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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E DA SAÚDE

CURSO DE PSICOLOGIA

Roberta Del Grande de Souza

A autoestima de mulheres jovens e a relação mãe-filha: um estudo psicanalítico

SÃO PAULO

2021
ROBERTA DEL GRANDE DE SOUZA

A autoestima de mulheres jovens e a relação mãe-filha: um estudo psicanalítico

Trabalho realizado como exigência da disciplina Trabalho


de Conclusão de Curso II, do curso de Psicologia da
Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo.

Orientadora: Prof.a Dra. Fátima Regina Pires de Assis

SÃO PAULO
2021
Agradecimentos

Vislumbrando agora o meu futuro como psicóloga, é imprescindível agradecer àqueles


que tiveram um papel imensurável neste processo. Agradeço a minha família, pelo constante e
incondicional apoio em todos os caminhos que escolhi seguir. Aos meus pais, João e Lucila,
meu lar. Não sei expressar o quanto os agradeço, admiro e amo. Ao meu irmão Renato, amado
e eterno oposto, com quem construí a mais sincera amizade da minha vida.
Aos meus avós, Renato e Maria Cecília, pelo carinho e afeto que sempre me nutriram.
A companhia de vocês é uma verdadeira alegria. Em memória de Terezina, que tenho certeza
que acompanha e ilumina cada passo da minha trajetória. Em memória de José Lucas: sua
coleção de livros de Sigmund Freud estampará as paredes do meu consultório.
À Giulia, minha companheira de graduação desde o primeiro dia de Pontifícia. Obrigada
pela nossa jornada e por tudo que construímos juntas. Nossa amizade foi um alicerce tanto na
minha graduação quanto na minha vida.
À Júlia, a pessoa mais acolhedora que já conheci. Sua amizade foi um verdadeiro
presente para mim. Te admiro em todos os âmbitos possíveis e imagináveis. Agradeço sua
companhia e seu constante apoio. Não vejo a hora de ter sua presença novamente.
À Rachel e ao vínculo extremamente bonito que fizemos nos últimos tempos. Nossa
sintonia e afeto é de imenso protagonismo em minha vida. Não achei que encontraria, em
tempos tão indigestos, alguém que me entendesse tanto. Tenho uma enorme certeza de que
sempre estaremos lado a lado. Te amo mais do que sei expressar. Obrigada por tanto.
À Letícia e Anaíse, as companhias mais engraçadas dos meus intervalos. À Patrícia,
Lara e Maria Luiza. Vocês sempre serão meu porto seguro. Ao Pedro, e seu incansável incentivo
em tudo que eu faço. Obrigada pela companhia e escuta diária.
Ao Gian Luca, não só por me ensinar as particularidades de estatística necessárias no
desenvolvimento deste trabalho, mas também por me incentivar a ser sempre a minha melhor
versão. Você me faz bem.
Às participantes deste estudo, pela imensa confiança em compartilhar conteúdos tão
íntimos de forma tão espontânea. Muito obrigada.
Agradeço à minha orientadora, professora Fátima Regina Pires de Assis. Obrigada pela
disponibilidade, ajuda e apoio. Agradeço toda a segurança e o acolhimento que me deu neste
processo.
Agradeço todos os meus professores, em especial o professor Claudinei Affonso, pela
disponibilidade de me oferecer um parecer neste trabalho e, acima disto, por fazer meus olhos
brilharem com a Psicologia.
À Pontifícia Universidade Católica, por me formar não só como psicóloga, mas como
pessoa. Obrigada pela transformação.
Área do conhecimento: 7.07.00.00-1 – Psicologia
Título: A autoestima de mulheres jovens e a relação mãe-filha: um estudo psicanalítico
Ano: 2021
Orientanda: Roberta Del Grande de Souza
Orientadora: Prof.ª. Dra. Fátima Regina Pires de Assis

RESUMO

A autoestima pode ser definida como o conjunto de sentimentos e pensamentos de um indivíduo


em relação ao seu próprio valor (ROSENBERG, 1965). Neste contexto, dentro da premissa
psicanalítica da importância da função materna na constituição psíquica, o presente estudo teve
como objetivo investigar a relação entre a autoestima da mulher jovem e o relacionamento desta
com sua mãe. Para tal, o estudo contou com uma primeira fase com 131 participantes em que
foi aplicada a Escala de Autoestima de Rosenberg (1965) e um questionário que investigou
características a respeito da relação mãe-filha. Na segunda fase da pesquisa, uma amostra
reduzida de 10 participantes respondeu uma entrevista semi-dirigida que permitiu maior
profundidade acerca do relacionamento entre a participante e a mãe. Ambas as fases foram
coletadas de maneira online. Os dados foram analisados para criar a discussão e as conclusões
a respeito da relação entre a autoestima e a relação mãe-filha em mulheres jovens, dentro do
referencial teórico da Psicanálise. Os resultados apontam que existe uma relação entre o
relacionamento mãe-filha e a autoestima da mulher jovem. Ademais, essa influência é
enunciada diretamente pelas participantes.

PALAVRAS-CHAVE: Psicanálise, Função Materna, Autoestima, Relação mãe-filha.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 7
1.1 Autoestima....................................................................................................................... 7
1.2 Autoestima na psicanálise .............................................................................................. 8
1.3 A importância materna na constituição psíquica ...................................................... 10
1.4 A especificidade da relação mãe e filha ...................................................................... 11
2 OBJETIVO .......................................................................................................................... 14
3 MÉTODO ............................................................................................................................. 15
3.1 Participantes ................................................................................................................. 15
3.2. Local.............................................................................................................................. 15
3.3 Instrumentos ................................................................................................................. 15
3.4 Procedimento de coleta ................................................................................................ 16
3.5 Procedimento de análise............................................................................................... 17
4. Resultados e Discussão ....................................................................................................... 18
4.1 Primeira fase ................................................................................................................. 18
4.1.1. Contextualização da amostra ................................................................................. 18
4.1.2 Escala de autoestima Rosenberg ............................................................................. 19
4.1.3 Relação Materna ..................................................................................................... 20
4.1.4 Identificação: considerar ou não a mãe como modelo ........................................... 22
4.1.5 Autoestima ............................................................................................................... 23
4.2 Segunda Fase ................................................................................................................. 25
4.2.1 Autocrítica, valorização e expectativa materna ...................................................... 29
4.2.2 Separação eu e outro ............................................................................................... 36
4.2.3. Adolescência ........................................................................................................... 41
4.2.5. Escuta e comunicação ............................................................................................ 45
4.2.4. Beleza: estética, corpo e aparência física .............................................................. 49
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 56
6. REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 57
7. APÊNDICE A ................................................................................................................. 62
8. APÊNDICE B.................................................................................................................. 64
9. APÊNDICE C ................................................................................................................. 71
7

1 INTRODUÇÃO

1.1 Autoestima

A autoestima é, atualmente, um termo muito empregado e já pertencente ao senso


comum. Entretanto, não existe ainda um consenso científico de sua definição. Hoje, a
autoestima é considerada um fenômeno de interesse das mais diversas áreas do
conhecimento, que a teorizam de forma multidimensional e com perspectivas distintas
(PEREIRA, 2019). Considerando a etimologia da palavra, temos “auto”, como o sentido
de si mesmo e “estima” como afeição, amor. Assim, autoestima seria a afeição por si
mesmo (TUCHERMAN, 2019). Criador da escala de autoestima mais utilizada em
artigos científicos atualmente (DONNELAN, TRZENSNIEWSKI, ROBINS, 2015), que
foi aplicada no presente estudo, Morris Rosenberg (1965) criou uma definição mais
complexa de autoestima. Segundo este, a autoestima é definida como “um conjunto de
sentimentos e pensamentos do indivíduo em relação ao seu próprio valor, competência,
confiança, adequação e capacidade para enfrentar desafios, que repercute em uma atitude
positiva ou negativa em relação a si mesmo”.

A autoestima é definida também como gostar de si na totalidade de suas


características, sendo capaz de reconhecer os próprios valores, atributos, qualidades e
competências, preservando a capacidade de reconhecer, tolerar, aceitar e tentar lidar com
as incompetências, falhas e características que não aprecia em si (TUCHERMAN, 2019).
Uma boa autoestima, portanto, não implica em uma atitude em que o indivíduo se enxerga
como melhor que os demais ou livre de defeitos. Assim:

Quando falamos de alta autoestima, então, simplesmente queremos dizer que


o indivíduo respeita a si mesmo, considera-se digno; não se considera,
necessariamente, melhor que os outros, mas, definitivamente, não se considera
pior; não acha que é o máximo em perfeição, mas, ao contrário, reconhece suas
limitações e espera crescer e melhorar. A baixa autoestima, por outro lado,
implica autorrejeição, autoinsatisfação, autodesprezo. O indivíduo não tem
respeito pelo eu que ele observa. A autoimagem é desagradável e o indivíduo
gostaria que esta fosse diferente (ROSENBERG, 1965, p. 31, tradução de
Jefferson Luiz Pereira, 2019)
8

Pode-se dizer então, que a autoestima seria o resultado da relação entre a realidade
do indivíduo e suas supostas potencialidades (PEREIRA, 2019). Diz respeito, portanto, a
maneira com que o indivíduo estabelece relação entre suas possibilidades e competências
e a atitude que sustenta perante a tais aspectos. Dessa forma, é imprescindível ao bem-
estar e a saúde mental uma autoestima satisfatória e qualquer alteração nesta implica em
consequências extremamente negativas na vida do indivíduo, inclusive na maneira com
que se relaciona com o ambiente e os outros:

Quando há alteração da autoestima, a imagem que fazemos de nós mesmos


também fica alterada. Não temos a possibilidade de avaliar corretamente a
pessoa que somos. Tal imagem alterada será o modelo do que imaginamos
estar dentro da cabeça dos outros. Se penso que sou incompetente, minha
tendência é imaginar que os outros me verão da mesma
forma.(TUCHERMAN, 2019, p. 16)

1.2 Autoestima na psicanálise

Na especificidade da psicanálise, a autoestima também é discutida. Christian


Dunker (2017) reporta que Freud, o criador da psicanálise, referia-se à autoestima como
estima de si, sentimento de si (Selbstgeful). Para Freud, o sentimento de si é um critério
muito sensível para a detecção de sofrimento e uma autoestima alterada se relaciona
intimamente com o sofrimento psíquico. O psicanalista coloca, ademais, que o sentimento
de si responde diretamente a ideia de Ideal do Eu construída pelo sujeito. O Ideal do Eu,
construto teórico freudiano, seria uma instância simbólica formada a partir do Complexo
de Édipo que é responsável por construir a ideia de como o sujeito deveria ser para poder
legitimar o seu desejo. O Ideal do Eu é, segundo Dunker (2017), uma espécie de substituto
da cena inicial onde os pais são seres supremos.

Lacan (1949/1998), a respeito dos conceitos de Ideal do Eu e Eu Ideal, em “O


estádio do espelho como formador da função do eu”, marca o momento em que o bebê
reconhece seu reflexo no espelho (entre os seis e os dezoito meses de vida) como central
na separação psíquica entre mundo interno e mundo externo. É nessa experiência, que são
formadas as ideias de Eu Ideal e de Ideal do Eu, segundo as quais a autoestima responde
(FERREIRA-LEMOS, 2011; DUNKER, 2017).

Sobre esse processo, é evidenciada a importância do papel do Outro, nomenclatura


lacaniana usada para aquele que insere o bebê no campo simbólico, função geralmente
9

realizada pela mãe. Neste contexto, o mundo interno passa a ser apropriado através de
identificações com o mundo externo, que são oferecidas pelo Outro, cuja mediação por
meio do desejo é necessária enquanto responsável por nomear que o objeto fixo no
espelho é o bebê. Assim:

A criança irá se identificar com este objeto fixo que se mostra com uma
aparência unificada, mais semelhante à ideia que tem de seus pais ou de seus
cuidadores, que lhe parecem muito mais capazes, poderosos e coordenados que
ela. É também neste momento que a fala do Outro parental como “boa menina”,
“menino de ouro”, “filha má” é internalizada. A imagem que reflete no espelho
acompanhada do discurso do Outro e que, portanto, é estruturada
linguisticamente, compõem o que a criança percebe como seu eu (self).
(FERREIRA-LEMOS, 2011, p. 92)

Neste sentido, reafirma-se que a autoestima está intimamente relacionada às ideias


de Ideal do Eu e Eu Ideal que é construída pelo sujeito. Ademais, tanto nas obras de Freud
quanto nas de Lacan, como posto anteriormente, encontram-se evidências de que as
funções realizadas normalmente pela mãe são essenciais nesse processo, enquanto é por
intermédio de seu desejo que o sujeito reconhece sua imagem no espelho, concretizando
o eu. Portanto, estabelece-se que a mãe tem papel intrínseco na formação do Eu Ideal e
do Ideal do Eu, que, por sua vez, formam a ideia de autoestima do ponto de vista da
psicanálise.

Macedo e Andrade (2012), discorrendo também sobre psicanálise, afirmam que


Freud reconhece que a autoestima está diretamente relacionada com a libido narcisista.
As autoras também salientam que o amor que envolve desejo e privação diminuiria a
autoestima enquanto ser amado e correspondido no amor aumentaria a mesma. Portanto,
seria fundamental para a autoestima a crença de ser amado, ser merecedor do amor.
Considerando o protagonismo da relação mãe-bebê na constituição psíquica e subjetiva
do indivíduo, anteriormente discutida, a segurança do amor da figura materna é, dessa
forma, extremamente importante para a formação de uma boa autoestima. Outrossim,
autores já concluem que a construção da autoestima é resultado do estabelecimento de
relações de vinculações significativas há bastante tempo, desde Bowlby em 1988
(ROCHA, MOTA, MATOS, 2011).
10

1.3 A importância materna na constituição psíquica

Faz-se relevante, dessa forma, investigar a importância da relação entre o sujeito


e sua mãe na construção da autoestima. Na psicanálise, é consenso que as relações
primordiais do indivíduo são de imenso protagonismo na constituição psíquica. Para
discorrer mais especificamente a respeito da constituição do eu na teoria psicanalítica,
pode-se recorrer ao desenvolvimento do ser humano. Ao nascer, existe uma impotência
completa que deixa o indivíduo recém-nascido impedido de experienciar um
comportamento articulado, efetivo e eficiente. Essa importância (Hilflosigkeit) é o estado
de desamparo definido por Freud como a condição de estar sem ajuda, sem socorro
(DALLA COLLETA, AMARAL, FAGUNDES, 2018).

No contexto acima, Freud afirma que o indivíduo se encontra em total desamparo


a partir do momento de seu nascimento. Esse desamparo é tanto físico quanto psíquico:
físico enquanto o indivíduo não é capaz de sobreviver sem assistência de um outro e
psíquico enquanto é dependente da ação do outro para desafogar o eu de um acúmulo de
necessidades pulsionais que não podem obter satisfação sem tal respaldo (VILLELA,
2017). Cabem então, àquele que realiza a função materna, não só os cuidados
fundamentais de sobrevivência como alimentação e higiene, mas também a interpretação
e significação do desejo do bebê, a inscrição de um sujeito nele.

Todo esse processo de subjetivação, portanto, é conectado profundamente com os


reflexos da relação do indivíduo com sua mãe. Todas essas ações de libidinização da
criança, da ordem da pulsão de vida, são essenciais na constituição psíquica para que o
indivíduo possa entender-se, finalmente, como sujeito. Pode-se afirmar, assim, que a
“função materna sustenta para a criança uma imagem que serve para ela como referência
para constituir-se subjetivamente” (THEISSEN, 2014).

Já Lacan, a respeito dessa condição de desamparo, nomeia o lugar


ocupado pelo bebê como um lugar de alienação, enquanto a função da mãe vai além da
satisfação das necessidades básicas de sobrevivência do bebê:

É precisamente neste primeiro encontro, nessa relação primordial, que se


instaura, para a criança, o campo do desejo e a estrutura do terreno das
subjetivações. [...] O desejo materno confere à criança um lugar simbólico e
imaginário, um lugar na linguagem. A mãe, como veículo determinante do
processo de subjetivação da criança, é o real “tesouro dos significantes”
(LACAN,[1957]1998). A mãe é a fonte das primeiras significações de que
depende a criança.” (VILLELA, 2017 , p. 43)
11

Dessa forma, a mãe é essencial na constituição psíquica do indivíduo enquanto é


nela que se encontra a fonte das primeiras significações da vida da criança, que são
imprescindíveis para seu processo de subjetivação. Ademais, a criança também está,
desde o seu nascimento, submetida aos efeitos das fantasias parentais, por meio do
processo de identificação. (VILLELA, 2017). O processo de subjetivação, ademais,
também é importante ao discutir-se sobre autoestima. A transmissão da vida psíquica só
será possível dentro de um contexto intersubjetivo no qual exista o encontro com um
outro que esteja disposto e disponível para atender aos cuidados do bebê. Um outro sujeito
psíquico já constituído que ceda, no início, seu próprio ego como auxiliar e seu próprio
corpo como base e enquadre (GODOY, 2019). Essa função é, normalmente, realizada
pela mãe.

1.4 A especificidade da relação mãe e filha

“A feminilidade de uma mulher se tece na relação mãe e filha”

Marina Ferreira da Costa Ribeiro

Lacan (1972), afirma que há uma diferença entre as expectativas da mulher em


relação às figuras parentais, uma vez que ocorre uma devastação constituída na maioria
das mulheres em sua relação com a mãe, de quem, enquanto mulher, ela realmente parece
esperar mais substância que do pai.

Outra especificidade da relação entre mães e filhas é a dupla função que a mãe
exerce na organização da filha: de objeto de amor e alicerce para sua identificação
(MULLER, CASTELO, 2015). A identificação entre mãe e filha, permanece ao longo de
toda a vida e é constantemente reeditada de forma que a cada desafio na trajetória
feminina, a menina (mais tarde mulher) é lançada novamente a uma identificação com a
mãe (RIBEIRO, 2009).

Dessa forma, as fronteiras entre mãe e filha, que são sempre parciais e
momentâneas, são construídas por um intenso trabalho psíquico e passam por diversos
processos de reedição durante a vida (RIBEIRO, 2009). Assim, a complexidade do
vínculo é intensa e faz parte da vida da mulher em todas as suas fases:
12

Paradoxalmente, as meninas precisam de suas mães para se separar delas. Isso


torna as filhas mais suscetíveis às demandas e insatisfações narcísicas das
mães, o que gera experiências traumáticas de aprisionamento aos ideais
maternos. A filha passa a ser a mulher que a mãe gostaria de ter sido; a filha é
aprisionada no projeto narcísico da mãe. (RIBEIRO, 2009 , p. 55)

Parece então existir uma especificidade importante na relação entre mãe e filha,
enquanto o jogo identificatório entre ambas permanece e impacta a mulher durante toda
sua vida. Dessa forma, a aproximação identificatória entre mãe e filha praticamente não
tem equivalente masculino (ANDRÉ, 2001, apud RIBEIRO, 2009, p. 50), o que levanta
a questão de que a relação com a figura materna pode influenciar mais a autoestima
feminina do que na masculina.

Neste sentido, o estudo de Paixão, Patias e Dell’Aglio (2019), investigou variáveis


relevantes na autoestima e nos sintomas de transtornos mentais na adolescência, e mostra
que os participantes homens do estudo apresentaram média mais baixa de sintomas
quando comparados às meninas. Assim, concluiu-se que essa relação entre autoestima e
sintomas psíquicos se dava de forma mais nítida nas adolescentes do sexo feminino. A
mesma pesquisa não encontrou evidências da importância de associação entre o tipo de
configuração familiar (nuclear, monoparental e reconstituída) e a autoestima. Entretanto,
a relação materna em específico, distinta da configuração familiar geral, não foi
investigada.

Portanto, evidências apontam no sentido de uma relação mais íntima entre a


autoestima e a relação com a mãe em mulheres. Além disso, sabe-se que existem
momentos críticos onde as fronteiras entre mãe e filha são postas à prova de forma mais
atípica, como a adolescência e a maternidade da mulher (RIBEIRO, 2009).

Como sustentado nos estudos apresentados, a função materna é essencial para a


constituição subjetiva do indivíduo e a autoestima também é, por conseguinte, impactada
por essa relação. Faz-se, desta forma, relevante o entendimento dos efeitos de uma relação
materna que não seja suficientemente boa na autoestima da mulher jovem. Se é, portanto,
imprescindível para um desenvolvimento psíquico adequado que a relação entre mãe e
indivíduo seja construtiva e saudável, torna-se cada vez mais relevante investigar as
consequências de uma possível falha deste processo.
13

Considerando então as conclusões das autoras apresentadas sobre a relação entre


autoestima e sintomas de transtornos mentais em participantes mulheres ser mais clara
além da falta de informações sobre a relação dessas participantes com as mães, decidiu-
se que o foco do presente estudo é de investigar essa associação nas mulheres.
Considerando que a adolescência e a maternidade da mulher são períodos atípicos na
relação da mesma com sua mãe, que não foram encontrados muitos estudos em relação a
autoestima de mulheres jovens adultas em comparação a estudos sobre a autoestima de
adolescentes, este trabalho selecionou a faixa etária de participantes de 20 a 25 anos.
14

2 OBJETIVO

Assim, como antes sustentado, a função materna é essencial para a constituição


subjetiva do indivíduo. Faz-se relevante então a seguinte questão: a relação mãe-filha
exerce alguma influência na autoestima da mulher jovem? Se é, portanto, imprescindível
para um desenvolvimento psíquico adequado que a relação entre mãe e indivíduo seja
construtiva e saudável, torna-se cada vez mais relevante investigar as consequências desta
relação no âmbito da autoestima. Neste contexto, o objetivo do estudo será investigar a
relação entre a autoestima e as características do relacionamento entre mãe e filha,
considerando a imensa importância de ambas na saúde mental.
15

3 MÉTODO

3.1 Participantes

Na primeira fase as participantes consistiram em 131 Mulheres jovens adultas na


faixa etária de 20 a 25 anos, estudantes universitárias no presente momento. Na segunda
fase, 10 destas mulheres foram selecionadas de forma aleatória para participar das
entrevistas.

3.2. Local

A primeira fase do estudo foi realizada de maneira online, por meio da


plataforma Google Forms. A segunda fase também foi realizada de maneira remota, via
ligações de vídeo da plataforma Whatsapp ou Zoom, a depender da preferência da
participante. A especificidade de usar a modalidade online no estudo se deu pelo contexto
da pandemia do vírus COVID-19 e do isolamento social requisitado como estratégia de
combate à mesma.

3.3 Instrumentos

Foram utilizados três instrumentos: a Escala de Autoestima de Rosenberg


(1965) (Anexo A), um questionário que objetiva informações a respeito da relação entre
mãe e filha (Apêndice B) e uma entrevista semiaberta (Anexo B).

O instrumento (Apêndice B) consta de um questionário com questões fechadas de


múltipla escolha ou dicotômicas elaborado pela autora sobre a relação entre a autoestima
e o relacionamento mãe e filha. O instrumento é constituído de duas partes. A primeira
parte é composta por questões que caracterizam as participantes da amostra enquanto a
segunda por questões sobre os aspectos dessa relação conforme a seguinte organização:

1. Relação com a mãe na infância


2. Relação da mãe na adolescência
3. Relação da mãe atualmente
4. Como a participante relata sobre a relação com a mãe
5. Influência da relação mãe e filha na autoestima da participante
16

Na segunda fase do estudo o instrumento utilizado foi o de uma entrevista


semiaberta, que aborda tanto o aspecto da autoestima quanto da relação entre mãe e filha.
As entrevistas seguiram as perguntas elencadas abaixo, também disponíveis no Anexo B:

1. Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante contar da
sua vida.
2. Me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha importante contar
sobre ela.
3. Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.
4. Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na adolescência.
5. Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.
6. Na primeira fase desse estudo, você disse que (sim ou não, a depender da resposta
de cada participante) acredita ter uma boa autoestima. Me conte um pouco como
você avaliou sua autoestima.
7. Você disse que sua mãe (sim ou não, a depender da resposta de cada participante)
interferiu na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe
influenciou na avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa
influência?
8. Tem algo que você quer acrescentar?

3.4 Procedimento de coleta

A primeira fase do estudo foi feita via formulário da plataforma Google Forms,
constituído tanto pela Escala de Autoestima Rosenberg quanto pelo questionário
elaborado pela autora (Apêndice B). O link do questionário foi disponibilizado em redes
sociais (Grupos de Facebook). Os critérios de inclusão na amostra foram bem enfatizados
na publicação e estavam disponíveis no próprio formulário.

O formulário foi dividido em quatro sessões. A primeira sessão foi constituída


pelo Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice A) e pelas perguntas que
investigam se a participante tem ou não os critérios de inclusão necessários (sexo, idade,
estar cursando ensino superior). As participantes que não selecionarem as opções
desejadas foram excluídas da amostra automaticamente. A segunda sessão consistiu em
perguntas para delimitar o contexto socioeconômico da amostra. Já a terceira sessão foi
constituída pela Escala de Autoestima Rosenberg (adaptação de Hutz, 2010). A última
17

sessão foi constituída pelas perguntas referentes ao questionário elaborado pela autora
que visa investigar a relação mãe-filha. Ao final do questionário, foi disponibilizado um
espaço onde a participante poderia deixar seu contato caso tenha interesse em participar
do segundo momento do estudo. O contato da autora também foi disponibilizado.

Para a segunda fase do estudo, a amostra foi reduzida para uma seleção aleatória
feita por sorteio de 10 das participantes que mostraram interesse em continuar no estudo
e deixaram seus contatos no formulário. Foram feitas com estas participantes entrevistas
semiabertas, que ocorreram via ligação de vídeo pela plataforma WhatsApp ou Zoom.
Nestas, o objetivo foi de investigar com mais profundidade os efeitos de uma relação
materna boa ou ruim na autoestima da mulher.

3.5 Procedimento de análise

Assim, foi feita em um primeiro momento uma análise quantitativa, baseada na


primeira fase do estudo. Com os dados do formulário, foram analisadas variáveis
quantitativas descritas por dados numéricos e estatísticos. Essas variáveis foram
organizadas em tabelas comparativas. Em um segundo momento, também foi feita uma
análise qualitativa, baseada na segunda fase do estudo (entrevistas semiabertas). O
presente estudo teve caráter descritivo. Os resultados qualitativos foram analisados por
meio de discussões e aproximação com a teoria psicanalítica.
18

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Primeira fase

Os resultados da primeira fase do estudo foram colhidos em março de 2021 de


maneira online, como especificado no método. A contextualização da amostra e os
principais resultados são expostos abaixo.

4.1.1. Contextualização da amostra

A primeira fase do presente estudo, como antes posto, consistiu em um


questionário online. Foram recolhidas 160 respostas, das quais 131 foram julgadas válidas
considerando os critérios de inclusão de gênero, idade e estar cursando ensino superior
atualmente.
Assim, a amostra da primeira fase foi constituída por 131 participantes, mulheres
entre 20 e 25 anos, cursando ensino superior. Abaixo se encontra a distribuição das
participantes segundo idade.

Tabela 1: Distribuição etária das participantes da primeira fase

Idade Número de participantes

20 17

21 35

22 51

23 19

24 3

25 6

Total 131
Fonte: Dados da primeira fase

Um recorte importante se deu em relação ao contexto socioeconômico das


participantes. A distribuição de participantes segundo a renda familiar se encontra abaixo:
19

Tabela 2: Contexto econômico das participantes da primeira fase

Renda mensal familiar em salário mínimo Número de participantes Porcentagem de participantes

Nenhuma renda 1 0,8%

Até um salário mínimo 0 0,0%

De 1 a 3 salários mínimos 2 1,5%

De 3 a 6 salários mínimos 17 13%

De 6 a 9 salários mínimos 14 10,7%

De 9 a 12 salários mínimos 6 4,6%

De 12 a 15 salários mínimos 13 9,9%

Mais de 15 salários mínimos 78 59,5%

Total 131 100%


Fonte: Dados da primeira fase

Assim, mais da metade das participantes (59,5%) se concentra em uma única faixa
de renda mensal familiar: a de maior privilégio (mais de 15 salários mínimos). No mesmo
sentido, 84% das participantes estudam em uma instituição privada. Assim, é importante
colocar desde já que os resultados se referem a este contexto socioeconômico particular
e restrito.

4.1.2 Escala de autoestima Rosenberg

Como antes colocado, foi usado como instrumento dentro da primeira fase do
estudo a Escala de Autoestima Rosenberg (1979). Segundo Hutz e Zanon (2011), esta
Escala é uma medida unidimensional constituída por dez afirmações relacionadas a um
conjunto de sentimentos de autoestima e autoaceitação que avalia a autoestima global. Os
itens são respondidos em uma escala tipo Likert de quatro pontos. A pontuação pode
variar de 10 a 40 pontos: quanto maior a pontuação, maior será o nível de Autoestima do
indivíduo. Hutz e Zanon (2011) também buscaram revisar as características psicométricas
da EAR. Foi confirmada a solução uni fatorial da escala e boa consistência interna (α=
0,90), além de ser verificada uma correlação negativa entre a autoestima e a idade dos
participantes (r= -0,47) (BATISTA, PIOVEZAN E MUNER, 2015). No presente estudo,
foi usada a adaptação para português por Hutz (2010), presente no Anexo A. A Escala
foi aplicada na terceira seção do questionário online, após os critérios de inclusão e o
20

contexto socioeconômico. Neste instrumento, a participante deveria classificar 10


afirmações nas categorias discordo totalmente, discordo, concordo e concordo
totalmente.
Considerando que uma pontuação mais alta reflete uma autoestima elevada
(VISCARDI, CORREIA, 2017), constatou-se que a maior parte da amostra (64,1%) está
concentrada em faixas com pontuação média/alta (de 26 a 40 pontos). Entretanto, ainda
se faz relevante que 35,87% das participantes tiveram pontuações menores do que 26
pontos.
A distribuição das pontuações das 131 participantes do estudo na Escala de
Autoestima Rosenberg, segundo os dados anteriormente colocados, foi exposta na tabela
abaixo:

Tabela 3: Pontuação Escala de Autoestima Rosenberg

Faixa de pontuação Número de participantes

10 a 15 5

16 a 20 15

21 a 25 26

26 a 30 44

31 a 35 25

36 a 40 16

Total 131
Fonte: Dados da primeira fase

Posteriormente na análise de resultados, será feita uma comparação com a


pontuação da Escala de Autoestima Rosenberg com a afirmação da própria participante
de se tem ou não uma boa autoestima.

4.1.3 Relação Materna

Nesta seção, como explicado anteriormente, as participantes responderam uma


série de questões a respeito da relação entre elas e suas mães em diferentes épocas da vida
(infância, adolescência e atualmente). Uma destas consiste em como a participante define
21

essa relação, com respostas variando de “Excelente” a “Muito ruim”. A distribuição das
participantes nestas respostas encontra-se na tabela abaixo.

Tabela 4: Definição da relação mãe e filha

Questão Excelente Boa Normal Ruim Muito


ruim

Como você definiria sua relação com a sua mãe durante 46,6% 34,4% 13,7% 3,1% 2,3%
a sua infância?

Como você definiria sua relação com a sua mãe durante 19,8% 22,1% 26,7% 21,4% 9,9%
a adolescência?

Como você definiria sua relação com a sua mãe 45,8% 29% 13,7% 9,9% 1,5%
atualmente?
Fonte: Dados da primeira fase

Nos resultados, como exposto acima, foi possível observar que a relação mãe e
filha das participantes mostrou-se mais positiva atualmente e na infância (46,6% das
participantes classificaram a relação durante a infância como “excelente” e 34,4% como
“boa” enquanto 45,8% das participantes classificaram a relação atualmente como
“excelente” e 29% como “boa”).
Por outro lado, na fase da adolescência essa estatística desce para 19,8% das
participantes afirmando ter tido uma relação “excelente” e 22,1% “boa” com as mães,
enquanto 26,7% afirmam ter tido uma relação “normal”, 21,4% afirmam ter tido uma
relação “ruim” e 9,9% afirmam ter tido uma relação “muito ruim”. Este dado se faz
relevante para a discussão de resultados posterior.
Outra parte do questionário pediu que as participantes escolhessem três palavras
que definem suas relações com suas mães. A grande maioria das palavras utilizadas
tiveram tonalidade positiva. O grupo de palavras “amor”, “amorosa”, ‘carinho”,
“carinhosa” e ‘cuidado” apareceu 62 vezes nas respostas, compondo os significantes mais
frequentes. Outro grupo de palavras foi composto por “parceria”, “cumplicidade” e
“companheirismo”, significantes que apareceram 28 vezes. Já os significantes “amizade”,
“amigável” e “amiga” apareceram 26 vezes. As palavras com tonalidade negativa tiveram
menos repetições do que as positivas. O grupo de significantes mais frequente neste
sentido foi “distante” e “afastamento”, aparecendo oito vezes. O significante
“conturbada” foi o segundo mais frequente, aparecendo em cinco respostas. Também
22

foram usados, com menor frequência: “complicada”, “exaustão”, “controladora”, “culpa”


e “cobrança”.
Por fim, faz-se relevante também colocar que 79,4% das participantes avaliaram
as relações com suas mães como “próxima” ou “muito próxima”. Em contrapartida,
15,3% avaliaram como “normal” neste sentido e 5,3% afirmaram não ter uma relação
próxima com suas mães. Dessa maneira, a maior parte da amostra foi constituída de
participantes com proximidade com as mães.

4.1.4 Identificação: considerar ou não a mãe como modelo

Em uma das questões da primeira fase do estudo, investigou-se se as participantes


consideravam ou não sua mãe como inspiração ou modelo. Os motivos para as respostas
positivas e negativas foram investigados. A distribuição das participantes nesta questão
encontra-se na tabela abaixo:

Tabela 5: Identificação na relação mãe e filha

Você considera sua mãe uma inspiração ou um modelo?

Opções de resposta Porcentagem de participantes

Sim 58,8%

Não 9,9%

Parcialmente 31,3%

Fonte: Dados da primeira fase

Como se pode observar, grande parte da amostra afirma considerar sua mãe uma
inspiração ou modelo, representando 58,8% das participantes. Enquanto isso, 9,9% das
participantes afirmaram não considerar sua mãe um modelo ou inspiração e 31,3%
consideram as mães neste sentido apenas parcialmente.
Nas respostas abertas, chama atenção a quantidade de participantes que
responderam positivamente à questão para a qual relatam considerar suas mães fortes,
determinadas e esforçadas. Ambos os três significantes aparecem com frequência, assim
23

como “batalhadora”. A valorização do trabalho (produto de atividade) é clara. Sobre as


participantes que responderam à questão de forma negativa, aparecem frequentemente
nos relatos divergência de valores e opiniões. Além disso, também é relatado com
frequência a diferença nos estilos de vida (participantes que relatam que querem seguir
caminhos e escolhas diferentes dos que foram tomados pelas suas mães). Novamente,
aparece a clara valorização do trabalho, as participantes relatam majoritariamente não
considerarem as mães modelos ou inspirações por terem escolhido abrir mão do trabalho,
seguindo um projeto de vida distinto do que as participantes almejam. O significante
“dependente” aparece como frequência. Outros significantes notados foram “dona de
casa” e “estilo de vida”.

4.1.5 Autoestima

Os resultados obtidos nas questões que abordavam de forma mais direta o tema
da autoestima também foram bastante relevantes. Quando perguntadas se em algum
momento de sua vida suas mães haviam conversado com elas sobre autoestima, amor
próprio ou algum tema semelhante, 69,5% das participantes responderam
afirmativamente. Entretanto, 30,5% das mulheres que participaram do estudo
responderam não ter tido nenhuma conversa desta natureza com as suas mães, um número
que ainda se mostra importante na análise.
Às participantes também foi perguntado se se sentiam valorizadas pelas suas mães
atualmente, na adolescência e na infância. A distribuição dessas respostas encontra-se na
tabela a seguir.

Tabela 6: Valorização na relação mãe e filha

Opções de Você se sente valorizada Você se sentia valorizada pela Você se sentiu valorizada
respostas pela sua mãe sua mãe durante sua pela sua mãe na sua
atualmente? adolescência? infância?

Em todas as 35,1% 19,1% 50,4%


minhas ações

Na maioria 40,5% 34,4% 29,8%


delas

Em algumas 18,3% 34,4% 16%

Em nenhuma 6,1% 12,2% 3,8%


Fonte: Dados da primeira fase
24

Dessa maneira, pode-se afirmar que a adolescência mais uma vez se mostrou um
período significativo na relação mãe e filha. Pode-se chegar a esta conclusão observando
que 12,2% das participantes não se sentiam valorizadas pelas suas mães em nenhuma de
suas ações na adolescência, enquanto na infância e atualmente a porcentagem de
participantes que relataram terem se sentido assim é de 3,8% e 6,1%, respectivamente. A
porcentagem de participantes que se sentia valorizada em todas as suas ações durante a
adolescência também é significativamente menor do que nos outros períodos da vida, o
que mostra a adolescência como um período de possível afastamento na relação mãe e
filha.
Em outro momento, às participantes foi perguntado: “Há alguma característica sua
que sua mãe demonstre algum tipo de valorização?”. A maior parte da amostra respondeu
de maneira afirmativa (sim), representando 95,4%. Entretanto, 4,6% (seis participantes)
afirmaram que não existe nenhuma característica delas que suas mães demonstram
valorização, o que ainda se faz relevante. Após esta questão, às participantes que
responderam de forma afirmativa foi perguntado quais características eram valorizadas
por suas mães. Foram frequentes os significantes relacionados a produtos de atividade:
inteligência (17 respostas), determinação (14 respostas), dedicação (11 respostas),
estudos (14 respostas) e trabalho (sete respostas). Também apareceram de forma menos
frequente, mas ainda relevante os significantes relacionados à aparência física: beleza,
estética e porte físico (11 respostas).
Em seguida, foi perguntado às participantes: “Você acredita que sua relação com
a sua mãe influenciou na sua maneira de ser em algum sentido?”. Nesta questão, os
resultados foram de extrema relevância: 100% das participantes responderam “Sim” (não
houve nenhuma resposta negativa). Em seguida, foi perguntado se essa influência havia
sido positiva ou negativa. A maior parte da amostra considerou a influência como positiva
(61,1% das participantes), enquanto uma menor parcela considerou essa influência
negativa (15,3%). Por essa pergunta ser uma pergunta aberta, o restante da amostra
dividiu-se entre respostas mais individuais (onde a maioria pode ser interpretada como
parcialmente positiva e parcialmente negativa). Em seguida, foi perguntado sobre o
porquê dessa influência ter sido positiva ou negativa. Como as respostas eram abertas e
permitiam respostas longas, houve poucas repetições de significantes. Entretanto, na
tonalidade de respostas negativas foi possível elencar como frequentes temas de
25

insuficiência, cobrança, insegurança, aparência e perfeição. Já na tonalidade positiva


foram frequentes temas de caráter, determinação e independência.
Por fim, na última questão do questionário, foi perguntado “Você acredita ter uma
boa autoestima?”. A maioria das participantes respondeu que sim, representando 59,5%
da amostra. O restante, 40,5% das participantes, respondeu que não. Considerando os
resultados da Escala de Autoestima Rosenberg, acima elencados, pode-se observar que
existe uma discrepância significativa. Dado que 64,1% das participantes tiveram
pontuação média/alta na Escala de Autoestima, entende-se que parte da amostra
provavelmente acredita ter uma autoestima pior do que a apontada pelo instrumento.

4.2 Segunda Fase

Na última questão do questionário da primeira fase do estudo, foi deixado um


campo onde as participantes poderiam deixar seu contato caso existisse o interesse e a
disposição de participar da segunda fase do trabalho. Entre participantes que deixaram o
contato, foi feito um sorteio que selecionou de maneira aleatória 10 participantes. As
entrevistas que compõem a segunda fase do estudo foram feitas em março de 2021 de
maneira online, via chamada de vídeo, como especificado no método. A transcrição das
entrevistas está disponível no Apêndice C.
Antes da análise qualitativa dos dados da entrevista, faz-se abaixo a especificação
das respostas julgadas mais relevantes para a interpretação dos dados das entrevistas na
primeira fase do estudo. Na Tabela 7, encontra-se uma distribuição das participantes
segundo idade e renda familiar mensal.
As participantes da segunda fase do estudo, portanto, distribuem-se de forma
desigual entre os 21 e os 25 anos de idade. Um recorte importante se deu em relação ao
contexto socioeconômico das dez participantes: todas se encontram na mesma faixa de
renda familiar mensal de mais de 15 salários-mínimos. Portanto, os resultados referem-
se a este contexto socioeconômico específico.
26

Tabela 7: Idade e renda familiar das participantes da segunda fase

Participante (Nome fictício) Idade Renda familiar mensal em salário-mínimo

Pérola 22 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Augusta 22 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Violetta 22 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Antonieta 25 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Tatiana 23 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Kiara 22 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Lizandra 22 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Donatela 21 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Elizabeth 23 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

Flora 22 Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)


Fonte: Dados da primeira fase

Faz-se relevante também expor os dados em relação à autoestima das participantes


da segunda fase do estudo. Além da pontuação da Escala de Autoestima Rosenberg,
encontra-se na Tabela 8 abaixo a resposta de cada participante para a questão “Você
acredita ter uma boa autoestima?”.
Tabela 8: Autoestima e pontuação das participantes na primeira fase

Participante Resposta para a questão: “Você acredita ter uma Pontuação na Escala de Autoestima
boa autoestima?” Rosenberg.

Pérola Sim 39 pontos

Augusta Sim 39 pontos

Kiara Sim 37 pontos

Violetta Sim 34 pontos

Lizandra Sim 31 pontos

Flora Sim 29 pontos

Tatiana Sim 27 pontos

Antonieta Não 26 pontos

Donatela Não 24 pontos

Elizabeth Não 23 pontos


Fonte: Dados da primeira fase
27

Como pode-se observar, as participantes do estudo tiveram variados resultados


em relação a Escala de Autoestima Rosenberg. É interessante observar que as
participantes que afirmaram acreditar não ter uma boa autoestima realmente tiveram
pontuação inferior na Escala de Autoestima Rosenberg, com pontuações de 23, 24 e 26
pontos. Já entre as participantes que afirmaram acreditar ter uma boa autoestima, a
pontuação variou de 27 a 39 pontos.
Já no âmbito da relação mãe e filha, selecionaram-se como mais relevantes duas
questões. A primeira questão selecionada foi “Como você definiria sua relação com sua
mãe?”, na qual as respostas foram divididas no questionário entre infância, adolescência
e atualmente. A distribuição das participantes conforme as respostas desta questão
encontram-se na Tabela 9, abaixo:

Tabela 9: Definição da relação mãe-filha participantes da segunda fase

Participante Como você definiria sua Como você definiria sua Como você definiria sua
relação com sua mãe na relação com sua mãe na relação com a sua mãe
infância? adolescência? atualmente?

Pérola Excelente Excelente Excelente

Augusta Excelente Boa Excelente

Kiara Excelente Excelente Excelente

Violetta Excelente Excelente Excelente

Lizandra Excelente Boa Boa

Flora Normal Boa Boa

Tatiana Boa Normal Excelente

Antonieta Boa Normal Boa

Donatela Boa Normal Excelente

Elizabeth Excelente Ruim Boa


Fonte: Dados da primeira fase

Nesta distribuição, observa-se que as participantes que julgaram a relação mãe e


filha como “excelente” em todos os períodos da vida, Pérola e Kiara, são participantes
com pontuação alta na Escala de Autoestima Rosenberg (39 e 37 pontos,
respectivamente). Em contraponto, a única participante que selecionou a opção “ruim”
para definir a relação mãe e filha em algum período da vida, foi a participante com menor
pontuação na Escala (Elizabeth, com 23 pontos). Entretanto, apesar da exposição feita,
28

esclarece-se que não é possível fazer nenhuma aferição quanto à causalidade desses dados
com base apenas nesta observação.
A segunda questão escolhida para a análise foi “Você se sente/se sentiu valorizada
pela sua mãe?”, na qual as respostas foram divididas no questionário entre os períodos da
vida e as categorias “em todas as minhas ações”, “na maioria delas”, “em algumas” e “em
nenhuma”. Analisando tais respostas, foi possível observar que a adolescência se
destacou como um período em que as participantes da segunda fase do estudo se sentiram
menos valorizadas em suas ações do que nos outros períodos da vida. A adolescência será
analisada de forma qualitativa posteriormente. A distribuição das participantes nesta
questão encontra-se a seguir.

Tabela 10: Valorização materna nos diferentes períodos da vida das participantes

Participante Você se sentiu valorizada Você se sentiu valorizada pela Você se sente valorizada
pela sua mãe na sua sua mãe durante sua pela sua mãe atualmente?
infância? adolescência?

Pérola Em todas as minhas ações Em todas as minhas ações Na maioria delas

Augusta Em todas as minhas ações Na maioria delas Em todas as minhas ações

Kiara Em todas as minhas ações Em algumas Em todas as minhas ações

Violetta Na maioria delas Na maioria delas Na maioria delas

Lizandra Em todas as minhas ações Em algumas Em todas as minhas ações

Flora Na maioria delas Em todas as minhas ações Em todas as minhas ações

Tatiana Na maioria delas Em algumas Na maioria delas

Antonieta Em algumas Em algumas Em algumas

Donatela Na maioria delas Em algumas Na maioria delas

Elizabeth Em todas as minhas ações Em nenhuma Na maioria delas


Fonte: Dados da primeira fase

Após tal contextualização das respostas de cada participante na primeira fase do


estudo, parte-se para a análise qualitativa dos conteúdos trazidos na entrevista. Para
melhor organização desta, as respostas foram organizadas em categorias de análise:

4.2.1. Autocrítica, valorização e expectativa materna


4.2.2. Separação eu e outro
4.2.3. Adolescência
29

4.2.4. Escuta e comunicação


4.2.5. Beleza: estética, corpo e aparência física

4.2.1 Autocrítica, valorização e expectativa materna

No discurso das participantes, destaca-se em primeiro lugar a recorrência de temas


de autocrítica, autocobrança, insuficiência e semelhantes. Em determinados momentos, é
possível observar que as participantes chegam a relacionar suas posturas exigentes em
relação a si mesmas e suas conquistas com a valorização e a expectativa de suas mães.
Para ilustrar essa análise qualitativa, foram selecionados recortes das entrevistas. Os
nomes das participantes foram mudados por nomes fictícios, enquanto as idades foram
preservadas.
Antonieta, de 25 anos, conta que sua mãe a teve aos 43 anos. Considerando a
gestação tardia, a filha conta que a mãe ficou extremamente preocupada com a sua
saúde:

“Minha mãe ela me teve mais velha, então ela já me teve com 43 anos. [...] Na
época ela ficou bem assustada quando soube que estava grávida. Tenho uma
diferença bem grande com os meus irmãos. [...] minha mãe até fala assim que
quando eu nasci, quando ela estava grávida, ela nem se importava muito qual
era o sexo, ela nem sabia do sexo quando eu fui nascer. Ela era muito
preocupada se eu ia nascer saudável né, se eu ia ter alguma malformação [...].
Naquela época não era tão comum ter filho mais velho. Ela até fala que quando
nasci a primeira coisa que ela perguntou foi ‘é perfeito?’.” (Antonieta, 25 anos)

Pode-se analisar então que desde os primeiros momentos de vida de Antonieta, já


se coloca posta pela linguagem uma expectativa materna: a de perfeição. Assim, segundo
Lewkovitch e Grimberg (2016), Lacan sublinhou em “Observação sobre o relatório de
Daniel Lagache” (1998) justamente a passagem em que Lagache afirma que antes do
nascimento a criança já é um polo de expectativas, projetos e atributos, e observa que
talvez seja sob o acúmulo deles que o sujeito irá claramente sufocar. E estas expectativas,
como posto posteriormente no discurso da participante, deixa marcas:

“Comecei a perceber [...] que a opinião da minha mãe importava para mim de
uma maneira muito absurda assim, qualquer pessoa que falava eu não me
importava tanto quanto a opinião da minha mãe. [...] Eu comecei a entender
essa parte, eu acho que agora eu sou muito autocrítica comigo [...]. Não me
acho suficiente para alguma coisa por causa de críticas da minha mãe, críticas
da minha família.” (Antonieta, 25 anos)
30

Neste momento, Antonieta relaciona de forma direta sua tendência autocrítica


excessiva com críticas feitas por sua mãe e por sua família ao longo de sua vida. Assim,
supõe-se que a relação de Antonieta com sua mãe teve influência na autoestima da
participante. Quando perguntada diretamente como foi feita sua avaliação a respeito de
sua autoestima, a participante coloca:

“Eu avalio a autoestima não tanto assim aparência ou essas coisas, mas eu
tenho uma dificuldade muito para... assim sei lá, para me… Deixa eu pensar.
Para me valorizar em alguns aspectos. [...] Eu tenho uma autoestima de nunca
me achar suficiente, talvez. Acho que é nesses aspectos mesmo, de
autoaceitação, sabe? De também de… Deixa eu achar uma palavra. Sabe
acreditar em mim mesma? Que eu sou capaz?” (Antonieta, 25 anos)

Observa-se, portanto, que no discurso da participante fica nítida a sua tendência à


autocobrança excessiva, que afeta diretamente sua autoestima. Antonieta também traz a
sua dificuldade em se valorizar. Esta característica foi observada em diversas entrevistas.
Como por exemplo, na fala de Elizabeth, também de 23 anos:

“Apesar de eu demonstrar muita confiança de quem eu sou, eu não me acho


nada disso, sabe? [...] Eu sou assim. E… Não acho que isso me faz nada
demais. Mas eu vejo as pessoas achando isso incrível em mim e eu fico tipo
‘Não fiz nada, não mereço nada. Só sou assim’. ´ [...] Eu acho que é isso, eu
não reconheço metade dos meus talentos, apesar de saber que em algum lugar
eles existem para as outras pessoas”. (Elizabeth, 23 anos)

Neste recorte, Elizabeth discorre sobre a dificuldade que tem em reconhecer e


valorizar seus talentos. Em outro recorte anterior, quando a participante foi orientada a
falar um pouco sobre sua mãe, ela coloca:

“E ela é muito autocrítica, eu acho, isso pode ser meio ruim para quem está ao
entorno. Tipo assim, ela faz esse tanto de coisa e não reconhece que ela é
incrível. E você fica tipo: ‘você precisa validar que você é muito boa no que
você faz’. Ela fala ‘Ah não, é bobagem.’ [...] Ela é bem humilde, mas é uma
humildade tipo ‘ei, se valoriza’”. (Elizabeth, 23 anos)

Assim, é possível observar o traço identificatório que existe em relação a


dificuldade em se valorizar, que existe na personalidade da mãe e é perpetuada também
na vida da filha. Sabe-se, no âmbito da psicanálise, que o Ideal do Eu e o Eu Ideal são
criados a partir de um referencial simbólico. Segundo Lewkovitch e Grimberg (2016),
podemos pensar o investimento narcísico dos pais como aquilo que dá um lugar à criança
no campo do Outro, o lugar dos significantes que abarcam o sujeito. Assim, a partir desse
31

referencial simbólico, o sujeito constrói sua imagem, aquilo que deverá ser - segundo sua
própria fantasia - para ser amado. Essa é justamente a constituição que Freud chamou de
Eu Ideal (Ideal-Ich), Ideal do Eu (Ich-Ideal) e “supereu” (Über-Ich), que também foi
chamada pelo psicanalista Antonio Godino Cabas (1982) de aparelho identificatório.
(LEWKOVITCH, GRIMBERG, 2016).
Retomando o discurso de Elizabeth, a participante, após discorrer sobre o percurso
profissional admirável de sua mãe, discorre novamente sobre sua dificuldade em se
reconhecer. Reflete-se nesse contexto, que após a construção do ideal, o “supereu”,
segundo Lewkovitch e Grimberg (2016), é uma instância psíquica especial que atuaria a
partir deste Ideal do Eu exigindo a satisfação narcísica e, ao mesmo tempo, observaria o
eu e mostraria, ininterruptamente, o quão distante ele (o eu) está desse ideal. Ou seja, o
“supereu” não funciona apenas para cumprir o ideal, mas também para mostrar de forma
constante ao eu que ele falhara em relação a este. Na associação abaixo, Elizabeth
identifica como o seu “supereu”, em sua dificuldade em reconhecer seus méritos, está
ligado a uma expectativa que quer atingir em relação a sua mãe:

“Isso por um lado é duro, porque eu não reconheço as coisas que eu sou. Em
algum lugar eu tenho essa dificuldade de me reconhecer. Então a relação com
a minha mãe é…Também tem um lado de uma expectativa que eu queria
atingir. Apesar que ela nunca declarou nada, eu só senti cobrança, só senti que
eu precisava fazer mais coisas.” (Elizabeth, 23 anos)

Neste recorte, quando a participante coloca que sua mãe nunca declarou nada
sobre esta expectativa de forma direta, é possível observar como o Eu Ideal e o Ideal do
Eu são construídos segundo uma fantasia. Também é exposto como a autocobrança, neste
caso, teve raiz no seio do desejo de suprir a expectativa materna.
No discurso de Donatela, outra participante entrevistada de 21 anos, a
autocobrança excessiva já aparece novamente no início da entrevista, quando a
participante foi orientada a falar um pouco sobre si:

“Eu acho que eu sou uma pessoa que está sempre tentando se melhorar. Nunca
está satisfeita assim, com relação aos meus esforços [...] Eu gosto muito de
tipo… De me dedicar no que eu faço e sei lá, eu sinto que eu não consigo fazer
as coisas mal feitas e isso me deixa muito aflita. Então às vezes eu acabo nem
fazendo coisas que daria para fazer, mas eu sou bem perfeccionista. Bastante
autocrítica, já fui muito controladora [...] No passado eu não conseguia aceitar
tipo os meus defeitos e as minhas sombras, era muito difícil para mim lidar
com eles.” (Donatela, 21 anos)
32

É possível observar neste recorte alguns traços da personalidade de Donatela.


Quando a participante é dirigida a falar um pouco sobre sua mãe, identificam-se algumas
similaridades: ela conta que sua mãe também é controladora e evita fazer coisas que saem
do seu controle. Donatela também conta que acredita que o jeito de sua mãe de “dar conta
dos defeitos dela” (sic) é priorizar os outros. Quando a participante discorre sobre
valorização, retomando um tópico muito abordado nas entrevistas, ela coloca sobre sua
mãe:

“Aprendi muito com ela que a gente não podia aceitar os agrados, aceitar as
valorizações, porque isso era tipo… [...] Isso para a nossa família era algo de
ser metido, de ser orgulhoso. Eu nunca aceitei agrado. Sempre que eu recebia
um presente eu tinha que falar ‘Ah não, que isso!’. Ou quando alguém me
falava que eu era bonita era tipo: ‘Ah não, você é bem mais. Veja bem, olha
isso…’. Foi uma coisa que me atrapalhou bastante, porque eu sempre trazia a
minha valorização baseada no outro, eu sempre valorizava os outros mas eu
era um caos comigo.” (Donatela, 21 anos)

Donatela, nesta associação, reitera o reflexo que a atitude da mãe perante si mesma
teve em sua autovalorização (o que já foi possível observar no discurso das participantes
analisadas anteriormente). Assim, a identidade de uma filha é uma combinação de
partilhas e clivagens em relação à sua mãe (GUIGNARD, 2002).
Ao ser abordado na entrevista diretamente o tópico da autoestima, Donatela relata
que acredita que sua relação com sua mãe influenciou em sua autoestima:

“Era um ensino meio contraditório porque ao mesmo tempo que ela falava para
mim ‘Filha, você é especial’ ela tipo (sic.) não fazia nada disso, sabe? Ela
nunca se valorizava, ela nunca se colocava em primeiro lugar. Tipo (sic.) era
sempre o outro, o outro, o outro. E tipo, onde existe a autoestima se você
sempre coloca o outro em primeiro lugar? Chega a ser uma coisa meio… é…
Sei lá, ela esquecia da auto valorização dela e sempre criticava ela, até hoje
assim, nada para ela está bom. Eu que tinha que valorizar ela, então era como
se eu sempre esperasse que as pessoas me valorizassem. [...] Obviamente foi o
que ela pôde fazer, mas acho que isso me pegava bastante, o fato de ela não se
aceitar atrapalhava muito a minha situação de não me aceitar também.”
(Donatela, 21 anos)

A participante elucida neste trecho, então, como a falta de autoaceitação de sua


mãe influenciava na sua própria auto aceitação - uma parte central da autoestima.
Ademais, é nítido na fala da participante a sua mobilização com o tema. Discurso
semelhante foi observado na fala de Flora, 22 anos. A participante, quando questionada
se sua relação com sua mãe influenciou na avaliação que faz da sua autoestima, colocou:
33

“Eu acho que sim, porque ela sempre… Como eu falei, a gente tem uma relação
muito aberta, sabe? De se apoiar, e tudo mais. Então eu sempre fui muito aberta
com as minhas questões e ela sempre tentou me colocar para cima e me ajudar
em relação a isso e tudo mais. Mas eu acho que tem algumas coisas dela que
eu peguei para o lado negativo também. Então tipo, a minha mãe é uma pessoa
muito insegura, muito que se coloca para baixo. Então às vezes eu acho que eu
peguei um pouco dessa mania [...] Sei lá, alguém falava: “Nossa, como você é
isso e tal”. E eu falava “nem é isso”. Porque eu aprendi que era mais bonito
você não se achar tanto. Se você tinha uma autoestima boa é porque você se
achava, sabe? Então acho que eu peguei essa mania de me colocar para baixo
por não ser bonito se sentir bem, ter uma boa autoestima.” (Flora, 22 anos)

Neste recorte, vemos que Flora traz em um primeiro momento um reflexo positivo
da relação mãe e filha em sua autoestima. Posteriormente a participante relata, assim
como Donatela, que a tendência percebida em sua mãe de não se autovalorizar ensinou-a
a fazer o mesmo. Em outras entrevistas, vemos reflexos positivos da relação materna na
autoestima das participantes de forma mais detalhada. Aqui, fica clara a importância da
valorização materna. Augusta, 22 anos, quando questionada se acreditava que sua relação
com sua mãe influenciou em sua autoestima, associou:

“Com certeza. Eu acho que a minha relação com a minha mãe sempre foi muito
permeada por palavras de cuidado, por essa… Ela sempre quis elevar muito,
me valorizar muito. Eu e minha irmã no caso. Eu sinto muito que isso de ter
uma figura que vá lá te mostrado que você pode fazer as coisas, que você
consegue fazer as coisas, vai te dando mais segurança. Consequentemente, vai
te dando mais autoestima para você fazer as coisas que você quer fazer. [...].
Então acho que sim, com certeza.” (Augusta, 22 anos)

Neste relato, vemos o contrário do que foi exposto anteriormente no discurso de


outras participantes: como a valorização da mãe trouxe, para Augusta, confiança e
segurança - uma base para construir uma autoestima boa e um eu sólido. Pode-se, neste
recorte, observar a possível influência positiva da relação mãe e filha no contexto da
autoestima, enquanto o amparo oferecido pela mãe reflete uma autoestima estável e
suficiente na filha. A pontuação de Augusta na Escala de Autoestima Rosenberg foi de
39 pontos, entre as maiores pontuações entre todas as participantes.
O reflexo positivo da relação materna na autoestima da filha também foi
observado no discurso de Lizandra, participante de 22 anos. A participante relata, ao
longo da entrevista, que sempre foi uma pessoa dedicada e com um nível de autocobrança
alto: almejava a perfeição. Quando questionada se acredita que a relação com sua mãe
influenciou em sua autoestima, a participante conta:
34

“Meus pais sempre foram muito flexíveis comigo. Como eu sempre me cobrei
muito, eles sempre foram o oposto assim, eles nunca foram de me cobrar. Então
eu sinto que isso da minha mãe também me ajuda a manter esse equilíbrio. [...]
Eu sofria muito com prova, chegava uma prova e eu ficava chorando
desesperadamente. Comecei a fazer psicóloga com 12 anos de idade porque eu
me cobrava muito. E isso acabava afetando minha autoestima nesse sentido,
eu achava que eu tinha que ser perfeita, que eu só podia tirar dez [...]. E a minha
mãe sempre foi muito importante nesse sentido de me mostrar que tipo: Não,
se eu tirasse um zero estava tudo bem e que eu não tinha que ser perfeita em
tudo. E não tinha que ficar me cobrando tanto. Então eu acho que ela me ajudou
a construir autoestima nesse sentido, de ver que errar faz parte [...].” (Lizandra,
22 anos)

Observa-se, portanto, que frente ao sofrimento da filha a mãe foi capaz de


estabelecer um Eu Ideal com base no real, onde o erro é aceito como parte do processo.
Essa aceitação perante um eu falho faz com que Lizandra possa construir, como ela
mesmo coloca, sua autoestima.
A participante Kiara (22 anos) também conta como os ensinamentos de sua mãe
foram importantes para a construção de sua autoestima. Ao longo da entrevista, antes de
ser questionada diretamente sobre a influência da relação com sua mãe na sua autoestima,
a participante coloca:

“Mas ela sempre me dava presente, sempre me elogiava, sempre… Sei lá,
quando eu tinha prova ela estudava comigo. Quando eu tinha que memorizar
alguma coisa ela sempre me ajudava. Então ela sempre esteve super presente
assim. [...] E aí ela sempre me elogiou, sempre me ensinava as coisas. [...] Que
mesmo eu não sendo a pessoa mais rica, a pessoa mais ‘x’, mais ‘y’, eu sempre
ia ter que ser muito positiva e me defender, porque querendo ou não se você
não se defende, não se ama, ninguém vai te amar. Ela me ensinou muito essa
parte de amor próprio.” (Kiara, 22 anos)

Kiara, no trecho exposto, começa a relatar aspectos de sua relação com sua mãe.
Esta foi a única participante a abordar diretamente o tema de “amor próprio”. Quando
questionada diretamente sobre a influência da relação com sua mãe na sua autoestima,
em um segundo momento, Kiara retoma o tema de amor próprio, explicitando:

“A minha mãe sempre, desde pequena, me ensinou: ‘K (sic adaptada), se você


não se amar, ninguém vai te amar. Se você não se achar bonita, ninguém vai te
achar bonita’. [...] ‘Independente de você ser esteticamente bonita você precisa
ser uma pessoa educada, uma pessoa que transmite educação, uma pessoa que
transmite o bem. Porque isso é o que te faz ser bonita, entendeu?’ [...] Então
eu sempre fui uma pessoa que eu sempre cuidei bastante de mim. [...] Porque
se ela não tivesse me ensinado isso, eu até poderia ter uma autoestima boa, mas
eu acho que seria mais superficial. No sentido só de eu me achar bonita. E não
no sentido de eu cuidar de mim, eu querer o bem para mim, eu entender que às
vezes eu também sou importante em algumas situações. Ou as vezes, tipo…
35

É… Só consigo pensar inglês, “speak up”, sabe? Falar por você.” (Kiara, 22
anos)

Neste momento, Kiara explicita em seu discurso como os significantes de amor


próprio introduzidos por sua mãe desde que era pequena influenciaram na sua prática de
autocuidado. Também foi observado um reflexo positivo da relação mãe e filha na
autoestima da participante Pérola (22 anos). A participante, quanto questionada sobre a
influência de sua relação com sua mãe em sua autoestima, conta como a mãe sempre
“colocou-a para cima”. Pérola conta que sua mãe sempre fez muitos elogios para ela e
sempre usou palavras de afirmação, desde que a participante era pequena. Pérola diz
acreditar que isso, conscientemente ou conscientemente (sic), ficou na sua cabeça.
Lucia Moysés (2014), em seu livro “A Autoestima se constrói passo a passo",
coloca que a criança tem um processo de aprendizagem relacionado às referências e
comentários que são feitos a seu respeito. Assim, a criança vai fazendo aproximações do
significado real das referências, ao mesmo tempo que vai internalizando tais comentários,
até que os adota como seus. Para exemplificar sua afirmação, a autora conta um caso
prático que viveu quando trabalhava em uma escola. Moysés relata que no início do ano
letivo observou uma mãe chegar com o seu filho de seis anos na escola. Ao entregar a
criança para a autora, a mãe comenta: “Esse menino não presta. É o demo em figura de
gente. Pode meter a mão na cara dele, se for preciso. Ele é uma peste! Ninguém aguenta
com ele”. Moysés relata que, após menos de um mês, a criança havia tido diversas
atitudes consideradas negativas, como cortar a camisa de um colega, pisotear a merenda
de outro e estrangular gatos que circulavam na escola. Ao ter este tipo de atitude, a criança
proferia compenetrada: “Eu sou um peste. Sou o demo. Comigo ninguém aguenta”.
Segundo a autora, a criança já havia internalizado tudo aquilo que sua mãe afirmou
anteriormente a seu respeito. Lucia compartilha sua linha de raciocínio de que
provavelmente a criança nem soubesse direito o significado da expressão “é o demo em
figura de gente”, mas que mesmo assim, já havia internalizado seu sentido. O resultado,
segundo a autora, não é somente a apropriação dos significantes, mas também que o
menino se manteve coerente às expectativas maternas em relação a ele.
Assim, da mesma forma que Moysés (2014) atesta a importância da expectativa
materna e dos significantes dados à criança pela mãe, atesta-se nos discursos das
participantes do presente estudo o protagonismo destes na construção da autoestima.
Kiara coloca como as palavras de sua mãe refletiram em sua prática de autocuidado,
Pérola associa os elogios proferidos pela mãe a sua boa autoestima e Lizandra reitera que
36

a aceitação de sua mãe frente ao erro auxiliou-a na construção de sua própria autoestima
e capacidade de errar. Retomando os discursos anteriormente expostos, o significante
“perfeito”, atribuído a Antonieta por sua mãe no momento de seu nascimento, também
perpassa sua constante autocobrança refletida na construção de sua instável autoestima.
Elizabeth também coloca, de forma explícita, o peso que a expectativa de sua mãe teve
no seu desejo de sempre “fazer mais”. A autoestima de Donatela opera no mesmo sentido
de não se valorizar, ao ver a falta de valorização que sua mãe sustenta. Augusta explica
como a valorização que sua mãe sempre fez dela lhe promoveu segurança. Dessa maneira,
após a análise cautelosa do discurso das participantes segundo essa categoria de análise,
supõe-se que as expectativas, os significantes e a valorização materna, têm papel de
extrema importância na autoestima da mulher jovem.

4.2.2 Separação eu e outro

Outro aspecto que se fez presente de forma importante no discurso das


participantes entrevistadas foi a separação entre o eu e o outro. Uma das questões na
entrevista semi-dirigida abordava a relação da participante com sua mãe no período da
infância. Em diversas associações, atestou-se que o período da infância retrata uma fase
de grande - e complexa - proximidade com a figura materna.
Klein (1982), acredita que as relações entre o bebê e a sua mãe acabam
estabelecendo desde muito cedo o modelo básico de como ele se relaciona consigo mesmo
e com os outros durante a sua vida. Assim, dado que a relação entre a criança e sua mãe,
que na infância é extremamente próxima, é fundamental para estabelecer o modelo como
o sujeito se relaciona com ele mesmo no futuro, também é importante, portanto, para a
constituição da autoestima. No mesmo sentido, Freud (1976), em Inibição, sintoma e
angústia, afirma que a condição da criança de extrema e prolongada dependência da mãe
é determinante na formação da personalidade do ser humano. Supõe, novamente, que uma
vez determinante da personalidade, é também determinante da autoestima, um aspecto
desta.
Em sua entrevista, a participante Antonieta, quando foi questionada sobre sua
relação com sua mãe na infância, relata que neste período se considerava bastante tímida.
A isso, relaciona o fato de que era “bem apegada a sua mãe”. A participante apresenta
dificuldade de encontrar um significante que abarque o que queria expressar. Neste
37

processo de associação livre, entre pausas, fala que tinha “uma coisa bem assim” com sua
mãe. Mais tarde, define o significante: dependência.
Elizabeth, já no começo de sua entrevista, quando é orientada a falar um pouco
sobre si, começa contanto que adquiriu os sobrenomes da sua mãe quando adolescente,
já que os pais haviam optado por manter a filha apenas com os nomes do pai. Discursando
sobre sua personalidade, Elizabeth se define uma pessoa muito amorosa e que seu jeito
de amar consiste muito em servir o outro. Em uma associação, coloca:

“[...] acho que um negócio que me define muito é descobrir o limite entre eu e
o outro. Isso é uma coisa que por causa dessa característica de eu querer servir
é muito difícil, porque eu achava que eu tinha que ser, dar e estar muito para
fora [...].” (Elizabeth, 23 anos)

É interessante como a própria participante identifica em si a questão de descobrir


o limite entre o eu e o outro. Em um segundo momento, Elizabeth relata um pouco de um
transtorno alimentar que teve na adolescência (que será abordado com mais profundidade
em categorias de análise posteriores). Após associar aspectos deste transtorno a falas de
sua mãe, a participante diz, quando questionada sobre sua relação com sua mãe
atualmente:

“Nossa eu acho que as coisas se transformaram muito, principalmente porque


eu amadureci muito. E para reconhecer que muito das coisas que ela me dizia
era muito mais sobre ela do que sobre mim. Na hora que eu fiz essa separação
interna foi um alívio, foi tipo: ‘eu não te culpo, eu não te julgo’. Foi muito duro
para mim, mas eu sei da onde vem, sabe? Trouxe um pouco mais de compaixão
para a minha relação com ela.” (Elizabeth, 23 anos)

Elizabeth, neste recorte, conta como foi importante para o seu crescimento e para
a própria relação entre mãe e filha, entender que algumas coisas colocadas pela mãe
pertenciam somente a esta, em sua individualidade e complexidade. Faz-se relevante
colocar que Elizabeth encontra-se em um processo de análise com uma psicanalista, do
qual traz reflexões durante a entrevista. Uma delas, encontra-se abaixo:

“Entender quem a minha mãe é para entender quem eu sou. [...] Minha
terapeuta sempre fala ‘eles [meus pais] em mim’. Isso me ajuda muito a ter
clareza de que o tamanho que eu dou é o tamanho que as coisas têm. Já dei
muito grande, mas hoje não preciso porque sou adulta. E na hora que eu falo
isso para mim, ‘eu sou adulta’ também me dá um poder. Tem coisas que
quando se é adulto não dá para você esperar para os pais, não cabe mais a eles
ocupar o espaço” (Elizabeth, 23 anos)
38

Nesta reflexão, observa-se que Elizabeth é capaz de compreender e expressar a


influência que suas figuras primordiais têm em si - são partes de quem ela é. O discurso
de Elizabeth foi destrinchado nesta categoria de análise por ser um bom exemplo do
processo de separação que é necessário ocorrer entre o eu e o outro - filha e mãe - para
que o eu se constitua, enfim, como sujeito.
Em outras entrevistas, a proximidade entre mãe e filha no período da infância foi
detalhada de forma mais explícita. Isto encontra-se presente no discurso de Lizandra, por
exemplo:

“Quando eu era pequena a gente sempre foi muito, muito, muito ligada assim.
A gente era inseparável. Eu falava que não queria casar, não queria sair de casa,
eu queria morar com a minha mãe para sempre.” (Lizandra, 22 anos)

A participante mostra como o afastamento da mãe, mesmo em um futuro distante,


era inconcebível ao seu eu infantil. Neste mesmo sentido, Flora também discursa como
foi sua reação com a chegada do irmão, quando tinha três anos:

“Na verdade, foi meio conturbado porque quando o meu irmão nasceu eu fiquei
muito com ciúmes assim, por eu me sentir trocada. Eu ficava sendo um pouco
brava, meio raivosa, sabe? Meio querendo fazer coisas para não estar em casa.
Eu sempre ia dormir na casa da minha avó ou tipo na casa das minhas amigas.
Para evitar ficar em casa e não ter que lidar com essa coisa de ciúmes.” (Flora,
22 anos)

Flora conta, neste momento, como foi insustentável para si a ideia de que sua mãe
não se doaria, em totalidade, apenas para ela. Fainguelernt e Tosta (2018), discutem neste
sentido que Winnicott (1960/1999) afirma que a criança ao ganhar um irmão, em conflito
com o sentimento de ambivalência entre amor e ódio, passa a sentir raiva quando percebe
que o amor da mãe está disponível a outra pessoa que não ela. Assim, supõe-se que o
afastamento do vínculo materno, ao tornar-se não exclusivo, causa sofrimento.
Por outro lado, Donatela, que conta ser filha única, detalha a proximidade da
relação que tinha com sua mãe na infância:

“Minha mãe sempre foi muito protetora, tipo, absurdamente protetora. Às


vezes ela não conseguia, tipo, confiar no meu pai para me levar para passear
sozinho. Então era tipo… Ela era muito grudada comigo. Até no próprio
trabalho dela, ela tinha um escritório e eu ficava lá com as babás. A gente não
podia ficar na nossa casa, tinha que ficar lá para ficar sempre junto.” (Donatela,
21 anos)
39

Neste recorte, vemos como a mãe da participante não sustentava a separação da


filha no momento de trabalho, nem quando a outra figura primordial - o pai - que atenderia
aos seus cuidados. Assim como no caso de Elizabeth, antes exposto, Donatela também
reconhece as semelhanças entre traços dela e da mãe:

“[...] porque acho que é um ponto muito importante que as coisas que eu mais
criticava na minha mãe eram as coisas que eu mais tinha em mim, mas ao
mesmo tempo só quando eu aceitei ela como ela era foi quando eu consegui
mudar isso em mim [...].” (Donatela, 21 anos)

Assim, a participante reconhece em si aspectos de sua mãe. São traços, inclusive,


que a participante diz mais criticar na personalidade da figura materna. Segundo Marcos
(2011), a mãe e o seu amor (ou sua impossibilidade) são elementos essenciais para
abordar o feminino. A autora elucida que Freud (1933), em sua última conferência sobre
a sexualidade feminina, acentua o ódio ressentido em relação à mãe, que é considerada
responsável pela falta da filha. O autor também explica a intensidade deste ódio, ainda
segundo Marcos (2011), pela própria intensidade do amor que o precede. Sendo este amor
primeiro e tão intenso, é necessário o afastamento para que a menina possa se endereçar
ao pai - e esse afastamento é calcado na hostilidade e no ódio. (MARCOS, 2011). Neste
sentido, observa-se no discurso de Donatela a hostilidade pelos traços de sua mãe que
herdará, via identificação. Em um segundo momento, quando é questionada como é sua
relação com sua mãe atualmente, Donatela explicita o movimento de afastamento que é
necessário acontecer para que a filha possa exercer sua individualidade:

“Acho que eu entrar na vida adulta me deu coragem para viver a minha vida e
não viver como o modelo dela. Porque eu sempre fiz de uma forma de, tipo…
Acho que como eu sou filha única por bastante tempo isso foi sempre uma
maneira de querer dar orgulho para ela, de querer agradar. Quando eu cresci, a
partir dos meus 20, 21 anos, eu comecei a sentir que eu não precisava mais
agradar ela. Porque isso não adiantava. Acho que o fato de ser eu, viver a minha
individualidade, viver o que funciona para mim e não para ela, me fez melhorar
a relação com ela, muito. É… Me fez melhorar a minha relação com ela, me
fez me aceitar mais, aceitar ela como pessoa e... É isso, acho que eu quis parar
de ficar vivendo a base do modelo dela.” (Donatela, 21 anos)

Neste trecho, faz-se interessante a análise de que além do afastamento, a


participante traz em suas associações o reflexo deste movimento também em sua
autoestima: “Me fez me aceitar mais”. Assim, supõe-se que não só a proximidade, mas
40

também o afastamento entre mãe e filha, é constitutivo de autoestima. Na fala da


participante Augusta, também pode-se observar semelhanças:

“Sinto que às vezes tem algumas divergências de talvez valores em algumas


coisas. Só que tudo é muito conversado, então é muito fácil chegar em um
consenso. Acho que de tanto falar vai ficando mais claro que tem uma
diferença entre quem eu sou e quem a minha mãe é. Então isso é algo que
também venho trabalhando bastante para entender que não preciso agradar ela
e ela não precisa me agradar.” (Augusta, 22 anos)

Assim como Elizabeth e Donatela, Augusta também cita este processo de


reconhecimento e discernimento entre o que é seu e o que é de sua mãe (separação entre
o eu e o outro). Augusta também retoma a mesma temática trazida no recorte da
participante anterior, sobre compreender que não é necessário agradar a mãe - ou seja,
corresponder à expectativa materna (e ao Ideal do Eu). Faz-se relevante retomar que no
âmbito da Psicanálise, o desejo da mãe é de extremo protagonismo na vida da criança.
Segundo Rinaldi (2003), para Lacan, o significante do desejo da mãe é um significante
primordial que rege a vida da criança e a marcará para sempre. No caso da menina, o
autor chama a atenção também para a existência de uma certa nostalgia da filha em
relação à mãe, indicando que o corte simbólico introduzido pelo pai não é total. A
operação edípica deixa, portanto, um "resto" no destino feminino, fazendo com que a
mulher tenha mais propensão a ficar alienada no "desejo da mãe". (RINALDI, 2003).
Desta maneira, conclui-se que a especificidade da relação mãe e filha, no âmbito do
feminino, é relevante enquanto entende-se a propensão a corresponder ao que acredita-se
ser o desejo - expectativa - materna.
Outra participante que trouxe em suas associações tanto a proximidade quanto o
afastamento da mãe foi Pérola. A participante, quando questionada como era sua relação
com sua mãe durante a infância, relata:

“Eu sempre fui muito grudada com a minha mãe, sempre tive muito ciúmes
dela quando eu era pequena. Acho que teve uma vez até que eu… Enfim,
algumas vezes… Lembro de três vezes que eu vi ela, uma foto dela, com
alguma outra pessoa. Uma com meu primo, que quando eu vi eu fiquei com
tanta raiva que eu até bati a cabeça e tive que ir para o hospital. Outra com meu
irmão, que eu peguei uma foto deles e risquei. E uma foto da minha mãe
entrando no casamento dela com o meu tio, já que meu avô faleceu [...]. E aí
eu fiquei com tanto ciúmes que ela estava casando na minha cabeça com o meu
tio que eu cuspi na foto [...]. Eu acho que eu devia ter uns 5 anos. E… Assim,
sempre fui muito muito muito grudada com ela. Assim, de querer dormir com
ela, com meus pais. E eu sempre fui, enfim, muito muito grudada com ela.”
(Pérola, 22 anos)
41

Neste recorte, Pérola retrata de forma vívida a intensidade da relação que tinha
com sua mãe na infância. A participante relata sentimentos de tonalidade possessiva e
hostil perante qualquer representação do desejo de sua mãe endereçado a um outro que
não ela. Mais tarde, quando questionada como é sua relação com sua mãe hoje, Pérola
conta:

“Acho que mudou um pouco quando eu comecei a namorar. [...]. A gente


continua amiga assim, continuo próxima dela. Mas acho que um pouco menos.
Um pouco, não. Menos. Para ela foi muito difícil, e para mim foi difícil porque
para ela foi difícil. Mas acho que ela teve… Para mim ela nunca disse isso,
mas eu acho que… Sempre negou na verdade. Mas eu acho que ela sentiu um
pouco de ciúmes, sabe? [...] então acho que ver eu crescendo, eu tendo uma
experiência diferente assim, que é um namorado, que é meu primeiro
namorado, acho que foi difícil para ela assim. Por ver que eu me afastei um
pouco. Mas um afastamento normal, sabe? De crescimento e
amadurecimento.” (Pérola, 22 anos)

Neste segundo momento, Pérola explica como o afastamento da mãe se deu,


relacionando este ao seu relacionamento afetivo com o namorado. É interessante que
Pérola é capaz de avaliar que o movimento de afastamento da mãe é, além de normal,
importante para o seu processo individual de crescimento e amadurecimento.
Dessa maneira, observa-se que no discurso de diversas participantes (Elizabeth,
Donatela, Augusta, Lizandra e Pérola), pode-se identificar tanto o período de maior
proximidade com a mãe (sempre localizado na infância), como o período de afastamento
da figura materna (localizado hora na adolescência, hora atualmente). Sobre a
adolescência, também é visível que é um período de suma importância na relação mãe e
filha, no cerne da feminilidade. Esta categoria de análise será discutida a seguir.

4.2.3. Adolescência

Segundo Pereira (2005), a adolescência é um constructo teórico referente a um


processo caracterizado pelas mudanças psicológicas que ocorrem em um período de
transição entre a infância e a idade adulta. É um período onde, na Psicanálise, acredita-se
ocorrer a intensificação das pulsões. Anna Freud (1895-1982), ainda segundo autor antes
citado, caracteriza a adolescência como um período de conflitos internos, desequilíbrio
psíquico e comportamento inconstante ou errante.
42

Ademais, segundo Ayub (2009), a adolescência contempla também a reedição do


Complexo de Édipo. Nesta reedição, o objeto de desejo, interditado anteriormente, deverá
ser agora definitivamente abandonado para que seja possível o investimento libidinal em
novos objetos. Nesse sentido, o retorno às questões edípicas na adolescência se dá com
uma força ainda maior. A autora cita o pensamento de Pinheiro (2001), que afirma que o
objeto abandonado é o que primeiro criou o sujeito narcisicamente, permitindo que este
acreditasse ter a garantia do afeto incondicional. Dado que não há garantia de que os
objetos substitutos reproduzirão este modelo, são observados frequentemente sentimentos
ambivalentes em relação às figuras parentais. Assim, entende-se que a relação entre mãe
e filha também passa por uma reedição no período da adolescência, onde sentimentos
ambivalentes prevalecem.
Já na primeira fase do presente estudo, como antes analisado, a adolescência
mostrou-se como um período de maior afastamento entre mãe e filha. Como exposto, as
participantes que responderam o formulário se sentiram significativamente menos
valorizadas por suas mães no período da adolescência do que em outros momentos da
vida. Também foi possível observar que as participantes classificaram a relação como
mais positiva nos períodos da infância e atualmente do que na adolescência. Nas
entrevistas feitas na segunda fase do estudo, a adolescência também se destacou.
Antonieta, quando questionada como foi sua relação com sua mãe na adolescência, conta:

“A gente tinha umas brigas assim, que me deixavam muito ansiosa. Comecei
a perceber na adolescência que eu levava a opinião… Que a opinião da minha
mãe importava para mim de uma maneira muito absurda assim.” (Antonieta,
25 anos)

Antonieta elenca, aqui, como a opinião da mãe continuava extremamente importante para
ela. Atender à expectativa materna continuava um causador de ansiedade. Entretanto, a
participante relata que brigava com as mães com frequência. Mais tarde, quanto é
orientada a discursar sobre sua relação com sua mãe atualmente, Antonieta coloca que
apesar de ainda existirem desentendimentos normais de convivência, não existem mais
“nada de brigas maiores, como tinha na adolescência”. Donatela, no mesmo sentido,
conta: “De uma forma geral assim a gente brigava um pouquinho, dava umas quebradas
de pau assim.” (sic). Percebe-se, na fala da participante, o contraste entre a “a gente
brigava um pouquinho” e “dava umas quebradas de pau”. Expressa-se que existiam
43

conflitos. Em uma fala posterior, Donatela traz que acredita que foi o “momento de maior
afastamento” entre ela e sua mãe. Como antes visto, o afastamento é previsto e necessário
na adolescência.
Violetta, quando questionada sobre a adolescência, também relatou conflitos com
sua mãe. É interessante que em sua fala, a participante nomeia em sua fala “alguns
desentendimentos que eu acho que faz parte de mãe e filha, faz parte da adolescência”.
Observa-se como Violetta, em sua visão, entende o desentendimento como constitutivo
da relação mãe e filha e, ademais, constitutivo da adolescência. Flora, assim como as
demais participante, também discorreu sobre conflitos nesta relação durante a
adolescência:

“Tipo, eu tive vários conflitos com ela. Eu acho que ela queria que eu
amadurecesse e eu ainda não estava tão madura assim. [...] E aí eu acho que
ficou um pouco mais conturbada por ela querer que eu tivesse uma mentalidade
que eu ainda não tinha.” (Flora, 22 anos)

Na fala da participante, pode-se observar um traço característico da adolescência:


o processo de passagem entre o infantil e o adulto, o amadurecer. Em sua relação com
sua mãe, Flora relata ter se sentido demandada de um lugar de onde ainda não estava
pronta para responder: o de mulher adulta.
Tatiana, em seu discurso, detalhou de forma mais cautelosa que as participantes
anteriores os conflitos na relação mãe-filha. A participante, quanto questionada como foi
a relação com sua mãe na adolescência, conta:

“É, na adolescência começou a ser um pouco complicada [a relação]. Porque


eu acho que na adolescência eu comecei a descobrir mais sobre mim mesma
assim. [...] E aí eu comecei na adolescência mesmo a escolher meu estilo de
roupa, que não era mais as roupas que ela escolhia para mim como na infância
e tal. Enfim… Acho que isso afetou um pouco ela assim, nesse sentido de eu
procurar uma identidade. Eu lembro também de um episódio na adolescência
quando eu contei para ela que eu tinha beijado uma menina. Foi uma coisa
super assim, um choque para ela. É… E também a questão que eu acho que foi
na adolescência que eu comecei a descobrir a minha opinião política realmente
desvinculada dela e do meu pai. Acho que isso também gerou alguns atritos.
Então acho que a adolescência teve um pouco de atrito por conta disso assim.”
(Tatiana, 23 anos)

A participante traz como os conflitos com sua mãe na adolescência foram


acentuados pelo seu movimento de afastar-se dos valores e ensinamentos maternos na
procura, como a própria coloca, de uma identidade. Segundo Pereira (2005), na
adolescência aquelas crianças que antes acatavam as opiniões e diretrizes dos pais passam
44

a questionar e, frequentemente, a se rebelar contra os valores destes. É o que se observa


no relato de Tatiana, o movimento de questionamento e busca de valores independentes
dos trazidos por sua família. Ainda de acordo com o autor, a adolescência é uma época
de definição da personalidade (nomeado por Tatiana aqui como a procura de uma
identidade). Nesse processo, o idealismo infantil dirigido aos pais vai ser desconstruído,
e estes vão deixar de ser pessoas perfeitas para serem aceitos como seres humanos com
defeitos e qualidades. Este processo, como imagina-se, não é fácil para as mães. Lizandra,
em seu discurso, elucida como para sua mãe foi complicado este movimento:

“Na adolescência eu sinto que foi se distanciando um pouco nesse sentido


porque foi um momento que... É… Eu fui precisando do meu espaço. Mas eu
sinto que é um pouco uma aflição dela de sentir essa falta da gente ficar tão
juntas. Só que parecia que essa pressão dela em me cobrar que a gente não
estava ficando juntas me deixava mais afastada ainda. Então eu senti que a
gente foi criando umas barreiras. [...] Então acho que nessa fase da
adolescência foi um momento que a gente acabou se distanciando em questão
disso, momentos que eu estava me descobrindo em certas questões.” (Lizandra,
22 anos)

Lizandra também relata, assim como Tatiana, um movimento de definição de


personalidade, nomeado por ela como o “descobrir-se em certas questões”. Na fala de
Lizandra, expressa-se a dificuldade de sua mãe em aceitar e acolher esse seu movimento
de afastamento. Este momento, como antes posto, representa uma angústia na vida da
mãe. Isso atenua-se pois, neste momento em que “o ninho ficará vazio”, a mãe terá que
dar um outro sentido a sua vida. Algumas mães, apesar de desejarem conscientemente
que seus filhos tenham uma vida feliz e compensadora, os mantêm “amarrados à barra de
suas saias”, incentivando assim, sua dependência. (PEREIRA, 2005).
Em conclusão, reitera-se que o adolescente necessita reeditar sentimentos e
vínculos primários em relação às figuras parentais neste período da vida para que possam,
assim, revisar seus objetos internos e sua identidade. (JORDÃO, 2008). Observa-se,
portanto, que os relatos sobre o afastamento e os conflitos entre mãe e filha durante a
adolescência, que aparece no discurso de diversas participantes, é esperado e saudável
para o desenvolvimento como sujeito desejante. Segundo Jordão (2008) para os pais, e,
neste estudo, especialmente para as mães, trata-se de um processo angustiante e confuso,
uma vez que será necessário se deparar com questões como a separação, a diferenciação,
a finitude, a alterações de lugares e de papéis na dinâmica familiar, além, ainda, das
inevitáveis frustrações consequentes do crescimento e das escolhas dos filhos. Entretanto,
apesar das divergências com os pais, um aspecto da relação mãe e filha que apareceu
45

bastante valorizado no discurso das participantes do foi a escuta e comunicação. Este


aspecto será destrinchado abaixo.

4.2.5. Escuta e comunicação

Essa categoria de análise, diferente das anteriores, foi observada de forma


unânime em todas as entrevistas. Nos discursos, aparece que a escuta e a comunicação
entre mãe e filha é um dos aspectos de avaliação da relação: ou seja, a relação é boa
quando existe uma boa comunicação e a relação é pior quando esta é insuficiente. Em
diversos momentos, logo após a participante relatar uma boa relação com a mãe, relata-
se o ato do “contar”: eu conto tudo para ela. Outro significante usado diversas vezes neste
sentido para classificar a relação mãe e filha é o da amizade. Costa (1997), explica que
pais procuram modelos para pautar as relações com seu filho. Segundo o autor, desde
aquela época a amizade já se apresentava como um modelo recorrente, sendo avaliada
como o modelo ideal que deveria estabelecer-se nas relações familiares.
Dornelas e Garcia (2006), no mesmo sentido, propuseram em seu trabalho uma
análise descritiva da relação entre mães e filhas adultas. Em suas conclusões, relatam que
as participantes do estudo valorizaram a disponibilidade materna em ajudar e tentar
compreender situações. As filhas relataram que gostavam de saber a opinião de suas mães,
tanto no âmbito da vida pessoal quanto profissional. Os autores também relatam que a
cooperação entre mãe e filha busca facilitar a vida de ambas. A cumplicidade aparece
frequentemente nos resultados. A amizade também foi frequentemente trazida. Uma das
conclusões importantes dos autores é que a amizade entre mãe e filha não pode ser
considerada típica, uma vez que não é voluntária. Assim, colocam que a amizade na
relação mãe e filha pode ser entendida como reciprocidade de afeto e comportamento. Os
autores, ademais, afirmam que o apoio entre mãe e filha contribui para melhorar a
autoestima da filha (ponto primordial do presente trabalho), uma vez que saber que as
mães estão por perto ajuda as filhas a se arriscarem.
No presente estudo, encontrou-se resultados similares aos antes expostos.
Antonieta, quando questionada como é sua relação com sua mãe hoje em dia, iniciou sua
resposta relatando, logo após de avaliar que é uma relação boa, que “conta tudo” para sua
mãe. Já fica claro, neste pequeno ato, como a comunicação é um fator de avaliação da
relação. Elizabeth, no mesmo momento da entrevista que a participante anterior, relatou:
46

“Acaba que a minha mãe recorre a mim para falar sobre essas coisas. A gente
tem uma coisa meio de amizade também, de dividir como a gente está como
família, como a gente se ajuda. É… Então acho que é isso, eu sou um braço
sólido para ela recorrer. Eu acho que eu tenho, que eu criei há alguns anos,
uma estrutura emocional muito forte. [...] ela é bem forte e carinhosa, ao
mesmo tempo que acolhe muito. Ela tem um ouvido que é indescritível assim
para você desabafar.” (Elizabeth, 23 anos)

Elizabeth, portanto, detalha uma relação recíproca com sua mãe ao que diz
respeito à comunicação e ao apoio. A participante também relata como atualmente a
relação se transformou muito comparada aos outros períodos de sua vida (uma mudança
que retrata como positiva). Aqui, aparece o significante de amizade. No discurso de
Donatela, também vemos a relação de amizade como diretamente nomeada:

“Posso dizer que ela é quase minha melhor amiga, sabe de tudo da minha vida.
A gente compartilha de muita coisa. E sei lá, eu conto bastante coisa para ela
assim. Em comparação a minha vida inteira, é a época que eu conto mais, a
gente compartilha muito”. (Donatela, 21 anos)

Assim como Antonieta, também aparece enunciado no discurso de Donatela a


atitude do “contar tudo”, do compartilhamento aberto e sem restrições. Pode-se observar
também que a participante avalia de forma explícita que quanto mais “conta” para a sua
mãe, mais positiva parece a relação. Augusta, no mesmo sentido, elenca o diálogo e a
disposição para a compreensão como aspectos fundamentais de sua relação com sua mãe:

“Sempre teve muita troca, a gente sempre compartilhava muitas coisas. Eu


acho que sempre teve a intenção de ouvir e de entender as fases que eu estava
vivendo e que ela estava vivendo. Esse diálogo sempre foi muito importante.
E principalmente na adolescência e agora também na vida adulta. [...] É uma
relação muito boa, acho que a gente consegue conversar sobre bastante coisa.”
(Augusta, 22 anos)

Neste momento, Augusta resgata a importância da comunicação não apenas


atualmente, mas também na adolescência, o que as outras participantes ainda não haviam
relatado. Também aparece, assim como nos discursos anteriores, a valorização da relação
avaliada pelo quanto se conversa, conta ou compartilha. Violetta, em seu discurso, traz a
comunicação mais cedo do que as outras participantes, já no segundo momento, quando
é orientada a contar um pouco sobre sua mãe:

“Minha mãe… Ela é muito determinada. Muito mãe, mas também muito minha
amiga. Ela me entende muito, consigo conversar com ela sobre vários assuntos.
47

[...] Sempre tive essa relação de amiga com a minha mãe, de poder contar
tudo.” (Violetta, 22 anos)

Assim, fica claro como o compartilhar, nessa relação, é tão primordial que aparece
já quando a filha é orientada a descrever sua mãe. Novamente, observamos a avaliação
da relação como amizade. É interessante, porém, que a participante faz a distinção das
duas posições: “muito mãe, mas também muito amiga”. Ao usar o termo “mas”, Violetta
implica, em seu discurso, que o ser mãe e o ser amiga são para ela, pelo menos em algum
sentido, opostos. Tatiana, diferente das participantes anteriores, foi a primeira a trazer de
forma explícita a diferença nas opiniões dentro do âmbito do compartilhamento:

“Eu acho que ela respeita minhas singularidades, respeita o que eu penso.
Apesar de ela às vezes não concordar com o que eu penso, sabe? Ela sempre
está ali para ouvir o que eu acho sobre determinado assunto. A gente discute
coisas e assuntos, mas não briga. É uma discussão saudável. Eu acho que ela
tem um espaço, ela abre um espaço muito importante para eu conversar com
ela sobre vários assuntos.” (Tatiana, 23 anos)

Tatiana, neste recorte, valoriza não só a comunicação, mas também o respeito


frente às diferenças entre mãe e filha. Essa disposição de sua mãe detalhada acima é muito
valorizada pela participante durante a entrevista. Assim, da mesma forma que Garcia
(2006) encontra em seus resultados a valorização da disponibilidade materna em tentar
compreender as diversas situações, o discurso de Tatiana e Augusta aponta neste sentido.
Kiara, em um discurso similar às anteriores, resgata novamente o tema da amizade:

“A gente é bastante amigas, ela me conta bastante da vida dela. Às vezes


quando ela está triste, ou quando ela tem algum problema, quando está com
saudades da mãe dela. E quando eu tenho um problema ela sempre me ajuda.
Então acho que ao longo do tempo foi melhorando e amadurecendo.” (Kiara,
22 anos)

Destaca-se, entretanto, que diferente das participantes anteriores, Kiara avalia a


relação de amizade pelo quanto a mãe compartilha com ela, e não pelo oposto como antes
visto. Em seu discurso, a participante relata recorrer à mãe apenas nas situações de
conflito. Pérola, em contrapartida, relata quando questionada sobre sua relação com sua
mãe na adolescência:

“Acho que eu sempre tive uma relação muito boa com ela também, tudo que
acontecia ela era a primeira pessoa que eu queria contar. Assim, sempre ouvi
muitos conselhos dela. Acho que a gente continuou muito grudada, mas acho
que de um jeito diferente. Eu sempre via minha mãe muito como minha amiga
assim, sabe? De contar segredos e enfim... Acho que é isso.” (Pérola, 22 anos)
48

Assim, ao contrário de Kiara, a participante avalia a qualidade da relação com


base em sua iniciativa de compartilhamento com sua mãe. Sobre a reciprocidade no
compartilhar, Pérola não tece nenhum comentário durante a entrevista. Novamente
aparece a temática da amizade. Flora também resgata o tema, em seu discurso:

“Eu sinto que ela é muito minha amiga, isso é muito bom. Ela sempre quer
ouvir, ela é super empática. [...] Mas ao mesmo tempo tipo, eu sempre fui muito
amiga dela. Sempre pude contar com ela. Ao mesmo tempo que tinha um
pouco dessa questão de se afastar por conta do ciúmes, sempre ela tentou ser
próxima e eu sempre fui recíproca a isso. Contar das minhas amigas, dos
namoradinhos. Essas coisas. [...] Fora isso continuou muito essa questão da
amizade, reciprocidade, empatia. A gente sempre conversou muito, sempre
procurou se entender e tal.” (Flora, 22 anos)

Flora avalia, apesar do conflito de ciúmes do seu irmão que relata ter permeado a
relação mãe e filha, que a amizade e o apoio sempre fizeram parte do vínculo. A
reciprocidade, diferente de Kiara e Pérola, aqui é enunciada de forma clara e explícita.
Assim, nove das dez participantes da segunda fase do estudo valorizaram, nas
relações com suas mães, a comunicação. Entretanto, o discurso de Lizandra aconteceu
em outro sentido, também igualmente importante. A participante coloca:

“E apesar da gente sempre ter sido próxima, nunca teve muito uma
proximidade no sentido de contar as coisas. Ela nunca foi muito de perguntar
assim da minha vida, dos detalhes da minha vida. De meninos, de festa… De
tudo. [...] E eu sempre fui muito fechada em relação a todos, não só em relação
a ela. Nunca fui de falar muito sobre a minha vida pessoal. E como eu não
sentia um movimento dela em querer saber eu também não contava. E aí eu fui
sentindo que foi criando uma distância entre a gente principalmente nesse
sentido assim, que eu não me sentia confortável em me abrir por questões
pessoais e como não tinha um movimento dela também eu acabava não me
abrindo [...]. Então foi se distanciando não nesse sentido físico, mas de
questões mais emocionais. [...] Porque é uma coisa que tem um desejo muito
forte meu, mas por eu ter crescido sem isso é muito difícil eu chegar um dia e
simplesmente falar: ‘olha mãe, aconteceu isso, isso e isso’. Então ainda sinto
esse distanciamento.” (Lizandra, 22 anos)

Lizandra retrata, portanto, que em sua relação com sua mãe não existia o
compartilhamento de aspectos da vida pessoal. É interessante como o discurso da
participante, apesar de ser diferente dos anteriores, também deixa claro o quão importante
a participante julga que é para a relação este tipo de compartilhamento. Nota-se, também,
que Lizandra elenca sentir falta do espaço de escuta, do interesse de sua mãe em ouvi-la.
49

Dessa forma, é possível concluir que em todas as entrevistas foi observado que a
comunicação e a escuta entre mãe e filha é de imensa importância na avaliação da relação
e da proximidade desta. Apesar de não ter aparecido de forma concreta a associação da
comunicação entre mãe e filha com a autoestima, supõe-se que esta deve existir, uma vez
que a relação mãe e filha é essencial na formação da personalidade (como antes visto) e
a comunicação é avaliada, pelas participantes, como importante na qualidade desta
relação.

4.2.4. Beleza: estética, corpo e aparência física

Uma outra temática que se destacou de forma importante no discurso das


participantes foi a da estética, do corpo e da aparência física. Na fala das participantes,
entende-se uma clara associação entre autoestima e beleza. Segundo Leal, Catrib,
Amorim e Montagner (2008), no Brasil a população mais atingida pela crença de que o
corpo é infinitamente maleável são as mulheres, mais especificamente as adolescentes e
jovens adultas do sexo feminino. Os autores, além de perceber o aumento do interesse
em cirurgias estéticas eletivas, postulam que os limites do corpo e da psique são
extrapolados no esforço de atingir modelos que, por serem irreais, são inatingíveis. Neste
raciocínio, os mesmos colocam que as práticas sociais nocivas incluem, por exemplo,
regimes alimentares radicais, lesões corporais causadas pelo excesso de exercícios físicos,
uso danoso de anabolizantes ou medicamentos para emagrecer e distúrbios de imagem
que acompanham bulimias e anorexias. Isso, além da banalização das intervenções
estéticas.
Vilhena, Medeiros e Novaes (2005), ao discutir a violência da imagem, entendem
que a imagem da mulher, dentro da cultura, confunde-se com a da beleza. No trabalho
destes autores, encontra-se que um dos pontos mais enfatizados no discurso da mulher é
justamente que a mulher deve ser bonita ou, se não, não será totalmente mulher. No
mesmo sentido, Silva e Rey (2011), ao fazerem uma articulação entre a beleza, a
feminilidade e a Psicanálise, perguntam-se qual a possível função psíquica exercida pelos
ideais de beleza propagados na cultura sobre a constituição do feminino. As autoras, em
suas observações do contexto, constatam um grande movimento especialmente por parte
das mulheres em busca de um ideal de perfeição estética, fundamentado em um culto ao
corpo belo e perfeito. Resgatando a Psicanálise, retomam o texto de Freud (1932/2006f),
50

“Feminilidade”, onde o autor salienta que a Psicanálise não busca fazer a descrição do
que é uma mulher - devido à dificuldade desta demanda.
Ao longo de seu trabalho, Silva e Rey (2011) seguem discutindo que, para Freud,
a menina se dirige para a feminilidade após o reconhecimento da diferença sexual, que
leva à renúncia da masculinidade. A decepção pela ausência do pênis leva a um
afastamento da mãe, que se torna uma rival ao passo que a menina torna-se mulher. Mais
tarde, as autoras afirmam que Freud apresenta um novo pressuposto na tentativa de dar
conta da constituição da feminilidade: a partir de 1931, o autor passa a enfatizar a relação
mãe-filha como ponto fundamental para a estruturação feminina. A relação mãe-filha
ganha destaque na feminilidade, segundo as autoras, devido ao fato de as instâncias
psíquicas de Eu Ideal e Ideal do Eu (discutidas anteriormente) serem constituídas na
relação inicial com as figuras paternas e maternas.
Uma vez parte de uma cultura, todas as mulheres internalizam referenciais de
valores estéticos do que corresponde a beleza. Entretanto, Silva e Rey (2011) afirmam
que o que vai determinar a função que o ideal de beleza irá exercer no psiquismo está
relacionado à experiência particular de constituição psíquica de cada uma, ou seja, à
relação com as figuras parentais e, portanto, à construção do Eu Ideal e do Ideal do Eu.
Dessa forma, entende-se que a relação mãe-filha, por ser de imenso destaque na
construção do Eu Ideal e do Ideal do Eu e, portanto, na estruturação da feminilidade, é
também relevante na elaboração da autoestima da mulher. Ao longo das entrevistas,
diversas participantes discutiram o tema da beleza. Uma das questões da entrevista
consistia em perguntar para a participante como ela fez a avaliação da sua autoestima.
Nesse momento, Pérola coloca que acredita ter uma boa autoestima por considerar-se uma
pessoa bonita e atraente. Flora, ao ser questionada da mesma maneira, responde:

“Ai, eu pensei um pouco na minha aparência. Que eu acho que eu tenho uma
autoestima boa em relação a minha aparência física. Já tive muitas questões
com o meu corpo e tudo mais. Mas acho que tem melhorado, não é que eu me
olho no espelho e falo: ‘Nossa, que coisa horrorosa’. Então eu acho que é mais
para sim do que para não.” (Flora, 22 anos)

Neste recorte entende-se que Flora, no mesmo sentido de Pérola, atribui ao


significante autoestima o significado da opinião acerca da beleza e da aparência física.
Augusta, quando questionada também sobre sua avaliação de sua autoestima, coloca:
51

“Eu acho que não está muito relacionado a como você vê o seu corpo
diretamente. Acho que está muito relacionado a forma como você consegue
entender quais são seus valores, consegue realmente se sentir íntegra nas coisas
que você faz. Então eu sinto que talvez a gente tem (sic) muito a visão de que
autoestima é algo que está totalmente relacionado a um corpo bonito, a mostrar
nosso corpo físico. Eu acho que por um outro lado eu vejo muito mais como
conseguir se posicionar nas relações, conseguir mostrar quais são seus valores
e seus pontos de vista. Mais essa segurança mesmo.” (Augusta, 22 anos)

Augusta, então, coloca-se na contramão do que foi colocado pelas participantes


anteriores, Flora e Pérola. Para esta participante, a autoestima tem uma dimensão maior
do que a estética, mas também aspectos de autoconfiança. A participante, que apresentou
bons resultados na escala de autoestima, afirma que acredita que sua relação com sua mãe
influenciou nesta. Kiara, quando questionada no mesmo sentido, introduziu o significante
da vaidade:

“E eu sempre via ela se arrumar. Toda vez que ela se arrumava, eu ficava na
cama dela vendo. Acho que essa parte de se arrumar, de vaidade mesmo, eu
peguei muito disso. Porque eu sempre vi ela colocando roupa, tirando roupa.
‘Ai, essa não ficou boa. Acho que vou assim’. Era bizarro porque minha mãe
ficava 8 horas em pé e ela ficava de salto. E na loja você não podia sentar, se
você sentasse você era demitida, sabe? Uma coisa desumana. E eu sempre vi
essa vaidade e acabei pegando para mim também.” (Kiara, 22 anos)

Kiara reconhece em sua fala o traço identificatório em relação a vaidade que


herdou ao observar sua mãe na infância. É interessante como a participante traz em seu
discurso a indecisão da mãe ao se arrumar, o que torna o processo do arrumar-se de uma
tonalidade mais negativa. A participante, em um momento anterior da entrevista, também
trouxe memórias sobre uma fase da vida mais difícil para ela:

“Porque querendo ou não, como ela contava muito comigo, eu fiquei


sobrecarregada. Porque eu pensava ‘eu não posso parecer fraca para ela’ [...]
Então foi uma época que eu absorvi muito. E… Aí foi também
consequentemente a época que eu mais engordei, porque eu precisava
descontar em alguma coisa. Precisava conversar com alguma pessoa, mesmo
fazendo terapia, sabe? Acho que foi essa época.” (Kiara, 22 anos)

Kiara, neste momento, discorre sobre a pressão que sentia em parecer forte para a
mãe no momento em que ela estava passando pelo processo de divórcio de seu pai. A
participante relaciona a sobrecarga emocional do período com a necessidade de descontar
em algo: a comida. Assim, percebe-se o reflexo da relação mãe e filha no corpo. Kiara
em seu discurso também elucida a necessidade de expressar pela linguagem o que estava
52

sentido: “Precisa conversar com alguma pessoa”. A comida também foi uma temática
presente na fala de Lizandra:

“Eu já tive uma fase da vida que eu tinha uma autoestima muito para baixo
assim, não de demonstrar para os outros mas de não estar feliz com meu corpo,
de não estar feliz comigo, de sempre achar um erro em alguma coisa, querer
mudar alguma coisa. [...] Então isso de antes eu tinha muito é… Uma nóia com
exercício e com comida. Então assim, eu comia uma colher de nutella que eu
amo e ficava me sentindo super culpada e ficava mal comigo achando que eu
estava gorda e… Enfim, pensando mil coisas.” (Lizandra, 22 anos)

Lizandra, em sua fala, relaciona sua baixa autoestima a um momento no qual não
se sentia satisfeita com seu corpo. Neste sentido, a participante entende uma relação
conflituosa com exercício físico e alimentação. O engordar, aqui, ganha uma tonalidade
negativa. Em um segundo momento, quando questionada se acredita que a relação com
sua mãe influenciou em sua autoestima, Lizandra detalha como era a posição de sua mãe
frente ao conflito antes relatado:

“Então assim, de: ‘Filha, você está com vontade de comer, come. Não tem
problema. Come o doce’. Ela é tão viciada em doce quanto eu. Então sempre
teve um movimento dela de me fazer manter o equilíbrio nessas coisas que
acabam afetando minha autoestima. Então não só em relação a comida e
exercício, mas mesmo em relação a stress, dia-a-dia.” (Lizandra, 22 anos)

Neste trecho, Lizandra relata como sua mãe manteve, durante sua vida, um
movimento de ajudar a filha a manter o equilíbrio dentro das coisas que influenciavam na
sua autoestima. A filha também afirma que estes aspectos eram não só a alimentação e o
exercício físico, antes trazidos por ela como conflituosos em determinada fase de sua
vida, mas também a outros aspectos cotidianos. Lizandra afirma entender que sua relação
com sua mãe teve uma influência positiva em sua autoestima. Elizabeth, Donatela e
Violetta trouxeram discursos que vão no sentido contrário. Elizabeth, quando orientada a
falar sobre sua relação com sua mãe, começa a relatar que sua relação com sua mãe “se
consiste muito em torno da alimentação”, por ter experienciado na adolescência distúrbios
alimentares e de imagem. A participante conta:

“Eu acho que a parte da adolescência foi muito dura, porque enfim, eu engordei
muito durante um período, durante o meu estirão, e ela ficava: ‘cuidado para
não comer muito, porque quando eu tinha sua idade eu engordei.’ [...] Eu tive
muito medo de comer depois e achava que eu não seria digna de ser amada por
causa da comida, isso foi muito, muito duro. E enfim, foi muito conturbado,
foi muito triste. Muito sofrimento da minha parte. [...] E minha mãe também
teve muita… Eu não queria falar que a responsabilidade é dela, mas ela
53

transferiu muito medo para mim. E… Eu fazia muito balé, jazz, e ela falava
que só era bonito jazz e balé se eu estivesse magra. Então também… Com 15
anos eu desenvolvi bulimia, foi muito duro.” (Elizabeth, 23 anos)

Elizabeth conta, neste recorte, como sua relação com sua mãe influenciou no
distúrbio alimentar que desenvolveu, a bulimia. Marini (2016), em seu trabalho “‘Você
poderá vomitar até o infinito, mas não conseguirá retirar sua mãe de seu interior’ -
psicanálise, sujeito e transtornos alimentares”, afirma que a anorexia e a bulimia são
transtornos numérica e caracteristicamente femininos, relacionados a um ideal de
feminilidade. Sobre a gênese dos transtornos alimentares, a autora afirma que a relação
mãe-filha tem um papel fundamental, ainda que não se deva atribuir culpa ou
responsabilidade à mãe por se tratar de uma complexa dinâmica entre mãe e filha. Vemos
a relação do transtorno com o ideal de feminilidade na fala da mãe trazida pela filha que
suas atividades só seriam valorizadas como belas se fosse magra. Em outro momento da
entrevista, resgatou-se que na primeira fase do estudo Elizabeth afirmou não acreditar ter
uma boa autoestima. Quando questionada como fez essa avaliação, a participante relata:

“[...] Acho que também por essa questão do peso, da imagem. É… Não me
sinto bonita. Eu genuinamente não me acho bonita [...] Vou falar uma palavra
muito dura, mas de me aceitar como mulher. Mesmo.” (Elizabeth, 23 anos)

A fala da participante expressa de forma dura como sua opinião acerca de sua
imagem influenciou na avaliação que faz de sua autoestima. Além disso, transmite a
relação da autoestima com a feminilidade: por não se sentir bonita, Elizabeth não
consegue se enxergar mulher. Sabe-se, dentro da psicanálise, que a questão “O que é ser
uma mulher?” reside no seio da histeria. Donatela, na primeira fase do estudo, assim como
Elizabeth, também afirmou que não acredita ter uma boa autoestima. Quando questionada
como fez essa avaliação, a participante conta:

“Então, esse é um ponto bem complicado. Eu sinto que tipo… Desde


pequenininha tive muito problema com corpo porque eu era muito gordinha,
fui gordinha a vida inteira. E a minha mãe ela tipo… Ao mesmo tempo que ela
me deixava comer doce, ela sempre se preocupou muito com o meu peso
também. Mas isso é geracional também, posso dizer que a minha avó era super
neurótica com isso, ela trancava a geladeira, escondia doce e umas coisas
assim, absurdas. Mas que foi o que a minha mãe aprendeu sabe? Eu fui
descobrir isso depois. Mas a minha mãe sempre me trouxe que eu era especial,
que eu era muito legal, importante e tal. Tipo sempre me trouxe que eu era
linda, mas ao mesmo tempo tipo eu sempre… Ela me metia em trinta mil
esportes para fazer, tipo… Dietas… Eu acabava seguindo as dietas dela. Ela
fazia dieta, eu fazia também.” (Donatela, 21 anos)
54

Donatela, neste momento, traz um aspecto muito interessante da feminilidade: a


transmissão geracional desta. Por meio do discurso da participante, supõe-se que a relação
de sua mãe com sua avó influenciou, também, em sua autoestima. É relevante também
que Donatela entende que o discurso de sua mãe de afirmar que era especial e importante
nem sempre condizia, em sua perspectiva, com suas atitudes. Apesar de Donatela colocar
que sua mãe a elogiava, a posição da mãe perante seu corpo ainda influenciava sua
autoestima. Segundo Ricciardelli e Clow (2009), as sensações de um indivíduo na
avaliação de si mesmo (e, consequentemente, sua autoestima) pode ser afetada pelo modo
como uma pessoa acredita que a sociedade valoriza seu corpo.
Violetta, em movimento similar, quando questionada como fez a avaliação
positiva de sua autoestima, entende que tem uma boa autoestima pois considera-se
determinada e dedicada. Entretanto, a paciente relata que quando se questiona sobre o que
vê no espelho, existem várias coisas que a incomodam. Quando questionada, em um
segundo momento, se acredita que a relação com sua mãe influenciou na avaliação que
faz da sua autoestima, a participante relata:

“Muito. Desde pequena. Quando eu era pequena eu era muito gordinha, muito
acima do peso. E ela sempre pegou muito no meu pé com isso. Quando eu tinha
sei lá, dez, nove anos. Eu fiz uma mega de uma dieta, ia em vários médicos.
‘Você precisa ficar magrinha’. Também é óbvio que por uma questão de saúde,
não só estética, mas sempre teve muita pressão nisso. Então isso fez com que
minha cabeça também virasse um pouco ‘eu só vou ser bonita se eu tiver o
cabelo x, se eu tiver o corpo x’. Porque também tinha esse negócio do cabelo,
sei lá eu tinha cinco anos e minha mãe fazia escova no meu cabelo porque ela
gostava do meu cabelo lisinho. Ela falava: ‘seu cabelo fica bonito lisinho, não
gosto dele do outro jeito’. Entre outras coisas. Então meio que eu criei uma
imagem em cima disso, claro que não só da minha mãe, de todo o resto. Mas
teve essa influência dentro de casa também. Isso interferiu bastante.” (Violetta,
22 anos)

A participante detalha de forma clara como as opiniões de sua mãe sobre sua
aparência, principalmente seu corpo e cabelo, influenciaram na avaliação que faz de sua
autoestima. Outro ponto de muita relevância é que apesar de Violetta associar que criou
uma imagem em cima das experiências com sua mãe, também atribui esta imagem a “todo
o resto”, como nomeia. Aqui, pode-se entender a influência da cultura na autoestima.
Portanto, como visto, a temática da beleza, no âmbito da estética, do corpo e da
aparência física, foi um tema recorrente na entrevista. Com base nos dados expostos, é
55

possível entender que a relação mãe-filha influencia na avaliação que as participantes


fazem de sua autoestima, com destaque para o aspecto estético desta.
56

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como discutido anteriormente, o objetivo deste trabalho foi investigar se a relação


mãe e filha exerce alguma influência na autoestima de mulheres jovens. Considerando os
dados expostos tanto na primeira quanto na segunda fase do estudo, supõe-se que a
relação mãe e filha tenha influência na autoestima de mulheres jovens de 20 a 25 anos
que estão cursando ensino superior atualmente. A esses resultados, faz-se a ressalva de se
tratar de uma amostra de 131 participantes na primeira fase e 10 na segunda, de um
contexto socioeconômico restrito e similar. Assim, para resultados mais abrangentes,
seria necessária a expansão da amostra e do contexto socioeconômico de suas
participantes.
Entendendo o contexto psicanalítico abordado anteriormente da importância da
função materna na constituição psíquica do sujeito, supõe-se que a autoestima, por ser um
aspecto da personalidade do sujeito, também é influenciada pelo papel exercido pela mãe.
Ademais, entende-se que dentro dessa influência, destacam-se os aspectos de valorização
e expectativa materna, separação eu e outro, adolescência, escuta e comunicação e beleza
(estética, corpo e aparência física). A relação mãe-filha no intermédio de todos esses
aspectos parece, segundo os resultados analisados, exercer influência na autoestima da
mulher jovem.
Faz-se, por último, o recorte de que a coleta de dados foi feita no contexto da
pandemia do COVID-19. Entendendo que a COVID-19 tem provocado, além do medo
de contrair a doença, a sensação de insegurança em todos os aspectos da vida, da
perspectiva coletiva à individual, do funcionamento diário da sociedade às modificações
nas relações interpessoais (LIMA et al,. 2020; OZILI & ARUN, 2020), é possível que os
resultados do presente trabalho tenham sido também influenciados pelo contexto no qual
os dados foram colhidos. Para trabalhos futuros, portanto, sugere-se além da expansão da
amostra, e do método que não se restrinja ao contexto online, uma possível investigação
fora do contexto sócio-histórico do COVID-19.
57

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São Paulo, SP: Martins Fontes, 1999. (Obra original publicada em 1960).
62

7. APÊNDICE A

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Eu, ______________________________ , R.G.:___________________, declaro,


por meio deste termo, que concordei com a minha participação na pesquisa de campo
referente ao projeto intitulado “A autoestima de mulheres jovens e a relação mãe-filha:
um estudo psicanalítico”, desenvolvido pela aluna Roberta Del Grande de Souza, do
Curso de Psicologia na Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Fui informada, ainda, de que a pesquisa
é orientada pela Profª Dra Fátima Regina Pires de Assis, a quem poderei contatar a
qualquer momento que julgar necessário através do telefone 3670.8320 ou e-mail
psicopuc@pucsp.br.

Afirmo que aceitei a minha participação, sem receber qualquer incentivo


financeiro e com a finalidade exclusiva de colaborar para o sucesso da pesquisa. Fui
informada do objetivo estritamente acadêmico do estudo, que, em linhas gerais é
investigar a autoestima de mulheres jovens e fatores que contribuem ou não para a mesma.
Fui também esclarecida de que os usos das informações obtidas estão submetidos às
normas éticas destinadas à pesquisa envolvendo seres humanos, da Comissão Nacional
de Ética em Pesquisa (CONEP) do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde.

A colaboração se fará de forma anônima. Terão acesso aos dados coletados e à


sua análise apenas a pesquisadora e sua orientadora.

Estou ciente de que, caso eu tenha dúvida ou vislumbre algum prejuízo advindo
desta participação, poderei contatar a orientadora da pesquisa, ou, ainda, o Comitê de
Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (CEP-PUC/SP),
situado na Rua Ministro de Godoy, 969 – Térreo, Perdizes, São Paulo (SP), CEP: 05015-
000, telefone: 3670.8466.

A pesquisadora me ofertou uma cópia assinada deste Termo de Consentimento


Livre e Esclarecido, conforme recomendações da Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa (CONEP).
63

Fui ainda informada de que posso me retirar desse estudo a qualquer momento,
sem prejuízo para seu acompanhamento ou sofrimento de qualquer sanção ou
constrangimento.

São Paulo, ___ de __________ de _____

Participante __________________________________________

Pesquisadora ________________________________________
64

8. APÊNDICE B

Questionário Autoral – Google Forms (Constituído por Anexo A e Apêndice B)

Sessão 1 – Critérios de Inclusão na Amostra

1. Com qual gênero você se identifica?

- Feminino

- Masculino

- Outro

*Apenas as participantes que selecionaram “Feminino” foram consideradas.

2. Qual sua idade?

- 20

- 21

- 22

- 23

- 25

- Outro

*As participantes que selecionaram “Outro” foram desconsideradas.

3. Você está atualmente fazendo um curso de ensino superior? (Faculdade)


65

- Sim

- Não

*As participantes que selecionaram “Não” foram desconsideradas.

Sessão 2 – Contexto Socioeconômico

1. Somando a sua renda com a renda das pessoas que moram com você, quanto é,
aproximadamente, a renda familiar mensal?

- Nenhuma renda

- Até um salário-mínimo (até R$ 1.100)

- De 1 a 3 salários-mínimos (de R$1.100 até R$3.300)

- De 6 a 9 salários-mínimos (de R$6.600 até R$9.900)

- De 9 a 12 salários-mínimos (de R$9.900 até R$12.200)

- De 12 a 15 salários-mínimos (de R$12.200 até R$15.500)

- Mais de 15 salários-mínimos (R$15.500)

2. Qual é o nível de escolaridade da sua mãe?

- Não sei

- Ensino fundamental incompleto

- Ensino fundamental completo

- Ensino médio incompleto

- Ensino médio completo

- Superior incompleto

- Superior completo
66

3. Qual é o nível de escolaridade do seu pai?

- Não sei

- Ensino fundamental incompleto

- Ensino fundamental completo

- Ensino médio incompleto

- Ensino médio completo

- Superior incompleto

- Superior completo

4. A instituição na qual você cursa ensino superior atualmente é pública ou privada?

- Instituição Pública

- Instituição Privada

Sessão 3 - Neste momento aparece o Anexo A (Escala de Autoestima Rosenberg –


Adaptação de Hutz, 2010)

Sessão 4 – Relação Materna (Questionário Autoral)

1. Como você definiria sua relação com sua mãe atualmente?

- Excelente

- Boa

- Normal

- Ruim
67

- Muito ruim

2. Como você definiria a sua relação com a sua mãe durante a sua infância?

- Excelente

- Boa

- Normal

- Ruim

- Muito ruim

3. Como você definiria sua relação com a sua mãe durante a sua adolescência?

- Excelente

- Boa

- Normal

- Ruim

- Muito ruim

4. Você considera sua mãe uma inspiração ou um modelo?

- Sim

- Parcialmente

- Não

5. Sobre a pergunta anterior, por quê?

*Resposta aberta.

6. Escolha três palavras que definem sua relação com a sua mãe

*Resposta aberta.
68

7. Você considera sua relação com a sua mãe próxima?

- Muito próxima

- Próxima

- Normal

- Não

8. Sua mãe já conversou com você sobre autoestima, amor próprio, ou algum tema
semelhante?

- Sim

- Não

9. Você se sente valorizada pela sua mãe atualmente?

- Em todas as minhas ações

- Na maioria delas

- Em algumas

- Em nenhuma

10. Você se sentia valorizada pela sua mãe na sua adolescência?

- Em todas as minhas ações

- Na maioria delas

- Em algumas

- Em nenhuma

11. Você se sentia valorizada pela sua mãe na sua infância?

- Em todas as minhas ações


69

- Na maioria delas

- Em algumas

- Em nenhuma

12. Há alguma característica sua que sua mãe demonstre algum tipo de valorização?

- Sim

- Não

13. Em caso afirmativo na questão anterior, qual(is)?

*Resposta aberta.

14. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na sua maneira de ser em
algum sentido?

- Sim

- Não

15. Se sim, essa influência foi positiva ou negativa?

- Positiva

- Negativa

- Não acredito que a relação com a minha mãe influenciou na minha maneira de
ser.

16. Sobre a pergunta anterior, por que essa influência foi positiva ou negativa?

*Resposta aberta.

17. Na sua opinião, que fatores influenciam sua maneira de ser?

*Resposta aberta.

18. Você acredita ter uma boa autoestima?


70

- Sim

- Não

19. Você tem algo a acrescentar? Estou à disposição por aqui ou pelo e-mail
(robertadelgrande1@gmail.com)

*Resposta aberta

20. Caso você esteja disposta a conversar mais sobre o assunto e participar da segunda
fase do estudo, por favor deixe seu nome, telefone e e-mail abaixo. Todas as respostas da
pesquisa são confidenciais e usadas somente para fins acadêmicos sem identificação da
participante. Obrigada.

*Resposta aberta
71

9. APÊNDICE C

TRANSCRIÇÃO DE ENTREVISTAS

Antonieta
19 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: Sou Antonieta, tenho 25 anos e faço Psicologia. Eu… Pera… (Pode falar
o que você quiser, o que você acha importante). Ah, eu sou.. eu tenho.. A minha família..
Eu sou tia já, tenho 2 irmãos mais velhos. Eu moro com os meus pais e com meu irmão.
Eu acho que o que tem pra saber de mim é meio que isso.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: Ah, eu tenho uma relação muito boa agora com a minha mãe assim, mas
eu já não tive. Eu já tive uns atritos com a minha mãe. Nada muito grande assim, mas
dava umas brigas. Eu era a única que morava aqui em casa dos meus irmãos antes, era
uma convivência mais assim. Tudo vinha para mim assim. Minha mãe ela me teve mais
velha, então ela já me teve com 43 anos. Na época ela ficou bem assustada quando soube
que estava grávida. Tenho uma diferença bem grande com os meus irmãos. E… Então
quando, minha mãe até fala assim que quando eu nasci, quando ela estava grávida ela
nem se importava muito qual era o sexo, ela nem sabia do sexo quando eu fui nascer. Ela
era muito preocupada se eu ia nascer saudável né, se eu ia ter alguma malformação, e era
meio isso assim. Naquela época não era tão comum ter filho mais velho. Ela até fala que
quando nasci a primeira coisa que ela perguntou foi “é perfeito?” E também outra coisa
é que eu acho que minha mãe assim, nossa relação de apego essas coisas, minha mãe é
uma mãe… não é uma mãe assim super carinhosa do tipo ai “te amo”, que te abraça
sempre. Não é. É uma mãe super presente, eu acho agora que foi uma mãe superprotetora,
sabe? Às vezes até meio crítica né, sabe? Agora que eu estou mais velha e tudo mais é
uma relação boa. Minha mãe é bem agitada, sempre está fazendo alguma coisa. Não é
assim uma pessoa que consegue ficar sem fazer nada. Está sempre fazendo alguma coisa,
é ansiosa, sabe? Esforçada, resolve muito as coisas. Tem essa personalidade assim.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.

Participante: Eu era muito apegada a minha mãe que eu me lembre assim. Eu era bem
tímida quando eu era criança então eu era bem apegada assim a minha mãe, acho que eu
tinha uma coisa bem assim com a minha mãe. Eu tinha uma… sei lá… Uma dependência.
Não chegava a ser uma dependência de ai eu era grudada na minha mãe. Não. Mas o que..
Eu acho que era bem assim com a minha mãe. Não sei se tinha essa superproteção
também. Na minha casa também tem essa questão. Aqui em casa a gente é muito com
todo mundo, sabe? Meus irmãos, meu pai, todo mundo é muito junto assim, muito
grudado. Mas eu acho que tem, na infância. Na escola, quando eu comecei a ir para a
escola eu não queria deixar a minha mãe ir embora, sabe? A adaptação foi bem difícil.
Teve isso. Acho que a gente era bem assim, eu era bem assim com a minha mãe.
72

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na
adolescência.

Participante: Na minha adolescência… Minha mãe, ela nunca foi uma pessoa de “não
vai, não pode isso, não pode aquilo”. Minha mãe é bem “quer ir, vai”, meus pais não
foram muito controladores nesse sentido. Mas eu lembro que eu tinha umas brigas com a
minha mãe. “Ai você não arruma o seu quarto”, tinha muito “faz isso, faz aquilo”. A gente
tinha umas brigas assim, que me deixavam muito ansiosa. Comecei a perceber na
adolescência que eu levava a opinião… Que a opinião da minha mãe importava para mim
de uma maneira muito absurda assim, qualquer pessoa que falava eu não me importava
tanto quanto a opinião da minha mãe. Não só ela mas com outras pessoas da minha família
também, a opinião da minha família importava muito mais do que a opinião das outras
pessoas.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: A gente tem uma relação boa, eu conto tudo assim para minha mãe. A
gente não briga. Lógico que tem às vezes desentendimento normal, mas nada de brigas
maiores como tinha mais na adolescência, que era mais de adolescente. Também fui
entendendo o lado dela, meu lado, tudo isso. Agora a gente tem uma relação melhor. Eu
comecei a entender essa parte, eu acho que agora eu sou muito autocrítica comigo ou eu
sou também sei lá… Tenho essa crítica comigo, não tenho... Não me acho suficiente para
alguma coisa por causa de críticas da minha mãe, críticas da minha família.

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que não acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Eu avalio a autoestima não tanto assim aparência ou essas coisas, mas eu
tenho uma dificuldade muito para... assim sei lá, para me… Deixa eu pensar. Para me
valorizar em alguns aspectos. Eu tenho muito mais problema de em âmbitos profissionais
do que sociais, de relacionamento. Eu tenho uma autoestima de nunca me achar
suficiente, talvez. Acho que é nesses aspectos mesmo, de autoaceitação, sabe? De também
de… Deixa eu achar uma palavra. Sabe acreditar em mim mesma? Que eu sou capaz? Eu
sou muito uma pessoa que tem todas as provas, que eu consigo, eu sei. Mas tipo, por
exemplo, eu posso tirar 10 em tudo. E outra pessoa pode tirar 10 em tudo, mas eu vou
achar que a outra pessoa é melhor. Principalmente profissional, acadêmico. E acho que
isso vai muito por causa da minha família, acho que eles dão muito valor nisso, não sei.
Porque assim aparência… Acho que hoje a autoestima na sociedade está muito ligada a
isso, aparência, rede social, namoro, principalmente na mulher eu vejo isso. Mas para
mim está muito ligada a isso. Isso me deixa muito assim, está muito ligada a isso para
mim. Eu sofro muito por isso, realmente. Eu sofro realmente muito por não me sentir
capaz. Para mim, autoestima é essa coisa de insuficiência, de não capacidade.

Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: Acho que sim. Tipo… Depois de anos de terapia eu acho que muito,
principalmente esse negócio de insuficiência. Essa crítica de assim “ai eu fiz isso”. Mas
porque não...? Sabe, de não estar boa o suficiente para ela por exemplo. Eu tenho uma
cobrança. Agora eles não me cobram de fazer isso ou ser aquilo, trabalhar, estudar. Eles
73

nunca fizeram isso, foi uma coisa meio inconsciente, eu fui me tornando assim desde
muito nova. Mas acho que sim, essa coisa de não ser suficiente ou de me criticar muito
eu acho que sim. Foi uma influência meio negativa nessa parte de não me sentir boa
mesmo, me sentir incapaz de alguma coisa. Não ser tão boa quanto… Acho que não foi
só ela, acho que foram outras coisas que aconteceram na minha vida também. Mas acho
que talvez essas pequenas críticas vão construindo essa sua forma de ser. Eu acho… Acho
que tem isso.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Acho que não.

Elizabeth
19 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: Tá, então… Elizabeth … é o meu nome completo. Esse não era o meu
nome, adquiri os sobrenomes da minha mãe depois. Quando a gente nasceu os meus pais
achavam que a gente não ia querer ter 6 sobrenomes. Mas a gente tem muito mais
afinidade com a família da minha mãe. Então quando eu fiz 15, meu irmão tinha um
pouco mais e a minha irmã um pouco menos, a gente adquiriu os sobrenomes da minha
mãe. Acho isso muito importante. Nasci no Rio, moro em São Paulo há mais de 20 anos.
Tenho uma origem muito católica na minha família. Uma criação bem espiritual religiosa
para o catolicismo. Tive uma infância muito muito feliz. Hoje eu sou formada em ciências
sociais do consumo, sou vegana há três anos e isso me define em muitos sentidos.
Trabalho com pesquisa de mercado, gosto muito do que faço e sou muito realizada. Sou
leonina com ascendente em sagitário e lua em capricórnio. A minha lua em capricórnio é
a forma que eu me expresso, eu sou bem racional. O emocional assim, eu reflito muito
sobre as minhas emoções, procuro intensidade onde as vezes é só o que é. Isso pode ser
muito bom e às vezes ser muito denso também. Sou uma pessoa muito ativa, muito, muito
ativa. É uma característica que meus chefes sempre elogiam do meu trabalho, eu sou
muito rápida, eu resolvo tudo com rapidez. Mas por causa dessa rapidez também eu acabo
pecando em não revisar detalhes importantes por querer estar sempre em movimento. Sou
muito ativa na academia, malho 6 vezes por semana. Isso já foi um problema, hoje em
dia é mais administrado. O que mais da minha personalidade? Sou uma pessoa muito
amorosa mesmo, meu jeito de amar eu recentemente descobri na terapia que é muito servir
a pessoa, então se alguém está na minha casa quero dar tudo para ela, pode vir, chega
mais. É o meu jeito de falar: você está em casa. Então isso é desde os convidados da
minha casa até estar à disposição dos meus amigos sempre e estar à disposição da minha
família sempre. Que mais que eu quero falar sobre mim? Recentemente também na
terapia, acho que um negócio que me define muito é descobrir o limite entre eu e o outro.
Isso é uma coisa que por causa dessa característica de eu querer servir é muito difícil,
porque eu achava que eu tinha que ser, dar e estar muito para fora e recentemente eu
descobri isso, de que não, eu posso ficar bem mais no meu mundinho e isso tem sido um
super ganho do último ano, na pandemia foi meu maior insight.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.
74

Participante: Minha mãe é f... (sic.). É uma pessoa que eu admiro absurdamente, ela é…
Acho que a história da minha mãe é legal contar porque ela é a primeira filha mulher de
5 homens. Ela enfim, nasceu em uma família mais masculina. Se formou na escola, depois
fez Psicologia. Conheceu meu pai com 20 e poucos anos e aí com 20 e… teve nós três,
eu, meu irmão e minha irmã. E ela é… O meu pai falou que ia ser transferido para São
Paulo e ela falou “então vamos”. Eu acho que isso é uma puta (sic) exemplo de coragem,
ela falar “tá bom, eu largo meu trabalho e minhas coisas para te apoiar no seu trabalho e
nas suas oportunidades”. E nós éramos tipo, nenéns, minha irmã tinha 3 anos, eu tinha 4
e meu irmão tinha 6. Então era muito pequeno. E acho que isso diz muito sobre ela. Hoje
em dia ela tem uma ONG, ela é diretora de uma ONG mas no paralelo ela toca duzentos
mil projetos sociais, faz doutorado em Psicologia da Educação, é casada com meu pai há
16 anos. Eles são um casal muito admirável assim, são muito respeitosos, muito
amorosos. Se conhecem muito, então se respeitam muito. E… E é isso, eu acho que ela é
uma pessoa que tem muita coragem, ela tem muita força. Ela recentemente vive isso, esse
processo de “o que é meu e o que é do outro”, que na família dela meus tios brigaram
muito recentemente e eu vejo muito ela como mediadora de uma situação muito complexa
e nesse sentido eu admiro muito ela porque acho que ela é uma pessoa muito mediadora,
conciliadora das partes. Ela é canceriana, então dá pra mostrar que ela é assim uma pessoa
muito fluída, que vai com os outros. Então acho que as maiores características dela são
essas, o diálogo, a força, a coragem. E por outro lado as partes densas dela eu diria que
muito agressiva às vezes, muito chata. Fala as coisas muito na lata e às vezes você não
está pronta e você fica tipo “que? como assim?”. E ela é muito autocrítica, eu acho, isso
pode ser meio ruim para quem está ao entorno. Tipo assim, ela faz esse tanto de coisa e
não reconhece que ela é incrível. E você fica tipo: “Você precisa validar que você é muito
boa no que você faz.” Ela fala “Ah não, é bobagem.” Eu tenho uma ONG há 16 anos em
Paraisópolis, é bobagem”. E você fala não. Ela é bem humilde, mas é uma humildade tipo
“ei, se valoriza”.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.

Participante: Eu acho que a minha mãe foi uma baita mãe. Ela largou tudo para estar
disposta à família. É… Eu acho que ela incentivava muito a gente a inventar e fazer moda,
fazer qualquer coisa. Fazer moda tipo assim, criativo, brincar de baldinho, subir na árvore.
Mas eu reconheço que tipo, hoje eu acho que, não sei, é uma relação de admiração da
minha parte mas de outra eu acho que muitas coisas assim… É que assim a relação com
a minha mãe também se consiste muito em torno da alimentação porque eu tive muitos
distúrbios alimentares na adolescência, distúrbio de imagem, enfim… Acho que se posso
dizer que estou curada, se eu curei, foi há pouco tempo. E muito se dava pela forma como
a minha mãe dizia… É que era para falar da infância né, posso falar da adolescência?

Entrevistadora: Pode, claro. Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na
adolescência.

Participante: Eu acho que a parte da adolescência foi muito dura, porque enfim eu
engordei muito durante um período, durante o meu estirão, e ela ficava: “cuidado para
não comer muito, porque quando eu tinha sua idade eu engordei”. Foi muito isso, muito
muito isso. E aí não deu outra, eu engordei também. Eu descontei muito na comida. Eu
tive muito medo de comer depois e achava que eu não seria digna de ser amada por causa
da comida, isso foi muito, muito duro. E enfim, foi muito conturbado, foi muito triste.
Muito sofrimento da minha parte. E chegou um momento que assim, eu estava tão mal
que eu falei para ela: não fala sobre comida comigo. Também comecei a ir muito atrás
75

disso, então eu tenho acompanhamento nutricional desde que eu tenho 13 anos, eu nunca
parei. Fui pingando de nutricionista em nutricionista, mas todo ano pelo menos eu passei
em alguém. E aí é… Os primeiros anos né, 13, 14, 15 anos era do lado dela, de falar “você
precisa ter um acompanhamento de um nutricionista para você não engordar”. Depois
teve um medo meu de falar “eu preciso de uma nutricionista porque eu engordei, porque
eu vou engordar”. Então isso foi muito duro. Quando eu tinha uns 20 anos… Acho que o
mais duro foi o começo da faculdade, eu não comia nada. Acho que eu comia tipo, só o
que estava na dieta e fiz muito academia. Namorava um cara que também gostava disso
então me botava pilha nisso. Eu não percebi que virou um distúrbio de imagem, de me
achar gorda o tempo inteiro, de não valorizar quem eu era e achar que o corpo era muita
coisa. De não comer determinadas coisas, eu não comia hamburguer, massa. Massa era
inconcebível. E minha mãe também teve muita… Eu não queria falar que a
responsabilidade é dela, mas ela transferiu muito medo para mim. E… Eu fazia muito
balé, jazz, e ela falava que só era bonito jazz e balé se eu estivesse magra. Então
também… Com 15 anos eu desenvolvi bulimia, foi muito duro. Aos poucos eu fui
cavando meu próprio buraco e me reerguendo e acho que hoje também, mas foi osso (sic).

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: Nossa eu acho que as coisas se transformaram muito, principalmente


porque eu amadureci muito. E para reconhecer que muito das coisas que ela me dizia era
muito mais sobre ela do que sobre mim. Na hora que eu fiz essa separação interna foi um
alívio, foi tipo: “eu não te culpo, eu não te julgo”. Foi muito duro para mim, mas eu sei
da onde vem sabe? Trouxe um pouco mais de compaixão para a minha relação com ela.
E eu acho que por eu também, na minha família, nós somos em três: eu minha irmã e meu
irmão. Minha irmã tem TOC, ansiedade e depressão. E… Ela tem esse quadro já há uns
6 anos, é muito puxado, é bem grave. E meio que a minha mãe é o porto seguro dela. Isso
ocupa um espaço na nossa família bem grande, como a gente vai lidar, como a gente vai
acolher? A gente é… ajuda mas não cobra. Quer estar perto mas respeitando o espaço.
Então isso é um grande desafio na vida familiar. E por causa da minha irmã ocupar esse
lugar meio de, eu acho né, que é um lugar de apoio e meu irmão também está na faculdade
já há 6 anos, se forma esse ano, mas é uma pessoa que parece que… Eu amo ele, com
todo meu coração… Mas eu acho que falta uma força, falta um assim… Acaba que a
minha mãe recorre a mim para falar sobre essas coisas. A gente tem uma coisa meio de
amizade também, de dividir como a gente está como família, como a gente se ajuda. É…
Então acho que é isso, eu sou um braço sólido para ela recorrer. Eu acho que eu tenho,
que eu criei há alguns anos, uma estrutura emocional muito forte. E também porque ela
tem passado várias coisas com a família, briga dos irmão porque ela perdeu o pai
recentemente e teve muita briga. Ela recorreu muito a mim para falar como estavam as
disputas, quem queria o que, como se posicionar, o que eu achava que ela deveria fazer.
Teve um momento que eu falei “Eu sou filha dela, esse é o lugar que eu ocupo. Não sou
mais do que isso, não posso ser mais do que isso”. É nesse lugar que preciso me colocar,
foi muito bom. Ela é uma mãe bem f... assim (sic), ela é bem forte e carinhosa, ao mesmo
tempo que acolhe muito. Ela tem um ouvido que é indescritível assim para você
desabafar. Muitas vezes eu choro no colo dela e falo “eu não aguento mais, preciso de
ajuda em determinado ponto”. Ela está sempre disposta, reconhece o meu discernimento
sobre mim. Sabe? “Preciso de tal, posso contar com você?” Ela sempre está disposta. É
isso acho… Hoje estamos assim.
76

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que não acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Nossa, é que eu me acho o cocô do cavalo. Sério, não é brincadeira não.
Apesar de eu demonstrar muita confiança de quem eu sou, eu não me acho nada disso,
sabe? Eu acho que tudo que eu… Por exemplo, eu tenho alguns talentos. Eu vou
compartilhar só para você entender. Eu gosto de pintar, gosto de escrever. Tenho
habilidade com escuta, minhas amigas recorrem a mim sempre para ouvir, para saber
minhas opiniões sobre os assuntos e sobre política. Sou muito engajada socialmente, faço
voluntariado. Sou muito engajada com a minha família, tenho uma espiritualidade muito
aguçada. Só que isso diz sobre quem eu sou, não acho que isso é uma estrela, eu não
ganhei prêmio por isso. Eu sou assim. E… Não acho que isso me faz nada demais. Mas
eu vejo as pessoas achando isso incrível em mim e eu fico tipo “Não fiz nada, não mereço
nada. Só sou assim”. Acho que também por essa questão do peso, da imagem. É… Não
me sinto bonita. Eu genuinamente não me acho bonita, não me acho a gostosa que eu
deveria me achar. Eu não vejo isso, tenho muita dificuldade de… Vou falar uma palavra
muito dura, mas de me aceitar como mulher. Mesmo. E… Eu acho que é isso, eu não
reconheço metade dos meus talentos, apesar de saber que em algum lugar eles existem
para as outras pessoas, para mim é meio tipo “ah, você fez o mínimo sabe”.

Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: Muito. Eu acho que… Não é só a minha relação com a minha mãe, mas
acho que o jeito que a minha mãe é nessa coisa de ser humilde, não se achar o máximo,
acho que eu herdei um pouco isso de achar que a gente não tem que se achar, a gente tem
que só ser. Isso por um lado é duro, porque eu não reconheço as coisas que eu sou. Em
algum lugar eu tenho essa dificuldade de me reconhecer. Então a relação com a minha
mãe é… Também tem um lado de uma expectativa que eu queria atingir. Apesar que ela
nunca declarou nada, eu só senti cobrança, só senti que eu precisava fazer mais coisas.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Os pais são f... (sic), é muita coisa… Dá para falar por horas. Eu tenho
muito a brisa da espiritualidade, no último ano foi um ano muito de entender a minha
ancestralidade e de onde eu vim. A gente não falou muito de pai aqui, mas acho que o
meu pai também é muito… Não vou dizer responsável porque eu acho que a
responsabilidade é minha mas é um cara que se cobra muito, que é muito exigente,
correto, político, agitado. Nossa, é um cara “by the book”. Também acho que herdei essas
características, apesar de ele ser uma pessoa amorosa, gentil, encantadora. Super
influente. Ele é um cara muito assim… Pesa. E na hora que pesa eu acho que também foi
um lugar de entender quem ele é para entender quem eu sou. Entender quem a minha mãe
é para entender quem eu sou. E eu acredito muito no perdão, essa palavra vem muito para
mim. De não culpá-los pelo que fizeram na minha criação, porque acho que foi o melhor
que eles puderam fazer. Acho que é muito mais sobre mim do que sobre eles. Então é…
Minha terapeuta sempre fala “eles em mim”. Isso me ajuda muito a ter clareza de que o
tamanho que eu dou é o tamanho que as coisas têm. Já dei muito grande, mas hoje não
preciso porque sou adulta. E na hora que eu falo isso para mim, “eu sou adulta” também
me dá um poder. Tem coisas que quando se é adulto não dá para você esperar para os
pais, não cabe mais a eles ocupar o espaço. É gratidão, evolução.
77

Donatela
20 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: Bom… Eu acho que eu sou uma pessoa que está sempre tentando se
melhorar. Nunca está satisfeita assim, com relação aos meus esforços. Sempre corro atrás
de estar melhor emocionalmente, principalmente. E melhorar a minha maneira de me
relacionar com as pessoas, para mim é uma coisa muito importante. Eu gosto muito de
tipo… De me dedicar no que eu faço e sei lá, eu sinto que eu não consigo fazer as coisas
mal feitas e isso me deixa muito aflita. Então às vezes eu acabo nem fazendo coisas que
daria para fazer, mas eu sou bem perfeccionista. Bastante autocrítica, já fui muito
controladora mas hoje em dia não sou mais tanto porque venho aprendendo muito com
isso. No passado eu não conseguia aceitar tipo os meus defeitos e as minhas sombras, era
muito difícil para mim lidar com eles. Hoje em dia acho que como eu passei por um
processo de muito amadurecimento e tipo um “down” na vida, um momento de muita
introspecção, acho que eu comecei realmente a aceitar elas e parar de ser tão positiva.
Não positiva no sentido de… Positividade tóxica, sabe? Acho que comecei a trabalhar a
ideia da humanização mesmo, não só minha, mas dos outros como sempre trabalhei, mas
principalmente minha. Acho que comecei a entender melhor as pessoas. Esporte eu adoro
fazer, para me sentir bem, me sentir centrada. Uso muitas técnicas para me sentir centrada,
em várias áreas. Não tenho religião fixa, já tive, mas não tenho mais.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: A minha mãe é uma mulher que ela sempre… É que hoje em dia ela mudou
bastante, mas desde a infância ela era uma mulher que sempre se dedicava muito aos
outros mais do que ela mesma, à mim por exemplo. Ela sempre me ensinou muito que
tinha que colocar os outros em primeiro lugar, porque ela fazia isso né, era o jeito dela de
dar conta dos defeitos dela. Ela sempre foi uma pessoa disposta para todo mundo, sempre
preparada para se relacionar, se dá muito bem com as pessoas. É uma mulher muito
positiva, às vezes até demais. Bem controladora assim, várias vezes não queria fazer as
coisas porque saía do controle dela. Bastante imediatista, na hora dela e no momento dela.
Mas é uma mulher com um coração absurdo de grande, sempre preparada para se
melhorar. Ela mais quer se melhorar para os outros do que para ela. Hoje em dia ela está
começando a entrar nessa fase mais individual. Era sempre assim. Acho que é bem
engraçado, porque a gente se parece muito assim. Eu fui sei lá, fui analisando isso bastante
com a minha psico (sic), porque acho que é um ponto muito importante que as coisas que
eu mais criticava na minha mãe eram as coisas que eu mais tinha em mim, mas ao mesmo
tempo só quando eu aceitei ela como ela era foi quando eu consegui mudar isso em mim
e quanto naturalmente ela muda também. Acho que… Não sei se faz sentido, mas a gente
conversa bastante muito na parte da constelação familiar, mas é como se a gente estivesse
honrando aquela consciência, como se sempre acabamos seguindo os padrões dos nossos
pais porque achamos que esse é o jeito certo, como se se a gente fizesse diferente
estaríamos meio que traindo eles. Eu acho que isso se mostra muito nos relacionamentos.
Meus pais se separaram pelo menos umas três vezes quando eu era pequena. Acho que
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isso foi um fator que para mim mexeu muito porque eu sempre achei que assim como ela
era muito crítica comigo e com o meu pai eu repliquei isso para os meus relacionamentos
amorosos. Só quando eu percebi que eu não precisava ter um relacionamento conturbado
para viver emoções e amar e tudo mais, foi quando a gente começou a trabalhar isso. Eu
muitas vezes achei que tendo um relacionamento um pouco diferente do dela eu estaria
indo contra, eu não seria amada por ela.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.

Participante: Então, como eu falei meus pais se separaram quando eu tinha mais ou
menos uns 6 ou 7 anos, uns 6 anos. Quando eu tinha 2 e quando eu tinha 6. Minha mãe
sempre foi muito protetora, tipo, absurdamente protetora. As vezes ela não conseguia,
tipo, confiar no meu pai para me levar para passear sozinho. Então era tipo… Ela era
muito grudada comigo. Até no próprio trabalho dela, ela tinha um escritório e eu ficava
lá com as babás. A gente não podia ficar na nossa casa, tinha que ficar lá para ficar sempre
junto. Foi uma mãe muito presente, sempre teve tudo, sempre esteve disposta e preparada
para me ajudar e auxiliar, me dar suporte. E… Acho que é isso assim, uma relação tão
próxima que acho que tipo… Principalmente no momento de separação dos pais a gente
acaba pegando as dores, eu acabei pegando um pouco as dores dela. Mas depois
obviamente com psicóloga eu curei isso, mas é nesse sentido. Eu era, eu sou, muito
próxima dela.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na adolescência.

Participante: Ah, eu acho que no período da adolescência foi um momento que eu


conversava com ela mas não era aquela história, fui bem mais introspectiva assim. Era
uma relação de, sei lá, a parte da minha espiritualidade veio dela na adolescência. Mas
com relação a carinhas, amigas, essas coisas, amigas às vezes eu conversava com ela. Ela
sempre me tratou numa relação igualitária, até porque ela é muito nova, me teve com 24.
Então tipo a gente conversou muito sobre isso. Mas sobre caras eu não gostava de
conversar com ela porque não me sentia confortável. E acho que também por conta dos
conflitos que meus pais já tinham tido. De uma forma geral assim a gente brigava um
pouquinho, dava umas quebradas de pau assim. Em compensação com o meu pai eu
brigava bem mais. Aí… Só isso assim. Uma relação assim… Acho que foi o momento de
maior afastamento.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: Atualmente tipo… Posso dizer que ela é quase minha melhor amiga, sabe
de tudo da minha vida. A gente compartilha de muita coisa. E sei lá, eu conto bastante
coisa para ela assim. Em comparação a minha vida inteira, é a época que eu conto mais,
a gente compartilha muito. Crescemos muito juntas. Acho que é engraçado que nessa
reviravolta eu acabei trazendo algumas coisas para a minha mãe, eu comecei a ser o
exemplo de coisas que antes ela não fazia, sabe. Acho que eu entrar na vida adulta me
deu coragem para viver a minha vida e não viver como o modelo dela. Porque eu sempre
fiz de uma forma de tipo… Acho que como eu sou filha única por bastante tempo isso foi
sempre uma maneira de querer dar orgulho para ela, de querer agradar. Quando eu cresci,
a partir dos meus 20, 21 anos, eu comecei a sentir que eu não precisava mais agradar ela.
Porque isso não adiantava. Acho que o fato de ser eu, viver a minha individualidade, viver
o que funciona para mim e não para ela me fez melhorar a relação com ela, muito. É…
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Me fez melhorar a minha relação com ela, me fez me aceitar mais, aceitar ela como pessoa
e... É isso, acho que eu quis parar de ficar vivendo a base do modelo dela. Acho que isso
foi um momento bem importante, foi quando a nossa relação melhorou e quando ela
começou a me respeitar e respeitar minhas escolhas porque antes eu não sabia nem dizer
não para ela. Ela era a primeira pessoa que eu não conseguia negar coisas para fazer e
tudo mais porque eu sempre tinha medo mesmo, sei lá, medo de rejeição e abandono.
Acho que até pelo fato do que eu vivi na época da separação deles.

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que não acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: É… Então, esse é um ponto bem complicado. Eu sinto que tipo… Desde
pequenininha tive muito problema com corpo porque eu era muito gordinha, fui gordinha
a vida inteira. E a minha mãe ela tipo… Ao mesmo tempo que ela me deixava comer
doce, ela sempre se preocupou muito com o meu peso também. Mas isso é geracional
também, posso dizer que a minha avó era super neurótica com isso, ela trancava a
geladeira, escondia doce e umas coisas assim absurdas. Mas que foi o que a minha mãe
aprendeu sabe? Eu fui descobrir isso depois. Mas a minha mãe sempre me trouxe que eu
era especial, que eu era muito legal, importante e tal. Tipo sempre me trouxe que eu era
linda, mas ao mesmo tempo tipo eu sempre… Ela me metia em trinta mil esportes para
fazer, tipo… Dietas… Eu acabava seguindo as dietas dela. Ela fazia dieta, eu fazia
também. Então isso era meio que uma loucura assim porque acho que o fato de ela ter
uma autoestima baixa e sempre achar que nunca ela era bonita, que nunca ela era
suficiente… E eu acho a minha mãe linda assim. E é isso, muitas vezes trabalhar isso,
tentar entender tipo minha mãe não se acha bonita. E a gente nunca conseguiu acei…
Aprendi muito com ela que a gente não podia aceitar os agrados, aceitar as valorizações,
porque isso era tipo… Hoje em dia tudo bem, já está desconstruído, mas aceitar tipo
“nossa, você fez isso, que legal, parabéns!”. Isso para a nossa família era algo de ser
metido, de ser orgulhoso. Eu nunca aceitei agrado. Sempre que eu recebia um presente eu
tinha que falar “Ah não, que isso!”. Ou quando alguém me falava que eu era bonita era
tipo: “Ah não, você é bem mais. Veja bem, olha isso…”. Foi uma coisa que me atrapalhou
bastante, porque eu sempre trazia a minha valorização baseada no outro, eu sempre
valorizava os outros mas eu era um caos comigo. Em relação a autoestima hoje em dia
posso dizer que está melhorando um pouco, mas ela ainda é bem conflitante porque tudo
que eu vivi na época da infância, tudo que eu senti mesmo como ter problema com
menino, não me sentir bem entre as minhas amigas, coisas desse tipo me fez não me
aceitar muito como eu era sabe? Acho que era isso. É. Também com relação a por
exemplo… Muitas das coisas que a minha mãe me ensinava. As minhas amigas, vamos
supor, quando a gente é jovem e a gente gosta de muitas coisas iguais. “Modinha de tal,
modinha de tal”. Minha mãe odiava modinhas. Qualquer modinha ela não me deixava
entrar. Falava “Não, isso é um absurdo, você não tem que se valorizar por causa disso.
Você tem que ser mais você” e tudo mais… Mas ao mesmo tempo que isso foi ótimo
porque tipo quando as modinhas acontecem eu sei que são só uma fase e eu vivo elas e
entendo e compreendo que é uma forma das pessoas se sentirem integradas, ao mesmo
tempo eu me sentia tipo um peixinho fora da casinha (sic), porque eu trabalhava coisas
que as meninas da minha idade não faziam. Isso mexia muito com a minha autoestima
porque era confuso, os adultos falarem para mim “nossa, você é muito inteligente, você
trata de assuntos muito maduros” e minhas amigas falarem “mano, do que você tá
falando?”. Acho que isso mexia bastante com a minha autoestima. Acho que por isso que
é bem instável.
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Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: Total, total. Ah, porque tipo, foi como ela me ensinou. Era um ensino meio
contraditório porque ao mesmo tempo que ela falava para mim “filha, você é especial”
ela tipo não fazia nada disso sabe? Ela nunca se valorizava, ela nunca se colocava em
primeiro lugar. Tipo era sempre o outro, o outro, o outro. E tipo, onde existe a autoestima
se você sempre coloca o outro em primeiro lugar? Chega a ser uma coisa meio… é… Sei
lá, ela esquecia da auto valorização dela e sempre criticava ela, até hoje assim, nada para
ela está bom. Eu que tinha que valorizar ela, então era como se eu sempre esperasse que
as pessoas me valorizassem. Trabalhar nesse sistema era um pouco… Não move a gente
para frente, então ela meio que nesse sentido… Obviamente foi o que ela pôde fazer, mas
acho que isso me pegava bastante, o fato de ela não se aceitar atrapalhava muito a minha
situação de não me aceitar também.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Não, acho que é isso.

Augusta
20 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: Eu acho que é interessante saber que tenho 22 anos, faço Psicologia na
PUC. Gosto bastante de me relacionar com as pessoas, ter essa troca significativa com as
pessoas. Valorizo bastante acho que principalmente essa conexão com outras pessoas.
Gosto muito de ser determinada, isso é algo que é muito presente na minha personalidade.
Também eu acho que é uma coisa que eu gosto em mim. Sinto que muitas vezes os meus
relacionamentos estão muito permeados por carinho e por cuidado. Hm… Acho que é
isso.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: A minha mãe, ela é muito cuidadosa. Ela faz as coisas pensando muito
nessa relação de cuidado, na relação de transmitir amor. Então, sei lá, algo que eu valorizo
muito nela e que eu acho que é muito bonito. Ela é uma pessoa super atarefada, ela tem
muitas coisas. Mas ela sempre usa o tempo dela para transmitir isso assim, então ela
sempre faz alguma comidinha gostosa, sempre faz é… Conversa bastante com a gente,
ela é sempre presente assim. Ela… Eu acho muito legal que ela tem se desenvolvido muito
nos últimos anos. Então como uma forma dela realmente ir buscando coisas para ela.
Então ao mesmo tempo que ela faz as coisas para a gente como família ela também faz
bastante coisas para ela ou ela está buscando mais fazer isso.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.
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Participante: Quando eu nasci, até 8 meses de idade, a minha mãe trabalhava muito.
Então eu ficava mais com a minha avó. Eu, minha irmã e minha avó. Só que aí com 8
meses eu tive uma questão de saúde mais séria assim, e aí a minha mãe decidiu parar de
trabalhar. Então ela parou de trabalhar e se dedicou totalmente para mim e para minha
irmã. E aí foi sempre uma relação muito presente, a gente fazia tudo com a minha mãe e
sempre teve muito esse cuidado assim, em todas as coisas. Acho que a relação na infância
foi muito presente assim, essa figura materna foi muito… Realmente muito presente
assim. Acho que teve, foi muito permeado realmente por esse cuidado.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na adolescência.

Participante: Acho que foi parecida. É… Sempre teve muita troca, a gente sempre
compartilhava muitas coisas. Eu acho que sempre teve a intenção de ouvir e de entender
as fases que eu estava vivendo e que ela estava vivendo. Esse diálogo sempre foi muito
importante. E principalmente na adolescência e agora também na vida adulta.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: É uma relação muito boa, acho que a gente consegue conversar sobre
bastante coisa. É… Sinto que às vezes tem algumas divergências de talvez valores em
algumas coisas. Só que tudo é muito conversado, então é muito fácil chegar em um
consenso. Acho que de tanto falar vai ficando mais claro que tem uma diferença entre
quem eu sou e quem a minha mãe é. Então isso é algo que também venho trabalhando
bastante para entender que não preciso agradar ela e ela não precisa me agradar. Talvez a
importância maior é a gente chegar em um consenso mesmo do que funciona para as duas.
Então sempre respeitando e não se deixando de lado, sabe? Então acho que tendo um
diálogo em tudo que a gente faz as duas conseguem ceder em alguns aspectos e também
priorizar alguns aspectos que são mais importantes. Por exemplo, para minha mãe era
muito difícil me deixar dormir na casa de namorado. De uns tempos para cá, fomos
conversando bastante sobre isso e é algo que tem sido mais tranquilo né, porque ela
entende que para mim é algo muito importante. Então mesmo sendo difícil para ela, a
gente chega em consensos.

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Difícil essa pergunta (risos). É… Eu acho que ter uma boa autoestima está
muito relacionado a se sentir segura, se sentir bem, conseguir se posicionar nos ambientes
que você convive. É… Eu acho que não está muito relacionado a como você vê o seu
corpo diretamente. Acho que está muito relacionado a forma como você consegue
entender quais são seus valores, consegue realmente se sentir íntegra nas coisas que você
faz. Então eu sinto que talvez a gente tem muito a visão de que autoestima é algo que está
totalmente relacionado a um corpo bonito, a mostrar nosso corpo físico. Eu acho que por
um outro lado eu vejo muito mais como conseguir se posicionar nas relações, conseguir
mostrar quais são seus valores e seus pontos de vista. Mais essa segurança mesmo. Acho
que de uns tempos para cá tinha uma época que para mim era muito difícil me posicionar
em diversas situações. E aí com muito tempo de terapia lidando com essa questão de me
posicionar e me sentir segura, eu fui trabalhando bastante isso. Eu acho que agora por
entender na prática que eu consigo fazer isso, que eu posso fazer isso, que eu devo fazer
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isso eu fui linkando isso com autoestima e fui percebendo que sim, eu tenho uma boa
autoestima.

Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: Com certeza. Eu acho que a minha relação com a minha mãe sempre foi
muito permeada por palavras de cuidado, por essa… Ela sempre quis elevar muito, me
valorizar muito. Eu e minha irmã no caso. Eu sinto muito que isso de ter uma figura que
vá lá te mostrado que você pode fazer as coisas, que você consegue fazer as coisas, vai te
dando mais segurança. Consequentemente, vai te dando mais autoestima para você fazer
as coisas que você quer fazer. E eu acho que quando você tem uma figura oposta que vai
falando “ah não, você não consegue fazer tal coisa” isso vai te dando mais insegurança
para fazer as coisas. Então acho que sim, com certeza.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Não. Acho que é isso mesmo.

Violetta
20 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: Tá. É… Não sei, eu acho que eu sou uma pessoa que não gosto de ficar
parada, gosto sempre de estar fazendo alguma coisa. Sou muito proativa. É… Sou tímida.
Para algumas coisas, para outras acho que não. E… É mais uma coisa geral ou é para
especificar? Resposta: Como você quiser. É… Em relação a mim acho que é isso. Eu…
Eu faço faculdade de arquitetura, não sei se eu gosto disso ainda ou não, mas pretendo
me formar. Trabalho com várias coisas diferentes que hoje eu gosto muito, aprendi a
gostar conforme as coisas foram acontecendo. E… Acho que é isso. Eu moro com os
meus pais ainda, pretendo não estar morando até o final desse ano ou no ano que vem.
E… Acho que sobre mim é mais isso.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: Minha mãe… Ela é muito determinada. Muito mãe, mas também muito
minha amiga. Ela me entende muito, consigo conversar com ela sobre vários assuntos.
E… Ela também é muito determinada, focada, proativa e… Batalhadora, ela corre atrás
do que ela quer independente de qualquer outra coisa. E… É isso.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.

Participante: Sempre fui muito próxima, sempre tive muito mais contato com a minha
mãe do que com o meu pai. Inclusive, sempre morei com ela, então sempre fui muito
próxima e muito amiga. Sempre tive essa relação de amiga com a minha mãe, de poder
contar tudo. Desde alguma coisa que aconteceu na escola ou com a minha amiga ou
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qualquer coisa. Seja com amigas dela, qualquer coisa que acontecia eu sempre tive uma
relação muito próxima com a minha mãe, a gente tem muita liberdade uma com a outra.
E… Quando eu era pequena a gente não ficava tão próxima, não no sentido de poder
conversar e ser aberta, mas a gente não ficava tão juntas fisicamente porque ela trabalhava
muito e eu ficava muito sempre com os meus avós. Isso quando eu era menor assim,
depois foi mudando. Quando eu era criança tinha essa situação aí, ela trabalhava e eu
ficava em casa. E basicamente foi isso. Sempre foi muito legal, sempre que ela podia ela
passava bastante tempo comigo, me levava para brincar, me levava no parque, coisas que
eu gostava de fazer e que a gente gostava de fazer juntas.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na adolescência.

Participante: Sempre foi muito boa também, sempre próxima. Teve algumas… Alguns
desentendimentos que eu acho que faz parte de mãe e filha, faz parte da adolescência. A
gente tem que fazer algumas coisas que na nossa cabeça é certo mas na realidade, depois
de um tempo, a gente descobre que não é. É… Sempre tudo muito ok. Eu só… A única
coisa que eu sinto é que ela sempre me cobrou muito em todos os sentidos, seja na escola,
no vôlei, no inglês, em qualquer atividade que eu fazia e também na vida pessoal. Sempre
teve muita cobrança de “você precisa isso, você precisa aquilo”. É… Óbvio que sempre
no sentido bom, mas sempre muito forte assim. Tipo, muita cobrança de “você precisa ir
bem, você precisa disso, você precisa daquilo”. Mas no geral sempre nossa relação foi
muito boa e muito aberta também. Sempre confiou muito em mim, sempre tive mais
liberdade desde sei lá, quer ir na festa vai na festa, quer voltar de uber pode voltar de uber.
Coisas do tipo.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: Hoje em dia continua praticamente a mesma. Ainda tem muita cobrança,
mas ao mesmo tempo não porque ela entende que eu já tenho maturidade para uma série
de coisas. Ela confia muito em mim. E eu confio nela, a gente tem uma relação hoje em
dia mais de amiga do que de mãe e filha. Às vezes até os papéis se invertem um pouco,
eu fico cobrando mais ela do que ela me cobrando. Mas também a mesma coisa assim, eu
confio nela para tudo, converso com ela para tudo. Namorado, amiga, enfim qualquer
coisa. E ela também me conta de situações pessoais dela. A gente tem alguns
probleminhas de questão de trabalho, porque a gente trabalha juntas e aí tem sempre
algumas questões que acabam misturando o pessoal com o profissional, mas faz parte
também. A gente sabe resolver. Mas em geral nossa relação é ótima.

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Hm… Porque eu acho que… Sei lá, quando você pediu para eu falar sobre
mim. Eu pensei nas minhas qualidades, foi a primeira coisa que me veio na cabeça. Eu
sou proativa, sou determinada, sou dedicada, não gosto muito de ficar quieta. É… Em
relação a isso eu acho que é boa. Mas em relação a aparência eu não acho que é 100%,
tem várias coisinhas que me incomodam no sentido pessoal de “quando você se vê no
espelho você vê o que?”. Mas quando eu penso como pessoa vem mais qualidades do que
qualquer outra coisa na minha cabeça. Acho que a autoestima tem os dois lados.
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Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: Muito. Desde pequena. Quando eu era pequena eu era muito gordinha,
muito acima do peso. E ela sempre pegou muito no meu pé com isso. Quando eu tinha
sei lá, dez, nove anos. Eu fiz uma mega de uma dieta, ia em vários médicos. “Você precisa
ficar magrinha”. Também é óbvio que por uma questão de saúde, não só estética, mas
sempre teve muita pressão nisso. Então isso fez com que minha cabeça também virasse
um pouco “eu só vou ser bonita se eu tiver o cabelo x, se eu tiver o corpo x”. Porque
também tinha esse negócio do cabelo, sei lá eu tinha cinco anos e minha mãe fazia escova
no meu cabelo porque ela gostava do meu cabelo lisinho. Ela falava “seu cabelo fica
bonito lisinho, não gosto dele do outro jeito”. Entre outras coisas. Então meio que eu criei
uma imagem em cima disso, claro que não só da minha mãe, de todo o resto. Mas teve
essa influência dentro de casa também. Isso interferiu bastante.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Não.

Tatiana
21 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: É… Bom, eu faço Psicologia na PUC. Sempre me interessei muito por


Psicologia, por, é… enfim, ter feito terapia por muitos anos, então eu me interessei por
isso. É… Acho que eu sou uma pessoa bastante sociável, eu acredito, um pouco assim
extrovertida, gosto muito de sair. Gosto muito de ver meus amigos. É… Ir em festas,
essas coisas. Enfim, acho que é isso. Não sei muito o que falar.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: A minha mãe é uma pessoa mais reservada do que eu assim, eu acho que
eu sou uma pessoa bastante expansiva assim, e ela é bem reservada. Ela, ela… Ela sabe
os momentos certos de falar as coisas para as pessoas, sabe? Para as pessoas no momento
que enfim… No momento certo, ela espera o momento certo para falar. Ao contrário de
mim, que sou super explosiva assim. Ela é uma pessoa muito trabalhadora, muito… É…
Enfim ela nunca faltou no trabalho, ela leva muito a sério. Ela sempre dá o melhor dela
assim. E… Mas ela também tem os momentos divertidos dela. A gente assiste big brother
toda noite, a gente assiste série, a gente bebe vinho. É… Enfim.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.

Participante: Quando eu era criança eu acho que a gente tinha uma relação boa assim,
eu não lembro de ter brigas assim sempre com a minha mãe. Mas acho que era uma
relação… Hoje eu tenho uma relação muito melhor com ela. Acho que na infância rolava
muito um ciúmes da minha irmã. Então às vezes ela se colocava no meio para apartar
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brigas. Então às vezes tinha um certo ranço com a minha mãe porque ela acabava ficando
do lado da minha irmã. É… Mas assim, acho que teve uma relação muito tranquila com
ela mesmo. Eu admirava muito ela na infância, eu lembro disso. Eu falava assim “ai, eu
quero muito ser a mamãe, eu não sou do jeito que ela é. Organizada, essas coisas assim”.
Eu queria muito ser do jeito que ela é. Eu lembro que eu até chorei uma vez quando eu
era pequena sobre isso. Mas é, acho que era uma relação tranquila assim, eu não lembro
de grandes atritos. Só às vezes, brigas normais assim.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na adolescência.

Participante: É, na adolescência começou a ser um pouco complicada. Porque eu acho


que na adolescência eu comecei a descobrir mais sobre mim mesma assim. Eu acho que
isso foi… A terapia me ajudou muito nesse sentido. O teatro, que eu fiz por alguns anos,
também me ajudou muito nesse sentido. E aí eu comecei na adolescência mesmo a
escolher meu estilo de roupa, que não era mais as roupas que ela escolhia para mim como
na infância e tal. Enfim… Acho que isso afetou um pouco ela assim, nesse sentido de eu
procurar uma identidade. Eu lembro também de um episódio na adolescência quando eu
contei para ela que eu tinha beijado uma menina. Foi uma coisa super assim, um choque
para ela. É… E também a questão que eu acho que foi na adolescência que eu comecei a
descobrir a minha opinião política realmente desvinculada dela e do meu pai. Acho que
isso também gerou alguns atritos. Então acho que a adolescência teve um pouco de atrito
por conta disso assim.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: Hoje em dia eu acho que eu tenho uma relação incrível com a minha mãe.
Eu acho que ela me respeita muito, como pessoa, sabe? Eu acho que ela respeita minhas
singularidades, respeita o que eu penso. Apesar de ela as vezes não concordar com o que
eu penso, sabe? Ela sempre está ali para ouvir o que eu acho sobre determinado assunto.
A gente discute coisas e assuntos, mas não briga. É uma discussão saudável. Eu acho que
ela tem um espaço, ela abre um espaço muito importante para eu conversar com ela sobre
vários assuntos. Então tipo, sobre o meu relacionamento eu me sinto muito segura em
conversar com ela, sabe? Não tem um tabu ou alguma coisa. Enfim, sobre várias coisas
eu consigo conversar com ela. As vezes até sobre drogas assim, de uma maneira óbvio
que cautelosa, mas tipo ela é uma pessoa bastante aberta. Ela me ouve bastante, eu acho
que a gente tem uma relação muito boa. A gente sempre assiste coisas juntas, eu sempre…
Quando a gente estava no presencial eu lembro de sempre tentar ler todos os textos que
eu tinha da faculdade para a gente assistir a novela juntas ou beber um vinho juntas. É
muito importante esse tempo que eu tinha com ela de noite, depois do dia inteiro e tal. De
noite era o único momento que eu podia ficar com ela, conversar com ela e tal. Então eu
acho que eu tenho uma relação muito boa com a minha mãe hoje. Acho que eu nunca tive
uma relação tão boa com ela como eu tenho atualmente.

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Hm… Ah, eu acredito que eu tenha uma certa confiança assim em certos
aspectos. É… Acredito que em alguns aspectos eu tenho uma autoestima boa, em alguns
outros aspectos eu não tenho uma autoestima tão boa. Mas em um balanço geral assim,
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quando eu vejo, eu acho que eu tenho uma boa autoestima assim. Eu acho que eu várias
vezes confio no meu potencial, é… Às vezes eu me sinto um pouco insegura em relação
a algumas coisas, mas depois eu falo “não, eu consigo fazer”. Eu acho que eu vou
conseguir assim. Eu acho que eu atrelo a minha autoestima muito a essa questão de fazer
as coisas, sabe? De conseguir por exemplo, o TCC. Conseguir fazer certo trabalho. Acho
que a minha autoestima vem daí assim. Apesar de às vezes eu ficar um pouco insegura
pensando se eu vou conseguir, eu acho que eu sempre tenho essa: “não, eu vou conseguir,
eu vou fazer, vai dar tudo certo”. E no final dá. Então eu acho que no balanço eu tenho
uma autoestima boa, eu acho. Eu acho que eu penso muito nessa questão relacionado ao
trabalho e ao acadêmico assim. A minha autoestima vem muito disso, poder por exemplo
ler um livro difícil, entender um conceito difícil. Tipo a minha autoestima… Eu me sinto
muito feliz quando eu entendo alguma coisa que eu não entendia antes, então um conceito
complicado de Psicanálise. Eu entendo e fico muito feliz assim. Óbvio que a minha
autoestima também vem um pouco… Eu adoro comprar roupa, então a minha autoestima
também vem daí e tal. Mas eu acho que o principal é essa questão de eu querer ser
valorizada por alguma coisa relacionada ao trabalho ou ao acadêmico.

Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: Acredito muito. Porque ela é uma pessoa que sempre teve essa ética de
trabalho assim bastante presente né. A minha família inteira sempre foi uma família que
valorizou muito o trabalho, que valorizou muito se esforçar para conseguir seus objetivos.
E a minha mãe… A minha mãe tem muito isso tipo, ela sustenta eu e minha irmã sozinha,
ela valoriza muito o trabalho que ela tem. Ela sempre fala tipo “nossa, ainda bem que eu
sou uma mulher que sempre trabalhou”. Porque ela, quando ela era casada com o meu
pai, ela poderia não ter trabalhado, mas ela sempre teve essa opção de trabalhar. E isso
vem muito para mim, essa questão que eu falei da autoestima relacionada ao trabalho e
ao acadêmico. Então eu acho que vem muito desse lado dela de sempre ter incentivado,
tipo: “Olha, sejam mulheres trabalhadoras, sejam mulheres que se esforcem para atingir
os objetivos de vocês”. Minha autoestima vem um pouco daí sim, dessa questão de me
sentir valorizada quando eu faço alguma coisa boa no trabalho ou academicamente. Então
eu acho que sim. Eu acho que ela sempre… Às vezes eu até falo “mãe, me fala coisas que
estão ruins no trabalho”. Porque minha mãe é uma pessoa que trabalha com política e ela
escreve muitos textos né. Então às vezes eu falo para ela “mãe, me fala um pouco o que
você acha de ruim”. E ela sempre põe muitas coisas boas. As vezes ela faz algumas
críticas mas na maioria ela sempre reforça os pontos positivos e tal. Ela sempre… Enfim,
eu acho que ela tem uma autoestima muito boa na minha autoestima sim.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Não, acho que eu falei. Acho que as perguntas abrangem minha relação
com a minha mãe.

Lizandra
21 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.
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Participante: É… Em relação ao que eu estou fazendo da vida ou mais coisas de


personalidade mesmo?

Entrevistadora: Os dois, o que você quiser.

Participante: Bom, eu tenho 22 anos, estou terminando o último ano da faculdade de


administração. Sempre gostei muito de trabalhar com moda, e agora então estou
estagiando nesse mercado. Estou trabalhando em uma empresa de moda, na área
comercial. É… Sempre fui uma pessoa muito dedicada assim, em tudo que eu fiz. Tanto
na faculdade quanto no trabalho e mesmo na vida pessoal. Sempre fui muito próxima
tanto da minha família quanto das minhas amigas, sempre mantive uma relação muito
forte em relação a isso, sempre foi a base para mim de tudo. E é o que eu tento manter
assim, mesmo trabalhando e estudando, manter uma relação forte com as pessoas que eu
sou próxima. Hm... Adoro viajar, adoro fazer compras, adoro chocolate (risos). E que
mais? De personalidade… Acho que eu tenho uma personalidade bem forte assim, em
alguns sentidos. Ao mesmo tempo que eu sou uma pessoa fácil de lidar assim, em
amizades eu sou sempre muito aberta. Ao mesmo tempo eu também sou muito gênio forte
em certas relações, principalmente familiares assim, porque eu sou uma pessoa muito…
É… Gênio forte no sentido de… É… Ter sempre a última palavra, sabe? Então, isso é
uma coisa que eu venho trabalhando bastante ultimamente. Mas eu sinto que em alguns
momentos prejudicou ao longo da minha vida.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: Bom, minha mãe, ela é uma pessoa muito dedicada também. Eu sinto que
essa parte da dedicação eu puxei muito dela. Principalmente em relação a família e
amigos, ela sempre… Para ela assim, o mais importante é manter a família unida e tudo.
A família inteira dela é muito próxima, a gente sempre está junto, sempre marcando
jantares. Eu sinto que isso é uma coisa que ela passa muito para gente, sempre… Desde
a nossa infância, essa união. E até hoje eu sinto que é assim, o mais importante para ela.
Mesmo com problemas pessoais ela sempre tenta não deixar isso prejudicar a relação dela
familiar. E… Eu sinto isso não só em família também, mas ela é uma pessoa que gosta
muito de sempre ajudar os outros, isso também é uma coisa que a gente tem muito em
comum. Ela está envolvida agora em um projeto social lá da escola que a gente tem. Então
é uma coisa que ela gosta de se dedicar para os outros em todos os sentidos. E… Ela…
Mas ela também tem uma personalidade forte nesse sentido de… De ser meio dona da
razão. Então isso foi uma coisa que sempre eu acho que atrapalhou a gente em alguns
sentidos, das duas terem uma personalidade forte, apesar de ter essa questão de ligação
de ter essa preocupação com a família, de proximidade, as duas tem esse gênio forte que
em alguns momentos acaba se estreitando. Mas de resto assim, acho que ela é uma pessoa
realmente muito aberta. Ela é… Tem… Como posso dizer? Ela é meio cabeça fechada
em algumas questões atuais. Isso também é uma coisa que pega em alguns momentos,
né? Na relação. Mas ela sempre está disposta assim, a tentar mudar em algumas coisas.
Ao contrário, por exemplo do meu pai, sinto que ela tem muito mais disponibilidade em
entender o que a gente está passando e entender o momento que a gente está e tentar
ajudar de uma certa forma.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.
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Participante: É… Quando eu era pequena a gente sempre foi muito, muito, muito ligada
assim. A gente era inseparável. Eu falava que não queria casar, não queria sair de casa,
eu queria morar com a minha mãe para sempre. E… Então assim, desde pequena a minha
irmã Camila era mais ligada ao meu pai e eu mais ligada à minha mãe. Tudo que a gente
ia fazer a gente fazia juntas, e… Isso é uma coisa que eu acho que ela sente muita falta
hoje, da proximidade que a gente tinha antes. A gente sempre gostou muito das mesmas
coisas então a gente cresceu… Eu cresci gostando de fazer as coisas com ela,
principalmente que ela trabalhava com decoração e eu sempre gostei muito de
acompanhar ela nas obras então sempre ia trabalhar com ela, não era uma proximidade
só em casa assim. A gente era muito ligadas nesse outro sentido assim de gostos também.
Então sempre foi uma relação muito boa e muito próxima.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na adolescência.

Participante: Na adolescência eu sinto que foi se distanciando um pouco nesse sentido


porque foi um momento que... É… Eu fui precisando do meu espaço. Mas eu sinto que é
um pouco uma aflição dela de sentir essa falta da gente ficar tão juntas. Só que parecia
que essa pressão dela em me cobrar que a gente não estava ficando juntas me deixava
mais afastada ainda. Então eu senti que a gente foi criando umas barreiras. E apesar da
gente sempre ter sido próxima, nunca teve muito uma proximidade no sentido de contar
as coisas. Ela nunca foi muito de perguntar assim da minha vida, dos detalhes da minha
vida. De meninos, de festa… De tudo. Então acho que nessa fase da adolescência foi um
momento que a gente acabou se distanciando em questão disso, momentos que eu estava
me descobrindo em certas questões. E eu sempre fui muito fechada em relação a todos,
não só em relação a ela. Nunca fui de falar muito sobre a minha vida pessoal. E como eu
não sentia um movimento dela em querer saber eu também não contava. E aí eu fui
sentindo que foi criando uma distância entre a gente principalmente nesse sentido assim,
que eu não me sentia confortável em me abrir por questões pessoais e como não tinha um
movimento dela também eu acabava não me abrindo at all. Então foi se distanciando não
nesse sentido físico mas de questões mais emocionais.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: Atualmente eu ainda sinto um pouco essa distância assim, em relação a


contar as coisas. Mas hoje eu sinto que é muito mais uma questão minha do que dela,
porque a gente já teve… Eu já conversei muito disso com ela, assim de as vezes eu não
me sentir confortável em expor as minhas coisas e não sentir que ela pergunta tanto. Então
ultimamente eu tenho sentido ela muito mais em cima assim, de perguntar como é que eu
estou, perguntar da vida, perguntar de tudo que ela… Que antes eu sentia esse
distanciamento. Então eu vejo uma proximidade dela em querer tirar essa barreira, só que
para mim isso ainda é muito difícil. Então é uma coisa que por exemplo eu trabalho muito
na psicóloga, de tentar me abrir mais com ela. Porque é uma coisa que tem um desejo
muito forte meu, mas por eu ter crescido sem isso é muito difícil eu chegar um dia e
simplesmente falar “olha mãe, aconteceu isso, isso e isso”. Então ainda sinto esse
distanciamento, mas sinto que hoje é algo que as duas partes sabem que está acontecendo
e estão tentando trabalhar em cima disso. Então ao mesmo tempo que ele existe, eu sinto
que tem uma perspectiva disso melhorar. Então isso me dá vontade de realmente querer
contar as coisas e trabalhar isso comigo para que a gente se aproxime. E também no…
Acho que principalmente no último ano, é, com… O ano passado principalmente que eu
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não estava bem comigo então eu passei por uma fase ruim. A minha mãe também já teve
quadro de ansiedade, depressivo, e eu senti que a gente se conectou um pouco nesse
sentido de eu ver a preocupação dela comigo em tentar me ajudar com uma coisa que ela
já tinha passado. Então eu senti assim um movimento muito mais forte dela nessas
questões de perguntar mais e de tentar se envolver não só fisicamente mas
emocionalmente porque ela sabia o que eu estava passando e eu me sentia confortável em
falar disso com ela porque eu sentia que ela realmente queria me ajudar e que ela sabia o
que eu estava sentindo. Então acho que nesses últimos meses a gente tem conseguido
aumentar essa relação por conta disso também, por essa conexão mais de um momento
parecido que a gente passou.

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Eu acho que essa pergunta assim foi muito uma foto do momento assim.
Eu já tive uma fase da vida que eu tinha uma autoestima muito para baixo assim, não de
demonstrar para os outros mas de não estar feliz com meu corpo, de não estar feliz
comigo, de sempre achar um erro em alguma coisa, querer mudar alguma coisa…
Principalmente agora nesse ano que eu comecei a me cuidar mais emocionalmente, ir
mais na terapia, eu tenho cuidado muito esse lado e tenho me sentido muito melhor
comigo. Então isso de antes eu tinha muito é… Uma nóia com exercício e com comida.
Então assim, eu comia uma colher de nutella que eu amo e ficava me sentindo super
culpada e ficava mal comigo achando que eu estava gorda e… Enfim, pensando mil
coisas. Agora tipo, eu sei que eu comer uma colher de nutella não vai me fazer mal
nenhum. Muito pelo contrário, vai me deixar muito mais feliz. Então eu sinto que hoje eu
tenho uma autoestima boa no sentido de me amar mais e me cuidar, estar disposta a me
cuidar assim, a isso. A não me cobrar tanto. Por que antes eu sinto que eu tinha muito
esse negócio de me cobrar, de querer ser perfeita, de tudo e eu acabava prejudicando a
imagem que eu tinha de mim mesma. E hoje em dia eu tenho trabalhado muito isso e
tenho sentido que eu tenho me sentido muito mais confiante e consequentemente eu acho
que eu passo essa confiança para os outros. Então é uma autoestima, mas também uma
imagem.

Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: É… Não sei. Acho que em partes sim, acho que tipo… Minha mãe… Meus
pais sempre foram muito flexíveis comigo. Como eu sempre me cobrei muito, eles sempre
foram o oposto assim, eles nunca foram de me cobrar. Então eu sinto que isso da minha
mãe também me ajuda a manter esse equilíbrio. Então assim, de “Filha, você está com
vontade de comer, come. Não tem problema. Come o doce”. Ela é tão viciada em doce
quanto eu. Então sempre teve um movimento dela de me fazer manter o equilíbrio nessas
coisas que acabam afetando minha autoestima. Então não só em relação a comida e
exercício, mas mesmo em relação a stress, dia-a-dia. Eu sofria muito com prova, chegava
uma prova e eu ficava chorando desesperadamente. Comecei a fazer psicóloga com 12
anos de idade porque eu me cobrava muito. E isso acabava afetando minha autoestima
nesse sentido, eu achava que eu tinha que ser perfeita, que eu só podia tirar 10, que isso
e que aquilo. E a minha mãe sempre foi muito importante nesse sentido de me mostrar
que tipo: Não, se eu tirasse um zero estava tudo bem e que eu não tinha que ser perfeita
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em tudo. E não tinha que ficar me cobrando tanto. Então eu acho que ela me ajudou a
construir autoestima nesse sentido, de ver que errar faz parte, que sair da dieta faz parte,
que não treinar o tempo inteiro faz parte. E a importância de você se cuidar
emocionalmente. Ela sempre foi muito de apoiar terapia, todo esse trabalho mais
emocional e eu sinto que isso me faz ser quem eu sou hoje.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Ah, acho que é isso. Falei mais do que achei que eu fosse falar! (risos).

Kiara
21 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: Tá. Tipo idade essas coisas? O que eu trabalho?

Entrevistadora: O que você quiser.

Participante: Então, eu sou a Kiara (sic adaptada), tenho 23… 22 anos. Às vezes eu
esqueço minha idade” (risos). Estou para me formar na ESPM em Publicidade. Acho que
publicidade é um curso muito bom para mim, porque querendo ou não eu sempre fui uma
pessoa que tem bastante personalidade. Sempre gostei de me comunicar e sempre soube
me comunicar muito bem. É… Então eu acho que querendo ou não essa parte de
publicidade por ter muito essa técnica de persuasão, de você impactar algo, é algo que
eu gostei bastante. Quando eu era pequena eu sempre fui uma pessoa muito influenciável
no sentido de sempre que eu via alguma coisa na tv e gostava eu queria comprar, sempre
quis ser atriz. Acho que essa parte de comunicação sempre esteve comigo. E eu acho que
atualmente como estou trabalhando com comercial é legal falar que a minha mãe sempre
trabalhou nessa parte de comercial, no sentido de vender as coisas. Ela sempre mandou
muito bem. Então eu acho que é muito legal ver que algo que ela fazia tão bem eu estou
fazendo bem também. Eu sou uma pessoa mais ansiosa, às vezes estressada. Às vezes
tranquila também, depende. Tenho um senso de humor bem engraçado, me acho bastante
engraçada (risos). Me acho uma pessoa meio cômica assim às vezes. Tenho personalidade
forte, sou super teimosa. Eu sou uma pessoa bastante sensível também. E… Acho que
desde pequena, isso é legal falar também, sei lá na sala assim quando tinha aquela pessoa
mais isolada, eu sempre defendia essa pessoa. Eu lembro de uma menina que foi uns três
anos da minha sala e apesar de eu ter outras amigas eu sempre pegava uma pessoa que
era mais sozinha e ficava amiga.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: Tá. Minha mãe tem 57 anos. Ela teve uma infância bastante difícil porque
quando ela tinha tipo 15 ou 14 ela perdeu o pai dela. E depois de alguns anos, não sei
quantos especificamente, ela perdeu o irmão mais velho dela. Tipo, a árvore genealógica
dela era assim: a mãe dela, o pai dela, aí ela tinha dois irmãos mais velhos que nem eu e
ela era a caçula. Lembro que ela falou que quando o pai dela morreu foi muito difícil
porque estava tudo ótimo na vida dela, mas foi um super susto. A minha avó é daquelas
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pessoas que meio que tipo… Era outra época, né? Então ela meio que nasceu para cuidar
do marido. Ela casou com 18 anos, não fez faculdade, tal… Então minha avó teve super
que se virar nos trinta. E minha mãe sempre viu isso. E logo depois também o irmão mais
velho dela morreu e aí, puts… (sic) Foi muito osso. (sic). Minha mãe disse que passou
por várias coisas tristes, mas querendo ou não ela aprendeu muito. Ela aprendeu muito a
ser sempre positiva, a meio que tentar achar uma… Tipo… É que não é… Tipo uma rocha
dentro dela assim, sabe? Achar um forte dentro dela. Ela sempre foi uma pessoa super
dedicada. Ela gosta muito de criança, então ela trabalhou com isso. Ela é formada em
pedagogia. Aí ela trabalhou com criança até ela engravidar e aí depois ela ficou sem
trabalhar. Depois de um tempo, depois que me teve, ela começou a trabalhar com loja. Aí
foi que ela começou a trabalhar nessa parte de vendas, e ela gostava muito. Ela sempre
foi uma pessoa que gostava de pessoas também. Então ela falava que era muito gostoso
interagir com as crianças, mas também com os pais das crianças e na loja que ela ficou
muito tempo também era de criança e ela gostava bastante. Acho que ela é uma pessoa
super batalhadora, porque querendo ou não ela também teve que se virar, sabe? Ela
também teve que… Em uma época ela não conseguia ajudar a minha avó, mas depois que
ela estava mais velha ela sempre cuidou da minha avó, até mais que o irmão dela né.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.

Participante: Foi muito boa. A gente sempre foi muito amigas. Mas quando eu era
pequena… É que ela sempre trabalhou né, então eu não lembro dela brincando e essas
coisas em casa. Porque ela sempre estava trabalhando. Mas ela sempre me dava presente,
sempre me elogiava, sempre… Sei lá, quando eu tinha prova ela estudava comigo.
Quando eu tinha que memorizar alguma coisa ela sempre me ajudava. Então ela sempre
esteve super presente assim. Aí… Eu fui crescendo e ela sempre foi… Me elogiou… Mas
acho que depois… Acho que quando eu comecei a namorar a gente ficou mais próximas,
porque ela me ajudava bastante. “A próxima pergunta é sobre a relação de vocês na
adolescência” Ah, então tá. Já vou falar.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na adolescência.

Participante: Na hora que eu cresci, a gente ficou mais próxima porque eu lembro que
eu namorava e tinha uma época que o meu irmão ainda não sabia e ela me ajudava. A
gente ficou bastante próxima. A nossa relação sempre foi boa, mas melhorou bastante. E
aí ela sempre me elogiou, sempre me ensinava as coisas. Sempre me explicava como eu
tinha ser positiva, que quando eu tava estressada eu tinha que me acalmar. Que não
adiantava eu ser uma pessoa… Eu sou uma pessoa que falo muito sem pensar, e ela
sempre me ensinava a pensar antes. Falar tipo, “calma, vê”. Não falar qualquer coisa que
pensa, estruturar antes, até para não perder a razão. Ela sempre me falou que ela teve
diversas chances para ser uma pessoa meio que f... mesmo (sic), mas sempre foi positiva,
sempre lutou. E ela falou que isso que manteve ela sempre sã, sabe? Uma coisa que ela
sempre ressaltava para mim é que a vida sempre foi muito difícil com ela, mais que a
maioria das pessoas. E é verdade. Mas que ela sempre se saiu muito bem, ela sempre
gostava de mostrar para mim isso. Que mesmo eu não sendo a pessoa mais rica, a pessoa
mais x, mais y, eu sempre ia ter que ser muito positiva e me defender, porque querendo
ou não se você não se defende, não se ama, ninguém vai te amar. Ela me ensinou muito
essa parte de amor próprio.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.
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Participante: Ah, é muito boa. Muito boa. Sempre foi muito boa. Agora é muito boa
também. Ainda mais que eu estou namorando, ela gosta bastante do Carlo (sic adaptada).
Acho que muitas vezes ela fica com mais saudade assim, de não ficar muito comigo
porque querendo ou não eu e meus irmãos estamos namorando, então a gente passa
bastante tempo com os namorados. Acho que isso acabou afetando ela um pouco, tipo
com a pandemia… Mas mesmo assim a gente sempre está juntas. Ela gosta de me dar uns
presentes, quando ela viaja ela me dá alguma coisa, quando eu viajo eu dou alguma coisa
para ela também. Ou sei lá, quando ela vai na farmácia e eu não vou ela gosta de comprar
um shampoo que eu gosto, alguma coisa assim, sabe? A gente é bastante amigas, ela me
conta bastante da vida dela. Às vezes quando ela está triste, ou quando ela tem algum
problema, quando está com saudades da mãe dela. E quando eu tenho um problema ela
sempre me ajuda. Então acho que ao longo do tempo foi melhorando e amadurecendo.
Acho que a fase mais difícil foi no terceiro colegial, quando meus pais se separaram. Foi
uma época de muito atrito. Foi muito difícil porque ela tinha perdido a mãe dela, então
querendo ou não, ela não é muito próxima do irmão, então querendo ou não foi muito
ruim para ela. E ao mesmo tempo ela se separou. E acho que isso afetou… Eu sempre fui
a pessoa mais próxima dela, então quando a mãe dela morreu e ela precisava meio que
contar com alguém ela sempre contava em mim (sic). Foi uma época que eu sempre falo
que eu cresci muito, porque eu lidei com problemas que teoricamente uma pessoa da
minha idade não vai lidar. Mas por ela estar sozinha e precisar falar com alguém, e às
vezes chorar com alguém, ela fazia isso comigo. E aí foi uma época de atrito no sentido
que foi muito difícil assim, para as duas. E… Acho que foi isso, assim. Ela sempre fala
“você tem mágoa dessa época?” e eu falo “não, eu não tenho”. Porque realmente foi uma
época que eu cresci muito. Mas não deixa de ser difícil, sabe? Porque querendo ou não,
como ela contava muito comigo, eu fiquei sobrecarregada. Porque eu pensava "eu não
posso parecer fraca para ela, mas ao mesmo tempo eu tenho que segurar as pontas em
casa com o meu pai e meus irmãos.” Então foi uma época que eu absorvi muito. E… Aí
foi também consequentemente a época que eu mais engordei, porque eu precisava
descontar em alguma coisa. Precisava conversar com alguma pessoa, mesmo fazendo
terapia, sabe? Acho que foi essa época.

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Então, acho que muito por conta da minha mãe assim. A minha mãe
sempre, desde pequena, me ensinou: “K (sic adaptada), se você não se amar, ninguém vai
te amar. Se você não se achar bonita, ninguém vai te achar bonita”. E o bonita dela não é
tipo… Óbvio que tipo… Eu sou uma pessoa loira, de olho claro, então acaba sendo mais
fácil. Mas ela falou “isso não é o que te faz bonita”, entendeu? Independente de você ser
esteticamente bonita você precisa ser uma pessoa educada, uma pessoa que transmite
educação, uma pessoa que transmite o bem. Porque isso é o que te faz ser bonita,
entendeu? Independente de você ser loira ou morena. Então eu sempre fui uma pessoa
que eu sempre cuidei bastante de mim, eu sempre tentei… É… Eu sempre tentei, não
ajudar as pessoas no sentido de as pessoas necessitarem, mas eu sempre gostei de ouvir
as pessoas. Sempre gostei de ajudar elas. Meio que essa parte da minha mãe da autoestima
eu meio que passava para as pessoas. Então tinha uma época que uma amiga minha estava
meio triste porque não estava se sentindo muito bonita, e ela passava muito lápis. E minha
mãe sempre falava para ela não usar lápis, porque ia deixar ela mais leve. E eu falava
“nossa, é verdade”. Sei lá, não sei. Acho que tem isso. Acho que eu me acho uma pessoa
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com autoestima alta porque eu tenho muito cuidado comigo e aí volta naquela coisa “se
eu não cuidar de mim mesma, quem vai cuidar?”. Tanto cuidado na posição psicológica,
então sempre ver se eu estou bem, se não estiver bem pedir ajuda. Ou esteticamente
também, sabe? Cuidar do meu cabelo, cuidar da minha pele, fazer exercício. Então eu
acho que vêm disso também, vêm das práticas do dia a dia.

Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: 100%. 100%. Porque se ela não tivesse me ensinado isso, eu até poderia
ter uma autoestima boa, mas eu acho que seria mais superficial. No sentido só de eu me
achar bonita. E não no sentido de eu cuidar de mim, eu querer o bem para mim, eu
entender que às vezes eu também sou importante em algumas situações. Ou as vezes,
tipo… É… Só consigo pensar inglês, “speak up”, sabe? Falar por você. Eu acho que ela
me deu muito isso, porque ela foi me demonstrando sempre como ela conquistou as coisas
e foi mostrando isso para mim, sabe? E eu acho que refletiu muito. E querendo ou não ela
também sempre foi muito vaidosa. Acho que isso é legal falar. Quando eu era
pequenininha, eu estudava a tarde e minha mãe sempre ia para a loja umas 10, né? E na
época, sei lá, eu acordava umas 6 para ir para a escola de inglês, e voltava. E eu sempre
via ela se arrumar. Toda vez que ela se arrumava, eu ficava na cama dela vendo. Acho
que essa parte de se arrumar, de vaidade mesmo, eu peguei muito disso. Porque eu sempre
vi ela colocando roupa, tirando roupa. “Ai, essa não ficou boa. Acho que vou assim”. Era
bizarro porque minha mãe ficava 8 horas em pé e ela ficava de salto. E na loja você não
podia sentar, se você sentasse você era demitida, sabe? Uma coisa desumana. E eu sempre
vi essa vaidade e acabei pegando para mim também.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Hm… Não sei, acho que não. Acho que minha mãe meio que sempre que
mostrou que ela foi uma pessoa que batalhou, sabe? Mesmo ela não sendo sei lá, a pessoa
das amigas dela mais rica ou com mais coisa material, ela sempre falou para mim: eu
sempre soube que eu não ia ser uma pessoa que ostentaria dinheiro, no sentido de ter
muito, mas eu sempre soube que teria uma família muito boa”. Então eu sou muito sortuda
em relação a isso. Ela me passou muito a riqueza da família também. Acho que é isso.

Pérola
23 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: Tá. Meu nome é Pérola (sic adaptada), eu tenho 22 anos. É… Eu faço
faculdade de medicina hoje em dia, estou no terceiro ano. É… Eu namoro. Minha religião
é… Eu sou evangélica. Acho que é isso basicamente. Da minha personalidade, eu sou
muito sensível, sou emotiva assim. Me emociono muito fácil. Acho que sou uma pessoa
muito carinhosa, amorosa com as pessoas. Acho que os pontos mais importantes na minha
personalidade são esses.
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Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: A minha mãe ela é.. Se não me engano ela tem 44 anos. Também é muito
carinhosa. Comparando comigo ela é um pouco menos sensível, ela é mais racional do
que eu. É. Acho que a minha visão da minha mãe é que ela é a pessoa que resolve
problemas. Acho que assim, sempre quando eu preciso de alguém para… Quando eu…
Preciso de alguém que me ajude em alguma coisa, ela é a primeira pessoa que eu recorro.
Para mim ela é muito inteligente, acho que ela é muito articulada assim com as coisas que
acontecem, com as adversidades vamos dizer assim.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.

Participante: Eu sempre fui muito grudada com a minha mãe, sempre tive muito ciúmes
dela quando eu era pequena. Acho que teve uma vez até que eu… Enfim, algumas vezes…
Lembro de três vezes que eu vi ela, uma foto dela, com alguma outra pessoa. Uma com
meu primo, que quando eu vi eu fiquei com tanta raiva que eu até bati a cabeça e tive que
ir para o hospital. Outra com meu irmão, que eu peguei uma foto deles e risquei. E uma
foto da minha mãe entrando no casamento dela com o meu tio, já que meu avô faleceu, e
aí ela entrou no casamento dela com meu tio. E aí eu fiquei com tanto ciúmes que ela
estava casando na minha cabeça com o meu tio que eu cuspi na foto quando eu era
pequena. Eu acho que eu devia ter uns 5 anos. E… Assim, sempre fui muito muito muito
grudada com ela. Assim, de querer dormir com ela, com meus pais. E eu sempre fui,
enfim, muito muito grudada com ela.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na adolescência.

Participante: Acho que eu sempre tive uma relação muito boa com ela também, tudo que
acontecia ela era a primeira pessoa que eu queria contar. Assim, sempre ouvi muitos
conselhos dela. Acho que a gente continuou muito grudada, mas acho que de um jeito
diferente. Eu sempre via minha mãe muito como minha amiga assim, sabe? De contar
segredos e enfim… Acho que é isso. Às vezes tinham conflitos, acho que toda relação de
mãe e filha têm conflitoszinhos (sic) assim. Minha mãe ela sempre é… Sempre… Não
ditou muito regras, não regras. Ela sempre me falava o que ela achava que era certo e o
que ela acha que não era certo. Mas eu sempre via uma imposiçãozinha assim no que ela
falava.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: Acho que mudou um pouco quando eu comecei a namorar. É… Eu acho


que eu meio que… Não transferi isso para o meu namorado, mas acho que hoje em dia as
coisas que eu contaria para ela eu conto para ele, sabe? Eu ainda tenho na minha cabeça
que se eu preciso de alguém para me ajudar ou alguma coisa ela é a pessoa que eu recorro,
mas acho que minha relação com ela mudou um pouco a partir desse momento. A gente
continua amiga assim, continuo próxima dela. Mas acho que um pouco menos. Um pouco,
não. Menos. Para ela foi muito difícil, e para mim foi difícil porque para ela foi difícil.
Mas acho que ela teve… Para mim ela nunca disse isso, mas eu acho que… Sempre negou
na verdade. Mas eu acho que ela sentiu um pouco de ciúmes, sabe? De eu ficar… Eu
passo bastante tempo com o L. (sic adaptada) né, então acho que ver eu crescendo, eu
tendo uma experiência diferente assim, que é um namorado, que é meu primeiro
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namorado, acho que foi difícil para ela assim. Por ver que eu me afastei um pouco. Mas
um afastamento normal, sabe? De crescimento e amadurecimento.

Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Ah, eu acho que eu tenho uma boa autoestima porque eu me considero uma
pessoa bonita. Me considero alguém, sei lá, atraente. Eu acho que não sei… Eu me gosto,
eu gosto das minhas características e da minha personalidade também. Não sei, foi com
base nisso. Autoestima para mim é quando você se sente bem com você mesmo. Você ter
uma boa relação com você mesmo. Acho que todo mundo tem alguma coisa que não
gosta, mas acho que assim, as coisas que eu não gosto são menores que as coisas que eu
gosto.

Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: Eu acho que sim. A minha mãe sempre me colocou para cima, sabe? Tipo,
ela sempre enfatizou que eu sou uma pessoa bonita assim. Acho que até mais do que
deveria. Eu acho que ela sempre usou palavras de afirmação comigo, desde pequena
assim. Sempre fez muitos elogios para mim. Acho que isso inconscientemente ou
conscientemente ficou na minha cabeça, sabe? A minha mãe sempre foi uma pessoa muito
vaidosa, e acho que ela passou isso para mim, sabe? Então eu sempre me arrumei bastante,
sempre gostei de me arrumar, sempre gostei de me cuidar também, de enfim… Coisas
pequenas, fazer a unha, cuidar da pele, maquiagem. A minha mãe sempre que eu saia
assim me ajudava a arrumar meu cabelo…

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Acho que não, acho que é isso

Flora
24 de abril de 2021

Entrevistadora: Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante
contar da sua vida.

Participante: Ah, eu acho que eu sou uma pessoa muito dinâmica. Tipo assim, gosto de
fazer várias coisas ao mesmo tempo. Mas ao mesmo tempo eu equilibro muito isso na
minha vida com exercício físico e meditação que foram coisas que eu peguei muito da
minha família. É… Mas me considero muito agitada, sabe? Uma pessoa que gosta de
fazer coisas, sempre está em movimento. E… Acho que é isso.

Entrevistadora: Agora me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha
importante contar sobre ela.

Participante: Ai, a minha mãe é uma pessoa muito guerreira assim, muito forte.
Principalmente no âmbito profissional, ela que cuida de todas as contas da nossa casa,
paga tudo para a gente porque o meu pai não tem condições de ajudar. Então isso me
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inspira muito assim nela, sabe? Ver tipo a força dela, toda essa jornada profissional dela
que sempre foi muito incrível. Eu fico muito orgulhosa de ver que ela conseguiu
conquistar várias coisas e se tornou uma referência assim. Da personalidade ela tem
algumas questões psicológicas. Ela tem ansiedade, depressão, e isso caga (sic.) um pouco
a relação com ela. Ela acaba ficando muito afobada as vezes com algumas coisas. Mas da
personalidade dela, que eu acho legal assim, eu acho ela uma pessoa muito generosa,
muito amorosa. Ela sempre procura muito ouvir o outro, sempre procura ser próxima
principalmente de mim assim. Eu sinto que ela é muito minha amiga, isso é muito bom.
Ela sempre quer ouvir, ela é super empática. Mas as vezes ela acaba ficando estourada,
acho que por essas questões dela aí de ansiedade e tal. E aí atrapalha um pouco.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.

Participante: Ai… Nossa, eu não lembro. Eu estava falando com a minha terapeuta disso
esses dias. Na verdade, foi meio conturbado porque quando o meu irmão nasceu eu fiquei
muito com ciúmes assim, por eu me sentir trocada. Eu ficava sendo um pouco brava, meio
raivosa, sabe? Meio querendo fazer coisas para não estar em casa. Eu sempre ia dormir
na casa da minha avó ou tipo na casa das minhas amigas. Para evitar ficar em casa e não
ter que lidar com essa coisa de ciúmes. Mas ao mesmo tempo tipo, eu sempre fui muito
amiga dela. Sempre pude contar com ela. Ao mesmo tempo que tinha um pouco dessa
questão de se afastar por conta do ciúmes, sempre ela tentou ser próxima e eu sempre fui
recíproca a isso. Contar das minhas amigas, dos namoradinhos. Essas coisas.

Entrevistadora: Me conte um pouco como foi sua relação com sua mãe na adolescência.

Participante: Na adolescência eu acho que começou a ficar um pouco melhor. Tipo, eu


tive vários conflitos com ela. Eu acho que ela queria que eu amadurecesse e eu ainda não
estava tão madura assim. Principalmente por essas questões eu acho que financeiras, que
foi quando ela se separou do meu pai e tudo mais. Aí a gente precisou conter gastos por
ele não estar podendo ajudar e tudo. E aí eu acho que ficou um pouco mais conturbada
por ela querer que eu tivesse uma mentalidade que eu ainda não tinha. Mas ainda
continuou… Fora isso continuou muito essa questão da amizade, reciprocidade, empatia.
A gente sempre conversou muito, sempre procurou se entender e tal. Por mais que tinha
conflitos, não era uma coisa do tipo “ai, não fala comigo por um mês”, sabe? A gente
sempre tentou se entender e crescer juntas assim.

Entrevistadora: Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.

Participante: Então… Atualmente é uma coisa assim louca. (risos). Mentira, eu acho que
a pandemia tipo intensificou muito todas as relações. Aqui não foi diferente, a gente se
mudou, tipo, sabe? Teve várias coisas que aconteceram que a gente teve que se unir mais.
Eu acho que isso foi muito bom para a gente tornar a relação mais forte e tal. Mas ao
mesmo tempo geraram alguns conflitos que a gente teve que ir se moldando, sabe? Então
tiveram várias discussões até acho que de choque de personalidade que a gente não se
conhecia antes direito e aí como a gente conviveu muito a gente teve que se entender para
conseguir se encaixar. Mas deu super certo, a gente conversa e tal e cada vez mais vai
melhorando. Mas óbvio que ainda tem uns conflitos ou outros que antes não tinha porque
a gente não convivia tanto.
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Entrevistadora: Na primeira fase deste estudo, você disse que acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.

Participante: Ai, eu pensei um pouco na minha aparência. Que eu acho que eu tenho
uma autoestima boa em relação a minha aparência física. Já tive muitas questões com o
meu corpo e tudo mais. Mas acho que tem melhorado, não é que eu me olho no espelho
e falo: Nossa, que coisa horrorosa. Então eu acho que é mais para sim do que para não. E
também a questão de… A minha personalidade. Às vezes eu fico muito insegura, mas
não é nada que eu deixo de fazer alguma coisa em relação a isso. Então eu acredito que
seja mais para o bom do que para o ruim.

Entrevistadora: Também na primeira fase do estudo, você disse que sua mãe interferiu
na sua maneira de ser. Você acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na
avaliação que você faz da sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?

Participante: Eu acho que sim, porque ela sempre… Como eu falei, a gente tem uma
relação muito aberta, sabe? De se apoiar, e tudo mais. Então eu sempre fui muito aberta
com as minhas questões e ela sempre tentou me colocar para cima e me ajudar em relação
a isso e tudo mais. Mas eu acho que tem algumas coisas dela que eu peguei para o lado
negativo também. Então tipo, a minha mãe é uma pessoa muito insegura, muito que se
coloca para baixo. Então às vezes eu acho que eu peguei um pouco dessa mania, por mais
que às vezes eu não achasse alguma coisa… Sei lá, alguém falava: “Nossa, como você é
isso e tal”. E eu falava “nem é isso”, porque eu aprendi que era mais bonito você não se
achar tanto. Se você tinha uma autoestima boa é porque você se achava, sabe? Então acho
que eu peguei essa mania de me colocar para baixo por não ser bonito se sentir bem, ter
uma boa autoestima.

Entrevistadora: Tem algo que você queira acrescentar?

Participante: Não, tudo certo.


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ANEXO A

ESCALA DE AUTOESTIMA ROSENBERG – Adaptação de Hutz (2010)

Leia cada frase com atenção e selecione a opção mais adequada.

1. Eu sinto que sou uma pessoa de valor, no mínimo, tanto quanto as outras pessoas.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo

Concordo Totalmente

2. Eu acho que eu tenho várias boas qualidades.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo

Concordo Totalmente

3. Levando tudo em conta, eu penso que eu sou um fracasso.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo

Concordo Totalmente

4. Eu acho que sou capaz de fazer as coisas tão bem quanto a maioria das pessoas.

Discordo Totalmente

Discordo
99

Concordo

Concordo Totalmente

5. Eu acho que eu não tenho muito do que me orgulhar.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo

Concordo Totalmente

6. Eu tenho uma atitude positiva com relação a mim mesmo.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo

Concordo Totalmente

7. No conjunto, estou satisfeito comigo.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo

Concordo Totalmente

8. Eu gostaria de poder ter mais respeito por mim mesmo.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo
100

Concordo Totalmente

9. Às vezes eu me sinto inútil.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo

Concordo Totalmente

10. Às vezes eu acho que não presto para nada.

Discordo Totalmente

Discordo

Concordo

Concordo Totalmente
101

ANEXO B
ENTREVISTA SEMI-DIRIGA – SEGUNDA FASE

1. Me fale um pouco sobre você, o que você gostaria e acha importante contar da
sua vida.
2. Me fale um pouco sobre sua mãe, o que você gostaria e acha importante contar
sobre ela.
3. Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na infância.
4. Me conte um pouco como foi sua relação com a sua mãe na adolescência.
5. Me conte um pouco como é sua relação com a sua mãe atualmente.
6. Na primeira fase deste estudo, você disse que (sim ou não) acredita ter uma boa
autoestima. Me conte um pouco como você avaliou sua autoestima.
7. Você disse que sua mãe (sim ou não) interferiu na sua maneira de ser. Você
acredita que sua relação com a sua mãe influenciou na avaliação que você faz da
sua autoestima? Se sim, como foi essa influência?
8. Tem algo que você queira acrescentar?

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