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http://dx.doi.org/10.18224/educ.v25i1.

12449
ARTIGOS TEMÁTICOS
POSSIBILIDADES E LIMITES DO
ATO EDUCATIVO PARA O ENSINO
DESENVOLVENTE: A AUTOFORMAÇÃO
DA PERSONALIDADE COMO EXPRESSÃO
DA LIBERDADE CONSCIENTE*

Armando Marino Filho**


Suely Amaral Mello***

Resumo: este artigo faz uma análise dos limites do ato educativo para o desenvolvimen-
to cultural da personalidade. Compreende que a personalidade deriva do auto movimen-
to dos sujeitos em relação à atividade educativa dos seus modos de ser. Entende que nas
contradições entre as necessidades pessoais e as culturais se estrutura um drama afetivo
emocional do desenvolvimento que tem implicações para o processo de ensinar e para o
processo de aprender. Considera que o ato educativo precisa respeitar o auto movimento
criativo dos sujeitos, mas também, proporcionar as condições materiais e ideacionais no
ensino que se guia pela formação de funções psicológicas superiores como autodomínio
da relação ativa dos sujeitos com o seu mundo. Compreende, por isso, que o ensino
desenvolvente é aquele compartilhado entre educador e sujeito de modo que um não
determina o ser do outro, mas juntos criam e recriam as possibilidades para o desenvol-
vimento de ambos. Nesse sentido, o limite do ato educativo é dado pela necessidade auto
criativa e autônoma, momento no qual o educador passa a ser educado pelas necessida-

* Recebido em: 04.06.22. Aprovado em: 17.10.2022.


** Doutor, Pós Doutor e Mestre pela UNESP, Marília SP. Professor Associado Dep. Educação
UFMS, Três Lagoas, MS. Pós-Graduado em Violência Doméstica contra Crianças e
Adolescentes pela USP, SP. Graduado em Psicologia pela UNIP. Líder Grupo de Pesquisa:
Implicações da Teoria Histórico-Cultural para o Ensino e Aprendizagem CNPQ; Professor
colaborador PPGEDU UFMS- CPTL. E-mail: armando.marino@ufms.br
*** Doutora em Educação. Professora aposentada do departamento de Didática da
Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP. Professora colaboradora do PPGE do
mesmo Câmpus. Membro do Grupo de Pesquisa Implicações Pedagógicas da Teoria
Histórico-Cultural. Co-coordenadora do Grupo de Estudos em Educação Infantil:
teoria e práticas. Assessora da Divisão de Educação Infantil da Secretaria Municipal de
Educação de São Paulo. E-mail: suemello02@gmail.com

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des de desenvolvimento da personalidade dos sujeitos educandos, o que implica que estes
sejam agentes do seu desenvolvimento cultural.

Palavras-chave: Educação. Obutchénie. Consciência. Personalidade.

Pois o desenvolvimento
Não é pré-determinado,
Muito menos é constante
E nem é mecanizado,
Mas um todo tão complexo
Do viver humanizado.

P ouco sabíamos até pouco tempo atrás sobre a complexidade do pro-


cesso de aprender, o que implica a complexidade do processo de en-
sinar. O conhecimento pedagógico produzido e tratado com as categorias
da lógica cotidiana (HELLER, 1991), a partir de uma concepção inatista
de desenvolvimento humano, mais que um obstáculo à formação e ao de-
senvolvimento de capacidades humanas é, e exatamente por isso, um ins-
trumento político de manutenção das relações de poder e dominação que
caracterizam nossa organização social.
À medida que se instala uma nova concepção de ser humano, e que
o desenvolvimento das capacidades humanas como funções psíquicas
superiores é percebido como uma possibilidade condicionada pela vida
concreta - pela agência dos sujeitos, por suas vivências (VYGOTSKY, 2018)
-, em última instância, pela educação sob a forma de condições materiais em
que se dá a vida de cada criança ou aluno, o ato educativo ganha foco. Se o
desenvolvimento humano é uma possibilidade que depende das experiências
vividas e de como cada sujeito percebe essas experiências – o lugar que
ocupa nas relações de que participa (LEONTIEV, 1988), as particularidades
de sua personalidade em formação (VYGOTSKY, 2018), sua situação social
de desenvolvimento (VYGOTSKY, 1996), então o ato educativo precisa
ser planejado, organizado e avaliado para provocar esse desenvolvimento.
Nessa nova perspectiva de uma educação desenvolvente (DAVIDOV,
1988), os elementos que envolvem o ato educativo em sua totalidade se
adensam e a questão central e fundamental que vem embutida nessa nova
compreensão de ser humano e de como ocorre a constituição das qualida-
des humanas é o novo lugar do sujeito aprendente que se configura como

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agente e também protagonista nesse processo. Isso implica diretamente uma
profunda transformação nas relações de poder e dominação que têm carac-
terizado fortemente as relações educador/educando e a cultura escolar como
um todo. O que antes se percebia como um limite do aluno no processo de
aprender com o ilimitado ato educativo, passa agora a ser percebido com
um limite do próprio ato educativo, desafiado a enfrentar a complexidade
do aprender e do ensinar numa perspectiva de promover a formação de
individualidades plenas.

EDUCAÇÃO

Necessidade da Educação

Considerar a necessidade da educação é ao mesmo tempo compreen-


der as condições que se criam na passagem do homem como ser biológico
ao gênero humano. É compreender o surgimento da atividade social, a
transformação da natureza em sua materialidade e em sua significação e
os fenômenos psíquicos que emergem na forma de consciência nos seres
humanos.
A unidade entre esses processos na passagem ao novo gênero é con-
dição para a análise e compreensão dos fenômenos culturais, das formas
de ser que se desenvolveram historicamente, isto é, condição para análise
e compreensão do mundo humanizado da existência material e dos sujeitos
sociais. A unidade entre esses processos significa que eles não existem
independentemente uns dos outros.
Ainda que a materialidade da natureza preexista ao gênero humano,
que a organicidade do ser biológico do homem preexista ao ser social, e que
um sistema de atividade viva confira aos indivíduos singulares uma naturali-
dade em sua orientação psíquica, na passagem ao gênero humano, todos são
transformados pela prática social material dos homens. A natureza material,
biológica e psíquica é transformada pela prática social. É possível, agora,
falar em natureza sociocultural das formas materiais, das transformações
adaptativas do ser biológico e do surgimento de um sistema psicológico
com funções “superiores”, socioculturais de orientação da atividade viva.
É nesse sentido que a educação se apresenta como necessidade da prática
social, como transformação intencional dos próprios homens. A educação, por

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isso, pode assumir muitas formas, intensões e atender a diversos interesses
que historicamente se desenvolveram nas sociedades e diferentes culturas.
Uma condição comum, no entanto, persiste nessas diferentes formas que
historicamente se criaram, as relações de poder e dominação entre os sujeitos
sociais - o poder humano como a capacidade de agir sobre a realidade com
os recursos materiais e ideacionais que os próprios homens criaram, e a
dominação como a capacidade que uma classe de indivíduos adquiriu para
controlar, desviar, e impedir a aquisição, o desenvolvimento e a efetivação
do poder em outros sujeitos. Por isso, concordamos com Mészáros quando
afirma que,

[...] no sentido verdadeiramente amplo do termo educação, trata-se de


uma questão de “internalização” pelos indivíduos [...] da legitimidade da
posição que lhes foi atribuída na hierarquia social, juntamente com suas
expectativas “adequadas” e as formas de conduta “certas”, mais ou me-
nos explicitamente estipuladas nesse terreno (MÉSZÁRÓS, 2005, p. 44).

Dessa citação queremos destacar a ideia do lugar que os indivíduos


ocupam e das formas de conduta, e como a educação orientada para essa
finalidade está relacionada ao desenvolvimento da personalidade, mesmo
que os professores não tenham consciência disso, nem tomem essa intenção
como sua própria e orientadora de seu trabalho Isso, nos remete diretamente
às intenções do ato educativo nos processos de ensino na atividade escolar,
como esta atividade é educativa na medida que é também instrução, for-
mação e transformação dos sujeitos ali envolvidos. A intencionalidade que
subsidia o ato educativo na prática de ensino - mesmo na ausência de uma
intenção claramente explicitada ou mesmo compreendida pelos professores
- tem implicações para o desenvolvimento de todos os sujeitos envolvidos.
Assim, compreender o ensino desenvolvente demanda uma discussão sobre
a unidade, os limites e o lugar que como sujeitos, individualidade e perso-
nalidade, o indivíduo ocupa.
Considerar os seres humanos como sujeito, indivíduo e personalidade,
significa que consideramos essas três manifestações categorias do mesmo
ser como totalidade. Por isso, uma não pode ser compreendida sem a outra
e nem o ser como totalidade sem o dinâmico movimento de transformação
e transição de uma em outra. O mesmo acontece quando queremos com-

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preender a prática social transformadora, isto é, a sociedade como totalidade
nas suas diferentes categorias e formas de existência. Por isso, educação,
ensino e desenvolvimento consciente dos indivíduos, como categorias do
ser social, constituem, da mesma forma, uma unidade.
Uma condição essencial para tal desenvolvimento se apresenta
como atividade entre os homens, isto é, não de um homem isolado, ou
deste sobre o outro, mas dos homens em cooperação. A cooperação,
como um dos fundamentos do ensino desenvolvente, indica que uma
transformação e transição na forma de ser dos sujeitos está em curso,
e este processo se distingue substancialmente do que ocorre quando a
cooperação é negada no processo de ensino. Nesse caso, a dominação do
educador/professor sobre o educando condiciona o desenvolvimento da
consciência de ambos, determina a imposição do método pelo educador
e produz a alienação do educando e do educador. No caso da educação
orientada para a cooperação, educando e educador/professor produzem
juntos algo novo para ambos, um método para o educador e conhecimento
e formação e desenvolvimento da personalidade como individualidade
para si para o educando. Por isso, a orientação da intencionalidade co-
laborativa condiciona as transformações.
A singular cooperação entre a criança e o adulto é o aspecto crucial
do processo de instrução, junto com os conhecimentos que são transmitidos
à criança segundo um determinado sistema. [...] durante o desenvolvimento
desta cooperação amadurecem as funções psíquicas superiores da criança com
ajuda e a participação do adulto (VIGOTSKI, 2000, p. 183, tradução nossa).

Ato Educativo x Intencionalidade

O ato educativo, portanto, e em qualquer das suas categorias, como no


nosso caso o ensino na atividade escolar, implica desde o princípio a comu-
nidade e a cooperação entre os sujeitos. Comunidade uma vez que a intenção
atenda às necessidades e ao desenvolvimento de todos, cooperação uma vez
que trabalhem juntos para produzir objetivamente esse desenvolvimento.
A realização efetiva do ato educativo requer, ainda, que a consciência seja
o principal conteúdo da intencionalidade posta a princípio como motivo e
produto de tal atividade. A ausência dessa intencionalidade que tenha como
meta a produção da consciência para si é a imediata negação dos sujeitos

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agentes, ou, a produção de sujeitos sujeitados, visto que dela somente uma
consciência alienada resulta.
Essa consciência alienada implica uma autonomia do sujeito limitada
a operações com signos na esfera da lógica cotidiana (HELLER, 1991), ao
uso de pseudoconceitos em lugar do desenvolvimento do pensamento teórico
conceitual sobre a realidade. É preciso distinguir entre essas duas formas de
pensamento para considerar o desenvolvimento. Na forma cotidiana do pensa-
mento produzido com as categorias da lógica cotidiana, a realidade está dada
na forma como se apresenta imediatamente, marcada pela ausência de reflexão,
pelo pragmatismo, pela economia de esforços, pelo espontaneísmo. Por isso,
a análise que se realiza não vai além da constatação das relações aparentes,
pragmáticas, que limita o pensamento a operações com os objetos. Por outro
lado, o pensamento teórico, indo além da aparência imediata, alcança conhe-
cer a realidade em seu movimento de existência multideterminado. Por isso,
essa forma de pensamento habilita os sujeitos a operar sobre os objetos com
o pensamento e em sua transformação conscientemente orientada. De acordo
com Leontiev (1978, p. 35-36) “[...] na forma desenvolvida do pensamento
teórico – a atividade de pensar transcorre sem contato direto com os objetos
do mundo material”. Isso ocorre porque, como explica Davidov,
A essência do pensamento teórico, consiste em que se trata de um
procedimento especial com o qual o homem aborda a compreensão das
coisas e dos acontecimentos pelo caminho da análise das condições de sua
origem e desenvolvimento (DAVODV,1988, p. 6, tradução nossa).
Desse ponto de vista,

[...] descobre as conexões internas como fonte dos fenômenos observados.


As ações que estabelecem as conexões entre o externo e o interno (singular
e universal) constituem a base da compreensão do objeto. O seguimento
do processo de formação do concreto, com a ajuda de tais ações, é o
pensamento, realizado em forma de conceitos, quer dizer, o pensamento
teórico (DAVIDOV, 1988, p. 138, tradução nossa).

O mundo social x mundo pessoal

Do ato educativo e sua intencionalidade deriva, ainda, que o desen-


volvimento da atividade pensante com e sobre os objetos é subjetivada

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como atividade reflexiva sobre o seu próprio lugar como sujeito, os motivos
e sentidos psicológicos que se integralizam nele, em seu sistema psico-
lógico. Quando analisa os resultados dos seus atos na realidade na forma
de sentimentos, afetos, emoções, e conhecimento ocorre, a final, que ele
generaliza a sua relação com o mundo social e culturalmente criado em
torno dele. O reflexo psíquico da atividade do sujeito sobre o seu objeto,
mediada pela prática social é, portanto, a síntese em forma de imagem
ideal da unidade da experiência viva com o seu mundo, que resulta em
sua personalidade.
As implicações da intenção do ato educativo estão, nesse sentido,
diretamente relacionadas à formação da personalidade. Não queremos
dizer com isso que ela determina inteiramente essa formação. Queremos
destacar o fato de que a personalidade se forma nas relações com os outros
e suas intenções, com o meio e com a qualidade da mediação pedagógico
instrucional da atividade educativa. Participando dessa atividade, tanto
educador quanto educando estão sempre processando em forma afetiva,
emocional e cognitiva as suas vivências individuais. Essas vivências que
resultam em desenvolvimento das funções psicológicas superiores, como
afirmou Vigotski (2000), são funções da personalidade.
Disso resulta que, de fato, cada indivíduo experiencia a duplicidade da
sua existência como individualidade de sujeito/sujeitado no mundo social e
como um sujeito/agente que faz escolhas e cria determinados fins para a sua
existência. Repkin (2003, p. 14, tradução nossa) afirma que “[...] na atividade
de estudo [...] tanto o objetivo como o resultado não são um produto externo,
mas mudança dentro de si mesmo como agente/sujeito da atividade”. Na
formação e desenvolvimento da sua individualidade por meio da atividade de
ensino, pode dar-se conta da unidade entre essas duas formas de existência -
social e pessoal -, ou, por outro lado perceber o mundo e a si mesmo de forma
fragmentada. A autoconsciência em si, neste último caso, reflete de forma
espontânea e naturalizada a existência de si como um indivíduo entre outros,
de forma individualista. Por isso, como considera Golubovi,

É a subjetividade, como fenômeno novo, que se torna o fator mais im-


portante da dinâmica social contemporânea. Nesse contexto, a distinção
entre dois sistemas opostos de valores - um heterônomo e outro autôno-
mo - torna-se muito significativa para compreender as possibilidades

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de desenvolvimento de pessoas livres, isto é, de emancipação do homem
como sujeito (GOLUBOVI, 1998, p. 94-95).

Ser com o outro, ser social, significa antes de tudo que a produção
da vida não é independente e que o desenvolvimento expressa essa relação
de unidade, identidade e diversidade entre os sujeitos. Queremos destacar,
por isso, que a relação não é unidirecional quando se pensa na atividade de
ensino desenvolvente. Em outras palavras, será desenvolvente a situação
de ensino que promova desenvolvimento para todos os seus participantes.
Observamos, ainda, que esse desenvolvimento é multilateral, envolve todas
as funções psicológicas que dão forma e conteúdo ao sistema de orientação
na realidade sociocultural por meio da criação e autocriação da personali-
dade humana.
É próprio da análise de todos os fenômenos socioculturais compreen-
der em unidade a sua materialidade, a prática social e a consciência que
nasce nessa relação dos homens entre si, e no processo de transformação da
natureza que existe sem a intervenção humana. A materialidade do ensino
escolarizado refere a que, no princípio utiliza objetos materiais cultural e
historicamente criados pelos próprios homens. O ensino, que conduz ao
desenvolvimento pode ser considerado como a prática social na qual ocorre
a transformação daquela materialidade e dos sujeitos como consciência.
A consciência entendida aqui como atividade consciente, isto é, atividade
concreta material e subjetiva na forma de generalização ideal, por meio da
significação, da prática material do ser social.

Destacamos a consciência da criança entendida como sua “relação


com o mundo” (Marx) e a consideramos produto das mudanças físicas
e sociais do indivíduo, como a expressão integral das peculiarida-
des superiores e mais importantes da estrutura da personalidade,
veremos que na transição de uma idade a outra crescem e se desen-
volvem nem tanto os aspectos parciais, isolados, da consciência ou
algumas funções e modos de sua atividade, mas, em primeiro lugar,
se modifica a estrutura geral da consciência que em cada idade se
distingue por um sistema determinado de relações e dependências
entre seus aspectos isolados, entre as distintas formas de sua atividade
(VIGOTSKI, 2000 p. 263).

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Sujeito e Consciência social

A relação entre a consciência e o ser sujeito tem como ponto de par-


tida a sua atividade social e, nessa atividade social, o desenvolvimento da
autoatividade de generalização dos afetos e emoções ligados ao conheci-
mento da realidade pelo sujeito – ele próprio condicionado por sua história
anterior, por sua situação social de desenvolvimento, pelos afetos e emoções
anteriormente vividos. Por isso, a consciência do sujeito não é a reprodução
integral da consciência social, não é uma repetição desta. Em diferentes
sentidos os conteúdos que estão sendo generalizados pelo sujeito entram
parcialmente na atividade consciente sob a forma de diferentes processos
intelectuais como percepção, discriminação, classificação, por exemplo,
que necessariamente são motivados pela relação afetiva, isto é, aquilo que
em dado momento tem valor para a personalidade, aquilo que responde
às suas necessidades - social e culturalmente criadas e transformadas em
sentido pessoal.
Por isso, a unidade entre sentido social e sentido pessoal da significa-
ção psicológica nunca coincidem plenamente. Somente no comportamento
alienado do sentido pessoal, isto é, na ausência de unidade da diversidade
dos sentidos social e pessoal, no automatismo reprodutivo do cotidiano,
externamente o comportamento responde inteiramente ao sentido social.
Como afirma Repkin (2003, p. 13, tradução nossa) “[...] o sistema educa-
cional tradicional [...] realiza tarefas educacionais puramente funcionais.
Ele não dá o impulso necessário para o desenvolvimento humano e auto-
desenvolvimento. ” Assim, o sujeito pode executar uma ação que responde
àquilo que é esperado pela significação da situação social. Porém, o que
se espera do ensino desenvolvente não é que o sujeito possa responder a
uma ou outra exigência da situação social, no sentido de que as suas ações
sejam aquelas esperadas pelos outros. Do ensino desenvolvente, espera-se
que, respondendo de forma adequada àquilo que socialmente faz sentido na
situação, o sujeito o faça com plena consciência e domínio consciente da
totalidade da atividade na qual toma parte, do seu lugar de sujeito agente
das necessidades sociais, mas também, das necessidades pessoais às quais
responde com suas ações.
A autoconsciência, o autodomínio da conduta e a autonomia para
tomar decisões e operar na atividade como uma atividade que também é

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própria, e não apenas para o cumprimento de uma tarefa para responder
à exigência de outra pessoa, como o professor, por exemplo, constituem
finalidades do ensino desenvolvente. É nesse sentido que expressamos a
liberdade da consciência que precisa se formar em tal ensino. A liberdade
não se apresenta aqui como uma liberação do compromisso social dos su-
jeitos, ao contrário, quando o ensino envolve o ser comunitário que produz
em cooperação, o sujeito está livre para recriar essas mesmas relações hu-
manizadoras, está livre para a sua transformação criativa. A personalidade,
então, não resulta no paradoxal individualismo da existência social, mas em
uma personalidade de nível superior voltada para a humanização de todos,
porque consciente da sua unidade com os outros sujeitos que compõem a
sua própria existência, opera no domínio da sua própria vida. Nas palavras
de Löwy (1987, p. 200) “[...] o “reino da liberdade”, isto é, a dominação
consciente e racional dos homens sobre a sua vida social. ” Como explicita
Golubovi,

[...] Marx não apresentou essa contradição entre história e existência


individual como fatal. Sua mensagem é a seguinte: os homens não são
necessariamente livres e criativos mas podem se tornar graças a essa
capacidade especificamente humana de agir como produtor. Para rea-
lizar essas potencialidades, os homens devem tornar-se conscientes das
suas capacidades e das suas contradições inerentes, assim como das
contradições do mundo (GOLUBOVI, 1998, p. 93).

Sujeito e Autoconsciência

A reflexão é uma qualidade especial no surgimento da atividade


consciente que possibilita ao homem perceber o mundo dos objetos em
diferentes gêneros de relações, perceber as transformações por que passa,
suas conexões e interrelações por meio da significação social da atividade
cooperativa. Esta se diferencia daqueles processos mais primários do re-
flexo psíquico da relação objetiva dos indivíduos. A reflexão implica que o
indivíduo pode perceber a si mesmo como sujeito/sujeitado e sujeito/agente
ao mesmo tempo, nos pequenos atos e nas mais complexas ações da sua
atividade. A reflexão é a fonte, ainda, da autovaloração consciente, isto é, da
capacidade de incluir a si mesmo em um gênero de relações que refletem a

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qualidade dos efeitos que suas ações produzem tanto na realidade objetiva
quanto na sua subjetividade.

A segunda característica da consciência é a consolidação da distinção


precisa entre o sujeito e o objeto, isto é, o que pertence ao “eu” da
pessoa e ao “não eu”. [...] O homem é o único entre os seres vivos que
tem a capacidade de introversão, isto é, dirigir a atividade psíquica à
análise de si mesmo. O homem realiza uma autovaloração consciente
de seus atos e de si mesmo. A diferenciação do “eu” do “não eu” é um
caminho que cada pessoa percorre na infância e culmina no processo
de formação da autoconsciência do homem (PETROVSKY 1986, p.
44, tradução nossa).

Podemos, ainda, apontar para uma consequência essencial do pro-


cesso de autoconsciência e autovaloração na atividade reflexiva, o fato de
que da mesma forma que o sujeito age sobre a realidade objetiva, age como
sujeito de si e sobre si mesmo. Isso, significa que obedece à sua consciência,
reflete a valoração que reconhece como sendo de si mesmo naquilo que
faz e, portanto, é capaz de agir em sua própria transformação com base nos
valores que atribui a si mesmo na relação com os outros homens e objetos.
“A reflexão, disse Busemann, pode influir sobre o sujeito modificando-o
(autoformação) [...]” (VIGOTSKI, p. 242, tradução nossa)”.
Aqui podemos afirmar a profundidade da expressão marxiana da
consciência que afirma que “a minha consciência é a minha relação com o
mundo”, a minha relação com o mundo se transforma em relação comigo
mesmo. A transformação do meu mundo pela minha atividade significa
a minha transformação também, mas uma transformação que emerge das
minhas escolhas conscientes e da minha vontade. Não queremos com
isso afirmar um individualismo nessa autoformação. Sabemos que a au-
toatividade dos indivíduos reflete a sua atividade de sujeito social, que
reproduz subjetivamente as formas e conteúdos dessa vida, nunca é uma
produção absolutamente original de natureza não cultural. Mas é um ato
de autocriação histórica, como base ontologia do ser pessoal. Ela entra
em conexão com a formação das funções psicológicas superiores que
constituem a marca sociocultural da formação da personalidade. “Todas as
funções psíquicas superiores são relações interiorizadas de ordem social,

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são o fundamento da estrutura social da personalidade (VIGOTSKI, 1996
p. 151, tradução nossa)”.
O desenvolvimento psíquico que resulta de um ensino desenvolvente
é, portanto, o desenvolvimento de todas as funções da personalidade que
condensam em forma generalizada a relação sociocultural do ser individual
em sua plena significação. O que isso quer dizer? O sujeito em desenvol-
vimento por meio desse tipo de ensino se apropria das funções da signifi-
cação como funções da personalidade de forma integrada. A síntese dessa
significação representa o lugar que o indivíduo ocupa, suas necessidades,
interesses, tendências e intencionalidade.
A significação é, portanto, o núcleo comum de todo ensino desenvolven-
te nas suas diferentes possibilidades e sistemas que, por necessidade histórica
e contextual, possam ser criados. Ter esse núcleo comum como fundamento
do processo de formação do sistema psicológico não limita ou determina um
objetivo comum às diferentes possibilidades de organização desse tipo de
ensino. Os sistemas de ensino podem estar orientados ao desenvolvimento
do pensamento teórico (Sistema Elkonin-Davidov-Repkin), ou a formação
gradual dos processos mentais (Sistema Galperin-Talizina) ou, ainda, ao desen-
volvimento geral como a inteligência, sentimentos e valores morais (Sistema
Zankov) (NECHAEVA, 2020, p. 820). Assim, é possível a diversidade de
intencionalidades baseadas em um mesmo princípio desenvolvente. Esse fato é
relevante quando precisamos planejar uma prática social de desenvolvimento
em diferentes circunstâncias socioculturais. Em diferentes tempos históricos,
locais, regiões e necessidades será exigido de uma Obuchiéne desenvolvente a
atividade cooperativa e comunitária desse sistema com a participação de todos
os sujeitos, para a sua transformação multilareral. É claro para nós que, por
esse motivo, a Obuchiéne não pode ocorrer na forma de transposição de uma
cultura para outra. A Obuchiénie desenvolvente, concretamente coerente com
a vida dos sujeitos, precisa, antes de tudo, ser um ato de criação comunitária,
uma expressão da liberdade consciente dos sujeitos nela envolvidos.

Consciência como Sistema Integrado de Orientação Psicológica

A consciência é um fenômeno complexo e decisivo para a compreen-


são do ser social. O trabalho na complexidade da sua atividade, a produção
de instrumentos e de ferramentas, a comunicação e a linguagem, as afetações

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e emoções, o pensamento e o surgimento de motivos, da simbolização, etc.
constituem parte daquilo que pode ser relacionado a ela. Entretanto, toma-
remos aqui uma das suas características que consideramos importante para
o que estamos discutindo: o seu caráter sistêmico e de estrutura integrada.
Como explicita Leontiev,

é uma condição indispensável à evolução da consciência do homem


novo: o sentido novo deve com efeito realizar-se psicologicamente nas
significações, pois um sentido não objetivado e não concretizado nas
significações, nos conhecimentos, é um sentido ainda não consciente,
que não existe ainda totalmente para o homem. [...] A estrutura interna
nascente da consciência, a sua nova “formação”, caracteriza-se, antes
de mais, por esta nova relação entre sentido e significações. Não é de
modo algum um retorno à sua coincidência inicial, à sua fusão pura e
simples. Esta nova relação conserva a forma desenvolvida de passagens
complexas de uma para a outra. Há como que uma rotação do plano dos
sentidos que abole o fenómeno de desintegração da consciência. Agora,
a consciência humana apresenta uma estrutura integrada (LEONTIEV
1978, p. 136, tradução nossa).

Essa compreensão é essencial para estabelecer a relação entre o núcleo


central do ensino, a significação, e a prática social pela qual a Obuchénie de-
senvolvente pode acontecer. Compreendemos que a consciência se constitui
pelo processo de integração dos sentidos afetivos, emocionais e cognitivos
na significação social da atividade dos sujeitos. Assim, na atividade pela
qual as pessoas estão se desenvolvendo, a integração desses sentidos da
sensibilidade no sistema de significação social indica as diferentes formas
que o desenvolvimento social do indivíduo pode adquirir. Indica, ainda, suas
implicações para a formação da personalidade, visto que o seu núcleo se
encontra no sistema “eu” que é essencialmente formado pela síntese afetivo,
emocional e cognitiva que os indivíduos criam para si a partir da valoração
pessoal que atribuem à significação social. Uma síntese generalizada de
conhecimentos e afetos.
A integração dos sentidos pessoais na significação social resulta
em integração do próprio sujeito na dinâmica da vida social. Quando
os sentidos pessoais encontram uma conexão com os sociais, isso é, sua

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relação com o mundo que é orientada pelo significado social, as ações
dos sujeitos estarão integradas no sentido social das ações e da atividade
objetivada. Transformam-se em conscientes pelo fato de representarem a
relação própria do indivíduo com o meio social. Tal integração ocorre pelo
processo de generalização e formação de conceitos das atividades nas quais
toma parte. A generalização é a integração das ‘impressões dispersas’ na
realidade em um sistema de relações. De acordo com Vigotski (2001, p.
220, tradução nossa), “[...] o pensamento da criança complexifica objetos
particulares que ela percebe, combina-os em determinados grupos e, assim,
lança os primeiros fundamentos de combinação de impressões dispersas, dá
os primeiros passos no sentido da generalização dos elementos dispersos
da experiência [...].”
O sentido dessa generalização é que ela está direcionada ao emprego
funcional na orientação psicológica objetivada na palavra quando o sujeito
estabelece relações sociais, e inclusive, consigo mesmo (VIGOTSKI, 2001).
Por isso, o desenvolvimento social da criança significa que está ocorrendo o
domínio dos processos de integração das percepções dispersas, que aparecem
na forma de uma realidade caótica, em sistemas de orientação psicológica
na realidade sob a forma de integração de si no movimento concreto des-
sa realidade com os outros. Compreendemos, assim, que de acordo com
Vigotski (2001, p. 290, tradução nossa), “[...] a tomada de consciência se
baseia na generalização dos próprios processos psíquicos, que redunda em
sua apreensão. Nesse processo manifesta-se, em primeiro lugar, o papel
decisivo do ensino.

Assinalamos a consciência da criança como sua “relação com o meio”


(Marx) e a consideramos produto das mudanças físicas e sociais do
indivíduo, como a expressão integral das peculiaridades superiores
e mais importantes da estrutura da personalidade, veremos que na
transição de uma idade a outra crescem e se desenvolvem não tanto
os aspectos parciais, isolados, da consciência ou algumas funções
e modos de sua atividade, quanto, em primeiro lugar, se modifica a
estrutura geral da consciência que em cada idade se distingue por um
sistema determinado de relações e dependências entre seus aspectos
isolados, entre as distintas formas de sua atividade (VIGOTSKI, 2000,
p. 263, tradução nossa).

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A FORMAÇÃO DO INDIVÍDUO E PERSONALIDADE

Compreendendo a formação do indivíduo como pessoa por meio do


conceito de totalidade, o ensino desenvolvente não poderia limitar-se a uma
ou outra função intelectual, ou ainda a uma habilidade ou competência.
Nesse sentido, ele está relacionado ao desenvolvimento em unidade dos
sujeitos e, portanto, da própria sociabilidade entre eles. Retomamos a
importante condição mencionada acima, sobre a duplicidade de existência
dos indivíduos como sujeitos sociais e personalidades, para apontar para os
limites do ato educativo que aparecem quando, a partir das necessidades
da personalidade, os sujeitos precisam, entre si, considerar criativamente a
transformação das relações sociais. O ensino desenvolvente não está dado
definitivamente para uma sociedade cristalizada na sua forma de ser, mas
encaminha os sujeitos para a criação de uma nova sociedade. Concordamos
com Golubovi quando afirma que,

[...] tal distinção implica duas vias diferentes no processo de formação


da personalidade: na primeira, determinadas relações entre os indiví-
duos e a sociedade e a cultura, no sentido de acomodação do indivíduo
às normas sociais, são definidas fora e lhes são impostas; ao passo que
a segunda implica o funcionamento das instituições sociais e culturais
através da satisfação das necessidades fundamentais dos indivíduos
concretos. Significa que são oferecidas chances iguais a todos os in-
divíduos, ótimas em um nível historicamente dado, para realizar suas
capacidades pessoais. Os potenciais subjetivos e as condições objetivas,
neste caso, não estão em oposição, mas, ao contrário, representam duas
partes complementares e necessárias para um desenvolvimento interior
da personalidade bem como da sociedade (GOLUBOVI, 1998, p. 95).

O meio como fonte e a personalidade como finalidade do ensino ca-


minham juntos, não se sobrepõem um ao outro. Por isso, a intencionalidade
não pode se restringir às do educador. É preciso que este altere as finalidades
postas por ele considerando as necessidades das crianças, de modo que um
diálogo produtivo emerja da situação social na qual a obutchénie se forma.
Nesse sentido o educador aprende com as crianças sobre o conteúdo neces-
sário para o ato educativo no qual a personalidade se cria em comunidade.

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DESENVOLVIMENTO DO SER SOCIAL E DO SER PESSOAL
- OBUTCHÉNIE

Duas categorias importantes para a análise das formas de ser são as


transformações e transições. Entendemos essas categorias como processos:
primeiro de acumulação parcial de novos componentes que não alteram sis-
temicamente um gênero de existência e, segundo, a mudança para um novo
gênero de existência que se configura mediado pelas múltiplas transforma-
ções internas e mediações externas. Assim, as formas de ser expressam essas
duas formas de movimento que constituem, de forma geral, a sua história.
Essas categorias estão interrelacionadas como mediações que
encaminham ao surgimento de algo novo. De forma simples, podemos
compreender que um fenômeno só existe interconectado com outros, que
são os meios pelos quais ele se formou. Compreende-se, assim, a sua mul-
tideterminação - ainda, que essa multideterminação adquire o caráter de
sistema de relações que se configura como totalidade, isto é, a conjunção
da diversidade das partes e unidades que o constituem.

Processos de Transição das Formas de Ser

Por meio desse movimento de desenvolvimento daquilo que existe é


possível a compreensão da personalidade como algo que surge e se renova
como sistema e totalidade representativa da vida individual na existência
social. A personalidade, dessa forma, é o escopo do ensino desenvolvente,
no sentido em que este não reduz o objetivo do seu processo a algum aspecto
parcial da vida dos sujeitos, determinadas funções psicológicas, como memó-
ria, atenção, leitura, conhecimentos, por exemplo, ou das demandas sociais
para a sua existência, por exemplo a especialização para uma dada área da
atividade social, ou o mercado de trabalho. Por isso, consideramos que as
transformações do ser de natureza biológica em ser de natureza histórica
cultural – educação - que fazem parte do processo de ensino desenvolvente
implicam a transição, a formação – do não ser ao ser - da subjetividade do
indivíduo em uma personalidade para si, uma totalidade representativa do seu
ser com outros indivíduos. Um ser-para-si que não é estranhamento do ser-
-com-o-outro, como acontece nos casos onde a intencionalidade do educador
se realiza sobrepondo-se à personalidade do educando.

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ENSINO/APRENDIZAGEM COMO UNIDADE ENTRE
TRANSFORMAÇÃO E TRANSIÇÃO DO SER

A personalidade, por isso, pode ser compreendida como unidade


das atividades sociais dos sujeitos em sua inextrincável conexão com a
autoatividade do indivíduo que se forma historicamente em pessoa. “ A
personalidade do homem ‘é produzida’, ou seja, é criada pelas relações
sociais que o indivíduo estabelece em sua atividade (LEONTIEV, 1978, p.
138, grifo nosso, tradução nossa). É um indivíduo que expressa sua indi-
vidualidade como integração consciente do ser sujeito e pessoa ao mesmo
tempo. Queremos afirmar que essa unidade íntegra da personalidade não
se cria sem uma Obuchénie desenvolvente. Ou, que uma personalidade
consciente, por isso livre, nas palavras de Marx, só se torna possível na
comunidade dos homens em cooperação para a produção da sua vida
comunitária.
A unidade do ato educativo no qual ocorre intencionalmente o de-
senvolvimento de funções particulares do pensamento, o caráter social
comunitário da atividade e o nascimento de um novo homem é limitada
pelo fato de que a intencionalidade existe em todos os sujeitos, professor e
aluno, educador e educando como uma situação dramática pela qual ambos
superam a alienação um do outro e da vida sociocultural como horizonte da
sua existência. Horizonte, no sentido em que o ponto de chegada do desen-
volvimento vai sempre adiante, mediado pelas novas perspectivas postas
pela personalidade que se renova nos sujeitos como possibilidade ilimitada
de criação e autocriação da sua existência.
A condição dramática do desenvolvimento precisa ser considerada
no processo de ensino, visto que, quando a intencionalidade do professor
pressupõe a anulação da intencionalidade do aluno, de forma que ele se
submeta às regras dadas sem a sua participação ou ao cumprimento de ações
sem que tenha consciência dos seus motivos e por isso, com sentidos que
se chocam, por exemplo, essa condição dramática do desenvolvimento é
transferida para a subjetividade como drama personificado no sujeito. Este,
internaliza a situação dramática social como se fosse individual.
Essa internalização do drama social como condição individual inten-
sifica o sofrimento psicológico que, nesse caso, não encontra solução na
relação como o outro. E precisa, por isso resultar em uma criação indivi-

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dualista como alternativas de comportamentos que, na maioria dos casos,
aparecem como disfuncionais para o professor. Como explica Vigotski,

[...] a passagem, [...], do externo ao interno, modifica o próprio processo,


transforma sua estrutura e funções. Por traz de todas as funções supe-
riores e suas relações se encontram geneticamente as relações sociais, a
autênticas relações humanas. Disso, um dos princípios básicos da nossa
vontade é o princípio da divisão de funções entre os homens, a partilha
em dois daquilo que agora está fusionado em um, o desdobramento
vivencial do processo psíquico superior naquele drama que vivem os
seres humanos (VIGOTSKI, 2000, p. 150, tradução nossa)

A condição dramática significa que, necessariamente, dadas as con-


dições de transformação da natureza da existência do ser natural, os indiví-
duos entram em contradição negando-se uns aos outros e afirmando-se em
novos modos de existência. Por isso, como afirmam Robutsova; Daniels
(2016, p. 191, tradução nossa), Vigotski, tratando do autodesenvolvimento,
significa drama como, “[...] colisão, oposição, conflito de personagens. Não
um cenário impessoal de circunstâncias externas, mas um sistema dinâmico
de orientações mútuas, motivos e ações, tendo seu próprio ‘enredo’ – assim
é o ambiente social, no qual a personalidade é formada como participante
do drama. ”
A compreensão de movimento entre os sujeitos da situação social
é uma condição para a superação da dominação da intencionalidade do
educador sobre aquilo que se forma como necessidade da personalidade do
educando. A superação da prepotência da intencionalidade do educador é
condição sem a qual não se forma uma Obuchénie desenvolvente, no sen-
tido do seu escopo que apresentamos acima. Se, de um lado a adaptação
da natureza biológica submeteu-se ao imperativo do meio, de outro lado, a
humanização supera esse imperativo adaptando a natureza às suas necessi-
dades sem que essa nova natureza, historicamente produzida, tenha que se
transformar novamente em determinante do seu modo de existir. Podemos
compreender com Vigotski (1997; 1996) que o meio criado pelo homem é
a fonte do seu desenvolvimento, no entanto, pode ser também seu algoz.
Quando o meio se transforma em algoz, este pode produzir todo tipo de
distorções e sofrimentos que se criam na personalidade.

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Os Limites do Ato de Ensinar Dados pelo Ato de Aprender

O autocontrole pelo educador da sua dominação sobre o educando


ocorre quando ele reconhece, na atividade de ensino, as manifestações da
personalidade do educando que indicam as necessidades criadas pelo meio/
contexto onde ocorrem. Essas necessidades caracterizam, no pensamento
expresso pelos educandos, as suas intencionalidades, que podem ser tradu-
zidas como as inclinações afetivo emocionais que dão objetividade à sua
personalidade, que indicam o sentido psicológico da organização da sua auto
atividade que precisa ser considerada pelo educador. Como afirma Vigotski,

O pensamento não nasce de si mesmo nem de outros pensamentos,


senão da esfera motivacional da nossa consciência, que abarca nossas
inclinações e nossas necessidades, nossos interesses e impulsos, nossos
afetos e emoções. Por trás de cada pensamento há uma tendência afetivo
volitiva (VIGOTSKI, 2001a, p. 342, tradução nossa).

Abertura na relação de ensino para as transformações nas particula-


ridades da intencionalidade do professor condicionadas pelas necessidades
dos alunos é uma condição para o desenvolvimento de ambos. É preciso
salientar que não é a eliminação da intencionalidade do professor, mas a
abertura para a inclusão das necessidades do aluno na esfera do ensino, que
atendam à sua autoformação. Somente essa inclusão pode levar à transição
da situação de prepotência para uma situação de cooperação.

O Caráter Dramático da Relação Humana

O drama pode ser compreendido como jogo psicológico que se desen-


volve em toda relação social tendo em vista o jogo como um processo “di-
nâmico de alteração do valor posicional dos sujeitos e as suas possibilidades
alternativas de autorrealização” (MARINO FILHO, 2022, p. 640). O indivíduo
sempre ocupa um lugar no complexo sistema de relações e atividades que
têm um valor para a produção da sua vida. Essas atividades, porque existem
como possibilidades de transformação criativa, alteram constantemente os
valores dos objetos e relações. Forma-se, com isso, um complexo sistema
dinâmico de alteração do valor do lugar que o indivíduo ocupa como sujeito

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e como pessoa, criando-se assim o campo dramático da produção da sua vida.
Vigotski, analisando a teoria spinoziana, compreendeu que,

No processo de desenvolvimento ontogenético, as emoções humanas


entram em conexão com as normas gerais relativas tanto à autocons-
ciência da personalidade como à consciência da realidade. Meu desprezo
a outra pessoa entra em conexão com a valoração dessa pessoa, com a
sua compreensão. E essa complicada síntese é onde transcorre a nossa
vida. O desenvolvimento histórico dos afetos ou das emoções consiste
fundamentalmente em que se alteram as conexões iniciais em que se pro-
duziram e surgem uma nova ordem e novas conexões (VIGOTSKI,1997,
p. 87, tradução nossa).

A dinâmica do desenvolvimento, por isso, pode ser caracterizada


por uma parte como jogo afetivo emocional das mudanças de lugar que a
criança ocupa nas relações sociais O valor afetivo e emocional da constante
alteração do lugar que a criança ocupa adquire, portanto, o sentido de uma
experiência dramática da participação nas atividades sociais. O lugar que a
criança ocupa é duplamente valorado, isto é, tanto pelos adultos quanto pela
própria criança, e esses valores nunca coincidem no sentido psicológico que
têm para ela. Isso confere sempre instabilidade, confronto, choque com a
realidade que existe. A personalidade expressa, por isso, a autocriação de
alternativas para harmonizar a situações dramáticas que são fundadas, no
entanto, sobre a prática social, as formas de agir, de pensar e sentir que são
transformadas pelos sujeitos em particularidades pessoais do seu ser social.
Heller, discutindo a essência humana para Marx esclarece que,

No curso da história o homem pode chegar a ser – até agora por meio
da alienação – cada vez mais produtivo, cada vez mais social (histó-
rico), cada vez mais consciente e livre: isto é, podemos falar de um
desenvolvimento da essência humana somente se e na medida em que
o homem desenvolve estas características [o trabalho, a socialidade,
a consciência, a universalidade e a liberdade]. O desenvolvimento da
essência humana é a base de todo e qualquer desenvolvimento de valor.
[...]. Daqui em diante indicaremos como valor, como carregado de um
conteúdo de valor, tudo aquilo e somente aquilo que promove direta ou

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indiretamente o desenvolvimento da essência humana (HELLER, 1991,
p. 49, tradução nossa).

É nesse sentido, então, que estamos compreendendo a Obuchénie


desenvolvente como a atividade na qual aquelas características podem
se formar como um valor positivo para a personalidade, porque o drama
também se produz com realizações, conquistas e humanização criativa da
multilateralidade artística, filosófica, teórica, ética e estética. A Obuchénie
desenvolvente pode se instalar, desde que respeitados o lugar que o sujeito
ocupa como pessoa que sente, que imagina e cria, que coopera e se emocio-
na; com a possibilidade de que a ordem das relações de poder e dominação
possam ser redefinidas como possibilidades ilimitadas de transformação
da vida comunitária.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Reciprocidade no Ensino Desenvolvimental

A proposta deste artigo sobre o ensino e o desenvolvimento dos in-


divíduos é antes de tudo a explicitação da sua unidade, a superação daquilo
que pode parecer separado, o ensino de um lado e o desenvolvimento de
outro. Neste sentido podemos recorrer a conceitos como comunidade, reci-
procidade, cooperação, colaboração, sistema, interação, entre outros, que
remetem sempre à interdependência daquilo que existe sob alguma forma,
com a existência de outras. Vir a ser, tornar-se, formar-se são expressões
que servem à ideia de síntese do movimento de transformação e transição
que caracterizam o desenvolvimento por meio da interdependência das
formas de ser.
O contexto da prática social onde essa unidade ganha corpo é com-
preendido aqui como educação. Uma atividade social essencial para a trans-
formação dos seres humanos, na qual estão envolvidos os interesses político e
econômicos que são mediados por relações de poder e de dominação. Nenhum
desses dois conceitos são entendidos pejorativamente; não confundimos as
vicissitudes que essas formas adquirem no contexto histórico atual com o fato
de que realmente ambos são necessários à produção da vida social e individual.
O poder humano caracterizado pela capacidade de transformação criativa

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de novos meios de mediação da produção da vida possibilita, de fato, que
o homem estabeleça relações de domínio do movimento de outros homens,
da realidade e da sua autoatividade. O que está posto como característica
fundamental dessas formas de ser é a intencionalidade, a finalidade pela qual
exercemos poder e domínio. Nesse sentido, ambos podem mediar o desen-
volvimento de um sentido de valoração positiva, ou não, para os indivíduos.
O valor das relações é, assim, uma das formas da consciência que
emerge da atividade entre os homens. Ele pode ser compreendido como
característica da sensibilidade que, uma vez afetada, registra como memó-
ria, em forma de imagens, a unidade dinâmica e sistêmica - generalização,
que compreendemos como afeto. O afeto constitui o núcleo das vivências
individuais em meio coletivo, grupal ou diádico que, como reflexo dessas
relações objetivas, se transforma em meio de relação consigo mesmo, em
subjetivação da personalidade.
É com isso que tomamos, como centro da nossa discussão sobre a
Obutchénie desenvolvente, a formação da personalidade. Relembramos que
a educação pode tomar muitas formas, diferentes finalidades, e que a inten-
cionalidade do ato de ensinar pode ser posta sobre aspectos particulares do
ser, a serviço de diferentes funções psicológicas e ou práticas, por exemplo.
Essas diferentes formas têm o seu próprio valor para o desenvolvimento
humano. Mas o que está sendo considerado aqui é que a personalidade será
sempre afetada pelas formas particulares, e que ela representa a síntese
generalizada da vivência humana nos indivíduos. Por isso, tomamos como
relevante para nossa discussão a personalidade como expressão da totalidade
sistêmica que resulta da relação de ensino.
Propomos ainda, que a reciprocidade seja orientadora da compreen-
são da complexidade do ato educativo e da prática de ensino. Isso se refere
a que a orientação, a execução e o controle dessa atividade não deve ser
unidirecional, do professor ou educador sobre o aluno ou educando, mas
que todos os sujeitos, por serem afetados pelo conteúdo e pelo produto da
atividade, ocupam um lugar importante uns para os outros. Nesse sentido,
quando a atitude do professor se caracteriza como prepotente sobre o aluno,
ambos, professor e aluno se alienam da sua humanização, perdem de vista
a essencialidade da sua interdependência comunitária.
Os homens não criam a sua humanidade de forma independente, criam
em cooperação. Não perdem, contudo, o auto movimento criativo, sobre o qual

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podemos compreender expressões de autonomia, autoformação, a produção
de interesses pessoais, uma perspectiva de futuro e de realização de desejos
e motivos pessoais. Por isso, trouxemos para essa discussão o conceito de
situação dramática do desenvolvimento. O fato de que um jogo psicológico é
vivenciado individualmente como representação do valor das relações, e que
esse valor medeia a atitude, o posicionamento pessoal na situação de ensino.
Como de fato tanto os valores sociais quanto os pessoais estão postos
na situação dramática, o que a caracteriza como movimentos de choque,
colisão, mas também, de integração e transição, compreendemos que essa
situação precisa da superação da prepotência pela comunidade por tornar
comum entre os sujeitos o poder humano criado social e culturalmente.
Ainda, para que a partilha do poder possa vir a ser cultura entre os sujeitos,
para que possam dominar a produção da vida comunitária em conjunto, é
preciso que a educação seja um ato de mútua transformação, que o educador
possa aprender com o educando, segundo as necessidades que emergem da
situação dramática, tanto aquelas que entram em oposição como aquelas
que concordam com os sentidos da personalidade dos sujeitos envolvidos.
Assim se realiza, sob o nosso ponto de vista, a Obuchénie humanizadora.

POSSIBILITIES AND LIMITS OF THE EDUCATIONAL ACT FOR DEVELOPMENTAL


TEACHING: THE SELF-FORMATION OF PERSONALITY AS AN EXPRESSION OF
FREE CONSCIOUSNESS

Abstract: This article assumes as a problem the analysis of the limits of the educational
act for the cultural development of the personality. It is substantiated on the argument
that personality derives from the self-movement of subjects in relation to the educational
activity of their ways of being. We understand, therefore, that in the contradictions between
personal and cultural needs, an affective emotional drama of development is structured,
which has implications for the teaching process and for the learning process. The goal is
to demonstrate that the educational act needs to respect the creative self-movement of the
students, but also to provide the material and ideational conditions in the teaching that is
guided by the formation of superior psychological functions as self-mastery of the subjects’
active relationship with their world. It is understood, therefore, that the developmental
teaching is shared between teacher and student in such a way that one does not determine the
being of the other, but together they create and recreate the possibilities for the development
of both. In this sense, the limit of the educational act is given by the self-creative and
autonomous need, when the teacher starts to be educated by the needs of personality
development of the students being educated. This implies that students are agents of their
cultural development. The method is the conceptual theoretical analysis based on literature

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review. The results demonstrate the importance of reciprocity and mutual respect in the
development of students’ personality as a product of developmental teaching.

Keywords: Education. Obutchénie. Consciousness. Personality.

Notas
1 Verso extraído de PAZ, F. C. Vigotski e sua teoria em bom “cordelês” (Litera-
tura de cordel). Santarém-PA: GEPEI-Ufopa, 2022, formato digital.
2 A palavra Obuchénie é compreendida neste artigo como unidade da atividade
que envolve ações de ensino e aprendizagem. Envolve a cooperação entre os
sujeitos de modo que ambos se transformam afetiva, emocional e cognitiva-
mente por meio da intencionalidade posta como finalidade das ações de estudo
e significação do conteúdo da atividade.

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