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PLANEJAMENTO

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E GESTÃO ESTRATÉGICA

Neste módulo você aprenderá:

O que é um museu, em termos teóricos,


e de que forma essa definição se modificou
ao longo do tempo;

Acerca das políticas públicas e profissionalização


relativas ao setor museal.

Sobre o histórico e estrutura da área,


seus principais agentes e agências.
MUSEUS E DIVERSIDADE
PATRIMONIAL NO SÉCULO XXI

1. O QUE É UM MUSEU?
TRANSFORMAÇÕES DA
INSTITUIÇÃO MUSEAL E OS NOVOS
PARADIGMAS INSTITUCIONAIS.

Os museus são locais historicamente ligados à coleta


e ao estudo de testemunhos provenientes do mundo
natural e cultural. Entretanto, desde sua origem, os
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museus passaram por mudanças que alteraram esse


foco de atuação, transferindo o olhar e as práticas dos
profissionais dessas instituições do cuidado com as co-
leções para a atenção com o público (RIVIÈRE, 1989).
Essas mudanças trouxeram impactos na compreensão
do que é um museu na contemporaneidade, e como
essas instituições se relacionam com a sociedade.

A mudança no caráter público dos museus, de insti-


tuições que armazenavam e estudavam coleções do
mundo natural e cultural, para instituições nas quais
as necessidades do público visitante têm um papel
fundamental, aconteceu de forma mais drástica a
partir da segunda metade do século XX. Essas trans-
formações não aconteceram sem tensões e mesmo
nos dias atuais suscitam intensos debates na comu-
nidade museológica.

O significado da palavra museu, mudou ao longo do


tempo. Do templo das musas, aos museus da con-
temporaneidade, muitas são as possibilidades ins-
titucionais que existem sob essa denominação. Um
importante recurso para entender as mudanças na
definição de museu é a documentação do Conselho
Internacional de Museus (Icom), órgão ligado à Unesco
que reúne os profissionais, pesquisadores e institui-
ções da área museológica em todo o mundo. Fundado

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em 1946, o Icom tem uma série de ações e progra-


mas visando o fortalecimento da profissão dos tra-
balhadores de museus, a estruturação das práticas
institucionais e a consolidação da área museológica.

De acordo com a pesquisadora Maria Esther Valente


(2008), a definição inicial de museu proposta pelo Icom foi:

“Museu é toda instituição permanente que


conserva e apresenta coleções de objetos
de caráter cultural ou científico, para fins de
estudo, educação e de deleite” (ICOM, 1947,
article 3 apud VALENTE, 2008, p. 23).

O que pode ser considerado como uma definição


abrangente deixava transparecer as controvérsias
sobre a função dos museus: é a coleta e estudo de
coleções ou a educação e a comunicação que devem
ser o foco da instituição? (MARTINS, 2006). Em 1974
a definição inicial da entidade foi modificada, ficando
com seguinte texto:

“O museu é uma instituição permanente,


sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e
de seu desenvolvimento, aberta ao público, Para saber
mais sobre o
que realiza pesquisas relativas aos teste- funcionamento
munhos materiais do homem e de seu meio e a composição
do Conselho
ambiente, os adquire, os conserva, os co- Internacional de
munica e especialmente, os exibe para fins Museus, acesse:
http://icom.
de estudo, educação e deleite. (MAIRESSE museum/
e DESVALLÉES, 2007, p. 52).”

Em 1998 foi criado um grupo de trabalho interno


do Icom para a discussão e reformulação dos prin-

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cipais documentos do órgão. A definição de museu


foi um dos documentos discutidos e reformulados.
Após aprovação no âmbito da assembleia geral da
entidade, em 1998, em Seul, na Coréia do Sul, ficou
definido como museu: “uma instituição permanente,
sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu
desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, con-
serva, pesquisa, divulga e expõe, para fins de estudo,
educação e lazer, testemunhos materiais e imateriais
dos povos e seu meio ambiente.” (ICOM, 2006, p.6).

Tal definição comporta uma multiplicidade de funções


que geram diferentes enfoques institucionais para o
Para saber mais museu. Instituições com caráter mais educacional e
sobre a diversidade
museal brasileira,
você pode acessar comunicacional, como ecomuseus e museus de socie-
o Guia dos Museus
Brasileiros (http:// dade, convivem lado a lado com aquelas mais volta-
www.museus.gov.br/
guia-dos-museus-
-brasileiros/) e a das para a pesquisa científica e a guarda de coleções.
plataforma Museus.
br, uma repositório Ainda, o lazer adquire um aspecto relevante nessa
de informações,
organizado pelo
Instituto Brasileiro de definição, trazendo à tona o caráter de instituição cul-
Museus (Ibram) sobre
os museus nacionais tural e midiática, fruto de intensas discussões na área
(http://museus.
cultura.gov.br/).
nas últimas décadas.

Outro aspecto derivado dessa definição é a multipli-


cidade de instituições que são consensualmente con-
sideradas, pela comunidade internacional represen-
tada no Icom, como museus. Esse é o caso dos jardins
botânicos, zoológicos, aquários, planetários, centros
de ciência e centros culturais.

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Em 2007, o Icom novamente propôs alterações na


definição de museu, votando em sua 22ª. Assembleia
Geral o seguinte texto:
“O museu é uma instituição permanente,
sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e
de seu desenvolvimento, aberta ao público,
que adquire, conserva, pesquisa, comunica
e expõe o patrimônio material e imaterial
da humanidade e de seu meio ambiente,
com fins de educação, estudo e lazer.”

Nessa nova definição, o conceito de patrimônio ma-


terial e imaterial ganha relevância, ao mesmo tempo
em que são reafirmados os valores de comunica-
ção, educação e lazer como funções e objetivos ins-
titucionais, juntamente com a pesquisa, o estudo, a
conservação e a coleta. Muitas e diferentes tipologias
institucionais convivem dentro dessa definição, tanto
nacional quanto internacionalmente. No Brasil, temos
exemplos de museus e processos museológicos, que
vão desde os grandes museus governamentais até
museus comunitários e virtuais. Internacionalmente,
as possibilidades de arranjo museais também são
inúmeras, evidenciado a capacidade dos museus de
se fazerem relevantes na contemporaneidade.

O conceito de museus proposto pelo Icom é base para


a definição utilizada no Estatuto de Museus, lei que
rege essa área no Brasil. No tópico seguinte, apresen-
taremos mais informações acerca da legislação mu-
seal brasileira.

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2. PANORAMA DO SETOR MUSEAL


BRASILEIRO: POLÍTICAS PÚBLICAS
E PROFISSIONALIZAÇÃO.

2.1. HISTÓRICO E ESTRUTURA DO SETOR –


PRINCIPAIS AGENTES, AGÊNCIAS E SUA ATUAÇÃO
NA ESTRUTURAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
MUSEAIS NO BRASIL.

A institucionalização dos museus no Brasil remonta


ao século XIX, quando foi inaugurado o primeiro mu-
seu em solo nacional (Museu Real, 1818). A partir da
segunda metade do século XIX, diversas instituições
museais foram criadas no país. A criação de um ór-
gão governamental voltado à gestão e consolidação
do campo museal no Brasil, só aconteceria em 1934,
com a criação da Inspetoria de Monumentos Nacio-
nais, no Museu Histórico Nacional. Esse órgão é o em-
brião do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico
Para saber mais
sobre patrimônio
imaterial, acesse
Nacional (SPHAN), criado em 1936.
o portal do IPHAN:
http://portal.iphan.
gov.br/pagina/
detalhes/234 Nesse processo de institucionalização do campo mu-
Acessa também a
Convenção da Unesco seal no Brasil, também são importantes os debates,
para a Salvaguarda
do Patrimônio Cultural
Imaterial: http:// encontros e associações estabelecidos pelos profis-
portal.iphan.gov.br/
uploads/ckfinder/ sionais atuantes na área. Esse é o caso do já citado
arquivos/Convencao%
20Salvaguarda%20
Patrim%20Cult%20 Conselho Internacional de Museus, criado em 1946,
Imaterial%202003.pdf
congregando internacionalmente os profissionais e

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instituições atuantes no campo. Aqui no Brasil, com o


intuito de também organizar os profissionais da área,
foi criada, em 1963, a Associação Brasileira de Muse-
ologistas, atual Associação Brasileira de Museologia.

A criação da Associação Nacional Pró-Memória, em


1979, permitiu a instalação do Programa Nacional de
Museus, já em 1983. Essa instituição e a Secretaria
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN)
foram responsáveis pela manutenção de uma política
pública museal nacional entre as décadas de 1970 e
1980. No início da década de 1990, ambas foram in-
corporadas ao Instituto Brasileiro do Patrimônio Cul-
tural (IBPC) que, mais tarde se tornaria o Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). É
somente no início do governo do presidente Luiz Iná-
cio Lula da Silva (2003-2010), com a remodelação do
Ministério da Cultura (MinC), sob a gestão do minis-
tro Gilberto Gil, que uma Política Nacional de Museus
(PNM) pode ser efetivada. A elaboração da PNM con-
tou com ampla e efetiva participação da sociedade
civil interessada, em especial a comunidade de profis-
sionais e instituições museais.

“Um dos resultados dessa ampla consulta


foi o entendimento de museus como práti-
cas e processos socioculturais colocados a
serviço da sociedade e do seu desenvolvi-
mento, politicamente comprometidos com a

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gestão democrática e participativa e volta-


dos para as ações de investigação e inter-
pretação, registro e preservação cultural,
comunicação e exposição dos testemunhos
do homem e da natureza, com o objetivo
de ampliar o campo das possibilidades de
construção identitária e a percepção críti-
ca acerca da realidade cultural brasileira.”
(Ministério da Cultura, Instituto Brasileiro
de Museus, 2010, p. 32).

Como consequência da PNM, foi criado, ainda em


2003, um órgão destinado a pensar os museus na-
cionais dentro do Iphan, o Departamento de Museus
e Centros Culturais (DEMU) que, em 2009 se tornaria
o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). Criado pelo
mesmo instrumento que instituiu o Estatuto de Mu-
seus, lei que rege a área museal no Brasil, o Ibram é
o responsável pelos museus federais. Também é res-
ponsável pela Política Nacional de Museus e pela me-
lhoria dos serviços do setor.

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BOX PARA SABER MAIS

Marcos legais e documentos estruturantes

Documentos estruturantes da área museológica: fruto de reu-


niões internacionais de profissionais e instituições atuantes no
campo dos museus. Tiveram importante impacto na consolida-
ção de políticas públicas museais no Brasil e no mundo.

Atas do “Seminário Geral da Unesco sobre a Função Educativa


dos Museus”. Realizado no Rio de Janeiro em 1958, esse seminá-
rio inaugura uma linha de reuniões regionais que abriu a possibi-
lidade de reflexão museológica a partir de olhares não europeus
(CÂNDIDO, 2000). As discussões estiveram centradas na função
educativa dos museus, sendo feitas diversas recomendações à
Unesco, centradas na ampliação de quadros e serviços educa-
cionais dentro dos museus.

“Mesa Redonda de Santiago do Chile sobre o Papel do Museu


na América Latina”. É considerada por Mensch (apud CÂNDIDO,
2000) a mais original e importante contribuição da América La-
tina para o pensamento museológico contemporâneo. Realizada
no ano de 1972, a Mesa Redonda teve sua importância atrelada
à proposição do uso social do patrimônio, bem como à definição
do conceito de museu integral e de patrimônio global/integral. É
considerado o marco fundador da Nova Museologia.

Declaração de Quebec (1984). Documento fundador do MINOM


– Movimento Internacional para uma Nova Museologia. Nesse
documento os museus são conclamados a envolver a popula-
ção em suas ações, que por sua vez, devem ser catalisadoras
de transformações sociais. Como decorrência dessa nova forma
de atuação, as estruturas museais passam por modificações
radicais que desembocam em novos modelos organizacionais,
tais como os museus comunitários, os museus de vizinhança e
os ecomuseus.

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Declaração de Caracas (1992). Nesse documento foram ava-


liadas as mudanças ocorridas e os desafios enfrentados pelos
museus desde 1958. Reafirmou-se o compromisso social dos
museus, dessa vez frente a um cenário consolidado de abertura
das instituições museológicas ao seu entorno.

Documentos legais da área museal no Brasil.

A criação do Instituto Brasileiro de Museus e da promulgação


do Estatuto de Museus foram importantes marcos estruturantes
para a área museal no Brasil. Além desses, existem as políticas
públicas que guiam a estruturação do setor no Brasil.

1. Política Nacional de Museus – Disponível em: https://www.mu-


seus.gov.br/wp-content/uploads/2010/01/politica_nacional_mu-
seus.pdf

2. Estatuto de Museus – Lei no 11.904, de 14 de janeiro de 2009


– é a principal ferramenta de gestão do Ibram. Lei que rege a
área museal no Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11904.htm

3. Criação do Instituto Brasileiro de Museus – Lei no 11.906, de


20 de janeiro de 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2007-2010/2009/Lei/L11906.htm

4. Política Nacional de Educação Museal. Disponível em: https://


www.museus.gov.br/wp-content/uploads/2017/06/Documento-
-Final-PNEM1.pdf

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REFERÊNCIAS
CÂNDIDO, M. M. D. Ondas do Pensamento Museológico Brasileiro.
2000. Monografia (Especialização em Museologia) – Museu de Arque-
ologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2000.

MAIRESSE, F.; DESVALLÉES, A. Vers une redéfinition du musée?


Paris: L’Harmattan, 2007.

MARTINS, L. C. A relação museu/escola: teoria e prática educacio-


nais nas visitas escolares ao Museu de Zoologia da USP. 2006. Dis-
sertação (Mestrado) – Faculdade de Educação, Universidade de
São Paulo, São Paulo, 2006.

MINISTÉRIO DA CULTURA, INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS. Polí-


tica Nacional de Museus – Relatório de gestão 2003-2010. Brasília, DF:
MinC/Ibram, 2010.

ICOM, Museum definition. Código de Ética para Museus do ICOM .


ICOM-BR, 2006. Tradução da edição do Código de Étic a para Mu-
seus do ICOM; org. gestão período 2003-2006.

_______________. Disponível em: https://icom.museum/en/activities/stan-


dards-guidelines/museum-definition/2007. Acesso em: maio de 2018.

RIVIERE, G. H. L’écomusée, un modèle évolutif (1971-1980). In: DES-


VALLÉES, A. Vagues. Une anthologie de la nouvelle muséologie. Paris:
Presses Universitaires de Lyon, W, MNES, p. 440-445, 1992.

VALENTE, M. E. A. Museus de Ciências e Tecnologia no Brasil: uma


história da museologia entre as décadas de 1950-1970. Campinas,
2008. Tese (Doutorado) – Instituto de Geociências, Universidade Es-
tadual de Campinas, 2008.

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