Você está na página 1de 9

Linha Mestra

Ano VI. No. 21 (ago.dez.2012)


ISNN: 1980‐9026

Bia Porto
Artista visual | designer gráfica | designer de roupas infantis (JayKali)
www.biaporto.weebly.com
www.jaykali.weebly.com

18° COLE
A ESCOLA COMO MEDIADORA NA FORMAÇÃO DA FAMÍLIA LEITORA

Yara Maria Miguel1

Resumo

Nos últimos anos, a temática sobre a necessidade dos alunos se tornarem leitores tem
sido amplamente discutida. No intuito de criar nos alunos o hábito de leitura, as escolas
incentivam que levem livros para casa, e orientam pais e familiares para que leiam para as
crianças. Iniciativas como estas são importantes, porém é preciso considerar que a inserção
das famílias e das crianças na comunidade de leitores não se dá apenas pelo acesso aos
materiais escritos. É preciso criar tanto no ambiente escolar como no familiar uma cultura
letrada. Cultura esta que depende da construção de comportamentos, procedimentos e
habilidades de leitura. Além disso, é fundamental conviver com leitores para continuar lendo.
Este trabalho analisará os impactos e as contribuições da entrada dos livros na casa dos
alunos: os comportamentos, procedimentos e habilidades de leitura incorporadas pelas
crianças nas situações escolares e, que ao serem compartilhadas, são incorporadas por seus
familiares. Nesse contexto, interessa-nos identificar de que forma pode a mediação da escola
contribuir para a inserção das famílias na cultura escrita.

Palavras-chave

Formação de leitores; comunidade de leitores; práticas de leitura.

Abstract

The discussion on the need of turning pupils into readers has been lately extensively
debated. For the purpose of rousing the habit of reading amongst pupils, schools encourage
them to take books home and suggest parents as well as other members of the family read to
their children. Such initiatives are important. However, it is important to consider that the
inclusion of families and children in the community of readers does not take place by solely
providing access to written materials. It is necessary to create at both, school and family
environments, a literary culture. A culture that depends on the breeding of behaviors,
development of procedures and the ability of reading. Besides that, it is fundamental create
intimacy with other readers in order to keep the interest in reading. This paper will examine
the impact and the contribution of the introduction of books in the domestic environment: the
behavior, procedures and reading abilities assimilated by children in school situation and,
when shared, are also assimilated by their family members. In this context, we are interested
in identifying how, through school mediation, families can be included in the literary culture.

Keywords

To cultivate readers; community of readers; reading practices.

1
Formadora do Programa Ler e Escrever da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Pedagoga.
Professora de Educação Básica e Educação Especial.
A ESCOLA COMO MEDIADORA NA FORMAÇÃO DA FAMÍLIA LEITORA

Introdução

“Aprender a ler; ensinar a ler; a importância da leitura para a constituição da cidadania;


a competência leitora como garantia de continuidade na vida escolar.”
Nunca se falou tanto em leitura e, principalmente, nunca se investiu tanto em projetos e
programas para a formação de leitores.
Temos como exemplo o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) cujo principal
objetivo é subsidiar o trabalho pedagógico dos professores por meio da distribuição de
coleções de livros didáticos aos alunos da educação básica. Além desses, há a distribuição de
obras complementares para os anos iniciais do ensino fundamental que têm como objetivo
ampliar o universo de referências culturais dos alunos nas diferentes áreas do conhecimento e,
ao mesmo tempo, contribuir para ampliar e aprofundar as práticas de letramento no âmbito da
escola. São cinco acervos distintos (com 30 títulos diferentes) e um manual, destinados às
salas de aula dos 1º e 2º anos do ensino fundamental. Todas as escolas públicas cadastradas
no censo escolar recebem esses acervos. A Secretaria Municipal de Educação de São Paulo e
A Secretaria Estadual de Educação de São Paulo têm desde o ano 2005 e 2007,
respectivamente, proposta semelhante ao do PNLD.
Outro exemplo é o Projeto Entre na Roda: leitura na escola e na comunidade,
desenvolvido pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária
(CENPEC), que atua na Educação Infantil e Ensino Fundamental, oferecendo apoio a
secretarias municipais, estaduais e a instituições para formar orientadores de leitura, entre
educadores, bibliotecários e voluntários da comunidade para que atuem em diferentes espaços
– escolas, bibliotecas, associações, hospitais, asilos etc. –, estimulando o gosto pela leitura.
Em relação à formação do leitor, Previattelli e Miguel (2010) assinalam que:

O status dado à leitura na escola se deve à importância que esta tem fora
dela. Dessa forma, é sua função institucional formar cidadãos leitores. Para
muitas crianças as bases da experiência leitora são construídas, desde muito
cedo, no interior das famílias, sendo que ler é tão importante quanto brincar
e, por esta razão, os pais possibilitam aos seus filhos o acesso aos livros na
mais tenra idade. Em muitos casos as famílias participam da cultura escrita
há várias gerações.

Contudo, para muitos, o acesso aos materiais escritos se dá fundamentalmente na


escola. Dessa forma, grande parte dos investimentos, está centralizada na formação do leitor
no período escolar. Tanto é assim que, para muitos, a conclusão do Ensino Médio sepulta
definitivamente o acesso à leitura diversificada, à biblioteca, ao convívio com os textos e às
múltiplas possibilidades de encontros e diálogos, que o ato de ler propicia.
O resultado da segunda edição de Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto
Pró-Livro, com o objetivo de diagnosticar e medir o comportamento leitor da população,
apontou os seguintes resultados:

 Número de leitores: 95 milhões;


 Número de não-leitores: 77 milhões;
 Número de livros comprados: 1,2 livro por habitante/ano (o que dá 36,2 milhões de
compradores de livros);
 Número de livros lidos (4,7 livros por habitante/ano).

Por sua vez, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgou no


comunicado nº 129, de 10 de janeiro de 2012 que 5.187 municípios têm bibliotecas públicas,

LINHA MESTRA, N.21, AGO.DEZ.2012 682


A ESCOLA COMO MEDIADORA NA FORMAÇÃO DA FAMÍLIA LEITORA

sendo que 378 municípios não possuem nenhuma. O que justificaria a transformação das
bibliotecas escolares e salas de leitura, por todo o país, em espaço aberto a comunidade.
Temos incentivado nos contextos de formação do Programa Ler e Escrever2, que as
escolas desenvolvam projetos de fomento à leitura, visando à participação da família em
diferentes contextos de leitura. A ideia é que estas desfrutem da leitura, como fazem os que
participam ativamente da cultura escrita.
Consideramos que o caminho inverso, isto é, a participação da escola na construção da
cultura leitora das famílias pode ser fator determinante para a plena inserção dos alunos na
comunidade de leitores, pois a interação com leitores é fundamental, tanto para a formação do
leitor, quanto para que este continue a ler ao longo da vida.

O Projeto Sacola Literária

O Projeto Sacola Literária3, faz parte de um conjunto de propostas de incentivo à


leitura. Inserem- se nesse contexto eventos como: sarau literário, festa literária, hora da
leitura, leitura silenciosa contínua4 e biblioteca aberta (empréstimos de livros para a
comunidade). Todas as escolas da rede estadual de ensino realizam uma ou mais versões
desses projetos.
É importante mencionar que muitas escolas brasileiras realizam projetos e programas de
incentivo à leitura. Elas contam com a parceria de Fundações, Secretarias de Educação e
Cultura, ONGs, entre outros agentes sociais.
Quando iniciamos, em 2007, o trabalho de formação com os coordenadores
pedagógicos e diretores de escola, nossa principal tarefa foi qualificar as propostas
desenvolvidas pelas escolas, tendo em vista, que a maior parte já havia escolarizado as
práticas sociais de leitura.
De maneira geral, a descaracterização da leitura como objeto cultural se dá tanto para as
crianças como para os familiares. É frequente a solicitação, por parte da escola, de atividades
pós-leitura, no intuito de avaliar a compreensão leitora e verificar se de fato estão lendo. As
crianças são comumente incentivadas a desenhar, resumir, já os pais são convidados a
responder questionários e fichas. Diante desse contexto, o papel da formação é o de favorecer
a reconceitualização dos usos sociais da leitura.
No Projeto Sacola Literária, os alunos levam para casa, com certa regularidade, livros
de literatura. Uma variação importante foi a introdução de outras publicações interessantes
para a família, como revistas e jornal. Podemos analisar a inserção de materiais impressos no
universo familiar, a partir das seguintes perspectivas. A primeira, relacionada aos aspectos
afetivos: o contato com a literatura produz encantamento, propicia experiências inusitadas.
Experiências que legitimam seu lugar na comunidade de leitores, ao favorecer a incorporação
de comportamentos, recriar procedimentos, e principalmente experimentar, como diz Colomer
(2007), “a literatura como dimensão socializadora”.

2
Política Pública da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, para as séries iniciais do Ensino
Fundamental. Está alicerçado em três eixos: 1. Acompanhamento institucional através de dois instrumentos: o
mapeamento do processo de aprendizagem dos alunos e um sistema de avaliação externa que ocorre anualmente;
2. Material didático para alunos e professores; 3. Formação profissional.
Uma iniciativa importante desse Programa, foi a criação das bibliotecas de sala de aula para todas as escolas da
rede publica de ensino.
3
Meu primeiro contato com esse projeto ocorreu em 2007, num grupo de formação de municípios conveniados
com a Secretaria de Educação do Estado. Na ocasião, muitas escolas municipais participavam do projeto Entre
na Roda, em parceria com a Fundação Volkswagen e o Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e
Ação Comunitária (Cenpec). Mala literária, Mala viajante, Bolsa literária, são algumas variações desse projeto.
4
“Programa de Lectura Silenciosa Sostenida” de Mabel Condemárin.

LINHA MESTRA, N.21, AGO.DEZ.2012 683


A ESCOLA COMO MEDIADORA NA FORMAÇÃO DA FAMÍLIA LEITORA

A segunda, é que com a leitura restitui-se, aos pais e familiares, o direito de continuar
aprendendo, descobrindo, conhecendo. A leitura pode fazer de nós pessoas melhores, mais
humanas, comprometidas com o próximo, com o coletivo, e com o nosso próprio desenvolvimento.
A terceira, é que a presença sistemática de livros e outros materiais escritos (jornal,
publicações mensais, etc.), permitem que cada família construa, a partir dos saberes iniciais,
significados mais complexos, mais coerentes, sobre os usos sociais da leitura. Paulo Freire
(1983), em seu livro A importância do Ato de Ler, nos diz que “a leitura do mundo precede
sempre a leitura da palavra e a leitura desta, implica a continuidade da leitura daquele”.
Assim, a compreensão de si e do mundo, pode ser profundamente afetada pelas leituras que
fazemos ao longo da vida.
Contudo, Ferreiro (2002) argumenta que “a democratização da leitura e da escrita veio
acompanhada de uma incapacidade radical de torná-la efetiva”, à medida que a escola
pública não possibilitou que muitos pais de alunos se tornassem membros plenos da
comunidade de leitores, como afirma Delia Lerner (2002). Tornar-se leitor é uma forma de
recuperar a dignidade, de assumir conscientemente o papel de sujeitos históricos, após terem
sido precocemente impedidos de fazer parte da cultura escrita, ou de nela permanecer.

O início do Projeto

Conheci a professora Ana Luiza Matielli Campos em 2009, ano em que iniciei o
trabalho de formação pelo Programa Ler e Escrever, com os diretores e coordenadores
pedagógicos da Diretoria de Ensino5 de São João da Boa Vista – Estado de São Paulo.
Naquela época, Ana Luiza era coordenadora de uma escola.
No ano seguinte, foi convidada para participar da equipe técnica da Diretora de Ensino,
onde seria uma das responsáveis pela formação dos coordenadores pedagógicos e pelo
acompanhamento escolar. Como coordenadora, realizou um trabalho com extrema
competência e carinho pelo que fazia. Seu entusiasmo era contagiante! E o mesmo ocorreu na
nova função.
Contudo, no início de 2011 precisou afastar-se da coordenação pedagógica, para
assumir uma classe como professora na Secretaria Municipal de Educação, da mesma cidade.
Desde então mantivemos contato via e-mail, e vez ou outra, visitava sua sala de aula, pois,
coincidentemente, os encontros de formação dos coordenadores pedagógicos aconteciam na
escola em que trabalhava.
Num dos e-mails, sugeri que realizasse o Projeto Sacola Literária com os seus alunos.
Apesar do interesse, comentou que teria dificuldades para iniciá-lo, pois o acervo da sala de
aula contava com poucos títulos. Prontifiquei-me a ajudá-la, começando pela doação de livros
do acervo dos meus filhos, que já são adultos, e outros materiais impressos que tivesse em
casa. Além disso, os alunos contariam com o jornal do dia seguinte, gentilmente cedido pelo
pai dela, e livros e revistas dos filhos pequenos.
Passei a acompanhar o projeto mais de perto, sugerindo alguns encaminhamentos.
Discutimos que por ser um projeto permanente, seria interessante que as crianças
pudessem compartilhar as experiências leitoras com outras pessoas, em situações tais como:

1. A Roda de Leitura

 Semanalmente, nos dias em que as crianças devolvem os livros.

5
Diretoria de Ensino - Órgão regional que representa a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. São 63
DE’s no interior e 28 na região metropolitana.

LINHA MESTRA, N.21, AGO.DEZ.2012 684


A ESCOLA COMO MEDIADORA NA FORMAÇÃO DA FAMÍLIA LEITORA

 Bimestralmente, na reunião de pais. (Comentei que valeria a pena realizar uma leitura em
voz alta e dedicar alguns minutos para fazer a análise do texto, com foco no conteúdo
temático e linguístico para mostrar aos pais como é realizada a atividade com os alunos.)

2. Eventos na escola.

 Aproveitar a Festa Junina para apresentar jograis relacionados ao tema, previamente


memorizados em casa, para ser recitados por pais e filhos.
 Outras festividades em que a família estivesse na escola, também são excelentes
oportunidades para inserir a prática da leitura.
 Ler para outras crianças da escola ou da Educação Infantil.

O Projeto foi batizado de Bolsa Literária, em virtude das argumentações das crianças,
que consideraram os nomes “Mala e Sacola” inadequados, visto que associam “mala” com
“gente chata” e “sacola” com “nada específico, pois pode levar qualquer coisa”.

As experiências do 3º ano H

A classe da professora Ana Luiza contava com 27 alunos, crianças entre 7 e 8 anos. No
início do ano letivo, uma parte dos alunos não escrevia, e lia convencionalmente. Ao final do
primeiro semestre todos os alunos liam e escreviam com autonomia.
A rotina semanal da sala de aula incluía a realização de atividades de leitura para
atender a diferentes propósitos: para obter uma informação; para seguir instruções, por lazer
ou diversão, para estudar, para revisar um escrito próprio ou de outro, para comunicar um
texto a um auditório, para praticar a leitura em voz alta, entre outras práticas sociais de leitura.
Em todas as situações de leitura, a professora trabalhava para que procedimentos,
comportamentos e habilidades de leitura, fossem explicitados, isto é, modelizados por ela,
para que os alunos se apropriassem deles.
A professora articulava o trabalho coletivo, em grupo e individual para que todas as
crianças pudessem se beneficiar da interação cognitiva. Este movimento metodológico
possibilitou aos alunos que a interação com o objeto de ensino, se desse por sucessivas
aproximações. Além disso, considerava as modalidades de leitura mais adequadas para o
desenvolvimento das atividades: ensinar a ler, enquanto lê para os alunos (leitura
compartilhada/colaborativa); propor a leitura individual ou em dupla e questões para
favorecer a construção de sentidos dos textos lidos.
No início do segundo semestre, existiam sete bolsas na sala do 3º ano, o que possibilitou
que todas as crianças levassem para casa, pelo menos uma vez ao mês, livros de literatura,
gibis, revistas e jornais. Segundo a professora, os títulos mais lidos foram: Revista Recreio,
Gibi, Jornal, O Peixe Arco – Íris (Marcus Pfister), Tistu - o menino do dedo verde (Maurice
Druon), revistas femininas, A Ilha Perdida (Maria José Dupré), contos do livro de textos do
aluno - Programa Ler e Escrever6.
Ana Luiza afirma que o projeto trouxe importantes contribuições para os alunos,
destacando, no depoimento que se lerá abaixo, a participação da família:

“Os pais se apaixonaram pelo material levado. Por isso, em nova reunião de
pais, realizamos uma roda de indicação literária entre eles – os pais que não

6
O Livro de Texto do Aluno apresenta uma coletânea de textos de diferentes gêneros, tradição oral: parlendas,
trava-línguas; literários: contos de fada, poemas; textos de divulgação científica; e instrucionais: receitas, jogos e
brincadeiras.

LINHA MESTRA, N.21, AGO.DEZ.2012 685


A ESCOLA COMO MEDIADORA NA FORMAÇÃO DA FAMÍLIA LEITORA

puderam participar, foram representados por um membro da família. Foi um


momento muito significativo e produtivo, pois a princípio, muitos não
conseguiam verificar/encontrar uma função social para a leitura. Alguns não
tinham o hábito de ler, muito menos ler para os filhos. Outros não leem
porque, são analfabetos. Muitos começaram a pedir mais livros, alguns
pediram até doações. Com a melhora significativa dos alunos, os mesmos
bem motivados e encantados com a leitura, produziram coletivamente uma
carta para os alunos da sala ao lado, convidando-os a realizar o projeto. Este,
se iniciará no 2º semestre. Finalizando as etapas do projeto, os alunos
adquiriram comportamento leitor e escritor, leram para as demais salas da
escola e estão fazendo produções escritas cada vez melhor.

Por sua vez, os depoimentos dos alunos recolhidos pela professora são emocionantes,
pois evidenciam o impacto que este projeto teve no âmbito familiar e escolar.
As crianças afirmaram:

“Estou lendo melhor, eu quero até fazer (escrever) um gibi contanto tudo o
que acontece quando a bolsa chega na minha casa. Eu também estou lendo
mais! Leio para meu irmão menor. Quando a bolsa chega na nossa casa,
ficamos reunidos na sala lendo. Minha mãe lê revistas e jornal, eu e minha
irmã lemos livros, gibis e revista Recreio, e meu pai ainda lê pouco, mas
estou animando-o a ler.” (Jorge – 8 anos)

“Estou lendo melhor, minha mãe falou que melhorei muito meu modo de ler.
Também estou descobrindo palavras bem elaboradas para escrever meus
textos. Estou feliz! Mudou também meu conhecimento, pois estou utilizando
a revista Recreio para pesquisar e saber mais. Meu pai também fica com
vontade de ler. O dia que o pessoal da igreja vem na minha casa, aí é um
sucesso, ficamos lendo e brinco com as crianças de escola.” (Larissa)

“Convidei minha tia para ler comigo, ela está me ajudando a ler os livros”
(Weslen )

“Antes eu não lia nada, eu nem tinha livros na minha casa... Agora leio
revistas, contos, piadas...
Ah....Também não sabia ler direito, acho que estou melhorando, não é
professora?” (Welington)

“Mudou tudo!!!! Pois eu não lia nem escrevia direito!” (Wesleu B.)

“Eu estou amando ler os gibis, pedi para a minha mãe comprar alguns, e
quando a professora me dá um, não vejo a hora de chegar em casa para ler. a
turma da Mônica Jovem é bem legal!” (João Gabriel)

“Melhorou a reunião da minha família, pois quando a bolsa chega, nos


reunimos para ler. Meu pai e minha mãe estão se separando, mas quando a
bolsa chega... Todos ficam próximos! A namorada do meu irmão, que está
grávida, amou as revistas sobre bebês, ficamos até tarde lendo. (Maria
Fernanda)

Como se pode observar, este projeto teve impacto significativo nas relações familiares e
na aprendizagem das crianças. Elas aprendem a ler com fluência, desenvolvem proficiência
leitora e estão se tornando bons produtores de textos e, consequentemente, participantes ativos
da cultura escrita.

LINHA MESTRA, N.21, AGO.DEZ.2012 686


A ESCOLA COMO MEDIADORA NA FORMAÇÃO DA FAMÍLIA LEITORA

Promover situações em que a leitura seja constituída de sentido, é condição para


restituir às famílias o direito de continuar aprendendo e, como afirma Luzia de Maria (2010),
a literatura permite:

“(...) tomar contato com o cotidiano de pessoas e de realidades, com as quais


nem sonhávamos (...), mostrando que, por maiores que sejam as diferenças
culturais, o que permanece é o humano. E a literatura segue nos lembrando
que somos habitantes de uma mesma casa, herdeiros de um destino comum,
acima e apesar de tudo, para sempre, irmãos.

Sem desconsiderar a função da leitura no desenvolvimento cognitivo e construção do


conhecimento, para essas crianças a introdução da leitura em casa, cumpriu sobretudo, um
papel afetivo, alicerçado pela construção de novos conhecimentos, possibilidades de diálogo,
troca de experiências, contribuindo indiscutivelmente para o estreitamento das relações
familiares.

Considerações finais

É inegável o valor que a leitura tem no mundo de hoje para o exercício da cidadania e
para o desenvolvimento humano. Entretanto, os investimentos na formação de leitores, são
feitos prioritariamente no período escolar. Não queremos com isso desconsiderar os profícuos
investimentos em projetos de fomento à leitura. Assim, parece-nos necessário enfatizar, como
afirma Grotta (2000), citando Silva (1991), em sua dissertação de mestrado que:

[...] a efetiva promoção da leitura – formação de leitores – depende de


condições que devem estar presentes na sociedade como um todo. Tais
condições pressupõem: convivência com livros, acesso à educação formal,
possibilidade de frequentar uma rede de bibliotecas bem equipada e que
atenda aos seus interesses e necessidades, poder aquisitivo para compra
regular de materiais escritos, tempo para o exercício da leitura, estímulos
para valorizar a leitura como meio de aquisição de conhecimentos, projeto
social orientado para despertar a consciência crítica através da leitura,
política nacional eficiente de incentivo ao hábito da leitura, etc.

É neste contexto que a escola pode cumprir seu papel fundamental, ao tratar a leitura
não somente como objeto de ensino, mas também, e sobretudo, como objeto facilitador de
aquisição cultural, promovendo situações significativas para a plena inserção das famílias, em
parceria com as crianças, na comunidade de leitores. E quando vemos o trabalho da
professora Ana Luiza e de seus alunos, concluímos que isso é plenamente possível!

Referências

BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Língua


portuguesa: orientações para o professor, Saeb/Prova Brasil, 4ª série/5º ano, Ensino
Fundamental. – Brasília, 2009

COLOMER, Teresa. “Andar entre livros – a leitura literária na escola”. São Paulo: Global,
2009.

FERREIRO, Emilia. Passado e Presente dos verbos ler e escrever. São Paulo: Cortez, 2002

LINHA MESTRA, N.21, AGO.DEZ.2012 687


A ESCOLA COMO MEDIADORA NA FORMAÇÃO DA FAMÍLIA LEITORA

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1983.

GROTTA, Ellen B. Processos de formação de leitor – relato e análise de quatro histórias de


vida. Dissertação de mestrado. Faculdade de Educação. Universidade Estadual de Campinas,
2000.

INSTITUTO PRÓ-LIVRO. Retratos da Leitura no Brasil. 2ed, 2008. www.prolivro.org.br


LERNER, Délia. Ler e escrever na escola – o real, o possível e o necessário.São Paulo:
Ática, 2002.

MARIA, Luzia de. “O clube do livro – ser leitor – que diferença faz?” São Paulo: Globo,
2009.

PREVIATTELLI, Wania e MIGUEL, Yara. Projetos de leitura: para além dos muros da
escola. Trabalho apresentado nos congressos: IBBY ( Santiago de Compostela – Espanha,
2009) e Congresso de Pedagogia (Havana- Cuba, 2010).

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO – Programa Ler e


Escrever. http://lereescrever.fde.sp.gov.br/SysPublic/Home.aspx

LINHA MESTRA, N.21, AGO.DEZ.2012 688

Você também pode gostar