalmente à ponte e
ao bulbo. Possui dois hemisférios e três lobos, anterior, posterior e flóculo
nodular, com uma estrutura central denominada verme (ou vermis). Suas
funções estão relacionadas ao refinamento de informações motoras, diminuindo
possíveis erros e monitorando as contrações musculares para atividades que
vão desde a marcha, ao caminhar, até dirigir e digitar. Contém um córtex
similar ao cérebro, bem como substância branca e núcleos internos, sendo o
núcleo denteado o mais conhecido. Suas células são cesta, de Purkinje (as
mais longas), estrelares e granulares, e sabe-se que existem mais neurônios
no córtex cerebelar que no cérebro.
Sistema nervoso central: encéfalo 29

Figura 17. Tronco encefálico.


Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 434).
30 Sistema nervoso central: encéfalo

O cerebelo é conectado ao tronco encefálico pelos pedúnculos cerebelares,


que fazem as conexões com inúmeras regiões, como o cérebro, a partir do
diencéfalo, e as estruturas do tronco encefálico (mesencéfalo, ponte e bulbo)
(BEAR; CONNORS; PARADISO, 2017; VANPUTTE; REGAN; RUSSO,
2016; MARIEB; HOEHN, 2008). Visualize essas estruturas na Figura 18.

Figura 18. Cerebelo.


Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 436).

A Figura 19 resume todas as estruturas do encéfalo que discutimos neste


tópico e suas funções.
Sistema nervoso central: encéfalo 31

Figura 19. Divisões do encéfalo e suas funções.


Fonte: Vanputte, Regan e Russo (2016, p. 431).

Você já ouviu falar do caso Phineas Gage? Ele era um trabalhador de ferrovias que, em
1848, sofreu um grave acidente com uma barra de ferro, que atravessou seu cérebro na
região frontal. Algumas sequelas ficaram, mas ele sobreviveu, e seu caso até hoje intriga
neurocientistas. Se quiser saber mais sobre esse curioso caso, acesse o link a seguir.

https://qrgo.page.link/GcVZr

Neste capítulo você estudou os componentes do SNC e do SNP. Conheceu


as células de cada sistema e sua função básica e, por último, viu que o encéfalo
é o centro controlador de todas as ações do organismo, desde as atividades
motoras e sensoriais até o seu raciocínio lógico e atenção para ler este capítulo.
32 Sistema nervoso central: encéfalo

A doença de Parkinson é provocada por morte de neurônios da substância negra, no


mesencéfalo. Esses neurônios produzem dopamina, um neurotransmissor essencial para
a iniciação de movimentos voluntários. Sem ela, as aferências corticais motoras ficam
prejudicadas, gerando os sinais característicos da doença, o tremor e a hipocinesia.
Suas causas ainda são incertas, mas sabe-se que características genéticas e intoxicações
ambientais, por exemplo, podem ser agentes indutores.
Fonte: Bear, Connors e Paradiso (2017, p. 501).

BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema


nervoso. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.
BECKER, R. O. Anatomia humana. Porto Alegre: SAGAH, 2018.
KANDEL, E. R. et al. Princípios de neurociências. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014.
MARIEB, E. N.; HOEHN, K. Anatomia e fisiologia. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2008.
MERLO, S. et al. O ciclo da vesícula sináptica, espinhos dendríticos e a transdução de
sinal. Revista Medicina (Ribeirão Preto), v. 44, n. 2, p. 157−171, 2011. Disponível em: http://
www.revistas.usp.br/rmrp/article/view/47356. Acesso em: 24 set. 2019.
SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 7. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2017.
TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Anatomia e fisiologia. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.
VANPUTTE, C.; REGAN, J.; RUSSO, A. Anatomia e fisiologia de Seeley. 10. ed. Porto Alegre:
AMGH, 2016.

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