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ANATOMIA

Gabriela Augusta
Sistema nervoso: estrutura
anatômica e tecido nervoso
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Reconhecer a organização e estrutura anatômica básica do sistema


nervoso;
„„ Identificar os principais tipos de células do sistema nervoso;
„„ Identificar a estrutura e função geral de neurônios e bainha de mielina.

Introdução
Anatomicamente, o sistema nervoso está dividido em sistema nervoso
central (SNC) e sistema nervoso periférico (SNP). O SNC integra, processa
e coordena a chegada de estímulos sensitivos e a saída de estímulos
motores. O SNP inclui todos os tecidos nervosos fora do SNC e apresenta
duas subdivisões: SNP aferente e SNP eferente. O neurônio e a neuróglia
são as células do sistema nervoso.
Neste capítulo, você estudará os sistemas nervosos central e periférico.

Divisão anatômica do sistema nervoso


O sistema nervoso é constituído pelo tecido nervoso, o qual é distribuído
pelo corpo, interligando-se e formando uma rede de comunicações. Ana-
tomicamente, este sistema é dividido em sistema nervoso central (SNC),
formado pelo encéfalo e pela medula espinal, e em sistema nervoso peri-
férico (SNP), formado pelos nervos espinais e cranianos e pelos gânglios
nervosos (Figura 1).
O SNC é responsável pela recepção de estímulos sensitivos, sua inte-
gração e a saída de estímulos motores. É o centro de funções cognitivas,
como a inteligência, o raciocínio, a memória, o aprendizado e as emoções.
O encéfalo é a parte do SNC contida no interior da cavidade craniana e a
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medula espinal é a parte que continua a partir do encéfalo e se localiza no


interior da cavidade vertebral. O encéfalo apresenta uma forma irregular,
repleta de dobras e saliências. No seu interior, existem cavidades chamadas
de ventrículos, preenchidas por um líquido, o líquor, atualmente denomi-
nado líquido cerebrospinal (LCS) ou líquido cerebrorraquidiano (LCR). Já
a medula espinal tem forma cilíndrica ou tubular e termina em forma de
cone, chamado de cone medular.
O SNP é composto por todas as estruturas que estão fora do SNC, transmite
as informações sensitivas ao SNC e conduz os comandos motores do SNC para
sistemas e tecidos periféricos. Sua subdivisão consiste em divisão aferente,
que conduz informações sensitivas ao SNC, e divisão eferente, que conduz
estímulos motores para músculos (do tipo liso e esquelético).
Os principais componentes do SNP são os nervos, que são conjuntos de
fibras nervosas encontrados em todas as partes do corpo. Os nervos cranianos
e os nervos espinais fazem parte deste sistema. Os nervos espinais se conectam
ao SNC a partir de orifícios na coluna vertebral e os nervos cranianos o fazem
através de orifícios existentes no crânio. Estas duas classes de nervos podem
transmitir informações sensitivas, motoras, viscerais ou somáticas. Existem
nervos que conduzem tanto informações sensitivas quanto motoras, sendo
chamados de nervos mistos.
Os nervos cranianos e os nervos espinais compõem a subdivisão do SNP,
que é o sistema nervoso somático (SNS), o sistema nervoso autônomo (SNA)
e o sistema nervoso entérico (SNE).
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Figura 1. Panorama anatomofisiológico do sistema nervoso: a divisão anatômica


entre o sistema nervoso central e o sistema nervoso periférico e os componentes
funcionais dentro desta divisão.
Fonte: Martini, Timmons e Tallitsch (2009).

Conceitos organizacionais
É muito importante que você saiba os significados de alguns termos relacio-
nados ao sistema nervoso, muito comuns e bastante difundidos na linguagem
anatomoclínica. Por exemplo: qual a diferença entre substância branca e
substância cinzenta? Os dois termos sempre vão estar relacionados ao SNC,
mas substância cinzenta é um aglomerado de corpos de neurônios pertencentes
ao SNC e substância branca são regiões com somente axônios de neurônios no
SNC. O termo cinzenta se refere à coloração dos somas neuronais e o termo
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branca se refere à coloração vinda das bainhas de mielina que revestem os


axônios dos neurônios.
O que é um gânglio? Gânglio é um aglomerado de corpos de neurônios fora
do sistema SNC, isto é, este termo é aplicado somente para o SNP!
O que é fibra nervosa? Fibra nervosa é o conjunto de um axônio e o tipo
de célula que o reveste. Isto é, no SNC, os axônios dos neurônios são reves-
tidos por células gliais chamadas de oligodendrócitos e, no SNP, os axônios
são revestidos por células gliais chamadas de células de Schwann. Tanto o
revestimento por oligodendrócitos quanto o revestimento pelas células de
Schwann formam a denominada “bainha de mielina”.

Os neurônios se comunicam por meio de sinapses. Existem as sinapses elétricas e as


sinapses químicas. As elétricas são evolutivamente mais antigas e ocorrem através
de correntes elétricas entre as junções comunicantes dos neurônios, em ambas as
direções, isto é, em dois sentidos; estão presentes frequentemente em estágios iniciais
da embriogênese. Já a transmissão sináptica química, via de regra, é a que ocorre no
sistema nervoso maduro, de forma unidirecional e envolvendo neurotransmissores
(neuropeptídeos) que farão a comunicação neuronal.

Tipos de células que compõem


o sistema nervoso
O tecido nervoso apresenta dois componentes principais: os neurônios e as
células gliais ou neuróglia.

Neurônios
São células altamente excitáveis, isto é, respondem a estímulos químicos ou
elétricos, vindos geralmente de outras células, e que, a partir disto, geram
impulsos elétricos (ou potencial de ação) que são transmitidos ao longo da
membrana plasmática que recobre seus prolongamentos.
Estas células nervosas apresentam morfologia complexa, mas quase todas
apresentam três componentes (Figura 2):
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„„ Dendritos: são prolongamentos numerosos especializados em receber


estímulos sensoriais do meio externo e do meio interno e de outros
neurônios. Os dendritos contêm processos espinhosos chamados de
espinhas dendríticas, que recebem os estímulos excitatórios das ter-
minações nervosas de outros neurônios.
„„ Corpo celular ou soma: é o corpo celular que contém o citoplasma ou
axoplasma e suas organelas e também pode receber estímulos.
„„ Axônio: prolongamento geralmente cilíndrico e único que parte do soma,
é especializado em conduzir impulsos nervosos para outras células, como
células glandulares, musculares e outras células nervosas (Figuras 2 e 3).

O sistema nervoso está continuamente sofrendo modificações relacionadas


a sua morfologia e a suas conexões nervosas: é a chamada plasticidade neural.
A partir de determinados estímulos, mudanças na organização, nas conexões
neurais e até na estrutura dos neurônios podem ocorrer. Através da plasticidade,
por exemplo, novos comportamentos são aprendidos e o desenvolvimento
humano se torna um ato contínuo.

Por meio da plasticidade neural, novos comportamentos são aprendidos e o desen-


volvimento humano se torna um ato contínuo. Em geral, a aprendizagem global é
resultado de alterações locais nos neurônios.
Existem diversas formas de modificações possíveis em um neurônio. Por exemplo:
dendritos podem nascer, assim como também podem ser removidos; alguns dendritos
podem se esticar ou ser encolhidos, permitindo ou eliminando, respectivamente, a
conexão com outras células; novas sinapses podem ser criadas ou sofrer alterações,
e sinapses também podem ser removidas.

Os neurônios são envolvidos pela membrana plasmática, cuja excitabilidade


dá aos neurônios a propriedade de produzir sinais elétricos que funcionam
como unidades de informação.
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Figura 2. Desenho esquemático de um neurônio típico.


Fonte: Tortora e Derrickson (2012).
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Figura 3. A inervação pelos neurônios em diversas estruturas.


Fonte: Martini, Timmons e Tallitsch (2009).

Sendo unidades funcionais de informação, os neurônios operam em grandes


conjuntos, compondo os circuitos neuronais ou redes neuronais.

Neuróglia
Além dos neurônios, o sistema nervoso é composto pela neuróglia, que é um con-
junto de vários tipos de células. As células gliais são responsáveis pela sustentação
e pelo trofismo dos neurônios e uma parcela destas células tem função fagocitária.
Descobertas atuais evidenciaram o papel ativo da neuróglia em inúmeros
processos cognitivos e de integração nas redes de conexões neuronais, deixando
para trás a noção de função meramente de suporte estrutural para os neurônios.
As células da glia podem se multiplicar e se regenerar e têm participação
essencial nos processos de lesão e degeneração neuronal.
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Existem seis tipos de células da neuróglia, sendo que quatro pertencem ao


SNC e duas ao SNP (Figura 4).

Células gliais do SNC: astrócitos, oligodendrócitos,


micróglia e células ependimárias

Os astrócitos compõem a maioria das células gliais e, como o nome já expressa,


apresentam forma de estrela. Contribuem para o controle do espaço entre as
células, aumentando a área de superfície entre elas e proporcionando, também,
uma resistência mecânica aos neurônios; fazem parte da barreira hemato-
-encefálica, que isola a circulação geral do tecido nervoso.
Os oligodendrócitos possuem prolongamentos que fazem contato com
os axônios ou corpos celulares de neurônios e, além disto, “enrolam-se” nos
axônios e formam a bainha de mielina, com propriedades isolantes que au-
mentam a velocidade da transmissão sináptica.
As células da micróglia fazem parte de um sistema de defesa do SNC e
fagocitam elementos celulares que não funcionam ou que são indesejáveis,
residuais ou com algum poder patológico. Em casos de lesões ou infecções,
ocorre um aumento no número destas células.
Células ependimárias revestem os ventrículos encefálicos e o canal central
da medula espinal, desta forma, agindo como uma barreira que impede que
elementos não desejáveis da circulação comum entrem no SNC. As células
ependimárias estão dispostas de forma que somente elementos gasosos e
glicose, por exemplo, ultrapassem suas junções.

Células gliais do SNP – células satélites e células de Schwann

„„ Células satélites: cercam os somas dos neurônios periféricos, regulando


a troca de nutrientes e produtos residuais entre o corpo do neurônio e
o líquido extra celular.
„„ Células de Schwann: envolvem os axônios dos neurônios do SNP,
compondo o neurilema, que é a cobertura destas células nos axônios
periféricos, e formam a bainha de mielina.
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Figura 4. As diferentes células que compõe a neuróglia e sua distribuição nos sistemas
nervoso central e periférico.
Fonte: Martini, Timmons e Tallitsch (2009).

Estrutura e função geral dos neurônios


e da bainha de mielina
Os neurônios apresentam muitas formas e cada uma delas serve para determinada
função. Sendo assim, existem neurônios morfologicamente diferentes distribuídos
em diversas regiões do sistema nervoso central e do sistema nervoso periférico.
Os tipos morfológicos são classificados da seguinte maneira (Figura 5):

„„ Apolares: são neurônios nos quais não se pode distinguir, pelo menos
anatomicamente, qual é o axônio e quais são os dendritos.
„„ Unipolares: apresentam um soma e um axônio, sendo que do axônio partem
alguns dendritos. Células da retina e da mucosa olfatório são deste tipo.
„„ Bipolares: são células que participam das funções de transmissão nos
sentidos especiais, como na visão, no olfato e na audição. O soma se
localiza entre o dendrito e o axônio. Vários dendritos se unem em um
único feixe, partindo do corpo celular.
„„ Multipolares: possuem vários dendritos e um axônio com uma ou
mais ramificações.
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Figura 5. Alguns tipos morfológicos de neurônios.


Fonte: Tortora e Derrickson (2012).

O axônio de um neurônio apresenta, em geral, as seguintes características:


inicia partindo do cone de implantação, que é uma região em forma de cone,
no corpo celular; sua porção terminal é chamada de terminal axônico e possui
vários botões sinápticos. Estas estruturas contêm vesículas sinápticas que
armazenam os neurotransmissores, responsáveis pela comunicação neural.
Os axônios da maioria dos neurônios são envolvidos por uma bainha de
mielina, um revestimento feito por células gliais, que no SNC são os oligoden-
drócitos e que no SNP são as células de Schwann. Estas células envolvem o
axônio do neurônio enrolando-se em torno de si mesmas. A bainha de mielina
isola o axônio de um neurônio e aumenta a velocidade de condução do impulso
nervoso. Espaços ou lacunas entre as bainhas de mielina são chamados de
nódulos de Ranvier. Os neurônios que possuem axônios revestidos por bai-
nha de mielina são chamados de mielínicos e os sem este revestimento são
chamados de amielínicos (Figura 2).
O sistema nervoso está continuamente sofrendo modificações relaciona-
das a sua morfologia e a suas conexões nervosas: é a chamada plasticidade
neural. A partir de determinados estímulos, mudanças na organização, nas
conexões neurais e até na estrutura dos neurônios podem ocorrer. O fenômeno
da plasticidade faz parte dos processos de aprendizado e memória, pois a cada
novo comportamento aprendido desde o nascimento até a fase adulta, várias
conexões neurais ocorrem e se fixam no sistema nervoso central, contribuindo
para o desenvolvimento normal e evolutivo do ser humano. 
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Você já ouviu falar de esclerose múltipla (EM)? Esta é uma doença desmielinizante sem
cura de origem inflamatória e degenerativa, na qual a bainha de mielina é destruída e,
por isso, dificulta a transmissão sináptica no sistema nervoso central e no sistema ner-
voso periférico, levando a dificuldades motoras incapacitantes. As possíveis causas são
desconhecidas e o tratamento depende da resposta de cada indivíduo. A abordagem
do paciente com EM é multidisciplinar e existem vários centros de referência desta
doença no Brasil, como a Associação Brasileira de Esclerose Múltipla – ABEM (Santa
Maria, RS) e o Centro de Esclerose Múltipla do Hospital Albert Einsten (São Paulo, SP).

Além da classificação morfológica, os neurônios podem ser classificados


funcionalmente. O critério usado para tal é a direção em que o impulso nervoso
é transmitido em relação ao SNC: neurônios aferentes ou sensitivos, neurônios
eferentes ou motores e interneurônios ou de associação.

„„ Neurônios sensitivos ou ascendentes: de maioria unipolar, estes neurô-


nios transmitem informações sensitivas, por meio de impulsos nervosos,
que são potenciais de ação, para o SNC.
„„ Neurônios eferentes ou motores: conduzem os potenciais de ação par-
tindo do SNC para os efetores, que são músculos (liso e estriado esque-
lético) e as glândulas do corpo, através de nervos cranianos e espinais.
„„ Interneurônios ou neurônios de associação: de maioria multipolar e
com o corpo celular dentro do SNC, estes neurônios fazem a conexão
entre vários outros neurônios de outras áreas.
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MARTINI, F.; TIMMONS, M. J.; TALLITSCH, R. B. Anatomia humana. 6. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2009.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE NEUROCIÊNCIAS E COMPORTAMENTO. São Paulo, 2017.
Disponível em: <www.sbnec.org.br>. Acesso em: 10 out. 2017.
TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Corpo humano: fundamentos de anatomia e fisiologia.
8. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012.

Leitura recomendada
CASTRO, L. N.; VON ZUBEN, F. J. Redes neurais artificiais. Campinas: Unicamp, 2010. Dis-
ponível em: <ftp://ftp.dca.fee.unicamp.br/pub/docs/vonzuben/ia006_03/topico5_03.
pdf >. Acesso em: 10 out. 2017.

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