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A TEORIA DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICO NO DIREITO

BRASILEIRO

A TEORIA DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICO NO DIREITO BRASILEIRO


Revista dos Tribunais | vol. 655/1990 | p. 7 - 11 | Maio / 1990
Doutrinas Essenciais de Direito Civil | vol. 4 | p. 205 - 212 | Out / 2010
Doutrinas Essenciais Obrigações e Contratos | vol. 4 | p. 529 - 536 | Jun / 2011
DTR\1990\86

Clóvis V. do Couto E Silva


Catedrático de Direito Civil na Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Área do Direito: Civil


Sumário:

1. O sistema contratual, próprio às concepções liberais do século XIX, da época em que


se realizaram as grandes codificações do Direito Civil, tinha como valor supremo o
*
princípio da autonomia da vontade.

Colaborava, também, para adoção desse princípio, como fundamento único do Direito
contratual, o fato de as relações econômicas serem estáveis, sem as grandes crises que
se começaram a desenhar na primeira metade do nosso século. Por esse motivo, os
códigos não inseriram, expressamente, outros conceitos limitadores da aludida
autonomia, como o da "clausula rebus sic stantibus"; ou ainda, os casos de lesão
enorme ou enormíssimas que continham, p. ex., as Ordenações Filipinas, (L, IV, tít.
XIII), sendo enorme a lesão que viesse a ultrapassar a metade do justo preço, e
enormíssima quando alguém houvesse recebido a terça parte, apenas, do valor de um
bem. Nesse particular, cumpre aludir ao fato de certos códigos, como o Código Civil
(LGL\2002\400) austríaco, no § 934, conterem disposições a esse respeito,
estabelecendo que uma desproposição significativa entre a prestação e a
contraprestação deverá ocasionar a invalidade do contrato.

2. Ainda quando no século passado se tenha a vontade como o valor supremo, ao ponto
de afirmar-se "qui dit contractuel dit juste", ainda assim houve juristas que se
aperceberam que a estrutura contratual pressupõe, para que possa exercer com
normalidade a sua função de troca, uma relação estreita com a realidade econômica
subjacente.

Essa vinculação com a realidade encontrava seus institutos de maior importância nas
condições, suspensivas e resolutivas, e na teoria da impossibilidade, especialmente na
impossibilidade posterior. Havia quem indagasse, se certas hipóteses de dificuldade (
difficultas) não deviam ser equiparadas à impossibilidade absoluta posterior, tendo o
Código Civil (LGL\2002\400) alemão, no § 275, II, feito essa equiparação, pelo menos
quanto à impossibilidade relativa, uma das espécies de impossibilidade.

3. A dificuldade em razão das modificações econômicas configurava as hipóteses de


aplicação da "cláusula rebus sic stantibus". Essa cláusula tão famosa na história dos
conceitos não foi recebida na maioria das codificações do século passado. Alguns
autores, como Günther Teubner ("Die Geschäftsgrundlage als Konflikt zwischen Vertrag
und gesellschaftlichen Teilsystem, in Zeitschrift für Handelsrecht, 146, 1982, pp. 625 e
ss.), aludem a existência à época de um "rigorismo normativo", na ordem contratual, o
qual pressupõe um sistema econômico e social cujos elementos possam ser objeto de
cálculo com grau elevado de exatidão, e isto somente foi possível, porquanto existiam
condições de mercado eficientes, situações políticas estáveis, um tipo de estado que não
realizou intervenções punctuais na economia e uma moeda estável. Esses são os
requisitos necessários a que o aludido rigorismo normativo realize uma distribuição dos
riscos contratuais.

É óbvio que, presentes essas condições no meio econômico, não se poderia, nos fins do
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século passado e início desse século, cuidar da aplicação da aludida "cláusula rebus sic
stantibus" ou de outro conceito que tivesse a mesma finalidade; depois, porque a
tendência marcada para a generalização dos conceitos, tornava impraticável a aplicação
da aludida cláusula em todo o direito, com o mesmo repertório de significados. Pareceu
ser, assim, a melhor solução não incluí-la nas codificações do século passado e do início
deste século.

4. O princípio "pacta sunt servanda" e a ênfase dada à vontade na teoria dos negócios
jurídicos contribuíram, em grande medida, para que não se adotassem as soluções com
base na mencionada cláusula. h certo que o princípio "pacta sunt servanda" salienta, por
um lado, a obrigatoriedade do contrato, a necessidade de serem cumpridas as
obrigações que dele resultam, o que não merece o menor reparo; por outro, indica, o
que é e sempre foi inexato, a sua absoluta imodificabilidade, ainda quando as condições
econômicas, no curso de sua vigência, se tenham alterado de modo essencial.

5. Seria possível concluir que somente em nosso século é que a questão da base do
negócio jurídico, como atualmente se denomina o conceito relativo à modificação da
realidade subjacente do contrato, teria adquirido autoridade na jurisprudência e na
doutrina.

Porém, ainda no século passado, reacendeu-se a discussão a respeito das relações entre
o contrato e a realidade na qual ele se insere, especialmente quando nela se manifestam
modificações substanciais. A questão parecia ser acadêmica em face da estabilidade da
economia da época; mas ela se realizava dentro do "Direito Comum", ou seja do "Direito
romano atual" à época, propondo-se sempre a questão com base na relevância ou
irrelevância dos motivos, para resolver problemas decorrentes de possíveis alterações do
meio econômico. A solução a essa questão estava, na época, em vinculação íntima com
a teoria do erro. Fazia-se, como ainda hoje se faz, uma distinção nítida entre causa e
motivo, distinção essa, que provém de Baldo, a quem se atribui a criação do termo
causa motivae, em que o termo "motivo" aparece, pela primeira vez, na linguagem
jurídica. Ele se constitui em simples cálculo, probabilidades de que algo venha a ocorrer,
o que, por sua variedade, não pode integrar o conteúdo do negócio jurídico, salvo
menção expressa.

6. Windscheid, para resolver essas questões, criou o termo "pressuposição" (


Voraussetzung), definindo-o como um conceito que tinha como fundamento o fato de as
partes contratantes fazerem depender o seu acordo, ainda que de modo tácito, da
existência de certas situações. Tratar-se-ia de uma "condição não totalmente
desenvolvida, talvez de uma conditio subintelecta - conceito tão de agrado dos
canonistas - pois a condição era tácita. Windscheid incluía no conceito de pressuposição
não somente a hipótese de erro a respeito dos motivos, como também expectativas não
realizadas e ainda certas modificações posteriores das circunstâncias do contrato ("Die
Voraussetzung", in Archiv für die civilistische Praxis, v. 78/161 e ss.).

A crítica que se lhe fez, à época, foi a de que pretendia, na verdade, dar relevância aos
motivos, permitindo pudessem ser objeto de anulação os atos em que as circunstâncias
supostas pelas partes não viessem a ocorrer na vigência do contrato.

Os Códigos, como já se mencionou, não dão relevância jurídica ao motivo e, por isso, o
Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro, em seu art. 90, exara a regra de que "só vicia o
ato a falsa causa quando vier expressa como razão determinante ou sob forma de
condição".

7. Seria razoável pensar que os aspectos subjetivos do contrato - como então se


considerava a sua vinculação com a realidade fora das hipóteses legisladas - em face
dessa orientação estariam completamente excluídos da teoria do negócio jurídico. Mas
assim não sucedeu. Em primeiro lugar, porquanto, no Direito Público, começou a
desenvolver-se a partir de uma decisão do Conselho de Estado da França, de 1916, a
respeito de uma sociedade concessionária de gás e a Municipalidade de Bordéus, e daí
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em diante foi aplicada, progressivamente, a teoria da imprevisão. E, por outro,


porquanto começou a desenhar-se, no Direito Civil, a teoria da base subjetiva do
negócio jurídico, e, depois, a da base objetiva.

A teoria da base subjetiva do negócio jurídico retoma a problemática e a solução


propostas por Windscheid, a respeito da relevância jurídica das modificações das
"circunstâncias do contrato" e a aproxima, pois, da noção de erro. Mas, ainda assim,
apesar do prestígio que lhe deu Oertmann, não se livrou da crítica de que, através dela,
se pretendia introduzir uma hipótese de anulabilidade com base no erro nos motivos.

8. Pensou-se, por igual, em resolver a questão através da hermenêutica integradora,


quando as experiências da interpretação jurídica começaram a tornar-se importantes
para o Direito, o que coincide com a retomada das funções criadoras pelos juízes. Mas
havia sempre a dificuldade de saber como integrar a lacuna do negócio jurídico, pois ele
não continha nenhuma cláusula a respeito das modificações das circunstâncias do
contrato.

Acresce que, além da lacuna do contrato, havia, também, a lacuna da própria ordem
jurídica, pois esta não havia exarado nenhuma norma a respeito. Contudo, parecia certo
que, não se tratando de contrato aleatório, havia necessidade de se distribuírem os
riscos normais do contrato entre os figurantes.

9. Como se cuida de regular o risco nos contratos, logo veio a idéia de considerar as
modificações das circunstâncias como espécie da impossibilidade, a qual, como ninguém
ignora, tem precipuamente essa função. É, aliás, o que sustenta K. Larenz (
Geschäftsgrundlage und Vertragserfüllung, Berlim, 1957, pp. 18 e ss.) ao afirmar que o
conceito objetivo da base do negócio jurídico se vincula com a finalidade real do contrato
e procura responder à questão de saber se a intenção geral dos contratantes pode ainda
efetivar-se, em face das modificações econômicas sobrevindas. Por isso, ela se vincula
com a teoria da impossibilidade.

Em verdade, cuidar-se-ia de uma impossibilidade econômica, porquanto ultrapassados


os limites de que se poderia exigir de uma das partes no contrato, o denominado "limite
de sacrifício" ( Opfergrenze), a espécie se qualificaria como de impossibilidade posterior,
ainda quando ela não estivesse especificamente prevista nas codificações do início do
século, de que é exemplo o nosso Código Civil (LGL\2002\400), embora nos Códigos
mais recentes, como no italiano (arts. 1.467 e ss.), ela apareça com a denominação de
"onerosidade excessiva".

10. A impossibilidade posterior absoluta, como ninguém ignora, se total, resolve o


negócio jurídico (CC, art. 865). As hipóteses de impossibilidade, especialmente nas
obrigações de dar, referem-se, no geral, à perda de um bem, compreendida a perda no
sentido natural, ou seja, a sua destruição, seja ela total ou parcial, que o Código Civil
(LGL\2002\400) denomina de deterioração. Há, por igual, a impossibilidade moral que se
aproxima da aludida impossibilidade econômica, e se refere a um ato a ser realizado. Em
certos casos, é moralmente impossível exigir-se a contraprestação, tendo-se em vista
que o cumprimento, in casu, não teria o menor sentido, como, p. ex., sucede com
alguém que se obrigue a realizar um espetáculo em certo dia, sendo que nesse dia seus
pais faleceram, exemplo didático que ninguém desconhece.

A teoria da impossibilidade poderia ser a fundamentação correta para os casos de


modificação nas circunstâncias do contrato, se não existissem outros princípios que
definissem a relação contratual como uma relação material.

Ainda que não conste de preceito expresso, ninguém ignora a existência em nosso
Direito do princípio da boa-fé aplicável às relações obrigacionais e limite importante ao
princípio da autonomia da vontade (v. nosso ensaio "A obrigação como Processo", São
Paulo, 1976, pp. 29 e ss.). São amplas as suas funções, pois, como princípio
fundamental, ele confere ao juiz poderes para criar novas soluções, dando-lhe um
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suporte sistemático que afasta o simples julgamento por eqüidade, e determina uma
profunda objetivação no conceito de negócio jurídico. Pode-se concluir que a tendência à
objetivação do negócio jurídico acabou por determinar a criação do conceito de "base
objetiva do contrato".

11. Outra questão é a de saber como se desenvolveram, no plano lógico, as condições


necessárias para o surgimento desse novo conceito, fazendo-o independente da teoria
da impossibilidade a que se vinculou por dilatado espaço de tempo.

A tendência inicial da objetivação do negócio jurídico manifestou-se com a adoção da


teoria da declaração, ou mesmo da teoria preceptiva, com o que se deu ênfase à posição
do destinatário da manifestação de vontade.

O conceito de "base objetiva" revela a mesma problemática, com a diferença relevante


de que não se leva em conta a posição de apenas uma das partes do contrato, e, sim, a
de ambos os figurantes. A "base objetiva do negócio jurídico" decorre de uma "tensão"
ou "polaridade" entre os aspectos voluntaristas do contrato - aspecto subjetivo - e o seu
meio econômico - aspecto institucional - o que relativisa, nas situações mais dramáticas,
a aludida vontade, para permitir a adaptação do contrato à realidade subjacente.

Como relação de polaridade entre o contrato e o seu meio, ou entre o seu aspecto
subjetivo e o institucional, não atua ela de modo automático, como sucede com a
"cláusula rebus sic stantibus", pois supõe, sempre, um juízo de valor a respeito da
importância das modificações do meio econômico em que o contrato se situa.

Em razão dessa objetivação, configura-se a base objetiva como um modelo jurídico


próprio e independente, de formação jurisprudencial, deixando de constituir-se mero
elemento de outros institutos, como da teoria da impossibilidade. A sua fundamentação
sistemática está no princípio da boa-fé, podendo o juiz, no caso de rompimento da base
objetiva do contrato, adaptá-lo às novas realidades, ao mesmo tempo que atribui ao
contratante prejudicado o direito de resolver o contrato. Decorrência lógica da faculdade
de adaptar o contrato, está o direito de exigir reparação ou complementação do preço,
quando, não se tratando de relação duradoura, o contrato já houver sido, integralmente,
cumprido (K. Larenz, Lehrbuch des Schuldrechts, II/330, Berlim, 1987, 1, nota 74 b).

12. Um dos setores mais importantes da aplicação da base objetiva do negócio jurídico,
é o da alteração das prestações em razão da inflação, e também o das modificações
resultantes dos atos de Estado de intervenção na economia, como sucede com a fixação
dos preços máximos e mínimos.

A todo o momento, a jurisprudência consagra entre nós, modificações ao princípio "pacta


sunt servanda", bastando mencionar, que o próprio princípio nominalista (CC, art.
1.061), vem sendo progressivamente afastado, por força da correção monetária.
Observe-se o número crescente das dívidas de valor, que não são apenas as dívidas de
"prestar coisas", para ter-se uma idéia da distância em que estamos do princípio da
obrigatoriedade dos contratos, pelo número sempre maior de exceções. Na espécie, há a
convergência dos princípios da base objetiva do contrato com os efeitos do contrato em
que se fixou um preço mínimo. Houve, sem dúvida, infringência ao preço mínimo, ou,
pelo menos, e o que tem o mesmo sentido, a cristalização do preço mínimo não atendeu
aos preços dos insumos necessários à produção, devendo, portanto, ser corrigido para
permitir que os contratos cumpram a sua função.

Essa matéria foi, aliás, objeto de decisão pela 6.ª Câmara Cível do TJSP (Ap. cível
586056548, in RT 630/177 e ss.) e nela afirma-se, excelentemente: "Como quer que
seja, ao menos em teoria, a aplicação das tabelas de conversão limita-se a inverter o
processo bem conhecido dos povos que convivem habitualmente com uma economia
inflacionária; ao invés de aumentarem-se, mês a mês, dia a dia, os valores nominais,
deles deduz-se o que não representa verdadeira mais-valia mas simples aspecto
compensatório da desmonetização. Não tivesse sobrevindo o "Plano Cruzado", no que diz
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com este caso concreto, pode-se ter como certo que, assim mesmo, o presente litígio
surgiria, porque ao tempo do pagamento o preço fixo estabelecido situar-se-ia em nível
inferior ao dos preços mínimos de garantia".

13. No caso de o Estado haver determinado preços mínimos para certos produtos,
salienta Gerd Rinck ("Preisherabsetzung von Hoher Hand", in Archiv für die civilistiche
Praxis, v. 152/503) que "a lei obriga o comprador a cumprir um contrato em condições
diversas das que foram convencionadas. A fixação dos preços modifica o conteúdo do
contrato em seu ponto mais sensível, na relação de equivalência entre a mercadoria e o
preço. A vinculação do comprador no contrato não decorre mais da vontade das partes,
mas da lei; e, pois, ele se configura como um contrato cogente, ou melhor, como um
contrato corrigido".

Pode suceder, entretanto, que o contrato seja realizado em obediência ao preço mínimo,
e, posteriormente, por ato de intervenção do Estado, através de planos econômicos
setoriais, venha o aludido preço mínimo a cristalizar-se, ficando muito abaixo dos preços
dos insumos necessários. Como se há de resolver o problema?

Considera-se como um dos aspectos mais importantes para aplicação do conceito de


base objetiva do contrato a influência dos atos do Estado no controle da economia. Essas
modificações são, no geral, imprevisíveis, porquanto as autoridades governamentais
nunca afirmam que se vai adotar um plano de congelamento. O Estado utiliza-se de
todos os meios para criar a expectativa de que tal não sucederá, para evitar o aumento
antecipado dos preços. Por esse motivo, é impossível prever os efeitos resultantes da
adoção dos malsinados planos, e como se comportarão os preços após o seu término.
Pois todos esses aspectos justificam a aplicação da teoria da base objetiva do negócio
jurídico, para restabelecer o equilíbrio das prestações em face de um eventual
rompimento (Peter Ulmer, "Wirtschaftslenkung und Vertragserfüllung", in Archiv für die
civilistische Praxis, v. 174/167 e ss., especialmente p. 201). Advertem muitos autores
até mesmo que o conceito fundamental no Direito das Obrigações é o da equivalência
das prestações, entendendo-se que a perda de 25% ou de cerca de 50% do seu valor
permite afirmar ter-se rompido a base objetiva do contrato (Kegel, Rupp, Zweigert, Die
Einwirkung des Krieges auf Verträge, 1941, p. 202; Wieacker, "Gemeinschaflicher Irrtum
der Vertragspartner und clausula rebus sic stantibus", in Festschrift für Wilburg, 1965,
pp. 229 e ss.; Peter Ulmer, Wirtschaftslenkung und Vertragserfüllung cit., p. 181).

14. Em suma, a objetivação, o aspecto institucional do negócio jurídico, permite que o


juiz adapte o contrato com mais liberdade; se ele já houver sido cumprido, pode
determinar uma complementação do preço, pois não está adstrito à vontade das partes,
e, portanto, ao princípio "pacta sunt servanda". Deve preencher a dupla lacuna, a do
contrato e a da lei. Para isso, tem de observar não só as soluções legais existentes, mas
também os aspectos de fato. Se o contrato se insere no campo do Direito dos preços, e
se existe um preço mínimo ultrapassado pelo aumento dos insumos normais e
necessários à sua produção, pode o juiz tomar o critério do preço mínimo e adequá-lo à
realidade presente, corrigindo-o, monetariamente, como uma forma de reequilibrar o
contrato, tornando, ainda que somente em parte, equivalentes as prestações. Essa
possibilidade decorre da circunstância de competir ao juiz superar o conflito existente
entre os aspectos voluntarísticos do negócio jurídico e a realidade subjacente, o seu
aspecto institucional, sendo certo que uma profunda modificação nas prestações altera o
"sistema de riscos", essencial ao contrato, e sem o qual ele não pode cumprir a função a
que se destina.

Em conclusão, feitas estas considerações, podemos afirmar que, fora de dúvida, o nosso
sistema jurídico adota a teoria da base objetiva do negócio jurídico, em razão de a
relação jurídica apresentar aspectos voluntarísticos, ou subjetivos, e objetivos, ou
institucionais, resultantes da tensão entre o contrato e a realidade econômica. Esta
tensão constitui, precisamente, a "base objetiva" do contrato.

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* Extrato de parecer.

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