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A IFRS 9 cria novos desafios para as empresas


31 Maio 2019
Os novos requerimentos contábeis para instrumentos financeiros
impactam todas as empresas, não apenas os bancos.

A IFRS 9 Instrumentos Financeiros (CPC 48) não é aplicável


apenas aos bancos. Muitas empresas estão fechando neste
momento suas primeiras demonstrações financeiras anuais após
a adoção da IFRS 9 (CPC 48). Neste contexto, dois aspectos
podem ser bastante desafiadores:
Determinar a base de mensuração apropriada para ativos
requer mais julgamento. Além disso, certos ativos financeiros
que antes eram mensurados ao custo amortizado passam a
ser mensurados ao valor justo, sendo que nem sempre
existem preços observáveis disponíveis para sua mensuração.
A mensuração da redução no valor recuperável (impairment)
dos ativos financeiros muda de um modelo de perda de crédito
incorrida para um modelo de perda de crédito esperada. Isso
significa que provisões para perdas de crédito com recebíveis
e ativos contratuais podem requerer projeções de dados
econômicos futuros mais robustas.

A IFRS 9 (CPC 48) é efetiva para períodos anuais iniciados a partir de


1º de janeiro de 2018¹ e é aplicável a empresas de todos os setores. A
IFRS 9 (CPC 48) introduz mudanças importantes para a maior parte das
empresas. Se de um lado o impacto da norma sobre as instituições
financeiras tem sido altamente divulgado, de outro lado, o impacto
sobre as empresas não financeiras não tem recebido a mesma
atenção. Em nosso artigo IFRS and US GAAP long awaited changes to
hedge accounting apresentamos uma reflexão sobre os impactos dos
novos requisitos relacionados à contabilidade de hedge. Neste artigo,
concentramo-nos nas questões relacionadas à classificação,
mensuração e impairment, que são pertinentes para empresas não
financeiras.
A IFRS 9 (CPC 48) é uma norma contábil abrangente, que exige uma
combinação de julgamento por parte da administração e de cálculos
complexos, que podem exigir uma intensa mudança de modelo nos
processos chave, envolvendo diversas funções dentro da organização.
Como parte do processo de atualização das rotinas contábeis para
classificação, mensuração e impairment de ativos financeiros, as
empresas também devem considerar a disponibilidade de dados,
divulgações adicionais e outros processos financeiros a partir da data
da adoção inicial. Isso geralmente implica também uma atualização
sistêmica. É preciso que as empresas não financeiras considerem as
seguintes ações, dentre outras:
Necessidades de negócio da área contábil e de outros usuários das
demonstrações financeiras;
Adaptação do processo de elaboração das demonstrações
financeiras e dos controles internos relacionados para atender aos
novos requisitos de divulgação;
Disponibilidade e armazenamento dos dados e estratégia para
migração de sistemas;
Arquitetura de sistemas e possíveis restrições;
Controles internos relacionados aos relatórios financeiros; e
Cálculos de impostos.

Classificação e mensuração
A nova norma altera a maneira como os ativos financeiros são
classificados no balanço patrimonial e estabelece as seguintes
categorias:
Ativos financeiros mensurados ao custo amortizado;
Ativos financeiros mensurados ao valor justo por meio de outros
resultados abrangentes (VJORA); e
Ativos financeiros mensurados a valor justo por meio do resultado
(VJR).
As categorias de mensuração da IAS 39 Instrumentos Financeiros:
Reconhecimento e Mensuração (CPC 38) para títulos mantidos até o
vencimento, empréstimos recebíveis e disponível para venda foram
eliminadas.
Para investimentos em instrumentos patrimoniais que não são
consolidados nem contabilizados pelo método da equivalência
patrimonial, a IFRS 9 (CPC 48) altera a sua classificação e
mensuração. De acordo com a IAS 39 (CPC 38), os investimentos em
instrumentos patrimoniais eram classificados como (i) disponíveis para
venda e avaliados pelo VJORA ou (ii) como mantidos para negociação,
sendo mensurados ao VJR. Havia também uma isenção que permitia às
empresas mensurar os instrumentos patrimoniais a custo, em
circunstâncias limitadas.
O IFRS 9 (CPC 48) exige que as empresas mensurem investimentos
em instrumentos patrimoniais ao VJR, mas oferece a opção de
mensurá-los no VJORA, se esses não forem mantidos para
negociação. Isso significa que o custo não é mais uma base de
mensuração aceitável. A opção de VJORA para instrumentos
patrimoniais pode ser útil para empresas que buscam evitar a
volatilidade no resultado. Entretanto, existem algumas desvantagens,
por exemplo, os ganhos ou perdas do investimento são registrados em
outros resultados abrangentes e nunca mais serão reclassificados para
o resultado.
Para investimentos em instrumentos de dívida, a IFRS 9 (CPC 48)
introduz uma análise de duas etapas para determinar a categoria
apropriada para sua classificação e mensuração.
1) Avaliação de “Somente Não VJR
P&J”:
Os fluxos de caixa do ativo
financeiro são compostos
exclusivamente por Sim Vá para o
pagamentos de principal e passo 2
juros (Somente P&J)?

2) Avaliação do modelo de
negócio:
O objetivo do modelo de Coletar os fluxos de Custo
negócios é manter ativos caixa contratuais amortizado
financeiros para…

Tanto coletar os fluxos VJORA


de caixa contratuais
como vender os ativos
financeiros

Outro modelo de VJR


negócio

A aplicação do critério de Somente P&J e a avaliação do modelo de


negócio exigem julgamento da administração e, portanto, novos
processos, controles e documentação robusta para dar suporte às
conclusões da classificação.

Observação KPMG
A aplicação mais recorrente do valor justo como base de mensuração
na aplicação da IFRS 9 (CPC 48) em comparação com a IAS 39
(CPC 38) é o maior desafio operacional para empresas que possuem
carteiras de títulos de dívida e/ou títulos patrimoniais. Historicamente,
as empresas não financeiras nem sempre tem processos
estabelecidos para determinar o valor justo de títulos não
negociados. Essas empresas terão possivelmente que criar novos
processos e capturar novos dados para aplicar a mensuração do
valor justo de acordo com a IFRS 13 Mensuração do Valor Justo
(CPC 46).
Avaliações anteriores sobre derivativos embutidos em ativos
financeiros também precisam ser revistas. De acordo com a IAS 39
(CPC 38), um derivativo embutido era separado do contrato principal
quando as características econômicas e riscos do derivativo embutido
não estavam altamente relacionados aos do contrato principal. Ao
contrário da IAS 39 (CPC 38), os derivativos embutidos cujo contrato
principal é um ativo financeiro não são separados do contrato principal
de acordo com a IFRS 9 (CPC 48). Ao invés disso, o contrato inteiro,
composto pelo contrato principal e pelos derivativos embutidos, é
avaliado como uma única unidade de contabilização. Na maioria dos
casos, isso significa que ele não atende ao critério de Somente P&J e,
portanto, é mensurado ao VJR como um todo.

Exemplo - Título conversível em ações


A Companhia possui um investimento em um título conversível em
ações emitido pela Companhia B, o que dá à Companhia A a opção
de conversão em um número fixo de ações da Companhia B. De
acordo com a IAS 39 (CPC 38), como a opção de conversão
embutida não está intimamente relacionada ao contrato de dívida, o
título conversível era bifurcado em um contrato principal (mensurado
pelo custo amortizado) e uma opção de conversão em ações
(mensurada ao VJR).
Agora, de acordo com a IFRS 9 (CPC 48), o título conversível é
avaliado como uma unidade de contabilização única. Como os termos
contratuais do instrumento não dão origem apenas a pagamentos de
principal e juros sobre o valor principal do título, ele não atende ao
critério de “somente P&J” e é mensurado ao VJR.

As mudanças nos modelos de classificação e mensuração também


afetam a forma como os ativos financeiros são apresentados no
balanço patrimonial. A terminologia da IAS 39 (CPC 38) ficou obsoleta e
a nova linguagem da IFRS 9 (CPC 48) precisa ser incorporada às
práticas de elaboração das demonstrações financeiras das empresas.
A IFRS 9 (CPC 48) também alterou a IFRS 7 Instrumentos Financeiros:
Evidenciação (CPC 40) para introduzir novos requisitos de divulgação.

Perdas de crédito esperadas


A IFRS 9 (CPC 48) possui um único modelo de perda de crédito
esperada aplicável a todos os ativos financeiros mensurados ao custo
amortizado e instrumentos de dívida mensurados a VJORA, com
algumas simplificações para recebíveis comerciais, ativos contratuais e
recebíveis de arrendamento.
O modelo de perdas de crédito esperadas difere significativamente do
modelo de perda incorrida da IAS 39 (CPC 38), uma vez que não é mais
necessário que um evento de perda ocorra para que o impairment seja
reconhecido. Em outras palavras, não precisa mais haver um evento de
perda para iniciar-se o seu reconhecimento, ou seja, não é mais
apropriado esperar que um cliente fique inadimplente (ou haja outra
evidência de perda) para registrar uma provisão para perda. Sob o
modelo de perdas de crédito esperadas, as empresas tendem a
registrar provisões para perdas mais cedo, em montantes maiores e
mais voláteis em relação às que eram reconhecidas anteriormente.
Nas empresas não financeiras muitos ativos financeiros podem ser
impactados pela IFRS 9 (CPC 48).

Ativo financeiro Abordagem de perdas


esperadas

• Recebíveis comerciais e ativos Abordagem simplificada


contratuais sem componente
significativo de financiamento

• Recebíveis comerciais e ativos Abordagem simplificada ou


contratuais com componente de abordagem geral
financiamento significativo

• Recebíveis de arrendamento

• Investimentos em títulos de dívida Abordagem geral


mensurados pelo custo amortizado ou
a VJORA

• Empréstimos concedidos mensurados


pelo custo amortizado ou a VJORA

Abordagem geral
De acordo com a abordagem geral, a provisão para perdas de crédito
de um instrumento financeiro é inicialmente mensurada com base nas
perdas esperadas para os próximos 12 meses. No entanto, se na data
do balanço o risco de crédito do instrumento financeiro tiver aumentado
significativamente desde o reconhecimento inicial, a provisão para
perdas baseia-se em perdas de crédito esperadas para a vida inteira
do contrato. Se, em um exercício subsequente, o risco de crédito
determinado não mais apresentar um aumento significativo desde o
reconhecimento inicial, a provisão para perda volta a ser mensurada
com base nas perdas de crédito esperadas para 12 meses naquele
período subsequente.

Abordagem simplificada
Para recebíveis comerciais e ativos contratuais sem componente de
financiamento significativo, a IFRS 9 (CPC 48) permite uma abordagem
simplificada usando a mensuração da perdas de crédito esperadas pela
vida inteira, independentemente de ter sido observado um aumento
significativo no risco de crédito. Embora a IFRS 9 (CPC 48) exija o
desconto das perdas esperadas para considerar o valor do dinheiro no
tempo, no caso de recebíveis comerciais e ativos contratuais sem
componente de financiamento significativo de curto prazo, pode ser
possível concluir que o efeito do desconto não é material.
Para recebíveis comerciais ou ativos contratuais com um componente
de financiamento significativo e para recebíveis de arrendamento, as
empresas podem optar por aplicar a abordagem simplificada ou
abordagem geral para mensuração das perdas de crédito esperadas. A
abordagem simplificada é menos complexa, mas pode resultar em um
valor mais elevado de perdas de crédito esperadas na maioria das
circunstâncias. Além disso, as perdas de crédito esperadas de tais
ativos devem ser descontadas usando a taxa de juros efetiva original
do instrumento.

Matriz de provisão
A IFRS 9 fornece um expediente prático de mensuração de risco de
crédito na forma de uma matriz de provisão². A matriz de provisão leva
em consideração os saldos históricos dos recebíveis comerciais ao
longo de um determinado período de tempo, segregados com base nas
características de risco de crédito, e divididos em categorias de
inadimplência - por exemplo: em dia, até 30 dias em atraso, entre 31-60
dias em atraso e assim por diante.
Usando os dados históricos é possível determinar a taxa pela qual os
devedores passam para uma categoria com maior risco de
inadimplência ao longo do tempo e, em seguida, usando a multiplicação
de matrizes, determinar uma taxa de perda para cada categoria de
inadimplência.
As taxas de perda histórica identificadas devem ser ajustadas para
refletir as condições atuais e também as condições econômicas futuras
ao longo da vida remanescente dos recebíveis comerciais, utilizando
para isto projeções “razoáveis e suportáveis”. Estas taxas de perda
são então aplicadas ao saldo de contas a receber em aberto, por
categoria de inadimplência, para determinar a provisão para perdas de
crédito esperadas.
Essa abordagem pode parecer semelhante ao que já é feito na maioria
das empresas quando calculam suas provisões para perdas de crédito
conforme IAS 39 (CPC 38). No entanto, a IFRS 9 (CPC 48) requer que
as taxas de perda reflitam informações relevantes, razoáveis e
suportáveis sobre as expectativas futuras que influenciam a perda
esperada. Desta maneira, as provisões para perdas de crédito
estimadas segundo a IFRS 9 (CPC 48) tendem a ser maiores do que a
abordagem de perda incorrida anteriormente utilizada.

O quadro abaixo apresenta um exemplo ilustrativo de matriz de


provisão:

Categoria de Taxa de Recebíveis Provisão


inadimplência perda comerciais para
perdas
esperadas

Em dia 3,0% 15.000 45


1-30 dias em 1,6% 7.500 120
atraso
31-60 dias em 3,6% 4.000 144
atraso
61-90 dias em 6,6% 2.500 165
atraso
Acima de 90 10,6% 1.000 106
dias em atraso
Total 30.000 580

A matriz de provisão é uma maneira eficaz de estimar perdas de crédito


esperadas de maneira consiste período a período. Ela tende a ser
bastante útil para empresas com um alto volume de vendas e, portanto,
saldo relevante de recebíveis comerciais. No entanto, as empresas
devem agrupar de maneira apropriada os recebíveis comerciais com
base em características de risco de crédito (por exemplo, geografia ou
rating de crédito devedor) e determinar taxas de perda para cada
grupo.
Entretanto, este método pode não ser apropriado para empresas com
padrões de receita altamente sazonais, sendo necessário recorrer a
outros métodos. Isso ocorre porque os recebíveis comerciais podem
não seguir um padrão ou podem atingir um volume muito acima da
média em determinados momentos durante o ano fiscal. O uso de uma
matriz de provisão em tais casos poderia resultar em taxas de perda
que não são adequadas para a mensuração de perdas de crédito
esperadas.
Indiscutivelmente, o aspecto mais desafiador da aplicação das perdas
de crédito esperadas da IFRS 9 (CPC 48) aos recebíveis comerciais
são as projeções razoáveis e suportáveis das condições econômicas
futuras e como integrá-las ao cálculo. Esta estimativa prospectiva deve
levar em conta mudanças nas condições macroeconômicas que afetam
a capacidade dos devedores de continuar pagando.

Observação KPMG
Para muitas empresas, a falta de experiência na projeção ou uso de
dados econômicos na estimativa de perdas implica a necessidade de
uma curva de aprendizado para incorporá-las à mensuração da perda
esperada. A maioria das empresas não tem a prerrogativa de ter um
economista interno e, portanto, contratou serviços externos para
obter projeções de dados macroeconômicos. Isso cria dados
adicionais para a elaboração de estimativas financeiras que devem
estar sujeitos a seus processos de controle interno.

Outros ativos financeiros


Outros ativos financeiros mensurados ao custo amortizado, como
empréstimo concedidos, títulos de dívida (por exemplo, títulos privados,
títulos públicos) ou contratos de garantia financeira emitidos, também
exigem reconhecimento de impairment segundo o modelo de perda
esperada. Para esses, a abordagem simplificada não está disponível.
Isso traz uma complexidade adicional à modelagem, devido à
necessidade de gerenciar migrações de ativos entre os intervalos de
medição de 12 meses e a vida inteira do instrumento.
Os ativos no escopo do impairment da IFRS 9 (CPC 48) que tinham
uma provisão zero de perda de crédito de acordo com a IAS 39 (CPC
38) porque não haviam apresentado "evidência objetiva de perda"
podem ter alguma provisão de acordo com a IFRS 9 (CPC 48). Esta é
uma mudança importante porque a inexistência de um histórico de
perdas não pode ser usada como a única base para concluir que a
perda de crédito esperada para um ativo financeiro mensurado pelo
custo amortizado é zero.
Para considerações relacionadas a US GAAP, leia nossa publicação
IFRS compared to US GAAP.
Autores
Tiago S. Bernert, Roland Kuerzi, André M. Tristão, Luciana T. de Lima
1. A IFRS 9 Instrumentos Financeiros (CPC 48) é efetiva para
períodos anuais iniciados após 1º de janeiro de 2018. As empresas
podem optar por adiar a aplicação do novo modelo de hedge
accounting até que o projeto de macro hedge do IASB esteja completo.
As seguradoras podem optar por adotar a IFRS 9 (CPC 48) em sua
totalidade até que a IFRS 17 Contratos de Seguro seja efetiva.
2. A abordagem da matriz de provisão deve seguir os princípios
descritos no parágrafo IFRS 9.5.5.17 (CPC 48.5.5.17).
As informações aqui contidas são de natureza geral e não têm a
intenção de abordar as circunstâncias de qualquer indivíduo ou
entidade em particular. Embora nos esforcemos para fornecer
informações precisas e oportunas, não podemos garantir que tais
informações sejam precisas na data em que são recebidas ou que
continuarão a ser precisas no futuro. Ninguém deve agir com base
nessas informações sem o devido aconselhamento profissional após
uma análise aprofundada da situação específica.
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