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A crítica do conceito de democracia liberal em Domenico Losurdo

O presente projeto de pesquisa consiste na investigação das críticas do filósofo italiano


Domenico Losurdo às ideias liberais, a saber, o apontamento de uma evidente
contradição das ideias propostas pelos principais pensadores liberais,

onde a liberdade individual paradoxalmente cria cláusulas de exclusão, excluindo


também vários outros contextos e dando relevância a países que historicamente foram
países detentores de ações no mercado escravocrata.

Losurdo se apresenta como um pensador que apresenta críticas incisivas aos preceitos
liberais, apontando os paradoxos da tradição liberal baseando-se no contexto histórico
político enquanto destrincha o pensamento dos grandes expoentes dessa tradição.

O capitalismo, por sua vez, se apresenta como um sistema baseado nessas ideias
liberais, onde existe uma defesa fervorosa da liberdade do indivíduo e propriedade
privada que se assemelha bastante com as preocupações da tradição liberal: "o
liberalismo é a tradição de pensamento que situa no centro de suas preocupações a
liberdade do indivíduo, desconsiderada ou pisoteada pelas filosofias organicistas de
diferente orientação." (LOSURDO, 2006, P. 15).

Entretanto, nas práticas políticas durante a história, os grandes representantes da


tradição liberal vistos como "países modelos” são figuras de opressão sob países
subdesenvolvidos.

Como bem aponta Losurdo, existe um grande impasse nos autores liberais e suas
teorias. Enquanto defensores ferrenhos da liberdade do indivíduo, muitos dos autores e
defensores desse modelo liberal são escravocratas.

É nesse ponto onde mora a grande contradição, afinal, por que expoentes defensores da
liberdade individual, defendem também as instituições escravocratas? Para Losurdo,
uma grande questão é que o liberalismo defende mais a propriedade do que a própria
liberdade do indivíduo, propriedade que foi construída sob o alicerce do sistema
escravocrata. (LOSURDO, 2004).
Losurdo aponta que muitos desses autores/filósofos liberais (tais como John Locke,
entre outros) se beneficiaram e eram acionistas desse mercado, ou seja, o sistema
escravocrata era conveniente a esses defensores do liberalismo: o sistema capitalista de
braços dados com o pensamento liberal em defesa da exploração humana em todos os
sentidos.

Outro ponto que Losurdo expõe é que muitos desses teóricos apesar de serem
defensores do liberalismo, eram coniventes até mesmo com a falta de liberdade de seus
compatriotas, muitas vezes vistos como marginais ou pessoas ociosas. Ressaltando
assim, a necessidade de escravidão dos vagabundos, mendigos e a plebe ociosa
"incorrigível da metrópole" (LOSURDO, 2006).

Introdução

Ao publicar a obra "a contra-história do liberalismo” Losurdo contrapõe o pensamento


prevalente referente ao liberalismo:

Na era do triunfalismo da chamada democracia liberal burguesa, apresentando uma ampla


argumentação que se sustenta em uma extensa documentação onde o pensador defende
que a democracia é burguesa porque soube o capitalismo se adaptar ao regime político,
regime esse que é determinado sobre determinado pelo padrão de acumulação e pela
defesa da liberdade individual.

Entretanto, no pensamento de Losurdo. O que entendemos como instrumentos típicos da


democracia política, não está atrelado a uma criação da burguesia, mas sim uma imposição
do movimento operário e anti colonial para a burguesia.

Quando se pensa no processo histórico, a burguesia de forma ferozmente lutou para


esvaziar, no sentido de soberania popular, os mecanismos de democracia política, em
especial, podemos pensar no sufrágio universal e no direito de voto para todos os
indivíduos, mas também protagonizaram a defesa do mercado escravocrata como
necessário para o desenvolvimento do Estado. (MANOEL, 2021).

Para Losurdo, em sua obra “contra história do liberalismo”, o debate central se apresenta na
ideia de uma história objetiva do que é o liberalismo enquanto conceito e prática social,
ademais, as suas transformações históricas também são de suma importância para o
entendimento assim como o condicionamento histórico político que essas transformações
vão acarretar: "Portanto, ao dar início à pesquisa, somos levados a nos colocar uma
pergunta preliminar sobre o objeto cuja história temos a intenção de Reconstruir O que é o
liberalismo?" (LOSURDO, 2006, p. 14).

Losurdo não está pensando em uma história da ideia do liberalismo através dos autores da
teoria liberal, seu objetivo se pauta em uma análise histórica política do liberalismo dentro
da história.

Para o liberalismo, como bem aponta Losurdo, as chamadas raças inferiores não eram
consideradas humanas, mas sub-humanas. O reconhecimento da dignidade humana de
cada indivíduo provem de vastos processos revolucionários históricos, a partir de
movimentos políticos e sociais que frequentemente combateram as sociedades de modelos
liberais e as instituições da escravidão:

Muito diferente é a situação da América Latina entre inícios e liberais e êxitos radicais a
revolução tem colocado em marcha uma frente atravessada por profundas contradições
sociais e étnicas. Enfrentam-se duas ideias contrapostas de liberdade uma leva a pensar no
gentleman inglês decidido a dispor livremente de seus servos; a remete a luta que em São
Domingos Haiti havia posto o fim a escravidão dos negros (LOSURDO, 2006, p. 181).

Na concepção de Domenico Losurdo, o liberalismo nunca concebeu integralmente a


liberdade formal, nesse parâmetro acaba por gerar um constrangimento quando a
escravidao se torna uma pauta política a ser levada em consideração.

Outro pensamento prevalente que Losurdo vai questionar se baseando em fatos históricos,
é a afirmação de que a universalização das condições humanas foram frutos do
pensamento liberal. No entendimento de Losurdo, a universalização da condição dos
humanos provém de lutas revolucionárias anticoloniais e operárias, de imposições ao
sistema burguês.

Losurdo mostra que historicamente a tradição liberal elaborou cláusulas de exclusão para
condição de humano, de tal modo, povos racializados da periferia do sistema capitalista
(negros, mulheres e classe operaria) estava foras da categoria de humanos.
"Vimos que a tradição Liberal está perpassada por duas macroscópicas cláusulas de
exclusão. Na realidade existe uma terceira contra as mulheres que, no entanto, apresenta
características peculiares." (LOSURDO, 2006, p. 217).

Losurdo também aponta que o universalismo do iluminismo e do europeu em geral sempre


foi um universalismo restritivo, com várias cláusulas de exclusão:

Aos olhos de Locke não é propriamente capaz de vida intelectual e moral "a maior parte da
humanidade destinada ao trabalho e tornada escrava pelas necessidades de suas
condições medíocres cuja vida se consome apenas na busca das suas necessidades".
(LOSURDO, 2006, p. 115).

Em contrapartida, Losurdo defende a importância da Revolução de Outubro como impacto


central para a universalização do direito a voto. Sendo apenas na Rússia revolucionária a
primeira experiência do mundo que o direito a voto foi franqueado para todas e todos sem
exceção, inclusive mulheres analfabetas e minorias nacionais.

Vale salientar que, para Losurdo, no século XX, o movimento comunista foi o grande
adversário do colonialismo, da "democracia para o povo dos senhores" e do Estado racial.
(LOSURDO, 2015).

Finalmente, a última pergunta: a "democracia para o povo dos senhores" desapareceu


totalmente dos nossos dias?

Na visão do filósofo italiano constatar que o capitalismo se sustenta dentro do revisionismo


histórico liberal para não demonstrar suas contradições e como se apoiam em uma
"prosperidade" de países historicamente imperialistas defensores de uma liberdade que
pode ser entendida como uma liberdade dos senhores.

Desse modo, muitos dos elementos da tradição colonial clássica nunca foram superados.
(LOSURDO, 2020).

Nosso projeto visa, seguindo os passos de Domenico Losurdo, dar uma contribuição para a
pesquisa contemporânea em torno de questões relevantes no discurso interdisciplinar
global em torno dos rumos a serem traçados pela humanidade no início desse novo milênio
devida atenção para a problemática da democracia liberal.

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