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Revista da Pró-Inclusão: Associação Nacional de Docentes de Educação Especial

ENTREVISTA

Pedro Cunha

DOSSIER TEMÁTICO
l. 9 / Nº2
Autonomia, · Vo ·
5
Po

16 47- 6 7 3

7€
r t u ga l · D e

Flexibilidade
e Inclusão
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2018 ·
Palavras do Centro Formação Editorial
Caros sócios e amigos:

Estamos, num tempo hístórico e cultural, em que, diariamente, somos confron- Esta é a primeira revista da nossa associação 55/2018 e Dec-Lei 54/2018, precisa de ser deta-
FICHA TÉCNICA
tados com imensos desafios! A mudança e a inovação em educação não consti- desde que entrou para o 2.º ciclo do Ensino Bá- lhada e pragmaticamente analisada em cada
tuem apenas chavões, mas, igualmente, necessidades emergentes perante uma Educação Inclusiva sico… Na verdade, comemoramos, com alegria um dos nossos 811 agrupamentos de escolas.
Sociedade e um Mundo em constante transformação. Revista da Pró-Inclusão: Associação Nacional
de Docentes de Educação Especial e competência, os 10 anos da fundação da nos- Este assunto da publicação da lei está bem con-
Não podemos ficar parados perante as alterações que a Sociedade tem Volume 9, n.º 2, Dezembro de 2018 sa associação com um simpósio realizado na templado neste número da revista com entre-
sofrido. Semestral
Fundação Calouste Gulbenkian a 13 de Julho. vistas e artigos de opinião que ajudem todos
ISSN 1647-6735
A Escola deverá acompanhar estas tendências sob pena de se criar um sig- Depósito Legal 312441/10 Foi o evento de maior visibilidade que realiza- os professores a avaliar a dimensão e direção
nificativo desfasamento entre o que é esperado da função da Escola e da educa-
DIRETOR:
mos este ano de 2018 que agora chega ao fim. das mudanças sugeridas. O dossier temático é,
ção/formação dos alunos enquanto condições necessárias para enfrentarem os David Rodrigues Chega ao fim o ano, mas não chegam ao fim desta vez, dedicado à flexibilidade curricular,
desafios da sociedade do séc. XXI.
as tensões e polémicas no setor da Educação. um tema que certamente desperta nos nossos
Precisamos de, em conjunto, reinventar uma Escola que teima em ficar CONSELHO REDATORIAL:

ancorada numa organização da Era Industrial: de ensinar muitos, ao mesmo Alcinda Almeida A publicação do Dec-Lei n.º 54/2018 veio con- leitores o maior interesse.
Ana Rosa Trindade
tempo e com o mesmo currículo, como se todos fossem iguais e aprendessem Dídia Lourenço
vidar as escolas a uma organização diferente para apoiarem Caro leitor: está bonita a revista não está? Depois de a ler – e
de igual modo, num modelo em que o professor é o centro do processo de apren- Elvira Cristina Silva os alunos com dificuldades, na verdade, para apoiarem to- eventualmente reler – diga-nos a sua opinião. Esta revista é
Helena Neves dos os seus alunos. Lembro aqui – e pelos meus mais de 40 fruto de muito esforço voluntário imaginando o seu sorriso
dizagem e a fonte incontestável de conhecimento. No entanto, sabemos por Olga Sá
experiência e avaliação científica que esse é um modelo que não responde à anos neste setor, sou um observador experimentado… – que e aprovação. Estamos sempre abertos a ouvir opiniões e su-
diversidade dos alunos. Sendo que, hoje em dia, a diversidade é a norma que CONSELHO EDITORIAL E CIENTÍFICO: tanto o DL 319/91 como o 3/2008, foram diplomas que cau- gestões. E podem dizer bem porque ninguém pode ser pro-
Angeles Parrilla – Univ. de Vigo (Espanha)
caracteriza as paisagens escolares. António Nóvoa – Univ. de Lisboa (Portugal) saram uma grande entropia nas escolas e levaram um bom fessor se não for otimista e não souber encontrar o que está
Surgem assim novos desafios que concorrem para uma Escola que se quer David Justino – Univ. Nova de Lisboa (Portugal) tempo até que se tornaram óbvios, claros e familiares. Creio bem nas escolas, nas famílias, nos alunos e na educação. Um
David Rodrigues – Instituto Piaget Almada (Portugal)
cada vez mais proativa, participativa, humanista e equitativa; onde os valores Francisco Ramos Leitão – Univ. Lusófona (Portugal)
que o mesmo se irá passar com o presente diploma. Temos abraço a todos!
democráticos e inclusivos são o cerne de uma educação de qualidade. Por outro Jack Sagot – INS-IHA (França) que contar com o compromisso e a participação de todos,
José Morgado – ISPA (Portugal)
lado, sabemos que somos chamados a proporcionar novas formas de ensinar e Lani Florian – Univ. de Aberdeen (Reino Unido)
opinando para a sua melhoria para podermos construir
novas formas de promover respostas educativas flexíveis, plurais, dinâmicas e Luzia Lima-Rodrigues – ESE Jean Piaget de Almada um marco na construção de uma escola que seja realmente — David Rodrigues
significativas, de modo a responder à diversidade de alunos. (Portugal)
Martyn Rose – Univ. de Aberdeen (Reino Unido)
para todos. Creio que a trilogia “Perfil dos Alunos…”, Dec-Lei Diretor da revista Educação Inclusiva
A Escola inclusiva, a flexibilidade curricular, as competências constantes Mel Ainscow – Univ. de Manchester (Reino Unido)
no perfil do aluno à saída da escolaridade obrigatória, as aprendizagens essen- Miguel Angel Verdugo – Univ. de Salamanca (Espanha)
Philipe Perrenoud – Univ. de Geneve (Suiça)
ciais e a avaliação para e das aprendizagens, constituem temáticas inscritas na Renato Opperti – IBE - UNESCO (Suiça)
ordem do dia e nas quais o CF-Pin-ANDEE, tal como o seu Plano de Formação, Seamus Hegarty – IAEA (Reino Unido)
Sofia Santos – Univ. Técnica de Lisboa (Portugal)
tem investido na formação dos profissionais de educação, de forma a contribuir
Teresa Brandão – Univ. Técnica de Lisboa (Portugal)
para propiciar mudança de práticas. Paulo Freire defendia que "Ninguém educa
ninguém, ninguém se educa a si mesmo, os homens se educam entre si, media- PROPRIEDADE:
Pró-Inclusão — Associação Nacional de Docentes
tizados pelo mundo". É nesta perspetiva que nos situamos! de Educação Especial
Para que assumamos estes desafios, precisamos de investir na formação Avenida Jorge Peixinho, 30
Quinta da Arreinela

Sumário
contínua de forma reflexiva, no desenvolvimento profissional dos docentes de
2805-059 Almada — Portugal
forma colaborativa e, ainda, nos contextos educativos, analisando e refletin- Tlm.: (00351) 927 138 331 / (00351) 964 502 105
do sobre paradigmas educacionais que proporcionem a todos aprendizagens E-mail: proandee@gmail.com
WebSite: http://proandee.weebly.com
significativas.
O Centro de Formação da Proandee procura, assim, dinamizar ofertas for- ILUSTRAÇÃO DE CAPA:
mativas que visem responder às inquietações dos seus associados, proporcio- Marco Taylor
04 Entrevista: Pedro Cunha 21 Artigo: Ruth Mariani 36 Dar voz a: Agrupamento
info@marcotaylorautor.com
nando uma oferta formativa diversificada constituída por oficinas de formação, Diretor-Adjunto do Programa O ontem, o hoje e o amanhã: uma visão de Escolas da Parede
cursos de formação, ACDs, simpósios, seminários, ciclo de sábados – falando FOTOS:
Gulbenkian Conhecimento (FCG) de acessibilidade no contexto da deficiência Vibeats – Um projeto inclusivo
Pró-Inclusão visual a partir de uma visita a um museu
com quem faz, com oradores e formadores convidados, que procuram propor- 08 Artigo: David Rodrigues no Rio de Janeiro 38 Instantes Inclusivos...:
cionar uma formação e partilha de práticas com elevados índices de qualidade, LOGOTIPO PIN-ANDEE: Liderar a escola para a Inclusão Elvira Cristina Silva
atualidade e pertinência das temáticas. Roberto Borgeso 27 Entrevistas: João Adelino dos Santos, (Re)Inícios
Assim, e numa perpetiva de trabalho colaborativo e de cooperação, es- 10 Artigo: Marco Rosa José Morgado, José Patrício, Mário Nogueira
PAGINAÇÃO: O caminho e as pedras e Maria Manuela Prata Dossier Temático: organização
tamos disponíveis para estabelecer parcerias com diferentes instituições da 3H Comunicação Perspetivas sobre a Educação Inclusiva: de Ana Ferreira, Ana Rosa Trindade,
Comunidade (escolas públicas e particulares), através de ofertas formativas de 13 Artigo: Lúcia Canha, olhares sobre a nova lei Helena Neves e Margarida Loureiro
TIRAGEM: Ana Colaço e Celeste Simões Autonomia, Flexibilidade e Inclusão
curta duração ou cursos de formação que versem temátivas sobre a inclusão e 1000 exemplares
Caminhos para a Inclusão: relato da 33 Caminham ao nosso lado:
construção de comunidades educativas aprendentes. experiência do projeto GAPRIC Associação Bengala Mágica
© Reservados todos os direitos.
Sugerimos que estejam perto de nós, atentos à nossa oferta formativa e à na Associação de Paralisia Cerebral Porque a visão não se limita ao
Proibida a reprodução total ou parcial sem permissão
qualidade dos nossos formadores. Aconselhamos a visita dos nossos sítios: do proprietário. de Odemira que os nossos olhos veem…
https://cfpinandee.weebly.com/ e https://proandee.weebly.com/
IMPRESSÃO:
GrafiPágina – Artes Gráficas, Lda.
Saudações inclusivas! Sta. Iria da Azóia
Tlf.: (00351) 219 599 045
— Ana Maria Lopes Ferreira E-mail: grafipagina@netcabo.pt
1. Portugal é considerado um case study porque qualificou teligente?). A esta revolução tecnológica também se asso-
Entrevista rapidamente gerações inteiras e reduziu o abandono esco- ciam mudanças sociais profundas.
lar de 50%, nos anos de 1990, para 13%, nos dias de hoje. Foi Pensar a educação das crianças que agora têm idade
a maior queda de sempre da União Europeia, contudo este escolar e que viverão em contextos tão incertos é um gran-
investimento na Educação revelou-se insuficiente. Qual a de desafio. Sabemos que estas crianças terão entre 10 a 20

Pedro Cunha sua opinião relativa ao facto constatado? ocupações ou papéis profissionais ao longo da sua vida, e
que cerca de 80% delas terão empregos que ainda não exis-
PC: De facto, temos razões para estar muito orgulhosos tem. Mais de 40% dos empregos atuais desaparecerão na
— Diretor-Adjunto do Programa Gulbenkian Conhecimento do percurso que a sociedade portuguesa, em particular as próxima década por força da automação e outros serão in-
famílias e as escolas, fizeram no sentido da promoção da ventados (não sabemos se na mesma proporção). Tudo o
Entrevista conduzida por Helena Neves escolaridade, da aprendizagem e do conhecimento. Esta- que puder ser facilmente ensinado, memorizado, baseado
mos perante uma quebra muito assinalável num indica- em tarefas estritamente cognitivas e rotineiras será pro-
dor – o abandono escolar – que reconhecemos hoje como gressivamente automatizado.
um forte preditor de exclusão social, desemprego ou em- No Programa Gulbenkian Conhecimento (PGC),
prego pouco qualificado, problemas de saúde e baixa qua- entendemos que a sociedade civil pode dar um contri-
lidade de vida. Mas prolongar a escolaridade não basta. buto importante na preparação de uma nova geração
Pedro Cunha é licenciado e de Acompanhamento das Atividades Também temos de assegurar que, concluída a formação que abrace esta revolução tecnológica, sem ser por ela
mestre em Psicologia Educacional, de Enriquecimento Curricular e de inicial, todos os jovens detêm e usam os conhecimentos, ultrapassada. Temos de investir mais nas competências
capacidades e atitudes necessárias analíticas e interpessoais, nas carac-
e amplamente reconhecido pelo seu Apoio à Família; coordenar o Projeto para lidar com problemas comple- terísticas que dificilmente poderão
vasto trabalho enquanto Subdiretor- Playgroups for Inclusion, financiado pela xos, gerir tensões e dilemas, para ser codificadas ou transformadas
lidar com a incerteza, a mudança num algoritmo: a criatividade, o pen-
-Geral da Educação (2010-2017), Comissão Europeia; integrar a Early e a diversidade, enfim, para encon- samento crítico, a compaixão … Por
na Direção-Geral da Educação. Childhood Education and Care Network, trar o seu lugar no mundo. outro lado, também temos de promo-
No que diz respeito às compe- ver competências que permitam aos
No âmbito destas funções, foi da OCDE; representar a DGE em todas tências académicas, temos razões jovens navegar nos mares da incer-
responsável pelo desenvolvimento as reuniões sobre educação, promovidas para estar otimistas. Também aí o teza e da complexidade, da híper co-
nosso país se destacou pelo cres- netividade e das sucessivas ondas de
da política educativa nos domínios pelo FMI, BCE e Comissão Europeia, cimento sustentado nos resulta- informação a que agora são expostos.
da educação pré-escolar e 1º Ciclo no âmbito do processo de monitorização dos do estudo PISA, por exemplo,
situando-se hoje acima da média 3. Como se enquadra o concurso “Aca-
do Ensino Básico, pelos programas do Memorando de Entendimento da OCDE nas três provas (Ciências, demias do Conhecimento”, neste pro-
nacionais de inovação e promoção do com Portugal; integrar as Comissões Leitura e Matemática). No entanto, grama? Pode explicar-nos em que con-
a evidência científica demonstrou sistem as Academias de Conhecimento?
sucesso escolar, educação e promoção Nacionais para a Proteção das Crianças que o conhecimento académico é
da saúde, educação especial e apoios e Jovens em Risco, para a Promoção dos fundamental mas não é suficien- PC: As Academias Gulbenkian Co-
te. Estudos longitudinais, que se- nhecimento são projetos promovi-
socioeducativos, psicologia e orientação Direitos e Proteção de Crianças e Jovens guem cohorts de crianças ao longo dos por organizações da sociedade
em meio escolar. e de Intervenção Precoce na Infância. de muitos anos, mostraram que as competências sociais e civil, escolas, autarquias e universidades, cofinancia-
emocionais são tão ou mais importantes do que as com- dos pelo PGC, com o objetivo de promover competên-
Foi ainda responsável por: coordenar Integra o Think Tank da Ordem petências cognitivas no sucesso educativo, na participação cias sociais e emocionais em crianças e jovens, desde
a Comissão de Acompanhamento dos dos Psicólogos Portugueses e é perito social, empregabilidade, saúde, rendimento, etc. Mostra- o nascimento até aos 25 anos de idade. As entidades
ram, ainda, que este efeito é particularmente importante promotoras podem desenhar uma metodologia original
Centros de Recursos para a Inclusão; convidado na Comissão Europeia, nas crianças mais vulneráveis. Investir na promoção de e submetê-la à validação científica, ou recorrer a meto-
coordenar o Grupo de Trabalho UNICEF e OCDE. competências sociais e emocionais é, portanto, um impe- dologias de referência, estandardizadas e com evidência
rativo de inclusão e de coesão social. produzida no nosso país.
Interministerial para a revisão da Atualmente é o responsável pelo O âmbito de intervenção das Academias é totalmen-
legislação sobre educação especial projeto Academias do Conhecimento 2. Foi neste âmbito que surgiu o Programa Conhecimento te aberto e inclui as componentes curriculares e não cur-
(2018-2022), promovido pela Fundação Calouste Gulbenkian? riculares em contexto escolar, bem como as atividades
criado pelo Despacho n.º 706-C/2014 da Gulbenkian, um projeto ambicioso desportivas, culturais, científicas, sociais e de cidadania
dos Ministérios da Educação e Ciência que tem como objetivo preparar PC: Vivemos num tempo muito marcado pela mudança rá- em contexto comunitário.
pida – a que alguns já designam por quarta revolução in-
e da Solidariedade, Emprego e crianças e jovens para o futuro através dustrial – alimentada pela robotização e pelo crescimento 4. Quais são as competências sociais e emocionais que es-
Segurança Social; coordenar a Comissão do desenvolvimento de competências. exponencial da inteligência artificial (será realmente in- tão na génese deste projeto?

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PC: No primeiro concurso, lançado em maio de 2018, prio- potencial de replicação e a relação custo benefício tam- 10. Qual o impacto pretendido, a longo prazo, deste Pro-
rizámos a adaptabilidade, autorregulação, comunicação, bém foram objeto de ponderação. grama Conhecimento na nossa sociedade?
pensamento criativo, resiliência e resolução de problemas.
É provável que nos próximos concursos possamos evoluir 8. Este concurso será novamente promovido no ano 2019. PC: O PGC visa a produção e/ou aplicação de conhecimen-
para formulações diferentes, em função da monitorização Os critérios de seleção dos projetos candidatos irão man- to na qualificação das pessoas, preparando-as para os de-
que formos realizando. ter-se ou serão alterados, tendo em conta a experiência ad- safios do presente e do futuro, e na abordagem a problemas
quirida ao longo deste ano? de grande relevância social e interesse público.
5. Estão a pensar em grande escala e num efeito bola de neve
através deste movimento nacional de competências? Como? PC: Avaliámos a experiência deste ano de forma muito po- 11. Um olhar integrado para o quadro legal que suporta a
sitiva. O PGC está a gerar muito interesse, excedendo as Flexibilidade Curricular, o Perfil do Aluno à Saída da Esco-
PC: Sim. Investindo nas pessoas, pretendemos contribuir nossas melhores expectativas, e a qualidade modal dos laridade Obrigatória, assim como as Aprendizagens Essen-
para uma visão integrada da Educação, para a valoriza- projetos foi boa. Até ao momento aprovámos 33 projetos, ciais (Decreto-lei 55/2018), permitem dissecar orientações
ção das competências sociais e emocionais com recurso a mas muitos mais ficaram em carteira para as próximas práticas para o desenvolvimento de uma educação de qua-
experiências concretas e cientificamente validadas, pas- edições do concurso. lidade, inclusiva e equitativa, que vai ao encontro do novo
síveis de replicação, ou que possam ser inspiradoras de regime legal para a Inclusão escolar (Decreto-lei 54/2018).
políticas e práticas. 9. O Programa Conhecimento incide essencialmente em duas Considera que o Programa Conhecimento, nomeadamente
Na escola e no movimento associativo, há muito que formulações: “ Qualificar para o futuro e investir em pessoas o projeto das Academias de Conhecimento pode consti-
se promovem estas competências, com grande mérito, que farão a mudança” e “Usar o conhecimento em problemas tuir-se como mais uma alavanca rumo a uma Escola que
embora nem sempre se tire partido da evidência científica de grande relevância social e interesse” – Fale-nos um pouco prepara os cidadãos destes tempos para lidarem com as
mais recente, que pode tornar essas intervenções ainda dos outros projetos que integram o Programa Conhecimen- novas exigências e necessidades do futuro?
mais eficazes. Se formos capazes de demonstrar, em gran- to, nomeadamente as Oficinas de Conhecimento, Desafios de
de escala e por todo o país que, de facto, o desenvolvimen- Conhecimento e os Laboratórios de Conhecimento. PC: Sim, é essa a nossa maior ambição.
to de programas estandardizados de promoção de com-
petências sociais e emocionais produz impactos muito PC: Para além das Academias, o PGC integra três outros
relevantes nas pessoas, nas organizações e na sociedade, eixos de intervenção.
deixando exemplos concretos documentados e ferramen- As Oficinas Gulbenkian Conhecimento destinam-se a
tas disponíveis para os profissionais, e para as organiza- adultos com mais de 25 anos e têm como objetivo a pro-
ções, teremos dado um contributo muito importante para moção da aprendizagem ao longo da vida. Serão lançados
a melhoria da qualidade da oferta educativa, de carácter quatro concursos de ideias (a partir de outubro de 2018).
formal, não-formal e informal. O primeiro incidirá em projetos inovadores de promoção
da aprendizagem em contexto laboral, sobretudo nas or-
6. Como decorreu o processo de avaliação (antes, durante ganizações de menor dimensão. O segundo incidirá em
e depois) do concurso Academias de Conhecimento? estratégias inovadoras de apoio à estruturação e gestão
de planos de carreira e de desenvolvimento profissional. O
PC: Recebemos perto de 600 candidaturas e selecionámos terceiro procurará soluções de base comunitária suscetí-
50 para uma segunda fase. As organizações que integra- veis de mobilizar as populações mais resilientes à educa-
ram a segunda fase foram apoiadas na melhoria e apro- ção e formação (pessoas com baixas qualificações, idosos
fundamento das propostas e, no final, apoiámos 33 proje- e minorias étnicas). Por fim, o quarto concurso procura
tos em todos os distritos e regiões autónomas do País. O apoiar soluções de base tecnológica para o acesso livre ao
nosso objetivo é apoiar cerca de 100 Academias em todo conhecimento, ultrapassando as barreiras que hoje são co-
o País e chegar a, pelo menos, 10.000 crianças e jovens até nhecidas, como a distância, o custo ou o interface.
2022. Vamos lançar outro concurso no início de 2019 e ou- Os Desafios Gulbenkian procuram dar continuidade
tro em 2020, até criamos a rede nacional de Academias, à boa experiência do Programa Gulbenkian Inovar em Saú-
com 100 projetos locais. de, alargando a sua intervenção para os domínios da Edu-
cação e do Desenvolvimento Social. Em concreto, serão
7. No processo de avaliação que tipo de projetos valoriza- testadas soluções para problemas sociais complexos, com
ram? Quais os domínios abrangidos? base nas descobertas mais recentes da economia compor-
tamental, ainda pouco conhecidas no nosso país.
PC: Valorizámos projetos inovadores, ambiciosos mas Por fim, o quarto e último eixo de intervenção é o
realistas, assentes em estratégias de reconhecido mé- Laboratório do Conhecimento, um espaço de apoio à pro-
rito ou com elevado potencial de produzir os impactos dução e comunicação científica, à investigação em zonas
desejados. A qualidade da parceria, a articulação dos di- fronteira ou emergentes (por via de bolsas, conferências,
ferentes contextos de intervenção (escola-família-comu- grupos de estudo, publicações, entre outras estratégias),
nidade), os mecanismos de monitorização e avaliação, o em articulação com o Fórum Gulbenkian.

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bem cientes que, para que as pessoas possam estar motiva-
Artigo das e felizes, precisam de exercer algum tipo de poder. As-
sim, o poder não seria uma ânsia só de alguns, mas, sendo
de todos, implicaria criar oportunidades para que todas as
pessoas possam ter autonomia, responsabilidade e “poder”

Liderar a escola para a Inclusão de conceber, realizar e ser autoras de projetos.


Uma outra ideia é que a liderança não é unívoca.
Quando estudamos a forma como as instituições são li-
— David Rodrigues deradas entendemos que diferentes lideranças surgem em
diferentes momentos. Por exemplo, pessoas que são mais
Conselheiro Nacional de Educação, Presidente da Pró-Inclusão, Professor Catedrático (Ap.) vocacionadas para o diálogo e para a negociação podem
estar “ausentes” num quotidiano sem conflitos, mas as-
sumem uma liderança discreta e imprescindível em mo-
mentos de confronto. Encontramos também líderes com
funções diferentes: líderes naturais para organização de
eventos, líderes afetivos, líderes de competência, líderes
de equilíbrio, líderes por variadas razões. Por isso, é mais
correto falar em processos de liderança – muitas vezes dis-
seminados, com modelos diferentes, abarcando várias pes-
soas do que num líder único e centralizador.
De uma forma ou de outra é inegável, como dizíamos,
a existência de uma liderança, isto é, a importância de vi-
sualizar, de antecipar, de “caminhar para” um projeto de
futuro, um projeto que dê uma direção, uma polaridade
que permita conjugar os esforços de todos para a consecu-
ção de uma finalidade comum.
Talvez um dos grandes objetivos, hoje em dia, de uma
liderança educacional, seja liderar para a construção de
A liderança é muitas vezes apontada que eles acham justos e necessários. É talvez o tipo de lide- uma escola inclusiva. E esta importância deriva de um
rança mais comum: uma liderança que caminha à frente fator fundamental: liderar para a Inclusão é simultanea-
com um fator essencial para se e procura que outros a sigam. Mas há também lideranças mente liderar para a inovação. É hoje evidente que não é
conseguir que a escola se reforme, se que preferem caminhar ao lado. Estas são as lideranças possível uma reforma educacional inclusiva sem que a
que se manifestam no processo de decisão, contribuindo escola se comprometa com processos de modificação das
transmute numa instituição inclusiva. para decisões partilhadas e coletivas, lideranças enfim, suas práticas. E temos múltiplos exemplos: quais as con-
Mel Ainscow, por exemplo, no seu livro que influenciam, mas que se diluem no processo de decisão sequências pedagógicas que tem a adoção do “Perfil dos
ou de mudança. Existe ainda um outro estilo de lideran- Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória”? Quais as
“Struggles for Equity in Education” ça: as lideranças que caminham atrás. O que normalmen- consequências de todos os alunos participarem e terem
(Routledge, 2016), chama a atenção para te se designa por “Leading by following”: liderar seguindo. sucesso no processo de aprendizagem? O que significa pla-
São lideranças subtis que procuram sobretudo sustentar e near o currículo para que todos aprendam? Como se avalia
a importância da liderança como fator apoiar as decisões que os coletivos vão tomando. São líde- para contribuir para a aprendizagem e não para fiscalizar
fundamental para o desenvolvimento res de suporte, de apoio, de encorajamento e de provisão a aprendizagem? Como se pode integrar a inovação se ela
de meios para que os grupos possam decidir e avançar. for só para reforçar a aprendizagem e potenciar as oportu-
da Equidade em Educação. Encontramos, pois, vários estilos de liderança e que, cer- nidades dos “bons alunos”?
tamente, podem ser usados em diferentes momentos, em Enfim… tantas questões que precisamos que as li-
diferentes situações e condições de decisão. deranças das nossas escolas analisem, optem, decidam.
O termo liderança é frequentemente conotado com ideias Um segundo aspeto inspira-se na opinião de F. Nietzs- Usando a autonomia que têm, potenciando os recursos
simplistas e até autocráticas. O líder seria alguém (nor- che quando afirmou que a “vontade de poder” está embuti- que dispõem, mobilizando para objetivos humanos e de
malmente uma pessoa) que, iluminada por um ideal e pe- da na natureza humana. Poderemos talvez problematizar responsabilidade de todos.
las formas de concretizar esse ideal, conduziria uma dada a universalidade desta afirmação, mas não será muito ra- Na verdade, a inovação que precisamos não é para
instituição a cumprir uma missão. A esta ideia sobre o que zoável ignorar que existe uma procura de exercer algum alguns. Dispomos até de estudos que mostram que são os
é a de liderança contraporia três razões. tipo de controlo e de poder sobre alguns aspetos da vida melhores alunos aqueles que são mais resistentes a novas
Antes de mais há vários estilos de liderança. Há sim quotidiana dos humanos. Se considerarmos que existe esta formas de ensinar (pudera…). A liderança desafiante, ino-
líderes que caminham à frente. Líderes sozinhos ou coleti- predisposição, esta vontade para exercer o poder então – e vadora, que humanamente vale a pena, é liderar a escola
vos que lideram outras pessoas para atingirem os objetivos seguindo as pegadas do filósofo alemão – deveríamos estar para que ela abrace a inovação inclusiva. Vamos a isso?

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Ao que parece, a realidade vai- que vive na aceitação e respeito por si
Artigo -nos mostrando o declínio de um mesmo, enquanto premissa para acei-
discurso que vingou e que marcou a tar e respeitar o outro.
escola e a sociedade, baseado numa A escola, de alguma forma, tem
espécie de darwinismo social e acadé- sido um lugar de dominadores e do-

O caminho e as pedras mico, sustentado por chavões, como a


premiação da excelência e do mérito.
minados, enquanto prolongamento
da realidade social. Nesta linha de
Como que assumindo que todos par- relacionamento, entre dominadores e
— Marco Rosa tem do mesmo lugar e com as mesmas dominados, há seres humanos a quem
condições. Esse discurso foi-se desen- se lhes proibiu ser o que são. Muito
Docente de Educação Especial – Agrupamento de Escolas de Castro Marim, marcocorriente@gmail.com. volvendo numa lógica individualista, sensível a esta questão, Paulo Freire,
que só foi servindo para validar pro- refere mesmo que os dominados fo-
cessos eliminatórios que garantissem ram explorados, violados e foi-lhes
a perpetuação de uma ideologia do- negado de forma violenta o direito de
minante e de um projeto social que, de existir e de se expressarem.
resto, talvez tenham chegado a uma A dominação leva a que se origi-
expressão radical do seu declínio, se ne um processo de negação de si mes-
observarmos que a distribuição da ri- mo, de alienação, e é determinante na
queza é cada vez mais desigual e com a pragmatização de relação que se estabelece com os alunos. Estes, a menos
dois exemplos dramáticos: o fenómeno Trump, nos EUA e, que já se aceitem ou respeitem a si próprios, vão cair na “ar-
mais recentemente, o fenómeno Bolsonaro, no Brasil. madilha” da não-aceitação e do desrespeito por si mesmos,
Os referidos exemplos são a expressão de uma impo- com inevitáveis implicações, pois vão temer, vão invejar ou
sição que têm na sua marca distintiva a ausência de um vão depreciar o outro, mas não o aceitarão, nem respeita-
Fazer o caminho é viajar pelo que não Hoje, no tempo presente, temos que assumir o desafio argumentário forte, mas que é validado, por um lado, pela rão. Sem aceitação e respeito pelo outro, como legítimo ou-
de construir a escola que, abrindo as portas a todos, tem a capacidade manipuladora da demagogia e, por outro lado, tro na convivência, o fenómeno social ficará prejudicado.
se sabe. As pedras são as respostas certas! responsabilidade acrescida de aprofundar a sua dimensão pela incapacidade de discernir e descodificar a mensagem Se, de alguma forma, já estamos a chegar a um ponto
O discurso sobre educação tem sido ética e humana, num sentido que, a todos, tem o dever de subliminar, que coloca em causa direitos humanos, a qua- de saturação, quanto à caracterização e origens do pro-
garantir a participação e o sucesso, em torno da constru- lidade da democracia e ideais progressistas, baseados na blema, que podemos sintetizar num paradigma instru-
dominado por uma tónica que coloca ção do conhecimento. Não deixando ninguém para trás. igualdade e na solidariedade entre os povos, que jamais cional, de matriz seletiva e que partia do princípio de que
a essência das soluções no futuro. O efeito A instituição educativa transmissora das respostas julgaríamos ver postos em causa nos dias de hoje. Por isso a muitos se podia ensinar como se de um só se tratasse,
certas deixou de ter lugar num mundo em que o conhe- mesmo, bem ilustrativos e, acreditem, ser-me-ia muito urge, cada vez mais, a necessidade de dar o passo em fren-
provocado tem sido tornar esse lugar- cimento se constrói através da formulação de perguntas, confortável não ter estes exemplos para designar. te. Um passo que assuma a diversidade numa dimensão
-comum um sítio confortável, porque se simplesmente porque o lugar das respostas certas e da Nunca é demais revisitar Humberto Maturana, quan- ética e estética, enquanto fator de riqueza e de estimula-
transmissão do que é sabido jamais deixará de marcar pas- do se pretende fundamentar a conceção do processo edu- ção de ambientes onde, para além de todos aprenderem
situa num tempo que não é hoje, fazendo so e, portanto, permanecerá no mesmo lugar. cativo enquanto processo contínuo que se desenvolve ao com todos, são projetados para uma maior complexidade
com que as perturbações e inquietações, A mudança traz inquietações e, muitas vezes, receios. longo de toda a vida. Essa ideia, segundo o autor, faz da dessas mesmas aprendizagens e das competências decor-
Faz-nos olhar, por vezes, para aquilo que nos trava. As pe- comunidade onde vivemos um mundo espontaneamente rentes desse processo.
também elas, vão sendo adiadas… dras. Assumo a minha posição de fé no otimismo, numa conservador, no que se refere à educação, o que não signifi- Temos caminhado, portanto, num sentido que se tem
remetidas para um tempo vindouro! convicção negociada e que se baseia em algo tão simples ca que o contexto educativo não mude, mas sim que a edu- afastado de uma escola que era o lugar privilegiado do co-
como o que vou descrever: Uma vez, ao descer um desfila- cação, enquanto sistema de formação da pessoa, ao longo nhecimento, onde este se concentrava e onde era transmi-
deiro de bicicleta, foquei-me em todas as pedras e obstá- da sua vida, tem efeitos de longa duração, que não mudam tido pela pessoa do professor, para uma informação cada
culos que o ornamentavam e lhe davam nome. Estava com facilmente. Podemos sintetizar essa ideia reforçando a vez mais dispersa e disponível por vários meios, mas que
Assim tem permanecido a “velha” escola, um lugar seguro, medo. Nem me lembro se consegui evitar algum desses obs- perspetiva de que é durante a infância que se vive o mundo não prescinde do papel do professor para que essa mesma
agarrado às respostas certas, cujos ímpetos reformistas vão táculos, acho mesmo que “encalhei” em todos até que, ine- em que se alicerçam as possibilidades da criança se con- informação possa ser devidamente tratada e transformada
sendo projetados para um futuro que tem tardado a chegar. vitavelmente, acabei por cair. Uma vez que estava longe de verter num ser capaz de aceitar e respeitar o outro, a partir em conhecimento.
Nesta reflexão, para a qual todos estamos convoca- casa, e tinha que regressar, fui obrigado a enfrentar mais al- da aceitação e do respeito por si mesma. Na juventude, a Só se poderá falar de mudança e essa só será efetiva
dos, começo por partir do princípio que a escola tem esco- guns desfiladeiros nessa aventura solitária. Nos seguintes, validade desse mundo de convivência experimenta-se na num sentido de melhoria qualitativa pela valorização dos
lhido o lugar da transmissão das respostas certas e daquilo não sei se por coragem ou medo, decidi concentrar-me no aceitação e no respeito pelo outro a partir da aceitação e seus atores. Não se pode abdicar de uma palavra de apre-
que é sabido. Tem sido o lugar daqueles que reproduzem as objetivo final, no sítio onde pretendia chegar. Não voltei a do respeito por si mesmo, representando o começo de uma ço e de encorajamento para os professores, pois, citando
respostas certas para as questões que se colocam, deixan- cair. Essa trágica viagem pode explicar-se bem pela minha vida adulta social e individualmente responsável. o incontornável António Nóvoa, “nada substitui um bom
do todos os outros para trás. Não seremos justos se nos re- falta de habilidade a pedalar por percursos menos urbanos, Assim, na linha de raciocínio explanada, o principal professor”. É aos professores a quem se pede e se invoca a
ferirmos a todas, mas não nos distanciaremos da verdade mas acredito que fiz os caminhos com sucesso por não me referencial nas relações humanas é a solidariedade, o res- mobilização de competências, que, até então, não têm pas-
se afirmarmos que este paradigma tem marcado a genera- focar nos obstáculos. É uma convicção e, como qualquer peito e o amor, que se consubstancia nas ações que cons- sado do plano discursivo para o plano da ação. Refiro-me à
lidade das escolas. convicção, é uma questão de fé e vale o que vale. tituem o outro e o legitimam na realização do ser social autonomia profissional, tantas vezes reclamada por estes

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profissionais, nas suas várias possibilidades e dimensões,
assumindo que uma discricionariedade consentida, mas Artigo
ao mesmo tempo refletida, das suas práticas pode tra-
zer um enriquecimento que potencie oportunidades de
aprendizagem para todos e para cada um, respeitando o
princípio de que cada pessoa tem uma forma muito sin-
gular de construir a sua própria aprendizagem. Algo que Caminhos para a Inclusão:
as neurociências caracterizam e estabelecem como ter-
mo de comparação, a unicidade e singularidade de uma relato da experiência do projeto GAPRIC
impressão digital.
Voltando a essa componente de autonomia profissio-
(Gabinete de Apoio a Programas Incluídos na Comunidade)
nal docente, sem a qual não é possível ambicionar uma na Associação de Paralisia Cerebral de Odemira
escola promotora de sucesso, não resisto a citar o grande
Mestre, Rúbem Alves, que de uma forma única e ilumina- — Lúcia Canha, Ana Colaço, Celeste Simões
da, com aquele jeito que só ele tinha para contagiar os ou-
tros com as suas palavras, dizia assim: Lúcia Canha – canha@uwm.edu, Ana Colaço – ana.colaco@apco.pt, Celeste Simões – csimoes@fmh.ulisboa.pt

“Imagine que você quer ensinar a voar. Na imaginação


tudo é possível. Os mestres do voo são os pássaros.
Então, você aprisiona um pássaro numa gaiola
e pede-lhe que ele o ensine a voar. Pássaros
engaiolados não podem ensinar o voo, por mais que
eles expliquem a teoria do voo, só ensinarão gaiolas”.
RESUMO ciais, e conduz a um estilo de vida mais incluído na comu-
Os professores têm que ensinar o voo, não podem con- nidade. Este projeto deu provas de que o impacto de uma
tinuar a ensinar gaiolas. A Educação ou tem uma função Introdução: Após o término da escolaridade obrigatória, os intervenção desta natureza, com enfoque na comunidade e
libertadora e potenciadora do sonho na pessoa humana ou, jovens com deficiência e suas famílias são confrontados com na pessoa, ocorre em vários domínios de vida: âmbito pro-
então, não serve para nada. a ausência de um serviço de apoio, que lhes permita pers- fissional, qualificação escolar, recreação, saúde e bem-estar.
Fazer o caminho é olhar para a frente, com a sabedo- petivar um futuro incluído na comunidade e alternativo à
ria que transportamos, que construímos, chegando aos institucionalização. Os Gabinetes de Apoio a Programas Palavras-chave: inclusão, comunidade, deficiência/inca-
lugares que não sabíamos que podíamos chegar, que não Incluídos na Comunidade (GAPRIC) são projetos piloto que pacidade, transição para a vida adulta
sabíamos como eram antes de lá termos estado. Como di- surgiram em Portugal numa tentativa de colmatar esta la-
zia o poeta António Machado, “ao olhar para trás veremos o cuna. Este artigo caracteriza e apresenta os resultados do
trilho que jamais se voltará a pisar”. Temos o trilho e à nossa apoio do GAPRIC, da Associação de Paralisia Cerebral de 1. INTRODUÇÃO
frente as múltiplas possibilidades que o caminho que já tri- Odemira, a 13 jovens e adultos ao longo de três anos.
lhámos nos oferece. A transição do jovem com deficiência para a vida adulta
Para concluir, não resisto a recuperar uma história, Metodologia: Foram utilizados procedimentos e estra- A transição para a idade adulta é uma fase decisiva no de-
contada por Rúbem Alves, num outro contexto, mas que tégias de intervenção individualizadas, inspirados pelos senvolvimento de qualquer jovem. É um período em que
nos pode alimentar a reflexão. Reza a história que uma princípios do Planeamento Centrado na Pessoa (PCP). Para são exigidas decisões relacionadas com a forma como os
centopeia que andava feliz pelo jardim foi interpelada por a avaliação do impacto do apoio do Gabinete GAPRIC na jovens irão exercer a sua autonomia ao nível laboral, con-
um grilo: “Dona centopeia, sempre tive curiosidade sobre vida das pessoas apoiadas, nas famílias e na comunidade, tinuação dos estudos, lazer, cuidados de saúde, interação
uma coisa: quando a senhora anda, qual, de entre as suas foram aplicados questionários de avaliação da satisfação. social e participação na comunidade (Wehman, 2006).
cem patas, aquela que a senhora mexe primeiro?”. “Curio- Apesar de ser um período desafiante para qualquer jovem
so”, respondeu a centopeia. “Sempre andei, mas nunca Resultados: O número de parcerias aumentou exponen- que se confronta com as complexidades inerentes à entra-
pensei nessa questão. Da próxima vez prestarei atenção”. cialmente com o desenvolver do projeto, e a idade das pes- da nesta fase, é sabido que os jovens com deficiência e/ou
A história termina dizendo que a centopeia nunca mais soas que solicitaram o apoio foi diminuindo ao longo do incapacidade enfrentam desafios adicionais (Lollar, 2010).
voltou a andar. tempo. Tanto para as pessoas apoiadas, como para as suas Na área da Educação Especial, o conceito de tran-
Se dirigirmos o nosso olhar para um horizonte mais famílias e entidades parceiras, o grau de satisfação com o sição tem sido alvo de diferentes abordagens. Todavia,
humanista, com convicção, estou certo que não tropeça- projeto foi positivo. O tempo e a diversidade de atividades todas têm em comum o papel fulcral da escola na cons-
remos nas pedras. na comunidade aumentaram para a generalidade das pes- trução de um projeto de vida de jovens com deficiência
soas apoiadas. A inclusão profissional de algumas das pes- e incapacidade, ao promover uma transição para a vida
soas, foi outro dos resultados alcançados. adulta efetiva e contextualizada na comunidade, através
Conclusões: Proporcionar experiências na comunidade, do ensino-aprendizagem de habilidades que permitam a
permite o desenvolvimento de competências pessoais e so- adaptação aos contextos onde os indivíduos se inserem,

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providenciando oportunidades de sucesso pessoal e so- (Hirano et al., 2017). Por exemplo, ainda na escola, ao se ficiência, mas antes por ajudá-la a encontrar o seu cami- deficiência fazer as suas próprias escolhas, tornar-se um
cial (Santos, 2013). Neste sentido, proporcionar aos jovens determinar as expectativas da família, nível de envolvi- nho e a percorrê-lo (Ferreira & Pereira, 2015). É por isso agente ativo na sua própria vida, interagir com pessoas
com deficiência, o mais cedo possível, experiências na mento, conhecimento, e preocupações relacionados com que o desenvolvimento de competências, como a autode- com diferentes características, frequentar diferentes con-
comunidade tendo em consideração os seus interesses e o período após a escola – tais como opções vocacionais, terminação, durante o processo de transição para uma textos, experienciando um aumento de competências, são
capacidades, tem demonstrado ser uma prática de suces- emprego, suporte e assistência disponíveis – os profissio- vida adulta, é essencial para que o jovem com deficiência condições essenciais para a construção de futuros felizes
so, aumentando a probabilidade de emprego e inclusão nais podem estar mais aptos para alinharem o seu apoio, descubra este caminho e desenvolva relações interpes- (Soresi, Nota, & Wehmeyer, 2011).
social (Mamun et al., 2018). de forma a responderem melhor às necessidades dos jo- soais fortes e positivas, contribuindo para o sucesso no
vens e das famílias, e a desenvolverem objetivos que são desempenho de papéis da vida adulta (Bremer & Smith,
Desenvolvimento de uma vida incluída na comunidade por eles valorizados (Chambers et al., 2004). 2004), nomeadamente ter um emprego e participar ativa- 2. MÉTODOS E PROCEDIMENTOS
Após o término da escolaridade obrigatória, assume-se Um dos aspetos positivos do envolvimento dos pais, mente na comunidade.
frequentemente que os jovens com deficiência que não é o seu impacto no desenvolvimento dos adolescentes ou GAPRIC – Gabinetes de Apoio
prosseguem estudos necessitam de ser institucionaliza- jovens (Bennett & Hay, 2007). Os pais ou familiares po- Autodeterminação, inclusão a Programas Incluídos na Comunidade
dos. Face à falta de vagas nas instituições que prestam dem ser ajudados a serem agentes promotores da inclu- na comunidade & qualidade-de-vida Os GAPRIC’s constituem uma modalidade de apoio à in-
apoio à deficiência, este é um período de ansiedade para são, e a adquirirem uma perceção de controlo interno da A autodeterminação pressupõe o desenvolvimento e a clusão de pessoas com deficiência e/ou incapacidade em
jovens com deficiência e suas famílias, pois são confron- situação. Por exemplo, a utilização de estratégias como o aquisição de um conjunto de componentes que ocorre ao atividades em contextos naturais, através da mobiliza-
tados com a ausência de um apoio alternativo à institucio- envolvimento do jovem/família com a sua comunidade, e longo da vida e começa desde as idades precoces, tais como ção dos recursos existentes na comunidade, tais como
nalização, e surge o desânimo perante falta de perspetivas a disponibilização de informação e criação de oportuni- a capacidade de fazer escolhas, tomar decisões, resolver autarquias, empresas, serviços e organizações várias. Es-
futuras (Canha, Owens, & Simões, 2013). Na verdade, um dades que auxiliem o jovem e família na adaptação aos problemas, estabelecer metas, ter autoconsciência e auto- tes gabinetes de apoio surgiram em 2015 através de um
número considerável de pessoas com deficiência não ne- diferentes cenários que a transição implica, podem ser de conhecimento (Wehmeyer & Schalock, 2001). Uma pessoa consórcio de 10 instituições em Portugal Continental,
cessita de um apoio ou suporte prolongado e continuado, grande utilidade. autodeterminada é capaz de controlar a sua vida, sendo o dinamizadas pela Associação ASSOL, e foram financia-
existindo um conjunto de atividades que conseguem rea- Outro aspeto a ter em consideração no envolvimento agente primário na sua vida, fazendo escolhas e tomando dos pelo Instituto Nacional para a Reabilitação (INR). A
lizar por elas próprias se tiverem um suporte inicial (Sore- dos pais, relaciona-se com a importância de criar momen- decisões sem influência ou interferência externa (Wehme- Associação de Paralisia Cerebral de Odemira (APCO) é
si, Nota, & Wehmeyer, 2011). Muitas vezes, o que falta são tos de suporte e partilha nesta fase de transição. Durante yer, Kelchner, & Richards, 1996). A autodeterminação é as- uma das instituições participantes. De seguida são apre-
oportunidades de experienciar uma maior inclusão nos este período, se o jovem estiver envolvido num programa sim desafiada quando a escolha, e o controlo sobre a vida sentados os resultados do funcionamento do GAPRIC ao
vários contextos das suas vidas, acompanhadas das modi- de inclusão comunitária, podem emergir dificuldades por diária, são retirados das pessoas com deficiência, e quando longo de três anos.
ficações ou suportes ambientais necessários (Soresi, Nota, parte dos pais ou familiares ao lidarem com a ampliação a sua autonomia é constrangida pela institucionalização A APCO é a única Instituição Particular de Solida-
& Wehmeyer, 2011). das autonomias dos jovens; o suporte emocional aos cui- (Morris, 2005 cit in Gowar, 2014). -riedade Social do concelho de Odemira que presta apoio
Deste modo, um serviço que dê suporte e proporcione dadores permite, nestas circunstâncias, proporcionar al- Está amplamente relatado que a inclusão na comu- a crianças, jovens e adultos com deficiência e suas famí-
atividades na comunidade, e faça a ligação das famílias e guma tranquilidade e segurança numa fase de turbulência nidade, e a autodeterminação da pessoa com deficiência, lias. De ano para ano, cada vez mais se observa que jovens
jovens ao seu ambiente próximo, constitui uma alterna- (Canha & Fernandes, 2018). é essencial para a sua qualidade de vida (Soresi, Nota, & adultos se encontram no domicílio, após a sua escolarida-
tiva à institucionalização. É nas comunidades que se en- Wehmeyer, 2011). Por exemplo, no nosso país, um estudo de, sem qualquer resposta. No sentido de responder a esta
contram as relações, os suportes e as oportunidades, que A abordagem: o Planeamento Centrado na Pessoa levado a cabo com 195 jovens com deficiência com o ob- necessidade, a APCO juntou-se a este consórcio, recebendo
podem ampliar as experiências de vida em jovens e adultos Outra das variáveis a ter em consideração na inclusão da jetivo de compreender a relação entre as componentes da o financiamento do INR para um período de 4 meses. Pos-
com deficiência (Carter et al.,2009). No âmbito profissional, pessoa com deficiência na comunidade, é o tipo de apoio autodeterminação e a qualidade de vida, concluiu que a teriormente, deu continuidade ao projeto na instituição,
a comunidade pode facultar aos indivíduos oportunidades necessário para que essa inclusão ocorra. A variabilidade capacidade de escolha é o fator que está mais associado quer através de outras candidaturas a programas de finan-
de explorar potenciais interesses de carreiras profissionais inter e intra-individual resulta em diferentes necessida- à qualidade de vida em pessoas com deficiência (Canha ciamento, quer através de fundos próprios.
(Carter et al., 2009), e a aprendizagem de competências e des relativamente ao nível, tipo, intensidade ou duração et al., 2016). Em outros estudos fora do nosso país, verifi- O objetivo dos GAPRIC’s consiste em apoiar o de-
comportamentos através de experiências em contextos de apoios, principalmente se a pessoa estiver a participar caram-se diferenças significativas na qualidade de vida senvolvimento de atividades significativas incluídas na
reais de trabalho, estruturados e supervisionados (Linds- ativamente e a agir de forma mais autónoma (Soresi, Nota, entre indivíduos com dificuldade intelectual integrados comunidade: experiências socioprofissionais em con-
trom et al., 2014). & Wehmeyer, 2011) o que nos leva a outro dos pilares no em contextos comunitários, quando comparados com os textos reais de trabalho, atividades culturais, desporti-
apoio à transição para a vida adulta: a individualização que frequentam programas em centros de dia, em contex- vas, de lazer e voluntariado. Pretende-se que as pessoas
Envolvimento das famílias dos apoios segundo a visão do Planeamento Centrado na tos protegidos, uma vez que os indivíduos que realizam apoiadas adquiram competências, e uma rede de apoio
As famílias jogam um papel central no desenvolvimen- Pessoa (PCP). O PCP é o termo usado para descrever uma experiências de trabalho na comunidade relataram um que lhes permita serem elas próprias os agentes ativos na
to das aspirações e expectativas do adolescente e jovem variedade de abordagens de planeamento que se focam aumento das oportunidades para fazer escolhas e tomar construção de uma vida com mais qualidade e incluída
com deficiência em relação ao futuro (Woods, Sylvester, no indivíduo – nas suas necessidades, preferências, inte- o controlo sobre a sua própria vida (Blick et al., 2016). Es- na comunidade.
& Martin, 2010; Lindstrom et al., 2007; Wagner et al., resses e sonhos – tendo em mente o reconhecimento da tes resultados sugerem que a integração e inclusão na O GAPRIC atua segundo os princípios do Planeamen-
2006). Deste modo, é da maior importância envolver os importância dos suportes formais e informais. Assim, este comunidade está correlacionada com o sentido de “nor- to Centrado na Pessoa. Tem como linha orientadora a ideia
pais durante todo o processo de transição para a vida planeamento é construído à volta das necessidades e pre- malidade” consistente com os colegas que não têm uma de que os apoios devem ser negociados com cada pessoa
adulta, dado o importante papel que a família representa ferências da pessoa, coloca a pessoa no centro das decisões deficiência, cultivando características de autodetermina- em função dos seus sonhos, capacidades e necessidades no
na vida do adolescente e jovem com deficiência, inclusi- e não os serviços, identifica agentes motores das ações pla- ção (Blick et al., 2016). sentido de melhorar o seu funcionamento pessoal, incluin-
ve a preferência dos próprios jovens em receberem apoio neadas e atribui responsabilidades, e avalia o progresso da Concluindo, para uma transição ser bem-sucedida, do a sua participação na vida familiar e na comunidade,
da família ao longo da vida. Neste âmbito, atualmente pessoa de forma contínua (O’Brien, 1992). deverá existir uma contínua participação do jovem, o en- estimulando e apoiando o seu poder de decisão ao longo de
existem esforços no sentido de avaliar e intervir sobre os Segundo a visão do PCP, o papel dos profissionais volvimento da família e proporcionar experiências posi- todo o processo. O apoio dado pelo GAPRIC é de proximi-
fatores que motivam a um maior envolvimento dos pais não passa por definir um caminho para a pessoa com de- tivas na comunidade. A oportunidade para o jovem com dade, e ocorre essencialmente na comunidade.

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Procedimentos sendo flexível, isto é, foi ajustado, sempre que necessário, no caso das atividades de âmbito laboral, encontradas ta- Instrumentos de Avaliação
A primeira fase do projeto na APCO passou pela divulgação face ao desenvolvimento e maior conhecimento da pessoa refas progressivamente mais complexas, de acordo com o Os resultados do projeto foram avaliados através da aplica-
do gabinete GAPRIC na comunidade, através das redes so- de si mesmo, e das oportunidades existentes. Foi dada es- desempenho da pessoa e as necessidades das empresas. ção de questionários de avaliação da satisfação a todos os
ciais, e da distribuição de cartazes em várias organizações pecial atenção ao envolvimento da família e à mediação da envolvidos – pessoas com deficiência, famílias, entidades/
e serviços. Paralelamente, foram realizadas reuniões com vinculação das pessoas às suas comunidades próximas. Público-alvo empresas parceiras. Os instrumentos utilizados resulta-
o Município de Odemira, as Juntas de Freguesias próxi- O projeto contou com o suporte de uma técnica, que Durante os três anos do projeto a que se refere este estudo, ram de uma adaptação dos instrumentos utilizados pela
mas das zonas de residência das pessoas apoiadas, de apoiou no terreno os participantes e as diversas entidades foram apoiadas no total 13 pessoas, com idades compreen- Associação ASSOL (Ferreira & Pereira, 2015): 1) Questio-
modo a dar a conhecer o GAPRIC, bem como em empre- que os incluíram. Este apoio em contexto, numa fase inicial didas entre os 18 e os 51 anos, sendo a média de idades 29,6. nário de avaliação da satisfação das pessoas apoiadas
sas e outras entidades do concelho (associações locais de de integração, foi realizado através da presença da técnica Quanto ao género, 53% são do género masculino e 46% do (satisfação face ao apoio da técnica, à relação com os co-
âmbito desportivo, recreativo, cultural). todo o tempo em que a pessoa se encontrava no contexto. género feminino. Relativamente à escolaridade, 8% têm legas, ao desenvolvimento de capacidades, às atividades
Seguiram-se um conjunto de ações que guiaram o Após a fase de integração, a técnica continuou a estar pre- apenas o 1º ano de escolaridade, 62% concluíram a esco- programadas e as realizadas, oportunidade de escolha); 2)
apoio a todas as pessoas que integraram o projeto GAPRIC sente e disponível, embora de forma mais pontual, de acor- laridade até ao 9º ano e 30% têm o ensino secundário con- Questionário de avaliação da satisfação das famílias
(ver Tabela 1). Partindo do conhecimento da pessoa, foi de- do com as necessidades da empresa/entidade de acolhi- cluído. 46% das pessoas apoiadas apresentam dificuldades (qualidade do apoio da técnica à pessoa e à família, cum-
senhado um plano de atividades operacionalizado através mento e do participante. No decorrer da experiência foram intelectuais, 23% dificuldades motoras e 30% doença do primento das atividades acordadas); 3) Questionário de
de experiências em contextos comunitários. Este plano foi realizadas adaptações às tarefas realizadas pela pessoa e, foro psiquiátrico. avaliação da satisfação das entidades/empresas par-
A dinâmica da entrada de pessoas no gabinete foi pro- ceiras (apoio da técnica às pessoas apoiadas e aos colabo-
gressiva, e obedeceu a critérios de capacidade e qualidade. radores da empresa,impacto do projeto na entidade).
Isto é, para que fosse garantido um apoio individualizado e
Ações desenvolvidas Descrição holístico na construção de programas incluídos na comu-
nidade, existiu a necessidade de assegurar uma maior dis- 3. RESULTADOS
ponibilidade da técnica numa fase inicial. De facto, quando
1. Definição do Perfil Pessoal para Reuniões iniciais de avaliação dos interesses, necessidades e potencialidades às pessoas interessadas
elaboração dos Planos Individuais
uma pessoa é integrada existe um investimento na procura Parceiros
em integrar o GAPRIC. Foram envolvidos neste processo os familiares, amigos, professores e outros
de Inclusão Comunitária. convidados da pessoa apoiada, e foi utilizada a ferramenta MAPS (Making Action Plans).
dos recursos da comunidade que sejam resposta para as vá- No início do projeto, estabeleceram-se 7 protocolos de par-
O MAPS envolve 8 áreas: história pessoal; sonhos; pesadelos; características pessoais da pessoa; rias dimensões da vida da pessoa (pessoal, social, cultural ceria com diversas entidades da comunidade de Odemira:
forças/talentos; necessidades (o que precisa para atingir o sonho) e; plano de ação (quem vai fazer e recreativa). Posteriormente, a pessoa opta pelos recursos 3 empresas, 1 Junta de Freguesia, 3 Associações. As par-
o quê e quando). a que deseja recorrer e é apoiada na ligação aos mesmos. O cerias foram aumentando de ano para ano, à medida que
afastamento da técnica deu-se à medida que a pessoa ficou foram integradas novas pessoas, de acordo com as suas
2. Estabelecimento de parcerias Estabelecimento de contactos e parcerias com entidades na comunidade. mais autónoma e, como tal, necessitando de menos apoio e necessidades ou resultado de novos interesses manifes-
permitindo assim a entrada de novas pessoas. tados pelos participantes. No início do 3º ano de projeto,
Também ocorreram saídas do projeto (por motivos o GAPRIC contava com 20 parceiros, colaborando na in-
3. Atividades na comunidade Desenvolvimento, suporte próximo, e monitorização das atividades na comunidade em vários âmbitos:
pessoais ou porque se deu a transição para uma situação clusão dos participantes em atividades socioprofissionais,
laboral, recreativo, desportivo e de voluntariado.
de empregabilidade) dando lugar a outros candidatos, cuja atividades desportivas e culturais, nomeadamente 2 esta-
procura de apoio deste gabinete foi crescente, resultado da belecimentos escolares; 6 Associações; 2 IPSS; 6 Empresas;
4. Sessões de grupo com Reuniões ao longo do projeto com uma periodicidade mensal. As sessões de grupo, com sua divulgação na comunidade e das ligações que se foram 1 Câmara Municipal e 3 Juntas de Freguesia.
as pessoas apoiadas a presença de todos os participantes, criam um espaço e um tempo de partilha de experiências,
estabelecendo com as escolas.
preocupações e necessidades. Estas sessões procuraram ainda promover o desenvolvimento
O projeto GAPRIC iniciou com um grupo de seis pes- Grau de Satisfação com o Projeto
de aptidões sociais, interpessoais, mais especificamente, aptidões de autodeterminação.
De acordo com as necessidades que foram surgindo, foram trabalhadas aptidões comportamentais
soas e foi integrando gradualmente novos elementos. No O grau de satisfação foi obtido através da aplicação de três
relacionadas com o mundo laboral. No âmbito destas atividades foram ainda organizadas atividades final do primeiro ano de projeto tinham sido apoiadas um questionários de satisfação aos principais intervenientes
lúdicas na comunidade sob proposta do grupo. total de 8 pessoas, no 2º ano, estavam a ser apoiadas 10 no projeto: pessoas apoiadas; famílias das pessoas apoia-
e, no final do 3º, ano o gabinete contava com 11 pessoas das; e entidades parceiras. No 3º ano do projeto, os três
5. Reuniões com pais Reuniões de pais ao longo do projeto com uma periodicidade semestral. Estes momentos permitiram
apoiadas. Ao longo dos 3 anos tiveram lugar 5 novas ad- grupos de pessoas reportaram um nível de satisfação posi-
envolver os pais no processo de construção dos projetos de vida dos participantes, e gerir emoções missões e 3 saídas. tivo, mas foram as pessoas apoiadas que apresentaram um
que surgem perante os comportamentos mais autodeterminados, e a mudança para um novo estilo Relativamente à situação inicial dos participantes na nível de satisfação superior (90,74%), seguidas das famílias
de vida mais autónomo dos seus filhos. altura da admissão, os que integraram o projeto na fase (88,75%) e entidades parceiras (88,28%), com um nível de
inicial, foram pessoas ligadas de alguma forma à APCO, satisfação muito idêntico.
6. Acompanhamento técnico Acompanhamento continuado do técnico à pessoa apoiada, ao empregador e colegas de trabalho,
para os quais não havia resposta, e com perfil para inte-
próximo e continuado no caso de atividades de âmbito profissional, ou pessoas responsáveis nos outros contextos de grar este tipo de apoio. No 1º ano, 2 das pessoas apoia- Impacto do apoio no trajeto de vida das pessoas
inclusão. Reuniões de avaliação das experiências socioprofissionais realizadas com os responsáveis das, estavam sem ocupação, institucionalizadas numa apoiadas — âmbito profissional
nas empresas/entidades parceiras. residência, 6 encontravam-se sem ocupação, algumas Ao longo do 2º ano, uma das pessoas apoiadas iniciou um
beneficiárias de pensão de invalidez foram referenciadas estágio-inserção para pessoas com deficiência/incapa-
7. Avaliação e monotorização Aplicação de questionários de avaliação da satisfação. Aplicação de questionários de auto por serviços diversos na comunidade, bem como pela sua cidade na empresa onde realizava a sua experiência so-
e heteroavaliação das experiências profissionais. família. Ao longo do 2º e 3ºano, foram progressivamente cioprofissional de forma não remunerada. No início do 3º
entrando pessoas mais jovens, reencaminhadas pela es- ano, uma pessoa apoiada foi contratada pela empresa na
Tabela 1. Principais ações desenvolvidas durante o processo de apoio cola após o processo de transição. qual estava inserida no âmbito do projeto, outra aguardava

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o início de um contrato de trabalho, e outra integrou uma O estabelecimento de novas relações de amizade, o Resposta complementar a outras respostas com serviços, empresas e organizações comunitárias,
formação profissional financiada pelo IEFP. sentirem-se parte integrante de um grupo e úteis nas ta- institucionalizadas conduz a comunidades progressivamente mais inclusi-
refas que realizavam, foram outros aspetos presentes no As respostas sociais tradicionais, prestadas pelas institui- vas e competentes.
Impacto do apoio no trajeto de vida desenvolvimento do apoio, e que são relevantes para a qua- ções de apoio à pessoa com deficiência, podem também be-
das pessoas apoiadas — qualificação escolar lidade-de-vida e desenvolvimento destas pessoas. neficiar deste tipo de apoio. Por exemplo, como mostram Limitações
No decorrer do apoio prestado, surgiu o desejo de alguns As famílias foram ativamente envolvidas neste pro- os resultados deste projeto, pessoas que requerem o apoio Apesar destes resultados positivos, um dos aspetos senti-
participantes melhorarem a sua qualificação escolar. Nes- cesso, observando elas próprias as conquistas pessoais dos residencial não significa que necessitem de um Centro de dos como limitação diz respeito ao financiamento desta
tes casos, o papel do apoio do GAPRIC foi estabelecer a seus familiares, na crescente participação na comunidade, Atividades Ocupacionais. Podem ser jovens que necessi- resposta, que tem sido conseguida, apenas parcialmente,
ligação às entidades formativas e apoio, sempre que solici- e criação de relações interpessoais, e o desenvolvimento de tem apenas de apoio na sua inclusão comunitária e, even- através de projetos. As limitações nos horários da rede de
tado, durante todo o percurso de qualificação (aluno e en- uma maior autonomia e responsabilização. tualmente, também profissional. transportes públicos para a deslocação das pessoas apoia-
tidade formativa). No 2º ano do projeto, uma das pessoas das, bem como em alguns casos específicos, as atitudes ne-
apoiadas finalizou o 12º ano, e no 3º ano cinco encontra- Impacto do projeto na comunidade: envolvimento e Boas práticas: trabalho em rede gativas face às pessoas apoiadas, foram outros constrangi-
vam-se em processo de obtenção de maiores habilitações construção progressivos de ambientes mais inclusivos e o apoio técnico próximo e continuado mentos encontrados.
literárias (2 inscritos para frequência de Curso de Educa- O trabalho desenvolvido pelo GAPRIC prova que a rela- O apoio próximo e regular da técnica na integração nos Embora o GAPRIC não seja uma resposta social, ou
ção e Formação – 9º ano, e 3 a frequentar o Programa Qua- ção estreita com a comunidade que caracteriza o apoio postos de trabalho, foi sentido como um aspeto positivo seja, um apoio formal e financiado, a Associação que su-
lifica – 12º ano). prestado, contribui para comunidades mais solidárias e por parte dos parceiros e familiares, permitindo sentirem- porta este projeto, a APCO, apesar dos seus recursos li-
sensibilizadas, uma vez que os agentes da comunidade -se mais apoiados e seguros. Pensamos que esta proximi- mitados, tem vindo a garantir a continuidade do projeto,
Impacto do projeto no trajeto de vida das são apoiados no sentido da construção de uma sociedade dade e disponibilidade da técnica permitiu maior inves- dadas as crescentes solicitações da comunidade a este
pessoas apoiadas — recreação, saúde e bem-estar mais inclusiva. timento e envolvimento de todos no desenvolvimento do gabinete. Tem-se também iniciado o passo no sentido de
Com o decorrer do projeto verificou-se um aumento do Em apenas quatro meses, observou-se uma adesão po- programa de atividades dos participantes. um enquadramento legal para o GAPRIC.
número de pessoas envolvidas em atividades relacionadas sitiva de empresas e entidades a este novo modelo de traba- O esforço intencionalizado e sistemático na cons- Este tem sido até ao momento o caminho percorrido,
com a saúde, desporto, voluntariado ou culturais. É de re- lho. Esta adesão foi sendo crescente e foi possível, em alguns trução do trabalho em rede, constitui outra prática que mas fica a necessidade de continuar a caminhar e de tor-
ferir que uma pessoa integrada no desporto, por exemplo, casos, transitar para uma situação de empregabilidade. se considera ter tido uma influência positiva nos resulta- nar este projeto como um serviço disponível e generaliza-
pode também estar incluída em outros contextos de ativi- dos obtidos. A realização de atividades em contexto real do ao país, para que o trabalho até agora desenvolvido não
dades, de acordo com as suas necessidades e motivações. Resposta à lacuna existente no apoio de trabalho, que em alguns casos resultou numa situação se perca por escassez de recursos financeiros e humanos.
Deste modo, no final do 3º ano de projeto, 7 pessoas esta- após a escolaridade obrigatória de emprego, foi conseguido através da sensibilização e ar-
vam a frequentar atividades desportivas, 2 a realizar expe- O tipo de apoio prestado pelo GAPRIC ainda não está di- ticulação crescente com empresas e outras organizações
riências de voluntariado através do Banco Local de Volun- fundido em Portugal, nem constituiu uma resposta formal e serviços, incluindo os serviços do IEFP. O envolvimento
tariado, 6 a frequentar atividades recreativas culturais e 2 à pessoa com deficiência. Contudo, os resultados positivos das diversas organizações das comunidades próximas das
em ligação com serviços de saúde na comunidade (apoio obtidos na avaliação da satisfação com o apoio dado pelo pessoas, permitiu que fossem criadas oportunidades de
psicológico e consultas de nutrição). GAPRIC – pessoas apoiadas, familiares e parceiros – reme- desenvolvimento de atividades de âmbito da recreação, da
tem para a importância que projetos desta natureza têm saúde e bem-estar.
na reflexão sobre boas práticas para a inclusão.
4. CONCLUSÕES E LIMITAÇÕES Neste sentido, pensamos que o projeto GAPRIC deu Resiliência do Projeto GAPRIC
provas, durante os seus três anos de existência, da ne- Quando iniciou o projeto GAPRIC, a APCO tinha apenas
Este artigo apresenta os resultados do apoio prestado pelo cessidade e adequabilidade deste tipo de resposta. Ficou como certeza o funcionamento do projeto durante quatro
projeto GAPRIC de Odemira a 13 pessoas com deficiência/ provado que este tipo de apoio se constitui como uma boa meses, o período do financiamento. Tinha como objetivo
incapacidade ao longo de três anos de funcionamento. De prática de inclusão, isto é, responde às necessidades dos construir evidências que testemunhassem que o apoio a
seguida apresentamos algumas conclusões sugeridas pe- jovens que, terminada a sua escolaridade ou em situação programas incluídos na comunidade a pessoas com defi-
los resultados do projeto. de inatividade, necessitam de um serviço de apoio que os ciência era possível, que era um apoio adequado às carac-
ajude na construção de projetos de vida inclusivos ao ní- terísticas e necessidades de algumas pessoas com deficiên-
Impacto do apoio prestado nas pessoas apoiadas: vel profissional, social e de lazer. cia, com um impacto positivo nas suas vidas. Estes meses
saída de uma situação de inatividade para um estilo Se analisarmos a dinâmica do grupo alvo apoiado, a transformaram-se em três anos de apoio continuado a jo-
de vida útil e incluído na comunidade partir do segundo ano verificou-se a entrada de pessoas vens com deficiência.
A evolução dos programas de atividades individuais de- com idades mais jovens encaminhadas pela escola. De Este projeto deu provas de que o impacto de uma
senvolvidos semanalmente, fala-nos do impacto positivo facto, este projeto tem possibilitado, em alguns casos, um intervenção desta natureza, com enfoque na comunida-
no trajeto de vida das pessoas apoiadas. Desde o início do apoio continuado após a escolaridade, dando seguimento de e na pessoa, ocorre em vários domínios de vida: âm-
projeto, foram evidentes as transformações significativas aos projetos de vida dos alunos, dando evidências de que bito profissional, qualificação escolar, recreação, saúde
nas vidas das pessoas: passaram a ter objetivos de vida e uma resposta, como a dada pelo GAPRIC, é uma respos- e bem-estar. O estabelecimento de novas relações de
rotinas, com o consequente aumento da sua autoestima, ta viável para jovens com deficiência, preenchendo uma amizade, o sentir-se parte integrante de um grupo, ter
autonomia e poder de decisão pessoal. Além disso, de ano lacuna existente no nosso país: a existência de um apoio um sentimento de utilidade nas tarefas que realizam
para ano, e de acordo com o desejado por cada pessoa, os alternativo à institucionalização, que dê continuidade à na comunidade, são outros fatores que contribuem para
objetivos e as atividades acordadas foram sendo mais exi- escolaridade obrigatória, evitandos períodos de inativi- que estes jovens/adultos se sintam mais felizes. Ao nível
gentes, desafiantes e em maior número. dade, incerteza e perda de capacidades. ambiental, a relação próxima e continuada estabelecida

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localizado na Zona Portuária da cidade do Rio de Janeiro, A Importância da acessibilidade
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to Employment: Role of the Family in Career Development. 73(3), 348-366. a partir da realização de um estudo de caso. Para tal, rea- No que diz respeito à pessoa com deficiência no Brasil a aces-
Lindstrom, L., Hirano, K., McCarthy, C., & Alverson, C. (2014). “Just Having lizamos um estudo de caso onde observamos a interacção sibilidade é uma questão legal, um direito adquirido em lei.
a Job”: Career Advancement for Low-Wage Workers with Intellectual de um aluno com baixa visão severa e paralisia cerebral Por esse motivo, a materialização desse direito é uma pro-
and Developmental Disabilities. Career Development and Transition for
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(marcha comprometida) do 8º ano do Instituto Benjamin posta oferecida pelo Museu do Amanhã à sociedade comum.
Lollar, D. (2010). Launching into Adulthood: Na Integrated Response to
Constant nas dependências do local. Apresentamos uma Como nos mostra FERNANDES e ORRICO, 2012, a
Support Transition of Youth with Chronic Health Conditions and Disabilities. breve história da Zona portuária da cidade do Rio de Ja- Constituição Federal do Brasil de 1988; a Lei nº 7.853 (24
Baltimore, Maryland: Paul H. Brooks Publishing Co. neiro, do período Colonial, Império e República, fazendo de Outubro de 1989), a Lei 10.048 (8 de dezembro de 2000),
Mamun, A. A., Carter, E. W., Fraker, T. M., & Timmins, L. L. (2018). Impact uma breve transição do modelo arquitectónico destes a Lei 10.098 (19 de Dezembro de 2000), a Lei 13.146 “Lei da
of Early Work Experiences on Subsequent Paid Employment for Young
Adults with Disabilities. Career Development and Transition for Exceptional períodos até a privatização no Século XXI, pela Conces- Inclusão” (6 de julho de 2015), o Decreto 3298 de 20 de De-
Individuals. sionária Porto Novo. Concluímos que, não obstante a exis- zembro de 1999, que estabelece o acesso da pessoa com de-
O’Brien J, Lovett H. Finding a Way Toward Everyday Lives: The Contribution tência de Tecnologia Assistivas (TA) no referido espaço, ficiência aos bens sociais e materiais e o Decreto n. 7612 de
of Person Centered Planning. Harrisburg, PA: Pennsylvania Office of Mental
Retardation; 1992.
ainda existem aspectos carentes de melhorias. 17 de Novembro de 2011, que institui o Plano Nacional dos
Direitos da pessoa com deficiência – Plano Viver sem Limi-
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Educativas Especiais. Dissertação elaborada com vista à obtenção do Grau Palavras-chave: acessibilidade; deficiência visual; Museu tes. (BRASIL, 1989; BRASIL, 1999; BRASIL, 2011; BRASIL,
de Mestre em Reabilitação Psicomotora (FMH-UL). Inclusivo; Inclusão Social; Museu do Amanhã 2015), todas estas legislações, apontam em um só sentido:
Soresi, S., Nota., L., & Wehmeyer, M. (2011). Community involvement in a pessoa com deficiência tem o direito como outro cidadão
promoting inclusion, participation, and self-determination. International
Journal of Inclusive Education, 15(1), 15-28. Abstract: This article aims to investigate the conditions of sem deficiência aos espaços públicos e qualquer serviço
accessibility of Tomorrow the Museum; located in the Har- que for oferecido a um cidadão.
bor Zone of the city of Rio de Janeiro. To this end, we per- Tendo em vista que outros estabelecimentos com a
formed a case study where we observe the interaction of a mesma proposta cultural ainda não se encontram cum-
student with severe low vision and cerebral palsy (difficulty pridores dessas proposições, o Museu do Amanhã atende
walking) of the 8th year of the Instituto Benjamin Constant requisitos básicos da política nacional, fazendo valer o que
in local dependencies. We present a brief history of the port preconiza a Lei 13.146 de 6 de julho de 2015, que afirma
area of the city of Rio de Janeiro, Colonial period, Empire que toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade
and Republic, making a brief architectural model of these de oportunidades como as demais pessoas e não sofrerá
transition periods until privatization in the 21st century, by nenhuma espécie de discriminação (BRASIL, 2015). O Pro-
Concessionary Porto Novo. We conclude that, despite the grama Turismo Acessível no Brasil, tem um conjunto de
existence of Assistive Technology (AT) in that space, there acções para promover a inclusão social e o acesso de pes-
are still aspects in need of improvements. soas com deficiência ou com mobilidade reduzida à activi-

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dade turística, de modo a permitir o alcance e a utilização relevantes que vão acontecer ao seu redor como: o Palace- Banco Santander, Rede Globo e Fundação Roberto Mari- ambiente interno, as maquetes táteis, pisos táteis, sistema
de serviços, edificações e equipamentos turísticos com se- te D.João VI, o Edifício Joseph Gire, além do moderno Edifí- nho resultou em uma oferta de grande legado arquitectó- de áudio descrição e mobiliários. Os indivíduos com bai-
gurança e autonomia. cio RB1 (DE ALMEIDA e RIBEIRO, 2013). nico, cultural e histórico. xa visão necessitam do conhecimento prévio do espaço,
A Reforma Pereira Passos concede uma certa impo- Concebido pelo arquitecto espanhol Santiago Cala- da posição em que se encontram nesse espaço e também
Breve história da Zona Portuária do Rio de Janeiro nência à Cidade do Rio de Janeiro, alargando ruas, acaban- trava, o Museu do Amanhã é: os obstáculos que alteram sua locomoção em determina-
Construído na Zona Portuária da cidade do Rio de Janeiro, do com os cortiços, saneando e trazendo uma infra-estru- do ambiente. Alguns meios de representações espaciais,
o Museu do Amanhã traz consigo grande legado histórico tura de transporte para a capital. Neste período, a região “(…) um dos ícones arquitectônicos do Porto como mapas tácteis, maquetes tácteis e/ou sonoras e sina-
e cultural. Sua localização nos remete à colossal saga de da Zona Portuária foi invadida por aqueles que ficaram Maravilha, (…) maior projecto de desenvolvimento lizações são utilizadas como recursos que facilitem a per-
povos que marcaram a construção desta cidade. sem Teto com o advento da Reforma, criando favelas em urbano em curso no país, (…) ocupa 15 mil metros cepção do espaço pelo usuário deficiente.
Conforme Mello (2003), a cidade de São Sebastião torno deste local. Com o forte crescimento da exportação quadrados, cercado por espelhos d’água, jardim, Lembramos que a identificação de demandas sociais
fundada em 1565 possuía condições propícias como clima de café surge o primeiro sindicato do Brasil, a Estiva. Con- ciclovia e área de lazer, numa área total de 34,6 mil é uma das premissas básicas para o cotidiano científico, a
e posição geográfica de sua baia. Sendo assim, esta região comitantemente, desenvolvem-se o turismo, o câmbio, a metros quadrados do Píer Mauá. Sua forma longilínea, formulação das hipóteses, o encontro de respostas e solu-
passa a ser cobiçada por corsários franceses para efetuar malandragem e a prostituição. inspirada nas bromélias do Jardim Botânico, foi ções que possam trazer benefícios à humanidade.
o contrabando de produtos tropicais. Para Fridman (1999) Na década de 1970, implanta-se a perimetral que, projetada de maneira a se integrar à paisagem ao
a fundação da cidade de São Sebastião é uma questão es- além de afectar esteticamente a região, resulta no isola- redor e, especialmente, deixar visível o Mosteiro de São
tratégica e de segurança. mento da mesma, trazendo uma grande desvalorização Bento, um dos mais importantes conjuntos barrocos RESULTADOS E DISCUSSÃO
Devido ao crescimento da produção açucareira e de dos imóveis em seu entorno. do país. O conjunto arquitectónico do entorno ainda
outros produtos como a farinha, o tráfico de escravos e inclui o edifício A Noite (primeiro arranha-céu da Durante o nosso deslocamento do Município de São Gon-
bichos exóticos intensificou-se na «Praia do Peixe», hoje O Museu do Amanhã como um dos América Latina e sede da Rádio Nacional) e o Museu çalo – localidade na qual reside o convidado até o Museu
chamada de Praça XV. Neste caminhar histórico, a capital elementos de revitalização da Zona Portuária de Arte do Rio (MAR), entre outros marcos. “A ideia do Amanhã pelo sistema de transporte público (Ônibus,
da colónia portuguesa localizada na Bahia transfere-se em O que é espaço urbano? Este é um conceito que não po- é que o edifício fosse o mais etéreo possível, quase Barcas e o sistema Veículo Leve sobre Trilhos – VLT), hoje
1763 para o Rio de Janeiro e começa a acelerar um proces- demos fechá-lo. Entretanto, é possível citar alguns parâ- flutuando sobre o mar, como um barco, um pássaro constitui-se inviável para uma pessoa nas condições do
so urbanístico para a nova capital, até que o Marquês de metros para sua formulação tais como: espaço geográfi- ou uma planta”, (…) A forma do edifício, porém, mesmo (deficiência visual: baixa visão severa e parali-
Lavradio, transfere o comércio de escravos em 1774 para o co, extensão territorial, área de densidade populacional, não é produto de uma pura metáfora ou uma ideia sia cerebral: marcha comprometida). Sendo assim, não
cais do Valongo. Nos anos a seguir, entre 1811 e 1831 mais pouca actividade agrícola, predomínio do desenvolvi- arquitectónica, destaca o arquitecto. “É o resultado de é possível para alguém nestas circunstâncias ou mesmo
de 800 mil escravos foram negociados neste cais: «[...] a vin- mento de sectores terciários, crescimento imobiliário, um diálogo muito consistente para que o edifício se alie em estados semelhantes a partir dos meios de transpor-
da da Família Real para o Brasil e a Abertura dos Portos actividades de infra-estrutura (transporte, educação, à intenção de ser um museu para o futuro, como uma tes referidos acima ter acesso com independência ao Mu-
as Nações Amigas, em 1808, o processo de urbanização e saúde, entre outros). unidade educativa.” (MUSEU DO AMANHÃ). seu do Amanhã, bem como visitar a Região Portuária do
desenvolvimento da Saúde, da Gamboa, do Saco do Alferes Na perspectiva de melhorar as condições de infra-es- Rio de Janeiro.
e da praia Formosa ampliou-se”. (Mello, 2003, p.32) trutura do carnaval Carioca, o maior espectáculo do mun- Neste sentido, desejamos por meio do presente estudo Caracteriza-se como acessibilidade a:
Com o advento da independência dos escravos em 7 do, a Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro atende uma contribuir para que a Educação Brasileira seja um direito
de Setembro de 1822, o 1º Reinado não traz grandes modi- reivindicação antiga do mundo do samba, impulsionado de todos e para todos. (UNESCO, 2014). “Possibilidade e condição de alcance, percepção
ficações políticas e económicas com a nova Carta Magna pela Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Ja- O nosso objectivo com este artigo é divulgar a pesqui- e entendimento para utilização, com segurança
de 1824; tendo em vista que nela se mantém a escravidão neiro – LIERJ: a fundação da Cidade do Samba João Trinta sa de campo realizado ao Museu do Amanhã para analisar- e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos
e a centralização do poder nas mãos do Imperador. To- em 2006. A Zona Portuária passa a ser revisitada por tra- mos a efectividade do carácter inclusivo no espaço proposto urbanos, edificações, transportes, informação
davia, no 2º Reinado, D. Pedro II do Brasil (D Pedro V de balhadores, artistas e turistas, o samba pede passagem na (Museu do Amanhã). Observarmos e avaliamos a relação de e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias,
Portugal); estabelece compromissos políticos com a In- perspectiva de uma nova Zona Portuária. um aluno com baixa visão severa e paralisia cerebral (mar- bem como outros serviços e instalações abertos ao
glaterra para pôr fim ao comércio escravista ultramarino. Segundo Melo e Gonçalves, 2016 “[...] O Pan-2007, a cha comprometida) com o espaço físico do museu. público, de uso público ou privado de uso colectivo,
O cais do Valongo foi soterrado e “[...] transformado por Copa do Mundo-2104 e as Olimpíadas-2016 vão acelerar tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com
Grandjean de Montigny na primeira praça monumental um boom especulatório dos imóveis em toda a Zona Por- deficiência ou mobilidade reduzida.”
do Rio, a antiga Municipal, agora Barão de Tefé.” (Mel- tuária acelerando o processo da privatização deste espaço MATÉRIAS E MÉTODOS (ABNT – NBR – 9050, 2015)
lo,2003,p.11). O mesmo passa a ser chamado de Cais da face aos eventos internacionais que acontecerão na cida-
Imperatriz pois ali desembarcou Thereza Cristina, futura de” (MELO E GONÇALVES, 2016). Para desenvolvemos este artigo realizamos um levanta- Dias et.al; (2014) menciona que:
princesa do Brasil. Dentro desta premissa, a especulação do grande ca- mento bibliográfico, no sistema do Google Académico e na
Segundo Kessel (2001), o fim da extinção das activida- pital leva ao conflito de interesses individuais, trazendo base Scielo, sobre a história da Zona Portuária do Rio de “os indivíduos com baixa visão necessitam do
des do comércio de escravos em 1851 acelera a expansão grandes contradições sociais ao longo deste processo de Janeiro onde esta localizado o Museu do Amanhã. conhecimento prévio do espaço, (…) Alguns meios
económica nesta região em todos os sentidos sejam eles revitalizaçãoo. De acordo com Melo e Gonçalves, 2016, p.3 Logo, a fim de cumprir nosso objectivo e por conse- de representações espaciais, como mapas tácteis,
navais, comerciais, bancários, malhas ferroviárias e até o “[...] neste contexto do ideário urbanístico e do projeto polí- guinte as premissas supracitadas, optamos por realizar a maquetes tácteis e/ou sonoras e sinalizaçõeses são
telégrafo. Com a crise do império em 1889, a república se tico presente no projecto do Porto Maravilha no sentido de presente pesquisa no formato “Estudo de Caso”, através de utilizadas como recursos que facilitem a percepção
instala e começa uma transição urbanística na capital. tentar fabricar um consenso, a Praça Mauá de hoje junta- um convite a um aluno do oitavo ano do Instituto Benja- do espaço pelo usuário deficiente.”
A zona portuária ganha a chamada Praça Mauá, ho- mente com o Museu de Arte do Rio e o Museu do Amanhã. mim Constant com deficiência visual (baixa visão severa) e (DESTEFANI et. al., 2009 apud DIAS,et al, 2014)
menagem ao Barão João Evangelista de Souza em 1910. A Em virtude do espaço da Praça Mauá ter ficado mar- paralisia cerebral (marcha comprometida).
Praça Mauá marca não só o início da Avenida Rio Branco, ginalizado ao longo de décadas, a formação do Museu do Através de visita conjunta, registrada por imagens e A partir deste conceito, pontuamos alguns obstáculos
como também recebe outras transformações imobiliárias Amanhã através da parceria público-privada envolvendo o apontamentos à mão, convidamos o aluno para explorar o para uma pessoa com baixa visão severa:

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a. Veículo Leve sobre Trilhos, (VLT- Praça XV): sua es- forme preconiza o Decreto Municipal nº 38881 de 02 Tablet que a todo momento saia do ar, trazendo enormes pois existem fendas que são altas, fazendo com que o cego
tação encontra-se pronta mas não em funcionamento de Julho de 2014. Somente espaços privados. transtornos de idas e vindas no processo de áudio descri- tenha dificuldades em percebe-las e de caminhar.
(Figura 1), fazendo com que uma pessoa com deficiên- ção. Esta ferramenta é importantíssima para orientação Nas Lojas disponíveis no museu, não encontramos ne-
cia visual com paralisia cerebral tendo sua marcha d. Comunicação e Sinalização: não existe uma tipologia e mobilidade das pessoas com Deficiência Visual (DV), ela nhum produto acessível, nem sequer um livro ou folheto
comprometida necessariamente tenha que andar de comunicação e sinalização espacial para a pes- deveria proporcionar, autonomia para que a pessoa com no formato Braille. Na loja de conveniências, os mobiliários
com auxílio de amigos em torno de 2km. Ressaltamos soa com deficiência visual na Praça Mauá, nenhu- deficiência pudesse explorar o espaço. Entretanto, duran- não são acessíveis, com cadeiras fixas o que dificultaria
ainda que, caso tivesse este tipo de transporte directo ma maquet táctil e/ou sonora que pudesse indicar te a visitação o equipamento utilizado pelo aluno (Figura um deficiente físico em cadeiras de rodas de transitar pelo
ao Museu do Amanhã, não há sinal sonoro no início ao cego sua localização espacial para chegar até a 2) não funcionou. espaço, o cardápio não está adaptado ao sistema Braille. O
da Avenida da Presidente Vargas. entrada do Museu do Amanhã ou mesmo explorar A informação que estava descrita no sentido de orien- Material Promocional sobre o museu: até a presente data
o seu entorno. tar a pessoa com D.V, na realidade trouxe alguns transtor- não conhecemos informações como folder, revista ou his-
b. Ônibus: não existe uma linha de ônibus do Município nos no sentido de orientação. Foram encontradas barreiras tórico no sistema Braille ou em CDs.
de São Gonçalo do Bairro do Colubandê, que passe na No interior do Museu do Amanhã, na recepção não como cones, cadeiras no piso táctil direccional e de alerta
Praça Mauá o que dificultou o nosso deslocamento. há nenhuma informação visual ou um funcionário capa- no espaço interno do museu, trazendo um desconforto e ao
citado para receber uma pessoa com deficiência; mas no mesmo tempo frustração, conforme a figura 3. CONCLUSÃO
c. Estacionamento: não foi observado parqueamento museu encontramos várias Maquete Táctil e os painéis O Museu foi inaugurado no dia 19 de Dezembro de
ao longo da via da Avenida Presidente Vargas, no en- tácteis por vezes se confundem na áudio descrição. A áu- 2015, e o aparelho com a áudio descrição chegou ao local Não obstante a percepção do direccionamento de louvá-
torno da região, para Pessoas com deficiência con- dio descrição é fornecida pelo Museu do Amanhã em um no dia 18 de Novembro de 2016, conforme dados de um veis esforços em virtude da acessibilidade no Museu do
funcionário. Desta forma, concluímos que o museu foi Amanhã, acções estas determinadas por lei, constata-
inaugurado sem acessibilidade auditiva conforme preco- mos da mesma maneira aspectos a serem aprimorados.
niza a ABNT 9050 (2015) e o Plano Nacional Viver Sem O que detectamos no Museu do Amanhã poderá ser in-
Limites (2011). vestigado em outros museus pela cidade e até mesmo de
O tamanho das fontes utilizadas nos textos, disposto outros países.
pelo Museu se mostrou inapropriado para um aluno com Sugerimos algumas intervenções tais quais: a utili-
baixa visão severa (Figura 4). zação de piso tátil direcional e o alerta em vinil, respei-
No Sistema Braille disponível nos painéis (Figura 5), tando a ABNT 9050; a utilização de mecanismo de áudio
foram identificados alguns equívocos na grafia das maque- descrição adicional instalado directamente no objecto ex-
tes e painéis como por exemplo: no painel “Amanhã”, nas plorado; o aumento do tamanho das fontes utilizadas nos
palavras “biodiversidade”, “marte”, “espaciais”, e no painel textos; reparo das peças que compõe o Sistema Braille e
“ALAN TURING”, não há nada na grafia Braille. De igual instalação de textos neste sistema a fim de tornar todas as
forma foi observado que algumas identificações nas pare- grafias em Língua Portuguesa acessíveis em Braille; repa-
des do Museu do Amanhã não acompanham a tradução da ro/ aprimoramento/revisão do utilitário “Tablet” Aventa-
grafia Braille. mos outrossim a oferta de material gráfico em Braille nas
O Piso Tátil Direcional e de Alerta: Sendo constituído Lojas assim como em materiais Promocionais quando dis-
Figura 1. O aluno convidado na Estação Veículo Leve sobre Trilhos – VLT.
Praça XV ainda desactivada. (Fonte: Arquivo pessoal) em alumínio, o recurso apresentou-se como um obstáculo, ponibilizados em Língua Portuguesa.

Figura 2. Aluno utilizando o equipamento de áudio descrição em frente à Figura 3. Barreiras físicas localizadas na saída do elevador no 2º piso. Figura 4. Aluno com baixa visão com dificuldade para ler os textos nos painéis. Figura 5. Realização da Leitura no Sistema Braille. (Fonte: Arquivo Pessoal.)
Maquete. (Fonte: Arquivo pessoal) (Fonte: fotos produzidas pelos autores) (Fonte: Arquivo Pessoal)

24 | Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | 25


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Entrevista
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manuais/abnt-nbr9050-edicao-2015.pdf.

Perspetivas sobre a Educação Inclusiva:


BRASIL. Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989. Dispõe sobre o apoio
às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre
a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de
Deficiência – Corde, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos

Olhares sobre a nova lei


ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público,
define crimes, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República
Federativa do Brasil, Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/leis/L7853.htm.
BRASIL. Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei — Margarida Loureiro e Sofia Duarte
no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para
a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de
proteção, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa
do Brasil, Brasília, DF. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
decreto/d3298.htm.
BRASIL. Decreto nº 7612, de 17 de novembro de 2011. Institui o Plano
Nacional da Pessoa com Deficiência – Plano Viver sem Limites. Diário Oficial
[da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF. Disponível em: http://www.
planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7612.htm.
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Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
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DIAS, Regina Álvares; ESTANISLAU, Sarah; BAHIA, Isabella. Maquetes
e mapas táteis: diretrizes para projeto, seleção de materiais e técnicas.
em Diário da República o Decreto-Lei n.º 54/2018, após um escolas não agrupadas, às escolas profissionais e aos
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de maio, e a Portaria n.º 201-C/2015, de 10 de julho), visa, do diploma supramencionado, os Agrupamentos/Escolas
MELLO, Fernando Fernandes de. A Zona Portuária do Rio de Janeiro:
fundamentalmente, a implementação de medidas que pro- desencadearam os procedimentos necessários e possíveis
antecedentes e perspectivas. Unveröffentlichte Diplomarbeit, movam maior inclusão escolar, as quais se encontram de- para garantir a sua aplicação na preparação do ano letivo
Rio de Janeiro, 2003. vidamente expressas no artigo 1.º respeitante ao objeto e seguinte (2018-2019), de modo a que produzisse efeitos a
MUSEU DO AMANHÃ. A Arquitetura de Santiago Calatrava. Disponível em: âmbito do mesmo: partir do início do ano escolar.
https://museudoamanha.org.br/pt-br/content/arquitetura-de-santiago-calatrava.
No decurso do período que decorreu entre a data da
Secretaria Especial dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Viver Sem
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“1. O presente decreto-lei estabelece os princípios sua publicação e o início do ano letivo, as escolas, para além
sem-limite. Acesso em 12 de Janeiro de 2017. e as normas que garantem a inclusão, enquanto dos exames, viveram momentos de grande instabilidade
UNESCO. REPRESENTAÇÃO DA UNESCO NO BRASIL. 2014. Disponível processo que visa responder à diversidade das provocado, fundamentalmente, pelas contestações/greves
em: http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/education/education-for-all/. necessidades e potencialidades de todos e de cada sucessivas, acrescendo o facto dos docentes considerarem
um dos alunos, através do aumento da participação que a tutela deveria ter assegurado formação alargada no
nos processos de aprendizagem e na vida da âmbito do novo quadro legal para a educação inclusiva.
comunidade educativa. Tendo em conta as diferenças percecionadas na apro-
2. (...) identifica as medidas de suporte à priação e operacionalização deste quadro legal, a Pró-Inclu-
aprendizagem e à inclusão, as áreas curriculares são, com base na experiência, conhecimento, instituição de
específicas, bem como os recursos específicos a origem e funções que desempenham, convidou um grupo
mobilizar para responder às necessidades educativas de cinco professores a responder às seguintes questões: (1)
de todas e de cada uma das crianças e jovens ao Quais os aspetos positivos que destaca nesta nova lei?, (2) Que
longo do seu percurso escolar, nas diferentes ofertas dificuldades antevê na aplicação desta lei? e (3) Que sugestões
de educação e formação. apresentava de modo a facilitar a sua operacionalização?

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1. Quais os aspetos positivos que destaca nesta nova lei? sido trabalhado nas escolas, olhando para o aluno como como critério, pelo menos, único de referenciação dos
um indivíduo único, mas potenciador de diversidade. alunos, a eliminação das unidades e a criação de centros
JAS: O paradigma educativo emergente da publicação do Reconhecendo este Decreto-Lei como de enorme po- para apoio à aprendizagem em cada escola ou agrupa-
Decreto-lei n.º 54/2018, de 6 de julho, provoca uma cisão tencial para a verdadeira inclusão, prefiro destacar aspetos mento, são aspetos que apontam para a criação de um
com o conceito enraizado de “alunos com necessidades menos visíveis aos olhos dos outros, mas de grande rele- quadro legal de verdadeira inclusão.
educativas especiais”, e, consequentemente, algum des- vância operacional, nomeadamente o envolvimento dos
norte, sobretudo nos docentes. órgãos da escola, com a criação da equipa multidisciplinar. 2. Que dificuldades antevê na aplicação desta lei?
Um dos aspetos mais significativas do paradigma da edu- Assim, se transpõe para o centro de decisão da escola as
cação inclusiva centra-se no facto de deixar de existir uma questões relacionadas com a inclusão, vinculando de uma JAS: A ausência de referências categoriais dos alunos provo-
categorização dos alunos. Por contraponto, a educação in- forma mais incisiva, as respostas encontradas para cada cou, e provoca ainda, algum vazio que, por consequência,
clusiva passa a abranger todos os alunos que evidenciem, a aluno, a monitorização e avaliação de medidas implemen- leva a alguns níveis de inquietação. É frequente os docen-
João Adelino dos Santos (JAS), José Morgado (JM), Professor determinado momento, dificuldades, independentemente tadas, deixando de ser um problema muitas vezes margi- tes questionarem sobre a designação a atribuir aos alunos
Diretor do Agrupamento de Escolas e Investigador no Instituto Superior
de Vila Nova de Paiva. de Psicologia Aplicada.
do seu perfil. Por outro lado, há uma centralidade na com- nal e entregue às mãos do professor de Educação Especial. alvo do Decreto-lei n.º 54/2018 e sobre os responsáveis pelos
ponente educativa do aluno, numa visão holística. Por outro lado, a Lei procura proporcionar ao aluno e fa- processos e pela implementação das medidas educativas.
Há a destacar, ainda, a vontade explícita de fomentar a par- mília um papel mais claro e determinante na escolha das Esta ausência de categorização vai levar algum tempo a ser
ticipação efetiva dos alunos, para além da presença física medidas e percursos educativos, permitindo maior flexibi- apropriada pela comunidade educativa, uma vez que a mes-
na escola, e de promover o seu progresso e o sucesso. lidade no destino escolar do aluno, melhores ajustamentos ma tem enraizado o sistema de categorização.
curriculares e inflexões resultantes da evolução enquanto A reação inicial à publicação do regime educativo
JM: O seu próprio surgimento é um aspeto de registar, o estudante e cidadão. da educação inclusiva foi de inquietude e de ansiedade,
DL 3/2008 carecia de alteração desde que entrou em vigor. com especial incidência no processo de implementação,
Do quadro que estabelece e de uma forma muito breve sa- MP: Falar de Educação Inclusiva implica falar de Di- sobretudo porque o normativo foi publicado no final de
lientaria: reitos Humanos, de Educação para Todos, do percurso um ano escolar, época em que os docentes estão a iniciar
• O fim de algo do meu ponto de vista insustentável francamente positivo que temos efetuado, do ponto em o período de férias e, como tal, indisponíveis para se or-
em educação, a elegibilidade. Não existem alunos que estamos e onde queremos chegar. Nesta perspetiva, ganizarem e definirem procedimentos. Neste contexto, o
não elegíveis para uma qualquer forma de apoio edu- saliento o mais recente compromisso da Declaração de normativo deveria ter contemplado uma fase de transi-
cativo a partir da altura que expressam ou os seus Incheon. Marco de Ação da Educação 2030: rumo a uma ção, na medida em que prevê a produção de efeitos a par-
professores sentem algum tipo de dificuldade. educação de qualidade inclusiva, equitativa para todos tir do ano escolar 2018-2019.
José Patrício (JP), Docente Manuela Prata (MP), Docente de (UNESCO,2015), o de implementar, com caráter de urgên- Neste último aspeto, considero que seria inteiramente
e Presidente da Associação de Educação Especial no Agrupamento
Paralisia Cerebral Almada Seixal. de Escolas Marinha Grande Poente.
• O aprofundar do entendimento de que educação cia, uma agenda de Educação única e renovada, que seja adequado, e coerente com outros normativos entretanto
inclusiva não é a resposta educativa em escolas re- holística, ousada e ambiciosa, que não deixe ninguém publicados, designadamente o decreto-lei n.º 55/2018, de 6
gulares a alunos com necessidades educativas espe- para trás. As políticas públicas de educação do nosso País de julho, e regulamentação subsequente das ofertas educa-
ciais. A promoção da educação inclusiva assenta na têm vindo a responder a estes desafios de forma conver- tivas, se fosse determinada uma fase de aplicação gradual,
resposta educativa com qualidade à diversidade dos gente através de um quadro normativo congruente e in- para que, no limite, os alunos não se vissem privados dos
alunos e não a grupos de alunos, os alunos com ne- terdependente onde se inclui o Perfil dos Alunos (PA), a apoios de que carecem.
cessidades educativas especiais, por exemplo. Autonomia e Flexibilização Curricular, as Aprendizagens
Essenciais (AE), a Estratégia Nacional de Educação Para a JM: Para além de aspetos que se prendem com a calen-
• A afirmação do princípio da participação e pertença Cidadania, e a Educação Inclusiva. É este TODO, do qual darização da sua entrada em vigor, e que, como tem sido
de todos os alunos a um grupo de pares. o Decreto-lei nº 54/2018 é PARTE INTEGRANTE, que sa- divulgado têm levantado algumas dificuldades às esco-
liento como aspeto mais positivo e significativo. É neste las, existe um aspeto que me parece pertinente. Do meu
• O desaparecimento de uma figura, o Currículo Específi- TODO que situo e enquadro o novo paradigma da Educa- ponto de vista, os normativos em educação sobretudo
co Individual que para além da sua estranha designação ção Inclusiva (EI) enquanto processo que visa responder à em matérias mais complexas deveriam centrar-se nos
representava em muitas situações uma ferramenta de diversidade das necessidades e potencialidades de todos princípios (visão) que devem informar o universo a que
exclusão. e de cada um dos alunos. se destinam, definir também os princípios de natureza
Mário Nogueira (MN), processual e organizativa que envolvem e, é um aspeto
Secretário-Geral da FENPROF.
Existem, naturalmente, outros aspetos positivos cuja refe- MN: O regime de inclusão escolar, constante do DL crítico, definir os dispositivos de regulação da sua ope-
rência se justificaria. 54/2018, de 6 de julho, assenta em pressupostos positi- racionalização.
vos, apontando, no seu preâmbulo, para a transição entre Acontece que como é frequente também o DL
JP: A grande virtude do novo enquadramento legislativo uma simples integração de alguns alunos e um contexto 54/2018 define de forma excessiva quadros teóricos que,
está no olhar mais atento para o conceito de inclusão, tor- de inclusão, que diz respeito a todos. No plano teórico, não estando em causa a sua sustentação, promovem
nando-se um processo abrangente, alargado ao universo este é o caminho certo. Os alunos, todos os alunos, in- dificuldades na medida em que terão de ser integrados
de todos os alunos e todos os intervenientes no processo tegram as turmas e têm o mesmo professor. Preveem-se por muitos milhares de intervenientes nos processos de
educativo. Dada a diversidade de alunos, problemáticas medidas específicas que vão ao encontro das necessida- educação inclusiva, professores do ensino regular, desde
e dimensões de apoio requeridas, a lei reconhece que a des apresentadas por cada aluno e, sobre estes pressu- logo, professores especializados, direções escolares, téc-
intervenção vai muito além do que tradicionalmente tem postos, pouco há a dizer. Também a eliminação da CIF nicos das equipas da escola e de entidades exteriores, pais

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e encarregados de educação, etc. Os discursos que têm MP: As mudanças propostas requerem (re) ajustamentos a existem nas escolas, em particular, os humanos. É claro JP: Dois aspetos fundamentais e realistas para que se ope-
sido produzidos nos últimos meses ilustram esta questão. nível de toda a Escola, tanto a nível organizacional como que podemos ser líricos e afirmar que não são os recursos racionalize da melhor maneira.
A forma como é definida e abordada a questão da “cate- pedagógico e curricular, só exequíveis se a EI for uma op- que determinam a criação de um contexto de verdadeira A Equipa Multidisciplinar tem de ter as condições
gorização” com a “extinção” da referência a “necessidades ção estratégica na política educativa das Escolas, criando inclusão, mas o nosso lirismo não irá resolver o problema. de trabalho que lhe permita apresentar níveis elevados de
educativas especiais” parece-me apenas um exemplo dos espaços e tempos de (re) interpretação, e de reflexão que E o que acontece é que não se percebe no governo a inten- eficácia e eficiência do seu desempenho, nomeadamente,
equívocos e ruído criados. permitam a apropriação de fundamentos, princípios, mo- ção de resolver este problema de subfinanciamento e con- construção documental, acompanhamento, avaliação e
Temo ainda a dificuldade de assegurar em tempo delos pedagógicos para a capacitação de TODOS. Para sequente falta de recursos nas escolas. A integração dos demais competências. Assim sendo, não pode o trabalho
oportuno os recursos e dispositivos de apoio competentes além de outras variáveis, consideramos que o momento alunos nas turmas, sem os apoios devidos, não é inclusão; ser condensado num par de horas não letivas, como está
e suficientes providenciados em tempo oportuno. tardio da publicação dos Decretos-Lei nº54 e 55/2018 e a redução do papel do docente de EE a tarefas de consulto- a ser implementado em muitas escolas. Se pensarmos que
curto espaço temporal para a entrada em vigor não permi- ria, não é inclusão; a indefinição sobre a tutela dos técnicos os seus elementos permanentes são, na sua maioria, do-
JP: As grandes dificuldades da implementação desta lei tiram às Escolas avançar com esses processos coletivos de especializados e a sua mais que provável saída das escolas centes com outras funções letivas e não letivas, parece-
assentam em três pilares básicos, o tempo, os recursos aprendizagem. No caso da operacionalização do diploma para outros níveis (municípios ou CRI), não é inclusão; a -me gritante que a equipa estará condenada, em muitas
e o risco. da EI os impactos são ainda mais visíveis devido ao fac- não consideração da posição das famílias em relação às escolas, a ser um parente pobre e não um aspeto nuclear
O tempo: Foi um exagero e demagogia do MEC espe- to de este não prever qualquer gradualidade e/ou período medidas a tomar, não é inclusão; a falta de esclarecimen- da vida escolar. Uma política tão audaz, inclusiva e ino-
rar que as escolas, em pleno verão, conseguissem reajustar transitório, opção que contribuiria para respostas mais tos às escolas e a responsabilização destas pela implemen- vadora na sua matriz, não se compadece com obrigações
a forma de trabalhar, e em tempo útil, se reorganizassem informadas, mais sustentadas e mais convergentes com os tação do regime, num quadro de forte restrição também orçamentais tão rígidas, exigindo-se que seja dado tempo
de acordo com os pressupostos na lei. Para mais, quando princípios, modelos e práticas que fundamentam e enqua- no que respeita ao exercício da sua autonomia no domínio efetivo que permita trabalho de qualidade.
outra legislação fundamental e estruturante é publicada dram esta legislação. Saliento também as dificuldades sen- organizacional, põe em causa a inclusão. É importante que se criem dinâmicas locais, no-
no mesmo momento. Quando assim acontece, as escolas tidas pelos elementos das Equipas Multidisciplinares de meadamente ao nível concelhio, de parceria, partilha de
estabelecem as suas próprias prioridades, dando enfoque Apoio à Educação Inclusiva (EMAEI), umas em formação, 3. Que sugestões apresentava de modo a facilitar a sua ope- recursos e resolução de problemáticas, que fomentem o
à flexibilização curricular e deixando a educação inclusiva outras já em atividade, em responder neste “tempo curto” racionalização? envolvimento das estruturas da comunidade e em rede
para mais tarde. Como consequência desta trapalhada, a às suas competências, sobretudo se tivermos em conta que de escolas, de modo a que não sejam encontradas apenas
desorganização, escolhas arbitrárias, posições questioná- grande parte dos seus elementos não frequentaram forma- JAS: O conhecimento que vou tendo da situação atual, por soluções espartilhadas e muito individualizadas. Esta po-
veis e centenas de alunos com apoios precários ou mesmo ção no âmbito da EI, tão importante ao exercício de fun- contacto pessoal e por muitas questões colocadas por co- lítica inclusiva terá de se afirmar como catalisadora de
inexistentes. Este documento requer seriedade, respon- ções de tão elevada responsabilidade e centralidade. Des- legas, indicia que as escolas se estão a organizar no senti- sinergias e mobilização de recursos internos, da escola, e
sabilidade e ponderação, contraproducente com procedi- taco também as dificuldades relativas ao (re) ajustamento do de procederem à transição e à operacionalização deste dos agentes da comunidade.
mentos efetuados em cima do joelho que tenham reflexos e clarificação de funções e responsabilidades dos docentes, paradigma educacional. Muitas escolas já constituíram a
negativos evidentes no quotidiano dos alunos. com destaque para os de educação especial, assim como equipa multidisciplinar de apoio à inclusão (EMAEI), órgão MP: É demasiado evidente a necessidade e a importância
Os recursos: A Lei, sustenta-se em pressupostos que na organização das respostas e âmbito dos CAA. Na minha fulcral neste processo da educação inclusiva, e encontram- desta mudança de paradigma e é fundamental que, nesta
nem sempre são reais, pois as escolas não têm um manan- opinião, grande parte da responsabilidade das dificulda- -se em fase de construção dos documentos necessários. fase de transição normativa, não haja o menor risco de que
cial de recursos humanos, físicos e materiais, que consubs- des que se vivem atualmente nas Escolas decorre destas Para além das questões referidas anteriormente, exis- algum aluno fique para trás, ao verificarem-se “disparida-
tanciem e garantam, à partida, sucesso na implementação conflitualidades entre o “tempo e a urgência” da opera- tem, ainda, muitos outros constrangimentos. A título de des e desigualdades no acesso, na participação e nos resul-
desta política. No mesmo contexto, nem sequer os recursos cionalização da Educação Inclusiva. Disso nos dão conta exemplo, refere-se o facto de a composição deste órgão con- tados de aprendizagem”. O que nos é exigido é que tenha-
das comunidades possuem um grau de comprometimento também os relatos de muitos docentes quando expressam templar apenas um dos seus elementos com formação garan- mos a capacidade e a competência para garantir o efetivo
e vínculo à escola e de conhecimento dos alunos, nomea- as dificuldades, que sentem. tida na área da educação inclusiva. Sendo uma equipa que se “acesso, na equidade e na inclusão, bem como na qualidade
damente no que diz respeito às equipas de saúde escolar Importa salientar que apesar dos constrangimentos, orienta pelo princípio da inclusão, determina o processo dos e nos resultados da aprendizagem de Todos e de Cada um
relativamente aos alunos com problemas de saúde. Assim, a maioria das Escolas, tem salvaguardado as respostas aos alunos e presta aconselhamento aos docentes na implemen- dos alunos” (Cfr. UNESCO, 2015, iii). É para isso que TODOS
quando se transpõe a letra da lei para o terreno, nomeada- alunos e paralelamente avançado na (re) organização, pla- tação de práticas pedagógicas inclusivas, deveria ter maior temos que trabalhar, fazendo bem a nossa parte.
mente em escolas de áreas mais deprimidas, suburbanas neamento e ajustamento gradual à nova legislação. Assis- representatividade de docentes de educação especial. Deixo algumas sugestões que, na minha perspetiva, são
e altamente carenciadas, muitas das conquistas previstas timos, no entanto, a velocidades e respostas de geometria Por outro lado, e sobretudo neste ano letivo, seria muito importantes nesta fase inicial de operacionalização:
serão difíceis de alcançar. muito variável, onde é determinante o “ADN” de cada Es- pertinente que os docentes da referida equipa multidis- Em cada Escola, criação de espaços e tempos de refle-
O risco: A maior virtude desta lei, é a sua maior fra- cola em matéria de Inclusão e os conhecimentos e compe- ciplinar de apoio à inclusão pudessem beneficiar de horas xão /ação em contexto envolvendo docentes de diferentes
queza! A universalidade das respostas centrada nas di- tências que docentes e lideranças desenvolveram em maté- de componente letiva para assegurar o seu perfeito fun- grupos disciplinares e/ou equipas educativas que permi-
ficuldades e potencialidades de todos e de cada um dos rias relacionadas com os princípios, quadros conceptuais e cionamento e, consequentemente, garantir as respostas tam envolver Todos na missão de Educar Cada Um.
alunos. Quando a este aspeto, associamos a escassez de modelos que fundamentam e enquadram tanto o decreto- mais adequadas aos alunos, assim como a todo o proces- Formação no âmbito da Educação Inclusiva para os
recursos, problema real das escolas, corremos o risco de -lei nº54/2018 como toda a outra legislação complementar. so de monitorização. docentes, dando prioridade aos elementos permanentes das
abrir uma caixa de Pandora, relegando muitas crianças EMAEI, preferencialmente assente em redes de partilha en-
e jovens com Necessidades Educativas Especiais, segun- MN: A principal dificuldade reside na natureza do poder JM: Parece-me que a existência de dispositivos de regula- tre Escolas/Agrupamentos da mesma área de influência dos
do a anterior terminologia, para um vazio de acompa- político, para quem o interesse pedagógico é sempre ci- ção eficientes e competentes dirigidos e próximo das esco- CEFAE, pela visão holística e conhecimento transdiscipli-
nhamento, ou o risco ainda maior de se generalizarem lindrado pela ditadura economicista. A Educação é a área las será um fator determinante no contributo para que um nar que devem incorporar, pela importância e destaque que
respostas avulsas, de falsa inclusão, em sala de aula, e em que Portugal mais se distancia dos restantes países da quadro normativo sobre educação inclusiva melhor que o vão assumir na mobilização de todos os agentes educativos.
uma reintegração mal avaliada e precipitada de alguns União Europeia, designadamente no que respeita ao inves- antecedente possa, de facto, sustentar mudança e aprofun- Destaco ainda a importância e sentido de oportuni-
alunos em instituições, num rumo que significaria um timento e isso cria problemas à inclusão. É que a falta de dar o desenvolvimento de um sistema educativo verdadei- dade da promoção e desenvolvimento por parte da DGE de
retrocesso civilizacional. investimento reflete-se diretamente nos recursos que (não) ramente inclusivo. propostas Formativas cujos conteúdos se centrem na ope-

30 | Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | 31


racionalização do Decreto-lei nº 54/2008, eventualmente São igualmente consensuais algumas das dificulda-
destinada aos formandos que frequentaram o primeiro des que as escolas vivenciaram em momento anterior à Caminham ao nosso lado
Curso “Para o desenvolvimento de uma Educação Inclu- publicação dos normativos e vivenciam atualmente, tendo
siva” que foi replicado. Este Upgrade para além de securi- em conta a urgência da sua implementação: esta conflitua-
zante para o trabalho destes docentes (onde me incluo) lidade entre o tempo e a urgência que se tem vindo a per-
na replicação da formação que têm vindo a desenvolver
através de alguns CEFAE, (por vezes, fora do seu horário de
cecionar, manifesta algumas das suas fragilidades para a
respetiva operacionalização. Porque a visão não se limita
trabalho e Probono), permitiria, na fase de transição, criar
referenciais comuns que pudessem orientar opções mais
estruturantes da operacionalização do diploma que susci-
Consensual é também a visão do trabalho e determi-
nação das escolas na busca de um caminho que minimize
o impacto destas dificuldades.
ao que os nossos olhos veem…
tam interpretações diversas. Parafraseando um dos entrevistados, ‘Falar de Educa- — Associação Bengala Mágica
Seria também importante a criação e desenvolvimento ção Inclusiva implica falar de Direitos Humanos, de Educa-
de alguns referenciais e/ou dispositivos orientadores e regula- ção para Todos, do percurso francamente positivo que temos
dores que facilitassem a operacionalização da Legislação, em efetuado, (de onde viemos) do ponto em que estamos e onde
complemento dos já constantes no Manual de Apoio à Prática queremos chegar.’
(DGE, 2018) e das versões das FAQS já disponibilizadas. E queremos chegar a um futuro (de entre muitos futu-
ros) onde todos devem ter lugar!
MN: Desde logo, o adiamento, por um ano, da implemen-
tação do regime, dando, assim, tempo para que se criem
condições (logísticas, recursos, formação…) que permitam
superar as principais dificuldades que resultam de um re-
gime publicado em cima das férias dos professores e desti-
nado a vigorar logo que estes regressassem às escolas. Essa
é uma posição que a FENPROF defende desde a publica- Para a maioria das pessoas viver ciais aparentemente simples: desconstruir e normalizar
ção tardia do DL 54/2018. Mas também a redução efetiva a falta de visão perante a sociedade e orientar famílias e
do número de alunos por turma, a existência de apoios sem o sentido da visão é, por si só, profissionais que se deparam com esta realidade e que não
adequados a todos os alunos, a garantia de que as equipas um pensamento aterrador, não sabem como lidar com ela.
multidisciplinares estão devidamente organizadas e de Nasceu assim a Bengala Mágica: Associação de Pais,
que técnicos e assistentes operacionais pertencem às esco- conseguindo sequer imaginar como Amigos e Familiares, de Crianças, Jovens e Adultos Cegos e
las e não a entidades exteriores, a criação de um grupo de seria a sua vida se perdesse a visão com Baixa Visão, formalmente constituída a 20 de outubro
recrutamento para a Intervenção Precoce, capaz de dar as de 2017. A Bengala Mágica tem como áreas prioritárias de
respostas adequadas atempadamente. Para que isto possa ou se tivesse um filho que nascesse atuação:
acontecer, é fundamental uma nova política para a Educa- ou ficasse cego. Este é de facto um • a capacitação das famílias;
ção, em que o investimento no setor seja considerado como • a formação profissional;
tal e não como despesa. mundo desconhecido para aqueles que • a intervenção especializada o mais precocemente
não têm que lidar com ele, no entanto possível;
• a realização de atividades lúdicas e culturais, de la-
Sem dúvida alguma, os diferentes pontos de vista que aqui acaba por ser um mundo naturalmente zer e desportivas numa dinâmica pedagógica e in-
vos deixamos – e pontos referem-se literalmente a diferen- normal, para aqueles que se veem clusiva.
tes lugares a partir dos quais se observa, constata, analisa
– mostram-nos alguns denominadores comuns, dos quais obrigados a viver nele e com ele. Sendo uma Associação em que todos os elementos dos
destacamos: a coerência do quadro legal para a educação órgãos sociais são Pais de crianças cegas ou com baixa vi-
inclusiva com os compromissos assumidos a nível mundial; são, a Bengala Mágica tem por natureza o conhecimento
a congruência e interdependência dos normativos agora em A falta de informação e de prática podem, contudo, ser prático da questão, indispensável para a compreensão e
vigor; a valorização da Voz dos alunos, chamando-os a par- impeditivos de uma adequada atuação e por isso, todos, eficaz atuação. Contudo, para poder agir de forma tecni-
ticipar ativamente e desenvolvendo o sentido de pertença independentemente de viverem esta camente sustentada, é apoiada por um
à sua comunidade, dentro ou fora da escola; o reconheci- situação de perto, devem conhecer e órgão consultivo, Conselho Técnico
mento da mudança do paradigma da educação inclusiva compreender esta realidade e perce- Cientifico, formado por profissionais
retirando o foco da categorização e dos referenciais para a ber que afinal … a visão não se limita das mais variadas áreas de interven-
elegibilidade dos alunos, passando a abranger todos os alu- ao que os nossos olhos veem! ção (saúde, educação, ação social, jurí-
nos, bem como a chamada dos órgãos da escola, visando o Tendo em comum o facto de terem dica…) que em regime de voluntariado
seu envolvimento e vinculação para aspetos que eram fre- filhos que não veem (com os olhos) ou colabora na definição e acompanha-
quentemente considerados ‘marginais’ e da responsabilida- que têm baixa visão, um grupo de pais mento do Plano de Ação/Atividades e
de exclusiva dos docentes de educação especial. e mães uniu-se com dois objetivos ini- dinamiza o “Espaço de Avaliação de

32 | Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | 33


casos/intervenção”, identificados e/ou sinalizados no “Es- São objetivos futuros da Associação apresentar publi-
paço de Acolhimento”, onde dois elementos da Direção es- camente e junto dos organismos competentes algumas das
tão disponíveis para atender quem procurar a Associação, conclusões que decorrem da auscultação de pais e encar-
mediante marcação. regados de educação de crianças cegas e com baixa visão e
Com pouco mais de um ano de existência a Bengala que consubstanciam a necessidade de adequar as respostas
Mágica conta já com quase uma centena de Associados. ao nível da intervenção precoce no âmbito do SNIPI, assim
Pessoas que vivem e convivem direta ou indiretamente como das Escolas de Referência para alunos cegos e com bai-
com a cegueira e a baixa visão e outras que apoiam a cau- xa visão (figura 5).
sa por acreditarem nela. É por esta razão que a Bengala São ainda objetivos a curto prazo a criação de um cen-
Mágica é uma associação de pais, de familiares, de ami- tro de recursos que possa disponibilizar materiais adap-
gos e, também, das próprias pessoas cegas e com baixa tados (jogos/ livros/ baús temáticos/ material áudio/ arti-
visão, ou seja uma Associação de Todos. gos) numa dinâmica interativa entre pais, creches e jardins
O primeiro ano foi um ano de consolidação do Projeto de infância e escolas, a nível nacional (figura 6).
e edificação dos alicerces desta Associação. A Associação pretende ainda continuar a desenvol-
Com vista a dar resposta às necessidades identifi- ver as dinâmicas formativas, em registo formal e informal
cadas foram desenvolvidas algumas ações ao nível da (ações de sensibilização/formação/ encontros de pais);
Figura 2.
sensibilização e formação de pais e de profissionais. Sen- bem como as atividades que promovem a diversificação de
do esta uma área prioritária foram estabelecidas algu- experiências, na área cultural, de lazer e do desporto…) en-
mas parcerias no sentido de poder vir a ser aprofundada tre crianças e jovens com e sem deficiência visual.
no futuro (figuras 1 e 2). Muito ainda está por fazer na sociedade para a ver-
Foi também prioridade a realização de atividades de dadeira Inclusão das pessoas cegas e com baixa visão, seja
caráter lúdico-pedagógico e desportivo, não só como for- nas escolas, nos serviços públicos e privados, no acesso à
ma de contribuir para a inclusão social mas também de cultura e lazer, no entanto a Bengala Mágica acredita que a
desenvolver competências em vários domínios, e ainda pior exclusão é aquela que parte do coração. Havendo von-
ajudar na capacitação familiar. tade tudo é adaptável e concretizável.
De forma a obter apoio financeiro para o desenvol- Qualquer pessoa pode ser “Bengala Mágica”, qual-
vimento de algumas atividades foram apresentados dois quer pessoa pode precisar, ou vir a precisar, de uma “Ben-
projetos a entidades privadas, no âmbito de candidaturas gala Mágica”.
publicamente disponibilizadas, um na área do Desporto,
que visa o desenvolvimento da modalidade desportiva
www.facebook.com/associacaobengalamagica/, www.bengalamagica.pt
“Surf” de forma continuada e outro, na área da música.
Ambos os projetos, assim como todas as nossas atividades,
são dirigidos a crianças, jovens e adultos com e sem defi-
ciência visual, sempre numa dinâmica de partilha e inte-
rajuda (figura 3). Figura 4. Figura 3.
Desde janeiro de 2018 a Associação dispõe de um Es-
paço de Acolhimento às famílias (na sede da Associação
– Casa da Cidadania em S. Domingos de Benfica) onde é
feito o levantamento das necessidades e encaminhamento
de casos ou para respostas já existentes ou para o Espaço de
Avaliação/Intervenção, onde uma equipa multidisciplinar
faz o acompanhamento de cada caso e apresenta as soluções.
Foram organizados e dinamizados encontros de pais e
atividades entre pais e filhos com o objetivo de partilha de
vivências e experiências e estreitamento de laços (figura 4).
A Bengala Mágica tem participado em vários eventos
formativos, em espaços culturais, em escolas e universidades,
dando a conhecer a Associação, os seus objetivos e missão.
Com um ano de vida a Associação Bengala Mágica or-
gulha-se do trabalho desenvolvido, no entanto sente uma
responsabilidade acrescida e o dever de se desafiar para
conseguir fazer mais e chegar a todos aqueles que preci-
sam desta “bengala” e também a todos aqueles que podem
ser esta “bengala”. Figura 1. Figura 5. Figura 6.

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Dar voz a...

“VIBEATS” — Um Projeto Inclusivo


— Agrupamento de Escolas da Parede, Cascais

“Ser surdo num mundo ouvinte fruir dela. Nesse mesmo vídeo, as pessoas surdas estão a
sentir a música a partir de um colete de vibrações. Pen-
é sentir o isolamento que vivencia sámos que, tendo este equipamento sido já testado, po-
e, positiva e efetivamente, vislumbrar díamos criar algo mais portátil, semelhante aos equipa-
mentos que os jovens utilizam para ouvir música. Assim,
a beleza e a riqueza da inclusão que idealizámos uma pulseira que transmite as vibrações das
não demora. Ser surdo num mundo músicas através de placas vibratórias na parte interior
da pulseira.
ouvinte é ter, sobretudo, o sonho de
ser, de alguma forma, ouvinte um dia, E pusemos mãos à obra...
Para o desenvolvimento deste produto contactámos pro-
mas respeitando a sua surdez.” fissionais do curso de biomédica do IST de Lisboa para as-
— Armando Nembri segurarmos que o produto era viável de se produzir e de
funcionar. Fomos encorajados por professores e alunos do
referido curso. Também contactámos a Associação de Sur-
John Kennedy disse que poucos entre nós são individual- dos, o maestro e uma participante do Projeto “Mãos que can-
mente capazes de fazer acontecer uma mudança positiva tam” para saber o feedback em relação ao nosso produto.
entre as pessoas mas, à medida que cada um de nós faz a
sua pequena parte, cada uma dessas partes torna-se uma O desejo de fazer a diferença...
pequena ondulação e essas ondulações tornam-se uma Se o Vibeats for produzido será algo inovador para a medi-
onda poderosa capaz de derrubar a montanha mais alta. cina e para a tecnologia. E, ao dar, às pessoas surdas, aces-
O projeto “Vibeats” desenvolvido por quatro alunos so a uma forma de arte, isso melhorará a sua qualidade de
do 11º ano do curso de Economia A, do Agrupamento de vida e inclusão na sociedade. Pensámos sobretudo nos jo-
Escolas da Parede (Cascais), reflete a ondulação necessária vens surdos que poderão usufruir de concertos e conhecer
para o exercício de uma cidadania plena, ativa e criativa as músicas que os seus colegas e amigos (ouvintes) ouvem.
numa sociedade que se quer mais inclusiva e centrada na Poderão fazer parte e deixar de ficar à parte.
pessoa humana.
Afinal não somos só nós... Quévin Sequeira, Miguel Outeiro, Vera Fernandes e João Tavares, alunos do 11.º ano, Agrupamento de Escolas da Parede, Cascais.
A ideia do projeto... O projeto foi selecionado para a final do Concurso Nacio-
O desafio da professora de Economia A foi criar uma ideia nal do Programa Junior Achievement – A Empresa e ga-
de negócio, de preferência que refletisse as aprendizagens nhou o 1.º prémio do Concurso Escolas Empreendedoras
realizadas nas atividades sobre os Objetivos de Desenvol- da DNA Cascais.
vimento Sustentável. Compreendemos que este projeto foi ao encontro de uma
A ideia do Vibeats surgiu a partir de um vídeo musi- necessidade sentida pela comunidade em geral. O nosso
cal que um dos colegas da equipa conhecia. O vídeo fala objetivo começou por ser criar uma ideia de negócio ino-
sobre a possibilidade de utilizarmos a nosso favor o que vadora mas, com a investigação que realizámos, rapida-
nos diferencia e alguns jovens surdos partilham experiên- mente se transformou numa forte motivação de contribuir
cias de exclusão. Pareceu-nos que a música pode ser um para uma mudança na vida das pessoas. A nós os quatro,
veículo de união, se todos tiverem a oportunidade de usu- realizar este projeto, mudou-nos.

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Instantes inclusivos…

Instantes Inclusivos (Re)inícios


— Elvira Cristina Silva

Num semestre de (re)início escolar, partilho algumas preciosidades Era Uma Vez um Dia Normal de Escola A árvore da escola
Colin McNaughton (texto) e Satoshi Kitamura (ilustração) António Sandoval (Texto), Emilio Urberuaga (ilustração)
de leitura que abordam o primeiro dia de escola para alguns, o seu — Ana Paula Faria editora (2005) — Kalandraka (2017)
reinicio para outros ou ainda as experiências significativas dos
ciclos que fazem parte da vida.

Lucas y Oso O Primeiro Dia de Escola


José Campanari (texto, Kristina Andres (ilustração) António Mota (texto), Paulo Galindro (ilustração)
— OQO Editora (2010) — Gailivro (2011)

A rotina diária habitual de um aluno é alterada com algo Apelando à conservação e preservação da natureza o ce-
fora do normal. A mudança de um professor pode causar nário de composição gráfica centra o plano da ação onde
efeitos secundários muito positivos na vida de uma crian- decorre a narrativa. O pátio da escola onde uma criança se
ça, especialmente quando essa presença se reveste de ori- desloca, na base dos afetos para com a natureza, influen-
Um livro simples, sem explicações aprofundadas de como A preocupação com o primeiro dia escola, por parte de ginalidade e de música. ciam o percurso temporal.
as crianças enfrentam os medos e a própria maturação. uma menina que anseia do seu irmão mais velho a tran- Uma extraordinária viagem de imaginação e criativi- Uma paleta de guache ou acrílico dão a cor à ilustra-
As fases do crescimento nunca são fáceis, mas é por quilidade da experiência. Contudo, ao inverso, o irmão, de dade que apela aos sentidos e à capacidade de transformar ção com elementos definidos, sendo a construção da figura
isso mesmo que o livro funciona como catarse. Com algu- modo humorístico, mas bem dramático para a persona- momentos do nosso imaginário. humana, a preto desenhada, em cima da mancha numa in-
ma dose de humor e muita autenticidade, José Campanari gem ansiosa, responde às inquietudes da irmã com situa- A ilustração de tinta de china, de linha inconstante pro- teração visual realçando pormenores da narrativa visual
relata os episódios de enurese noturna e o drama do pri- ções surpreendentes, deixando-a obviamente assustada. vocada pela gramagem fina do papel conduz o leitor numa acompanhando a textual. A circularidade prévia da narra-
meiro dia de escola. É o avô, personagem apaziguadora do conflito que, narrativa gráfica que oferece um jogo feliz de tridimensio- tiva enternece mesmo os mais insensíveis. Remete para a
Ilustrações maioritariamente de caneta e aguarela, numa viagem à sua própria infância, nos relata experiên- nalidade e bidimensionalidade. O jogo de cores comunica de crença nos afetos, o deslumbramento da natureza e a espe-
com técnica de trama para delinear as sombras, trans- cias geracionais e o valor da amizade. O autor aborda na forma relevante com a intenção da narrativa textual, condu- rança de um mundo que melhor respeite o planeta.
portam-nos para as memórias que associamos à infância. sua narrativa o crescimento, a importância da partilha da zindo o percurso narrativo num crescendo empolgante até Nada de mais, extremamente simples, as crianças
A gramagem e textura do papel com uso pontual de ca- família na questão do serenar medos e de partilhar senti- ao desfecho cíclico. compreendem. Os adultos, alguns, precisam de se deixar
rimbos e algumas composições digitais, de cores pastel mentos. Recorrendo à fantasia do texto de António Mota, As próprias guardas do livro contrastam entre si, reme- enternecer pelas coisas simples da vida.
quentes, apresentam todo o universo de objetos e cenas Paulo Galindro ilustra a narrativa numa composição de tendo a inicial para a monotonia dos dias, em oposição com
do quotidiano a par da imaginação infantil. Os relevos de diferentes técnicas e paletas de cor diversificadas onde a a guarda final, após a vivência extraordinária de escutar a
cores frias evidenciam elementos pontuais em concor- ilustração ocupa as páginas, invadindo o texto escrito, de magia da música e da criatividade.
dância com a oscilação dos sentimentos. modo a que texto e ilustração se fundem numa amálgama Um deleite para a imaginação de todas as idades e cla-
Crianças pequenas identificar-se-ão com o prota- divertida de leituras paralelas. ro para os professores que proporcionam dias diferentes aos
gonista. Os mais velhos, irão com certeza recordar esses seus alunos.
momentos da infância, com um sorriso nos lábios e um Obviamente que este será também um livro para todos
sentimento de nostalgia. os que amam a música e com ela se inspiram todos os dias.

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Dossier organizado
PRÓ-INCLUSÃO
Abílio Associação Nacional
Marco Taylor, edição de autor (2016) de Docentes de Educação

por Ana Maria Ferreira, Especial



Parte integrante da revista

Ana Rosa Trindade, Educação Inclusiva,


Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018

Helena Neves
e Margarida Loureiro

AUTONOMIA,
FLEXIBILIDADE
Marco Taylor é o autor da ilustração da revista que temos
nas mãos. Responsável por diversas obras que manifesta-
mente primam pela originalidade da ilustração e também
pelas abordagens fora do convencional editorial.
Abílio é um dos exemplos. Livro sem texto, deixando ao

E INCLUSÃO
leitor a construção da narrativa onde, as ilustrações, clara-
mente estão construídas com um fio condutor, mas não es-
tanque na sua interpretação. Desde a capa despretensiosa,
às guardas com mensagens nas entre linhas, conduzem-nos
para a identidade do personagem que pretende versar. Ilus-
tração com colagens, lápis de traço irregular, com algum
trabalho digital numa composição limpa e arejada.
Uma introdução gráfica antes da ficha técnica, remete-
-nos para uma leitura cinematográfica da narrativa. Porme-
nores aparentemente simples, mas que fazem toda a diferen-
ça para a compreensão leitora e antecipação da narrativa.
Abílio é o protagonista, pouco sabemos dele, quase
não o vemos, ou talvez seja ele que não quer ser visto. Va-
gueia noutra dimensão. Vê as coisas de outro ângulo. Vive
numa outra perspetiva do mundo. Este porém, é um lugar
de regras convencionais que acorrentam os indivíduos que
desde cedo sonham outros ciclos. O argumento apresenta
um final desenhado, do ponto de vista da ilustração, mas
o texto, esse, fica em aberto para a continuidade de outros
enredos, outros ciclos, como na vida. Existem imensas pos-
sibilidades de leitura, de interpretar e, sobretudo, de como
Entrevista Gestão e processos Inclusão e inovação Azeitão: uma escola
aceitar o outro. Lê-se vezes sem conta, tão circular como a Ariana Cosme de liderança para pedagógica em transformação
vida. Encantador e único como cada indivíduo. o desenvolvimento Paulo Almeida Maria Clara Félix
organizacional: algumas
notas a propósito da
autonomia e flexibilidade
curricular
Estela Costa

A autonomia e flexibilidade A realidade de um Desenvolvimento de Avaliação para aprender


curricular no agrupamento Agrupamento na procura aprendizagens matemáticas em contextos de autonomia
de escolas de Alcanena de uma diferenciação num contexto inclusivo e de flexibilidade curricular
Ana Cláudia Cohen pedagógica, numa – práticas no âmbito da Domingos Fernandes
José Fradique prática inclusiva autonomia e flexibilidade
Célia Guerreiro Almeida curricular
Maria do Carmo Correia Sandra Nobre

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Apresentação Entrevista
Ariana Cosme

Professora na Faculdade de Psicologia da Lei de Bases do Sistema Educativo Português, em 1986


assumimos, como objetivos centrais da política educativa, o
e de Ciências da Educação na alargamento do número de anos da escolaridade obrigatória,
O presente dossiê pretende ser, por si só, a fundamentação bilidade Curricular (PAFC). Segue-se um artigo da Professora Universidade do Porto. Co-coordenadora assegurando maior equidade no acesso à escola de todas as
matricial da nossa Associação. O contínuo aprofundamento de Estela Costa, sobre o papel da gestão e processos de lideran- crianças e jovens em idade escolar e a promoção de uma edu-
uma Educação Inclusiva, levando o sonho à realidade. O tema ça no desenvolvimento organizacional. As experiências relata- do Observatório de Vida das Escolas cação de qualidade que garantisse melhores oportunidades
da Autonomia e Flexibilidade Curricular é um tema da atualida- das, no âmbito da Autonomia e Flexibilidade Curricular, reves- integrado no CIIE – Centro de educativas para todos os alunos. Ampliámos este compromis-
de, e é uma importante dimensão da contínua democratização tem-se de uma grande abrangência, uma vez que incluem um so em 2009, com o alargamento da escolaridade obrigatória
do acesso à aprendizagem, através de uma ação consciente, Projeto Piloto de Inovação Pedagógica (PPIP), nomeadamente Investigação e Intervenção Educativas. para doze anos, desafiando a escola a considerar percursos
responsável e enriquecida pelos valores da equidade e do pro- o do Agrupamento de Escolas Fernando Casimiro Pereira da Formadora e consultora de escolas educativos diversificados, atendendo à variedade de públicos
fundo respeito pela pessoa humana. Silva – Rio Maior; dois Projetos de Autonomia e Flexibilidade e à heterogeneidade dos respetivos objetivos de formação e
A recente publicação de legislação, designadamente Curricular, do Agrupamento de Escolas de Azeitão e do Agru- inseridas em Territórios Socialmente qualificação. Por esta razão, constitui-se como uma grande
o DL 54/2018 e o DL 55/2018, ambos de 6 de julho, e de pamento de Escolas de Alcanena. A última experiência é do Vulneráveis (os TEIP) e em Projetos oportunidade para a área da educação, a autorização, em re-
documentos estruturantes e orientadores, tais como o Perfil Agrupamento de Escolas Pedro Eanes Lobato, que não tendo gime de experiência pedagógica, a implementação do proje-
dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, as Aprendi- aderido à operacionalização do Despacho nº 5908/2017, de de Inovação Pedagógica (os PPIP). to de autonomia e flexibilidade curricular dos ensinos básico
zagens Essenciais e a Estratégia Nacional de Educação para 5 de julho, em regime de experiência pedagógica, optou por Consultora do PAFC, Projeto Piloto e secundário, no ano escolar de 2017-2018 (Despacho n.º
a Cidadania, quando potenciados numa vertente sistémica desencadear um conjunto de mecanismos de consolidação da 5908/2017, de 5 de julho), no momento em que contribuiu para
e enquadrados em contexto, assumem um importante papel. operacionalização do seu Projeto Educativo, preparatórios de de Autonomia e Flexibilidade Curricular, que as escolas (da rede pública e privada) se possam assumir,
Esse papel, não é mais que a disponibilização de meios ao um caminho a realizar com vista à sua integração no ano letivo a convite do Ministério da Educação. de facto, como espaços socialmente mais equitativos e cultu-
serviço de uma profissão docente, que quando comprome- 2018/2019, no Projeto de Autonomia e Flexibilidade Curricular. ralmente mais significativos, permitindo-lhes responder, assim,
tida com um desenvolvimento profissional, alicerçado numa A Professora Sandra Nobre relata-nos uma experiência aos problemas do abandono e da retenção dos seus estudan-
perspetiva de trabalho colaborativo, enquanto fator de for- enquanto docente de Matemática, do 7.º ano, no âmbito do 1. O que é para si flexibilidade curricular e porque conside- tes, mas também da promoção e desenvolvimento de projetos
talecimento e enriquecimento, só poderá ter um efeito trans- Projeto de Autonomia e Flexibilidade Curricular (PAFC), du- ra importante flexibilizar o currículo? Na sua opinião, quais os que visam a promoção de melhores aprendizagens indutoras
formador num contínuo aperfeiçoamento de práticas. Práti- rante o ano letivo 2017/2018, decorrida no Agrupamento de imperativos políticos, pedagógicos, sociais e económicos que do desenvolvimento de competências de nível mais elevado.
cas, essas, que vão ao encontro de um ensino que promova Escolas Professora Paula Nogueira, em Olhão. justificam esta mudança de paradigma? O desenvolvimento desse Projeto Piloto justificou a gene-
oportunidades de aprendizagens significativas para todos os Por último o Professor Domingos Fernandes deixa-nos ralização da implementação de um novo referencial curricular
alunos, assumindo a diversidade como um fator decorrente um dos importantes desafios que os sistemas educativos AC: Em Portugal, as últimas décadas foram marcadas, no es- em Portugal, após a aprovação do Decreto-Lei n.º 55/2018,
da própria natureza humana. contemporâneos têm pela frente – a melhoria das práticas de paço sociocultural e socioeconómico, por profundas e rápidas que estabelece, entre outros, o princípio da inclusão de todos
Este dossiê inicia-se com uma entrevista à Professora avaliação pedagógica, nos contextos de Autonomia e de Flexi- transformações em diversos campos da vida dos portugue- os alunos num projeto educativo bem sucedido (Decreto-Lei
Ariana Cosme, consultora de Projetos de Autonomia e Flexi- bilidade Curricular. ses e em especial no campo educativo. Desde a aprovação n.º 54/2018), assumindo a centralidade das escolas, dos seus

II | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | III


alunos e professores, e permitindo que a gestão do currículo à implementação de medidas de política educativa que promo- espaços de empoderamento profissional, poderão afirmar- Muito provavelmente as tensões endógenas são mais
se desenvolva de forma flexível e contextualizada, reconhecen- vam e enquadrem a ação das escolas e das suas comunidades -se, igualmente, como espaços de produção de saberes complexas o que explica e legitima em larga medida, a resis-
do que o exercício efetivo de autonomia em educação só é ple- educativas e a dimensão respeitante às práticas educativas, profissionais e de reflexão sobre as iniciativas desenvolvidas tência dos professores à mudança paradigmática para a qual o
namente garantido se o objeto dessa autonomia for o currículo. não podendo nenhuma delas ser negligenciada e/ou desvalo- pelos professores. PAFC os convoca. Trata-se de uma grande mudança no enten-
rizada” (in Noesis, nov, 2018). Quando falamos de “professores mais flexíveis” pensa- dimento do que é o ato de educar na escola e que os obriga a
2. Como se articulam (ou “costuram”, para usarmos uma ex- A necessidade de transformar a escola num espaço mos em profissionais que se interpelam de forma qualificada e enfrentar as limitações das suas crenças e das suas idiossin-
pressão sua) o D.L. n.º 54, com o D.L. n.º 55/2018, de 6 de de formação (tendencialmente) integral dos alunos, propor- reflexiva e importo, como condição favorável, um conjunto de crasias, de forma a procurar não só outras respostas educa-
julho, com todos os documentos de referência que têm vindo a cionador de uma diversidade e riqueza de experiências de características sistematizadas pela Professora Manuela Este- tivas e outras formas de organização do trabalho pedagógica
ser publicados (Perfil do Aluno, Aprendizagens Essenciais e a aprendizagem tendo em vista o desenvolvimento de conhe- ves (FPCEUL), quando refere que “um profissional reflexivo é mas obriga, sobretudo, a raciocinar e a refletir em função de
Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania)? cimentos, capacidades e atitudes necessários à vida em aquele que tem e manifesta capacidades de observação cri- um outro tipo de pressupostos epistemológicos e concetuais.
sociedade convoca todos ao compromisso com a inclusão teriosa, de análise e de interpretação crítica dos fenómenos Ou seja, o que o PAFC solicita aos professores é que estes se
AC: O desenvolvimento sustentado de percursos de sucesso e o sucesso escolar que prometemos a cada um dos alunos e de si próprio, e que toma decisões fundamentadas em re- envolvam num processo que exige mais do que a mobilização
educativo para os alunos portugueses, obrigados a frequen- que se matricula na escola. lação aos contextos em que atua, as avalia e corrige sempre de novos instrumentos didáticos para modernizar a sua ges-
tar a escola durante doze anos, só pode ser alcançado me- que necessário. Mais do que viver apenas do conhecimento tão curricular que, muitas vezes e apesar dessas mudanças,
diante a implementação de medidas de política, integradas e 4. “Nós criamos um monstro e agora é preciso desatar o mons- já existente, o profissional reflexivo é, para nós, alguém que é continua a ser burocrática e estandardizada. Muitas vezes a
articuladas, e do alinhamento das orientações dos diferentes tro do sistema” é uma expressão que a Ariana usou ao falar do capaz de produzir conhecimento válido sobre os espaços em procura de novos instrumentos didáticos é estrategicamente
diplomas e instrumentos estruturantes da política educativa no modelo de acesso ao Ensino Superior. É possível flexibilizar que trabalha, recorrendo a um percurso idêntico ao do investi- motivada para aumentar a eficiência da gestão do modo de
domínio do currículo e das aprendizagens que garantem a in- mantendo o atual panorama de avaliação – exames nacionais gador. Indagar/investigar sobre o seu campo de docência para ensino simultâneo como do correspondente modelo de avalia-
clusão enquanto processo que visa responder à diversidade e o modelo de acesso ao Ensino Superior? Qual a postura do agir, pensar criticamente sobre o seu próprio trabalho serão os ção seletiva que esse modo de ensino inspira sem nunca pôr
das necessidades e potencialidades de “todos e de cada um IAVE e das famílias perante esta realidade? traços que melhor definem a reflexividade e que permitem per- em causa o modelo instrucionista. Por outro lado, é necessário
dos alunos”. ceber quanto ela é uma meta em construção permanente ao reconhecer que o PAFC convida os professores ao exercício
A publicação dos diplomas legais DL n.º 54/2018 e o DL. AC: Na sequência da reflexão e das conclusões do Estudo Ava- longo da vida.” (Manuela Esteves in Formar professores como complexo e desafiante de “estilhaçar”, quando isso se justifi-
n.º 55/2018, ambos de 6 de julho, e ainda da publicação dos liativo da Experiência Pedagógica Desenvolvida em 2017/2018 profissionais autónomos, 2009). ca, as fronteiras das áreas de saber especializado que são as
documentos orientadores sobre o Perfil dos Alunos à Saída da ao Abrigo do Despacho Nº 5708 / 2017 (Setembro de 2018), Neste âmbito, considero muito relevante a decisão do Mi- suas, o que os conduz a ter de participar na construção cola-
Escolaridade Obrigatória, sobre a Estratégia para Cidadania e que desenvolvi por solicitação do ME/DGE, torna-me possível nistério da Educação de destacar um conjunto de professores borativa de coletivos profissionais mais avisados e solidários,
Desenvolvimento e ainda das Aprendizagens Essenciais, per- propor um conjunto de recomendações focalizadas, sobretu- especialistas para apoiar os Centros de Formação das Asso- ultrapassando inseguranças e dificuldades.
mitiram estabelecer de forma articulada e coerente os princí- do, nas dimensões curriculares e pedagógicas que o projeto ciações de Escolas (CFAEs) a delinear uma estratégia forma-
pios e as normas que garantem a inclusão enquanto processo experimental PAFC suscitou e, entre elas, o desenvolvimento tiva e a definir iniciativas no âmbito da formação contínua de 7. Que sugestões deixaria, neste momento, às Escolas Por-
que visa responder à diversidade das necessidades e poten- amplo de um conjunto de iniciativas, coordenado por espe- professores, relacionadas com a AFC e com as novas neces- tuguesas/Agrupamentos que ainda hesitam em relação à mu-
cialidades de todos os alunos. cialistas na matéria, sobre a relação da avaliação com o de- sidades dos professores. Chamo a atenção, igualmente, para dança? Deixe umas breves palavras aqueles que ousaram se-
Temos consciência de que, apesar da consensualidade senvolvimento do PAFC, tendo em conta que o estudo mostra a importância estratégica e o impacto que podem vir ter a cria- guir o caminho da flexibilidade (se quiser pode particularizar
da responsabilidade nacional pelo desenvolvimento de um que há um consenso significativo em torno da necessidade ção de redes de trabalho entre escolas, associações profissio- por atores educativos: diretores, professores, pais e enc. ed.,
projeto escolar de matriz inclusiva, traduzindo “um imperativo das escola transitarem de conceções e práticas de avaliação nais, instituições de formação e capacitação de professores e/ alunos e comunidade educativa).
ético e um adquirido civilizacional”, são muitos e complexos os seletiva para uma avaliação potenciadora das aprendizagens ou outros parceiros, onde se possam partilhar experiências,
obstáculos que se colocam à sua implementação. Esta só será dos alunos, ainda que, do ponto de vista do processo da sua soluções, questões e recursos, capazes de contribuir para o AC: Entendo este desafio a que somos convocados para cria-
possível no quadro de uma política educativa mais integrada e operacionalização, se constate: (i) a existência de crenças e desenvolvimento de iniciativas relacionadas com o AFC refor- ção de um pensamento curricular mais autónomo como uma
de abrangência sistémica que coloque no centro da ação da soluções que podem pôr em causa a possibilidade de cons- çando nos professores a capacidade e a disponibilidade para grande oportunidade para a reinvenção da profissão docente,
escola os alunos e as suas aprendizagens, promovendo o seu truir um modelo de avaliação das aprendizagens congruente trabalhar em equipa com outros profissionais, para enunciar e reconhecendo que, sendo expetável e desejável, que a par de
sucesso escolar, mas, igualmente, promovendo novas configu- com os pressupostos daquele projeto e (ii) as tensões e as dú- e desenvolver projetos coletivos visando a melhoria da ação uma boa resolução dos atuais problemas com que se defronta
rações da atividade profissional docente entendida como uma vidas acerca das possibilidades das provas de avaliação exter- educativa nas escolas. Foi evidente neste ano piloto/experi- a classe (carreiras longas, envelhecimento ou precaridade la-
atividade mais gratificante e mais significativa para os seus na, tal como têm vindo a ser pensadas e realizadas, poderem mental a importância formativa resultante do impacto das mi- boral), possamos ultrapassar outras dificuldades e desgastes
profissionais. ser congruentes com a complexidade dos objetivos educativos cro redes (nascidas das necessidades instituintes dos territó- da profissão que estão longe de poderem ser circunscritos, ex-
que caraterizam o PAFC. rios educativos) como espaços mais sustentados de reflexão, clusivamente, a estes problemas profissionais. Hoje, é neces-
3. Como sair de um currículo padronizado e de tamanho único debate e empoderamento estratégico das ações das escolas sário que, nos cenários educativos do mundo contemporâneo,
em função de um aluno médio “imaginário” para um currículo 5. Há professores que dizem que gostariam de flexibilizar mas e dos professores. os professores possam encontrar novos sentidos e novos sig-
flexível e significativo para cada um dos alunos? não contam com a colaboração dos colegas ou dos órgãos de nificados para a profissão que exercem, não só para que pos-
gestão da escola. O que lhes diria? Como pensa que seriam 6. Quais os principais constrangimentos e desafios com que sam obter uma maior gratificação pelo trabalho que realizam
AC: Farei minhas as palavras da Dra. Filomena Pereira (DGE) os conteúdos e modelos de uma formação em serviço que en- se tem deparado no caminho da flexibilidade? como para, em função disso, possam assumir um outro prota-
quando nos desafia a pensar no desafio de diferenciar a opor- corajasse os professores a serem mais flexíveis? gonismo na criação das condições e na definição dos desafios
tunidade de aceder ao currículo como um desafio ético, para AC: Apesar da importância que atribuímos ao projeto de Auto- que permitam aos alunos encontrar nas escolas um espaço de
além de um desafio técnico-pedagógico: “perspetivar a edu- AC: Entendo como estratégica a importância de valorizar o nomia e Flexibilidade Curricular temos todos consciência que empoderamento cultural, pessoal e social. É disso que se trata
cação inclusiva implica considerar as três dimensões que a investimento em iniciativas de formação de natureza formal são múltiplas as tensões endógenas e exógenas que o atra- quando somos “condenados à liberdade” de pensar autónoma
mesma incorpora: a dimensão ética, referente aos princípios e e experiencial ao nível das escolas e dos territórios educa- vessam ou que o desenvolvimento generalizado deste projeto e flexivelmente a nossa prática curricular. Saibamos nós, a es-
valores que se encontram na sua génese; a dimensão relativa tivos locais, que, no momento em que se constituam como de organização curricular suscita. cola portuguesa, aproveitar esta liberdade.

IV | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | V


Gestão e processos de liderança para dia (direção de turma, coordenação de departamento, coor-
denação de projeto, etc.), mormente da sua capacidade para
no nível mais superficial e visível da cultura de escola – o dos
artefactos – designadamente criando novas rotinas e rituais.

o desenvolvimento organizacional:
orientar, apoiar e motivar o corpo docente. Kim (1993) refere as rotinas organizacionais e a partilha de
Recupero aqui um estudo de avaliação sobre a eficácia elementos culturais – os denominados “modelos mentais par-
da implementação de um projeto de ensino bilingue, em que tilhados” – como mote para a aprendizagem organizacional;

algumas notas a propósito participei (Almeida, Costa, Pinho, Rocha & Antão, 2014; Cos-
ta, Almeida, & Pinho, 2017), cujos resultados confirmaram a
March (1981) destaca as regras e as normas e a sua codifica-
ção escrita, que garantem que a informação seja transmitida

da autonomia e flexibilidade curricular


importância das direções e estruturas intermédias no êxito de aos membros da organização, através dos tempos.
projetos de inovação pedagógica e curricular. Nos seis casos Pois bem, a transformação da aprendizagem individual
analisados (agrupamentos de escolas situados em diferentes em organizacional, expressa um ciclo de transformação de
regiões do país), o sucesso do Projeto esteve associado à in- conhecimento (Carlile & Rebentisch, 2003) que direciona a
— Estela Costa tensidade e amplitude do compromisso assumido pelas dire- alteração de rotinas, de objetivos e de regras no interior da or-
ções na sua consecução, bem como à capacidade demonstra- ganização (Borgatti & Cross, 2003; Levitt & March, 1988). As
Instituto de Educação da Universidade de Lisboa da para fazerem uso da influência, sabendo motivar, coordenar rotinas são estruturas temporais frequentemente usadas para
e direcionar os professores para as metas estipuladas. Em concretizar o trabalho organizacional, reveladas em padrões
alguns dos casos, a simbiose alcançada entre diretores e repetidos de comportamento que estão vinculados por regras
coordenadores que, em conjunto, desenvolveram estratégias e costumes (Feldeman, 2000). Se delineadas com propósitos
para envolver os professores, permitiu inclusive consolidar as específicos, as rotinas organizacionais permitem induzir com-
culturas de escola. portamentos. As rotinas são objeto de acertos. À medida que
Demais, este estudo possibilitou perceber, que o papel os atores escolares desenvolvem novos entendimentos sobre
atribuído às estruturas intermédias, não é independente das o que fazem e o que podem fazer, vão adaptando-as à sua
opções estratégicas das direções. Nas condições de eficácia ação. Não constituindo necessariamente um movimento para
apuradas, um dos aspetos aludidos foi a necessidade de apoio a harmonia, tais ajustamentos têm tanto de comportamental
e de implicação da direção mediante o exercício de lideranças quanto de cognitivo e devem fazer-se acompanhar por dinâ-
participativas (vd. Costa et al, 2017). Efetivamente, verificou-se micas orientadas para a discussão e a análise, com base num
que, quando as direções se comprometeram, foi possível criar esclarecimento sistemático dos propósitos organizacionais,
ambientes facilitadores da mudança e motivadores dos ato- sob pena de dificilmente ocorrer comprometimento coletivo.
res escolares. Já quando se provou existir baixas expectativas
relativamente ao sucesso do Projeto (que era encarado pela O DIRETOR COMO LÍDER DO CURRÍCULO
coordenação como uma tarefa mais a acrescentar na já atare- A sala de aula e a criação de condições propícias a melhorar
Este texto resulta de um desafio que processos de regulação transacionais, através da influência fada vida escolar), a dinâmica colocada pelos professores na os processos de ensino-aprendizagem são o que orienta as
de instâncias internacionais ‘padronizadoras’ (Brunsson & Ja- sua realização não foi suficiente para impedir que se reduzisse mudanças organizacionais. Assumindo-se o currículo como “o
me foi colocado sobre a gestão e liderança cobsson, 2000) (e.g. União Europeia, OCDE, Banco Mundial, a um conjunto de iniciativas soltas e esporádicas, com pouca verdadeiro núcleo das organizações escolares” (Beltrán & San
das escolas, no quadro de uma maior etc.) e que tem na ‘Nova Gestão Pública’ um poderoso catali- consistência quanto às aprendizagens realizadas pelos alunos Martín, 2000, p. 38), é ao diretor que compete assegurar a sua
sador da pressão em torno dos resultados, da qualidade e da e quanto ao seu prosseguimento, instaurando-se um ambiente gestão, orientar a sua conceção e desenvolvimento, e acom-
flexibilidade na gestão curricular, eficácia, a par de novos desafios resultantes dos avanços na marcado por alguma impassibilidade. panhar a sua implementação e monitorização. A ação do dire-
presentemente a ser objeto de efetivação Ciência e Tecnologia, e de formatos comunicacionais diferen- Igualmente, a literatura tem atestado que as escolas que tor como líder do currículo consiste em direcionar os atores
tes, acelerados pelas redes sociais. Concomitantemente, uma melhoram o desempenho dos alunos tendem a ter diretores escolares no sentido de os comprometer em processos que
no sistema educativo português. grande parte das escolas ainda fazem do currículo uma “lei- que são ‘líderes sistémicos’, capazes de criar sistemas de permitam gerar e sustentar formas de interpretar e dar sentido
tura rígida” (Formosinho & Machado, 2009), que reflete uma apoio robustos (Horng & Loeb, 2010), que contam com lide- ao que acontece no contexto escolar. O currículo não é uma
organização pedagógica pouco maleável, caracterizada pela ranças distribuídas (Bolívar, 2006, Gronn, 2000, Normand, questão que seja resolvida apenas declarando-a por escrito
A gestão é uma atividade complexa, que envolve a coorde- estandardização e a uniformização (vd. Barroso, 2001). 2013), como se refere em estudo da Organização para a Coo- em Planos curriculares ou no Projeto Educativo. Assim sendo,
nação de pessoas, de grupos e de relações entre pessoas e É, tendo presente este cenário complexo, marcado pelo peração e Desenvolvimento Económico (OCDE): a “autorida- importa que cada escola encete dinâmicas de trabalho (pro-
grupos (cada qual com significados e interesses distintos). De- abandono e por fracos desempenhos escolares, por desi- de para liderar pode estar distribuída entre pessoas diferentes cessos/relações profissionais) focadas na discussão, análise
finida por Donnelly, Gibson e Ivancevich (2000) como um “pro- gualdades nos resultados dos alunos e pela culpabilização de dentro da escola” (Pont, Nusche, & Moorman., 2008, p.2). e reflexão e no esclarecimento dos propósitos organizacionais,
cesso levado a cabo por um ou mais indivíduos, de coordena- professores e diretores, que consideramos que o exercício do Seguramente, o labor das direções nas questões moti- e que o gestor detenha capacidade organizativa, estimulando
ção das atividades de outras pessoas, com vista a alcançar trabalho do cargo de gestor escolar deve ser equacionado. vacionais não será suficiente para que se operem alterações o coletivo para a definição e consecução dos objetivos organi-
resultados que não seriam possíveis pela ação isolada de uma nas culturas de escola. Porém, toda a mudança deve ser an- zacionais, na certeza de que as mudanças de nível organizativo
pessoa” (p.3), a gestão impõe a ativação de papéis múltiplos O GESTOR E A IMPLEMENTAÇÃO DE PROJETOS tecedida por uma intervenção focada na consolidação de va- (introdução de novas estruturas, processos e papéis) são tri-
e diferenciados quanto à sua natureza e escopo, incorporan- A introdução, nas escolas, de processos de renovação peda- lores partilhados por todos – que permitam guiar a ação da butárias das mudanças nos processos de ensino-aprendiza-
do reflexão, análise, colaboração e proatividade, para além de gógica, como é o caso da promoção de maior flexibilidade cur- organização e justificá-la – e dos pressupostos básicos, i.e., gem (vd. Cuban, 1988).
energia pessoal (Mintzberg, 2010). ricular, carece da criação de ambientes propícios à mudança das suas perceções, aceções, sentimentos e emoções (vd. Gerir o currículo implica fazer opções sobre a natureza do
Atualmente, os gestores escolares convivem com uma e à inovação, estando muito dependente do compromisso e Schein, 2004). Estas dimensões invisíveis têm um profundo que está contido e que dá sentido à escola, estabelecer prio-
‘crise de legitimidade’ do Estado, que é impulsionada por proatividade das direções e das estruturas de gestão intermé- alcance e podem ser potenciadas por meio de um investimento ridades, e definir para quê, o quê, como, quando, onde e com

VI | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | VII


que meios se vai ensinar e aprender. Isto implica gerar proces- segurando que os outros compreendem as decisões tomadas REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Formosinho, J., & Machado, J. (2009). Equipas Educativas. Para uma nova
organização da escola. Porto: Porto Editora.
sos diários de funcionamento organizacional, adotar (novos) e que as mensagens fluam sem constrangimentos. Almeida, M. M., Pinho, A.S., Costa, E., Antão, V., Rocha, P. (2014, Dezembro).
padrões de ação e dessa forma ir ‘construindo organização’. Como se constata, é de liderança que falamos. Liderança Relatório Final do estudo de avaliação sobre a eficácia da implementação Friedberg, E. (193). O poder e a regra: dinâmicas da ação coletiva organizada.
do projeto Ensino Bilingue Precoce (EBP). Lisboa: IEUL- DGE/MEC. Lx: Piaget.
Nesta equação, estão contidos diferentes componentes que o que se constrói em cada situação, em cada contexto de gru-
Barroso, J. (2001). O século da escola: do mito da reforma à reforma de um Gronn, P. (2000). Distributed properties: A new architecture for leadership.
gestor deve observar: (a) os professores, organizados de modo po, e que implica persuadir, motivar, convencer os outros com mito. In T. Ambrósio, E. Terrén, D. Hameline & J. Barroso, O Século da Escola Educational Management, Administration Leadership, 28(3), 317-338.
a atingir-se os objetivos curriculares, definindo o modo como vista a alcançar as metas compartilhadas entre o ‘líder’ e seus – Entre a utopia e a burocracia (pp. 63-94). Porto: Edições ASA.
Horng, E., & Loeb, S. (2010). New Thinking about Instructional Leadership,
serão agrupados, como se reúnem e dialogam uns com os ou- seguidores (Yukl, 2006). Assim entendida, a liderança é um Beltrán, F., & San Martín, Á (20009. Diseñar la coherencia escolar. Madrid: Kappan, 66-69.
Ed. Morata.
tros; (b) a aprendizagem, necessariamente acessível a todos os “processo pelo qual um indivíduo influencia um grupo de indi- Kim, D. H. (1993). The Link Between Individual and Organizacional Learning.
Bolívar, A. (2006). A Liderança educacional da direcção escolar em Espanha: Sloan Management Review, 37-50.
alunos, garantindo a igualdade de oportunidades, o que implica víduos para alcançar um objetivo comum” (Northouse, 2015). entre a necessidade e a (im)possibilidade. Revista do Fórum de Administração
Leithwood, K., Day, C., Sammons, P., Harris, A., & Hopkins, D. (2006),
a diversificação de modelos organizativos de aprendizagem, de De resto, como assinalam Leithwood e Riehl (2003), existe um Educacional, 6, 77-93.
Seven Strong Claims about Successful School Leadership. National
estratégias e organização do trabalho; (c) a infraestrutura organi- núcleo duro de práticas de liderança que formam a base do Borgatti, S. P., & Cross, R. 2003. A relational view of information seeking College of School Leadership, Nottingham.
zacional, no sentido de providenciar condições de trabalho (e.g. sucesso dos líderes, em contexto escolar, a saber, (a) fixar ‘di- and learning in social networks. Management Science, 49(4), 432-445.
Leithwood, K., & Riehl, C. (2003). What we know about successful school
horários, espaços comuns previstos nos horários, subdivisões; reções’ para o trabalho escolar; (b) desenvolver as pessoas; Brunsson, N., & Jacobsson, B. (2000). The contemporary expansion of leadership. Philadelphia, PA: Laboratory for Student Success, Temple
standardization. In Brunsson, N., Jacobsson, B. [and associates], A World University.
coexistência de áreas para trabalho coletivo/individual, etc.). Em (c) desenvolver a organização e (d) responder aos desafios of Standards (1-17). Oxford: Oxford University Press. Levitt, B., & March, J. G. (1988). Organizational learning. Annual review
suma, ao gestor cumpre pensar a organização pedagógica da e oportunidades do ambiente organizacional. Carlile, P. R., & Rebentisch, E. S. (2003). Into the black box: The knowledge of sociology, 14(1), 319–340.
escola, encetando configurações (mais) flexíveis de organização O estudo de avaliação referido e a literatura que o su- transformation cycle. Management Science, 49(9), 1180-1195 March, J. G. (1981). Decisions in Organizations and Theories of Choice.
de alunos e professores, de modo a que o tempo e o espaço se porta permitem perceber que para que a liderança exista de Costa, E. (2015). Da liderança pedagógica do diretor escolar aos processos In A. Van de Ven & W. Joyce (eds.). Perspectives on Organization Design
de reconfiguração organizacional da escola, in Conselho Nacional de and Behavior, pp. 205–244. New York, NY: Wiley Interscience.
adaptem às necessidades educativas dos alunos e não tanto o modo distribuído há que ‘conferir poder a’. Por outras palavras, Educação, Estado da Educação 2014 (254-261). Lisboa: Conselho Nacional Mintzberg, H. (2010). Gérer (tout simplement). Montréal: Les Éditions
contrário (vd. Costa, 2015). é necessário envolver, comprometer, dar autonomia e apoiar as de Educação. Transcontinental.
Em relação às estruturas intermédias, a sua ação é pri- estruturas intermédias. No fim de contas, o que está em causa Costa, E., Almeida, M., & Pinho, A. S. (2017). Papéis do gestor escolar, Normand, R. (2013). Le chef d'établissement du second degré: vers un
mordial para levar a bom termo a ação do coletivo e a sua é assegurar uma correspondência significativa entre a visão e liderança pedagógica e desafios organizacionais na implementação do nouveau modèle professionnel? Administration et Education (12/2013).
projeto-piloto de ensino bilingue precoce no 1º CEB, In M. Anjos Cohen (Org.),
aprendizagem conjunta. As organizações apenas aprendem se a missão declaradas da escola, no seu Projeto, e as práticas Supervisão, Liderança e Inclusão (pp.267-275), Ramada: Edições Pedago. Northouse, P. G. (2015). Leadership: theory and practice. (7th edition).
Los Angeles: SAGE.
quem nelas trabalha aprender individualmente, mas também curriculares e educacionais do dia-a-dia. Cuban, L. (1988) The Managerial Imperative and the Practice of Leadership
em interação (Fernandes, 2000; Kim, 1993). É precisamente in Schools. Albany, NY: State University of New York Press. Pont, B., Nusche, D., & Moorman, H. (2008). Improving School Leadership,
Volume 1: Policy and Practice. Paris: OECD. http://www.oecd.org/edu/
nesta interação entre os atores, que a escola como ação orga- Donnelly, J.H., Gibson, J.L., & Ivancevich, J.M. (2000). Administração, Lisboa: schoolleadership
McGraw-Hill.
nizada (vd. Friedberg, 1993), se consubstancia, o que é favo- Schein, E. H. (2004). Organizational Culture and Leadership (3rd edition).
Feldman, M. S. (2000). Organizational Routines as a Source of Continuous San Francisco: Jossey-Bass.
recido pela adoção de posturas integradoras, que estimulem a Change. Organization Science, 11(6), pp. 611-629.
partilha de informação, dúvidas e decisões. Competindo-lhes Fernandes, A. (2007). Tipologia da Aprendizagem Organizacional: Teorias
Yukl, G. (2006). Leadership in Organizations (6th ed.). Upper Saddle
River: NJ Pearson Education.
ordenar o trabalho da organização, alinhando os pares com e Estudos. Lisboa: Livros Horizonte.
as metas pré-estabelecidas, a ação pedagógica coordenada
dependerá mais dos processos e da dinâmica do trabalho do
que das diretrizes e das prescrições político-administrativas.
Com efeito, a dinâmica de interação entre os atores é o que
efetivamente cria a organização, enquanto espaço sociocultu-
ral. Mais, é neste contexto que os diversos atores se desenvol-
vem e dão forma ao quotidiano. À medida que atribuem signi-
ficado ao que sucede em seu redor, interpretando, filtrando e
recriando a realidade, à luz das suas crenças e valores, (novos)
modos de pensar e agir vão sendo estruturados, com base em
hábitos e padrões de ação mais ou menos rotineiros. E é nos
processos relacionais, que decorrem das dinâmicas de traba-
lho, que a ideia de currículo, das abordagens ao currículo, das
estratégias encetadas se desenvolve e consolida.
Por conseguinte, a concertação entre o que as diferentes
estruturas fazem e o seu alinhamento com a missão da esco-
la afiguram-se decisivos. Para isso, há que pôr as pessoas a
trabalhar nesse sentido. Os gestores intermédios podem fazer
a diferença, pois são os ‘nós’ de interface entre os diferen-
tes ‘ambientes’ e atores, no interior da organização. O núcleo
do seu trabalho repousa na capacidade em ouvir os pares, de
considerar as suas necessidades, de valorizar os seus contri-
butos, a todos reconhecendo importância, e construir ordem,
alinhar as ações e os atores com os objetivos do Projeto Edu-
cativo. Também relevante é a capacidade de comunicação, as-

VIII | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | IX


Inclusão e inovação pedagógica • a formação contínua era bastante reduzida e incipiente;
• as escolas precisavam de tempo para trabalho colaborativo;
• a mudança causa receio e apreensão.
ra dificuldade. Consideramos, por isso, que, para estes alu-
nos, uma metodologia baseada na resolução contextualizada
de problemas, com recurso às tecnologias de informação
— Paulo Almeida e comunicação, num ambiente mais informal, constitui uma
Envolta nesta realidade, a comunidade educativa do AEF- mais-valia em termos de melhoria dos índices motivacionais
Diretor do Agrupamento de Escolas Fernando Casimiro Pereira da Silva – Rio Maior CPS assumiu o desafio de alterar o paradigma educativo vigen- e aprendizagem, dando sentido aos conceitos e aprendi-
te, com recurso a abordagens pedagógicas centradas no aluno, zagens em desenvolvimento, reforçando a necessidade de
profundamente influenciadas pelo acesso e uso da tecnologia aumentar o seu esforço pessoal no sentido de melhorar
e pelo aparecimento de novos contextos de interação social. a qualidade das aprendizagens e o nível de aquisição de co-
É justamente com a consciência desta realidade que a nhecimentos.
escola precisa de se reinventar, ajustando-se às necessida- É neste contexto que surgem os laboratórios de aprendiza-
des, expectativas e interesses dos alunos, dos pais e encarre- gem incluídos num projeto alargado denominado ActiveLab.
gados de educação e da comunidade envolvente, garantindo
que essas mudanças se façam com sentido de responsabilida- ACTIVELAB
de, com qualidade e com respeito pelas diferenças. O projeto “ActiveLab” pretendeu reequacionar toda uma filo-
Se todas as mudanças são difíceis e normalmente lentas, sofia de escola, centrando a sua ação em três focos: Espa-
em educação essas mudanças estão, neste momento, a vários ço, Metodologias e Recursos. Baseado na Filosofia da Future
ritmos no que concerne ao processo de autonomia e flexibiliza- Classroom Lab, o ActiveLab tornou-se num projeto de escola
ção curricular, e dependem sobretudo da habitual capacidade que não se centrava apenas em mudanças pontuais mas que
de adaptação às mudanças e da força mobilizadora dos pro- equacionava toda a lógica de trabalho docente.
fessores para a implementação de estratégias e metodologias O aparecimento do Perfil dos Alunos à Saída da Es-
pedagógicas inovadoras. colaridade Obrigatória (PASEO) e a sua articulação com as
Com uma equipa de profissionais de qualidade e aberta Aprendizagens Essenciais vêm colocar novos desafios, no que
a novos desafios, o AEFCPS quis dar a volta a esta situação e se refere à adoção de metodologias promotoras de aprendiza-
responder ao desafio de colocar a escola no século XXI, onde gens significativas. Os Ambientes Educativos Inovadores são
a inovação das práticas pedagógicas são a garantia de inclu- espaços por excelência para o desenvolvimento das áreas de
são e de sucesso escolar dos nossos alunos. competência definidas no PASEO.
NOTA INTRODUTÓRIA De entre as conclusões da reflexão, destacam-se os se- A realidade do agrupamento é similar à realidade de Os Ambientes Educativos Inovadores são espaços de
O Agrupamento de Escolas Fernando Casimiro Pereira da Sil- guintes aspetos: muitas escolas onde se verifica que uma faixa da população trabalho, pensados e desenhados para o desenvolvimento de
va (AEFCPS) é composto por quatro escolas (Escola Básica • o trabalho em sala de aula estava muito centrado na figura escolar apresenta baixos índices de motivação para os es- situações de aprendizagem ativa, compatíveis com as exigên-
da Mina do Espadanal, Escola Básica Poeta Ruy Belo, Escola do professor; tudos, pelo que os métodos mais tradicionais de ensino não cias inerentes à evolução social e tecnológica.
Básica da Asseiceira e Escola Básica Integrada Fernando Ca- • os alunos tinham pouco espaço de intervenção e não constituem, por si só, uma garantia de aprendizagem, uma As atividades desenvolvidas com os alunos no âmbito
simiro Pereira da Silva), sendo, igualmente, escola associada desenvolviam, como se desejava, competências de nível vez que os alunos, por norma, acabam por desistir à primei- deste projeto são pensadas, não como atividades isoladas e
de dois estabelecimentos prisionais (Estabelecimento Prisio- avançado; independentes, mas como cenários de
nal de Alcoentre e Estabelecimento Prisional de Vale de Ju- • a aprendizagem informal, tida nos diferentes espaços aprendizagem.
deus). O agrupamento tem aproximadamente mil e duzentos educativos não formais, tornava o conhecimento mais Os cenários de aprendizagem apre-
alunos, sendo cerca de 16% do pré-escolar, 31% do 1.º ciclo, mobilizável; sentam-se como situações de aprendi-
21% do 2.º ciclo, 19% do 3.º ciclo e 13% de cursos de Educa- • a indisciplina e a desmotivação tinham tendência para zagem compostas por um conjunto de
ção e Formação de Adultos. aparecer no modelo tradicional; elementos que descreve o contexto em
Cerca de 55% dos alunos do agrupamento são sub- • estas conclusões induziram, na comunidade educativa, que a aprendizagem se desenrola, o
sidiados e quase 13% apresenta necessidades educativas um desejo de mudança de paradigma educativo e uma ambiente em que a mesma ocorre e os
especiais de caráter permanente, por referência ao Decre- vontade conjunta de procura de soluções. papéis desempenhados pelos diferentes
to-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro. O agrupamento tem em agentes ou atores.
funcionamento duas unidades de apoio especializado, uma Contudo, o processo deparou-se com alguns constrangi- O trabalho desenvolvido no âmbito
para alunos com multideficiência e outra para alunos autistas. mentos próprios da realidade educativa da altura: do ActiveLab confirmou a necessidade
Numa lógica de escola aprendente, desde 2008, o agru- • os currículos estavam “obesos”, demasiados carregados de mudança e, ao mesmo tempo, conso-
pamento tem vindo a trabalhar no sentido de compreender as de informação que dificultava a implementação de práti- lidou a estratégia de ação dessa mesma
razões pelas quais o sucesso educativo não é alcançado por cas baseadas em trabalho de e por projeto; mudança com resultados visíveis quer
todos os alunos e o modo como pode ser melhorada a quali- • os docentes vivenciaram as práticas que implementavam ao nível da organização física da esco-
dade do sucesso. e estavam formatados para trabalhar nessa realidade la, quer ao nível das rotinas de trabalho
O Observatório de Qualidade do Agrupamento procurou, educativa; pedagógico e das metodologias do de-
ao longo destes anos, encontrar variáveis/causas que expli- • a importância das provas e exames era excessiva, nor- senvolvimento curricular. A intenciona-
cassem o insucesso de alguns alunos, tendo sido obtidas al- teando todo o trabalho educativo, incutindo, muitas vezes, lidade do ActiveLab está centrada na
gumas respostas que indicaram o rumo a tomar. a prática para a preparação destes momentos; criação dos espaços designados como

X | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XI


“Ambientes Educativos Inovadores”, vulgarmente conhecidos cia, Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Pro- partir de modelos agregadores de competências e de con- GESTÃO CURRICULAR
como “Salas de Aula do Futuro”, organizados como laborató- fissional e a Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares. teúdos curriculares transversais ao currículo. A gestão do currículo é feita numa lógica de ciclo, ajustando
rios de aprendizagem e espaços de inovação para professo- O Projeto-Piloto de Inovação Pedagógica do AEFCPS Numa visão holística, tendo como cerne do problema algumas das aprendizagens ao ano de escolaridade e identi-
res e alunos. Rapidamente, o conceito do ActiveLab alastrou organiza-se em duas grandes dimensões: organizacional e a desconstrução da compartimentação do saber, a Oficina ficando as aprendizagens-chave de cada ano. Nos trabalhos
a todo o agrupamento e a visão estratégica da direção passou pedagógica; e desenvolve-se procurando conjugar três gran- do Conhecimento está assente em Cenários Integrados de preparatórios, os diferentes grupos disciplinares realizaram
por desconstruir todos os espaços educativos por forma a pro- des pilares: autonomia, responsabilidade e cooperação. Aprendizagem (CIA). um processo de mapeamento dos programas das diferentes
porcionar espaços flexíveis e ajustáveis à realidade de trabalho As medidas definidas na dimensão organizacional cons- Os cenários tiveram origem na identificação, para cada disciplinas, acentuando as aprendizagens consideradas cha-
do agrupamento. tituem-se como opções estratégicas de gestão de tempo e da ano de escolaridade, de disciplinas nucleares e complemen- ve em cada ano de escolaridade e definindo claramente os
O projeto ActiveLab pode ser consultado em: www.acti- forma como a estrutura pedagógica se organiza. De entre estas tares, assim como das aprendizagens a promover em cada tópicos comuns a cada área, ajustando as planificações e
velabanet.wordpress.com. medidas destacam-se o calendário escolar, a flexibilidade dos cenário. No desenho de cada projeto, participa toda a equipa evitando redundâncias.
grupos turma, a matriz curricular e as ofertas extracurriculares. educativa, procurando que o cenário migre do espaço destina- O mapeamento construído foi mais tarde enriquecido
PROJETO-PILOTO DE INOVAÇÃO PEDAGÓGICA (PPIP) As medidas pedagógicas prendem-se com as opções do a trabalho de projeto para cada uma das áreas curriculares. com o aparecimento das aprendizagens essenciais.
Em maio de 2016, o AEFCPS aceitou o desafio, apresenta- metodológicas, a forma como se define a gestão curricular e o Os CIA são pontos de partida para o desenvolvimento Este trabalho minucioso de identificação das aprendiza-
do pela Direção-Geral de Educação (DGE), juntamente com modo como se regulam as aprendizagens. de trabalhos de projeto, arquitetados pelas diferentes equi- gens essenciais permitiu identificar, em cada ano de escolari-
outras cinco escolas convidadas, Agrupamentos de Escolas pas educativas e construídos com e pelos alunos. dade, as disciplinas nucleares para o trabalho transdisciplinar
de Freixo (Ponte de Lima), do Cristelo (Paredes), da Mari- CALENDÁRIO ESCOLAR e aquelas que serviriam de suporte, as disciplinas complemen-
nha Grande Poente (Leiria), de Fernando Casimiro Pereira O calendário escolar está organizado numa lógica semestral, FLEXIBILIDADE DOS GRUPOS TURMA tares. Permitiu igualmente definir os já referenciados Cenários
da Silva (Rio Maior), de Vila Nova da Barquinha (Santarém) com ajuste nas interrupções letivas, por forma a encurtar os A constituição administrativa das turmas tem, por imperativo Integradores de Aprendizagem, que se constituem como ponto
e da Boa Água (Sesimbra), para definir os princípios fun- períodos contínuos de atividade letiva, possibilitar a recupera- legal, de respeitar os normativos vigentes. Contudo, a flexi- de partida para a elaboração de projetos transdisciplinares e
damentais para a conceção do Projeto-Piloto de Inovação ção de aprendizagens e incluir nas práticas pedagógicas mo- bilização dos grupos permite ajustar as metodologias a im- funcionam como catalisadores da articulação curricular.
Pedagógica (PPIP). mentos frequentes de balanço do trabalho desenvolvido e dos plementar e as dinâmicas de sala de aula ao perfil de cada Assim, o currículo é visto como uma unidade global a gerir
Formalizado com a publicação do Despacho n.º 3721/ resultados alcançados. conjunto de alunos. pela escola e por cada equipa educativa, consoante a realida-
2017, de 7 de Abril, o PPIP visa promover o sucesso e a qua- A adoção de um modelo não tradicional de calendário esco- Assim, aparecem no agrupamento formas distintas de de do seu contexto e o perfil de cada conjunto de alunos.
lidade das aprendizagens de todos os alunos, através do re- lar permite fornecer feedback regular a alunos e famílias e esta- organização de grupos turma que procuram exponenciar o
forço da autonomia das escolas, na conceção e adoção de belecer momentos formais de avaliação com maior regularidade. trabalho educativo e que se traduzem em reorganizações dis- ASSEMBLEIAS DE ESCOLA E DE TURMA
projetos educativos próprios, através da introdução de altera- Este modelo de calendário escolar permitiu adequar as tintas dos grupos, nomeadamente: As Assembleias de Escola são momentos por excelência para
ções de âmbito organizacional e pedagógico, nomeadamente interrupções letivas ao contexto social do agrupamento e con- • a organização dos alunos, de um ou mais anos de esco- o exercício da cidadania e para a criação de compromisso en-
ao nível didático e da gestão curricular, que visem responder tribuiu para a alteração da lógica da aplicação de instrumentos laridade, por estações em rotatividade; tre os alunos e a aprendizagem.
às suas necessidades específicas e, em simultâneo, promo- de avaliação apenas para a classificação dos alunos. • a constituição de ateliês; Nas Assembleias de Escola, os alunos organizam-se por
vam um maior alinhamento das práticas educativas com as • a divisão por turnos ou grupos para trabalho em torno forma a responderem àqueles que são, no seu entendimento,
dinâmicas da sociedade de hoje. MATRIZES CURRICULARES dos planos individuais, no caso das línguas, da matemá- os problemas e projetos de cada escola.
Enquanto projeto-piloto, a monitorização de todo o pro- No que diz respeito às diferentes matrizes curriculares, o tica e da educação física; As sessões das diferentes Assembleias de Escola per-
jeto é da responsabilidade da Direção-Geral da Educação e agrupamento desenhou as suas próprias matrizes, através da • a organização de alunos de diferentes níveis de escola- mitem um trabalho em torno das emoções e dos valores muito
cabe-lhe coordenar os trabalhos, juntamente com o envolvi- agregação parcial de disciplinas e da criação de espaços de ridade para a execução de uma mesma tarefa. próprio do “Growth with a growing mindset”, um dos vários
mento de um Grupo de Acompanhamento, no qual também trabalho transdisciplinar (Oficina do Conhecimento). projetos Erasmus+ em desenvolvimento no AEFCPS.
estão representados a Estrutura de Missão para a Promoção A Oficina de Conhecimento funciona a partir da orga- As Assembleias de Turma funcionam no início e no final
do Sucesso Escolar, a Inspeção-Geral da Educação e Ciên- nização de unidades curriculares integradoras, planeadas a de cada semana/quinzena. As Assembleias de Turma de início

XII | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XIII


de semana/quinzena ocorrem no primeiro tempo de segunda- de competência do PASEO, em cada ciclo de ensino. sucesso a rondar os 99%, sendo que cerca de 83% dos alu-
-feira e servem para definir os objetivos próprios de cada Pla- O dispositivo de planeamento é o instrumento utilizado nos não apresentam níveis de insucesso a qualquer disciplina.
no Individual de Trabalho e de cada agenda semanal que são no planeamento do trabalho educativo, procurando responder Na avaliação externa, os resultados das provas finais de
avaliados na sessão que termina a semana/quinzena, no último ao ciclo básico da aprendizagem, orientado pelas questões: português foram bastante satisfatórios, com cerca de 93%
tempo de sexta-feira. “o que queremos que aprendam?”, “o que fazemos para que dos alunos com níveis de sucesso e os resultados de matemá-
aprendam?”, “como verificamos que aprenderam?”. tica subiram cerca de 7%, por comparação com os resultados
PLANOS INDIVIDUAIS DE TRABALHO Os dispositivos de regulação, acompanhamento e com- do ano anterior e por contraponto com a descida dos resulta-
Os Planos Individuais de Trabalho (PIT) são instrumentos de promisso, e validação, destinam-se ao trabalho conjunto em dos nacionais.
gestão pedagógica que visam a promoção da autonomia e da torno da regulação das aprendizagens. Os níveis de indisciplina desceram acentuadamente e os
responsabilidade, numa lógica de cooperação. Deste modo, a seleção do instrumento de avaliação a uti- alunos apresentam maior grau de autonomia e responsabilidade.
Os PIT visam contribuir para uma aprendizagem que res- lizar orienta-se pela tipologia de trabalho educativo e, por isso Na análise da perceção que os alunos têm da escola, o
peite o ritmo próprio de cada aluno, definindo momentos de mesmo, tem uma maior diversidade. estudo levado a cabo pela perita externa que acompanha o PPIP
trabalho individual e momentos de trabalho conjunto. do AEFPC, Dr.ª Ariana Cosme, concluiu que os alunos julgam
O trabalho por PIT está muito alicerçado no 1.º ciclo e tem INCLUD-ED que, ser aluno na escola é sinónimo de ser bem-sucedido, ter
vindo a aparecer nos 2.º e 3.º ciclos, com maior incidência na O projeto Includ-ed aparece no AEFCPS no ano letivo autonomia, responsabilidade e cooperação, sentir-se incluído,
matemática e na educação física. 2017/2018, por convite da DGE, e traduz-se na dinamização estar motivado para aprender, ter respeito e ser respeitado, e ser
No caso da educação física, o projeto conjuga-se com de Ações Educativas de Sucesso (AES) e na construção de alvo de exigência sem descuidar a inovação e a diversão.
uma organização distinta do tempo letivo tradicional e uma comunidades de aprendizagem. Assim se continua o trabalho em torno da melhoria da
desconstrução dos grupos turma. O trabalho é delineado O projeto apresenta seis AES das quais se destacam as qualidade da aprendizagem no agrupamento, na certeza de
tendo por base o Personal Training e o Game Designer e Tertúlias Dialógicas Literárias e os Grupos Interativos. que, quando a escola falha, falhamos todos e de que, se for-
incluiu o desenvolvimento da Inteligência Emocional e do As Tertúlias Dialógicas Literárias procuram desenvol- mos sozinhos, vamos mais rápido, mas se formos juntos va-
culto do corpo. A área de trabalho do grupo de educação ver competências leitoras, argumentativas, espírito crítico e mos mais longe.
física pode ser acompanhada em: www.educacaofisicaaef- respeito pelo outro. Nestas ações, cada grupo seleciona, em
cps.wordpress.com. conjunto com o docente, um clássico da literatura que será
trabalhado pelos alunos de forma colaborativa.
AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS Os Grupos Iterativos são formas distintas de organização
O processo de avaliação das aprendizagens tem um ca- da sala de aula, na qual participam diferentes voluntários da
ráter predominantemente formativo, com tónica acentuada comunidade. A aula é preparada pelo professor e o trabalho
no processo e na forma como as aprendizagens vão sendo dos voluntários permite a manutenção do foco na atividade e a
conseguidas. colaboração entre os alunos.
O AEFCPS encontra-se a construir uma APP que permita Em relação às comunidades de aprendizagem, os dife-
monitorizar o processo de aquisição das aprendizagens e o grau rentes estabelecimentos estão, ao momento, na fase de sele-
de desenvolvimento das diferentes áreas de competências. ção de prioridades após a conclusão da fase dos sonhos.
Para a construção desta ferramenta tem sido fundamental
a desconstrução dos diferentes instrumentos de planeamento RESULTADOS
do agrupamento. Os resultados obtidos são bastante satisfatórios e indicam que
O dispositivo de operacionalização do Perfil define as o caminho já percorrido tem sido profícuo.
etapas intermédias de desenvolvimento das diferentes áreas Em termos de resultados escolares, salienta-se a taxa de

XIV | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XV


Azeitão: uma escola competências para enfrentar os desafios do século XXI, levam-
-nos a consolidar e a desenvolver outras estratégias previstas
alteração de comportamentos face às desigualdades de de-
senvolvimento e problemas ambientais.

em transformação
no Decreto-Lei nº55/2018 de 6 de julho e regulamentadas pela No 2º e 3º ciclo, as disciplinas com menos tempos sema-
Portaria nº 223-A/2018 de 3 de agosto. nais funcionam semestralmente, como é o caso de Educação
Acreditamos ser este o caminho que nos levará a uma Visual, Educação Tecnológica, História, Ciências Naturais,
escola inclusiva, onde cada uma das nossas crianças, jovens Educação Musical e Geografia. Ao menor número de turmas
— Maria Clara Félix
e adultos realiza o seu projeto educativo. Acreditamos que, por semestre corresponde um acréscimo de horas letivas por
numa escola que se quer para todos, a resposta pode estar semana, o que permite que o professor acompanhe com maior
Diretora do Agrupamento de Escolas de Azeitão
na flexibilidade e autonomia curricular. Nas nossas mãos de proximidade os seus alunos.
professores está a possibilidade de adaptar os currículos às Nas Línguas Estrangeiras – Francês e Inglês – num tem-
necessidades e expetativas dos alunos e não o inverso. po simultâneo com Português, a turma funciona em desdobra-
O percurso que temos feito revela a inevitabilidade de (re) mento, promovendo o desenvolvimento da oralidade. As dis-
inventar uma escola consciente de que tem de viver o tempo do ciplinas de TIC e de Cidadania e Desenvolvimento partilham
conhecimento ativo, integrado e transdisciplinar. um tempo comum, de modo a ser implementada uma dinâmica
Neste âmbito, a ação educativa prioriza a interligação e a de trabalho interdisciplinar e potenciado o carácter transversal
interseção de saberes de diferentes áreas disciplinares e dis- destas áreas do saber. As opções tomadas pretendem contri-
ciplinas, numa perspetiva horizontal e vertical, a constituição buir para o desenvolvimento de estratégias de ensino e apren-
de equipas educativas e uma avaliação contínua e sistemáti- dizagem que permitam maior individualização e uma avaliação
ca ao serviço das aprendizagens. O envolvimento ativo dos centrada no processo.
alunos no seu processo de aprendizagem e a valorização da
sua voz no quotidiano da escola são igualmente determinantes TRILHANDO CAMINHO ENTRE DISCIPLINAS
para a sua formação integral. O percurso gradual de (trans)formação das práticas peda-
Retomando o propósito de uma escola em (trans)forma- gógicas em sala de aula é precedido de bastante esforço ao
ção, salienta-se o conceito formação. A escola é espaço de nível da organização, como já temos vindo a referir. Destaca-
formação, casa de aprendizagem para todos – alunos, profes- -se, em julho, a distribuição de serviço, momento em que se
sores e para a própria organização. Transformar-se e transfor- constituem as equipas educativas. Este ano, privilegiou-se a
mar faz-se numa cultura de reflexão, de trabalho colaborativo, atribuição do menor número possível de professores por ano
de partilha de práticas pedagógicas entre docentes, o que nos de escolaridade.
leva a novas formas de fazer e de estar. (Trans)formação impli- A constituição de equipas educativas tem por objetivo es-
ca obrigatoriamente Mudança. tabelecer o compromisso de um grupo de professores que le-
Não há, não comum dos quatro Projetos Educativos aprovados desde essa ciona o mesmo ano de escolaridade com um grupo de alunos,
altura. Proclamava-se o Conhecimento com o seu valor social PASSO A PASSO NOS TRILHOS DA esbatendo as limitações impostas pelos conceitos tradicionais
Duas folhas iguais em toda a criação. e ético. Neles inscrevem-se ações e práticas pedagógicas que FLEXIBILIDADE E AUTONOMIA CURRICULAR de grupo turma e de disciplina. Este compromisso levou-nos,
Ou nervura a menos, ou célula a mais, contribuem para a formação de crianças, jovens e adultos res- No ano letivo de 2017/2018, o Projeto de Autonomia e Flexibi- também, à planificação de tempos que se caracterizam por se-
ponsáveis, autónomos, capazes de lidar com a mudança. lidade Curricular abrangeu todas as turmas de 1º, 5º e 7º anos guir uma tendência de desfragmentação dos saberes – Oficina
Não há, de certeza, duas folhas iguais. Considerando que a questão atual não é uma escola para – no total 21 turmas, cerca de 500 alunos. No ano em curso, do 5@bER Sem Fronteiras – e à atribuição de tempo para tra-
— António Gedeão todos, mas uma escola onde todos aprendem, temos vindo, em este número mais do que duplicou, contam-se agora 1042 alu- balho colaborativo aos docentes.
conjunto, a procurar outras formas de trabalhar com os nossos nos, distribuídos por 43 turmas de 1º, 2º, 5º, 6º, 7º e 8º anos. Ousar outros modos de fazer escola, eliminando gra-
alunos. Encontrar respostas adequadas a todos e a cada um O número considerável de alunos, a necessidade de ul- dualmente as fronteiras entre disciplinas implicou definir no-
Nos tempos em que vivemos, falar de educação é um enorme deles tem levado à elaboração de diferentes planos de ação. trapassar os aspetos menos positivos identificados no decor- vas manchas horárias. Semanalmente, nos horários dos alu-
desafio. O avanço da tecnologia, a evolução da inteligência Sucederam-se os Planos de Melhoria, o Plano de Ação ao ní- rer do ano anterior e o desejo de ir mais longe, estão na origem nos estão marcadas entre 6 a 8 horas de Oficinas do 5@bER
artificial e a crescente necessidade de uma cidadania parti- vel dos departamentos e, em 2015/2016, o Plano de Ação Es- das alterações introduzidas ao nível das matrizes, dos docu- Sem Fronteiras, conforme se trate de um ano de iniciação ou
cipativa alteram significativamente a sociedade. A escola não tratégica. Este último antecipava os caminhos que viriam a ser mentos de suporte, da gestão pedagógica e da constituição de continuação no Projeto de autonomia e flexibilidade. Nes-
só reflete estas alterações como tem de se (re)inventar quo- iniciados no ano seguinte. das estruturas intermédias que articulam diretamente com a tas horas, exploram-se percursos pedagógico-didáticos pro-
tidianamente, adequando-se ao ritmo dos tempos. Cabe-lhe No ano letivo de 2017/2018 ousámos ir mais longe. Em Direção. Estes novos passos foram dados num momento em motores do trabalho prático e ou experimental, trabalham-se
um novo e exigente papel: ser capaz de se (trans)formar e de regime de experiência pedagógica, implementámos o Projeto que se alterou significativamente o corpo docente, em resul- conteúdos integrados em trabalhos que envolvem diferentes
(trans)formar. Nesta escola, o horizonte é a educação em ci- de Autonomia e Flexibilidade Curricular ao abrigo do Despa- tado do concurso de professores, o que trouxe mais alguns áreas do saber, pelo que os alunos são acompanhados e
dadania, pelo que a sua ação se fundamenta numa cultura hu- cho nº 5908/2017, de 5 de julho. Este passo refletia, uma vez constrangimentos. orientados por vários docentes, em simultâneo. Salienta-se a
manística, transdisciplinar e globalizadora de saberes. mais, o compromisso da nossa comunidade educativa com Ao nível das matrizes, no 1º ciclo, criámos uma nova ofer- valorização crescente da metodologia de trabalho de projeto
Na certeza de que a mudança de paradigma não se faz a busca permanente da melhoria do sucesso educativo de ta complementar: Desenvolvimento, Ambiente e Sustentabi- para o desenvolvimento de saberes integrados. Esta forma de
de um dia para o outro, o Agrupamento de Escolas de Azeitão todos os seus alunos. lidade. Na sua génese, esta área curricular é promotora de trabalhar, confere oportunidade aos alunos de participarem
iniciou esta linha de pensamento em 2005, ano da elaboração Em 2018/2019, o resultado da monitorização realizada interdisciplinaridade. O programa está organizado por temas, no planeamento, avaliação e realização de aprendizagens que
do seu primeiro Projeto Educativo enquanto Agrupamento de durante o ano letivo transato, assim como o crescente reco- trabalhados a diferentes níveis de profundidade, consoante o têm sentido para eles, num processo acompanhado e orien-
Escolas. Educar Em Cidadania passou a ser o denominador nhecimento de que a missão da escola é formar cidadãos com ano de escolaridade. O seu propósito final é contribuir para a tado pelos professores.

XVI | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XVII


As Oficinas do 5@bER Sem Fronteiras podem ser di- A avaliação das aprendizagens pressupõe, assim, uma Professor titular acompanha esta atividade e apoia o registo dos
namizadas na sala de aula, na Biblioteca ou noutro espaço, recolha sistemática de informação que envolve os alunos, pro- assuntos, que pode assumir o formato de um jornal de parede.
inclusive para além dos muros, juntando-se grupos de alunos, fessores, pais e encarregados de educação no ajustamento de Trimestralmente, são realizadas reuniões entre a Dire-
da mesma turma ou não, do mesmo ano de escolaridade ou processos e estratégias. ção ou o Coordenador de Estabelecimento e os Delegados e
de anos diferentes. Aprender e avaliar são os dois lados da mesma moeda. Subdelegados. Os professores titulares de turma ou os dire-
O crédito horário foi, ainda, usado para constituir uma tores de turma recolhem previamente as propostas de ques-
“Bolsa”. Esta integra docentes de diferentes áreas do saber a OS ESPAÇOS DA ESCOLA ONDE SE CONSTRÓI tões a debater. A ordem de trabalhos da reunião é definida de
quem foram atribuídos tempos letivos para apoiar e acompa- CONHECIMENTO acordo com este levantamento e posteriormente há uma ata
nhar os alunos nos tempos destinados às Oficinas do 5@bER A reorganização dos espaços reflete a forma como se trabalha elaborada pelos alunos.
Sem Fronteiras. Esta medida proporciona a realização de ati- e constitui um fator preditor de mudança. Urge ir (des)arru- A Associação de Estudantes integra alunos do 5º ao 9º
vidades interdisciplinares, a resolução de questões que envol- mando a sala de aula tradicional, adaptando-a a metodologias ano, com uma representatividade que deve garantir o equilí-
vam conhecimentos específicos e, sobretudo, a compreensão de trabalho cooperativo, de construção partilhada do conhe- brio entre géneros. Apesar de muito jovens dinamizam ativi-
da interligação dos saberes. cimento. Distribuir as mesas em forma de “U”, em ilha ou re- dades que integram o Plano de Atividades do Agrupamento.
A todos os docentes foram atribuídos tempos da com- correndo a mesas redondas promove a criação de ambientes Ao longo do ano, todos os alunos participam na monito-
ponente de trabalho de estabelecimento para implementação educativos, nos quais a interação entre alunos, alunos e pro- rização do Plano de Atividades. Para cada uma das ativida-
de trabalho colaborativo entre pares, que se concretiza numa fessores é valorizada na construção de aprendizagem ativa. A des em que participam, os alunos pronunciam-se, através de
reunião quinzenal da equipa educativa. Nestas reuniões, pre- implementação de rotinas dinâmicas e criativas de discussão, questionários, sobre o interesse e o contributo das mesmas
param-se e concertam-se estratégias para as diferentes fases análise, reflexão beneficiam deste tipo de organização. para as aprendizagens ou para a melhoria do clima de escola.
do processo de aprendizagem, ensino e avaliação. As dinâmicas de aprendizagem que combatem o exercí- Acreditamos que a escola deve ser o chão da democra-
Cada ano de escolaridade tem um coordenador que lide- cio de um papel passivo por parte do aluno têm reflexos natu- cia. A responsabilidade e a autonomia exercidas desde cedo
ra a equipa educativa, cabendo-lhe orientar e acompanhar os rais na qualidade do ambiente escolar, no desenvolvimento de preparam os alunos para virem a desempenhar o seu papel
processos de gestão do currículo nas suas dimensões multi, uma relação saudável com os outros e com os espaços. de cidadãos participativos.
inter e transdisciplinar. Ao coordenador compete, ainda, moni- Assumir uma nova organização dos espaços de aprendi-
torizar, juntamente com a Direção, os resultados educativos e zagem é compreender que ninguém aprende sozinho, de cos- O CAMINHO ESTÁ APENAS INICIADO
promover estratégias de reorientação de percursos que pos- tas viradas para os outros. Instituir e consolidar novas formas de fazer não é um processo
sam responder à diversidade de dificuldades, interesses, moti- O espaço de aprendizagem não se confina a quatro pare- fácil, há que incentivar o trabalho colaborativo, seja nos momen-
vações e expetativas dos alunos. des. A comunidade onde nos inserimos oferece oportunidades tos de planificação, seja através das coadjuvações ou ainda da
de alargar a nossa ação, proporcionando aos alunos experiên- supervisão pedagógica, enquanto processo de co-formação.
APRENDER E AVALIAR COMO PARTES cias vivenciadas numa relação direta com o ambiente e apren- No processo de supervisão, uma vez por período, to-
DO MESMO PROCESSO dizagens contextualizadas, em plena Serra da Arrábida. O dos os docentes são observadores e observados, implicando
Os critérios de avaliação constituem referenciais comuns na desenvolvimento de uma consciência ecológica faz-se através neste processo uma mudança de papéis, confiança, coo-
escola para os anos de escolaridade que se encontram em desta relação direta com o ambiente. O projeto, “Ciências na peração, vontade de aprender e de partilhar. Este ano cen-
flexibilidade. Estes critérios têm em conta o Perfil do Aluno à Nossa Serra”, que resulta de uma parceria com uma instituição trar-se-á nas metodologias de trabalho desenvolvidas, nos
Saída da Escolaridade Obrigatória, as Aprendizagens Essen- local e o apoio da autarquia, permite ampliar as atividades ex- momentos de Oficina do 5@bER Sem Fronteiras, de modo
ciais e as prioridades e opções curriculares que promovem perimentais e está a ganhar um novo fôlego ao mobilizar outras a possibilitar a melhoria das nossas práticas pedagógicas.
a interdisciplinaridade, nomeadamente as desenvolvidas nas áreas do saber. Em conjunto, o trabalho colaborativo, a coadjuvação e a
Oficinas do 5@bER Sem Fronteiras. Aprender para além de quatro paredes permite conciliar o supervisão pedagógica contribuem para uma nova visão de
Neste sentido, a avaliação deve focar-se no processo e uso de novas tecnologias com o simples olhar, toque e cheiro. escola, do papel do professor e da inevitabilidade de mudan-
não no produto final, conduzindo ao aperfeiçoamento do pro- O telemóvel, por exemplo, assume-se como um instrumento ça de práticas pedagógicas. O professor toma consciência
cesso de aprendizagem e de ensino, contribuindo para que os facilitador de aprendizagem. Neste contexto educativo, surgem que tem em suas mãos o poder de se formar e de transfor-
alunos trabalhem autonomamente e sejam responsáveis pela oportunidades para que se desenvolvam as competências do mar a escola num lugar onde todos aprendem, onde cada um
construção do seu conhecimento. Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória. encontra, efetivamente, o seu projeto educativo. Transformar
Este entendimento de avaliação implica redesenhar diver- tem como objetivo responder com sucesso a todos e a cada
sos instrumentos e momentos de avaliação formativa, valori- ESCUTANDO OS ALUNOS um dos nossos alunos.
zando a observação contínua das aprendizagens. A escola deverá constituir-se como um espaço de pertença. O Ao longo destes dois anos de Projeto de Autonomia e
Assumem, por isso, particular importância as apresenta- envolvimento dos alunos no quotidiano da escola, no seu pro- Flexibilidade Curricular, temos enfrentado resistências por
ções orais e escritas, o recurso aos suportes tecnológicos, a cesso educativo é importante para estimular mais e melhores parte de alguns docentes e também de alguns encarregados
recolha de evidências, os relatórios, as questões de aula. Mais aprendizagens, combater a indisciplina e o abandono escolar. de educação. Questionam as mudanças, dizem que sentem,
do que o instrumento, interessa que a correção dos mesmos No sentido de dar voz aos alunos, são proporcionadas, ao lon- por vezes, o chão fugir-lhes. Os momentos de discussão en-
seja orientadora para o aluno saber o que precisa de fazer para go do seu percurso educativo, vivências democráticas. tre os diferentes atores, a partilha de práticas entre docentes,
realizar as aprendizagens. Ao nível do grupo turma, periodicamente realizam-se as- o convite a que todos participem em momentos de reflexão
A diversificação de instrumentos de avaliação, numa sembleias de alunos em que se debatem os problemas da turma têm sido determinantes para combater receios e levar por
perspetiva de regulação e de autorregulação do processo de e se propõem soluções, visando a redução de conflitos, a melho- diante o desejo de fazer mais e melhor escola. A escola pú-
aprendizagem, permitem garantir a equidade, a inclusão. ria dos resultados escolares e sociais. O Diretor de Turma ou o blica onde todos aprendem mais e melhor.

XVIII | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XIX


A autonomia e flexibilidade curricular Intervenientes Funções/Ações Calendarização

no agrupamento de escolas de Alcanena Diretora


Auscultação da comunidade educativa – órgãos de gestão, estruturas intermédias,
alunos, professores, colaboradores, encarregados de educação e parceiros
Julho

Conceção de uma estratégia de comunicação eficaz para os diferentes públicos,


— Ana Cláudia Cohen e José Fradique de modo a clarificar os propósitos e âmbito da PAFC e envolver a comunidade educativa
no desenvolvimento do projeto

Diretora do Agrupamento de Escolas de Alcanena, coordenador da Flexibilidade (Ensino Secundário) no Agrupamento Criação de uma equipa multidisciplinar representativa dos diferentes ciclos, departamentos
de Escolas de Alcanena . Autores do Guia de Autonomia e Flexibilidade Curricular, Raiz Editora e estabelecimentos de ensino do AE para coordenar a implementação do modelo

Tomada de decisão quanto à distribuição do crédito horário – atribuição de horas aos DT

Desenho, ouvida a comunidade, de um plano de capacitação da equipa, Setembro


em particular e dos docentes, em geral

Nomeação dos coordenadores de ano para a flexibilidade

Empowerment da equipa multidisciplinar dos coordenadores PAFC dos Diretores de Turma / Ao longo do ano
A Escola e os professores têm, antecedida de uma reflexão coletiva, no sentido de todos os conselhos de turma

atores se apropriarem dos pressupostos do exercício da auto-


necessariamente, de se reinventar nomia ao nível da gestão flexível do currículo, da qual decorreu
Validação e aprovação de todas as etapas em CP e CG, ouvidas as estruturas intermédias

para superarem, com sucesso, os novos um compromisso alicerçado num processo de corresponsabi- Acompanhamento e disponibilização de recursos de natureza diversificada essenciais à
implementação do projeto
lização plural, na assunção de que o PAFC poderia constituir
desafios. Há que pensar e construir uma oportunidade para:
Escolha do tema central e globalizante Setembro
oportunidades para que os nossos jovens • generalizar, com efetiva integração no currículo, boas prá- Equipa
Multidisciplinar
ticas já recorrentes no AEA; da Flexibilidade
e crianças sejam os protagonistas do seu

Nível organizacional
Investigação de áreas do currículo local passíveis de integração no currículo formal
• promover a melhoria das aprendizagens, objetivando a
processo educativo, de modo a poderem aquisição de conhecimentos (Aprendizagens Essen- Conceção de documentos essenciais para o mapeamento do processo
ciais), o desenvolvimento de competências (Perfil do
incorporar os seus interesses e as suas Aluno) e a valorização de atitudes (Cidadania e Desen- Articulação ente os diversos DT e a diretora Ao longo do ano

necessidades no ambiente escolar. volvimento); Operacionalização global


• valorizar as artes, a ciência, o desporto, as humanidades,
O Agrupamento de Escolas de Alcanena as TIC's, o trabalho experimental; Mapeamento dos projetos no âmbito do AFC do ano que coordena Ao longo do ano
Coordenadores
tem, no âmbito do exercício da Autonomia • desenvolver competências de pesquisa, gestão da infor- de ano
Articulação com os diferentes DT
mação, reflexão, trabalho colaborativo e de comunicação;
e Flexibilidade Curricular, alcançado • privilegiar e generalizar a implementação do trabalho de
Apresentação de propostas de parcerias estruturantes para os diferentes projetos
resultados muito positivos, tanto em projeto, a par de outras metodologias ativas; interdisciplinares
• flexibilizar a concetualização dos espaços (sala de aula
termos processuais como de resultados sem paredes) e dos tempos escolares; Promoção da reflexão focalizada na gestão curricular junto dos diretores de turma

escolares dos alunos. • promover o exercício de uma cidadania ativa, responsá-


Análise de pontos de interseção e articulação entre disciplinas Setembro
vel e inovadora. Departamentos
e Áreas
Disciplinares Averiguação de inclusão das disciplinas em DAC nos diferentes anos de escolaridade
ENQUADRAMENTO FASES E INTERVENIENTES
O Projeto de Autonomia e Flexibilidade Curricular (PAFC) foi, A implementação da AFC foi, assim, assumida como um de- Discussão e tomada de decisão quanto aos instrumentos de avaliação a mobilizar
no ano letivo de 2017/2018, percecionado, logo desde o início, safio para a organização, sendo que a sua operacionalização
pelo Agrupamento de Escolas de Alcanena (AEA) como uma implicou o envolvimento dos stakeholders internos e externos, Mapeamento dos DAC Setembro
Conselhos
oportunidade de mobilização de novas metodologias de ensino numa abordagem ecológica do currículo, assente em estraté- de Turma
Aferição de eixos de articulação entre as várias disciplinas
e de aprendizagem, consubstanciadas no trabalho colaborati- gias de cooperação ativa, multidimensional e plural, no sentido
vo entre docentes, no pressuposto de que a matriz curricular da assunção de um compromisso de, em conjunto, desenvol- Validação do grau de envolvimento de cada disciplina
adotada é potenciadora do sucesso de todas as nossas crian- ver uma estrutura escolar positiva, potenciadora da integração,
ças e alunos. Participaram três turmas do 1º ano (apenas as motivação, bem-estar e sucesso escolar. Foi um desafio plural Elenco das AE a mobilizar para a concretização do projeto
turmas puras) e todas as do 5º, 7º e 10º anos, num total de 427 da comunidade educativa assente num plano de ação multiní-
Definição de critérios para a avaliação das competências transversais
alunos num universo de 1550. vel, mais concretamente com três níveis de atuação – nível da
Com efeito, a implementação deste projeto, ao tempo, organização escolar, nível da família, nível da comunidade – Calendarização das paragens
corporizado pelo Despacho n.º 5907/2017, de 5 de julho, foi nos quais cada ator desempenhou um papel distinto.

XX | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXI


Comunicade Alunos
Intervenientes Funções/Ações Calendarização Escolar
Professores – CT

Equipas Desenvolvimento de projetos interdisciplinares DIRETOR


Parcerias
Educativas DE TURMA/
Articulação horizontal em conselho de turmas MEDIADOR
Encarregados
Dinamização de experiências de team teaching, consubstanciadas em práticas interdisciplinares de educação
Coordenador PAFC
Direção
Estabelecimento de pontos de partida
DT/ACN/Alunos
Contextualização Figura 1. Friso cronológico com a distribuição dos trabalhos desenvolvidos por Figura 2. Importância da figura do Diretor de Turma em todo
todas as turmas envolvidas no PAFC em 2017/2018 no AEA. o processo PAFC.
Motivação
Envolvimento
Nível organizacional

Ao longo do ano
Incentivo
Orientação Áreas Disciplinares, analisaram-se possíveis pontos de inter- Posteriormente, definiram-se critérios comuns para a ava-
Fio condutor seção e de articulação entre as disciplinas e averiguou-se a liação das dimensões de natureza procedimental e atitudinal.
possível inclusão em DAC nos diferentes anos de escolarida- Em cada turma, a coordenação das atividades foi da respon-
Asseguração da ligação ao currículo / às AE
de, de acordo com a temática central. sabilidade do respetivo Diretor de Turma, cabendo às equipas
Levantamento de ideias – pesquisa, investigação, viabilidade, exequibilidade Após o levantamento de ideias junto dos alunos, deu-se educativas o desempenho de um papel mais ativo e de super-
Alunos Decisão sobre o projeto a desenvolver / problema a resolver início à planificação das etapas (problema inicial, processo, visão, com os alunos, na conceção, planificação e execução
produto), aferiram-se eixos de articulação entre as várias dis- das tarefas de cada projeto.
Conceção e planificação do projeto (problema inicial, processo, produtos)
Ao longo do ano ciplinas, validou-se o grau de envolvimento de cada uma no Coube a cada Diretor de Turma promover o levantamento
Distribuição de funções, tarefas e responsabilidades
projeto único da turma e elencaram-se as Aprendizagens Es- de questões; envolver os alunos na apresentação de suges-
Realização de atividades significativas e relevantes, integradas no currículo
senciais (AE) a mobilizar para a sua concretização, com possi- tões para o projeto; contextualizar.
Recolha de evidencias do trabalho realizado e resultados obtidos. bilidade do respetivo aprofundamento e abordagem através de Os Diretores de Turma tiveram um papel crucial em todo
Execução, registo, organização, interpretação, avaliação estratégias baseadas em projetos. o processo, coordenando todo o projeto/trabalho; motivaram,
A operacionalização das diversas fases da metodologia envolveram, orientaram, responsabilizaram, incentivaram, su-
Encarregados Envolvimento dos pais e encarregados de educação em:
de Educação
de trabalho de projeto foi assegurada durante as aulas, regis- pervisionaram. Foram os efetivos mediadores e alinharam to-
Nível da família

∙ Identificação das opções curriculares tando-se um maior desenvolvimento das tarefas nas “pausas” dos os intervenientes no mesmo sentido, assegurando uma
∙ Tomada de decisão ao nível da gestão curricular Ao longo do ano dos horários regulares, prévia e adequadamente, programa- coerência entre o início, o meio e o fim e entre as partes e o
∙ Acompanhamento e envolvimento nos projetos desenvolvidos das em Conselho de Turma, atendendo às especificidades de todo. Com os alunos, asseguraram o fio condutor/continuidade
∙ Participação informada no processo de avaliação dos seus educandos cada projeto. A organização diferente dos tempos de aula, a de todo o trabalho; com os professores do respetivo Conse-
par de uma outra forma de agrupar os alunos tornaram-se cru- lho de Turma, mantiveram funções de coordenação de todas
Parceiros Articulação do currículo à realidade local ciais para concretizar as metas inicialmente estabelecidas e as atividades e fomentaram a articulação horizontal; agilizaram
Nível da comunidade

comunitários
Motivação dos alunos para responder através dos projetos a problemas da comunidade compartilhadas por todos, uma vez que implicaram uma efetiva a comunicação entre todos. Com os Encarregados de Edu-
Partilha de conhecimentos científicos e práticas profissionais Ao longo do ano articulação de ações inter e transdisciplinares, em torno de um cação, apresentaram, no início do ano letivo, o PAFC; esta-
Promoção do empreendedorismo
projeto comum. beleceram pontos de situação sistemáticos e fomentaram um
As disciplinas envolvidas não perderam a sua identidade. espírito de colaboração.
Participação na tomada de decisão ao nível da gestão curricular
Cada uma enriqueceu o seu currículo com opções metodológi- Por seu turno, os coordenadores PAFC asseguraram a
Tabela 1. Elenco dos intervenientes no PAFC e respetivas funções/ações. cas adequadas aos contextos. Não se trabalharam apenas os existência de uma visão geral do PAFC de todo o AEA, neces-
conteúdos comuns às disciplinas, mas, principalmente, procu- sária para a manutenção de uma coerência num todo e para
raram-se formas de integração e mobilização curricular de cada a apresentação eficaz de um produto final global – Feira do
disciplina no projeto único de turma, formas de contribuir para Tempo. Os Diretores de Turma criaram também condições que
O PROJETO turma. Distribuíram-se os subtemas num friso cronológico as diversas fases do trabalho de projeto. permitiram o estabelecimento de contactos com parcerias e de
Para agilizar e promover uma eficaz mobilização de todos os (figura 1) por anos de escolaridade. A cada turma coube Os alunos, por seu turno, assumiram um papel ativo em laços de colaboração, de partilha e de experiências com várias
elementos da comunidade educativa, o grupo de trabalho o desenvolvimento de uma abordagem específica de acor- todo o processo, desde a tomada de decisão até à avaliação do instituições locais e nacionais. A Direção do AEA procurou, na
multidisciplinar, criado para o efeito, propôs, como ponto de do com as características dos respetivos alunos, perfil do próprio progresso, o que potenciou o desenvolvimento de com- senda de uma liderança transformadora, ser facilitadora do tra-
partida, uma temática integradora – “Caminhando ao lon- Conselho de Turma, problemáticas locais ou globais, assim petências de nível elevado, uma vez que a uma maior liberdade balho de todos, uma fonte de inspiração, de suporte e de cola-
go da nossa história”, resultante da interseção do currículo como as expectativas de prosseguimento de estudos dos que é proporcionada aos alunos, corresponde, necessariamen- boração de todo o trabalho desenvolvido.
formal com o currículo local. A constituição dos Domínios alunos (ensino secundário). te, uma maior responsabilidade da sua parte, desenvolvendo No presente ano letivo de 2018/2019, o processo de Auto-
de Articulação Curricular (DAC) teve em conta o nível/ciclo Começou-se, no início do ano letivo, com uma reunião competências fundamentais para a sua vida social, profissional nomia e Flexibilidade Curricular tem seguido as mesmas linhas
de ensino e as opções metodológicas foram delineadas de da Equipa Multidisciplinar da Flexibilidade. Os objetivos eram e do futuro. gerais do PAFC implementado no ano transato. Foi, também,
acordo com as características dos alunos, estabelecendo- a escolha de um tema central e globalizante para todo o Agru- O processo de avaliação, por sua vez, foi integrado no cur- definido um tema aglutinador, o Antropoceno, que constituiu um
-se domínios de abordagens dominantes (histórica; artísti- pamento e preparar a operacionalização global do processo, rículo, valorizando-se as suas dimensões formativa e formadora. ponto de partida para as diversas ações a desenvolver em cada
ca; geológica; económica; geográfica; cultural; científica; antevendo possíveis e potenciais articulações entre disciplinas Os instrumentos de avaliação foram diversificados e os procedi- uma das turmas (apenas os 3º, 4º, 9º e 12º anos de escolaridade
tecnológica...) para o desenvolvimento dos projetos de cada nos diversos anos de escolaridade. Em Departamento e em mentos agilizados com recurso a ferramentas digitais. não estão abrangidos).

XXII | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXIII


Em suma, no AEA a flexibilidade tem vindo a concretizar-se Ao longo do ano a formação dos professores do AEA, em Atendemos aos significados plurais de todos os intervenientes,
a diversos níveis – currículo, opções metodológicas, processo áreas como metodologias ativas, avaliação para as aprendiza- no sentido de facilitar a emergência de inovações e de proces-
de avaliação dos alunos e formas de trabalho colaborativo entre gens e pedagogia de projeto, permitiu desenvolver todo o pro- sos de comunicação eficazes entre os diferentes stakeholders,
docentes. A motivação e o envolvimento de professores e alu- cesso do PAFC com intencionalidade e consistência. Por outro na certeza de que o aprofundamento da qualidade do trabalho
nos são o motor da co-construção de aprendizagens múltiplas, lado, o dispositivo de intervisão / supervisão pedagógica 360º, docente é fundamental para assegurar uma gestão curricular
devendo-se o sucesso da implementação do PAFC, principal- este ano no nosso agrupamento com um desafio acrescido lan- promotora de aprendizagens significativas, na sua diversidade,
mente, ao trabalho articulado entre todos – Direção, equipas de çado aos docentes – a intervisão interdisciplinar – evidenciou, facilitadoras do sucesso para todos os alunos.
coordenação (grupo de trabalho multidisciplinar e coordena- ainda mais, os benefícios dos compromissos inter e transdis-
dores de ano), diretores de turma, docentes e alunos. ciplinares em termos do sucesso das aprendizagens, tendo-se
constituído enquanto processos de colaboração docente opti- BIBLIOGRAFIA
EM SÍNTESE… mizadores das potencialidades de cada um e simultaneamente Agrupamento de Escolas de Alcanena (2018). O PAFC no Agrupamento de
Escolas de Alcanena: uma janela de oportunidades. Noesis – Boletim mensal
Tendo o Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigató- capacidades da toma de decisão partilhada em torno da dife- DGE, n.º 21.
ria como horizonte, e as Aprendizagens Essenciais como re- renciação das respostas pedagógicas, tendo em vista a diversi- Cohen, A.C., & Fradique, J. (2018). Guia da Autonomia e Flexibilidade
ferente, o Agrupamento de Escolas de Alcanena selecionou dade que cada aluno apresenta. Curricular. Lisboa: Raiz Editora.
um tema aglutinador, “Caminhando ao longo da nossa história”, Com a AFC, no AEA, os professores tiveram oportuni-
com uma forte componente do currículo local. dade de:
A aposta na articulação interdisciplinar da História e das Ar- • Experienciar dinâmicas de trabalho estimulantes, interes-
tes levou os alunos do 5º ano a pesquisar e a aprofundar os co- santes, favoráveis à aprendizagem;
nhecimentos dos primeiros povos que habitaram o nosso território. • criar condições atrativas e oportunidades para os alunos
No 7º ano, o trabalho desenvolvido nas Ciências e em aprenderem de forma autónoma e cooperativa;
Geografia permitiu conhecer o carso e o relevo da nossa re- • fugir da rotina;
gião, em parceria com o Centro de Ciência Viva do Alviela. • promover desafios escolares significativos;
O ensino experimental e a resolução de problemas am- • fomentar o empowerment dos alunos.
bientais, contextualizada numa vertente socioeconómica, fo- • mudar a gramática escolar.
ram os desafios do 10º ano, em que a Ciência se aliou às • Introduzir variantes curriculares específicas de âmbito local.
Tecnologias, com a colaboração das Faculdades de Ciências
e Tecnologias da Universidade Nova de Lisboa e da Univer- Ao longo do ano, fizemos um exercício emancipatório
sidade de Coimbra e do Centro Tecnológico das Indústrias impulsionado pela AFC, em consonância com um novo pa-
do Couro. radigma para a educação, este ano generalizado, através da
Criámos novas disciplinas (@rtes; literacia digital; ofici- publicação do Decreto-Lei nº 55/2018, de 6 de julho. Tentá-
na de línguas). Integrámos projetos no currículo (Ilídio Pinho; mos partilhar uma visão ecológica da Escola; promovemos a
Arrisca C; Switch Up; Parlamento dos Jovens; Projeto Rios). reflexividade e a tomada de decisão partilhada, num processo
Para o desenvolvimento dos projetos: negociado e não imposto, próprio de uma cultura de escola
• programámos pausas das atividades letivas, perdendo-se, colaborativa que pretendemos sedimentar em cada momento.
frequentemente, a lógica da turma, agrupando-se os alu-
nos por centros de interesse, orientados por equipas edu-
cativas, numa efetiva articulação inter e transdisciplinar;
• flexibilizámos espaços, numa perspetiva de sala de aula
sem paredes: estas ocorreram no pátio, no centro de
ciência viva, num prado, numa gruta, numa empresa, num
ambiente educativo inovador, num palco;
• flexibilizámos tempos escolares, criámos espaços para
todos os alunos aprenderem num contexto favorável à co-
laboração, onde todos, sem exceção, exploraram e mos-
traram as suas potencialidades;
• Motivámos equipas, mobilizámos os Diretores de Turma,
envolvemos os pais e desenvolvemos parcerias.
• Mostrámos à comunidade o currículo aprendido, sob a
forma da Feira do Tempo, na qual o nosso território foi
mostrado sob várias perspetivas: artística, histórica, geo-
gráfica, geológica, económica, científica e tecnológica.
• Melhorámos os resultados escolares – retenções zero nos 1º
e 2º ciclos; melhoria da taxa global de sucesso (97,8%); me- Figura 3 – Esquema concetual do tema aglutinado do PAFC 2018/2019, do AE
lhoria da taxa de sucesso pleno e da qualidade do sucesso. de Alcanena, e sistematização dos projetos a desenvolver por todas as turmas.

XXIV | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXV


A realidade de um agrupamento centes de todas as áreas e saberes, que de forma voluntária
se disponibilizaram para que, em comunidade de aprendi-
desenvolvimento de projetos, na intervenção multinível de ace-
so ao currículo e na operacionalização da abordagem multinível.

na procura de uma diferenciação


zagem profissional , de partilha de prática pedagógica, se A constituição em junho de 2018 de 4 grupos-núcleo
realizasse um trabalho de investigação, reflexão e ação, assu- dinamizadores, um por cada projeto, permitiu a metodologia
mindo-se como multiplicadores de mudança, ao dinamizaram de pesquisa, e planeamento estratégico, alargada, em julho,

pedagógica, numa prática inclusiva movimentos em rede nos seus departamentos, nos conselhos
de docentes e de turma, visando o desenvolvimento de novas
construções sociais de aprendizagem adequadas à sociedade
pela constituição das equipas educativas de ano reforçadas
pela intervenção dos docentes e técnicos especializados, va-
lorizando as dinâmicas de trabalho pedagógico adequadas
— Célia Barão Guerreiro Almeida e Maria do Carmo Correia do século XXI, substanciadas no espirito do aprender mais e às especificidades da turma e de Cada Um dos Alunos e or-
de modo mais significativo. ganizando um conjunto de respostas flexíveis que permitem o
Diretora do Agrupamento de Escolas Pedro Eanes Lobato e Coordenadora da Equipa Multidisciplinar do mesmo Agrupamento. A participação do Agrupamento no projeto piloto para o acesso ao currículo e potencializa as capacidades de todos
Coordenadora do Grupo de Educação Especial do Agrupamento de Escolas Pedro Eanes Lobato, pedroeaneslobato@gmail.com Novo modelo de mobilização e disponibilização dos apoios os Alunos.
adicionais (promovido pela DGE) desde março de 2017 a A realização das Jornadas Pedagógicas do Agrupa-
julho de 2018, ao proceder à reavaliação da identificação dos mento, organizadas pelos núcleos dinamizadores, permitiu a
níveis de necessidade dos alunos, à reorganização das in- partilha de saberes com todos os docentes do Agrupamento
tervenções especializados, distinguindo as de carácter mais e de outras escolas, das dinâmicas desenvolvidas até aquele
intensivo e de carácter abrangente, foi um facilitador signi- momento e inspirou o início da fase de operacionalização dos
ficativo para que todos os intervenientes educativos redefi- diversos projetos.
nissem dinâmicas de trabalho em contexto de sala de aula. O Centro de Apoio à Aprendizagem (CAA), criado em
Paralelamente o desenvolvimento de dinâmicas com os En- outubro de 2018 e coordenado por uma equipa formada por
carregados de Educação visando sensibilizar para as novas quatro elementos detentores de diferentes saberes e práticas,
linhas orientadoras; a realização de ações formativas “Capa- e organizado, de acordo com as orientações emanadas da
citar para Incluir”, dirigidas a todos os docentes e a sensi- Equipa Multidisciplinar.
bilização ao pessoal não docente permitiu o início de novas Este recurso organizacional permitiu um contínuo de
construções sociais de aprendizagem. respostas educativas subsidiárias às ações desenvolvidas na
A participação neste projeto piloto tornou premente a turma, direcionadas para o reforço das aprendizagens – apoio
O Agrupamento de Escolas Pedro Eanes Lobato desafiado integração no ano letivo 2018/2019 no projeto de Autonomia constituição da Equipa Multidisciplinar de Apoio à Apren- aos alunos nas dificuldades nas diferentes componentes do
há muito pelo contexto de território educativo em que se en- e Flexibilidade Curricular. dizagem e à Inclusão, nomeada pela Diretora do Agrupa- currículo; no enriquecimento curricular (ateliês e oficinas); inte-
contra inserido e operacionalizando, desde 2012, o Progra- A apropriação feita pelo Agrupamento do Perfil dos Alunos à mento em fevereiro de 2018, e coordenado pela própria, an- grando também um conjunto de recursos para apoiar e acom-
ma Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, ali- Saída da Escolaridade Obrigatória, homologado pelo Despa- tecipando o trabalho a realizar em julho de 2018, aquando panhar a implementação de medidas adicionais (metodologias
cerçado nas linhas orientadoras do seu Projeto Educativo, cho n.º 6478/2017, 26 de julho, constituiu-se como o referen- da publicação do Decreto-lei n.º 54, de 6 de julho de 2018, de ensino estruturado, desenvolvimento de competências de
corroborado pelo Projeto de Intervenção da Diretora e im- cial curricular desta entidade, levando-o à definição do perfil do garantindo, desde esse primeiro momento, o processo de autonomia pessoal e social).
buído do espírito emanado das palavras de Santos Guerra aluno à saída do 9º ano, e consequentemente ao planeamento e identificação das barreiras à aprendizagem; a operacionaliza- A mudança de paradigma na abordagem às dificuldades
de que “uma instituição fechada à aprendizagem, hermética operacionalização das áreas de competências, de acordo com ção de uma diversidade de medidas de suporte; o acompa- de aprendizagem, proposta pela Escola Inclusiva, implica a
face às interrogações e alicerçada em rotinas, acabará por o nível etário, escolar e contexto educativo, expresso na defi- nhamento e monitorização da aplicação das mesmas, numa consciência de que tudo isto é urgente, mas não pode ser feito
repetir inevitavelmente os mesmos erros. Jamais aprenderá” nição de um perfil do aluno por ciclo de escolaridade, (do abordagem multinível, integrada e contínua, acautelando o à pressa, requerendo tempo de leitura, de apropriação, de liber-
(2001:11), assume-se como uma escola reflexiva, capaz de pré-escolar ao 9ºano), de forma flexível e sequencial, garantin- percurso escolar de cada aluno. tação de medos e preconceitos, ganhando-se a consciência de
se pensar a si própria, espaço de desafios e partilha de sa- do que o perfil dos alunos seja desenvolvido por todos, ainda O trabalho colaborativo dinamizado pelos próprios do- que os docentes não estão sozinhos na mudança, mas sim em
beres, com vista à procura de respostas que visem a concre- que através de percursos diferenciados. centes permitiu que o conhecimento teórico se alicerçasse equipas educativas, e que é preciso aprender a ousar, a fazer
tização da sua missão: A de proporcionar uma resposta de O documento de Estratégia Nacional de Educação para a ao conhecimento em contexto e que pequenos núcleos natu- acontecer, de modo a que se possa garantir os mecanismos
qualidade à diversidade dos seus públicos, num ambiente Cidadania (ENEC) levou a que o Agrupamento realizasse, um ralmente se tornassem elementos enquadradores e de apoio, de sustentabilidade educativa. Acredita-se absolutamente que
que permita a Todos e a cada um dos alunos, aprendizagens trabalho de definição de valores e de temas de cidadania a de- promotor da força motriz necessária à mudança educacional a exigência da tarefa e as dificuldades encontradas não devem
ricas em significado com vista à promoção de uma vida ver- senvolver, tendo por base, a definição do perfil do aluno por ao proporcionar espaços formativos, reconhecidos pelo Centro fazer desviar do caminho de que a inclusão só é verdadeira se
dadeiramente autónoma. ciclo de escolaridade e o referencial dos valores preconizados de Formação, designadamente a ação “Para o desenvolvimento for feita Com Todos e Para Todos.
Promovendo uma gestão estratégica com base numa li- no Projeto Educativo. de uma Escola Inclusiva”, dirigida, num primeiro momento, aos Tenhamos todos a responsabilidade ética de, com sensi-
derança educacional assente numa cultura participativa e de Esta ação implicou, num primeiro momento, congregar, órgãos de gestão do Agrupamento, e num segundo, aos do- bilidade e sabedoria, ver com os sonhos e fazer acontecer.
responsabilidade, consciente de que a Escola não muda por no seio da equipa de docentes, um espírito de abertura e mo- centes que constituem as equipas educativas do pré-escolar,
decreto, não aceitou participar no desafio de operacionaliza- tivação, num compromisso moral, de empatia pela mudança 1º; 5º e 7º ano de escolaridade.
ção do Despacho n.º 5908/2017, de 5 de julho, em regime de e responsabilidade partilhada, perfeitamente conscientes de Todo este processo levou a que em maio de 2018 o Con- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
experiência pedagógica, da implementação do projeto de au- que como refere Nóvoa, “inovação não se decreta. A inovação selho Pedagógico do Agrupamento aprovasse um modelo NÓVOA, António. A formação tem de passar por aqui: as histórias de vida
tonomia e flexibilidade curricular, tendo optado por desenca- não se impõe. A inovação não é um produto. É um processo. educacional, para o ano letivo 2018/2019, elaborado como no projeto Prosalus. In: NÓVOA, António; FINGER, Matthias (Orgs.) O
método (auto)biográfico e a formação. Lisboa: Ministério da Saúde. Depart.
dear, no ano letivo 2017/2018, um conjunto de mecanismos Uma atitude. É uma maneira de ser e estar na educação que uma resposta objetiva e assertiva à gestão da diversidade dos dos Recursos Humanos da Saúde/Centro de Formação e Aperfeiçoamento
de consolidação da operacionalização do seu Projeto Educa- necessita de tempo.” (1988:8). Num segundo momento, esta seus públicos, assente em quatro projetos tratores, um por Profissional, 1988. p. 107-129.
tivo, preparatórios de um caminho a realizar com vista à sua ação consubstanciou-se na constituição de um núcleo de do- cada ano a intervir, alicerçado no trabalho interdisciplinar, no SANTOS GUERRA, Miguel. A Escola que Aprende, 2001, Edições Asa.

XXVI | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXVII


Desenvolvimento de aprendizagens Projetos desenvolvidos
Temas do 7.º ano de

matemáticas num contexto inclusivo


Matemática

Ser solidário Números e Operações

— práticas no âmbito da autonomia À descoberta de proporções

e flexibilidade curricular
antropométricas

Álgebra / Geometria
Vulcões no planeta Terra

— Sandra Nobre
Conhecer uma empresa local
Agrupamento de Escolas Professor Paula Nogueira – Olhão, Doutorada em Didática da Matemática pelo Instituto
de Educação da Universidade de Lisboa, sandraggnobre@gmail.com
Organização e tratamento de
Nós e os outros
dados

Tabela 1. Projetos desenvolvidos pela turma no âmbito de Matemática,


Ciências Naturais e Físico-Química.

Figura 1. Um cartaz de um grupo de trabalho.

Neste artigo relato parte da minha PAFC reuniram-se quinzenalmente para fazer trabalho de arti- tabela 1 os projetos realizados no âmbito do desenvolvimen-
culação, delineando os projetos a desenvolver, fazendo balan- to das aprendizagens essenciais da disciplina em articulação
experiência enquanto professora ços de outros já desenvolvidos e/ou em desenvolvimento. com outras disciplinas, nomeadamente as Ciências Naturais
de Matemática do 7.º ano no âmbito Foram vários os projetos realizados no âmbito do PAFC e a Físico-química. Os alunos trabalharam na maior parte das
com as turmas. Esses trabalhos foram desenvolvidos nos vezes em grupos de 3 ou 4 alunos sendo que a composição
do Projeto de Autonomia e DAC, nas diferentes disciplinas e em articulação com as várias dos grupos foi variando ao longo do ano.
Flexibilidade Curricular (PAFC), áreas disciplinares.
UM OLHAR SOBRE ALGUNS DOS PROJETOS
durante o ano letivo 2017/18. A TURMA DESENVOLVIDOS
Como professora de Matemática trabalhei com uma das tur- Passo de seguida a exemplificar o trabalho desenvolvido, de
mas onde foi implementado o PAFC. A turma era constituída forma sucinta, em três dos projetos desenvolvidos. Dois des-
A IMPLEMENTAÇÃO DO PAFC por 18 alunos, com três alunos abrangidos pelo Decreto – Lei ses projetos foram desenvolvidos no início do ano letivo e o
Este projeto surge como uma oportunidade para as escolas n.º 3/2008 (necessidades educativas especiais), dois alunos outro quase no final.
autonomamente tomarem decisões acerca da sua organiza- repetentes do 7.º ano e uma aluna vinda de um percurso curri-
ção, tendo em conta as suas prioridades. cular alternativo, sendo que ao todo cinco alunos apresentam PROJETO “SER SOLIDÁRIO”
Para a operacionalização do projeto, o agrupamento de mais de duas retenções. De um modo geral, no início do ano, O primeiro projeto, de cariz solidário, levou os alunos a estu-
escolas onde leciono concebeu uma nova disciplina – Artes os alunos apresentavam bastantes dificuldades na aprendiza- darem as caraterísticas de alguns alimentos como o grão e o
performativas e dois Domínios de Autonomia Curricular (DAC) gem da Matemática e manifestavam um fraco envolvimento na arroz e a sua importância na alimentação. Em grupos, os alu-
– DAC1 (Matemática, Ciências Naturais e Físico-Química) e aprendizagem da disciplina em sala de aula. nos foram estimulados a descobrir o número de bagos de arroz
DAC2 (Português, Artes Performativas e Inglês). Para além Ao longo do ano os professores foram tomando conhe- que um pacote tem, entre outras tarefas. Posteriormente foram
disso alguns tempos de disciplinas eram alternados quinze- cimento das caraterísticas dos alunos e delineando vários desafiados a escrever esses números de forma mais simples,
nalmente, nomeadamente Físico-Química e Ciências Naturais projetos na tentativa de os incentivar para o estudo e para a em notação científica – um conteúdo matemático fundamen-
bem como Educação Visual/TIC com História. Os Conselhos aprendizagem nas diferentes áreas disciplinares. tal para a disciplina de Físico-química. Construíram cartazes
de Turma das duas turmas do 7.º ano onde foi implementado o Relativamente à disciplina de Matemática, apresento na de incentivo à comunidade para a contribuição com bens ali- Figura 2–3. O trabalho dos alunos com o grão.

XXVIII | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXIX


mentares. Ao todo conseguiram angariar cerca de 100 kg de
alimentos que foram entregues ao Banco Alimentar do Algarve
que os fez chegar a várias instituições de solidariedade.

PROJETO “À DESCOBERTA DE PROPORÇÕES


ANTOPROMÉTRICAS”
Neste segundo projeto, os alunos em grupo, após efetuarem
medições aos seus corpos tentaram descobrir relações entre
os vários valores encontrados. Neste trabalho recorreram ao
computador para mais rapidamente conseguirem comparar to-
dos dados recolhidos e estabelecer relações.
Entre outras descobertas, neste trabalho, os alunos veri-
ficaram que a sua altura é muito próxima da envergadura, que
a sua altura também é cerca de quatro vezes a largura dos
ombros e que o antebraço mede aproximadamente o mesmo
que o pé. Na conclusão, os alunos foram incentivados a es-
crever em linguagem algébrica as relações que descobriram,
explicando o seu significado. Por fim, foram depois confronta-
dos com os resultados a propósito das proporções do Homem
Vitruviano (desenhado por Leonardo da Vinci), tendo verificado
que chegaram a resultados idênticos aos descritos.

PROJETO “CONHECER UMA EMPRESA LOCAL”


Este projeto surgiu da identificação da necessidade de que os
alunos, de um modo geral, têm de conhecer melhor a realidade
do seu meio, em particular no campo empresarial. Em sala de Figura 7–8. Construção de tabelas e gráficos na folha de cálculo.

aula, esta ideia foi lançada aos alunos e, através de brainstor-


ming, estes decidiram que gostavam de conhecer melhor uma
empresa conserveira.
mação através de apontamentos, tiraram fotografias, fizeram
1. A definição de objetivos gravações áudio e fizeram ainda várias questões de modo a
Os alunos, em grande grupo, referiram algumas ideias acerca da- tentar recolher os dados necessários e outros aspetos que lhe
quilo que gostariam de estudar, nomeadamente: a evolução do suscitaram dúvidas e/ou curiosidade.
Figura 4–5. Alunos a efetuarem medições e o trabalho com o computador
na folha de cálculo. número de trabalhadores, os tipos de produtos confecionados,
formas de escoamento dos produtos, países de exportação, em- 3. A análise dos dados
balagens utilizadas, conservantes utilizados, entre outros aspetos. Em sala de aula, os alunos analisaram os dados recolhidos Figura 9–10. Ambiente de trabalho em sala de aula
Posteriormente, em pequenos grupos, definiram planos de e construíram o produto final- um vídeo para disponibilizar
trabalho com os aspetos que pretendiam investigar na empresa. num Padlet.
Estes planos de trabalho foram preenchidos como documentos Exemplifico alguns procedimentos dos alunos na análise do número de trabalhadores ter vindo a diminuir nos últimos
partilhados na Drive, o que permitiu dar feedback acerca dos dos dados recolhidos: anos com o surgimento de nova maquinaria, ou a existência de
objetivos do trabalho e, por outro lado, todos os grupos toma- - a medição de algumas das embalagens utilizadas para um maior número de mulheres a trabalhar na sala de produção
rem conhecimento dos trabalhos a desenvolver pelos seus cole- conservas e para patés e o cálculo de áreas de superfície bem devido ao facto das mulheres possuírem mãos mais delicadas
gas, para que não houvesse duplicação de trabalhos. como de volumes (Figura 6). para trabalhar o peixe.
Os dados recolhidos contemplaram muitos outros aspe- Um aspeto fundamental a destacar foi o facto de o traba-
2. A recolha de informação tos, designadamente: o tipo de peixe utilizado na confeção das lho de grupo ter sido sempre marcado pela interdependência.
Após a definição dos objetivos de estudo foi a vez de sairmos da conservas e patés, a não utilização de conservantes confeção, Os elementos de cada grupo de trabalho tinham tarefas distin-
sala de aula e de visitarmos o museu de uma empresa conser- os países de exportação, os materiais constituintes das emba- tas – definidas nos planos de trabalho, sendo simultaneamente
veira de Olhão – A Conserveira do Sul. Nesta visita foi-nos apre- lagens, os hábitos de higiene e segurança dos trabalhadores, corresponsáveis pelo produto final. Na figura 5 é possível ve-
sentado a história de crescimento da empresa, houve a oportu- as diferentes línguas utilizadas na tradução dos rótulos das rificar que os alunos trabalhavam em ambientes distintos, uns
nidade de vermos, através de vídeo, o processo de trabalho da embalagens, a planta da fábrica para cálculo da área total bem nos computadores, outros nas mesas da sala, a realizar outras
fábrica, desde a chegada do peixe à lota, o transporte, a pas- como a área de cada um dos diferentes setores. tarefas igualmente importantes.
sagem pela sala de produção, até ao embalamento para venda. Para além da análise de tabelas e de gráficos construídos, Os vídeos- produto final dos diferentes grupos de traba-
Os alunos munidos dos seus planos de trabalho estive- os alunos ficaram a perceber ouros aspetos relacionados com lho ficou disponível no Padlet www.padlet.com/Sandra_No-
Figura 6. Cálculo de áreas e de volumes das embalagens ram muito atentos a todas as explicações, recolheram a infor- a empresa que inicialmente não tinham previsto, como o facto bre/3x9m7fsxdo87.

XXX | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXXI


“Matemática é muito mais que ficar sentados a fazer contas”.
Outro aspeto também solicitado na reflexão foi que pen-
sassem na mudança de papel da professora neste tipo de au-
las de projeto, em comparação com as aulas com um ensino
mais direto.
De um modo geral, os alunos foram unânimes em afirmar
que a professora teve uma postura mais passiva, com menos
intervenções, tendo-lhes dado mais espaço para trabalharem
sozinhos. Afirmam também que gostaram dessas aulas “as au-
las mais divertidas”.
Analisando o desenvolvimento dos alunos ao longo do
ano, verifico que gradualmente todos eles começaram a estar
mais envolvidos nas aulas, a ter iniciativa, a participar e a ques-
tionar. Embora alguns dos alunos ainda manifestem algumas
Gráfico 1. Respostas Q4.
dificuldades, os alunos passaram a ter uma postura positiva
face à disciplina e a reconhecer-lhe utilidade.

A CONCLUIR
As atuais orientações curriculares vêm incentivar os profes-
sores das diferentes áreas disciplinares a uma cooperação
efetiva, associada a uma gestão curricular sincronizada. A se-
leção de tarefas/projetos que sirvam os propósitos de ensino
e aprendizagem da Matemática e em simultâneo os de outras
áreas disciplinares é um ponto de partida fundamental para
apoiar o processo de aquisição e de construção do conheci-
mento de todos os alunos. No trabalho desenvolvido com esta
turma durante o ano letivo anterior foi possível verificar que
esta seleção foi crucial. As propostas incentivaram um ensino
experimental regularmente, num contexto real, promovendo o
Gráfico 2. Respostas Q5.
envolvimento de todos os alunos. Em qualquer um dos projetos
que apresentei é possível verificar que os alunos assumem o
papel de investigadores, com uma função ativa na construção
do seu conhecimento. Por outro lado, o trabalho colaborativo
Figura 9. Apresentação dos trabalhos aos colegas do 6.º ano.
desenvolvido dentro dos grupos foi igualmente fundamental
não só para o desenvolvimento de aprendizagens essenciais
nas diferentes disciplinas mas também para o desenvolvimento
4. Divulgação do produto final zação deste trabalho mostra que é possível aprender de forma de competências sociais.
A divulgação dos trabalhos realizados foi feita no auditório da diferente. O que mais te impressionou?”. Os alunos maiorita- Nos dias de hoje é fundamental que os professores con-
escola para os Encarregados de Educação e outros professo- riamente respondem que foi a utilização do Movie Maker. tinuem a apostar em metodologias de trabalho inclusivas que
res bem como para alunos de outras turmas do 6.º ano que no Na última parte do questionário em resposta a “ Partilha promovam aprendizagens de caráter interdisciplinar, que po-
próximo ano estariam integrados no PAFC. connosco algo que consideres importante” os alunos reportam tenciem os nossos jovens a dar resposta aos desafios do mun-
ao facto de terem aprendido mais sobre a sua cidade, de terem do atual, a par do desenvolvimento das diferentes áreas de
aprendido Matemática e outras disciplinas de forma diferente, competência definidas no perfil dos alunos.
A reflexão dos alunos de terem trabalhado bastante com o computador, de ter sido
Os alunos tiveram depois a oportunidade de expressar, por um trabalho “sério” que os fez “puxar pela cabeça” e de este
escrito, a sua opinião acerca do projeto desenvolvidos em dois trabalho os levar a pensar nas suas profissões no futuro.
momentos, através de um questionário online e através de uma As reflexões escritas complementaram aquilo que os alu-
reflexão escrita. Destaco algumas das respostas recebidas nos já tinham expressado neste questionário, como apresento
através desse questionário online: na figura 10. Figura 10. Excertos de algumas das reflexões escritas pelos alunos
No gráfico 1 é possível observar as respostas à questão Estas reflexões espelham a liberdade que lhes foi dada
“As aprendizagens realizadas com este projeto…” e verifica- na tomada de decisão relativamente ao estudo desenvolvido,
-se que a maioria dos alunos responde “serão úteis para a ao facto de terem saído da sala de aula, de terem recorrido à
vida futura”. tecnologia digital. Uma das alunas mostra mesmo mudança na
No gráfico 2 apresento as respostas à questão “A reali- conceção do que é a disciplina de Matemática ao afirmar que

XXXII | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXXIII


Avaliação para aprender Esta conceção de avaliação como um processo emi-
nentemente pedagógico cujo mais fundamental propósito é
cessariamente, uma profunda transformação das práticas
pedagógicas escolares. Assim, as escolas e os professores

em contextos de autonomia
apoiar os alunos a aprender mais e, sobretudo, melhor, com enfrentam desafios que exigem a redefinição, a reconstrução
mais compreensão, implica uma estreita articulação entre os e a reinvenção de conceções e práticas que têm prevalecido
processos de aprendizagem, ensino e avaliação. Ou seja, a nos sistemas educativos desde o século XIX. Não é tarefa fá-

e de flexibilidade curricular avaliação é essencialmente orientada para as aprendizagens


e, consequentemente, é tendencialmente contínua. É uma
avaliação de proximidade, isto é, baseada na interação com
cil reposicionar o conhecimento no quotidiano das escolas e
das instituições de educação e formação em geral. Entre as
pressões para a obtenção de resultados a qualquer preço e
— Domingos Fernandes os alunos a propósito das atividades que se desenvolvem no as perspetivas que tendem a ignorar os resultados e a relevân-
decorrer das aulas. É, neste sentido, uma avaliação do dia a cia dos conhecimentos académicos, é necessário encontrar
Professor e Investigador do Instituto da Educação da Universidade de Lisboa dia, destinada a distribuir feedback de elevada qualidade aos um lugar para a lucidez e para novas racionalidades que nos
alunos acerca do trabalho em que estão envolvidos para que ajudem a enfrentar os desafios da educação e da formação
todos aprendam. Nestas condições, a avaliação pedagógica, contemporâneas.
da integral responsabilidade dos professores e que ocorre es- A reinvenção da Escola, entendida simplesmente como
sencialmente no contexto das salas de aula, é, por natureza um um processo que visa a melhoria e o enriquecimento das apren-
processo flexível e inclusivo. dizagens dos alunos, do papel e do desempenho dos profes-
A gestão flexível do currículo tem de ser acompanhada sores e das ações que se desenvolvem no seu seio, é indis-
por uma avaliação com as caraterísticas genéricas que se vêm pensável para que se cumpra um dos seus papéis primordiais:
apresentando e tendo em devida conta aspetos tais como: a) proporcionar uma educação de qualidade a todos e a cada um
a diversificação dos processos de recolha de informação (e.g., dos seus alunos. Desta forma, reinventar a Escola tem a ver
testes, observações, elaboração de ensaios, apresentações com a integração dos jovens cidadãos na sociedade, contri-
orais, resolução de uma diversidade de problemas); b) a parti- buindo para a coesão social. A ideia da reinvenção da Escola
cipação dos alunos e de outros intervenientes nos processos está assim associada a um imperativo ético e moral da educa-
de avaliação; c) a definição clara dos objetos a avaliar; d) a inte- ção: educar e formar cidadãos que possam contribuir de forma
gração da avaliação nos processos de aprendizagem e de en- crítica, consciente, deliberada e inteligente para o bem-estar
sino; e e) a seleção criteriosa das tarefas a propor aos alunos. das pessoas em sociedades genuinamente democráticas.
A avaliação é muitas vezes confundida com a classifica- Dir-se-ia que a melhoria das práticas de avaliação peda-
ção; ou seja, com a atribuição de um número de uma dada es- gógica é um dos mais importantes desafios a enfrentar pelos
cala que, supostamente, mede rigorosamente o que os alunos sistemas educativos contemporâneos. É um duro e difícil com-
sabem e são capazes de fazer. Este é um dos equívocos que bate pedagógico, social e cultural. Tal e qual. Porque tem a ver
mais tem contribuído para que a avaliação seja desviada do seu com a possibilidade real de conseguirmos trazer milhões de
principal propósito: ajudar os alunos e os professores a apren- crianças e de jovens para os indubitáveis benefícios do saber
der e a ensinar melhor! Na verdade, a avaliação não é uma mera e do saber fazer, da cultura, da curiosidade e do fascínio que é
técnica de atribuição de notas aos alunos. Isso é classificação. conhecer e compreender o mundo em que vivemos. É este um
A avaliação é um processo eminentemente pedagógico, que dos caminhos que temos de prosseguir. Temos de ser capazes
obriga a ter em conta questões de natureza ética, política e cur- de centrar mais os nossos esforços e as nossas inteligências
ricular e que deve servir para ajudar os alunos a aprender. na melhoria efetiva das práticas escolares. As sociedades têm
De acordo com os resultados de investigações realizadas de apoiar mais as suas escolas e os seus professores a cum-
nas últimas décadas, a avaliação contribui para que todos os prirem esse desígnio. Trata-se de um imperativo ético e de um
alunos aprendam melhor e com mais profundidade. Mas são dever incontornável. Para que possamos ter sociedades social,
A avaliação para as, e das, são o cerne da organização de todo os alunos provenientes de meios social, cultural e economica- económica e culturalmente mais justas.
aprendizagens tem de estar deliberada o trabalho pedagógico. Perspetivas mente mais deprimidos quem mais beneficia desta avaliação
orientada para melhorar, a chamada avaliação para as aprendi-
e conscientemente orientada para pedagógicas em que a autonomia zagens ou avaliação formativa. Trata-se de uma avaliação que
melhorar e aprofundar o que os alunos é assumida como uma condição está intrinsecamente articulada com os processos de apren-
dizagem e de ensino, é utilizada de forma deliberada, sistemá-
sabem e são capazes de fazer. Este é um indispensável para que o currículo tica e contínua, utilizando uma diversidade de processos de
desafio que tem de ser enfrentado sem possa ser gerido e desenvolvido de forma recolha de informação. Além do mais, os alunos são frequen-
temente chamados a participar, nomeadamente através da au-
tibiezas e que tem de estar fortemente flexível, tendo naturalmente em conta toavaliação, os professores distribuem regularmente feedback
enraizado em perspetivas pedagógicas a diversidade (e.g., social, cultural, a todos os alunos e o seu poder de avaliar é partilhado com
outros intervenientes (e.g., outros professores, pais, alunos).
em que as aprendizagens que todos e económica, étnica) existente nas Como facilmente se conclui, esta é uma avaliação que
cada um dos alunos têm de desenvolver escolas do mundo contemporâneo. exige um significativo empenho profissional pois implica, ne-

XXXIV | DOSSIER — Educação Inclusiva Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXXV


A PRÓ INCLUSÃO — ASSOCIAÇÃO
NACIONAL DE DOCENTES DE
EDUCAÇÃO ESPECIAL, FOI CRIADA
EM JULHO DE 2008 POR UM GRUPO
DE PROFESSORES DE EDUCAÇÃO
ESPECIAL.

COMO ADERIR?

Preencher a Ficha de Adesão e juntar


uma foto tipo passe (p.e. digitalizada)
para emissão do Cartão de Sócio
ou preencher o Formulário de Adesão
no website da associação.
SÃO OBJETIVOS DA ASSOCIAÇÃO:
a) Valorizar a profissão, promovendo os valores da Inclusão, o conhecimento Efetuar o pagamento de adesão
e a competência de docentes comprometidos com o seu próprio desenvolvimento profissional. no valor de 35,00€ (inclui cotas do
ano em curso, revista profissional e
b) Promover a comunicação e a cooperação entre os docentes de Educação Especial, desconto nas iniciativas da associação)
favorecendo a identidade associativa e sentimento de pertença. através de transferência bancária (IBAN:
c) Promover a formação, informação, conhecimento e troca de saberes, dos docentes PT50.0036.0106.99100042329.74
de Educação Especial, através de publicações, reuniões científicas, formação e divulgação Montepio) ou subscrever a anuidade através
de todo o tipo de iniciativas neste âmbito. do PayPal.

d) Colaborar na elaboração e divulgação de materiais, técnicas, procedimentos e recursos, Enviar comprovativo de transferência,
de forma a qualificar o exercício da profissão. devidamente identificado, para o e-mail
proandee@gmail.com.
e) Estimular a investigação científica na área das Necessidades Educativas Especiais
e promover a fundamentação das práticas e decisões, com base no conhecimento.
Para renovar a Cota anual, deve enviar
f) Desenvolver projetos e ações conjuntas com associações similares, nacionais o comprovativo de transferência bancária
e internacionais. do valor da cota ou, na data devida, autorizar
o pagamento da subscrição (Paypal).
g) Promover a colaboração com outros grupos profissionais do setor, bem como com
outras organizações da comunidade, nomeadamente associações de pais.
h) Promover os valores da afirmação pessoal e da valorização das capacidades, pela positiva, Contactos:
da pessoa com Necessidades Especiais, na defesa dos seus direitos e cidadania. Avenida Jorge Peixinho, 30
Quinta da Arreinela
i) Promover a cooperação institucional, nomeadamente através de protocolos e parcerias, 2805-059 Almada — Portugal
Tm: (00351) 927138331 / (00351) 964502105
com organismos públicos e privados, no âmbito da consultadoria, assistência e informação proandee@gmail.com
técnica e científica, participando como parceiros sociais. www.proandee.weebly.com

Ficha de Adesão
Nome: Data de Nascimento: / /

Morada: Localidade:

Código Postal: – Telefone: E-mail:

CC: Data de Validade: / / NIF:

IBAN: Formação Académica:

Formação Especializada:

Área de Especialização:

Escolas/Agrupamento de Escolas:

XXXVI | DOSSIER — Educação Inclusiva Outra situação: Vol. 9 Nº2 — Dezembro 2018 | XXXVII
Aponte na sua agenda!

VI Congresso
Internacional
da Pró-Inclusão
4, 5 e 6 de julho — 2019
Na cidade do Porto
Mais detalhes, em janeiro,
no nosso site!
Contamos consigo!

www.proandee.weebly.com

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