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A TOPOFILIA COMO ESTRATÉGIA DE PREVENÇÃO DE ATAQUES ATIVOS EM

ESCOLAS.

Ives da Silva Duque-Pereira1

RESUMO

O estudo em questão aborda a preocupante tendência de violência nas escolas brasileiras,


com foco em ataques ativos. A reflexão sugere que a falta de conexão afetiva dos alunos com
o ambiente escolar pode estar correlacionada, contribuindo com a emergência desses atos
violentos. Assim, destaca-se a importância de cultivar a topofilia - uma relação afetiva com o
espaço escolar - como uma estratégia preventiva contra tais ataques. O cerne deste trabalho
é a apresentação e análise do projeto “(Re)Conexão: Amar e Mudar as Coisas para construir
a Escola dos Sonhos”, uma iniciativa que visa fortalecer os laços afetivos dos estudantes com
o ambiente escolar. Desenvolvido no contexto do Ensino Médio de uma escola pública no Rio
de Janeiro, e integrado à disciplina de Arte, o projeto adota metodologias ativas de
aprendizagem e uma abordagem de Design Thinking. Ele engaja os alunos na identificação e
compreensão dos desafios da escola, na busca por soluções e na concepção de um protótipo
da "Escola dos Sonhos", seja através de maquetes ou do jogo Minecraft. Os resultados
obtidos foram notavelmente positivos e surpreendentes, evidenciando o potencial dos
estudantes como agentes transformadores, capazes de reimaginar espaços escolares mais
acolhedores, seguros e inclusivos, enfrentando os desafios do dia a dia escolar.

Palavras-chave: Violência escolar. Ataque Ativo. Escola dos Sonhos. Topofilia. Prevenção.

1 INTRODUÇÃO

A violência nas escolas têm sido um tema de crescente preocupação no cenário


educacional brasileiro. Em particular, os ataques extremos em violência tendo como
resultado a morte de pessoas, têm gerado insegurança e medo em todos os
envolvidos no processo educacional. Esses ataques ativos, caracterizados por
indivíduos armados que buscam vítimas no espaço escolar, frequentemente sem alvo
específico, levantam um ponto de reflexão importante. A escolha de instituições de
ensino como palco de tais ataques não é aleatória, mas a meu ver simbólica, refletindo
uma profunda desconexão e/ou sentimento de aversão ao espaço escolar.
Em uma reflexão anterior (PEREIRA e MOURA, 2023), abordei a crescente
violência física nas escolas durante o retorno ao ensino presencial após a pandemia
da COVID-19. Esse estudo enfatizou o conceito geográfico de "lugar", que se refere à
interação entre os sentimentos e subjetividades dos indivíduos e o local onde têm
vivência, atuando como um espaço de reprodução simbólica. Na geografia, o "lugar"

1
Doutorando em Cognição e Linguagem, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro
(UENF), ivesduque@gmail.com .
é definido como qualquer espaço que estabelece vínculos emocionais, seja de afeição
(topofilia) ou aversão (topofobia), resultantes das experiências vividas pelos sujeitos.
A partir da suposição de que houve uma desconexão emocional com o espaço
escolar durante o período de ensino remoto emergencial, sugere-se que o retorno
presencial, sem a devida atenção à reconstrução de laços afetivos com esse ambiente
e seus ocupantes, pode ter contribuído com uma onda de violência nas escolas. Esse
cenário pode ter sido agravado pela potencialização de problemas já presentes no
contexto escolar, como bullying, dificuldades dos alunos em interagir com figuras de
autoridade e com colegas que apresentam diferenças. A falta de conexão e elos
afetivos com o espaço escolar pode ter facilitado sentimentos de aversão a esse
espaço e àqueles que nele convivem, caracterizando a topofobia.
A escola não é apenas um conjunto de salas de aulas e corredores, mas um
espaço onde identidades são formadas, relações são construídas e valores são
transmitidos. No entanto, a escola que deveria ser um ambiente seguro e acolhedor,
provocadora de uma relação positiva com o lugar, muitas vezes pode estar sendo
percebida como um espaço de exclusão, tensão, onde há falta identificação e, em
casos extremos, violência.
A topofilia é um conceito criado pelo geógrafo Yi-Fu Tuan (1980) que entende
a relação entre seres humanos e ambiente por um elo afetivo entre sujeitos e lugares
permeado e possibilitado pelas experiências pessoais positivas. Assim, para pensar
em mudanças na escola é importante compreender o conceito de “lugar”, em especial
na perspectiva da topofilia, que pode ser útil como campo de conexão com o mundo
a qual sujeitos estão em convívio.
A partir dos apontamentos iniciais de Tuan (1980), se desenvolveu uma
variedade de abordagens e diferentes focos de entendimento do conceito de topofilia.
O senso de lugar pode ser percebido pelo indivíduo, a coletividade e o ambiente. As
relações positivas potencializam o bem-estar e o desenvolvimento humano quando
existem fortes conexões com lugares específicos. Esse contexto, influencia no
comportamento, desempenho de atividades e habilidades, sendo importante elemento
de identidade pessoal e comunitária. (DUARTE et al., 2021)
Em face do cenário atual, torna-se imperativo repensar o espaço escolar. Mais
do que uma mera reconfiguração física, é preciso considerar a capacidade desse
espaço de evocar emoções e simbolismos, alinhados à formação para a cidadania.
Defendo que fomentar a topofilia pode revolucionar a relação dos alunos com o
ambiente escolar. Ao promover intencionalmente essa conexão positiva com o espaço
escolar, incentivamos um senso de pertencimento, fazendo com que os estudantes se
sintam reconhecidos e valorizados, reduzindo, assim, a propensão a comportamentos
violentos.
Com base nessa premissa, desenvolvi uma estratégia pedagógica centrada
nos estudantes e expressa no projeto “(Re)Conexão: Amar e mudar as coisas para
construir a Escola dos sonhos”. A ideia consistia em envolver os alunos no desafio de
retomar a conexão e o sentimento de pertencimento no ambiente escolar,
restabelecendo e fortalecendo laços dos estudantes com esse espaço.
Inspirado na música “Alucinação” de Belchior, o projeto destaca a importância
de enfrentar a realidade pela busca em identificar os problemas da escola, incentivá-
los a pensar em possíveis soluções e, finalmente, projetar uma escola idealizada,
usando ferramentas digitais como o jogo Minecraft. O produto deste projeto não visava
apenas uma reconfiguração arquitetônica, mas uma (re)imaginação do espaço
escolar, onde os desejos e necessidades dos alunos estavam no centro e se
materializavam no projeto de uma nova escola.
Este artigo tem como objetivo geral descrever e analisar essa estratégia,
refletindo sobre sua eficácia na construção de laços efetivos e na prevenção de
ataques ativos. Para isso, precisaremos compreender melhor o contexto de ataques
ativos e como isso tem afetado as escolas brasileiras na atualidade. Algumas
hipóteses são levantadas como premissa e seguirei com a descrição das atividades
propostas com análise dos resultados.

2 ATAQUES ATIVOS NAS ESCOLAS

Segundo o Departamento de Segurança Interna dos EUA (U.S. DEPARTMENT


OF HOMELAND SECURITY, 2008), “Atirador Ativo” (“active shooter”) é um indivíduo
que está ativamente engajado a matar em uma área confinada e populosa, usando na
maioria dos casos armas de fogo e sem selecionar vítimas. Blair e Schwieit (2014),
reforçam essa definição descrevendo uma situação de tiroteio que está em
andamento, mas que diferentemente de um crime específico como um assassinato ou
assassinato em massa, o “ativo” implica que tanto a polícia quanto os cidadãos têm o
potencial de influenciar o desfecho do evento, dependendo de suas ações.
A Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC-RJ), em
junho de 2023, realizou uma sequência de palestras em parceria com a Política Militar
do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) sobre o tema “Segurança na Escola”, com o
objetivo de orientar como agir em episódios de violência que envolvam um agressor
ativo na escola. A PMERJ não adota o termo “atirador ativo” devido a identificação, na
realidade brasileira, de ataques predominantemente com outros tipos de armas como
facas, machados etc. Assim, considera-se o termo “Atacante Ativo” para o sujeito que
promove o “Ataque Ativo”.
O termo “Atacante Ativo” foi conceituado na palestra Segurança na Escola –
PMERJ (2023) como alguém altamente empenhado em matar ou tentar matar o maior
número possível de pessoas no menor espaço temporal, me uma área delimitada e
populosa. Entende-se como um evento imprevisível e que acontece rapidamente, não
seguindo padrões ou métodos definidos para seleção de vítimas.
A professora do Departamento de Psicologia Educacional da Unicamp, Telma
Vinha, mapeou os ataques chamados na pesquisa de violência extrema em escola.
Considera que os protocolos internacionais não conseguem dar conta da
complexidade da realidade brasileira e classifica esse tipo de violência como sendo
externas à escola e não na/da escola. A violência extrema à escola no Brasil foi
mapeada a partir de ataques cometidos por estudantes e ex-estudantes, observando
que são sempre atos contra a vida e análogos ao crime de ódio (motivados por
preconceitos, discriminação, racismo, intolerância de um grupo), planejados e tendo
como foco principal, ainda que não exclusivamente a escola. (VINHA, GARCIA, 2023)
Vinha e Garcia (2023) apresentaram um estudo que delineia a evolução dos
ataques extremos em escolas desde 2002 até os primeiros meses de 2023. O que
chama a atenção é o aumento significativo desses eventos nos últimos anos. Em um
período de 21 anos, com um total de 22 ataques registrados, quase metade deles (9)
aconteceu nos dois anos mais recentes, 2022 e 2023.
A pesquisa conduzida por Vinha e Garcia (2023) também traçou um perfil
predominante dos autores desses ataques. São jovens do sexo masculino e brancos.
Muitos deles demonstram uma inclinação para a violência, admiração por armas e
uma busca constante por reconhecimento e valorização perante um público
específico. Além disso, esses indivíduos costumam ter relações interpessoais
limitadas, o que muitas vezes resulta em um isolamento social. Outras características
observadas incluem valores e crenças opressoras, como misoginia, homofobia,
racismo, xenofobia e ideais de supremacia branca. Muitos desses jovens também
apresentam falta de perspectivas e propósitos claros na vida, e em alguns casos,
chegaram a abandonar a escola.
No estudo conduzido por Vinha e Garcia (2023), duas características são
destacadas e merecem atenção. A primeira refere-se à escola como um palco de
sofrimento para os autores desses ataques. Esses indivíduos, muitas vezes, possuem
um histórico escolar marcado por exclusão, repreensões, como suspensões, e
episódios de bullying. Assim, o ambiente escolar torna-se um local de experiências
negativas, potencialmente alimentando sentimentos que culminam em ações
extremas contra a vida dentro desse espaço.
A segunda característica apontada por Vinha e Garcia (2023) é a profunda
imersão desses jovens em subculturas extremistas presentes em "comunidades
mórbidas" de fóruns online. Estes fóruns frequentemente promovem a violência,
misoginia e disseminam ideias neonazistas e discursos de ódio. É importante ressaltar
o possível senso de pertencimento que esses jovens podem desenvolver ao integrar
tais comunidades, onde o ódio é coletivizado. Em um ambiente virtual, eles encontram
uma espécie de refúgio, uma aceitação mútua entre indivíduos com vivências e
sentimentos semelhantes. Assim, enquanto são marginalizados no ambiente escolar,
gerando sentimentos negativos, esses jovens encontram acolhimento e validação ao
expressar seus pensamentos mais violentos em tais comunidades online.

3. ESTRATÉGIA PEDAGÓGICA PARA TOPOFILIA

Em face do contexto apresentado e das angústias decorrentes, percebeu-se a


necessidade de dar um primeiro passo para resgatar uma relação positiva com o
espaço escolar. Esse passo envolveu a identificação dos problemas que dificultam a
construção de relações saudáveis entre os estudantes e o ambiente escolar. Para
isso, foi elaborado o projeto denominado “(Re)Conexão: Amar e Mudar as Coisas para
construir a Escola dos Sonhos”. Este projeto foi organizado em etapas, e cada etapa
continha atividades designadas como passos, culminando na (re)concepção
imaginativa da escola pelos estudantes.
A ação ocorreu no Colégio de Aplicação (CAp) do Instituto Superior de
Educação Professor Aldo Muylaert (ISEPAM) que é mantida pela Fundação de Apoio
à Escola Técnica (FAETEC), instituição pública subordinada à Secretaria de Estado
de Ciência, Tecnologia e Inovação do Rio de Janeiro, dentro do componente curricular
Arte, em duas turmas do curso Médio Regular (1ª e 3ª séries), três turmas do curso
Normal Médio (1ª, 2ª e 3ª séries) e uma turma do curso Técnico em Informática (1ª
série), envolvendo um total de 106 estudantes nas atividades.
Com base no conteúdo sobre Arte Engajada, que apresenta exemplos de como
as artes podem ser empregadas para expressar ideias, o projeto foi concebido sob a
ótica das metodologias ativas de aprendizagem. O protagonismo juvenil, que incentiva
os alunos a assumirem responsabilidade por sua aprendizagem e a se tornarem
agentes ativos de transformação em seu contexto educacional, foi o princípio
orientador. Esta abordagem foi integrada ao Design Thinking, uma abordagem que
promove a solução criativa de problemas.
O conteúdo de Arte Engajada atuou como um estímulo, permitindo que os
alunos se engajassem profundamente na construção e aplicação de seu
conhecimento. Assim, foram estabelecidas etapas que funcionaram como ferramentas
para fomentar a reflexão crítica. Durante o processo, os alunos foram motivados a
identificar desafios, gerar ideias, criar protótipos, testar conceitos e imaginar soluções
em um ambiente colaborativo.
Para a organização e avaliação das atividades, o conjunto de ferramentas do
Google for Education mostrou-se fundamental. Um website foi desenvolvido usando a
plataforma Sites do Google, facilitando o acompanhamento do projeto 2. Além disso,
foram empregados o Google Sala de Aula (Classroom) para registro e avaliação das
tarefas, e o Youtube, tanto como ferramenta de aprendizado quanto como repositório
para o trabalho final. As atividades, tanto individuais quanto coletivas, foram realizadas
ao longo do ano letivo de 2022, durante as aulas de Arte. Estas aulas intercalavam
conteúdos específicos do currículo de cada série com o desenvolvimento do projeto,
que ocorria pelo menos uma vez por mês.
3.1 Descobrir
A etapa “Descobrir” teve como primeiro passo o autoconhecimento e
introspecção, incentivando os estudantes a olharem para dentro antes de considerar
o mundo exterior. O objetivo foi entender os sentimentos dominantes dos alunos,
identificar as causas desses sentimentos e reconhecer na música uma ferramenta
para evocar e processar emoções.
O segundo passo do projeto envolveu a aplicação de um questionário individual

2
Acesse o site do projeto aqui.
com dez perguntas, inspiradas nas ações do programa “Criativos na Escola – Design
for Change”, promovido pelo Instituto Alana. Estas questões abordavam diversos
aspectos da vivência escolar, desde preferências até desafios enfrentados. Além
disso, incentivavam os alunos a refletir sobre os espaços que frequentam e os
momentos marcantes vivenciados na escola. Durante essa fase, muitos estudantes
resgataram memórias positivas anteriormente esquecidas. O simples ato de pausar,
refletir e compartilhar com colegas trouxe à tona momentos significativos que haviam
se perdido na memória.
O último passo dessa etapa focou na identificação de problemas específicos
da escola que os alunos gostariam de abordar. Em uma sessão de brainstorming em
sala de aula, os estudantes listaram diversos desafios, que foram registrados pelo
professor no quadro. Com uma extensa lista em mãos, realizou-se uma votação, na
qual cada aluno escolhia o problema que mais o incomodava. Os problemas mais
votados foram então organizados em uma tabela no site do projeto. Os alunos foram
orientados a formar equipes para pensar em soluções, comprometendo-se a abordar
ao menos um dos desafios mais votados. No entanto, havia a flexibilidade de se
engajarem em mais de um problema, caso desejassem.
Durante a identificação dos problemas em sala de aula, cada turma trabalhou
isoladamente, sem interação entre elas. No entanto, observou-se uma recorrência de
desafios mencionados em todas as turmas. Dentre os problemas comuns, destacam-
se: a falta de higiene e manutenção dos banheiros, a aparência monótona e com
grades da escola que remete a um "presídio", a ausência de eventos como festas
temáticas e torneios esportivos, e comportamentos preconceituosos e agressivos
relacionados ao racismo, homofobia, assédio e bullying.
Outros problemas frequentemente citados incluíram paredes pichadas, a
percepção de que os alunos não têm voz ativa, tarefas “chatas”, falta de conteúdo
relacionado à vida fora da escola, desrespeito entre alunos e professores, falta de
acessibilidade para PCDs e comunicação ineficaz entre docentes, gestão e alunos.
A introspecção e o autoconhecimento desempenharam um papel crucial na
reconexão dos alunos com o espaço escolar. Ao compreenderem seus sentimentos e
desafios individuais, os estudantes se tornaram mais aptos a enfrentar as questões
mais amplas da escola. A abordagem inicial, que envolveu reflexão pessoal e
evocação de memórias positivas por meio do questionário, foi essencial para
reacender uma topofilia anteriormente esquecida.
No entanto, ficou evidente que a presença desses problemas no ambiente
escolar gera um distanciamento entre os alunos e o espaço. Muitos desses desafios,
embora não sejam complexos, exigem uma escuta ativa das necessidades dos
estudantes. Um feedback recorrente durante essa fase foi que nunca haviam
questionado os alunos sobre suas insatisfações na escola. É notável a unanimidade
dos estudantes em comparar a escola a um presídio, o que, sob uma perspectiva
foucaultiana, traz reflexões profundas sobre os sentimentos evocados e as
consequências disso. Essa percepção deve ser uma preocupação contínua para a
instituição.
3.2 Compreender
Na etapa "Compreender", os estudantes foram incentivados a aprofundar seu
entendimento sobre os problemas identificados na fase anterior. Para isso, houve a
introdução de duas ferramentas: a "Árvore de Problemas" e a "Matriz CSD". A primeira,
"Árvore de Problemas", utiliza uma representação gráfica de uma árvore para
desmembrar uma situação-problema (representada pelo tronco) em suas principais
causas (raízes) e consequências (frutos). Já a "Matriz CSD" é uma estratégia que
categoriza informações em certezas (C), suposições (S) e dúvidas (D), tornando o
problema mais claro para todos os envolvidos.
Os conceitos dessas ferramentas foram apresentados aos estudantes em sala
de aula, e eles foram encorajados a explorar mais sobre o assunto por meio de
imagens e vídeos disponíveis no site do projeto. Com esse conhecimento, os alunos
foram orientados a criar, individualmente, sua "Árvore de Problemas" para cada
desafio que desejavam abordar. Posteriormente, em grupos, compararam suas
árvores e desenvolveram uma versão consolidada para a equipe. O mesmo processo
foi aplicado à "Matriz CSD".
A etapa "Compreender" ressalta a relevância de uma abordagem colaborativa
e estruturada para decifrar e abordar problemas. Ao empregar ferramentas como a
"Árvore de Problemas" e a "Matriz CSD", os alunos aprendem a segmentar problemas
complexos, facilitando sua compreensão e a identificação de soluções efetivas. Esta
abordagem metódica é crucial para fomentar a topofilia, pois os estudantes passaram
a perceber a complexidade de certos desafios, que anteriormente pareciam simples.
Isso gera empatia com a gestão e o corpo docente, ao reconhecerem que algumas
situações vão além da responsabilidade direta de gestores e professores.
3.3 Projetar
Na etapa "Projetar", os estudantes foram desafiados a elaborar soluções
críticas e inovadoras para os problemas previamente identificados e analisados. Para
isso, foram introduzidos a duas ferramentas-chave: o "Brainstorm" e o "5W2H".
Iniciando com uma sessão de brainstorming, os alunos tiveram a oportunidade
de sugerir ideias que pudessem resolver os desafios enfrentados na escola. O
principal objetivo dessa fase era encorajar a liberdade de pensamento, acolhendo
todas as propostas como potencialmente válidas. A meta era diversificar as soluções,
construindo-as com base no entendimento adquirido sobre os problemas nas etapas
anteriores. Foi nesse momento que os estudantes reconheceram a importância das
fases antecedentes, pois elas forneceram uma base sólida para a concepção de
soluções, especialmente ao abordar as causas ou consequências dos problemas
identificados.
Após a sessão de brainstorming, os estudantes foram introduzidos à ferramenta
"5W2H". Esta ferramenta é utilizada para estruturar um plano de ação, organizando
as estratégias propostas através de um conjunto de perguntas: O que (What) será
feito?; Por que (Why) é necessário?; Onde (Where) será realizado?; Quando (When)
acontecerá?; Quem (Who) é o responsável?; Como (How) será executado?; e Quanto
(How Much) custará? No contexto do projeto, essas ações estavam voltadas para a
resolução dos problemas identificados. Assim, cada solução proposta foi
acompanhada de um Plano de Ação específico, estruturado com base no "5W2H".
A etapa "Projetar" enfatiza a necessidade de uma abordagem prática e focada
na ação para resolver problemas. Com o auxílio de ferramentas como o "Brainstorm"
e o "5W2H", os alunos puderam converter ideias conceituais em planos de ação
tangíveis. Esse método prático é crucial para fomentar a topofilia, cultivando um senso
de responsabilidade nos alunos e incentivando-os a contribuir ativamente para a
melhoria do ambiente escolar, fortalecendo a conexão entre eles e o espaço.
Embora a expectativa inicial fosse que os alunos concretizassem esses planos,
ao se aproximar do final do ano letivo e observar o desgaste dos alunos em lidar
constantemente com os problemas, decidiu-se encerrar a etapa no plano de ação. O
foco foi direcionado para o prazer de imaginar e sonhar uma escola que se deseja. Os
planos de ação foram compartilhados através da plataforma Classroom, com o
compromisso de serem apresentados à direção e coordenação da escola para futuras
implementações.
3.4 Sonhar
Na etapa "Sonhar", foi proposto um exercício para inspiração e criatividade.
Após discutirem os problemas da escola e planejarem soluções, os estudantes foram
incentivados a visualizar e criar a "Escola dos Sonhos". Esta seria uma representação
idealizada e imaginativa do que eles acreditam ser o ambiente escolar perfeito.
Desafiamos os estudantes a criar uma representação da "Escola dos Sonhos",
seja através de uma maquete física ou utilizando ferramentas virtuais como Minecraft,
The Sims ou qualquer outra de sua preferência. A ideia era usar o espaço atual do
ISEPAM, um espaço (re)conhecido, como base. O objetivo não era apenas modificar
o espaço físico da escola, mas também representar todas as mudanças desejadas,
muitas das quais foram planejadas no plano de ação "5W2H". O intuito era transformar
a escola em um ambiente que despertasse sentimentos positivos.
Reconhecendo o esforço e a dedicação que seriam necessários para o projeto,
que se tornaria o principal instrumento de avaliação do último trimestre do ano, foi
decidido oferecer aos estudantes a liberdade de escolher a forma de conclusão. Eles
tinham a opção de finalizar o projeto "Escola dos Sonhos", desenvolver um Jogo de
Tabuleiro ou Cartas com foco na História da Arte, ou até mesmo realizar uma
performance.
Dos 29 grupos formados, 21 escolheram desenvolver a "Escola dos Sonhos",
6 optaram por criar um Jogo de Tabuleiro ou Cartas, e 2 decidiram por performances.
Esse engajamento demonstra o interesse dos alunos no projeto. A receptividade
positiva da proposta se deve, em grande parte, à liberdade de escolha e à
possibilidade de trabalhar com jogos já populares, como o Minecraft. Para ilustrar, dos
21 grupos que decidiram pela "Escola dos Sonhos", 16 utilizaram o Minecraft como
ferramenta de criação.
Inicialmente, os grupos que escolheram criar a “Escola dos Sonhos” foram
formados dentro de suas turmas específicas. No entanto, foi permitido que os alunos
se agrupassem de acordo com interesses comuns, sem a necessidade de se limitarem
às suas turmas ou séries originais. Isso proporcionou a formação de grupos
diversificados, com membros de diferentes turmas e séries, sempre respeitando um
número máximo de participantes por grupo.
Os estudantes apresentaram seus resultados em vídeos narrativos, nos quais
exibiam ambientes virtuais ou maquetes em formato de gameplay. Esses vídeos foram
compartilhados na plataforma YouTube e estão disponíveis no site do projeto
(DUQUE-PEREIRA, 2022). Em uma data previamente definida, realizamos uma roda
de conversa avaliativa, durante a qual os vídeos foram exibidos para todos. Nesse
momento, os alunos puderam assistir e debater as diversas interpretações da "Escola
dos Sonhos" elaboradas por seus colegas. O engajamento e a qualidade dos
trabalhos foram impressionantes, com reproduções fiel da arquitetura da escola com
as devidas modificações, e muitas das ideias discutidas na etapa "Projetar" foram
efetivamente incorporadas nas sugestões de melhorias.
Além disso, ficou evidente a aplicação de conceitos aprendidos nas aulas de
arte, como linguagem audiovisual, textura, cores e proporcionalidade. As sugestões
dos alunos abrangeram uma série de modificações estruturais. Algumas propostas
eram mais concretas, como a criação de áreas verdes, hortas, rampas e elevadores
para acessibilidade, lixeiras para reciclagem, catracas na entrada, um chafariz
funcional e muros repintados. Outras ideias, mais inovadoras, incluíram a construção
de um heliporto, salas interligadas e a inclusão da bandeira LGBTQIAP+ ao lado das
bandeiras do Brasil e do Estado.
A etapa "Sonhar" enfatizou a importância da criatividade e imaginação no
ambiente educacional. Ao projetar a "Escola dos Sonhos", os estudantes não apenas
reconheceram os desafios atuais, mas também propuseram soluções inovadoras e
práticas. Esta abordagem, focada no aluno, incentivou o trabalho em equipe. Muitos
estudantes relataram dedicação intensa, participando ativamente de videochamadas
e reuniões fora do horário escolar para aprimorar os resultados do projeto e garantir a
melhor entrega possível. Além disso, o projeto reforçou o vínculo dos alunos com o
ambiente escolar. Eles demonstraram um desejo genuíno de ver mudanças e
refletiram sobre como se relacionam, tanto emocional quanto fisicamente, com o
espaço escolar, reconhecendo sua conexão e importância em suas memórias.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste trabalho, exploramos a crescente preocupação com a violência


nas escolas, particularmente os ataques ativos, e a necessidade urgente de
abordagens inovadoras para enfrentar essa questão. Partindo da hipótese que a falta
de laços afetivos com o espaço escolar pode ser um dos agravantes subjacentes
dessa violência, a topofilia, ou elo afetivo de conexão com o lugar, surge como
estratégia potencial para combater essa tendência preocupante.
O projeto “(Re)Conexão: Amar e Mudar as Coisas para construir a Escola dos
Sonhos” serve como um estudo de caso ilustrativo de como a topofilia pode ser
cultivada no ambiente escolar. Através de metodologias ativas de aprendizagem e
uma abordagem de Design Thinking, os estudantes são engajados a identificar e
conhecer problemas da escola, projetar soluções e, finalmente, visualizar e criar sua
“Escola dos Sonhos”. Esta abordagem não apenas permite que os alunos se tornem
protagonistas de seus espaços de convívio, mas também promove a construção de
laços afetivos com o espaço escolar pelo cuidado e projeção de melhorias.
As etapas do projeto demonstram a importância de uma abordagem sistemática
e colaborativa para resolver problemas e a utilização de ferramentas digitais servem
como suporte para uma melhor compreensão, desenvolvimento, organização e
avaliação das atividades propostas.
A violência nas escolas é uma questão complexa que requer soluções
multifacetadas. No entanto, ao focar na construção de laços afetivos em espaços
escolares e incentivar estudantes como agentes de mudança, podemos dar um passo
significativo na direção de uma escola que produz emoções positivas, produzindo uma
identificação dos estudantes com esse espaço. O projeto apresentado serviu como
modelo promissor de como a educação pode ser reimaginada para criar ambientes
escolares mais seguros, inclusivos e próximos dos desejos dos estudantes.
REFERÊNCIAS
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