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A importância das rotinas escolares,

segundo Doug Lemov:


No fim de 2017, o educador concedeu entrevista ao podcast do portal britânico Tes, no qual fala
sobre a importância de estabelecer rotinas para aprender sobre comportamento e que, assim,
todo aluno prospere. “Às vezes, nossas intenções mais rigorosas na sala de aula são desfeitas
pela falta de atenção aos detalhes mundanos de como as coisas devem funcionar corretamente”,
diz Doug Lemov.

Você fala sobre a leitura como um processo empoderador e libertador. Não é apenas sobre
acessar currículos, acessar a sociedade para a alfabetização. Onde você acha que o ensino
da leitura é certo ou errado nas escolas?
E onde você tenta levá-los a leitura?

A leitura é uma mistura de uma batalha de sobrevivência. O seu maior inimigo é provavelmente o
celular. Toda vez que um aluno senta para ler um livro, tem um aparelho brilhante com sinos e
assobios que busca distraí-lo constantemente e que pode canalizar qualquer informação.

Uma das maneiras que nos colocamos para perder essa batalha é que deixamos a leitura se
tornar um exercício solipsista. Os professores não leem mais em voz alta para os alunos nem
com os alunos.
E eu acho que uma das formas de construir uma cultura de amor à leitura é com professores que
leem em voz alta, trazendo vida para o texto, dando vida a história e deixando os alunos
participarem disso; sentindo alegria ao ler um texto com expressividade e com significado; rindo
juntos nas partes engraçadas e vendo os outros alunos fazendo isso também.

As histórias começaram como um fenômeno cultural compartilhado, muito antes de serem


escritas. Uma das formas de manter essa tradição viva nas salas de aula é através da leitura em
voz alta para e com os alunos. E isso não é algo que acontece mais. Não acontece mais porque,
em muitos casos, as pessoas não acreditam mais que os alunos deveriam ler textos
compartilhados pela turma.

Você deve ler seu próprio texto. Você escolhe o seu livro e escreve o que quiser sobre o livro. Um
problema real é que começamos a acreditar que a leitura é um conjunto de habilidades, e que ler
é sobre perguntar e responder perguntas sobre o texto, e pode ser qualquer texto.
Acredito que o texto importa profundamente. Eu quero comparar as estruturas narrativas do livro
que estou lendo com outro livro que todo mundo leu. Nos Estados Unidos, quase não existe um
livro que eu possa presumir que todo mundo na classe tenha lido. Assim, eu não posso falar
sobre as similaridades e diferenças dos textos.
A escolha do que lemos é vastamente subestimada por escolas e professores. Muitas escolas e
professores enxergam a leitura como um conjunto de habilidades, que é preciso praticar para
fazer inferências sobre o texto. Mas os alunos não podem fazer inferências porque eles não
entendem que uma inferência é fazer uma conexão entre o que está escrito no texto e o
conhecimento que eu tenho.

Na maioria dos casos onde os alunos não fazem uma inferência não é porque eles não sabem o
que é uma inferência – da mesma forma que quando os alunos não conseguem extrair a ideia
principal do texto, não é porque eles não sabem o que é extrair a ideia principal. É porque eles
não conhecem o contexto, não conhecem o vocabulário usado, não experimentaram textos
complexos o suficiente em voz alta, para serem capazes de processar com suficiente memória
ativa para pensar sobre o texto.
Nós, muitas vezes, pensamos que os problemas de leitura são problemas de habilidade, quando,
na verdade, são problemas de conhecimento. Um exemplo: eu estava com a minha filha mais
nova, lendo um dos livros de Little House On The Prairie [Os Pioneiros], uma série literária sobre
o oeste americano no fim dos anos 1800.

A mãe da personagem principal diz para ela: “É noite de quarta-feira. Nós vamos para a cidade
para tomar banho”. E isso é para ser um sinal de que algo muito importante vai acontecer. Então,
perguntei para a minha filha como ela sabia que um evento especial iria acontecer. Ela adivinhou
todo o tipo de coisa, mas não sabia. Ela é uma ótima leitora.

A razão para ela não entender é porque ela não sabia o fato de que, no século 19, no oeste
americano, você tomava banho apenas aos sábados para ficar pronto para a igreja, que era aos
domingos. Isso porque a água era cara e você precisava buscá-la do poço. As pessoas tomavam
banho uma vez por semana na época.

Assim, tomar banho numa noite de quarta-feira era algo muito incomum. A minha filha poderia ter
praticado fazer inferências milhares de vezes, com milhares de livros diferentes e, mesmo assim,
ela não conseguiria fazer aquela inferência específica. Essa inferência é sobre conhecimento.
Geralmente, nós subestimamos sistematicamente a importância do conhecimento na educação.
Passamos a acreditar no argumento falso de que na era do Google, quando você pode pesquisar
qualquer coisa, o conhecimento não importa mais.

Conhecimento é diferente de informação. Você precisa de conhecimento para ser capaz de


processar informação. A falta de um conhecimento sistemático é uma das maiores causas para os
problemas de leitura. Ajudaria os alunos se pedíssemos mais perguntas sobre o texto baseadas
no conhecimento do que fazer as perguntas de sempre.

Isso porque eles conseguiriam construir seu conhecimento com o tempo, tornando-se melhores
leitores. Eu acho que essa é uma das principais razões pelas quais lutamos para progredir com
os alunos, pois ainda vemos a leitura como um conjunto de habilidades formalistas. Eu acho que
a pesquisa é bem clara que esse não é o caso.

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